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O artigo científico e a

Análise do Discurso:
Estudo do gênero
Os gêneros não são tipos textuais
fixos, mas formas de (inter)ação
em eventos sociais.
Gênero
Os gêneros estão ligados aos
segundo significados acionais/relacionais do
Norman discurso.
Fairclough Os gêneros também estão ligados
às funções textual e interpessoal da
Linguística Sistêmico-Funcional.
• Gêneros variam em sua estabilidade, fixidez e
homogeneização – o artigo científico é bastante
“ritualizado” em certas áreas do saber, mas não em
outras. Outros gêneros são mais flexíveis (um
prefácio de livro).
Níveis de abstração/especificidade
Pré-gênero Exposição
(tipologia textual) [+ argumentação, narração]

Gênero desencaixado Artigo


(disembedded)

Gênero situado Artigo científico


Artigo de pesquisa
Artigo de pesquisa na área
de Linguística
Análise de gêneros específicos: o artigo
científico

Atividade – o que as pessoas estão fazendo (ações)?


Que propósitos estão envolvidos? Como se organizam
os textos (estrutura genérica)?

Relações sociais – que tipo de relação há entre as


pessoas envolvidas?

Tecnologias de comunicação – que tecnologias mediam


as ações e as relações sociais estabelecidas pelo artigo?
Que impacto as novas tecnologias trazem sobre as
ações e interações mediadas pelo artigo?
Estrutura IMRD

1. Qual era o problema? Introdução


2. Como foi o estudo? Metodologia
3. O que foi descoberto? Resultados
4. O que significam os Discussão
achados?
Entretanto, o
esquema IMRD deixa
de fora…
• O título, a autoria e o
resumo/abstract.
• A conclusão e as
referências.
• Em alguns casos,
encontramos ainda
agradecimentos e
apêndices ou anexos.
Artigos em
análise do
discurso
(crítica): alguns
exemplos
Introdução

Referências
Introdução

Referências
Introdução

Referências
Variação no discurso acadêmico

PADRÃO IMRD LINGUÍSTICA/ACD


Introdução
• Introdução: não inclui
revisão de literatura.
• Metodologia: flutuante,
Método
recategorizada, +
qualitativa
Resultados • Resultados + Discussão:
não há dados brutos
Discussão sem interpretação
Fluxo de leitura não linear no
esquema IMRD
D.E.L.T.A. – até 10.000 palavras.

Linguagem em (Dis)curso – de 5.000 a


9.000 palavras.

Extensão RBLA – até 10.000 palavras.

dos Trabalhos em Linguística Aplicada – até


artigos 10.000 palavras.

Investigações – 10 a 25 páginas (até 10.000


palavras).

Diálogo das Letras – 15 a 20 páginas.


3.500 palavras, da
Para introdução à conclusão
comparar: (Revista Enfermagem
Uerj) – 6-7 p.
extensão do
artigo em 5.000 palavras, idem
Enfermage (Revista
m Latino-Americana de
Enfermagem) – 10-11 p.
Um convite à
leitura do artigo: o
resumo/abstract
Resumo de artigo (DELTA) – 172 palavras
Uma ferramenta para compreender as
convenções do discurso no resumo
acadêmico:

A análise de movimentos retóricos


Resumo de artigo (DELTA) – 172 palavras
Linguística
Literatura
Ensaio linguística
Resumo acadêmico de enfermagem
ABNT/NBR 6028/2021
Resumo de dissertação de mestrado em Linguística
Comparando Un1 – Apresentação
com outro Un2 – Contextualização
gênero... Un3 – Metodologia
Un4 – Resultados
Un5 - Conclusões
Um discurso sem sujeito
• “Este artigo tem como objetivo [...]”
• “Este artigo parte de várias considerações [...]”
• “O presente artigo trata de uma temática pouco
considerada [...]”
• “Esta dissertação consiste no estudo das formas de
tratamento [...]”

“Convém usar o verbo na 3ª. pessoa.”


(NBR 6028/2021)
A porta de
entrada para o
artigo: a
introdução
A introdução é uma seção estratégica do
artigo.

O objetivo da introdução é seduzir, convencer


o leitor de que vale a pena ler o artigo.

Como fazer isso? Como é que os


pesquisadores mais experientes costumam
fazer?
PLO
EXEM
A competência lexical de alunos universitários aprendendo a
ler em inglês como língua estrangeira
(DELTA, v. 13, n. 2, p. 215-246, 1997)

.
O MODELO CARS
[Create a Research Space]

Um modelo para entender as


estratégias retórico/discursivas usadas
em introduções de artigos de pesquisa.

