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Filosofia e Educação

Vila Velha (ES)


2018
Escola Superior Aberta do Brasil

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Almir da Cruz Sousa
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Almir da Cruz Sousa
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Coordenador do Curso de Sistemas de Informação EAD
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Produção do Material Didático-Pedagógico


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Diagramação
Rayron Rickson Cutis Tavares
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Docentes dos Cursos

Copyright © Todos os direitos desta obra são da Escola Superior Aberta do Brasil.
www.esab.edu.br
Apresentação

Caro estudante,

Seja bem vindo à ESAB. A Escola Superior Aberta do Brasil, funda-se no princípio básico
de atuar com educação a distância, utilizando como meio, tão somente, a internet. Em
2004,foi especialmente credenciada para ofertar cursos de pós-graduação a distância,
via e-learning, utilizando-se de software próprio denominado Campus Online.

Em 2009 foi credenciada com Instituição de Ensino Superior – IES, através da portaria
MEC nº 1242/2009, de 30 de dezembro de 2009, ocasião em que também foi autorizada
a ofertar o curso de pedagogia – licenciatura, na modalidade presencial, conforme
portaria MEC nº 14/2010, de 9 de janeiro de 2010.

Em outubro de 2012 recebeu o Prêmio Top Educação 2012, da Editora Segmento, sendo
reconhecida como a Melhor Instituição de Ensino EAD para Docentes.

Em 2013 é aprovada para a oferta dos cursos de: Administração (Bacharelado);


Pedagogia (Licenciatura) e Sistemas de Informação (Bacharelado), todos na
modalidade EAD, com avaliação máxima das comissões avaliadoras.

Na disciplina de Filosofia da Educação estudaremos prioritariamente os fundamentos


da Filosofia e da Educação, bem como a relação histórica estabelecida entre as duas.
Ao longo de 24 unidades de estudo, vamos desde a origem da filosofia, passando pelos
principais filósofos e suas contribuições para educação, chegando até aos dias atuais,
na educação da dita sociedade pós-moderna.

Para isso, utilizaremos como ferramental teórico os autores: Aranha (2006), Chauí
(2002), Luckesi (2004), e ainda, como leitura complementar, Mattar Júnior (2010),
Morin (2000), Rocha (2004), Trigo (2009). Convidamos você a ficar atento também às
seções de estudo complementar e saiba mais, nestas você encontrará sugestões de
leituras, filmes, sites entre outros encaminhamentos que auxiliarão na compreensão
do conteúdo das disciplinas no decorrer do curso.

Bom estudo!

Equipe Acadêmica da ESAB


Objetivo
O nosso objetivo é apresentar as principais doutrinas filosóficas e a construção do
conhecimento ao longo da história, as relações estabelecidas e as contribuições da
Filosofia para a Educação. A partir desse enfoque, observaremos também como a
educação se configura historicamente, transparecendo a sociabilidade de cada
época.

Competências e habilidades
• Conhecer a natureza da Filosofia e suas imbricações com a Educação.
• Conhecer as principais doutrinas filosóficas e a construção do conhecimento ao
longo da história.
• Utilizar o pensamento filosófico para compreender os fenômenos educacionais.
• Aplicar as questões filosóficas para responder as problemáticas educacionais que se
apresentam.

Ementa
A questão do conhecimento ao longo da história do pensamento ocidental. A filosofia:
suas relações com os aspectos políticos, econômicos, sociais e educacionais. Questões
epistemológicas nas diferentes correntes filosóficas. A Filosofia da Educação. A
influência da Filosofia na teoria e prática da Educação brasileira. Pressupostos da
abordagem histórico-crítica da educação brasileira.
Sumário
1. A natureza da Filosofia e a Educação................................................................................6
2. A educação no Mundo Antigo........................................................................................12
3. O mito como gênese da Filosofia....................................................................................17
4. Os primeiros filósofos: pré-socráticos.............................................................................22
5. A Filosofia e a preocupação com o homem e a sociedade...............................................27
6. Os sofistas e seu método de educação............................................................................32
7. Sócrates: a educação a partir do diálogo........................................................................37
8. Platão: a institucionalização e abstração do saber.........................................................43
9. Aristóteles: a natureza como fonte do saber...................................................................50
10. O helenismo e a disseminação da cultura grega.............................................................57
11. Os Pais da Igreja e o uso da Filosofia no combate ao gnosticismo...................................63
12. Santo Agostinho e a educação como afirmação da fé.....................................................69
13. A escolástica e as primeiras universidades.....................................................................76
14. Tomás de Aquino e a retomada da cultura clássica.........................................................82
15. O século das luzes: Iluminismo e Renascimento.............................................................87
16. Iluminismo e Renascimento e a transformação no pensamento ocidental.....................92
17. Rousseau e a realização da natureza humana................................................................97
18. A Filosofia moderna: empirismo x racionalismo...........................................................102
19. Kant e a solução para o dilema moderno.....................................................................109
20. O materialismo histórico e dialético de Marx e Engels..................................................114
21. A educação tradicional no Brasil..................................................................................121
22. A filosofia e o movimento da Escola Nova no Brasil......................................................126
23. Paulo Freire: a educação crítica no Brasil......................................................................131
24. A educação na pós-modernidade.................................................................................137
Glossário.............................................................................................................................144
Referências.........................................................................................................................159
A natureza da Filosofia e a
1 Educação
Objetivo
Apresentar a natureza da Filosofia e suas imbricações com a
Educação.

Certamente você está se perguntando: afinal, o que exatamente é a


Filosofia da Educação? Ou ainda: como a Filosofia serve ou se relaciona
com a Educação? Nesta unidade, tentaremos respondê-las e, quem sabe,
instigá-lo a elaborar muitas outras questões.

Para iniciarmos este diálogo e buscar uma melhor compreensão sobre o


que seria essa tal Filosofia da Educação, é importante inicialmente definir
a filosofia e a educação.

1.1 A Filosofia
Você já ouviu falar muito de Filosofia, não é mesmo? É muito provável
que esse assunto não seja totalmente novo para você, e que você tenha
alguns conceitos previamente elaborados. Que tal utilizá-los e arriscar
definir o que é Filosofia? Rascunhe em suas anotações o seu conceito de
Filosofia e, mais tarde, ao final desta unidade, retome-o.

Feito isso, vamos tentar definir Filosofia, o que não é uma tarefa fácil.
Qualquer definição de Filosofia esbarra na complexidade do termo,
pois, se dissecarmos a morfologia da palavra filosofia, chegaremos a dois
termos gregos: Philos (amigo) e Sophia (sabedoria). Dizer que o filósofo
é simplesmente um amigo da sabedoria não nos auxilia a definir o que é
Filosofia.

Quando buscamos definir algo e nos deparamos com uma aporia, ao


invés de tentar definir positivamente, explicando o que é tal coisa,

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podemos buscar o caminho inverso, definindo negativamente, ou seja,
dizendo o que não é tal coisa.

Dessa forma, convido você a realizar esse caminho inverso, definindo a


Filosofia negativamente. Para isso, segundo Chauí (1996) é necessário
distingui-la das abordagens mítica, artística, senso comum e científica.

• A abordagem mítica: seria uma compreensão intuitiva da realidade,


em que não precisamos fundamentar nossos argumentos ou
conhecimentos. Ou seja, exige que se acredite na explicação sem
discutir ou debater seus fundamentos que muitas vezes remetem a
figuras fantásticas ou à origem divina dos fenômenos, prevalecendo a
fé e a crença.
• A arte: também é um conhecimento intuitivo da realidade, porém a
arte apela para a nossa imaginação falando aos nossos sentimentos.
O artista busca uma compreensão original da realidade, provocando
naquele que usufrui da obra de arte uma nova experiência.
• O senso comum: seria o conhecimento herdado do grupo social
em que convivemos. Reproduzimos esse conhecimento sem muitos
questionamentos ou fundamentações, ainda que do senso comum
derivam o bom senso, que seria uma abordagem relativamente
crítica dos valores e saberes recebidos, buscando adequá-los às novas
situações.
• O conhecimento científico: é caracterizado pela experimentação
sistemática. A partir disso, os cientistas descobrem regularidade
nos fenômenos e elaboram leis gerais e teorias, apesar do status de
verdade que o conhecimento científico carrega. Esta abordagem
reduz nossa experiência de mundo às questões empíricas, ignorando
nossas emoções, crenças, intuições, imaginação, afetividade etc.

Apesar de a Filosofia não ser nenhuma das abordagens citadas


anteriormente, ela faz uso de muitos recursos do mito, do senso comum,
da ciência e da arte – como intuição, sistematização, imaginação etc.
Podemos afirmar que sobre qualquer tema que se dedique à arte, religião,
ciência etc., a Filosofia possui um olhar específico e característico.

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Agora que você já sabe o que não é Filosofia. Vamos tentar descobrir o
que é a Filosofia ou para que a Filosofia?

Segundo Chauí (1997, p. 12), certa vez um filósofo, ao ser questionado


sobre a existência da filosofia, respondeu: “Para não darmos nossa
aceitação imediata às coisas, sem maiores considerações”. Essa afirmação
sugere que a Filosofia é radical, e vai a fundo não aceitando as “verdades”
ditas óbvias, desconfiando do naturalmente aceito. Por exemplo, uma
atitude crítica não aceita que algo simplesmente seja belo, mas pergunta
o porquê é belo e o que é o belo.

A isso, dá-se o nome de atitude filosófica, ou atitude crítica. As


questões centrais da atitude filosófica são: “o que é?”; “como é?”; e “por
que é?”.

Outra característica importante da Filosofia é a reflexão, que consiste


no pensar, no voltar-se para si mesmo, ou seja, o pensamento se
interroga, se pergunta as razões pelas quais pensamos, agimos ou
dizemos determinadas questões, além de indagar o conteúdo dos nossos
pensamentos, nossas ações e falas e, por fim, questionar sua finalidade. As
questões centrais da reflexão filosófica são: “por quê?”, “o quê?” e “para
quê?”.

A Filosofia, portanto, é uma atividade caracterizada por uma atitude e


reflexão própria, além de ser um pensamento sistemático partindo de
princípios comuns se relacionando em um todo coerente.

1.2 A educação
Agora que você já estudou um pouco mais a fundo o que é a Filosofia,
convido você a realizar uma reflexão filosófica. Vamos pensar juntos “o
que é”, “por que é” e “para quê” serve a educação.

Quando você pensa em educação, qual a primeira coisa que vem a sua
cabeça? É possível que, imediatamente, você visualize uma instituição
formal de ensino. Acertamos? Mas o conceito de educação ultrapassa
o conceito de educação institucionalizada, sendo uma característica

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exclusivamente humana e que acompanha o nosso desenvolvimento e
constituição como ser social. Nesse sentido, Aranha (2006) afirma que
a educação é um conceito universal, amplo e que supõe o processo de
desenvolvimento integral do indivíduo, de sua capacidade física, moral e
intelectual. A educação visa à formação de caráter e personalidade, e não
apenas à formação de habilidades.

Assim como fizemos o caminho inverso, dizendo o que não é filosofia,


podemos começar dizendo o que não é educação. Ao contrário do
conceito difundido no âmbito do senso comum, de que educação seria
uma transmissão do conhecimento de uma geração para outra, podemos
dizer que a educação não é uma simples propagação de conhecimento,
mas sim um movimento que possibilita que o novo rompa com o velho.
Assim, mais que transmitir conhecimento, a educação visa criar/construir
conhecimentos, cultura e possibilitar a socialização e a humanização,
onde a partir da educação o humano se constrói e reconstrói
historicamente.

Para Aranha (2006, p. 67),

[...] É a educação que mantém viva a memória de um povo e dá condições para a


sua sobrevivência material e espiritual. A educação é, portanto, fundamental para a
socialização e a humanização, com vista à autonomia e à emancipação. Trata-se de
um processo que dura a vida toda e não se restringe à mera continuidade da tradição,
pois supõe a possibilidade de rupturas, pelas quais a cultura se renova e o ser
humano faz a história.

Segundo a autora, se distinguem três tipos de educações:

• educação informal: realizada pela família, amigos e meios de


comunicação. Geralmente transmitem valores e conhecimentos da
própria cultura;
• educação não formal: realizada por organizações não
governamentais ou por meio de programas públicos. Geralmente
com esse tipo de educação busca-se atingir a um grupo social
determinado. Ex: programa de Alfabetização Jovens e Adultos;

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• educação formal: realizada por instituições privadas e públicas que
são oficializadas por meio do poder público.

Desta forma, podemos afirmar que o processo educacional não é


uniforme, mas variável de sociedade para sociedade. Algumas sociedades
aceitam mais facilmente as mudanças propostas pela educação do que
outras – como as tradicionais.

O termo educar vem do latim educare – derivado de educere –, verbo composto do


prefixo ex (fora) e ducere (conduzir, levar), significando literalmente “conduzir para fora”,
ou seja, conduzir de um estado a outro, modificar em certa direção.

Vale dizer que o ato educativo é social, e a partir da interação entre


seres humanos, visa transformá-los em cada vez mais sociais. Segundo o
grande educador Paulo Freire (2005, p. 78), “Ninguém educa ninguém,
ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados
pelo mundo”.

No ato educativo, podemos distinguir três componentes:

• o agente educador (pessoa, grupo, meio social etc.);


• a mensagem transmitida (conteúdo, habilidade, método etc.) e
• o agente educado, ou educando (estudante, grupo de estudantes,
geração etc.).

Assim, a educação seria uma mediação entre o indivíduo e a sociedade,


e por isso a educação não pode ser compreendida fora do seu contexto
social e histórico.

A educação se configura para além das instâncias educativas institucionais


(creche, escola, universidade etc.). Como seres sociais, aprendemos em
todos os ambientes, pois estamos em constante interação social. No
entanto, as sociedades organizadas estruturalmente criam desde cedo
espaços privilegiados de ensino/aprendizagem, que chamamos de escola.

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1.3 A Filosofia e a educação
Antes de seguirmos com a leitura, a partir da delimitação dos
conceitos de Filosofia e de educação, procure refletir sobre as principais
contribuições da Filosofia no campo da educação.

Em uma primeira definição, é possível pensarmos na Filosofia da


educação como uma disciplina da filosofia que possibilita uma reflexão
crítica sobre a educação, uma aplicação da filosofia sobre a educação.
Quando pensamos criticamente o ato educativo, ou seja, quando usamos
a filosofia para pensar a educação, ela nos remete às bases desta: “que
tipo de pessoa se quer formar com o ato educativo”, “para qual sociedade
formamos essas pessoas”. Ao pensar o conteúdo do ato educativo, a
filosofia se pergunta “o que ensinamos?” e “como ensinamos?”, pois a
educação não é um ato neutro, não se separa da ideologia e do poder.
A filosofia da educação busca responder a essas questões desvelando,
denunciando e aprimorando os discursos e as práticas pedagógicas.

No decorrer deste material, buscaremos compreender melhor as


imbricações históricas da filosofia com a educação e como elas se
interligam. Essas primeiras definições, tanto de educação quanto
de filosofia, são apenas aproximações dos conceitos, pois não estão
isentas de críticas e complementos. Seria uma tarefa difícil – se não
impossível – apresentar uma definição de filosofia e de educação em
apenas uma unidade deste caderno de estudo. No decorrer da disciplina,
aprofundaremos esses conceitos, construindo uma filosofia da educação.

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2 A educação no Mundo Antigo
Objetivo
Caracterizar a educação antes do surgimento da Filosofia e seus
elementos constitutivos.

Como vimos na unidade anterior, a educação sempre esteve presente nas


organizações humanas, por ser uma atividade exclusivamente humana e
por nos constituir como seres sociais que somos. Como trataremos, ao
longo desta disciplina, a relação da filosofia com a educação, importa
saber de que forma esta se organizava antes da filosofia e assim observar
as mudanças ocorridas na educação a partir do advento da filosofia. Nesta
unidade, abordaremos de forma sucinta como era organizada a educação
antes do século V a.C.

Nos primeiros agrupamentos humanos, denominados tribos, o trabalho


era coletivo e não havia propriedades privadas, o que formava uma
sociedade homogênea: sem classes, sem estado, sem comércio.

Para sua reflexão


Você já imaginou uma sociedade sem escolas?
Você acredita que as escolas sempre existiram?
Como seria a sociedade hoje se não tivéssemos
acesso às escolas?
As respostas a essas reflexões formam parte de sua
aprendizagem e são individuais, não precisando
ser comunicadas ou enviadas aos tutores.

As escolas nem sempre existiram. No entanto, as instituições formais de


ensino são praticamente onipresentes nas sociedades modernas e é por
meio delas que socializamos, aprendemos e construímos o conhecimento;

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e que também somos preparados para participar e nos enquadrar em uma
sociedade.

Apesar da dificuldade de imaginar uma sociedade sem escola, durante


muito tempo os primeiros agrupamentos humanos, como as tribos,
não possuíam instituições de ensino. A educação era realizada de forma
difusa: não havia um responsável pela transmissão do conhecimento
e nem mesmo um ambiente dedicado exclusivamente para isso.
Todos eram educadores/mestres e todos eram educandos/aprendizes
constantemente. Apesar de haver tarefas distintas para homens e
mulheres, todos eram professores/estudantes.

Nessas comunidades, as crianças aprendiam imitando os adultos; e os


adultos, imitando o adulto que melhor sabia fazer determinada coisa, ou
seja, aprendiam para a vida e por meio da vida. Nessa forma de educação,
o saber era integral, abrangendo todo o conhecimento da tribo: todos
tinham acesso ao saber produzido pela comunidade.

Ainda que alguns conhecimentos se destacassem e encontrassem seu


ápice em um ou outro indivíduo, como no caso do chefe ou do feiticeiro,
a distinção do conhecimento tinha como base o prestígio e não resultava
em um privilégio.

A base pedagógica era a oralidade, que perpetuava a memória da tribo a


partir dos mitos e rituais. Desse modo, o mito exaltava comportamentos
considerados ideais, condenava comportamentos considerados
prejudiciais e possuía um forte caráter moral.

Para exemplificar esse caráter moral do mito, convido você a ler o “Mito
de Sísifo” (INFOPEDIA, 2003-2012):

Sísifo, rei da Tessália e de Enarete, era o filho de Éolo. Fundador da cidade de Éfira,
que mais tarde veio a chamar-se Corinto, e também dos jogos de Ístmia (ou Ístmicos).
Sísifo tinha a reputação de ser o mais habilidoso e esperto dos homens, e por essa
razão dizia-se que era pai de Ulisses. Sísifo despertou a ira de Zeus quando contou
ao deus dos rios, Asopo, que Zeus tinha sequestrado a sua filha Egina. Zeus mandou
o deus da morte, Tanatos, perseguir Sísifo, mas esse conseguiu enganá-lo e prender

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Tanatos. A prisão de Tanatos impedia que os mortos pudessem alcançar o Reino das
Trevas, tendo sido necessário que fosse libertado por Ares. Foi então que Sísifo, não
podendo escapar ao seu destino de morte, instruiu a sua mulher a não lhe prestar
exéquias fúnebres. Quando chegou ao mundo dos mortos, queixou-se a Hades,
soberano do reino das sombras, da negligência da sua mulher e pediu-lhe para voltar
ao mundo dos vivos apenas por um curto período, para castigá-la. Hades deu-lhe
permissão para regressar, mas quando Sísifo voltou ao mundo dos vivos não quis mais
voltar ao mundo dos mortos. Hermes, o deus mensageiro e condutor das almas para o
além, decidiu então castigá-lo pessoalmente, infligindo-lhe um duro castigo, pior do
que a morte. Sísifo foi condenado para todo o sempre a empurrar uma pedra até ao
cimo de um monte, caindo a pedra invariavelmente da montanha sempre que o topo
era atingido. Este processo seria sempre repetido até a eternidade.

Sísifo entrou para a tradição como um dos maiores ofensores dos


deuses e foi castigado por toda eternidade por se valer da sua astúcia
para ludibriar homens e deuses. Entre as muitas lições morais que esse
mito intenta passar, esta sugere a obediência aos deuses e o não uso de
artifícios escusos nas relações sociais.

Os mitos sempre estiveram presentes em todas as tradições e


sobreviveram socialmente assumindo várias roupagens, seja como lenda,
fábula ou história infantil. Afinal, quem não se lembra das histórias
contadas nos tempos de criança, dizendo que não devia se aceitar doce de
estranhos nem andar sozinho na rua? Sempre havia um elemento trágico
para dissuadir o comportamento considerado ruim.

Às margens do mar Egeu, de onde surgiu a civilização grega e a filosofia,


a educação realizada a partir dos mitos era declamada na forma de
poemas. O mais famoso poeta dessa época foi Homero, que criou, ou
reuniu, a partir de uma série de poemas menores, as epopeias Ilíada e
Odisseia.

A Ilíada e a Odisseia tinham como objetivo incutir no cidadão e


no guerreio o espírito de respeito às leis, ao destino e aos deuses. O
indivíduo devia almejar uma vida de resignação ao seu destino e de
submissão absoluta à vontade dos deuses; ter sido escolhido pelos deuses
era sinal de força, valor e excelência. Essa educação visava à formação
integral, a paideia.

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A paideia grega tinha por objetivo a educação do corpo e da mente para, assim, realizar
plenamente o ser humano. A partir das poesias de Homero, Telêmaco e Aquiles foram
alçados à condição de modelos de excelência moral e física, pois exemplificavam a
prudência, a lealdade, a hospitalidade, a honra, a glória, o desprezo pela morte e tantas
outras virtudes gregas durante toda a sua existência.

A partir da invenção da escrita, o mito toma uma proporção totalmente


nova e, consecutivamente, a educação também. A necessidade da
invenção da escrita ocorreu quando as tribos, por causa das guerras,
começaram a produzir um excedente da agricultura, que precisava
ser estocado e controlado. Isso propiciou também o surgimento das
primeiras cidades voltadas para o comércio, em que a escrita teve um
papel fundamental para administração dos negócios.

