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Supremo Tribunal Federal

Ementa e Acórdão

Inteiro Teor do Acórdão - Página 1 de 14

29/03/2021 SEGUNDA TURMA

AG.REG. EM MANDADO DE SEGURANÇA 35.741 DISTRITO FEDERAL

RELATORA : MIN. CÁRMEN LÚCIA


AGTE.(S) : UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO
AGDO.(A/S) : RUTH MARIA FORTES ANDALAFET
ADV.(A/S) : RUDI MEIRA CASSEL
INTDO.(A/S) : TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO MANDADO DE


SEGURANÇA CONTRA O TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO.
REGISTRO DE APOSENTADORIA. DETERMINAÇÃO DE DEVOLUÇÃO
DE VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ PELA IMPETRANTE. DECISÃO
ADMINISTRATIVA DO CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO
PÚBLICO. DESNECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO. PRESSUPOSTOS
COMPROVADOS NO PROCESSO. PRECEDENTES. ORDEM
CONCEDIDA. ARGUMENTAÇÃO NA QUAL NÃO SE INFIRMAM OS
FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO REGIMENTAL
AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do


Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do
Ministro Gilmar Mendes, na conformidade da ata de julgamento, por
unanimidade, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos
do voto da Relatora. Sessão Virtual de 19.3.2021 a 26.3.2021.

Brasília, 29 de março de 2021.

Ministra CÁRMEN LÚCIA


Relatora

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MS 35741 AGR / DF

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AG.REG. EM MANDADO DE SEGURANÇA 35.741 DISTRITO FEDERAL

RELATORA : MIN. CÁRMEN LÚCIA


AGTE.(S) : UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO
AGDO.(A/S) : RUTH MARIA FORTES ANDALAFET
ADV.(A/S) : RUDI MEIRA CASSEL
INTDO.(A/S) : TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO

RELATÓRIO

A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA (Relatora):

1. Em 12.11.2020, concedi segurança em favor da agravada para


“anular a determinação de devolução aos cofres públicos dos valores pagos
indevidamente à interessada em decorrência do ato tido por ilegal, na forma
estabelecida pelo art. 46 da Lei 8.112/1990, sob pena de responsabilidade solidária
da autoridade administrativa omissa, consoante disposto nos arts. 71, inciso IX,
da Constituição Federal e 262 do Regimento Interno desta Corte”, constante do
item 9.3.1 do Acórdão n. 3.214/2017, Primeira Câmara, e seus consectários, do
Tribunal de Contas da União (art. 205 do Regimento Interno do Supremo
Tribunal Federal)”.

Esta a ementa da decisão:

“MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA O TRIBUNAL


DE CONTAS DA UNIÃO. REGISTRO DE APOSENTADORIA.
DETERMINAÇÃO DE DEVOLUÇÃO DE VALORES
RECEBIDOS DE BOA-FÉ PELA IMPETRANTE. DECISÃO
ADMINISTRATIVA DO CONSELHO NACIONAL DO
MINISTÉRIO PÚBLICO. DESNECESSIDADE DE
DEVOLUÇÃO. PRESSUPOSTOS COMPROVADOS NO
PROCESSO. PRECEDENTES. ORDEM CONCEDIDA” (e-doc.
37).

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2. Publicada essa decisão no DJe de 13.11.2020 e intimado o


Advogado-Geral da União em 23.11.2020, a agravante interpõe agravo
regimental tempestivamente (e-doc. 45).

3. A agravante alega que não estariam presentes os requisitos


cumulativos para a não restituição ao Erário de valores indevidamente
recebidos por servidores que, conforme a jurisprudência deste Supremo
Tribunal, seriam: “’i] presença de boa-fé do servidor; ii] ausência, por parte do
servidor, de influência ou interferência para a concessão da vantagem
impugnada; iii] existência de dúvida plausível sobre a interpretação, validade ou
incidência da norma infringida, no momento da edição do ato que autorizou o
pagamento da vantagem impugnada; iv] interpretação razoável, embora errônea,
da lei pela Administração’” (fl. 7, e-doc. 45).

Transcreve os trechos das decisões do Tribunal de Contas da União


nos quais teria sido claramente demonstrado “o equívoco contido na
Portaria PGT nº 184, de 29 de março de 2016 - ao conceder parcela da
remuneração indevida à impetrante, ao arrepio do contido na Emenda
Constitucional nº. 70/20122 - não estaria embasado na existência de dúvida
razoável acerca da correta interpretação a ser conferida à norma jurídica aplicável
ao caso” (fl. 8, e-doc. 45).