Em outras palavras, um modelo de


leitura e um modelo para a escrita da
introdução.
M P LOA COMPETÊNCIA LEXICAL DE ALUNOS
EXE UNIVERSITÁRIOS APRENDENDO A LER EM INGLÊS
COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA
M3-a [OBJETIVO] Meu objetivo neste trabalho é apresentar
uma caracterização da competência lexical de alunos
aprendendo a ler em inglês como LE em uma universidade
estadual paulista. M1-b [PESQUISA ANTERIOR] Essa
caracterização se baseia em parte dos dados coletados em um
estudo anterior (Scaramucci, 1995), cujo objetivo é investigar,
na perspectiva de um modelo de leitura interativo, o papel do
vocabulário na compreensão em leitura em inglês como LE.
M2-a [LACUNA] Caracterizações desse tipo, M1-a
[RELEVÂNCIA] importantes não apenas em estudos que visam
a estabelecer sua relação com a leitura – como é o caso da
pesquisa que originou estes dados – mas também naqueles
que têm por objetivo orientar o ensino de LE, não têm sido
encontradas na literatura, apesar de se afirmar muito
frequentemente que o vocabulário é uma das maiores fontes
de dificuldades do leitor em LE.
M3-e [ESTRUTURA] Este artigo está subdividido em
quatro partes: na primeira, apresento o conceito de
vocabulário usado na definição de competência lexical.
Na segunda, caracterizo a metodologia, os sujeitos e
os instrumentos envolvidos; na terceira, analiso e
discuto os resultados, enquanto na quarta e última,
saliento algumas implicações para o ensino de inglês
como LE.
• Há várias maneiras de escrever a
introdução, mas todas elas tendem
a seguir opções constantes no
modelo.
• Encontre a sua maneira,
combinando as estratégias que
Tem que você preferir e sempre procurando
realizar os 03 grandes movimentos
ser retóricos:
assim? 1. Estabeleça o território (área do
trabalho)
2. Estabeleça o nicho (o espaço
específico a ocupar)
3. Apresente sua proposta de
pesquisa (ocupe o espaço
indicado)
Discurso & Sociedad, Vol. 5(3), 2011, 492-513.
Benedito Gomes Bezerra, Questões de gênero em
traduções da Bíblia para português e inglês
Informação irrelevante para os
objetivos do estudo
Contextualização insuficiente
Problemas
Objetivo não informado (ou informado,
geralmente mas não claro)
apontados Informação fora de lugar
na
introdução Extensão (introdução longa demais)

Afirmações não fundamentadas ou


opiniões pessoais
Excesso de citações
Introduções em artigos de saúde pública

(DIAS; BEZERRA, 2013)


(COTOS; HUFFMAN; LINK, 2015)
A seção de
discussão/conclusão
do artigo de pesquisa
A seção de discussão (ou conclusão)
(SWALES, 2004)
Tende a espelhar a introdução numa ordem inversa:
Ocupando o nicho
(Re)estabelecendo o nicho
Estabelecendo um território
(adicional)
LÊDO & PIMENTEL, 2018
Conclusão
(Cotos; Huffman; Link, 2015)

• reestabelece o território no espaço de pesquisa


visado, a fim de fundamentar a discussão;
• comenta os principais achados para situar o novo
conhecimento reportado;
• referencia a literatura para redesenhar território de
conhecimento previamente abordado;
• e estabelece um território adicional considerando
possibilidades de pesquisas futuras à luz dos achados.
Movimentos e passos mais
recorrentes (LÊDO; PIMENTEL, 2018)
M1P2 – Delineando quadro teórico específico
Ex.: “Partiu-se de uma breve discussão sobre interação aluno-aluno
em contextos a distância, os diferentes tipos de feedback existentes na
literatura e o papel do feedback em cursos on-line” (Art01).
M2P1 – Explicando resultados
Ex.: “Os resultados apontaram diferentes tipos de feedback
aluno-aluno que se inserem nas categorias motivacional/interacional e
informativo/avaliativo, conforme a tipologia referente...” (Art01)
Ex.: “Quanto aos resultados parciais da pesquisa e sua contribuição
para o desenvolvimento de multiletramentos, pode-se afirmar que...”
(Art07)
M4P1 – Generalizando resultados
Ex.: “Por fim, o tão almejado ethos de credibilidade política, em
situações conflituosas como a do debate político, é sempre instável,
devendo o político gerenciar a sua fala e a do outro sobre si.” (Art05)
AS DIFERENTES VOZES DE
UMA REPORTAGEM:
O MITO DA IMPARCIALIDADE
Regina Celi Mendes PEREIRA

