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Habitação em Centros Históricos

Como uma visada retrospectiva pode contribuir?

até pelo menos a 1a metade do século XX


contextos urbanos menos complexos

Áreas multifuncionais

Multiplicidade de situações e de personagens,


relação amigável com a rua
formas particulares de sociabilidade e de relação com a
cidade
A especialização e a perda da função residencial
são relatos comuns a todos os sítios históricos brasileiros
o processo de industrialização,

a expansão demográfica,

a presença do Estado
grandes cirurgias urbanas
legislação urbanística.

O centro se transforma em “local turístico” ou “sitio histórico”


promovido a referência simbólica
condenado a um local apartado da vida da cidade.
Giulio Carlo ARGAN
(o conceito de centro histórico pode ser útil mas é )

“teoricamente absurdo porque, se se quer


conservar a cidade como instituição, não se pode admitir
que ela conste de uma parte histórica, com um valor qualitativo,
e de uma parte não-histórica, com caráter puramente quantitativo.

Fique bem claro que o que tem e deve ter, não apenas organização, mas
substância histórica, é a cidade em seu conjunto, antiga e moderna."
Confinar centros históricos acaba por conferir-lhes
exatamente o oposto, ou seja, um caráter “não histórico”

Supressão da densidade e do caráter – superposição e do entrelaçamento de diversos


tempos.

Qualquer indução de novas especializações dos centros históricos parece


absurda

condenação a “local turístico”,


uso residencial dirigido a uma única clientela
(baixa renda / lofts e flats)
As cidades coloniais brasileiras foram desenhadas pelo
acaso?

Até o século XIX


Morfologia, tipologias das construções, alinhamentos e uso do solo
resultavam sobretudo de posturas urbanísticas –
Ordenações do Reino, Cartas Regias

influência dos tratadistas, difundidos pelas “irmandades embandeiradas

Século XX –
A ação do Estado é determinante dos processos de
perda de população nas áreas centrais
grandes cirurgias urbanas
legislação urbanística
Os processos de degradação dos centros tradicionais
não são “naturais” ou “inexoráveis”

portanto

As atuais intervenções não podem ser parciais


devem buscar instrumentos de abrangência, no mínimo, análoga

ser integradas a estratégias de desenvolvimento local e de gestão

prever mecanismos que se valham da lógica do mercado


para garantir o interesse público e o acesso à moradia.
Imóvel Próprios x Alugados
A proporção se inverte ao longo do século XX

SÃO PAULO
Condição de 1920 1940 1950 1970 2000
ocupação % % % % %

Alugados 70 67 58 38 22
Próprios 19 25 37 54 69
Outros 2 7 5 8 9

RIO DE JANEIRO- séc XIX


entre 79 e 85% dos imóveis das freguesias urbanas eram alugados.
propriedade muito concentrada (Nireu Cavalcanti)

negócio imobiliário muito rentável - aluguéis propiciavam rendas superiores aos 5% de


juros legalmente permitidos
Intervenção do Estado a partir dos anos 1940

Regulação do mercado de aluguéis

Planos de aquisição da casa própria, mas,

principalmente

Permissão tácita da expansão periférica associada à auto-


construção

“casa própria”
não significou ascensão social ou melhoria das condições de
vida
A importância da reabilitação: descoberta tardia?
IPHAN – principais centros históricos protegidos até os anos 1970

Planos urbanísticos
SÃO LUIS – 1º plano do IPHAN em 1959; plano de Michel Parent (UNESCO), 1966

OURO PRETO - Plano Vianna de Lima (UNESCO) - 1971 ; Plano Fund. João Pinheiro - 1974

PCH - Programa Integrado de Reconstrução das Cidades Históricas IPHAN - 1973

SALVADOR – 1as medidas no final dos anos 1970, intensificadas a partir da inscrição do
Pelourinho na Lista do Patrimônio Mundial, em 1985;

