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| ‘Dados Internacional de Catalogaso na Publicagio (CIP) (Clara Brasileira do Livro, SP, Beas) Barcallos, Gustavo ‘Obangucte de psique : imaginaso cultura epsicologia da slimentagio | Gustavo Barcellos. ~ Petropolis, RJ: Vues, 2017 Biblogratia ISBN 978-85:526-5460-4 1. limentos~ Aspects pcogicas 2, Arquéipo (Psicologia) 3, Habitoralimentaes 4. Imagem (Psicologia) 5, Psicologia jungulana 6, Receas culinras Tito. 03554 epp.150 Indies para catilogo sistem: 1. Habits alimentares: Aspects psicolgicos 150 GUSTAVO BARCELLOS 0 ; _ BANQUETE DE PSIQUE Imaginagao, cultura e psicologia da alimentagio Rea ret Lay 100 25689900 Petrol, RJ ‘womens cob Bel “Todos ox dito reservados. Neshuma pace des aba poser er reprodusida ou asi por qualquer frm cou qubquer meios (cetinca ou mecinico, inlando forccpae gavage) ow agua em ‘qualquer sem ou bano de dads sem permite ei da edtors, CONSELHO EDITORIAL Diretor Gilbero Gongaies Garcia Editors Aline don Santon Canina aan Jo Psi Marae Lorine Olek ‘Welder Laci Matchink onsets Fanci Moris Leonaado ART. dos Sao eadovie Garmus “Tesi Heidemann oloey J Betkenbock Secrets exectve | Joto Batista Keach “Large: Fi Pinon Diagumajs:Shlandre Desens, Griico tet de mid stages pga 113, 157,158, 159, 160, 161, 162, 163,164, 165: naa daniesko | Sharersock, Isao pias 2, 131,155: The geen lion devouring the sun. Rosiam Phosphorus 1350), Rev gfe, Non Bra da Roche (Dieta der Papen LOST ISBN 978-85-326.5469-4 Editado conforme o nove acordo ortogrifico. z i 2 Exe of compost impeso pla Editor Vores Ld No principio fo a fome, Lufs da Camara Cascudo No inicio de tudo esta boca. James Hillman | NC) MMA Para Angela Tesi Para Rodrigo Gouvea, ara minha mie, Hely. Antepasto para uma reflexio, 9 Entrada, 13 Victor Palomo Mesa, 21 1 Aimaginagio da oralidade, 23, 2 Aalmaco gosto, 38 3 Aboca ea psique do engolimento, 48 4 As metiforas digestivas, 60 5, Coninha imaginal, 78 6 Comida dos deuses, deuses como comida, 98 7 Técnicas, utenslios, processos, 105 8 Temperose temperamentos, 114 9. Cocgéo final, 127 Sobremesa, 131 1 Doce e amargo na alma, 133 2 Esbogo para uma alquimia do agicar, 141 3. Bvocagio da cachaga, 152 Caderno de receitas, 155 Referéncias, 167 St i i j ANTEPASTO PARA UMA REFLEXAO ‘Ao me debrucar sobre o problema da alimentagio para orgunizar ¢ eserever minha contribuigfo a0 debate do IV Encontro dos Amigos da Psicologia Arquetipica, que ocor- retia em julho de 2006 em Sao Francisco Xavier, Sio Paulo, cajo tema era exatamente “Alma & Comid’, tive a certe- za de que esse asunto no podia, ou mesmo nem queria, deixar-me apenas com observagies iniciis, de cardter mais generalizante Hoje existem intimeros livos sobre histria, antropo- logia © mesmo psicossociologia da alimentagio, ¢ © cnor- me volume de trabalhos académicos sobre a sociologia da alimentagio, da comida ¢ dos habitos A mesa formam uma biblioteca imensa & disposigdo do pesquisador. Comer é um ato fsiolégico, antropolégico ¢ cultural, mas & também cemocional e simbdlico. Num plano psicolégico, 0 que cozi- har e.comer revela sobre nse sobre o mundo? Procurei na literatura da psicologia profunda, psicanal- ica junguiana, por uma abordagem que escapasse inteira- ‘mente da perspectiva psicossomitica, ou mesmo simbslica tradicional, com relagio a todo o capitulo da nutrigio ¢ do alimento, sua cultura, sua psicologia e sua psicopatologia. - Mf mma | Que escapasse, de verdade, encontrei quase nada, Pensava serimportante uma reflexio picoldgca & comida, que levase «em considerasao a alma e suas imagens, alimentagao estas _metéforasa psique da comida ~ ¢ ambém, claro, comida da psigue, Ua abordagem, por assim dizer, da imaginagio= ‘Acobra.a segus, que quando muito explora to somente uma introdugio a essas quest6es, busea ssa aproximagio, Este livro € para aqueles que querem refletr sobreo-at0- culeural de alimentar- em seu significado psicolégico mais ‘profindo, explorando as metiforas que esse gesto didrio © seus process originam para nos ajudar a entender melhor a centralidade da comida e dafome na vide fntima deodos “ngs, E um estudo de psicologia da imaginacéo gastrondmica, Sonhos doces, verdades amargss,realidades salgadas, rel es apimentadas,situagbes picantes compiem a psicologia da alimentasio muito antes que se instalem os transtornos alimencares