Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
2
3
4
Lua Valentia
5
6
7
Copyright © 2020 por Lua Valentia
Este livro é uma publicação inédita dos editores da Specula. Não reproduza, copie, receba ou distribua
cópias sem a devida autorização.
ATENÇÃO! Este é um livro protegido pelo servidor SPECULOS. Caso queira emprestá-lo a terceiros,
compre a cópia impressa.
OTELUMA – LUA VALENTIA
Copyright © 2020 EDITORA SPECULA
Você não pode copiar, distribuir, modificar, reproduzir, republicar ou retransmitir qualquer informação,
texto e/ou documentos contidos neste livro ou qualquer parte deste em qualquer meio da Internet, sem
o consentimento expresso por escrito da autora.
Para mais informações, contate: specula.magia@gmail.com www.specula.com.br
Segunda edição: 2017
8
Oh, Perséfone,
Minha Mãe, minha Rainha,
Tu és o verdadeiro templo vivo
Com tantos nomes, faces e fases
Tu me deste muitas vidas
Como a tua eterna sacerdotisa
Por ti, em ti e contigo
Tenho voz para exaltar-te
Tenho dedos para escrever-te
Danço para aclamar-te
Torno viva a tua palavra
Pois meus lábios sempre louvam o teu nome
Em minha língua há sempre o gosto das romãs
Em minha cesta há sempre papoulas, rosas e lavandas
Tua vestimenta é feita de ouro
E teu cabelo enfeitado de joias
Tua coroa é de flores, de terra e de ossos
Tua beleza é ornada de mistério, morte e ressurreição
Tu és a minha medicina, meu conforto e minha alegria
9
Todos os inimigos caem e agora sofrem e se lamentam
Pois tu também és a destruição, a lança e a ferida
Eu me purifico em ar, fogo e água
Para encontrar-te
Eu me enterro na terra
Para ressuscitar-me
Eu me purifico nos Mistérios
Para louvar-te
Khairé, Perséfone!
Salve, Primavera Divina!
Salve, Rainha das Rainhas!
Da tua filha,
Lua Valentia
10
Teoria
Introdução / 13
O Mito de Perséfone / 19
Os Mistérios Eleusinos / 23
Perséfone como arquétipo / 53
Perséfone e sexo / 75
Perséfone e o feminismo atual / 79
Perséfone, a Deusa da Adaptação / 101
Prática
Tabela de correspondências de Perséfone / 111
Selo de Perséfone / 113
Óleo de Consagração de Perséfone / 114
O altar de Perséfone / 116
Modelo de qualquer ritual / 117
Ritual de dedicação à Perséfone / 123
Os Rituais Menores / 130
Os Rituais Maiores / 131
Evocações para Perséfone e sua família / 139
Fontes / 165
11
12
A minha fascinação por Perséfone começou assim que li o seu nome pela primeira vez.
Fiquei então encantada com a sua história e fui pesquisar todas as fontes que pude encontrar a
respeito da mitologia greco-romana.
Houve uma conexão de imediato por Koré, seu primeiro nome, a Deusa da Primavera
bela e delicada que colhia flores e que foi brutalmente sequestrada pelo Rei do Submundo, Hades.
Após esta experiência traumática, Koré se transforma em Perséfone, a Rainha do Submundo.
Na época, as minhas fontes eram apenas acadêmicas, visto que eu não considerava cultuar
Perséfone como uma religião – no sentindo de me religar a uma força divina. Eu via como
mitologia e ainda não sabia sobre Magia do Caos e tampouco o uso mágicko e direcionado do
trabalho com arquétipos.
Quando tinha cerca de 17 anos, eu sonhei com Perséfone. Sua voz era delicada e forte ao
mesmo tempo. A Deusa do submundo me dizia que eu havia aberto diversos portais para o
inferno e que era minha obrigação fechá-los.
Eu fiquei com aquele sonho na minha mente e jamais me esqueci dele. Anos mais tarde,
meu amigo e mestre do Caos, Willian Lucas, me apresentou a Magia do Caos e disse que era a
minha única e exclusiva decisão sobre como e se eu gostaria de cultuar os deuses antigos.
13
Estávamos num parque, comendo algodão doce. Eu fiquei deslumbrada. Então quer dizer
que eu realmente posso cultuar qualquer Deusa? As pessoas realmente fazem isso? Eu perguntei com uma
jovialidade digna de Koré.
Então decidi que iria me aprofundar ainda mais no arquétipo de Perséfone, no que ele
representava para mim e como cultuar esta Deusa tão imponente e misteriosa.
Para melhor compreendermos a Deusa majestosa, resolvi que iria abordar o tema a partir
de três esferas: a acadêmica, a arquetípica e a religiosa.
Na parte acadêmica, eu li e reli a literatura que cita Perséfone, tais como os escritores
clássicos Ovídio e Hesíodo e Homero. Eu recomendo que leia Hino Homérico de Deméter, a
Teogonia de Hesíodo e qualquer boa tradução que você encontrar.
Eu também traduzi artigos de historiadores contemporâneos que falam a respeito e
interpretam os textos clássicos. Na parte de “Outras Vozes”, eu coloco a maioria desses artigos
na íntegra.
Decidi assim fazê-lo, dando as fontes naturalmente, porque infelizmente não há muito
material em português. Como apenas cerca de 5% dos brasileiros realmente compreendem o
inglês, resolvi que deveria fazer um esforço a mais ao trazer o assunto para a minha língua
materna. Além disso, a importância de Perséfone é profunda para o mundo clássico, segundo o
site Ancient History Encyclopedia:
O culto a Perséfone era especialmente forte na Sicília e no
sul da Itália, e além dos mistérios eleusinos de Elêusis
havia santuários para a deusa em todo o mundo grego,
principalmente em Locri Epizephyrii, Mantinea,
Megalópolis e Esparta. Aqui as festividades anuais
celebravam o casamento de Perséfone e sua colheita de
14
flores. Thesmophoria era uma celebração grega da deusa e
de sua mãe. Exclusivo para as mulheres, era realizado
anualmente antes do período de semeadura, quando eram
feitos sacrifícios e os restos de porcos em putrefação eram
misturados com as sementes. Perséfone, em sua aparência
de rainha do submundo, era frequentemente apelada em
tábuas de maldição e nas folhas de ouro inscritas
enterradas com os seguidores mortos do orfismo, que
davam instruções sobre como se comportar na vida após
a morte1.
— Via Ancient History Encyclopedia
Esta parte acadêmica também revela muito sobre como Perséfone era representada para
os artistas da antiguidade.
1
https://www.ancient.eu/persephone/
15
Arqueológico Nacional de Atenas. Na cerâmica de figuras
vermelhas do sótão durante todo o período clássico,
Perséfone é frequentemente mostrada sentada em seu
trono em Hades.
2
https://www.ancient.eu/persephone/
16
Aqui também precisamos abordar as novas interpretações feministas sobre Perséfone,
uma vez que seu mito gira em torno do seu sequestro e possível estupro por Hades, temas muito
polêmicos e delicados que precisam de nossa atenção.
Necessitamos repensar o que o simbolismo deste mito representa para nós atualmente.
Afinal, como poderíamos cultuar uma deidade sem conhecer todas as suas facetas?
Recomendo, portanto, que você pegue a leitura dos clássicos com suas próprias mãos e
interprete o que lê da melhor maneira.
Por fim, escrevo sobre a parte religiosa. Muito do que eu escrevo é justamente a minha
interpretação a respeito de tudo que eu li, senti e vivi que se relaciona com Perséfone e seu mito.
Trata-se do meu culto pessoal e da minha própria interpretação. Eu não quero, com este
livro, colocar-me como especialista em Perséfone, Iniciada em seus Mistérios ou qualquer outra
questão deste porte.
Meu intuito é oferecer informação e prática atual de acordo com a perspectiva da Magia
do Caos, ou seja, criando assim meu próprio caminho e interpretação, não simplesmente fingindo
que este livro se trata de um reconstrucionismo helênico, pois isso seria falso.
A Magia do Caos me dá a liberdade de realmente tomar o mito em minhas mãos e
ressignificá-lo, criando assim práticas que condizem com a minha própria realidade pessoal.
Portanto, faça uso deste livro como bem entender, desde que de maneira sadia a
responsável, isto é, esteja ciente das suas próprias limitações, escolhas e decisões.
17
“Feliz é o mortal que presenciou os Mistérios Eleusinos. Abençoados são seus olhos que os
viram, pois após a morte a jornada da sua alma será diferente daqueles que não foram
iniciados.”
— Homero
"Apenas aqueles iniciados nos Mistérios eleusinos podem ter esperança no final de suas
vidas e pela eternidade".
— Sófocles
19
Hades rapta a bela moça enquanto ela colhia narcisos com suas irmãs. Quando Perséfone
desaparece, Deméter se desespera à procura pela filha.
Irada, Deméter deixa o Olimpo e se disfarça de uma velha senhora cujo apelido é Doso.
Ela então chega à cidade de Elêusis. Enquanto procura pela filha, a Deusa aceita um trabalho
como ama num palácio. Oferecem-lhe vinho, mas Deméter pede uma mistura de farinha e água
com poejo tenro (kukeôn).
