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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA

4ª Semana do Servidor e 5ª Semana Acadêmica


2008 – UFU 30 anos

UM ESTUDO COMPARATIVO ENTRE LITERATURA E PINTURA EM


AQUARELAS DE HILDA HILST

Lívia Carolina Alves da Silva1


Universidade Federal de Uberlândia-ILEEL-liviakrolina@hotmail.com

Resumo: O presente artigo irá apresentar os resultados obtidos em um estudo de mestrado que
objetiva fazer uma análise comparativa entre os poemas da obra aquarelas de Hilda Hilst e as
pinturas feitas pela própria autora nesta referida obra, levando-se em conta as discussões teóricas
que elucidam os estudos interartes. Para tanto nós fizemos um levantamento bibliográfico
denotando a importância destes estudos interartes e como ao longo do tempo esses, tiveram uma
evolução. Feito isto, nós analisamos alguns poemas da obra hilstiana por meio de uma análise
comparativa entre as pinturas e os poemas desenvolvidos pela autora, tentando ressaltar deste
modo um pouco da teoria estudada.

Palavras-chaves: Pintura, Literatura, Estudos comparados.

1-INTRODUÇÃO:

As relações da literatura com a pintura são extremamente variadas e complexas; a poesia


diversas vezes se inspira na pintura, na escultura ou na música; do mesmo modo, estas outras artes
também fazem o uso de alguns aspectos desenvolvidos pela mesma.
Estas ligações foram estudadas ao longo dos tempos por vários autores, se estabelecendo de
maneira variada. Os estudos comparativos entre a pintura e a poesia se iniciam com Horácio e
ganham importância nos dias atuais com a criação da disciplina Literatura Comparada.

2-EVOLUÇÃO DA COMPARAÇÃO ENTRE PINTURA E LITERATURA NA


PERSPECTIVA DE VÁRIOS AUTORES:

Horácio foi um dos primeiros autores que aproximaram a literatura das demais artes
procurando nestas alguma semelhança. Para ele a poesia e a pintura são “artes irmãs”, ou seja, elas
guardam características idênticas entre si. Nesse sentido, ele ao tentar determinar, em sua obra Arte
poética (1997) quais seriam os princípios que a poesia deveria ter e ele a compara com as
características da pintura utilizando-se da expressão Ut pictura poesis. Esta comparação se dava de
maneira inconsciente e incidental, pois para ele não havia diferença entre estas artes e desse modo
ele poderia justificar o uso de algumas características de uma na outra.
A obra Arte poética (1997) mostra-nos quais são os preceitos básicos que a poesia deve
conter, são eles a docilidade; a utilidade; a unidade, harmonia e proporção dentro da obra; uma
verossimilhança com o real; entre outros aspectos. Para fazer isso, este autor, usa o exemplo da
pintura, para ilustrar a característica da unidade que a poesia deve ter.

1
-Mestranda do curso de Mestrado em Teoria Literária , Orientador: Prof. Dr. Ivan Ribeiro.