propriamente ditos. (Com ilustragées alqutmicas retiradas de tratados me- ievais,esteestudo aborda 0 alimento como campo simbs- lico'e imaginativo. As questées da alimentagio ¢ da nutti- ‘fo, da gastconomia ¢ do preparo e ingestio de alimentos so aprofundadss a partir do ponto-de-vista da psicotogia como andlive-calearal, com-o-viés das arresecidnctas da imaginaso. © Cadero de Receitas que esté no final do liveo serve como ma ilustragio daquilo que podemos chamar de “co- ‘mid de alma’. Séo recetas que foram lembradas, imagina- das, recolhidas depois redigidas de um modo muiro par- sicular por causa da ajuda de minha amiga Angela ‘Teixeira, coninhera ildsola ror mytca desta alquimia gastrolirri- “tia; que emprestou seu talento culindrio, aliado a seu talento ‘com as ideas, para pensar comigo quais receitas entratiam ‘numa brew ima selesfo de pratos desse tipo de gistono- sia, A cla devo um agradecimento muito sincer. Também devo um agradecimento a Wladia Beatriz Pi- rex Correa e Cecilia Abrahamsson Marcondes Pereira, que leram os originaiscontribuindo com diversas sugestdes im- portants, a Marsa Penna porter me apresentad vos com cs quais pensar culindra ea alimentagio, ca Elina Coréa que desvenda para mim os mistérios do organismo. Ga Pedi Grande Sto Francisco Xavier Jancio/2017 ENTRADA No outono de 2015, jantavamos Gustavo Barello, dois ou trs analistas junguianos, um psiquiatra, um amigo aror eu, Faltavam poucas semanas para arealizagao do VI Con- gresso Latino-americano de Psicologia Junguiana, em Bue- nos Aires, ¢ omentévamos, despretensiosamente, os temas expectativas quanto & recepeSo das nossas comunicagSes. Subicamente, o psiquiatra dirigiu-se a Gustavo e indagou qual o assunto da sua palestrae ele, tomado por um sem- blante que entremeava dese, prazer € mistéro, respondew que faria alguns comencétios a respeto da alquimia do agi- car, Um timo de inquietagio fora registrado na respiracio dos comensais ¢ uma inquestiondvel surpresa (ou quem sabe até incredulidade) romou conta do olhar do amigo psiquia- ‘ra, cujo dstanciado interesse,apesar de ser um profssional mais que legtimado © competente na sua lida, 0 impedit captar a relevincia daquela imagem que Gustavo propusera ‘como miitema para as suas flexbes. Jamals me esquecere da luminosidade do olhae de Gustavo naquele momento ¢ me comtento de, somente agora, poder revelar (ou desvelar) em breves palavras a podtica do banquete, os segredos anfmicos dda comida e do comensal, que meu amigo jd fermentava € el se deixava imaginar naquele ritual gastrondmico e que eu, imprecisamente, registrar Pesquisador meticuloso¢ leitor concumaz, Gustavo con- vida-nos neste O banguete de psigue a aprofundarmo-nos na imagem do banchett, diem vo de banco, Etimologica- mente, © vocdbulo designa uma refeigio que deve ser degustada por pessoas sentadas ou acomodadas em tomo de ‘uma mesa, Tal cardter ritualistico assumido pelo texto desde © inicio anuncia que a enunciagio da psique da comida e da comida da psique se faré por meio de palavras ou locugées populares e proverbiais, muito menos ocupadas com as pos- sfveis camadas que enscjam seus suportes lingusticos, mas entregues as propriedades metaféricas implicica a essas te ‘minologias: mporcam aqui a rama das imagens e as pro dades imaginativas suscitadas pelo alimento, por suas esco- Ihas, as formas de preparo, as reccitas, o engolimento, o tubo digestivo, a excregio, 0 salgado, 0 doce, a mesa ea sobremesa, apreciados a partir de suas “necessidades riualistcas in secas’,cerimOnias necessitias a0 soul making. A adesio e a hhonestdade intelectuais de Gustavo a tas premisss imprime a0 texto sua perspectiva (seu olhar através) radicular, a qual se afasa de uma narrativa linear ou uma resenha analitica sobre o ato de comer e suas vicissitudes. As imagens alcan- gam contundencia, isto sim, e provocam no leitor 0 {mpeto de devoramento porque organizam uma poética da comida, dafome ¢-da alimentagio, tangenciando aquilo que causa ‘maior impacto quando entramos em contato com as esco- thas os temas eleitos pelo autor ¢ que constitui sua marca indomével: a sensualidade. ‘A ocupagéo-sensual-opta por Ura linguagen elipcic, csifaday organizada em planos curtos, dando ao leitor iner- vals para respira impar o paladar e saborear as imagens sequencialmente oferecdas. Essa ténica lteitia (note-se que 0 psicologizr aqui deliciosamente servido ¢ literatura) aproxima-se do conecito de cortelato objetivo proposto por TSS Eliot, nfo por acaso poeta caro a Gustave quando teceu finisimos comentérios sobre “Os quatro quartets’, poema que guarda versos como “Seu ritmo estava(..]