A Unidade 1 consiste numa introdução à arquitetura e à organização de
computadores. É feita uma apresentação histórica da tecnologia, e traçado um panorama geral das tecnologias atuais.
1.2 Problematizando o tema
Antes da problematização do tema, definiremos termos muito usados:
computador e processador. Refere-se ao termo computador o sistema de pro- cessamento completo, incluindo a memória e a unidade de processamento, que aceita a interligação de diversos periféricos como impressora, teclado, monitor de vídeo, unidade de disco rígido e modem. A rigor, o termo processador refere-se a apenas uma parte da máquina, a unidade central de processamento, sem incluir a memória. O processador também é conhecido como Unidade Central de Pro- cessamento (Central Processing Unit – CPU, em inglês). Como atualmente um processador é implementado, na maioria das vezes, em circuito integrado (chip), pode-se confundir o processador com o próprio chip que o contém. Porém, à medida que os chips aumentam de conteúdo, o mesmo pode conter vários pro- cessadores, como os chips multicore atuais.
Gordon E. Moore, ex-presidente da Intel, certa vez observou que o poder
de processamento dos chips, bem como o número de transistores, dobrava a cada 18 meses. Essa profecia tornou-se realidade e acabou ganhando o nome de lei de Moore. Essa observação tem servido de parâmetro para uma elevada gama de dispositivos digitais além das CPUs. Analisando, porém, em detalhes, os processadores a partir de 1978, nota-se que no período inicial o aumento no poder de processamento (desempenho) era de 25% ao ano. A partir de 1986 o aumento foi mais acentuado, 52% ao ano e, a partir de 2002 o aumento tem sido de 20% ao ano, conforme mostra a Figura 1.
Figura 1 Curva de desempenho dos processadores a partir de 1978. 19
O aumento inicial de 25% anuais deve-se principalmente ao avanço da tec- nologia de fabricação de circuitos integrados, que é a tecnologia usada para os processadores atuais. O aumento de 52%, no período de 1986 a 2002, deve-se não só ao avanço da tecnologia, mas também ao melhoramento da arquitetura e organização a partir da introdução de conceitos como a arquitetura superescalar, com despacho e execução de várias instruções simultaneamente. No período a partir de 2002, é notado um crescimento menor em relação aos períodos anteriores, devido à saturação na exploração dos mecanismos de melhoria de desempenho de execução de instruções, problemas de latência de memória e de dissipação de energia nos circuitos integrados cada vez mais densos.
O presente livro pretende abordar a arquitetura e a organização de proces-
sadores e computadores de forma a esclarecer os principais mecanismos que resultam na curva da Figura 1.
1.3 Introdução à tecnologia dos processadores
O item descreve a evolução da tecnologia, uma breve explanação sobre a
fabricação de chips, a evolução da memória dinâmica, o problema da dissipação de energia nos circuitos integrados e as classes de computadores.
1.3.1 Evolução da tecnologia eletrônica
Os processadores e demais componentes de um computador tiveram uma
melhoria de velocidade, em grande parte, por causa da evolução da tecnologia de construção. A Tabela 1 mostra as tecnologias usadas a partir de 1951, época em que estavam em desenvolvimento os primeiros computadores.
Tabela 1 Tecnologia de fabricação dos computadores.
A primeira coluna representa o ano em que a tecnologia atinge o desem-
penho/custo explicitado. Embora a tecnologia eletromecânica tenha sido usada para os primeiros computadores desenvolvidos em universidades, ela não consta 20 na Tabela 1 pelo fato de ser muito lenta se comparada à tecnologia eletrônica. As tecnologias apresentadas são todas eletrônicas e são comparadas com a primeira que é a válvula, portanto, com valor de desempenho/custo igual a 1. As válvulas são componentes de forma e tamanho semelhantes a uma lâmpada incandescente, com vácuo interno, que atingem centenas de graus centígrados de temperatura durante o funcionamento. A segunda tecnologia é o transistor construído a partir de materiais semicondutores. Os primeiros computadores a transistores usaram esses mesmos componentes, construídos discretamente (em empacotamento individual para cada transistor). As linhas de interconexão de cobre impressas sobre as superfícies desses cartões interligavam os termi- nais dos transistores com outros componentes formando os circuitos digitais. A tecnologia de circuito integrado refere-se àqueles denominados na época de pequena (small scale integration – SSI), média (medium scale integration – MSI) e larga (large scale integration – LSI) integração, contendo em média algumas unidades, dezenas, ou centenas de transistores, respectivamente. Para se cons- truir um computador, era necessário o uso de centenas ou milhares desses circuitos integrados de pequena, média ou larga escala de integração. O circuito VLSI (Very Large Scale Integration) é, como o próprio nome diz, integrado numa escala muito larga. Essa é a tecnologia em que os microprocessadores são construídos num único chip. O circuito ULSI (Ultra Large Scale Integration) é um circuito ainda mais denso em relação ao anterior e tem atualmente a capacidade de conter vários processadores internamente.
1.3.2 Tecnologia de fabricação de chips
A fabricação de um chip começa com o silício contido num cristal de quartzo.
O silício é um material semicondutor, caracterizado por se situar entre os mate- riais condutores de eletricidade e os isolantes. É possível, por meio de proces- sos químicos, adicionar materiais no silício e transformar pequenas áreas em: a) excelentes condutores; b) excelentes isolantes; e c) áreas que conduzem ou não sob controle, conhecidas como transistores. Um circuito VLSI, ou ULSI, é, portanto, uma combinação de enorme quantidade dessas três áreas.
