Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Resumo
Pretende-se com este trabalho apresentar sugestões metodológicas sobre a utilização de actividades
lúdicas (desporto e turismo) dentro do Maciço Calcário Estremenho (MCE) e PNSAC para dar a conhe-
cer a Geologia e Geomorfologia desta área, contribuindo tais conceitos e objectos para a percepção do
funcionamento da Natureza. Entre outras abordagens, a fórmula básica passa por apresentar e relacionar
aspectos diversos da Geologia (Geomorfologia, Paleontologia, Mineralogia, Sedimentologia e Tectónica,
entre outras) com as situações concretas que resultam em potencialidades de alguns locais para a prática
destas actividades de ar livre. Iremos analisar em detalhe alguns dos tipos de desportos de natureza
praticados na região e outras práticas correlacionáveis com as actividades de ar livre com vocação de
aquisição ou manipulação de conhecimentos em contexto não formal, tentando enquadrar legalmente
estas actividades dentro do PNSAC, bem como abordar os impactos ambientais e as condicionantes
geológicas da realização destas actividades.
Palavras-chave: MCE; PNSAC; Desportos de Natureza; Turismo de Natureza; Ensino de Geologia.
145
1. Introdução
1.1. Objectivos
O Maciço Calcário Estremenho constitui uma região excepcional para demonstrar a
importância do elementos geológicos na ecologia, na paisagem, no clima, nas comunidades
humanas, enfim, como determinante no funcionamento da Natureza deste planeta peculiar
que sustenta a Vida e, em particular, o Homem. Impõe-se valorizar estas potencialidades
tão especiais junto dos seus habitantes e visitantes, mesmo que a motivação primeira destes
últimos seja um passatempo.
Neste trabalho fazemos a análise sucinta da geologia da região, que avaliamos como
excepcional para os objectivos referidos, bem como passamos em revisão as actividades lúdicas
já realizadas ou perspectivadas, e cuja relação com a geologia e geomorfologia julgamos ser
uma oportunidade pedagógica.
146
trata de uma caso notável de relação entre as características geológicas, a morfologia, o clima,
a ecologia e a ocupação humana (Martins, 1949; Fernandes, 2000).
Nesta perspectiva, e como veremos, pela riqueza e variabilidade de elementos geológicos,
excepcionalmente bem expostos pelas condições morfoclimáticas, a região é extremamente rica
em exemplos pedagógicos ao nível de Geomorfologia, Sedimentologia, Tectónica, Estratigrafia,
Paleontologia e Mineralogia.
147
fundo e na falha-diapiro de Porto de Mós – Rio Maior. A mobilização desta unidade pode
ainda ser associada à definição dos domos de largo raio S. Mamede e Pragosa (Gruneisen
et al., 1973).
A Bacia (terciária) do Baixo Tejo pode ser considerada uma bacia de antepaís do con-
junto de blocos elevados que incluem, além do MCE, a Cordilheira Central Portuguesa e a
Serra de Montejunto.
2.1. Geomorfologia
A área abrangida pelo PNSAC/MCE é, do ponto de vista geomorfológico, o melhor
exemplo de Paisagem Cársica portuguesa, no que diz respeito ao exocarso e endocarso. Dada
a posição geográfica desta zona, com boas acessibilidades, centralidade no que diz respeito ao
território continental português e proximidade de grandes urbes e zonas turísticas, é natural
que as actividades lúdicas, quer ligadas a Desportos de Natureza, quer ligadas ao Turismo,
levam muitas pessoas ao PNSAC/MCE para a realização de actividades que podem ser usadas
para realçar o carácter excepcional desta paisagem. Assim, tal como se fez em outras áreas
protegidas (Ferreira 1999) seria importante colocar nos diversos locais interessantes do ponto
de vista geomorfológico (miradouros, depressões cársicas, cavidades, falhas, etc.) painéis
interpretativos (como um que se encontra no Monumento Natural das Pegadas de Dinossáu-
rios, no Bairro) que possibilitem aos visitantes desta área entender um pouco melhor o que
vêem, pelo menos em alguns locais com o Polje de Minde (nos miradouros), na Fórnea, em
exsurgências ou ressurgências (v.g. Olhos de Água do Alviela ou Nascentes do Rio Almonda
ou Lena), em rochas filonianas ou vulcânicas (v.g. Filão da Portela de Teira), nalgumas
lapas/algares, nos locais com os mais interessantes lapiás, nas principais falhas e dobramen-
tos, em depressões cársicas menores (v.g. Chão das Pias), Canhões (v.g. Canhão da Ribeira
dos Amiais), etc.
