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Reformando a globalização:

criação de uma governança global independente


Rubens R. Sawaya

M Making Globalization Work, o Prê- nia dos países em desenvolvimento, en-


E mio Nobel Joseph Stigliz procura com- fraqueceram seus regimes democráticos
pletar o trabalho que iniciou em A glo- pela imposição – de fora para dentro – de
balização e seus malefícios (2002), quan- medidas1 e valores inapropriados, e, no
do analisou o impacto das políticas libe- fim, têm criado um grande número de
ralizantes do Consenso de Washington, perdedores tanto nos países ricos como
e em Os exuberantes anos 90 (2003), no nos pobres, pelo desemprego que criam.
qual contrapõe a lógica liberalizante à Segundo o autor, esse é o resultado de
política dos Estados Unidos e ao en- um modelo imposto pelos países avan-
fraquecimento dos Estados Nacionais çados por meio de instituições como
ante o mercado financeiro e os interes- FMI, Banco Mundial, OMC e Tesouro
ses das grandes corporações. Com esse Norte-Americano de forma não-demo-
novo livro, o objetivo é propor reformas crática, refletindo os interesses dos países
no modo como é gerida a globalização, desenvolvidos e de suas grandes corpo-
para torná-la mais justa, minimizando rações. “Sem um governo e instituições
seus malefícios e fortalecendo seus bene- globais, nós temos um sistema de gover-
fícios. Apesar de ser um livro mais pro- nança global caótico, sem coordenação”
positivo do que analítico, é recheado de (p.21).
fatos e histórias extremamente interes- Lança à discussão um conjunto de
santes que servem para melhor justificar propostas para administrar melhor a glo-
suas propostas. balização. O autor acredita que é pos-
Torna-se um livro obrigatório não sível criar mecanismos para gerenciar a
apenas pela riqueza e volume de propos- globalização a fim de promover o de-
tas em si, mas pela análise das questões senvolvimento mundial, garantindo que
que dão corpo a elas. Além disso, porque os interesses dos menos poderosos e dos
nos coloca o seguinte desafio: é possível países em desenvolvimento sejam de fato
administrar a globalização? Em outras pa- contemplados. Procura recuperar assim
lavras, talvez pudéssemos dizer: é possível a famosa afirmação de Keynes (1978,
controlar o movimento do capital global p.126): “De minha parte, acho que, sa-
materializado na ação das grandes potên- biamente administrado, o capitalismo
cias e suas corporações multinacionais? provavelmente pode se tornar mais efi-
Em parte, o livro propõe repensar ciente para atingir objetivos econômicos
as reformas liberalizantes tipo “market- que qualquer outro sistema alternativo
friendly” aplicadas em diversos países, conhecido [...]”.2 Para Stiglitz, pelos re-
incluindo o Brasil, a partir do Consenso sultados já constatados, é possível afirmar
de Washington. Demonstra como essas que “Hoje, a defesa do ‘fundamentalis-
estratégias geraram instabilidade e não mo de mercado’ desapareceu em larga
desenvolvimento, diminuíram a sobera- medida [...] Sem regulação e intervenção

