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Resumo:
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Professor do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas (UFBA). Doutor em
Ciências da Comunicação (UNISINOS).
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Diante disso, os jovens, pela familiaridade e domínio das novas tecnologias, talvez
sejam o segmento que mais vivencie essas transformações diante das grandes coorporações
multi e transnacionais. Hoje, um pequeno número de empresas de entretenimento controla
uma parte substancial do mercado de bens culturais e, além disso, monopoliza praticamente
todas as instâncias de produção, já que esse domínio envolve o percurso que vai desde a
feitura dos produtos até os aparelhos que permitem a sua reprodução e consumo. Nesse
cenário, noções como espaço nacional, cultura popular e/ou local parecem deslocadas. Não
que elas não façam mais sentido e, sim, porque elas precisam de ser repensadas diante de um
cenário que envolve outras formas de produção e consumo das mídias. Por outro lado,
configurações midiáticas cracterísticas, que incluem consumo segmentado e formas
diferenciadas de apreensão desses fenômenos na urbe, permitem que uma parcela significativa
da juventude valorize determinados processos midiáticos em detrimento de consumos não-
especializados.
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nos discursos, sejam as de sua geração ou as que dão conta de seus efeitos” (VERÓN, 1996,
p.127.).
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Abordar os movimentos juvenis contemporãneos a partir de seus dispositivos
midiáticos permite entender esses fenômenos como processos partilhados de maneira global
através de lançamentos mundiais de discos, vídeos, sites, enfim, através das atividades
midiáticas de caráter global. Esses aspectos são filtrados pelas revistas, distribuidoras,
apropriações das entrevistas e críticas presentes nos veículos nacionais. Nas apropriações
locais estão envolvidos os locais de show, a tensão com as realidades regionais, a
diferenciação entre grandes cadeias de distribuição e lojas especializadas, enfim, as
especificidades produzidas nos encontros dos aspectos globais com os modos de consumo e
produção regionais.
Diante desse cenário, parece adequado pensar a configuração midiática dos grupos
juvenis a partir de uma proposição metodológica que permita reconhecer as diferenças e as
similaridades que envolvem os aspectos globais e locais desses grupos. Assim, os conceitos
de comunidade de sentido e grupamento urbano, são aqui apresentados como hipóteses de
trabalho que possibilitam a análise das condições de produção e reconhecimento desses
fenômenos da cultura juvenil.
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Isso não significa que os membros dessas comunidades perderam seus traços locais e, sim,
que os patamares, em que as comunicações entre seus membros se estabelecem, são aquelas
que resumem os traços comuns a toda comunidades em nível globais. Por isso, é possível
falar em comunidades de roqueiros, grafiteiros, skatistas, etc, situadas para além de suas
localizações geográficas específicas. Ao falar particularmente das comunidades de roqueiros,
Grossberg afirma que:
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princípio de formação dos sentidos e/ou a escolha de diferentes objetos culturais em relação a
um sentido idêntico, mas amorfo.
Isso porque, apesar das especificidades das apreensões locais: (1) há configurações de
sentidos e objetos culturais que são reconhecidos de maneira desterritorializada e que
caracterizam, de maneira diferencial, as comunidades de sentido. (2) esses objetos ligam-se a
redes midiáticas específicas, fundadas em processos de circulação característicos, forjando
projeções e partilhas de sentidos diferenciados.
Mas algumas ressalvas devem ser feitas para evitar qualquer acusação de romantismo
ou ingenuidade no trato com esses fenômenos. Nessa direção, acredita-se que: (1) a
especificidade dessas comunidades está marcada pela sua própria normatização, que
estabelece regras de práticas sociais e discursivas nos entrecruzamentos entre produtores e
receptores; (2) os espaços das comunidades, dessa forma, também operam cerceamentos,
opressões simbólicas e codificações. São eles que permitem o reconhecimento entre os pares,
mas que indicam o outro, o ‘estranho’ como ‘indesejado’, (3) os aspectos locais continuam
sendo importantes quando da apropriação dos objetos culturais pelos membros das
comunidades; daí a valorização do território urbano, local de manifestação última das
produções de sentido.