Deméter cria o filho da soberana do palácio como um deus, pois queria torná-lo imortal.
Dentre as práticas para imortalizá-lo, Deméter colocava a criança em meio a brasas. Certa noite,
a mãe da criança viu seu filho arder e se desesperou. Deméter então não transforma o menino
num Deus.
Ela se cansa de seu disfarce, aparece em esplendor e ordena que construam um grande
templo em Seu nome. Então ela ensina à humanidade os ritos dos Mistérios. Ela deixa o palácio
e fica no Templo, desesperada pela ausência da filha. Por isso, ela seca a terra, seca as flores e
assim nasce o inverno.
A humanidade se desespera e pede a Zeus uma solução. Zeus exige que Hades devolva
Perséfone, mas Ela havia comido seis sementes de romã e deveria permanecer no submundo, tal
como estabelecia a regra. Deméter então envia Hermes, o Deus da Comunicação, para resgatar
Perséfone.
Hades finalmente autoriza o resgate de Perséfone, desde que ela voltasse ao Submundo
de tempos em tempos. Fica estabelecido então que Perséfone ficaria seis meses com sua Mãe
(época da Primavera) e seis meses com Hades (época do Inverno).
O objetivo dos rituais era morrer para renascer. Era preciso descer ao Submundo junto
com Perséfone para enfim retornar à vida e florescer com a Primavera.
20
Para que você tenha uma noção mais completa sobre como os Mistérios Eleusinos
funcionavam, resolvi traduzir alguns artigos acadêmicos que certamente irão complementar seus
estudos.
Você verá que tais artigos estão mais à direita do livro, seguindo o mesmo padrão em
todos os meus livros, para que você possa diferenciar aquilo que foi escrito por mim daquilo que
foi escrito por outros autores.
A minha ideia é jamais plagiar, copiar ou usurpar tais autores, mas sim incluir suas
pesquisas aqui de maneira evidente para que os falantes da língua Portuguesa tenham acesso a
ela.
O primeiro autor, Joshua J. Mark, é então professor acadêmico e filósofo. Já morou na
Grécia durante alguns anos e escreve para Ancient History Encyclopedia. No próximo artigo, o autor
aborda bastante sobre os eventos históricos dos Mistérios:
21
Os Mistérios Eleusinos: Os Ritos de Deméter3
Escrito por Joshua J. Mark
Traduzido por Lua Valentia
3
https://www.ancient.eu/article/32/the-eleusinian-mysteries-the-rites-of-demeter/
22
participaram dos mistérios foram mudados para sempre
para melhor e que não mais temiam a morte.
Deméter e Perséfone
A história de Deméter e Perséfone é o mito mais
significativo da Grécia antiga, precisamente por causa de
sua influência nesse entendimento. Enquanto os contos de
Homero e Hesíodo informavam a cultura, e os relativos a
Héracles eram expressões significativas de valores
culturais, a história de Deméter oferecia algo que outros
mitos não podiam: uma visão da vida eterna e triunfo
sobre a morte.
23
Deméter, a deusa da natureza, teve uma filha, Koré (que
significa 'donzela'), que foi sequestrada e, segundo alguns
relatos, estuprada, por Hades, senhor do submundo.
Deméter procurou por Koré em todo o mundo em vão,
finalmente chegando a um poço na cidade de Elêusis. Lá,
disfarçada de velha, ela cuidava do filho da rainha,
batizando-o todas as noites no fogo para que ele fosse
imortal. Quando a rainha, certa noite, encontrou sua babá
colocando seu filho no fogo, ela ficou
compreensivelmente chateada — mas não tão zangada
quanto a deusa em luto que depois tirou seu disfarce e
revelou sua glória e sua ira.
24
Como ela só havia comido algumas, no entanto, foi
acordado que ela passaria metade do ano com Hades no
submundo e metade com sua mãe na terra. Koré emergiu
do submundo como Perséfone (“aquela que leva a
perdição”) a Rainha dos Mortos e, enquanto permanecia
na terra, Demeter fez com que o mundo fosse frutífero,
enquanto, quando Perséfone estava no submundo, as
plantas secavam e morriam; assim as estações foram
explicadas. Mais importante, porém, o mito refletia o
conceito de transformação e a natureza cíclica da vida. A
existência de uma pessoa não terminava com a morte
porque não havia morte; havia apenas mudança de um
estado de ser para outro.
Os Mistérios
Os rituais eram encenados duas vezes por ano. Havia os
Mistérios Menores, que ocorriam na primavera, e os
Mistérios Maiores, dos quais aqueles que haviam sido
purificados anteriormente participaram quando setembro
chegava. Eles caminharam pelo Caminho Sagrado de
Atenas até Elêusis, chamando o Koré e encenando a busca
de Deméter por sua filha perdida.
Os depoimentos
Platão, um iniciado (como Sócrates estava diante dele)
menciona os Mistérios especificamente em seu famoso
diálogo sobre a imortalidade da alma, o Fédon: "nossos
mistérios tinham um significado muito real: aquele que foi
purificado e iniciado deve habitar com os deuses "(69: d,
trad. da Igreja FJ). No mito de Er, o último capítulo da
República de Platão, um guerreiro chamado Er é morto
em batalha e vai para a vida após a morte, mas,
diferentemente dos outros que o acompanham, não bebe
26
as águas do rio Lethe que o levariam a esqueça sua vida na
terra e avançasse para a próxima.
Influência egípcia
28
Tão importante quanto um significado recém-encontrado
para a vida de alguém. Os iniciados reconheciam que suas
vidas tinham um propósito eterno e não estavam apenas
vivendo para morrer. A crença na transmigração de almas
- reencarnação - parece ter sido central para a visão dos
Mistérios, e isso proporcionou às pessoas uma sensação de
paz, pois elas teriam outra chance, muitas outras chances,
de experimentar a vida na Terra sob outras formas.
O fim
Os Mistérios Eleusinos diferiam da prática religiosa
convencional, pois os iniciados estavam experimentando
em primeira mão o que os outros estavam ouvindo nos
templos. A adoração tradicional dos deuses foi fundada
em histórias contadas sobre como o universo funcionava,
a vontade dos deuses e o que esses deuses haviam feito. A
diferença entre esse tipo de experiência religiosa e a dos
mistérios seria a mesma de atuar em uma peça de teatro
em comparação com ouvir sobre uma performance; os
atores terão uma experiência muito diferente e mais
significativa. Mesmo assim, não há indicação de que os
iniciados desprezem as práticas religiosas tradicionais ou
se considerem superiores. Platão provavelmente o fez,
mas apenas porque ele já pensava que era melhor que seus
contemporâneos.
30
Os Mistérios foram decretados por mais de mil anos e,
naquele tempo, proporcionaram a inúmeras pessoas uma
compreensão maior da vida e do que esperava além da
morte. Os rituais foram encerrados pelo imperador cristão
Teodósio em 392 EC, quando ele viu os ritos antigos
como uma resistência inspiradora ao cristianismo e à
"verdade" de Cristo. À medida que o cristianismo ganhava
mais adeptos e poder, os rituais pagãos eram
sistematicamente eliminados, embora significados,
iconografia e simbolismo fossem apropriados pela nova fé
e transformados para apoiar a crença em Jesus Cristo
como o messias.
Os Mistérios
Escrito em inglês originalmente por Gitana e traduzido por Lua
Valentia
Publicado originalmente no Rosicrucian Digest Volume 90
Número 2 2009
Os Mistérios Menores
Os Mistérios Menores podem ser mais bem caracterizados
como uma purificação preliminar pela qual um candidato
32
deve passar antes de participar dos Mistérios Maiores. [1]
Até Sócrates comenta que não é permitido que se inicie
nos Mistérios Maiores sem antes ter sido iniciado no
Menor. [2] Plutarco escreveu que “nas iniciações
misteriosas se deve suportar as primeiras purificações e
eventos perturbadores e esperar que algo doce e brilhante
saia da atual ansiedade e confusão”. [3] Os gregos antigos
acreditavam que a participação na Mistérios foi de grande
importância, pois era o culto mais popular da Grécia
antiga. Platão explica que “quem chega a Hades como um
iniciante e não participante dos ritos de iniciação ficará na
lama, mas aquele que era purificado e participava dos ritos
de iniciação, ao chegar lá, habitará com os deuses . [4]
Os estudiosos têm motivos para acreditar que, antes do
século V aC, esses rituais de purificação aconteciam no
pátio da Telesterion Eleusinian. [5] No entanto, também
havia rituais de purificação muito semelhantes que
estavam ocorrendo em Atenas, perto do rio Ilissos. Por
volta de meados do século V, os oficiais sagrados de
Elêusis decidiram que as purificações atenienses poderiam
servir como o pré-requisito necessário para os Mistérios
Maiores. [6] Assim, uma nova tradição começou, na qual
os candidatos passaram pelas purificações iniciais em
Atenas na primavera. [7] No outono do ano seguinte, eles
33
foram elegíveis para participar dos Mistérios Maiores de
Elêusis. A única mudança nessa tradição foi em 215 AEC,
quando os oficiais acrescentaram uma repetição opcional
dos Mistérios Menores. [8] Essa repetição foi realizada no
mês anterior aos Mistérios Maiores, e foi aberta a qualquer
um que viajasse para Atenas, mas perdeu a oportunidade
de participar dos ritos da primavera, ou simplesmente para
acomodar o grande número de pessoas que desejavam ser
iniciadas. Isso continuou até o século IV dC, quando os
mistérios e todas as outras práticas pagãs foram proibidas
pelo imperador cristão. No entanto, um pequeno templo,
que ainda estava de pé em meados da década de 1700,
pode ter sido um dos templos onde os Mistérios Menores
foram mantidos. [9]
35
mitológicas nas quais Héracles está passando pelos ritos
dos Mistérios Menores.
