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UM GUIA SEGURO

PARA O CÉU

J. Alleine

PUBLICAÇÕES EVANGÉLICAS SELECIONADAS


Caixa Postal 1287
01059-970 - São Paulo - SP
Título original:
An Alarm to the Unconverted

Autor:
Joseph Alleine

Editora:
The Banner of Truth Trust
Edinburgh - Scotland

Tradutora:
Sylvia E. de Oliveira

Revisor:
A. Poccinelli

Cooperador:
L. J. Christianini

Primeira edição pela "PES":


1987

Segunda edição pela "PES":


2002

Capa:
Sergio Menga

Impressão:
Imprensa da Fé
ÍNDICE

Dados Biográficos ...................................................... 07

Introdução .................................................................. 15

1. Erros a Respeito da Conversão .................................. 19

2. A Natureza da Conversão .......................................... 28

3. A Necessidade da Conversão .................................... 63

4. As Características dos que não são Convertidos ...... 89

5. As Misérias dos que não são Convertidos .............. 106

6. Orientações para os que não são Convertidos ........ 133

7. Os Motivos para a Conversão .................................. 174

Conclusão ................................................................. 189


DADOS BIOGRÁFICOS
Joseph Alleine nasceu e foi batizado em Devizes,
Wiltshire, em 8 de abril de 1634, numa família puritana.
Naquela época a Inglaterra enfrentava os sofrimentos causa-
dos pelos agitados acontecimentos que logo resultaram na
Guerra Civil, e antes que Alleine completasse dez anos, a
Praça do Mercado, onde ficava sua casa, ressoou com o
estrondo dos canhões e o ribombar dos mosquetes, quando
os monarquistas puseram os puritanos em retirada na bata-
lha de Roundway (julho de 1643). Dois anos mais tarde os
papéis se inverteram e o próprio Cromwell providenciou
para que a bandeira azul do Parlamento fosse hasteada no
alto do velho castelo, o qual se erguia em frente à casa onde
Alleine passou sua infância. O círculo familiar também não
ficou isento de problemas. Seu pai, embora bem conceituado
como comerciante de tecidos, sofreu alguns dos infortúnios
econômicos decorrentes da guerra; e para maior tristeza deles,
Edward, o irmão mais velho de Joseph, já ativo no ministério,
morreu em 1645.
No mesmo ano Alleine "apresentava-se para a carreira
cristã" implorando a seu pai que lhe permitisse se preparar
para "suceder seu irmão no ministério". Assim, em abril de
1649, nós o encontramos a caminho de Oxford para sentar-
-se aos pés de teólogos como John Owen e Thomas Goodwin.
Em novembro de 1651 transferiu-se do Lincoln para o
Corpus Christi College - este último um seminário mais

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radicalmente puritano, sob a presidência do piedoso Dr.
Edward Staunton. Ali recebeu o grau de Bacharel em Artes
em 6 de julho de 1653, tornando-se professor assistente e,
subseqüentemente, capelão do seminário. Sem dúvida
alguma, foi devido à influência de Alleine que Henry Jessey
pôde escrever em 1660: "Penso que não havia no mundo outro
colégio corno Corpus Christi, onde um grande número de
pessoas demonstrava o poder da piedade e a pureza da
adoração a Deus. Era tal qual um Éden, mas agora não passa
de um deserto estéril".
Os anos que Alleine passou em Oxford foram carac-
terizados pela piedade e diligência nos estudos. Seu bom
temperamento granjeou-lhe muitos amigos, porém se as
visitas deles interrompiam seu tempo de estudo, "ele não se
dava ao luxo de recebê-las", dizendo: "É preferível que se
admirem da minha rudeza a que eu perca o meu tempo;
pois somente alguns sentirão minha indelicadeza, mas muitos
sentirão minha perda de tempo". Na qualidade de capelão,
empenhou-se em evangelizar as aldeias rurais ao redor de
Oxford e, de quinze em quinze dias, também pregava para
os encarcerados. Assim foi o seu treinamento para o futuro
ministério. Antes dos 21 anos ele já havia aprendido a ser
"infinita e insaciavelmente ávido pela conversão das almas
perdidas, e por essa causa derramava sua alma em oração e
pregação".
Não admira, pois, que um notável teólogo puritano,
George Newton (1602-1681), ministro de Saint Mary Mag-
dalen, Taunton, urna cidade produtora de artefatos de lã, com
urna população de aproximadamente 20 mil pessoas, era um

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baluarte puritano no ocidente da Inglaterra. O espírito da
cidade havia se manifestado clararamente 10 anos antes,
quando, com heróica firmeza, havia resistido desesperados
cercos monarquistas - embora metade das ruas houvesse
sido queimada por uma carga de morteiros e muitos
habitantes haviam morrido de fome! Foi ali, em meio às
montanhas, campinas e pomares de Somerset, que Alleine
havia de passar o seu curto e inesquecível ministério.
Logo depois de começar seu trabalho em Taunton,
Alleine casou-se em 4 de outubro de 1655 com sua prima
Theodosia Alleine, mulher de singular espiritualidade, que
deixou um comovente relato sobre o ministério de seu
marido. A única "falha" que achava nele era a de não passar
mais tempo com ela, ao - que ele respondia: "Oh, minha
querida, sei que tua alma está salva; mas quantas há que estão
perecendo e das quais eu tenho que cuidar? Oh, se eu pudesse
fazer mais por elas!" A vida inteira de Alleine foi uma ilus-
tração de suas palavras: "Mostre-me um crente que considere
seu tempo mais precioso do que ouro". Quando a semana
começava, ele dizia: "Temos uma nova semana à nossa
frente, vamos usá-la para Deus!" E a cada manhã: "Vamos
viver bem este dia!" "Enquanto teve saúde", escreve sua
esposa, ele se levantava constantemente às quatro horas da
manhã ou antes, e aos domingos, mais cedo ainda, se
acordasse; ficava muito magoado se ouvisse algum ferreiro,
ou sapateiro, ou negociante fazendo seus trabalhos antes que
ele tivesse cumprido seus deveres para com Deus. Então
dizia-me: "Oh, como esse barulho me envergonha! Porven-
tura meu Senhor não merece mais do que o deles?" Das

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quatro às oito da manhã passava em oração, em santa
contemplação, e cantando salmos - o que muito lhe agradava
- fazendo suas devoções diárias sozinho, como também com
a família".
Este devotado casal trabalhava esforçadamente pelas
almas perdidas. Theodosia mantinha uma escola para
crianças em sua casa, enquanto seu marido passava cinco
tardes por semana reiterando os urgentes apelos aos
incrédulos que ele lançava domingo após domingo, sob a
majestosa torre - de Mary Magdalen. Ele mantinha uma
lista com os nomes dos habitantes de cada rua e cuidava para
que cada um fosse visitado e catequizado. O resultado desse
trabalho foi uma numerosa colheita de almas.* "Suas súplicas
e exortações", diz George Newton, "eram, muitas vezes, tão
afáveis, tão cheias de zelo santo, vida e vigor, que conquis-
tavam completamente seus ouvintes; ele os comovia e, às
vezes, amolecia os mais duros corações". É claro que, mesmo
numa época em que a pregação poderosa e a evangelização
bem sucedida eram relativamente comuns, o ministério de
Alleine era notável aos olhos de seus irmãos. "Poucas épocas
produziram pregadores mais eminentes que o Joseph
Alleine" - declarou o puritano apostólico, Oliver Heywood.
E Baxter, referindo-se a Alleine, fala de sua "grande

* "O Senhor Se agradou em abençoar grandemente os nossos esforços",


escreveu Theodosia Alleine, "de modo que muitos foram convertidos
em poucos anos, os quais, antes, não conheciam a Deus."JosephAlleine,
por Charles Stanford, 1861, pág. 101.

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habilidade ministerial na exposição pública e na aplicação
das Escrituras - tão comovente, tão convincente, tão
poderosa".
Um período de bênção chegava ao seu fim quando
Alleine iniciou o seu ministério. Três anos mais tarde
Cromwell estava morrendo. Dois anos depois, os sinos de
Taunton tocaram alegremente para dar as boas-vindas a
Charles II e à restauração da monarquia (1660). Mas a
felicidade nos corações dos puritanos durou pouco, pois o
tempo em que "a nação gozou de um estado de religiosidade"
acabou em 1662, quando, com o infame Ato da Uniformi-
dade, dois mil dos melhores ministros que a Inglaterra já
teve, foram destituídos de seus púlpitos. Entre os oitenta e
cinco ministros que sofreram dessa maneira em Somerset,
encontramos, como era de esperar, os nomes de George
Newton e Joseph Alleine. Mas, embora afastado do púlpito,
Alleine recusou-se a ficar calado; de fato, conta-nos sua esposa
que "deixando de lado outros estudos por achar que seu
tempo era curto", ele intensificou sua atividade de pregação.
"Eu sei que ele chegou a pregar catorze vezes numa semana,
em muitas ocasiões dez vezes, e regularmente seis ou sete
xezes numa semana, durante aquele período."
Finalmente, após sobreviver a muitas ameaças, Alleine
recebeu uma intimação em 26 de maio de 1663. Na noite
seguinte ele marcou um encontro com seus fiéis "por volta
de uma ou duas horas da manhã, ao qual compareceram, de
boa vontade, centenas de jovens e adultos; então pregou e
orou com eles durante três horas, aproximadamente". Poucas
horas depois ele foi jogado na prisão em Ilchester. Após um

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ano foi libertado, mas apenas para enfrentar os rigores do
Ato das Cinco Milhas e o Conventicle Act.*
Embora já com a saúde precária, continuou a pregar
ocultamente até 10 de julho de 1666. Naquela tarde, quando
pregava sobre o Salmo 147:20 numa reunião em certa casa
particular, foram arrombadas as portas e ele foi preso
novamente. Uma vez mais foi libertado e com a mesma
energia espiritual considerou o que ainda poderia fazer para
promover o evangelho de Cristo. "Temos mais um dia", diria
à sua esposa ao se levantar pela manhã, "mais um dia para
Deus; vamos vivê-lo bem, trabalhar bastante por nossas
almas, armazenar muito tesouro no céu, pois só nos restam
alguns dias para viver." Sua esposa nos conta que, com verda-
deiro espírito puritano, considerou a possibilidade do
trabalho missionário no País de Gales ou mesmo na China.
Jamais o evangelho de Jesus Cristo ardeu mais fervorosa-
mente em qualquer outro coração inglês! Mas o trabalho
de Alleine estava terminado, pois sua constituição física
jamais se recuperou dos maus tratos sofridos nas prisões e
seu corpo definhava-se rapidamente. No dia 17 de novembro
de 1668, aos 34 anos, Deus o levou, poupando-o dos males
futuros, e o idoso George Newton permaneceu junto ao seu
corpo, quando foi enterrado na Capela de onde ressoava o
"alerta" de seus chamados às pessoas não convertidas.
Este livro incorpora a substância da mensagem de
Alleine, e, portanto, apresenta um verdadeiro modelo do

* "Conventicle Act" - Ato das Reuniões Religiosas Clandestinas. Nota


da tradutora.

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evangelismo puritano. A fraseologia pode mudar de época
para época, e os dons de homem para homem, porém não
hesitamos em dizer que aqui estão princípios que precisam
estar presentes em qualquer apresentação verdadeira do
evangelho. Muitos dos grandes evangelistas tiveram suas
convicções moldadas pelas páginas deste livro. George
Whitefield, enquanto estudante em Oxford, nos conta em
seu diário que oAlerta ( Um Guia Seguro para o Céu) de Alleine
o beneficiou sobremaneira. Charles Haddon Spurgeon
registra que, quando ele era criança, sua mãe sempre lia uma
parte doAlerta de Alleine para seus filhos quando se sentavam
ao redor da lareira nos domingos à noite, e que, quando ele
foi levado à convicção do pecado, foi àquele livro que
recorreu. "Lembro-me", escreve ele, "de que quando eu
acordava pela manhã, a primeira coisa que pegava era oAlerta,
de Alleine, ou o Chamado aos Não-Convertidos, de Baxter.
Oh, que livros aqueles! Que livros!! Eu não os lia apenas, eu
os devorava ... " Com o seu coração inflamado assim pela
teologia puritana, Spurgeon se preparava para seguir os passos
de Alleine e Whitefield.
Inúmeras edições deste livro têm sido publicadas desde
a primeira edição em 1671. Dr. Calamy escreveu sobre ele
em 1702: "Multidões terão motivos para serem eternamente
gratas a ele. Nenhum livro na língua inglesa (com exceção
da Bíblia) pode igualar-se a ele no que se refere ao número
de exemplares distribuídos; já foram vendidos vinte mil
exemplares sob o título de O Chamado ou oAlerta, e cinqüenta
mil sob o título de Um Guia Seguro para o Céu, trinta mil dos
quais foram vendidos numa só edição". Como uma notável

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ilustração da influência espiritual desta obra podemos citar
o seguinte exemplo: no final do século 18, o ministro de uma
congregação no norte da Escócia - homem mais conhecido
pela sabedoria do que pelo fervor evangélico - foi solicitado
por uma entidade para traduzir oAlerta para a língua gaélica.
O livro foi, então, passado às suas mãos. Achando o material
apropriado para pregações, começou a utilizá-lo em seus
sermões, apresentando-o capítulo por capítulo. Conta-se que
o resultado "foi um grande despertamento que perdurou por
muito tempo no distrito de Nether Lorn".
Com a oração de que o conteúdo deste livro seja nova-
mente divulgado por todo o nosso país e noutros países além
dos mares, nós o recomendamos à bênção de Deus, cuja
Palavra é "viva e eficaz, e mais penetrante do que espada
alguma de dois gumes". "Porque toda a carne é como a erva,
e toda a glória do homem como a flor da erva. Secou-se a
erva e caiu a sua flor; mas a palavra do Senhor permanece
para sempre; e esta é a palavra que entre vós foi evangelizada"
(1 Pedro 1:24-25).
1 de agosto de 1959
Iain Murray

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INTRODUÇAO
-

Um Fervoroso Convite aos


Pecadores a que
se Voltem para Deus

Amados, reconheço alegremente que sou um devedor


para com vocês, e como devo ser considerado um bom
despenseiro da casa de Deus, estou preocupado em dar a
cada um a sua porção, Mas a maior preocupação do médico
é com aqueles pacientes cujos casos são mais questionáveis
e perigosos; e a piedade do pai está voltada especialmente
para o filho moribundo. Da mesma maneira, as almas não
convertidas precisam de uma fervorosa compaixão e uma
pronta diligência para arrebatá-las, como tições, do fogo
(Judas, versículo 23). Portanto, é a elas que me dedicarei
primeiramente nestas páginas.
Mas aonde buscarei meu argumento? Como conquistá-
-las? Oh, se eu soubesse! Iria escrever-lhes com lágrimas.
Iria chorar em cada argumento. Esvaziaria minhas veias
para escrever; pediria por elas ajoelhado. Oh, como eu fica-
ria grato se pudessem ser convencidas, se se arrependessem
e se voltassem para Deus.
Quanto tempo tenho labutado por vocês! Quantas vezes

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eu quis conquistar vocês! Para isso mesmo tenho orado e
estudado todos estes anos a fim de conduzi-los a Deus. Oxalá
eu o pudesse fazer agora! Porventura vocês ainda se conven-
cerão?
"Mas, ó Senhor, quão incapaz eu sou para esse trabalho. Pobre
de mim, com que poderei traspassar as escamas do leviatã ou fazer
o coração sentir que é tão duro quanto a mais dura pedra? Irei e
falarei aos sepulcros, e esperarei que os mortos me obedeçam e
venham para fora? Farei um discurso às rochas ou falarei às
montanhas, pensando que elas se moverão com argumentos? Acaso
eu farei o cego ver? Desde o começo do mundo nunca se ouviu que
um homem abrisse os olhos de um cego (João 9: 32). Mas, ó Senhor,
Tu podes traspassar o coração do pecador. Eu somente posso tentar
armar o arco, porém Tu diriges a flecha entre as junções da
armadura. Apaga o pecado e salva a alma do pecador que lança
seus olhos sobre estas páginas."
Não há outra entrada para o céu senão a estreita passa-
gem do novo nascimento; sem santidade vocês jamais verão
a Deus (Hebreus 12: 14). Portanto, entreguem-se ao Senhor
agora. Busquem-no agora. Entronizem o Senhor Jesus em
seus corações e O exaltem em suas casas. Beijem o Filho
(Salmo 2: 12). E abracem as ofertas de misericórdia; toquem
Seu cetro e vivam; por que motivo morrerão? Não peço nada
para mim mesmo, mas para que vocês sejam felizes; esse é
o prêmio a que aspiro. O desejo de minha alma e a minha
oração por vocês é que possam ser salvos (Romanos 10: 1).
Eu rogo que me permitam uma liberdade e uma
franqueza amiga em seu mais profundo interesse. Não estou
assumindo o papel de orador, no sentido de apresentar-lhes

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um discurso erudito, nem apresentar o assunto com
eloqüência a fim de agradar-lhes. Estes capítulos tratam de
uma mensagem de peso significativo - convencer, converter
e salvar vocês. Não estou usando a retórica como isca nem
pescando aplausos, mas suas almas. Meu trabalho não é
agradá-los, e sim salvá-los; nem tratar com sua imaginação,
porém com seus corações. Se eu não tiver seus corações, nada
terei. Se fosse para agradar seus ouvidos, falaria de outro
modo. Se pregasse sobre mim mesmo, tomaria outro rumo.
Poderia, então, contar-lhes uma história mais suave; faria
travesseiros para vocês e falaria de paz, pois como pode Acabe
amar este Micaías, que sempre profetiza o mal a seu respei-
to? (1 Reis 22:8). Ora, quão melhores são as ofensas de um
amigo do que os bons discursos da prostituta, que lisonjeia
com os seus lábios até que a flecha lhe atravesse o fígado!
(Provérbios 7:21-23 e 6:26). Se tivesse que aquietar uma
criança que chora, bastaria cantar para ela uma canção mais
alegre ou niná-la para dormir. Mas quando a criança cai no
fogo, o pai toma outra atitude; ele não tenta silenciá-la com
uma canção ou com coisas insignificantes. Sei que se não
formos bem sucedidos com vocês, estarão perdidos; se não
pudermos obter o seu consentimento para se levantarem e
saírem, vocês perecerão para sempre. Se não houver conver-
são, não haverá salvação! Preciso obter a sua boa vontade
ou terei que deixá-los no pecado.
Mas aqui volta-me outra vez à mente a dificuldade do
meu trabalho. ªÓ Senhor, escolhe as minhas pedras do ribeiro
(1 Samuel 17:40,45). Venho em nome do Senhor dos exércitos, o
Deus dos exércitos de Israel. Venho como o jovem Davi contra

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Golias para lutar não contra a carne e o sangue, e sim contra os
principados e potestades, contra os príncipes das trevas deste século
(Efésios 6: 12). Que neste dia o Senhor derrote os filisteus, despoje
o homem forte de sua armadura e entregue-me os cativos. Senhor,
escolhe-me as palavras, escolhe-me as armas; e quando eu puser
minha mão no alforge, pegar uma pedra e atirá-la, que Tu possas
levá-la ao alvo e fazê-la penetrar não na fronte, mas no coração
do pecador: não convertido, derrubando-o em terra, como fizeste
a Saulo de Tarso (Atos 9:4)."
Alguns de vocês não sabem o que eu entendo por
conversão, e em vão tentarei persuadi-los àquilo que não
entendem. Portanto, por amor a vocês, vou mostrar o que é
conversão.
Outros alimentam secretas esperanças de misericórdia,
embora continuem apáticos. Para esses preciso mostrar a
necessidade da conversão.
Outros provavelmente endureçam seus corações com o
vão conceito de que já são convertidos. Para esses preciso
mostrar as características dos que não são convertidos.
Outros pelo fato de não sentirem o pecado, de nada
temerem, dormem tranqüilos. A esses devo mostraras misé-
rias daqueles que não são convertidos.
Outros permanecem quietos, porque não vêem como
escapar. A esses devo mostrar os meios da conversão.
Finalmente, para o estímulo de todos, encerrarei com
os motivos para a conversão.

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1
Erros a Respeito da Conversão
O diabo tem produzido muitas imitações de conversão,
iludindo as pessoas, ora com isto, ora com aquilo. Ele possui
tamanha habilidade e astúcia que, se possível fosse, engana-
ria até os próprios eleitos. Agora, para que eu possa eliminar
o erro devastador de alguns que pensam que são convertidos
quando não o são, bem como remover as inquietações e os
temores de outros que pensam que não são convertidos
quando na verdade o são, mostrarei a natureza da conversão
- tanto o que ela não é quanto o que ela é. Vamos começar
com o aspecto negativo.
Conversão não é professar o cristianismo. O cristia-
nismo é mais que um nome. Se dermos ouvidos a Paulo,
veremos que o cristianismo não se fundamenta na palavra,
mas no poder (1 Coríntios 4:20). Se o fato de deixar de ser
judeu ou pagão e professar o cristianismo significasse con-
versão verdadeira - visto que isso é tudo o que alguns dão a
entender a respeito dela- quem poderia ser melhores cristãos
senão os de Sarda ou de Laodicéia? Eram todos cristãos
professos, porém apenas de nome; e por serem cristãos só de
nome, são condenados por Cristo e ameaçados de serem
rejeitados (Apocalipse 3:14-16). Quantos há que invocam o

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nome do Senhor Jesus mas não se apartam da iniqüidade
(2 Timóteo 2:19), professando que conhecem a Deus, mas
negando-O com suas obras? (Tito 1: 16). Será que Deus vai
recebê-los corno verdadeiros convertidos? O quê? Conver-
tidos do pecado enquanto eles ainda vivem em pecado? É
urna visível contradição! É claro que se o óleo das lâmpadas
da fé não houvesse faltado, as virgens loucas jamais teriam
sido impedidas de entrar (Mateus 25:12). Encontramos não
apenas cristãos professos rejeitados, porém inclusive pre-
gadores de Cristo e milagreiros, pois são maus obreiros
(Mateus 7:22-23).
Conversão não é revestir-se das insígnias de Cristo
no batismo. Ananias, Safira e Simão Mago foram batizados,
assim corno as demais pessoas. Quantos caem em erro neste
ponto, enganando e sendo enganado; imaginando que a graça
eficaz está necessariamente ligada à administração externa
do batismo, de modo que toda pessoa batizada é regenerada,
não apenas por observar a ordenação, mas também no sentido
real e literal da palavra. Assim, os homens imaginam que
por haverem sido regenerados por ocasião do batismo, não
necessitam de nenhuma outra obra. Todavia se fosse assim,
então todos os que houvessem sido batizados seriam,
necessariamente, salvos, pois a promessa de perdão e salvação
é feita em referência à conversão e à regeneração (Atos 3: 19;
Mateus 19:28). E, de fato, se a conversão e o batismo fossem
idênticos, então seria conveniente que os homens levassem
um certificado de seu batismo quando morressem, e medi-
ante a apresentação dele não haveria dúvidas quanto à sua
admissão no céu.

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Em suma, se não há nada mais a acrescentar à salvação
ou à regeneração, senão o fato da pessoa ser batizada, isto vai
frontalmente contra o que dizem as Escrituras em Mateus
7:13-14, bem como contra muitas outras passagens. Se isto
for verdade, não deveremos mais dizer: "Estreita é a porta, e
apertado o caminho", porque se todos os que são batizados são
salvos, a porta é excessivamente larga e nós, daqui em diante,
deveremos dizer: "Larga é a porta e espaçoso o caminho que
conduz à vida". Se isto é verdade, milhares podem entrar
lado a lado; e nós não ensinaremos mais que os justos
dificilmente serão salvos ou que há necessidade de tanto
empenho para apoderar-se do reino dos céus pela violência
e de tanto esforço para entrar nele. (1 Pedro 4:18; Mateus
11: 12; Lucas 13:24). Sem dúvida alguma, se o caminho é
tão fácil como muitos supõem, ou seja, que é necessário pouco
mais que simplesmente ser batizado e clamar: "Senhor, tem
misericórdia", não precisamos nos empenhar em buscar, bater
e lutar, como requer a Palavra de Deus, a fim de obtermos a
salvação. Reafirmamos que se isto é verdadeiro, não diremos
mais: "Poucos há que a encontram"; será melhor dizermos:
"Poucos a perderão". Não diremos mais que, dos muitos
que são chamados, "somente alguns são escolhidos" (Mateus
22:14), e que, mesmo do Israel professo, somente um rema-
nescente será salvo (Romanos 9:27). Se esta doutrina é
verdadeira, não mais faremos coro com os discípulos: "Quem,
então, será salvo?" - mas ao invés disso: "Quem, então, não
será salvo?" Assim, se alguém for batizado - mesmo que
seja um fornicário ou escarnecedor, ou avarento, ou beberrão
- herdará o reino de Deus! (1 Coríntios 5: 11 e 6:9-10).

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Alguns irão alegar: aqueles que pecaram depois de terem
recebido a graça regeneradora no batismo precisam ser
renovados; caso contrário não poderão ser salvos.
Eu respondo: em primeiro lugar, há uma conexão infa-
lível entre regeneração e salvação, como já temos mostrado.
Em segundo lugar, o homem teria de nascer de novo outra
vez - o que é um grande absurdo. Poderíamos, do mesmo
modo, supor que o homem nascesse duas vezes fisicamente,
bem como duas vezes espiritualmente. Mas, em terceiro lugar
e acima de tudo, isso garante o que eu defendo, isto é, não
importa o que os homens recebam ou aspirem receber no
batismo, se depois disso forem considerados flagrantemente
ignorantes, ou profanos, ou formais, ou destituídos de poder
espiritual, ''precisam nascer de novo" (João 3:7) ou, então,
ficarão fora do reino de Deus. Assim, precisam ter mais a
argumentar em seu favor do que simplesmente a regeneração
batismal.
Bem, como podem ver, nisto todos concordam, isto é,
seja o que for que se receba no batismo, se os homens não
forem santificados precisam ser renovados por uma mudan-
ça total e poderosa ou não escaparão da condenação do
inferno. "Não vos enganeis, Deus não se deixa escarnecer." Quer
seja o seu batismo ou qualquer outra coisa que aspirem, digo-
-lhes, da parte de Deus, que se qualquer de vocês for uma
pessoa ímpia, ou escarnecedora, ou amante de más com-
panhias (Provérbios 13:20), em suma, se não for um cristão
santo, cuidadoso, abnegado, não poderá ser salvo (Hebreus
12:14; Mateus 15:14).
A conversão não se fundamenta na justiça moral. Esta

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justiça não ultrapassa à dos escribas e fariseus, portanto, não
pode conduzir-nos ao reino de Deus (Mateus 5:20). Antes
de sua conversão, Paulo era irrepreensível segundo a justiça
que há na lei (Filipenses 3:6). O fariseu poderia dizer: "Não
sou roubador, injusto, adúltero, etc." (Lucas 18: 11). Vocês
precisam de alguma coisa além disso para apresentar, ou seja
corno for que se justifiquem, Deus os condenará. Eu não.
condeno a moralidade; mas os aconselho a não descansarem
nela. A piedade inclui a moralidade, assim como o cristia-
nismo inclui a humanidade, e a graça inclui a razão; porém
não devemos confundir as coisas.
A conversão não consiste numa conformidade exte-
rior às normas de piedade. É certo que os homens podem
ter urna aparência de piedade, mas sem eficácia (2 Timóteo
3:5). Podem fazer longas orações (Mateus 23:14), jejuar
freqüentemente (Lucas 18:12), ouvir de bom grado a Pala-
vra de Deus (Marcos 6:20), e serem muito zelosos no serviço
de Deus - ainda que isso lhes seja caro e dispendioso (Isaías
1: 11) e, mesmo assim, não serem convertidos. Devem ter
alguma coisa a mais para argumentar em seu favor do
que simplesmente o fato de ir a urna igreja, dar esmolas, e
fazer uso da oração, para provar que são verdadeiramente
convertidos. Não há serviço exterior que um hipócrita não
possa fazer, até mesmo dar todos os seus bens para o sus-
tento dos pobres e o seu corpo para ser queimado (1 Coríntios
13:3).
A conversão não é apenas o aprisionamento da
corrupção mediante a educação, mediante as leis
humanas ou pela força da afliç·ão. É comum e fácil

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confundir-se educação com graça; mas se isto fosse suficiente,
que homem haveria melhor que Joás? Enquanto seu tio
Jeoiada viveu, ele se mostrou muito dedicado ao serviço de
Deus e tomou sobre si o encargo de reparar a casa do Senhor
(2 Reis 12:2, 7). Contudo neste caso não foi nada mais senão
o resultado de uma boa educação durante o tempo em que o
seu bom tutor viveu, pois, quando ele morreu Joás revelou
que era apenas um lobo enjaulado, logo depois caindo na
idolatria.
Em suma, a conversão não consiste em iluminação,
ou convicção, ou mudança superficial, ou reforma parcial.
O apóstata pode ser um homem iluminado (Hebreus 6:4), e
um Félix pode ficar espavorido sob condenação (Atos 24:25),
e um Herodes pode fazer muitas coisas (Marcos 6:20). Uma
coisa é alvoroçar o pecado somente por convicções; outra
coisa é crucificá-lo pela graça da conversão. Pelo fato de terem
a consciência atormentada pelos pecados, muitos têm em alta
conta o seu caso, confundindo miseravelmente a convicção
com a conversão. Entre estes inclui-se Caim, o qual poderia
ter passado por convertido, andando pelo mundo, para cima
e para baixo, como um homem enlouquecido, sob a fúria de
urna consciência culpada, até que ele a sufocou, dedicando-
-se à construção e aos negócios. Outros imaginam que, devido
haverem deixado seus caminhos devassos, as más compa-
nhias e alguns prazeres em particular, e havendo-se trans-
formado em pessoas sóbrias e civilizadas, são agora verda-
deiramente convertidos. Esquecem-se de que há uma enorme
diferença entre ser santificado e civilizado. Esquecem-se de
que muitos procuram entrar no reino dos céus- não estando

24
longe dele e chegando bem perto do cristianismo - e,
contudo, deixam finalmente de alcançá-lo. Enquanto são
dominados pela consciência, muitos oram, ouvem, lêem e
reprimem os pecados deleitáveis; mas tão logo que ela se
aquieta eles voltam a pecar novamente. Quem poderia ser
mais religioso que os judeus quando a mão do Senhor pe-
sava sobre eles? No entanto, antes que passasse a aflição, já
haviam se esquecido de Deus. Vocês podem ter abandonado
um pecado incômodo e haver escapado da torpe corrupção
do mundo, sem contudo haverem mudado a sua natureza
carnal.
Vocês podem pegar uma massa grosseira de chumbo e
moldá-la na mais graciosa forma de uma planta, depois na
forma de um animal, e então na forma e feições de um
homem, porém continuará sendo chumbo o tempo todo.
Assim, um homem pode passar por várias transformações -
da ignorância ao conhecimento, da irreverência à delicadeza,
e finalmente a uma aparência de religião - e durante esse
tempo todo ser carnal, irregenerado, e sua natureza per-
manecer a mesma.
Ouçam então, pecadores, ouçam para que vivam. Por
que se iludirem, fundamentando suas esperanças sobre a
areia? Sei que será tarefa difícil àquele que tentar arrancar
.. as suas esperanças infundadas. Só pode ser desagradável para
vocês, como também o é para mim. Faço isso como um
cirurgião que, com o coração pesado, tem que cortar o
membro gangrenado de seu querido amigo, porque é
necessário fazê-lo. Entretanto, entendam-me, amados, estou
apenas derrubando a casa arruinada (pois, caso contrário,

25
ela vai desmoronar-se rapidamente e soterrá-los sob suas
ruínas) para que eu possa construí-la bela, forte e firme para
sempre. A esperança do ímpio perecerá (Provérbios 11 :7).
Não seria melhor, ó pecador, deixar que a Palavra de Deus o
convença agora enquanto é tempo, deixando de lado suas
falsas e enganadoras esperanças, ao invés de permitir que a
morte abra seus olhos tarde demais e você se ache no inferno
antes que possa arrepender-se? Eu seria um pastor falso e
infiel se não advertisse a vocês que se não tiverem edificado
suas esperanças sobre terreno melhor que aqueles já
mencionados, então ainda estão em pecado. Deixem falar a
consciência. O que querem apresentar em sua defesa? Seria
que usam a vestimenta de Cristo; que ostentam o nome de
Cristo, que são membros da Igreja visível; que têm conhe-
cimento dos princípios religiosos; que são civilizados; que
cumprem as tarefas religiosas; que são justos em seu
procedimento; que têm a consciência atormentada pelos
pecados? Declaro-lhes, da parte do Senhor, que tais argu-
mentos jamais serão aceitos no tribunal de Deus. Tudo isso,
embora seja bom em si mesmo, não vai provar que são
convertidos, e, portanto, não será suficiente para sua salvação.
Oh, atentem para isso e tomem a decisão de voltarem rápida
e completamente. Examinem seus corações, não descansem
até que Deus tenha completado a obra em vocês, pois devem .
ser pessoas diferentes ou estarão perdidos.
Ora, se essas pessoas não são convertidas, o que dizer
dos profanos? Estes, talvez, dificilmente leiam ou escutem
este discurso, mas se há algum deles que o esteja lendo ou
ouvindo, precisa saber - da parte do Senhor que o fez - que

26
está longe do reino de Deus. Se é possível que aquele que
faz companhia às virgens prudentes ainda pode ficar de fora,
não será, então, muito mais provável que aquele que faz
companhia às loucas seja destruído? Seria possível alguém
ser sincero em sua conduta e não ser justificado diante de
Deus? O que será de você, então, ó homem miserável, cuja
consciência lhe diz que é falso nas suas transações e na sua
palavra? Se os homens podem ser iluminados e levados à
prática externa dos deveres sagrados, e ainda assim se
perderem por não serem convertidos, o que será de vocês, ó
famílias miseráveis, que vivem sem Deus neste mundo? O
que será de vocês, miseráveis pecadores, em cujos pensa-
mentos Deus raramente está- vocês que são tão ignorantes
que não podem orar, ou tão descuidados que nem se
preocupam com isso? Oh, arrependam-se e sejam conver-
tidos, afastando-se dos seus pecados pela justificação.
Refugiem-se em Cristo, a fim de obterem a graça perdoadora
e renovadora. Entreguem-se a Ele, para andarem com Ele
em santidade, caso contrário jamais verão a Deus. Oh, se
dessem atenção aos conselhos de Deus! Em nome dEle,
admoesto-lhes mais uma vez. Atentem para a minha repre-
ensão. Abandonem a insensatez e vivam. Sejam sóbrios,
justos e piedosos. Lavem as mãos, pecadores; purifiquem
os seus corações, ó vocês de duplo ânimo. Cessem de fazer o
mal, aprendam a fazer o bem (Provérbios 1:23 e 9:6; Tito
2:12; Tiago 4:8; Isaías 1:16-17). Mas se continuarem como
estão, morrerão.