Apontando precedente deste Supremo Tribunal, assevera que “os


efeitos financeiros das revisões de aposentadoria concedidas com base no art. 6º-A
da Emenda Constitucional 41/2003, introduzido pela Emenda Constitucional
70/2012, somente se produzirão a partir da data de sua promulgação
(30/2/2012)” (fl. 11, e-doc. 45).

Conclui não haver “dúvida de que o Ministério Público do Trabalho


(órgão pagador), ao determinar que os proventos da impetrante fossem calculados
com base na remuneração do cargo efetivo desde 31 de outubro de 2009, afastou-
se do que se possa compreender por “dúvida razoável quanto a interpretação da

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norma” (fl.11, e-doc. 45).

Para a agravante, “a partir do momento em que houve a determinação, por


parte da Corte de Contas, para suspender o pagamento do benefício de
aposentadoria por invalidez e a impetrante tomou ciência dessa decisão, é certo
MS 35.741 13 que cessou a pretensa boa-fé e não há mais que se falar em
confiança legítima digna de proteção” (fl. 13, e-doc. 45).

Salienta que “o caráter alimentar das importâncias pagas não é motivo


hábil a obstar a reposição ao erário. Nos termos do art. 46 da Lei nº 8.112/1990, o
caráter alimentar dos vencimentos ou proventos não obsta a restituição dos
valores recebidos indevidamente, tendo em vista que, para tanto, o ordenamento
jurídico disciplinou o limite dos descontos decorrentes de reposições ou
indenizações ao erário” (fl. 16, e-doc. 45).

Requer a reconsideração da decisão ou o provimento do presente


recurso.

4. A agravada apresentou contrarrazões no sentido da manutenção


da decisão recorrida, por seus próprios fundamentos (e-doc. 49).

É o relatório.

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VOTO

A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA (Relatora):

1. Razão jurídica não assiste à agravante.

2. Como assentado na decisão agravada, reafirmando o que


afirmado desde o deferimento da liminar, pelo Ministro Dias Toffoli, as
quantias percebidas pelos servidores em razão de decisão administrativa,
dispensam a restituição quando: a) auferidas de boa-fé; b) há ocorrência
de errônea interpretação da Lei pela Administração; c) ínsito o caráter
alimentício das parcelas percebidas; e d) constatar-se o pagamento por
iniciativa da Administração Pública, sem participação dos servidores.

Comprovaram-se presentes, na espécie, todos os pressupostos à não


devolução dos valores de natureza alimentícia, recebidos de boa-fé pela
impetrante, decorrentes de pagamento implementado por ato exclusivo
da Administração Pública, com respaldo em decisão colegiada do
Conselho Nacional do Ministério Público.

Reitero os fundamentos da decisão agravada a serem mantidos no


julgamento deste agravo:

“8. O objeto deste mandado de segurança cinge-se à impugnação


“dos itens 9.2 e 9.3.1 do Acórdão 3214/2017, da 1ª Câmara do
Tribunal de Contas da União, proferido no processo TC 028.308/2016-
6, na parte em que impôs o ressarcimento dos valores recebidos com
base nos atos lá impugnados”.

Na espécie, a aposentadoria por invalidez da impetrante deu-se


no cargo de Procuradora Regional do Trabalho, concedida em
11.7.2008, com proventos integrais calculados pela média das

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remunerações utilizadas como base para as contribuições, e julgada


regular pelo Tribunal de Contas da União.

Demonstrou-se no processo que o ato impugnado dera entrada


no Tribunal de Contas da União “há menos de cinco anos” da decisão
(fl. 31, e-doc. 4), pelo que inaplicável o necessário chamamento da
impetrante para o contraditório e ampla defesa.

Este Supremo Tribunal firmou jurisprudência “no sentido de


exigir que o TCU assegure a ampla defesa e o contraditório nos casos
em que o controle externo de legalidade exercido pela Corte de Contas,
para registro de aposentadorias e pensões, ultrapassar o prazo de cinco
anos, sob pena de ofensa ao princípio da confiança – face subjetiva do
princípio da segurança jurídica”, o que não se verifica na espécie (MS
n. 24.781/DF, Redator para o acórdão o Ministro Gilmar Mendes,
Plenário, DJe 9.6.2011).

9. A alteração da base de cálculo dos proventos da impetrante


decorreu da entrada em vigor do art. 2º da Emenda Constitucional n.
70/2012, a prever que “os proventos passassem a ser calculados com
base na remuneração do cargo em que se deu a aposentadoria e
reajustados conforme a regra da paridade” (fl. 30, e-doc. 4).