/ No aroma das was sobre a mesa de outono”. Como menu, a mesa ¢ & sobremesa postas por este ensaio seguem a reccitaclotiana do emprego de imagens podticas de modo sucessivo, quase como diapositivos vertiginosos que evocam um desconcerto no leitor, deixsando sua conscigncia.evemente em desacordo ¢ (desJatenta 20 que cozinha nela e para além dela, 0 que pode ser asado, frito, metabolizado, servido ¢ devorado na alma, E para um banquete animico que somos convidados desde o antepasto, servido detalhadamente por meio do con- traponco de imagens sustentadas ou sugeridas pelas “frases ‘ou conjunto de frases que 0 pocta diz e que juntas compéem ‘um poema (Octavio Pz). E aqui reside o ponto que gerou desasossego no jantar ao qual me referie que confere @ mar- ca indeével de Gustavo: cle compreendeu que seranalista e+ ser poeta slo vocagbes indssociveise a linguagem, rocada pela poesia, dleixa de ser inguagem comezinha mutilada pelo tempo apressado da prosa utilitria ese rende (ou aesta) dit rmensio mitopoésiea da psique, afinidade menos eletiva que passional pela qual 0 autor deste ensaio afiemacse, definiti- ‘vamente, possuido, As imagens aqui sio-irredutives a arma- dias inexpretativas ou quaisquer explcagbes reducionstas, _mas antes vivid, porque o sentido delas (ow do poema) S30" clas-emsi: Essas imagens aderidas & linguagem apresentam alma e ndo a representam, Portanto, a poética gustaiva deve ser apreciada com vagar, caso contritio detxaremos escapulir suas sutilezas. Evidentemente, 0 texto ancora-se em pressupostos te ricos resultantes de um marcante trabalho de pesquisa: cabe lembrar que pesquisar aqui néo se restringe somente a0 es forgo revisional dos escritos académicos, mas em deicados destaque e atengio a0s ditos ¢ expresses da linguagem co- loquial que acolhe, com relativa inconsciéneia, as imagens alimentares como recurso metaérico para a comunicagio~ c-expressio de suas ideas. Sobre o primeiro caminho argu= :mentativo: a fome ji fora percebida por C.G. Jung, em A nasureza da psique, como-umn dos faroresprimétios que in que se registra, atualmente, é um enorme volume de pu- blicagbes (obviamence importances) que tentam destrinchar ‘oy emaranhados neurofisioligicos € psicopatoldgicos: que io. suporte 298°THanstorn0s-Alimentares, locusao adorada pelos tratdos de saide mental para catalogar as desordens {que derivam da obesidade & anorexia ‘Como um pocma, 0 ensaio O banguete de psigue apre- sentaenos imagens que no se ocupam com tais conceitos. Seguindo sua versficagio live, apreende-se que a gastrono- ria a legslagio do estdmago, implica aaquisigiosnaeleigio ‘ema imposigio do gosto, tema que eangencia os dominios da biologia, da-anetopologia' & da estética, Brillane-Savarin dissertou sobre a fisiologia do gosto; assim como Claude Lé= -sieStraus argucamente percebeu que as metéforas do “cru” © do “cozido” abrigam um vasto campo de possibilidades inter- pretativa sobre a cultura, De forma astua também procedeu (Cimara Caseudo ao historiografar os procesosalimentares no Brasil e mapear a alma brasileira no gosto culinati. Se a imaginagéo dos processs alimentares éandloga 205 processos que delineiam os eaminhos eulturas percorridos entree estade de narurezaea cultura, a boca serv imagen inicialmente clita para as reflexes sobre a alma e «comida. ‘© mundo adentra o corpo pelo engolimento ¢ essa poetics “ddasensagio integra imagens saborosas, amargas, doces, salga~ das, azedas. A dialética engolidor-engolido j fora repistrada nas natracivas mitics, pois os deuses comem e sio comidos. Daboca a0 estémago, atents-s ao figado’eomo imagem das painses vivazes e dos excessos ¢, ids 8 roa, deparamo-nos com uma poética da excrescéncia, quando o intestine € 0 “mus sio imaginados. Sendo a alimentagio arquetipica seus utensfis, ccnicas e temperos denotam ¢ conotam nossos hhumores, nossa fancasias, nossa alma famintae saciada: En~ tre afome eo fastio, as metiforas digestivas slo destacadas de forma insistente a0 longo do texto, pois na alma gistrie ex operam processos alquimicos