27
2
A Natureza da Conversão
Não tenho coragem de deixá-los com os olhos semi-
cerrados, à semelhança daquele que viu "os homens corno se
fossem árvores ambulantes". A Palavra é proveitosa tanto
para ensinar corno para redargüir. E, portanto, havendo
conduzido vocês através das rochas e declives de erros tão
perigosos, gostaria de guiá-los, finalmente, ao porto da
verdade.
A conversão então, em resumo, consiste na mudança
completa do coração e da vida. Vou descrevê-la rapidamente
em sua natureza e em suas causas.

1. O autor da conversão é o Espírito de Deus e, portanto,


ela é chamada "a santificação do Espírito" (2 Tessalonicenses
2: 13) e a "renovação pelo Espírito Santo" (Tito 3:5). Isto não
exclui as outras pessoas da Trindade, pois o apóstolo nos en-
sina que devemos bendizer o Pai de nosso Senhor Jesus
Cristo, que "nos gerou de novo para uma viva esperança" (1
Pedro 1:3). E Cristo é mencionado corno aquele que dá "a
Israel o arrependirnento"(Atos 5:31); e é chamado de "Pai da
eternidade" (Isaías 9:6) e nós somos Sua semente e "os filhos
que Deus (Lhe) deu" (Hebreus 2: 13). Contudo, esta obra é

28
atribuída principalmente ao Espírito Santo, e por isso é dito
que somos "nascidos do Espírito"(João 3:5-6).
Portanto, a conversão é algo que supera o poder humano.
Somos "nascidos, não do sangue, nem da vontade da carne, nem
da vontade do varão, mas de Deus" (João 1: 13). Vocês jamais
devem pensar que podem converter-se a si mesmos. Se ti-
verem de ser convertidos para a salvação, abandonem qual-
quer esperança de fazê-lo segundo a sua própria força. É uma
ressurreição dos mortos (Efésios 2: 1), uma nova criação
(Gálatas 6: 15; Efésios 2: 10), uma obra de absoluta onipotência
(Efésios 1: 19). Isto tudo não estaria fora do alcance humano?
Se não têm nada mais do que aquilo que receberam na ocasião
do primeiro nascimento - uma boa natureza, um tempe-
ramento humilde e casto, etc. - estão longe da verdadeira
conver.são. Trata-se de uma obra sobrenatural.

2. A causa eficaz da conversão é tanto interna quanto


externa.
(1) A causa interna é somente a liv-re graça. "Não pelas
obras de justiça que houvéssemos feito, mas segundo a sua
misericórdia, nos salvou ... " e... "(mediante) renovação pelo Espírito
Santo" (Tito 3: 5). "Segundo a sua vontade, ele nos gerou ... "
(Tiago 1: 18). "Somos escolhidos e chamados para a santificação,
e não por causa dela" (Efésios 1:4).
Deus não encontra nada no homem para comover Seu
coração, mas encontra o suficiente para nausear o Seu
estômago; Ele encontra o bastante para provocar Sua
repugnância, porém não encontra nada para despertar Seu
amor. Olhe para si mesmo, crente! Considere a respeito da

29
sua natureza imunda, seu lixo imundo, o lodaçal que você
amava (2 Pedro, capítulo 2). Contemple o seu lodo e a sua
corrupção. Suas próprias roupas não o abominam? (Jó 9:31).
Como, então, a santidade e a pureza poderiam amá-lo?
Assombrem-se, ó céus, diante disso; mova-se, ó terra! Quem
não precisa clamar "graça! graça!"? (Zacarias 4:7). Ouçam e
envergonhem-se, ó filhos do Altíssimo. Ó homens ingratos,
a livre graça já não está mais em seus lábios, em suas mentes;
já não é mais adorada admirada e recomendada por indiví-
duos como vocês! Pensar-se-ia que vocês não deveriam fazer
outra coisa senão louvar e admirar a Deus onde quer que
estivessem. Como podem se esquecer de tal graça ou
desprezá-la com uma menção ligeira e formal? O que mais
senão a livre graça poderia levar Deus a amá-los, a menos
que a inimizade pudesse fazê-lo, a menos que a deformidade
pudesse fazê-lo? Com que sentimento Pedro levanta as suas
mãos e diz: "Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus
Cristo, que, segundo sua grande misericórdia, nos gerou de novo"
(1 Pedro 1:3). Com que sentimento Paulo magnifica a livre
misericórdia de Deus: "Mas Deus, que é riquíssimo em
misericórdia, pelo seu muito amor que nos amou ... nos vivificou
juntamente com Cristo (pela graça sois salvos)"(Efésios 2:4-5).

(2) A causa externa é o mérito e a intercessão do bendito


Senhor Jesus Cristo, Ele obteve dons para os rebeldes (Salmo
68: 18) e é através dEle que Deus opera em nós aquilo que é
agradável aos Seus olhos (Hebreus 13:21). Por meio dEle
todas as bênçãos espirituais nos são outorgadas nos lugares
celestiais (Efésios 1: 3). Ele intercede pelos eleitos que ainda

30
não creram (João 17:20). Cada convertido é fruto de Sua
agonia. Jamais nasceu uma criança no mundo com fardo
semelhante àquele que Cristo suportou por nós. Todas as
dores que Ele sofreu na cruz foram as dores do nosso
nascimento espiritual. Ele foi feito santificação para nós (1
Coríntios 1:30). Ele santificou-Se a Si mesmo, isto é,
separou-Se como um sacrifício, para que nós pudéssemos
ser santificados (João 17: 19). Somos santificados através da
oferta de Seu corpo de uma vez por todas (Hebreus 10: 10).
Nada mais, então, a não ser o mérito e a intercessão de
Cristo, pode prevalecer diante de Deus para outorgar-nos a
graça da conversão. Se você é uma nova criatura, já sabe a
que deve isso: às agonias e orações de Cristo. O potrinho
não busca o bebedouro, nem a criança o seio materno, com
mais naturalidade do que o crente o Senhor Jesus Cristo. E
aonde mais você deve ir? Se há no mundo alguém que possa
fazer por seu coração aquilo que Cristo pode, então que o
faça. Acaso satanás o reivindica? O munqo o atrai? O pecado
lhe faz a corte? Com que direito? Porventura foram crucifi-
cados por você? Ó cristão, ame e sirva o Senhor enquanto
você é um ser vivente.

3. O instrumento da conversão é pessoal e real.


(1) O instrumento pessoal é o ministério. " ... porque eu
pelo evangelho vos gerei em Jesus Cristo" (1 Coríntios 4: 15). Os
ministros de Cristo são aqueles que estão sendo enviados
para abrirem os olhos dos homens e os conduzirem a Deus
(Atos 26: 18). Oh, mundo ingrato! Você mal sabe o que está
fazendo, quando persegue os mensageiros do Senhor. Estes

31
são os que, submetidos a Cristo, têm a tarefa de salvá-lo. A
quem você censurou ou contra quem blasfemou? (Isaías
37:23). Oh, mundo tolo e insensato! Os ministros são os
servos do Deus Altíssimo que lhe mostram o caminho da
salvação (Atos 16: 17), e você lhes agradece dessa maneira?
(Deuteronômio 37:6). Oh, filhos da ingratidão, de quem
escarnecem? Os ministros são os instrumentos que Deus
usa para converter e salvar os pecadores; será que vocês
vituperam os seus médicos ou lançam os seus pilotos ao mar?
"Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem."

(2) O instrumento real é a palavra. Somos gerados pela


Palavra da verdade. É ela que ilumina os olhos, converte a
alma ( Salmo 19: 7-8), que nos torna sábios para a salvação (2
Timóteo 3: 15). Ela é a semente incorruptível, pela qual
somos nascidos de novo (1 Pedro 1:23). Se somos lavados, é
pela Palavra (Efésios 5:26). Se somos santificados, é através
da verdade Goão 17: 17). Isso gera fé, e nos regenera (Romanos
10:17; Tiago 1:18).
Oh irmãos, santos, como vocês devem amar a Palavra,
pois foi através dela que foram convertidos! Vocês que têm
sentido o seu poder renovador, devem dar muito valor a ela
enquanto viverem; ser sempre agradecidos pela existência
dela. Devem atá-la ao pescoço, escrevê-la sobre as mãos,
guardá-la no coração. Ao andarem, permitam que ela os
conduza; ao dormirem, permitam que ela os guarde; ao
acordarem, permitam que ela lhes fale (Provérbios 6:21-22).
Digam com o salmista: "Nunca me esquecerei dos teus preceitos,
pois por eles me tens vivificado" (Salmo 119:93). Vocês, que

32
não são convertidos, leiam a Palavra com diligência; reúnam-
-se onde ela é poderosamente pregada; orem pela vinda do
Espírito na Palavra. Levantem-se de seus joelhos para
ouvirem o sermão, e, após o sermão, voltem aos seus joelhos.
O sermão não prosperará se não for banhado com orações e
lágrimas e coberto pela meditação.

4. A causa final ou o fim da conversão é a salvação do ho-


mem e a glória de Deus. Somos escolhidos para a salvação,
através da santificação (2 Tessalonicenses 2: 13), chamados
para que sejamos glorificados (Romanos 8:30), mas,
especialmente, para que Deus seja glorificado (Isaías 60:21),
para que anunciemos Seus louvores (2 Pedro 2 :9), e
frutifiquemos em boas obras (Colossenses 1: 10).
Ó cristão, não se esqueça da finalidade de seu chamado!
Deixe a sua luz brilhar, a sua lâmpada queimar, permita que
seus frutos sejam bons, abundantes e sazonados (Salmo 1: 3).
Que os seus intentos coincidam com os de Deus, para que
Ele seja engrandecido em você (Filipenses 1:20).

5. O assunto da conversão é o pecador eleito, e isso em


todas as suas partes e poderes, membros e mente. Aos que
Deus predestinou, a esses, e somente esses, também chamou
(Romanos 8:30). Ninguém vem a Cristo por chamado
próprio nem vai a Ele porque crê; somente o Seu rebanho,
aqueles que o Pai Lhe deu (João 6:37,44). O chamado eficaz
coincide com a eleição eterna (2 Pedro 1: 1O).
Você está começando pelo lado errado se argumentar,
em primeiro lugar, a respeito de sua eleição. Prove sua

33
conversão, e daí jamais duvide de sua eleição. Se você ainda
não pode prová-la, inicie uma volta veraz e completa.
Quaisquer que sejam os propósitos de Deus, os quais são
secretos, estou certo de que Suas promessas são fiéis. Com
que desespero os rebeldes argumentam: "Se eu sou eleito,
serei salvo; não importa o que eu faça. Caso contrário, estarei
perdido, faça o que fizer". Pecador perverso, você começa
onde deveria terminar. Acaso a Palavra não está diante de
você? O que diz ela? ':Arrependei-vos, pois, e convertei-vos,
para que sejam apagados os vossos pecados ... " " ...se mortificardes
as obras do corpo, vivereis." "Crê ... e serás salvo ... " (Atos 3: 19;
Romanos 8: 13; Atos 16:31). O que pode ser mais claro? Não
fique discutindo sobre a eleição, mas disponha-se a arre-
pender-se e a crer. Clame a Deus pela graça da conversão.
As coisas reveladas lhe pertencem; ocupe-se com elas. Como
já bem disse alguém: aqueles que não se alimentam da carne
da Palavra ficarão sufocados com os ossos. Quaisquer que
sejam os propósitos de Deus, estou certo de que Suas pro-
messas são verdadeiras. Quaisquer que sejam os decretos
do céu, estou certo de que se eu me arrepender e crer, serei
salvo; e se não me arrepender, serei condenado. Isso não
seria um chão seguro para você? Ou você ainda quer se
perder?
Mais particularmente, esta mudança de conversão
estende-se ao homem na sua totalidade. Uma pessoa carnal
pode ter alguns fragmentos de boa moralidade, mas jamais
será completamente boa. A conversão não é o simples reparo
de um velho edifício; porém ela o derruba por completo e
edifica uma nova estrutura. Não se trata de um remendo de

34
completamente, cria em mim, ó Deus, um coração puro".
Ele se vê completamente imundo, corrompido tanto na raiz
como nos galhos (Salmo 14: 3; Mateus 7: 17-18). Ele escreve
"impuro" sobre todas as suas partes, poderes e feitos (Isaías
64:6; Romanos 7: 18). Descobre os cantos imundos que jamais
notou e vê a blasfêmia, o roubo, o assassinato e o adultério
que há em seu coração, os quais ele antes ignorava. Até então,
não via atração nem formosura em Cristo, nenhuma beleza
para que pudesse desejá-10; mas agora encontrou o "tesouro
escondido", e venderá tudo para adquirir este campo. Cristo
é a "pérola" que ele procurava.
Agora, de acordo com esta nova luz, o homem possui
outra mente, outro julgamento, diferente daquilo que ele
possuía anteriormente. Agora, Deus está inteiramente com
ele; não há ninguém, no céu nem na terra como Ele; na
verdade, ele O prefere a tudo que há neste mundo. Sua
graça é a sua vida, a luz de Seu rosto é mais que o trigo,
o vinho e o óleo - os bens que ele anteriormente buscara e
sobre os quais pusera o seu coração (Salmo 4:6-7). Um
hipócrita pode submeter-se a um consenso geral de que
Deus é o bem supremo; de fato, pelo menos alguns dos mais
sábios pagãos têm descoberto isso. Mas nenhum hipócrita
vai tão longe, a ponto de olhar para Deus como o mais
desejável e conveniente bem para ele, a cujo bem pode se
sujeitar. Esta é a linguagem do convertido: "A minha porção
é o Senhor, diz a minha alma; a quem tenho eu no céu senão a ti?
E na terra não há quem eu deseje além de ti"(Lamentações 3:24;
Salmo 73:25-26).
A conversão modifica a inclinação da vontade tanto

36
quanto aos meios como quanto ao fim. As intenções da
vontade são alteradas. Agora o homem tem novos alvos e
projetos. Agora ele almeja a Deus acima de tudo, e não deseja
nem planeja coisa alguma neste mundo, senão que Cristo
seja engrandecido nele. Considera-se mais feliz assim do
que com tudo o que a terra pudesse lhe oferecer, desejando
apenas ser útil a Cristo e glorificá-10. O alvo a que ele
aspira é este: que o nome de Jesus possa ser engrandecido
no mundo.
Leitor, você lê isto sem se perguntar se é assim que
ocorre com você? Faça uma pausa e examine-se a si mesmo.
A escolha também é modificada. Escolhe Deus como
sua bem-aventurança; e Cristo e a santidade como meios para
conduzi-lo a Deus. Escolhe Jesus como seu Senhor. Ele não
é meramente forçado pela tempestade em direção a Cristo
nem se apossa de Cristo por simples necessidade, mas ele o
faz espontaneamente. Sua escolha não é feita sob terror, como
no caso de uma consciência aterrorizada ou de um pecador
moribundo que aparentemente faria qualquer coisa por
Cristo, no entanto só O aceita para não ir para o inferno.
Resolve, deliberadamente, que Cristo é a melhor escolha e
O prefere a todos os bens deste mundo, ainda que pudesse
desfrutá-los enquanto vivesse (Filipenses 1:23). Outrossim,
abraça a santidade como sua vereda; não se submete a ela
por necessidade, mas porque tem prazer nela e a ama. " ...pois
escolhi os teus preceitos" (Salmo 119: 173). Ele toma os teste-
munhos de Deus - não como um jugo, porém como uma
herança; sim, uma herança eterna. Ele os considera não
como uma escravidão, mas como uma felicidade; não são

37
suas travas, mas são seus tônicos. (1 João 5:3; Salmo 119: 14,
16, 47). Ele não apenas suporta, mas toma o jugo de Cristo.
Ele não aceita a santidade como o estômago aceita o re-
médio amargo (que o homem prefere tomar para escapar à
morte), mas como homem faminto aceita a comida gostosa.
Não há tempo que passe tão docemente para ele, quando
só, como o tempo que gasta nos exercícios da santidade. São
seu alimento e elemento, o desejo de seus olhos e a alegria
de seu coração.
Pergunte à sua consciência se você é esse homem. Oh,
que homem feliz é você, se for este o caso! Todavia, certifique-
-se de ser meticuloso e imparcial nesse auto-exame.
A conversão muda a inclinação dos sentimentos. Estes
correm num novo canal. O Jordão agora tem o seu curso re-
cuado, e as águas correm ao contrário do curso natural. Cristo
é a esperança do cristão. Ele é o seu prêmio. Aqui está o seu
olho; aqui está o seu coração - e feliz está por lançar tudo ao
mar, tal como faz o mercador na tempestade, quando está
prestes a perecer, para que possa preservar sua pedra preciosa.
Sua principal ambição não é o ouro, e sim a graça. Ele
anseia por ela, procura-a como à prata e busca-a como um
tesouro escondido. Prefere a graça à grandeza. Prefere ser o
mais santo dos homens sobre a terra a ser o mais culto, ou o
mais famoso, ou o mais próspero. Enquanto era carnal, dizia:
"Oh, se eu pudesse ser considerado em grande estima, estar
rolando em riquezas e. nadando em prazeres; se minhas
dívidas fossem pagas, nada faltando a mim e à minha família
- então eu seria um homem feliz!" Mas agora a linguagem é
outra: "Oh", diz o convertido, "se eu pudesse subjugar os

38
meus pecados, se tivesse a graça numa tal medida e a
comunhão com Deus - ainda que fosse pobre e desprezado,
não me importaria, mas me consideraria um homem
abençoado". Leitor, seria esta a linguagem de sua alma?
Suas alegrias foram mudadas. Regozija-se no caminho
dos testemunhos de Deus, tanto quanto em todas as riquezas.
Deleita-se na lei do Senhor, na qual antes ele tinha pouco
interesse. Não tem satisfação que supere os pensamentos de
Cristo, o gozo de Sua companhia e a prosperidade do Seu
povo.
Suas preocupações foram modificadas. Antigamente
estava à mercê do mundo e qualquer fragmento de tempo
livre era suficiente para sua alma. Agora, seu clamor é: "que
é necessário que eu faça para me salvar?" (Atos 16:30). Sua
grande preocupação é ter certeza da salvação de sua alma.
Oh, como ele bendiria alguém que pudesse tirar-lhe todas as
dúvidas a esse respeito!
Seus temores já não são tanto sofrer como pecar. Outrora,
ele não temia nada senão a perda de sua posição ou sua
reputação; nada lhe parecia tão terrível quanto a dor, ou a
pobreza, ou a desgraça. Agora, isto nada representa para ele
em comparação com a desonra ou a insatisfação de Deus.
Com que cuidado ele anda, para não cair numa cilada! Olha
para todos os lados; tem seu olhar sobre o seu coração e está
constantemente vigiando para não cometer pecados. Pensar
em perder o favor de Deus quebranta o seu coração; isto o
aterroriza como sua maior desgraça. Nenhum pensamento
o machuca tanto como o da possibilidade de ficar separado
de Cristo.

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Seu amor tem um novo curso. "Meu amor foi crucifi-
cado", diz lgnácio, referindo-se a Cristo. "Tal é o meu amado",
exclama a esposa (Cantares de Salomão 5: 16). Quão
freqüentemente Agostinho derrama seu amor sobre Cristo!
Não consegue encontrar palavras suficientemente doces.
"Permite que eu Te Jeja, ó Luz dos meus olhos. Vem, ó
Alegria do meu espírito; permite que eu Te contemple, ó
Regozijo do meu coração. Permite que eu Te ame, ó Vida da
minha alma. Manifeste-Se para mim, ó meu grande prazer,
meu doce Conforto, ó meu Deus, minha vida, e toda a glória
da minha alma. Permite que eu Te encontre, ó Desejo do
meu coração; permite que eu Te toque, ó Amor da minha
alma. Permite que eu Te abrace, ó Noivo Celestial. Permite
que eu Te possua."
Suas tristezas têm, agora, uma nova saída (2 Coríntios
7 :9-1 O). A visão de seus pecados, a visão de Cristo crucificado
- coisas que dificilmente o comoviam-quão profundamente
tocam seu coração agora!
Ferve seu ódio e queima sua ira contra o pecado. Não
tem paciência consigo mesmo. Acusa a si mesmo de tolo, de
animal e considera qualquer qualificação boa demais para
si próprio, toda vez que sua indignação se levanta contra
o pecado (Salmo 73:22; Provérbios 30:2). Outrora, poderia
espojar-se no pecado com muito prazer; mas agora abomina
o pensamento de voltar a ele tanto quanto abomina o pensa-
mento de ajuntar o vômito mais nojento.
Comungue com seu próprio coração, atente para o curso
geral de seus sentimentos e verifique se eles são direciona-
dos a Deus, em Cristo, acima de todas as outras preocupações.

40
Na verdade, mudanças súbitas e fortes de sentimentos são
próprias dos hipócritas, especialmente daqueles que têm
temperamento colérico. Por outro lado, os santificados não
sofrem, geralmente, uma agitação consciente dos senti-
mentos, tendo o temperamento mais calmo, frio e sóbrio. A
coisa principal é descobrir se raciocínio e vontade estão
firmemente determinados a favor de Deus, acima de todas
as outras coisas - quer reais ou aparentes. Se de fato é assim,
e se os sentimentos seguem sinceramente sua escolha e
conduta, embora não tão forte e profundamente como seria
desejável, então não há dúvida de que a mudança é salvadora.

(2) Os membros ,
Estes, que antes eram instrumentos do pecado, agora se
tornaram instrumentos santificados no templo vivo de Cristo.
Aquele que antes desonrava o seu corpo, agora possui o seu
vaso em santificação e honra, em temperança, em castidade,
em sobriedade, e o dedica ao Senhor.
O olho, que antes era irrequieto, dissoluto, arrogante,
cobiçoso, é agora empregado, como o de Maria, em chorar
pelos seus pecados, em contemplar a Deus através de Suas
obras, em ler a Sua Palavra ou em procurar motivos de
misericórdia e oportunidades para o Seu serviço.
O ouvido, que antes estava aberto à voz de satanás, e que
só se deleitava com coisas imundas ou conversas vãs e com a
risada dos tolos, encontra-se agora conjugado com a casa de
Cristo e aberto aos Seus discípulos. Ele diz: «Fala, Senhor,
porque o teu servo ouve". Ele espera por Suas palavras como
pela chuva e tem mais prazer nelas do que no alimento

41
(Jó 23: 12), mais do que no mel e do que no licor dos favos
(Salmo 19: 10).
A cabeça, que estava cheia de propósitos mundanos, está
agora cheia de outros assuntos e aplica-se ao estudo da
vontade de Deus; e o homem usa sua cabeça não tanto para
obter lucro, mas para cumprir o seu dever. Os pensamentos
e reocupações que enchem sua cabeça são, principalmente,
como poderá agradar a Deus e fugir do pecado.
Seu coração, que era um poço de imundícia, tornou-se
agora um altar de incenso onde o fogo do amor divino é
mantido sempre aceso, do qual o sacrifício diário de oração
e louvor, do doce aroma de desejos santos, exaltações e
intercessões se elevam continuamente.
A boca tornou-se uma fonte de vida; sua língua é como
prata escolhida e seus lábios alimentam a muitos. O sal
temperou seu discurso e tirou a corrupção (Colossenses 4:6)
e limpou o homem das conversas imundas, frívolas,
jactanciosas, injuriosas, mentirosas, blasfemadoras,
caluniadoras que outrora saíam como relâmpagos do inferno
que havia em seu coração (Tiago 3:6). A garganta, que era
um sepulcro aberto, agora exala o doce hálito da oração e
do discurso santo e o homem fala uma outra língua, na
linguagem da Canaã celestial, e jamais se sente tão bem como
quando fala de Deus, de Cristo e dos assuntos referentes
ao outro mundo. Sua boca produz sabedoria; sua língua
se tornou a trombeta prateada de louvor ao seu Criador, é·
sua glória, o melhor membro que ele tem.
Nessas coisas, contudo, você encontrará o hipócrita triste-
mente deficiente. Ele fala, talvez, como um anjo, mas tem

42
um olhar cobiçoso ou o lucro da injustiça em sua mão. Sua
mão é branca, porém o seu coração está cheio de imundícia
(Mateus 23:27), cheio de cobiças não dominadas, um forno
cheio de concupiscência, uma fábrica de orgulho - a sede da
malícia. Talvez, como a estátua de Nabucodonosor, ele tenha
uma cabeça de ouro - uma grande quantidade de conhe-
cimento - mas ele tem pés de barro; suas afeições são
mundanas, ocupa-se de coisas terrenas, seu caminho e andar
são sensuais e carnais. A obra nele não é salvadora.

(3) A vida e a prática


O novo homem segue um novo curso (Efésios 2:2-3).
Sua conversação é celestial (Filipenses 3:20). Logo que
Cristo o chama, através de Sua graça eficaz, imediatamente
ele se torna um seguidor. Após lhe dar um novo coração e
escrever Sua lei em sua mente, daí em diante o homem
anda nos Seus estatutos e guarda os Seus mandamentos.
Embora o pecado possa habitar nele - um hóspede
verdadeiramente enfadonho e indesejável - já não tem
domínio sobre ele. Tem agora os frutos da santidade e ainda
que cometa muitos erros, a lei e a vida de Jesus são os seus
padrões e nutrem nele um sincero respeito por todos os
mandamentos de Deus. Ele se sensibiliza ante os mínimos
pecados e os menores deveres. Suas próprias enfermidades
- as quais ele não pode evitar, mesmo se quisesse - são o
peso de sua alma e são como ciscos nos olhos de alguém, que
apesar de pequenos o perturbam bastante. (Ó leitor, será que
você lê isso e nunca se detém para examinar-se a si mesmo?)
O verdadeiro convertido não apresenta um comportamento

43
na igreja e outro em casa. Não é um santo quando está de
joelhos e um impostor no seu trabalho. Ele não vai dar o
dízimo da hortelã e do cominho e negligenciar a miseri-
córdia e o julgamento ou os aspectos mais importantes da
lei. Ele não aspira à piedade, negligenciando a moralidade.
Mas deixa todos os pecados e guarda todos os estatutos de
Deus; embora não o faça com perfeição (a não ser naquilo
que se refere ao desejo e ao esforço), contudo, o faz com
sinceridade, não se permitindo infringir nenhum deles.
Agora ele se deleita na Palavra, dedica-se à oração, abre sua
mão e sua alma aos famintos. Rompe com o pecado prati-
cando a justiça, e afasta suas iniqüidades demonstrando
misericórdia para com os pobres (Daniel 4:27). Tem uma
boa consciência, desejando em tudo viver honestamente
(Hebreus 13:18), evitando ofender a Deus e aos homens.
Aqui, novamente, você encontrará as deficiências de
muitos que se consideram bons cristãos. São parciais na lei
(Malaquias 2:9) e cumprem os deveres insignificantes e fá-
ceis da religião, mas não fazem o trabalho completo. São
como um bolo meio assado e meio cru. Talvez os ache
corretos nas suas palavras, pontuais em seus feitos, porém
não se exercitam na santidade; não examinam a si mesmos e
não governam seus corações. Talvez você os veja regularmente
na igreja; mas acompanhe-os ao convívio familiar e ali vai
constatar pouco mais que uma mente mundana; ou, se
cumprirem os deveres familiares, acompanhe-os aos seus
quartos e lá verificará que suas almas são mal cuidadas.
Talvez tenham a aparência de religiosos, mas não reprimem
suas línguas, e, portanto, toda a sua religião é vã (Tiago 1:26).

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Talvez pratiquem a oração íntima e a familiar, contudo siga-
-os até o balcão de suas lojas e vai encontrar neles o hábito de
mentir ou alguma maneira elegante de enganar. Portanto, o
hipócrita não é uma pessoa obediente.

6. As coisas que deixamos ao sermos convertidos são:


pecado, satanás, o mundo e nossa justiça própria.
(1) Deixamos o pecado. Quando alguém é convertido,
passa a viver em eterna inimizade com o pecado; sim, com
todo o pecado, mas, acima de tudo, com seus próprios pecados
e, especialmente, com seus pecados mais íntimos. O pecado
passa a ser objeto de sua indignação. Seu pecado aumenta
suas tristezas. É o pecado que o transpassa e o fere; ele o sen-
te como um espinho a penetrar-lhe o lado, como uma
ferroada no olho. Ele geme e luta com o pecado e clama -
não de modo formal, mas sinceramente: "Miserável homem
que eu sou!" Nenhum outro peso o torna tão impaciente como
o peso do seu pecado. Se Deus lhe concedesse o direito de
escolher, escolheria qualquer outra aflição para se ver livre
do pecado; sente-o como uma pedra cortante no sapato,
picando e ferindo seu pé à medida que anda.
Antes de sua conversão, o cristão tinha pensamentos
levianos a respeito do pecado. Ele o acariciava em seu seio,
como Urias acariciava a sua cordeirinha; ele o nutria e o
mesmo crescia juntamente consigo, comendo como se fosse
de sua própria carne, e bebendo do seu próprio copo. Ele o
abrigava em seu seio, como a um filho. No entanto, quando
Deus abriu seus olhos através da conversão, atirou o pecado
para longe, com repugnância, da mesma forma que faria com

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um sapo asqueroso, que, na escuridão, houvesse apertado
em seu peito, imaginando que fosse um belo e inofensivo
pássaro. Quando um homem é convertido torna-se profun-
damente convencido não só do perigo, mas também da
corrupção do pecado; e quão fervoroso ele se torna para com
Deus, a fim de ser purificado! Ele sente aversão por si mesmo
por causa de seus pecados. Corre para Cristo e lança-se na
fonte aberta por Ele para o pecado e a impureza. Se ele cair,
que agitação haverá ali para que fique limpo novamente!
Ele não terá descanso enquanto não se refugiar na Palavra,
lavando-se, esfregando-se, enxaguando-se na fonte infinita e
esforçando-se para purificar-se de toda a imundícia da carne
e do espírito.
O verdadeiro convertido está sinceramente engajado
contra o pecado. Luta com ele, combate contra ele; é, tam-
bém, freqüentemente derrotado, porém enquanto houver
vida em seu corpo, jamais abandonará a causa nem deporá
as armas. Não vai se reconciliar com o pecado, não vai dar
abrigo a ele. Pode esquecer-se de seus outros inimigos,
pode apiedar-se deles e orar por eles; mas com o pecado é
implacável, está empenhado em exterminá-lo. Ele o per-
segue como se o fizesse em favor de uma vida preciosa;
não terá misericórdia do seu olho nem poupará sua mão,
ainda que seja a mão direita ou o olho direito. Pode ser um
pecado proveitoso, muito agradável à sua natureza ou
importante para sustentar a estima de seus amigos
mundanos; ainda assim, preferirá lançar seu lucro na sarjeta,
ver seu crédito ruir ou a flor de seu prazer murchar em
sua mão, a permitir--se caminhar qualquer trilha conhecida

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de pecado, Não será indulgente, não será tolerante. Ele se
lança contra o pecado onde quer que o encontre, e o
desaprova com esta mal acolhida saudação: "Ó meu inimigo,
eu o achei?!"
Leitor, você tem posto sua consciência em ação enquan-
to está analisando esta argumentação? Tem ponderado estas
coisas em seu coração? Tem examinado o livro intimamente,
para ver se estas coisas são assim? Caso contrário, leia-o nova-
mente e faça sua consciência falar se de fato é ou não é assim
com você.
Será que você tem crucificado sua carne com suas paixões
e concupiscências? Você não apenas tem confessado, mas
também se afastado dos seus pecados- todo pecado em seus
ardentes desejos - e a prática regular de cada pecado delibe-
rado e obstinado de sua vida? Se não tiver feito isso, você
ainda não é convertido. À medida que lê, acaso a consciência
não se lança na sua face e lhe diz que você vive de forma
mentirosa em seu proveito próprio? Que você está usando o
engano no seu chamado? Que há, de certa maneira, um
capricho secreto no qual você está vivendo? Então, deixe de
enganar-se a si mesmo. "Você vive no fel da amargura e na
prisão do pecado."
Porventura sua língua desenfreada, seu vício de apetite,
suas más companhias, sua negligência na oração, na leitura
e no ouvir da Palavra de Deus não testemunham agora con-
tra você dizendo: "Somos suas obras e o seguiremos"? Ou,
se não o acertei em cheio, o conselheiro interior não lhe diz
que há tais e tais maneiras que você sabe serem más e que,
contudo, por causa de algum aspecto carnal, acaba tolerando

47
em si mesmo? Se este for o seu caso, então não está
regenerado até hoje, e tem que ser transformado ou
condenado.