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apropriada do governo, o mercado não As políticas liberalizantes e a privatiza-
conduz à eficiência econômica [...] O ção6 desmantelaram e enfraqueceram os
desenvolvimento requer pensamento de Estados nacionais e a estrutura produtiva
longo prazo e planejamento” (p.XIV). de países. O caso limítrofe foi a Rússia.
Crítica à ortodoxia A liberalização dos mercados
É importante destacar o esforço de Segundo o autor, nunca houve livre-
Stiglitz em recuperar a tradição keyne- comércio no sentido que os economis-
siana – após de quinze ou vinte anos de tas7 defendem.
neoliberalismo – contra a ortodoxia fun- O mundo de Adam Smith e do mer-
damentalista de mercado, segundo a qual cado livre que advoga que sob ele to-
o mercado é regido pelas mesmas leis da dos ficarão em melhor situação não é
natureza. Para a teoria econômica, talvez apenas um mundo mítico dos merca-
isso seja o mais fundamental no livro:3 a dos funcionando perfeitamente, sem
retomada dessas idéias a fim de gerenciar desemprego; é também um mundo
o capitalismo; a constatação de que sem no qual riscos não têm importância
gerenciamento o sistema cria pobreza e podem ser evitados, a competição
é sempre perfeita, sem Microsofts ou
e desigualdade; a constatação de que o
Intels dominando as áreas. (p.68)
mercado só pode funcionar se adminis-
trado. O autor sabe que não é uma lógica Além de considerar que o livre-mer-
nova, mas que é mais atual e consistente cado é uma ficção, Stiglitz conclui que a
do que a lógica do Consenso de Washing- liberalização comercial mundial se efeti-
ton. Além disso, já tirou o capitalismo de va de forma injusta e assimétrica, “abrin-
uma grande crise pelo menos uma vez. do mercados nos países em desenvolvi-
Indo um pouco mais além, constata mento para bens dos países industriais
também que não existe uma única forma avançados sem reciprocidade” (p.62).
de pensar o desenvolvimento econômico A assimetria a que se refere é resultado
que sirva a diferentes países com caracte- não apenas das diferenças de desenvolvi-
rísticas diversas, ainda mais aquela que se mento industrial e tecnológico entre os
diz baseada na economia norte-america- países, mas também de poder de nego-
na de “livre-mercado” que, na verdade, ciação, poder esse que está relacionado
nunca foi livre e nem desvinculada de ao poder econômico. Para Stiglitz, rara-
um Estado forte e atuante.4 Para o au- mente países em desenvolvimento con-
tor, países asiáticos como China, Japão, seguem de forma isolada um acordo que
Cingapura são exemplos disso e soube- seja justo. Por isso, defende que os acor-
ram desenhar estratégias próprias dosan- dos bilaterais devam ser desencorajados.
do Estado e mercado.5 A América Latina Uma constatação relevante é que a
fez tudo diferente da Ásia, e seu fracasso efetivação do livre-comércio beneficia
“junto com o sucesso da Ásia do Les- apenas as corporações multinacionais,8
te provê o mais forte argumentos con- uma vez que resulta em desemprego e
tra o Consenso de Washington” (p.35). elevação da pobreza tanto nos países po-
O fundamentalismo de mercado gerou bres, pela destruição de capitais produ-
muito mais problemas que soluções para tivos locais, como nos países ricos, pelo
o desenvolvimento mundial. “Chávez na deslocamento das empresas para outros
Venezuela é o resultado [...]” (p.144). países. A perda de empregos ocorre em