profundos e presents, por analogia, no trabalho psicoterdpico. Novamente,linguagem « imagem se fundem para provar que linguagenpoética’é* “imagem quando o texto convocao leitor a adentrar em um ‘coxpo-imaginal. E confirma que a psicoterapia-é-wibutétia da Fungo poética da linguagem, quando a retérca digestive ‘convida suas imagens 20 consultério para “digerit, engoir, cengasgar,entala, mastiga,saborear, degustar, assimilas, pro- cessarcozinhar, ruminar, evacuat” nossas belezas, verdades € dores animicas.E nfo somente na psicoterapia,lembra Gus- tavo, mas também no discurso vigiLe na gramétic onttica, Mas a protagonista dest texto & a Fungo poética da lin- gagem, quando o ritmo da prosa que implica uma sustenta- so de conceitos¢transmutado no devi proprio A gramética das imagens, apresentadas em sucesso ou contraposicio. Em tas instigantes momentos, o texto nfo se serve das palavras, mas se rende servo delas, de suas imagens intrnsecas, conv dando-nos a digeri-las em uma temporaldade propria, como uma “ligio de pacigncia’ inerente & alquimia da cozinha. As “experitncias” com o-tempo estio presentes nas entrelinhas do poema em prosa escrito por Gustavo 0 qual, antes de nos oferecer a dogura e a remnura da sobremesa, serve-nos na bandeja 0-coragio. do texto a inexticivel asociacio entre comida, mesa, cozinha e o.arquétipo fraterno, Esta sit, grande dogura, sem pieguices, do poema alquimico por ele criado, Se nas "Notas sobre a fungio fraternal”, inchuida em Voos naees (2006), é-se que oirmao “define, em niveis mais avancados do que aquees do influxo de pai e mie, meu esar no mundo, meu amor pelo mundo” e que o ismio.é imagem ‘que instaura na alma os discursos da diversidade- da seme- Ihanga na diferenga, tlvex em O banguete de psigue cle venha respondido, saborosamente, & indagacio deixada como pro- vocagio naquelas divagagées: “como, de que forma constelar ©-eu faterno? (..] Como liberar os horizontes da alma para aque Finalmente ela se faternize?” Resposta: na sofisticasio poética da mesa ¢ da sobremesa, quando o tempo arqueti- pico do poema ganha a “camadura concreta” do caderno de receitas, livro de poemas em que nossa anima imaginase ‘desmanchada’, “debulhada’, “dessalgada’, “quentinha’, 'machucads’, “separada’, “ita, “temperada’, “enfeitads’ ‘Comparithar -olhar-do irmao'% meso convite feito por Gustavo, pois o poema ser sempre uma obra inacabada se io for vvido (ou comid) pelo eto Bom petite! Victor Palomo Dsus, anal jnguiano pela Socidade Basa de Pinos Arliss, meee dowtrando cm Lee pela Universidad de Sto Paula a | ‘A IMAGINAGAO DA ORALIDADE [Na tradigio da psicologiaarquetpica’, ama e comida jé _ se encontram entrelagadas em niveis muito profundos: fazer ‘comida é um modo de cultivar a alma; cultivar a alma ¢ co- rinhar o cru de nossas experéncias de vida. Foi o humor, lembremos antes de mais nada, que intro- duziu aaproximagao de alma e comida nessa psicologia, com a publicagio, em 1985, do Livro de cozinba do Dr. Freud ® sétia brincadeira escrta por James Hillman ¢ Charles Boer. Ali, a primazia da oralidade sobre a genitaidade, que revere légica freudiana, std tefletida nos discursos que enaleecem, 1A piclogn age ¢ uma sbordage de vee junguian que ded os shor de 1970 dé comindadee apefundamcto a eal deC.G,Jngesz Teva dor Aras Tem come poet «rei d pesca edo pensaren> piecgcos com fos a alin © na imagine, no apenas a ii Seu inal autor origi James Hila (1926201. 2. HILLMAN, J &€ BOER, C. 0 ede coin de Dr. Fado Pal: Pat Te, 1986 ( } i tudo aquilo que vem antes, tudo que é anterior: numa bie- sarquia ontogenética dos apetits,primeiro afore; depois 0 sexo. Ou sea, primeira a mesa, depos a cama, ‘Um vasto campo de imagens imediatamente se abre: 0 livro de cozinha, os programas matutinos de TY, as revistas cspecializadas, as receitas que atravessam geragies€ que cir- cculam de mo em mio meticulosamente anotadas em lin- guagem propria, a curiosidade dos paladares, as técnicas, os termos, os utensilios, os ingredientes, as medidas, as anota- ‘ges, as disputas, os concursos. O jornalismo gastronémico, a critica de gastronomia. O grande banquete € 0 pequeno lanche, © trivial ¢ 0 sofisticado, 0 chefe a velha coui- nheira de familia. O menu. O repasto, a ceia, 0 rega-bofe, 6 farnel de viagem, 0 piquenique. O taro. que éo sabor ovina ioternacional. Hate cuisine, nowelle