(Universidade Federal da Paraíba)


Introdução

M1-S2 Diferentes abordagens teóricas (sócio-semióticas, sócio-discursivas e


sócio-retóricas) têm refletido sobre as marcas de subjetividade presentes em
gêneros orais e escritos. M2-1D Em nosso trabalho utilizaremos os
fundamentos teórico-metodológicos do Interacionismo Sócio-Discursivo (ISD)
que estabelecem um conjunto de parâmetros que podem influenciar a
organização de um texto. M1-S3 Segundo Bronckart (1997), o primeiro
parâmetro refere-se ao mundo físico, o que implica a constatação de que
todo texto resulta de um comportamento verbal concreto e no qual estariam
implícitos aspectos relacionados ao lugar de produção, ao momento de
produção e às especificidades relativas ao emissor e ao receptor. O segundo
refere-se ao mundo social e subjetivo, e estabelece que todo texto se insere
nos quadros de uma formação social, mais precisamente no quadro de uma
forma de interação comunicativa que implica o mundo social e o mundo
subjetivo. Neste quadro interativo, tornam-se relevantes o lugar e o papel
social do enunciador e do destinatário, bem como o objetivo da interação.
M3-S1A O nosso trabalho tem como objetivo observar a influência desses
dois sub-conjuntos na constituição de um gênero cujo propósito
comunicativo mais saliente seria a divulgação de informações para a
sociedade: reportagens sobre a nacionalização do gás boliviano publicadas
nas revistas Isto é (maio 2006, n.1907) e Carta Capital (maio 2006, n.393).
M3-S2 Na análise, foi possível constatar a presença de marcas lingüísticas
que apontam para o posicionamento enunciativo dos autores, deixando
explícitas as marcas de subjetividade que comprometem a imparcialidade do
gênero reportagem.
GÊNEROS TEXTUAIS
EMERGENTES
NO CONTEXTO DA
TECNOLOGIA
DIGITAL

