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1 Nesta pesquisa serão utilizados os termos “população velha”, assim como “pessoas velhas”
para abranger a etapa da vida correspondente a velhice. Não serão relacionados a estes
termos os sentidos negativos que normalmente os cercam.
Neste contexto, a competitividade, antes restrita ao mundo empresarial ou
esportivo, emerge como uma matriz constituinte da construção dos modos de ser e estar
no mundo, isso ocorre, pois, o espírito da empresa invade todos os âmbitos e sentidos da
vida. Imersos nesse ambiente de competição, os indivíduos desenvolvem uma
admiração por aqueles que apresentam melhores resultados, a este efeito o sociólogo
francês Alain Eherenberg chama de “culto da performance” (EHRENBERG, 2010)
Todo esse contexto ganhou uma nova perspectiva no ano de 2020, a pandemia
do novo Coronavírus impôs ao mundo uma realidade inesperada, a qual acrescentou
novas camadas à relação dos indivíduos com o tempo disponível, principalmente para
aqueles que se viram mais ameaçados pela doença, os seres humanos velhos. A
necessidade de isolamento social e o cenário de extrema incerteza ocasionado pela crise
sanitária decorrente da pandemia trouxeram consigo novos problemas à já problemática
relação da sociedade com o tempo. A conjuntura anterior apresentava uma forte
midiatização e imposição de uma velhice performática (FREITAS, 2018), porém esse
contexto se altera quando as pessoas velhas passam a ser as principais vítimas da
pandemia.
REFERENCIAL TEÓRICO
O crescimento destes programas ao longo dos últimos anos das décadas de 1980
e 1990 e início dos anos 2000 aflorou o debate acerca da vivência da velhice. Tal debate
gerou investigações mais profundas acerca desta temática, como por exemplo o estudo
desenvolvido pela pesquisadora Solange Maria Teixeira intitulado “Lazer e tempo livre
na “terceira idade”: potencialidades e limites no trabalho social com idosos”
(TEIXEIRA, 2007, pg. 187), para ela, ainda que os trabalhos sociais tenham seu papel
na socialização e geração de autoestima na população velha, seu peso negativo é
evidente, pois aliena as pessoas velhas ao induzirem que as atividades desempenhadas
são autônomas e livres do condicionamento social.
Iniciado em 2018, “Avós da Razão”, canal do Youtube criado por três mulheres
velhas, discute as mais variadas temáticas relacionadas à velhice. As apresentadoras,
Helena Wiechamn, Gilda Bandeira de Melo e Sonia Bonetti, são amigas há muitos anos
e compartilham em seu canal suas experiencias de vida. O canal conta com mais de 100
vídeos e quase 50 mil inscritos. A produção dos vídeos costuma ser simples, e com
exceção do primeiro vídeo e algumas curtas mensagens de natal ou ano novo, a
estrutura predominante do conteúdo é baseada nas perguntas enviadas ao canal pelos
espectadores.
A analise desses dois vídeos denota como o discurso sobre a necessidade de ser
produtivo está incorporada no pensamento das apresentadoras. Este discurso mostra
como gradativamente os espaços de autonomia do ser são tomados pela produtividade.
Na velhice, etapa que tem possui características limitadoras em ao corpo, esse discurso
torna-se ainda mais perverso, a cobrança pela performance exige uma superação não de
obstáculos, mas de características intrínsecas à velhice. Todo este contexto torna-se
ainda mais complexo quando os propagadores do discurso são as próprias pessoas
velhas.
CONLUCSÃO
As vivencias de velhice experienciadas e propagadas pelas três amigas
apresentadoras do canal “Avós da razão” ajudam a compreender os novos sentidos
atribuídos a velhice na contemporaneidade, de forma destacada a vivencia performática
da velhice (FREITAS, 2018). Os discursos propagados no canal mostram como a
juventude ainda exerce uma forte influência sobre a velhice, a recorrência de temas
joviais como o sexo, cuidados estéticos e ocupação profissional, denotam a falta de real
autonomia dos seres humanos velhos, o espaço para subjetividade é guiado por pressões
e imperativos que pregam a produção e a jovialidade como determinantes para uma
“velhice bem”.
Helena, Gilda e Sonia são mulheres que vivem todo esse processo cotidianamente,
como elas, a população velha tende a interiorizar todo esse processo e além disso,
propaga-lo. Com a perspectiva de que em 30 anos 2 bilhões de habitantes mundo à fora
tenham 60 anos ou mais, a retomada do tempo livre como um ambiente de livre escolha
é essencial para um envelhecimento que não dependa da produtividade para ter sentido.
BIBLIOGRAFIA
O GLOBO. População mundial vai crescer 53% e chegar a 11,2 bilhões em 2100, diz
relatório da ONU. Disponível em: <
https://oglobo.globo.com/sociedade/sustentabilidade/populacao-de-idosos-do-planeta-
pode-triplicar-ate-fim-do-seculo-17012816> acessado em : 30 de Out. 2020
JORNAL DA USP. Em 2030, Brasil terá a quinta população mais idosa do mundo
Disponível em: https://jornal.usp.br/atualidades/em-2030-brasil-tera-a-quinta-
populacao-mais-idosa-do-mundo/ acessado em: 30 de Out. 2020
The Beatles, “When i’m Sixty four”, Abbey Road Studios, 1967
MACHADO, Fabíola Orlando Calazans; FREITAS, Vanessa Santos de. Corpo, velhice
e performance na série “Grace and Frankie”. In: CONGRESO DE LA ASOCIACIÓN
LATINOAMERICANA DE INVESTIGADORES DE LA COMUNICACIÓN, 14.,
2018, San Pedro. Memorias [...]. San Pedro: Asociación Latinoamericana de
Investigadores de la Comunicación, 2018. p. 204-209.