etn cori= nha molecular, desconsrutivs, corinha recnoemocional, data cuisine (corinha de dados, que investiga como a comida pode ser utilizada como um meio de informagio), cozinha rmodernista (com scus corinheirosaboratristas). Hi-tech, low-tech, industriaiada, arcesanal, casera. As dialéticas do frugal edo. guloso. Os heragramas 5 (‘A Espera [Nu- trigdo]"), 27 (“As Bordas da Boca”), ¢ 50 (“O Caldeirio”) lo Lioro dar Mutageschints, © I Ching. A “tava are”. “décima musa Gastérea, presdindo aos prazeres do gosto. Os Penates, da mitologia romana, deuses do lar, cujo nome ee vem da palava penus, que quer dizer despensa’. A touca da Cocanha, Cocagne, Cuccagnd ~ pals mitico do fol clore medieval onde jorra nas uas ole, © mel ¢ © vinho, ‘onde boliahos chovem do eéu, doce e chocolate nascem na borda das lorestas, comida crescendo como flores”. Fome.e- 5 ‘ ‘ A.sciologia dos simbolos da alimentagio pode dar gar a uma pricologia dos arquétipos da alimentagio. © campo mecaérico entre comida e alma é, de ito, ‘imenso: apetite.¢.inanigio, que traduzem atrasio.¢.repul- “sa, Esse campo permitenos, princpalmente, deslteralizar as to cartegadas questdes da pscossomstica, dos distdrbios dha alimentagio, das psicopatologias do peso © da gravidade, da goedura e da levena, da ingens ¢ da digeriodammasr ‘olla! aycuas mesg case: gula aqui no como um prcida capita mas como um crac cnindasieales E ‘que é mesmo a gula, podemos perguntar, agora num pla- ‘no animico, néo espiritual, ndo moral? A gula sé se tornou 3. Ente os manos€ os ess os ets cava dis provisis eds rmatimentos, poranto ds desenss, dorcel «doe armands 4 ej ssc de comida bebidas Na refer din ea conte oe (coheed, 4. Beng, Cua, Chacona, Jj, Schaafeland, Lalande a a ‘eal io Saat so outs dsgnayies de res mri magi, om exbernca ce comida, bia cseo, cm rai flies dines qe “Bla no pis da Con, CE FRANCO JR, H. Combe vrs ees de wna opi, Sto Pls Arh 1998 S.C. MANGUEL, A. &e GUADALUPI, . Dion de Lago imainti. ‘Sio Pal: Companhia das Leas 2003, ¢ ' \ 26 tum problema de fato com 0s cristios; tomnou-se pecamino- sa, inserida pela tradigio naquela famosa lista dos pecados capitais. Problema com os instintos. Para a Igreja Catélica, a gula é um vicio no qual hé uma busca de prazer “desorde- nado” (Tomds de Aquino), ou seja, nio natural, na comida «ena bebida, 0 que inclu comer excessivamente, comer com ‘0s olhos, comer preocupando-se com gostos requintados e, inclusive, também os vicios do fumo edo Aleool. Mas, para 1a gula, assim como para todos os outros pecados da lista ‘std previsto um ansidoto, Esses antidotos sio referidos como as “sete virtudes opostas", no caso da gula, a. tem= peranga. Esses pecadores, os gulosos, estdo destinados na primeira parte da Divina comédia, Infeeno (Canto VI) de Dante Alighieri, a0 Terceiro Circulo, 0 chamado Lago de Lama, onde jazem imersos numa lama suja e espessa, vigiados, arranhados dilacerados constantemente pelo mi- tico cio Cétbero, 0 de txts cabesas, que os devora as carnes sgordas. Ali cai permanentemente uma tempestade fortssi- ma de granizo, gel e neve sujos. Um horror. ‘Mas a gula pode ser entendida como gluronaria, paixio de que softeram viros ilustres da Histéra e da Imaginasio, da erdnica socal eda fcso: U0, gloutons, goinfes,comi- lees, seres devotados imaginagao alimentar, mestres da vo- racidade, aficionados gastrdlaras que nos ensinam o prazer¢ 6s petigos da quantidade, que nos ensinam o poder que exer- ce sobre a alma a paixio de comer. Uma lisio dos extremos. ome supeslaiva. Uma extraordindtia abertura para o prazer ‘compariveltalver somente da crianga,revelando tancosima_ riquera de fancasia. quanto uma desordem da sensagio. Ea sla de Timlquio e seus convivas na orga gatronémica do Saryricon (a sitira de Pettdnio, século 1), de Apicio (gastréno- mo, autor do De re coguinara,tnico recetuério de cozinha {que sobreviveu e nos faz conhecer a gastronomia do mundo romano), do imperador Vitelio (dos mais volentos impera- ores romanos, devorou 1.200 ostras como hors douvre num banquete), de Jlio César, de Heliogdbalo (0 25° imperador romano, 0 jovem imperador travesti, excéntrico e decaden- te, dado a0s excesss da gula e da usr, personagem cruel que foi tema de um livro de Antonin Areaud, de 1934, He- liogibalo ou o anarquista covoado), de Liiculo (118-56 a.C., conhecido como o