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velocidade e volume mais elevado do novas tecnologias, ao contrário, freia-o
que o ganho pelo desenvolvimento de ao estabelecer monopólio10 sobre co-
novas atividades. Eleva, portanto, a po- nhecimentos muitas vezes adquiridos ao
breza tanto nos países pobres como nos longo do tempo por diversas pesquisas
de indústria avançada. financiadas com dinheiro público. Não
Além disso, para Stiglitz, a discussão tornar público determinado conheci-
sobre a liberalização comercial não está mento leva à ineficiência produtiva, uma
correta. Não é o livre-mercado que resul- vez que impede a difusão da inovação.
ta em mais desenvolvimento dos países. Impede também o desenvolvimento tec-
A história tem demonstrado que é a ele- nológico dos países em desenvolvimen-
vação das exportações dos países pobres to por transferência, bem como a dimi-
e não a remoção de barreiras à impor- nuição da distância entre países ricos e
tação que tem promovido seu desenvol- pobres. Além disso, contraria a lógica da
vimento. Da mesma forma, demonstra concorrência. Os países ricos criam mo-
não ser verdade que é a política de libe- nopólio sobre a mercadoria que têm para
ralização de importações é que atrai in- vender, ao mesmo tempo que defendem
vestimentos estrangeiros, mas uma série a liberalização em outras áreas.
de outros fatores. “O sucesso da China A questão dos países ricos
demonstra isso”, afirma o autor (p.66). em recursos naturais
Por isso, defende a total abertura dos Preocupado com os conflitos latentes
mercados dos países desenvolvidos aos no mundo envolvendo países detentores
subdesenvolvidos até que estes últimos de recursos naturais, principalmente pe-
possam competir. tróleo, Stiglitz se pergunta qual a razão
À parte os inúmeros exemplos e análi- de os países que detêm essa riqueza se-
ses de casos sobre o papel das instituições rem pobres, possuírem grande disparida-
internacionais na forma desigual como o de entre ricos e pobres e terem sido (ou
comércio mundial tem sido gerido em serem) dominados por ditaduras. Apesar
favor dos países mais ricos, Stigliz defen- de não relacionar a ditadura a interesses
de a modificação dessas instituições ou econômicos de grupos nacionais e inter-
a criação de novas, independentes, para nacionais, diretamente, aponta para o
que os acordos sejam mais justos e pro- papel ativo nessa realidade das empresas
movam de fato o desenvolvimento glo- multinacionais e das políticas de priva-
bal, permitindo aos países mais pobres tização desses recursos. Em ambos os
alcançarem os mais ricos. casos, o fato é que têm sido garantidos
Outra questão importante é sua crítica os interesses tanto de grandes empresas
aos acordos relativos aos direitos de pro- como de consumidores globais e das
priedade (Trip).9 Para ele, esses acordos elites locais que se beneficiam da explo-
apenas “refletem o triunfo dos interesses ração ou venda dos recursos (privatiza-
corporativos dos EUA e União Euro- ção), deixando a população desses países
péia” (p.105) no comércio internacional. à margem. Corrupção tanto nos países
Aponta que a garantia da propriedade como por parte das grandes empresas
intelectual não tem sido boa nem para os tem sido corriqueira. Isso é o que ocorre
países desenvolvidos. Não é um instru- e ocorreu em países como a Venezuela.
mento eficaz para o desenvolvimento de Lembra, assim, que a eleição de Chávez

