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PESQUISA

CDD: 371.33

Uma análise da produção


audiovisual colaborativa:
uma experiência inovadora em
uma escola de ensino fundamental

Mônica Cristina Garbin1

RESUMO
O objetivo do presente trabalho é analisar de que forma se deu a
colaboração entre os alunos e os professores para a construção
de um vídeo educativo, em uma escola de ensino fundamental
localizada em Campinas. Organizamos nosso trabalho em três
etapas, sendo a primeira correspondente à criação dos materiais
a serem usados na pesquisa de campo; a segunda diz respeito ao
trabalho de campo, com observações e entrevistas dos sujeitos;
e a terceira relaciona-se à criação de parâmetros para análise
dos dados e à análise propriamente dita. Além disso, a pesquisa
na escola, realizada entre os anos de 2009 e 2010, foi dividida
em duas fases: na primeira trabalhamos com estudantes e
professores do ensino médio e, na segunda, com o ciclo II do
ensino fundamental. Durante a análise dos dados, utilizamos
nossa pesquisa bibliográfica para ajudar na identificação dos
processos encontrados no material coletado, caracterizando-os
como colaborativos ou não. Ao final da pesquisa, notamos que
o processo de colaboração entre alunos e professores requer
uma mudança de postura de ambos.

PALAVRAS-CHAVE
Produção audiovisual colaborativa; Web 2.0; Tecnologias na
educação; Ensino fundamental

1
Pedagoga, Mestre em Educação pelo Laboratório de Novas Tecnologias Aplicadas na Educação – Faculdade de
Educação – Unicamp. Pesquisadora da área de Tecnologias Aplicadas para a Educação. E-mail:
monica_garbin@yahoo.com.br – Brasil.

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Analysis of collaborative audiovisual
production: an innovation experience in
an elementary school

ABSTRACT
The aim of this paper is to examine how the collaboration took
place between students and teachers to build an educational
video in an elementary school located in Campinas. Therefore,
we organize our work into three phases: the first one
correspond to the creation of materials to be used in our field
research, the second relates to the field work (observations and
interviews with the subjects), and the third relates to
establishing parameters for data analysis and the analysis
itself. Furthermore, the school research, conducted during the
years 2009 and 2010, was divided into two phases: the first one
we worked with high school teachers and students and in the
second one we worked with teachers and students from the
second cycle of basic education. During data analysis we used
our literature research to help us to identify the found processes
in our collected material, characterizing them as collaborative
or not. At the end of the study we have noted that the process of
collaboration between students and teachers requires a change
of attitude from them.

KEYWORDS
Collaborative audio-visual production; Web 2.0; Technologies
in education; Elementary education

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INTRODUÇÃO

Há muito tempo se fala sobre a importância da interação social e da colaboração


no desenvolvimento do pensamento humano, como pode ser visto nos trabalhos de Vygotsky
(1998) e Piaget (1989). Ao desenvolverem sobre este tema, os autores apontam que o
conhecimento se enraíza na relação que os indivíduos estabelecem com o meio ambiente ou
com aqueles outros com quem se relacionam.

Quando estudamos a literatura recente a respeito de colaboração, notamos que os


autores (LAN; JIANG, 2009; HUANG; LIU, 2009) trabalham também com termos que
permeiam esse conceito, abordando conceitos como o de mediação e de cooperação, sem
contar o de interação social, implícito na teoria defendida tanto por Vygotsky (1998) como
por Piaget (1989). Além disso, é notável certa homogeneidade de pensamento em relação ao
uso da tecnologia como auxílio no trabalho do professor ou, ainda, como objeto mediador
entre conhecimento e alunos, mas, ainda assim, sem deixar de lado o papel do professor como
mediador primeiro no uso desses elementos para desenvolvimento do aprendizado.

Neste sentido, Prensky (2001; 2007; 2009) argumenta que, com o advento das
Novas Tecnologias da Comunicação e da Informação e a rápida disseminação do
conhecimento, novas formas de pensar surgiram. Para ele, os sujeitos nascidos num mundo
altamente tecnológico pensam e agem de maneira diferente em relação aos conhecimentos,
utilizam novos mecanismos para resolver um problema, divulgam e compartilham conteúdos,
dentre tantas outras atividades.

Diante desse cenário, as condições de trabalho também se modificam. Os


empregadores cada vez mais procuram sujeitos com qualidades diferenciadas, que saibam
trabalhar em grupo, que tenham certo engajamento com as tecnologias e capacidade de
resolver problemas que lhes são apresentados pela primeira vez (TSAI, 2009).

Diante de todas as modificações que as tecnologias criaram na sociedade,


apontamos para a necessidade de analisar como essas ações influenciam o cotidiano de quem
as executa, bem como seu reflexo no processo de aprendizado dos sujeitos imersos neste novo
universo. Considerando, ainda, que elas promovem certa interação e colaboração e que, como

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apontavam Vygotsky e Piaget, ambas favorecem o desenvolvimento do pensamento, de que
maneira poderiam contribuir para o processo de aprendizado?

COLABORAÇÃO E APRENDIZAGEM

A maioria dos autores (ALMENARA, 2003; ESPINOSA, 2003; BELLONI; GOMES,


2008; LAN; JIANG, 2009) que trata do tema ―colaboração‖ estabelece a relação deste com o
termo ―cooperação‖ e, ainda, de ambos com a teoria sociointeracionista. Para alguns, os
termos colaboração e cooperação são sinônimos; entretanto, em outros casos, há a
diferenciação sobre o papel ou o envolvimento de cada indivíduo do grupo para a resolução
da tarefa. Ao estabelecerem a relação de ambos os termos com a teoria sociointeracionista,
apontam, ainda, a importância da interação e da mediação durante processos de colaboração e
cooperação, para que sejam de fato satisfatórios. (BELLONI; GOMES, 2008).

