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- 2016 -
FCT-UNL – Tópicos sobre Equações Diferenciais Ordinárias – 2019/20 2
Conteúdo
3
CONTEÚDO
5
1.1. MODELOS COM EQUAÇÕES DIFERENCIAIS
P ′ = (n − m)P.
Esta equação é conhecida como a lei de Malthus, considera-se que a variação da população
é proporcional ao tamanho da população, em cada instante. Note-se que se n > m então
P ′ > 0 logo a população cresce e se n < m então P ′ < 0 logo a população decresce.
Q′ = −kQ(t)
onde k é uma constante positiva que depende do elemento. Por exemplo, para o carbono-
14 o valor aproximado de k é 1, 244 × 10−4 e para o rádio o valor aproximado de k é
1, 4 × 10−11 .
Comum a todos estes exemplos é o facto da taxa de crescimento (decaimento) ser propor-
cional à quantidade existente. Todos eles podem ser descritos pela EDO
x′ = kx, k ∈ R. (1.1)
onde C é uma constante arbitrária, são solução da EDO (1.1) uma vez que substituindo
na equação diferencial obtemos uma proposição verdadeira. E que
x(t) = x0 ek(t−t0 )
é solução de (1.2), uma vez que, para além de ser solução da equação diferencial, verifica
ainda a condição x(t0 ) = x0 .
Quando a taxa de crescimento é positiva (k > 0), x(t) cresce exponencialmente e quando
k < 0, x(t) decai exponencialmente e quando k = 0, x(t) é constante. A figura 1.6 ilustra
as três possibilidades.
Figura 1.1: Soluções particulares de (1.2) para k positivo (linha tracejada), negativo (linha
contı́nua) e nulo (linha pontilhada).
x′ = px(b0 − bx).
Note que o segundo membro é uma parábola (na variável x) com a concavidade voltada
para baixo, que tem dois zeros em x = 0 e x = b0 /b. Então, x′ > 0 para 0 < x < b0 /b, a
população cresce; e x′ < 0 para x > b0 /b, a população decresce. A constante K = b0 /b é
chamada a capacidade de suporte da população. Podemos reescrever a equação da seguinte
forma mais usual
x
x′ = rx 1 − . (1.3)
K
onde r = pb0 . Este modelo é conhecido como modelo de crescimento logı́stico. A solução
geral é da forma
CKert
x(t) = , (1.4)
1 + Cert
com C uma constante arbitrária. A solução do problema associado à condição inicial
x(0) = x0 é da forma
Kx0 ert
x(t) = . (1.5)
K + x0 (ert − 1)
Na figura 1.2 estão representadas duas soluções particulares para o caso r = 1, K = 10 e
x0 = 1 (linha contı́nua) e x0 = 19 (linha tracejada).
No caso x0 < K a população é crescente e para x0 > K a solução é decrescente. Em
ambos os casos, aproxima-se assiptoticamente da capacidade de suporte da população K.
Na figura 1.3 é apresentado o resultado de experiências levada a cabo por G.F. Gause,
em 1934 sobre o crescimento de populações de organismos unicelulares. Note que estas
populações exibem comportamento semelhante ao crescimento logı́stico que acabámos de
descrever (com x(0) < k).
No próximo exemplo vemos que as mesmas equações também servem para modelar um
problema totalmente diferente.
Figura 1.3: Experiências de G.F. Gause, em 1934, envolvendo duas população de orga-
nismos unicelulares (Paramecium caudatum e Paramecium aurelia), que mostram cresci-
mento logı́stico.
uma das classes será denotado por S = S(t) e I = I(t). Vamos considerar que o número
total de indivı́duos não se altera ao longo do tempo e é dado por N = S(t) + I(t). O
número de novos infeciosos num intervalo de tempo [t, t + ∆t] é o número de indivı́duos
infeciosos no instante inicial do intervalo, I(t), multiplicado pelos contactos que em média
um indivı́duo tem nesse intervalo de tempo, c∆t, vezes a probabilidade desse contacto ser
com um indivı́duo suscetı́vel S(t)/N = (N − I(t))/N. Obtemos,
N − I(t)
I(t + ∆t) = I(t) + c∆tI(t)
I no final I no inı́cio N
novos infeciosos
Observação 1 Este modelo prevê que, no limite t → +∞, toda da população estará
infetada. Esta conclusão não é razoável, mesmo para doenças com transmissão muito alta.