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é uma resposta a esse histórico. “A ha- acesso a eles exclusivamente àqueles que
bilidade de Chávez em negociar antigos têm renda mais elevada, os mais ricos.
contratos para melhorar seus termos para Propõe, assim, a criação de “alguma for-
seu país, simplesmente, reforça a crença ma de gestão pública dos recursos natu-
de que, no passado, os venezuelanos fo- rais e a criação de um conjunto de regras
ram enganados” (p.144). globais sobre o uso e as externalidades
Para Stiglitz, os países ricos em re- negativas que esse uso gera” (p.165).
cursos naturais devem assumir a maior Propõe ainda formas de punição econô-
responsabilidade por seu uso. A criação mica pela cobrança pelo uso, apesar de
de instituições que zelem por normas in- essa forma resultar em problemas seme-
ternacionais para o uso desses recursos lhantes aos da privatização. De qualquer
pode reduzir a corrupção tanto interna maneira, aponta que essas ações têm pou-
como externa e garantir seu bom uso. ca chance de resultado se países como os
De qualquer forma, o autor sabe que Estados Unidos e a China não apoiarem.
mexer com esse assunto é tratar com Mas propõe um sistema de sanções que,
interesses antagônicos dos países desen- apesar de contrariar interesses, poderia
volvidos e suas corporações, que têm por talvez funcionar.
objetivo controlar os recursos naturais O papel das grandes corporações
no mundo, mas acredita que instituições Apesar de não apenas neste livro, mas
internacionais independentes podem nos anteriores aqui citados, o autor ter
minimizar o problema. destacado o papel das grandes corpora-
O agravamento ções na lógica do poder que tem feito
da questão ambiental a globalização funcionar de forma que
A forma como a globalização tem seu malefícios se sobressaiam em relação
funcionado, também, está contribuindo aos benefícios, pouco toca nesse assunto
para uma acelerada piora nas condições quando se refere a elas diretamente. A
do meio ambiente e no aquecimento despeito do que havia dito antes, agora
global. O problema é que a poluição é reduz o mal que causam quase que exclu-
gerada localmente, mas afeta o planeta sivamente a problemas éticos (destruição
como um todo. É uma questão típica da concorrência, corrupção, uso indevido
de como ações micro criam externalida- de recursos naturais, poluição) e não ao
des negativas, em escala macro, no caso, conjunto de determinações sociais, polí-
planetária. Portanto, a solução só pode ticas e econômicas que decorrem de sua
ser encontrada nesse âmbito e deve ser lógica de atuação e que põem em marcha
regulamentada de forma global e inde- o processo que denomina de globaliza-
pendente dos interesses de países ou de ção, sobre o qual realiza a sua crítica.
empresas específicas, na verdade, muitas Assim, para ele, resolvendo-se esses
vezes contrariando esses interesses. problemas éticos relacionados a valores
Recursos naturais são bens públicos. sociais por meio de uma contabilização
A gestão privada desses recursos pode pública – numa espécie de balanço social
resultar em algum controle e preserva- – para que a empresa seja julgada social-
ção, segundo o autor, mas implica, sem- mente, bem como pela criação de alguns
pre, uma distribuição menos igualitária sistemas de punição a essas “externalida-
dos recursos, muitas vezes permitindo o des”, restariam, para o autor, apenas os

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benefícios que resultam da ação dessas Stiglitz, dado que o sistema financeiro
corporações multinacionais, tais como a internacional pensa, principalmente, no
melhoria das condições de vida das pes- lucro e retorna quando o país começa a
soas pela criação de empregos, a transfe- crescer. Uma outra solução é não adotar
rência de tecnologia e conhecimento aos as políticas do FMI13 – “opostas ao que
países menos desenvolvidos, e a promo- Keynes proporia” – focadas sempre no
ção do crescimento econômico. déficit fiscal, na elevação de impostos, no
A questão das dívidas externas corte de despesas públicas. O caráter re-
cessivo dessas políticas agrava o quadro.
O autor põe ainda em questão a for-
Além disso, muitas vezes as solicitações
ma de financiamento dos países menos
do Fundo vão além, forçando os países a
desenvolvidos, recorrente fonte de cri-
adotarem a liberalização de capitais para
ses financeiras e falências desses países,
atrair capitais externos, piorando ainda
às vezes com potencial de desestabilizar
mais as coisas pela elevação da instabili-
todo o sistema. Para ele, trata-se de um
dade desses países.
problema de gestão: os países menos de-
senvolvidos tomam empréstimos além A criação da moeda global
da sua capacidade de pagamento – por Para o autor, o sistema de reservas glo-
pressão ou não do sistema financeiro bais atual tem sido perverso e tem criado
internacional –, e os credores não têm uma instabilidade crescente nas finanças
o devido cuidado, no momento de em- mundiais. Pensando nisso, de todas as
prestar, dado o baixo risco que decor- propostas, talvez a mais interessante e
re da garantia dada pelo FMI.11 Ambos, polêmica seja a de criação de uma moeda
credores e devedores, subestimam riscos global na direção do que havia proposto
de desvalorização cambial nos países to- Keynes no pós-guerra. Stiglitz compre-
madores ou de uma elevação dos juros ende que o sistema de reservas mundiais,
internacionais. Ora, se é um problema tendo o dólar como centro, beneficia
de gerenciamento,12 o autor propõe a apenas os Estados Unidos ao disponi-
formulação de contratos capazes de in- bilizar-lhe recursos de baixo custo para
cluir os riscos, bem como a criação de financiar seu desequilíbrio comercial.14
um sistema de provisão para calamida- Isso seria fonte de uma enorme instabi-
des macroeconômicas (desvalorização lidade financeira internacional. Qualquer
ou elevação das taxas de juros interna- desconfiança no dólar pode fazer que pa-
cionais) e a criação de controles sobre íses passem a manter suas reservas em ou-
capitais especulativos. Uma estrutura tra moeda, o que poderia provocar uma
de leis internacionais regulamentaria crise de financiamento (se não uma cor-
essas relações e estabeleceria a punição rida contra o dólar) dos Estados Unidos.
dos responsáveis, quando da ocorrência O sistema atual de reservas em dólar
de crises de endividamento, evitando-se cria uma situação inusitada, na qual os
que o peso caia, exclusivamente, sobre países menos desenvolvidos acabam por
os devedores como é hoje. financiar os Estados Unidos. “O que os
Uma vez, porém, deflagrada uma Estados Unidos recebem dos países em
crise de endividamento externo, dentre desenvolvimento pelo sistema de reser-
as soluções propostas está a moratória, vas é mais do que eles fornecem a esses
o que não é um ponto negativo para países como ajuda” (p.250).

