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1º Frequência Micaela Pimentel

Direito Comercial

Actos de comércio/Actos comerciais


Artigo 2º do Código Comercial – “serão considerados actos de comércio todos
aqueles que se acharem especialmente regulados neste Código, e, além deles, todos
os contratos e obrigações dos comerciantes, que não forem de natureza
exclusivamente civil, se o contrário do próprio acto não resultar”.

Os actos de comércio são parte essencial da “matéria mercantil” e são


sobretudo contratos. Deste modo, é possível afirmar que são actos de comércio os
factos jurídicos voluntários especialmente regulados em lei comercial e os que,
realizados por comerciantes, respeitem as condições previstas no final do artigo 2º do
Código Comercial.

Os actos de comércio podem ser objectivos e subjectivos, mediante o artigo 2º


do Código Comercial, sendo os primeiros “todos aqueles que se acharem
especialmente regulados neste Código” e os segundos “todos os contratos e
obrigações dos comerciantes, que não forem de natureza exclusivamente civil, se o
contrário do próprio acto não resultar”.

→ Actos de comércio objectivos


• Fiança (artigo 101º C. Comercial)
• Empresas (artigo 230º C. Comercial)
• Mandato (artigo 231º e ss C. Comercial)
• Conta corrente (artigo 344º e ss C. Comercial)
• Operações de banco (artigo 362º e ss C. Comercial)
• Transporte (artigo 366º e ss C. Comercial)
• Empréstimo (artigo 394º e ss C. Comercial)
• Penhor (artigo 397º e ss C. Comercial)
• Depósito (artigo 403º e ss C. Comercial)
• Depósito de géneros e de mercadorias nos armazéns gerais (artigo 408º e ss C.
Comercial)
• Compra e venda (artigo 463º e ss C. Comercial)
• Reporte (artigo 477º e ss C. Comercial)
• Escambo ou troca (artigo 480º C. Comercial)
• Aluguer (artigos 481º e 482º C. Comercial)
• Transmissão e reforma de título de crédito mercantil (artigos 483º e 484º C.
Comercial)
• Actos relativos ao comércio marítimo (livro III)
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Relativamente à maioria destes actos, o Código Comercial estabelece regras


próprias para cada um deles. No entanto, as operações de banco e o aluguer são
regulados pelas disposições do Código Civil, não deixando desmerecer estes actos o
qualitativo “comerciais”.

São actos de comércio objectivo apenas os “especialmente regulados neste


Código” (Comercial)?

Esta formulação faria algum sentido em 1888. Contudo, não é razoável


petrificar um catálogo de actos num código datado, pois é necessário acompanhar a
evolução económica surgindo, deste modo, novos actos comerciais. A expressão
“neste Código” deve ser interpretada extensivamente de modo a abarcar outras leis
comerciais.

Existem três hipóteses para uma lei ser considerada comercial:

1. Leis que substituem normas do Código Comercial – Código das Sociedades


Comerciais, lei uniforme relativamente ao cheque (LUC) e lei uniforme
relativamente às letras e lideranças (LULL). A lei substituta será em princípio
comercial e os actos nela regulados serão mercantis. No entanto, nem todas as
leis substitutas de artigos do Código Comercial serão comerciais e, por isso,
qualificadoras de actos mercantis (ex: o contrato de associação em participação
revogou a conta em participação);
2. Leis que se auto-qualificam como comerciais – há disposições no Código Civil
que dizem respeito ao arrendamento para fins comerciais e, por isso, são actos
de comércio objectivos (ex: o arrendamento comercial, trespasse ou locação de
empresas;
3. Leis que não se auto-qualificam nem como comerciais nem como civis – na
maioria dos casos, as leis não se auto-qualificam explicitamente como
comerciais, civis, etc. Para saber se as leis em questão são comerciais é
necessário observar se elas disciplinam matéria análoga à disciplinada no
Código Comercial ou em outras leis classificadas como comerciais.
 Analogia legis – exemplo: artigo 230º, nº7 do C. Comercial (ex: a TAP e
os seus actos praticados. Apesar dos seus serviços não estarem
expressamente previstos no artigo, recorre-se à analogia legis para
aplicar o mesmo, pois o seu sentido abrange a companhia aérea);
 Analogia juris – casos omissos através da aplicação de “princípios
gerais” obtidos através de induções lógico-generalizadoras de uma série
de normas legais. Actos praticados por empresas prestadoras de
serviços são actos comerciais (ex: spa, hotéis), porque se aplica o
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princípio de que a prestação de serviços praticada no âmbito da


exploração de uma empresa é comercial. Não há artigos.