Com o advento das cidades, as sociedades se complexificaram e se


fragmentaram, passando a existir as divisões sociais: as mulheres
ficaram restritas as casas, tornando-se dependentes dos homens; e os
segmentos sociais se especializaram, surgindo as classes dos governantes,
comerciantes, produtores, escravos, soldados etc., hierarquizando a
riqueza e o poder, acabando com a forma coletiva de produção utilizada
nas sociedades tribais.

Essa hierarquização exigiu uma nova forma de educação, que outrora


era difusa e igualitária, mas que passou a ser dividida: de um lado as
classes privilegiadas, que recebiam uma educação para o sagrado e a
administração; do outro lado as classes subalternas, que recebiam um
adestramento para as mais diversas atividades necessárias para a produção
da vida nas cidades.

Essa dualidade na educação impediu que a grande massa tivesse acesso


ao ensino formal, ficando submetida à educação familiar e informal. No
entanto, a educação formal, oferecida às classes dominantes, era bastante
dependente do sagrado, ficando restrita a uma série de normas religiosas
e morais que visavam perpetuar tradições e evitar transgressões.

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O conhecimento nessa época possuía um forte caráter prático, em que
se apreendia o que era essencial para desenvolver determinada atividade.
Além disso, o conhecimento mais teórico e abstrato estava totalmente
subjugado ao conhecimento religioso, como era o caso da matemática,
que por muito tempo foi considerada uma atividade mística, organizada
a partir de grupos dedicados a essa arte. Foi a partir dessa educação
sagrada e mítica que a civilização grega nos legou a Filosofia.

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3 O mito como gênese da Filosofia
Objetivo
Destacar a transformação do pensamento mítico ao pensamento
racional e sistemático da Filosofia.

Você sabe qual a origem da Filosofia? Comumente, as pessoas associam


a origem da Filosofia à Grécia Antiga por causa da associação aos
pensadores famosos, como Sócrates, Platão e Aristóteles. Porém, essa
explicação não é consenso entre os estudiosos da área. Você deve estar
pensando: mas eu sempre ouvi dizer que a Filosofia é grega! Fique calmo.
Vamos tentar esclarecer melhor tudo isso.

Para Chauí (1996) ainda hoje muitas são as discussões sobre as origens
da Filosofia. Por um lado, temos os teóricos que defendem o surgimento
da Filosofia a partir da influência das culturas orientais; por outro
lado, teóricos que afirmam a origem plenamente grega da Filosofia,
argumentando que não sofreu nenhuma influência de outras culturas – o
chamado “milagre grego”.

Porém, estudiosos mais recentes de arqueologia, história, linguística


etc. buscam um meio-termo entre as duas teses e argumentam que não
se pode negar a influência oriental na cultura grega e no surgimento
da Filosofia, mas também não se pode negar a engenhosidade e
originalidade dos gregos. Para você, qual a tese lhe parece mais coerente?
Vamos conhecer cada uma dessas explicações.

Os primeiros autores a defender a influência oriental na filosofia foram


os pensadores judaicos e os pais da igreja, nos séculos II e III d.C. Essas
discussões foram realizadas devido à grande influência da filosofia grega
no pensamento romano, sendo que a filosofia era considerada a mais
pura e avançada forma de conhecimento.

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Os pensadores judeus, como Filo de Alexandria, afirmavam que a
filosofia era filha das culturas orientais, buscando equipará-la aos escritos
de Moisés, remontando assim a uma origem comum tanto as leis
judaicas quanto a filosofia, pois ambas teriam se originado no Egito. Já
os pais da igreja intentavam defender a originalidade e superioridade
do pensamento cristão em contraste com a filosofia, pois sendo filha
do misticismo e das superstições orientais não se compararia aos
ensinamentos de Jesus como perfeição da sabedoria humana.

Apesar de não ser amplamente aceita, a tese de que a filosofia teria raízes
orientais não foi muito discutida. Apenas no século XIX passou-se a
defender abertamente a filosofia como produto exclusivo da cultura
grega, o chamado “milagre grego”. Para os defensores dessa tese, qualquer
influência recebida pelas culturas orientais foi de tal forma transformada
que não se poderia afirmá-las. A filosofia teria criado formas tão
distintas que em nada se assemelharia às outras culturas, sendo algo
exclusivamente grego.

Os gregos eram comerciantes e se relacionavam comercialmente


com muitos povos, tendo acesso assim a muitas culturas. Mas, por
viverem em uma região montanhosa de difícil acesso, não foram
invadidos e colonizados pelos grandes impérios da época, e dessa forma
desenvolveram uma cultura própria.

Apesar de terem recebido influências – como na agrimensura, genealogia,


astrologia – de povos como egípcios, caldeus, babilônicos e persas,
os gregos imprimiram a essas influências uma identidade própria,
inaugurando uma nova forma de pensar, dando um sentido mais abstrato
ao uso desses conhecimentos. Como no caso da astrologia, que se
limitava a prever o futuro de uma forma mística, os gregos aplicaram esse
conhecimento na agricultura e nas navegações, utilizando-o para realizar
previsões meteorológicas, promovendo assim um pensamento mais
sistemático que culminaria na filosofia.

Outra herança que os gregos receberam e aprimoraram, e que foi


fundamental para o surgimento da filosofia, foi o mito.

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O mito é a base educativa e social das sociedades mais simples, e que acaba se tornando
muitas vezes a religião das sociedades mais complexas. Como narrativa fantástica,
o mito explica com certa racionalidade os mistérios que sempre atormentaram a
humanidade, questões como: por que as coisas sempre mudam, por que após uma
estação vem outra (e sempre a mesma sequência), por que nascemos, por que
morremos etc. O mito auxilia nessas explicações, buscando responder a esses anseios,
porém a racionalidade do mito se limita aos símbolos e às metáforas.

Segundo Aranha (2006), os gregos deram feições humanas aos mitos,


tornando humanos seus deuses e divinizando os homens. Os mitos dos
povos que cercavam os gregos, em sua maioria, partiam da dicotomia
entre bem e mal: havia uma divindade do bem e outra do mal, assim
como o dia e a noite. Os gregos, a partir de Homero e Hesíodo, que são
os grandes formadores da cultura grega, apresentaram deuses sujeitos às
paixões e fraquezas humanas; e também homens como Aquiles, Héracles,
Heitor etc. com características divinas de bondade e sacrifício em prol do
outro ou do coletivo.

O mito, como narrativa que pretende explicar ou revelar algo, possui


forte caráter pedagógico, utilizado na educação antiga como base para
questões simples ou de cunho social. Os gregos explicavam, por exemplo,
que o Sol era o deus Apolo que saía todos os dias cruzando os céus, e
o porquê de determinada pessoa ser governante. A explicação, em sua
maioria, se reportava à origem divina dos governantes ou benefícios que
essas pessoas ou famílias recebiam dos deuses.

Dessa forma, o mito buscava explicar não apenas a natureza, mas


também a sociabilidade. A autoridade do mito repousava sobre o
narrador. A pessoa que narrava o mito esteve presente nos eventos
do acontecido ou foi agraciado pelos deuses com o dom de narrá-lo.
A exemplo disso, basta verificar como Homero inicia a “Ilíada” e a
“Odisseia”, solicitando inspiração às musas. Na “Odisseia”, o poeta diz
“Fala-me musa...”, e na “Ilíada”, “Canta a cólera ó deusa...”.

Os mitos influenciaram o surgimento da filosofia por serem as primeiras


explicações para as questões sobre as quais esta se debruçaria. A reflexão

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crítica, como característica da filosofia, ao se deparar com as limitações
e contradições dos mitos, foi reformulando-os e racionalizando-os,
transformando-os em uma explicação totalmente nova. Para Chauí
(1996), é possível apontar três grandes diferenças entre os mitos e a
filosofia:

• o mito narrava como as coisas tinham acontecido ou como foram no


passado; a filosofia se preocupa em explicar por que as coisas são na
totalidade do tempo (passado, presente e futuro);
• o mito explica a partir de fatos como nascimentos, mortes,
rivalidades e alianças entre os seres divinos ou entre os seres divinos
e humanos; já a filosofia busca explicar a partir de elementos
primordiais, despersonalizados como água, terra, fogo e ar;
• o mito não busca resolver as contradições, aliás estas não interferem
na narrativa, pois ela tem como fundamento a autoridade do
narrador; a filosofia, por outro lado, não admite contradições e busca
criar um todo ordenado e sistemático, baseado na racionalidade que
é comum a todos os humanos.

Estudo complementar
O mito da caverna é um dos mais populares entre
os pensamentos de Platão. É por meio dele que
o filósofo pregou a formação ética e política do
indivíduo. Para aprofundar esse assunto, clique
aqui e leia o artigo “A importância da educação na
formação do indivíduo em Platão”.

O mito, com sua função de narrar simbolicamente as origens, além de


explicar dando sentido a tudo que há evidenciando um todo ordenado,
também revela tudo o que há. Dessa maneira, o mito seria a forma a
partir da qual evoluiu a filosofia. As primeiras formas de fazer filosofia,
chamadas pré-socráticas, foram influenciadas pelos mitos. São chamadas
assim por serem anteriores ao patrono da filosofia, Sócrates, mas isso é
tema da próxima unidade.

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Fórum
Caro estudante, dirija-se ao Ambiente Virtual de
Aprendizagem da instituição e participe do nosso
Fórum de discussão. Lá você poderá interagir com
seus colegas e com seu tutor de forma a ampliar,
por meio da interação, a construção do seu
conhecimento. Vamos lá?

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Os primeiros filósofos:
4 pré-socráticos
Objetivo
Revisitar os primeiros filósofos, as primeiras formas de filosofia e seu
enfoque ontológico.

Para trabalhar a origem clássica, ou ocidental, da filosofia, é importante


caracterizar os diferentes movimentos realizados nesse período conforme
a influência de diferentes pensadores.

Estudo complementar
Como diversos pensadores serão citados nesta
unidade, procure conhecê-los um pouco melhor
consultando um dicionário de filosofia. Que tal
o clássico de Nicola Abbagnano? Aproveite para
investigar os conceitos trabalhados nas escolas
citadas no decorrer da unidade.

É provável que você já tenha ouvido, visto ou presenciado alguma sátira


à filosofia em que os pensadores são retratados como admiradores da
natureza, e que, à mera divagação, fazem grandes descobertas: “Eureka!”.
Essas sátiras dizem respeito justamente a uma classe de filósofos da
civilização grega, a qual estudaremos nesta unidade: a pré-socrática.

Inicialmente, para entendermos os filósofos pré-socráticos, urge


delimitar as balizas que os diferenciam de Sócrates. Para além da
questão cronológica, a expressão pré-socráticos se refere a uma questão
qualitativa, pois designa um grupo de filósofos conhecidos pelas suas
reflexões acerca da natureza (phýsis). Sócrates é um marco no sentido em
que evidencia a reflexão filosófica acerca do próprio ser humano.

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O termo pré-socrático é particularmente recente. Hermann Diels
popularizou o termo em 1903 ao publicar “Os fragmentos dos pré-
socráticos”, unificando assim uma série de filósofos que antecederam
cronologicamente e qualitativamente Sócrates. Antes de Diels, Nietzsche
chamara esses filósofos de pré-platônicos, incluindo na lista o próprio
Sócrates. Antes de Nietzsche, Hegel os denominou pré-aristotélicos,
inserindo também Platão e Sócrates na divisão qualitativa.

Ainda que cada autor defenda os fundamentos para seu modelo de


divisão, há algo em comum às três caracterizações: a ênfase em Sócrates,
Platão e Aristóteles como avatares que marcam a transição entre a
filosofia antiga, realizada em muitas partes da Grécia, e a filosofia clássica,
da experiência de Atenas.

Para debater a ideia do “milagre grego” – explanada na unidade anterior


–, podemos observar a influência do mito ainda presente no modo
de fazer filosofia dos pré-socráticos ao verificar que seu objetivo é
essencialmente buscar um algo que harmonizasse todas as coisas. Esse
algo poderia ser concretizado por meio da busca do explicativo da
natureza. No mito, esse princípio era objetivado nas divindades, o ser
transcendental.

Os pré-socráticos habitualmente são divididos em escolas filosóficas, mas


esta divisão não é aceita de forma unânime entre os comentadores, pois
alguns pré-socráticos tinham pontos de vista tão divergentes que não se
pode dizer que tenham pertencido a uma mesma escola. Este movimento
filosófico perdurou pelos séculos VI e V a.C. sendo suas principais
escolas:

• escola jônica: centrada na cidade de Mileto, na Jônia, entre seus


principais nomes se encontram Tales, Anaximandro, Anaxímenes,
Heráclito, Anaxágoras, Arquelau e Diógenes de Apolônia;
• escola eleática: situada no sul da Itália na cidade de Eléia, esta escola
revelou quatro grandes filósofos: Xenófanes, Parmênides, Zenão e
Melisso;

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• escola Pitagórica: recebeu o nome do seu fundador, Pitágoras de
Samos. Outros pensadores importantes dessa escola foram: Filolau,
Arquitas e Alcmeón.

4.1 A arché como princípio explicativo


Para Chauí (1996), o primeiro pré-socrático e, consecutivamente, o
primeiro pensador considerado filósofo foi Tales de Mileto, famoso
matemático que ficou conhecido pelo teorema de Tales. Conta-se que
Tales conseguiu medir a altura de uma pirâmide com base na relação
entre o tamanho de sua sombra e a sombra da pirâmide. Por meio de seu
experimento, Tales estabeleceu a proporção entre a sombra e o objeto que
projeta a sombra. Além da matemática, Tales fez incursões nas ciências
da física e da filosofia. Para ele, a substância essencial de todas as coisas
(arché) era a água.

Tales pertencia à escola Jônica, à qual também pertencia Anaximandro,


um discípulo seu que discordava do mestre ao afirmar que arché deveria
ser o ilimitado (a-perion). Anaxímenes, discípulo de Anaximandro,
afirmava que a arché era o ar, e Heráclito de Éfeso, por sua vez, defendia
que todas as coisas se originavam do fogo.

No período da guerra entre gregos e persas, a escola Jônica se extinguiu e


a filosofia foi expandida a outros locais da Grécia. É nesse ínterim que se
revela Pitágoras de Samos, filósofo que considera o número como a arché.
Influenciando profundamente a ciência moderna, Demócrito afirmava
que o princípio de tudo era o átomo, já Parmênides defendia o ser como
a origem de todas as coisas.

Talvez a ideia da arché fundamentada em elementos da natureza lhe


pareça absurda, mas lembre-se de que por meio de uma suposição inicial
foram desenvolvidas pesquisas científicas para que um dia pudéssemos
afirmar que a menor unidade de matéria é o átomo. E mais tarde
descobriu-se que o átomo continha unidades de matéria ainda menores
– prótons, elétrons e nêutrons – e, assim, o próprio conceito de átomo
foi questionado, pois, etimologicamente, átomo significa sem divisão. E,
para você, existe um algo que explique o princípio de tudo?

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4.2 O ser e o surgimento do racionalismo
Outro grande embate desse período, que de certa forma dividiu a
filosofia, ocorreu entre Parmênides e Heráclito. Enquanto o primeiro
defendia o imobilismo do ser, o segundo defendia, justamente, o
mobilismo. Vamos entender melhor essa disputa.

Parmênides e seus discípulos, ao defenderem o ser como arché,


afirmavam que não era possível existir um não ser. Radicalizando esse
pensamento, Zenão negou a própria ideia de movimento, conhecido
como Paradoxo de Zenão: uma flecha lançada no espaço não se move,
pois a flecha no seu deslocamento ocupa um espaço após o outro.
Em todos esses espaços ela é flecha – contida nos seus limites – e,
dessa forma, está sempre parada. A origem do cinema pode elucidar
o entendimento dessa questão, pois suas obras são compostas pela
reprodução sucessiva de quadros estáticos. O movimento é resultado da
apresentação sequencial das cenas.

Ao ser questionado sobre a transformação das coisas, Parmênides


argumentou que nossos sentidos são falhos em apreender o ser, o que
apenas a razão poderia fazer. É assim inaugurada uma corrente filosófica
intitulada racionalismo, que apregoa a superioridade da razão sobre os
sentidos.

Tendo por base o fogo como arché, Heráclito afirmava a mobilidade


radical e a transformação constante do ser. Tornou-se dito popular a
afirmação de Heráclito de que “não é possível banhar-se duas vezes no
mesmo rio”, pois o rio nunca é o mesmo devido ao movimento constante
das águas. Seu discípulo Crátilo radicalizou a teoria ao afirmar que sequer
é possível mergulhar uma vez no mesmo rio, pois “a água que molha a
ponta do pé não é a mesma que molha o calcanhar”.

A afirmação do movimento evidencia a contradição absoluta do ser


expressa nas dualidades – dia e noite, quente e frio, amor e ódio. Assim,
Heráclito dá início à dialética e reafirma a constante transformação do ser
humano e da natureza. Ainda, lança o princípio do Empirismo, doutrina

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filosófica que privilegia os sentidos em detrimento da razão ao abordar a
origem do conhecimento.

Apesar de a educação remeter-se a um local específico nesse princípio


da filosofia, sua configuração não deve ser comparada a uma educação
institucionalizada, como a de uma escola. Esse modelo educativo era
restrito a poucos escolhidos, geralmente filhos de famílias mais abastadas,
e se assemelhava em muito à educação realizada nos templos.

Os pré-socráticos reuniam seus discípulos em locais pré-determinados


para estudos, que eram realizados a partir da contemplação, da leitura de
poetas clássicos e do ouvir as reflexões do mestre. Há uma história que
conta que os discípulos de Pitágoras passavam até cinco anos em silêncio,
como sinal de reverência ao conhecimento. Essa classe de filósofos
inaugurou uma forma nova de abordar a natureza, utilizando a razão
para encontrar elementos explicativos de dúvidas universais.

A jornada dos pré-socráticos perdurou por mais de 25 séculos como


tradição filosófica e influencia nossa sociedade atual.

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A Filosofia e a preocupação com o
5 homem e a sociedade
Objetivo
Compreender as transformações sociais na Grécia Antiga que
possibilitaram o surgimento da ética e da filosofia política e as suas
implicações na educação.

Para melhor situarmos esse diálogo, vamos utilizar uma divisão para
os períodos gregos. Ainda que essa divisão seja útil pedagogicamente,
ela necessita ser complementada com uma abordagem mais detalhada,
pois qualquer divisão histórica é complexa devido às épocas que se
interpenetram. A história é movimento, e toda e qualquer tentativa de
secioná-la é questionável. Para Aranha (2006), uma possível divisão dos
períodos gregos seria a descrita a seguir.

• Período Micênico (do século XX ao século XII a.C.): nesse


período, a civilização micênica reuniu vários povos, sobretudo os
Aqueus, que inicialmente viviam em uma sociedade primitiva que
evoluiu até uma aristocracia militar.
• Período Homérico (do século XII ao século VIII a.C.): período
de formação da civilização grega narrada nos poemas de Homero.
Inicia-se a construção de uma identidade grega a partir da aliança de
vários povos e tribos para derrotar Troia.
• Período Arcaico (do século VIII ao VI a.C.): surgimento
das primeiras cidades-estados; expansão grega no mar Egeu; e
surgimento dos filósofos pré-socráticos.
• Período Clássico (séculos V e IV a.C.): ápice da civilização grega.
Após a guerra do Peloponeso, Atenas predomina sobre as outras
cidades-estados. Nesse período se desenvolveu a filosofia de Sócrates,
Platão e Aristóteles.

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• Período Helenístico (séculos III e II a.C.): decadência do domínio
grego após a dominação macedônia e depois a romana. Nesse
período, a cultura grega é tomada por todo o Império Romano.

Tendo seu surgimento no período Arcaico, a filosofia se preocupou


inicialmente em responder às questões mais imediatas sobre a natureza,
em busca da arché, e gradualmente voltou-se para a vida social, focando
na formação do cidadão. Dessa forma, a filosofia influenciou diretamente
a educação da época.

A educação, como vimos anteriormente, não é um processo neutro. Ela


sempre emprega uma ideologia e está comprometida com a sociedade.
Dessa forma, não pode ser pensada isolada do exercício do poder.

A Grécia (século VI a.C.), mais precisamente em sua capital Atenas,


situada na região do Peloponeso, uma extensa península no sul da Grécia,
foi o solo onde se desenvolveram a filosofia e a democracia. A democracia
é considerada a melhor forma de governo, e a filosofia, a mais perfeita
forma de conhecimento da realidade.

Atenas é, portanto, um bom exemplo de como conhecimento e poder


se misturam, e como um influencia o outro. Nessa relação complexa e
dialética, no entanto, o conhecimento pode não ser considerado poder
(nesse caso, nós professores seríamos a elite política do país), mas o poder
se constitui de conhecimento.

A cidade-estado Atenas no período arcaico era uma cidade aristocrática,


dominada pelos grandes proprietários de terras. Aos poucos, o poder
político e militar da aristocracia foi reduzido pelo desenvolvimento do
comércio. Com a expansão grega no mar Egeu, a classe dos comerciantes
se tornou numerosa e rica. Os comerciantes que viviam no espaço
urbano iniciaram, então, uma série de disputas com os aristocratas pelo
poder político e militar.

Essas disputas foram encerradas por Sólon (legislador e jurista da


antiga Atenas, 638-558 a.C.), que inventou a polis (cidade) como
espaço comum, em que predominam as regras coletivas, e não mais os

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indivíduos. A justiça, que apesar de continuar sendo divina, passa a ser
reconhecida também como humana a partir da instituição de leis. Essa é
a essência da democracia grega, a polis seria o lugar da igualdade.

A democracia se instala em Atenas a partir das reformas de Clístenes, no


século V, e tem seu apogeu com Péricles, após a guerra do Peloponeso.
Já a filosofia tem seu período áureo no final da democracia, no início do
século IV, logo após a morte de Sócrates.

Péricles, em seu famoso discurso descrito na obra “A história da guerra


do Peloponeso” de Tucídides, fala da singularidade da experiência
ateniense. Ele expõe que em Atenas é realizado um governo da maioria,
com oportunidades e igualdades perante a lei, sendo uma cidade onde
o importante são o mérito e a reputação, e que todos podem exercer a
palavra.

