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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ


Centro de Educação Aberta e a Distância – CEAD
COORDENAÇÃO DE FILOSOFIA
/ DISCIPLINA: Monografia I / Trabalho de Conclusão de Curso II

ALESSANDRA RODRIGUES DE PONTES

O CONHECIMENTO DE DEUS SEGUNDO SÃO TOMÁS DE AQUINO

SIMPLÍCIO MENDES PI

2021
ALESSANDRA RODRIGUES DE PONTES

O CONHECIMENTO DE DEUS SEGUNDO SÃO TOMÁS DE AQUINO

Trabalho de Conclusão de Curso II apresentado como


requisito em Licenciatura Filosofia do Centro de
Educação Aberta e a Distância / Universidade Federal do
Piauí. Orientação: Profª: Silmara Mendes

SIMPLÍCIO MENDES-PI

2021
1- O CONHECIMENTO E A EXISTÊNCIA DE DEUS SEGUNDO SÃO TOMÁS DE
AQUINO.

No presente tópico, buscaremos discutir sobre a visão do pensamento de Deus


segundo a filosofia de São Tomás de Aquino, pegando pelo viés da do conhecimento da
existência da divindade. Mas antes de tudo, faz-se necessário apresentarmos o espaço
de Deus em sua filosofia, para assim possamos chegar ao ponto em questão.

Ao pararmos para analisar o espaço de fala de Deus na filosofia cristã, sobretudo


no pensamento ortodoxo, veremos que ele ocupa nada menos que o centro da teoria. Por
vezes os questionamentos que foram feitos ao longo da história da humanidade foram se
moldado conforme cada período, mas mesmo assim, a divindade ocupa, desde muito
tempo um espaço privilegiado, quase que intocável por todos aqueles que acreditam em
seus ensinamentos e pregações, ao passo em que também objeto de inúmeras questões
e indagações, como tudo quando se diz respeito as produções humanas.

Na filosofia tomista, assim como em muitos de seus estudiosos o lugar que Deus
ocupa também de ator principal, como faz parte da tradição ortodoxa do catolicismo,
ainda enquanto criança, somos direcionados aos pensamentos católicos, ora por tradição,
ora até mesmo por conveniência social em suas determinadas épocas. Nascimento
(1992) ressalta que a vida de São Tomás deu-se em torno de responder a questões
relacionadas a existência da divindade, em sua pergunta clássica: “Quem é Deus? ”. “Sua
vida foi dedicada, inteiramente, de ponta a ponta, a responder esta
pergunta”(NASCIMENTO, 1992, p. 60). Em diversas passagens de suas escrituras há
relatos de indagações a cerca dessas respostas.

Antes de adentramos ao mundo em que pertence a filosofia tomista, é necessário


que façamos uma análise do contexto em o que o próprio encontra-se inserido, desde o
seu nascimento, percorrendo seus processos de aquisição de instrução e algumas de
suas referências, para que possa-se buscar compreender de onde surge seus
pensamentos e referências.

Tomás de Aquino nasceu por volta de 1224/1225 em Roccasecca, na Itália e viveu


até 1274, ainda jovem, com 50 anos de idade. (TORREL, 1999, p.1). Reale e Antiseri ao
descreverem São Tomás dizem que:
Expoente máximo entre os escolásticos, verdadeiro gênio metafísico e um
dos maiores pensadores de todos os tempos [...], elaborou um sistema de
saber admirável pela transparência lógica e pela conexão orgânica entre
as partes, de índole mais aristotélica do que platônico-agostiniana. (2003,
p. 211)

Com um gosto preciso pela leitura e aprendizado, Tomás de Aquino dedicou-se


muito tempo de sua curta trajetória de vida aos ensinamentos catolicistas, estudou na
Universidade de Nápoles, que foi fundada por Frederico II. Como havia sido discípulo de
Alberto Magno, em 1252 é idade por ele para ser bacharel na Universidade de Paris onde
irá lecionar de 1252 a 1254 (TORREL, 1999).

É por volta desse mesmo período que ele produziu os Comentários às Sentenças
de Pedro Lombardo, também escreveu os opúsculos De ente et essentia e De principiis
naturae, onde São Tomás exibe os princípios metafísicos gerais dos quais o inspiraram
para futuras reflexões (REALE; ANTISERI, 2003). Por volta de 1256 a 1259 ele leciona
em Paris e desenvolve a obra Summa Contra Gentilis (TORREL 1999).