O ato de revisão da aposentadoria da impetrante decorreu de ato


ex officio do Ministério Público do Trabalho, nos termos da Portaria n.
193/2012, após a promulgação da Emenda Constitucional n. 70/2012.

No ato de alteração, “determinou[-se] que os proventos da


interessada fossem calculados com base na remuneração do cargo
efetivo desde 31/10/2009, segundo justificativa do Controle Interno no
ato submetido a registro” (fl. 37, e-doc. 4).

Embora tenha considerado legais a modificação da base de


cálculos dos proventos e a incorporação da Vantagem Pessoal
Nominalmente Identificada – VPNI, o Tribunal de Contas da União
julgou irregular a “aplicação retroativa do benefício (…) haja vista

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que essa permissão somente ocorreu a partir da edição da Emenda


Constitucional 70/2012”, impondo a “devolução aos cofres públicos
dos valores pagos à interessada, em virtude da edição do ato de
alteração de aposentadoria” (fl. 28, e-doc. 4).

Para o Tribunal de Contas da União, o pagamento das


diferenças seria ilegal, pois a parte final do art. 2º da Emenda
Constitucional n. 70/2012 restringiria os efeitos financeiros
decorrentes da revisão das aposentadorias concedidas a partir de
1º.11.2004 a partir da promulgação da emenda, e não da data da
concessão da aposentadoria.

Como informado no processo, o Ministério Público do Trabalho


reconheceu, “no âmbito administrativo, a legalidade do pagamento das
diferenças entre o subsídio dos membros da ativa e os proventos
recebidos pela aposentada desde a data da aposentadoria até a data da
implantação da EC 70/2012, conforme decidido pelo CNMP nos autos
do processo 0.00.000.000059/2012-40” (fl. 30, e-doc. 4). Confira-se,
nos termos da análise técnica, no acórdão impugnado:

“Depreende-se que foi reconhecido no âmbito administrativo o


pagamento das diferenças entre o subsídio dos membros da ativa e dos
proventos recebidos pelos representados desde a data da aposentadoria
até a data da implantação da Emenda Constitucional 70/2012,
conforme decidido pelo CNMP nos autos do processo
0.00.000.000059/2012-40.
10. A justificativa do CNMP para concessão de tal benefício que
veio a ser reconhecido expressamente somente a partir de 30/3/2012,
com a edição da Emenda Constitucional 70/2012, é que a Constituição
Federal excetuou os casos de invalidez permanente decorrente de
acidente em serviço, moléstia profissional ou doença grave dos casos
gerais de invalidez permanente contidos na parte inicial do inciso I do
§ 1° do seu art. 40, não se aplicando a essas hipóteses excepcionais,
portanto, as limitações previstas no art. 1º da Lei 10.887/2004. Assim,
desde a concessão do benefício, o pagamento dos respectivos proventos
deveria ser calculado de forma integral, segundo a remuneração

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prevista para o cargo em que se deu a aposentadoria (conforme parecer


do Relator do Acórdão no Conselho Nacional do Ministério Público na
peça 5, p. 190/198).
11. No entender desta Unidade Técnica a edição do ato de
alteração em destaque, onde foi reconhecida a modificação da base de
cálculo dos proventos da interessada, com vigência anterior à edição
da Emenda Constitucional 70/2012, não pode prosperar” (fl. 26, e-
doc. 4)

10. Como assentado na decisão liminar proferida pelo Ministro


Dias Toffoli, na esteira dos precedentes deste Supremo Tribunal, “as
quantias percebidas pelos servidores em razão de decisão
administrativa dispensam a restituição quando: a) auferidas de boa-fé;
b) há ocorrência de errônea interpretação da Lei pela Administração;
c) ínsito o caráter alimentício das parcelas percebidas, e d) constatar-se
o pagamento por iniciativa da Administração Pública, sem
participação dos servidores”.

No julgamento plenário do Mandado de Segurança n. 26.085,


decidi nesta mesma linha:
“Se a acumulação apurada em dada situação administrativa
mostra-se duvidosa quanto à sua validade constitucional, há que se
examinar e concluir quanto à sua ilicitude. Se ilícita, a acumulação
haverá de ser declarada nula. Contudo, os seus efeitos são diferentes,
conforme se esteja diante de um caso de ilicitude decorrente de má-fé
do servidor ou de boa-fé.
De má-fé estará o servidor que subtrair ou faltar com a verdade
sobre sua situação, deixando, por exemplo, de declarar a sua condição
de titular de outro cargo público, quando de sua nomeação para um
segundo cargo, função ou emprego” (ROCHA, Cármen Lúcia
Antunes. Princípios Constitucionais dos Servidores Públicos. São
Paulo: Saraiva, 1999, p. 278).
Na mesma linha, Celso Antônio Bandeira de Mello salienta que:
“Acresce que, dada a presunção de legitimidade dos atos
administrativos, os administrados que atuarem em sua conformidade
nada mais fizeram senão arrimar-se em um esteio pressupostamente