(2) Nós nos afastamos de satanás. A conversão amarra


o homem forte, estraga sua armadura, lança fora os seus bens,
faz com que os homens se voltem do poder de satanás para
Deus. Antes, tão logo que o diabo levantasse o seu dedo
para chamá-los à sua companhia pecaminosa, jogos pecami-
nosos e prazeres imundos, eles o seguiam imediatamente
"como um boi vai para o matadouro ou como um louco vai para o
castigo das prisões, como o pássaro que se apressa para o laço e
não sabe que está ali contra a sua vida" (Provérbios 7:22-23).
Logo que satanás os mandasse mentir, imediatamente eles
estariam com a língua pronta para proferir mentiras; tão
logo o diabo oferecesse um objeto lascivo, já já seriam
aguilhoados pela lascívia. Se o diabo lhes dissesse: "Deixem
esses deveres familiares", estejam certos de que tais deveres
raramente seriam cumpridos em suas casas. Se ele lhes
dissesse: "Larguem dessa rigidez, dessa precisão", eles
ficariam bastante longe delas. Se ele lhes dissesse: "Não há
necessidade dessas devoções domésticas", dia a dia iriam
deixando de fazê-las. Mas após sua conversão o cristão serve
a um outro Mestre e toma um rumo bem diferente; ele anda
segundo os mandamentos de Cristo. Satanás pode, de vez
em quando, apanhá-lo em sua armadilha, porém ele já não
será mais um cativo voluntário. Está vigilante contra os laços
e engodos do arquiinimigo, e procura cientificar-se dos seus
ardis. Torna-se bastante desconfiado de suas tramas e muito

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zeloso daquilo que lhe acontece, caso satanás tenha algum
propósito a seu respeito. Luta contra os principados e
poderes; trata com o mensageiro de satanás do mesmo modo
que os homens tratam com o mensageiro da morte. Fica
atento aos seus deveres e mantém seus olhos sobre o grande
inimigo, para que o mesmo não leve vantagem.

(3) Nós nos afastamos do mundo. Antes de ter uma


fé verdadeira, o homem é dominado pelo mundo. Inclina-
-se a Mamom ou idolatra sua reputação; ou ama os prazeres
mais do que a Deus. Aqui está a raiz da miséria do homem
na Queda. Ele se volve à criatura e lhe dá a estima, confiança
e afeição que são devidas somente a Deus.
Ó homem miserável, que monstro deformado o pecado
fez de você! Deus o fez "um pouco menor do que os anjos"; o
pecado o fez um pouco acima dos demônios, um monstro
que tem a cabeça e o coração no lugar dos pés, e estes,
esperneando contra o céu - tudo fora de lugar. O mundo,
que foi formado para servir você, está prestes a dominá-lo -
a meretriz enganosa o enfeitiçou com seus encantos e o fez
inclinar-se diante dela e servi-la.
Mas a graça que converte põe tudo em ordem novamente
e coloca Deus no trono, e o mundo aos Seus pés; Cristo está
no coração e o mundo sob os pés. " ...o mundo está crucificado
para mim e eu para o mundo" (Gálatas 6: 14). Antes dessa
mudança, todo clamor era: "quem nos mostrará algum bem
(mundano)?", mas, agora, ele ora: "Senhor, levanta sobre mim a
luz do Teu rosto", e quem quiser fique com o trigo e o vinho
(Salmo 4:6-7). Anteriormente o prazer e o contentamento

49
de seu coração estavam no mundo; então, sua canção era:
';1.lma, tens em depósito muitos bens para muitos anos; descansa,
come, bebe e folga". Agora, porém, tudo isto já perdeu sua
importância e já não tem graça para que o deseje; e ele se
afina com o doce salmista de Israel: "O senhor é a porção da
minha herança; as linhas me caem em lugares deliciosos; sim,
coube-me uma formosa herança". Nada mais pode deixá-lo
contente. Escreveu "vaidade" e "tormento" sobre todos os
prazeres mundanos; e "perda" e "imundícia" sobre todas as
virtudes humanas. Está em busca, agora, da vida e da imor-
talidade. Anseia por graça e glória, e tem em vista uma coroa
incorruptível. Seu coração está empenhado em buscar o
Senhor. Busca primeiro o reino de Deus e Sua justiça, e a
espiritualidade não se trata mais de um assunto casual para
ele, mas é a sua principal preocupação. Outrora o mundo
tinha domínio sobre ele. Ele faria mais para obter lucro do
que para obter santidade - mais para agradar seu amigo ou
sua carne, do que a Deus que o fez; e Deus precisava esperar
enquanto o mundo era servido em primeiro lugar. Mas agora,
tudo precisa esperar; ele odeia pai, mãe, a vida e tudo o mais
em comparação a Cristo.
Bem, leitor, pare um pouco e olhe para dentro de si
mesmo. Isso não o preocupa? Você finge ser de Cristo, mas
o mundo o domina? Você não sente gozo e contentamento
mais reais no mundo do que nele? Você não se sente mais à
vontade quando o mundo está na sua mente e quando está
rodeado de prazeres carnais do que quando a sós, em seu
quarto, para orar e meditar, ou, assistindo ao culto e adorando
ao Senhor? Não há evidência mais segura do estado de falta

50
de conversão, do que ter as coisas do ·mundo em primeiro
plano, no que se refere aos nossos interesses, amor e estima.
Para o verdadeiro convertido, Cristo tem a supremacia.
Quão querido é o Seu nome para ele! Quão preciosa é a Sua
graça! O nome de Jesus está gravado em seu coração. Para
ele, a honra é simples aparência; o riso é apenas loucura; e
Mamam caiu por terra como Dagom diante da arca, com as
mãos e a cabeça quebradas na soleira, quando Cristo é
revelado de maneira salvadora. Aqui está a pérola de grande
preço para o verdadeiro convertido; aqui está o seu tesouro;
aqui está a sua esperança. Esta é a sua glória: "Meu amado é
meu, e eu sou dele". Oh, é mais doce para ele ser capaz de
dizer: "Cristo é meu", do que se ele pudesse dizer: "O reino
é meu; as Índias são minhas".

(4) Nós nos afastamos de nossa justiça própria. Antes


da conversão o homem procura cobrir-se com folhas de
figueira e santificar-se com seus próprios deveres. Está apto
a confiar em si mesmo, a estabelecer sua justiça própria e a
contabilizar seus borós como ouro, mas não está apto a se
submeter à justiça de Deus. Mas a conversão muda sua
mente; agora ele considera sua justiça própria como trapos
de imundícia. Ele a lança fora como uma pessoa faria com
os trapos repugnantes de um mendigo asqueroso. É, agora,
levado à pobreza de espírito; condena-se e reclama de si
mesmo; considera todos os seus bens "desgraçados, e miseráveis,
e pobres, e cegos, e nus". Vê um mundo de iniqüidade nas suas
coisas santas, e sua justiça - antes idolatrada - chama de
imundícia e prejuízo; e nem por milhares de mundos se

51
acharia vestido nela. Agora começa a dar um alto valor à
justiça de Cristo. Vê a necessidade de Cristo em cada dever,
para justificar sua pessoa e santificar seus atos; não pode
viver sem Ele; não pode orar sem Ele. Cristo precisa ir
com ele, caso contrário, não pode chegar à presença de
Deus; inclina-se para Cristo e, portanto, encurva-se na casa
de seu Deus. Esconde-se em Cristo, como a raiz de uma
árvore se _espalha na terra para ter estabilidade e nutrir-se.
Outrora as novas de Cristo eram uma coisa sem graça e sem
sabor; mas, agora, quão doce é Cristo. Agostinho não podia
apreciar seu tão admirado Cícero, porque não podia encon-
trar nos escritos dele o nome de Cristo. Quão enfaticamente
ele exclama: "ó suavíssimo, amantíssimo, bondosíssimo,
queridíssimo, preciosíssimo, desejadíssimo, adorabilíssimo,
justíssimo!" (Meditat c.37), tudo de um só fôlego, quando
fala de e para Cristo. Em suma, o convertido brada junta-
mente com o mártir: "Ninguém, senão Cristo".

7. Aquele a quem voltamos na conversão é Deus Pai,


Filho e Espírito Santo, o qual o verdadeiro convertido
considera sua bênção eterna e toda-suficiente. Um homem
nunca está realmente santificado enquanto seu coração não
estiver verdadeiramente colocado sobre Deus, acima de todas
as coisas, como a sua porção e o seu bem principal. Estas são
as aspirações naturais do coração do crente: "O Senhor é a
minha porção". '54 minha alma se gloriará no Senhor." " ...dele
vem a minha esperança. Só ele é a minha rocha e a minha salvação
... e a minha glória; a rocha da minha fortaleza, e o meu refúgio
estãoemDeus"(Salmo 119:57; Salmo 34:2; Salmo62:5-6).

52
Você gostaria de saber com certeza se é, ou não é, um
convertido? Então permita que sua alma e tudo o que há
em você prestem atenção.
Você tem recebido Deus como a sua felicidade? Onde
está o desejo do seu coração? Qual é a fonte de sua maior
satisfação? Venha, então, e com Abraão levante seus olhos
para o leste, para o oeste, para o norte, para o sul, e olhe à sua
volta; o que há no céu ou na terra que gostaria de receber
para fazê-lo feliz? Se Deus lhe desse o direito de escolha,
como fez com Salomão, ou se Ele lhe dissesse como Assuero
disse a Ester: "Qual é o seu pedido e qual é o seu requerimento, e
se fará" - o que você pediria? Vá aos jardins do prazer, e
colha todas as flores perfumadas que houver lá; isso iria
satisfazê-lo? Vá aos tesouros de Mamom; suponha que possa
carregar tudo o que quiser. Vá às torres, aos troféus de honra.
Que você acha de ser um homem de renome, e ter nome
como os dos grandes homens da terra? Será que qualquer
uma dessas coisas ou todas elas o satisfariam e fariam com
que você se considerasse feliz? Caso positivo, você certa-
mente é carnal e não é convertido. Caso negativo, vá adiante;
penetre nas excelências divinas, na abundância de Suas
misericórdias, no esconderijo de Seu poder; nas profundezas
insondáveis de toda a Sua suficiência. Isso lhe convém e
agrada mais? Você diz: "É bom estar aqui. Vou instalar-me,
viver e morrer aqui"? Você prefere mais isso ao mundo todo?
Então, está tudo bem entre você e Deus: como você é feliz, ó
homem - feliz como jamais o foi. Se Deus pode fazê-lo feliz,
você deve ser feliz, pois tem o Senhor como seu Deus. Você
diz a Cristo como Ele diz a nós: "Teu Pai será o meu Pai,

53
Teu Deus o meu Deus"? Aqui está o ponto chave da questão.
Um falso convertido jamais descansa em Deus; mas a graça
que converte faz a obra e, assim, cura a miséria fatal da Queda,
afastando o coração de seu ídolo e voltando-o para Deus.
Agora diz a alma: "Senhor, para onde irei? Tu tens as palavras
de vida eterna". Aqui se centraliza e aqui se fixa. Trata-se de
sua entrada no céu; ele põe o seu interesse em Deus. Ao
descobrir isto, diz: "Volta, minha alma, ao teu repouso, pois o
Senhor te fez bem"(Salmo 116:7). E está até pronto a cantar o
hino de Simeão: '54.gora, Senhor, despede em paz o teu servo", e
a dizer com Jacó, quando seu velho coração reviveu diante
das agradáveis notícias: "Basta ... " (Gênesis 45:28). Ao ver
que pode se refugiar no Deus do concerto, isto significa toda
a sua salvação e todo o seu desejo (2 Samuel 23:5).
Seria este o seu caso? Seria isso que você tem experi-
mentado? Se for assim, então você é "bendito do Senhor".
Deus tem operado em você; Ele tem Se apoderado do seu
coração pelo poder da graça regeneradora; senão você jamais
poderia ter feito isso.
De modo particular, na conversão fazemos o seguinte:

(1) Voltamos para Cristo,o único Mediador entre Deus


e os homens (1 Timóteo 2:5). Sua tarefa é levar-nos a Deus
(1 Pedro 3:18). Ele é o caminho para o Pai (João 14:6), a
única tábua de salvação pela qual podemos escapar, a única
porta pela qual podemos entrar (João 10:9). A conversão
leva a alma a Cristo, para que O aceite como o único meio de
vida, como o único caminho, como o único nome dado
debaixo dos céus, Ela não procura salvação em nenhum

54
outro, senão nEle; lança-se somente sobre Cristo.
"Vou me aventurar", diz o pecador convicto; "E se eu
perecer, perecerei; se eu morrer, morrerei. Mas, Senhor, não
permita que eu pereça sob os olhares da Tua misericórdia.
Impede que eu Te abandone ou que eu desista de seguir-Te.
Eis-me aqui, se me matares, não sairei da Tua porta."
Portanto, a pobre alma aventura-se em Cristo e resoluta-
mente entrega-se a Ele. Antes da conversão o homem
desprezava Cristo; dava maior importância aos seus bens,
amigos, negócios do que a Cristo; agora Cristo lhe é tão
necessário quanto a comida, quanto o pão diário; é a vida do
seu coração, o esteio de sua vida. Seu grande desejo é que
Cristo seja engrandecido nele. Outrora seu coração excla-
mava, como se diz à esposa: "Que é o teu amado mais do que o
outro amado ... ?" (Cantares de Salomão 5:9). Ele encontrava
maior graça em seus alegres companheiros, em seus jogos
ilícitos, em prazeres terrenos do que em Cristo. Religião era
uma fantasia, e a manifestação de grande gozo, um sonho
inútil; mas, agora, para ele o viver é Cristo. Ele despreza
tudo o que considerava precioso, pela excelência do conhe-
cimento de Cristo.
Tudo o que diz respeito a Cristo é aceito pelo verdadeiro
convertido. Ama não apenas o salário, mas o serviço de
Cristo também; não apenas os benefícios, porém o fardo de
Cristo também. Está disposto não apenas a esmagar o trigo,
mas a submeter-se ao jugo também. Aceita os mandamentos
de Cristo - sim, também a cruz de Cristo.
O falso convertido não aceita Cristo inteiramente. Deseja
a salvação que está em Cristo, entretanto não deseja a

55
considera as leis da religião apenas toleráveis; considera-as
desejáveis; sim, mais desejáveis do que o ouro, do que o ouro
puro - sim, do que muito ouro puro.
Seu juízo está plenamente persuadido que é melhor ser
santo, que é melhor ser rígido, que este é o melhor caminho,
e, para ele, é a mais sábia, mais racional e mais desejável
escolha. Veja o conceito do homem de Deus: "Sei, ó Senhor,
que teus juízos são retos; amo os teus mandamentos mais do que o
ouro, e ainda mais do que o ouro fino. Por isso tenho em tudo
como retos todos os teus preceitos, e aborreço toda a falsa vereda"
(Salmo 119: 127-128). Observe que ele aprova tudo o que
Deus ordena e desaprova tudo o que Ele proíbe. ''Justo és, ó
Senhor, e retas são os teus juízos. Os teus testemunhos que ordenaste
são retos e muito fiéis. A tua palavra é a verdade desde o princípio,
e cada um dos teus juízos dura para sempre" (Salmo 119: 137-
138, 160). Vejam quão pronta e completamente ele aceita
os juízos de Deus; declara sua aprovação e aceitação desses
juízos e de cada coisa neles contida.
(ii) O alvo do coração é conhecer a mente completa de
Cristo. Não quer que nenhum pecado fique encoberto nem
quer ser ignorante de nenhum dever requerido dele. A
aspiração natural e honesta de um coração santificado é:
"Senhor, se há algum caminho mau em mim, revela-o. O
que eu não sei, ensina-me; e se tenho cometido iniqüidade,
não cometerei mais". O falso convertido é deliberadamente
ignorante, não ama o caminho da luz. Quer continuar com
tais e tais pecados, e, portanto, detesta reconhecer que está
cometendo pecado e não permitirá que a luz o penetre. Agora
o coração bondoso deseja conhecer toda a largura e amplidão

58
das leis do seu Criador. Recebe com total aceitação a Palavra
que o convence de qualquer dever que antes desconhecia ou
desprezava, cujo dever revela pecados que outrora perma-
neciam escondidos.
(iii) A livre e resoluta escolha da vontade é pelos
caminhos de Cristo, antes de todos os prazeres do pecado e
de toda a prosperidade do mundo. Sua aceitação não é
oriunda de uma situação angustiante, nem se trata apenas
de uma resolução súbita e apressada, mas o cristão está
resolvido e faz a escolha voluntária deliberadamente. Na
verdade, a carne irá se rebelar; contudo, a parte predomi-
nante de sua vontade decide-se pelas leis e pelo governo
de Cristo, de modo que o cristão se adere a elas - não como
um peso ou carga, porém como uma bem-aventurança.
Enquanto o não santificado anda nos caminhos de Cristo
como se estivesse preso em cadeias e grilhões, o verdadeiro
convertido o faz. de coração aberto e considera as leis de
Cristo sua liberdade. Seu prazer está nas belezas da santidade
e tem esta característica inseparável. Se pudesse escolher,
preferiria uma vida rígida e santa a uma vida próspera e
florescente, porém mundana. " ...e foram com ele (Saul) do
exército aqueles cujos corações Deus tocara" (1 Samuel 10:26).
Quando Deus toca os corações de Seus escolhidos, eles seguem
Cristo imediatamente e, embora atraídos por Deus, seguem-
-no voluntariamente e desejosos de se devotarem ao Seu
serviço, buscando-O de todo o coração. O temor tem seu
valor, mas ele não é a principal fonte propulsora de um
coração santificado. Cristo não controla Seus súditos pela
força, mas é Rei de um povo voluntário que, através de

59
Sua graça, dedica-se espontaneamente ao Seu serviço. Eles
O servem por livre escolha - não como escravos, mas como
um filho ou uma esposa; escolha essa, proveniente de
uma fonte de amor e de uma mente fiel. Em suma, as leis
de Cristo são o amor, gozo e objeto de estudo contínuo do
cristão.
(iv) A inclinação do seu caminho está direcionada no
sentido de guardar os estatutos de Deus. Sua preocupação
diária é andar com Deus. Busca grandes coisas, tem projetos
nobres, embora falhe em realizá-los. Seu alvo não é nada
menos que a perfeição; ele a deseja, ele se esforça para obtê-
-la; não descansará em nenhum degrau da graça enquanto
não se livrar completamente do pecado e estar aperfeiçoado
na santidade (Filipenses 3: 11-14).
É aqui que a podridão do hipócrita pode ser descoberta.
Ele deseja a santidade, como já disse alguém muito bem,
apenas como uma ponte para o céu e procura sinceramente
descobrir qual é o mínimo necessário para servir ao seu
propósito; e se ele puder conseguir esse mínimo necessário,
ficará satisfeito. Mas o verdadeiro convertido deseja a
santidade por causa da santidade, e não simplesmente por
causa do céu. Não ficaria satisfeito apenas com aquilo que
poderia apenas salvá-lo do inferno, porém deseja o ponto
mais alto. Contudo, desejos não são suficientes. Qual é o
seu caminho e a sua trajetória? O intento e o objetivo da sua
vida foram alterados? A santidade é o seu objetivo e a religião
o seu empreendimento? Se não é assim, então você não
alcançou a verdadeira conversão.
E será que isto que temos descrito se constitui na

60
conversão que é absolutamente necessária para a salvação?
Então esteja informado de que estreita é a porta e apertado o
caminho que conduzem à vida - de que são poucos os que a
encontram - de que há necessidade de poder divino para
converter um pecador a Jesus Cristo.
Por conseguinte, ó leitor, novamente o exorto a examinar-
-se a si mesmo. O que diz sua consciência? Ela começa a
acusá-lo? Ela o aferroa à medida que você prossegue? Aquilo
que temos descrito corresponde ao seu juízo, à sua escolha
e ao seu caminho? Se for assim, então está tudo bem. Ou
porventura seu coração o condena e lhe fala de um certo
pecado no qual está vivendo em desacordo com sua cons-
ciência? Acaso não lhe fala que há tal e tal caminho secreto
da iniqüidade no qual você deseja prosseguir, tal e tal dever
do qual você ainda não se conscientizou?
Pergunto: sua consciência não o leva para seu quarto a
fim de lhe dizer quão raramente a oração e a leitura da Palavra
de Deus são ali realizadas? Ela não o leva à sua família, para
lhe mostrar a exortação de Deus e as almas de seus filhos, as
quais você tem negligenciado? Sua consciência não o conduz
até a sua loja, até o seu comércio para lhe falar de uma
determinada iniqüidade que existe ali? Ela não o leva até o
botequim da esquina ou ao clube privado, a fim de culpá-lo
pelas amizades dissolutas que você mantém ali, como
também, o tempo e os talentos preciosos gastos ali? Ela não
o leva ao seu aposento secreto para ali proferir a sua
condenação?
Ó consciência, cumpra o seu dever! Em nome do Deus
vivo, eu lhe ordeno: cumpra a sua missão. Agarre este

61
3

A Necessidade da Conversão
Talvez vocês estejam prontos a indagar: "O que significa
essa insistência?" Talvez estejam admirados que eu os persiga
tão ardentemente, sempre batendo na mesma tecla, ou seja,
que devem se arrepender, devem ser convertidos. No entanto,
preciso dizer-lhes como Rute disse a Noemi: "Não me instes
para que te deixe, não me obrigues a não seguir-te" (Rute 1: 16).
Se se tratasse de um caso de indiferença, isto é, que vocês
pudessem ser salvos de maneira como estão, eu, de bom
grado, os deixaria em paz; mas acham que não vou preocupar-
-me com vocês, sabendo que estão prestes a perecer? Como
o Senhor vive, diante de quem eu estou, não tenho a mínima
esperança de vê-los no céu, a menos que sejam convertidos.
Eu me desespero completamente de sua salvação, a não ser
que vocês sejam persuadidos a desistirem de si mesmos e
a se voltarem para Deus em santidade e novidade de vida.
Teria Deus dito: "... aquele que não nascer da água e do Espírito,
não pode entrar no reino de Deus", e, contudo, admiram-se
que Seus ministros lutem tão diligentemente por vocês?
Será que não acham estranho que eu seja zeloso para que
vocês sigam a santidade, e que eu deseje ver a imagem de
Deus refletida em vocês? Jamais alguém entrou ou entrará

63
no céu por qualquer outro caminho, senão por esse. A con-
versão descrita não é um alto prêmio para alguns cristãos
aperfeiçoados, mas toda alma que é salva passa por essa
transformação.
Conta-se de um nobre romano que, ao apressar-se em
levar mantimento à cidade onde havia fome, disse aos
marinheiros que se negavam a navegar sob um mau tempo:
"É-nos necessário navegar- não nos é necessário viver". O
que você considera necessário? O seu pão é necessário? A
sua respiração é necessária? Então a sua conversão é muito
mais necessária. De fato, esta é a única coisa necessária. Suas
posses não são necessárias; você pode vender tudo para
comprar a pérola de grande preço e, contudo, lucrar com a
compra. Sua vida não é necessária; você pode perdê-la por
Cristo, com infinita vantagem. Sua reputação não é ne-
cessária; você pode ser repreendido por causa do nome de
Cristo e ainda ser feliz; sim, você pode ser muito mais feliz
na censura do que na fama. Todavia sua conversão é ne-
cessária; sua salvação depende dela; e não seria preciso ter
cuidado num assunto tão importante? É deste ponto que
depende sua formação ou sua ruína para toda a eternidade.
Portanto vou mostrar-lhes, mais especificamente, a
necessidade da conversão em cinco pontos.

1. Sem conversão sua existência é vã.


Não seria uma pena se você não servisse para nada, se
fosse um peso inútil sobre a Terra, uma simples verruga no
corpo do universo? Entretanto, é isso que você é enquanto
não for convertido, pois não pode responder pela finalidade

64
talhar o mármore sem ferramentas, nem pintar sem pincéis
e tintas, nem construir sem materiais, não é possível realizar
qualquer serviço agradável a Deus sem as graças do Espírito,
que são tanto os materiais como os instrumentos de trabalho.
A caridade não é um serviço a Deus, mas um ato de osten-
tação, a menos que brote do amor a Deus. O que é a oração
dos lábios sem a graça no coração, senão uma carcaça sem
vida? O que são todas as nossas confissões se não forem
práticas de contrição piedosa e de arrependimento sincero?
Que são nossas petições, se não forem animadas de desejos
santos e de fé nos atributos e promessas de Deus? Que são
nossos louvores e ações de graças, se não brotarem do amor
de Deus e se não forem uma santa gratidão e um sentimento
das misericórdias de Deus em nossos corações? Portanto,
assim como não se pode esperar que as árvores falem ou que
os mortos se movimentem, também não se pode esperar que
o não-convertido apresente um serviço santo e agradável a
Deus. Se a árvore é má, como pode dar bons frutos?
Da mesma forma, sem conversão você vive para um mau
propósito. A alma não convertida é uma verdadeira gaiola
de aves imundas (Apocalipse 18:2), um sepulcro cheio de
corrupção e imundícia (Mateus 23:27), uma repugnante
carcaça cheia de vermes rastejantes, que exalam um mau.
cheiro muito nojento às narinas de Deus (Salmo 14:3). Oh,
que situação terrível! Você ainda não percebeu que é
necessário que haja uma mudança? Não nos teria entriste-
cido ver os consagrados vasos de ouro do templo de Deus
transformados em copos de bebidas alcoólicas e poluídos
com o culto aos ídolos? (Daniel 5:2-3) Os judeus não

67
consideraram uma terrível abominação quando Antíoco
colocou a figura de um suíno na entrada do Templo? Quão
mais abominável, então, teria sido se o próprio Templo fosse
transformado num estábulo ou num chiqueiro e o Santo dos
Santos fosse servido como a casa de Baal! É exatamente este
o caso daquele que não é regenerado. Todos os seus membros
estão transformados em instrumentos de injustiça, em ser-
vos de satanás e o mais íntimo de seu coração num receptáculo
de impureza. Você pode ter idéia do tipo de convidados que
estão dentro da casa por aqueles que vêm para fora; pois
"do coração procedem os maus pensamentos, mortes, adultérios,
prostituição, furtos, falsos testemunhos e blasfêmias" (Mateus
15:19). Este bando negro mostra o inferno que há no inte-
rior.
Oh, que abuso insuportável ver uma alma nascida para
o céu humilhada a tal baixeza; ver a glória da criação de
Deus, a principal obra de Deus, o Senhor desta Terra,
comendo bolotas como o pródigo! Não foi lamentável ver
aqueles que se alimentavam de delicadas iguarias, sentados
desfalecidos nas ruas; e os preciosos filhos de Sião,
comparáveis ao ouro puro, reputados como vasos de barro; e
aqueles que estavam vestidos de carmesim, abraçando o
esterco? (Lamentações de Jeremias 4:2,5). E não seria muito
mais terrível ver o único ser nesta terra que é dotado de
imortalidade e que tem o sinete de Deus, tornar-se um vaso
no qual não há prazer, destinado ao mais sórdido uso? Oh,
que indignidade intolerável! Seria melhor que você fosse
quebrado em mil pedaços do que continuar a ser rebaixado
a um serviço tão vil.

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2. Sem a conversão, não somente o homem é inútil, mas
também o é toda a criação visível. Deus fez todas as
criaturas visíveis no céu e na terra para servirem ao homem,
e o homem é somente o porta-voz de todo o resto. O homem
é, no mundo, o que a língua é para o corpo, isto é, fala por
todos os membros. As outras criaturas não podem louvar
seu Criador, a não ser através de sinais mudos e insinuações
dirigidas ao homem, para que ele fale por elas. O homem é,
por assim dizer, o sumo-sacerdote da criação de Deus,
para oferecer o sacrifício de louvor por todas as suas co-
-criaturas. O Senhor Deus espera um tributo de louvor de
todas as Suas obras. Ora, todas as demais criaturas trazem
os seus tributos ao homem e pagam esses tributos através
das mãos dele. Então, se o homem é falso, infiel, egoísta,
Deus é roubado por todas as criaturas e não recebe a glória
ativa de nenhuma de Suas obras.
Oh, que pensamento horrível! Imaginem, Deus criar um
mundo como este, despender tão infinito poder, sabedoria e
bondade, e no fim ser tudo em vão! Pensem no homem ser
culpado, afinal, de roubar a Deus e de privá-10 da glória de
tudo! Reflitam bem nisso. Enquanto alguém for incrédulo,
todos os préstimos das outras criaturas lhe são inúteis. Sua
comida o alimenta inutilmente. O sol brilha para ele inutil-
mente. Suas roupas o aquecem em vão. Seu animal o carrega
em vão. Em resumo, o incansável trabalho e o contínuo
serviço de toda criação são inúteis para ele. O serviço de
todas as criaturas que trabalham arduamente e submetem
toda a sua força ao homem, com a qual ele deveria servir o
Criador delas, não passa de trabalho perdido. Por isso, "toda

69
a criação geme" (Romanos 8:22) sob o abuso de homens
profanos que pervertem todas as coisas, usando-as para sa-
tisfazer suas luxúrias, uso bastante contrário ao verdadeiro
propósito da existência delas.

3. Sem a conversão sua religião é vã. Todas as suas práticas


religiosas são nada mais que perdas, pois elas não cumprem
os verdadeiros propósitos do evangelho, isto é, não podem
agradar a Deus nem salvar sua alma (Romanos 8:8;
1 Coríntios 13:2-3). Mesmo que seus cultos sejam muito
especiais, Deus não tem prazer neles (Isaías 1: 14; Malaquias
1: 1O). Não seria terrível a situação daquele homem, cujos
sacrifícios são como homicídios e cujas orações como um
sopro de abominação? (Isaías 66:3; Provérbios 28:9). Muitos,
sob convicção, pensam que estão determinados a se cor-
rigirem e que algumas orações e esmolas poderão consertar
tudo; mas que tristeza, senhores, enquanto seus corações per-
manecerem sem santificação, nenhuma de suas obrigações
será aceita. Quão meticuloso era Jeú! No entanto, tudo foi
rejeitado porque o seu coração não era justo (2 Reis, capítulo
10 com Oséias 1:4). Quão irrepreensível era Paulo! Contudo,
não sendo convertido, tudo não passava de perda (Filipenses
3:6-7). Os homens acham que fazem muito em dar atenção
ao serviço de Deus, e até O consideram em débito com eles,
entretanto, não estando santificados, suas práticas religiosas
não podem ser aceitas.
Ó alma, quando seus pecados a perseguem, não pense
que uma simples oraçãozinha e uma reformazinha de sua
conduta poderão aplacar a Deus. É necessário começar com

70
o seu coração. Se ele não for renovado, você não pode agradar
a Deus mais do que alguém que, tendo-o ofendido indizivel-
rnente, viesse trazer-lhe a coisa mais asquerosa para acalmá-
-lo; ou, havendo caído no lodo, pensasse em reconciliar-se
com você com seus abraços imundos.
É urna grande desgraça labutar no fogo. Os poetas não
poderiam inventar um inferno pior para Sísifo, do que ficar
labutando eternamente, a fim de levar para cima da
montanha a pesada pedra que sempre rolava para baixo
novamente, obrigando-o a recomeçar o seu trabalho. Para
Deus o maior dos julgamentos temporais é que aqueles
que desobedecem edifiquem urna casa sem habitar nela,
que plantem e não colham, e que seu trabalho seja devorado
pelos estrangeiros (Deuteronômio 28:20, 38-41). Não seria
urna grande desgraça perder todo nosso trabalho, semear e
construir em vão? Mas é muito pior perder nossos esforços
religiosos - orar, ouvir a Palavra de Deus e jejuar em vão!
Trata-se de urna perda eterna e irreparável. Não se deixe
enganar: se você continuar no seu estado pecaminoso, ainda
que estenda as suas mãos, Deus vai esconder os olhos; mes-
mo que você faça muitas orações. Ele não ouvirá (Isaías 1: 15).
Se um homem incapaz começa a fazer o nosso trabalho e
o estraga, mesmo que ele capriche, não o agradecemos por
isso. Deus tem que ser adorado conforme Sua determinação.
Se um servo faz o nosso trabalho totalmente contrário à
nossa ordem, ele deverá receber açoites ao invés de louvores.
A obra de Deus precisa ser feita de acordo com a vontade
dEle, ou Ele não Se agradará; e isto não pode ser, a não ser
que seja feito com um coração santo.

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4. Sem a conversão verdadeira, suas esperanças são em
vão. "... a esperança do hipócrita perecerá" (J ó 8: 12-13). "...porque
o Senhor rejeitou as tuas confianças" (Jeremias 2: 37).