Essa obra em questão é de grande valia para a composição de nosso estudo, uma
vez que faz uma examinação, contextualização e ao mesmo tempo uma crítica a todo um
conjunto de “errantes” contra a fé cristã, sendo eles: pagãos, muçulmanos, judeus e
hereges (TORREL, 1999, p. 123).

Em diversas passagens ele pontua sobre a centralidade de Deus ao que tange a


ciência teológica. Em escritos da Summa Theologiae, também declara: “Ora, na doutrina
sagrada, tudo é tratado sob a razão de Deus, ou porque se trata do próprio Deus ou de
algo que a Ele se refere como a seu princípio ou a seu fim” (TOMÁS DE AQUINO, 1996,
p.32). Demonstra com isso a centralidade da divindade, Deus sendo o sujeito (subiectum)
de tudo o que permeia as ciências teológicas.

1.1 A Existência de Deus na Visão Tomista.

As questões nas quais se inserem Deus como centro das discussões nas ciências
filosóficas figuram-se como um ponto delicado, pois entra em total confronto com os
conceitos de verdades na ciência citada, isso por si só já é uma dicotomia que exige um
debate amplo e cuidadoso, pois não é função do filósofo pesquisador apontar ou impor
sua verdade, mas sim levar à reflexão de sua fala para o que entendimento e
conhecimento sejam adquiridos.

Já no que se refere ao ponto de vista cristã , a filosofia não se apresenta mais como
a busca da verdade, porque consideram que esta já foi encontrada e trazida pela própria
palavra de Deus. Nascimento (1986), pontua que São Tomás julga que nos seus
pensamentos não há brusca ruptura entre razão e fé, pois muitas verdades na religião são
tendentes à demonstração racional, pois a fé não contradiz a razão. Todavia entende-se
que a própria consciência da razão sujeita-nos às autoridades dogmáticas e a buscar
entendimentos que muitas vezes perpassam nosso conhecimento.

Na filosofia tomista, para a verdade ser evidente, ela precisa necessariamente ser
inteligente, isso é um marco nos estudos que englobam seus ensinamentos. No que se
refere a existência de Deus, muitos defendem que essa é uma verdade evidente por si
mesma, a despeito disso, Gilson (1960) ressalta:

É certo que alguns filósofos consideram esta verdade como evidente


em si mesma; devemos, pois, primeiramente examinar suas razões
que, se forem fundadas, nos dispensará de toda demonstração, e
ainda – já que não pode demonstrar-se o evidente –, farão, não
somente supérfluas, senão sem objeto, e, em conseqüência,
impossíveis, todas as demonstrações da existência de Deus (p. 70).

Ao levarmos em consideração se o que é evidente por si mesmo é uma verdade e


esta, portanto não requer provas de sua existência, entendemos que esse é o ponto de
partida do conhecimento, que é necessário a partir do que é por si, logo teremos um
conhecimento espontâneo.

Correlacionado a isso, ao conhecimento natural e evidente, Tomás cita Damasceno

Podemos dizer que são assim conhecidas de nós as coisas cujo


conhecimento que temos naturalmente, como os primeiros princípios da
demonstração onde o todo faz parte imediata do maior pelo qual
compreende o nome de Deus como sendo o maior que existe, então “o
conhecimento da existência de Deus é naturalmente infundido em todo".
(Suma teológica I, q.2, art.1.1.p.161).

Com isso, chega-se a conclusão que o conhecimento a respeito da existência de


Deus é inato aos seres humanos, de fato desde muito cedo aprendemos sobre os
ensinamentos pertencentes a evidência da divindade, independente de que religião você
venha pertencer.
Vale ressaltar que para Tomás de Aquino, uma coisa pode ser evidente de duas
formas: em si mesmo e não para nós e em si mesmo e ao mesmo tempo para nós. (Suma
teológica I, 2, 1, C), e ele explica que algo será evidente por si mesmo quando o
predicado estiver dentro na razão do sujeito; e com efeito, se além de o predicado estar
contido no sujeito, a definição do sujeito e do predicado for conhecida por todos, então a
proposição é evidente por si mesma e para todos. (Suma teológica I, 2, 1, C).

Nos ditos de Tomás, a proposição “Deus existe” está inserida na primeira das duas
formas, logo Ele é evidente em si mesmo, mas não necessariamente para todos nós. A
existência da divindade aqui é marcada pela concepção de sujeito e predicado, mas
enquanto seres humanos, não é possível que conheçamos a essência de Deus, tal como
ela seria.