Relembre-se que este modelo é apenas indicado quando se consideram curtos perı́odos de
tempo, durante os quais é razoável considerar que os indivı́duos se mantém transmissı́veis
sem consequências para os próprios. Em alternativa, em vez de uma doença podemos
pensar num caso de colonização, sem consequências negativas para o hospedeiro.
Exercı́cios 1
Exemplo 6 (Migração)
Um fenómeno comum quando se considera o crescimento de uma população é o contributo
dos movimentos de migração da população. Vamos alterar o modelo de crescimento
exponencial de forma a incluir a entrada e saı́da de indivı́duos com taxas constantes i, e,
respetivamente. Desta forma, obtém-se
x′ = kx − e + i. (1.6)
T ′ = −k(T − Ts ),
onde k é uma constante positiva determinada pela condições fı́sicas da troca de calor. A
solução geral desta EDO é
T (t) = ce−kt + Ts .
100
80
60
T(t)
40
20
0
0 5 10 15
t
A figura 1.4 mostra uma solução particular. Note que quando t tende para infinito o
primeiro termo de e−kt tende para zero, pelo que a temperatura se aproxima assimptoti-
camente de Ts .
Exercı́cios 2
2. Verifique que os modelos dos Exemplos 6 e 7, podem ser escritos na forma x′ = ax+b,
com a e b parâmetros reais.
Exercı́cio 3
Faça corresponder as equações aos problemas descritos (mais do que uma equação pode
coincidir com uma descrição, e vice-versa).
Os problemas:
3. A taxa de reprodução de uma determinada espécie de peixes está sujeita aos limi-
tes impostos pela capacidade do ambiente e da população. A população pode ser
reduzida pela pesca que decorre a uma taxa constante.
′
x
(e4) x = kx 1 − ; (e10) x′ = −k(x − K) + c;
K
x
(e5) x′ = kx 1 − + c; (e11) x′ = −k(x − K) − c;
K
x
(e6) x′ = kx 1 − − c; (e12) x′ = −k(x − K);
K
FCT-UNL – Tópicos sobre Equações Diferenciais Ordinárias – 2019/20 15
1.2. CONCEITOS BASE
(e14) x′ = kx + c;
Uma equação onde a incógnita é uma função e que relaciona os valores da função com os
das suas derivadas e da variável independente denomina-se equação diferencial.
Definição 1 Uma igualdade do tipo F (t, x, x′ , x′′ , . . . , x(n) ) = 0 onde F é uma função que
depende de uma variável independente t, real, x = x(t) é uma variável real dependente
de t e x′ , x′′ , . . . , x(n) são as derivadas de x em ordem a t denomina-se equação diferencial
ordinária de ordem n ou, mais simplesmente, EDO de ordem n.
Exemplos 8
1. A equação
y ′ = y − t2 (1.7)
Esta equação diferencial é de primeira ordem pois a derivada de ordem mais elevada
que nela está envolvida é a primeira.
Definição 2 Uma solução particular de uma EDO num intervalo I ⊂ R é uma função
x = x(t) que satisfaça a equação nesse intervalo I, ou seja, uma função x com derivadas
x′ , x′′ , . . . , x(n) que transformam a equação numa proposição verdadeira, qualquer que seja
o valor de t ∈ I.
Na equação (1.7) y ′ está relacionada com um ponto (t, y), o que permite associar a cada
ponto (t, y) o declive y ′ = y − t2 .