39
Também vemos a sacerdotisa segurando um leque, ou
liknon, sobre a cabeça de Héracles. Este é um tipo de cesto
usado para separar o joio do trigo. Sua conexão com
Deméter e Perséfone, deusas do grão, é óbvia. A ação
também pode ser descrita como um tipo de magia
simpática. O trigo é purificado, e o iniciado também. O
liknon também é um símbolo comum no culto de
Dionísio. Nesse contexto, separar o joio do trigo torna-se
uma metáfora para separar a alma de seu invólucro
externo, o corpo. [25] Embora esse ensino seja mais órfico
do que eleusino, parece que a metáfora ainda é aplicável.
Um autor antigo diz que Musaeus, filho de Orfeu, já foi
um dos principais sacerdotes de Elêusis. [26]
42
[
43
Agora que já traçamos o perfil acadêmico de Perséfone, iremos analisar o que seu mito
significa para a psicologia. A psicologia analítica define que arquétipo é um modelo, paradigma,
que deve ser sempre interpretado dentro de um contexto.
Para Jung, este modelo é algo primitivo que existe no inconsciente coletivo e que se revela
através dos mitos, contos e lendas de um povo. Por isso, aqui iremos falar a respeito da mulher
Perséfone, ou seja, aquela que carrega muito das características de Perséfone, que, portanto, se
identifica com sua história.
Será que você, por exemplo, tem muito de Perséfone no seu inconsciente? Qual Deusa
está mais presente em sua mente? Com qual temperamento divino você se identifica mais? Quais
são os mitos que me mais te chamam a atenção e que de uma forma ou outra retornam em sua
vida?
No site Goddess Archetype, a autora Nancy trata a questão das deusas mais comuns e como
seus arquétipos se manifestam atualmente na psiquê. A seguir, traduzo a parte sobre Perséfone.
Cabe entender que aqui tratamos da análise e opinião da autora. Leia com cuidado e tire suas
próprias conclusões.
Perceba que alguns detalhes do mito são diferentes e interpretados doutras formas. Isto
acontece porque até mesmo os poetas e filósofos antigos tinham interpretações diferentes sobre
o assunto.
44
Perséfone como arquétipo
Escrito por Nancy em Goddess Archetype
Traduzido por Lua Valentia
48
➢ Natureza pensativa e intuitiva ao invés de mente
intelectual — dificuldade em "explicar" seu
raciocínio, pois é uma percepção intuitiva.
➢ Menos à vontade com / em seu corpo e
sexualidade do que outros tipos de deusas.
➢ Forte conexão com o espírito — ambivalência
profunda em relação ao mundo exterior e seu
sentimento de ser incompreendida e alienada da
sociedade convencional.
➢ Um tipo principalmente de Perséfone,
profundamente sensível, possui tipicamente uma
estrutura frágil do ego, portanto, facilmente
dominada por sentimentos e impressões de seu
inconsciente.
➢ O tipo de Perséfone tem dificuldade em
discriminar e tem dificuldade em colocar suas
impressões em palavras.
➢ Forte capacidade de atravessar para outros reinos
da consciência psíquica — muito à vontade no
mundo além dos sentidos físicos.
➢ Atraída para o trabalho metafísico, curativo,
intuitivo e orientada a serviços.
49
➢ Por natureza, ela é reclusa / recuada, secreta,
possuindo um sistema sensível que exige tempo
longe da estimulação externa.
➢ "Submundo" entendido como 'inconsciente' —
então, Perséfone foi sequestrada no 'inconsciente'
— para lidar com aspectos de seu próprio material
inconsciente pessoal e também o inconsciente
coletivo.
➢ Ela experimenta episódios de depressão e / ou
ataques misteriosos e difíceis de diagnosticar
➢ Um tipo principalmente de Perséfone não é
promíscuo. Ela pode ser involuntariamente atraída
por parceiros que tentam dominá-la / controlá-la.
Como proteção, ela pode mudar para amantes
muito mais jovens, com quem pode ser mãe e se
sentir segura.
50
➢ propensa a atrair pessoas com problemas graves
ou comportamentos possivelmente abusivos;
➢ propensa a doenças misteriosas difíceis de
diagnosticar ou tratar;
➢ sensação de profunda alienação, isolamento,
depressão;
51
a consciência de seu lado sombrio: raiva, rancor — ela
continua sendo a donzela incompleta. A Perséfone madura
que retornou de sua jornada no submundo viu tudo; ela
une nascimento e morte dentro de si mesma. Ela se tornou
a mulher sábia, alegre, mas também tendo acessado sua
raiva reprimida, ainda mantém sua juventude como uma
mulher idosa e madura.
52
A tarefa de Perséfone
Unir os lados escuros e claros da deusa dentro de si —
abraçar cada vez mais a vítima / mártir sofredora em sua
consciência. Resolver o problema dela com relação ao
poder. Disposição de olhar para o rosto desse sofrimento
e entender sua relação com ele — não de um lugar de
culpa, e sim de empoderamento. Reconhecer que um
apego tão forte à Luz lança uma sombra muito escura.
Perséfone deve renunciar a seu eu de solteira (a persona
adorável, agradável e gentil com seus ideais elevados e
apego à 'inocência' e renunciar a seu desamparo) —
permitindo sua morte — enquanto ela desce para se
encontrar com Hades - e, eventualmente, emergindo como
a Mulher - em reconhecimento ao seu poder que ela agora
aceita - não projetando mais esse poder nos outros.
Dons de Perséfone
Sua receptividade, intuição, empatia com o sofrimento
dos outros, seus aguçados poderes de imaginação,
inspiração, capacidade de ler os corações e mentes dos
outros. Perséfone, uma vez amadurecida através de seu
próprio trabalho interior, é o guia para o Submundo.
Personalidade de Perséfone
53
Quando criança e adolescente:
➢ Calma, despretensiosa, complacente, ansiosa por
agradar — semelhante a um salgueiro — tenderá a
se curvar com as circunstâncias ou em relação a
personalidades mais fortes ao seu redor.
➢ Introvertida, imaginativa, muitas vezes vive em seu
'pequeno mundo' de faz de conta, talvez como
uma estratégia para escapar do desagrado que ela
experimenta em seu ambiente familiar.
➢ Ela costuma preferir brincar sozinha.
➢ Ela gosta de sua solidão, uma criança Perséfone
pode ser encontrada sonhando acordada, ouvindo
música.
➢ Incerta de suas preferências, dificuldade em tomar
decisões.
➢ A criança Perséfone costuma ser a criança
“problemática” da família ou bode expiatório
porque suas sensibilidades não estão em
conformidade com as normas da família.
➢ A criança Perséfone frequentemente enfrenta
trauma na infância, emocional e/ou físico.
54
➢ A Perséfone madura se envolveu com a donzela,
Koré, aspecto de sua natureza. Ela está
aprendendo a "dizer a verdade" — em vez de
evitar e/ou mentir para outras pessoas com medo
de desagradá-las. Ela está aprendendo a
estabelecer limites saudáveis — dizendo "não", em
vez de agir de maneira manipuladora, indireta ou
culpada para atender às suas necessidades —
evitando conflitos.
➢ A Perséfone madura está aprendendo a cuidar de
si mesma, aprendendo a atender às suas próprias
necessidades, com responsabilidade, ao entender
agora como ela culpou os outros no passado.
➢ Perséfone madura está desenvolvendo um
relacionamento consciente com seu "homem
interior", em termos junguianos, seu animus, o que
significa desenvolver sua natureza assertiva/ ação.
➢ A Perséfone madura encontra valor e significado
no ritual espiritual.
➢ A Perséfone madura que passou por sua
experiência transformadora em Hades está agora
equipada para guiar outras pessoas em sua descida
ao submundo. Ela é muito compassiva, intuitiva e
55
sabiamente guia os outros a se conectarem com
sua própria profundidade e significado.
➢ A Perséfone madura pode ser encontrada
trabalhando como curandeira, terapeuta,
herbalista, leitora de tarô, astróloga, escritora,
fotógrafa, musicista, médica intuitiva, jardineira.
➢ Perséfone requer tempo 'sozinha' suficiente para
regenerar suas energias, porque ela absorve as
vibrações/ emoções das pessoas ao seu redor.
Música, natureza e experiências místicas
recarregam suas baterias.
➢ Como mãe, Perséfone pode estar conectada aos
filhos de maneiras intuitivas, psíquicas e menos
focada em sua fisicalidade.