gourmer da Roma lisica), de Gargantua. « Pantagruel (os gigantes comilées do romance de Frangois Rabelais, escrito em 1534), de Bartolomeo Sacchi (conhe- cido como Platina, humanista e gastrdnomo renascentista, autor do primeiro tatado de culindria impresso de que se tem noticia, o De-bonesta voluptate et valetudine (Do prax © er correto e da boa satel, de 1474), ou ainda do asstio, ‘Assurbanipal seu festim gastrondmico nove séculos antes de Cristo (10 dias, 69.500 convidados, 10.000 peixes, 1.400 cabrits, 1.000 carneiros, 20.000 jarras de vinho), do inter- rinvel banquete do Figado de Prometeu, de Eva que comeu a magi no Paraiso, de Perséfone que comeu a roma no Mun- do das‘Trevas e, de certa forma, também de Cronos/Saturno, ‘0 devorador arquerpico. 2 At 28 Grnaes Vase a ee a a il Janes de Monte Snes. Chico vans 166 Pio ¢ égua, arroz¢ fifo, pio com manteiga, café com Ieite, café pequeno, manteiga deretda, papas na lingua, ‘spit no praro, morrer pela boca, comer bola, cudo em pra- tos limpos, lete derramado, descascar © abacaxi, marmela- da, reftesco, pepino ~ entre tantas ¢ muitas outras locugbes. -populares e provesbiis.nasfronteira da significagio, tradu- em combinagbes que sio, mais que expresses da idioma, impactos da alma para além do plano linguistico. ¢ da comida podem. nos ajuda a vislumbrare guiar nos sos procesos de cuidado e cultvo da alma? Sonos doces, ‘verdades amargas, realidades salgadas, relagdes apimentadas, siquagSespicantescompem apsicologa da alimentacio an- tes que se instalem os transtornos alimentares propriamente ditos, Caminhamos, talvez mais aqui do que com outros te- ‘nas, uma ténue linha entre a metéfora significativac liber tadora ea concretude literal e aprsionante. ‘Asa, ensopar, defumar; 0 cru, 0 cozido, 0 podre— que sio 0s dois famosos tripés culinétios, ou as lees, da antro- pologia de Claude Lévi-Strauss, apresentados em A origem dos modos & mesa, volume 3 das Mitolgicas, de 1968°. For- nos ¢ fogs, liquidificadores, processadores, panels, facas, colheres, pots, tigelas. Aromas ¢ explosdes,sabores € vene- nos. Miscurar e separar. Aquecer, cortar, destrinchar,ferver, picar, empera. Tado isso ~€ muito mais nesse universo de simbolos ~ encontra lugar em nossos sonhos e fancasias, em ‘08 de ingestio e digestio de nossas experiéncias de vida, de ‘nossa dores de ala, dos eventos de nosss instintos, afetos, e-emogées: tudo aquilo que cozinha dentro de nés, tudo 0 que absorvemos ou que somos impelidos a metabolizar,e {que vai nos nutrindo, ot nos intoxicando, 6 LEVYSSTRAUSS, Corie dos madi me ~ Migs. Vo 3. to Plo: Cons iy 206, . 425-448, “Pguene ado de rollin 2 ¢ ' i ‘Assim & que quero por a mesa desse banquete psiquico interminvel. E 0 fago agora com muito gosto, pois esses ‘nossos apetites apreciam inflamar-se com talheres¢ baixelas de prata, porcelana ricamente desenhada, faianga fina, fi imos copos ¢ tagas de crstaiscoloridos ou transhicidos, toalhas e guardanapos de linho bordado, rendas, brocados, 8 meia-luz de castisais e candelabros de prata ¢ ouro som- breando silhuctas e convivio, conversas e olhares,relagdes € desejos. Servigo & fra say 2 russa, mordomos, maneiras alta etiqueta da mesa, estética de mesa ¢ de sobremesa. Continas avcludadas, lareira, aromas, perfume, incenso. Opuléncia, cores, sabores. Pois na verdade tudo isso, todas cssas imagens ¢ elevagbes, jf nos colocam no rico lugar da fantasia ¢ da alma, da psique ¢ da imaginasao, No entanto, o que tenho para servir, de fato, & apenas ‘um antepasto neste banquete de psique, antepasto para uma ‘eflesio infindvel, anrepasto que nio deixa de sex um clogio Aoralidade. Do sripé cama-mesa-banho, a psicologia profunda tem explorado de modo mais enfatico 0 primeizo eixo, a cama Aqui, decididamente, interessamo-nos pelo segundo, a. ‘mesa ¢ suas vicissitudes, O terceto cixo, @ banho, fcaré para depois [Apesar de Freud, cama e mesa estiveram sempre em eter ra disputs, muitas vezes no empate, com rlagio & sua prefe- réncia, anteioridade ou poder sobre os apeites sonhadores do homem civilizado. Na mistica.da.cama.