O trabalho discute a inovação criativa da escrita queirosiana relacionada ao espaço, à
ambientação e à narração, realizada por meio de uma fina ironia, que tem como ponto fulcral uma temática recorrente na produção do autor: a oposição entre homem e natureza. Para tanto, a análise está centrada nos contos “O tesouro” e “Frei Genebro”, que constituem exemplos da opção pela tradição literária, mas de modo inovador, sutil, em que os elementos espaciais vão funcionar como indícios da ironia presente propondo um novo sentido para as narrativas e transformando-as em contos modernos. Diferentemente da forma de circunscrição espacial realizada comumente por meio de descrições diretas e detalhadas, Eça de Queirós lança mão a outra forma de composição do cenário narrativo por meio do uso de uma adjetivação sintética e sugestiva altamente poética. Em “O tesouro”, por exemplo, parte da comparação entre o espaço e seus elementos para discorrer sobre os personagens e sua caracterização de forma a opor a beleza do cenário aos caracteres pessoais de cada um. De modo semelhante, no conto “Frei Genebro”, muitos elementos não estão expressos de modo explícito, mas sujeitos a uma leitura crítica instigada pela arquitetura narrativa. A reflexão apreciativa nessa narrativa, após a surpresa do final inesperado, é resultante do amálgama entre o desenvolvimento da ação, a apresentação do cenário construído por linguagem altamente significativa e a voz narrativa sutilmente atenuada pelo discurso indireto livre. Nas duas narrativas analisadas, essa arquitetura funciona como arcabouço de sustentação do sentido implícito presente. Abreviado ao essencial, ao contrário de um cenário postiço, tal recurso semanticamente intensificado funciona como uma impressão, um sentido encoberto instaurado pela voz narrativa de maneira sutil, ora próxima e pautada em recursos da oralidade, ora mais distante e implícita favorecida pelo discurso indireto livre. Consideramos, pois, que nessa organização narrativa, o espaço, a tradição e o foco narrativo, analisados segundo a perspectiva de Barthes (2011), Bakhtin (2003), Duarte (2006). Brait (2008) e Guerra Da Cal (1969), são recursos que auxiliam o leitor a perceber as contradições presentes, indiciando o sentido proposto pela crítica irônica.
Palavras-chave: Eça de Queirós, Conto, Ironia, Espaço, Tradição literária.