A Figura 2 ilustra um processo de fabricação de um circuito integrado VLSI
ou ULSI: (a) o lingote de silício, cujas dimensões atualmente variam entre 30 e 60 cm de comprimento e 20 e 30 cm de diâmetro; (b) após passar por um fatiador, as fatias, conhecidas como wafers, têm aproximadamente 0,25 cm de espessura; (c) as fatias virgens passam por várias etapas de processos químicos para a criação de transistores, condutores, e isolantes; (d) as fatias com os circuitos já implementados são testadas, e os elementos marcados com x referem-se aos circuitos que apresentaram falhas; (e) os circuitos (dies), também conhecidos como chips, são separados individualmente por um cortador (dicer); (f) os circuitos 21 separados e aprovados são encapsulados; (g) os circuitos encapsulados são testados novamente, pois o processo de encapsulamento pode provocar danos; (h) os circuitos que passaram pelo teste final podem ser comercializados.
Figura 2 Processo de fabricação de um circuito integrado VLSI ou ULSI.
Fonte: adaptada de Hennessy & Patterson (2008).
1.3.3 Evolução da tecnologia de memória dinâmica
A tecnologia atual de memória principal dos computadores é conhecida
como RAM (Random Access Memory) dinâmica.
Figura 3 Diagrama ilustrativo da evolução da tecnologia de memória RAM dinâmica, ao
longo do tempo, em relação ao número de transistores usados nos chips (K = 1024 bits, M = 1024 Kbits).
22 Fonte: adaptada de Hennessy & Patterson (2008).
A evolução da tecnologia dessa memória se caracteriza pela quadruplicação da capacidade a cada novo lançamento, ao longo dos anos. A Figura 3 ilustra um diagrama no qual se pode verificar a linearidade dessa evolução, que está de acordo com a lei de Moore. Apesar de a capacidade das memórias RAM dinâmi- cas ter sido duplicada a cada 18 meses, conforme a lei de Moore, a velocidade de acesso dessas memórias tem evoluído na razão de duplicação a cada 10 anos.
1.3.4 Consumo de energia nos circuitos integrados
O consumo de energia nos circuitos integrados equivale à dissipação de
calor. Para os chips de CMOS (Complementary Metal Oxide Semiconductor), que constituem a tecnologia atual de fabricação dos microprocessadores, o con- sumo de energia principal tem sido, na comutação dos transistores, chamado de potência dinâmica. A potência dinâmica (em watts) exigida por um transistor é dada pela equação:
Potência = ½ × carga capacitiva × voltagem2 × frequência.
Assim, a potência dinâmica é diminuída reduzindo-se a voltagem, e, por
isso, as voltagens caíram de 5 V para pouco mais de 1 V em 20 anos. O proble- ma de potência tem ficado cada vez mais crítico na tecnologia de circuitos inte- grados com o aumento dos transistores nos chips, tem-se notado dissipadores cada vez mais sofisticados sobre os processadores.
1.3.5 Classes de aplicação dos processadores
Neste item será feito um breve resumo sobre as classes de aplicações de
processadores. A primeira classe de aplicação é a do computador desktop, em que o computador é projetado para uso pessoal e normalmente é acompanhado de um monitor gráfico, um teclado, um mouse e interfaces para impressoras, redes e outros periféricos. A outra classe de aplicação é a do computador ser- vidor, que é usado para executar grandes programas de múltiplos usuários, normalmente conectados em rede. Esses servidores podem ser computado- res semelhantes aos desktops usados para armazenamento de arquivos, para pequenas aplicações comerciais e serviços web simples. Podem ser também computadores enormes, chamados de supercomputadores, contendo cente- nas até milhares de processadores, gigabytes até terabytes de memória e terabytes até petabytes de disco rígido, normalmente usados para cálculos científicos e de engenharia, como previsão metereológica, exploração de petróleo e pesquisas 23 de estruturas de proteínas. Outra classe de aplicação de processadores é a de computadores embutidos, dedicados ou embarcados. Essa é a classe com maior diversidade e quantidade, e inclui os microprocessadores encontrados em con- troles de eletrodomésticos e de veículos, em telefones celulares, em televisões digitais, entre outros. Esses processadores, como estão embutidos em disposi- tivos diversos, são usados para executar uma aplicação predeterminada. Exem- plos desses processadores estão, também, em cartões de congratulações e em chips de identificação por radiofrequência, RFID (Radio Frequency Identification), usados para identificações de veículos, animais e produtos em supermercados. Muitos chips usados para controle incluem uma grande quantidade de interfa- ces, para facilitar a construção de aplicações, e nesses casos são denominados microcontroladores. Outros processadores, denominados Processadores de Si- nais Digitais (Digital Signal Processor – DSP), são projetados para o processamen- to de filtros digitais em tempo real.
1.4 Considerações finais
Nesse texto foi feita uma introdução à arquitetura e à organização de com-
putadores, sobre as classes de processadores atuais, a tecnologia de fabricação e sua evolução. As descrições mais detalhadas podem ser encontradas nas bi- bliografias e referências.
1.5 Estudos complementares
Para complementar os estudos introdutórios sobre a tecnologia de cons-
trução de computadores, sugere-se a leitura do primeiro capítulo, Fundamentos do projeto de computadores, do livro de Hennessy & Patterson (2007). Sugere-se também o primeiro capítulo, Computer Abstractions and Technology, do livro de Hennessy & Patterson (2008). Recomenda-se a leitura do primeiro capítulo, Intro- dução, do livro de Tanenbaum (2007). O artigo de J. A. N. Lee (1996) apresenta uma visão cronológica da história da computação.