— Via Nancy
Há muitas questões neste texto que se focam muito na versão da Perséfone que
não se curou após a descida do Hades. Está bem claro que, na visão de Nancy, a maioria
que carrega este aspecto não se curou emocionalmente ou psicologicamente.
O texto de Nancy é excelente, porém é um tanto incompleto porque não se foca
muito na mulher Perséfone que se transforma na Rainha do Submundo. Nancy se
esquece da questão do empoderamento de Perséfone e no quanto ele influencia nas
decisões do inconsciente.
56
Sim, o texto cita a questão de a mulher Perséfone ser uma curadora, até mesmo
poder se dedicar à medicina ou à psicologia, porem não fala sobre sua sexualidade ou
empoderamento, citando o último apenas brevemente.
A mulher Perséfone é muito ligada ao glamour sombrio, geralmente voltada para
temas góticos com toques florais e da realeza. Um bom exemplo contemporâneo é a Dita
Von Teese, artista burlesca, que foi casada com o músico Marilyn Manson.
Dita é empresária e escreveu livros sobre beleza, elegância e comportamento. Ela
se separou de Marilyn Manson por não suportar o comportamento abusivo e constante
uso de drogas de seu ex marido.
Ela ainda mantém uma face jovial que não deixa transparecer a sua idade,
aparentando ser muito mais jovem do que realmente é. Ela gosta de brincar com temas
de glamour, com sensualidade e fantasias, tudo isso sempre com toques sombrios. Em
termos estéticos, ela representa bastante a mulher Perséfone.
Dita nasceu naturalmente loira, porém colore seus cabelos de preto. Usa sempre
um batom vermelho, que é a sua marca principal. Ela gosta de usar roupas e acessórios
que lembram as décadas passadas e ainda mantém uma presença forte de BDSM (bondage
e disciplina, dominação e submissão, sadomasoquismo).
Mais um exemplo que segue o mesmo tipo de beleza misteriosa e sombria é a atriz
Eva Green, que protagonizou Vanessa Ives na série Penny Dreadful. Eva também
aparenta ser mais jovem e tem uma postura altiva.
Outra grande artista da contemporaneidade é Lana del Rey. Com coroas de
flores na cabeça, a vontade de se tornar parte da realeza de Hollywood e uma vontade de
ser salva pelo seu “daddy”, sempre brincando com temas de vida e de morte.
A mulher Perséfone é a típica femme fatale dos antigos film noir.
57
Por um lado, ela aparenta ser jovem, ingênua e inofensiva. Geralmente teve uma
vida difícil, passou por algo muito traumático, todavia este trauma lhe deu forças para que
ela se tornasse a Senhora de Si mesma.
Então, ao mesmo tempo, ela também pode ser lida como arrogante, mandona e
esmerada. Sua postura é um misto de doçura com temperamento forte. Por isso, a mulher
Perséfone geralmente também é empresária ou dona de algum estabelecimento do qual
ela supervisiona.
A mulher Perséfone já não admite ser subjugada, traída ou mal amada. Ela
lidera, ela comanda, ela exige perfeição.
A mulher Perséfone é o signo de virgem que foi picado pelo veneno do escorpião.
Ela se foca no trabalho que é entender o inconsciente e deixá-lo florescer.
A mulher Perséfone também pode ter um quê vampírico. Ela usa essa pretensa
ingenuidade a seu favor, atraindo homens poderosos dos quais ela pode “sugar” poder.
Esta mulher pode ser extremamente perigosa, pois ela é capaz de manipular a
todos ao seu redor, usando jogos mentais e abusando de sua beleza e poder.
Porém, ela apenas realmente cresce quando percebe que o poder encontra em si
mesma, e não em mais ninguém, pois no fim ela é Deusa e Rainha por merecimento,
porque se adaptou a uma situação horrível e tirou dela o seu sustento.
A mulher Perséfone é tanto pura quanto destruidora e podemos entender
melhor os aspectos de sua personalidade quando lemos os tantos epítetos que a Deusa
Perséfone carrega4:
4
https://www.theoi.com/Khthonios/PersephoneGoddess.html#Titles
58
DESPINA, SIGNIFICA SENHORA
Veja então quantas Perséfones existem. A Perséfone que está em mim talvez não seja a
mesma que há em você. A Perséfone que está em mim é diferente, única, mas nossas vozes se
confundem e juntas temos algo em comum e que nos une.
59
É comum analistas afirmarem que a mulher com arquétipo de Perséfone geralmente é
abundantemente “espiritual” e que por isso não gosta ou não pratica sexo com intensidade.
Para muitos, Perséfone é a eterna virgem que um dia foi violada e que agora chora para
sempre pelos cantos.
Ora, isto está muito longe do mito original.
De fato, muitos dizem que Perséfone foi estuprada. Após ler as diversas versões, afirmo
que ela foi sim sequestrada, mas comeu as sementes porque quis, ou seja, ela estava curiosa sobre
o ato sexual.
Perséfone se apaixonou e desejou Hades porque ele era o único que a tratava como
adulta.
Perséfone foi criada para ser uma eterna virgem por Deméter, sua mãe extremamente
protetora, o que era contraditório, visto que Perséfone é uma Deusa da fertilidade.
Deméter, em sua proteção controladora, escondeu de Perséfone toda a sua
potencialidade.
Perséfone era tão fértil que inclusive deu luz a duas crias de Hades, que antes de se casar
era considerado infértil justamente por ser o Deus da Morte. Suas filhas foram Melinoë e Macária.
A sua mãe a tratava como uma criança imaculada, mas este status mudou quando
Perséfone foi desposada por Hades.
60
Há quem vai interpretar este fato como um trauma insuperável e há quem vai interpretar
como um trampolim para seu amadurecimento.
De fato, a mulher que passa por algum tipo de trauma, especialmente sexual, pode
carregar sequelas por toda a vida.
A mulher que consegue superar esses eventos mantém relações sexuais prazerosas, que
ligam o mundo carnal ao espiritual.
Essas práticas são conhecidas como magia sexual.
Para as bruxas e magos que estudam a fundo tais questões, o mundo espiritual não é
separado do mundo carnal.
A mulher Perséfone não quer apenas gozar, ela quer atingir o êxtase sexual para
alcançar o mundo espiritual.
Para isso, ela direciona o gozo para a sua Vontade, abrindo de fato um portal energético
intenso e obtendo assim tudo aquilo que ela de fato deseja.
No sexo, a mulher Perséfone quer ser tratada como Rainha, geralmente usando fantasias
do universo Kink, cheia de peculiaridades, experimentando com todas as sensações disponíveis.
O sexo não se resume a sua “romã”, mas sim a todas as partes do corpo, em especial o
pescoço, pés e mãos, que clamam por ser tocados e adorados como merecem.
É exatamente por isso que ela acaba conhecendo a comunidade BDSM (práticas sexuais
que envolvem bondage, disciplina, dominação, submissão e sadomasoquismo).
Somente a penetração é algo enfadonho para a mulher Perséfone, pois ela precisa colocar
em prática todas as suas fantasias, seus fetiches e seus desejos obscuros.
Muitas vezes a mulher Perséfone irá usar as suas feições de menina para brincar com sua
pretensa ingenuidade, tal como muitas fizeram no mundo contemporâneo ao chamar seus
parceiros de “daddy” (papai).
61
Ela pode gostar de ser submissa até certo ponto (ou então switcher para a comunidade
BDSM), alternando entra sua face que imita uma “adolescente em apuros” para a sua face mais
dominante.
Seja como submissa ou dominante, ela brincará com sua vestimenta: usando lingerie
glamourosas nas cores vermelho e preto, salto alto. Ela se valerá de acessórios como cordas,
algemas, máscaras, coleiras, amarras, vendas, chicotes, chibatas, arreios (harness), plugs dentre
tantos outros.
Ela gosta de balanços, brinquedos sexuais, ser amarrada com práticas de shibari:
Todas essas práticas não afastam a mulher Perséfone do mundo espiritual, pelo
contrário, acabam fazendo com que ela se conecte melhor com as suas mais diversas facetas.
62
Perguntei a Perséfone: “Como você pôde amá-lo? Ele levou você das flores para um reino
onde nem um único ser vivo pode crescer”.
Perséfone sorriu: “Minha querida, todas as flores da sua terra murcham. O que Hades me
deu foi uma coroa feita para as flores imortais em meus ossos.
63
No romance Lore Olympus, a escritora e ilustradora Rachel Smythe modifica o mito
completamente. Nesta versão, Perséfone é estuprada pelo Deus Apolo, que é inimigo de Hades.
Hades é um deus não compreendido, justamente por ser Deus do Submundo. Ele é
solitário e temido. Primeiro se encanta com a beleza de Perséfone. Depois percebe que ela tem
as mesmas qualidades melancólicas que ele enxerga em si mesmo, por isso ele se apaixona por
ela.
Lore Olympus não é o mito original, mas tem mais de três milhões de leitores até o
momento. Podemos argumentar que se a visão popular sobre Perséfone muda, também seu mito
evoluirá para algo mais aceitável atualmente, assim como os contos de fada um dia foram
adaptados para as crianças.