1
A pintura que Horácio exemplifica como sendo uma quebra de unidade é aquela em que o
pintor junta uma cabeça humana ao pescoço de um cavalo, desta maneira há nesta uma falta de
harmonia.
A tentativa deste autor no sentido de igualar a pintura e a poesia como “artes irmãs” trouxe
uma grande contribuição para os estudos interartes, à medida que a partir disso percebeu-se que
havia uma possibilidade de aproximação entre artes. Dessa forma, esta concepção horaciana foi
utilizada por vários anos.
Na renascença, por exemplo, essa concepção foi bastante retomada pelos artistas, porém,
neste momento, não era a poesia que deveria ser igual à pintura, mas era pintura que deveria ser
igual a poesia, já que a poesia era mais valorizada. Essa inversão de valores trouxe algumas
conseqüências sociais, uma vez que, a pintura que se constituía como uma arte mecânica e da
imitação passa a fazer parte dos homens liberais.
Nesse período, como nos indica Praz (1982) entre os poetas ingleses, os pintores aceitavam
de fato as sugestões dos escritores, obedecendo, por exemplo, a esquemas inventados por eles na
decoração de paredes e tetos e mesmo na composição de um quadro. Assim, criavam-se galerias de
pinturas em verso. Dessa forma, formou-se um grande número de pintores que foram influenciados
pelos poetas.
No século XVIII, a concepção horaciana, da unidade e da harmonia na obra de arte, retorna
a orientação crítica de pintores, escultores, poetas, entre outros artistas. Orientadas por esses
aspectos, as pinturas, por exemplo, obtinham, características literárias e históricas. Assim, a pintura
assemelhará a fábulas literárias.
Desenvolveu-se neste século, uma ampla difusão dos estudos comparativos entre as artes,
nas quais uma interação entre a poesia e a pintura se dava por meio de uma inspiração do mundo
natural “a poesia, afirma-se, enriquece a mente com as visões que pintor poderá representar, e o
conhecimento da obra poética ajudará o homem comum a apreciar as belezas da natureza”
(OLIVEIRA, 1993, p.15).
Neste mesmo século, as vagas comparações baseadas na semelhança temática, determinada
pela tradição horaciana, perde o seu prestígio e valor, o que fez com que surgissem duas novas
correntes críticas: a de Diderot, na França, e a de Lessing, na Alemanha.
Diderot estabelece uma nova teoria sobre as artes, à medida que as longas descrições de
quadro feitas pelos artistas dos séculos anteriores é substituída por interpretações mais criativas e
imaginativas. Para se determinar esta nova apreensão da pintura é preciso se levar em conta que há
um julgamento individual de gosto e de perspectiva do quadro, ou seja, há um sujeito que apreende
o mesmo segundo o seu ponto de vista e passa a interpretá-lo. Assim “Diderot evita, pois, a
descrição do quadro analisado, descrevendo apenas certos objetos nele presentes. Convida o leitor a
fixar alguns deles, numa espécie de passeio para a tela”.(OLIVEIRA, 1993, p.17).
O olhar sobre a tela não pronuncia apenas um detalhe ou um momento único mas vários
ângulos e pontos de vista. Dentro desse aspecto mostra-se que é possível se criar uma história ou
um enredo dentro do quadro enunciando o elemento temporal na sua análise o que dá liberdade na
interpretação do mesmo.
Para este autor, a pintura que apresentava apenas a sua dimensão espacial passa a ter assim
como a poesia uma noção temporal. Esta dimensão é regulada por dois aspectos, são eles: o tempo
de unidade da visão (totalidade) e tempo variável da sua interpretação e leitura da tela.
Ao fazer isso, Diderot traz uma grande contribuição para os estudos interartes, uma vez que,
ele mostrou-nos que as características de um meio de expressão poderiam estar em outro, ou seja,
na pintura nós encontramos elementos temporais como na poesia nós temos elementos espaciais,
isso justifica, então, uma possível comparação entre as artes.
Lessing percebeu que havia um erro na formulação de pintura e poesia como “artes irmãs”,
pois para esse autor estas duas se configuram com linguagens e características distintas, cada uma
delas possui a sua especificidade não podendo desse modo serem igualadas. O autor realizou, então,
um trabalho de crítica à paridade estabelecida entre a poesia e a pintura em sua obra Lacoonte: um
ensaio sobre os limites da pintura e da poesia.