Com efeito ao que menciona-se anteriormente, percebe-se que a visão tomista em


reverência da existência de Deus diz respeito ao que já fora relatado sobre Ele, sendo
quase que impossível que consigamos compreendê-lo e conhecê-lo em sua essência. Em
Suma contra os gentios, no capitulo 14 ele diz: “Com efeito, não podemos captar a
respeito de Deus o que é, mas o que não é e como o resto se refere a Ele, como é
patente a partir do que foi dito anteriormente”. (Suma contra los gentiles. B.A.C., 1952,
2v). São Tomás de Aquino nos dizia que antes de conhecer a essência e evidencias das
coisas, é necessário que saibamos se de fato elas existem: “o que por primeiro se deve
conhecer de algo é se ele existe” (TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica. I, 2, 2, SC).
Observa-se que a experiência de Deus, segundo o autor, é um tanto quanto sensitiva,
assim, a divindade existe na mente, mas não no real, e por não existir nesse último plano,
não temos uma experiência filosófica.

1.2 Deus Segundo o Conhecimento Humano

Para São Tomás de Aquino, existiam duas verdades das quais se pode partir a
respeito da existência da divindade segundo os conhecimentos humanos, a primeira,
aquelas verdades sobre Deus que a nossa razão natural pode admitir e a segunda,
aquelas verdades que ultrapassam as capacidades naturais da nossa razão. (Suma
contra los gentiles. B.A.C., 1952, 2v). Em ambos os casos é perceptível o contato humano
no entendimento de Deus, para o Frade de Roccassecca, as os seres humanos são
considerados em si mesmos e, partindo deles, é que pode-se chegar a Deus.

Ao que se refere ao conhecimento natural de Deus, São Tomás discorre:

“Por isso, conhecemos sua relação com as criaturas, a saber, que é causa
de todas elas, e a diferença das criaturas com relação a Deus, a saber,
que Ele não é nada do que são os seus efeitos” (TOMÁS DE AQUINO.
Suma Teológica I, 12, 12, C).

Dessa forma é possível entendermos que a essência divina seja em si mesma


bastante evidente para nós, pois bem sabemos que temos a origem de todos os nossos
principais conhecimentos nos sentidos, e ela não goza de uma evidência imediata.

Partindo desse pressuposto, Tomás de Aquino corrobora também que a existência


de Deus é algo possível de ser demonstrado, sobretudo pelos efeitos, uma vez que
pontua que essa existência não é evidente no plano real, precisando assim ser
demonstrada a fim de querer afirmar sua certeza, pois são mais evidentes os efeitos que
são sensíveis (effectus nobis notos), e dessa forma é mais fácil demonstrar seus efeitos.

Entre outras palavras, é basicamente o que assevera Gilson (1995) ao tratar do


conhecimento natural de Deus:

Assim, o caminho direto que nos proporcionava o argumento ontológico de


santo Anselmo nos é fechado; mas o que Aristóteles indica permanece
aberto para nós. Busquemos, pois, nas coisas sensíveis cuja natureza é
proporcional à nossa, um ponto de apoio para nos elevar a Deus. (p.658).

Em razão da própria existência humana ser imperfeita, tal conhecimento por muitas
vezes pode encontrar diversos empecilhos, e vale ressaltar que tal demonstração da
existência de Deus, no plano da demonstração não deve, por si só, ser encarada como a
única definição da essência de sua existência, é de importante valia pensar nessa
proposição sob o viés da ideologia tomista, pegando como base o ser humano diante de
suas imperfeições. Para Gilson (1995), a existência de Deus no Frade de Roccassecca
passa a ser totalmente natural na medida em que é de domínio da filosofia e assim
igualmente torna-se acessível à todos.

Outro fator importante a esse estudo, diz respeito aos atributos marcados como
sendo pertencentes à divindade na visão tomista com foco no conhecimento humano, no
que se foi dito e pensado a despeito dEle. E dessa maneira ela busca demonstrar o viés
por meio de duas proposições: a primeira parte do princípio de que já que não nos é
permitido o conhecimento de Deus em si mesmo, na sua principal essência, deve-se
considerar aos seus efeitos. Segundo ponto incide em considerar que a causa esta
presente no seu efeito, logo Deus nos deu a certeza de seu caráter infinito. (GILSON,
1995).