(1) A espectativa de conforto aqui é vã. É preciso que


você seja convertido não somente por segurança, mas
também para o conforto de sua situação. Sem a conversão,
você não conhecerá a paz (Isaías 59:8). Sem o temor de Deus,
você não pode ter o conforto do Espírito Santo (Atos 9:31).
Deus fala de paz somente ao Seu povo e aos Seus santos
(Salmo 85:8). Se permanecendo em seus pecados você tem
uma falsa paz, ela não provém de Deus e, portanto, você
pode adivinhar quem é o autor dela. O pecado é uma ver-
dadeira doença (Isaías 1:5), sim, a pior das doenças; é uma
lepra na cabeça (Levítico 13:44); uma chaga no coração
(1 Reis 8: 38), uma quebradura nos ossos (Salmo 51 :8); ele
traspassa, fere, tortura, atormenta (1 Timóteo 6:10). Do
mesmo modo que um homem não pode esperar alívio
quando a doença está na sua força total, ou quando os ossos
estão desjuntados, também não pode esperar conforto
enquanto estiver em seus pecados.
Ó homem infeliz, que não tem alívio nessa situação,
senão aquilo que provém da mortalidade da doença! Na sua
irreflexão, o pobre homem enfermo diz que está bem; com a
morte já estampada em sua face, ele ainda se levantaria e
estaria ativo em seus negócios, quando o próximo passo seria,
provavelmente, a sepultura. Os homens não santificados
geralmente não vêem nada defeituoso; consideram-se sadios
e não chamam o médico; mas isso simplesmente mostra o

72
perigo da situação em que se encontram.
O pecado produz naturalmente doenças e distúrbios na
alma. Que tumulto contínuo há numa mente descontente!
Que mal consumidor é a preocupação desordenada! O que é
a paixão, senão uma verdadeira febre na mente? O que é a
luxúria, senão um fogo nos ossos? O que é o orgulho, senão
um edema mortal? O que é a cobiça, senão uma sede in-
saciável e insuportável? O que é a malícia, senão um veneno
no próprio coração? A preguiça espiritual nada mais é que
um escorbuto na mente, e a segurança carnal é uma letargia
mortal. Como essa alma pode ter conforto verdadeiro, se
está acometida de tantos males? Mas a graça da conversão
cura e, portanto, alivia a mente e prepara a alma para uma
paz firme, duradoura e imortal. "Muita paz têm os que amam
a tua lei, e para eles não há tropeço" (Salmo 119: 165). São os
caminhos da sabedoria que garantem o prazer e a paz
(Provérbios 3: 17). O salmista tinha muito mais prazer na
Palavra de Deus do que em todas as delícias de sua mansão
(Salmo 119:103,127). A consciência não pode ter paz com-
pleta enquanto não for totalmente purificada (Hebreus 10:22).
Maldita é aquela paz que se mantém no caminho do pecado
(Deuteronômio 29: 19-20). Há duas espécies de paz que
devem ser temidas mais do que todas as aflições deste mundo:
a paz com o pecado e a paz no pecado.

(2) A esperança da salvação na vida futura é vã. Essa


esperança é a mais ofensiva a Deus e a mais perniciosa para
você. Nessa esperança há morte, desespero e blasfêmia.
Reitero: há morte nela. Sua confiança, ó homem, será

73
arrancada dos seus tabernáculos, Deus a arrancará com raízes
e ramos; ela o conduzirá ao rei dos terrores (Jó 18: 14).
Embora você possa encostar-se nessa casa, ela não resistirá;
ao contrário, provará ser como um edifício arruinado que,
quando o homem põe nele a sua confiança, desmorona em
cima dele (Jó 8:15).
Há desespero nessa esperança. ".. .qual será a esperança
do hipócrita ...quando Deus lhe arrancar a sua alma?" (J ó 27: 8).
Então há um fim eterno para essa esperança. De fato, a es-
perança do justo tem um fim, mas não se trata de um fim
destruidor, e sim de um fim aperfeiçoador. Sua esperança
termina em gozo; a de outros, em frustração. O homem justo,
no momento da morte, diz: "Está acabado"; mas o ímpio
diz: "Está perdido", e pode, sinceramente, lamentar-se como
Jó (embora esse o tenha feito por equívoco) em sua situação:
"Onde está a minha esperança? Quebrou-me de todos os lados, e
eu me vou; e arrancou a minha esperança, como a uma árvore"
(J ó 19: 1O). "... ojusto até na sua morte tem esperança" (Provérbios
14:32). Quando a natureza está agonizando, as esperanças
do justo estão vivas; quando o corpo está desfalecendo, as
esperanças estão florescendo; a esperança do justo é uma
esperança viva, mas a de outros é uma esperança morta,
condenadora, que destrói a alma. "Morrendo o homem ímpio
perece a sua expectação, e a esperança dos injustos se perde"
(Provérbios 11 :7). Tal esperança fica frustrada e mostrará
que é como uma teia de aranha (Jó 8:41), que gera de suas
próprias entranhas; mas então chega a morte e destrói tudo e
há, portanto, um fim eterno de sua confiança, na qual se
firmava. "Os olhos dos ímpios desfalecerão, e perecerá o seu

74
refúgio; e a sua esperança será o expirar da alma" (J ó 11: 20). Os
ímpios se fixam em sua esperança carnal, e não se apartarão
dela; eles a seguram firmemente, não deixarão que ela se vá;
mas a morte a arrancará de seus dedos. Embora não possamos
desenganá-los, a morte e o julgamento o farão. Quando a
morte arremessar o seu dardo através de seu fígado, destruirá
num só golpe sua alma e suas esperanças. Os ímpios têm
esperança apenas nesta vida e, portanto, são os mais mise-
ráveis de todos os homens. Quando a morte chega, deixa-os
no espantoso abismo de infindável desespero.
Há blasfêmia nessa esperança. Esperar que sejamos
salvos apesar se continuarmos não convertidos, é esperar que
provemos que Deus é mentiroso. Misericordioso e compas-
sivo como é, Deus lhes tem dito que jamais os salvará se
continuarem nos caminhos da ignorância e da injustiça. Em
suma: Ele lhes tem dito que não importa o que sejam ou
façam, nada lhes garantirá a salvação, a menos que se tornem
novas criaturas. Ora, dizer que Deus é misericordioso e que
Ele nos salvará sem conversão, é o mesmo que dizer: "Es-
peramos que Deus não cumpra aquilo que Ele diz". Não
podemos pôr em antagonismo os atributos de Deus. Ele
decidiu glorificar a Sua misericórdia mas sem prejudicar
a Sua verdade, fato que o pecado presunçoso descobrirá
para seu desespero eterno.
Objeção: mas nós esperamos em Jesus Cristo. Colo-
camos toda nossa confiança em Deus, portanto não há dúvida
de que seremos salvos.
Resposta: isso não é esperar em Cristo, mas esperar
contra Cristo. Esperar ver o reino de Deus sem nascer de

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novo, esperar achar a vida eterna no caminho largo, é espe-
rar que Cristo Se revele um falso profeta. O clamor do
salmista é: " ... mas confiei na tua palavra" (Salmo 119:81).
Mas a esperança do opositor é contra a Palavra de Deus.
Mostre-me uma palavra de Cristo que sustente sua esperança
de que Ele o salvará na ignorância ou na negligência profana
de Seu serviço, e eu jamais tentarei abalar sua confiança.
Deus rejeita essa esperança com repugnância. Os que
foram condenados pelo profeta, continuaram em seus pe-
cados; contudo, diz o profeta: "... e ainda se encostam ao
Senhor... " (Miquéias 3: 11). Deus não suportará ser trans-
formado em esteio para o homem em seus pecados. O Senhor
rejeitou aqueles pecadores arrogantes que continuaram nas
suas transgressões e ainda se apoiavam no Deus de Israel,
da mesma forma que se sacode o pó que adere à roupa.
Se a sua esperança vale alguma coisa, ela os purificará
de seus pecados ( 1 João 3: 3), mas maldita é a esperança que
acalenta o homem em seus pecados.
Objeção: então, quer que caiamos no desespero?
Resposta: vocês devem perder a esperança de ir para o
céu do jeito que estão, isto é, enquanto não forem convertidos.
Devem perder a esperança de ver a face de Deus, sem santi-
ficação. Mas não devem, de modo algum, desesperar de achar
misericórdia se se arrependerem e forem convertidos. Nem
precisam desesperar de alcançar arrependimento e conversão
se usarem os meios de Deus.

5. Sem a conversão, tudo que Cristo fez e sofreu será


em vão para vocês. Sua obra não vai ajudá-los, de forma

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alguma, para obter a salvação. Muitos alegam que o fato de
Cristo haver morrido pelos pecadores é uma base suficiente
para a salvação deles; mas devo dizer-lhes que Cristo jamais
morreu para salvar pecadores impenitentes e não convertidos.
Um notável teólogo costumava fazer duas perguntas ao tratar
particularmente com as almas: "O que Cristo fez para você?
O que Cristo realizou em você?" Sem a atuação do Espírito
na regeneração, não temos participação nos benefícios da
redenção. Digo-lhes, da parte de Deus, que o próprio Cristo
não pode salvá-los se continuarem nesse estado.

(1) Salvar os homens em seus pecados seria ir contra


a Sua fidelidade. O Mediador é o servo do Pai, apresenta o
encargo que o Pai Lhe deu, age em nome dEle, e pleiteia a
ordem dEle para Sua justificação (João 10: 18,36; João
6:38,40). Deus O encarregou de tudo, confiou-Lhe Sua
própria glória e a salvação de Seus eleitos (Mateus 11 :27;
João 17:2). Assim, antes de deixar o mundo, Cristo apresenta
ao Pai um relato de ambas as partes daquilo que Ele Lhe
confiou (João, capítulo 17). Ora, Cristo iria impedir com-
pletamente a glória do Pai, empanar Seu maior crédito, se
Ele salvasse os homens que estivessem em pecado; pois
isso iria derrubar todos os Seus juízos e profanar todos os
Seus atributos.
Iria derrubar todos os juízos de Deus, cuja ordem é que
os homens sejam levados à salvação através da santificação
(2 Tessalonicenses 2:13). Ele os escolheu para que fossem
santos (Efésios 1:4). São eleitos para o perdão e para a vida,
através da santificação (1 Pedro 1:2). Se vocês puderem anular

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a lei dos imutáveis juízos de Deus ou corromper Aquele que
o Pai selou, fazendo com que vá frontalmente contra o Seu
mandamento, então poderão ir para o céu na condição em
que se encontram. Mas, esperar que Cristo os salve enquanto
não forem convertidos, é esperar que Ele Se revele infiel
ao Seu encargo. Ele jamais salvou nem salvará uma alma
que não Lhe tenha sido dada pelo Pai na eleição, e levada
a Ele por um chamado eficaz (João 6:37,44). Estejam
certos de que Cristo não salvará pessoa alguma de forma
contrária à vontade do Pai.

(2) Salvar os homens em seus pecados, significaria


profanar todos os atributos de Deus.
A Suajustiça. A justiça do julgamento de Deus está em
retribuir a todos segundo as suas obras. Ora, se os homens
semeassem para a carne e colhessem do Espírito vida eterna,
onde ficaria a glória da justiça divina, uma vez que seria
dada ao ímpio tal qual é dada ao justo?
A Sua santidade. Se Deus não apenas salvasse os pe~
cadores, mas os salvasse em seus pecados, Sua tão pura e
irrepreensível santidade seria extremamente deturpada. Aos
olhos santíssimos de Deus, aqueles que ainda não foram
santificados são piores do que um porco ou do que uma
víbora. Seria uma extrema profanação da infinita pureza da
pessoa de Deus, permitir que tais elementos habitassem com
Ele. Eles não podem suportar o Seu julgamento e não
poderiam permanecer na presença dEle. Se Davi que era
santo não agüentou tal coisa em sua casa, nem mesmo diante
de seus olhos (Salmo 101 :3,7), como podemos pensar que

78
àqueles que não iriam manifestar qualquer agradecimento?
Será que o Deus sapientíssimo, que nos proibiu de fazê-
-lo, iria lançar Suas coisas santas aos cães e Suas pérolas aos
porcos, os quais não iriam fazer outra coisa senão voltar-se
novamente e dilacerá-lo? Isto seria, realmente, fazer com que
a misericórdia fosse desprezada. A sabedoria requer que a
vida seja dada conforme a honra de Deus, e que Deus cuide
de Sua glória, bem como da felicidade do homem. Seria
uma desonra para Deus outorgar as Suas mais preciosas
riquezas àqueles que têm maior prazer nos seus pecados do
que nos deleites celestiais que Ele oferece. Deus perderia
o louvor e a glória de Sua graça, se Ele a lançasse sobre aque-
les que não apenas são indignos dela, mas também não a
desejam.
Além disso, as misericórdias de Deus não são próprias
para os que não são convertidos. A sabedoria de Deus é
vista em coisas que são próprias umas às outras: os meios
aos fins, o objetivo ao poder de realização, a qualidade do
dom, a capacidade do receptor. Ora, se Cristo levasse o
pecador não regenerado para o céu, esse pecador se sentiria
tão mal ali como um animal que fosse levado à bonita sala
de uma sociedade de homens eruditos, uma vez que a pobre
criatura preferiria estar pastando com seus companheiros
no campo. Digam-me: o que um homem não santificado
faria no céu? Não poderia ficar contente lá porque nada é
apropriado para ele. O lugar não lhe convém e sentir-se-ia
completamente deslocado, como um peixe fora d'água. A
companhia não poderia agradá-lo, pois que comunhão têm
as trevas com a luz, a corrupção com a perfeição, a baixeza

80
e o pecado com a glória e a imortalidade? O trabalho ali não
o agradaria, pois os cânticos do céu não se adaptam à sua
boca nem agradam aos seus ouvidos. Quem poderia cativar
um jumento com a música ou levá-lo junto ao seu órgão e
esperar que ele produza uma melodia ou mantenha o ritmo
com um coral harmonioso? Se ele tivesse habilidade, não
teria vontade para fazer tal coisa e, portanto, não teria prazer
nisso. Seria uma ofensa para um doente enfraquecido pôr
diante dele uma mesa repleta de iguarias deliciosas. Se o
pobre pecador considera um sermão muito longo e comenta
sobre um culto: "que canseira!", imagine quão miserável ele
se sentiria ao pensar na eventualidade de estar engajado
num culto eterno!
A Sua imutabilidade, ou a Sua onisciência ou a Sua
onipotência. Está aprovado no céu e registrado no decreto
da corte celestial, que somente os limpos de coração verão a
Deus (Mateus 5: 8). Ora, se Cristo levar pessoas não conver-
tidas para o céu sem o conhecimento do Pai, onde estará a
onisciência de Deus? Se Ele as levar contra a vontade do
Pai, onde estará a onipotência de Deus? Ou se Ele tiver
que mudar a vontade do Pai, onde estará a imutabilidade
de Deus?
Pecador, será que você não vai desistir de sua inútil
esperança de ser salvo nesta condição pecaminosa? Bildade
diz: " ... será a terra deixada por tua causa? Remover-se-ão as
rochas do seu lugar?" (Jó 18:4). Será que posso argumentar
ainda mais com você? Serão as leis do céu alteradas por sua
causa? Serão os fundamentos eternos transtornados por sua
causa? Irá Cristo confundir a onisciência do Pai ou encurtar

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o braço do Seu poder eterno por sua causa? Será a justiça
divina violada por sua causa? Ou o brilho de Sua santidade
empanado por sua causa? Oh, a impossibilidade, o absurdo,
a blasfêmia de tal confiança! Pensar que Cristo o salvará
nessa condição é fazer do Salvador um pecador e ofender
a infinita Majestade como nenhum dos ímpios da Terra
ou nenhum dos demônios do inferno jamais fez ou pode-
ria fazer;_ e nem assim você vai desistir dessa esperança
blasfema?

(3) Salvar os homens em seus pecados seria ir contra


a palavra de Cristo. Não precisamos dizer: "Quem subirá ao
céu? (Isto é, trazer do alto a Cristo.) Ou: quem descerá ao abismo?
(Isto é, tornar a trazer dentre os mortos a Cristo.) ... A palavra está
junto de ti"(Romanos 10:6-8). Você concorda que Cristo vai
encerrar a controvérsia? Ouça, então, as Suas próprias pala-
vras: " ... se não vos converterdes ... de modo algum entrareis no
reino dos céus", "... necessário vos é nascer de novo", "... se eu não
te lavar, não tens parte comigo", "...se vos não arrependerdes, todos
de igual modo perecereis" (Mateus 18:3; João 3:7; João 13:8;
Lucas 13: 3). Poder-se-ia pensar que uma só palavra de Cristo
seria suficiente; mas quão freqüente e sinceramente Ele a
reitera: "Em verdade, em verdade te digo que aquele que não
nascer de novo, não pode ver o reino de Deus" (João 3:3). Sim,
Ele não somente afirma, porém também prova a necessida-
de do novo nascimento da carnalidade e da pecaminosidade
do primeiro nascimento, em razão das quais o homem não
está mais apto para o céu do que os animais para o aposento
do rei. E você ainda descansará na sua confiança altiva,

82
frontalmente contrária às palavras de Cristo? Ele teria que
agir completamente contra a lei do Seu reino e contra as regras
do Seu julgamento para salvá-lo nesse estado.

(4) Salvar os homens em seu estado pecaminoso seria


ir contra o juramento de Cristo. Levantando a Sua mão ao
céu, Ele jurou que aqueles que permanecessem na in-
credulidade e não conhecessem os Seus caminhos (isto é,
fossem ignorantes deles ou desobedientes a eles), não
entrariam no Seu descanso (Hebreus 3: 18). Ó pecador, você
ainda não acreditará que Ele está falando muito sério? O
concerto da graça está confirmado por um juramento e selado
com sangue; mas tudo isso ficaria anulado e seria achado
um novo caminho para o céu, caso você fosse salvo nesse
estado, isto é, vivendo e morrendo sem santificação. Nos
Seus tratos com os homens Deus condescendeu ao máximo
que Sua honra Lhe permite. Os homens não podem ser sal-
vos enquanto não forem convertidos, a menos que consigam
que um outro concerto seja feito e que toda a estrutura do
evangelho - que foi estabelecida para sempre com tão ve-
neráveis solenidades - seja completamente alterada. Não
devem estar loucos aqueles que esperam tal coisa?

(5) Salvar os homens em seus pecados seria ir contra


a honra de Cristo. Deus manifestará Seu amor pelo pecador
de tal maneira que ao mesmo tempo revelará Seu ódio
pelo pecado. Portanto, aquele que invoca o nome de Jesus,
precisa apartar-se da iniqüidade e renunciar a toda a
impiedade; e aquele que tem a esperança de vida em Cristo,

83
precisa purificar-se a si mesmo como Ele é puro, doutro
modo Cristo seria considerado um aprovador do pecado
(2 Timóteo 2:19; Tito 2:12; 1 João 3:3). O Senhor Jesus quer
que o mundo inteiro saiba que embora Ele perdoe o pecado
isso não significa que Ele protege o pecado. Se um homem
santo como Davi falou, ':Apartai-vos de mim, todos os que
praticais a iniqüidade ... " (Salmo 6: 8), e fechou as suas portas
contra el~s (Salmo 101:7), não devemos esperar muito mais
da santidade de Cristo? Seria digno de Sua honra ter
cachorros à mesa, ou abrigar porcos juntamente com Seus
filhos, ou fazer do seio de Abraão um ninho de víboras?

( 6) Salvar os homens em seu estado pecaminoso seria


agir contra os Seus ofícios. Deus O elevou a Príncipe e
Salvador (Atos 5:31). Ele estaria agindo contra esses atributos
se salvasse os homens em seus pecados. É ofício do rei ser
um terror para os malfeitores, e um louvor para os que pra-
ticam o bem. "... é ministro de Deus, e vingador para castigar o
que faz o mal" (Romanos 13 :4). Ora, se Cristo favorecesse os
ímpios, ou seja, os que permanecem em seus pecados, e
levasse para reinar com Ele aqueles que não queriam que
Ele reinasse sobre eles, então estaria agindo completamente
contra os Seus ofícios. Portanto, Ele reina para que possa
colocar os Seus inimigos debaixo de Seus pés. Se por outro
lado Ele os acolhesse em Seu seio, frustraria o objetivo de
Seu poder real. Pertence a Cristo, na qualidade de Rei, o
poder de subjugar os corações e aniquilar as concupiscên-
cias de Seus escolhidos (Salmos 65: 5 e 11 O: 3). Que rei levaria
rebeldes em franca hostilidade para sua corte? O que

84
for racional então não há razão para que vocês continuem
como estão, mas há toda a razão do mundo para que se voltem
imediatamente e se arrependam.
O que direi? Eu poderia esgotar-me neste argumento.
Oh, se vocês pelo menos me ouvissem; se começassem
agora uma nova vida! Não querem ser purificados? Quando
isso vai acontecer? Amigos, sentem-se e considerem o argu-
mento que acabo de mencionar. Não seria melhor voltarem?
Venham, e raciocinemos juntos. Pergunto: é bom para vocês
estarem aqui? É bom experimentar se Deus vai cumprir a
Sua Palavra e se endurecerem num conceito de que tudo
está bem enquanto permanecem não santificados?
Que tristeza sinto por tais pecadores! Terão que perecer,
finalmente, aos milhares? Que argumentos usarei com eles
que ainda não tenho usado? "... de que outra maneira procederia
com afilha do meu povo?" (Jeremias 9:7).
"Ó Senhor Deus, ajuda-me. Que tristeza! Devo deixá-los,
então? Se eles não me ouvirem, pelo menos que Tu me ouças. Oh,
que eles pudessem viver na Tua presença! Senhor, salva-os, ou
perecerão. Meu coração se derreteria ao ver suas casas queimando
enquanto estivessem dormindo profundamente em suas camas; e
não se comoverá, então, minha alma dentro de mim ao vê-los caindo
na perdição eterna? Senhor, tem compaixão, e salva-os do inferno.
Manifesta o· Teu poder divino, e a obra será feita."

88
4
As Características dos que não são
Convertidos
Enquanto permanecemos à distância, fazendo afirmações
generalizadas, há poucos frutos a esperar; é a luta corpo-a-
-corpo que opera os resultados. Davi não foi despertado
pela hesitação do profeta, à distância, com insinuações
parabólicas. Natã foi forçado a aproximar-se dele e a dizer-
-lhe claramente: "Tu és este homem". Poucos negariam
verbalmente a necessidade do novo nascimento, mas eles têm
uma auto-confiança enganadora de que tal transformação
não tem que ser feita agora. E por saberem que estão isentos
daquela hipocrisia grosseira - à qual a religião é apenas coisa
aparente - que engana os outros e encobre maus desígnios,
confiam em sua sinceridade e não desconfiam da hipocrisia
mais íntima, que constitui um grande perigo e com a qual
o homem engana a sua própria alma. Todavia o enganoso
coração do homem é uma tão incomparável fraude, uma
auto-ilusão tão dominadora, e uma doença tão fatal, que não
sei qual é maior: a dificuldade ou a necessidade da obra
esclarecedora em que estou empenhado. Pobres incrédulos!
Eles precisam ser desenganados; do contrário perecerão! Mas
como acontecerá isso?

89
"Ajuda-me, ó Luz que tudo penetras, e permita que o Teu olho
discernidor desvenda ofundamento miserável do auto-enganador.
Guia-me, ó Senhor Deus, como fizeste com os profetas, aos
recônditos das ilusões, penetra os corações pecadores e revela as
perversidades secretas que estão ocultas na escuridão. Oh, envia o
Teu anjo adiante de mim para abrir as trancas de seus corações,
assim como Tu fizeste com Pedro, e faze com que os portões de
ferro se abram de repente e espontaneamente. E à semelhança de
Jônatas, cujos olhos se iluminaram com o mel ao prová-lo, concede-
-me, ó Senhor, que as pobres almas enganadas com as quais preciso
tratar, ao lançarem seus olhos sobre estas linhas tenham suas mentes
iluminadas, suas consciências convencidas e despertadas; que
possam ver com seus olhos, ouvir com seus ouvidos e ser convertidas;
e que Tu possas curá-las."
Antes de continuar, precisamos dizer que sem dúvida
nenhuma os homens estão sinceramente persuadidos de que
suas condições e seus corações são bons, quando na verdade
não são saudáveis. Ouçam o próprio Cristo afirmando que,
como no caso de Laodicéia, os homens podem ser desgra-
çados, miseráveis, pobres, cegos e nus e, contudo, não saberem
disso; de fato, eles se julgam ricos e amadurecidos na graça
(Apocalipse 3: 17). "Há uma geração que é pura aos seus olhos,
e que nunca foi lavada de sua imundícia" (Provérbios 30: 12).
Quem mais do que Paulo já esteve persuadido do seu
estado, enquanto ainda na condição de não convertido?
(Romanos 7 :9). Do mesmo modo, estão miseravelmente
enganados aqueles que acham que uma firme confiança é
uma evidência suficiente. Aqueles que não têm outra prova
melhor, senão uma forte convicção de que são convertidos,

90
(1) Os impuros. Estes são sempre conta dos entre os bodes
e têm os seus nomes mencionados em todas as listas ante-
riormente citadas.
(2) Os avarentos. Esses são sempre caracterizados co-
mo idólatras, e as portas do reino estão definitivamente
fechadas para eles.
(3) Os beberrões. Estes não somente se embebedam e
perdem a razão, mas também são fortes demais para bebidas
fortes. O Senhor enche a Sua boca de maldição contra eles
e declara que não herdarão o reino de Deus (Isaías 5: 11-12,22;
Gálatas 5:21).
(4) Os mentirosos. O Deus que não pode mentir
declarou-lhes que não terão lugar em Seu reino nem acesso
ao Seu monte; mas a porção deles é no lago de fogo, com o
pai das mentiras, de quem são filhos (Apocalipse 21 :8,27;
João 8 :44; Provérbios 6: 17).
(5) Os blasfemos. O fim destes, se não houver um pro-
fundo e pronto arrependimento, é a repentina destruição e
a infalível e inevitável condenação (Tiago 5:12; Zacarias 5:
1-3).
(6) Os escarnecedores e os caluniadores. Estes gostam
de difamar seu próximo, lançando-lhe em rosto toda a su-
jeira possível ou, pior ainda, ofendendo-o secretamente na
sua ausência (Salmo 15: 1,3; 1 Coríntios 5: 11 ).
(7) Os ladrões, os extorsionários. Estes são opressores
que afligem o pobre ou lesam seus irmãos sempre que se
lhes oferece uma oportunidade. Esses precisam saber que
Deus é o vingador dos inocentes (1 Tessalonicenses 4:6).
Ouçam, ó servos falsos, inúteis e roubadores; ouçam, ó

92
negociantes enganadores, ouçam a sua sentença! Deus
certamente fechará a porta para vocês e mudará seus tesou-
ros de injustiça em tesouros de ira, e fará com que sua prata
e seu ouro adquiridos desonestamente os atormentem, co-
mo um metal que queima a sua carne (Tiago 5:2-3).
(8) Todos os que vivem, geralmente, na profana ne-
gligência da adoração de Deus. Estes não ouvem a Sua
Palavra, não invocam Seu nome, não oram a Deus, não se
importam com as suas próprias almas nem com as almas de
seus familiares, mas vivem no mundo, sem Deus (João 8:47;
Jó 15:4; Salmo 14:4; Salmo 79:6; Efésios 2:12 e 4:18).
(9) Os amantes e freqüentadores de más companhias.
Deus declarou que será o destruidor de tais pessoas, e que
elas não entrarão no Seu repouso (Provérbios 9:6 e 13:20).
(10) Os escarnecedores da religião. Estes zombam da
vida reta e escarnecem dos mensageiros e dos diligentes ser-
vos do Senhor, de sua santa profissão, e se alegram com as
fraquezas e as falhas dos cristãos professos. "Ouvi, ó despre-
zadores", ouvi sua terrível condenação (Provérbios 19:29; 2
Crônicas 36: 16).
Pecador, considere sinceramente se você está incluído
numa dessas classes, pois se for esse o caso, você está no
fel da amargura e na escravidão da iniqüidade, visto que
todos esses têm os sinais em suas testas e são, sem dúvida
alguma, filhos da morte. E se assim for, que o Senhor Se
compadeça de nossas pobres congregações. Oh, quão
pequeno é o número que restará quando essas dez classes
forem excluídas.
Senhores, admiro-me dos esforços que fazem para

93
anda em suas culpas", "O homem que muitas vezes repreendido
endurece a cerviz, será quebrantado de repente sem que haja cura",
"Mas porque clamei e vós recusasses; porque estendi a minha
mão, e não houve quem desse atenção ... também eu me rirei na
vossa perdição, e zombarei, vindo o vosso temor" (Salmo 68:21;
Provérbios 29: 1 e 1:24-27).

B. Pois bem, imagino agora que muitos começarão a


bendizer-se e a pensar que tudo está bem, porque não podem
ser acusados desses pecados mais torpes. Mas preciso dizer-
-lhes que há um outro tipo de pessoas não santificadas,
que não têm os sinais nas testas, mas os têm de forma
mais secreta e encoberta. Essas pessoas freqüentemente
enganam-se a si mesmas e aos outros, passando por bons
cristãos, quando na realidade ainda não estão salvos. Muitos
não são descobertos até que a morte e o julgamento tragam
tudo à luz. Esses auto-enganadores parecem chegar até à
porta do céu certos de sua admissão, mas no fim não
conseguem entrar (Mateus 7:22). Rogo-lhes encarecidamente
que apliquem aos seus corações e retenham firmemente
esta reflexão que é um alerta, isto é, que multidões perecem
por causa de algum pecado secreto, o qual não está escondido
apenas dos outros, mas devido não perscrutarem seus próprios
corações, está escondido até deles mesmos. Um homem pode
estar isento de poluições patentes e, contudo, morrer por
causa de algum pecado que passa despercebido; e existem os
seguintes doze pecados ocultos, pelos quais almas descem
aos milhares para os recintos da morte eterna. Precisam
investigar cuidadosamente estes pecados e considerá-los

95
como marcas negras onde quer que se encontrem, e como
reveladores de um estado não regenerado e, se amam suas
vidas, notem os mesmos cuidadosamente com zelo santo
para que vocês não se revelem ser as pessoas referidas.
(1) Ignorância crassa e voluntária (Oséias 4:6). Oh,
quantas almas infelizes estão sendo mortas por este pecado,
embora pensem sinceramente que têm bons corações e que
estão preparadas para o céu. Este pecado é o assassino que
executa milhares silenciosamente, sem que nada suspeitem
e sem que vejam a mão que os destrói. Não importa quais
sejam as desculpas que apresentem para a ignorância, eles
descobrirão que ela é um pecado que destrói a alma (Isaías
27: 11; 2 Tessalonicenses 1:8; 2 Coríntios 4:3). Ah, como teria
afligido nossos corações se tivéssemos visto aquele horrível
espetáculo em que os pobres protestantes eram jogados num
celeiro e vinha um açougueiro, com suas mãos manchadas
com sangue humano, e os conduzia um por um de olhos
vendados para um cepo onde os matava um após outro em
grande número, a sangue frio. Mas seus corações devem sofrer
muito mais ao pensar nas centenas que a ignorância destrói
em segredo e conduz de olhos vendados para o cepo. Tomem
cuidado para que este não seja o seu caso. Não justifiquem a
ignorância; se pouparem esse pecado, saibam que ele não os
poupará; e será que alguém abrigaria um assassino em seu
seio?
(2) Reservas secretas quanto à entrega a Cristo.
Renunciar a tudo por Cristo, odiar pai e mãe, sim, renun-
ciar à própria vida por Ele, "duro é este discurso"(Lucas 14:26).
Alguns farão muitas coisas, mas não querem a religião que

96
os salvará, jamais chegam a ser totalmente devotados a
Cristo nem completamente submissos a Ele. Precisam ter o
doce pecado; não querem prejudicar-se a si mesmos; têm
exceções secretas para a vida, para a liberdade ou para a
posição social. Muitos aceitam a Cristo dessa maneira e
jamais levam em conta os Seus termos de auto-negação, nem
avaliam o custo; e este erro fundamental estraga tudo e os
arruína para sempre (Lucas 14:28-33).
(3) Formalidade na religião. Muitos descansam no lado
externo da religião e no cumprimento exterior de seus deveres
sagrados. E muitas vezes isto engana efetivamente os homens
e certamente os invalida mais do que a impiedade, à se-
melhança do que aconteceu com o fariseu. Ouvem, jejuam,
oram, dão esmolas, e portanto não admitirão que não estão
em ótimas condições espirituais. Entretanto, descansando na
obra feita e falhando no trabalho do coração, no poder inte-
rior e na vitalidade da religião, acabam caindo no fogo por
causa de sua esperança ilusória e da persuasão confiante de
que estão bem preparados e a caminho do céu. Oh, que
situação terrível quando a religião de um homem só serve
para endurecer seu coração e efetivamente iludir e enganar
a sua própria alma!
(4) O predomínio de motivos errados nos deveres san-
tos. Esta era a ruína dos fariseus. Oh, quantas almas infelizes
são destruídas por causa disso e caem no inferno antes que
descubram o seu erro! Fazem suas "boas obras" e pensam
que tudo está bem, mas não percebem que estão sendo
impulsionadas continuamente apenas por motivos carnais.
É verdade que até mesmo no caso dos verdadeiramente

97
santificados, às vezes objetivos carnais parecem renascer;
mas são sempre matéria de seu ódio e humilhação, e jamais
chegam a dominá-los, nem subjugá-los de novo. No entanto,
quando a mola mestra que comumente leva o homem aos
deveres religiosos é um objetivo carnal, tal como a satisfação
da consciência, a obtenção da reputação de que é religioso,
ser notado pelos homens, mostrar seus próprios dons e ta-
lentos, evitar a censura de que é uma pessoa profana e não
religiosa, ou coisa semelhante, isso revela um coração não
regenerado. Ó cristãos, se quiserem evitar o auto-engano
então dêem atenção não apenas às suas ações, mas também
aos seus motivos.
(5) Confiança em sua justiça própria. Isso é um mal
que destrói a alma. Quando os homens confiam na sua jus-
tiça própria, certamente rejeitam a de Cristo. Amados, vocês
precisam ser vigilantes em tudo, pois não apenas os seus
pecados podem arruiná-los mas também os seus deveres.
Talvez vocês jamais tenham considerado isso, mas é assim
mesmo; sem dúvida alguma, um homem tanto pode pere-
cer por causa de sua justiça aparente e de suas supostas
virtudes, como por causa de pecados crassos, ou seja, quando
ele confia em coisas como a sua justiça própria e as apresenta
diante de Deus para satisfazer a Sua justiça, apaziguar Sua
ira, buscar o Seu favor e obter o Seu perdão. Isso significa
demitir Cristo do Seu ofício e produzir um salvador a par-
tir de nossas obras e virtudes. Acautelem-se disso, cristãos
professos; vocês são muito atuantes, mas isso pode estragar
tudo. Quando tiverem feito o máximo e o melhor, fujam de
si mesmos para Cristo; reconheçam que suas justiças próprias