Definição 3 Uma representação geométrica que a cada ponto do plano (t, y) associa o
declive y ′ calculado a partir de uma equação diferencial denomina-se campo de direções.
-1
-2 -1 0 1
No campo 1.5 estão representados diversos declives, por exemplo no ponto (1, 0) está
representado o declive y ′ = 0 − 12 = −1.
ao declive representado. Uma dessas curvas está representada na figura1.5. Se essa curva
tiver equação y = f (t) teremos y ′ = f ′ (t), com f ′ (t) igual ao declive representado no ponto
(t, y). O valor desse declive é y − t2 = f (t) − t2 , ou seja, concluı́mos que f ′ (t) = f (t) − t2
e que a curva é o gráfico de uma função solução da equação. Repare que poderiam ser
traçadas outras curvas, correspondentes a outras soluções. Estas curvas denominam-se
curvas integrais e cada uma é o gráfico de uma solução particular.
Definição 4 Uma expressão que contenha todas as soluções particulares como casos par-
ticulares designa-se por solução geral.
Exercı́cios 4
(a) y(1) = 2,
Exercı́cio 5
1. Verifique que T (t) = c e−kt +Ts é solução da equação para qualquer c ∈ R e que
T = Ts é uma solução particular da equação.
3. Suponha que a temperatura ambiente não era constante mas sim periódica da
forma Ts (t) = a cos(bt) + d. Justifique que a solução geral não é da forma T (t) =
c e−kt +Ts (t).
x′ = kx. Outra forma equivalente de descrever este modelo utiliza a noção de crescimento
especı́fico, o quociente de x′ por x, que indica o crescimento relativamente à quantidade
em causa. No modelo de crescimento exponencial o crescimento especı́fico é constante.
Obtém-se assim a equação diferencial ordinária
x′
= k, x > 0, (1.8)
x
com k > 0 parâmetro constante. Esta equação é equivalente à anterior para todos os
valores de x não nulos.
Mais geralmente, podemos assumir que k não é constante ao longo do tempo podendo,
por exemplo, ser influenciado pelas estações do ano. Nesse caso o modelo que traduz o
crescimento da população pode ser escrito como
x′ (t)
= k(t) (1.9)
x(t)
y(t) = C eK(t) ,
processo de resolução padrão, permitindo obter a solução geral desde que se consigam
efetuar as primitivas que surgem na resolução. Esta classe assume por isso especial re-
levância, tornando-se importante reconhecer que uma dada equação é de facto de variáveis
separáveis.
Ilustramos a definição com alguns exemplos de equações que pertencem ou não a esta
classe.
Exemplos 11
x′
1. A equação x
= r(t)(1 − x/K) é de variáveis separáveis, pois pode ser escrita na
x′
forma x(1− K
= r(t).
x
)
Exercı́cios 6
1. Para cada um dos modelos seguintes justifique que as equações apresentadas são de
variáveis separáveis
3. Indique condições sobre as funções p e q para que a equação x′ + p(t)x = q(t) seja
de variáveis separáveis.
(a) x′ t = tx;
x
(b) t
+ x′ = 0;
Exercı́cio 7
Considere a equação do modelo exponencial x′ = kx, com k um parâmetro real constante.
2. Verifique que x(t) = ek(t−t0 ) também é uma solução de x′ = kx, qualquer que seja
t0 ∈ R. Qual a relação entre as soluções desta forma e as da forma x(t) = C ekt ?
2. Primitivamos f (x(t))x′ (t) e g(t), obtendo F e G tais que F ′ (x(t)) = f (x(t))x′ (t) e
G′ (t) = g(t);
x(t) = F −1 (G(t) + c) ,
c constante arbitrária.
Se não for possı́vel inverter F , não realizamos o passo 4. A expressão F (x(t)) = G(t) + c,
apesar de não definir x explicitamente, oferece uma condição que o definem (dizemos
que define x implicitamente). Por vezes será possı́vel obter a expressão explı́cita apenas
restringindo o domı́nio onde a solução é válida.