Colaboração

Tendo entendido que interação é um processo de relação, que tanto pode ser
humana como entre humanos e objetos, a partir de agora, buscaremos um significado para
colaboração, tendo em vista que a interação é parte do processo de colaboração, como
veremos a seguir.

Para Lan e Jiang (2009), o aprendizado colaborativo envolve uma série de outras
abordagens na educação, que se relacionam com um esforço intelectual conjunto de vários
alunos e professores. Além disso, enumeram seus benefícios: possibilitar o aumento do
envolvimento com o conteúdo trabalhado; desenvolver o pensamento crítico e a capacidade
de resolução de problemas; encorajá-los a aprender a realizar tarefas.

Argumentam, ainda, que a realização do aprendizado colaborativo depende de três


itens: bom canal de recepção e transmissão de conhecimentos, o que melhora o sentido de
participação para os aprendizes; surgimento de conhecimentos gerados pela partilha de
informações; e, finalmente, alunos que tiveram considerável senso de conhecimentos básicos
e participação (LAN; JIANG, 2009).

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Para Vygotsky (1987, p. 17), ―[...] a colaboração entre pares durante a
aprendizagem pode ajudar a desenvolver estratégias e habilidades gerais de solução de
problemas através da internalização do processo cognitivo implícito na interação e na
comunicação‖. Nesse sentido, a colaboração entre os seres pressupõe o desenvolvimento de
um trabalho de parceria, visando um objetivo comum — algo que não poderia ser produzido
de maneira individual.

Para Almenara (2003) e Espinosa (2003), na formação de grupos para a realização


de tarefas colaborativas deve-se, sempre que possível, contemplar sujeitos que não tenham
vínculos sociais. Além disso, as autoras apontam que, em um grupo colaborativo, o
conhecimento deve ser construído de maneira conjunta e negociado numa comunicação
bidirecional e contínua.

Em relação a essas habilidades necessárias para um trabalho comum, não


podemos deixar de citar o conceito de polifonia defendido por Bakhtin (1981). Segundo ele, a
multiplicidade de vozes e as consciências individuais representam pontos de vista sobre o
mundo. Assim, num trabalho colaborativo, diferentes vozes e visões de mundo dialogam, num
processo dinâmico, envolvendo tensões e conflitos de significações; portanto, há necessidade
de constantes negociações de sentidos.

Adicionalmente a isso, a aprendizagem colaborativa é considerada pelos


estudiosos do assunto uma importante forma de ensino. Ela não apenas é um forte aliado para
a construção do conhecimento de cada participante, como também favorece a partilha, com
outros alunos, dos saberes construídos. Tal forma de ensino, se usada de maneira adequada,
proporciona a cada estudante adquirir um conhecimento mais abrangente do que aqueles que
são construídos de maneira individual, por exemplo (LAN; JIANG, 2009).

Um aprendizado realizado de maneira colaborativa age na zona de


desenvolvimento proximal dos estudantes envolvidos, já que sujeitos em diferentes níveis de
desenvolvimento interagem para a construção de um conhecimento em comum. E, ainda,
alunos que participam de atividades desse tipo desenvolvem melhor habilidades de resolução

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de problemas, aprendem com mais facilidade a utilizar ferramentas, melhoram a comunicação
com seus pares etc. (HUANG; LIU, 2009).

No que se refere ao desenvolvimento de novas habilidades nos estudantes, Tsai


(2009) aponta que, cada vez mais, o mercado de trabalho cobra de seus empregados essas
novas competências, principalmente aquelas que se relacionam ao uso de ferramentas
tecnológicas, como o computador, por exemplo. Sendo assim, é importante que as instituições
de ensino incluam o aprendizado colaborativo e utilizem as tecnologias como mediadoras de
processos de aprendizado; daí a importância da construção do conhecimento de maneira
conjunta.

Nesse sentido, diante daquilo que foi observado, podemos dizer que colaboração é
um processo de construção conjunta, em que um grupo de pessoas tem um objetivo em
comum a ser alcançado e, de maneira coletiva, deve tomar decisões e atitudes para alcançá-lo.
Disso decorre a importância da interação dentro da colaboração.

Cooperação

Apesar de muito semelhante ao conceito de colaboração, já que também está


ligada a um processo de interação para chegar a um objetivo comum, a cooperação tem como
principais características a necessidade de hierarquia e as ações coordenadas. Assim,
diferenciam-se cooperação e colaboração, como sustentam Belloni e Gomes (2008). As
autoras apontam que a colaboração e a interação são conceitos que integram o de cooperação.

Já segundo Almenara (2003) e Espinosa (2003), há a diferenciação também em


relação à formação de grupos e à existência de hierarquias. No trabalho cooperativo, não há
necessidade de agrupar indivíduos sem ligação pessoal; os grupos podem ser formados por
sujeitos com certa proximidade. Além disso, um grupo cooperativo pressupõe a existência de
um comandante, alguém que seja considerado o chefe (ALMENARA, 2003; ESPINOSA,
2003).

Tanto a colaboração como a cooperação podem ser utilizadas no ambiente escolar,


no desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem. Belloni e Gomes (2008) acreditam

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que a aprendizagem pode ser mais rica, se o ensino for proposto de maneira cooperativa, mas,
para tanto, cada aluno deve saber que seu êxito pessoal tem peso para o grupo.

Além disso, as autoras concordam, também, que o conceito de cooperação vai


para além daquele de colaboração, pois esta última existe mesmo que não haja um projeto
sendo desenvolvido, mas a primeira está relacionada ao sucesso de um projeto em comum.
Elas defendem também que o uso criativo de tecnologias pode auxiliar em tais processos,
maximizando os ganhos cognitivos dos estudantes na realização da tarefa proposta.

