Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 1

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

INSTITUTO DE LETRAS
ALUNA: SAMANTA VITÓRIA SIQUEIRA
PROFESSORA: REGINA ZILBERMAN
LIT00077 – LITERATURA E SOCIEDADE – QUESTÕES DE MÉTODO 2019/2

● Observações sobre ​o exercício da justiça e à afirmação (ou não) dos direitos humanos
no conto "Virginius", de Machado de Assis.

Neste conto, Machado de Assis retrata uma situação oriunda do período colonial do Brasil e
principalmente com resquícios da abolição da escravatura. Como o próprio personagem
principal e narrador observa no final do conto, a história é inspirada na t​ragédia de Virginius,
da sociedade romana, há vinte e três séculos. Nessa tragédia, Ápio Cláudio apaixonou-se por
Virgínia, filha de Virginius. Como foi impossível conquistá-la, o único meio que restava ao
apaixonado foi escravizá-la. Querendo evitar a escravização da filha, Virginius decide cravar
uma faca no coração da moça para livrá-la do infortúnio de ser propriedade de Ápio Cláudio.
A cena se remete, mas dessa vez em contexto brasileiro. Julião, aparentemente um
ex-escravizado ou um homem sem posses, vivia com sua filha Elisa em terras cedidas pela
fazendeiro e “bom” homem, Pio. Eis que um dia o filho de Pio, Carlos, decide que quer Elisa
para si e incomoda a moça. Julião exige respeito para com sua filha, mas Carlos responde de
maneira brutal: invade a casa dos dois e pega Elisa a força. Chegando no meio daquela
confusão, o pai, Julião, verificando que a filha seria a mais infeliz dos seres caso acabasse
sendo violada por Carlos, decide matá-la, antes que algo aconteça. Nessa trama, nosso
personagem e narrador, o advogado que é chamado da capital para defender Julião da justiça,
acaba não sabendo como lidar com a situação. Julião seria culpado diretamente ou poderia
ainda assim ser defendido, levando em conta a sua explicação? Quem é o verdadeiro
culpado? Julião ou Carlos? Julião é então julgado pelo júri sem sua defesa ser levada em
conta. A verdade é que o júri pouco se interessa que o pai tenha feito aquilo para salvar sua
filha, a partir do ponto de vista dele. A lei é a lei para todos. Temos uma regra cumprida de
maneira bastante empírica: Julião não nega que matou sua filha, logo, é culpado. O
questionamento que podemos fazer é o quanto isso realmente é justo. De um lado, temos uma
lei que é cumprida, de outro temos a verdade e a coisa certa a se fazer segundo esse pai,
oriundo de uma realidade muito diferente daqueles que escreveram essa lei. Caso não matasse
sua filha, não teria como impedir o horror da violação por Carlos; Carlos, assim como Ápio
Cláudio, acabaria escravizando-a. A conversa sobre os direitos humanos serem uma “Verdade
autoevidente” criada por homens brancos e poderosos que Lynn Hunt nos traz está bastante
evidente aqui. Principalmente e ainda mais quando descobrimos que Carlos, o violador, é
mandado para o quartel, para tornar-se soldado como “punição” de seu pai. As punições que
esses dois homens recebem é visivelmente diferente: enquanto um vai para cadeia, o outro
apenas continua livre, formando-se soldado, para muito possivelmente aplicar as regras e leis
dos poderosos em outros Juliões.

Você também pode gostar