Artigo 230º do Código Comercial – as empresas são conjuntos ou séries de


actos (actividades) objectivamente comerciais enquadrados organizatoriamente (actos
praticados no quadro de organizações de meios pessoais ou reais). Para Coutinho de
Abreu as empresas comerciais do artigo 230º são vistas como um conjunto de actos de
comércio objectivos enquadrados numa organização, isto é, são actos praticados no
quadro de uma organização de meios pessoais e reais (ex: AutoEuropa – artigo 230º,
nº1).

Nº 2 – fornecer géneros, produtos e bens (ex: livrarias ou comprar carne para vender
no talho)
Criador de gado talho Rita
Compra Vende
carne carne

Nº 3 – leiloeiras Artigo 463º C. Come + 230º, nº2

Nº4 – espectáculos (ex: LaFéria) (sempre que se trate de uma compra e


venda)
Nº 5 – editoras
Artigo 464º - acto civil (Rita)
Nº 6 – empresas de construção de casas
Artigo 464º, nº2 + 230º parágrafo 1º -
Nº 7 – transporte
criador de gado (não é um acto de
comércio objectivo)

→ Actos de comércio subjectivos


2º parte do artigo 2º do Código Comercial – são “todos os contratos e obrigações
dos comerciantes, que não forem de natureza exclusivamente civil, se o contrário do
próprio acto não resultar”. É uma fórmula com ares esotéricos e com combinação
transalpina, decompondo-se em três partes:

1) Ser praticado por um comerciante;


2) Não ser um acto de natureza exclusivamente civil (ex: casamento, divórcio,
apadrinhamento civil);
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3) “O contrário do próprio acto não resulta”. PS - na dúvida, é comercial, ou seja,


há ligação com o comércio.

3 Critérios

• Finalidade lucrativa

Excepções - Há actos que também podem ser actos de comércio e que não têm
como finalidade o lucro ou há actividades que não estão ligadas ao comércio e os
seus sujeitos podem praticar actos de comércio (ex: agricultores, profissionais
liberais e associações culturais)

• Interposição nas trocas

Excepções – há situações em que não é preciso ser um acto de interposição nas


trocas para ser um acto comercial (ex: fiador e penhor - artigos 101º e 397º C.
Comercial)

• Existência de empresa

Excepções – empresas civis que não praticam actos de comércio (ex: empresa
agrícola ou de pesca)

Os actos de comércio são, essencialmente, contratos. Embora haja contratos que


não sejam actos de comércio, como por exemplo o endosso (transmitir cheques –
negócio jurídico unilateral) ou acto de constituir uma sociedade por quotas
(sociedades unipessoal).

NOTA: Para Coutinho de Abreu todos os actos praticados no âmbito da exploração de


uma empresa são actos objectivos.

Regime especial aplicável aos actos de comércio:

1. Há um regime especial para cálculo de juros relacionados com actos de


comércio (artigo 102º C. Comercial);
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2. Artigo 15º C. Comercial - as dívidas comerciais dos comerciantes casados


presumem-se contraídas no exercício da profissão e por isso são dívidas
comunicáveis ao cônjuge do comerciante;
3. Artigo 100º C. Comercial – em direito comercial a regra da responsabilidade
plural é a da solidariedade.

→ Actos de comércio autónomos e actos de comércio acessórios


São actos de comércio autónomos os qualificados mercantis por si mesmos,
independentemente de ligação a outros actos ou actividades comerciais. Entendemos
por actos acessórios os que devem a sua comercialidade ao facto de se ligarem ou
conexionarem a actos mercantis, como por exemplo:

❖ Fiança (artigo 101º C. Comercial)


❖ Mandato (artigo 231º C. Comercial)
❖ Empréstimo (artigo 394º C. Comercial)
❖ Penhor (artigo 397º C. Comercial)
❖ Depósito (artigo 403º C. Comercial)

Este actos tanto podem ser acessórios de actos de comércio objectivos e


autónomos, como de actos de comércio objectivos mas acessórios.

→ Actos formalmente comerciais e actos substancialmente


comerciais
Actos formalmente comerciais são os esquemas negociais que, utilizáveis (por
comerciantes ou não comerciantes) quer para a realização de operações mercantis,
quer para a realização de operações económicas que não são actos de comércio nem
se inserem na actividade comercial, estão contudo especialmente regulados na lei
mercantil, merecendo portanto a qualificação de actos de comércio.

Protótipos destes actos são os negócios cambiários (relativos às letras de câmbio).


