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PROT. SIST.

ENERGIA

APLICAÇÃO DE RELÉS DE SOBRECORRENTE


NA PROTEÇÃO DE ALIMENTADORES

Unidade 01

Prof. JOSÉ WANDERSON


3.1 Introdução
O relé é definido como sendo um dispositivo sensor que comanda a abertura do disjuntor quando
surgem, no sistema elétrico protegido, condições anormais de funcionamento.

O modo geral de atuação de um relé pode ser sintetizado em quatro etapas:

 O relé encontra-se permanentemente recebendo informações da situação elétrica do sistema


protegido sob a forma de corrente, tensão, frequência ou uma combinação dessas grandezas
(potência, impedância, ângulo de fase, etc.);
 Se, em um dado momento, surgirem condições anormais de funcionamento do sistema protegido
tais que venham a sensibilizar o relé, este deverá atuar de acordo com a maneira que lhe for própria.
 A atuação do relé é caracterizada pelo envio de um sinal que resultará em uma ação de sinalização
(alarme), bloqueio ou abertura de um disjuntor (ou nas três ao mesmo tempo).
 A abertura ou disparo do disjuntor, comandada pelo relé, irá isolar a parte defeituosa do
sistema.

Neste capítulo será visto, inicialmente, informações sobre relés de sobrecorrente, e depois, a
aplicação destes para proteção de sistemas primários de distribuição.
3.2 Relés de sobrecorrente
Conforme o próprio nome sugere, têm como grandeza de atuação a corrente elétrica do sistema. Isto
ocorrerá quando esta atingir um valor igual ou superior ao ajuste previamente estabelecido
(corrente mínima de atuação).
No caso de serem usados para proteção de circuitos primários (classe 15kV, por exemplo), são
ligados de forma indireta através de transformadores de corrente.

3.2.1 Curvas características

Quanto ao tempo de atuação, possuem curvas características de dois tipos: de tempo definido e
de
tempo dependente.

a) De tempo definido
Uma vez ajustados o tempo de atuação (ta) e a corrente mínima de atuação (IMIN,AT), o relé irá atuar
neste tempo para qualquer valor de corrente igual ou maior do que o mínimo ajustado (Fig.3.1).
3.2 Relés de sobrecorrente
b) De tempo dependente
O tempo de atuação do relé é inversamente proporcional ao valor da corrente. Isto é, o
relé irá atuar em tempos decrescentes para valores de corrente igual ou maior do que a
corrente mínima de atuação ( corrente de partida ou starting current) (Fig.3.2).
3.2 Relés de sobrecorrente
b) De tempo dependente

As curvas de tempo dependente são classificadas em três grupos: Normalmente Inversa


(NI) , Muito Inversa (MI) e Extremamente Inversa (EI), conforme mostra a Fig. 3.3 .
3.2 Relés de sobrecorrente
b) De tempo dependente

Essas curvas são definidas, por norma, a partir de equações exponenciais do tipo:

I : corrente que chega ao relé através do secundário de um TC;


IS : corrente de ajuste ou de partida (starting current);
TMS : os valores numéricos atribuídos a TMS fazem as curvas se deslocarem ao longo do eixo
dos tempos.
Estes valores geralmente variam de 0,01 a 1, com passo de 0,01 (Fig.3.4).
3.2 Relés de sobrecorrente
b) De tempo dependente

Comumente os catálogos dos


fabricantes fornecem dez curvas por
grupo, conforme exemplo mostrado na
Fig.3. 4 Nesta figura, estão dadas curvas
NI de um determinado relé, cuja a
equação é:

Por norma, essas curvas são traçadas para


valores do múltiplo (m) variando,
geralmente, de 1,5 a 20, em um sistema de
eixos ortogonais com escala log x log.
3.2.2 Unidades instantânea (50) e temporizada (51)
Geralmente os relés de sobrecorrente são compostos por duas unidades:
instantânea e temporizada.

1. Nos esquemas elétricos que representam equipamentos de proteção, estas


recebem os números 50 e 51, respectivamente (Fig. 3.5). Neste caso, o relé
tem as funções 50 e 51. Se o relé está ligado para proteção de fase, as suas
unidades são conhecidas como 50 e 51 de fases. No caso de está realizando a
proteção de neutro ou terra, fala-se em unidades 50 e 51 de neutro ou terra.
2. A unidade 50, atua instantaneamente ou segundo um tempo previamente
definido. Já a unidade 51, pode atuar com curvas de tempo dependente ou de
tempo definido.
3. As unidades temporizadas ou de tempo dependente permitem dois tipos de
ajustes: corrente mínima de atuaçãoe curva de atuação.
4. As unidades instantâneas trabalham com dois ajustes: corrente mínima de
atuação e tempo de atuação (tempo previamente definido). Antigamente, estas
unidades (eletromecânicas) não permitiam o controle de tempo, isto é, atuavam num
temp o muito pequeno (da ordem de milisegundos), sem nenhum ajuste. Hoje, os
relés digitais possibilitam ajustes de tempo de atuação destas unidades.
3.2.3 Esquema básico de ligação
O esquema básico tradicional de proteção de um alimentador radial, trifásico e aterrado, na saída
de subestação, utiliza três relés de fase e um de neutro ou terra, ligados através de três
transformadores de corrente, comandando um disjuntor (52), conforme está mostrado na
Fig.3.5.
3.2.3 Esquema básico de ligação