A experiência ateniense, descrita por Péricles, se torna singular por


ser uma organização política que é totalmente diferente dos moldes
familiares, como era feito até então. Ou seja, no lugar da autoridade
antes apoiada em um líder, a democracia deu origem à politica
igualitária.

No entanto, essa igualdade democrática grega era bastante relativa, pois


ficavam de fora das atividades políticas as mulheres, os escravos e os
estrangeiros. Apenas participavam da democracia os homens livres, e
como nem todos moravam na cidade, a participação deles era esporádica
e reduzida.

Saiba mais
Sobre a pouca participação política das mulheres,
recomendamos a leitura do artigo “O papel da
mulher na sociedade grega”, disponível aqui.

A democracia grega era exercida nos diálogos e discursos realizados na


ágora – a praça principal na constituição da polis. Esse era o espaço

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privilegiado do exercício público da razão e da liberdade; nele, o todo
é o primeiro, e pertencer a esse todo é o que define o indivíduo como
cidadão.

Em Atenas, os cargos públicos eram distribuídos por sorteio. Todos


poderiam e deveriam participar igualitariamente da vida comunitária.
A partir de então, tornou-se necessária uma nova forma de educação,
voltada para a formação do indivíduo visando sua capacidade para
exercer a política.

Ainda que abordemos a filosofia como resposta aos problemas políticos


de Atenas, não podemos esquecer que a filosofia e a democracia não
nasceram ao mesmo tempo. Antes de Sócrates, nenhum filósofo se
interessou diretamente pela política. No período democrático, os pré-
socráticos não se voltaram para os problemas sociais, permanecendo na
sua busca pelo princípio organizador da natureza. A filosofia seria então
filha rebelde da democracia: a discussão pública da democracia grega
possibilitou o surgimento da filosofia.

A educação exerceu um papel fundamental na polis, pois se dedicou


a instruir os homens no domínio do discurso, sendo a linguagem o
instrumento da política e das relações sociais. À educação compete,
então, formar o ser social, possibilitando que todos possam participar da
vida pública.

Esse novo espaço de sociabilidade exige também uma nova forma de


agir, levando o homem a abdicar da sua individualidade, se dissolvendo
no coletivo da polis. As exigências de uma nova forma de agir levava os
gregos a se perguntarem qual era a melhor forma de agir, originando toda
a tradição ética dentro da filosofia.

A possibilidade de agir e decidir de acordo com a sua razão e a partir


dos seus interesses, sem remeter suas decisões à divindade, inaugura uma
nova atitude humana, de responsabilidade e liberdade. De certa forma, a
democracia grega tornou o homem livre e responsável pelo seu destino.

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Com a democracia, os homens passam então a depender apenas de
si próprios para agir politicamente. O poder não é mais exercido por
dependência dos deuses, mas sim livremente e de forma autônoma
entre os homens. A democracia, além de revolucionar as relações sociais,
também excluiu os deuses dos espaços públicos, reservado agora para os
homens.

Apesar de curto em duração, o período democrático grego alterou em


definitivo a forma com a qual nos relacionamos com o conhecimento,
com o mundo e com o outro. A democracia teve fim após uma série
de disputas que culminaram no governo dos Trinta Tiranos, cujo ato,
para sempre lembrado na história, é a condenação de Sócrates à morte –
assunto que veremos nas próximas unidades.

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Os sofistas e seu método de
6 educação
Objetivo
Apresentar os sofistas e seus métodos descompromissados com a
verdade em busca do convencimento por meio do discurso.

A nova educação realizada nas polis gregas exigiu também um novo tipo
de professor. Esses professores, especialistas no discurso, percorriam
as polis lecionando a quem possuísse meios de pagar pela educação. A
tradição filosófica a partir de Platão e Aristóteles os nomeia de sofistas,
dos quais os mais famosos foram Protágoras e Górgias.

Platão e Aristóteles traçaram um quadro desfavorável aos sofistas,


negando-lhes, inclusive, o título de filósofos. No entanto, o estudo desses
pensadores nos fornecem dados que possibilitam caracterizá-los como
filósofos, especialmente Protágoras.

A cidade de Atenas, como observamos, se organizava a partir da


democracia, e Protágoras, que gozava de muito prestígio perante a
sociedade, foi convidado por Péricles para realizar a constituição de uma
colônia ateniense.

O debate sobre o legado sofista está longe de ser considerado um


consenso, porém muitos teóricos afirmam ser os sofistas os criadores da
pedagogia e do humanismo antigo, além de fundarem o subjetivismo,
o relativismo e o individualismo em oposição ao objetivismo e ao
naturalismo da filosofia pré-socrática. Sem ignorar esses debates, o
propósito desta unidade é apresentar algumas contribuições dos sofistas
para educação.

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Na tradição grega, sofista era aquele que exercia a atividade de sábio (sóphos). Dessa
forma, eram assim designados genericamente aqueles que possuíam determinados
conhecimentos e a capacidade de comunicar esses conhecimentos. Aos poucos, esse
termo ficou restrito aos estudiosos que buscavam conhecer como se constroem as
relações humanas que culminam na polis. Tornando-se mestres nessa arte, os sofistas
passaram a ensiná-la aos outros.

A arte de construir relações está fundamentada no diálogo; e, para


os sofistas, a máxima realização humana se dá na política. Buscando
preparar os seus estudantes para a política, os sofistas tornaram-se
professores da aristocracia grega. Essa nova educação era necessária
devido ao novo paradigma de poder; outrora baseado na dominação,
o poder agora era exercido a partir da mediação e do consenso, sendo
central a retórica para buscar o convencimento nas assembleias populares.

De acordo com Rocha (2004) na democracia, a lei deixou de ser


sagrada e passou a ser humana, vinculando-se diretamente aos interesses
humanos, passando a ser uma convenção social. E para os sofistas, não
apenas as leis, mas a própria polis e a política são frutos das convenções
sociais, sendo passíveis de mudanças, que se operam a partir do
convencimento.

O individualismo apregoado pelos sofistas encontra eco na famosa frase


de Protágoras: “[...] o homem é a medida de todas as coisas”. Segundo
ele, o ser humano seria o critério para a realidade, negando assim as
teorias pré-socráticas da arché, pois o ser ou o não ser seriam dependentes
das nossas sensações, percepções, opiniões, ideias e ações.

Para Protágoras, tudo está em constante mudança, inclusive o nosso


conhecimento, pois tudo é fruto das convenções sociais nascidas de
algum consenso, visando não a verdade, mas a utilidade. Dessa forma,
não haveria apenas uma verdade, mas sempre a verdade melhor para cada
cidade e para cada cidadão. Os sofistas aprofundaram radicalmente o
antropocentrismo iniciado pela democracia.

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Uma das formas que os sofistas utilizavam em sua educação era solicitar
que os estudantes elaborassem um discurso defendendo “A”, afirmando
todos os atributos de “A” e posteriormente elaborassem outro discurso
condenando “A”, tornando explícito tudo o que era condenável em “A”.
Essa técnica visava preparar os estudantes para defender quaisquer pontos
de vista durante as assembleias.

Górgias de Leontini é um grande exemplo disso: reza a lenda que um


dia, chegando em Atenas para angariar simpatia dos cidadãos, proferiu
um discurso até então comum naquela época, condenando Helena de
Esparta pela guerra de Troia, afirmando que essa só foi seduzida por
Páris porque assim o quis. Após um maravilhoso discurso, Górgias pediu
que guardassem bem suas palavras e que no outro dia realizaria outro
discurso.

Esse outro discurso tratava-se do famoso “Elogio de Helena”. Nele,


Górgias enaltece Helena, argumentando que o destino quis que ela fosse
raptada e que tudo não passava de um designo dos deuses, pois Helena
caíra nas garras de Eros, e que a culpa não era sua, pois apenas cumpriu
seu destino.

Essa provável falta de compromisso com a verdade, a partir da afirmação


dos contraditórios, permeia as doutrinas sofísticas. Esse relativismo não
era motivado por uma falta de compromisso com a verdade, mas pela
impossibilidade de conhecer a verdade.

Em uma das falas mais abstratas e famosas de Górgias, ele afirma: “Nada
existe; mesmo se algo existisse, sobre isso nada poderia ser sabido; mesmo
se se pudesse saber algo, o conhecimento acerca disso não poderia
ser comunicado a outros, e mesmo que pudesse ser comunicado, não
poderia ser compreendido.”

Nessa fala, fica explícita a dificuldade de afirmar a verdade, pois ainda


que esta existisse, fosse conhecida e pudesse ser comunicada, não seria
compreendida. Estavam lançadas as raízes do ceticismo, que resultaria no
relativismo tão presente nos dias de hoje.

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O pressuposto sofista era de que ninguém detém previamente o saber, e
é nas assembleias, pelo entrechoque de opiniões, que os homens chegam
ao consenso, construindo uma unidade feita de multiplicidades. Dessa
forma, era necessário educar os homens para as assembleias, ensinando-
os, acima de tudo, a falarem, a defender o que lhes parece por bem
defender e a condenar o que lhes parece condenável. E esse foi o legado
dos sofistas, nos ensinar a falar por nós mesmos.

Segundo Chauí (1996), os sofistas também ampliaram a paideia; antes


restrita às crianças, agora a educação também abrangia os adultos, sendo
uma formação contínua e nunca finda do gênero humano. Além disso,
profissionalizaram a ocupação do professor, ao cobrar pelo exercício dessa
função.

No livro “Górgias”, de Platão, o autor nos apresenta um diálogo entre


Sócrates e Górgias, em que fica explícita a condenação que Sócrates faz
aos sofistas e à retórica, argumentando que esta visa somente a persuasão,
e não o ensino, pois apenas sugere crenças, sendo uma boa técnica apenas
diante de ignorantes.

O orador, segundo Sócrates, se aproxima do tirano, pois pode fazer o


que quiser no discurso sem se comprometer com nada. A retórica, então,
teria de ser condenada como técnica, pois faz com que algo que é mau
seja apresentado como bom.

Aqui encontramos o âmago do conflito de Platão com os sofistas,


pois, para os sofistas, como vimos, não há verdade, o que existe é o
convencimento. Porém, para Platão, a verdade não apenas existe, mas
ela deve ser a base do conhecimento – mas isso é assunto das próximas
unidades.

O embate entre Platão e os sofistas prenunciou uma batalha que se


estende até os dias de hoje e, de certa forma, permeia toda a educação.
Esse seria o duelo entre a retórica e a filosofia, entre o conhecimento e o
convencimento, e que se transfigurou em nossos dias no conflito entre
informação e conhecimento.

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Resumo

Ao longo das seis unidades, delimitamos a filosofia como uma atividade


caracterizada por uma atitude e reflexão própria, além de ser um
pensamento sistemático. Definimos a educação como um conceito
genérico, que supõe o processo de desenvolvimento integral do homem,
e que ocorre de forma distinta a partir de cada sociedade. Apresentamos
ainda algumas provocações de aplicação da filosofia na educação.
Abordamos como eram estruturadas as sociedades primitivas e como era
realizada a educação.

Também explanamos sobre a importância do mito nas sociedades, e a sua


função de revelar e explicar as origens e os comportamentos. Mostramos
a dualidade da educação e sua divisão entre a elite e a plebe a partir
da invenção da escrita. Explanamos o embate entre o surgimento e as
origens da filosofia, e as influências do mito para o surgimento dessa.

Foram apresentados os primeiros filósofos, denominados pré-socráticos,


e a sua busca pelo princípio organizador da natureza; e o duelo entre
Parmênides e Heráclito, pensadores que iniciaram a tradição filosófica do
Empirismo e do Racionalismo.

Buscamos vislumbrar os elementos da educação sofística compromissada


com o discurso, que tinha o relativismo e o homem como medida de
todas as coisas, e os elementos sociais gregos, que possibilitaram a virada
filosófica Tragédia – República – Tirania.

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Sócrates: a educação a partir do
7 diálogo
Objetivo
Demonstrar a importância do diálogo na educação como elemento
do método socrático de educação baseado na maiêutica.

Caro aluno, até aqui vimos o que é a Filosofia e revisitamos a educação


no mundo antigo. A partir de agora, você conhecerá alguns dos
importantes filósofos e suas principais contribuições para a educação.
Começaremos por Sócrates, considerado o patrono da Filosofia.

Sócrates foi um filósofo grego que viveu em Atenas de 469 a.C. a 399
a.C. Típico cidadão da plebe ateniense, não era um homem de grandes
posses, nem pertencia a família importante, mas participava da política
por ser um cidadão livre.

Esse filósofo ficou amplamente conhecido por sua forma peculiar de


fazer Filosofia e por ser mestre de Platão – considerado como um dos
mais influentes filósofos de todos os tempos. Grande parte do que
sabemos dessa figura lendária chegou até nós pelos escritos de Platão. No
entanto, Xenofonte e Aristóteles foram quem nos auxiliaram a construir
a imagem desse filósofo.

A verdadeira história de Sócrates passa, até os dias atuais, por muitos


debates. Há quem diga que ele existiu apenas na imaginação de Platão,
sendo um personagem utilizado por ele para ilustrar suas ideias. Mas,
apesar de toda a polêmica em torno de sua pessoa, Sócrates nos legou
elementos fundamentais para a educação, pois foi um grande educador,
levando a educação para o povo, educando na praça pública.

Esse pensador emblemático passava os dias nas praças e nos mercados


interpelando as pessoas, questionando aos que julgavam conhecer

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determinado assunto. Perguntava ao soldado que se dizia corajoso “O
que é a coragem?”, e ao juiz que se julgava justo “O que é a justiça?”.
Porém, as respostas oferecidas nunca atendiam à solicitação socrática,
porque elas sempre evidenciavam questões superficiais, e Sócrates
buscava a essência das coisas. Essa nova forma de fazer Filosofia por meio
do diálogo reflete uma nova forma de educação.

Para Chauí (1996), Sócrates se rebelou contra os sofistas, que, para


ele, não eram filósofos, porque não tinham amor pela sabedoria nem
tinham respeito pela verdade. Os sofistas defendiam qualquer ideia,
independente de ser ou não verdade, bastando que a ideia defendida
representasse alguma vantagem. Sócrates concordava com os sofistas
apenas quando eles afirmavam que a educação do mundo antigo não
mais atendia às exigências da sociedade grega.

Esse distinto filósofo não aceitava a educação praticada até então, pois
discordava da educação antiga baseada no mito e nos poetas; criticava
os pré-socráticos e repudiava a educação com base na oratória e retórica
sofista. Você deve estar se perguntando: qual seria então o modelo de
educação para Sócrates?

A base educativa de Sócrates é o famoso “Conhece-te a ti mesmo”, ou


seja, antes de intentarmos conhecer a natureza ou convencer os outros
da nossa opinião, devemos nos conhecer. Saber quem somos implica em
também encontrar e reconhecer nossos limites.

A frase “Conhece-te a ti mesmo” estava gravada no pórtico do templo


de Apolo, em Delfos, onde vivia o famoso Oráculo de Delfos. Diz a
lenda que, um dia, alguém consultou o oráculo e perguntou quem seria
a pessoa mais sábia da Grécia, o Oráculo respondeu “Sócrates”. Ao saber
disso, Sócrates dedicou sua vida à busca da sabedoria, dizendo que Apolo
o incumbiu dessa missão, pois como homem mais sábio da Grécia, ele
só tinha uma certeza: a consciência da própria ignorância, sintetizada na
máxima “Só sei que nada sei”.

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Para sua reflexão
O grande educador Sócrates partia de duas
premissas: (1) a necessidade de autoconhecimento
e (2) a certeza da ignorância. A partir dessas
questões, Sócrates revolucionou a educação. Uma
interpretação radical de suas teorias diz que é
possível ensinar sem saber. E você, concorda com
essa interpretação? Será mesmo que é possível
ensinar sem saber?
As respostas a essas reflexões formam parte de sua
aprendizagem e são individuais, não precisando
ser comunicadas ou enviadas aos tutores.

Sócrates ensinava a partir do diálogo; foi dialogando nas praças e nos


encontros sociais que ele educou toda uma geração e lançou as bases da
Filosofia antropológica. Vamos ver como ele fazia isso?

Muito se discute sobre qual seria o método socrático, porém, em


momento algum Sócrates afirma “Este é o meu método”. A partir dos
escritos de Platão – discípulo de Sócrates que organizou as ideias deste,
visto que seus ensinamentos eram transmitidos oralmente – foi possível
observar dois movimentos no processo argumentativo e educacional de
Sócrates: a ironia e a maiêutica.

No primeiro momento, Sócrates realizava várias perguntas questionando


as afirmações do seu interlocutor e, a partir delas, ele refutava as respostas
demonstrando os limites da abordagem. Dessa forma, entrou para
a história o diálogo inicial da República de Platão, quando Sócrates
interrogou seus colegas, perguntando “O que é justiça?”, refutando uma
a uma todas as teses apresentadas, demonstrando que nenhuma delas
continha a resposta. Partindo das respostas recebidas e das questões
formuladas, Sócrates leva o interlocutor a aceitar e construir uma nova
visão sobre o tema abordado. Esse processo é denominado maiêutica, que
significa conduzir, trazer para fora.

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No diálogo Teeteto, escrito por Platão, Sócrates compara a maiêutica a
um parto, argumentando que, assim como as parteiras, ela auxilia a dar à
luz, porém, é estéril em matéria de sabedoria, pois a divindade que o leva
a auxiliar os outros a darem à luz ao conhecimento o impede de conceber
qualquer sabedoria. Dessa forma, ele não possui nenhum pensamento
que possa apresentar como seu. Aqueles que dialogavam com Sócrates
pareciam ignorantes inicialmente, porém, gradativamente, o diálogo e
a convivência progrediam, tornando-os cada vez mais sábios. Contudo,
nada discutido provém de Sócrates, pois tudo já estava com ele.

O diálogo de Menon é um bom exemplo sobre o método socrático.


Nele, Sócrates leva o escravo de Menon que nunca aprendeu matemática
a resolver um intrincado problema de geometria, que consistia em
construir um quadrado de área dupla de um outro quadrado com dois
pés de comprimento.

A partir de perguntas precisas e de desenhos rabiscados no chão, o


filósofo leva o escravo a descobrir a proposição geométrica conhecida
como teorema de Pitágoras. O escravo, ao intentar responder,
incorre várias vezes ao erro, mas, ao prosseguir o diálogo, passa a dar
respostas corretas com o auxílio das perguntas de Sócrates, que conduz
magistralmente o diálogo. O escravo resolve o problema, mesmo nunca
tendo aprendido geometria. Para Sócrates, o escravo já possuía os
conhecimentos matemáticos, apenas necessitava “relembrá-los”.

Saiba mais
Para obter mais informações e ler o Diálogo de
Menon na íntegra, acesse o site clicando aqui.

Essa doutrina de relembrar os conhecimentos, conhecida como


reminiscência, anunciada por Sócrates e disseminada por Platão, parte
do pressuposto que todos os conhecimentos estão na alma, que seria um
substrato humano imortal.

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Para Sócrates, a alma ora completa uma vida, o que chamamos de morte, ora inicia
outra vida, o que chamamos de nascimento. Imortal e muitas vezes nascida, a alma
conhece todas as coisas e não há nada que ela não tenha conhecido. Dessa forma, o
papel da Filosofia é levar a alma a relembrar o que ela já conheceu.

Mas qual o objetivo de Sócrates com tantas perguntas? Sócrates buscava a


definição de cada coisa, intentava descobrir sobre o que realmente se estava
a falar, a essência do objeto, da ideia, do valor. Sócrates almejava respostas
que transcendessem a opinião e afirmassem o caráter mais universal
do objeto do diálogo, ou seja, o conceito, a essência, pois a opinião é
relativa à pessoa e pode mudar de indivíduo para indivíduo. Por outro
lado, o conceito não é relativo. O conceito é fruto do pensamento, não
se contamina com as impressões pessoais de cada sujeito, seria a essência
universal, intemporal e necessária de cada coisa, ideia ou valor.

Sócrates defende que para conhecermos o conceito e a verdade


precisamos nos afastar da ilusão dos sentidos, pois eles nos enganam,
nos apresentando a aparência das coisas, das palavras e das opiniões.
As palavras causam conflitos e não são uma fonte confiável de
conhecimento, pois expressam apenas a opinião sobre as coisas. O
conhecimento seria passar dessa aparência, dessa opinião, para a essência,
o conceito, saindo das impressões individuais e adentrando no universal
dos seres, valores e ideias.

A educação para Sócrates possuía um forte caráter ético, pois, segundo


esse filósofo, era impossível conhecer o bem sem praticá-lo; a causa da
injustiça e do mal era a ignorância. Para Sócrates, uma pessoa sábia é
justa, e uma pessoa justa é sábia, pois ao tomarmos conhecimento do
bem somos impulsionados a praticar o bem, toda ação errada ou injusta
é fruto da falta de conhecimento.

Sócrates nos faz pensar hoje que a educação necessita ser dialógica, tendo
como base o diálogo, respeitando o desenvolvimento do estudante, ao
mesmo tempo em que desafiamos o mesmo a buscar e construir novos
conhecimentos, Sócrates também nos lembra do caráter ético, pois ao
conhecer o bem devemos obrigatoriamente praticá-lo.

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De acordo com Chauí (1996), Sócrates buscou durante toda a sua vida
educar os cidadãos para o convívio na cidade, intentando criar o homem
ético, conhecedor das coisas e de si mesmo para melhor servir a pólis.
Porém, o pensamento imbuído de conhecimento é uma arma poderosa. Os
questionamentos de Sócrates passaram a incomodar os governantes, pois
perguntas como “O que é a bondade?” e “O que é a justiça?” nem sempre
encontravam ressonância na figura dos poderosos e, naquela época, Atenas
era dirigida por um grupo aristocrático chamado de “Os 30 tiranos”.