Por exemplo, A, não comerciante, vende o seu automóvel a B, que também não é
comerciante, destinando-se a viatura ao uso do comprador (compra e venda não
comercial – artigo 464º, nº1 do C. Comercial). O preço não é logo pago e as partes
convencionam a emissão de uma letra de câmbio sacada por A e aceite por B. Estes
negócios cambiários (o saque e o aceite) são actos de comércio, por estarem previstos
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em lei mercantil (LULL), apesar da sua comercialidade ser “formal” e da causa não ter
nada a ver com o comércio ou os actos de comércio.

→ Actos bilateralmente comerciais e actos unilateralmente


comerciais
Os actos bilateralmente comerciais são actos cuja comercialidade se verifica em
relação a ambos os sujeitos. Como por exemplo: A, produtora de automóveis, vende X
automóveis ao seu concessionário B (a venda é um acto objectivo ou subjectivo,
consoante a perspectiva adoptada, e a compra é também comercial) – artigo 463º, nº1
do C. Comercial.

São unilateralmente comerciais os actos cuja comercialidade se verifica só em


relação a uma das partes. Por exemplo: E, professor, compra a B um automóvel para
seu uso e da sua família (a venda é objectivamente comercial, artigo 463º, nº3, e a
compra é civil, artigo 464º, nº1 do C. Comercial).

Comerciantes
Os sujeitos (singulares ou colectivos) com capacidade civil de exercício possuem
igualmente capacidade comercial de exercício, podem praticar actos de comércio –
artigo 7º do C. Comercial.

→ Pessoas singulares
Nos termos do nº1, do artigo 13º do C. Comercial, são comerciantes “as pessoas
que, tendo capacidade para praticar actos de comércio, fazem deste profissão”, ou
seja, para serem comerciantes, as pessoas têm de exercer uma actividade comercial ou
praticar actos de comércio com profissionalidade, isto é, de modo habitual ou
sistemático (não é comerciante quem pratique esporadicamente actos mercantis). Não
se exige, no entanto, que a profissão comercial seja a única exercida pelo sujeito, nem
que seja a principal.
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→ Pessoas colectivas
▪ Sociedades comerciais

O artigo 13º do C. Comercial prescreve que “são comerciantes as sociedades


comerciais”. Nos termos do nº2, do artigo 1 do Código das Sociedades Comerciais,
“são sociedades comerciais aquelas que tenham por objecto a prática de actos de
comércio e adoptem o tipo de sociedade em nome colectivo, de sociedade por quotas,
de sociedade anónima, de sociedade em comandita simples ou de sociedade em
comandita por acções”.

Artigos 4º, nº1 e 5º do Código das Sociedades Comerciais; artigo 13º, nº1 do C.
Comercial.

▪ Outras pessoas colectivas

Além das sociedades comerciais, outras pessoas colectivas podem ser


comerciantes. É o caso das entidades públicas empresariais (EPE), dos agrupamentos
complementares de empresas (ACE), agrupamentos europeus do interesse económico
(AEIE) e cooperativas.

→ Sujeitos não qualificáveis como comerciantes


Não são comerciantes os que exercem actividades não mercantis. Sendo estas
actividades as não qualificadas legalmente de comerciais e as não análogas às
comerciais.

Assim, não são comerciantes as pessoas (singulares ou colectivas) que exercem


uma actividade agrícola (artigo 230º, parágrafo 1º e 2º + artigo 464º, nº2 e 4 do C.
Comercial), os artesãos (oleiros, ferreiros, latoeiros, sapateiros, etc. – artigo 230º,
parágrafo 1º + artigo 464º, nº3 do C. Comercial) e os profissionais liberais (advogados,
pintores, músicos, etc. – artigo 230º, parágrafo 3º do C. Comercial).

→ Sujeitos legalmente inibidos da profissão de comércio


▪ Entidades colectivas

Diz o artigo 14º do C. Comercial: “É proibida a profissão do comércio às


associações ou corporações que não tenham por objecto interesses materiais”. O
intuito de preceito parece ser o de vedar o estatuto de comerciante às citadas
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associações, ainda que exerçam o comércio, ele não deverá ser exercido a título de
profissão, como por exemplo, as associações de fim desinteressado ou altruístico não
podem ser comerciantes, não têm evidentemente por objecto interesses materiais e
aplica-se o parágrafo único do artigo 17º, do C. Comercial.