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sério e sólido. Seria descabido, então, que sofressem prejuízos


exatamente por agirem segundo o que deles se esperava. (págs. 347-
348).
Assim, ressalvados os casos em que o administrado atuou
dolosamente, com ma-fé, de maneira a iludir a administração
induzindo-a à suposição de que estava a compor ato juridicamente liso
e concorrendo dessarte para que se produzisse ato viciado ou,
daquel’outros em que – ainda pior – se concertou com agentes
administrativos para, em atuação conjunta, fraudarem o Direito, não
se pode admitir que a invalidação acarrete um enriquecimento do
Poder Público e um empobrecimento do administrado” (MELLO,
Celso Antonio Bandeira de. O Princípio do Enriquecimento sem
Causa em Direito Administrativo. Revista de Direito Administrativo,
Rio de Janeiro, vol. 210, out./dez. de 1997, p. 27). (...)
Ao contrário da boa-fé, a má-fé não pode ser presumida, razão
pela qual não se pode admitir seja o Impetrante submetido ao ônus de
restituir aquilo que recebeu indevidamente. Tal situação apenas se
mostraria viável se o Tribunal de Contas da União demonstrasse ter o
Impetrante agido dolosamente com o objetivo de induzir as
instituições em erro, o que não se deu na espécie dos autos.
Sobre a necessidade de se aferir a boa-fé em casos como o
presente, Sérgio Ferraz e Adilson Abreu Dallari assinalam que:
“A boa-fé é um elemento externo do ato, na medida em que se
encontra no pensamento do agente, na intenção com a qual ele fez ou
deixou de fazer alguma coisa. É impossível perscrutar o pensamento,
mas é possível, sim, aferir a boa-fé (ou má-fé), pelas circunstâncias do
caso concreto, por meio da observação de um feixe convergente de
indícios.
A boa-fé é um importante princípio jurídico, servindo também
como fundamento para a manutenção do ato tisnado por alguma
irregularidade, (...) podendo, em certas situações, sobrepor-se ao
princípio da legalidade (...)
Em resumo, no processo administrativo, no tocante à decisão de
validar ou invalidar um ato, de manter ou desconstituir uma situação
jurídica, de aplicar ou não uma penalidade, a boa-fé do particular
envolvido deve ser levada em consideração, pois sua intenção é

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efetivamente relevante para o Direito. Essa relevância está


expressamente ressaltada no art. 2º, IV, da Lei 9.784/1999 e reiterada
em seu art. 4º, II” (FERRAZ, Sérgio e DALLARI, Adilson Abreu.
Processo administrativo. Malheiros: São Paulo, 2007, p. 105).
Não se há de desprezar que o princípio da legalidade conjuga-se,
sistemicamente, com os princípios da boa-fé e da segurança jurídica.
Nesse sentido, ao tratar da anulação dos atos administrativos, Juarez
Freitas pondera que:
“O problema da anulação do ato administrativo, especialmente,
o gerador de direitos, apresenta-se dominado, no mais das vezes, por
dois princípios aparentemente antagônicos. De um lado, o princípio da
legalidade que reclama a anulação dos atos viciados. De outro, e em
contraposição de superfície, localizam-se o princípio da proteção da
confiança, que exige a consideração da boa-fé do destinatário do ato
concessivo de direitos e advoga a estabilidade do ato decretado pela
autoridade pública, determinando sua convalidação. Destarte, parece
claro (...) que o princípio da confiança ou da boa-fé estatui o poder-
dever, em casos de longo curso temporal, de não anular, senão que de
sanar ou convalidar determinados atos inquinados de vícios formais,
no justo resguardo da própria estabilidade das relações jurídicas. [E
conclui:] (b) a respeitabilidade do princípio da boa-fé, do princípio da
segurança jurídica e a relativização do princípio da legalidade,
conjugadamente, implicam a fixação de limites substanciais à cogência
da anulação dos atos administrativos, tanto à Administração quanto
ao Poder Judiciário; (...) (d) os atos administrativos, uma vez
incontrastável a boa-fé do administrado, devem ser anulados
excepcionalmente com efeitos atenuados, quando da passagem de um
médio lapso temporal, a critério da prudência pretoriana, sem que se
trate de convalidação parcial” (FREITAS, Juarez. A anulação dos atos
administrativos em face do princípio da boa-fé. São Paulo: Boletim de
Direito Administrativo, n. 2, ano XI, fevereiro de 1995, p. 97).
Na mesma linha, Luisa Cristina Pinto Netto afirma:
“[É] possível sustentar que o princípio da legalidade (estrita)
deve ceder, em determinados casos, diante de outros princípios, como o
da segurança jurídica e da proteção à boa-fé. Pode-se, talvez com mais
acerto, conceber a legalidade em sentido mais amplo, matizada pela