2.2. Paleontologia
Para além do atrás citado Monumento Natural, no Bairro, há muitos outros locais
com potencial de classificação e de utilização pedagógica no que diz respeito à Paleontologia,
quer no que diz respeito a icnofósseis (sobretudo de Dinossáurios) quer no que diz respeito
a moldes e conchas de invertebrados marinhos. Assim conviria iniciar a sua classificação,
avaliar a possibilidade de o parque lhes associar estruturas de interpretação (como a do
Bairro) ou usar meios mais ligeiros (guias com formação paleontológica) para a sua utiliza-
148
ção em visitas temáticas. Deveria ainda ser decidido (pelo PNSAC/ICNB) se há locais em
que a recolha de fósseis deveria ser condicionada, pois esta faz-se anarquicamente dentro
PNSAC/MCE, bem como tentar preservar alguns fósseis das muitas pedreiras que existem nesta
área e que, nalguns locais, fazem desaparecer quase na íntegra o registo fóssil dos locais onde
se encontram.
2.3. Mineralogia
Desde longa data que se recolhem, dentro do PNSAC/MCE, minerais (bem com rochas
e fósseis) para venda. Basta citar a calcite de Rio Maior, que é a habitualmente comercializada
pelos Vendedores de Rochas, Fósseis e Minerais portugueses. Aliás o PNSAC/MCE é muito
utilizado para recolha de rochas, fósseis e minerais, quer por profissionais quer por amadores,
pelo que se impunha a preservação de certas áreas, embora não seja possível, provavelmente,
impor à força estas medidas, pela impossibilidade de uma eficaz fiscalização. Impunha-se
ainda que os locais de venda de minerais (e rochas e fósseis) tivessem pessoas com formação
na área das Geociências, quer para evitar excessos na recolha dentro do PNSAC/MCE, quer
para que os habitais erros associados à venda destes materiais não continuasse a acontecer
(veja-se o caso das Grutas exploradas comercialmente, em que a venda estes materiais tem
muitas vezes lamentáveis erros e omissões). Devia ainda haver mais informação sobre mine-
ralogia/petrologia, nomeadamente nas Salinas de Rio Maior e em algumas pedreiras (activas
e inactivas) visitáveis.
2.4. Sedimentologia
Nesta área é possível, em alguns locais, criar painéis interpretativos, como alguns
que já existem no Monumento Natural no Bairro ou similares às do Parque Natural de
Serra da Estrela (Ferreira 1999). Aspectos como estruturas sin- e pós-deposicionais, inter-
pretação de ambientes deposicionais e outros podem ser feitos calcorreando os terrenos do
PNSAC/MCE, se os seus responsáveis preservarem algumas rochas e divulgarem os locais
interessantes a visitar. É ainda desejável, em algumas Recuperações Ambientais de Pedreiras
(Almeida et al., 2005), preservar aspectos sedimentológicos interessantes, do ponto de vista
pedagógico e didáctico (para além dos aspectos ligados com a biodiversidade, nestas recupe-
rações deve-se, sempre que possível, ter em conta a Paleontologia, Sedimentologia e Minera-
logia, entre outros, conforme algumas das últimas intervenções do PNSAC têm feito, o que é
de salientar).
2.5. Tectónica
Como vimos anteriormente, o PNSAC/MCE resulta da interacção dos agentes mode-
ladores do relevo externos e internos, que ao actuarem sobre as rochas carbonatadas deram
origem ao modelado cársico. As marcas da actuação dos agentes internos são as frequentes e
vigorosas falhas que cortam em blocos o MCE e o separam das rochas envolventes, bem como
os dobramentos, que, embora menos visíveis, são também muito importantes nesta zona. As
falhas e, nalguns casos, os dobramentos deviam, quando são importantes do ponto de vista
estrutural e têm interesse do ponto de vista didáctico-pedagógico, ter referência em painéis
interpretativos da paisagem.