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veiculados mundialmente. Esse não é um caminho linear; ao fazer circular os sentidos, os
indivíduos operam uma retroalimentação dos estilos que fundam a comunidade. Isso se dá não
só através das desigualdades entre as condições de produção e de reconhecimento dos
produtos veiculados pelas Comunidades dee Sentido, como também através das respostas
locais que envolvem a produção de objetos culturais específicos, a partir de valores que
permitem negociações localizadas entre sentidos mundializados e questões paroquiais.
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2) Espaço mercadológico e tempo dos objetos culturais:
Os traços configuradores das práticas culturais são moldados tanto pelo modo como os
lugares são transformados em espaços mercadológicos quanto pela lógica social dos objetos
culturais. Na análise desses objetos, é crucial perceber os percursos organizadores dessa
circulação enquanto práticas culturais. De acordo com as negociações locais, as cenas podem
experimentar, de maneiras diferenciadas, certas temporalidades que envolvem canonizações
específicas de alguns objetos e valores diversos, no que concerne ao que é novidade, ao que é
considerado ‘moeda corrente’ e ao que é proposto como ‘eterno’. É preciso, pois, considerar
uma ‘lógica da passagem do tempo’. As mercadorias culturais podem passar por um número
de mercados distintos e populações ao longo de seu ciclo de vida. Através dessa passagem, as
marcas dessas distinções e as bases de seu valor podem sofrer mudanças significativas.
3) Disputas de prestígio:
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Assim, a interdefinição entre Comunidades e Grupamentos perpassa essas
apropriações culturais através dos processos de territorialização e desterritorialização. A
tensão entre a perda das referências em relação aos aspectos tradicionais e a configuração de
novas teias culturais gera uma gama de possibilidades na articulação entre a urbe e o processo
de globalização. Apesar de, aparentemente efêmeras, as teias atuais possuem uma abrangência
infinitamente maior do que as antigas configurações culturais.
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“ Cada juízo de valor, enquanto consiste num gesto de atribuição,
contempla também um aspecto ‘polêmico’, ou seja, a rejeição da
ou das atribuições concorrentes. Que se trata de atribuição de
valores é testemunhado pelo próprio termo ‘valor’ que é
necessariamente categorial, isto é, manifestação de uma
polaridade, de uma diferença” (CALABRESE, 1988, p.35).
O estilo pode ser reconhecido pela rede de conexões que se estabelece entre diversos
objetos culturais; tem um caráter sintático, é da ordem da combinação. O tempo e o espaço
dos estilos não se referem a uma cronologia ou cartografia tradicionais e, sim, a uma
cronologia e a uma cartografia do gosto e, conseqüentemente, a valores subjacentes aos
processos de produção de sentido.
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No âmbito da semiótica da comunicação, o que interessa são as configurações dos
sentidos no tempo e no espaço de suas manifestações materiais, isto é, as formas como os
valores e gostos são conformados pelas Comunidades de Sentido e pelos Grupamentos
Urbanos.
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estruturam o espaço de nossos investimentos afetivos no mundo” (GROSSBERG, 1997,
p.31).
Esta correlação entre as paixões e o ritmo musical feita por Fabbri possibilita
pressupor que as produções de sentido das Comunidades de Sentido e dos Grupamentos
Urbanos estão envoltas por investimentos afetivos que as perpassam: assim é o próprio ritmo
que acaba conferindo a tonalidade de tais investimentos que estão diretamente relacionados
aos ritmos corporais: “A paixão origina, por exemplo, trocas de estados físicos do corpo. A
vaidade tem uma certa cor, existe uma amargura, paixões doces, e assim sucessivamente”
(FABBRI, 2000, p.68.). Os investimentos afetivos manifestam-se assim, em certas
configurações corporais e concatenações temporais, ou seja, por meio de certos ritmos.
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Uma vez que os tipos de agrupamentos a serem analisados se caracterizam pela
interdefinição entre mundialização e suas apreensões locais, é possível pensar em uma gama
de relações que envolvem desde a cidade em seu sentido literal, físico, até a cidade imaginária
ou virtual, agregadora de indivíduos situados em diferentes pontos do globo, mas que
partilham um mesmo espaço, ainda que, até mesmo os processos culturais globais precisem
da referência última do concreto urbano.
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