Podemos dizer, então, que cooperação está ligada ao desenvolvimento de um


projeto por um grupo de pessoas que estabelece um objetivo em comum e possui um líder que
é responsável por guiar e cobrar cada integrante de suas tarefas individuais. Além disso, cada
sujeito que integra o grupo tem um papel diferente, e cada tarefa executada, ao ser unida às
demais, complementa o projeto em desenvolvimento.

Nesse sentido, podemos estabelecer:

QUADRO 1
Quadro conceitual

Autores estudados Conceito

Colaboração Bakhtin (1981) É um processo de construção conjunta, em que um


Vygotsky (1987) grupo de pessoas tem um objetivo em comum a ser
Almenara (2003) alcançado e, de maneira coletiva, devem tomar
Espinosa (2003) decisões e atitudes para alcançá-lo.
Borges (2003)
Belloni e Gomes (2008)
Monahan, Mcardle e Bertolotto,
(2008)
Huang e Liu (2009)
Lan e Jiang (2009)
Cooperação Carvalho (1994) Está ligada ao desenvolvimento de um projeto por
Vygotsky (1998) um grupo, no qual é estabelecido um objetivo em
Almenara (2003) comum, bem como um líder que é responsável por
Espinosa (2003) guiar e cobrar cada integrante de suas tarefas
Borges (2003) individuais, que, unidas às demais, complementam o
Espinosa (2003) projeto.
Belloni e Gomes (2008)
Interação Vygotsky (1998) É a relação estabelecida entre o sujeito e o meio em
Oliveira (1997) que vive ou aquela realizada com outros indivíduos.
Belloni e Gomes (2008)
Monahan, Mcardle e Bertolotto,
(2008)
Chiu, Wen e Sheng (2009)

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Sabin e Leone (2009)
Mediação Luria (1979) É uma operação cognitiva que está entre o sujeito e a
Oliveira (1997) realidade, sendo que ela pode ser tanto humana,
Vygotsky (1998) quanto material, permitindo ao sujeito troca de
experiências, interpretações e significados.

É possível ainda definir indicadores ou características que permitem estabelecer


quando um processo é cooperativo, colaborativo, de interação ou de mediação:

QUADRO 2
Características

Indicadores Colaboração Cooperação Interação Mediação

Relação interpessoal Pressupõe contato Pressupõe contato Pressupõe Pressupõe


(Vygotsky, 1987, 1998; com mais pessoas. com mais pessoas. contato com mais contato com
Belloni e Gomes, 2008; pessoas ou mais pessoas
Monahan, Mcardle e ferramentas. ou ferramentas.
Bertolotto, 2008)
Formação de grupos Heterogêneo Sem restrições Não pressupõe Não pressupõe
(Almenara, 2003; formação de formação de
Espinosa, 2003; Lan e grupos. grupos.
Jiang, 2009)
Comunicação Bidirecional Unidirecional Sem restrições Sem restrições
(Almenara, 2003;
Espinosa, 2003; Belloni e
Gomes, 2008; Lan e Jiang,
2009; Huang e Liu, 2009)
Envolvimentos dos Integrantes têm Cada integrante - -
sujeitos nas tarefas papel comum. tem um papel
(Borges, 2003; Almenara, diferenciado.
2003; Espinosa, 2003;
Belloni e Gomes, 2008;
Monahan, Mcardle e
Bertolotto, 2008; Lan e
Jiang, 2009)
Negociação de sentidos É preciso chegar É preciso chegar - -
(Bakhtin, 1981; Lan e a um consenso a um consenso
Jiang, 2009)
Objetivos comuns Pressupõe Pressupõe - -
(Carvalho, 1994; Borges, objetivos comuns objetivos comuns
2003; Almenara, 2003;
Espinosa, 2003; Belloni e
Gomes, 2008; Monahan et
al., 2008)
Divisão do trabalho Todos são É necessário um - -
(Borges, 2003; Almenara, responsáveis por líder que
2003; Espinosa, 2003; todas as etapas. coordene as
Monahan, Mcardle e atividades
Bertolotto, 2008) individuais.
Ambiente diferenciado Pode ocorrer no É preciso ter uma Pode ocorrer no Pode ocorrer
(Carvalho, 1994; desenvolvimento tarefa específica, desenvolvimento no
Vygotsky, 1998; Belloni e de qualquer por exemplo, de qualquer desenvolvimen
Gomes, 2008) tarefa. relativa ao tarefa. to de qualquer

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ambiente escolar. tarefa.

A TECNOLOGIA NA EDUCAÇÃO

Macluhan já afirmava que haveria um dia que as crianças aprenderiam mais e


mais rapidamente, quando estivessem mais em contato com mundo exterior à escola do que
nela; ou, ainda, que, mesmo as mais pequeninas, sós ou em conjunto, pesquisariam pela
solução dos problemas que lhes fossem apresentados (MACLUHAN apud LIMA, 1971).

Em 2001, Prensky dizia que os estudantes se haviam tornado radicalmente


diferentes daqueles do passado, mas que a mudança não era somente em suas gírias, nos
adornos corporais ou no estilo, como outrora. A mudança a que se referia é a chegada e a
rápida disseminação da tecnologia digital nas últimas décadas do século XX.

O autor afirma que esses ―novos‖ estudantes passaram a vida inteira rodeados por
computadores, televisores, filmadoras, celulares e os graduados nos Estados Unidos nessa
época acumularam menos de 5 mil horas em leituras, porém mais de 10 mil horas jogando
video game e 20 mil horas assistindo televisão. Assim, essas tecnologias digitais já faziam
parte de suas vidas (PRENSKY, 2001).

Belloni e Gomes (2008) alegam que, no mundo, os mais entusiastas em relação ao


uso das tecnologias no cotidiano são os jovens, que se conectam a salas de bate-papo, MSN,
blogs, fotologs, jogos eletrônicos e de papéis. As autoras acreditam que para a maior parte dos
meninos e meninas o computador é uma máquina para conectar-se à rede.