149
3. Prática de desportos de natureza (e seu enquadramento legal) no PNSAC
e a Geologia
Algumas actividades têm agora enquadramento legal dentro do PNSAC, nomeadamente
no âmbito da carta de desportos da natureza do Parque (Portarias n.º 112/98, de 25 de Agosto
e 1465/2004, de 17 de Dezembro). Iremos agora analisar alguns aspectos destas, ligados com
a Geologia, bem como os impactos ambientais e as condicionantes geológicas da realização
destas actividades.
Fig. 2 – Mapa geológico simplificado do PNSAC (baseado na Carta Geológica de Portugal, escala 1: 500.000)
150
Assim, olhando directamente para a seguinte figura, onde colocámos os locais onde
se praticam ou podem praticar no PNSAC os desportos de natureza atrás citados, dá para
perceber sem hesitações que a Geologia Estrutural condiciona directamente a sua localização.
Mas vejamos, mais ao pormenor, como tal sucede.
3.1.2. Escalada
Neste desporto de natureza o escalador faz uma actividade de ascensão (tenta, com
diversas técnicas, progredir em rochas ou superfícies artificiais e na vertical). Estes locais, que
são nove no PNSAC (e consideramos ainda, dentro do MCE, outro com muita importân-
cia, na falha do Reguengo do Fetal) como se pode observar no mapa anterior, estão sempre
relacionados (dentro PNSAC/MCE) com escarpas de falha. Esta actividade pode ter algum
impacte ambiental (mais a nível biológico mas também algum a nível geológico, pois pode
gerar instabilidades nos taludes e por vezes os seus praticantes recorrem a produtos que poluem
os locais onde se praticam.
3.1.3. Pedestrianismo
A Carta da Natureza definiu para o PNSAC (e áreas limítrofes) dezasseis percursos
pedestres de pequena rota (até 30 quilómetros). Não sendo, directamente, condicionados
pela Geologia, estes são excelentes para mostrar aspectos da Geologia e Geomorfologia do
PNSAC/MCE e têm poucos impactes negativos, desde que os praticantes cumpram o estipu-
lado na legislação e tenham formação em educação ambiental. Na carta foram marcados de
modo a indicar o início e terminus.
151
ponor funciona como tal), pelo que podemos correlacionar directamente a Geologia com
esta prática desportiva. Há ainda a salientar que este desporto não tem grandes impactes
negativos (mesmo no Polje, quando inunda e onde é proibido) e poderia ainda acrescen-
tar-se à lista (embora com impactes negativos mais pronunciados) as lagoas, em particular a
Lagoa Grande do Arrimal.
4. Conclusões
Pelo acima exposto é possível concluir que o MCE constitui uma região de grande
riqueza e diversidade de elementos geológicos, incluindo mesmo um património geológico
significativo e formalmente reconhecido. Em muitas situações, as características geomorfoló-
152
gicas que lhes conferem excelentes condições de exposição, ou que são per se elementos rele-
vantes, são as mesmas que permitem a realização no PNSAC de várias actividades lúdicas e
desportos da natureza.
É de notar que quando tais relações são referidas em iniciativas diversas, nomeadamente
do PNSAC, parecem ser, sistematicamente, do manifesto interesse dos participantes. O mesmo
vale para a informação geológica (s.l.) que é fornecida a participantes ou visitantes.
Porém, tais dados são omitidos ou sub-explorados em muitas daquelas actividades.
Ora, considerando:
– O manifesto Interesse Público na Divulgação Científica e na Educação Ambiental, nome-
adamente para o objectivo genérico da Formação para a Cidadania, ou mesmo especificamente
para a sustentabilidade dos Projectos Conservacionistas (de que o PNSAC é exemplo);
– Tendo em conta os investimentos Público e Privado para a constituição de Áreas Pro-
tegidas, incluindo os custos em recursos humanos, a construção e manutenção de estruturas
e os esforços para a captação de públicos/clientes;
Julgamos que:
s !S ACTIVIDADES L¢DICAS ASSOCIADAS Í GEOLOGIA CÕRSICA DO -#%0.3!# CONSTITUEM
excelentes oportunidades para exercer pedagogia/transmitir conhecimentos no âmbito das
Ciências da Terra.
s / SEU NáO APROVEITAMENTO £ DIlCILMENTE ADMISS¤VEL NA PERSPECTIVA DE UMA 3OCIEDADE
que visa o Desenvolvimento Sustentável.
s )MPµE
SE POIS NAS REFERIDAS ACTIVIDADES REFOR½AR A INFORMA½áO QUE INCLUA CONHECI-
mentos no âmbito das Ciências da Terra.