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segurança jurídica e pela proteção da boa-fé, admitindo preterir


artigos de lei – ou melhor, regras jurídicas – para considerar uma
situação nascida em confronto com tais artigos – rectius, regras –
consolidada em virtude do decurso de tempo e da necessidade de
estabilidade das relações sociais” (PINTO NETTO, Luisa Cristina.
Ato de aposentadoria – natureza jurídica, registro pelo Tribunal de
Contas e decadência. Revista Brasileira de Direito Público. Belo
Horizonte: Fórum, ano 4, n. 13, abr./jun. 2006, p. 127)” (MS n.
26.085, de minha relatoria, Plenário, DJe 13.6.2008)

Confiram-se também os seguintes julgados: MS n. 34.243-AgR,


Relator o Ministro Edson Fachin, Segunda Turma, DJe 16.3.2017, e
AI 490.551-AgR, Relatora a Ministra Ellen Gracie, Segunda Turma,
DJe 3.9.2010.

11. Na espécie, comprovaram-se presentes os pressupostos à não


devolução dos valores de natureza alimentícia, recebidos de boa-fé pela
impetrante, decorrentes de pagamento implementado por ato exclusivo
da Administração Pública, com respaldo em decisão colegiada do
Conselho Nacional do Ministério Público.

A Procuradoria-Geral da República enfatizou que “os proventos


percebidos pela impetrante decorreram de erro da própria
Administração, que conferiu efeitos retroativos às alterações
introduzidas por meio da EC 70/2012. Ao julgar casos semelhantes a
esse, a jurisprudência do Supremo Tribunal vem assentando que o
reconhecimento da ilegalidade do ato pelo TCU não impõe,
automaticamente, o dever de restituição ao erário dos valores
recebidos, se não há causa para disputar a boa-fé do servidor” (fl. 4, e-
doc. 32).

12. Pelo exposto, concedo a segurança para anular a


determinação de “devolução aos cofres públicos dos valores pagos
indevidamente à interessada em decorrência do ato tido por ilegal, na
forma estabelecida pelo art. 46 da Lei 8.112/1990, sob pena de
responsabilidade solidária da autoridade administrativa omissa,

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consoante disposto nos arts. 71, inciso IX, da Constituição Federal e


262 do Regimento Interno desta Corte”, constante do item 9.3.1 do
Acórdão n. 3.214/2017, Primeira Câmara, e seus consectários, do
Tribunal de Contas da União (art. 205 do Regimento Interno do
Supremo Tribunal Federal).

13. Defiro o ingresso da União na presente ação e julgo


prejudicado o agravo regimental interposto contra o deferimento da
liminar (e-doc. 28)” (e-doc. 37).

3. Os argumentos da agravante, insuficientes para modificar a


decisão agravada, demonstram apenas inconformismo e resistência em
pôr termos a processos que se arrastam em detrimento da eficiente
prestação jurisdicional.

4. Pelo exposto, nego provimento ao agravo regimental.

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Supremo Tribunal Federal
Extrato de Ata - 29/03/2021

Inteiro Teor do Acórdão - Página 14 de 14

SEGUNDA TURMA
EXTRATO DE ATA

AG.REG. EM MANDADO DE SEGURANÇA 35.741


PROCED. : DISTRITO FEDERAL
RELATORA : MIN. CÁRMEN LÚCIA
AGTE.(S) : UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
AGDO.(A/S) : RUTH MARIA FORTES ANDALAFET
ADV.(A/S) : RUDI MEIRA CASSEL (22256/DF, 165498/MG, 170271/RJ,
49862A/RS, 421811/SP)
INTDO.(A/S) : TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo


regimental, nos termos do voto da Relatora. Segunda Turma, Sessão
Virtual de 19.3.2021 a 26.3.2021.

Composição: Ministros Gilmar Mendes (Presidente), Ricardo


Lewandowski, Cármen Lúcia, Edson Fachin e Nunes Marques.

Maria Clara Viotti Beck


Secretária

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