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10 de agosto de 2021

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Os fractais e a evolução
Como sabemos, os fractais estão presentes em quase tudo que nos rodeia. Não precisamos nos
esforçar muito para reconhecê-los nos ossos dos animais, nas montanhas, nas árvores,
nos caminhos dos rios, nas costas dos continentes, …
No entanto, o fato desses elementos da natureza serem exemplos de fractais não é a única coisa
que têm em comum. Todos eles apresentam uma forte característica: são frutos da evolução.
Desde que Charles Darwin publicou em “On the Origin of Species” (1859) a teoria da evolução
biológica, aprendemos que a seleção natural (advinda do confronto dos seres com as
adversidades do meio) promove adaptações para perpetuar as espécies. Essa adaptação foi
sintetizada na palavra evolução.

Ilustração do livro sobre evolução das espécies de Charles Darwin.

Aprofundando um pouco mais na propriedade de ser evoluído, é impossível não se apropriar


do neologismo criado por Nassim Nicholas Taleb em “Antifrágil: Coisas que se beneficiam com
o caos”, e dizer que o fruto da evolução é por essência “antifrágil”. Assim como as montanhas,
rios, costas, solos, árvores, …, estavam sujeitos aos intemperismos (casuais) da natureza, os
ossos estavam sujeitos aos intemperismos (também casuais) do ofício. É evidente que todos
esses estressores contribuíram para induzir à otimização (adaptação para perpetuar-se)
dessas geometrias. Ossos que não eram leves, flexíveis, resistentes e duráveis não levaram seus
possuidores a uma existência muito longínqua. Se, como disse Darwin, a existência é fruto da
evolução, o que existe hoje na natureza foi suficientemente antifrágil o bastante para se
perpetuar. A natureza não é apenas rígida, robusta ou inquebrável (que normalmente são as
definições usuais para o antônimo de frágil), a natureza é a mais perfeita antagonista da
fragilidade. Ela não só aguenta as adversidades, como melhora, aperfeiçoa, e enriquece, através
da evolução. O que não é bom, perde a capacidade de existir materialmente, e deixa espaço
para o que se adapta. Assim o fruto da natureza tende sempre para o antifrágil.
Ilustração do livro Antifrágil de Nassim Taleb.

Voltamos agora ao osso. Tecido conjuntivo rico em cálcio e fibras de colágeno. Essa estrutura
permite que milhares de espécies tenham sustentação para caminhar, correr, voar, nadar e até
fazer coisas inacreditáveis. Isso sem falar em suas dezenas ou até centenas de outras funções
associadas ao funcionamento do organismo. O osso é fractal. Ele é uma estrutura porosa,
cujos poros se repetem numa variação de escalas, sendo possível perceber padrões fractais (ou
multifractais). Além disso, o osso é evolução.

Ilustração de uma osso.

Se considerarmos apenas o osso do corpo de um humano, podemos afirmar que ele está em
processo de evolução (de melhora contínua) há milhares de anos. Logo, aquela estrutura
porosa e multifuncional (que produz e transporta sangue, resiste a muito peso, é leve, flexível e
regenerativo) pode, sim, ensinar muito acerca de estruturas eficientes. Existem hoje diversos
artigos que abordam os ossos através de uma óptica fractal, como “Fractal properties of bone”
(GERAETS & STELT, 2000). Complementando essa visão, há ainda artigos mais audaciosos que
buscam o entendimento acerca do comportamento dos ossos através do uso do cálculo
fracionário, como “A fractional calculus approach to the mechanics of fractal media”
(CARPINTERI et al., 2000).
Inspirando-se justamente nessas questões de eficiência e multifuncionalidade de forma a
reproduzir o que se tem na natureza, encontramos diversas propostas sobre a criação de
estruturas com os mais variados fins. Podemos citar, por exemplo as antenas fractais, as
esponjas metálicas, as fundações em forma de raízes de árvores (abre em nova aba), e até
mesmo estruturas mecânicas fractais, como a da patente em depósito “Método de
desenvolvimento de peças mecânicas multifuncionais utilizando a geometria fractal” e
os estudos sobre a mecânica das árvores (abre em nova aba) escritos por membros da própria
Fractalize. Com certeza, não faltam olhares que busquem constantemente aplicar a
antifragilidade da natureza nos ramos da engenharia.
Ilustração de asa de avião construída com elementos fractais.

É impossível negar que, construir uma teoria em cima de uma prática bilenar (que é a prática
da sobrevivência), segue uma lógica bem fundamentada. Se o osso é da forma que é graças a
praticamente uma infinidade de tentativas e erros, não é justo falar que ele é o que se tem de
mais adaptado no Mundo? Por que não olhamos para a natureza antes de fazer um projeto?
Por que pensamos que o tecnológico é sempre mais “evoluído” do que o natural? Por que
somos tão cientificamente cegos e tão naturalmente céticos?

Se você gostou do conteúdo desse post, confira mais sobre


as publicações do nosso grupo que foram citadas aqui.
Referências:
BARROS, M.M. e BRUGNARA, B.E. Método de desenvolvimento de peças mecânicas
multifuncionais utilizando a geometria fractal. Depositante: Universidade Federal de Juiz de
Fora, 2019.
BRUGNARA, B.E. Interpolando Parâmetros: uma discussão sobre a geometria fractal e o cálculo
fracionário na abordagem de fenômenos físicos, – São Paulo: Editora Dialética, 2021.
CARPINTERI A., CHIAIA B. & CORNETTI, P. A fractional calculus approach to the mechanics of
fractal media. Rendiconti del Seminario Matematico 58.1 (2000): 57-68
COHEN, N. Fractal antenna applications in wireless telecommunications. Professional Program
Proceedings. Electronic Industries Forum of New England, Boston, MA, USA, 1997, pp. 43-49.
DARWIN, C.R. On the Origin of Species by Means of Natural Selection – The Preservation of
Favored Races in the Struggle for Life. London, 1859.
GERAETS, WG., STELT,Van Der. Fractal properties of bone. Dentomaxillofac Radiol 2000 May;
29(3):144-53.
Illa B. Soncin, Lucas T. Souza, Marcelo M. Barros. Estruturas ramificadas como solução
alternativa para fundações. Engenharia e Geotecnia: Princípios Fundamentais. 1ªed.: Editora
Conhecimento Livre, Volume 1, p. 20-38. 2019
KENNY, Lorne D. Process for shape casting of particicle stabilized metal foam, 1994.
MANDELBROT, B. B., The Fractal Geometry of Nature, W.H. Freeman and Co., New York, 1982.
Ribeiro, P. de O., & Barros, M. M. (2020). Um estudo sobre a mecânica de árvores. Principia:
Caminhos Da Iniciação Científica, 19(1), 13. https://doi.org/10.34019/2179-
3700.2019.v19.29894
TALEB, Nassim Nicholas. Antifrágil: Coisas que se beneficiam com o caos. Tradução Renato
Marques, 1 ed., Rio de Janeiro: Objetiva, 2020.

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