Nesse mesmo sentido, Waycott et al. (2010) mostram em sua pesquisa, realizada
nos Estados Unidos, que as tecnologias mais utilizadas pelos jovens são celulares, tocadores
de MP3, bate-papos ou mensagens instantâneas, enquanto os mais velhos utilizam
computadores e celulares. Muitos dos jovens ainda citaram tecnologias como blogs e redes
sociais. (WAYCOTT et al., 2010, p. 1205)

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Ainda nessa mesma pesquisa, os entrevistados foram questionados sobre os usos
que faziam das tecnologias em seu cotidiano e, a partir dessas respostas, os autores
conseguiram identificar cinco tipos de uso: interesse pessoal ou entretenimento (exemplos:
baixar músicas, acessar informações, assistir a um filme etc.); comunicação social (exemplos:
contatar parentes ou amigos que moram longe, enviar convites de determinado evento para
uma lista de pessoas etc.); uso diário para atividades variadas (exemplos: armazenamento de
dados, acesso a informações, a horários de transportes etc.); uso profissional para trabalho; e
uso para a universidade, como atividades de estudos (WAYCOTT et al., 2010).

Em estudo semelhante, Jones et al. (2010) divulgam uma tabela que mostra os
usos que os estudantes fazem de determinadas tecnologias para a educação. Ali se apresentam
dados como, por exemplo: 44,59% dos entrevistados nunca usam blog e 32, 43% quase nunca
usam; 25,68% dos entrevistados raramente usam bate-papos e 40,54% nunca usam; 31,08%
dos entrevistados quase nunca usam videoconferência para atividades relacionadas a estudo e
51,35% nunca usam; e 20% deles sempre usam enciclopédias on-line (Wikipédia, por
exemplo) e 21,33% usam-nas frequentemente. São dados bastante significativos,
considerando que, para atividades relativas a lazer, todos os entrevistados utilizam tecnologias
e, em sua maioria, aquelas com características da Web 2.0.

No caso brasileiro, em pesquisa realizada na Grande Florianópolis, afirmava-se


que 73% dos jovens diziam ter acessado a internet pelo menos algumas vezes e, embora a
maioria do público pesquisado esteja em uma situação socioeconômica mais privilegiada, ela
nos mostra que mesmo aqueles em situação de risco ou já haviam tido contato com o
computador ou seu maior desejo era operar um (BELLONI; GOMES, 2008).

O PNAD, responsável pelas pesquisas com amostras nacionais por domicílio, em


seu último lançamento, divulgou dados mostrando que, nos últimos três anos, o número de
brasileiros com idade acima de 10 anos que acessaram a Internet aumentou 75,3%, passando
de 20,9% para 34,8%, o que correspondia a 56 milhões de usuários, em 2008.

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Tais dados mostram, ainda, que o fogão e a televisão representam os aparelhos
que mais estão presentes nos domicílios brasileiros. Em 2008, 98,2% (56,541 milhões) dos
lares possuíam fogão, enquanto 95,1% (54,753 milhões) possuíam televisão, que em 2001,
aparecia em 89% dos lares (BRASIL, 2008).

Dados divulgados em final de 2009 pelo Comitê Gestor de Internet no Brasil


(CGI) também mostram crescimento do acesso a esses meios tecnológicos, confirmando os
dados divulgados pelo PNAD em 2008. É importante lembrar que, neste caso em específico,
os dados não se referem à quantidade de computadores ou de Internet nos lares, mas, sim, ao
acesso da população, ou seja, essa utilização não está ligada necessariamente à posse da
ferramenta.

Nesse sentido, a pesquisa mostrou que, mesmo com o aumento de acesso a essas
ferramentas, a disparidade de acesso, se analisarmos por estado brasileiro, ainda é
considerável: por exemplo, um dos dados divulgados mostra que a região nordestina tem a
menor proporção de domicílios com essas tecnologias e demonstrou um desempenho menor
que a média nacional (CGI, 2009).

Essa realidade vai ao encontro daquilo que Belloni e Gomes (2008) afirmavam,
no ano anterior ao da pesquisa: a acessibilidade ainda é bem reduzida, por conta das
desigualdades sociais e regionais presentes no país. Entretanto, tal tecnologia ainda é desejo
de praticamente todos os jovens. Nesse sentido, as autoras afirmam que a escola ―deveria e
poderia‖ compensar as desigualdades, integrando os jovens nas culturas digitais, para que não
sejam ciberexcluídos.

Thinyane (2010) aponta que é preciso tomar cuidado com a generalização, para
evitar que todos os estudantes sejam tomados como usuários assíduos de tecnologias.
Primeiramente é preciso analisar quais são os usos que se fazem dessa tecnologia, ou seja, é
necessário realizar um exame do acesso a ela e do aproveitamento obtido pelos alunos quando
a utilizam. A autora revela que em seu estudo notou que muitos estudantes africanos só
tiveram acesso à tecnologia no primeiro ano de Faculdade; ou ainda que, embora muitos

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estudantes australianos sejam experientes no uso, essa não é uma situação homogênea em
toda população estudantil.

Tal contexto nos remete aos dados divulgados pelo PNAD em 2008 (BRASIL,
2008) e citados acima, que nos mostram que 34,8% dos brasileiros a partir dos 10 anos
acessaram a Internet, pelo menos uma vez. Ainda que essa porcentagem tenha aumentado, ela
indica também que mais da metade da população brasileira, naquela faixa etária, nunca usou a
tecnologia em questão.

Waycott et al. (2010) apontam que existe um termo que tem sido usado
tradicionalmente para definir as diferenças entre as nações ou grupos socioeconômicos e seus
acessos às tecnologias, que em inglês é o digital divide, que pode ser entendido como ―divisão
digital‖.