1
x
x′ = r
x 1− K
reconhecendo-se que é de variáveis separáveis pois está na forma f (x)x′ = g(t), com
1
f (x) = x(1− K
e g(t) = r (repare que em f não figura nem x′ nem t e em g não
x
)
figura nem x nem x).
′
1 1 1
2. Como f é uma função racional, primitiva-se fazendo x(1− K
= + . Obtemos
x
) x K−x
x′ (t) x′ (t) x(t)
F (x(t)) = P + = ln(x(t)) − ln(K − x(t)) = ln
x(t) K − x(t) K − x(t)
x
3. Obtemos a equação equivalente ln K−x
= rt + c, c constante arbitrária.
Aplicamos a exponencial
x
= C ert
K −x
tomando C = ec constante arbitrária positiva. Resolvendo em ordem a x ficará
KC ert
x= , C constante arbitrária positiva
1 + C ert
Apresentamos também exemplos em que não se consegue obter uma expressão explı́cita
para F ou em que para o conseguir se têm que colocar restrições ao domı́nio.
Exemplo 13
1. A equação 2xx′ = cos t resolve-se obtendo x2 = sin t + c. Esta equação pode ser
√
resolvida em ordem a x obtendo x(t) = sin t + c mas estaremos a obrigar a função
de estado x a ser não negativa.
Exercı́cios 8
dv v
(a) dt
= k 2−v , (0 < v < 2) com a condição inicial v = 1 em t = 0,
dy
m
(b) dx
= k 1 − y−1 K
, (k, K > 0) para m = 1, 2, 3 com a condição inicial y = 1
em x = 0.
2. Resolva as equações
(b) y ′ = ay 2 ,
(c) du/dt = u2 t,
3. Entre 1879 e 1881 foram introduzidos 435 robalo-muge na Baı́a de São Francisco,
oriundos do Oceano Atlântico. Em 1899 a rede comercial capturava 559733 kg de
robalos-muge na mesma baı́a. Assuma que o peso médio de um robalo-muge é 500 g
e que a captura corresponde a um décimo da população total. O crescimento da
população foi tão rápido que é razoável considerá-lo exponencial e modelá-lo com a
equação dN/dt = λN, onde N = N(t) é o número de robalos-muge em função do
tempo. Estime λ por defeito.
4. Resolva as equações
(c) dv/dt = v 2 − 9,
Exemplo 14
No Exemplo 6 obtivemos a equação (1.6)
x′ = kx + e − i
Esta é uma equação diferencial linear de primeira ordem como podemos ver pela definição
seguinte.
Repare que há equações diferenciais lineares de primeira ordem que são equações de
variáveis separáveis e que há equações de variáveis separáveis que não são equações lineares
de primeira ordem.
Exemplos 15
Exemplo 16
Adaptando o Exemplo 6, a equação
pode ser o modelo para a evolução de uma população, N(t), com fertilidade e migração
não constantes. Assumimos que λ(t) = sin t descreve sazonalidade na fertilidade e m(t) =
2t e− cos t descreve uma migração tendencialmente crescente ao longo do tempo mas com
algumas oscilações sazonais.
Podemos reescrever a equação como N ′ − sin tN = 2t e− cos t e multiplicar o primeiro
membro por eP (− sin t) = ecos t , obtendo ecos t N ′ − ecos t sin tN = 2t. Esta multiplicação
′ ′
4. Como eP (t) x = eP (t) x′ + p(t) eP (t) x escreve-se a equação na forma eP (t) x =
′
P eP (t) q(t) concluindo-se que eP (t) x = P eP (t) q(t) + c, c constante arbitrária;
5. Resolve-se em ordem a x, obtendo a solução geral x(t) = x = e−P (t) P eP (t) q(t) +
Exercı́cios 9
−2t
(c) p(t) = 1+t2
, q(t) = 3.