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Esta obra marca uma mudança na orientação crítica tanto da literatura quanto da pintura,
pois percebendo que as duas possuem características distintas, pode-se estudar com mais exatidão o
meio de expressão de cada arte.
Baseada nestes critérios de distinção entre as artes, ele percebe que a pintura é um fenômeno
visual que pertence ao espaço, assim, a sua compreensão e apreciação é vista em sua totalidade, ela
é vista de maneira total e imediata em apenas um golpe de visão; já a poesia é uma arte que depende
do tempo para revelar-se à medida que a sua leitura ocorre em ações que evoluem em uma
seqüência temporal. Isso pode ser verificado nas seguintes palavras de Lessing:
A pintura, em suas imitações, emprega meios ou signos totalmente diversos dos da poesia-
figuras e cores no espaço-enquanto a última utiliza sons articulados em ordem temporal: como,
indiscutivelmente, os signos usados devem ter uma relação precisa com o objeto representado,
segue-se que no conjunto ou em suas partes, existam dessa forma, enquanto os sinais que se
sucedem no tempo podem expressar apenas aqueles que, no todo ou em parte, sejam sucessivos.
(LESSING, 1964 apud OLIVEIRA, 1993, p.21).
Nesse sentido, a pintura deve escolher, um determinado momento para representar o objeto,
e este deve conter o máximo de gestos expressivos para que o espectador da tela tenha a sugestão de
visualizar o quadro em sua totalidade, já a poesia pode escolher e representar um número
indeterminados de atos. Daí decorre a visão de Lessing de que a poesia é superior à pintura “O
poeta ao descrever, não todos os traços do objeto, mas os mais significativos, e ao descrever uma
ação contínua, obtém efeito superior ao do pintor”.(OLIVEIRA, 1993, p.22).
Essa teoria trouxe uma grande evolução para os estudos comparativos entre pintura e
literatura, à medida que, Lessing mostrou-nos que esses estudos deveriam se basear não apenas em
uma simples verificação de semelhança entre as artes, mas sim na percepção de que cada arte possui
o seu estilo e meio de expressão. O critério de avaliação para as diversas artes deveria ser diferente.
Assim, ao compararmos dois meios distintos de arte, nós deveríamos perceber tanto a semelhança
temática e quanto à semelhança de estilo.
Os argumentos de Lessing provocaram opiniões divergentes e concordantes.Entre os
opositores nós encontramos P. Rudowiski e os que apóiam a teoria são de Austin Warren e René
Wellek.
P. Rudowiski nega que a poesia seja feita por ações, pois para ele os argumentos de Lessing
se fundam apenas nas artes tradicionais e não nas modernas na qual nós podemos encontrar
elementos espaciais na composição da poesia.
No século XIX a idéia de que as artes possuíam meios de expressão distintos, inspirou a
visão de dois teóricos da literatura, são eles Austin Warren e René Wellek. Essa concepção foi
empregada por estes autores em seu capítulo “A literatura e as outras artes” de sua obra Teoria da
Literatura(1997).
Segundo Wellek e Warren (1997), mesmo que as relações entre a literatura com a pintura
seja bastante variadas, na qual, a pintura diversas vezes inspirou-se em um poesia, e esta nos passe a
impressão de que estamos a visualizar um quadro, não se pode dizer que estamos diante por
exemplo de um poema-pintura, uma vez que, cada uma dessas artes possuem os seus meios de
expressão, o seu caráter e a sua qualidade técnica que são diversos um do outro.
Esses autores possuem uma posição contrária à comparação entre as artes, à medida que
para eles os paralelos estabelecidos entre a pintura e a literatura resumem-se nas impressões e nas
temáticas que os quadros e as poesias suscitam em nós, pois os usos destas comparações não nos
darão um avanço construtivo nos nossos conhecimentos.
Outros métodos de comparação entre as artes que estes autores acham inapropriadas são:
aquele que defende a noção de que um mesmo movimento apresenta a mesma característica para
todas as artes; aquele em que uma intenção do autor é revelada como única em duas artes distintas
do mesmo.
Para Wellek e Warren (1997) cada arte possui as suas características próprias apesar de elas
estarem convivendo em um mesmo momento. Isso ocorre, uma vez que, muitos paralelos
formulados entre elas ignoram o fundo social, esse aspecto é fundamental para uma análise