Prensky, em 2001, lançou os termos ―nativos digitais‖ e ―imigrantes digitais‖,


afirmando a existência de um fosso digital entre as gerações. Os jovens que cresceram com as
tecnologias, os nativos, são capazes de adotar facilmente as mudanças tecnológicas e adaptar-
se a elas, enquanto os mais velhos entram no mundo digital mais tarde, são os imigrantes,
mostrando menor afinidade com a tecnologia (PRENSKY, 2001).

Ambos os autores questionam que o maior problema enfrentado pela educação no


mundo nos últimos tempos, com a chegada e a socialização das tecnologias digitais, é
justamente a ―divisão digital‖ (PRENSKY, 2007, 2009; WAYCOTT et al., 2010).

O termo ―nativo digital‖ e seu significado remetem-nos à fala de Mcluhan, trazida


no parágrafo inicial deste tópico, de que os jovens um dia poderiam aprender em espaço
exterior à instituição escolar, o que, como vimos com Prenksy (2001), já acontece há algum
tempo. Além disso, Prensky (2001, 2009), citando evidências neurológicas, biológicas, social-
psicológica e estudos de aprendizado na infância, sugere que os nativos não apenas são
capazes de comunicar-se e aprender de maneiras diferentes, como também seus cérebros são
fisicamente diferentes.

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Belloni e Gomes (2008, p. 722) assinalam que estudos divulgados nos últimos
anos apontam para a importância das mídias na criação dos ―mundos sociais e culturais das
crianças‖, que é onde acontecem os ―processos de socialização‖. As pesquisas das autoras,
realizadas nas últimas décadas e em três capitais brasileiras, mostram evidências de como a
televisão e a Internet estão entre as tecnologias preferidas pelos jovens, que são ―usuários
assíduos‖ quando e sempre que têm acesso a elas.

O impacto do desenvolvimento tecnológico sobre as formas de vida social


(educação, comunicação, trabalho, lazer, relações pessoais, familiares, cultura, imaginário,
identidades etc.) é incontestável. As famílias que tiveram suas casas invadidas pela televisão
ou pela Internet, as escolas particulares que usam a tecnologia como atrativo e as igrejas que
se rendem ao meio televisivo para atingir mais famílias, são exemplos de como as tecnologias
modificaram os costumes da sociedade (BELLONI, 2009).

Os jovens nascidos e crescidos num mundo organizado e influenciado por essas


novas formas de viver em sociedade desenvolvem opiniões próprias, são capazes de divergir e
criticar as mensagens e os recursos dessas mídias. Porém, embora ocorram novos tipos de
aprendizagem ou novas formas de aprender propiciados por elas, isso não é suficiente para
criar o ―espírito crítico e utilizações criativas‖ (BELLONI; GOMES, 2008, p. 722).

Para as autoras, sempre serão necessárias ―as mediações dos adultos e das
instituições educativas, de onde decorre a importância da formação dos professores para que
estas mediações se orientem a partir de uma perspectiva de mídia-educação, assegurando
assim sua eficácia‖ (BELLONI; GOMES, 2008, p. 722, grifo do autor).

Como vimos, esses estudantes são diferentes: em sua maioria, chegam à escola
com alguns conhecimentos, sabem pesquisar informações, questionar, fazer anotações
enquanto assistem a um filme, interferir num programa de televisão que dispõe de espaços de
interação, fazer perguntas para animar um bate-papo, entre tantas outras ações (BELLONI,
2009).

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Nesse sentido, como os professores devem agir diante desse cenário, já que, como
afirmam Belloni e Gomes (2008), o papel do professor é fundamental?

Freire, em 1980, escreveu que o professor deve olhar para os estudantes como
―corpos conscientes‖ e não como ―depósitos de conteúdos‖ ou como ―seres vazios‖ que o
mundo enche de conhecimentos; assim, é possível problematizar a relação dialética que os
jovens estabelecem com o mundo. Embora os meios de comunicação da época fossem
diferentes e os nativos digitais nem existissem, a ideia de não encarar os estudantes como
vazios faz sentido até os dias de hoje.

Para Belloni (2009, p. 28), os alunos abrem-se a novas formas de aprendizado,


―mediatizadas‖. A autora considera dois principais fatores dessa ―nova pedagogia‖: o uso
cada vez mais frequente das ―tecnologias de produção, estocagem e transmissão de
informações‖ e o redimensionamento do papel do professor. ―O professor tende a ser
amplamente mediatizado: como produtor de mensagens inscritas em meios tecnológicos,
destinadas a estudantes a distância, e como usuário ativo e crítico e mediador entre estes
meios e os alunos‖. (BELLONI, 2009, p. 28)

Amaral, em 2009, fundamentou um termo: a Pedagogia Comunicacional


Interativa, em que coloca o professor como autor de seu conteúdo, sem que tenha que
submeter-se a profissionais de outras áreas para produzir seu material. O professor tem a
autonomia da produção, desenvolvendo-a de acordo com sua necessidade, criando conteúdos
com seus alunos de forma colaborativa.

Um bom exemplo disso são os casos de uso de vídeo educativo 2, em que o


professor é autor do conteúdo junto com seus alunos. Sousa e Fernández (2008, p. 223)
apontam que, ―em resumo, não é possível o uso da tecnologia para produzir conhecimento
sem a participação do estudante. O professor que usa os recursos tecnológicos em suas classes
(vídeo, projeções, transparências) está fazendo um uso válido, mas limitado‖.

2
Contextualizamos neste trabalho o termo ―vídeo educativo‖ como um material audiovisual construído pelo
professor e seus alunos, tendo como orientação de mensagem aqueles conteúdos relativos ao currículo
programático escolar. É, portanto, o vídeo educativo um material didático.