Os relés de fase irão


proporcionar proteção ao
alimentador contra os curtos-
circuitos que envolvam,
principalmente, as fases (trifásico
e bifásico). O relé de neutro ou
terra dará proteção contra os
curtos para a terra (fase-terra e
bifásico-terra).
3.2.3 Esquema básico de ligação
A vantagem desse esquema é que, para qualquer tipo de curto-circuito, haverá, no mínimo,
dois relés sendo percorrido pela corrente de curto.

Atualmente, com o emprego de relés digitais, os quatro relés do esquema da Fig. 3.5 são
substituídos por um único que realiza as funções 50 e 51 de fase e terra. Além disso,
desempenham outras funções tais como: medição de corrente, registros de dados, de
perturbações, etc. São conhecidos como relés de multifunções.

Geralmente os esquemas de proteção são apresentados em um diagrama unifilar,


onde os equipamentos envolvidos recebem uma numeração padronizada. Na Fig.
3.6, está mostrado o diagrama unifilar do esquema de proteção da Fig. 3.5.
3.3 Determinação de relação de TC
Para se fazer o ajuste da corrente de atuação de um relé de sobrecorrente indireto, é
necessário, em primeiro lugar, a definição da relação do TC que irá alimenta-lo.

A relação do TC (RTC) que alimenta um relé deve atender aos seguintes requisitos:
 A corrente nominal primária do TC deve ser maior do que a razão entre o curto-circuito
máximo (no ponto da instalação) e o fator de sobrecorrente do TC (FS). Geralmente, FS=20 .

A corrente nominal primária do TC deve ser maior do que a máxima corrente de carga a ser
considerada:

A máxima corrente de carga a ser considerada deverá levar em conta duas situações:
 Se a subestação não possuir circuito de transferência, a máxima corrente de carga a ser considerada
deverá ser : o somatório da corrente nominal do circuito em estudo com a carga de outro circuito que
eventualmente venha a ser interligado na mesma subestação.
 Se a subestação possuir circuito de transferência, a máxima corrente de carga a ser considerada deverá
ser: o somatório da corrente nominal do circuito em estudo com a carga de outro circuito considerado
contingência usual, com interligação na rede de distribuição.
3.4 Critérios para ajustes de corrente mínima de
atuação
Na medida do possível, os ajustes de corrente mínima de atuação de relés de
sobrecorrente devem observar os critérios dados a seguir.

I) Unidade 51 de fase

a) Quando o relé for instalado no circuito alimentador da subestação, a qual não possui
equipamento de proteção para transferência, sua corrente mínima de atuação deverá
ser maior que a somatória da máximac orrente de carga do circuito em estudo com a
máxima corrente de carga do circuito que eventualmente venha a ser transferido,
multiplicada pelo fator de crescimento de carga (k) e dividida pela respectiva RTC.
3.4 Critérios para ajustes de corrente mínima de
atuação
b) Quando o relé for instalado no circuito alimentador da subestação, a qual
possui equipamento de proteção para transferência, sua corrente mínima
de atuação deverá ser maior que a corrente de carga máxima multiplicada pelo
fator de crescimento de carga (k)e dividida pela respectiva RTC.

Onde, a% é a taxa anual prevista para o crescimento e n o número de anos para o qual o estudo
está sendo planejado.
3.4 Critérios para ajustes de corrente mínima de
atuação
c) A corrente mínima de atuação deverá ser ajustada num valor menor do que a
corrente de curto-circuito bifásico dentro da sua zona de proteção, incluindo
sempre que possível os trechos a serem adicionados quando em condição de
manobras consideradas usuais.
II) Unidade 51 de neutro
a) Quando o sistema for ligado em estrela aterrado, ou delta aterrado através de um
transformador de aterramento, e não possuir cargas ligadas entre fase e terra ou neutro,
o relé de neutro deverá ter a sua corrente mínima de atuação ajustada para um valor
menor que a corrente de curto-circuito fase-terra mínimo dentro da sua zona de proteção. E
deverá ser maior do que 10% da corrente de carga do circuito devido erros admissíveis
nos transformadores de corrente.