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comparativa, uma vez que estão sujeitas às mudanças tanto das classes sociais envolvidas quanto da
época em que foram formuladas.
No que tange as intenções do autor, Wellek e Warren (1997) diz que, mesmo aqueles casos
em que o pintor e o autor da poesia são a mesma pessoa, as intenções, os métodos, o caráter e a
qualidade estética são divergentes. Nesse sentido, os paralelos feitos entre as artes segundo as
intenções do autor não devem acontecer.
Desta forma, a melhor maneira de se fazer uma comparação entre as artes deve ser aquela
em que a análise se baseie nos próprios objetos de arte e nas suas relações estruturais. Para haver
um bom estudo comparativo, é necessário perceber a individualidade de cada uma delas e o que elas
possuem em comum.
René Wellek e Warren trouxeram uma evolução nos estudos interartes à medida que
perceberam a extrema importância de estudarmos as artes segundo as suas divergências estruturais,
pois cada uma tem a sua evolução individual e elas “devem ser concebidas como um esquema
complexo de relações dialécticas que funcionam nos dois sentidos, de uma arte para a outra e vice-
versa e que podem ser interamente transformadas adentro da arte em que ingressarem” (WELLEK,
WARREN, 1997, p.165.).
No século XX houve o nascimento da disciplina Arte e Literatura Comparada. A criação
desta disciplina trouxe uma grande contribuição para os estudos interartes que tomaram uma
enorme dimensão na atualidade. Segundo Gonçalves (1997, p.58):
Nos dias atuais, passou a existir uma espécie de “febre” cada vez mais alta em se estabelecer
algum tipo de relação comparada. Nos congressos surgem os mais inusitados tipos de temas sobre a
insígnia de Literatura Comparada.
Dentro desses estudos as teorias apresentadas ao longo dos tempos tiveram a sua
contribuição, pois nesses começou-se a comparar as artes não só pela semelhança temática, mas
também estilística e estrutural, traços esses propostos por Lessing, Wellek e Warren. Além disso, o
receptor da obra também deve ser considerado levando-se em conta os seus diferentes pontos de
vista, visão esta apresentada por Diderot.
Devido à importância dos estudos interartes na contemporaneidade é que nós escolhemos uma
autora e obra contemporânea para fazermos um estudo comparativo entre as suas pinturas e os
poemas que acompanham essas.

3-CONSIDERAÇÕES SOBRE HILDA HILST E A OBRA AQUARELAS:

A obra Aquarelas (2003) é composta por seis pequenas pinturas que são acompanhadas de
seis poemas que ficam dispostos ao lado destas. A produção das pinturas datam do ano de 1977 e a
publicação dos seis poemas conjugados à obra Da morte. Odes mínimas foi publicado no ano de
1980. Conforme Mora Fuentes (2008)2, revela em uma informação repassada por e-mail, a
produção das pinturas se deu quase de forma incidental, pois, segundo ele, Hilda fora visitá-lo em
sua casa e viu ele e a sua esposa pintando e se sentiu motivada a pintar.Por ocasião do preparo da
edição de Da morte. Odes mínimas, em 1980, Hilda considerou que os desenhos ficariam bem no
livro, então ela criou e acrescentou os poemas que acompanham cada um deles.
Ao fazer esta obra Hilda conjuga, então, dois universos artísticos distintos para dar maior
carga expressiva e simbólica à obra. Dentro do livro os dois universos se complementam e reiteram
a idéia a ser proposta pela autora.
Segundo Alcir Pécora (2003), a obra é elucidativa do tema da morte desenvolvido ao longo
Da morte. Odes Mínimas, ela tem todas as cores quentes vivas, não apresentando nenhuma forma
imediatamente reconhecível como fúnebre temível ou macabra.

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Mora Fuentes é presidente do Instituto Hilda Hilst -Centro de Estudos da Casa do Sol. Grande estudioso de Hilda
e amigo da escritora.

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Nesta obra, o eu-lírico dialoga com a morte que é nomeada de rinoceronte, elefante, peixe,
leão-rei, e que é vista pela persona lírica como o seu duplo. As pinturas são ensolaradas e
apresentam seres que se metamorfoseiam. Há uma atmosfera surrealista que reforça um tom onírico
onde não se distingue muitas vezes o eu (sujeito lírico) e a morte. Tal paradoxo, obviamente
proposital, vem afirmar que a poesia traz a morte para a ensolarada vida, procura(ndo) envolvê-la.
Ao início de suas Odes à Morte, Hilda Hilst substitui o antigo acompanhamento musical
dessa forma poética por pinturas amarelo-avermelhadas em que animais híbridos são cavalgados
por duplos. São cenas de encontros e passeios exóticos num sol de meio-dia. Nada aí lembra a
imagem usualmente assustadora da morte.
Como foi visto anteriormente há nesta obra o uso de animais que indicam o universo
simbólico e imagético da morte assim como o uso de pinturas. Enivalda Nunes Freitas e Souza
(2007) fez um estudo dela, levando em conta que a mesma nos leva para o uso de um gênero
denominado de Bestiário Medieval, daí se explica o uso de animais e ilustrações desenvolvidas na
obra de Hilda.
Segundo Souza (2007) os Bestiários surgiram na Idade média e tinham como intenção
mostrar a conduta animal e humana dando a primeira um valor de superioridade em relação à
segunda. Utilizava-se neste tipo de gênero animais reais, fictícios e exóticos. Cada um deles
representava algum ato moralizante e uma conduta a ser seguida. Além das imagens de animais, as
cores vermellho, dourado, verde e azul presentes nos Bestiários explica a utilização dessas,
predominantemente nas pinturas de Hilda.
O título do livro Aquarelas (2003) nos remete, para um possível imbricamento entre a poesia
e as pinturas, pois esse nós induz a imaginar a idéia de transparência, liquidez e efemeridade da vida
que a morte nos traz. Isso ocorre, uma vez que o termo aquarela é utilizado como uma técnica de
pintura, na qual as cores são misturadas com a água formando uma atmosfera cromática
transparente. Por isso, justificar-se-ia a utilização de tal título.
Após esta breve introdução a respeito da obra Aquarelas (2003) nós iremos fazer a análise
de três poemas da obra, por meio da comparação dos mesmos com as suas pinturas.