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Nesse sentido, Belloni (2009) sugere que a postura que o professor deve tomar é a
de coletividade: transitar entre várias áreas do conhecimento, quebrar o isolamento da sala de
aula convencional, e finalmente, aprender a ensinar a aprender.

Diante do cenário apresentado, esperamos que o professor, contextualizado no


mundo atual, tenha o papel de mediador na relação de interação entre conhecimento e
estudante, proporcionando, então, que os saberes sejam construídos ou desenvolvidos de
maneira colaborativa, usando como auxílio as tecnologias da comunicação e da informação.

MÉTODO

O presente trabalho insere-se nas pesquisas desenvolvidas pelo Laboratório de


Novas Tecnologias Aplicadas na Educação e foi desenvolvido em uma escola estadual
localizada em Campinas, buscando obter como resultado para a instituição escolar, um vídeo
cujo foco é contextualizar a história da escola e do local onde está inserida, traduzindo a visão
que seus novos e antigos moradores têm sobre sua constituição e seu desenvolvimento.

O estudo desenvolvido partiu do problema: De que maneira se dá o processo de


colaboração entre alunos e professor durante a produção de um vídeo educativo? Para tanto,
colocamos como objetivo geral: analisar de que forma se deu a colaboração entre os alunos e
o professor para a construção de um vídeo educativo, utilizando ferramentas disponíveis na
internet e encontros presenciais.

Para atingirmos os objetivos propostos, organizamos uma pesquisa do tipo


qualitativa, que, segundo Creswell (2007), é aquela em que os dados obtidos em observações
de processos sociais são analisados e interpretados segundo a óptica dos sujeitos.

Tal maneira de pesquisar nos permite certa flexibilidade no contato com os


sujeitos pesquisados, e, no caso da presente pesquisa, como a intenção era analisar o processo
colaborativo entre estudantes na construção de um vídeo educativo, o contato com o grupo era
de extrema importância, devido à necessidade de acompanhar suas expressões e seus
comportamentos. Para a coleta de dados, utilizamos ainda uma entrevista semiestruturada e
observações.

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O cenário para realização do trabalho foi o de uma escola estadual localizada em
Campinas, que possuísse o ensino médio. A escolha de alunos provenientes desse nível de
ensino justifica-se pela ideia de que os alunos dessa faixa etária são ―nativos digitais‖
(PRENSKY, 2001); partimos, então, do pressuposto de que os alunos selecionados teriam
certo engajamento com as tecnologias. Assim, os perfis dos participantes foram estabelecidos,
levando em consideração aspectos relativos ao contato dos estudantes e dos professores com a
tecnologia comunicacional atual. Desse modo, para participarem na construção do vídeo,
foram selecionados oito estudantes, de maneira aleatória, e seis professores.

Além disso, definimos como nosso papel subsidiar o planejamento e a execução


do vídeo, buscando envolver o corpo de professores e os alunos da unidade. Nesse sentido, os
pesquisadores deixam de ter papel apenas de observadores externos e passam a integrar e
interferir na produção do vídeo a ser realizado pelos integrantes da escola, ou seja, a
observação é do tipo participante. (CRESWELL, 2007)

PRODUÇÃO E O USO DO VÍDEO NA ESCOLA

O projeto desenvolvido na escola foi dividido em duas fases: a primeira


relativa ao processo de construção do vídeo e às atividades correspondentes a ele; e o que
chamamos de segunda fase do projeto diz respeito à maneira como o vídeo já pronto vem
sendo utilizado pelos professores em suas aulas.

É importante, ainda, ressaltar que a primeira fase do projeto contou com alunos e
professores do ensino médio, enquanto a segunda fase compreende a participação de alunos e
professores do ciclo II do ensino fundamental da mesma escola.

Inicialmente o objetivo da escola e da professora que idealizou o projeto era


englobar o número máximo de professores e alunos para a construção do vídeo. Entretanto,
não queríamos que fossem atividades meramente realizadas para o vídeo, mas esperávamos
que, a partir delas, surgissem discussões sobre conteúdos do currículo programático de cada
série.

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Sentimos certa resistência por parte dos membros da escola, pois a maioria dos
estudantes do ensino médio trabalha e não tem tempo de folga durante o dia, período em que
as filmagens deveriam ocorrer. O mesmo problema ocorreu com os professores, pois a
maioria deles cumpria, por vezes, até três turnos de trabalho e, portanto, não conseguiram
acompanhar as atividades desenvolvidas no período da tarde ou da manhã. À noite era
impossível realizar filmagens pelo bairro, em virtude da escuridão e dos problemas de
violência.

A solução encontrada foi realizar uma série de atividades, tais como oficinas e
entrevistas com moradores, aos sábados durante o dia, já que, nesse período, a disponibilidade
de todos era maior. A partir daí conseguimos maior adesão de alunos e professores do ensino
médio. No começo de 2010, conseguimos finalizar o vídeo e desenvolvemos algumas
atividades pedagógicas oriundas daquelas realizadas para captura de materiais para o vídeo.

Já tínhamos o vídeo pronto quando, em conversa com a professora que


coordenava o projeto na escola, ela nos contou da necessidade de expandir o projeto para
todos os ciclos, pois acreditava que, como havíamos focado somente o período noturno, o
vídeo não tinha cumprido com êxito seu objetivo inicial, que era mobilizar os alunos para a
história que estava por trás do bairro que moravam.

Dessa maneira, decidimos que a melhor data para apresentar os trabalhos


desenvolvidos seria o planejamento inicial dos professores, momento em que encontraríamos
todos reunidos, o que se deu no mês de fevereiro de 2010. Apresentamos, então, o projeto e
notamos exaltação daqueles oriundos do ciclo II do ensino fundamental. E, logo no início do
ano, realizamos algumas atividades em conjunto, tais como estudos do meio e apresentação
de materiais audiovisuais sobre assuntos do cotidiano da escola, a partir do vídeo produzido
no ano anterior.