(a) xy ′ + y = x2 , y(1) = 0,
(b) y ′ + √y = x2 , y(x0 ) = y0 ,
x
Pretende-se encontrar valores aproximados da solução x(t) em certos pontos num certo
intervalo [a, b]. Primeiro vamos escolher n + 1 pontos nesse intervalo: a = t0 , t1 , . . . , tn = b
b−a
igualmente espaçados i.e ti+1 − ti = h para todo i = 0, . . . , n − 1 (basta escolher h = n
).
Ao conjunto de pontos {t0 , . . . , tn } dá-se o nome de malha e a h dá-se o nome de passo,
no sentido em que tj+1 = tj + h = t0 + (j + 1)h com i = 0, . . . , n − 1.
Vamos supor que a solução x(t) tem derivadas contı́nuas até à segunda ordem no intervalo
[a, b]. Então, usando a fórmula de Taylor de x(t) no ponto t0 de ordem 2, obtemos
(t − t0 )2
x(t) = x(t0 ) + x′ (t0 )(t − t0 ) + x′′ (c)
2
2
com c ∈]t0 , t[. Então, x(t) = x(t0 ) + f (t0 , x(t0 ))(t − t0 ) + x′′ (c) (t−t20 ) . Sabemos que o resto
(t − t0 )2 R1
de Lagrange de ordem 1, R1 = x′′ (c) , verifica lim = 0 i.e é pequeno desde
2 t→t0 t − t0
que t esteja perto de t0 . Podemos então dizer que, para h suficientemente pequeno
Repetindo o processo para os restantes pontos da malha, obtemos uma sucessão (xn )
definida por recorrência
x0 = x(t0 )
x
i+1 = xi + f (ti , xi )h, i = 0, . . . n − 1.
x′ = xt, x(0) = 1.
Vamos usar o método de Euler no intervalo [0, 1] com h = 0.2. Então, tem-se
x = x(t ) = 1
0 0
x
i+1 = xi + ti xi 0.2, i = 0, . . . 4
Na figura podemos ver a solução analı́tica e as aproximações obtidas pelas duas sucessões,
no intervalo [0, 1].
1.8
1.7
1.6
1.5
1.4
1.3
1.2
1.1
1
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1
Repare-se que neste processo existem duas aproximações e consequentemente temos dois
tipos de erros associados a essas aproximações em cada iterada: o erro associado ao resto
de Lagrange e o erro por usarmos xi como valor aproximado de x(ti ), obtido na iterada
anterior (só não existe na primeira). Como consequência, quanto menor for o passo melhor
será a aproximação e quanto mais longe estivermos do ponto referente à condição inicial,
maior é o erro, pela acumulação dos erros nas várias iteradas. Este método é pouco
utilizado pois para passos grandes o erro é grande e para passo pequeno o método tem
um grande custo computacional. Existem outros métodos mais eficientes para a resolução
de EDO como o método de Runge-Kutta.
Exercı́cios 10
x′ = t − x + 2, x(0) = 2.
Escreva a sucessão dada pelo método de Euler no intervalo [0, 1] com h = 0.1.
Determine as 3 primeiras iteradas.
t
x′ = te−x + , x(0) = 0.
1 + t2
Escreva a sucessão dada pelo método de Euler no intervalo [0, 2] usando uma malha
com 9 pontos. Determine as 2 primeiras iteradas.
Muitos modelos envolvem a interação entre duas ou mais quantidades que influenciam
mutuamente a sua evolução. Podem ser interações de animais ou plantas, nomeadamente
uma espécie de árvores que reduz a luz incidente sobre uma outra espécie de planta; uma
espécie que providencia abrigo para as outras espécies; polinização de uma espécie de
planta que é realizada por uma espécie animal; solo que é envenenado por uma espécie,
inibindo assim o crescimento de uma certa planta.