Ora, se nós realmente queremos entender Perséfone em todas as suas facetas, precisamos
compreender seu mito original e todos os aspectos dele que nos repugnam! Ignorar tais aspectos
sombrios também é ignorar a nossa própria sombra.
Então vejamos, em primeiro lugar, temos que lidar com a questão do incesto, visto que
os Deuses mantinham sexo e se casavam entre si.
Hades é tio de Perséfone, ponto que hoje é um grande tabu inaceitável na nossa realidade.
Este fato está presente em muitas casas, visto que o estupro geralmente ocorre por familiares da
vítima5:
5
https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/maioria-dos-casos-de-violencia-sexual-contra-criancas-e-
adolescentes-ocorre-em-casa-notificacao-aumentou-83.ghtml
64
pessoas do convívio das vítimas, geralmente familiares. O
estudo também mostra que a maioria das violências é
praticada mais de uma vez.
Para Itamar Gonçalves da ONG Childhood Brasil, que
trabalha para promover o empenho de governos e
sociedade civil em combater a violência sexual contra
crianças e adolescentes, faltam no Brasil ações de
prevenção que trabalhem com temas como o
conhecimento do corpo, questões culturais de gênero e em
especial as que dizem respeito aos padrões adotados de
feminilidade e masculinidade.
"Para mudar este cenário é importante criar ambientes que
sejam acolhedores e inclusivos nos espaços frequentados
pelas crianças e adolescentes, nas famílias, escola, igrejas...
Um trabalho de prevenção se faz com informação,
especialmente sobre o funcionamento do corpo, a
construção da sexualidade, visando empoderar nossas
crianças".
Por outro lado, Deuses não são pessoas comuns, eles são forças da Natureza. Se
considerarmos esta óptica, Perséfone representa a primavera encarnada, enquanto Hades é o
Deus dos Mortos.
65
O Deus dos Mortos, então, “estupra e sequestra” a vida, e por isso temos o inverno.
Quando despersonalizamos os Deuses fica mais fácil entender que são parentes e familiares
porque tudo na Natureza está interligado.
Mas quando humanizamos os Deuses, nossa moralidade acaba intervindo e logo
começamos a julgá-los.
Seja como for, o feminismo atual debate se o caso de Perséfone é estupro ou Romance.
Assim como ocorreu com o texto de Nancy, focam-se muito na Perséfone enquanto vítima e
pouco em seu empoderamento.
Traduzi, assim sendo, o texto de Aimee Hinds para que entendamos perfeitamente qual
é a visão de algumas das feministas atuais e em seguida darei a minha opinião polêmica sobre este
assunto.
Estupro ou Romance?
Mau feminismo nas recontagens míticas
Escrito por Aimee Hinds
Traduzido por Lua Valentia
69
mas merece críticas por sua supressão de temas com
potencial de serem problemáticos hoje.
Para recapitular as principais fontes: Perséfone é
violentamente forçada a um casamento que ela claramente
não deseja. Hesíodo nos diz que ela foi roubada por
Hades; tanto o hino homérico a Deméter quanto a
metamorfose de Ovídio têm Perséfone claramente
clamando por sua mãe quando ela é arrebatada (como
evidenciado pelo uso da rapio latina - de onde vem a
palavra "rape" – estupro em inglês). Ovídio nos conta sua
angústia pela perda de seu estado virginal.
Apesar do que para nós é uma evidência clara de estupro,
no contexto antigo não houve erros: Hades obteve o
consentimento de se casar com Perséfone por seu pai,
Zeus, de forma preventiva ou retroativa. No entanto, a
história enfatiza a natureza violenta e oculta de seu
sequestro. Mais evidências dos elementos sexuais forçados
do mito de Perséfone podem ser encontradas ao comer as
sementes de romã, consideradas por muitos como um
eufemismo para a relação sexual (ver, por exemplo,
Lincoln 1938: 234, Ruis 2015: 24).
Diferentes versões do mito a obrigam secretamente a
comê-los, enquanto outros a mostram comê-los de bom
grado, mas explicitamente sem saber que isso significa que
70
ela ficará presa no submundo com seu sequestrador.
Embora o sequestro de Perséfone possa ter sido sem
problemas na Grécia antiga, contar como um romance
hoje apaga as experiências de mulheres antigas e
modernas.
Dada sua insistência na ausência de abuso sexual nas
fontes, enviei um e-mail a Gill para discutir seu poema e
perguntar o que ela havia feito para pesquisar a história de
Perséfone. Ela fez o que se esperava, lendo Ovídio,
Homero, Hesíodo e Apolodoro — tudo em tradução —,
além de ler obras mais modernas, como os mitos gregos
de Robert Graves e os mitos de Stephen Fry. O inglês é a
segunda língua de Gill (autodidata) e ela não é clássica nem
linguista. Como os próprios idiomas já fazem parte de um
debate sobre a exclusividade dos clássicos, não podemos
razoavelmente esperar que Gill ou outros consultem
textos em seus idiomas originais.
Versões traduzidas de textos antigos são cruciais para a
inclusão contínua dos clássicos. Mas, como Stephanie
McCarter demonstrou, a tradução também é crucial para
ocultar ou revelar estupros em textos antigos, e tradutores
irresponsáveis transformaram o abuso sexual em uma
união consensual ou até sensual. McCarter aponta a
tradução de Metamorfoses por David Raeburn como uma
71
das que têm mais liberdade — e, no entanto, é uma edição
extremamente popular. A tradução de Raeburn do
sequestro de Perséfone não menciona sua dor ou medo de
perder a virgindade — elementos do original — e
eufemiza seu estupro com seu vestido rasgado e flores
caídas.
Agora, não estou sugerindo que o conhecimento das
línguas clássicas seja automaticamente igual a uma leitura
feminista — caso contrário, não teríamos acabado com
más traduções. Nem conhecê-los significa que não
precisamos considerar os problemas. Mas o conhecimento
do grego antigo e do latim permite ao leitor tomar decisões
sobre o significado, decisões que já foram tomadas para
eles ao ler na tradução. Quando escritores não especialistas
querem usar esses textos para recepção, não surpreende
que mesmo feministas pensativas possam criar trabalhos
problemáticos, se elas se basearem em traduções que
fazem escolhas misóginas, racistas ou mesmo eufemísticas.
Gill já está à frente da curva aqui; a cópia da Odisséia que
ela consulta é a tradução recente de Emily Wilson. Mas
sem traduções igualmente progressivas de outros textos
populares para consultar, os criativos ficam presos a
versões desatualizadas dos mitos que eles estão traduzindo
em arte. Na prática, isso geralmente significa traduzir o
72
significado do texto em vez das palavras de maneira
mecânica — a abordagem adotada por Wilson e defendida
por Johanna Hanink.
Em resumo, vemos que para Aimee Hinds, colocar qualquer elemento romântico entre
Perséfone e Hades é algo típico de uma má feminista (ou feminista branca) que reproduz
misoginia ancestral.
Não quero entrar em detalhes aqui sobre diferenças dos feminismos. Nem todas pensam
da mesma forma e não existe um padrão ou uma cartilha a ser seguida. Sexualidade e romance
são muito mais complexos do que imaginamos e não podemos simplesmente ignorar isso.
Primeiro precisamos entender que o contexto histórico tem milhares de anos. A vida na
Grécia Antiga era completamente diferente da nossa. Como feminista, eu tenho uma regra: não
irei julgar aqueles que já morreram, nem mesmo antigas culturas que não posso mudar.
Só posso julgar os pensamentos dos vivos que mesmo com toda informação acabam
agindo de formas condenáveis: matando, estuprando e roubando o outro.
75
Por fim, sempre me perguntei bastante a respeito da relação de Perséfone e Hades após
o acontecimento do sequestro, pois o mito de Perséfone não é apenas este fato.
Em algumas versões, Hades estava inspecionando o reino dos mortais quando avistou
Perséfone pela primeira vez. Afrodite, temendo que Perséfone fosse virgem para sempre, decidiu
que Eros deveria fazer com que Hades se apaixonasse por Perséfone perdidamente.
Vejamos o entendimento de Salma Harfouche sobre o assunto:
78
Cabe cada um de nós refletir bastante sobre o tema. Se pegarmos o mito original, não
podemos cometer certos anacronismos. Por outro lado, se quisermos realmente nos apropriar
do tema, cabe escrever uma nova história assim como fez Rachel Smythe.
Todos nós temos nossos defeitos e telhados de vidro. Perséfone não é e não será a
feminista perfeita, nem mesmo a vítima perfeita da qual muitos escrevem. Ela é a Rainha do
Submundo e seu amor por Hades não deve ser ignorado ou usurpado, nem mesmo em nome da
moral e dos bons costumes feministas.
A meu ver Perséfone e Hades estavam apaixonados ou por outro e não houve estupro.
Tampouco podemos ignorar todos os epítetos de Perséfone e transformá-la apenas na
eterna vítima. Lembre-se, ela é a Rainha, a Destruidora, a Temida. Ela é muito mais que o seu
episódio de sequestro.
É justamente por isso que decidi traduzi mais um artigo, que cabe como uma espécie de
transição entre o entendimento da Perséfone-histórica e da Perséfone-arquetípica para a nossa
visão religiosa.