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Assim, para solucionar esses proble- la global, imaginando, talvez, a criação
mas, Stiglitz propõe a criação de uma de um governo global desvinculado das
moeda internacional denominada “gre- grandes potências e das grandes corpo-
enbacks”, na qual todos os países conver- rações multinacionais.
teriam suas reservas. Isso, segundo ele, O centro de sua discussão e de suas
teria enormes benefícios, tal como dimi- propostas está na revisão da relação en-
nuir a instabilidade potencial do sistema tre Estado e mercado, na necessidade
financeiro internacional e, ainda, criar de intervenção pública de forma con-
fundos para administrar crises e promo- tundente, exatamente onde o mercado
ver o crescimento e o desenvolvimento falha, no sentido de torná-lo mais pró-
de países subdesenvolvidos. Outro bene- ximo ao “perfeito”, que pelo visto não
fício seria a redução do poder de algu- são intervenções pequenas ou marginais.
mas moedas especularem contra outras, A questão é, portanto, como criar me-
dado que a taxa de câmbio seria definida canismos e instituições capazes de zelar
pela instituição administradora. por essa governança global e promover
Claro, o autor reconhece que isso tra- o desenvolvimento de todos os países,
ria problemas para os Estados Unidos, ricos e pobres. Para ele, isso depende da
que teriam, então, que financiar seu dé- capacidade de o mundo criar ou modifi-
ficit tomando empréstimos no mercado car instituições, fortalecendo as bases da
internacional, como qualquer outro país. democracia.
Não toca em questões mais complica- O que Stiglitz propõe no livro é bas-
das, como a diminuição do poder norte- tante ousado e merece reflexão e consi-
americano que resultaria dessa medida, deração. Pode-se dizer que defende que
problema que nem Keynes conseguiu se retire das mãos das grandes potências
superar em um momento que esse país e de suas corporações multinacionais o
ainda se iniciava no papel de potência controle que possuem sobre a globali-
hegemônica mundial. zação, responsável por grande parte dos
A democratização da globalização malefícios que se abatem sobre o mundo
O que Stiglitz defende neste livro, de atual. Resta pensar se isso é de fato possí-
fato, são mudanças na forma como é ge- vel, ou discutir o que suas propostas têm
renciado o sistema global atual. Acredita de real viabilidade e quais delas devem,
que essas mudanças possam ocorrer pela mesmo que aparentemente inviáveis, ser
democratização das decisões e das ins- um objetivo a perseguir. De qualquer
tituições internacionais, pela criação de forma, permanecerá a dúvida: será que é
um sistema de governança global, fazen- algo que poderia ocorrer, considerado o
do que os países menos favorecidos ou potencial de conflitos que envolve? Em
mais fracos consigam ter voz e possam, síntese, será que mudar a forma como
assim, se beneficiar da globalização, o a globalização funciona não é mudar a
que, até agora, pela lógica exclusiva do forma como o capitalismo funciona?
mercado, não ocorreu. De certa forma, O autor responde: “Este livro reflete
no mesmo caminho das propostas de minha fé na democracia; que cidadãos
Keynes para administrar o capitalismo bem informados estão mais predispos-
no âmbito dos países nos anos 1930, Sti- tos a realizar algum controle contra os
glitz faz suas propostas, agora, em esca- abusos das grandes empresas e de inte-