Nestes casos, temos duas funções incógnitas e em vez de apenas uma equação diferencial
vamos obter um sistema de equações diferenciais.
35
2.1. MODELOS COM EDO DE 2ª ORDEM E SISTEMAS DE EDO
tempo. Neste exemplo, vamos considerar que a primeira espécie é uma fonte de alimento
para a segunda espécie. Esta relação pode ser descrita pelo seguinte sistema de equações:
N ′ = aN − bN
1 1 2
, (2.1)
N ′ = cN + dN
2 1 2
onde a, c > 0 representam a taxa de crescimento de cada uma das populações e b > 0
a taxa de mortalidade por predação da segunda espécie e d > 0 a contribuição dessa
predação para o crescimento da segunda espécie.
Podem ser considerados outro tipo de interações a partir de relações bióticas entre duas
espécies, sejam elas de cooperação, comensalismo, exploração ou competição. Importa
considerar por um lado a dinâmica de cada uma das espécies e por outro a forma como a
presença de cada uma influencia a outra. A figura 2.1 apresenta um esquema das relações
existentes num sistema de interação entre duas espécies.
N1 N2
c b
a d
N1′ N2′
Figura 2.1: Interação entre duas espécies. O esquema representa a influência que cada
espécie pode ter sobre si mesma e sobre a outra.
Em geral, estes modelos podem ser descritos pelo seguinte sistema de equações diferenciais
ordinárias:
N ′ = aN + bN
1 1 2
a, b, c, d ∈ R. (2.2)
N ′ = cN + dN ,
2 1 2
Repare que as soluções do sistema serão as soluções desta equação de segunda ordem.
Exercı́cios 11
1. Para cada uma das relações bióticas seguintes indique qual o sinal que os parâmetros
b e d devem ter no sistema (2.2).
(c) Competição;
2. Considere o sistema
N′ = N − 1N
1 1 2 2
N ′ = 2N + 3N ,
2 1 2
(b) Deduza a equação diferencial de segunda ordem que é equivalente a este sis-
tema.
Mais geralmente, podemos considerar um sistema para n espécies que se relacionam entre
si. Podemos escrever esse sistema na forma matricial
X ′ = AX,
onde X = (x1 (t), . . . , xn (t)) é um vetor cujas componentes são as funções de estado,
X ′ = (x′1 (t), . . . , x′n (t)) é o vetor obtido pela derivação componente a componente de X
e A é uma matriz quadrada de ordem n. Estes sistemas designam-se por sistemas de n
equações lineares de primeira ordem.
Estes sistemas também podem ser designados por sistemas lineares de EDO de ordem n
pois, como exemplificámos na discussão seguinte ao Exemplo 18 no caso de ordem 2, um
sistema de n equações lineares de primeira ordem é equivalente a uma equação diferencial
ordinária de ordem n. Para além disso, o processo de transformação pode ser feito no
sentido inverso e a partir de uma equação diferencial de ordem n obter um sistema de n
equações. Por exemplo, a partir de uma equação diferencial ordinária de segunda ordem
da forma x′′ = ax, a parâmetro real, introduzimos uma nova função de estado y = x′ (que
pode ser interpretada como velocidade). Como y ′ = x′′ obtém-se
x′ = y
y ′ = ax,
Exercı́cio 12
1. Escreva o sistema
N ′ = N1 + 2N2 − N3
1
N2′ = 2N1 + 5N2
N′ = −N3 + 32 N2 ,
3
Figura 2.2: Oscilador linear, constituı́do por uma massa suspensa por uma mola e sujeita
à gravidade. A massa mover-se-á sempre que a força exercida pela mola e a força da
gravidade não se anularem mutuamente.
A figura 2.2 representa um corpo em pendurado do teto por uma mola e sujeito à força
da gravidade. Quando o corpo for colocado fora do ponto de repouso ele vai oscilar na
vertical. Como descrever essa oscilação?