Sócrates foi acusado de um crime grave: corromper a juventude e


desrespeitar os deuses – ele vivia em uma cidade cujo nome era de uma
deusa e buscava uma educação integral chamada paideia –, sendo, por
isso, condenado à morte.

O julgamento desse filósofo reforça sua figura mítica, pois, durante o seu
julgamento, ele não se defendeu, argumentando que caso se defendesse
estaria aceitando as acusações, algo que ele jamais aceitaria, até porque se
ele fosse julgado inocente, os juízes exigiriam que parasse de filosofar, e
Sócrates afirmava que preferia morrer a parar de filosofar.

A acusação, o julgamento e a morte de Sócrates impressionaram seus


discípulos pela clareza ética do mestre, pois em mais de um momento os
discípulos propuseram que Sócrates fugisse, mas ele preferiu ser julgado
e condenado a ter de sair da pólis negando sua condição de cidadão
ateniense. Platão narra esses eventos em uma obra chamada “Apologia
de Sócrates”, em que apresenta a defesa do mestre acusando a cidade de
Atenas de ter assassinado a única esperança desta. A morte de Sócrates
foi tão significativa para Platão que ele passa a defender que o filosofo só
pode conviver na cidade na condição de governante, como filósofo-rei,
mas isso é assunto da próxima unidade.

Saiba mais
Você pode fazer o download da obra “Apologia de
Sócrates” clicando aqui. Vale a pena conhecer essa
obra na íntegra!

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Platão: a institucionalização e
8 abstração do saber
Objetivo
Apresentar a teoria das ideias e o surgimento da educação
institucionalizada, compreender a relação de subordinação do real ao
mundo das ideias e a dicotomia entre teoria e prática.

Caro aluno, nesta unidade vamos conhecer a filosofia de Platão.


Conforme afirma Aranha (2006), esse pensador grego, discípulo de
Sócrates, foi considerado um dos mais importantes ícones para a
filosofia. Viveu entre os anos de 428 e 348 a.C., na cidade de Atenas.
Platão prosseguiu a Filosofia de Sócrates, contudo, a morte do mestre
desencadeou uma mudança radical na forma de fazer Filosofia – antes
praticada livremente nas praças, nos banquetes e no mercado público.
Platão assume outra postura, e com ele a Filosofia se fecha em um círculo
de pensadores e passa a ser acessível apenas aos iniciados na arte de
filosofar. Platão, consciente do poder corrosivo da Filosofia, encerra-a
entre quatro paredes, limitando a prática da Filosofia ao ambiente da
academia.

Esse importante filósofo, cujo verdadeiro nome era Arístocles, foi


apelidado de Platão – que significava “amplo” – em função do seu porte
atlético ou pela sua capacidade intelectual de abordar vários assuntos,
que permeavam desde ética à política, passando por epistemologia, entre
outros.

A importância da obra de Platão para a Filosofia é apresentada de forma


radical na máxima do matemático britânico Alfred North Whitehead,
que diz: “Toda a filosofia ocidental é uma nota de rodapé à obra de
Platão”. Platão mudou para sempre a nossa forma de ver o mundo e
também a nossa forma de pensar a educação. Ele fundou o primeiro
instituto de educação superior do ocidente, conhecido como “Academia”.
Ainda hoje, podemos perceber essa influência platônica quando

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chamamos o ambiente universitário como ambiente acadêmico, por
exemplo.

É na pessoa de Platão que a Filosofia clássica encontra a sua síntese, pois ele herda
de Sócrates a busca pela essência das coisas; de Heráclito, ele recebe a noção do
devir do mundo sensível; de Parmênides, a concepção de que deve haver algo uno
que nunca se altera; de Zenão, recebe a dialética; e, por fim, de Pitágoras, o amor
pela matemática. A paixão pela matemática era tamanha que no pórtico da academia
estava escrito “Que aqui não entre quem não for geômetra”.

A Filosofia de Platão apresentada nos seus 36 diálogos é transpassada por


uma teoria que ainda hoje divide opiniões, a “Teoria das ideias”. Essa
teoria praticamente inicia a metafísica ocidental, e alguns comentadores
argumentam que há duas formas de fazer filosofia: aceitando e
defendendo a Filosofia platônica ou recusando-a e contrariando-a. O
que não pode acontecer é ignorar a Filosofia de Platão e a sua teoria das
ideias. Mas o que seria a teoria das ideias? Vamos ver o que significa?

Segundo Chauí (1996), Platão introduz uma divisão no mundo ao


afirmar a existência de dois mundos inteiramente diferentes e separados:
o mundo das coisas e o mundo das ideias. O primeiro é o mundo
do Não Ser (o mundo sensível das coisas ou aparências); o segundo é o
mundo do Ser (o mundo das ideias ou das essências verdadeiras).

Podemos observar que, em sua teoria, Platão intenta reconciliar


Parmênides e Heráclito, argumentando que Heráclito, ao falar do devir
constante, se referia ao mundo sensível, e Parmênides, ao afirmar a
unicidade do ser, estava se referindo ao mundo das ideias.

Para Chauí (1996), a teoria das ideias evidencia o caráter aristocrático


de Platão, pois a busca pelo conhecimento passa a ser contemplativa,
a partir da racionalidade, sem uma aplicação material ou prática,
desprezando a aplicação do conhecimento na vida sensível. Essa
dicotomia entre teoria e prática é sentida até hoje na educação, pois
temos a tendência de imaginar que a teoria é mais importante do que a
prática.

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A matemática, para Platão, não era apenas um caso de amor. Ele a
considerava como um acesso privilegiado ao mundo das ideias, pois
quando pensamos em formas geométricas, ascendemos da experiência
sensível para a experiência do mundo das ideias; quando pensamos em
um triângulo, por exemplo, nos vem à mente um polígono de três lados
– esse objeto que invocamos estaria no mundo das ideias, apenas acessível
a partir do pensamento.

Em “A República”, mais especificamente no livro VII, Platão apresenta


uma das alegorias mais célebres de toda literatura, a alegoria da caverna,
que sintetiza, de forma até mesmo didática, o pensamento de Platão. As
aplicações da alegoria da caverna são as mais distintas, mas buscaremos
aqui utilizá-la para evidenciar o processo educativo e de transformação
do conhecimento apresentado em Platão.

Na alegoria da caverna, ou mito da caverna, Platão (1949, p. 315-319),


utilizando o personagem Sócrates, trava o seguinte diálogo com Glauco:

— Depois disso – prossegui eu – imagina a nossa natureza, relativamente à


educação ou à sua falta, de acordo com a seguinte experiência. Suponhamos uns
homens numa habitação subterrânea em forma de caverna, com uma entrada
aberta pela luz, que se estende a todo o comprimento dessa gruta. Estão lá dentro
desde a infância, algemados de pernas e pescoços, de tal maneira que só lhes é
dado permanecer no mesmo lugar e olhar em frente; são incapazes de voltar a
cabeça, por causa dos grilhões; serve-lhes de iluminação um fogo que se queima ao
longe, numa eminência, por detrás deles; entre a fogueira e os prisioneiros há um
caminho ascendente, ao longo do qual se construiu um pequeno muro, no gênero dos
tapumes que os homens dos “robertos” colocam diante do público, para mostrarem as
habilidades por cima deles.

— Estou a ver – disse ele.

— Visiona também ao longo deste muro, homens que transportam toda a espécie
de objetos, que o ultrapassam: estatuetas de homens e de animais, de pedra e de
madeira, de toda espécie de lavor; como é natural, dos que os transportam, uns
falam, outros seguem calados.

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— Estranho quadro e estranhos prisioneiros são esses de que tu falas – observou ele.

— Semelhantes a nós – continuei –. Em primeiro lugar, pensas que, nestas


condições, eles tenham visto, de si mesmo e dos outros, algo mais que as sombras
projetadas pelo fogo na parede oposta da caverna?

[...]

— Considera pois – continuei – o que aconteceria se eles fossem soltos das cadeias e
curados da sua ignorância, a ver se, regressados à sua natureza, as coisas se passavam
deste modo. Logo que alguém soltasse um deles, e o forçasse a endireitar-se de
repente, a voltar o pescoço, a andar e a olhar para a luz, ao fazer tudo isso, sentiria
dor, e o deslumbramento impedi-lo-ia de fixar os objetos cujas sombras via outrora.

[...]

— Meu caro Glauco, este quadro – prossegui eu – deve agora aplicar-se a tudo
quanto dissemos anteriormente, comparando o mundo visível através dos olhos
à caverna da prisão, e a luz da fogueira que lá existia à força do Sol. Quanto à
subida ao mundo superior e à visão do que lá se encontra, se a tomares como a
ascensão da alma ao mundo inteligível, não iludirás a minha expectativa, já que é
teu desejo conhecê-la. O Deus sabe se ela é verdadeira. Pois, segundo entendo, no
limite do cognoscível é que se avista, a custo, a ideia do Bem; e, uma vez avistada,
compreende-se que ela é para todos a causa de quanto há de justo e belo; que, no
mundo visível, foi ela que criou a luz, da qual é senhora; e que, no mundo inteligível,
é ela a senhora da verdade e da inteligência, e que é preciso vê-la para se ser sensato
na vida particular e pública.

Platão apresenta o mundo sensível como cópia do mundo das ideias,


sendo que todas as coisas apreendidas pelos nossos sentidos são apenas
reflexo das coisas verdadeiras que estariam no mundo das ideias. Dessa
forma, na alegoria, os prisioneiros veem apenas as sombras na parede
da caverna. Parafraseando o processo educativo, Platão explica como o
prisioneiro é libertado e toma consciência da sua condição nesse trecho
da alegoria em que um prisioneiro é forçado “[...] a endireitar-se de
repente, a voltar o pescoço, a andar e a olhar para a luz [...]”. (PLATÃO,
1949, p. 316).

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Para Platão, o processo educativo é social, sendo necessário alguém que
nos liberte das amarras da opinião e do mundo sensível, obrigando-nos
a aprender. Platão enfatiza o caráter penoso do conhecimento, pois à
custa de muito sofrimento, o prisioneiro consegue subir e sair da caverna,
sendo que seus olhos não estavam acostumados com a claridade.

Para sua reflexão


Não somos nós assim também? Quando
desconhecemos algo, o processo de conhecimento
é penoso, pois necessitamos aprender novos
conceitos, intentar solucionar problemas com
os quais não estamos habituados. Em princípio,
parece que quanto mais estudamos, mais difícil
fica compreender as coisas, porém, chega um
momento em que nos aproximamos da entrada
da caverna e, tal qual o prisioneiro, saímos e nos
deparamos com o mundo verdadeiro. O que você
pensa sobre isso?
As respostas a essas reflexões formam parte de sua
aprendizagem e são individuais, não precisando
ser comunicadas ou enviadas aos tutores.

Quando “saímos da caverna” tudo faz sentido – as peças se encaixam – e


observamos que o processo doloroso e complexo de apreensão do novo
conhecimento valeu a pena, pois agora as coisas nos aparecem de forma
mais clara. Da mesma forma que o cativo, a recompensa pelo sofrimento
é o conhecimento da verdade que está fora da caverna.

Na alegoria da caverna, Platão ainda retrata o caráter ético do


conhecimento e da educação, pois o prisioneiro que foi libertado e
conheceu a verdade se condói dos seus antigos companheiros de caverna
e é impelido a voltar e libertá-los, e para isso necessita abandonar a
claridade e voltar para a escuridão da caverna.

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A volta à caverna requer acostumar-se novamente com a escuridão, e seus
olhos demorarão a situar-se. A dificuldade para caminhar na escuridão
leva os prisioneiros a chamar o liberto de louco e dizer que ele ficou
louco por ter saído da caverna e tudo o que ele falar vai ser considerado
loucura, uma vez que este voltou pior do que saiu.

Quando o antigo prisioneiro tentar libertar seus companheiros a todo


o custo, forçando-os a sair da caverna, eles reagirão violentamente
e matarão o seu libertador. Platão, nessa passagem, faz uma crítica,
remetendo-se à cidade de Atenas, a qual matou Sócrates, o seu libertador.

Assim como o prisioneiro da caverna que foi libertado, quando


aprendemos algo ansiamos dividir esse conhecimento, mas no começo
as palavras nos faltam ou nos perdemos em meio aos argumentos de tal
forma que aqueles que intentamos ensinar acreditam que estamos loucos.
Porém, o que não podemos fazer é ter o conhecimento e nos calar, pois,
de acordo com Platão, o conhecimento nos compromete em ser uma
pessoa melhor e construir um mundo melhor.

Tributário do seu mestre Sócrates, Platão também associa o sábio ao


bem e à justiça, sendo o mal fruto da ignorância. Dessa forma, o filósofo
defende que quem deve dirigir a pólis é o mais sábio, ou seja, o filósofo.
“A República” é considerada a utopia platônica, pois reflete um ideal
de cidade e de estrutura e toda uma educação para gestar essa cidade.
Inicialmente todos teriam a mesma educação, mais tarde, de acordo com
as aptidões ou os “tipos de alma”, como se refere Platão, a educação seria
especializada para cada segmento social.

Platão desafia nós professores hoje a buscar uma educação universalizante


e libertadora, pois de um lado devemos construir uma educação que nos
aproxime do “mundo das ideias” transcendendo as opiniões superficiais
almejando assim a verdade. Por outro lado, devemos ter claro o caráter
libertador da educação, pois esta nos liberta da ignorância e isto pode ser
a mola propulsora para a libertação física.

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Durante todo o tempo em que esteve à frente da academia, Platão
teve muitos discípulos, mas um em particular se destacou: um jovem
chamado Aristóteles, que discordou radicalmente do seu mestre quanto
à teoria das ideias e ampliou o enfoque da Filosofia estudando o mundo
sensível, mas esse é o tema da próxima unidade.

Atividade
Chegou a hora de você testar seus conhecimentos
em relação às unidade 1 a 8. Para isso, dirija-se
ao Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) e
responda às questões. Além de revisar o conteúdo,
você estará se preparando para a prova. Bom
trabalho!

www.esab.edu.br 49
Aristóteles: a natureza como fonte
9 do saber
Objetivo
Conhecer a teoria aristotélica de categorização e o surgimento da
ciência e do método científico.

Caro aluno, na unidade anterior conhecemos uma das teorias mais


importantes de Platão atrelada à de Sócrates. Vimos também que ele teve
muitos discípulos, entre eles, Aristóteles, que, em particular, se destacou,
e você vai conhecê-lo nesta unidade!

Aristóteles (384 a 322 a.C.) teve uma agitada vida intelectual. Seus
escritos abrangem diversos assuntos, como a física, a metafísica, a poesia,
a música, a lógica, a retórica, o governo, a ética, a biologia, a zoologia etc.

Nascido em Estagira, estudou durante 20 anos na academia de Platão,


em Atenas, da qual saiu apenas após a morte do mestre por discordar da
nomeação de Espeusipo, sobrinho de Platão, como dirigente intelectual
da Academia, apesar de ter sido o próprio Platão quem o nomeou.
Aristóteles se sentia mais capaz de assumir a direção da academia: além
de discordar dos rumos filosóficos que a academia tomava, passou a ser
um grande crítico das doutrinas platônicas, especialmente da teoria do
mundo das ideias. Ao se despedir, ele disse “Sou amigo de Platão, mas
mais amigo da verdade”.

Depois do rompimento com a academia, Aristóteles cria o Liceu,


também chamado de ginásio, onde os estudantes eram conhecidos
como peripatéticos (os que passeiam) – apelido decorrente do hábito de
Aristóteles ensinar ao ar livre, passeando entre as árvores que cercavam o
Liceu.

Aranha (2006) e Chauí (1996) argumentam que, ao contrário da


Academia de Platão, o Liceu privilegiava as ciências naturais, pois

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Aristóteles partia do pressuposto que não há nada na mente que não
tenha passado pelos sentidos, sendo assim, não haveria um mundo das
ideias, pois o mundo é o que se apresenta aos nossos sentidos. Essa
afirmação da experiência e dos sentidos como instrumentos para se
buscar o conhecimento assinala o rompimento de Aristóteles com o
pensamento do seu mestre Platão.

Para Aristóteles, o seu mestre não estava errado, apenas havia invertido as
questões. Ele aceita a doutrina platônica das ideias como forma universal
que une todos os seres. Por exemplo, se pensamos na ideia de um livro,
este vai apresentar, no mínimo, muitas características de todos os livros
do mundo, tais como capa, folhas, ordenação de páginas, texto, enfim,
partes componentes de um livro. Mas, para Aristóteles, essa ideia, no
caso o livro, não existe, inicialmente, em um mundo das ideias; antes
de tudo, a ideia é um conceito criado por nós humanos por já termos
visto muitos livros. Depois de tomarmos conhecimento de vários livros,
buscamos características comuns que unifiquem todos os livros, e essas
características comuns formam o conceito criado artificialmente e
aplicado a todos os livros.

Em sua argumentação, Aristóteles afirma que as formas estão dentro das próprias
coisas. Desse modo, o livro e a forma do livro são duas coisas tão inseparáveis quanto
o corpo e a alma. Enquanto Platão julgava que o máximo de realidade está nos
pensamentos e nas ideias, para Aristóteles a realidade é apreendida com os sentidos.

Em busca de conhecer a natureza, Aristóteles lançou as bases da ciência


moderna, pois buscou criar princípios a partir da regularidade dela. A
astronomia Aristotélica perdurou por séculos até ser substituída pelas
teorias de Copérnico. No entanto, os tratados de Aristóteles sobre a
classificação das ciências e sobre a lógica são utilizados até hoje.

Dando vazão ao seu ímpeto científico, Aristóteles afirma que tudo existe
a partir de quatro causas que nos dizem “o que é”, “como é”, “por que é”
e “para que é” cada coisa. Segundo Chauí (1996), essas quatro causas são:

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a. causa material: aquilo de que uma essência é feita (ex.: água, fogo, ar);
b. causa formal: as diferentes formas que uma essência possui (ex.: mar, rio);
c. causa eficiente ou motriz: é a ação que resulta na forma da essência. (ex.:
ato sexual é a causa da criação de um novo ser, a ação de um carpinteiro é
a causa eficiente para a transformação da madeira em mesa);
d. causa final: o motivo, razão ou finalidade de a coisa existir (ex.: o bem
comum é a causa final da política, a flor é a causa final da semente etc.).

O conceito de causa final é um conceito central na ética de Aristóteles,


pois ele defendia que toda ação visa um fim, até mesmo as ações
humanas. Dessa forma, devemos direcionar esse fim para a “eudaimonia”.

O agir ético, para Aristóteles, era o meio-termo. Nesse sentido, ele


difere e ao mesmo tempo mantém o núcleo ético dos seus antecessores.
Enquanto ser ético, para Sócrates e Platão, consistia em conhecer e
praticar o bem, Aristóteles enfatiza um caráter mais prático ainda na
ética, argumentando que as nossas ações devem visar o meio-termo.
Por exemplo, a virtude da coragem; o excesso dela seria a temeridade
do agir por impulso, e a falta seria a covardia do não agir. Dessa forma,
Aristóteles define um meio-termo, que seria a coragem em si.

Em suas investigações, Aristóteles especulou que todas as coisas são em


potência e ato, por exemplo: uma semente é uma árvore em potência;
a árvore, por sua vez, é uma semente em ato e papel em potência. Uma
coisa em potência é uma coisa que tende a ser outra, já uma coisa em ato
é algo que já está realizado.

Segundo Chauí (1996), influenciado por Platão em sua forma de pensar,


Aristóteles admite a existência de algo que seria um ato puro, que não
se transformaria em nada, mas seria sempre igual a si mesmo; esse ato
puro seria o bem. Para Aristóteles, todas as coisas estão em movimento
da potência para o ato, e esse movimento é impulsionado pelo ato puro,
que, em última instância, seria Deus. Assim, Aristóteles caracteriza Deus
como o “motor imóvel do universo”.

Ainda de acordo com Chauí (1996), em seu objetivo de organizar as


ciências, Aristóteles dividiu e organizou o conhecimento em três campos
do saber:

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a. ciências produtivas: estudam as técnicas. Seriam as ações humanas
cuja finalidade está além da própria ação. Essas ciências visam a
realização de algo externo e diferente da própria ação – seria o
caso da agricultura, da medicina, da engenharia. Por exemplo: a
finalidade da engenharia não é o conhecimento de engenharia, mas
construir uma casa, ponte, estrada etc.;

b. ciências práticas: estudam as práticas humanas que têm nelas


mesmas seu próprio fim, ou seja, essas práticas não têm como
objetivo um produto diferente da prática, mas sim a realização
dessa prática no agente que a realiza. Poderíamos exemplificar pelos
casos da ética e da política, pois a ética visa formar o cidadão de
bem a partir da prática das virtudes, e a política visaria a prática das
virtudes éticas, em que toda ação tem por objetivo o bem comum;

c. ciências contemplativas: estuda tudo aquilo que existe


independente da vontade e da ação humana. Seu objetivo seria
contemplar e compreender a natureza e o divino, pois não sendo
feita por nós, só nos resta contemplá-las – seria a física, a biologia, a
matemática, a metafísica e a teologia.

A educação, para Aristóteles, se dava a partir das ciências práticas e


contemplativas, pois as ciências produtivas pouco acrescentam ao
conhecimento – seriam mais a aplicação dos saberes construídos nas
outras duas ciências. Como pode ser observado, esse filósofo também
pensava a educação de forma aristocrática, assim como seu mestre Platão.

O objetivo da educação, segundo Aristóteles, era conhecer a natureza


das coisas e manter o bom convívio na pólis, por isso a ênfase nas
ciências práticas e contemplativas. Apesar de a educação ter um caráter
contemplativo, ela não perde seu enfoque ético. Ainda que Aristóteles
não mantenha a identificação de sabedoria com justiça, como Platão e
Sócrates, ele afirma que a partir da contemplação da natureza das coisas
nos tornamos pessoas mais éticas, pois a natureza das coisas visa sempre
um fim – na natureza, nada é por acaso –, e esse fim visado pela natureza
é o bem, esta seria sua causa final.