98
são como trapos imundos (Filipenses 3:9; Isaías 64:6).
(6) Uma secreta inimizade contra o rigor da religião.
Muitas pessoas moralmente corretas, cumpridoras de seus
deveres religiosos, têm uma amarga inimizade contra o ri-
gor apreciam esta solicitude nem gostam que os homens
sejam tão zelosos. Condenam os rigores da religião como se
fossem singularidade, indiscrição, zelo exagerado, e
consideram o pregador zeloso e o crente fervoroso nada
mais que extremistas. Tais homens não amam a santidade
como santidade (porque então amariam a perfeição da
santidade) e portanto são corruptos em seus corações, seja
qual for o bom conceito que tenham sobre si mesmos.
(7) O descanso num certo grau de religião. Quando
supõem que já possuem o suficiente para serem salvos,
deixam de olhar mais adiante, e assim apresentam-se ca-
rentes da graça verdadeira, graça essa que sempre leva os
homens a aspirarem à perfeição (Filipenses 3: 13; Provérbios
4:18).
(8) O predominante amor ao mundo. Esta é a real
evidência de um coração não santificado. "Se alguém ama o
mundo, o amor do Pai não está nele" (I João 2:15). Mas quão
freqüentemente este pecado esconde-se sob a capa da
confissão pública de fé. Sim, há um tal poder de engano
neste pecado que, muitas vezes, quando todos podem ver o
mundanismo e a cobiça existentes na pessoa, ela própria não
os pode enxergar em si mesma, e apresenta tantas desculpas
e pretextos para justificar seu amor pelo mundo que fica
cega e perece no seu auto-engano. Quantos e quantos cristãos
professos existem, cujos corações pertencem mais ao mundo

99
(10) Orgulho não mortificado. Quando os homens
apreciam mais os louvores dos seus semelhantes do que o
louvor de Deus, e colocam o coração na estima, no aplauso
e na aprovação humanos, é bem certo que estão vivendo
em pecado e longe da verdadeira conversão (João 12:43;
Gálatas 1: 10). Quando os homens não vêem, nem lamen-
tam, nem gemem sob o orgulho do próprio coração, é sinal
de que estão completamente mortos no pecado. Oh, quão
ocultamente esse pecado vive e reina em muitos corações;
e eles não sabem, mas desconhecem a si mesmos (João 9:40).
(11) Um dominante amor pelo prazer. Esta é uma
marca negra. Quando os homens dão à carne a liberdade
que ela deseja, e a mimam e a agradam, ao invés de negá-la
e dominá-la; quando o maior prazer é gratificar seus apetites
e satisfazer seus sentidos, tudo é falso, não obstante a
aparência que tenham de religião. Uma vida que satisfaz à
carne não pode agradar a Deus. "E os que são de Cristo,
crucificaram a carne ... " e têm o cuidado de subjugá-la como
a um inimigo (Gálatas 5:24; 1 Coríntios 9:25-27).
(12) Segurança carnal. Trata-se de uma confiança pre-
sunçosa de que já estão em boas condições. Muitos clamam
"paz e segurança", quando uma repentina destruição está
vindo sobre eles. Foi essa segurança que manteve as virgens
loucas adormecidas quando deveriam estar trabalhando;
que as manteve na cama, quando deveriam estar no mercado.
Foi só quando o noivo chegou que perceberam que lhes
faltava óleo; e enquanto foram comprá-lo, a porta se fechou.
Oxalá aquelas virgens loucas nunca tivessem deixado
sucessores! Haveria, no entanto, algum lugar onde eles não

101
estejam? Onde é que eles não habitam? Os homens desejam
agradar-se a si mesmos sobre bases sempre tão frágeis,
esperançosos de que sua condição seja boa; portanto não
se preocupam em mudar, e por causa disso perecem em
seus pecados. E você, leitor está em paz? Mostre-me as bases
sobre as quais a sua paz se firma. É a paz das Escrituras?
Você pode apresentar as marcas características de um
verdadeiro cristão? Pode apresentar evidências de que tem
algo mais que qualquer hipócrita do mundo já teve? Se
não pode, então tema essa paz mais do que qualquer aflição;
e saiba que uma paz carnal geralmente revela-se o maior
inimigo da alma, e enquanto sorri, beija e fala de maneira
agradável, ela fatalmente golpeia e destrói.
A esta altura parece-me ouvir meus leitores exclamando
como os discípulos: "Quem poderá ser salvo?" Separem de
nosso meio todas aquelas dez fileiras de profanos de um
lado, e depois tirem aqueles doze grupos de hipócritas auto-
-enganadores e os coloquem do outro lado, e digam-me se
não há um saldo que vai ser salvo. Quão poucas serão as
ovelhas que restarão quando todos esses forem afastados
e incluídos com os bodes. De minha parte, não tenho
esperanças de ver no céu nenhum dos meus numerosos
leitores que for encontrado entre estas vinte e duas classes
aqui mencionadas, a não ser que seja conduzido a uma ou-
tra condição através da conversão verdadeira.
E agora, consciência, faça o seu trabalho. Fale franca,
profunda e intimamente àquele que ouve ou lê estas linhas.
Se encontrar qualquer uma dessas marcas nele, deve declará-
-lo completamente impuro. Não minta. Não fale de paz

102
àquele a quem Deus não fala de paz. Não permita que o
sentimento a corrompa, nem que o amor próprio ou o
preconceito carnal a ceguem. Eu a intimo, pelo tribunal
celestial, que venha e testifique. Visto que você vai responder
por sua conta, apresente um relato verdadeiro sobre o
estado e a situação daquele que lê este livro. Consciência, irá
ficar calada numa hora como esta? Eu lhe suplico, pelo
Deus vivo, que diga a verdade. O homem é convertido ou
não? Ele se permite alguma forma de iniqüidade ou não?
Ele realmente ama, agrada, louva e se deleita em Deus acima
de todas as coisas ou não? Levante-se e dê uma resposta
definida.
Por quanto tempo essa alma viverá na incerteza? Ó cons-
ciência, apresente o seu veredito. Esse homem é um novo
homem ou não? Como você descobre isso? Ele passou por
uma completa e poderosa transformação ou não? Quando,
aonde e por quais meios foi realizada nele essa completa
transformação do novo nascimento? Fale, consciência; e se
você não pode dizer o tempo e o lugar, então poderia mos-
trar uma evidência bíblica de que a obra foi realizada? O
mesmo já foi tirado de seu falso fundamento, de sua falsa
esperança e de sua falsa paz, nas quais confiava? Ele já foi
profundamente convencido do pecado e de sua condição de
perdido e destruído? Foi livrado de si mesmo e de seus
pecados para render-se totalmente a Jesus Cristo? Ou será
que ele se encontra, até hoje, sob o poder da ignorância ou
na lama do mundanismo? Você não acha que ele é um
estranho à oração, um negligente da Palavra, um amante
deste presente século? Você não o pega, de vez em quando,

103
numa mentira? Não encontra o seu coração fermentado com
a malícia ou queimando de concupiscência, ou andando
segundo sua cobiça? Fale francamente sobre todos os pontos
antes mencionados. Você pode absolver esse homem (ou essa
mulher) de sua inclusão numa das vinte e duas classes aqui
descritas? Se for encontrado em qualquer uma delas, ponha-
-o de lado; a porção dele não é com os santos. Precisa ser
convertido e feito nova criatura, ou não poderá entrar no reino
de Deus.
Amados, não sejam seus próprios traidores. Não en-
ganem seus corações, não dêem suas mãos à sua própria
ruína por causa de uma cegueira voluntária. Estabeleçam
um tribunal em seus corações. Reúnam a palavra e a
consciência. "À Lei e ao Testemunho." Ouçam o que a Palavra
conclui a respeito de sua condição. Prossigam na busca até
descobrirem como está a sua condição. Se cometerem um
erro aqui, perecerão. É tal a deslealdade do coração, a sutileza
de temperamento e o engano do pecado, tudo conspirando
para iludir e lograr a pobre alma; e é tão comum e fácil
cometer um erro que há mil chances contra uma de que
vocês serão enganados, a menos que sejam atentos, radicais
e imparciais no exame de sua condição espiritual. Portanto,
sejam diligentes na busca, desçam até ao fundo, investiguem
tudo, ponham-se na balança, cheguem ao padrão do santuário
e tragam sua moeda para a pedra de toque. Satanás é o pai
da mentira; ele sabe como lidar com a vida; ele é perfeito
no negócio e não há nada que ele não possa imitar. Não há
uma graça sequer que possam desejar a qual ele não possa
falsificar. Sejam zelosos; não confiem nem mesmo em si

104
próprios. Cheguem-se a Deus para que Ele os perscrute e os
prove, para que Ele os examine e conheça o seu íntimo. Se
outros tipos de ajuda não forem suficientes para resolver
o assunto, e vocês ainda estiverem incertos, consultem um
fiel e piedoso ministro ou um amigo cristão. Não descansem
até que tenham certeza de sua segurança eterna.
"Ó Perscrutador dos corações, faça com que esta alma Te
busque, e ajude-a na sua busca."

105
5
As Misérias dos que não são
Convertidos
É tão indescritivelmente terrível o caso das almas não
convertidas, que às vezes tenho pensado que se eu pelo menos
pudesse convencer os homens de que ainda não estão
regenerados, metade da tarefa já estaria realizada.
Mas tenho descoberto por meio de tristes experiências,
que os não-santificados possuem tal espírito de apatia e sono-
lência que, embora convencidos de não serem regenerados,
permanecem sossegadamente descuidados. Através do amor
ao prazer sensual, ou do apego aos negócios mundanos, ou
do ruído e clamor das preocupações terrenas e afeições
carnais, a voz da consciência é abafada e os homens não ultra-
passam alguns frios desejos e propósitos frouxos de se
arrependerem e de se corrigirem.
É, portanto, da maior importância que eu não apenas
convença os homens de que não são convertidos, mas também
que me esforce para levá-los a sentir a terrível miséria de seu
estado.
Aqui, porém, logo de início encontro-me embaraçado.
Quem poderá falar o bastante aos que rumam para o inferno

106
nele, pela cegueira do seu coração (Efésios 4: 18). Ele não
conhece nem pode conhecer as coisas de Deus, porque elas
são discernidas espiritualmente (1 Coríntios 2: 14). Seus olhos
não podem ser abertos para a salvação, senão pela graça que
converte (Atos 26: 18). É filho das trevas e anda nas trevas.
Sim, a luz que está nele são trevas.
Deverei, então, fazer soar soturnamente a sua má sina,
ou ler a sua sentença, ou fazer soar em seu ouvido a terrível
trombeta do julgamento divino, pensando que isso faria
vibrar seus ouvidos, e alarmá-lo como aconteceu com Bel-
sazar, até mudar o seu semblante, relaxar suas juntas e seus
joelhos baterem um no outro? Que pena, ele não me ouviria,
ele não tem ouvidos para ouvir. Ou deverei chamar as filhas
da música e cantar o cântico de Moisés e do Cordeiro? Nem
assim ele vai se comover. Deverei cativá-lo com o som jubi-
loso, a encantadora canção e as boas novas do evangelho, com
os mais doces e atraentes chamados, consolações e confortos
das promessas divinas, tão admiravelmente grandes e
preciosas? Isso não o atingiria de modo salvador, a menos
que eu conseguisse ouvidos para ele assim como fazê-lo ouvir
as boas novas.
O que fazer então? Deverei mostrar-lhe o lago que arde
com fogo e enxofre, ou abrir-lhe a caixa de nardo puro, tão
precioso, que enche o mundo todo com o seu perfume, e
esperar que o aroma balsâmico de Cristo e o cheiro de Suas
vestimentas o atraiam? Lastimavelmente, pecadores mortos
são como ídolos mudos: têm bocas, mas não falam; têm olhos,
mas não vêem; têm ouvidos, mas não ouvem; têm narizes, mas
não cheiram; têm mãos, mas não apalpam; têm pés, mas não

108
andam; nem som algum sai de sua garganta. São destituídos de
sentimento e ação espirituais.
Mas deixem-me tocar nos seus sentidos e desembainhar
a espada da Palavra; contudo, mesmo escolhendo as minhas
flechas na aljava de Deus e as lançando sobre o coração, ele
não as sentirá, pois como poderia sentir, visto que perdeu
todo o sentimento? (Efésios 4: 19) Portanto, apesar da "ira de
Deus habitar nele", como também o enorme peso de muitos
pecados, ele se acha à vontade como se coisa alguma o afli-
gisse. Em suma, carrega um corpo morto num corpo vivo e
sua carne nada mais é do que o esquife ambulante de uma
mente corrupta, duas vezes morta (Judas, versículo 12).
Qual o caminho que deverei seguir, então, para chegar
até o miserável objeto com o qual tenho de tratar? Quem
poderá fazer o coração de pedra comover-se ou fazer a carca-
ça sem vida sentir e mover-se? O Deus que é capaz de suscitar
das pedras filhos a Abraão, que ressuscita os mortos, que
liquefaz as montanhas, que faz brotar água da rocha, que
gosta de operar além das esperanças e da fé do homem, que
povoa a Sua Igreja a partir de ossos secos - Ele é capaz de
fazer isso. Portanto, ajoelho-me diante do Deus altíssimo,
e como nosso Salvador orou junto ao sepulcro de Lázaro,
como a sunamita correu para o homem de Deus implorando
pelo filho morto, assim os seus ministros os levam nos braços
da oração para aquele Deus em quem se encontra o seu
auxílio.
"Ó todo-poderoso Jeová, que operas e ninguém pode impedir-
-Te; Tu, que tens as chaves da morte e do inferno, que Tu Te
compadeças das almas mortas que aqui jazem sepultadas, e

109
usurpação! Quão penetrante foi o lamento de Saul na sua
situação extrema: "... os filisteus guerreiam contra mim, e Deus se
tem desviado de mim ... " (1 Samuel 28: 15). Pecadores, o que
farão no dia da visitação do Senhor? Para onde fugirão a fim
de obter auxílio? Onde deixarão a sua glória? O que farão
quando os filisteus os perseguirem, quando o mundo lhes
apresentar a sua despedida eterna, quando precisarem dizer
adeus aos amigos, casas e terras, para sempre? O que farão,
então, aqueles que não têm um Deus a quem recorrer?
Apelarão para Ele? Implorarão a Sua ajuda? Ai de vocês,
Ele não vai reconhecê-los como filhos, não vai dar atenção a
vocês, porém os mandarão embora, dizendo: "nunca vos
conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniqüidade"
(Mateus 7:23).
Aqueles que sabem o que é ter um Deus a quem recorrer,
um Deus em quem viver, conhecem um pouco a terrível
miséria de viver sem Deus. Isto fez com que um homem
santo clamasse: "Deixem-me ter Deus ou nada ter. Deixem-
-me conhecê-10 e à Sua vontade e aquilo que O agrada; e
que eu possa ter gozo nEle ou jamais terei entendimento
para conhecer alguma outra coisa!"
Ora, vocês não estão somente sem Deus; Deus está con-
tra vocês. Oh, se Deus permanecesse neutro, embora não os
reconhecesse como filhos nem os ajudasse, sua situação não
seria tão profundamente miserável. Ainda que Deus desistisse
das pobres criaturas a favor da vontade de seus inimigos para
que fizessem o pior com elas, e embora as entregasse aos
atormentadores para que os demônios as dilacerassem e as
torturassem até o máximo dos seus poderes e habilidades,

111
isso não seria tão horrível como a plena ira divina. Mas o
próprio Deus vai Se colocar contra os pecadores; e, acre-
ditem: "Horrenda coisa é cair nas mãos do Deus vivo"(Hebreus
10:31). Não há amigo como Ele nem há inimigo como Ele.
Assim como o céu está acima da terra, a onipotência acima
da impotência, assim tão mais terrível é cair nas mãos do
Deus vivo do que nas garras de ursos e leões, sim, de feras
ou demônios. O próprio Deus será o seu atormentador;
a sua destruição virá da presença do Senhor (2 Tessalonicenses
1:9).
Se Deus é contra vocês, quem será por vocês? "Pecando
homem contra homem, os juízes o julgarão; pecando, porém, o
homem contra o Senhor, quem rogará por ele?" (1 Samuel 2: 25).
"Tu, tu és terrível; e quem subsistirá à tua vista se te irares?" (Salmo
76:7). O que ou quem os libertará de Suas mãos? O dinheiro?
"Não aproveitam as riquezas no dia da ira ... " (Provérbios 11 :4).
Reis ou guerreiros? Não: "... e diziam aos montes e aos rochedos:
caí sobre nós, e escondei-nos do rosto daquele que está assentado
sobre o trono, e da ira do Cordeiro; porque é vindo o grande dia da
sua ira; e quem poderá subsistir?"(Apocalipse 6: 15-17).
Pecador, penso que você deve sentir isso como um punhal
no seu coração, isto é, saber que Deus é seu inimigo. Oh,
para onde você irá? Onde se abrigará? Não há esperança para
você, a menos que deponha as suas armas, peça perdão e
consiga que Cristo Se posicione como seu amigo e Se recon-
cilie com você. Se não for assim, então pode ir para algum
horrível deserto e lá definhar em tristeza, e enlouquecer por
causa da angústia do coração e do horrível desespero. Mas
em Cristo há uma possibilidade de misericórdia, há até

112
filhos - mas Ele tem um desprazer habitual e fixo contra
você. A natureza de Deus é infinitamente contrária ao peca-
do e, portanto, não pode ter prazer num pecador que não
está em Cristo.
Oh, que miséria é esta, a de estar fora da graça, sim, sob
a ira de Deus; esse Deus que poderia mais facilmente deixar
de lado Sua natureza e deixar de ser Deus do que deixar de
estar contra você e de detestá-lo, a não ser que você seja
transformado e renovado. Oh, pecador, como você ousa
pensar a respeito do brilhante e radiante sol da pureza, ou da
magnificência da glória da santidade de Deus? "... as estrelas
não são puras aos seus olhos." Ele "se curva para ver o que está
nos céus e na terra" (Jó 25:5; Salmo 113:6). Oh, esses olhos
penetrantes de Deus! O que eles enxergam em você? E ainda
não tem interesse em Cristo, para que Ele implore a seu favor?
Acho que Ele deve ouvir você clamando, atônito, com os
bete-semitas: "Quem poderia estar em pé perante o Senhor, esse
Deus santo?"
O poder de Deus está apontado como um poderoso ca-
nhão contra você. A glória do poder de Deus será demonstrada
na surpreendente confusão e destruição daqueles que não
obedecem ao evangelho. Ele fará conhecido o Seu poder neles
(Romanos 9:22), atormentando-os poderosamente. Foi com
essa finalidade que Ele os levantou: "para que pudesse fazer
conhecido o seu poder"(Romanos 9: 17). Ó homem, você é capaz
de contender com o seu Criador?
Pecador, o poder da ira de Deus está contra você, e o
poder e a ira unidos fazem um trabalho terrível. Seria melhor
que tivesse o mundo todo em guerra contra você do que o

115
poder de Deus. Não há como escapar de Suas mãos, não há
como quebrar as Suas cadeias. "Quem, pois, entenderia o trovão
do seu poder?" (Jó 26:14). Infeliz o homem que o entenderá
por ser necessário senti-lo! "Se quiser contender com ele, nem a
uma de mil coisas lhe poderá responder. Ele é sábio de coração,
poderoso em forças; quem se endureceu contra ele e teve paz? Ele é
o que transporta as montanhas, sem que o sintam e que as transtorna
no seu furor. O que remove a terra do seu lugar, e as suas colunas
estremecem. O que fala ao sol, e ele não sai, e sela as estrelas ...
Quem lhe dirá:que fazes? Deus não revogará a sua ira; debaixo
dele se encurvam os auxiliadores soberbos"(Jó 9:3- 13). E você se
sente capaz de competir com tal antagonista? "Ouvi pois isto,
vós que vos esqueceis de Deus, para que vos não faça em pedaços,
sem haver quem vos livre"(Salmo 50:22). Submeta-se à miseri-
córdia. Não permita que a poeira e o restolho oponham-se
ao Todo-poderoso. Não ponha sarças e espinheiros contra Ele
na batalha, para que Ele não Se vá contra eles e justamente
os consuma. Mas apodere-se de Sua força, para que possa
fazer paz com Ele (Isaías 27:4-5). '54i daquele que contende com
o seu Criador!"(Isaías 45:9).
A sabedoria de Deus está preparada para arruinar você.
Ele já armou Suas setas e já preparou instrumentos de morte,
e todas as coisas estão prontas (Salmo 7:11-13). Seus juízos
estão contra você, para planejar a sua destruição (Jeremias
18: 11 ). O Senhor Se ri de você ao ver como será apanhado e
preso na armadilha, no dia mal. "O Senhor se rirá dele, pois vê
que vem chegando o seu dia" (Salmo 37: 13). Ele assiste à sua
queda vigorosa e rápida, contraindo suas mãos, puxando seus
cabelos, dilacerando sua carne, rangendo seus dentes por

116
causa da angústia e perplexidade do coração, ao sentir que
está irremediavelmente perdido no poço da destruição.
A verdade de Deus está ajuramentada contra você. Se
Ele é fiel e verdadeiro, você vai perecer se continuar no
caminho em que está. A menos que Ele não seja fiel à Sua
palavra, você vai morrer se não se arrepender. ((Se formos infiéis,
ele permanece fiel: não pode negar-se a si mesmo" (2 Timóteo
2:13). Ele é fiel às Suas ameaças bem como às Suas promes-
sas, e demonstrará Sua fidelidade em nossa destruição, se
não crermos. Deus lhe tem falado tão claramente quanto
pode ser dito, que se Ele não o lavar não tem parte com Ele;
se fizer segundo a carne, morrerá; se não for convertido, de
modo algum entrará no reino do céu (João 13:8; Romanos
8:13; Mateus 18:3). Amados, assim como a imutável fideli-
dade de Deus na Sua promessa e juramento pode propiciar
sólida consolação aos crentes, igualmente, no que diz respeito
aos incrédulos, pode produzir irremovível consternação e
confusão.
Oh, pecador, diga-me o que pensa a respeito de todas as
ameaças de Deus que ali estão registradas contra você?
Acredita que são verdadeiras ou não? Se não, você é um
miserável infiel. Mas, se crê nelas, que coração inflexível é o
seu, visto que anda calmamente para cima e para baixo
quando a verdade e a fidelidade de Deus estão empenhadas
em destruí-lo! A Bíblia toda testifica contra você, enquanto
permanece uma pessoa não convertida. Ela a condena em
cada uma de suas páginas, e como o rolo de Ezequiel, é escrito
para você, por dentro e por fora, com lamentação, pesar e
tristeza. E tudo isso certamente virá sobre você, se não se

117
arrepender. "... até que o céu e a terra passem, nem um jota ou um
til se omitirá da lei" (Mateus 5: 18).
Agora, junte tudo isso e diga-me se a situação daquele
que não é convertido é ou não é deploravelmente miserável?
Da mesma maneira que sabemos de pessoas que se uniram
por um juramento e por uma maldição para matar Paulo,
assim você precisa saber, ó pecador, que todos os atributos
do Deus infinito estão unidos para castigá-lo. Ó homem, o
que vai fazer? Para onde vai fugir? Se a onisciência de Deus
pode achá-lo, você não escapará. Se o Deus fiel e verdadeiro
levar em consideração o Seu juramento, você perecerá, a não
ser que se arrependa. Se o Todo-poderoso tem poder para
atormentá-lo, você vai ser completamente miserável de alma
e corpo por toda a eternidade, a menos que isso seja impedido
por uma rápida conversão.

2. Toda a criação de Deus está contra vocês. "... toda a


criação", diz Paulo, "... geme e está com dores de parto ... "
(Romanos 8: 22). Mas qual a causa que faz a criação gemer?
O terrível abuso de estar sujeita ao serviço das concupiscências
dos homens não santificados. E a criação geme para quê?
Para libertação e livramento desse abuso, pois "a criação ficou
sujeita a essa escravidão, não por sua vontade" (Romanos 8:20-
21). Se as criaturas irracionais e inanimadas pudessem falar
e raciocinar, iriam gritar como estando sob uma escravidão
insuportável, devido serem vituperadas pelos ímpios, ou seja,
por serem usadas de forma que contraria suas naturezas e os
fins para os quais o grande Criador as criou. Há um pensa-
mento de um eminente teólogo, que diz: "Se a bebida que o

118
beberrão toma fosse racional como o homem, e pudesse
conhecer quão abusivamente ela é usada, gemeria no barril
contra ele; gemeria no copo contra ele; gemeria na garganta
dele; gemeria no estômago dele; lançaria acusações no seu
rosto, se pudesse falar. E se Deus abrisse a boca de Suas
criaturas, como fez com a boca da jumenta de Balaão, a capa
do homem orgulhoso gemeria contra ele. Não haveria um.a
só criatura que não gemesse contra ele, se soubesse como é
espezinhada pelo homem não convertido. A terra iria gemer
para suportá-lo; o ar iria gemer para dar-lhe a respiração;
sua casa iria gemer para enxotá-lo; sua cama iria gemer para
dar-lhe o descanso; a comida, para nutri-lo; as roupas, para
cobri-lo; e o animal, para dar-lhe qualquer ajuda e conforto,
enquanto ele vivesse em pecado contra Deus".
Penso que isso deve ser um horror para uma alma não
convertida, isto é, pensar que é um peso para a criação.
"... corta-a; por que ocupa ainda a terra inutilmente?" (Lucas
13:7). Se as criaturas inanimadas pudessem falar, a comida
que você come diria: "Senhor, eu tenho que nutrir um patife
como este e dar-lhe a minha força para que ele Te desonre?
Não: ao invés disso, vou estrangulá-lo, se Tu me permitires".
O próprio ar diria: "Senhor, sou obrigado a dar respiração a
este homem para que use a sua língua contra o céu, escarneça
do Teu povo, e dê vazão ao seu orgulho, à sua ira, à sua
conversa imunda e vomite heresias e blasfêmias contra Ti?
Não, basta uma palavra Tua e ele ficará sem vida". Seu próprio
animal de carga, diria: "Senhor, tenho que carregá-lo para
praticar seus ímpios propósitos? Não, quebrarei os seus os-
sos, encurtarei os seus dias, se Tu me-permitires". É homem

119
ímpio. A terra geme embaixo dele, o inferno anseia por ele,
até que a morte satisfaça a ambos. Enquanto o Senhor dos
Exércitos estiver contra um homem, esteja certo de que o
exército do Senhor e todas as criaturas também estarão contra
ele, como se estivessem em guerra, até que, com a sua
conversão, a controvérsia entre Deus e ele seja resolvida, e
Deus faça um concerto de paz entre as criaturas e ele (Jó 5:22-
24; Oséias 2: 18-20).

3. Satanás exerce todo seu poderio sobre vocês. Vocês estão


presos nas garras do leão que ruge o qual está disposto a
devorá-los (1 Pedro 5 :8); "... desprendendo-se dos laços do diabo>
em que à vontade dele estão presos" (2 Timóteo 2:26). Esse é o
espírito que opera nos filhos da desobediência (Efésios 2:2).
São escravos do diabo e praticam suas concupiscências. Ele
é o príncipe das trevas deste mundo (Efésios 6: 12), isto é,
dos pecadores ignorantes que vivem nas trevas. Vocês sentem
piedade dos pobres indígenas que adoram o diabo como seu
deus. Mas pensem um pouquinho se esse não é seu próprio
caso. A miséria comum de todos os que não são santificados
é que o diabo é o seu deus. Não que eles tencionem prestar-
-lhe essa homenagem. Estarão prontos para resistir e contestar
aquele que disser tal coisa a respeito deles. Entretanto fazem
tudo isso enquanto servem o diabo e vivem sob seu domínio.
"... sois servos daquele a quem obedeceis ... " (Romanos 6: 16). Oh,
quantos então serão classificados como verdadeiros servos
do diabo, os quais se consideram filhos de Deus! Tão logo
que ele lhes ofereça um prazer pecaminoso ou uma oportuni-
dade para a sua vantagem ilegal, vão aceitá-la imediatamente.

120
Se ele sugerir uma mentira ou propuser-lhes uma vingança,
prontamente obedecerão. Se ele lhes proibir de ler a Palavra
de Deus ou de orar, vocês ouvirão; portanto, são seus servos.
De fato, ele se esconde atrás da cortina, age nas trevas e os
pecadores não vêem quem os impele, mas ele os conduz o
tempo todo. Sem dúvida alguma, o mentiroso não pretende
servir a satanás, a não ser para sua própria vantagem; contudo,
é satanás que permanece oculto e coloca o intento no coração
dele. Certamente quando Judas vendeu seu Mestre por
dinheiro e os caldeus e os sabeus saquearam Jó, não
tencionavam prestar culto ao diabo, e sim satisfazer sua
própria sede de cobiça (João 13:27; Jó 1:12, 15, 17). Os homens
podem ser verdadeiros escravos e presas fáceis do diabo, sem
o saberem; mais ainda, podem iludir-se a si mesmos pen-
sando que são livres!
Vocês ainda estão na ignorância e sem se voltarem das
trevas para a luz? Receio que estejam sob o poder de satanás.
Vivem na prática espontânea de algum pecado revelado?
Saibam que pertencem ao diabo. Será que vivem em con-
tenda, inveja ou malícia? Verdadeiramente ele é o seu pai.
Que situação terrível! Entretanto, satanás pode prover seus
escravos de vários prazeres; contudo, isso visa somente
conduzi-los à perdição eterna. A serpente vem com o fruto
em sua boca mas, como foi no caso de Eva, vocês não vêem o
ferrão mortal. Aquele que é agora o seu tentador, será um
dia o seu atormentador. Oh, se eu pudesse pelo menos fazê-
-los ver que servem a um mestre tão maligno, que honram
um tirano completamente sem misericórdia, cujo prazer
é assegurar a sua perdição e destruição, e aquecer cada vez

121
mais a fornalha onde vocês serão queimados durante milhões
e milhões de eras.

4. A culpa de todos os seus pecados permanece como uma


montanha sobre vocês. Ó infelizes, vocês não o sentem, mas
é isso que sela a sua miséria. Enquanto não forem convertidos
nenhum de seus pecados é apagado; eles são todos registrados
contra vocês. A regeneração e a remissão nunca se separam;
os que não são santificados não são justificados nem
perdoados. É coisa terrível estar em débito, mas acima de
tudo, é coisa terrível estar em débito com Deus; não há um
aprisionamento tão terrível como o proveniente de Deus, não
existe uma prisão tão sombria como a procedente dEle.
Olhem para um pecador esclarecido que sente o peso de sua
própria culpa; oh, quão terríveis são os olhares de Deus, quão
horrorosas as lamentações, do pecador! Seus confortos são
transformados em amarguras, seu orvalho em secura, e o sono
aparta-se de seus olhos. É um terror para si mesmo e para
todos ao seu redor, e está pronto para invejar as próprias pedras
que jazem nas ruas, pois elas não têm sentimentos e não
sentem a sua miséria. Ele preferiria ser um cachorro a ser
um homem, porque assim a morte poria fim à sua miséria;
entretanto, agora será apenas o começo daquilo que jamais
terá fim.
Embora vocês desprezem agora a culpa do pecado não
perdoado, um dia vão descobrir que é uma carga pesada. É
uma pedra de moinho. "E quem cair sobre esta pedra despedaçar-
-se-á; e aquele sobre quem ela cair ficará reduzido a pó" (Mateus
21 :44). A culpa de nossos pecados causou a agonia e a morte

122
de nosso bendito Salvador. E se causou isso na árvore verde,
o que causará na árvore seca?
Oh, considerem sua situação enquanto há tempo. Será
que podem pensar nessa ameaça sem tremer: "... morrereis em
vossos pecados ... " (João 8:24)? Muito melhor seria morrerem
numa prisão, num fosso ou numa masmorra do que mor-
rerem em seus pecados. Se a morte, da mesma maneira que
vai tirar todos os seus confortos, tirasse também todos os seus
pecados, haveria algum atenuante; mas os seus pecados os
seguirão quando seus amigos os deixarem e todos os prazeres
mundanos lhes disserem adeus. Seus pecados não morrerão
com vocês à semelhança do que acontece com as demais fal-
tas de um prisioneiro; ao contrário, eles os acompanharão ao
julgamento para serem seus acusadores; irão ao inferno com
vocês para serem seus atormentadores. Oh, que fardo esses
pecados lhes serão! Considerem suas dívidas enquanto há
tempo; cada um dos mandamentos de Deus está pronto para
prendê-los e agarrá-los pela garganta com os inúmeros laços
que têm sobre vocês. O que farão, então, quando todos eles
juntamente vierem contra vocês? Mantenham abertos os
olhos de sua consciência para considerar isto, a fim de
perderem toda a confiança em si mesmos e se dirigirem a
Cristo, fugindo para se refugiarem na esperança que está
diante de vocês.