4- UMA ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE PINTURA E LITERATURA EM


AQUARELAS DE HILDA HILST.

Rinoceronte elefante
Vivi nos altos de um monte
Tentando trazer para o teu gesto
Teu Horizonte
Para o meu deserto

Figura 1: Ilustração que aparece ao lado do primeiro poema da obra Aquarelas

Ao analisarmos este poema nós podemos perceber que a morte neste poema se
metamorfosea em Rinoceronte Elefante e que a persona lírica do poema tenta uma aproximação
com a morte (o seu duplo) Vivi nos altos de um monte/ Tentando trazer para o teu gesto/ Teu
Horizonte.
Esta tentativa de aproximação entre a morte e o eu-lírico na qual este irá constituir o seu
duplo é reforçada quando observamos a pintura, uma vez que, ao observarmos essa nós podemos
notar que ela apresenta traços sem nitidez e que a morte é representada por um animal e que há uma

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mulher montada neste animal na qual não podemos distingui-las a medida que parece haver uma
fusão entre aos dois. E como a mulher está em cima deste animal (a morte) esta ilustração nos
mostra, também, que esta tenta domar a morte ao se aproximar e se fundir a ela.
As pinturas também nós leva para uma noção de simplicidade e primitividade dos animais
Rinoceronte e elefante, pois o desenho reforça a noção de primitividade feita por Hilda na escolha
destes dois animais, à medida que eles são retratados sem a nitidez e com a simplicidade de traços.
Ao escolher estes dois animais mais primitiva, Hilda reforça a idéia de origem e princípio que a
morte nos mostra.
Ainda dentro desta noção da metamorfose da morte nos podemos perceber que a morte é
representada pela figura de um animal que funde tanto as características de um elefante, onde este é
representado na ilustração pela tromba e pela orelha que parecem a de uns elefantes, como a de um
rinoceronte, representados pelo chifre.
Outro aspecto denotado na pintura e reforçado no poema é a utilização da cor amarela
representando o deserto.

Um peixe raro de asas


As águas altas
Um aguado de malva
Sonhando o Nada.

Figura 2: Ilustração que aparece ao lado do segundo poema da obra Aquarelas.

Neste poema, Hilda mostra o aparecimento de símbolos ascensionais, denotados pelas


palavras “Peixe”, “asas”, pois estes nos sugerem este aspecto. Estes referem-se, também, leveza,
tranqüilidade, pacificidade. Estes aspectos são reiterados pelo uso dos vocábulos “asas” e das
“águas”, “aguado”, pois Bachelard (1997) nos fala das águas tranqüilas e serenas que embalam a
vida e a morte, em sua obra A água e os sonhos ele em o ar e os sonhos (2001) também fala dos
símbolos dos pássaros e das asas como símbolos de ascensão, leveza e tranqüilidade em sua obra..O
uso da cor malva também reitera esta atmosfera de tranqüilidade. Neste momento do poema Hilda
denota a morte como algo tranqüilo e restaurador e é um momento em que ela deseja a morte.
Sonhando o Nada.
A pintura nos remete também para esta atmosfera de tranqüilidade e pacificidade, pois há o
uso das cores claras como o rosa, o azul mais claro, o vermelho também mais claro. Além disso, a
disposição gráfica do desenho nos leva a ter uma impressão de que este animal está voando com as
asas e nadando nas águas e nos passa uma idéia de leveza e tranqüilidade no movimento desta
representação.