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Segundo Chauí (1996), Aristóteles vê o homem como um animal
político (zoon politicon), e esse impulso político e social leva os seres
humanos a buscar uma vida em sociedade – o fim último da ação
humana, sua causa final seria a sociabilidade. O gênero humano se realiza
plenamente apenas na vida em sociedade que, estruturada a partir da
pólis, deve propiciar o pleno desenvolvimento material e intelectual do
ser humano. Dessa forma, para Aristóteles, o homem e a pólis estão
interligados organicamente, pois sem o humano não existe a pólis e
sem a pólis não há a realização do ser humano.

Ao relatar a educação defendida por Aristóteles, Chauí (1996) afirma que


a educação seria a fomentadora da unidade entre o ser humano e a pólis,
por isso ela deve ocupar toda a vida do cidadão – a educação formal
e pública, para Aristóteles, deveria se estender até os 35 anos. Assim,
a pólis, com o auxílio dos pais, buscaria a realização do bem político
por intermédio da educação familiar, privada e pública, distribuída nos
seguintes períodos:

a. procriação: neste período, a pólis deve fornecer o cuidado e a


alimentação das gestantes;

b. nutrição (um ano), pequena infância (dos dois aos cinco anos) e
primeira infância (dos cinco aos sete anos): nestes períodos, em
casa e nos Liceus, as crianças seriam habituadas ao convívio social, à
ginástica e às lições;

c. educação (dos sete aos 14 anos) e adolescência (dos 14 aos 21


anos): neste período, os jovens estudariam literatura e ciências, sendo
iniciados na Filosofia;

d. maioridade: encerrando a educação formal, os indivíduos


prestariam serviço militar obrigatório até os 35 anos, no qual seriam
iniciados na política, que é o fim último da educação.

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Para sua reflexão
A educação, portanto, não pode ser deixada
sob a responsabilidade de cada cidadão: ela é
responsabilidade de todos e especialmente dos
governantes, pois é somente pela educação que
desenvolvemos a política, que seria a arte de
conviver bem, tendo em vista a felicidade individual
e coletiva. O que você pensa a respeito disso?
As respostas a essas reflexões formam parte de sua
aprendizagem e são individuais, não precisando ser
comunicadas ou enviadas aos tutores.

Aristóteles nos auxilia a pensar a educação hoje quando defende uma


educação a partir do conhecimento do mundo, da vida, argumentando
que necessitamos construir uma educação que seja científica, mas que
não se desloque da vivência cotidiana dos nossos estudantes, pois a
educação deve construir sim relações sociais mais éticas, mas também
necessita ter um caráter prático que busque a melhoria da nossa
qualidade de vida.

O legado de Aristóteles está muito além da organização das ciências,


da educação ou da ética; o filósofo também é conhecido por ter criado
a lógica clássica. Em sua busca pela verdade, Aristóteles criou as bases
do discurso verdadeiro explicitado em sua lógica. O nosso objetivo,
nesta unidade, não é abordar esse conteúdo, no entanto, é importante
destacar que a lógica Aristotélica ainda hoje é estudada, a tal ponto
que Kant (1724-1804), o mais influente filósofo iluminista, diz: “Em
dois mil anos nada foi adicionado de relevante à lógica de Aristóteles”.
Somente no último século, a partir dos estudos de Gottlob Frege (1848-
1925) e Russel (1872-1970) é que se construiu uma alternativa à lógica
aristotélica.

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Aristóteles também ficou conhecido em seu tempo por ser tutor de
Alexandre, o Grande, filho de Felipe da Macedônia. Alexandre entrou
para a história como o mais célebre conquistador do mundo antigo.
Esse discípulo de Aristóteles subiu ao trono com 20 anos e disseminou
a cultura grega por todo o mundo antigo. Esse movimento cultural de
propagação dos valores gregos ficou conhecido como helenismo, e isso é
assunto da próxima unidade. Até lá!

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O helenismo e a disseminação da
10 cultura grega
Objetivo
Compreender como a universalização da cultura grega torna-se
universal no mundo ocidental a partir do helenismo.

Na unidade anterior, conhecemos a teoria aristotélica e o surgimento da


ciência e do método científico. Vimos que Aristóteles ficou conhecido
em seu tempo por ser tutor de Alexandre, o Grande, que entrou para a
história porque disseminou a cultura grega por todo o mundo antigo.
Esse movimento cultural de propagação dos valores gregos ficou
conhecido como helenismo, e será o assunto desta unidade.

Para Aranha (2006) e Chauí (1996), o “helenismo” indica um período


em que, após a consagração de pensadores como Sócrates, Platão e
Aristóteles, a cultura grega foi disseminada no território europeu. Essa
disseminação se deu após morte de Alexandre, o Grande, em 323 a.C, e
acompanhou o processo de anexação da Grécia pelo império Romano em
140 a.C. Nesta unidade, trabalharemos esse período filosófico de uma
forma mais extensa do ponto de vista cronológico.

Em linhas gerais e para fins didáticos, o helenismo abrange desde a


ascensão de Alexandre ao trono, em 336 a.C, até o início da Patrística,
com a morte de Cristo no ano 33. Os três séculos de helenismo que
culminaram no Império Romano, em 27 a.C., foram tempos ricos para
a Filosofia e as ciências. Nessa época, viveram os grandes matemáticos
Euclides e Arquimedes, além dos filósofos Zenão, Diógenes, Epicuro e
Pirro. Nesse mundo polifônico e cosmopolita, observamos a transição de
uma Filosofia clássica para uma renovação por meio do trabalho com o
conceito de ética.

O império de Alexandre não marca apenas a expansão da cultura grega


por meio da conquista de territórios, mas também o fim da pólis, do

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ideal de cidade e de cidadãos unidos organicamente e dependentes, como
afirmava Aristóteles. Com a ascensão do império, a Filosofia política
perdeu seu sentido, já que ela era exercida pelo imperador alçado à
condição de Deus.

Para sua reflexão


Você considera a existência de uma Filosofia
política nos dias atuais? Lembre-se que a ideia
de Filosofia política envolve a participação dos
cidadãos em questões fundamentais para o futuro
da sociedade em que vivem.
As respostas a essas reflexões formam parte de sua
aprendizagem e são individuais, não precisando
ser comunicadas ou enviadas aos tutores.

Depois da morte precoce de Alexandre – com apenas 33 anos –, seguiu-


se uma época marcada por incertezas políticas, com a fragmentação do
império em uma multiplicidade de países e territórios. Por essa herança
alexandrina, lutas fratricidas foram travadas, e foi esse cenário que
alimentou o surgimento de escolas filosóficas que buscavam um tipo de
sabedoria mais prática. Para além da Filosofia política e da metafísica,
estoicos, epicuristas, céticos e cínicos respaldaram à sociedade de seu
tempo, especialmente na ética.

Acompanhando o movimento das escolas filosóficas, com o advento


e queda do império de Alexandre, o ideal de educação grega sofreu,
entre outras alterações, a desvinculação da ética em relação à política e a
retomada da noção de consciência individual. No Império, a educação
substituiu a busca pela realização da coletividade pela busca de uma vida
boa e da ideia de felicidade.

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Para que você possa melhor analisar o desenvolvimento da educação e da Filosofia
nesse período, observaremos as quatro principais escolas filosóficas da época –
Epicurismo, Estoicismo, Ceticismo e Cinicismo – centrando-nos em sua maior herança: a
ética.

A escola Estoica tem seu início em Atenas, com Zenão de Cício, mas
espalha-se por todo o império grego. Tendo forte influência socrática, essa
escola desprezava a fama, a riqueza e a nobreza de nascimento, apregoando
uma virtude que seria alcançada independente de qualquer bem exterior.
Dessa forma, tornava a felicidade um bem alcançável por todos.

A virtude é a chave para o entendimento da ética estoica, é o bem


supremo. Para os pensadores dessa escola, a felicidade consiste na
consciência de ser virtuoso e, assim, a virtude tendo um fim em si
mesma. Vale destacar que, para os estoicos, a prática das virtudes não
pode advir de represália moral.

Herdeiros de Sócrates, esses filósofos opunham as virtudes aos vícios,


sendo estes considerados frutos do engano. Em oposição à prudência, por
exemplo, considerada o discernimento entre coisas boas, más e neutras,
há a imprudência, considerada a ignorância do que é bom, do que é mal
e do que é neutro. A título de referência, elaboraram quatro virtudes
cardeais: a prudência, a coragem, a temperança e a justiça, às quais
eram adicionadas virtudes especiais: perseverança, magnanimidade,
perspicácia e bom senso.

A partir dessa explanação, podemos extrair a radicalidade dessa escola


filosófica ao afirmar que apenas as virtudes e os vícios estão subordinados
a nossa vontade. Ser feliz, para os estoicos, era uma questão de sabedoria.

De acordo com Chauí (1996), contrários à austeridade dos estoicos


situavam-se os epicuristas, cuja escola foi fundada por Epicuro de Samos,
em Atenas, em um jardim conhecido como “Jardim de Epicuro”. A
máxima conhecida de Epicuro prega que “O prazer é o único bem
intrinsecamente valioso, portanto o prazer é o bem supremo”. Para esses
filósofos, uma vida feliz é uma vida prazerosa, que pode ser buscada e
alcançada por todos.

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O prazer apregoado no “Jardim de Epicuro” difere do vulgar “Coma,
beba e seja feliz”. Para essa escola filosófica, o prazer não é apenas um
estado positivo, vinculado à satisfação dos desejos ou necessidades, mas
também é a ausência de dor e sofrimento. O epicurismo encontrou
muitos seguidores devido a uma ética baseada no hedonismo.

A vida boa defendida por Epicuro consistia em um controle moderado


dos apetites, além do cultivo intelectual e da boa companhia (a amizade
é um dos temas centrais na sua Filosofia). Para ele, os maiores obstáculos
à felicidade humana são a preocupação, o temor e a ansiedade, e seu
objetivo consistia em curar esses males por meio da Filosofia.

É importante destacar que o epicurismo não nega a existência da dor e


do sofrimento, mas defende que nosso foco deva ser o da busca positiva.
Para Epicuro, a prudência era a fonte de todos os prazeres e virtudes,
pois, a partir de seu cultivo, seria possível uma existência prazerosa com
honra e com justiça.

Para que a proposta da escola epicurista seja melhor assimilada, o que você acha de
interpretar o seguinte poema de Luís de Camões (1524-1580) intitulado “Filodemo”, que
evidencia a busca pela felicidade? O poema diz o seguinte: “Não temas os deuses/Não
temas a morte/O bem pode ser alcançado/O mal pode ser suportado”.
E então, essa forma de interpretação da realidade tem a ver com aquilo que você
referencia para um modelo educacional?

Além dos estoicos e dos epicuristas, mais populares, os céticos e os


cínicos dividiram a atenção dos filósofos no helenismo.

Diferentemente do senso comum de que cético é aquele que não tem


crença, a escola cética deriva seu nome do termo grego skepsis, que
significa “exame cuidadoso” ou “observação atenta”. Os céticos também
são herdeiros de Sócrates e, especialmente, de sua famosa afirmação: “Só
sei que nada sei”.

Pirro de Élis, tido como o criador dessa escola, defendia que a felicidade
consiste na imperturbabilidade da alma, ou seja, na tranquilidade e na

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indiferença. Em sua luta contra a infelicidade, os céticos defendiam a
epoché, ou suspensão do juízo; não tomar partido, deixando as questões
“existenciais” em aberto. Para eles, a infelicidade consistia em buscar a
verdade em meio à polifonia de opiniões e multiplicidade de aparências.

Esses pensadores não se comprometiam com um ideal de felicidade e, assim,


prosseguiam a sua busca pela imperturbabilidade da alma.

Os cínicos, em outro movimento radical, encontram em Diógenes de


Sínope sua síntese. Ainda que hoje utilizemos o termo cínico de forma
pejorativa, ele origina-se da palavra “cão” em grego, e nomeou essa escola
porque seus seguidores viviam como cães pelas ruas de Atenas.

A doutrina cínica inverteu a hierarquia biológica tradicional, colocando os animais


acima dos homens. Se os deuses estavam acima da criação por serem autossuficientes,
os animais estavam acima dos seres humanos por satisfazerem suas vontades
naturalmente e, dessa forma, os cínicos buscavam viver como animais, negando as
necessidades artificiais.

Conta-se que Alexandre, ao passar por Atenas, quis conhecer o famoso


Diógenes. Ao encontrar o filósofo seminu tomando sol, Alexandre
ficou espantado com a felicidade estampada em seu rosto. Então,
posicionando-se na frente dele, disse: “Pede o que quiseres e te darei”, ao
que Diógenes respondeu: “Quero apenas que saia da frente do meu Sol”.

Iniciado com Alexandre, o helenismo levou a cultura grega aos territórios


conquistados que se estendiam da Macedônia à Índia. Esse imperialismo
militar e cultural não apenas disseminou a cultura grega, como trouxe em
sua bagagem a cultura dos povos conquistados. Esse período de grande
efervescência cultural e intelectual tornou possível não haver fronteiras
entre ocidente e oriente e, nessa troca, os deuses gregos foram ofuscados
pela tradição milenar oriental. Nem mesmo o batismo romano livrou
o Olimpo do ostracismo. Nossa próxima unidade envolverá tempos
incertos, em que velhos deuses morrem e novos deuses se estabelecem.

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Tarefa dissertativa
Caro estudante, convidamos você a acessar o
Ambiente Virtual de Aprendizagem e realizar a
tarefa dissertativa.

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Os Pais da Igreja e o uso da Filosofia
11 no combate ao gnosticismo
Objetivo
Compreender a influência da cultura helênica na ascensão do
cristianismo, bem como o papel da Filosofia a partir de Orígenes e
Tertuliano no embate com o gnosticismo.

Caro aluno, na unidade anterior vimos que o helenismo levou a cultura


grega aos territórios conquistados que se estendiam da Macedônia
à Índia. Esse imperialismo militar e cultural não apenas disseminou
a cultura grega, mas trouxe também em sua bagagem a cultura dos
povos conquistados. Esse período de grande efervescência cultural e
intelectual abriu fronteiras entre Ocidente e Oriente. Nesta unidade,
vamos compreender a influência da cultura helênica na ascensão do
cristianismo, bem como o papel da Filosofia a partir de Orígenes e
Tertuliano no embate com o gnosticismo.

Nos três primeiros séculos da nossa era, se configurou e estruturou um


movimento que alteraria profundamente a história da humanidade, a
ponto de dividir as eras entre antes e depois do evento inicial dele. O
evento inicial foi mais extraordinário que as conquistas de Alexandre
e de qualquer outro imperador, pois partiu de uma crença espetacular,
a crença de que Deus fez-se carne, viveu entre nós, foi morto, venceu
a morte e ressuscitou. O simbolismo dessa crença é profundo, pois se
Deus tornou-se homem e venceu a morte, o mal pode ser vencido e estão
abertas as portas da imortalidade; o homem já pode adentrar na vida
eterna. Dessa forma, o cristianismo, assim como a democracia grega,
trouxe a divindade para a terra e colocou o homem na condição de deus.

Os Pais da Igreja, distribuídos nesses três primeiros séculos, alimentaram-


se desse acontecimento; tudo o que pensaram, ensinaram, anunciaram
e repudiaram parte do pressuposto que Jesus de Nazaré existiu. Esses
bravos intelectuais lançaram as bases doutrinárias nas quais se assentou o
cristianismo – tudo o que o cristianismo prega hoje foi delimitado pelos

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Pais da Igreja, pois estes foram os guardiões da fé e os protetores das
bases cristãs, legando à posteridade uma defesa autêntica e apaixonada do
cristianismo.

O cristianismo nasce em um terreno fértil: se por um lado os deuses


greco-romanos já não seduziam as multidões, a formação multiétnica do
império e a pax romana possibilitavam o surgimento de novas religiões,
aproveitando-se da diáspora judaica. O cristianismo, nos primeiros anos,
cresceu rapidamente entre os judeus espalhados por todo o império
romano. Dessa forma, a primeira batalha travada pelo cristianismo
foi com o judaísmo – o rompimento do cristianismo com o judaísmo
é expresso no livro “Atos dos Apóstolos” e nas “Cartas de Paulo”,
publicadas no livro sagrado dos cristãos, a Bíblia.

Conforme descreve Chauí (1996), além do judaísmo, o cristianismo


enfrentou muitos outros adversários, porém, fazendo jus à ideologia
cristã, os embates fortaleceram e purificaram mais as doutrinas cristãs.
Desde o seu nascimento, o cristianismo foi imbuído pelo helenismo:
Paulo, o grande apóstolo dos gentios, responsável por levar o cristianismo
por toda a costa do mediterrâneo, era um judeu de cidadania romana,
formado a partir da cultura helênica, fruto desse ambiente cosmopolita.
Paulo encontra na Filosofia grega o adversário e o aliado na propagação
do cristianismo.

Os Pais da Igreja intentaram conciliar a nova religião nascente com


o pensamento greco-romano, pois, somente dessa forma, poderiam
convencer os pagãos da nova verdade e convertê-los à nova religião. O
diálogo com o helenismo foi árduo; o cristianismo apresentava conceitos
considerados absurdos pela Filosofia clássica. Chauí (1996) argumenta
que a patrística foi obrigada a introduzir a ideia de criação do mundo a
partir do nada, de pecado original do homem, de Deus como trindade
una, de encarnação e morte de Jesus, de juízo final ou de fim dos tempos
e ressurreição dos mortos etc. – ideias até então desconhecidas para os
filósofos greco-romanos. Além disso, precisou ainda explicar como o mal
pode existir em um mundo que foi criado por Deus.

A herança helênica era muito presente nos grandes centros do primeiro


século e, dessa forma, influenciado pela filosofia grega e pelo Estado

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romano, o cristianismo se estruturou até tornar-se religião oficial do
império no século IV. Esse processo aconteceu de forma gradual e a partir
de muitos embates intelectuais. Um deles, especificamente o embate do
cristianismo com o gnosticismo a partir de Orígenes e Tertuliano.

Segundo Chauí (1996), Orígenes (185 d.C., Alexandria – 254 d.C.,


Tiro) era filho de uma família cristã, mas vivendo em uma das cidades
mais cosmopolitas da sua época ampliou a sua formação intelectual
cristã a partir das tradições judaicas, romanas e gregas, tendo inclusive
estudado com Amônio Saccas, o fundador do Neoplatonismo.

Orígenes realizou uma vasta produção intelectual e, apesar de muitas


das suas obras terem sido destruídas pelos seus opositores, algumas delas
chegaram até nós, como a sua famosa obra “Contra Celso”. Nessa obra, o
filósofo-teólogo demonstra todo o seu conhecimento das escrituras e das
tradições clássicas ao refutar as acusações de Celso contra o Cristianismo.

Celso teria escrito duras críticas ao cristianismo em uma obra intitulada


“Discurso verdadeiro contra os cristãos”, escrita por volta de 170-185
d.C. Nela, Celso acusa o cristianismo de ser a maior ameaça ao império
romano, julgando ser ilegal perante as leis romanas, além de uma série de
acusações vulgares sobre a pessoa de Cristo, especificamente sobre o seu
nascimento, dizendo que Jesus nasceu de um adultério de Maria com um
soldado romano.

Para Chauí (1996), Orígenes responde a Celso argumentando que as


leis romanas não são universais, mas que refletem a cultura de um povo,
sendo que a única lei universal se resumiria no amor de Cristo. Contra
as acusações vulgares à pessoa de Cristo, Orígenes, usando Platão,
argumenta: “Não pertencem as ideias mais excelsas aos filósofos? Não
são estes os homens mais puros? Há, portanto, um parentesco entre
corpo e alma, a alma pura possui um corpo também puro”. Dessa forma,
não poderia uma doutrina tão pura e excelsa como o cristianismo ter
se originado de uma pessoa nascida de adultério, pois a alma pura que
criou o cristianismo também necessita de um corpo puro. Por meio do
raciocínio lógico, Orígenes destrói as premissas e demonstra a falsidade
das conclusões de Celso, defendendo o cristianismo, e lança as bases da
doutrina cristã.

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A vida de Orígenes, assim como a de muitos heróis cristãos, é marcada
por perseguições e martírio. Devido a sua ampla formação intelectual,
Orígenes alcançou grande fama e prestígio, sendo inclusive convidado
para inúmeros debates com os principais teólogos e filósofos da sua
época. Porém, essa fama resultou na inveja dos seus pares e Orígenes foi
duramente perseguido pelo bispo de Alexandria. Depois de abandonar
essa cidade, foi para Cesareia, na Palestina, onde lecionou na chamada
Escola de Cesareia. Em uma onda de perseguição aos cristãos, ordenada
por Décio, Orígenes foi preso, torturado e morto, tornando-se também
um mártir do cristianismo.

Bom, comentamos brevemente sobre a biografia e a importância de


Orígenes para a disseminação da doutrina cristã. E qual foi então o papel
de Tertuliano?

Nascido em Cartago (160-235 d.C.), filho de uma família romana pagã,


converteu-se ao cristianismo na maturidade e, no fim da vida, voltou-
se para o montanhismo, tornando-se herege da crença que ajudou a
construir. A vida e obra de Tertuliano refletem muito bem o ambiente de
conflitos intelectuais e institucionais que abalavam a Igreja no início da
era cristã.

A contribuição de Tertuliano ao cristianismo é tamanha que se atribui


a ele a criação da expressão “Santíssima Trindade”; em suas obras,
Tertuliano se atém a temas apologéticos, defendendo o cristianismo dos
judeus, dos pagãos e dos cristãos gnósticos. Em uma de suas obras mais
famosas, “A carne de Cristo”, Tertuliano expressa em seu estilo polêmico
a luta da Igreja contra as heresias.

Um dos muitos gnósticos que Tertuliano enfrenta no seu livro é Marcião,


autor de um evangelho que encontrou popularidade no meio gnóstico
da igreja. Esse evangelho buscava negar o caráter humano de Cristo,
afirmando que era indigno de um Deus encarnar na concupiscência
humana. Para Marcião, os evangelistas se deixaram influenciar pela
cultura judaica, por isso o caráter humano de Cristo.