Definamos x = x(t) como a posição do corpo ao longo do tempo t, medida num eixo
vertical e direcionado para baixo. O valor x = 0 desse eixo corresponde à posição em
repouso do corpo. Nessa posição a força elástica da mola é cancelada pelo peso do corpo,
sendo a força resultante F nula, daı́ o corpo estar em repouso.
Se x < 0, o corpo está acima da posição de repouso, a força elástica é inferior ao peso e
o corpo sofre uma força F = F (x) para baixo, ou seja, positiva. Se x > 0, o corpo está
abaixo da posição de repouso, a força elástica é superior ao peso e o corpo sofre uma força
para cima, ou seja, negativa. Conclui-se que F (x) tem sinal contrário a x.
Para pequenas deslocações de x em relação ao equilı́brio é um facto experimental que F
é diretamente proporcional a x, ou seja
Das equações (2.3) e (2.4) obtemos mx′′ = −kx que escrevemos como
mx′′ + kx = 0. (2.5)
Exemplo 20 (SIR) Vamos agora estudar o modelo clássico SIR com dinâmica vitais
(nascimentos e mortes). Considerando uma certa doença infeciosa, pretende-se estudar a
evolução do número de infeciosos numa população ao longo do tempo. Relativamente a
esta doença, os indivı́duos podem ser classificados como suscetı́veis, infecciosos ou recu-
perados com imunidade. O número de indivı́duos num instante de tempo t em cada uma
das classes será denotado por S = S(t), I = I(t) e R(t). Considere que os indivı́duos
nascem suscetı́veis, a uma taxa bN proporcional à população existente e que morrem à
bN cI NS aI
S I R
bS bI bR
mesma taxa independentemente do seu estado. Desta forma a população total mantém-se
constante ao longo do tempo. A entrada de novos infeciosos é semelhante ao Exemplo 5,
cI(t)S(t)/N. Para além disso consideramos uma taxa de recuperação de a indivı́duos por
unidade de tempo. O diagrama mostrando as transições entre estados do modelo SIR
está representado na figura 2.3. O sistema de equações que descreve a evolução de uma
epidemia ao longo do tempo será
S ′ = bN − cI NS − bS
I ′ = cI NS − aI − bI
R′ = aI − bR
Para certas combinações dos parâmetros a, b e c > 0 a solução deste modelo exibe os-
cilações amortecidas que representam epidemias recorrentes, mas com amplitudes cada
vez mais pequenas.
O próximo exemplo pode ser visto como tendo por base o caso apresentado no Exemplo 18.
Contudo, neste caso a interação entre as duas populações não é linear.
Na figura 2.4 está representado um exemplo desta interação com base em dados reais.
O modelo consegue reproduzir este fenómeno. Com efeito, para certas combinações dos
parâmetros, as soluções do sistema correspondem a oscilações do número de presas e
predadores desfasadas no tempo.
Exercı́cios 13
1. Considere que o oscilador linear está sujeito a atrito e que este é proporcional à
velocidade da massa com uma constante de proporcionalidade µ > 0. Escreva a
equação que modela o estado do oscilador linear.
Figura 2.4: Exemplo de uma relação predador–presa, com base em dados reais.
Exercı́cio 14
Faça corresponder as equações aos problemas descritos (mais do que uma equação pode
coincidir com uma descrição, e vice-versa).
Os problemas:
1. Um corpo está pendurado por uma mola, estando sujeito à força da gravidade. Todo
o sistema, incluindo o local onde a mola está pendurada está sujeito a uma oscilação
periódica.
2. Um corpo está pendurado por uma mola, estando sujeito à força da gravidade. A
elasticidade da mola varia com a temperatura ao longo do dia.
3. Um corpo de ferro está pendurado por uma mola sobre uma base com um ı́man,
estando sujeito à força da gravidade e à força magnética do ı́man.