Enquanto o cenário no ciclo II do ensino fundamental era de empolgação com o


projeto, no período noturno tivemos alguns entraves que dificultaram sua continuidade, tais
como greve ou transferência de professores para outras instituições e alunos que abandonaram

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o projeto por conta de novos empregos ou cursos de formação. Sendo assim, este é o cenário
geral de cada fase do projeto.

PRODUÇÃO DO VÍDEO: COLABORAÇÃO X COOPERAÇÃO

Durante este trabalho, defendemos que a colaboração é um processo de


construção conjunta, na qual um grupo de pessoas tem um objetivo em comum a ser
alcançado e, de maneira coletiva, deve tomar decisões e atitudes para alcançá-lo.

A partir dessa definição e de acordo com o Quadro 2, o processo geral de


construção do vídeo pode ser definido como um processo colaborativo, já que previu: relação
interpessoal; formação de grupos entre estudantes de diversas turmas; participação e
influência de todos nas tomadas de decisões; objetivos e papéis comuns entre os participantes.

Podemos também dizer que, dentro do processo de colaboração que previa a


construção do vídeo, tínhamos diversas outras atividades que foram organizadas e nem
sempre foram exercidas de maneira colaborativa. De acordo, ainda, com o Quadro 2, tais
atividades podem ser consideradas como processos de cooperação, interação, mediação e
colaboração.

Neste sentido, processos de cooperação podem ser exemplificados com os


trabalhos desenvolvidos em sala de aula por grupos de alunos cuja formação não era restrita, e
as atividades desenvolvidas dentro deles eram segregadas, sendo cada integrante responsável
por uma parte, tendo ainda, o professor como líder dessas atividades. Tais processos se
evidenciam na segunda fase do projeto, em que tínhamos como objetivo o uso do vídeo como
norteador das atividades em sala de aula e todas as atividades eram lideradas e coordenadas
pelos professores.

Como processos de colaboração envolvendo a mediação, podemos citar as


reuniões estabelecidas para organização do projeto e das atividades nele envolvidas.
Destacou-se a comunicação entre os professores, quando, por exemplo, combinavam passeios
no mesmo dia; cediam aulas para colegas; buscavam trabalhar em sala de aula em contexto
semelhante, além de outras atividades.

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Processos de interação — virtuais ou não — puderam ser vistos quando os
estudantes buscavam comunicação com a pesquisadora para marcar a data de uma reunião.

Além disso, é importante fazer a análise do olhar dos professores sobre a


colaboração. Embora eles a considerem um processo trabalhoso, envolvendo muitos tipos de
conflitos, afirmam que é também o caminho para o aprendizado mais significativo, indo ao
encontro daquilo que Vygotsky (1987) defendia. Também concordam com Lan e Jiang (2009)
e Huang e Liu (2009), quando apontam que a abordagem colaborativa pode proporcionar
diversos benefícios que vão para além do aprendizado de conhecimentos científicos. Para
eles, ainda, os benefícios do uso de tal abordagem podem ser assim enumerados: possibilitar o
aumento do envolvimento com o conteúdo do trabalho; desenvolver o pensamento crítico e a
capacidade de resolução de problemas; encorajar alunos a aprender a realizar tarefas.

Tais aprendizados podem ser evidenciados nas atividades referentes à primeira


fase do projeto, como, por exemplo, o planejamento e a construção do vídeo. Essa tarefa
envolvia diversas outras, e os alunos deveriam ser autônomos para organizar-se e decidir a
melhor maneira de executá-las, promovendo, assim, a capacidade de resolução de problemas.

Também as atividades relativas às oficinas de formação para a construção do


vídeo colaboraram para desenvolver tal capacidade. Durante tais encontros, a partir de uma
proposta inicial, os participantes deveriam decidir em grupo como executá-la de maneira
eficiente. A quebra da relação hierárquica estabelecida entre alunos e professores foi um
aprendizado concretizado e essencial para o desenvolvimento de um trabalho colaborativo.
Tal fato exigiu uma nova postura dos professores, mas foi um ganho ao longo deste trabalho.

A própria comunicação entre os sujeitos participantes revelou-se positiva para as


relações sociais. Durante a primeira fase do projeto, principalmente nas reuniões iniciais de
planejamento, foi preciso que um grupo de pessoas conseguisse chegar a um consenso, tendo
em mente que indivíduos diversos possuem diferentes formas de ver as situações. Assim,
através de constantes negociações de sentido, foi possível estabelecer um objetivo em comum.

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Ficou claro que, de acordo com as professoras, para um processo colaborativo, é
preciso certas habilidades sociais, tais como: possuir certo grau de tolerância, saber articular
seu ponto de vista e dispor de tempo para organização dos participantes, consolidando,
portanto, aquilo que Borges (2003) defende em seu trabalho.

Outro ponto relevante a ser destacado com relação à colaboração foi o uso das
tecnologias para a construção do vídeo. Tal processo envolveu a colaboração não só para
chegar ao objetivo final, como vimos, mas também para construir a coautoria entre
professores e alunos. Nesse sentido, confirmamos aquilo que Souza e Garcia Fernández
(2008) apontam como importante: o uso de tecnologias sem a participação dos estudantes é
um uso limitado.

Com relação às tecnologias de comunicação, elas foram utilizadas promovendo


processos de interação e de colaboração. Os primeiros puderam ser vistos quando as
atividades tinham como objetivo a comunicação; já os segundos, quando as usávamos para
reuniões que objetivavam decisões sobre o projeto, como já mencionado.