Sonhei que te cavalgava, leão-rei


Em ouro e escarlate
Te conduzia pela eternidade
À minha casa.

Figura 3: Ilustração que aparece ao lado do sexto poema da obra Aquarelas

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Neste poema o eu-lírico tenta dominar a morte cavalgando-a, Sonhei que te cavalgava, leão-
rei, e é neste momento da obra que ela consegue dominá-la Te conduzia pela eternidade/ Á minha
casa. Portanto há uma vitória da vida sobre a morte, pois o que prevalece para esta persona lírica
são as cores ouro e escarlate, ou seja, o vermelho e o amarelo que reforçam esta idéia da prevalência
da vida sobre a morte.
Com a pintura podemos perceber que o amarelo colocado nessa pintura é mais intenso e que
há a prevalência das cores, verde e vermelho representadas nas figuras, o que reforça esta idéia da
sobreposição da vida sobre a morte, além disso, nós podemos perceber que o braço da mulher está
totalmente envolto no animal dominando-o, isto mostra que nesse momento em que o eu-lírico
consegue dominar por completo a morte.

5-CONSIDERAÇÕES FINAIS:

Desta forma, nós podemos concluir que o universo que emerge da comparação entre pintura
e literatura é muito amplo, pois vimos que ao longo dos tempos esta possibilidade de comparação
vem sendo estudada e analisada por várias pessoas. Mas, foi, no século XX que ela teve o seu status
máximo, com a criação da disciplina da literatura comparada, a partir daí, se abre um leque de
inúmeras possibilidades entre os estudos interartes.
Dentro deste amplo arcabouço de possibilidades nós pudemos perceber, também, uma
aproximação entre as pinturas feitas por Hilda e os seus poemas e como estas complementam e
reiteram a idéia um do outro.

6- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ARISTÓTELES, HORÁCIO, LONGINO. Arte Poética. In: ___. A poética clássica. São Paulo:
Cultrix, 1997.

BACHELARD, Gaston. O ar e os sonhos. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

____.A água e os sonhos. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

FUENTES, Mora. “Aquarela” de Hilda Hilst. Mensagem recebida <hilda hilst@uol.com.br>em 4


de fevereiro de 2008.

GONÇALVES, Aguinaldo José. Relações homológicas entre literatura e artes plásticas. Revista
Literatura e Sociedade. São Paulo, no 2, p.57-67, 1997.

HILST, Hilda. Aquarelas. In: ____. Da morte. Odes mínimas. São Paulo: Globo, 2003, p.11-24.

OLIVEIRA, Solange Ribeiro de. Literatura e artes plásticas. Ouro Preto: UFOP, 1993.

PRAZ, Mário. Literatura e artes visuais. São Paulo: Cultrix, 1982.

PECORA, Alcir. Notas do Organizador. In: HILST, Hilda .Da morte. Odes mínimas. São Paulo:
Globo, 2003, p.7-11.
SOUZA, Enivalda Nunes Freitas e. Como se Morre com Hilda Hilst: Lições de seu pequeno
bestiário. In: CINTRA, Elaine Cristina; ____. (org). A escrita literária: teorias, histórias e
poéticas, Uberlândia, 2007. No Prelo.

WELLEK, WARREN, René, Austin. Literatura e outras artes. In: ____.Teoria da literatura. 1997,
p.153-165.

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A COMPARATIVE STUDY BETWEEN LITERATURE AND PAINTING IN
“AQUARELAS” OF HILDA HILST

Lívia Carolina Alves da Silva


Universidade Federal de Uberlândia- ILEEL- liviakrolina@hotmail.com

Abstract: This article will present the results of study of master course that aims to make a
comparative analysis between the poems of Hilda Hilst’s work named ‘Aquarelas’ and paintings
made by her in this work, taking into account the discussions that clarify the theoretical studies
between-arts. For this, we have done a survey bibliographic to explain the importance of these
studies between-arts and how over time, these studies had an evolution. Once that is done, we
looked at some poems of Hilda Hilst’s work through a comparative analysis between the paintings
and poems, trying to highlight some of the theory studied.

Key-words: Painting, literature, comparative studies.

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