Tertuliano se dirige duramente a Marcião, desejando até mesmo que este


morra, pois se a pregação falsa é um pecado e o pecado é a morte, então,

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que ele morra. Inicialmente, em sua obra, Tertuliano indaga Marcião
sobre a fonte da sua autoridade, afirmando que os apóstolos escreveram
o que presenciaram; sendo assim, com que autoridade ele escreveria um
evangelho?

Prosseguindo na defesa da fé e condenação a Marcião, Tertuliano


argumenta que, para Deus, nada é impossível, portanto, ele enviou
seu filho para que encarnasse como ser humano. A única coisa que é
impossível para Deus é o que ele não quer; se ele quis que seu filho
encarnasse, ele certamente encarnou.

Contra os argumentos gnósticos de Marcião, Tertuliano afirma que amar


os homens não é apenas amar a sua alma, mas também a sua carne. O
amor de Cristo abrange o homem em sua totalidade e, dessa forma,
para provar o seu amor, Cristo encarnou e viveu como homem. Assim,
Tertuliano inverte o argumento de Marcião, e aquilo que era objeto
de desprezo para este, torna-se objeto do mais puro e autêntico amor
cristão. Como Orígenes, Tertuliano prosseguiu defendendo e afirmando
o Cristianismo.

Apesar de estranha a conversão de Tertuliano no final da sua vida ao


montanhismo, tornando-se signatário das crenças que tanto combatera, a
sua adoção encontra ressonância na sua busca incontrolável pela verdade.
Não contente com o cristianismo ortodoxo, Tertuliano buscou no
misticismo do Montanhismo as respostas que tanto ansiava.

Em seus primórdios, o cristianismo fez uso exaustivo da educação para


propagar a boa nova: a partir da estrutura já organizada das sinagogas e
escolas filosóficas, os missionários cristãos varreram o mundo conhecido
apregoando a mensagem de Cristo. No seu início, o cristianismo
propagou uma ampla disseminação cultural, buscando evangelizar
todos os povos. Os cristãos espalharam cópias dos evangelhos por
todo o império romano, promovendo, a partir deles, uma verdadeira
alfabetização.

Os novos valores e a nova educação encontraram muita resistência no


meio greco-romano, especialmente por acrescentar um novo tipo de

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verdade, que seria a verdade revelada contrastando com a verdade do
conhecimento.

Esse novo tipo de verdade revelada por Deus seria um dogma, ou seja,
irrefutável e inquestionável. Com isso, surge o conflito entre fé e razão,
e o mote da Filosofia patrística é a tentativa de conciliar razão e fé, ainda
que isso não seja unânime, pois nessa relação conflituosa entre fé e razão,
os Pais da Igreja se dividiam em três posições principais, de acordo com
Chauí (1996):

a. os que julgavam fé e razão irreconciliáveis e a fé superior à razão;


b. os que julgavam fé e razão conciliáveis, mas subordinavam a razão à fé;
c. os que julgavam razão e fé irreconciliáveis, e afirmavam que cada
uma delas tem seu campo próprio de conhecimento e não devem
misturar-se.

A educação catequética defendida pelo cristianismo durante a sua história


de dominação da educação formal não encontra eco nos dias atuais, pois
atualmente recusamos todo e qualquer dogmatismo na educação, porém
fica o alerta para nós professores não limitarmos a educação à repetição
de verdades prontas, ainda que estas estejam embasadas nas ciências,
pois a simples repetição não possibilita o pleno desenvolvimento dos
estudantes.

O movimento caudaloso da Patrística encontra sua síntese em um


autêntico patriarca da Igreja. Esse filósofo-teólogo, declarado santo pela
Igreja, viveu nos últimos dias do império romano e viu ascender um
novo mundo, o mundo medieval. Nesses tempos incertos, deixaram-lhe
apenas uma certeza: a fé perene e autêntica no amor de Cristo. Dessa
forma, dedicou a sua vida na tentativa de subordinar a razão à fé a partir
da Filosofia de Platão. Santo Agostinho, bispo de Hipona, será o tema da
nossa próxima unidade.

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Santo Agostinho e a educação
12 como afirmação da fé
Objetivo
Compreender, a partir das ideias de Santo Agostinho, o papel da
educação na defesa do cristianismo.

Caro aluno, na unidade anterior você observou como o cristianismo


nos seus primórdios fez uso da Filosofia para evangelizar o povo e a elite
política e econômica da época. Viu também como o papel da Filosofia
garantiu o embate de Orígenes e Tertuliano contra o gnosticismo.
Nesta unidade, você vai compreender o papel da educação na defesa do
cristianismo a partir das ideias de Santo Agostinho. Vamos conhecê-lo?

Aurélio Agostinho, bispo de Hipona – antiga cidade da Argélia, fundada


por fenícios –, é também conhecido como Santo Agostinho (354-430):
foi bispo, escritor, teólogo, filósofo. Considerado uma das figuras mais
importantes do cristianismo, especialmente pela sua Filosofia, converteu
a Filosofia de Platão elevando o cristianismo de simples religião a um
complexo ético, epistemológico e metafísico.

Segundo Chauí (1996), Agostinho nasceu em uma família dividida, pois


seu pai era pagão e sua mãe era cristã; ainda jovem foi enviado a Cartago
para estudar retórica, onde flertou com várias doutrinas populares da sua
época, desde o Neoplatonismo até o Maniqueísmo. Após sua formação,
lecionou retórica imperial no tribunal da Província de Milão, onde se
converteu ao cristianismo, abandonando tudo para se dedicar à fé cristã.

O cristianismo, em seus primórdios, era apenas mais uma religião entre


as várias que se multiplicavam rapidamente no império romano, porém,
a sua característica evangelizadora, este ímpeto de espalhar o evangelho e
converter os pagãos à nova religião, foi um elemento novo acrescentado
à religiosidade, pois as religiões antigas tinham caráter nacionalista e
habitualmente se expandiam a partir da guerra.

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Devido às suas características e principalmente pelo seu poder
evangelizador, Chauí (1996) defende que o cristianismo não necessitava
de uma Filosofia, pois sendo uma religião da salvação, seu interesse maior
estava na moral, na prática dos preceitos virtuosos deixados por Jesus,
e não em uma teoria sobre a realidade; sendo uma religião vinda do
judaísmo, já possuía uma ideia muito clara do que era o Ser, pois Deus
disse a Moisés “Eu sou aquele que é, foi e será. Eu sou aquele que sou”.
Seu interesse maior como religião estava na fé e não na razão teórica; na
crença, não no conhecimento intelectual; na revelação, não na reflexão.

A verve evangelizadora atingiu Agostinho, e ele dedicou a sua vida a


criar uma Filosofia cristã, para que esta rivalizasse com a Filosofia grega e
convertesse os intelectuais e a elite greco-romana, habituados à Filosofia.
Dessa forma, o cristianismo criou uma Filosofia com um caráter
evangelizador, buscando subordinar a Filosofia ao cristianismo.

O Estado romano criou a noção de homem universal, sem pátria


ou comunidade. O cristianismo, dentro do império romano, foi sua
religião, pois se dirigia ao humano em geral com a promessa de salvação
individual. Além disso, o direito romano codificado em leis objetivas
possibilitou aos cristãos aceitarem e se afirmarem na lei moral invisível
inscrita na consciência de cada um. Dessa forma, a Igreja, como
comunidade dos crentes, organiza-se a partir de regras diferentes da
comunidade política. Agostinho vai buscar em Platão a subordinação do
poder temporal ao poder espiritual.

Resgatando o papel do indivíduo criado pelo direito romano, em que


cada ser humano é uma pessoa com direitos e deveres e responsável
pelos seus atos e pensamentos, Agostinho aprofunda a dicotomia entre
corpo e alma, pois a consciência livre e pura estaria aprisionada em um
corpo passional e fraco, levando o homem ao erro e ao pecado. Desse
modo, competia ao bom cristão subordinar o corpo à alma, assim
como o Estado deveria ser subordinado à religião, e assim como Platão
subordinava os sentidos à razão.

Agostinho vê a subordinação do corpo à alma como o conhecimento


deveria ser subordinado à fé. Entre as suas máximas, consta: “Creio ainda
que absurdo” (Credo quia absurdum), ou seja, por mais que a doutrina

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seja absurda, pela fé ele crê, seguindo a tradição paulina que a mensagem
da cruz é escândalo e absurdo para os não crentes.

Para Agostinho, sem a fé o conhecimento andaria nas trevas, atendo-se


a questões superficiais e esquecendo o mais importante: Deus. Segundo
ele, não é possível separar Filosofia de teologia, pois o mundo só pode ser
conhecido porque Deus o criou de forma harmoniosa e racional.

Na sua magnífica obra “Cidade de Deus”, Agostinho contrapõe as


cidades dos homens, Babilônia e Roma, com seus vícios e maldades, à
Cidade de Deus, a Nova Jerusalém, buscando demonstrar que, apesar das
vicissitudes da vida humana, devemos sempre ter em mente a “Cidade
de Deus”; devemos viver aqui nos preparando para morar na Nova
Jerusalém.

Agostinho não nega que haja muitas coisas boas na cidade dos homens, aliás, essa seria
a prova de que Deus não abandonou a humanidade e por isso enviou seu filho para
nos redimir, mas apesar das muitas coisas boas que existem, como a amizade, as leis,
as artes etc., nos movemos nas trevas devido à ignorância causada pela falta de fé. A
cidade dos homens seria uma sombra da cidade de Deus, assim como as sombras no
fundo da caverna eram cópias das coisas verdadeiras em Platão.

A queda de Roma foi um dos motivos pelos quais Agostinho escreveu


a “Cidade de Deus”. O filósofo preocupou-se em responder àqueles
que acusam o cristianismo de ter debilitado o Império e possibilitado
a derrota para os bárbaros. Sendo assim, essa obra possui forte caráter
apologético, já que visa afirmar o cristianismo frente ao paganismo culto,
além de justificar a fé cristã diante dos tempos incertos que se seguiam.

Agostinho, a partir da sua ampla formação filosófica, demonstra que não


era mais possível voltar ao paganismo, pois uma nova verdade mais pura
e excelsa se fazia presente: o cristianismo, sendo a chave pela qual era
possível interpretar todas as figuras do passado como meras preparações
para o seu advento.

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Para Agostinho, a Cidade de Deus era a resposta aos anseios por justiça
que sempre se fizeram presente na história da humanidade, como
punição aos maus e recompensa aos bons. A tensão entre virtude e vício,
entre o homem correto e o malfeitor, é desfeita na cidade de Deus, pois
nela apenas os bons habitarão, e os maus serão julgados e condenados.

A igreja seria então a única instituição capaz de apontar o caminho


para se alcançar a cidade de Deus, sintetizado na expressão “Sem a
Igreja não há salvação” (sine ecclesia nula salus). Agostinho representou
culturalmente a consolidação de uma nova concepção de mundo, a
concepção institucional do cristianismo expressa na figura da Igreja
Católica.

Com a queda de Roma, a Igreja tornou-se a instituição mais poderosa


do ocidente. No mundo esfacelado que se seguiu – a queda do império
romano –, educação e catequese se confundiam, as escolas buscavam
formar as pessoas para o exercício da fé, a educação era pautada nas
doutrinas e dogmas cristãos, os conhecimentos tradicionais vinham em
segundo plano.

Apesar de o conhecimento ter um papel central na doutrina Agostiniana,


ele se confundia com a fé. A educação tinha uma forte base hierárquica
que subordinava o conhecimento à fé, a filosofia às crenças e os
discípulos aos mestres, promovendo a resignação e a humildade diante
do desconhecido. Com o privilégio da alma sobre o corpo, a educação
visava controlar as paixões e, assim, buscar a salvação em uma vida após a
morte.

A educação, para Agostinho, era contemplativa por subordinar os


sentidos à razão. Encontrando em Platão a fórmula perfeita para a
educação no cristianismo, pois se o conhecimento verdadeiro é conhecer
a Deus e Deus só pode ser conhecido pela alma, o erro e o pecado são
causados pela ignorância e o engano dos sentidos. Desse modo, devemos
privilegiar nossa capacidade intelectual em detrimento da investigação
natural e física, como ocorria em Aristóteles; devemos intelectualmente
sair da caverna e olhar, segundo Agostinho, para a luz, que é Cristo.

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Podemos destacar como uma grande contribuição de Agostinho para
a educação a sua ênfase no sujeito, ou seja, para Agostinho a educação
visava uma transformação pessoal que retiraria o estudante das trevas
apontando para esta a luz. Não podemos esquecer nos dias de hoje o
papel libertador da educação, pois a partir da educação nos libertamos da
ignorância e do autoritarismo.

Agostinho pode ser considerado a pessoa certa no lugar certo, pois com
a queda de Roma, fazia-se necessário que a Igreja desse uma resposta
política ao caos que se seguiu. A resposta foi a subordinação do poder
temporal ao poder espiritual, dando novo fôlego à Igreja, que, durante
oito séculos, se alimentou da obra agostiniana até o surgimento de
um novo paradigma filosófico, o Tomismo, e este será o tema da nossa
próxima unidade.

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Resumo

Caro aluno, você observou nestas unidades o desenvolvimento da


Filosofia com Sócrates, Platão e Aristóteles, além da sua expansão
por todo o mundo pelo helenismo e, por fim, também pôde observar
como o Cristianismo se apropriou da Filosofia a partir de seu projeto
evangelizador.

Na unidade 7, você observou como Sócrates buscava a verdade – o


conceito daquilo que seria universal a todas as pessoas –, por isso ele foi
um grande educador, priorizando o diálogo em seus ensinamentos, além
de associar o conhecimento ao bem ao afirmar que o homem sábio é o
homem bom e justo.

Na unidade 8, você conheceu a Filosofia de Platão, discípulo de


Sócrates, o qual passa a defender que a única fonte confiável para acesso
ao conhecimento seria o pensamento. Ele radicaliza a sua Filosofia ao
afirmar que tudo o que vemos e sentimos não passa de cópia das coisas
verdadeiras que estariam no mundo das ideias.

Na unidade 9, você foi apresentado à filosofia de Aristóteles, discípulo de


Platão, que discorda radicalmente da teoria das ideias, e dá início assim
ao método científico. Para ele, não há nada na mente que não tenha
passado pelos sentidos.

Na unidade 10, você conheceu como a Filosofia se expandiu pelo


mundo a partir das conquistas de Alexandre, o Grande. Dessa expansão,
a Filosofia prioriza a ética, surgindo as principais escolas da época: o
estoicismo (uma vida boa seria uma vida sábia) e o epicurismo (a vida
boa seria em busca do prazer, ainda que este fosse um prazer moderado e
natural, suprindo as necessidades básicas).

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Na unidade 11, você observou como o cristianismo fez uso da Filosofia
para evangelizar a elite política e econômica da época, tendo Orígenes e
Tertuliano como dois grandes representantes.

E, por fim, na unidade 12, você foi apresentado à Filosofia de Santo


Agostinho, que dialogou com a Filosofia de Platão e o cristianismo.
Agostinho subordinou a Filosofia à fé, argumentando que as trevas
devem se subordinar à luz. Dessa forma, a “Cidade dos homens” deveria
se submeter à “Cidade de Deus”.

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A escolástica e as primeiras
13 universidades
Objetivo
Demonstrar a relação da escolástica com o surgimento das primeiras
universidades e os mosteiros como reduto da cultura do saber.

Apesar de haver muita divergência entre os historiadores quanto à


cronologia, o período que decorre entre Agostinho (século IV) e a
Reforma Protestante (século XV) é conhecido como idade das trevas,
Idade Média ou idade medieval, sendo consenso de que houve uma
estagnação política e cultural em toda a Europa. Porém, taxar esse
período como idade das trevas é um equívoco; não podemos analisar um
período histórico a partir do nosso período, caracterizando este período
como idade das trevas apenas por ele não se pautar pelos nossos valores
de liberdade, igualdade, reconhecimento, autonomia etc.

A Idade Média trouxe inúmeras contribuições para o conhecimento,


como Erígena (810-876), Abelardo (1079 – 1172) e Tomás de Aquino
(1225-1274), que desenvolveram filosofias. Para além das questões
religiosas, os árabes Avicena (980–1037) e Averróis (1126-1198)
conservaram e retomaram a filosofia grega. Na matemática, introduziu-se
o zero; na astronomia, foi aperfeiçoada a visão aristotélica que, apesar de
incorreta, explicava com certa precisão o movimento dos astros; e, por
fim, as artes se desenvolveram exponencialmente representando o divino
e a nossa relação com a experiência religiosa.

No pensamento europeu ocidental, até o século XII, predominou o


pensamento de Agostinho; porém, a partir do século IX, iniciou-se
a gestação de um movimento chamado Escolástica ou Tomismo. A
escolástica recebe esse nome devido à educação da época ser realizada em
escolas que eram dirigidas por mestres denominados escolásticos. Esse
movimento do pensamento encontraria seu ápice em Tomás de Aquino,
por isso Tomismo.

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É comum dividir a escolástica em três períodos, antes, durante e depois
de Tomás de Aquino. Nesta unidade, nos ateremos à filosofia pré-
tomista, ou seja, do século IX ao século XII.

A filosofia Tomista mantém as características da patrística (como vimos


nas unidades 11 e 12) ao subordinar a fé à razão. Dessa forma, nesse
período surge uma filosofia autenticamente cristã, que seria a teologia.
Os filósofos dessa época preocupavam-se em buscar argumentos racionais
para provar a existência de Deus, do espírito, da alma etc.

O pré-tomismo se inicia com as reflexões de John Scotu Erígena (810-


876), que buscava a solução para um dos maiores problemas da filosofia:
o “Problema dos Universais”. Chauí (1996) afirma que para alguns os
chamados universais (ideias, emanações, gêneros, espécies) eram nomes
gerais criados por nossa razão, e não seres, substâncias ou essências
reais. Para outros, o Ser deveria ser afirmado com o mesmo sentido para
Deus e para as criaturas, a diferença entre eles sendo de grau, e não de
natureza.

Em suma, o problema dos universais consistia em saber se os conceitos


possuíam existência, ou qual seria a realidade dos conceitos. Por exemplo,
haveria algo que poderia ser chamado de humano, flor, liberdade,
felicidade etc.? Ou esses conceitos seriam apenas palavras criadas para
designar características comuns a vários seres?

De um lado, temos Platão e a sua teoria das ideias afirmando que sim,
os conceitos possuem existência no mundo das ideias; do outro lado,
Aristóteles afirmando que os conceitos seriam apenas palavras.

Segundo Chauí (1996), Erígena (810-876) propõe uma solução radical


para o problema dos universais, argumentando a existência destes a partir
de Deus, pois, para o filósofo, a única existência é a existência divina,
pois Deus criou tudo a partir de si, tudo o que criou foi para si e tudo
voltará para Ele no final dos tempos. Sendo assim, a natureza divina
possui quatro partes:

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a. a natureza não criada e criadora, ou seja, Deus, que é a razão de
tudo;
b. a natureza criada e criadora, que seria o Verbo divino;
c. a natureza criada e não criadora, sendo toda a realidade material que
existe no espaço e no tempo;
d. a natureza não criada e não criadora, que é Deus, pois para Ele tudo
vai retornar no fim dos tempos.

A filosofia de Erígena afirma o princípio bíblico encontrado no livro


de Apocalipse, capítulo 1 e versículo 8: “Eu sou o Alfa e o Ômega,
o princípio e o fim, diz o Senhor, que é, e que era, e que há de vir, o
Todo-Poderoso”. Faz-se necessário distinguir que Erígena defende
que o mundo é Deus, mas Deus não é o mundo, pois Deus criou e
transformou-se no mundo, conservando-se em posição mais elevada do
que o mundo.

Outro famoso filósofo dessa época é Santo Anselmo de Cantuária (1033-


1109), muito conhecido pelo seu argumento de defesa da existência de
Deus, chamado de argumento ontológico. A lógica argumentativa usada
por Anselmo foi utilizada por muitos outros filósofos, entre os quais
Hegel – que foi a maior expressão do idealismo alemão.

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Em seu texto “Proslógio”, Anselmo defende a existência de Deus a partir do seguinte
raciocínio lógico:
a) existe na mente humana a ideia de um ser tão grande, do qual não se poderia pensar
outro maior. Este seria o maior de todos os seres;
b) existir apenas na mente é menos perfeito do que existir na mente e também na
realidade, pois a existência é uma das qualidades de algo perfeito;
c) se o maior de todos os seres, do qual não se pode pensar outro maior, só existisse na
mente, ele seria menor que qualquer outro ser que existisse na mente e na realidade,
existindo, assim, um ser maior do que o maior de todos os seres, porém isto é absurdo:
não pode existir um ser maior do que o maior de todos os seres;
d) dessa forma, o maior de todos os seres do qual não se pode pensar outro maior
obrigatoriamente deve existir também na realidade, caso contrário, o pensamento de
maior de todos os seres seria absurdo. Logo, conclui-se que existe Deus, sendo o ser
mais perfeito de todos.

Para além da filosofia cristã, a Idade Média também foi importante para
o desenvolvimento do pensamento Árabe. Filósofos como Avicena (980
- 1037) e Averróis (1126 - 1198) tornaram-se especialistas em filosofia
clássica, especialmente em Aristóteles. Aliás, se não fosse o zelo árabe,
certamente hoje não teríamos nenhum escrito de Aristóteles, apenas os
fragmentos dos comentadores.

Avicena (980-1037) foi o mais famoso e influente filósofo da “Era de


Ouro Islâmica”. Esse incansável intelectual escreveu centenas de obras
sobre os mais variados assuntos – seus escritos sobre medicina se tornaram
texto padrão de muitas universidades católicas medievais, pois enquanto
a Europa sucumbia à fé e ao misticismo, Avicena construiu um completo
sistema de medicina a partir dos princípios dos pais da ciência médica:
Hipócrates (Grécia, 460-370 a.C.) e Galeno (129-217 d.C.). Os seus
outros escritos versam sobre filosofia, astronomia, alquimia, geografia,
psicologia, teologia islâmica, lógica, matemática, física, poesia etc.