79
O artigo de Cyndi Brannen, que enxerga Perséfone como a Deusa da Adaptação é o que
mais se aproxima da minha visão pessoal em relação à Deusa.
80
como ela se transformou, administrou seus
relacionamentos e virou a roda do ano.
81
Perséfone nos textos antigos são um pouco mais limitados,
mas não menos diversos.
Transformação de Perséfone
Perséfone teve que se adaptar à vida na Terra e no Mundo
Inferior continuamente. Para mim, é a transformação dela
da tímida, mas linda donzela, para uma rainha tenaz que é
fascinante. A ascensão de Perséfone à Rainha do Inferno
era inevitável como esposa de Hades, por isso não é tanto
que ela tenha o título, mas que ela subiu ao título. Ela
reinou sobre o Mundo Inferior com uma ferocidade que
lhe valeu o antigo epíteto de Brimo, mas também foi
sensível quando Orfeu precisou resgatar Eurídice do
Mundo Inferior. Ela nos mostra que podemos tirar o
máximo proveito de onde nos encontramos e permanecer
gentis. Pelo menos para aqueles com quem podemos nos
relacionar. Apele para ela quando estiver buscando
transformação. Perséfone é uma verdadeira guerreira,
cujas vitórias não foram encontradas no valor do campo
de batalha, mas nas profundezas de sua alma. Soa familiar?
Os relacionamentos de Perséfone
Perséfone tinha relacionamentos complexos com
Deméter, sua mãe, e seu marido. Aqui estão mais
82
evidências que apoiam Perséfone como uma deusa da
adaptação. Ela teve que fazer sua mãe feliz enquanto
também lidava com esse marido. Em seu relacionamento
com Hades, ela se transforma da garota desanimada
chorando na caverna sobre seu noivado em esposa
ciumenta. Enfurecida por sua infidelidade, ela
transformou o objeto de sua afeição, Minthe, em uma
planta.
83
humanidade, trazendo a chegada da primavera com seu
retorno do submundo.
Adaptação do clima
Seu outro papel importante na antiguidade era o de uma
deusa da agricultura. Seu retorno do Mundo Inferior a
cada primavera tornava a terra fértil. A importância de
honrar Perséfone para que houvesse uma colheita
abundante era fundamental para aqueles que cultivavam.
Nesse papel, Perséfone nos mostra seu poder de
adaptação mudando as próprias estações do ano. Para ser
mais preciso, era sua mãe, Deméter, que estava no controle
das estações. No entanto, o mundo teria permanecido no
inverno, não fosse o retorno anual de Perséfone.
85
86
87
88
Pais Zeus (Deus dos Deuses)
Deméter (Deusa da Agricultura)
Irmãos Por parte de Pai:
Afrodite (Deusa do Amor)
Apolo (Deus do Sol)
Ares (Deus da Guerra)
Ártemis (Deusa da caça)
Atena (Deusa da Sabedoria)
Éris (Deusa do Caos)
Hebe (Deusa da Juventude)
Hefesto (Deus do Fogo)
Hermes (Deus da Comunicação)
Outros (para saber mais consulte filhos de
Zeus)
89
Estação do ano Primavera / Inverno/ Outono
Locais Grutas / Cachoeiras / Nascentes
Festividades Tesmoforia / Mistérios de Elêusis
Signos Virgem / Escorpião
Árvores Romã / Salgueiro
Plantas & Flores Rosa/ Narciso / Lírio /Margarida /
Lavanda / Papoula
90
91
Para consagrar vestes, ferramentas, amuletos, talismãs, quaisquer objetos do altar, use um óleo de consagração.
Você pode comprar ou fazer o óleo da sua escolha, tendo em mente as correspondências de Perséfone, ou então
simplesmente seguir a receita a seguir:
92
➢ Coloque o sangue, saliva e lágrimas;
➢ Coloque o álcool;
➢ Feche a caveira;
➢ Feche a caveira com cera da vela;
➢ Diga que este é um óleo de consagração de Perséfone;
➢ Agradeça à Deusa;
➢ Beije a caveira;
➢ Faça o banimento final;
Apenas use para consagrar objetos relacionados à Perséfone.
93
O altar ideal de Perséfone será apresentado a seguir, porém fique à vontade para modificá-lo.
Este altar foi pensando para aquelas pessoas que querem se tornar sacerdotisas dedicadas à Perséfone.
Consulte a tabela de correspondências caso queira saber mais.
➢ O altar deve conter uma imagem de Perséfone ao centro, seja ela uma estátua, uma pintura
ou ilustração;
➢ O altar deve conter duas velas: uma à direta e outra à esquerda de Perséfone;
➢ As velas devem ser brancas, vermelhas puxadas para o vinho, roxas ou pretas;
➢ As velas devem ser acesas diariamente;
➢ O altar deve conter flores;
➢ O altar deve conter um incensário dedicado à Deusa que deve ser usado periodicamente;
➢ Oferendas periódicas devem ser feitas: tais como cálice com água ou vinho, ou então
oferendas como alimentos;
➢ As ofertas devem ser trocadas periodicamente antes de estragarem;
➢ O altar deve conter elementos que correspondem à Perséfone, tais como os apresentados
na tabela de correspondências;
➢ Tudo no altar deve ser limpo, energizado e consagrado;
94
Este é um modelo de ritual que pode ser usado ou adaptado para qualquer ocasião. Eu
recomendo bastante a leitura do site RHB (Reconstrucionismo Helênico Brasileiro)
especialmente para as pessoas que realmente gostam de usar termos em grego. Como este livro
tem muito de Magia do Caos, iremos manter as práticas aqui o mais simples o possível.
Antes do ritual
➢ Deixe tudo preparado com antecedência. Muitas vezes pensar num ritual e
preparar o local pode demorar dias. O local deve estar limpo para receber os
Deuses. Faça uma lista para que não se esqueça de nada – separe alimentos,
ferramentas mágickas etc. Caso queira usar música durante o ritual, separe
também uma playlist. Separe além disso as roupas que você irá usar. No livro “O
Mapa do Caos”, eu coloco uma tabela que ajuda muito a organizar um ritual,
especialmente se ele é em grupo e não solitário;
➢ Deixe tudo limpo e preparado no seu altar;
➢ Também separe os hinos que você lerá sobre os deuses, cartas, contratos, tudo
que você deseja deve ser escrito de maneira clara e objetiva;
➢ Se precisar, ensaie o ritual para que você não se perca, especialmente se estiver
fazendo um ritual com mais de uma pessoa. Deixe as funções de cada pessoa
bastante claras e evidentes para ninguém se atrapalhar e ficar receoso antes do
ritual;
➢ Separe pelo menos uma hora antes do ritual para você se preparar. Sempre se
banhe antes de um ritual, pois isto faz parte da purificação. Recomendo que você
faça do banho em si um pequeno pré-ritual, usando produtos que contenham
romãs, rosas ou lavanda. Há muitos produtos para lavar e cuidar os cabelos com
pelo menos um desses ingredientes. Fique à vontade para usar outros ingredientes
95
que você considere fazer parte das correspondências ligadas à Perséfone. Eu
recomendo que você tome um banho de banheira, caso tenha alguma, com sais
de banho, bolhas e tudo que tem direito;
➢ Sempre use roupas limpas, de preferência consagradas e separadas apenas para
rituais. Você não precisa usar roupas bruxescas para tanto, porém recomendo
roupas separadas apenas para estas ocasiões;
➢ Coloque tudo sobre o altar antes de começar o ritual;
➢ Lembre-se de manter o altar e o local onde está o altar sempre limpos;
O banimento e a purificação
"Héstia, tu que cuidas da sagrada casa do senhor Apolo, o que atira longe ao
enorme Pytho, com suave óleo escorrendo sempre de suas madeixas, venha agora a esta
casa, venha, tendo uma só mente com Zeus o onisciente - venha para perto, e sobretudo
conceda suas graças sobre a minha canção".
➢ Após acender a vela a Héstia, a sacerdotisa declara que o espaço está puro.
Ofertas e libações
➢ Faça a primeira oferta, separando um punhado de bolo, frutas etc para os Deuses;
➢ Derrame um pouco de vinho, água ou suco numa jarra apenas para os Deuses
que estarão presentes;
96
Evocação
➢ Faça a evocação dos servidores/Deuses que você quer trazer para o ritual.
Estamos falando especialmente de Perséfone, mas há outros Deuses com os quais
você pode querer trabalhar.