¢-na mistica da quando no de dor ~ sio essencialmente os mesmos. nto o instinto mais bisico? C.G, Jung nos diz.que 1 fome, como expresso cratic do inatinno de autopreseragio,€ sem dvida um dos foe 1 primétosc mas poderosos de influécia do omportamento; na realidad, a vida ds primi- Groningen frtments pela do que pea senmldade, Newe nivel afomeeolfteo” Aimcga=acxsencia em si (CWS, $237) E James Hillman € forgado a reconhecer que “a crianga surge antes do homem, a lingua surge antes do pénis, a boca surge antes da vulva, filogeneticamente ¢ ontogeneticamen- 1”. Ainda comenta, signficativamente em seu livro sobre ‘0s sonhos, que comida ¢ tio fundamental, mais até que a se- aualidade, a agresio ou 0 aprendizado, que" ‘mpressionante perceber 0 descaso com comida ‘comer na psicologi profunds {7.HILLMAN, J 8 BOER, C. 0 le de sin de De Fra Ss Pa: Per Ten, 1986, p17 4 HILLMAN, J. Qsono eo mundo da os, Peplis: Ves, 203, p.245, ead. Gas Barc] “O sexo", adianta também Cémara Cased, “pode ser adiado, ransferido, sublimado em outras atividades absor- ventes ¢ compensadoras. O'estimago no. E dominador, imperioso, inadidvel”. E lembrx que a necessdade de ali- dla linguagem:figos antes de fon. Mas & claro, esses instintos mesclam-se, ea ampla plasti- cidade de ambos fazem-nos tantas vezes converpir, até mes- mo se confundir, para nfo falar de quando um toma aber- tamente o lugar do outro, em compensagio, Os prazeres da came ~ gula¢ luxiria ~ nfo se distinguem to facilmente, © Michel Maffesolireere-se a uma “sensualidade glucénica””. Esses prazeres, diga-se, compreendidos pela Igrja Catslica ‘como pecados capiais ~ou sea, “aitudes humanas contré- tas as leis divinas” (como foram definidos no final do século VI) ~ sio os kinicos da famosa lista que esto enraizados na corporeidade humana © que, portanto, distinguem-se dos ‘outros que so mais espirituais ou morais: avarcr, ira, inve- jn preguica, soberba (ou vaidade). Ventre sexual e ventre digestive entram inimeras ve- 10s em simbiose prazerosa. De fato, cles se tocam: “Desde Freud sabemos explictamente que a gulodice se encontra ligada & sexualidade, 0 oral sendo o emblema tegressivo |: CAMARA CASCUDO,L Hinde alimeran Bral St Palo: Go ‘sl, 2004, 9.17. 10. MAFFESOLI, M.A sombrt de Dio: cones a une sciloga de ogi Sto Pal: Zack, 205, p. 127 2 ee do sexual”, anota Gilbert Durand em seu liv edlebre As cstrusuras antropoligicas do imagindrio". © wabo digestivo aparece como “o eixo descendente da libido antes da sua fixago sexual”. A fala popular testemunha e denuncia essa aproximagio repetidamente: mais significativa entre todas sas linguas. Até as mais suaves “comer com os olhos”, “ait de boca’ € tantas outras expresses que nem vale a pena rmencionar, nascidas de nossas experiéncias com 0 ato de alimentar-se, tém também, todas, significados nfo alimen- tates, colocando-nos diante de apetites © agdes sexuais, dos mais vulgares 20s mais sofisticados. De qualquer forma, a imaginagio-da oralidade parece ter sido sempre ainda mais fet do. que a imaginacio da sgenitalidade. “A maior tealidade cortesponde em primeiro Iugarao que se come”, Bem mais que a cama, 2 mesa origi- now, por exemplo, diversas ocupagies profssionas, ¢conti- zmua produzindo: 0 cozinheiro comum, 0 chef que cria comanda a cozinha, o engenheiro de alimentos, 0 food designer, 0 nutticionista, 0 masscito, 0 pitisser, 0 restaura- eur, © maitre, o saucer, o barista, o mixologista, 0 gatgon, 0 copeiro ¢ todas as outras ocupagées perifércas que se desti- 1, DURAND, G.At rata enraptgos do imepindri So Pl: Marina ones, 202, p. 117 12 p. 202 AS. BACHELARDY Au or sho. Sip Paul: Martine Fonte, 1998, i & nam direra ou indiretamente & mess, como os apougueiros, 0s verdureiros, os frutcirs, os granjeitos, 0s peiteros, os quitandeiros, os quejeirs, os herbalists. A prépria.comi= ‘mas ambém como remédio, droga, vencno, panaccia diver: so e arte, Sade e doenca, vida e morte, esiveram sempre intimamente ligadas a cla, Tabus; proscrigbes prestige; dietas e regimes, tudo isso vigia constantemente “a mais in- sidiosa, diucurna e permanente” das tentagdes" Contdo, comer, propriamente dito, s6 comesaa ser um ‘mode de culivara alma (ul>making), como quero entrever aqui, quando se obedece ® sux necessidade ritualistica in- einseca, sua neessidadecerimonil: a refeigSo, Ela & central esse context, e para ela converge tudo o que vimos men- cionando. Na reféigio- partthada,-“as criangas aprendem a arte da conversagio e adquirem os habitos que caracterizam Caliente 1 Michael ale: Atlant gies 1518 simbolos « emogies,feixe de mensagens. Como declinio da refeigao casera —feita com o grupo familiar ou com o grupo cde amigos essencialmente como ritual de socabilidade, com seu tempo c intervalos bem marcados—e com aaceleragio do ato de comer no coridiano da casa, do trabalho e das ruas ~0 advento da comida répida, do lanche, do forno de microon- das que aquece o prato de comida de cada um ajustando-o is necessidades da agenda pessoal 0 ritodarefeigo,e mesmo sua ideia, como tantos outros, va-se perdendo.