Você sabe como era organizada a escola durante o período da Idade


Média? A educação na Europa medieval se voltava para o cristianismo

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e as doutrinas cristãs, as escolas se situavam no entorno das igrejas e a
maioria dos professores eram padres. Nesse período, também se deu
a fundação das primeiras universidades. Apesar da escuridão que os
iluministas imputam a essa época, as universidades gozavam de certa
autonomia e buscavam estudar muito mais que as doutrinas cristãs;
foram nessas universidades que se lançaram as bases para toda a ciência
moderna. Além disso, as discussões sobre o papel da universidade e a
autonomia universitária tão presentes nos dias de hoje remontam a esses
pioneiros do ensino superior.

Nesse período, a catequese católica se firmou como a principal forma de


socialização do saber. As igrejas, para atingirem a grande massa iletrada,
buscavam ensinar a partir do simbólico, com os ícones, as artes e a
arquitetura, tão característicos dessa época. Assim, as luzes dessa idade das
trevas eram irradiadas a partir do causador da escuridão, a Igreja Católica.

Apesar de todos os avanços com a criação das universidades a educação


na escolástica era basicamente elitista, pois apenas a classe dominante
possuía acesso a esta educação que visava a carreira eclesial, teológica
e ou o magistério superior, ou seja, o modelo educacional desta época
embasado nas humanidades e na literatura clássica objetivava formar o
“homem bom”, a elite pensante e não propagar o conhecimento.

Os mosteiros medievais se tornaram centros de convergência dos grandes


intelectuais e passaram a abrigar muito do conhecimento acumulado
historicamente pela humanidade. Dessa forma, intelectuais nem sempre
convictos com as doutrinas católicas se submetiam à ascese dos mosteiros
para ter a sua disposição obras clássicas e compêndios sobre os mais
diversos temas.

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Saiba mais
O filme “O Nome da Rosa”, inspirado no livro
homônimo de Humberto Eco, retrata muito bem
esse período, evidenciando como cada mosteiro
buscava restringir o acesso a sua biblioteca, bem
como o trabalho dos monges em reproduzir estes
livros, pois em uma época anterior à prensa de tipos
de Gutemberg, as cópias eram feitas manualmente.
Vale a pena ler o livro ou assistir ao filme.

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Tomás de Aquino e a retomada da
14 cultura clássica
Objetivo
Apresentar como Tomás de Aquino, a partir da utilização da teoria
aristotélica, dá novo fôlego ao cristianismo.

Historicamente, alguns homens sintetizam seu tempo a partir da sua


existência. Temos Sócrates, que demonstra o declínio da sociedade grega;
Aristóteles, que explicita o helenismo; Agostinho, que viveu com o
cristianismo do seu tempo em meio a debates e defesa da fé. Da mesma
forma, Tomás de Aquino é a síntese do século XIII, pois viveu em uma
época de reforma e ao mesmo tempo de consolidação, trazendo um novo
fôlego para Igreja e para a Europa.

O século XIII foi marcado pelo tratado de paz com os árabes após
os horrores das cruzadas. Nesse século, o papa Inocêncio III (1160-
1216) convocou o maior concílio do ocidente, o concílio de Latrão,
no qual 2.200 prelados definiram e promulgaram amplas reformas na
cristandade. Também foram fundadas as grandes universidades europeias
de Paris e Oxford; a arquitetura medieval atingiu seu ápice no século
XIII com as construções em arco, e assim, nesse século rico em cultura
e conhecimento, viveu Tomás de Aquino (1225-1274), que assim como
Agostinho é considerado um dos pilares do cristianismo católico. Esse
padre dominicano, que se dedicou à filosofia e à teologia, foi proclamado
santo e Doutor da Igreja devido a sua contribuição na formação da
filosofia e teologia cristã. Ao contrário dos seus antecessores, Aquino não
subordinou a razão à fé, mas defendeu uma harmonia entre a fé e a razão.

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Com Aquino, a Igreja passa a ter uma teologia – inspirada por Deus, revelada
divinamente – e uma filosofia – a partir do exercício da razão humana. Aquino
argumenta que fé e razão palmilham um caminho comum, cujo fim é Deus, pois a
filosofia nos leva a conhecer Deus, e a teologia nos revela Deus, sendo assim, não pode
haver contradição entre fé e razão.

A influência de Aristóteles se faz sentir em toda a obra de Tomás de


Aquino. Especula-se que Aquino tomou ciência de Aristóteles a partir
de Avicena e Averróis. Ademais, a Ordem dos Franciscanos, opositores
políticos dos dominicanos, aos quais pertencia Aquino, se declarava
contrária ao uso de Aristóteles como referência nas universidades
católicas, pois viam com desconfiança a afirmação da natureza e dos
sentidos apregoada por esse filósofo.

Nessa disputa política, o cristianismo ganhou uma síntese do


pensamento aristotélico imbricada à teologia cristã. Isto se torna evidente
quando Aquino, assim como Erígena e Anselmo, se propõe a demonstrar
racionalmente a existência de Deus com base em Aristóteles, levantando
três questões.

a. A proposição “Deus existe” é autoevidente?


b. Ela é demonstrável?
c. Deus existe?

Inicialmente, Aquino diz que algo pode ser evidente para si mesmo
ou evidente para si e para nós, como no caso da proposição “O fogo é
quente”. Para quem conhece o predicado “quente”, a frase será evidente,
então poderia haver essências de predicados ou qualidades e sujeitos ou
objetos que não conhecemos, pois nosso conhecimento de certa forma
está ancorado em conhecimentos anteriores.

Sobre a segunda proposição, Aquino argumenta que uma demonstração


pode ser realizada de duas formas, uma a priori, ou seja, pelo que vem
antes, a causa; a outra forma seria a posteriori, o que vem depois, o efeito.
Como o efeito de algo é mais perceptível por nós, devemos iniciar com
o efeito: se o efeito de algo pode ser conhecido, então esse algo pode ser

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conhecido pelos seus efeitos – seria o caso de Deus, que embora não seja
evidente, pode ser conhecido pelos seus efeitos.

Quanto à existência de Deus, Aquino sustenta que Ele pode ser


conhecido a partir de cinco modos explicitados pelos seus efeitos.

1. Primeiro motor imóvel: este primeiro modo pressupõe a existência


do movimento no universo, porém, um ser não move a si mesmo,
podendo apenas, então, mover outro ou ser movido por outro.
Assim, para não retroagir até o infinito, necessitamos de um
primeiro motor que mova todos os outros.
2. Primeira causa: o segundo modo seria o efeito do motor imóvel, ou
seja, a nossa percepção da ordenação das coisas em causas e efeitos,
que permite especular que não há efeito sem causa. Sendo assim,
para novamente não retroceder ao infinito, necessitamos de uma
primeira causa, da qual todo o resto é efeito.
3. O Ser Necessário: neste terceiro modo, Aquino argumenta que
as coisas são contingentes, ou seja, elas podem existir ou deixar de
existir. Tudo que existe, houve um tempo em que não existia, e
haverá um tempo em que não existirá mais. Dessa forma, houve um
tempo em que nada existiu, porém, se isso fosse verdade, hoje nada
existiria, pois “do nada, nada vem”. Portanto, precisamos admitir
que existe um ser que é necessário, que sempre existiu e que por
meio dele todos os outros seres vieram a existir. Esse ser não pode
não ter existido em determinado tempo e também nunca deixará de
existir, esse ser seria Deus.
4. Os Graus de Perfeição: outro modo de conhecermos a Deus seria a
partir dos graus de perfeição das coisas, ou seja, as coisas do mundo
podem ser comparadas, sendo algumas mais perfeitas, boas, belas
etc. do que outras. Dessa forma, deve haver algum ser que contém
esses predicados ao infinito, e esse ser seria a causa dessa mesma
perfeição, bondade, beleza etc. nos outros seres; esse ser seria Deus.
5. Governo Supremo: por fim, o quinto modo nos fala da questão da
ordem e finalidade. Observamos que tudo age em função de um fim,
e isto é evidente pelo fato de que os seres sempre agem da mesma
forma ou de maneira a obter os melhores resultados, dessa forma,

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não alcançam seus resultados ao acaso, mas intencionalmente.
Porém, aquilo que não tem conhecimento não pode se mover em
direção a um fim, a não ser que esteja sendo dirigido por algum
ser dotado de inteligência e conhecimento, por isso existe um ser
inteligente que dirige todas as coisas para o seu fim, e esse ser seria
Deus.

Podemos observar no pensamento de Aquino os conceitos de “Causa


final”, “Causa Material”, “Motor Imóvel”, “Ato puro” e tantos outros
conceitos já estudados na unidade 9 sobre Aristóteles. Aquino foi um
grande comentador desse filósofo, a ponto de comentar linha por linha
as doze obras dele, inclusive as obras centrais: “Metafisica”, “Ética” e
“Política”.

Aquino, seguindo o modelo aristotélico, intentava dividir as ciências


agrupando-as em quatro ordens:

a. ciência da ordem da natureza, que seria a ciência que estuda a


natureza além da matemática e metafísica;
b. ciência da ordem do que podemos produzir em nossos pensamentos,
como é o caso da lógica;
c. ciência da ordem do que realizamos a partir das nossas escolhas,
como o caso da política, economia, ética etc.
d. ciência da ordem das artes, que seria a ciência dos produtos
realizados por nós, como no caso das artes e das técnicas.

A divisão das ciências refletia na educação escolástica, que como


comentado na unidade anterior, levava esse nome devido aos mestres
que lecionavam nas “escolas” da época. Nesse período, o currículo era
dividido em duas partes, o trivium, que abarcava estudos de Gramática,
Lógica ou Dialética e Retórica, e o quadrivium, que tratava da
Geometria, Aritmética, Astronomia e Música.

A sociedade no século XII já não aceitava as justificativas para a


subordinação do poder temporal ao poder espiritual, o conhecimento
não estava mais restrito apenas à Igreja. A burguesia ascendente buscava
outras respostas, dessa forma, a síntese entre a filosofia de Aristóteles e o

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cristianismo foi a resposta dada pela Igreja aos questionamentos de seus
fiéis. A educação, baseada no trivium e no quadrivium, respondia aos
anseios da sua época por se afastar da formação religiosa, ainda que sem
perder o norte religioso.

A escolástica foi fruto do renascimento Carolíngio, no qual Carlos


Magno, rei dos francos entre 742 e 814, conquistou grande parte da
Europa e foi coroado Imperador do Sacro Império Romano pelo papa
Leão III. Carlos Magno fundou escolas e estruturou um sistema de
ensino em seu império com base no trivium e quadrivium. Além da
retomada dos clássicos gregos, lançou as bases para o movimento político
e do pensamento, que alteraria para sempre os rumos da humanidade: o
Iluminismo e o Renascimento, tema da nossa próxima unidade.

Fórum
Caro estudante, dirija-se ao Ambiente Virtual de
Aprendizagem da instituição e participe do nosso
Fórum de discussões. Lá você poderá interagir com
seus colegas e com seu tutor de forma a ampliar,
por meio da interação, a construção do seu
conhecimento. Vamos lá?

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O século das luzes: Iluminismo e
15 Renascimento
Objetivo
Apresentar o movimento iluminista e renascentista e a sua influência
na sociabilidade ocidental.

O século XVIII é conhecido como século das luzes; esse século viu
nascer inúmeros pensadores e artistas que realizaram uma profunda
transformação no pensamento, na política e na cultura. As luzes da razão
propagadas pelo Iluminismo e o Renascentismo iluminaram toda a
Europa, e seus efeitos se fizeram sentir até mesmo nas américas.

O Iluminismo foi um movimento político e filosófico que visava afirmar


a razão como condutora da vida humana, intentando reduzir o poder
da Igreja e a dependência da fé. Por outro lado, o renascentismo foi
um movimento mais amplo, que alcançou as artes e a cultura, em uma
retomada aos valores clássicos de beleza e virtude.

Apesar do Iluminismo e o Renascentismo se iniciarem antes do século


XVIII e se estenderem para além desse século, o tema desta unidade será
o século XVIII devido ao seu valor emblemático. Assim como o século V
a.C. foi o período áureo da filosofia com Sócrates, Platão e Aristóteles, o
século XVIII foi um período em que novamente se refundou a filosofia
revisitando seu sentido, pois foi o século de Hume, Voltaire, Locke,
Diderot, Rousseau, Kant, Fichte, Montesquieu etc.

Todo este furor filosófico estava muito bem assentado nos ideais
renascentistas. Esse movimento cultural foi denominado Renascimento
devido à redescoberta e revalorização dos princípios culturais da
antiguidade clássica, como observamos anteriormente. Desde o século
XIII, com a revisitação a Aristóteles, buscou-se um ideal humanista e
naturalista em contraponto ao idealismo platônico.

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O renascimento foi marcado por profundas mudanças culturais, sociais,
econômicas, políticas e religiosas, pois esse foi um período de transição
do feudalismo para o capitalismo. A partir do rompimento com a
estrutura medieval, criou-se um hiato no qual foi possível gestar um
mundo: esse novo mundo ficou caracterizado como mundo da razão e
encontrou seu ápice no século XVIII.

Outro fato determinante do século XVIII é a revolução industrial, pois


com o advento das novas tecnologias e a produção em massa se fez
necessário uma nova estrutura educacional devido à demanda de mão
de obra especializada, a organização da escola até hoje segue preceitos
da revolução industrial, onde o objetivo da escola é “adestrar” corpos e
mente para o trabalho.

As luzes desse século encontram seu apogeu na França, com a revolução


francesa, em 1789. O lema da revolução francesa, “Liberdade, igualdade
e fraternidade” – você viu mais sobre essa revolução na disciplina
Antropologia, Sociologia e Educação – espalhou-se rapidamente pelos
centros urbanos da Europa e influenciou politicamente todos os países
europeus, até mesmo a Rússia Czarista.

O Iluminismo atravessou o atlântico e ressoou nas colônias inglesas da


América do Norte, onde Benjamin Franklin (1706-1790) e Thomas
Jefferson (1743-1826), filósofos iluministas, desempenharam um papel
importante na Revolução Americana (1776). No Brasil, o Iluminismo se
fez sentir na inconfidência mineira, em que Joaquim José da Silva Xavier
(1746-1792), o Tiradentes, juntamente com um grupo de intelectuais,
defendeu a autonomia da colônia brasileira diante da metrópole
portuguesa.

Esse movimento chegou ao Brasil a partir das classes mais altas da


sociedade, que enviavam seus filhos para estudar nas universidades
europeias, onde entravam em contato com as teorias e pensamentos
europeus. Quando retornavam ao Brasil, esses intelectuais divulgavam
essas ideias principalmente nos centros urbanos.

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Os ideais iluministas influenciaram os inconfidentes, e estes se manifestaram em busca
do fim do colonialismo, fim do absolutismo, substituição da monarquia pela república,
liberdade econômica e liberdade religiosa, de pensamento e expressão. Apesar dos
inconfidentes não lograrem êxito em sua revolução, as suas ideias se difundiram entre a
população urbana do Brasil e marcaram de forma indelével nosso processo de formação
política.

Os ideais políticos iluministas influenciaram desde a Declaração de


Independência dos Estados Unidos até a Declaração Francesa dos
Direitos do Homem e do Cidadão. Rousseau norteou o movimento
político do iluminismo com a sua tese de que o homem é naturalmente
bom, porém, a sociedade o corrompe. Inspirados por esses ideais,
muitos movimentos sociais dessa época intentaram construir uma
sociedade mais justa, com direito iguais, imaginando que, com justiça,
a felicidade seria alcançada. Dando primazia à razão, o iluminismo se
posicionou contrário às imposições religiosas, às práticas mercantilistas
e ao absolutismo do poder real, além de condenar os privilégios da
nobreza e do clero.

Resumidamente, as críticas do Iluminismo à sociedade eram dirigidas


para: o Mercantilismo, que impedia o livre comércio; o Absolutismo
monárquico, que impunha a vontade soberana de um sobre todos; e
o poder da Igreja, com suas verdades reveladas pela fé. A partir disso,
o Iluminismo defendia: a liberdade econômica, na qual o estado não
interferisse na economia; o antropocentrismo, com sua ênfase na ciência
e na razão em detrimento da fé e das crenças; em suma, o predomínio da
burguesia e seus valores.

O principal financiador e interessado nesses movimentos sob o mote de


igualdade, liberdade e fraternidade foram os burgueses, pois a sociedade
feudal que ainda imperava na Europa impedia o pleno desenvolvimento
do comércio, com as altas taxas aduaneiras em um regime chamado
mercantilismo. Apesar dos burgueses deterem as riquezas, não possuíam
poder político, dessa forma, fomentaram e financiaram revoltas e
revoluções em toda Europa e América, visando a liberdade para o
comércio e o poder político.

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Com a burguesia ditando os rumos políticos, artísticos e culturais, nesse
período iniciou-se o interesse pela busca dos fundamentos econômicos da
sociedade, a origem e a forma das riquezas das nações. Encontrar, nessa
época, qual seria a principal fonte de riqueza das nações, se a agricultura
ou o comércio, era a controvérsia que dividia os pensadores. Desse modo,
surgem os primeiros tratados de economia, que visavam analisar a ciência
econômica com vistas a aperfeiçoá-la, e não apenas compreendê-la.
Data desse período a famosa obra “A riqueza das Nações”, do filósofo e
economista inglês Adam Smith (1723-1790) – essa obra é a gênese da
Economia Clássica.

O epicentro iluminista foi a França, não apenas pela Revolução Francesa,


mas também pela “Enciclopédia” editada por Denis Diderot (1713-
1784) –essa obra magna caracteriza muito bem as ideias iluministas.
Produzida a partir da contribuição de centenas de intelectuais, inclusive
de Voltaire (1694-1778) e Montesquieu (1689-1755), Diderot organizou
todo o conhecimento produzido historicamente pela humanidade;
distribuída em 35 volumes, essa obra, em sua época, vendeu mais de 25
mil cópias.

Ninguém melhor para definir o Iluminismo do que um filósofo


iluminista. Em sua obra “O que é o Iluminismo” (1784), Kant diz que
esse movimento representou a maioridade da razão humana, pois saímos
de uma condição em que a razão era tutorada, guiada para uma condição
de coragem para fazer uso da própria razão, pois outrora não usávamos
nossa razão, não por incapacidade, mas por falta de coragem para
exercitá-la de forma autônoma. Sendo assim, “Sapere aude” (ousar saber),
ousar usar a própria razão, esse foi o lema do Iluminismo.

Apesar dos muitos pensadores e até mesmo das contradições dessa época,
Chauí (1996) salienta que a filosofia iluminista afirma que:

• pela razão, o homem pode conquistar a liberdade e a felicidade


social e política (a Filosofia da Ilustração foi decisiva para as ideias da
Revolução Francesa de 1789);
• a razão é capaz de evolução e progresso, e o homem é um
ser perfectível. A perfectibilidade consiste em libertar-se dos

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preconceitos religiosos, sociais e morais, da superstição e do medo,
graças ao conhecimento, às ciências, às artes e à moral;
• o aperfeiçoamento da razão se realiza pelo progresso das civilizações,
que vão das mais atrasadas (também chamadas de “primitivas” ou
“selvagens”) às mais adiantadas e perfeitas (as da Europa Ocidental);
• há diferença entre Natureza e civilização, isto é, a Natureza é o
reino das relações necessárias de causa e efeito ou das leis naturais
universais e imutáveis, enquanto que a civilização é o reino da
liberdade e da finalidade proposta pela vontade livre dos próprios
homens em seu aperfeiçoamento moral, técnico e político.

O Iluminismo e o Renascimento não se fizeram sentir apenas nas


questões sociais, políticas e econômicas, a educação também foi
fortemente influenciada pelos ideais de igualdade e justiça. Esta
valorização do homem e da sua capacidade de autonomia e de
conhecimento racional expressos nos ideais iluministas revelam um
otimismo em relação à possibilidade da razão humana de transformar o
mundo.

Pela primeira vez na história da humanidade, pensou-se uma educação


universal: o homem alçado à condição de humano devia dispor de todos
os direitos, pouco importando sua raça, cor, seu credo ou nascimento,

A partir dessa noção de igualdade, muitos pensadores buscaram na


educação a realização da natureza humana. O impacto do Iluminismo e
do Renascimento na educação e no pensamento ocidental será o tema da
nossa próxima unidade.

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Iluminismo e Renascimento e a
16 transformação no pensamento
ocidental
Objetivo
Apresentar o movimento iluminista e renascentista e a sua influência
na filosofia, ciências e educação ocidental.

Como observamos anteriormente, o Iluminismo e o Renascimento


estenderam sua influência por todas as áreas do pensamento humano,
desde a ética à nossa forma de fazer ciência. A partir dos pressupostos
da razão, uma nova forma de pensar foi gestada, em que o homem,
conduzido por sua razão, encontrava a felicidade e a justiça.

Você já reparou que hoje somos filhos do Iluminismo? Esse período


foi a transição da Idade Moderna para a Contemporânea, e muitas
discussões realizadas pela filosofia no iluminismo ecoam até os dias de
hoje. Importa, então, conhecer os dilemas com que se depararam os
iluministas para melhor entendermos a nossa relação com o mundo e
com os outros.

Na filosofia política, os filósofos iluministas foram influenciados pelo


conceito de Contrato Social, que afirmava um acordo entre os membros
da sociedade a partir de um conjunto de regras ou princípios norteadores
da vida em comunidade; também debateram sobre a supremacia, a
autoridade e as características distintivas de um governante. Esses
debates foram norteados pelas teorias de Thomas Hobbes (1588-1679)
e Rousseau, e chegam até nós pelos dilemas de participação social e
função do estado.