RECIFE - 1as propostas tiveram origem no PCH

RIO DE JANEIRO - Corredor Cultural - início em 1979

Programa habitacional para os sítios históricos IPHAN/ BNH - 1983/86


RETROSPECTIVA DA RETROPSECTIVA

 AREAS MULTIFUNCIONAIS

 AS PERDAS DE POPULAÇÃO E DEGRADAÇÃO RESULTAM


DE PROCESSOS ABRANGENTES E NÃO NATURAIS,
COM FORTE AÇÃO DO ESTADO

 A CULTURA DA “CASA PRÓPRIA” FAVORECIDA PELA


AÇÃO E OMISSÃO DO ESTADO

 O TEMA VEM SENDO TRATADO HÁ MAIS DE 30 ANOS


COM RESULTADOS MUITO TIMIDOS

 A NECESSIDADE DE INTERVENÇÕES ABRANGENTES


Subsídios para analisar a
viabilidade da locação social em centros históricos

=
viabilidade de uso residencial e permanência de populações de renda
média e baixa nos centros históricos

=
Viabilidade de readequação de edifícios
•de uni-familiares para multi-familiares (casas e sobrados)
•de maior para menor área (apartamentos)
De que edificações ou conjuntos urbanos estamos falando?
ou
qual é o nosso objeto de intervenção

1 - Centros históricos coloniais


tombados pelo IPHAN, muitos inscritos na Lista do Patrimônio Mundial da UNESCO
Salvador, São Luis
regiões de Recife, Rio de Janeiro
Olinda, Ouro Preto, cidades históricas de Minas, Goiás
... 80 sítios urbanos tombados pelo IPHAN - menor porte

casas e sobrados
conjuntos urbanos remanescentes, em sua maioria, do século XIX
(edificações períodos anteriores - tombamento isolado)

2 - Centros urbanos do século XX


predominam tombamentos isolados e proteção pela legislação municipal
São Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte...
edifícios em concreto armado
OS DESAFIOS DA INTERVENÇÃO

Tipologias arquitetônicas são um “sistema”


valores estéticos e estilísticos
valores sócio-culturais,
materiais disponíveis,
tecnologias disponíveis,
condições ambientais.

que se traduzem em

plantas
volumes
coberturas
fachadas e elementos decorativos
sistemas construtivos

as intervenções devem considerar a lógica desse “sistema”


Não é apenas naquelas soluções intencionalmente decorativas
que a arquitetura é uma obra de arte:
a constância de um mesmo tipo de programa durante um largo período de tempo,
a preferência por um mesmo partido,
a eficiência comprovada de um esquema construtivo satisfatório,
a simpatia manifesta por uma determinada série de soluções particulares e, afinal, como
resultado,
a eleição de uma peculiar proporção, uma particular feição plástica,
contribuem para construir – a posteriori –
a fisionomia arquitetônica – artística de uma sociedade.

Esta fisionomia, inconfundível,


porque fruto de um sentimento coletivo acerca das coisas e dos problemas,
está na arquitetura, nas alfaias, no vestuário,
na maneira de ser e até na alimentação e na fala.

Luis Saia – Morada Paulista


Os estudos da Casa Brasileira
Jose Wasth Rodrigues
Robert Smith
Lucio Costa
Sylvio de Vasconcellos
Luis Saia
Paulo Tedim Barreto
Paulo Santos
Nestor Goulart reis Filho
Augusto da Silva Telles

Leila Mezan Algranti


História da Vida Privada – Vol I - Famílias e Vida Domestica
O que é comum a esses estudos

Processo evolutivo da casa térrea ao sobrado – da ocupação inicial ao séc XIX

Lote urbano - determinante da forma arquitetônica


Rua - definida pela seqüência de construções, não o contrario.

“Monotonia” nas plantas e sistemas construtivos


Homogeneidade não casual (Cartas Régias)
garantir uma aparência portuguesa

Debret
O sistema de construção encontra-se sem nenhuma alteração
nas grandes ruas e casas comerciais,
nas praças publicas e nos arrabaldes da cidade;
a diferença está em que, nos bairros elegantes o alto funcionário
e o negociante reservam o andar térreo às cocheiras e estrebarias,
ao passo que na cidade o comerciante nele instala os seus pequenos armazéns.
– casa de porta-e-janela
...“Monotonia”... – casa de ½ morada
•até alcançar situações – casa de ¾ morada
– casa de morada inteira
complexas, como a de São Luis – casa térrea de comercio
– casa de porão
– casa de mirante
– casa de porão e mirante
– sobrados de dois e três
pavimentos, com e sem porão
mirante
– sobrado de 4 pavimentos
Sobre a importância das plantas
BRUNO ZEVI - Saber ver a Arquitetura
O espaço interior, aquele que (...)
que não pode ser conhecido e vivido a não ser por experiência direta
é o protagonista do espaço arquitetônico.