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resses financeiros que têm dominado a mundo real, mas no que deveria ser mo-
globalização” (p.XIII). Vale lembrar que dificado para se alcançar aquele mundo
o trabalho que lhe deu o Prêmio Nobel ideal.
dizia respeito às conseqüências para os 8 E apenas no curto prazo, dado que não
agentes econômicos do fato de as infor- é sustentável no longo prazo por seus
mações serem sempre imperfeitas e limi- resultados.
tadas. 9 Tratados relacionados a direitos de pro-
priedade intelectual.
Notas 10 Narra exemplos histórico extremamente
curiosos.
1 Segundo Stiglitz, o próprio FMI dá
pouca importância à democracia dos 11 O chamado “risco moral”.
países, uma vez que determina políticas 12 Não relaciona esse problema, por exem-
econômicas de ajuste e a independência plo, ao esquema de financiamento às
do Banco Central à revelia das decisões próprias corporações multinacionais, às
do próprio país. Utiliza como método vezes amarrado à importação compul-
deixar essas políticas a “técnicos” que sória de equipamentos.
tomam decisões independentes da po- 13 Segue teorias econômicas que têm sido
lítica (p.56). “devastadoras para milhões de pessoas
2 Diga-se de passagem que o outro “sis- que vivem nesses países [devedores que
tema conhecido” à época era o sistema adotam as políticas]” (p.235).
soviético. 14 Não toca no ponto sobre o poder de
3 Esse aspecto parece estar ainda mais cla- Banco Central mundial que o Federal
ro em seus dois livros anteriores, mas Reserve tem de, ao fazer a política mo-
principalmente no segundo citado. netária internacional, promover cresci-
4 Demonstra isso claramente em Os exu- mento ou crises em outros países.
berantes anos 90.
5 Poderia também relembrar as propostas
da Cepal originais, mas não o faz. Referências bibliográficas
6 Stiglitz, referindo-se inclusive ao caso KEYNES, J. M. O fim do laissez-faire. In:
do Brasil: “O argumento para a priva- SZMRECSÁNYI, T. Keynes, John May-
tização é que o setor privado é mais efi- nard: economia. São Paulo: Ática, 1978.
ciente do que o público. Esta opinião
deve-se muito mais à ideologia do que
a alguma análise bem feita [...] A ine- STIGLITZ, J. E. Making Globalization
ficiência de algumas empresas estatais Work. New York: WW Norton, 2006.
deve-se à falta de investimentos causada
pela insistência do FMI em tratar as dí-
vidas dessas empresas como dívida pú- Rubens R. Sawaya é doutor em Ciência
blica [...] as empresas estatais dos países Política, mestre em Economia Política,
em desenvolvimento são efetivamente professor do Departamento de Economia
proibidas de fazer isso” (p.142). da PUC-SP e autor do livro Subordinação
7 Poderíamos acrescentar que muitos eco- consentida: capital multinacional no pro-
nomistas trabalham com a hipótese de cesso de acumulação da América Latina e
um mundo por eles idealizado, e for- Brasil (Annablume, 2006).
mulam suas políticas não como base no @ – rsawaya@uol.com.br

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