Esses atributos podem ser considerados uma extensão da prova da existência de


Deus, pois podem ser entendidos como um ato, e para Tomás, em Deus não há potencia,
Ele não é um corpo, mas há sim atos. A divindade, por ser o principal agente, não pode
ter potência, logo Ele é ato puro; dito isto, existe a negatividade de que em Deus haja
potência passiva. Sendo Deus um ser eterno, é imprescindível que ele próprio não seja
em potência, pois tudo o que é em potência pode não ser em algum momento ou não foi
em algum momento (Suma Teológica S.c.G.I, c.16).
2. SERIA POSSÍVEL DEMONSTRAR A EXISTÊNCIA DE DEUS?

A questão que permeia a discussão desse capítulo é também uma verdadeira


máxima na existência da humanidade, sobretudo aqueles que buscam discutir sobre a
temática em apreciação, assim como São Tomás de Aquino e seus discípulos. Para este
o verdadeiro conhecimento que temos de Deus começaria pelos sentidos e somente pela
razão, e pelo conhecimento que temos dos sentidos, é que seria possível a compreensão
da existência de Deus.

Essa seria uma questão meramente filosófica, e não teológico-metodológica, como


pode sugerir muitos interessados no assunto, portanto a resposta à pergunta introdutória
depende de toda a possibilidade de existir uma abordagem legítima e filosófica sobre
Deus no conjunto de obras de Tomás de Aquino.

Cabe pontuar que devido nossa próxima essência enquanto seres humanos,
somente as coisas sensíveis nos são de forma imediata acessíveis, dessa maneira a
própria existência de Deus necessita ser demonstrada a posteriori, tão somente por meio
dos efeitos que se encontram disponíveis no mundo sensível. É o que postula o próprio
Tomás: “Portanto, deve-se afirmar absolutamente que Deus não é o que por primeiro
conhecemos, mas, antes, que chegamos a conhecê-lo mediante as criaturas”. (TOMÁS
DE AQUINO. Suma Teológica. I, 88, 3, C). Assim, é possível compreender que só se
forma conceitos das coisas cuja suas essências sejam apreensíveis.

São nossos sentidos que dão origem ao nosso conhecimento, “(...) porque todo o
nosso conhecimento se origina a partir dos sentidos” (TOMÁS DE AQUINO. Suma
Teológica I, 1, 9, C). Nesse quesito, entra em ação a concepção da proposição Deus
existe na visão tomista, tomando como base a ideia das coisas que são evidentes por si
mesmas, mas não para nós. “Digo, portanto, que a proposição Deus existe, enquanto tal,
é evidente por si, porque nela o predicado é idêntico ao sujeito” (Tomás de Aquino. Suma
Teológica. I, 2, 1, C).

A afirmação supracitada, precisa ser demonstrada com o intuito de que se possa


compreender que venhamos a perceber que, no caso da proposição Deus existe, o
próprio predicado existir está explicito na essência divina. E seguindo a linhagem da
demonstração da existência de Deus, para Tomás de Aquino, ela é possível sob duas
perspectivas: a primeira começa da causa e termina no efeito, esse tipo de demonstração
parte do que é anterior de modo absoluto, já a segunda, percorre o inverso da primeira,
partindo do efeito para depois inferir a existência da sua causa , e parte do que é anterior
para nós.

Dessa maneira, para que consigamos chegar à prova da existência de Deus, é de


extrema valia pensar a partir dos efeitos no mundo até chegarmos à causa que Deus é, e
dessa forma, é importante pensar e provar que a existência pertence à essência divina.
Porém, antes de pontuamos a respeito de o mundo como efeito de Deus, é necessário
pensar e demonstrar que é o mundo é um efeito, pois assim estabelecemos a existência
da causa.
REFERÊNCIAS

ANTISERI, Dario; REALE, Giovanni. História da Filosofia (vol. III). 6. ed. São Paulo:
Paulus, 2003.

AQUINO, T. de. Suma contra os Gentios. Trad. D. Odilão Moura e D. Ludgero Jaspers;
revisão Luis Alberto De Boni. Porto Alegre: Escola superior de Teologia São Lourenço de
Brindes, 1990.

______. Suma Teológica. v.1 - São Paulo: Loyola, 2004

______. Compêndio de teologia. Ed. Abril, 1973. (Coleção Os Pensadores)

TORRELL, J-P. Iniciação a Santo Tomás de Aquino. Sua pessoa e obra. Trad. Luiz
Paulo Rouanet. Ed. Loyola, São Paulo, 1999.

NASCIMENTO, Carlos Arthur R. do - De Tomás de Aquino a Galileu. 2ª ed.


Campinas: UNICAMP, IFCH, 1992.

GILSON, Étienne. A Filosofia Na Idade Média. Trad. Eduardo Brandão. São Paulo:
MARTINS FONTES, 1995

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