4. Um corpo de ferro está pendurado por uma mola sobre uma base com um eletroı́man,
estando sujeito à força da gravidade e à força magnética do ı́man que oscila.
x′ = ax + bxy (e7) x′′ + (a sin(t) + b)x = 0
(e3) ;
y ′ = cy 1 − y , (e8) x′′ + kx = a sin(bt)
K
Exemplo 22
Descrevemos agora como encontrar a solução geral de uma equação linear de segunda
ordem com coeficientes constantes e homogénea,
ax′′ + bx′ + cx = 0
com a, b e c ∈ R e a 6= 0.
Suponha que representamos por Dx a derivada de x, ou seja
dx
Dx = = x′ .
dt
Teorema 2.1 Considere a equação linear de segunda ordem com coeficientes constantes
e homogénea
ax′′ + bx′ + cx = 0
2. A equação caracterı́stica tem uma raı́z dupla real α. A solução geral da equação
diferencial é x(t) = k1 eαt +k2 t eαt , k1 , k2 constantes arbitrárias,
ou seja,
k =0
1
,
k pk/m = 1
2
p p
concluindo-se que x(t) = m/k sin( k/mt) é a solução particular pretendida.
Exercı́cios 15
(d) 2x′′ + 3x = 0,
3. Justifique que uma equação da forma ax′′ + bx′ = 0, a e b constantes, pode ser
reduzida a uma equação linear de primeira ordem. Resolva-a através dos processos
lecionados para as equações de primeira ordem
5. Resolva o sistema linear seguinte, começando por o transformar numa equação linear
de segunda ordem de coeficientes constantes.
x′ = 7x − 4y
y ′ = −9x + 7y
Recorde que os sistemas de 2 equações diferenciais lineares de primeira ordem podem ser
reescritos como equações de segunda ordem. Vamos ver como o resultado anterior pode
ser traduzido para o caso desses sistemas. Considere o seguinte sistema
x′ = a x + a x
1 11 1 12 2
(2.8)
x′ = a x + a x ,
2 21 1 22 2
ou na forma matricial
X ′ = AX,
Os coeficientes desta equação são: −(a11 + a22 ) = −tr(A), onde tr(A) designa o traço da
matriz A definido como a soma dos elementos da diagonal principal; e a11 a22 − a12 a21 =
det(A). Então o polinómio caracterı́stico é
λ2 − tr(A)λ + det(A) = 0.
Vejamos agora que as raı́zes do polinómio caracterı́stico coincidem com os valores próprios
da matriz do sistema A. Para determinar os valores próprios
de A temos de resolver a
a11 − λ a12
seguinte equação, det(A − λI) = 0 ⇔ = 0 ⇔ λ2 − (a11 + a22 )λ +
a21 a22 − λ
Exercı́cios 16
Exercı́cios 17
(a) Verifique que existe uma solução particular da forma x = a e−t , para algum
valor real de a.
(c) Verifique que x = xP (t) + xH (t) é solução da equação não homogénea, onde xP
é a solução particular determinada na primeira alı́nea e xH é a solução geral
da equação homogénea encontrada na segunda alı́nea.
(d) Indique a solução particular da equação não homogénea que verifica x(0) = 1,
x′ (0) = 0.
3. Considere o problema do oscilador linear sujeito a atrito mx′′ = −kx − µx′ , com
m, k e µ > 0. Determine a solução geral para os casos: µ2 − 4mk > 0, µ2 − 4mk = 0
e µ2 − 4mk < 0. Interprete as soluções obtidas.
4. Considere que o oscilador linear está contido num fluido que causa um atrito sig-
nificativo. Justifique que a influência do atrito pode ser modelada introduzindo a
parcela µx′ , com µ > 0, obtendo-se a equação mx′′ + µx′ + kx = 0 e interprete o
significado de µ.
(d) Estabeleça a relação entre k, m e µ (todos positivos) que define uma situação
de transição no comportamento do oscilador, descrevendo os diferentes tipos
de comportamento.