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Fui chamada pra falar de religiosidade afro- sujeito está, quem são essas pessoas.
brasileira, (seria afro-indígena, afro-ameríndia)? Todas essas religiosidades dialogaram com
Não vou me centrar em nenhuma religiosidade o catolicismo e é daí que surgiram as irmanda-
Boa tarde a todas e a todos. Queria começar res- mente com o discurso veiculado pela elite, de que
gatando algumas falas que foram feitas anterior- a ação afirmativa é como se fosse uma gratifica-
mente durante o evento, que têm muito a ver com ção que está sendo dada para um grupo que não
o que quero discutir. O Hamilton diz: “Nós temos tem capacidade para entrar na universidade por
que falar por nós mesmos”. Acho que essa é uma si só. Fica difícil para o sujeito se assumir nes-
ideia importantíssima e temos que pensar nessa se lugar e se assumir negro também não é fácil,
noção dentro da psicologia e pensar o que psico- porque é se assumir como o não-sujeito social,
logia tem produzido como conhecimento, como aquele sujeito que não é bem quisto, que é o sus-
prática. Achei interessante também, Hamilton ter peito, que se atrela a uma série de representações
problematizado o termo afro-brasileiro, porque o pejorativas. Esse contexto me incomodou, prin-
“afro” remete a um resgate do sujeito e o “brasilei- cipalmente por questionar se essa dificuldade de
ro” é um engodo, pois a nação brasileira nunca de identificação era uma constante. Então comecei
fato acolheu o africano, e nos coloca de fato como a olhar para movimentos que são movimentos de
objetos. É necessário retomarmos a nossa voz. problematização e que propõem alguma forma
Faço parte de um grupo da UFSCAR chamado de enfrentamento do racismo. Transitando pe-
NUESTRA,( Núcleo de Trabalho Sociedade e Co- los saraus de São Paulo eu notei que havia uma
munidade), e nele são desenvolvidas pesquisas presença de corpos e de ideias negras muito fre-
que em sua maioria são feitas com grupos ditos quentes nesses espaços, e que a pauta da questão
minoritários. Muitos dos meus colegas pesquisa- racial se fazia muito presente , particularmente,
dores, colocam que uma das intenções de se fazer em alguns espaços. Se é dado o espaço pra esses
pesquisa com essa população é dar voz a esse su- sujeitos que são minoria, eles vão dizer das suas
jeito. E essa é uma discussão que tenho feito pois angústias, e os saraus de periferia mostram jus-
penso que não estamos dando voz a ninguém, tamente isso. É muito frequente a discussão de
e esses movimentos de resistência vêm mostrar gênero, de raça, de classe, porque isso perpassa o
justamente que esses sujeitos se organizam, eles cotidiano desses sujeitos que estão ali se colocan-
se coletivizam, eles se politizam e essa voz ecoa. do. Decidi, então, pesquisar esses coletivos dos
Então, trago algumas reflexões a partir da mi- saraus, partindo do pressuposto de que são cole-
nha pesquisa de doutorado, sobre o Movimento tivos que estão numa outra fase de identificação,
de Literatura Periférica que tem acontecido nas eles obviamente problematizam todo o malefício
periferias de São Paulo. Chego nesse campo de que o contexto racial brasileiro traz para as identi-
pesquisa a partir de algumas indagações na mi- dades de negros e negras, e para outras identida-
nha pesquisa de mestrado, na Universidade Fe- des também. São coletivos de afirmação. Eu quis
deral de São Carlos entrevistando jovens negros então não mais estudar aquilo que a psicologia já
que tinham ingressado nos três primeiros anos tem dito, que é o malefício do racismo à subjeti-
de implementação do programa de ação afirma- vidade de negros e negras, de brancos e brancas,
tiva. Eram jovens negros que tinham ingressado mas pesquisar este momento de identificação.
ou não pelo programa. Fazendo essa pesquisa me Quais são as representações que são forjadas nes-
deparei com algumas questões que me incomo- se contexto de ressignificação? Acho interessante
daram. Percebi que muitos dos estudantes que ler os trabalhos do Professor Alessandro de Oli-
ingressavam pela ação afirmativa e que optaram veira Santos, porque ele apresenta os momentos
pela ação afirmativa para negros, não necessaria- de tratamento da temática étnico-racial, e como
mente se assumiam negros e não necessariamen- a psicologia trata desse tema. O autor afirma que
te se assumiam nesse sistema de reserva de vagas. num primeiro momento existia movimento da Es-
Muitos estudos da ação afirmativa têm demons- cola Nina Rodrigues de eugenização e higieniza-
trado isso, e penso que essa dificuldade também ção, e nesse momento o negro é considerado um
não vem do nada. É difícil para esse sujeito se co- perigo social, aquele que deve desaparecer, que
locar como “reservista”, como adepto da reserva deve ser exterminado da sociedade. Num segun-
de vaga, tendo em vista todo o simbólico que se do momento, há o tratamento de outras questões,
aglutina à ideia de ação afirmativa e particular- como o preconceito, a discriminação, as atitudes