➢ Exemplos de evocações estarão no final do livro, mas você também pode usar os
hinos homéricos originais que você encontrar pela internet;
97
➢ Nós não honramos os Servidores, apenas os tratamos com devido respeito que
devemos tratar os nossos empregados;
➢ Mesmo o mago ou bruxa que já tenha começado a traçar o seu caminho enquanto
divindade na carne, precisa tratar os Deuses como seus superiores, visto que os
Deuses estão há muito mais tempo e são seres mais sábios, por isso a eles
devemos gratidão e glorificação;
Ápice do ritual
➢ Este é o momento em que a sacerdotisa faz seus pedidos, suas considerações e
abre realmente seu coração. É basicamente o momento chave do ritual, no qual
você revela aos Deuses porque os chamaram;
➢ Também é o momento que a Sacerdotisa também lê o contrato (caso tenha) dos
Servidores e diz de forma clara o que deseja;
➢ Aqui atinge-se o momento da gnose (estado alterado de consciência);
➢ Aqui a sacerdotisa faz o sacrifício ou mais ofertas e libações;
Refeição de aterramento
➢ Agora é o momento em que a sacerdotisa e os participantes comem a ceia
preparada, babem da bebida disponível;
➢ É o momento de comunhão, na qual todos se divertem e dividem a ceia;
➢ O aterramento é importante para que os participantes voltem “para a terra”;
➢ Muitas vezes recomenda-se até mesmo tomar chá ou café após a ceia;
Agradecimento
➢ É importante agradecer aos Deuses pela participação deles durante o ritual;
➢ O agradecimento é a oração final;
98
Banimento final
➢ O banimento final é o momento que desfazemos o círculo e concluímos o ritual;
➢ Geralmente se usa o mesmo banimento que se usou no começo, portanto se você fez o
banimento com sinos, faça o mesmo no final.
Após o ritual
➢ O ritual não termina quando fazemos o banimento final;
➢ Deve-se limpar tudo e levar os alimentos doados aos deuses para uma árvore, agradecer
e sair, ou então despejar numa pia ou lixo. Não deixe elementos que não são perecíveis
na Natureza, tais como garrafas ou copos etc;
➢ Guarde todos os outros mágickos, não os deixando à mostra, especialmente se você for
usar o mesmo ambiente para outras questões mundanas após o ritual.
99
➢ O ritual de dedicação deve ser feito na primavera ou no outono. Após entender
que a Perséfone é realmente a sua Deusa Mãe, Deusa Patrona ou Deusa escolhida,
a futura Sacerdotisa se prepara para dedicar a sua vida a Ela;
➢ Mesmo que você já tenha se apresentado como filha de Perséfone e na prática já
tenha se dedicado a Ela, recomendo fortemente que faça este ritual pelo menos
uma vez na vida. É como se fosse um ritual de “batismo”;
➢ Nota: escolhi o feminino neste caso, mas obviamente entenda que qualquer pessoa pode se dedicar
à Perséfone, independentemente do gênero.
➢ O objetivo deste ritual é conectar a futura Sacerdotisa à Deusa Perséfone, de
modo que ela se dedica ao seu chamado interior;
➢ Escrevo aqui sugestões. Adapte o ritual da melhor forma para a sua realidade;
➢ O ritual pode ser feito de forma individual ou em grupo;
Preparação
➢ A Sacerdotisa escolhe um objeto que representa esta conexão: pode ser um
anel/colar/outra joia que tenha uma romã, pode ser uma coroa de floras ou de
ossos feita ou comprada para a ocasião ou até mesmo uma caveira. Naturalmente,
estas são apenas algumas opções, faça como preferir;
100
➢ A Sacerdotisa pode fazer ou comprar um óleo de unção de sua preferência.
Recomendo um óleo que contenha rosas, romãs, lavanda ou qualquer uma das
correspondências de Perséfone. O óleo aqui descrito é perfeito para a ocasião;
➢ A Sacerdotisa deve fazer ou comprar uma vestimenta para esta ocasião, que deve
ser usado apenas para esta finalidade ou rituais que envolvem a Deusa Perséfone;
➢ Esta vestimenta deve ser na cor branca, preta, vermelho, roxo, azul ou dourado;
➢ A Sacerdotisa deve fazer ou comprar incenso com alguma correspondência de
Perséfone;
➢ A Sacerdotisa deve comprar ou fazer algo que represente Perséfone como
descrito na parte do altar, pode ser uma estátua ou ilustração;
➢ A Sacerdotisa deve fazer água de lua cheia ou crescente para a ocasião;
➢ A Sacerdotisa deve comprar velas que sejam da mesma cor que sua vestimenta;
➢ A Sacerdotisa deve montar o altar de Perséfone como descrito ou acima e
acrescentar mais objetos que ela achar pertinente;
➢ A Sacerdotisa deve preparar-se para o ritual fazendo/comprando uma ceia,
vinhos e o que mais for usar para sua oferta e o que for também comer,
➢ A Sacerdotisa se banha e coloca uma lingerie para a ocasião se quiser estar coberta,
ou então caminha nua até o altar;
➢ A Sacerdotisa acende a vela de Héstia e faz o banimento/purificação como
preferir;
➢ A Sacerdotisa evoca Perséfone como preferir (com algum poema deste mesmo
livro, lendo um hino à Perséfone, poesia que encontrar ou então simplesmente
101
lendo algum texto que ela mesmo escreveu, ou palavras que vierem de seu
coração);
➢ A Sacerdotisa pega o óleo de consagração e acaba consagrando a si mesma,
dizendo algo como:
Sobre a Terra nua eu caminho
Na Terra eu renasço
Pois eu me batizo com ar (acenda o incenso e passe ao redor de seu corpo)
Água (pegue água de lua crescente ou cheia e beba um pouco)
Fogo (acenda uma vela e passe ao redor do seu corpo)
Em nome de Perséfone eu renasço
Ela que é o Templo Vivo
Nela eu habito!
➢ A Sacerdotisa pega o óleo de consagração e consagra a sua vestimenta, dizendo
algo como:
Consagro esta Vestimenta em nome de Perséfone
Pois ela é a Deusa que veste meu espírito
Ela é a Deusa que reveste a minha alma
Em seu Nome eu habito!
➢ A Sacerdotisa pega o(s) objeto(s) que representa(m) esta conexão com
Perséfone, passando incenso ao redor deles para purificá-los e dizendo:
Eu declaro puro(s) e sagrado(s) este(s) objeto(s)
Em nome da Pureza que há em Persefóne
Hagne! Hagne! Hagne!
102
➢ A Sacerdotisa consagra cada um dos objetos com o óleo de consagração, e
enquanto os coloca em si mesma diz algo como:
Em Nome de Perséfone
A Grande Eterna Deusa
Em nome do Templo Vivo
Eu declaro que este objeto
Representa a nossa conexão
O amor que eu tenho por ti
Minha Senhora, Mãe e Deusa
Eu me devoto a ti
E entrego-te o meu ser, a minha honra
De modo que sempre que usar/vestir tal objeto
Imediatamente eu me conectarei a ti
E eu me lembrarei deste glorioso dia
O dia em que eu morro e renasço como
(Diga o seu nome Mágicko)
A sua Filha,
A sua eterna Sacerdotisa;
➢ A Sacerdotisa agora diz a que veio e ao que se compromete, algo como:
Eu me comprometo a sempre honrar teu nome
A contar a tua história para aqueles que precisam ouvi-la
A ajudar as minhas irmãs, aquelas que também são tuas Filhas
Eu me comprometo a honrar-te sempre, especialmente
103
Durante os Mistérios Menores e Maiores
A Primavera e o Outono
Eu me comprometo a espalhar toda Arte que seja a ti dedicada
Tornando a minha própria vida uma forma de Arte
Que o teu nome glorifica!
➢ Agora a Sacerdotisa pede a proteção e algo especial para a Deusa:
Em troca, minha Mãe, por favor sempre me resguarde
Mantenha-me entre suas favoritas
Proteja a minha vida
Que a minha vida seja cheia de amor, riqueza e sabedoria
Pois a minha vida é o maior bem
Que eu dedico a ti!
(Faça outros pedidos, se houver)
➢ A Sacerdotisa entra em estado alterado de consciência e olha para o selo de
Perséfone;
➢ A Sacerdotisa faz a refeição de aterramento;
➢ A Sacerdotisa agradeço a Perséfone;
➢ A Sacerdotisa faz o banimento final;
➢ A Sacerdotisa limpa e guarda tudo que ficou.
104
O recrutamento para os Mistérios era aberto podendo até mesmo ser considerado
proselitista. Diziam que os iniciados teriam privilégios após a morte, enquanto os não iniciados
não saberiam se portar no Hades depois que morressem.
Tais rituais eram tão secretos que a eles deram o nome de Mistérios. Estão entre os mais
importantes do mundo antigo. Os rituais duraram cerca de mil anos! Remontam ao século VI a.C
até a destruição do templo pelo imperador romano Teodósio (400 d.C). O cristianismo tentou
matar os Mistérios de Elêusis na Grécia Antiga, mas eles continuam presentes até o dia atual,
tanto que nós os adaptamos à nossa Era.
Os Mistérios eram divididos em dois períodos. Os Mistérios Menores eram celebrados
no primeiro semestre, no mês de Anthesterion (Ανθεστήριον), correspondente a março. Era
quando os sacerdotes faziam liberações, sacrifícios e rituais de purificação.
Já os Mistérios Maiores ocorriam no segundo semestre, no mês de Boedromion
(Βοηδρομιών), correspondente a setembro. Os Mistérios Maiores começavam dia 15 de setembro
e duravam nove dias.