5. Suas concupiscências inflamadas os escravizam


miseravelmente. Enquanto vocês não forem convertidos
são autênticos servos do pecado; ele reina sobre vocês e os
mantêm sob seu domínio, até que sejam levados para

123
dentro do concerto de Deus. Não existe um outro tirano corno
o pecado. Oh, quão vil e temerosa é a tirania na qual ele
envolve os seus escravos!
Acaso seus corações não ficariam feridos em ver um
grupo de infelizes criaturas afadigando-se e avançando
penosamente enquanto carregam feixes de lenha para a
fogueira em que eles próprios seriam queimados? Esta é a
tarefa dos escravos do pecado. Mesmo enquanto bendizem a
si mesmos com seus lucros injustos, cantam os seus prazeres,
nada mais fazem do que entesourar vingança para sua queima
eterna; não estão fazendo outra coisa senão aumentando a
pira de Tofete e espargindo óleo para fazer a chama se enfu-
recer cada vez mais. Quem iria servir a um tal senhor, cujo
serviço é enfadonho e cujo salário é a morte?
Que espetáculo doloroso foi o pobre gadareno possuído
por urna legião! Não entristeceria seus corações vê-lo entre
os túmulos, cortando e ferindo-se a si mesmo? Este é o caso
de vocês; tal é o seu trabalho; cada golpe é uma punha-
lada em seus corações. A consciência está de fato adormecida
agora, mas quando a morte e o julgamento os chamarem
à razão, então sentirão a angústia de todas as feridas. O peca-
dor convicto é um exemplo da miserável escravidão do
pecado. Sua consciência voa sobre ele e lhe fala a res-
peito do fim dessas coisas; contudo, ele está tão escravizado
às suas concupiscências que continua indiferente, embora
veja que isso será a sua perdição. Quando vem a tentação, a
concupiscência quebra as cordas de todos os seus votos e
promessas, e o carrega impetuosamente para a sua própria
destruição.

124
6. A fornalha da vingança eterna já está aquecida para
vocês. O inferno e a destruição abriram suas bocas para vocês,
estão escancarados para vocês, pranteando por vocês (Isaías
5: 14 ), esperando, com olhos ávidos, enquanto vocês estão à
borda, prestes a cair. Se a ira dos homens é "... como o bramido
do filho do leão ... " e "... mais pesada que a areia e a pedra"
(Provérbios 19:12 e 27:3), o que dizer então da ira do Deus
infinito? Se a fornalha aquecida "sete vezes mais" devido à
fúria ardente de Nabucodonosor era tão violenta que quei-
mou os que dela se aproximaram para nela atirarem os três
jovens, quão escaldantes serão as chamas da fúria do Todo-
-poderoso! Certamente, é "setenta vezes sete" mais ardente.
Ó homem, o que você acha de ser um feixe de lenha no
inferno por toda a eternidade? "Estará firme o teu coração?
Estarão fortes as tuas mãos, nos dias em que eu tratarei contigo?"
(Ezequiel 22: 14 ). Você pode suportar as chamas eternas? Vai
poder habitar com o fogo consumidor quando estiver no in-
ferno, tal qual ferro incandescente, e toda a sua alma e o seu
corpo estiverem tão completamente pos'suídos pela vingança
abrasadora de Deus como ferro faiscante, quando aquecido
na mais ardente fornalha? Alguns dos mais preciosos servos
de Deus, quando se sentiram longe de Sua face e temeram os
efeitos do Seu desagrado, deploraram sua condição com
amargas lamentações. Como, então, você vai suportar quando
Deus derramar todas as Suas taças de ira e colocar-Se contra
você para atormentá-lo; quando Ele fizer de sua consciência
um funil por onde derramará Sua ira ardente na sua alma
para sempre; quando Ele encher todos os seus poros de tor-
mento, da mesma forma que estão agora cheios de pecado;

125
quando a imortalidade for a sua miséria? Morrer a morte
de um bruto e ser engolido no golfo da aniquilação, acaso
não seria uma felicidade que nem toda uma eternidade de
desejos nem um oceano de lágrimas jamais poderiam
comprar?
Ora, você pode adiar o dia mau, rir, alegrar-se e esquecer
o terror do Senhor, mas como vai agüentar ou suportar quando
Deus o lançar numa "cama de tormentos"(Apocalipse 2:22) e
o deixar jazendo "em tormentos" (Isaías 50: 11); quando
bramidos e blasfêmias forem a sua única música, e o vinho
da ira de Deus - derramado sem mistura no cálice de Sua
indignação -for a sua única bebida (Apocalipse 14: 10)? Em
resumo, o que fará quando a fumaça de seu tormento subir
para sempre e sempre, e você não tiver descanso nem de dia
nem de noite, quando não houver repouso para sua
consciência nem para seus ossos, mas você se tornar uma
execração, um espanto, uma maldição e um opróbrio para
sempre (Jeremias 42: 18)?
Ó pecador, pare aqui e considere. Se você é um ser
humano e não um bloco de pedra sem sentimentos, reflita.
Veja onde está- à beira da verdadeira destruição. Assim como
o Senhor vive e como sua alma vive, há apenas um passo
entre você e a destruição. Ao deitar-se, você não sabe, porém
pode estar no inferno antes do amanhecer. Da mesma forma,
ao se levantar, você não sabe, mas pode cair no inferno antes
do anoitecer. Ousaria não dar importância a isso? Vai conti-
nuar nessa situação tão terrível, como se tudo estivesse bem?
Se procrastinar e disser que isso não lhe diz respeito, então
examine o capítulo anterior novamente e diga-me a verdade.

126
Não há nenhuma daquelas marcas negras em você? Não feche
os olhos. Não engane a si mesmo. Veja a sua miséria enquanto
pode evitá-la. Pense no que é ser um vil proscrito, um repro-
vado perdido, um vaso de ira, no qual o Senhor derramará
a Sua fúria tormentosa, enquanto Ele existir. A ira divina
é um fogo cruel, devorador, eterno e inextinguível, e isso
será a sua porção, a menos que considere seus caminhos e se
volte rapidamente para o Senhor através de uma genuína
conversão.
Pecador, de nada me adianta lisonjeá-lo: isso seria levá-
-lo ao fogo inextinguível. Saiba, da parte do Deus vivo, que
nessa condição você terá que ficar. Habitará nessas chamas
até que morra a imortalidade e mude a imutabilidade, até
que acabe a eternidade e a onipotência não seja mais capaz
de punir - a menos que seja transformado completamente
pela graça santificadora.

7. A lei descarrega todas as suas an:ieaças e maldições


contra vocês. Oh, quão terrivelmente ela troveja! Relampeja
o fogo devorador em suas faces. Suas palavras são como
espadas desembainhadas e como as flechas agudas do Todo-
-poderoso. Ela exige ser satisfeita ao máximo, e clama:
"Justiça! Justiça!" Fala de sangue, guerra, feridas e morte
contra vocês. Ó homem, fuja para sua fortaleza; acabe com
seus pecados; corra para o santuário, a cidade de refúgio -
para o Senhor Jesus Cristo. Esconda-se nEle, ou estará
perdido sem qualquer esperança de recuperação.

8. O próprio evangelho impõe a sentença de condenação

127
eterna sobre vocês. Se continuarem no seu estado de impe-
nitência e incredulidade, saibam que o evangelho proclama
uma condenação mais penosa do que aquela proclamada no
primeiro concerto. Não seria algo terrível o próprio evangelho
encher a boca de ameaças, e o Senhor bramar do Monte Sião
contra vocês (Joel 3:16)? Ouçam o terror do Senhor: "... mas
quem não crer será condenado". "... se vós não arrependerdes, todos
de igual modo perecereis." "E a condenação é esta: que a luz veio
ao mundo, e os homens amaram mais as trevas do que a luz."
"... mas aquele que não crê... a ira de Deus sobre ele permanece."
"... se a palavra falada pelos anjos permaneceu firme, e toda
transgressão e desobediência recebeu a justa retribuição, como
escaparemos nós, se não atentarmos para uma tão grande
salvação ... ?" "Quebrando alguém a lei de Moisés, morre sem
misericórdia; ... de quanto maior castigo cuidai vós serás julgado
merecedor aquele que pisar o Filho de Deus ... ?" (Marcos 16: 16;
Lucas 13:3; João 3:19,36; Hebreus 2:2-3 e 10:28-29).
Seria isso realmente verdade? Seria essa a sua miséria?
Sim, isso é tão verdadeiro como Deus é verdadeiro. É melhor
abrirem os olhos para vê-la agora, enquanto a podem
remediar, do que fechar os olhos e endurecer o coração até
que, para sua tristeza eterna, sintam aquilo em que não
creram .. E se isso é verdadeiro, por que estão procrastinando
e permanecendo numa situação como essa?
Ai de você, pobre homem! Com que eficiência o pecado
o tem destruído, depravado e despojado, até mesmo da
capacidade de cuidar de seu próprio bem-estar eterno! Ó
pobre infeliz! Que estupidez e insensatez o têm surpreendido!
Oh, deixe-me bater e acordar este dormente! Quem habita

128
entre as paredes deste corpo? Há uma alma aqui? Uma alma
racional e capaz de entender? Ou você é apenas uma massa
sem forma e sem sentido?
Será que você é uma alma racional, contudo embrute-
cido a ponto de se esquecer de que é imortal e pensar que é
semelhante aos animais que perecem? Tendo capacidade de
entender a eternidade do estado futuro, você ainda não dá
importância ao perigo de ser eternamente infeliz, o que
significa colocar-se abaixo dos animais, assim como é muito
pior agir contra a razão do que agir sem ela? Ó alma infeliz,
que era o representante de Deus no mundo e gozava da supre-
macia entre as criaturas, tinha o domínio sobre as obras do
Criador; você vai agora tornar-se um escravo dos instintos?
Está ajuntando um pouquinho de coisas terrenas, o que é
tão imprestável para sua imortal natureza espiritual? Oh, por
que você não reflete sobre onde vai passar a eternidade? A
morte está próxima; o juiz está à porta. Ainda um pouqui-
nho e ''iá não haverá mais tempo". E irá você correr o risco de
continuar em tal estado, no qual, se for surpreendido, estará
irrecuperavelmente perdido?
Eia! Desperte e atenda aos seus mais íntimos interesses.
Diga-me, aonde você vai? O quê! Vai viver em tal caminho,
onde cada ato é um passo para a perdição, e sem saber se
amanhã acordará no inferno? Oh, se você têm um pingo de
razão, reflita, volte-se e dê ouvidos ao seu verdadeiro amigo,
que, ao mostrar-lhe sua presente desgraça, deseja que escape
dela a tempo e seja eternamente feliz.
Ouça o que diz o Senhor: "não temereis a mim, diz o Senhor;
não temereis diante de mim ... ?" (Jeremias 5:22). Ó pecadores,

129
vocês desprezam a ira que está para vir? Estou certo de que
virá um tempo em que não a desprezarão. Ora, até os
demônios crêem e estremecem. O quê! Vocês estão mais en-
durecidos do que eles? Vão correr para a beira do precipício?
Brincarão no poço da serpente? Enfiarão as suas mãos na
cova do basilisco? Zombarão da ira devoradora como se lhes
fosse coisa indiferente escapar dela ou suportá-la? Não há
ninguém tão fora de si mesmo como o pecador obstinado
que persiste no seu estado de incredulidade sem se importar
com o que lhe pudesse acontecer. O homem que entra na
boca do canhão e brinca com o seu próprio sangue, ou se
suicida numa brincadeira, é sensato, sóbrio e sério quando
comparado com aquele que permanece nas suas transgressões.
«Porque estendeu a sua mão contra Deus, e contra o Todo-poderoso
se embraveceu. Arremete contra ele com dura cerviz, e com os pontos
grossos dos seus escudos"(Jó 15:25-26). Seria prudente brincar
com a segunda morte ou aventurar-se no lago que queima
com fogo e enxofre? O que direi? Não consigo encontrar pa-
lavras, comparações, com as quais descrever a terrível loucura
da alma que permanece no pecado.
Desperte! Desperte! Ó pecador, levante-se e fuja. Há
somente uma porta pela qual possa fugir, e essa é a porta
estreita da conversão e do novo nascimento. A menos que
se volte sinceramente de todos os seus pecados, venha para
Jesus Cristo, aceite-O como o Senhor de justiça e ande com
Ele em santidade e novidade de vida, assim como o Senhor
vive, é tão certo que dentro de pouco tempo você estará no
inferno, tanto quanto é certo que agora está fora dele. Oh,
disponha-se a considerar a sua situação. Sua desgraça ou

130
bem-estar eternos não mereceriam um pouco de considera-
ção? Reflita novamente sobre as misérias do indivíduo não
convertido. Se o Senhor não lhe tem falado através de mim,
não me dê atenção; mas, se é a própria Palavra do Senhor
que diz que toda essa miséria paira sobre você, em que estado
lamentável então se encontra! Será que é sensato viver em
tais condições? Ou não se deve fazer logo todo o possível
para impedir a ruína total? Ó homem, quem o enfeitiçou
para que nos assuntos desta vida seja suficientemente sábio
para planejar seus negócios, prever os perigos e evitar a sua
ruína, enquanto que nos assuntos que envolvem as conse-
qüências eternas seja negligente e descuidado, como se pouco
lhe importassem? Não significaria nada ter todos os atributos
de Deus unidos contra você? Acha que pode viver sem a Sua
graça? Pode escapar de Suas mãos ou suportar a Sua vin-
gança? Será que não ouve a criação gemendo sob você e o
inferno pranteando por você? E ainda assim, acha que sua
situação é bastante boa? Encontra-se sob o poder da corrup-
ção, na prisão escura e infecta, escravizado pelos desejos,
elaborando a sua própria condenação - e isso tudo não merece
uma reflexão? Vai desprezar todos os terrores da lei, bem
como suas maldições e clamores, como se fossem apenas
ameaças de uma criança? Você ri do inferno e da destruição,
ou será que pode beber o cálice amargo da fúria do Todo-
-poderoso, como se fosse apenas uma bebida vulgar?
Prepare-se como um homem, pois vou argüi-lo e você
vai me responder. Será que é um leviatã, cujas escamas
do orgulho podem resistir ao seu Criador? Irá considerar
Suas flechas como palha e os instrumentos da morte como

131
madeira podre? Você é o líder de todos os filhos do orgulho,
para que considere Suas setas como restolho e caçoe do tremor
de Sua lança? Zomba do medo e não está assustado, não se
afasta da espada do Senhor quando Sua aljava retine a lança
cintilante e o escudo contra você? Bem, se as ameaças e os
chamados da Palavra não o despertam, estou certo de que a
morte e o julgamento o farão. Oh, que fará você quando o
Senhor avançar ao seu encontro e, em Sua fúria, atacá-lo e
você puder sentir aquilo que está lendo agora? Se quando os
inimigos de Daniel foram jogados na cova dos leões com
suas mulheres e filhos, aqueles animais os dominaram e
esmigalharam todos os seus ossos logo que chegaram ao
fundo da cova, o que acontecerá com você quando cair nas
mãos do Deus vivo?
Oh, não contenda com Deus. Arrependa-se e seja conver-
tido, para que nada disso venha sobre você. "Buscai ao Senhor
enquanto se pode achar, invocai-o enquanto está perto. Deixe o
ímpio o seu caminho, e o homem maligno os seus pensamentos, e se
converta ao Senhor, que se compadecerá dele; torne para o nosso
Deus porque é grandioso em perdoar" (Isaías 55: 6-7).

132
6
Orientações para os que não são
Convertidos
Antes de ler estas orientações, admoesto-os, sim, eu os
responsabilizo diante do Senhor e de Seus santos anjos, a
que se resolvam a segui-las, à medida que suas consciências
se convençam de que são compatíveis com a Palavra de Deus
e com a sua situação; e peçam a Deus Sua ajuda e Sua bênção
para que possam ser bem sucedidos. Assim como busquei
ao Senhor e consultei Seus oráculos a respeito dos conselhos
que lhes dou, da mesma maneira devem acolhê-los com
aquele respeito, reverência e propósito de obediência que a
Palavra do Deus vivo requer.
Agora prestem atenção: "Aplicai o vosso coração a todas as
palavras que hoje testifico entre vós... porque esta palavra não nos
é vã, antes é a vossa vida ... " (Deuteronômio 32:46-47). Este é
o alvo de todas as palavras que foram ditas até aqui: levá-los
a ter seus corações voltados para Deus. Não quero causar-
-lhes atribulações nem atormentá-los antes da hora com
pensamentos de miséria eterna, mas desejo que escapem dela.
Se vocês estivessem encerrados em seu atual estado de miséria
sem recurso, seria misericordioso deixá-los em paz, para que

133
pudessem gozar daquele pequeno conforto que podem ter
neste mundo; todavia ainda podem ser felizes, se não recu-
sarem teimosamente os meios para sua recuperação. Vejam:
mantenho a porta aberta para vocês; levantem-se, fujam!
Coloco o caminho da vida diante de vocês; andem nele e não
morrerão, mas viverão. Entristece-me a possibilidade de
vocês se tornarem suicidas, atirando-se no abismo, não
obstante Deus e os homens estarem gritando para vocês:
"Poupem-se a si mesmos".
A destruição dos ímpios é voluntariosa. Deus, que os
criou, clama a eles como Paulo clamou ao carcereiro prestes
a suicidar-se: "Não te faças nenhum mal... " (Atos 16:28). Os
ministros de Cristo os previnem e os buscam, e teriam grande
alegria se eles se voltassem; mas pobres infelizes, nenhuma
admoestação ou súplica os impedirão, porém os homens irão
arremessar-se na perdição, enquanto a própria piedade os
observa.
Que direi eu? Não se entristeceria qualquer ser humano
que, em tempo de violenta epidemia, tivesse um remédio
que curasse, infalivelmente, toda nação e recuperasse a
maioria dos pacientes desenganados, e não obstante seus
próprios amigos e vizinhos morressem às centenas ao seu
redor, devido não usarem aquele remédio? Amigos e irmãos,
embora tenham estampados em suas faces certos sinais da
morte, eu ainda tenho um remédio capaz de curá-los
infalivelmente. Sigam estas orientações, e se vocês então não
ganharem o céu, estarei disposto a perdê-lo.
Ouça, então, ó pecador, e se quiser ser convertido e salvo,
siga as seguintes orientações:

134
ser salvo?" (Atos 16:30). Com este propósito:
Medite sobre o número de seus pecados. O coração de
Davi desmaiou quando ele pensou nisso e concluiu que tinha
mais pecados que os cabelos de sua cabeça. Isso o fez clamar
pela multidão das ternas misericórdias de Deus. A carcaça
repugnante não fica mais abominavelmente cheia de vermes
rastejantes do que a alma não santificada com suas concupis-
cências imundas. Elas enchem a cabeça, o coração, os olhos
e a boca do indivíduo. Olhe para trás: onde e quando foi
que você não pecou? Olhe interiormente: que parte ou poder
você pode encontrar na alma ou no corpo que não tenha sido
envenenado pelo pecado; que tarefa você realizou em que
não foi disseminado esse veneno? Oh, quão grande é a soma
de seus débitos; você que passou toda a sua vida endividado
e jamais pagou ou poderá pagar um centavo sequer! Examine
o pecado de sua natureza e todos os seus frutos amaldiçoados,
os pecados de sua vida. Lembre-se de todas as suas omissões
e comissões; os pecados de seus pensamentos, palavras e
ações; os pecados de sua juventude e os pecados de seus anos
mais maduros. Não se assemelhe a um falido desesperado
que tem medo de examinar seus balanços. Leia os registros
da consciência cuidadosamente. Esses livros, mais cedo ou
mais tarde, precisam ser abertos.
Medite sobre os agravos de seus pecados pois são os
grandes inimigos de Deus em sua vida e na vivência de sua
alma; em suma, são os inimigos públicos de toda a humani-
dade. Vemos como Davi, Esdras, Daniel e os bons levitas
agravaram os seus pecados, se considerarmos a sua oposição
a Deus e às Suas boas e justas leis, assim como às Suas

136
enquanto não for purificado pelo sangue de Jesus e pelo poder
da graça renovadora.
Acima de todos os outros pecados, considere esses dois:
(1) O pecado do seu coração. Não vale a pena cortar os
galhos se a raiz da corrupção se mantiver intacta. Em vão os
homens esvaziam os regatos se a fonte continua a correr e os
enche novamente. Deixe o machado de seu arrependimento,
como o de Davi, ir até a raiz do pecado. Considere quão
profunda e quão permanente é a sua poluição natural; quão
universal ela é, até que você clame, como Paulo, contra o seu
"corpo da morte". O coração jamais se torna completamente
quebrantado, enquanto não se convence totalmente de sua
depravação original, hedionda e profundamente enraizada.
Fixe nisso os seus pensamentos. É ele que o torna renitente a
todo o bem e propenso a todo o mal, que espalha cegueira,
orgulho, preconceito e incredulidade na sua mente, inimi-
zade, inconstância e obstinação na sua vontade, sentimentos
desordenados de altos e baixos nas suas afeições, insensi-
bilidade e infidelidade na sua consciência, instabilidade na
sua memória. Enfim, ele desequilibra todo o mecanismo da
alma, e faz com que uma habitação de santidade se transforme
num verdadeiro inferno de iniqüidade. É ele que tem
corrompido e pervertido todos os seus membros, trans-
formando-os em armas de injustiça e servos do pecado, que
tem enchido a sua mente de desejos carnais e corruptos, a
mão, de práticas pecaminosas, os olhos, de delírio e de
caprichos, a língua, de veneno mortal. É isso que tem aberto
os ouvidos às fábulas, às conversas enganadoras e impuras, e
os tem fechado às instruções da vida; e tem submetido o seu

139
coração à maldita fonte de todas as imaginações mortais,
de modo que flui incessantemente a sua impiedade assim
como a fonte jorra naturalmente as suas águas ou como o
mar furioso lança lodo e sujeira. E você ainda morre de
amores por si mesmo e nos fala de seu bom coração? Oh,
nunca deixe de meditar na infecção desesperada, na
corrupção natural de seu coração, até que, como Efraim,
lamente sua situação, e com a mais profunda vergonha e
tristeza bata no seu peito, como o publicano; e, como Jó,
aborreça a si mesmo e se arrependa no pó e nas cinzas.
(2) Aquele pecado particular ao qual você está mais
inclinado. Procure descobrir todos os agravos dele; repare
bem no seu coração todas as ameaças de Deus contra ele. O
arrependimento guia diante de si o elenco todo, mas
especialmente atira a flecha naquele pecado de estimação e o
destaca dos demais, a fim de destruí-lo. Oh, esforce-se para
tornar esse pecado odioso à sua alma e duplicar a sua defesa
e as suas resoluções contra ele, pois é o mais desonroso a
Deus, e também o mais perigoso para você.

3. Procure ter no coração um profundo sentido de sua


miséria atual.
Leia e releia atenciosamente o capítulo anterior e ponha-
-o no seu coração. Lembre-se, quando se deitar, de que existe
a possibilidade de acordar nas chamas eternas; e quando se
levantar, lembre-se de que antes de chegar a noite, talvez
faça a sua cama no inferno. Não significa nada para você o
fato de viver nesse estado de medo, cambaleando à beira do
abismo; viver sujeito às doenças que, se o acometerem, o

140
nada, há pouca esperança. Ela precisa estar profundamente
convencida de sua desventura, cegueira, pobreza e nudez
antes de se voltar para Cristo, a fim de adquirir o Seu ouro,
vestimentas e colírio. Portanto, mantenha abertos os olhos
da consciência, contemple sua miséria tanto quanto possível,
não fuja da visão dela por temer que o encha de terror. O fato
de sentir a sua miséria é como se fosse a supuração da ferida,
o que se faz necessário para que haja cura. É melhor temer
agora os tormentos que o esperam, do que senti-los na vida
futura.

4. Proponha em seu coração que é preciso procurar ajuda


fora de si mesmo e fora de seus feitos.
Não pense que por orar, ler e ouvir a Palavra de Deus,
confessar os pecados e corrigir-se você efetuará a cura. Todas
essas são necessárias, mas você estará destruído se confiar
apenas nelas. Você será urn homem perdido se esperar escapar
do afogamento agarrando-se a outra tábua de salvação, senão
a Cristo. É preciso despir-se de si mesmo, renunciar à sua
própria sabedoria, à sua própria justiça, à sua própria força,
e lançar-se completamente sobre Cristo, caso contrário não
escapará. Enquanto os homens confiarem em si mesmos,
estabelecerem a sua justiça própria, e confiarem na carne,
não buscarão a salvação em Cristo. É preciso saber que seu
lucro é perda, sua força é fraqueza, sua justiça é trapo de
imundícia, antes que haja uma união eficaz entre Cristo e
você. Será que o corpo sem vida pode se livrar de sua mortalha
e soltar os laços da morte? Se pode, então você poderá se
recuperar, estando morto em delitos e pecados e sob a

142
impossibilidade de servir ao seu Criador de modo aceitável,
nas condições em que se encontra. Por conseguinte, quando
orar, meditar ou realizar qualquer de suas obrigações aqui
mencionadas, saia de si mesmo e peça ajuda do Espírito,
como que sem esperança de fazer qualquer coisa que agrade
a Deus com suas próprias forças. Contudo, não negligencie
suas obrigações. Enquanto o eunuco lia a Palavra de Deus, o
Espírito Santo enviou Felipe a ele. Quando os discípulos
estavam orando, quando Cornélia e seus amigos estavam
ouvindo, o Espírito Santo veio sobre eles e os encheu com
Sua plenitude.

5. Daqui em diante, renuncie a todos os seus pecados.


Se você se entregar à prática de um pecado qualquer,
estará perdido. Esperará em vão a vida através de Cristo, a
menos que deixe a iniqüidade. Abandone os seus pecados,
ou não achará misericórdia. Você não pode desposar Cristo
se não se divorciar do pecado. Repudie o traidor, senão não
poderá ter paz com o céu. Não mantenha Dalila em seu colo.
Ou se separa de seus pecados ou perderá a sua alma; se pou-
par um único pecado, Deus não poupará você. Seus pecados
têm que morrer, ou você morrerá por causa deles. Se permitir
um só pecado, ainda que seja pequeno, um pecado secreto,
embora argumente que precisa dele, se tiver centenas de
evasivas e desculpas para ele, a vida de sua alma será sacri-
ficada pela vida desse pecado. Nesse caso, ele não terá sido
adquirido por um preço elevado?
Ó pecador, ouça e considere. Se abandonar os seus
pecados, Deus lhe dará o Seu Cristo. Isso não seria uma troca

143
justa? Testifico-lhe que se perecer não será porque jamais
foi-lhe providenciado um Salvador ou oferecida uma vida;
mas porque, como os judeus, você prefere o assassino ao
Salvador, o pecado a Cristo, e ama as trevas mais do que a
luz. Examine, portanto, o seu coração com velas, à seme-
lhança do que faziam os judeus, em suas casas, para procurar
o fermento antes da páscoa. Esforce-se no sentido de
descobrir os seus pecados; entre no seu quarto e reflita ... Qual
o pecado em que tenho vivido? Qual a obrigação que tenho
negligenciado em relação a Deus? Qual o pecado que tenho
praticado contra o meu irmão? E agora arremesse os dardos
no coração de seu pecado, como Joabe fez com o coração de
Absalão. Não fique olhando para os seus pecados nem
enrolando o bocado embaixo da língua, mas lance-o fora
como se fosse um veneno, com temor e repugnância.
Pergunto: o que farão seus pecados por você, para que hesite
em deixá-los? Eles vão lisonjeá-lo, porém irão destruí-lo e
envenená-lo enquanto o agradam, e, além disso, armarão a
justiça e a ira do Deus infinito contra você. Abrirão o inferno
para você e empilharão lenha para queimá-lo. Eis a forca
que eles têm preparado para você. Oh, trate-os como a Hamã
e aplique sobre eles a execução que prepararam para você.
Acabe com eles, crucifique-os, e permita que somente Cristo
seja o seu Senhor.

6. Escolha solenemente Deus como seu quinhão e sua


bem-aventurança.
Com toda a devoção e veneração possíveis, reconheça o
Senhor como seu Deus. Coloque o mundo - com toda a sua

144
glória, cores, gentilezas, prazeres e promoções - numa das
mãos; e coloque Deus - com todas as Suas infinitas exce-
lências e perfeições - na outra mão, e faça deliberadamente a
sua escolha. Descanse em Deus. Sente-se sob a Sua sombra.
Permita que Suas promessas e perfeições sejam decisivas
contra o mundo todo. Proponha em seu coração que o Senhor
é uma porção toda-suficiente; que você não pode ser
miserável enquanto tiver Deus em quem viver. Tome o
Senhor como seu escudo e grandíssimo galardão. Deus
sozinho vale mais que o mundo inteiro; satisfaça-se com Ele.
Deixe que outros possuam as preferências e as glórias do
mundo; mas confie a sua felicidade à graça de Deus e à luz
de Seu rosto.
Pobre pecador, você desviou-se de Deus e uniu o Seu
poder e a Sua ira contra você; saiba, porém, que na Sua
abundante graça Ele Se oferece para ser novamente o seu
Deus, em Cristo. O que diz você? Terá o Senhor como seu
Deus? Aceite este conselho e O terá. Chegue-se a Ele através
de Cristo, renuncie os ídolos de seus prazeres, lucros e
reputação. Deixe que sejam tirados de seus tronos e coloque
os interesses de Deus acima de tudo em seu coração. Torne-
-O como seu Deus, para que seja o centro de seus sentimentos
e propósitos, pois Ele não suportará ter qualquer outro acima
de Si mesmo. Em resumo, você deve aceitá-10 com todas as
Suas relações pessoais e com todas as Suas perfeições
essenciais.
(1) Com todas as suas relações pessoais. Deus, o Pai,
precisa ser aceito como seu Pai. Oh, venha a Ele como o
pródigo: "Pai, pequei contra o céu e perante ti, e já não sou digno

145
de ser chamado seu filho; mas considerando que pela Tua
misen'córdia, Tu tens prazer em me aceitar como Teu filho - eu que
sou muito vil, na verdade um animal e não um homem perante Ti
- aceito-Te, solenemente, como meu Pai; entrego-me aos Teus
cuidados, confio na Tua providência e lanço o meu fardo sobre Ti.
Dependo de Tua provisão, submeto-me às Tuas correções, abrigo-
-me à sombra das Tuas asas, escondo-me nas Tuas câmaras e fujo
para o Teu nome. Renuncio a toda a confiança em mim mesmo;
ponho a minha confiança em Ti. Declaro meu comprometimento
conTigo; serei Teu e de nenhum outro".
Deus, o Filho, precisa ser aceito como seu Salvador, Re-
de~tor e sua Justiça. Ele precisa ser aceito como o único
caminho para o Pai e como a única forma de vida. Dispa,
então, as vestes de seu cativeiro, vista as roupas matrimoniais
e case-se com Cristo. "Senhor, sou Teu, bem como tudo que tenho:
corpo, alma e posses. Dou-Te meu coração; serei inteiramente Teu,
Teu eternamente. Colocarei o Teu nome sobre tudo que tenho e o
usarei somente para Te engrandecer, durante a Tua ausência,
entregando tudo a Ti. Não terei outro Rei além de Ti. Outros
senhores já tiveram domínio sobre mim; mas agora farei menção
somente do Teu nome, e faço aqui um juramento de fidelidade a
Ti,prometendo servir-Te e temer-Te acima de todos os competidores.
Rejeito minha justiça própria e jamais espero ser salvo mediante
meus méritos ou virtudes; descansarei somente em Teu todo-
-suficiente sacrifício e intercessão para obter perdão, vida e aceitação
diante de Deus. Tomo a Ti como meu único Guia e Instrutor,
decidindo ser dirigido por Ti e esperar no Teu conselho."
Finalmente, Deus, o Espírito, precisa ser aceito como
seu Santificador, Advogado, Conselheiro, Consolador,

146
Ensinador, Penhor e Garantia de sua herança. "Levanta-te,
vento norte, e vem tu, vento sul; assopra no meu jardim ... "
(Cantares de Salomão 4: 16). "Vem, Espírito do Altíssimo;
eis aqui um templo para Ti; repousa aqui para sempre; ha-
bita aqui. Eis que Te dou possessão; total possessão; entrego-
-Te as chaves de meu coração, para que tudo possa ser Teu.
Renuncio o uso de tudo que tenho, a fim de que cada facul-
dade e cada membro possa ser um instrumento Teu para
promover a justiça e fazer a vontade do meu Pai que está no
céu."
(2) Em todas as suas perfeições essenciais. Considere
como o Senhor tem Se revelado a você em Sua Palavra. Vai
aceitar esse Deus como seu Deus? Ó pecador, esta é a notícia
mais abençoada que já chegou aos filhos dos homens: o
Senhor será o seu Deus se você simplesmente O aceitar em
Suas excelências. Você tomará o Deus misericordioso,
gracioso, perdoador de pecados, para seu Deus? "Oh, sim",
diz o pecador, "caso contrário estarei perdido." Pois bem,
Ele ainda lhe diz mais: "Eu sou o Deus santo que odeia o
pecado; se você deseja ser aceito como um do Meu povo,
precisa ser santo - santo no coração, santo na vida. Tem que
abandonar todas as suas iniqüidades, ainda que sejam mui-
to especiais, muito naturais, muito necessárias para manter
seus interesses mundanos. Se não estiver em inimizade com
o pecado, não posso ser seu Deus. Lance fora o fermento.
Tire a maldade de seus atos; cesse de fazer o mal; aprenda a
fazer o bem. Derrote os meus inimigos ou não poderá haver
paz coMigo". O que responde o seu coração? "Senhor, desejo
ser santo como Tu és santo, e tornar-me participante da Tua

147
santidade. Eu Te amo, não apenas por Tua bondade e
misericórdia, mas também por Tua santidade e pureza. Aceito
a Tua santidade para a minha felicidade. Oh, seja para mim
uma fonte de santidade. Aplica sobre mim o selo e a
impressão da Tua santidade. Cheio de gratidão, deixarei todos
os meus pecados segundo o Teu mandamento. Abandonarei
daqui em diante meus pecados voluntários; e quanto às
fraquezas que me traspassam, embora desejasse me livrar
delas, lutarei contra elas continuamente. Eu as detesto; orarei
contra elas e jamais permitirei que permaneçam em minha
alma." Amado, se você aceita o Senhor dessa maneira, Ele
promete que será o seu Deus.
Além disso, Ele lhe diz: "Sou o Deus todo-poderoso.
Prostrar-se-á aos Meus pés, colocar-se-á completamente à
Minha disposição, e aceitar-Me-á como sua única porção?
Reconhecerá e honrará Minha onipotência? Aceitar-Me-á
como sua bem-aventurança e tesouro, sua esperança e
felicidade? Sou, ao mesmo tempo, sol, e escudo; receber-
-Me-á como seu tudo?" O que diz sobre tudo isso? Sua alma
deseja as carnes e os manjares do Egito? Reluta em trocar
sua felicidade terrena por uma porção com Deus? E embora
gostasse de ter Deus e o mundo também, não poderia pensar
em ter Deus e nada além dEle? Ou preferiria estar agarrado
ao mundo se Deus lhe permitisse continuar comprometido
com ele enquanto quisesse? Este é um perigoso sinal.
Contudo se está disposto a vender tudo pela "pérola de
grande preço"; se o seu coração responder: "Senhor, não
quero outra porção além de Ti", então poderá dizer: "Quem
quiser, fique com o trigo, o vinho e o óleo, para que eu possa

148
ter a luz do Teu rosto. Apego-me a Ti para obter felicidade;
aventuro-me alegremente em Ti e confio-me a Ti. Ponho
minha esperança em Ti; descanso em Ti. Permita-me ouvi-
-10 dizer: "Eu sou o teu Deus, a tua salvação", e terei o
bastante-tudo aquilo que desejo. Farei conTigo somente os
acordos que Tu mesmo quiseres. Permita-me tê-10 em
certeza, apresentar o meu clamor e ver o meu direito de '(e
pertencer; quanto às demais coisas, deixo-as contigo. Dá-me
mais ou dá-me menos, qualquer coisa ou nada; ficarei
satisfeito com o meu Deus". Aceite-O dessa maneira e Ele
será seu.
Ele lhe diz, novamente: "Eu sou o Senhor soberano; se
Eu for o seu Deus, você deverá dar-Me a supremacia. Não
pode colocar o pecado ou qualquer outro interesse mundano
acima de Mim. Se quiser pertencer ao Meu povo, preciso ter
domínio sobre você; não pode viver segundo o seu bel-prazer.
Quer aceitar o Meu jugo? Render-se-á ao Meu governo?
Submeter-se-á à Minha disciplina, à Minha Palavra, à Minha
vara?" Pecador, qual é a sua resposta? "Senhor, prefiro estar
sob o Teu comando a viver segundo a minha vontade. Seja
feita a Tua vontade e não a minha. Aprovo e aceito as Tuas
leis, e considero um privilégio submeter-me a elas. Embora
a carne se rebele e freqüentemente rompa suas limitações,
decido não ter outro Senhor além de Ti. Juro, voluntaria-
mente, submeter-me à Tua supremacia, reconhecer Tua
soberania e resolvo pagar, todos os dias, o tributo da adoração,
obediência, amor e serviço a Ti e viver para Ti até o fim da
minha vida." Essa é uma correta aceitação de Deus.
Em resumo, Ele lhe diz: "Eu sou o Deus fiel e verdadeiro.