Luiz Antônio Marcuschi


Universidade Federal de Pernambuco
Ponto de Partida
• M3-S1B Esta exposição analisa as características
de um conjunto de gêneros textuais que estão
emergindo no contexto da tecnologia digital.
M1-S1 Não são muitos os gêneros emergentes
nessa nova tecnologia, nem totalmente inéditos.
Contudo, sequer se consolidaram e já provocam
polêmicas quanto à natureza e proporção de seu
impacto na linguagem e na vida social. Isso
porque o ambiente virtual é extremamente
versátil e hoje compete, em importância, nas
atividades comunicativas, ao lado do papel e do
som.
Já nos acostumamos a expressões como “e-mail”,
“bate-papo virtual” (chat), “aula virtual”, “listas de
discussão” e outras. M2-S1C Mas qual a
originalidade desses gêneros em relação ao que
existe? De onde vem o fascínio que exercem?
Qual a função de um bate-papo virtual, por
exemplo? Propiciar divertimento, veicular
informação, permitir participações interativas?
Pode-se dizer que parte do sucesso da nova
tecnologia deve-se ao fato de reunir num só meio
várias formas de expressão, tais como texto, som
e imagem, o que lhe dá maleabilidade para a
incorporação simultânea de múltiplas semioses,
interferindo assim na natureza dos recursos
lingüísticos utilizados.
O impacto das tecnologias digitais na vida
contemporânea está apenas se fazendo sentir, mas
já mostrou com força suficiente que tem enorme
poder tanto para construir como para devastar.
Seguramente, uma criança, um jovem ou um
adulto, viciados na Internet, sofrerão seqüelas nada
irrelevantes. Segundo observou David Crystal
(2001:169) a propósito da participação indefinida
nos bate-papos em salas abertas, a atividade se
parece com “um enorme jogo maluco sem fim” ou
então assemelha-se a uma “festa lingüística”
(linguistic party) para onde levamos nossa “língua”
ao invés de nossa “bebida”.
Neste quadro, três aspectos tornam a análise
desses gêneros relevante: (1) seu franco
desenvolvimento e um uso cada vez mais
generalizado; (2) suas peculiaridades formais e
funcionais, não obstante terem eles contrapartes
em gêneros prévios; (3) a possibilidade que
oferecem de se rever conceitos tradicionais,
permitindo repensar nossa relação com a
oralidade e a escrita. Com isso, o “discurso
eletrônico” constitui um bom momento para se
analisar o efeito de novas tecnologias na
linguagem e o papel da linguagem nessas
tecnologias. Aqui estão algumas reflexões de
caráter epistemológico e metodológico para uma
melhor compreensão do tema na perspectiva da
teoria dos gêneros.
A importância do
conceito de gêneros
discursivos no ensino
de redação
acadêmica
Désirée MOTTA-ROTH (UFSM)
Introdução
M1-S2 A dificuldade de novos pesquisadores divulgarem
seus trabalhos em vista de um substancial
desconhecimento de convenções genéricas acadêmicas
tem sido o foco de atenção na área de ensino de Línguas
para Fins Acadêmicos (ver, por exemplo, Swales, 1990).
M1-S3 Especificamente em relação ao ensino de leitura e
redação no 3o. grau em contextos periféricos como o
Brasil, a prática tem evidenciado a necessidade de uma
discussão sistemática, entre pesquisadores mais e menos
experientes, sobre o que é a academia, sua cultura, sua
prática e seu discurso (Leffa, 1997; Motta-Roth, 1997;
Oliveira, 1997), passando por questões tão variadas
quanto o problema da língua em que podemos ou
devemos publicar1 ou o debate sobre se um texto é
acadêmico ou não.
Além disso, o ensino de leitura e redação do texto
acadêmico tem se pautado por artigos e livros
publicados, comunicações e palestras, elaborados, com
raras exceções (ver, por exemplo, Coracini, 1991), a partir
de um ponto de vista estrangeiro a nossa realidade
acadêmica (ver, por exemplo, Belcher & Braine, 1995;
Berkenkotter & Huckin, 1995; Peck Macdonald, 1994;
Swales & Feak, 1994; Bhatia, 1993; Blue, 1993). M2-S1B
Assim, uma reflexão mais atenta sobre o ensino de
Línguas para Fins Acadêmicos torna clara a necessidade
de termos mais subsídios sobre como se dá a produção
de conhecimento através de gêneros discursivos no
contexto da academia nacional e sua significação no
âmbito internacional. Por gênero discursivo entendo aqui
texto construído em estágios retóricos, com forma e
objetivo comunicativo sistematicamente associados a um
contexto social onde uma dada atividade humana está se
desenvolvendo.
M3-S3 Nessa perspectiva, o presente trabalho
constitui-se em reflexão sobre dois pontos: 1) a
prática de redação acadêmica como atividade
humana de produção de conhecimento mediada
por gêneros discursivos e 2) o engajamento no
discurso da ciência por parte de pesquisadores
trabalhando em contextos acadêmicos centrais
(cultura acadêmica consagrada como, por
exemplo, a do meio universitário nos Estados
Unidos) e periféricos (cultura acadêmica em
construção como a do meio universitário no
Brasil).
Seis clichês e uma
sugestão sobre
leitura na Web
Ana Elisa Ribeiro (2009)
INTRODUÇÃO: Quer teclar comigo?