Mistérios Menores
Como não sabemos exatamente como os Mistérios aconteciam, vamos adaptá-los para a nossa realidade;
Este ritual pode ser feito de forma individual ou em grupo;
105
➢ Separe três dias de março (um final de semana prolongado, caso queira);
➢ Entenda esses dias como feriado/celebração, se puder, tire os dias de folga;
➢ Enfeite a sua casa e/ou templo com flores, romãs, estátuas de animais que
correspondem à Perséfone, tal como coelhos e corujas. Enfeite também com
laços das cores correspondentes à Perséfone;
➢ Coloque uma guirlanda feita de romãs e/ou rosas na porta de sua casa e/ou
templo;
➢ Limpe a sua casa e/ou templo para receber a divindade;
➢ Considere comprar estátuas de Perséfone, Hades e Deméter;
➢ Recomenda-se usar roupas claras para estes rituais, tais como branco, azul claro
ou qualquer correspondência que tenha a ver com Perséfone (ao menos a parte
mais clara das correspondências);
➢ No primeiro dia, monte o altar de Perséfone como descrito neste livro ou como
preferir, colocando Perséfone entre Hades e Deméter;
➢ Faça tudo o que tiver que ser feito para se preparar;
➢ Tome o banho e vista roupas limpas;
➢ Faça banimento e purificação;
➢ Acenda velas e incensos;
➢ Simplesmente leia o mito de Perséfone em voz alta ou então encene o mito caso
você tenha mais pessoas envolvidas, transformando o mito numa peça;
➢ Faça a refeição em conjunto;
➢ Faça o banimento final.
106
➢ No segundo dia, faça a purificação com ar e fogo, usando incensos e velas e se
declarando purificado de todo o mal, miasma. Caso queira, use o ritual com a
Cortana como descrito no livro Via;
➢ No terceiro dia, faça a purificação com água como se fosse um batismo,
batizando-se em nome de Perséfone e se declarando puro e preparado para os
Mistérios Maiores;
Mistérios Maiores
Calendário:
➢ Dia 1 (15 de setembro): Convocação e preparação dos iniciados. Sacerdotes
declamavam o "prorrhesis" que correspondia ao início dos ritos.
Substituição nos dias de hoje:
107
• Enfeite sua casa/templo novamente, espalhando flores, estátuas
correspondentes e colocando a guirlanda de romãs ou rosas na porta;
• Coloque as nove velas, uma ao lado da outra;
• Coloque os nove incensos, um do lado outro;
• Caso tenha estátuas, coloque a estátua de Perséfone no centro do altar e
a estátua de Hades à sua esquerda e a de Deméter à sua direita;
• Faça banimento/purificação;
• Acenda a primeira vela e o primeiro incenso e declare que o período de
Mistérios Maiores estão abertos e que os 9 dias seguintes serão para
honrar Perséfone;
• Faça libação de vinho, água ou suco;
• Agradeça;
• Faça o banimento final.
108
• Acenda a segunda vela e o segundo incenso e declare que você está pura para
honrar Perséfone;
• Faça libação de vinho, água ou suco;
• Agradeça;
• Faça o banimento final.
109
• Faça banimento/purificação;
• Acenda a quarta vela e o quarto incenso;
• Faça um ritual para a cura de alguém, pode até chamar a Curandeira como extra.
Se quiser, faça um ritual para a própria melhora física ou mental;
• Faça libação de vinho, água ou suco;
• Agradeça;
• Faça o banimento final.
110
• Se puder e quiser, vá a uma festa ou balada e grite o nome do Dionísio.
111
• Faça o banimento final.
I
Escutai, escutai vossa história
Então preparai vossa alma
Para os Mistérios vindouros! E disse o filósofo:
“Três vezes felizes os mortais
Que depois de contemplarem os Mistérios
Descerem ao Hades
Somente eles poderão viver;
Para os demais
Tudo será sofrimento..."
113
Nua, coroada de papoulas
Num véu negro iluminado de cometas
Ela dança em sua carruagem
Orquestrada por cavalos negros
Ela é o coração da melancólica
Assombrosa casa da noite
Patrona das feiticeiras
Rainha dos Mistérios Noturnos
Domadora da humanidade e dos Deuses
Da primeira Rainha nasce Hipnos
E de Hipnos nasce Morpheu,
O criador de Sonhos
Posto em sua cama de ébano
Numa caverna escura
Ornada de flores
E de narcóticos
114
II
115
Deformidades, desilusões
E o ano que é deixado para trás
Abraçai então tristezas
Abraçai profundas marcas
Para que assim
Em conjunto com a vossa Verdade
Inclusive a mais dolorosa e pessoal
Podeis doar três fios de cabelo à Deusa
E morrer em vós
Buscando a purificação e o renascimento
Pois sua filha, Macária, é o instante da transformação
O meio pelo qual a catarse purifica a alma
Não temeis, pois, o fim
Tampouco o recomeço que paira
Na esperança d’um novo caminho
Do amanhecer que já se cala ante a força de Nix
Levantai após o ritual
Como alguém que acorda do túmulo
Tomai as rédeas da vida e caminhai
Com alento e audácia, para a vida diária
Correi até vossos desejos mais impossíveis
116
Sabei ao certo como quereis
E deveis conduzir vossa própria Vontade
Cada qual deve buscar a autorreflexão
Procurai por momentos de meditação
Pois enfrentar o que há de pior em vós
É o passo certeiro para o vindouro
Eis o novo ciclo do renascimento
Eis a verdade e a vida
O começo do intenso e do doloroso
A promessa de cicatrização de antigas feridas!
III
117
E durante o dia se cura das feridas que fez
Junto ao caos de si mesma
Então a flor da terra suga o caldo da Verdade
E finalmente estuda a si mesma
Em busca de seu maior desejo
A perscrutar seu coração e seus medos
É a flor que refaz seus brotos
Desabrocha lindas pétalas
E se curva pela própria beldade
Toda letra de criatividade
A flor é vós,
O tudo
Escutai o quão fecundo
É a alma daqueles que pregam
Os louros de um espírito profundo
E livre!
118
Teus grandes olhos,
Nascidos tristes e cansados,
As dores desconheciam
Tu és a esperança,
Tu és a destruição,
Tu és a fortaleza, a Temível Rainha
Tu és a morte,
119
Tu és a vida,
A Primavera e o Inverno!
120
Venha a mim, oh Grande Deusa
Meu Templo Vivo
Minha morada, meu arrepio!
121
Olímpica Deusa da colheita,
Nossos grãos são filhos de
Teu ventre imaculado e astuto
122
123
Senhor dos Mortos, Deus do Submundo
Pai das riquezas de todos os subsolos
De obscura origem que venceu o Tempo
124
Traze-me riquezas, farturas e preciosidades
Porque falarei teu nome sempre e à vontade
Eu te louvarei até o final dos tempos
125
Hécate, a Vontade
Em busca de deuses e monstros
A segurar a Chave da vida
De ti conhecemos as plantas
O veneno, a necromancia e a feitiçaria
Honramos tua negra face e sabedoria
126
Oh, querida Melinoë,
Primeira grande Filha de Hades e de Perséfone
Mãe de todos os fantasmas e das aparições
127
Oh, Deusa da Boa Morte
Que tu venhas até a mim quando for
A minha hora de partir!
128
Conceda-me o dom de uma passagem tranquila
E eu te receberei alegremente!
129
Oh, Zagreus, oh Dionísio
Deus dos Prazeres e do Vinho
Eu celebro agora contigo
130
131
Oh, patrono de todos os comunicadores
Senhor das mensagens e dos mensageiros
Oh, Deus do discurso eloquente e persuasivo
Tantas metáforas compreendes do além-mundo
Que cada linha é pouca para apropriado culto
És tão sagaz, prudente e diplomata
Que tudo vês e compreendes
Inclusive o próprio silêncio dos deuses
Inventaste o mundo das ideias e das palavras
Bem como a astronomia e a música
Inventaste ainda as ginásticas
E as artes de luta!
Para tantas qualidades intelectuais
Foram muitas viagens e aprendizados
Caminhos pelas mais diversas estradas
Tanta excursão te trouxe belas amizades
E tua hospitalidade é reconhecida
132
Em qualquer lugar do mundo
És o Deus do enriquecimento inesperado
Do sorteio e da boa sorte
Tu levas as almas dos mortos para Hades
Afagas as pragas e os maus agouros
Tu és a representação da cura psíquica!
Oh, Deus mais amigo dos mortais
Nenhuma estranheza para ti é estranha
Orientador sensível e amável
Guia de todos os escritores e sábios
Ouve meu clamor e vem ao meu encontro
Recebe meus sacrifícios e minhas homenagens
Oh, Hermes, meu Patrono Divino
Tu és minha inspiração e tens Domínio
Sobre tudo o que escrevo!
133
• Ritual dos mistérios eleusinos - mitologia grega - prof. Dr. Oscar luiz brisolara
134
135
136
Lua Valentia é filha de Perséfone e de Morpheus.
Ela nasceu em Minas Gerais, mas passou grande parte da sua vida adulta entre São Paulo
e Rio de Janeiro.
Hoje Lua mora em Melbourne, na Austrália.
Em 2009, começou a praticar Magia do Caos e não parou mais. Ela é fundadora do site
Specula e divulga a Corrente 108.
137
Lua espera que sua obra artística seja compreendida de maneira holística, levando em
conta o período de seu nascimento.
luavalentia@gmail.com
138