149
Se Me tomar como seu Deus, terá que confiar plenamente
em Mim. Irá lançar-se sobre Minha Palavra, depender de
Minha fidelidade e ficar sob o Meu jugo para sua segurança?
Terá prazer em seguir-Me na pobreza, na adversidade, na
aflição e ainda aguardar a sua promoção no mundo porvir?
Terá prazer em trabalhar e sofrer, aguardando a recompensa
até a ressurreição dos justos? Minhas promessas nem sem-
pre serão cumpridas instantaneamente; terá paciência para
esperar?" Agora, amado, o que você diz a isso? Tornará esse
Deus corno seu Deus? Ficará satisfeito em viver pela fé e
confiar nEle para um felicidade invisível, um céu invisível,
uma glória invisível? Será que seu coração responde: "Se-
nhor, vou confiar-me a Ti; entrego-me a Ti; lanço-me sobre
Ti. Sei em quem tenho confiado. Quero aceitar a Tua Palavra;
prefiro Tuas promessas às minhas próprias possessões, e as
esperanças do céu aos gozos da terra. Farei aquilo que Te
agrada - aquilo que Tu desejas aqui na terra, de modo que
possa ter a Tua promessa fiel de estar no céu no futuro". Se
você puder, em confiança e deliberação, aceitar a Deus dessa
maneira, Ele será seu. Portanto, numa genuína conversão
deve existir uma afinidade com Ele, apropriada às Suas
excelências. Entretanto, quando os homens recebem a Sua
misericórdia, amando ainda o pecado, repudiando a santi-
dade e a pureza, ou O aceitam como seu Benfeitor, mas não
como seu Soberano; ou como seu Patrão, porém não como
sua Porção - isso não é conversão autêntica.

7. Aceite o Senhor Jesus sem nenhuma restrição.


Nestes termos Cristo pode ser aceito. Pecador, você se

150
perecerá, porém passou da morte para a vida. Eis aqui o ponto
principal de sua salvação: que seja achado em aliança com
Jesus Cristo; e, portanto, se tem amor a si mesmo, seja fiel a
Deus e à sua alma neste mundo.

8. Entregue todos os seus poderes, faculdades e interesses


a Ele.
"... a si mesmos se deram primeiramente ao Senhor... "
(2 Coríntios 8:5). "... apresenteis os vossos corpos em sacrifício
vivo... " (Romanos 12:1). O Senhor não procura aquilo que
lhe pertence, mas a você mesmo. Submeta, portanto, o seu
corpo com os seus membros a Ele; e a sua alma com todos os
seus poderes, a fim de que Ele seja glorificado em seu corpo
e em sua alma, os quais pertencem a Ele.
Havendo uma correta identificação com Cristo, todas as
suas faculdades são entregues a Ele, Sua mente diz: "Senhor,
Tu és digno de toda a aceitação, o mais distinguido entre dez
mil; feliz é o homem que Te acha. De tudo que se possa
desejar, nada se compara a Ti" (Provérbios 3: 13-15). A razão
abandona seus argumentos e sofismas corruptos, bem como
seus preconceitos contra Cristo e Seus caminhos. Ela não
questiona mais; pelo contrário, se determina a favor de Cristo
e contra o mundo. Conclui que é bom estar aqui pois vê um
tesouro tão valioso neste campo, uma pérola de incomparável
valor (Mateus 13:44-46). Diz: "Oh, eis aqui o maior prêmio
já oferecido aos homens; eis aqui o mais soberano remédio
que a misericórdia jamais preparou. Ele é digno de minha
estima, de minha escolha, do meu amor; Ele é digno de ser
aceito, adorado, admirado para sempre (Apocalipse 5: 12).

152
Aprovo as Suas condições; Seus termos são justos e racionais,
cheios de eqüidade e misericórdia". A vontade se submete
de novo. Ela já não permanece vacilante, mas está peremp-
toriamente determinada: "Senhor, Teu amor conquistou-me;
Tu me cativaste e eu serei Teu. Vem Senhor; entrego-me
voluntariamente a Ti; consinto em ser salvo segundo a Tua
própria maneira. Tu terás tudo - ou melhor, que Tu tenhas
tudo e eu apenas tenha a Ti". A memória entrega-se a Cristo:
"Senhor, eis aqui um estojo para Ti; tira daqui o lixo
existente, armazena os Teus tesouros. Permita que eu seja
um repositório das Tuas verdades, das Tua promessas, das
Tuas providências". A consciência intervém: "Senhor, estarei
sempre ao Teu lado; serei Teu fiel registrador. Avisarei quando
o pecador for tentado e rebaterei quando Tu fores ofendido.
Testemunharei de Ti e censurarei por Ti, conduzirei nos Teus
caminhos e jamais deixarei que o pecado tenha abrigo nesta
alma". Os sentimentos também vêm a Cristo: "Oh!", diz o
amor, "estou ansioso por Ti". "Oh!", diz o desejo, "agora
encontrei aquilo que tenho procurado. Eis o Desejado das
nações; aqui está pão e bálsamo para mim: isso é tudo o que
eu quero." O medo dobra os joelhos em respeito e adoração:
"Bem-vindo, Senhor, a Ti presto a minha homenagem. Tua
palavra e Tua vara ordenarão as minhas ações; adorar-Te-ei e
reverenciar-Te-ei; cairei diante de Ti e Te cultuarei". A tristeza
também diz: "Senhor, o Teu desagrado e a Tua desonra, as
calamidades do Teu povo e as minhas próprias iniqüidades
serão a causa de minhas lágrimas. Eu gemerei quando Tu
fores ofendido; chorarei quando a Tua causa for golpeada".
Semelhantemente, a ira se coloca ao lado de Cristo: "Senhor,

153
nada me irrita tanto quanto a minha insensatez contra Ti, o
fato de ser tão tolo, a ponto de dar ouvidos às lisonjas do
pecado e às tentações de satanás contra Ti". O ódio também
se posiciona ao lado de Cristo: "Declaro inimizade mortal
aos Teus inimigos; proclamo que jamais serei amigo dos Teus
adversários; declaro guerra eterna contra o pecado. Não darei
trégua, não farei as pazes com ele". Assim, permita que todos
os seus poderes se rendam a Jesus Cristo.
Insisto: você deve entregar todos os seus interesses a Ele.
Se reter qualquer coisa de Cristo, isso será a sua destruição
(Lucas 14:33). A não ser que renuncie a tudo, no preparo e
na resolução do seu coração, não pode ser discípulo de Cristo.
Deve odiar pai e mãe, sim, e também a sua própria vida, em
comparação com Ele, à medida que tais coisas possam estar
competindo com Ele. Em resumo, você deve dar-se a Ele e
tudo o que tem, sem reservas, ou então não terá parte com
Ele.

9. Escolha as leis de Cristo como uma norma de conduta


para suas palavras, pensamentos e ações.
Esta é a escolha do verdadeiro convertido. Mas lembre-
-se destas três regras. 1. Você deve escolher todas elas, pois
não é possível chegar ao céu através de uma obediência parcial.
Não basta cumprir as partes mais leves e fáceis da religião e
deixar de lado as tarefas mais difíceis, as quais exigem uma
auto-negação e uma oposição aos interesses da carne; tem
que obedecer a tudo ou a nada. Aquele que é sinceramente
convertido leva a sério não só os maiores pecados e as mais
pesadas tarefas, como também os pequenos pecados e deveres.

154
específicos de Cristo. Aqueles judeus, de quem fala o profeta,
pareciam tão determinados como quaisquer outros no
mundo e chamaram Deus para testemunhar que estavam
sendo sinceros. Entretanto, limitaram-se aos mandamentos
gerais. Quando o mandamento de Deus se opôs às suas
inclinações, eles não obedeceram (Jeremias 42:1-6, 43:2).
Consulte o Catecismo Maior do Concílio de Westminster, e
veja a exposição excelente e bastante ampla dos manda-
mentos, e aplique seu coração ao estudo deles. Você está
resolvido, pela força de Cristo, a dedicar-se à prática
consciente de cada tarefa que lhe for requerida e a colocar-se
contra todo o pecado por Deus proibido? Essa é a maneira
de estar firmado nos estatutos de Deus para que nunca seja
confundido (Salmo 119:80).
Observe os deveres especiais que seu coração mais
abomina e os pecados especiais aos quais está mais inclinado
e veja se ele realmente está disposto a abandonar os pecados
e a cumprir os deveres. O que você diz ao seu pecado predileto,
seu pecado lucrativo? O que diz aos deveres difíceis, perigosos,
desagradáveis à carne? Se hesitar aqui e não se resolver pela
graça de Deus a mortificar a carne, você não é autêntico.

10. Permita que tudo isso se realize num solene concerto


entre sua alma e Deus.
Separe algum tempo, de vez em quando, para ficar a
sós com o Senhor- buscando sinceramente Sua especial ajuda
e graciosa aceitação - sondando o seu coração para verificar
se você está desejando realmente abandonar seus pecados,
submeter-se de corpo e alma a Deus e ao Seu serviço,

156
servi-10 em santidade e retidão todos os dias de sua vida.
Ponha o seu espírito na postura mais séria possível,
adequada a uma transação de tão elevada importância. Lance
mão do concerto de Deus e apoie-se na Sua promessa de dar
graça e força, com as quais você será capaz de cumprir a sua
promessa. Não confie na sua própria força, na força de suas
próprias resoluções; mas aposse-se da força dEle.
Estando assim preparado, devido ter separado algum
tempo para esse propósito, inicie o trabalho e solenemente,
como se estivesse diante do Senhor, ajoelhe-se e elevando
seus braços para o céu abra o seu coração para Ele, orando
mais ou menos assim:
"Ó santíssimo Deus, pela paixão de Teu Filho, imploro
que aceite Teu pobre pródigo, que agora se prostra diante da
Tua porta. Afastei-me de Ti pela minha iniqüidade e sou,
por natureza, filho da morte e muitas vezes mais filho do
inferno pelas práticas pecaminosas. Mas na Tua infinita graça,
Tu me prometeste misericórdia em Cristo, se eu simples-
mente me voltasse para Ti de todo o meu coração. Assim,
pelo chamado do Teu evangelho venho agora e, despojando-
-me de minhas armas, submeto-me à Tua misericórdia. E
agora, visto que exiges, como condição de minha paz
conTigo, que eu extermine meus ídolos e me oponha a todos
os Teus inimigos com os quais, reconheço, tenho compar-
tilhado contra Ti, renuncio do fundo do meu coração a todos
eles, comprometendo-me firmemente conTigo a não me
permitir a prática de qualquer pecado consciente, mas a
empregar decididamente todos os meios preceituados por
Ti, a fim de mortificar e destruir totalmente todas as minhas

157
corrupções. E embora no passado eu tenha posto minhas
afeições no mundo, idólatra e desordenadamente, submeto
o meu coração a Ti, que o fizeste, declarando humildemente
diante de Tua gloriosa majestade que a firme resolução do
meu coração é que eu sinceramente desejo a Tua graça, para
que quando Tu me requerer eu possa pôr em prática esta
resolução mediante Tua ajuda. Desejo abandonar tudo o que
aprecio neste mundo, ao invés de deixar-Te e seguir pelas
sendas do pecado. Quero estar vigilante contra todas as
tentações, seja na prosperidade ou na adversidade, a fim de
que elas não afastem meu coração de Ti. Rogo-Te, também,
que me ajudes a não cair nas tentações de satanás a cujas
sugestões ímpias resolvo, pela Tua graça, jamais me submeter
como escravo. E, visto que minha justiça é como trapo de
imundícia, renuncio a toda confiança nela depositada,
reconhecendo que sou, em mim mesmo, uma criatura
desesperançada, desamparada e destruída, sem força e sem
justiça.
"E desde que, pela Tua infinita misericórdia, tens Te
oferecido graciosamente a mim, um vil pecador, para ser
novamente o meu Deus através de Cristo se eu Te aceitar,
conclamo o céu e a terra para testemunharem que neste dia
eu Te declaro, solenemente, meu Senhor e Deus. Declaro
com toda a reverência possível que prostro a minha alma aos
pés de Tua santíssima majestade e aceito a Ti, Senhor Deus,
Pai, Filho e Espírito Santo, como a minha porção e bem
supremo, e ofereço-me de corpo e alma para ser Teu servo,
prometendo e jurando servir-Te em santidade e em justiça
todos os dias da minha vida.

158
contradiga e se rebele, vou empenhar-me para ordenar
e governar toda a minha vida conforme a Tua direção, e
não negligenciarei coisa alguma que conheço ser do meu
dever.
"E sendo que pela fragilidade de minha carne estou
sujeito a muitas falhas, inclino-me humildemente para pedir
que as faltas involuntárias opostas à inclinação e à resolução
do meu coração, não venham a invalidar este pacto, segundo
a Tua Palavra.
"Agora, Deus todo-poderoso, que sondas os corações,
sabes que hoje faço este concerto conTigo, sem quaisquer
fraudes ou reservas conscientes, implorando-Te que se
desvendares qualquer imperfeição ou falsidade em meu
coração, possas revelá-la para mim e me ajudar a agir
corretamente.
"Ó Deus Pai, a quem me submeto de hoje em diante
para buscar-Te como meu Deus e Pai, glória seja a Ti por
proveres tal maneira de recuperar os pecadores perdidos.
Glória seja a Ti, ó Deus Filho, que me amaste e me lavaste
dos meus pecados em Teu próprio sangue, e agora Te tornaste
meu Salvador e Redentor. Glória seja a Ti, ó Deus Espírito
Santo, que pelo dedo de Teu poder onipotente voltaste meu
coração do pecado para Deus.
"Ó Santo e Supremo Jeová, Senhor Deus Onipotente,
Pai, Filho e Espírito Santo, és agora meu Amigo aliado e
pela Tua graça infinita sou Teu servo aliado, Amém; assim
seja. E permite que o concerto que fiz na terra seja ratificado
no céu."
Aconselho-o a fazer essa aliança não apenas no coração,

160
mas com palavras também; não apenas com palavras, mas
por escrito também; e que, com toda a reverência possível,
o apresente diante do Senhor como se fosse um documento
legal. E depois que tiver feito isso, pegue-o e assine-o.
Guarde-o como um registro das solenes transações feitas
entre Deus e você, ao qual possa recorrer em ocasiões de
dúvidas e tentações.

11. Cuidado para não adiar sua conversão, mas entregue-


-se rápida e imediatamente a Deus.
'54.pressei-me e não me detive ... " (Salmo 119:60). Lembre-
-se e trema diante do triste episódio das virgens imprudentes,
que só chegaram depois que a porta da misericórdia estava
fechada; e também do presunçoso Félix que adiou sua
conversa com Paulo para uma outra ocasião, porém não temos
conhecimento de que ele teve outra ocasião. Oh, venha
enquanto é dia, para que não seja endurecido pelo engano
do pecado; para que o dia da graça não termine e as coisas
relativas à sua paz não sejam escondidas de seus olhos. Agora
a misericórdia o está cortejando; agora Cristo está querendo
estender Sua graça a você, e o Espírito de Deus está
contendendo com você. Agora os ministros estão chamando,
a consciência está se agitando, o mercado está aberto e o óleo
pode ser obtido; você tem a oportunidade de comprá-lo.
Agora Cristo está à sua disposição. Oh, receba as dádivas da
graça. Tem que ser agora ou nunca. Se desprezar essa oferta,
Deus pode jurar, em Sua ira, que você jamais provará a Sua
ceia (Lucas 14:24).

161
com a renúncia completa de todo pecado, repugnando-o no
íntimo de sua alma e entregando todo o seu coração, sem
reserva, a Cristo. Diga para Ele: "Ó Senhor, golpeie certo;
não deixe a Tua obra incompleta. Vá ao fundo da minha
corrupção e expurgue a seiva impulsora de meus pecados".
Submeta-se assim, pecador, ao trabalho do Espírito e ice suas
velas aos Seus ventos.

14. Estabeleça o uso constante e diligente da oração séria


e fervorosa.
Aquele que negligencia a oração é um pecador profano
e não santificado. Aquele que não é constante na oração é
hipócrita, a menos que a omissão seja contrária ao seu
costume, sob a força de alguma tentação momentânea. Uma
das primeiras coisas em que se manifesta a conversão é que
ela leva os homens a orar. Portanto, dedique-se a esse mister.
Que não se passe nem um só dia sem que você reserve, de
manhã e à noite, algum temp_o para solene oração a sós com
Deus. Além disso, reúna sua família, diária e pontualmente,
para adorar a Deus com você. Ai de você se for encontrado
entre famílias que não invocam o nome de Deus (Jeremias
10:25). Devoções frias e sem vida não percorrerão nem a
metade do caminho para o céu. Seja fervoroso e insistente.
A importunação vencerá; mas sem esforço o reino do céu
não será alcançado. Você precisa empenhar-se para entrar e
lutar com lágrimas e súplicas, como Jacó, se quiser obter a
bênção. Sem a graça você está destruído para sempre e,
portanto, deve aplicar-se à oração e resolver a não admitir
recusa. O homem que se fixa nesta resolução, diz: "Bem,

163
preciso da graça, ou jamais desistirei enquanto não a obtiver;
jamais deixarei de implorar sinceramente e de empenhar-
-me com Deus e com meu próprio coração, até que Ele me
renove pelo poder de Sua graça".

15. Renuncie suas más companhias e abstenha-se das


oportunidades de pecar.
Você jamais deixará o pecado enquanto não rejeitar e
renunciar as tentações do pecado. Jamais esperarei que seja
convertido, enquanto não for levado a uma auto-negação e
fuga das oportunidades de pecar. Se você estiver mordiscando
a isca, brincando na margem e corrompendo-se com a cilada,
sua alma certamente será tomada. Quando Deus, com Sua
providência, expõe os homens a tentações inevitáveis, e as
ocasiões são tais que não se pode removê-las, podemos esperar
uma assistência especial no uso de Seus meios; mas quando
tentamos a Deus, devido corrermos para o perigo, Ele não
vai Se envolver para nos sustentar quando formos tentados.
E de todas as tentações, uma das mais fatais e perniciosas são
as más companhias. Oh, que esperançosos começos tais
companhias têm sufocado! Oh, as almas, as propriedades,
as famílias, as cidades que elas têm arruinado! Quantos
pobres pecadores têm sido iluminados e convencidos,
chegando quase a escapar do laço do diabo, e têm até em
parte escapado dele; contudo, as más companhias os têm
finalmente retido e os têm feito sete vezes mais filhos do
inferno! Em resumo, perco a esperança quanto a você, a
menos que se livre das más companhias. Sua vida depende
disso; renuncie-as ou não poderá viver. Seria você pior que

164
a mula de Balaão, indo contra o Senhor quando O vir com a
espada desembainhada no caminho? Grave estas palavras com
letras garrafais em sua consciência: "o COMPANHEIRO DE
TOLOS SERÁ AFLIGIDO" (Provérbios 13:20). O Senhor falou e
quem irá contradizê-10?
E você vai enveredar-se pelo caminho da destruição
quando o próprio Deus o está prevenindo? Se Deus um dia
mudar seu coração, isso se manifestará na mudança de suas
companhias. Oh, tema e fuja do abismo em que tantos
milhares têm sido engolidos pela perdição. Será realmente
difícil você escapar. Suas companhias vão escarnecer de sua
religião e vão procurar enchê-lo de preconceitos contra a
rigidez, como coisa ridícula e incômoda. Elas vão adulá-lo e
seduzi-lo, mas lembre-se dos conselhos do Espírito Santo:
"Filho meu, se os pecadores com blandícias te quiserem tentar, não
consintas. Se disserem: vem conosco; lançarás a tua sorte entre
nós; não te ponhas a caminho com eles; desvia o teu pé das suas
veredas; evita-o, não passes por ele; desvia-te dele e passa de
largo. O caminho dos ímpios é como a escuridão: nem conhecem
aquilo em que tropeçam. E estes armam ciladas contra o seu próprio
sangue, e as suas próprias vidas espreitam" (Provérbios 1 : 10-19
e 4:15-19). Minha alma está perturbada em mim, ao ver
quantos dos meus ouvintes e leitores estão a ponto de se
perderem, tanto eles como seus familiares, por causa desta
desditosa maldade, isto é, a de freqüentarem tais lugares e
companhias que os conduzem ao pecado. Admoesto-os uma
vez mais como Moisés a Israel: "Desviai-vos, peço-vos, das
tendas destes ímpios homens ... " (Números 16:26). Oh, fujam
deles como se fugissem daqueles que têm chagas, feridas que

165
lhes cobrem o rosto. São os alcoviteiros e os sedutores do
diabo; e se não escaparem, eles os levarão à perdição e serão
a sua ruína eterna.

16. Separe um dia para humilhar sua alma em secreto,


através de jejum e oração, para analisar os pecados e as
misérias de seu coração.
Leia uma exposição completa dos mandamentos e es-
creva os deveres que omitiu e os pecados que cometeu contra
cada mandamento; depois, faça uma relação de seus pecados,
e com vergonha e tristeza apresente-os ao Senhor. E se seu
coração estiver verdadeiramente de acordo com os termos,
una-se solenemente ao Senhor naquele concerto estabelecido
na décima orientação deste capítulo, e que o Senhor lhe
conceda misericórdia.
Assim sendo, tenho lhe dito o que deve fazer para ser
salvo. Obedecerá à voz do Senhor? Levantar-se-á e porá mãos
à obra? Ó homem, o que responderá? Que desculpa dará se
no final perecer por causa de sua obstinação, visto que
conheceu o caminho da vida? Não duvido do bom resultado
no final, se a sua própria preguiça não o destruir por negli-
genciar o uso dos meios tão claramente expostos aqui.
Levante-se, ó indolente, e aplique-se ao trabalho. Seja atuante
e o Senhor será com você.

166
de papel, até o céu, e todo esse papel fosse escrito, por dentro
e por fora, com números, e todos esses números fossem
somados, daria um resultado incrivelmente pequeno se
comparado àquilo que devo ao menor dos mandamentos de
Deus. Pobre de mim, pois meus débitos são infinitos e meus
pecados se multiplicam. São crimes diante da Majestade
infinita, e se aquele que comete traição contra um pobre
mortal merece ser torturado, arrancado e esquartejado, então
o que mereço eu, eu que tenho tão freqüentemente levantado
minha mão contra o céu e golpeado a coroa e a dignidade do
Todo-poderoso?
Oh, meus pecados, meus pecados! Aí vem um bando!
Multidões, multidões! Seus exércitos são inumeráveis. Ma-
les sem número têm me cercado; minhas iniqüidades têm
se apoderado de mim; elas se puseram contra mim. Oh, seria
melhor ter todos os regimentos do inferno contra mim, do
que ter meus pecados caindo sobre mim para destruir a
minha alma. Senhor, como estou cercado! Quantos e quantos
são os que se levantam contra mim! Cercam-me por todos os
lados, por dentro e por fora; apoderam-se, de todos os meus
poderes e se entrincheiram dentro da minha pobre alma como
uma fortaleza, à qual esta prole do inferno fortifica e mantém
contra o Deus que me fez.
E são tão poderosas quanto são numerosas. As areias do
mar são muitas, porém não são grandes; as montanhas são
grandes, porém não são muitas. Mas pobre de mim, meus
pecados são tão numerosos quanto as areias do mar e tão
poderosos quanto as montanhas. Seu peso é maior que o seu
número. Seria melhor que as rochas e as montanhas caíssem

168
sobre mim do que o peso esmagador e insuportável dos meus
pecados. Senhor, estou muito sobrecarregado; tenha miseri-
córdia de mim, senão estou perdido. Livra-me desta culpa
pesada, desta carga esmagadora, caso contrário estarei
irremediavelmente aniquilado e serei empurrado para o
inferno. Se minha tristeza fosse pesada totalmente, e meus
pecados colocados na balança, seriam mais pesados que a
areia do mar; portanto, minhas palavras são engolidas;
pesariam mais que todas as rochas e colinas, e inclinariam a
balança se postos contra todas as ilhas da terra. Ó Senhor, Tu
conheces minhas inumeráveis transgressões e meus terríveis
pecados.
Oh, minha alma! Oh, minha glória! Como você está
humilhada! Outrora, a glória da criação e a imagem de Deus;
agora, um amontoado de imundícia, um receptáculo de
podridão, repleto de maus cheiros e repugnâncias. Oh, o que
o pecado fez com você! Você será denominada "abandonada"
e todos os compartimentos dos seus poderes serão chamados
"desolados" e você será chamada "lcabode" ou "Onde está a
glória?" Como você caiu vertiginosamente! Minha formosura
transformou-se em deformidade e minha glória em
vergonha. Senhor, que leproso nojento sou eu! Os corpos
cheios de feridas de Jó e de Lázaro não foram mais ofensivos
aos olhos e às narinas humanas do que eu devo ser para o
Deus santíssimo, cujos olhos não podem contemplar a
iniqüidade.
E que infelicidade meus pecados têm trazido sobre
mim! Senhor, em que estado eu me encontro! Traído pelo
pecado, lançado fora da graça de Deus, maldito do Senhor,

169
amaldiçoado em meu corpo, amaldiçoado em minha alma,
amaldiçoado em meu nome, em meu estado, em minhas
relações, e em tudo que tenho. Meus pecados são imperdo-
áveis e minha alma está a um passo da morte. Que tristeza!
O que farei? Para onde irei? Que caminho devo seguir? Deus
não me vê com bons olhos lá de cima; o inferno lá embaixo
está pronto para me engolir; a consciência está me
esbofeteando interiormente; tentações e perigos cercando-
-me externamente. Oh, para onde fugirei? Onde posso me
esconder da Onisciência? Qual o poder que pode me proteger
da Onipotência?
O que significa, ó minha alma, continuar assim? Você
tem alguma aliança com o inferno? Fez algum pacto com a
morte? Está apaixonada por sua miséria? Acha bom estar
aqui? Ai, que vou fazer? Continuarei nos meus caminhos
pecaminosos? Ora, assim é certo que a condenação eterna
será o meu fim. Será que estou tão embrutecido e louco a
ponto de vender minha alma às chamas por uma cervejinha,
ou por um pequeno conforto, ou por um pequeno prazer,
lucro ou deleite da minha carne? Continuarei ainda neste
estado deplorável? Não, se eu permanecer aqui, morrerei. O
que fazer então? Não há remédio? Não há esperança?
Nenhuma, a não ser que eu volte. Ora, não há remédio para
uma tão grande miséria? Alguma misericórdia para tão
provocante iniqüidade? Sim, tão certo como o juramento de
Deus é verdadeiro, obterei misericórdia e perdão se me voltar
hoje mesmo para Deus, de forma sincera e sem reservas,
através de Cristo.
Portanto, ajoelhado, agradeço-Te com minha alma, ó

170
misericordioso Jeová, porque com Tua paciência esperaste
por mim até agora; pois se tivesse me levado nesse estado
teria perecido eternamente. E agora adoro Tua graça e aceito
as ofertas da Tua misericórdia, renuncio a todos os meus
pecados e resolvo, pela Tua graça, posicionar-me contra eles
e seguir-Te em santidade e retidão todos os dias de minha
vida.
Quem sou eu, Senhor, para invocar-Te ou ter qualquer
parte em Ti? Eu, que não sou digno de lamber o pó de Teus
pés? Contudo, visto que Tu apresentaste o cetro dourado,
inclino-me para chegar até ele e tocá-lo. Desesperar signi-
ficaria depreciar a Tua misericórdia; e permanecer fora de Ti
quando Tu solicitas que eu venha, significaria destruir a mim
mesmo e rebelar-me contra Ti sob a pretensão de humildade.
Portanto, prostro minha alma diante de Ti e, com toda
gratidão possível, aceito-Te como meu e entrego-me a Ti. Tu
serás meu Soberano, meu Rei e meu Deus. Tu estarás no trono
e todos os meus poderes submeter-se-ão a Ti; eles virão e
adorarão diante de Teus pés. Tu serás a minha porção, ó Senhor,
e descansarei em Ti.
Tu pediste meu coração. Oxalá ele fosse digno da Tua
aceitação! Mas sou indigno, Senhor, eternamente indigno de
ser Teu. Entretanto, desde que Tu queres que seja assim,
entrego-Te espontaneamente, meu coração. Toma-o, é Teu.
Quem dera que ele fosse melhor! Contudo, Senhor, ponho-o
nas Tua mãos, pois só Tu podes consertá-lo. Molde-o conforme
o Teu próprio coração; faça-o, como se fora Teu, santo, hu-
milde, celestial, brando, terno, flexível e escreve nele a Tua
lei.