• M3-S1B Embora pareça, este texto não tem


como tema central as relações estabelecidas
entre as pessoas por meio de salas de bate-papo
na internet. Embora não pareça, este é um
trabalho acadêmico que tem origem em uma
oficina ministrada a estudantes de todo o país
(de graduação e de pós-graduação) do II
Encontro Nacional sobre Hipertexto, em
Fortaleza, Ceará, na primavera de 2007.
• M3-S1A A proposta do minicurso era pôr em discussão alguns
clichês que permeiam os debates sobre a leitura, a escrita e a web.
Começamos, portanto, a partir de questões e afirmações que não
são novidades para qualquer um que tenha se envolvido com o
tema algum dia. Por isso mesmo, consideramos o que são “clichês”.
São frases que muitas pessoas falam e repetem, leem em jornais e
revistas, veem na televisão, encontram em debates, em rodas de
amigos que contam casos sobre filhos e sobrinhos, em reuniões de
escolas e, infelizmente, afirmações ainda encontradas em textos
acadêmicos e pretensamente científicos. Os “clichês” são
afirmações tão comuns que, de tanto serem repetidas, acabam
tendo seu sentido esvaziado. “Frases feitas” e “clichês” são
combatidos nas escolas, especialmente nas aulas de redação (ou
produção de textos, sem entrar na discussão sobre as diferenças
entre uma e outra), na tentativa de fazer com que os alunos
exercitem menos a repetição de “lugar-comum”, das trivialidades, e
passem a afiar a criatividade, a articulação inteligente de ideias e a
argumentação.
E já que vamos falar sobre “clichês”, por que será
que “frases feitas” se chamam “clichês”? Não se
pode afirmar que haja relação direta entre isto e
aquilo, mas o clichê, originalmente, era uma forma
de gravação e impressão com a chapa de zinco (ou
de metal). O texto ou o desenho eram
reproduzidos e repetidos, fielmente, até a placa se
gastar. E eram usados em diversos contextos,
como ilustração para vários tipos de texto. Note-se
que o mesmo clichê servia para vários contextos.
Qualquer semelhança não terá sido por acaso.
“Quer teclar comigo?” é menos um clichê do que
uma fórmula para se começar um bate-papo.
Então vamos a ele.
Questões de gênero em traduções
da Bíblia para português e inglês:
uma abordagem comparativa
Benedito Gomes Bezerra
Discurso & Sociedad, Vol. 5(3), 2011, 492-513
M1-S2 Pesquisas sobre a leitura ressaltam a centralidade dos
conteúdos religiosos e, particularmente, da Bíblia na preferência
dos leitores brasileiros, evidenciando, portanto, a importância
dessa literatura para a sustentação ou, eventualmente, para a
mudança das ideologias defendidas pelos grupos sociais
relacionados. M1-S1 Em sua segunda edição, e tendo ouvido
mais de 172 milhões de pessoas em todos os estados da
federação, a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil (AMORIM,
2008) indica que a Bíblia é o “gênero” mais lido por 45% das
pessoas. Na faixa etária entre 50 e 70 anos ou mais, a
preferência pela Bíblia chega a 75%. Ainda de acordo com a
pesquisa, as mulheres leem mais que os homens em todos os
gêneros, exceto em história, política e ciências sociais. A Bíblia,
especificamente, é mais lida por 45% das mulheres, contra
40% dos homens.
M1-S3 Teólogas feministas (cf. SCHÜSSLER-FIORENZA, 1992),
por sua vez, têm apontado a Bíblia como um livro “patriarcal”
responsável por contribuir para a perpetuação da desigualdade
entre os gêneros, parcialmente através do processo de
tradução das línguas antigas, grego e hebraico, para as línguas
contemporâneas. Em parte, portanto, a desigualdade de
gênero presumida no texto bíblico teria sua origem de modo
específico nos pressupostos dos tradutores, e não (somente) no
texto bíblico em si. Conforme van Dijk (2008), na perspectiva da
Análise Crítica do Discurso (ACD), a discussão sobre o gênero
se configura como uma das questões relacionadas com o
poder e o abuso do poder nas relações entre homens e
mulheres. O abuso do poder se manifestaria, neste caso, via
opções linguísticas, textuais e discursivas adotadas nos processos
de tradução da Bíblia para as línguas contemporâneas.
M3-S1A Diante dessa questão, meu objetivo, neste trabalho, é
empreender uma abordagem comparativa, teoricamente baseada
na Análise Crítica do Discurso, em diálogo com a teologia
feminista e os estudos da tradução, sobre as representações
de gênero em diferentes traduções da Bíblia das línguas
originais para a língua portuguesa e a língua inglesa. M2-S1D
Tal abordagem se inscreve, metodológica e epistemologicamente,
no quadro de uma perspectiva “transgressiva” (PENNYCOOK,
2006, p. 70), em que os estudos do discurso recusam-se a
praticar uma pseudoneutralidade científica e optam por
manter “um foco incansável nas operações do poder”. A
perspectiva aqui defendida, de caráter interdisciplinar,
caracteriza-se ainda, e por isso mesmo, como uma abordagem
“mestiça”, “híbrida” ou “indisciplinar”, nos termos da
linguística aplicada proposta por Moita Lopes (2006). Nesse
sentido, talvez fosse mais apropriado falar de Estudos Críticos do
Discurso, como quer van Dijk (2008), e não apenas de Análise
Crítica do Discurso como uma corrente teórica específica.
M3-S3 Para isso, o trabalho se organizará como
segue: em primeiro lugar, apresentarei a concepção de
van Dijk (2008) sobre como o exercício do poder e o
abuso do poder se manifestam no discurso assumindo
formas de manipulação e controle social e cognitivo.
Em seguida, exporei a concepção da teologia feminista
acerca da interpretação e tradução bíblica
tradicionais como um empreendimento “sexista” e
“patriarcal”. Em um terceiro momento, apresento os
princípios básicos que orientam a tradução da Bíblia, em
especial nos meios protestantes e ecumênicos, em que
essa atividade parece ser bem mais frequente.
Finalmente, explicito minhas opções metodológicas e
apresento os resultados da pesquisa.

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