▪ Pessoas singulares (alguns casos de incompatibilidades)

Diz o artigo 14º do C. Comercial que é proibida a profissão do comércio “aos


que por lei ou disposições especiais não possam comerciar”. A legislação comercial
estabelece algumas incompatibilidades, tais como:

➢ Artigo 253º do C. Comercial – nenhum gerente poderá negociar por


conta própria, nem tomar interesse debaixo do seu nome ou alheio em
negociação do mesmo género de que se acha incumbido;
➢ Artigo 180º, nº1 do C. Sociedades Comerciais – nenhum sócio pode
exercer, por conta própria ou alheia, actividade concorrente com a da
sociedade;
➢ Artigo 254º, nº1 do C. Sociedades Comerciais – os gerentes não podem,
sem o consentimento dos sócios, exercer por conta própria ou alheia,
actividade concorrente a da sociedade;
➢ Artigos 398º, nº3 e 428 do C. Sociedades Comercias – os
administradores de sociedades anónimas não podem, sem autorização,
exercer conta própria ou alheia actividade concorrente com a da
sociedade;
➢ Artigo 477º do C. Sociedades Comerciais – os sócios comanditados são
obrigados a não fazer concorrência à sociedade.

Insolvência e inibição para o exercício do comércio


O processo de insolvência visa satisfazer conjuntamente os credores de um
devedor (artigo 1º do CIRE).

Os credores dispõem de duas vias principais para aproveitarem as forças


patrimoniais do credor: ou vão pela liquidação dos bens integrantes da massa
insolvente e consequentemente repartição dos resultados distribuíveis ou se decidem
por um plano de insolvência onde regulam autonomamente o modo por que serão
satisfeitos os seus interesses.
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O processo de insolvência exige sempre um plano de insolvência. No entanto,


não existe um plano de insolvência para as pessoas singulares não empresárias ou
titulares de pequenas empresas (artigos 249º e 250º do CIRE), os sujeitos legitimados
para apresentar plano de insolvência não têm o dever de apresenta-lo (artigo 193º do
CIRE), só existe plano de insolvência se este for aprovado pelos credores (artigo 209º
do CIRE), a liquidação da massa insolvente processa-se nos termos previstos no artigo
56 e ss do CIRE, salvo se existir plano de insolvência regulando essa liquidação (artigo
192º, nº1 do CIRE)

▪ Incompatibilidades do exercício do comércio


o Inibição para o exercício do comércio
 Pessoas afectadas pela qualificação da insolvência como culposa
(artigo 189º, nº2, alínea c) do Código da Insolvência e da
Recuperação de Empresas (CIRE)

O CIRE é de 2004 e o seu paradigma é o da insolvência saneamento, artigo 1º


do CIRE (teoria) – traduz-se na possibilidade do devedor, ao apresentar-se à
insolvência, entregar um plano de insolvência para ser aprovado pelos credores. Este
plano pode conter medidas como: perdões, moratórias, venda parcial de bens, etc.
Permitindo assim ao devedor tentar a sua recuperação e evitar a liquidação dos bens.

Também existe a insolvência-liquidação (prática) – segundo este modelo, o


devedor ao apresentar-se à insolvência vai ver todos os seus bens serem apreendidos
para a massa insolvente para depois serem vendidos e do produto da venda serem
satisfeitos os créditos.

Quem está sujeito a declaração de insolvência?

Atendendo ao artigo 2º do CIRE, é possível compor três grupos:

a) “Quaisquer pessoas singulares ou colectivas” (artigo 2º, nº1 do CIRE). Enquanto


pessoas colectivas podem ser declarados insolventes associações, fundações,
sociedades comerciais, cooperativas, etc;
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b) Entidades ou sujeitos de natureza colectiva mas não personalizados (artigo 2º,


nº1, alínea c do CIRE). Como por exemplo, associações sem personalidade
jurídica e comissões especiais, sociedades civis, sociedades de tipo comercial,
etc;
c) Herança jacente (artigo 2º, nº1, alínea b do CIRE) e quaisquer outros
patrimónios autónomos (artigo 2º, nº1, alínea h do CIRE).

Artigo 2º CIRE – sujeitos que podem declarar insolvência. De acordo com este
artigo qualquer pessoa colectiva ou singular pode ser declarada insolvente. De todo o
modo, poderá ainda ser declarada insolvente a herança e ainda pessoas colectivas que
ainda não têm o seu acto constitutivo registado (alíneas c - h). Não é necessário ser
comerciante para ser sujeito passivo da declaração de insolvência

Por outro lado não poderão consideradas insolventes quaisquer entidades ligadas
ao Estado bem como seguradoras e instituições de crédito.