É o que distingue o que é e o que não é arquitetura

a história da arquitetura é a história das concepções espaciais

ARGAN - (a propósito do espaço interno de Zevi)


Evolução do conceito de espaço não é outra coisa senão o vir-a-ser
e a modificação da concepção da vida.
dilata esse conceito até a escala do o urbanismo
o urbanismo como prolongamento orgânico das plantas, em vez de
prolongamento
perspectivo das fachadas, (...)
que define a posição do individuo da sociedade,
mais do que sua posição em face à natureza.
... Aí está, acreditamos, o objetivo dos arquitetos modernos

– que preferem criar condições de vida, mais do que


condições de vista,
– e identificar nas formas valores humanos mais do que
símbolos de idéias eternas.

Giulio Carlo Argan


CRITÉRIOS DE INTERVENÇÃO
(conservação e restauro)
...evitando percorrer as varias teorias e cartas, o que é mais aceito:

8. Respeito pelas evidências documentais (documentos históricos, arqueologia)


9. Respeito pelo material histórico (reaproveitamento preferível à substituição)
10.Respeito pela história do edifício (contribuições de varias épocas – evitar a
busca do “original” ou do “estado completo”)
11.Reversibilidade
12.Legibilidade
13.Manutenção (evitar novas restaurações)
Nem tudo deve ser preservado , desde que
a decisão não seja isolada,
que se faça por critérios claros e
que se tenha em mente o conjunto

Em situações de reabilitação

– planta - dificilmente
– sistemas construtivos e acabamentos– parcialmente
– volume e coberturas – quase sempre
– ruínas – como intervir? ( de Ruskin ao Restauro científico)
Ruinas

Reconstrução?
ITÁLIA
Plano Regulador e Plano e Plano Particularizado
(Carta de Restauro)

Classificação das unidades

• Restauro – interno, estrutural, de fachada – edifícios mais bem conservados, especialmente os de propriedade
publica

• Reabilitação – extração de elementos descaracterizadores, adaptações para condições modernas de moradia

• Reestruturação com vinculo parcial – interior liberado, restauro e conservação apenas de fachada

• Reconstrução condicionada – edifícios sem maior significado, que não perturbam a leitura do tecido
histórico, podendo ser demolidos ou não. Se demolidos, sua área poderia ser reaproveitada para construção de
igual massa.

• Demolição sem reconstrução – edificações sobre áreas que no tecido histórico podem representar vazios
vitais. Servirão para áreas verdes e de lazer, públicas ou privadas
FRANÇA
Plan de sauveguard
Havana
Plan maestro
CONSERVAÇÃO E SUSTENTABLIDADE

O impacto urbanistico
• aumento de densidades
capacidade de carga

• diversificação de usos

• necessidades do presente – acessibilidade, estacionamentos, serviços

O impacto social
• a transição da moradia individual e precária para a habitação coletiva, com serviços e
responsabilidades comuns – os condomínios

• a importância da abordagem do conceito amplo de habitação

• acessibilidade, trabalho, renda, serviços urbanos (escola, saúde, lazer)


O QUE SE PODE AFIRMAR ...

Importância da abordagem integrada e completa


do “plano de salvaguarda” à intervenção arquitetônica

as condições sociais das novas populações residentes (capacidade de pagamento,


conservação, não transferência do imóvel)

Não há viabilidade se o custo reabilitação for analisado imóvel por imóvel


Outras abordagens seriam necessárias
A disposição-a-pagar

avaliação contingente - estimação dos valores médio e mediano que os consumidores estão dispostos a
pagar por um bem de valor não observável
ferramenta para mensurar danos ou melhorias ambientais (culturais, sociais?), parâmetro para a tomada
de decisões

O custo-de-não-fazer

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