b) Quando o sistema for ligado em estrela aterrado, ou delta aterrado através de um


transformador de aterramento, e possuir cargas ligadas entre fase e terra ou neutro, o
relé de neutro deverá ter a sua corrente mínima de atuação ajustada para um valor menor
que a corrente de curto-circuito fase-terra mínimo dentro da sua zona de proteção. E deverá
ser maior do que 10% a 30% da corrente de carga do circuito devido aos desequilíbrios
admissíveis do sistema.
III) Unidades 50 de fase e neutro
As unidades instantâneas dos relés de fase e neutro não deverão ser sensíveis aos
curtos-circuitos localizados após o primeiro equipamento de proteção instalado a jusante.
Geralmente a unidade instantânea é ajustada para proteger 80% do trecho compreendido
entre sua localização e o ponto de instalação do primeiro equipamento de proteção a
jusante (Fig. 3.7).
III) Unidades 50 de fase e neutro
a) A unidade instantânea do relé de fase não deverá ser sensível às correntes de
energização do circuito. Entretanto, poderão ser ajustadas para atuar para curtos-circuitos
bifásicos e trifásicos próximos do primeiro equipamento de proteção a jusante.

O fator de multiplicação (3 a 8) que será tomado, dependerá da característica da carga


do circuito. Em sistema com muito transformador e motor de indução, geralmente se
trabalha com fator 8.
III) Unidades 50 de fase e neutro
b) Quando o sistema for ligado em estrela aterrado, ou delta aterrado através de um
transformador de aterramento, e possuir cargas ligadas entre fase e terra ou neutro, a
unidade instantânea do relé de neutro não deverá ser sensível às correntes de energização
dessas cargas. No entanto, poderá ser ajustada para atuar para curtos-circuitos fase-terra
nas proximidades do primeiro equipamento de proteção a jusante.
3.5 Ajuste de curvas corrente x tempo das
unidades temporizadas
As curvas de tempo das unidades de
fase e neutro deverão ser escolhidas
de modo a atender a seletividade com
os equipamentos de proteção a jusante
e a montante, e também com a curva
de recozimento dos condutores.
Considere-se, por exemplo, o trecho
de sistema de distribuição dado na
Fig. 3.8. Para haver seletividade entre
os equipamentos de proteção
empregados, as suas curvas de tempo
deverão obedecer aos
coordenogramas dados nas Figuras
3.9 (coordenação de fase) e 3.10
(coordenação de neutro).
3.5 Ajuste de curvas corrente x tempo das
unidades temporizadas
3.6 Seletividade relé x relé
Geralmente esta situação ocorre em subestações, onde um conjunto de relés funciona como
proteção principal e outro como proteção de retaguarda (Fig. 3.8).
Para se obter seletividade entre esses dois conjuntos de relés, as curvas de tempo dos relés
principais (fase e neutro) deverão estar acima das curvas dos relés de retaguarda (fase e
neutro), respectivamente, no mínimo 0,4 s , no ponto mais crítico, em todo o trecho
protegido pelos relés principais, para as correntes de curtos-circuitos de fase e terra.
3.7 Seletividade relé x elo-fusível
A seletividade estará garantida, para o todo o trecho protegido pelo elo-fusível, quando
as curvas de tempo dos relés de fase e neutro estiverem, no ponto mais crítico, no
mínimo 0,2s, acima da curva de tempo total de interrupção do elo, para as correntes
de curtos-circuitos de fase e terra.
3.8 Exercício de aplicação
Fazer o estudo de seletividade da proteção do trecho de sistema da distribuição primária, trifásica e
aterrada na subestação dado na Fig. 3.11.

Observações :
Fora das subestações, os curtos-circuitos fornecidos são os trifásicos, bifásicos e fase-terra mínimos;
Os valores das correntes de curtos-circuitos no ponto de entrega da concessionária (barra de alta
tensão da subestação do consumidor) devem ser fornecidos pela mesma;
Para calcular os curtos-circuitos na barra de baixa tensão do consumidor, considere a resistência de
terra da malha igual a 10W.
Resolução: passo a passo
1) Fator de crescimento de carga (k)

2) Dimensionamento das relações dos TCs (RTC)

3) Dimensionamento do elo e da chave-fusível

4) Ajustes das correntes de atuação dos relés da concessionária

5) Determinação das curvas dos relés da concessionária

6) Ajustes das correntes de atuação dos relés do consumidor

7) Determinação das curvas dos relés do consumidor


Resolução:

1) Fator de crescimento de carga (k)


Taxa de crescimento : a= 10% ao ano ;
 Horizonte de estudo : 5 anos K=(1+0,1)5 = 1,61