Porque é que os Bancos em Portugal não podem ser declarados insolventes? –


artigo 2º, nº2 CIRE (resposta):

→ Não pode ser declarada insolvente nada que esteja relacionado com o Estado

A insolvência traduz-se na manifesta superioridade do passivo em relação ao activo


(comentar a afirmação)

 A noção de insolvência está no artigo 3º do CIRE e consiste na impossibilidade


de cumprimento das obrigações vencidas. No entanto, devemos associar esta
noção à falta de liquidez. Assim sendo, quem não tenha dinheiro de forma
acessível, ou seja, não tenha depósitos à ordem ou fluxo de caixa suficientes
para pagar dívidas, depósitos a prazo facilmente convertíveis à ordem, não terá
liquidez. Por isso, não será totalmente correcto identificarmos a insolvência
com a manifesta superioridade do passivo em relação ao activo. Uma
sociedade poderá ter muito passivo e pouco activo e não estar insolvente,
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porque alguém lhe empresta dinheiro que lhe permite solver os seus
compromissos financeiros (história da florista e tia). Por outro lado, alguém
pode ter bastante activo e pouco passivo e ainda assim não ter liquidez e por
isso estar insolvente (história do supermercado cheio de coisas e sem
ninguém).

Repudiar – recusar a herança

Insolvência pessoa singular (apresentação) – próprio devedor (artigo 18º CIRE)


Insolvência pessoa colectiva (requerida) – terceiro a pedir a insolvência (artigo
20º CIRE)

Em Portugal a insolvência pode ser pedida pelo próprio devedor, artigo 18º do
CIRE, que equivalerá à confissão de insolvência e, por isso, logo após a petição inicial
surgirá a sentença declaratória de insolvência. Trata-se da insolvência apresentação.
Poderá também ser um terceiro a pedir a insolvência do devedor caso em que terá que
alegar pelo menos um dos factos índices do artigo 20º, nº1 do CIRE. Nesse caso, o
devedor será citado para se opor e depois do julgamento o juiz proferirá ou não
sentença de insolvência. Estamos perante a insolvência requerida.

A sentença declaração de insolvência o juiz pode declarar aberto o incidente de


qualificação da insolvência a fim de se apurar se ela é culposa ou fortuita (artigos 185º
e 189º do CIRE).

 Insolvência culposa – quando a situação tiver sido criada ou agravada em


consequência da actuação, dolosa ou com culpa grave, do devedor;
 Insolvência fortuita – quando não tiver sido originada nos mesmos modos
que a culposa.
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Alguns sujeitos de qualificação duvidosa


 Mandatários comerciais com representação
 Gerente de comércio, auxiliares e caixeiros de comerciantes
 Comissários comerciais
 Mediadores
 Correctores
 Agentes comerciais
 Farmacêuticos
 Sócios de responsabilidade ilimitada
 Sociedades comerciais sem personalidade jurídica
 Comunidades conjugais
 Comunidade de herdeiros

Estatuto Jurídico dos Comerciantes

→ Firmas
A firma é o nome comercial dos comerciantes, o sinal que os individualiza ou
identifica.

Todos os comerciantes devem adoptar firma ou denominação (artigo 18º, nº1 do


C. Comercial).

RRNPC - Regime do Registo Nacional de Pessoal Colectivas

→ Composição
 Firmas dos comerciantes individuais – tem de ser composta pelo nome
completo ou abreviado, conforme seja necessário para identificação da
pessoa, não podendo a abreviação reduzir-se a um só vocábulo (artigo 38º,
nº1 e 3 do RRNPC);
 Firmas das sociedades comerciais – deve ser composta pelo nome ou firma
de todos os sócios (artigo 177, nº1 do C. Sociedades Comerciais);
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 Sociedades por quotas (SQ) – artigo 200º, nº1 do C. Sociedades


Comerciais
 Sociedades anónimas (SA) – artigos 200º, nº1 e 275º, nº1 do C.
Sociedades Comerciais
 Sociedades em comandita (SC) – artigo 467º, nº1 do C. Sociedades
Comerciais
 Firmas dos agrupamentos complementares de empresas – poderá
constituir numa denominação particular ou ser formada pelos nomes ou
firmas de todos os seus membros ou, pelo menos, um deles;
 Denominações de outras entidades colectivas – deve integrar a expressão
“entidade pública” ou as iniciais “E.P.E.” (artigo 57º, nº1 do RSPE);
 Temos firmas de:
✓ Nome – nomes/apelidos dos respectivos sócios
✓ Denominação – alusão à actividade desenvolvida
✓ Mistas – tem as duas coisas (nomes e alusão à actividade)

Desde 2005 que em Portugal é admissível a existência de firmas puramente de


fantasia sem por isso serem firmas nome, denominação ou mistas (ex: unicórnio, Lda).