Bibliografia
ALMEIDA, F., MIRA, J. & DUARTE, M. (2005) – Guia Recuperação de Áreas Degra-
dadas, Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros – ICN. 131 p. s.l..
AZERÊDO, A.C., RAMALHO, M.M., SANTOS, V.F. & CARVALHO, A.M.G. (1995)
– Calcários com pegadas de dinossáurios da Serra d’Aire: microfácies e paleoambientes. Gaia,
11: 1-6. Lisboa.
BRILHA, J. (2005) – Património Geológico e Geoconservação: A Conservação da Natureza
na sua Vertente Geológica, Palimage Editores. 190 p. Viseu.
CARDOSO, R. – Coord. (2007) – Turismo Científico em Portugal – um roteiro, Assírio
& Alvim – Ciência Viva, Rosa dos Ventos – 9. 174 p. s.l..
CRISPIM, J. A. (1993) – Algumas considerações sobre a estrutura geológica dos poljes
de Alvados e Minde, Algar, Bol. Soc. Port. Espeleol., 4: 13-26. Lisboa.
CUNHA, L. (1990) – As Serras Calcárias de Condeixa-Sicó-Alvaiázere – Estudo de Geomor-
fologia, Instituto Nacional de Investigação Científica, Geografia Física – 1. 329 p. Coimbra.
FERNANDES, I.M. (2007) – Percursos geológicos no sulco carbonífero dúrico-beirão:
Valongo, Gondomar, Castelo de Paiva. Afrontamento. – 144 p. Porto.
FERNANDES, J.L.J. (2000) – O Homem, o Espaço e o Tempo no Maciço Calcário Estre-
menho. O olhar de um geógrafo. Lisboa: Edições Colibri; Coimbra: Faculdade de Letras da
Universidade de Coimbra. 195 p.
153
FERREIRA, A.B., RODRIGUES, M.L. & ZÊZERE, J.L. (1988) – Problemas da evolução
geomorfológica do Maciço Calcário Estremenho. Finisterra, 23, 45, 5-28, Lisboa.
FERREIRA, N. & VIEIRA, G. (1999) – Guia Geológico e Geomorfológico do Parque
Natural da Serra da Estrela. Parque Natural da Serra da Estrela – ICN – IGM. 112 p., s.l.
GRUNEISEN, P., HIRLEMANN, G., JANOT, P., LILLIÉ, F. & RUHLAND, M.
(1973) – Fracturation de la couverture calcaire de structures diapiriques. Dômes salifères
de São Mamede et du Pragosa (Plateau de Fátima, Portugal). Sciences Geol. Bull., 26, 2-3,
187-217, Strasbourg.
MARTINS, A. F. (1949) – O Maciço Calcário Estremenho – Contribuição para um estudo
de geografia física. 248 p. Coimbra.
MANUPPELLA, G., ANTUNES, M.T., ALMEIDA, C.A.C. et al. (2000) – Notícia
Explicativa da Carta Geológica de Portugal (esc. 1/50.000), folha 27-A (Vila Nova de Ourém).
Serv. Geol. Portugal, 156 p. Lisboa.
RODRIGUES, M.L.E. (1991) – Depósitos e evolução quaternária das vertentes nas
depressões de Minde e de Alvados. Maciço Calcário Estremenho, Portugal. Finisterra, 51,
5-26, Lisboa.
RODRIGUES, M.LE. – Coord. (2007) – Glossário Ilustrado de Termos Cársicos, Edições
Colibri. 167 p. Lisboa.
RIBEIRO, A., KULLBERG, M.C., KULLBERG, J.C., MANUPPELLA, G. & PHIPPS,
S. (1990) – A review of Alpine tectonics in Portugal: Foreland detachment in basement and
cover rocks. Tectonophysics, 184: 357-366.
154