- ke sense 2 ae ABA a civilizagio: repartir, ouvir, ceder a vez, administar diferen- , discutir sem ofender”™. Ela é ato cultural e simblice, E ato psicoldgico: é sou! making, alimento psiquico, feixe de 14. CARNEIRO, H. Comidee cia una hs da aliments, Rip de Jaci: Hever 2003, p19, 15. A praduso de alimentos & at oj pincpal asap da humana: "Aapcukur empees 4196 da ppalsio mundial. mai que qualquer via atv, eocup 40% da die eters do glob. (Cave de um eg doa et sada par produc de plana. proximadamete dot eg former sos para gala) (STANDAGE,. Une hia come de manda io de ani; Zaha, 2010.38), 16 POLLAN, M. Canker una hisérianrral d slimenao. Rio de Jee ro Ines, 2014 p16 ead. Cando Fur) eee Le 3 i redonda ou quadtrada ~ ou retangular, € até oval”. Quando re- onda, ¢integracao circular €concéndia, livre citculago de afe- tos, quando entio no marca dferengas ou hierarquias. Ou rem Angulos de tensio oposigo, Tem ou no cabeceires, chia, autoridades. Tem lugares marcados, rotina de posigbcs, modos ¢ etiqueta de mesa. Ou tem liberdade total de atiudes ~ ‘espontines, sempre posta, receptiva. Mesa-da.comenslidade, —| ‘mesa clo poder. Veste-se de pano,rendas linhos, brdados, 0 plistcos papel. Ouest mua, expondo diretamente sua madei- 12 peda, video, plisico ou frmica. Vetese de festa, veste-se de cotidiano, Na-mesa-celebramos agrupamentos, comuni- “dades ¢ asociagbes: Nola brindamos e selamos eontratos. Mesa de cozinha, mesa de copa, mesa de sala de jantar — que zinha, lugar de aprender intimidades. A eozinha materia ¢ seus mistéros profundos, seus segredos, lugar das transmutagies, da intimidade ativa das operagies. Diferente da intimidade mais protegida dos quartose banheiros, que sio intimidades privadas, do sonho a sé, a cozinha, no nivel da meméria e do deseo, é 0 sonho da convivéncia transforma- dora, Bla iter; Forney éfonte, évaso.Atrai a brincadera, © iso, a fofoca, a invengio, Também o erotismo de misturas « separagbes,€o rigor de formas, exturas e aromas. E abriga |e re de mre pcb) desis ua ruta poi, {im mite! no serio ltr do emo, que clos ee ia quando ne "io" QMONTANAD, M Cid como alt, So alo Sena, 2008, p19), 16 fogo, 0 gesto de aquecer, Covinha lugar de Fogo, fieplic. ‘Dal sua corespondéncia dirta com a lateiray ealdeirso da feiticeina, a panel a estufa, a retortaalquimica, 0 estémago ~ «naturalmente a psique ques, como ela, a cdl transforma. ‘As memérias candentes que se ligam a esse espagoda domestic “scale mais profunda Fazem dele, fazem da cozinha, uma sala de estar dentro de nés. Junto a um fogio de lenha aceso hi conversas muito sinceras, de confissbes desejadas. Avcozinha Mca! Mae Alot ens 1618 ema XA ‘Plumbo habit candid foc opus mle, hoc est COOUE ee 2 A.numa € 0 Gosto A gummi bat de cosinor “iments pare prada fide Josep Nuno Redén A cvznb do pemsent, 207, A faculdade do gosto & um dos mistérios nervosos com que somos equipados. O primeico a enfrentar descrevé-lo dd forma mais sstematica foo franctsJean-Anthelme Bril Jat-Savarin (1755-1826), um dndi que em 1825 escreveu A faiologia do goss, urn trabalho de imaginasdo, nio de extados da matéria _ingerivel 0 cru, 0 cozido, © podre, o assado, 0 ensopado, 0 defumado, 0 tento, 0 fresco, 0 mofido, o queimado, 0 refo- gado, 0 fevido, 0 fito, 0 apurado, 0 reduzido, 0 fermenta- do. Bsses fo estos da animasio. [Antes de falarmos de processos digestivos propriamente ditose seus simbolos, hd sempre uma distingaoa ser feta en- _ ne gastronomia.enutrigio. A nutriglo, como ato fisiol6gico, ‘em.a.ver com alimentagio € side’ (‘a sade ¢ o objetivo lembra-nos Michel Onfray"). Agastrono- informagio, com beleza, com estética, histéria, imaginagio. Eculeurs, Com ela, estamos no pals da anima. Pois bem: a 35. Mais vbr humors shores tempermentor no cap 8, aden “Tepe for eremperimen $4 ONERAY, M, Oven dil Ri Jiro: Rao, 1990p. 27,

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