→ Princípios informadores da composição das firmas


1. Princípio da verdade – artigo 32º RRNPC. A firma não pode composta por
expressões que induzam em erro o público (ex: supermercado do Norte que se
situa no Algarve).
2. Princípio da novidade/exclusividade – artigos 33º, nº1 e 35º RRNPC. O titular de
uma firma registada tem direito exclusivo sobre ela em todo o território
nacional, por isso ninguém pode pedir um registo de uma firma que seja igual à
sua. Para verificarmos se uma firma é inteiramente nova, segundo Coutinho de
Abreu, temos de recorrer a alguns critérios: grafia das palavras, efeito fonético,
núcleo caracterizante, público-alvo, etc. É importante assinalar que, para
Coutinho de Abreu, este princípio é aplicável mesmo para firmas para
actividades não concorrentes, uma vez caso não se aplicasse o público poderia
tomar uma firma por outra, haver confusão entre clientes e fornecedor ou a
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reputação de uma ser colocada em causa por um processo de insolvência da


outra.
3. Princípio da capacidade distintiva – artigo 33º, nº3 RRNPC. As firmas não se
bastam com palavras genéricas, produtos ou nomes de cidades, porque caso
contrário não seriam distintivas o suficiente (ex: farmácia Porto).
4. Princípio da unidade – artigo 38º, nº1 RRNPC. Só aplicável a comerciantes em
nome individual. Estes só podem ter uma única firma independentemente do
negócio que desenvolverão.
5. Princípio da licitude – as firmas não podem conter expressões ofensivas aos
bons costumes e da ordem pública.

→ Transmissao de firmas
 Inter vivos – artigo 44º, nº1 e 4 RRNPC. Em primeiro lugar, só se pode
adquirir uma firma com o estabelecimento a ela associada. Para além
disso se se quiser ficar com a firma do anterior comerciante este deverá
autorizar por escrito e poderá ser adicionado à firma do adquirente a
menção de sucessor da firma anterior.
 Mortis causa – artigo 44º, nº3 RRNCP. Só se aplica a comerciantes em
nome individual.

→ Tutela do direito à firma ou denominação


O direito exclusivamente de forma ou denominação constitui-se com o registo
definitivo delas (artigos 3º e 35º, nº1 do RRNPC).

Para o correspondente âmbito de exclusividade, a protecção das firmas e


denominações faz-se por:
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• Meios preventivos: temos o certificado de admissibilidade de firma (artigo 35º,


nº2; artigo 45º e ss RRNSP) que é emitido pelo RRNPC e que confere segurança
quanto ao facto de não serem emitidas novas firmas idênticas ou iguais à firma
já registada;
• Meios repressivos: quando existe uma violação do princípio da
novidade/exclusividade poderão ser objecto de acção de declaração de
nulidade/anulação, as firmas obrigando-se à perda do direito ao uso (artigos
35º, nº4; artigo 60º RRNPC). Para além disso, o uso ilegal permite aos
interessados exigir uma indemnização pelos danos causados e eventualmente
puder propor a acção criminal (artigo 62º RRNPC).

→ Extinção do direito à firma ou denominação


Se a actividade comercial cessa porque o comerciante falece, extingue-se logo a
firma no caso de ele não ter deixado estabelecimento comercial. Caso o comerciante
tenha deixado empresa mercantil aplica-se as hipóteses previstas no artigo 44º, nº3 do
RRNPC.

Se a actividade comercial cessa por vontade do comerciante individual aplicam-se


os termos do artigo 61º, nº 1 e 2 do RRNPC.

As firmas e denominações ilegalmente constituídas, apesar de registadas a título


definitivo, podem ser declaradas nulas, anuladas ou revogadas por sentença judicial
(artigos 35º, nº4 e 60º, nº1 do RRNPC).

→ Escrituração mercantil
A escrituração é o registo ordenado e sistemático em livros e documentos de
factos relativos à actividade mercantil dos comerciantes para a sua informação e de
outros sujeitos (artigo 18º, nº2 C. Comercial – remete para o artigo 29º).

Sendo embora muito importante, a contabilidade (registo em unidades monetárias


de operações patrimonial-contabilizáveis) não esgota a escrituração.
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a. O comerciante tem liberdade quanto à determinação do número e à


sistematização dos livros e pastas para a escrituração (artigo 30º C. Comercial);
b. Existem livros de actas, mas deixaram de ser obrigatórios em 2006 (artigo 31º
C. Comercial);
c. O comerciante é obrigado a arquivar a escrituração durante 10 anos, sendo que
o arquivo pode ser em suporte físico ou electrónico (artigo 40º C. Comercial);
d. Para Coutinho de Abreu parece assentar-se o carácter não secreto da
escrituração mercantil com o prescrito no artigo 41º C. Comercial. No entanto,
parecem também existir algumas limitações à exibição da escrituração
mercantil consagradas nos artigos 42º e 43º C. Comercial;
e. Os documentos da escrituração mercantil têm força probatória nos termos do
artigo 44º C. Comercial;
f. Os comerciantes têm obrigação de dar balanço e de prestar contas
anualmente, ou seja, os gerentes/administradores devem elaborar e submeter
anualmente aos sócios o relatório de gestão e as contas de exercício da
sociedade comercial (artigo 18º, nº4 C. Comercial).