Além disso, podemos dizer que o processo de colaboração estabelecido pelos


estudantes teve maior ênfase nas atividades presenciais do que nas atividades a distância. Para
a professora de Biologia, os usos da tecnologia para a comunicação distanciam a relação
humana, sendo o presencial insubstituível. Já na fala dos estudantes era possível identificar
que mantinham muitos contatos virtualmente, usando com certa frequência programas de
comunicação instantânea. Entretanto, o mesmo não ocorreu nas atividades relativas ao
projeto.

Nesse sentido, é possível verificar que os tipos de usos que os sujeitos desta
pesquisa fazem da tecnologia estão de acordo com aqueles identificados por Waycott et al.
(2010): interesse pessoal; comunicação social; acesso a informações variadas; uso profissional
ou escolar.

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Além disso, a partir dos dados que obtivemos durante a realização das entrevistas
e das observações, percebemos que a tecnologia para nossos estudantes-sujeitos está
vinculada a seus momentos de lazer, ficando difícil quebrar a barreira entre sua utilização para
o trabalho ou estudo e seu uso para o lazer.

Isso se comprova até mesmo pela visão que os alunos assumiram ter sobre
algumas ferramentas: elas são para lazer e, por isso, devem ser segregadas da vida escolar ou
do trabalho. Tal afirmação vai em direção a um dos dados apresentados na pesquisa apontada
por Jones et al. (2010), quando nos revelam os motivos pelos quais os estudantes não são
favoráveis à utilização das tecnologias de lazer para o trabalho: separação da vida social do
estudo. Este foi até mesmo um dos argumentos de uma estudante, quando a questionamos
sobre o porquê da restrição de uso da tecnologia para o projeto.

Outro argumento que pode ser encontrado na fala dos sujeitos da presente
pesquisa e que foi também obtido por Jones et al. (2010) refere-se ao grande fluxo de
informações e à pouca experiência dos professores. Tomando a ideia de que há muita
informação na rede, as professoras afirmam que isso não garante o aprendizado dos
estudantes, pois estes não sabem utilizar-se deles: sabem de tudo um pouco e tudo
superficialmente.

Nesse sentido, a fala de Belloni (2009) aponta o papel do professor como


mediador entre conhecimento e estudante, perante as informações dispostas na rede. A autora
ainda afirma que o professor deve ter a postura de valorizar o coletivo, quebrando o
isolamento da sala de aula convencional, aprendendo a ensinar a aprender. As professoras que
participaram do estudo concordam com a autora, quando afirmam que é preciso que se
trabalhe de forma colaborativa e que o professor deve transitar entre as diversas áreas do
conhecimento e, portanto, mediar a relação entre estudantes e conhecimentos. De fato,
durante o processo de construção do vídeo e na segunda fase do projeto, percebemos que os
estudantes precisam ainda da figura do professor como orientador, como mediador.

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É importante destacar também que todos os professores, quando questionados
sobre os usos da tecnologia em atividades pedagógicas, assinalam positivamente a respeito. A
professora de Biologia, por exemplo, fala sobre o trabalho com conhecimentos concretos:
assim, em vez de falar sobre um processo que acontece no corpo humano, pode mostrar um
vídeo sobre ele.

Nessa direção, Amaral (2009), no mesmo sentido que Souza e Garcia Fernández
(2008), aponta para um fenômeno importante atualmente, que é a construção do material
didático pelo professor. Assim, durante as reuniões com professores e alunos, nosso objetivo
era justamente incluir a todos nas atividades relativas ao projeto e, portanto, criar recursos e
materiais que fossem coerentes com a realidade dos sujeitos. É possível perceber a autonomia
gerada em alguns professores quanto ao uso da tecnologia, quando analisamos a fala da
professora de Biologia no momento em que afirma que, no início do projeto, quem fazia as
oficinas, com relação à parte tecnológica, era a pesquisadora, porém, depois, ela, professora,
sozinha, ofereceu essa mesma oficina aos seus alunos. Assim, criou-se a noção da autonomia
de produção.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nosso objetivo era analisar a maneira como ocorreu o processo de colaboração


entre alunos e professor durante a produção de um vídeo educativo, desenvolvido, neste caso,
em uma escola pública. É importante lembrar que neste trabalho o público era específico, e o
processo aqui relatado, se aplicado num outro contexto, pode apresentar resultados diferentes.

Assim, para um aprofundamento sobre processos colaborativos em educação,


utilizando tecnologias como suporte, sugerimos uma pesquisa que contemple mais sujeitos e
em diferentes realidades de acesso à tecnologia. Dessa maneira, é possível até mesmo
verificar os usos que esses estudantes fazem da tecnologia e a sua visão de tecnologia, dois
fatores que estão muito ligados.

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Com relação, ainda, ao uso da tecnologia, sendo este projeto desenvolvido em
uma escola pública, com recursos materiais restritos, as conversas virtuais com os estudantes
aconteciam quando estavam em casa, já que não havia um laboratório de informática na
escola. Portanto, já estava implícito seu momento de lazer, pós-escola. Se tivéssemos
realizado esses encontros virtuais (pesquisadora–sujeitos) em ambiente escolar, poderíamos
notar alguma diferença comportamental.

Por fim, esperamos que as questões levantadas neste trabalho possam clarear um
pouco mais sobre questões como a importância da colaboração no processo de ensino e
aprendizagem, não só como recurso que ajuda no processo cognitivo do estudante, mas
também como facilitador do trabalho do professor; e possam também tornar mais visíveis os
possíveis usos das tecnologias pelos professores. Para tanto, é preciso vê-las como
ferramentas que podem auxiliar o dia a dia em sala de aula, lembrando que, em relatos de
algumas situações de uso na presente pesquisa, o professor algumas vezes foi ajudado pelos
estudantes, o que propiciou um aprendizado muito mais significativo. Daí a importância da
colaboração nas situações de ensino.

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Recebido em: 05/11/2010


Publicado em: 01/04/2011

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