171
Vem, Senhor Jesus, vem depressa. Entra triunfalmente.
Toma-me para Ti mesmo, para sempre. Dou-me a Ti, venho
a Ti como único caminho para o Pai, como único Mediador,
o meio determinado para levar-me a Deus. Destruí-me a mim
mesmo, mas o meu socorro está em Ti. Salva-me, Senhor,
senão vou perecer. Venho a Ti, com a corda no pescoço.
Mereço morrer e ser condenado. Nunca o salário foi mais
merecido pelo servo, o dinheiro mais merecido pelo
trabalhador, do que a morte e o inferno, meus justos salários,
são merecidos por mim. Mas recorro aos Teus méritos; confio
somente no valor e na virtude do Teu sacrifício e no
predomínio da Tua intercessão. Submeto-me ao Teu ensino,
escolho Teu governo. Abram, portas eternas, para que entre
o Rei da Glória.
Ó Espírito do Altíssimo, Confortador e Santificador dos
Teus escolhidos, venha com todo Teu séquito, com todos os
Teus cortesãos, Teus frutos e Tuas graças. Permita que eu seja
a Tua habitação. O que posso Te dar, senão aquilo que já é
Teu? Mas como a viúva, dou-Te meus dois óbulos - minha
alma e meu corpo, ofereço-os ao Teu tesouro, entregando-os
completamente a Ti para que os santifiques, a fim de que
sejam Teus servos. Serão Teus pacientes; cura as suas
enfermidades. Eles serão Teus agentes; governa as suas ações.
Já servi demais ao mundo; já dei ouvidos demais a satanás;
mas, agora, renuncio a tudo e serei regido pelos Teus preceitos
e ordens, e guiado pelo Teu conselho.
Ó bendita Trindade, ó gloriosa Unidade, entrego-me a
Ti. Recebe-me; escreve Teu nome, ó Senhor, sobre mim e
sobre tudo que tenho, como patrimônio Teu. Coloca Tua

172
marca sobre mim, sobre cada membro do meu corpo e sobre
cada faculdade da minha alma. Escolhi Teus preceitos. Tua
lei estará diante de mim; ela será o exemplar que manterei
diante dos meus olhos, para estudar e escrever. Resolvo andar
de acordo com a Tua graça; todo o meu ser será governado
por esta lei. E embora eu não possa guardar perfeitamente
nem um só de Teus mandamentos, contudo, não me permi-
tirei infringir nenhum deles. Sei que minha carne vai relutar;
mas resolvo no poder da Tua graça, apegar-me a Ti e aos Teus
santos caminhos, custe o que custar. Sei que junto a Ti nunca
serei perdedor; portanto, aceitarei de boa vontade repre-
ensões, dificuldades e sofrimentos, e negarei a mim mesmo,
tomarei a minha cruz e Te seguirei. Senhor Jesus, Teu jugo é
suave, Tua cruz é bem-vinda, visto que esse é o caminho que
conduz a Ti. Ponho de lado todas as esperanças de uma
felicidade secular. Aguardarei, de boa vontade, até que eu
possa ir a Ti. Que eu seja pobre e humilde, pequeno e despre-
zado neste mundo, para que me seja permitido viver e reinar
conTigo no porvir. Senhor, tens meu coração e minha mão
neste acordo. Que eles sejam como a lei dos medos e dos
persas, que não pode ser revogada. Eu me firmarei nisso,
nesta resolução, pela Tua graça, viverei e morrerei. Jurei, e
cumprirei, que guardarei os Teus justos juízos. Dei o meu
consentimento voluntário e fiz a minha escolha eterna.
Senhor Jesus, confirma este contrato. Amém.

173
o pecador não tem nem a metade dessa velocidade. Veja como
seu coração se comove, como a sua compaixão se apieda. Quão
perspicaz é o amor! A misericórdia espreita-o de longe;
esquece-se de sua vida ímpia, de sua rebelião abominável,
de sua terrível ingratidão - nenhuma palavra a respeito disso
- e o recebe de braços abertos, lança-se ao seu pescoço e beija-
-o; manda buscar o bezerro cevado, o melhor vestido, o anel,
os sapatos, a melhor comida que há na despensa celestial, as
melhores vestes que há no guarda-roupa do céu. Sim, a alegria
não pode ser contida em seu peito. É preciso que outros sejam
convidados a participar. Os amigos simpatizam-se, mas
nenhum deles conhece a alegria que o pai tem com seu filho
renascido, que ele recebeu dentre os mortos. Parece que posso
ouvir a música à distância. Oh, a melodia dos coristas
celestiais! Não posso aprender o cântico (Apocalipse 14:3),
porém acho que ouço o tema de todo o coro harmonioso, a
uma só voz, começar a cantar suavemente: "Porque esse meu
filho estava morto e reviveu, tinha se perdido e foi achado".
Não preciso dar mais explicações sobre a parábola. Deus é o
Pai; Cristo é a provisão; Sua justiça é o vestido; Sua graça
são os ornamentos, os ministros, os santos e os anjos são os
amigos e os servos, e você, leitor, caso se arrependa
sinceramente e se volte para Deus, é o pródigo bem-vindo,
a feliz instância desta graça, o bendito tema desta alegria e
amor.
Ó rochedo! Ó inflexível! Ainda não se moveu? Ainda
não resolveu voltar-se imediatamente para a misericórdia?
Vou tentar mais uma vez. Se lhe fosse enviado alguém den-
tre os mortos, iria se convencer? Ora, ouça a voz dentre os

176
Oh, estou mesmo engolfado na abundância dos
argumentos que poderia sugerir. Se há uma coisa sábia no
mundo que se deve fazer, é arrepender-se e vir. Se há algo
justo e razoável, é isso. Se há algo que possa ser chamado de
loucura e insensatez, ou algo que possa ser considerado
estúpido, absurdo, embrutecido e irracional é isto: continuar
no seu estado de incredualidade. Se não quiser destruir-se a
si mesmo, eu lhe imploro que pare e pese os seguintes
motivos, além daquilo que já foi dito, e permita à consciência
dizer se não é mais razoável você se arrepender e voltar-se
para Deus.

1. O Deus que fez você o convida muito graciosamente.


Sua natureza tão doce e misericordiosa o convida. Oh,
Sua bondade, Sua infinita compaixão, -Suas ternas miseri-
córdias! Como o céu está mais elevado do que a terra, assim
Seus caminhos são mais elevados do que os nossos caminhos,
e os Seus pensamentos mais elevados do que os nossos
pensamentos. Ele é "cheio de compaixão, e piedoso, sofredor, e
grande em benignidade e em verdade" (Salmo 86: 15). Este é
um grande argumento para persuadir os pecadores a se vol-
tarem para Deus. "... e convertei-vos ao Senhor. .. porque ele é
misericor,dioso, e compassivo, e tardio em irar-se, e grande em
beneficência, e se arrepende do mal." Se Deus não se arrependesse
do mal, isso seria um tanto desencorajador para o nosso
arrependimento. Se não houvesse esperança de misericórdia,
não seria de admirar-se que os rebeldes resistissem; mas ja-
mais os súditos tiveram um príncipe tão gracioso, tão piedoso,
paciente e clemente para tratar com eles como você tem.

178
"Quem, ó Deus, é semelhante a ti, que perdoas a iniqüidade?"
(Miquéias 7: 18). Ó pecadores, vejam com que Deus vocês
têm que tratar. Se simplesmente se voltarem para Ele, Ele
"tornará a apiedar-se de nós; subjugará as nossas iniqüidades e
lançará todos os nossos pecados nas profundezas do mar"
(Miquéias 7: 19). "... tornai-vos para mim, e eu tornarei para vós,
diz o Senhor dos Exércitos"(Malaquias 3:7). Os pecadores não
caem por terem pensamentos muito elevádos sobre as
misericórdias de Deus, e sim porque desprezam a Sua justiça
ou porque prometem a si mesmos que há misericórdia fora
dos caminhos de Deus. As misericórdias de Deus sobrepujam
toda a imaginação; grandes misericórdias, múltiplas
misericórdias (N eemias 9: 19), ternas misericórdias, firmes
misericórdias, eternas misericórdias; e todas elas serão suas
se se voltarem para Deus. Vocês querem vir? O Senhor tem
deixado de lado o Seu terror e erigido um trono de graça.
Ele apresenta o cetro dourado: toquem-no e vivam. Porven-
tura um homem misericordioso mataria seu inimigo quando
prostrado a seus pés, reconhecendo o erro, implorando perdão
e desejando fazer um pacto de paz com ele? Muito menos o
Deus misericordioso faria isso. Estude Seu nome: "Que
guarda a beneficência em milhares; que perdoa a iniqüidade, e a
transgressão, e o pecado ... " (Êxodo 34:7). Leia também a
experiência registrada em N eemias 9: 17.
Os chamamentos e promessas de Deus, que encorajam a
alma, os convidam. Ah, que honesto solicitador é a miseri-
córdia para vocês! Quão amorosamente, quão insistentemente
ela os chama! Quão sinceramente ela os procura! "... volta, ó
rebelde Israel, diz o Senhor, e não farei cair a minha ira sobre vós,

179
porque benigno sou, diz o Senhor, e não conservarei para sempre a
minha ira. Somente reconhece a tua iniqüidade ... convertei-vos, ó
filhos rebeldes, diz o Senhor. .. voltai, eu curarei as vossas rebeliões.
Tu te maculaste com muitos amantes; mas ainda assim, torna para
mim" (Jeremias, capítulo 3). "Vivo eu, diz o Senhor Jeová, que
não tenno prazer na morte do ímpio, mas em que o ímpio se converta
do seu caminho e viva. Convertei-vos, convertei-vos dos vossos
maus caminhos; pois porque razão morrereis, ó casa de Israel?"
(Ezequiel 33: 11). "Mas se o ímpio se converter de todos os seus
pecados que cometeu, e guardar todos os meus estatutos, e fizer
juízo e justiça, certamente viverá; não morrerá. De todas as suas
transgressões que cometeu não haverá lembrança contra ele; pela
sua justiça que praticou viverá... Vinde, e convertei-vos de todas
as vossas transgressões e a iniqüidade não vos servirá de tropeço.
Lançai de vós todas as vossas transgressões ... e criai em vós um
coração novo e um espírito novo; pois porque razão morrereis ó
casa de Israel? Porque não tomo prazer na morte do que morre,
diz o Senhor Jeová; convertei-vos, pois, e vivei" (Ezequiel,
capítulo 18).
Oh, que palavras comoventes e graciosas; a voz de Deus,
e não de um homem! Esta não é a maneira dos homens, pois
o soberano ofendido processa o rebelde traidor e ofensor. Oh,
como a misericórdia os segue e suplica! Seus corações ainda
não estão quebrantados? Oh, se hoje ouvissem a Sua voz!

2. Pecador, as portas do céu estão abertas para você.


Os portais eternos estão abertos para você e uma opulenta
entrada no reino do céu lhe é oferecida.
Cristo Se dirige agora a você, e o chama para que se

180
levante e tome posse desta boa terra. Considere a glória do
outro mundo, da maneira como é apresentada no mapa do
evangelho. Suba ao Pisga das promessas e levante seus olhos
para o norte, para o sul, para o leste e para o oeste, e veja a
boa terra que está além do Jordão e as montanhas prazenteiras.
Contemple o paraíso de Deus, banhado pelos ribeiros de
glória. Levante-se e ande através da terra na extensão do
comprimento e da largura; pois a terra que você vê, o Senhor
lhe dará para sempre se se voltar para Ele. Deixe-me
perguntar-lhe, como Paulo perguntou a Agripa: '~creditas
nos profetas?,, Se você crer de fato, veja que coisas gloriosas
são ditas a respeito da cidade de Deus, e saiba que tudo isso
lhe é oferecido em nome de Deus. Assim como Deus é
verdadeiro, tudo isso será seu para sempre, se entregar-se
completamente ao Senhor.
Contemple a cidade de ouro puro e transparente, cujos
fundamentos são ornamentados com toda a espécie de pe-
dras preciosas, cujos portões são pérolas, cuja luz é a glória,
cujo templo é Deus. Você acredita nisso?' Se acredita, será
que não está fora de seu juízo em não tomar posse quando
os portões estão abertos para você, convidando-o a entrar? Ó
filho da loucura, por que abraça as coisas vis e recusa o reino?
Veja, o Senhor o leva à montanha, mostra-lhe o reino do céu
e toda a sua glória e lhe diz: "Tudo isso lhe darei, se prostrado
me adorar; se se submeter à misericórdia, aceitar o meu Filho
e me servir em justiça e santidade". "... ó néscios, e tardas de
coraçãopara crer. .. " Você buscará e servirá o mundo, negligen-
ciando a glória eterna? O quê!? Deixar de entrar no paraíso
quando a espada flamejante, que uma vez foi levantada para

181
impedi-lo de entrar, agora é usada para conduzi-lo para
dentro? Mas você dirá que sou injusto ao considerá-lo infiel
e incrédulo. O que devo pensar, então, a respeito de você?
Ou você é um incrédulo desesperado que não dá crédito a
essa glória, ou está fora de si, pois conhece e crê na excelência
e eternidade desta glória e, contudo, a negligência tão
temerosamente.
Preste atenção àquilo que lhe é oferecido: um reino
abençoado, um reino de glória, um reino de justiça, um reino
de paz e um reino eterno. Ali você habitará, reinará para
sempre e o Senhor o colocará num trono de glória, e com as
Suas próprias mãos porá o diadema real sobre a sua cabeça e
lhe dará uma coroa - não de espinhos, pois ali não haverá
pecado nem sofrimento; não de ouro, pois esse, naquele dia,
será mais vil que o lixo; mas uma coroa de vida, uma coroa
de justiça, uma coroa de glória. Sim, você vestirá a glória
como um manto e brilhará como o sol no firmamento do
seu Pai. Veja agora a sua carne inútil. Essa carne, que não é
mais que cinza e pó, será mais brilhante que as estrelas. Em
resumo, você será como os anjos de Deus e contemplará Sua
face em justiça. Considere e diga-me: ainda não crê? Se não
crê, a consciência deve declará-lo um infiel, pois é o próprio
recado de Deus que lhe transmito.
Mas se disser que crê, diga-me então a sua resolução. Vai
abraçar isto para sua felicidade? Renunciará seus lucros
pecaminosos, seus prazeres proibidos? Pisará sobre a apre-
ciação do mundo e fechará os ouvidos às suas lisonjas e livrar-
-se-á dos seus envolvimentos? Vai contentar-se em conviver
com desprezo e pobreza, caso eles estejam no caminho para

182
o céu, e seguir ao Senhor com humilde auto-negação, levan-
do uma vida mortificada para a carne? Se for assim, tudo
será seu eternamente.
Não seria essa uma oferta justa? Não seria certo que fosse
condenado e que perecesse aquele que permanecer em seus
caminhos, quando tudo isso pode ser obtido? Você não vai
levar Deus a sério? Não vai desgarrar-se do mundo para
agarrar-se à vida eterna? Se não é isso que vai fazer, permita
que a consciência lhe diga se está fora de si ou não, por
negligenciar uma tão feliz escolha, pela qual poderia ser feliz
para sempre.

3. Deus lhe concederá privilégios indizíveis nesta vida.


Embora a plenitude de sua bem-aventurança esteja
reservada para o porvir, Deus lhe dará grandes coisas nesta
vida. Ele o redimirá de sua escravidão. Vai tirá-lo das garras
do leão. A serpente ferirá o seu calcanhar, mas você ferirá a
cabeça dela. Ele vai libertá-lo deste mundo mau. A
prosperidade não o destruirá; a adversidade não o separará
dEle. Ele o redimirá do poder da morte e transformará o rei
dos terrores num mensageiro de paz para você. Tirará a
maldição da cruz e fará da aflição o cadinho para purificar a
alma, a ventarola para remover as impurezas e o remédio
para curar a mente. Ele o livrará das algemas da lei e tornará
a maldição em bênção para você. Ele tem as chaves do inferno
e da morte, e quando fecha nenhum homem abre; e fechará
a boca do inferno como uma vez fez com a boca dos leões, a
fim de que você não sofra o dano da segunda morte.
Além disso, Ele não somente o salvará da miséria, mas

183
também o revestirá de indizíveis prerrogativas. Ele Se
entregará a você; será um amigo e um pai para você. Será
um sol e um .escudo para você. Em suma, Ele será seu Deus.
E o que mais poderia ser dito? O que pode esperar que Deus
faça por você e seja para você? Isso Ele fará, isso Ele será.
Aquela que se casa com um príncipe espera que ele a trate
conforme um príncipe deve agir, para que ela viva numa
condição adequada a um dote condizente. Aquele que tem
um rei como pai ou amigo espera receber dele o tratamento
próprio de um rei. Ora, os reis e os monarcas da terra, tão
superiores a você, nada mais são do que borboletas coloridas
entre o restante de sua espécie ou a bela lagarta colorida entre
todas as demais lagartas, se comparados com Deus. Assim
como Ele excede infinitamente em glória e poder a poeira
brilhante, assim Ele excederá, acima de todas as proporções,
para os Seus escolhidos, tudo o que os príncipes podem fazer
para os favoritos deles. E Ele dará a vocês, leitores, graça e
glória e não lhes negará bem algum. Ele os tomará por filhos
e filhas e os fará herdeiros de Suas promessas, e estabelecerá
Seu concerto eterno com vocês. Ele os justificará de tudo
que a lei, a consciência e satanás possam acusá-los. Dar-lhes-
-á livre acesso à Sua presença e os aceitará e receberá as suas
orações. Ele habitará em vocês e manterá uma constante e
amigável comunhão com vocês. Seus ouvidos, Suas portas,
Seus celeiros estarão sempre abertos para vocês. Sua bênção
repousará sobre vocês e fará com que os seus inimigos os
sirvam e que todas as coisas cooperem para o seu bem.

184
4. As condições de misericórdia serão as mais acessíveis.
Deus tem sido tão acessível para os pecadores quanto a
Sua honra O permite. Ele não será o autor do pecado nem
manchará a glória da Sua santidade; e como Ele descerá mais
do que tem descido, a menos que aja contra Si mesmo?
Deus não impõe coisa alguma irracional ou impossível
como condição de vida para você. Era preciso fazer duas
coisas, de acordo com o teor do primeiro concerto. 1. Que
nós satisfizéssemos completamente às exigências da justiça
quanto às ofensas do passado. 2. Que cumpríssemos pessoal,
perfeita e perpetuamente toda a lei no tempo por vir. Por
causa de nossos pecados, tornamos a salvação impossível
através de qualquer desses caminhos. Mas, eis a graciosa
provisão de Deus em ambos. Ele não insiste quanto ao
. pagamento; Ele Se contenta em cobrar de Cristo - Sua
própria provisão - aquilo que poderia exigir de você. "E tudo
isto provém de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por Jesus
Cristo, e nos deu o ministério da reconciliação; isto é, Deus estava
em Cristo reconciliando consigo o mundo, não lhes imputando os
seus pecados; epôs em nós a palavra de reconciliação"(2 Coríntios
5: 18- 19). Ele próprio declara haver recebido um resgate e
não espera nada senão que você aceite o Seu Filho, e Ele será
sua justiça e redenção. Se vier com desejo em seu coração de
agradá-10, fazendo disso a sua preocupação principal, Ele o
aceitará graciosamente.
Oh, considere a condescendência de seu Deus! Permita-
-me dizer-lhe como os servos de Naamã disseram a ele: ''Meu
pai, se o profeta te dissera alguma grande coisa, porventura não o
farias? Quanto mais, dizendo-te ele: lava-te, eficarás purificado"

185
(2 Reis 5: 13). Se Deus exigisse alguma coisa terrível, severa
e rigorosa de você para escapar da condenação eterna não
iria fazê-la? Suponha que tivesse que passar todos os seus
dias em tristeza, num deserto horrível, ou definhar de fome;
você não aceitaria de bom grado a redenção eterna, ainda
que essas fossem as condições? Mais ainda, se Deus lhe tivesse
dito que você iria ser queimado no fogo durante milhões de
eras ou at_ormentado no inferno por muito tempo, você não
aceitaria? Infelizmente tudo isso não é mais do que um grão
de areia na ampulheta da eternidade. Se o seu Criador
ofendido prendesse você por um ano num instrumento de
tortura, e depois o ordenasse que abandonasse seus pecados,
aceitasse Cristo e O servisse durante alguns anos em auto-
-negação - do contrário estaria perdido para todo o sempre -
você acha que teria hesitado diante da oferta, discutido seus
termos, ficando indeciso quanto à aceitação da proposta? Ó
pecador, volte-se e viva; por que morrer, quando a vida está
ao seu alcance, quando a misericórdia o implora a ser salvo?
Ainda que pudesse dizer: "Senhor, eu conhecia-te que és um
homem duro", mesmo assim você não teria desculpas; mas
quando o Deus do céu tanto Se humilhou e tanto condes-
cendeu, se você permanecer fora, quem rogará por você?
Objeção: não obstante todas as vantagens da nova ali-
ança, sou incapaz de me arrepender e crer e, portanto, de
preencher as Suas condições.
Resposta: você pode preenchê-las pela graça capacita-
dora de Deus; mas deixe que a próxima consideração sirva
como uma resposta mais completa.

186
5. Deus lhe oferece toda a graça necessária para capacitá-
-lo.
"...porque estendi a minha mão, e não houve quem desse
atenção" (Provérbios 1:24). Não importa que você esteja
mergulhado no abismo daquela miséria de onde jamais
conseguirá sair. Cristo Se oferece para ajudá-lo a sair; Ele
estende Sua mão; se você perecer é porque está recusando
a Sua ajuda. "Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir a
minha voz... entrarei... " (Apocalipse 3:20). Que importa se você
é um desgraçado, miserável, pobre, cego e nú? Cristo oferece
uma cura para a sua cegueira, uma cobertura para a sua
nudez e riquezas para a sua pobreza. Ele lhe oferece Sua
justiça, Sua graça: 'Yl.conselho-te que de mim compres ouro
provado no fogo, para que te enriqueças; e vestidos brancos, para
que te vistas, e não apareça a vergonha da tua nudez; e que unjas
os teus olhos com colírio, para que vejas" (Apocalipse 3: 18).
Acaso você diz: ''A condição é impraticável; não tenho com
que comprar"? Você deve saber que essa compra é "sem dinheiro
e sem preço" (Isaías 55: 1). Essa compra é através da petição e
da busca com todo o coração. Deus lhe ordena que O conheça
e O tema. Você diz: "Sim, mas a minha mente está cega e
o meu coração endurecido quanto ao temor de Deus"?
Respondo-lhe que Deus Se oferece para iluminar sua mente
e ensiná-lo o Seu temor. Portanto, se agora os homens vivem
na ignorância e na alienação do Senhor, é porque não
entendem e não desejam o conhecimento de Seus caminhos.
"E se clamares por entendimento, e por inteligência alçares a tua
voz, se como à prata a buscares e como a tesouros escondidos a
procurares, então entenderás o temor do Senhor e acharás o

187
conhecimento de Deus" (Provérbios 2:3-5). Não se trata de uma
oferta justa? "Convertei-vos pela minha repreensão; eis que
abundantemente derramarei sobre vós o meu Espírito ... "
(Provérbios 1:26). Embora por si mesmo nada possa fazer,
entretanto poderá fazer tudo através da capacitação do Seu
Espírito, e Ele Se propõe a ajudá-lo. Deus ordena que você
"se lave e fique puro". Você diz que é incapaz de fazê-lo, da
mesma fo~ma que o leopardo é incapaz de tirar suas manchas.
Sim, mas o Senhor Se oferece para purificá-lo; portanto, se
você ainda está impuro, é por sua própria teimosia. "...pois
te purifiquei, e tu não te purificaste ... "(Ezequiel 24: 13). "... ai de
ti,Jerusalém! Não te purificarás? Até quando ainda?"(Jeremias
13:27). Deus o convida a ser purificado e lhe suplica que se
submeta a Ele. Oh, aceite a Sua oferta e permita que Ele
faça por você e em você aquilo que não pode fazer por si
mesmo.

188
CONCLUSÃO
E agora, pecador amado, diga-me o que pensa. O ·que
pretende fazer? Vai continuar como está e morrer, ou voltar-
-se e tomar posse da vida eterna? Por quanto tempo ainda
vai se demorar em Sodoma? Por quanto tempo ainda coxeará
entre duas opiniões? Ainda não decidiu se vai ficar do lado
de Cristo ou de Barrabás, se vai escolher a felicidade ou o
tormento, se vai optar por este mundo fútil e ímpio ou pelo
paraíso de Deus? Qual será a melhor escolha? Seria discutível
se o Abana e o Farpar de Damasco são melhores que todos
os regatos do Éden, ou se o charco imundo do pecado é
preferível à água da vida, que é clara como cristal e que
procede do trono de Deus e do Cordeiro? Poderia o mundo,
mesmo se quisesse, fazer por você aquilo que Cristo pode?
O mundo lhe dará o seu apoio na eternidade? Prazeres,
propriedades, títulos e tesouros descerão com você? Se isso
não vai acontecer, será que você não precisa procurar alguma
outra coisa que o acompanhe? Como pode permanecer
vacilante? Será que vou acabar deixando-o como Agripa,
apenas "quase persuadido"? Você estará perdido para sempre
se ficar nessas condições; tanto faz "de maneira alguma"
quanto "quase persuadido". Quanto tempo vai repousar em
desejos inúteis e em propósitos infrutíferos? Quando chegará
a uma resolução definida, firme e completa? Não vê como
satanás o engana tentando adiar a sua decisão? Oh, quanto
tempo ele o tem iludido no caminho da perdição!

189
Bem, não me engabele com uma resposta evasiva; não
deixe para mais tarde. Preciso do seu consentimento ime-
diato. Se não está resolvido agora, enquanto o Senhor está
tratando com você e o convidando, provavelmente muito
menos se decidirá depois, quando essas impressões se
apagarem e o seu coração estiver endurecido pelo engano
do pecado. Quer comprometer-se agora? Quer deixar a porta
aberta e dar ao Senhor Jesus total e imediato domínio?
Vai subscrever o Seu concerto? O que resolve? Se ainda
pretende demorar, meu trabalho está perdido e, pro-
vavelmente, tudo redundará em nada. Venha, considere a
sua situação; faça a sua escolha. "Eis aqui agora o tempo acei-
tável, eis aqui agora o dia da salvação." " ...se hoje ouvirdes a
sua voz" (2 Coríntios 6:2; Salmo 95 :7). Por que não deve ser
hoje o dia a partir do qual você pode datar o início de sua
felicidade? Por que vai aventurar-se a viver mais um dia
nessas condições perigosas e terríveis? E se Deus pedir a
sua alma esta noite? Oh, se você pudesse conhecer neste
seu dia as coisas que pertencem à sua paz, antes que elas
sejam escondidas de seus olhos! Este é o seu dia, e não passa
de um dia. Outros já tiveram o seu dia e receberam a sua
sentença; e agora você é trazido para o palco deste mundo, a
fim de representar o seu papel para a eternidade. Lembre-se
de que seu comportamento atual vai se refletir na eternidade;
se não fizer uma escolha sábia agora, estará destruído para
sempre. Qualquer que seja sua presente escolha, tal será a
sua condição eterna.
Mas será tudo isso verdade? Será que você pode escolher
entre a vida e a morte? O que o impede, então, de ser feliz?

190
Nada o impede ou pode impedi-lo, a não ser a sua própria
negligência ou recusa. O eunuco disse a Felipe: "... eis aqui
água; que impede que eu seja batizado?" (Atos 8:36). Assim,
posso dizer a você: "eis aqui Cristo, eis aqui a misericórdia,
o perdão e a vida; o que o impede de ser perdoado e salvo?"
Um dos mártires, quando estava orando sobre a estaca onde
seria sacrificado, teve o seu perdão colocado ao lado dele
numa caixa, o qual ele, de fato, corretamente recusou, porque
estava vazado em termos indignos; mas estes termos são os
mais honoráveis e fáceis. Ó pecador, você vai perecer tendo
o perdão ao seu lado? Dê, de agora em diante, seu consenti-
mento a Cristo; renuncie seus pecados; negue-se a si mesmo;
tome Seu jugo e Sua cruz e será vitorioso. Cristo será seu;
perdão, paz, vida e bênçãos serão seus. Não se trata de uma
oferta digna de ser aceita? Por que deveria hesitar ou discutir,
duvidando dos termos estipulados? Acaso não está além de
controvérsia que Deus é melhor do que o pecado e a glória
melhor do que a vaidade? Por que recusar a misericórdia
que Deus lhe oferece e pecar contra a sua própria vida?
Quando vai abandonar a preguiça e deixar de lado as suas
desculpas? Não se vanglorie do dia de amanhã, pois não sabe
onde vai passar esta noite.
Agora o Espírito Santo está contendendo com você. Ele
não contenderá para sempre. Você não tem sentido o coração
aquecido pela Palavra e quase persuadido a deixar seus
pecados e a aproximar-se de Cristo? Você não tem sentido
alguns impulsos em sua mente, pelos quais foi avisado do
perigo em que se encontra e de onde vai terminar esse seu
caminho errado? Talvez você seja como o jovem Samuel que,

191
quando o Senhor o chamou várias vezes, não reconheceu a
Sua voz; mas esses impulsos são as ofertas, os chamados e as
contendas do Espírito. Oh, aproveite a sua maré e conheça o
dia da sua visitação.
Agora o Senhor Jesus estende Seus braços para recebê-
-lo. Ele implora a você através de nós. Com que emoção,
com que ternura, com que compaixão Ele chama. A Igreja é
colocada num êxtase súbito ao som de Sua voz, "a voz do
meu amado". Oh, você vai fazer ouvido mouco à voz dEle?
Não seria essa a voz que quebra o cedro e faz saltar as mon-
tanhas como um bezerro; que faz tremer o deserto e separa
as labaredas de fogo? Não é o trovão do Sinai, mas uma voz
calma e suave. Não é a voz do Monte Ebal, uma voz de
maldição e terror, e sim a voz do Monte Gerizim, a voz da
bênção e das alegres novas de coisas boas. Não é a voz das
trombetas nem o rumor de guerra, mas uma mensagem de
paz do Príncipe da paz. Posso dizer-lhe, ó pecador, como
Marta disse à sua irmã: "O Mestre está aqui, e chama-te"(] oão
11 :28). Agora, então, com Maria levante-se depressa e ve-
nha a Ele. Quão doces são os Seus convites! Ele clama à
multidão: "Se alguém tem sede, venha a mim, e beba" (João
7:37). Como Ele é dadivoso! Não exclui ninguém. " ...e quem
quiser tome de graça da água da vida" (Apocalipse 12: 17).
"Vinde, comei de meu pão, e bebei do vinho que tenho misturado.
Deixai os insensatos, e vivei... " (Provérbios 9:5-6). "Vinde a
mim ... tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim ... e
encontrareis descanso para as vossas almas" (Mateus 11 :28-29).
"... e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei/ora" (João
6:37). Como Ele lamenta o obstinado homem que recusa!

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terei que me sentar, por fim, desapontado? Mas o fato de
vocês me desprezarem é uma questão sem importância; o
pior é que estarão desconsiderando o Deus que os fez,
rejeitando a compaixão e as súplicas de um Salvador, e
resistindo ao Espírito Santo, caso não se arrependam e não
sejam convertidos.
Bem, embora eu os tenha chamado durante muito tempo
e vocês tenham recusado, ainda assim vou levantar minha
voz, uma vez mais, como trombeta e gritar dos mais altos
lugares da cidade, antes de concluir com uma triste ex-
clamação: "Tudo está acabado!" Chamarei novamente os
pecadores indiferentes para que, se possível, possa despertá-
-los: "Ó terra, terra, terra, ouve a palavra do Senhor!" (Jeremias
22:29). A menos que queiram morrer, dêem ouvidos aos
últimos chamados da misericórdia. Eis aqui, em nome do
Senhor, proclamo publicamente a vocês: ':4.gora, pois,filhos,
ouvi-me... ouvi a correção, não a rejeiteis e sede sábios"
(Provérbios 8:32-33).
"Ó vós, todos os que tendes sede vinde às águas, e os que
não tendes dinheiro, vinde, comprai, e comei; sim, vinde e comprai
sem dinheiro e sem preço, vinho e leite. Por que gastais o dinheiro
naquilo que não é pão? e o produto do vosso trabalho naquilo que
não pode satisfazer? Ouvi-me atentamente, e comei o que é bom,
e a vossa alma se deleite com a gordura. Inclinai os vossos ouvidos,
e vinde a mim; ouvi, e a vossa alma viverá; porque convosco
farei um concerto perpétuo, dando-vos as firmes beneficências de
Davi" (Isaías 55: 1-3 ).
Ó vocês, todos os que estão doentes - seja enfermidade
ou tormento, ou possessão de espírito mau, ou orgulho, ou

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a Cristo como vasos de santidade para uso exclusivo dEle; e
então " ... ainda que os vossos pecados sejam como a escarlate, eles
se tornarão brancos como a neve; ainda que sejam vermelhos como
o carmesim, se tornarão como a branca lã" (Lucas 7:47; Isaías
1:18,6:7).
Ouçam, ó ébrios, por quanto tempo continuareis a beber?
Lancem fora o vinho! Ainda que tenham rolado na imun-
dícia de seus pecados, entreguem-se a Cristo para viverem
sóbria, justa e piedosamente; abracem a Sua justiça; aceitem
Seu governo; e embora tenham sido vis, Ele os lavará
(Apocalipse 1:5).
Ouçam, ó dissolutos, cujo deleite está numa vã e cor-
rompida associação para gastar o seu tempo em diversões
carnais; atendam ao chamado da Sabedoria e a escolham e
seus caminhos, e viverão (Provérbios 9:5-6).
Ouçam, ó escarnecedores, ouçam a Palavra do Senhor.
Embora zombem da piedade e dos que a praticam, e façam
de Cristo e Seus caminhos um objeto de escárnio, contudo
Ele os chama, a fim de ajuntá-los sob as asas de Sua
misericórdia. Em suma, apesar de estarem entre os piores da
lista negra, serão lavados, santificados, justificados no nome
do Senhor Jesus e pelo Espírito de Deus, caso sejam conver-
tidos genuinamente (1 Coríntios 6: 10-11).
Ó professores formais, que são apenas mornos e estão
confiantes numa forma de piedade. Abandonem sua
indecisão; sejam verdadeiros cristãos; sejam zelosos e arre-
pendam-se; e, então, ainda que tenham ofendido a Cristo,
serão a alegria do Seu coração (Apocalipse 3: 16-20).
E agora testifiquem de que a misericórdia lhes foi

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sejam encontradas no último dia algumas almas que tenham sido
convertidas como resultado deste trabalho; e permita que alguns
possam levantar-se e dizer que por estas persuasões foram ganhos
para Ti. Amém, amém."
E aquele que lê, diga: amém.

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