→ Inscrição no registo civil


O registo comercial publicita certos factos respeitantes a determinados sujeitos,
tendo em vista a segurança do tráfico ou comércio jurídico (artigo 1º do C. Registo
Comercial).

Artigo 1º C. Registo Comercial – o registo serve para dar publicidade à situação


jurídica dos comerciantes em nome da segurança e certeza jurídicas;
Artigo 15º C. Registo Comercial – estão sujeitos obrigatoriamente a registo os
factos previstos neste artigo;
Artigo 11º C. Registo Comercial – o registo conduz à existência da presunção de
que a situação jurídica existe nos precisos termos em que se encontra inscrita
no registo comercial;
Artigo 13º C. Registo Comercial – o registo tem eficácia “inter partes”;
Artigo 14 C. Registo Comercial – o registo tem eficácia “erga onmes”.

Por isso o registo é um requisito de eficácia dos factos em relação a terceiros.


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→ Responsabilidade por dívidas comerciais contraídas por cônjuge


comerciante
As dívidas contraídas no exercício do comércio serão comunicáveis ao cônjuge do
comerciante se este for casado sob o regime de comunhão geral de bens ou comunhão
de adquiridos. Tal acontece, porque se presume o proveito comum do casal (artigo 15º
C. Comercial + artigo 1691, nº1, alínea d C. Civil). Assim, por tais dívidas responderão
os bens comuns do casal e, na sua falta ou insuficiência, os bens próprios de qualquer
um deles (artigo 1695º C. Civil).

No que diz respeito à prova, o credor apenas tem que provar que o devedor é
comerciante em nome individual (não tem que provar o proveito comum nem que a
dívida foi contraída no exercício do comércio).

Empresas
Empresa e estabelecimento são expressões sinónimas para Coutinho de Abreu,
porque a palavra “estabelecimento” denota dominantemente algo objectivo (uma
estrutura produtiva de um sujeito e objecto de relações jurídicas). Mas a palavra
“empresa” também pode ter o mesmo significado por ser empregue em grande escala
para significar sujeito.

Distinguem-se espécies de empresas quanto objecto e assim falaremos de:

 Empresas comerciais – empresas através das quais são exercidas


actividades de interposição nas trocas (maxime, compras de coisas para
revenda e vendas de coisas adquiridas para revender – artigo 463º do C.
Comercial). Em suma, empresas cujo objecto se traduza na realização de
actos objectivamente mercantis;
 Empresas não comerciais – empresas de indústria extractiva,
designadamente as de exploração dos “recursos geológicos”, pois nem
o artigo 230º do C. Comercial nem qualquer outra norma fazem menção
a estas empresas. Os profissionais liberais não são empresas em sentido
objectivo (ex: advogados, contabilistas)
1º Frequência Micaela Pimentel
Direito Comercial

Podemos distinguir também empresas consoante os sujeitos:

 Empresas do sector privado - a sua propriedade e gestão pertence a


uma pessoa singular ou colectiva, já não está nas mãos do Estado
ACE – aglomerado comercial de empresas
 Empresas do sector público
 Empresas públicas do Estado
✓ Empresas sociedades
 Artigo 2º, nº1 do RSPE;
 Artigo 5º, nº1 do RSPE – noção de empresas
públicas;
 Artigo 9º, nº1 do RSPE – 4 critérios para
demonstrar a influência dominante do Estado;
 Artigo 35º, nº1 do RSPE;
 Artigo 31º do RSPE;
 A estrutura muitas vezes é a estrutura adoptada
para as sociedades anónimas e por isso o Estado
tem ao dispor 3 tipos de estrutura: tipo
tradicional (conselho de administração e fiscal),
tipo germânico ou dualístico (conselho de
administração executivo e conselho geral e de
supervisão) e tipo monistico (conselho de
administração, mas dentro há uma comissão de
auditoria) – artigo 31º, nº3 do RSPE + artigo 278º
do C. Sociedade Comerciais;
 Eleição – feita por deliberação dos sócios (artigos
31º, nº4 e 5, e 33º do RSPE);
 Artigos 34º a 36º do RSPE.
✓ EPE`S (entidade pública empresarial) – no nome tem de
ter uma vírgula e de seguida dizer EPE (artigos 52º e 56º
do RSPE)
 Têm autonomia administrativa (realizam actos
jurídicos), financeira (têm um orçamento próprio)
1º Frequência Micaela Pimentel
Direito Comercial