2) Dimensionamento das relações dos TCs (RTC)

a) Concessionária

O TC com corrente nominal primária de 400 A, satisfaz as duas


condições : 400 / 5 ou 80:1

b) Consumidor

Para dimensionar a RTC do consumidor, é necessário calcular a corrente de carga. Para isso, será usado a
carga nominal do transformador: I C ,CONS. = 2000 / (13,8 x 1,732) = 84 A

Aplicando um fator de crescimento de 1,4 (k=1,4) e os mesmos critérios anteriores, obtêm-se: 150/5 ou 30:1
3) Dimensionamento do elo e da chave-fusível

a) Elo-fusível

b) Chave-fusível
Será considerado um fator de assimetria (f ASSIM. ) igual a 1,4 .

Para atender aos critérios e à classe de tensão do circuito (15kV), a chave deverá ter a seguinte especificação
básica:
corrente nominal = 100 A;
capacidade de interrupção = 5kA;
tensão nominal = 14,5kV;
NBI = 95kV.
4) Ajustes das correntes de atuação dos relés da concessionária

a) Unidades 51 de fases

b) Unidades 50 de fases

c) Unidade 51 de neutro
d) Unidade 50 de neutro
5) Determinação das curvas dos relés da concessionária

Estas curvas deverão coordenar com as curvas do elo-fusível e dos relés do consumidor.
Este estudo de coordenação será feito pelo método ponto a ponto.
As curvas de tempo dos relés deverão coordenar com o elo-fusível 40K na faixa de
correntes entre 1593 A e 2900 A.

a) Curvas das unidades 51 de fases


Neste caso, deve-se trabalhar com as correntes de
curtos-circuitos que envolvem somente as fases
(trifásico e bifásico).

Inicialmente, acha-se os tempos de interrupção do 40K


para as correntes limites da faixa de coordenação 1593
A e 2900 A (Fig. 3.12).
Pelos critérios de seletividade relé x elo, a curva escolhida deverá ser tal que:

Como geralmente as curvas de tempo dos relés são fornecidas em função de múltiplo (m), então deve-se
calcular os múltiplos para essas correntes

A seletividade está garantida quando as duas condições seguintes são satisfeitas conjuntamente :
A seletividade está garantida quando as duas condições seguintes são satisfeitas conjuntamente :

De acordo com a Fig. 3.13, escolhe-se, inicialmente,


a curva 0,2 (TMS = 0,2 ), para as unidades de fases,
pois satisfaz ao critério de seletividade relé x elo.
b) Curvas da unidade 51 de neutro
Neste caso, deverão ser empregadas as correntes de curtos-circuitos envolvendo a terra ou o neutro. Para o tipo
de sistema em estudo (trifásico a três fios, aterrado na subestação), serão usados somente os curtos-circuitos
fase-terra mínimos, cujos valores limites no trecho protegido pelo 40K , são 600 A e 303 A. Para estas
correntes, os tempos de interrupções do elo estão dados na Fig. 3.12.

Pelos critérios de seletividade relé x elo , tem-se:

Os múltiplos são :

Levando-se em conta as mesmas considerações que foram feitas na


determinação da curva da 51 de fase, e observando-se a Fig. 3.13 ,
escolhe-se, a princípio, a curva 0,9 (DT=0,9) para a 51 de neutro.
6) Ajustes das correntes de atuação dos relés do consumidor

a) Unidades 51 de fases

b) Unidade 51 de neutro
7) Determinação das curvas dos relés do consumidor

Para se fazer este estudo, será empregado o critério de seletividade relé x relé. Para isso, será
considerarado que os relés de fases e neutro do consumidor têm as curvas MI apresentadas na Fig.
3.14.

a) Curvas das unidades 51 de fases


Inicialmente, calculam-se os múltiplos das correntes que limitam a
faixa de coordenação dos relés de fases da concessionária e do
consumidor (1905 A e 2200 A).

Entrando com o valor de m1 (4,8) , na curva 0,2 da 51 de fase da


concessionária (Fig. 3.13) , obtêm-se o tempo de atuação em torno de
0,30s . Com m2 (5,5) , obtêm-se o tempo de atuação de
aproximadamente 0,25s . Isto é:
b) Curvas das unidades 51 de neutro

Para a determinação da curva do relé de neutro do consumidor será usada a corrente de curto-circuito fase terra
mínimo (220 A), uma vez que para o sistema em estudo, o fase-terra franco (1630 A), praticamente, é
impossível de acontecer.
A seguir, as Figuras 3.15 e 3.16 mostram os coordenogramas elo x relé e relé x relé. É importante observar
que os gráficos não estão em escala aproximada.
Roteiro de aula: REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:
José Wanderson
jose.silva@educador.facimed.edu.br

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