e patrimonial (têm um património próprio) –


artigo 58º do RSPE;
 São criadas por decreto-lei – artigo 57º, nº1 do
RSPE;
 O capital inicial é entregue pelo Estado – artigo
59º do RSPE;
 Nomeação – só pode ser feita no conselho de
ministros sendo que tem de haver uma proposta
elaborada pelos membros do Governo
responsáveis pelas finanças
✓ Artigo 39º, nº4 do RSPE
✓ Artigo 39º, nº6 do RSPE
✓ Artigo 39º, nº7 e 8

 Empresas públicas das Regiões Autónomas


 Empresas públicas locais – têm de ser sociedades por quotas ou
anónimas (aplica-se o RAEL e o C. Sociedade Comerciais)
❖ Artigo 23º do RAEL – fiscalizadas pelo tribunal de contas;
❖ Artigo 25º, nº2 do RAEL – assembleia-geral e fiscal único;
❖ Artigo 26º do RAEL – tem dois administradores
nomeados pelos sócios;
❖ Artigo 30º, nº4 do RAEL.
 Serviços municipalizados – actividades realizadas pelos
municípios (aparece o nome da empresa e a seguir EM –
empresa municipais ou EIM – empresa intermunicipais ou EMT –
empresa metropolitana)
• Capitulo 2º do RAEL
• Os serviços são criados pela assembleia municipal sob
proposta da câmara municipal – artigo 25º, nº1, alínea n)
do RAEL
• Não tem personalidade jurídica e tem por objectivo o
abastecimento de água, gestão dos resíduos urbanos,
etc… – artigo 10º do RAEL
1º Frequência Micaela Pimentel
Direito Comercial

• Artigos 13º, 15º e 16º do RAEL

 Empresas do sector cooperativo e social


✓ Artigo 2º, nº1 do Código Cooperativo
✓ Cooperativa de consumo – os membros possam beneficiar de
bens e serviços com o preço muito próximo do preço de custo (o
excedente não pode ser tido como lucro);
✓ Cooperativa de produção – todos os cooperadores são
trabalhadores, não recebem salário, mas beneficiam de certas
vantagens por trabalharem lá (o excedente não pode ser tido
como lucro);
✓ Cooperativa de venda – visa os cooperadores substituir os
intermediários-comerciantes e evitar que parte do valor dos
produtos fique nas mãos destes a título de lucro.

 Empresários em nome individual

→ Principais acessões de empresa


 Em sentido subjectivo – traduz-se na empresa enquanto sujeito jurídico que
exerce uma actividade económica. Evidenciam-se, principalmente, no direito
de defesa da concorrência;
 Em sentido objectivo – entende-se a empresa enquanto uma estrutura
económico-produtiva objecto de direitos e de negócios. É a unidade jurídica
fundada em organização de meios que constitui um instrumento de exercício
relativamente estável e autónomo de uma actividade de produção para a troca.

Acessão de empresa em sentido subjectivo

Esta noção é muito importante no seio do Direito da Concorrência. Para o Direito


Europeu da Concorrência são empresas os sujeitos jurídicos que exercem uma
actividade económica e que têm a hipótese de restringir a concorrência e afectar as
trocas comerciais para evitar a exploração de forma abusiva de uma posição
dominante.
1º Frequência Micaela Pimentel
Direito Comercial

Existem entidades que apesar de não serem empresas em sentido objectivo (não
têm aquela estrutura económico-produtiva objecto de direitos e de negócios) são
consideradas empresas em sentido subjectivo. Na verdade, apesar de não haver uma
organização de trabalho dependente e de outros factores de produção, é considerada
empresa em sentido subjectivo um profissional liberal, um artesão, um agricultor, etc.

Esta noção de empresa europeia influenciou a noção de empresa portuguesa e isso


reflectiu-se com a entrada em vigor do Regime Jurídico da Concorrência (lei 19/2012
de 8 de Maio). Neste domínio é importante salientar o artigo 3º deste regime que
contém a noção de empresa para efeitos de direito da concorrência. Este artigo vem
salientar que há entidades que podem não explorar empresas em sentido objectivo,
mas serem consideradas empresas em sentido subjectivo. Coutinho de Abreu entende
que o nº2, do artigo 3º não devia ter sido contemplado e que, também, a não
aplicação do artigo 9º a acordos e práticas consertadas entre empresas não exige que
se veja “no conjunto de empresas” uma única empresa.

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