Na ética, os iluministas construíram a noção de indivíduo, revitalizando


a ideia de que a natureza humana é inalterável, pouco importando
a época histórica ou as restrições culturais às quais está submetida.
Dessa forma, buscaram na própria racionalidade humana os princípios

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éticos norteadores das nossas ações – esse modo de pensar encontra seu
ápice com Kant e seus imperativos categóricos. Ainda hoje buscamos
princípios éticos baseados apenas na racionalidade, como é o caso mais
recente das discussões da Bioética.

O Iluminismo também se deparou com o ceticismo nas questões


epistemológicas, pois da Idade Moderna ele herdou a dúvida hiperbólica
de Descartes. Essa dúvida sobre o mundo e a respeito das verdades pré-
estabelecidas levou os iluministas a buscarem um conhecimento que
seria inabalável, do qual não se poderia haver dúvida, e encontraram na
ciência este conhecimento.

Como podemos ver, os intelectuais iluministas elevaram a ciência ao topo


hierárquico das atividades humanas. A física de Newton foi considerada
pelos iluministas como a ciência mãe, ou a filosofia na sua forma mais
pura, quebrando alguns paradigmas, dos quais podemos apresentar:

Abandono da alquimia Busca pela ciência química

Abandono da ideia de criação divina Biologia como etapas de desenvolvimento

Quadro 1 – Transição de valores.


Fonte: Elaborado pela autora.

A herança iluminista hoje é refletida na nossa fé inabalável na ciência e


na laicidade. Ainda que a ciência tenha resolvido inúmeros problemas da
humanidade, não podemos esquecer que a ciência também criou novos
problemas, desde armas de destruição em massa à poluição ambiental.

Entre os muitos pensadores desse período, vamos dialogar um pouco


sobre Voltaire, Montesquieu e Marquês de Condorcet, pois Kant,
Rousseau, Hume e Locke veremos nas próximas unidades.

Voltaire defendia uma reforma social, argumentando que as monarquias,


a partir de princípios racionais, poderiam construir uma sociedade mais
justa. Devido as suas críticas ácidas, foi exilado por três anos e preso duas
vezes. Esse pensador foi um dos primeiros expoentes do liberalismo,
defendendo a liberdade de expressão e pensamento: “Não concordo com

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nenhuma das palavras que me diz, mas lutarei até com minha vida se
preciso for, para que tenhas o direito de dizê-las”.

Montesquieu propôs dividir o poder estatal em três poderes autônomos


e dependentes: executivo, legislativo e judiciário (presentes até hoje
em nosso sistema político). Sendo competência do executivo a
administração pública da nação, poder este exercido pelo rei ou chefe de
Estado. Ao legislativo caberia criar as leis que regulamentariam a nação;
este poder seria exercido a partir da Câmara dos Parlamentares. Por fim,
o judiciário seria o poder exercido pelos juízes e magistrados; responsável
por garantir o cumprimento das leis pelos cidadãos e pelos outros dois
poderes.

Marquês de Condorcet aderiu à Revolução Francesa, tornando-se um


dos seus ideólogos. Durante seu envolvimento político com a revolução,
propôs uma nova constituição defendendo o ensino público e gratuito,
além de campanhas de vacinação em massa. Pelo fato de Condorcet
se opor aos princípios de Robespierre (1758-1794), ele foi duramente
perseguido e acabou morrendo em sua cela após ser preso. Ironicamente,
o governo revolucionário publicou suas obras e ordenou a distribuição
em todas as escolas públicas francesas.

Além das questões políticas e sociais, o Iluminismo também gestou uma


nova forma de fazer educação. Acompanhe esse raciocínio com Aranha
(2006, p. 28):

O Iluminismo, período muito rico em reflexões pedagógicas, teve um de seus aspectos


marcantes na política educacional focada no esforço de tornar a escola leiga e em
função do estado. Mais ainda, acentuava-se a recomendação do uso das línguas
vernáculas, em detrimento do latim, bem como uma orientação pedagógica mais
prática, voltada para as ciências, técnicas e ofícios, com o objetivo de mudar o rumo
do estudo exclusivamente humanístico.

Note que a laicidade da educação, ou seja, uma educação que não está
fundamentada em nenhuma religião, foi a principal bandeira pedagógica
dos iluministas. Em toda a Europa e América se iniciaram movimentos
para pressionar o Estado a criar escolas leigas, afastando-se do domínio
religioso. Em Portugal, durante o reinado de Dom José I, o primeiro

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ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, mais conhecido como
Marquês de Pombal (1699-1782), levou a cabo os ideais iluministas e
realizou uma série de reformas visando reerguer Portugal econômica e
culturalmente, inserindo-o no contexto das potências internacionais.
Entre essas reformas, o Marquês de Pombal interferiu diretamente na
educação com a expulsão dos jesuítas em 1759, fato que repercutiu no
Brasil Colônia.

Com a expulsão dos jesuítas, as aulas passaram a ser denominadas “aulas


régias”, por estarem sob o controle do poder real. As aulas se limitavam
ao ensino de disciplinas autônomas, lecionadas por um professor, sem a
vinculação a um sistema específico de ensino.

As reformas pombalinas elevaram Portugal ao status de primeiro estado


moderno a instituir o ensino laico, mas apesar dos discursos sobre o
poder da educação, o resultado foi bem distinto da teoria. O Brasil
Colônia não possuía uma estrutura educacional para substituir a parca
estrutura religiosa, instituindo-se, então, escolas com pouquíssimo
conteúdo científico, professores sem qualificação e muitas vezes sem
remuneração.

As escolas básicas praticamente não existiam e as escolas secundárias


possuíam um conteúdo puramente literário, longe dos ideais científicos
do iluminismo, além de servirem apenas às classes mais abastadas. Apesar
do ideal iluminista de levar a educação a todos os cidadãos, criou-se um
dualismo escolar, pois havia uma escola para a burguesia e outra para
o povo – dualidade aceita tranquilamente, pois não atentava contra o
princípio de igualdade tão caro aos iluministas.

Outro fator preponderante do iluminismo e do renascimento foi a


consolidação do capitalismo. Como regime econômico e político,
influenciou toda a estrutura social da época, e a educação não foi
exceção. Este novo regime necessitava da formação de mão de obra
técnica e/ou especializada, além da reeducação dos corpos para a
adequação a rotina das fábricas, ou seja, era papel da escola disciplinar os
antigos campesinos e agricultores para agora trabalhar nas fábricas. Desta
forma, a educação por questões filosóficas, sociais, econômicas e culturais
foi o grande mote do renascimento e do iluminismo.

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A preocupação com a educação foi um dos principais temas de um
filósofo que é a cara do Iluminismo: Rousseau. Esse pensador viveu
intensamente o século XVIII, escrevendo sobre moral, política, educação,
entre tantas outras questões. Sua obra “Emílio” (1762) até hoje é
referência quando se pensa uma educação que realize a natureza humana,
e isto será o tema da nossa próxima unidade.

Atividade
Chegou a hora de você testar seus conhecimentos
em relação às unidade 9 a 16. Para isso, dirija-se
ao Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) e
responda às questões. Além de revisar o conteúdo,
você estará se preparando para a prova. Bom
trabalho!

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Rousseau e a realização da
17 natureza humana
Objetivo
Apresentar a teoria pedagógica de Rousseau e a sua influência na
educação.

Jean-Jacques Rousseau (1712 a 1778) foi um humanista no sentido


pleno da palavra. Sua teoria política e educacional é permeada de um
humanismo apaixonante, basta analisar a sua famosa máxima “o homem
nasce bom, a sociedade o corrompe”. Esse filósofo, político, educador
e compositor influenciou diretamente o movimento iluminista, seja a
partir de seus escritos políticos ou de seus escritos pedagógicos.

Para melhor entender a concepção de humano em Rousseau,


necessitamos entender as principais teorias em voga no seu tempo.
Ele conviveu com os debates acerca do “estado de natureza”, muito
influenciado pela obra “Leviatã” (1651), de Thomas Hobbes, escrita no
século anterior. As discussões partiam do pressuposto hipotético de um
tempo histórico antes da fundação da sociedade civil ou do estado, em
que os humanos viviam isolados pelas florestas, em pequenos grupos,
sobrevivendo a partir da natureza.

Para Hobbes, esse era um estado selvagem, pois todos lutavam contra
todos, e por isso criamos as primeiras comunidades organizadas para
fugirmos desta violência do estado de natureza.

Rousseau, como bom humanista, se posicionou de forma contrária a


Hobbes. Segundo Chauí (1996), a concepção rousseauniana de estado
de natureza dizia que os homens não lutavam entre si, mas conviviam
harmoniosamente em seu estado mais natural, em que a comunicação
se dava por meio de gritos, gestos, músicas, não havendo divergências e
nem conflitos. Era a sociabilidade do “bom selvagem inocente”, como
diz Rousseau. Tal estado se corrompe com o surgimento da propriedade

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privada, quando um indivíduo se apropria de algo, argumentando que
aquilo lhe pertence. É dada a largada para o surgimento do Estado e da
sociedade fundamentados no conflito sobre a posse da propriedade.

Como você pode notar, se para Hobbes criou-se o Estado para fugir da
violência da natureza, em que impera a lei da selva, ou seja, a lei do mais
forte, para Rousseau, o estado da natureza foi criado para proteger a
propriedade privada, criando e autenticando a lei do mais forte, pois nele
impera a lei do mais forte. Aquele que tem poder impõe a sua vontade a
partir das leis, porém, Rousseau não defendia a extinção do estado e nem
a vida asceta isolada de tudo. Para ele, apesar da felicidade encontrada
no estado de natureza, o homem só realiza sua natureza em sociedade,
convivendo com seus pares, dessa forma, o Estado deveria realizar a
natureza humana.

O Estado, para Rousseau, deveria ser um corpo político e ético


fundamentado na vontade geral dos seus cidadãos. Contudo, essa
vontade geral é diferente da vontade de todos, pois, além de expressar
aritmeticamente a vontade dos cidadãos, a vontade geral estaria para
além da soma das vontades individuais, pois se configura como uma
transformação qualitativa das vontades particulares. Na vontade geral,
os indivíduos deixam de pensar apenas em suas vontades particulares e
passam a pensar nas necessidades de toda a comunidade.

A base ética da vontade geral em Rousseau parte da concepção de


natureza humana, pois, para esse pensador, a consciência moral era
inata, advinda da voz da natureza. Nesse estado natural o homem é
bom, agindo com generosidade e bondade para com todos. A maior
prova disso seria a consciência do erro quando agimos de forma errada,
pois, por mais que a sociedade corrompa nossa natureza, a consciência
continua nos alertando dos erros.

Para Rousseau, a felicidade poderia ser alcançada quando realizamos


nosso estado de natureza. Dessa forma, esse filósofo criou uma teoria
pedagógica que visava à realização desse estado de natureza; o mais
fantástico de sua teoria pedagógica foi o pressuposto de que a criança

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não era um pequeno adulto, ou um conjunto de deficiências que
necessitava de aperfeiçoamento. Rousseau defendeu a infância como
um período da vida humana que necessitava ser entendido a partir das
suas especificidades, e não comparado com a vida adulta. A educação,
portanto, deveria desenvolver de forma natural a criança, a partir do
acompanhamento e regramento de um adulto.

Aranha (2006) salienta que a educação até Rousseau visava formar


o homem para Deus ou para a vida em sociedade, como foi o caso
da educação na Patrística e Escolástica ou a educação na Grécia
clássica, como observamos nas unidades anteriores. Porém, Rousseau
desejava que o homem fosse educado para si mesmo, o objetivo da
educação seria a vida, o estudante deve ser formado não para ser um
magistrado, soldado ou sacerdote, mas sim para ser um homem.

A crítica que Rousseau faz à educação antiga tem como fundamento as


limitações que impomos à criança e que a impedem de se desenvolver,
pois as primeiras ideias desenvolvidas pelas crianças são sobre servidão,
sendo que, antes de falar, a criança ordena; antes de agir, ela obedece; e
antes de conhecer seus erros, nós as castigamos. Dessa forma, abafamos
sua natureza e depois a entregamos à escola, que pode lhe ensinar de
tudo, menos como ser feliz.

Em sua obra “Emílio”, Rousseau defende uma pedagogia naturalista,


ou seja, uma educação que se afastasse das convenções sociais, visando
à espontaneidade natural de cada pessoa, recusando o intelectualismo
livresco, não reduzindo o estudante a uma questão puramente
intelectual, pois somos mais que simplesmente razão, nossos sentidos,
emoções e instintos são anteriores à razão, sendo, portanto, mais dignos
de confiança do que os hábitos adquiridos socialmente.

Rousseau promoveu uma revolução copernicana na educação: assim


como Copérnico retirou a Terra do centro do universo e colocou o Sol,
dando todo um sentido à astronomia, Rousseau retirou o professor
do centro da sua pedagogia e colocou o estudante, dando um sentido
totalmente diferente à educação, defendendo que a educação ocorre a
partir de:

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• natureza, que seria o pleno desenvolvimento das nossas faculdades e
órgãos;
• homens, que seria o uso que nos ensinam a fazer das nossas
habilidades e do nosso desenvolvimento físico;
• coisas, que seria a nossa experiência sobre os objetos que nos afetam.

Quando esses três mestres se harmonizam, a educação se desenvolve


plenamente; quando há contradições entre eles, nossa educação é
deficitária. Das três fontes educativas, a única da qual somos realmente
senhores é a educação a partir dos homens, porém, em uma sociedade
corrompida, ela também é a principal causa de desvios na educação.

A educação das coisas é sempre secundária. Dessa forma, devemos nos


voltar para a educação da natureza, a educação natural, sendo esta a
única que poderia se desenvolver plenamente sem a nossa interferência.
Como o objetivo é harmonizar as três fontes da educação, então devemos
desenvolver plenamente as capacidades intelectuais naturais da criança.

O papel do professor é central na teoria pedagógica de Rousseau: não


compete ao mestre ensinar a pensar, mas sim direcionar a criança para
seu desenvolvimento. Apesar de toda ênfase na criança, a educação não
deve ter como base apenas o espontaneísmo infantil. Compete ao mestre
ensiná-la a conviver com suas vontades e conhecer seus próprios limites,
a criança deve aprender que acima da sua vontade há uma “vontade
geral”, que seria a necessidade comum a todos.

Ainda que revolucionárias, as ideias de Rousseau não escaparam da


crítica feroz de seus opositores, que argumentaram ser esta uma educação
elitista e individualista, pois “Emílio”, o personagem do livro de
Rousseau, era acompanhado desde a primeira infância por um preceptor,
fato impensável para uma educação pública e, ao separar a criança da
sociedade, estaria dando ênfase a uma educação individualista.

Apesar de todas as críticas, as ideias de Rousseau influenciaram muitos


pensadores, inclusive Kant, que, a partir do pensamento rousseauniano,
defendeu uma pedagogia que desenvolvesse moralmente as crianças,
formando indivíduos capazes de “sapere aude”, ousar saber, ou pensar por
si mesmos. Estudaremos essa teoria mais adiante. Na próxima unidade,

www.esab.edu.br 100
veremos um embate que se iniciou no século XVI com a filosofia
moderna e se estendeu até o século XVIII, no Iluminismo: o embate
entre racionalismo e empirismo e a questão “A razão é inata ou é fruto da
experiência?”.

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A Filosofia moderna: empirismo x
18 racionalismo
Objetivo
Exprimir o embate entre o racionalismo britânico e o empirismo
continental.

Como você tem acompanhado ao longo da leitura dessas unidades, deve


ter percebido que cem anos antes do Iluminismo, em plena Filosofia
moderna, René Descartes (1596-1650) havia formulado uma teoria
da origem da razão, que muito atormentaria os iluministas, levando os
filósofos a discutirem questões sobre a origem do conhecimento e a fonte
do conhecimento verdadeiro. O embate prosseguiu e acabou por dividir
os filósofos entre os entusiastas de Descartes, chamados de racionalistas,
e os críticos de Descartes, chamados de empiristas.

Vamos entender como se deu esse embate? Observamos anteriormente


que as discussões sobre a origem da razão e a fonte do conhecimento
verdadeiro se iniciam juntamente com a Filosofia, pois os pré-socráticos
Parmênides e Heráclito defenderam teorias que se assemelham aos
debates racionalistas e empiristas. Por quê? Vejamos. Parmênides afirma
a ilusão dos sentidos e o uso da razão para compreender o ser, algo muito
similar à teoria racionalista, e Heráclito fala do devir de todas as coisas
– esse devir, observamos a partir da experiência se aproximando dos
empiristas.

Posteriormente, Platão e Aristóteles trouxeram novos elementos para esse


dilema, você está lembrado? Platão irá defender sua teoria das ideias na
qual a razão é inata, ou seja, já nascemos com ela, além da controversa
teoria da reminiscência, em que todo o conhecimento já estaria na alma.
Aristóteles, por sua vez, contrariando o mestre, defende que não há nada

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na razão que não tenha passado pelos sentidos, sendo estes a fonte do
conhecimento verdadeiro.

Mas afinal, o que defendiam os racionalistas e empiristas? Para Chauí


(1996), os racionalistas argumentavam que a razão por si só, sem o
auxílio da experiência, seria o fundamento do conhecimento verdadeiro,
pois a experiência, para ter sentido, necessita ser guiada por princípios,
normas e regras estabelecidos pela razão. Dessa forma, a razão controlaria
a experiência, tornando-a conhecimento verdadeiro. Para essa corrente
filosófica, o conhecimento perfeito seria a matemática, por estar
subordinada diretamente à razão, sem a necessidade da experiência
sensível.

Por outro lado, os empiristas – nome que advém do termo empiria


(experiência, em grego) – defendem que o fundamento do conhecimento
verdadeiro e a fonte primeira do conhecimento é a experiência, sendo
esta a fonte das ideias na razão. Assim, a experiência controlaria a própria
razão, fornecendo-lhe os dados para a sua operação. Para os empiristas,
o conhecimento perfeito se dá nas ciências naturais ou experimentais,
como a física e a química.

Agora que situamos a duas linhas de pensamento, vamos observar o que


cada uma delas fala sobre a origem da razão. A pergunta que atormentou
filósofos por séculos foi: qual a origem dos princípios racionais de
pensamento? Por exemplo, de onde vem a noção de tempo (quando
uma coisa antecede a outra), a ideia de causa e efeito, o princípio da
não contradição (uma coisa é igual a ela mesma) etc.? E, a partir dessa
questão, muitas outras surgem, como: de onde vem a nossa intuição?
Nascemos com ela ou a recebemos a partir da educação? A razão seria
uma característica natural do humano ou desenvolvemos a partir das
experiências?

A resposta para essas questões, oferecidas pelo racionalismo de Descartes,


afirma que a razão é inata, pois ao nascermos trazemos em nossa mente
não apenas os princípios racionais, mas também ideias verdadeiras, sendo
chamadas de ideias inatas. Para Descartes, em nossa mente possuímos
três tipos de ideias, de acordo com sua origem e qualidade.

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a. Ideias adventícias: aquelas que advêm de fora, a partir dos nossos
sentidos, seriam geralmente falsas ou enganosas; como o caso de
uma colher em um copo de água: ao observarmos, veremos que
a colher aparenta estar quebrada, ao retirarmos a colher da água,
ela está inteira. Dessa forma, em qual das duas percepções confiar?
Como pode algo se apresentar de duas formas diferentes? Para
Descartes, não devemos confiar nos sentidos.

b. Ideias fictícias: seriam as ideias que criamos a partir da nossa


fantasia ou imaginação; quando criamos seres inexistentes, ao
misturarmos partes das nossas memórias, como é o caso quando
pensamos em cavalos alados ao associar cavalo e asas, da mesma
forma quando pensamos em anjos, pois associamos a imagem de
homem e asas. Para Descartes, essas ideias sempre são falsas por não
corresponderem ao real.

c. Ideias inatas: neste caso, seriam ideias que não dependem da


experiência e nem da fantasia ou memória. Assim, a única hipótese
restante é que nascemos com elas, como é o caso do infinito: não
possuímos experiências com a infinitude, muito menos possuímos
na memória algo similar. Essas ideias seriam verdadeiras, pois
estariam na nossa mente desde que nascemos. Para Descartes, são
inatos também os princípios da racionalidade, como é o caso do
axioma “O todo é maior que as partes” e assim por diante; as ideias
inatas seriam a assinatura do criador na alma das criaturas racionais.

Para Descartes, a questão era muito simples: caso não possuíssemos ideias
inatas, das quais advêm os princípios básicos do pensamento, não haveria
possibilidade de fundamentar um conhecimento verdadeiro; também
não haveria critérios para julgar entre um conhecimento e outro, pois os
nossos sentidos e a experiência costumam se contradizer.

Contestando Descartes, os empiristas, em especial Jonh Locke (1632


a 1704), defendiam que a razão, a verdade e as ideias são adquiridas a
partir da experiência. Radicalizando sua teoria, Locke defendeu que a
mente, antes da experiência, é uma tábula rasa, ou seja, sem experiência
não há nada na mente, seria como uma folha em branco aguardando as
impressões das experiências.

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Segundo Chauí (1996), além de Locke, David Hume (1711-1776) e
George Berkeley (1685-1753) foram outros eminentes empiristas que
defenderam a primazia da experiência. Esses filósofos argumentavam
que nossos conhecimentos se iniciam pelos sentidos, pois a partir das
sensações formulamos as ideias. Como? Por exemplo, quando vemos a
cor vermelha e percebemos uma forma arredondada, ao mesmo tempo
em que sentimos um cheiro característico, a nossa mente, a partir de
todas essas informações, formula a ideia de maçã. Sendo assim, as ideias
seriam as percepções que se combinam e associam.

A associação das sensações ocorre por semelhança, proximidade ou


sucessão temporal. A principal causa pela qual realizamos associação de
percepções seria a repetição, ou seja, devido às percepções se repetirem
por similaridade, no mesmo espaço ou próximas umas das outras, e até
mesmo por se repetirem em um contínuo temporal, uma após a outra, é
que nós as associamos, criando as ideias.

Para os empiristas, as nossas experiências são armazenadas na memória e,


a partir dela, a razão as transforma em pensamento, ou seja, a experiência
grava em nossa mente os dados com os quais a razão trabalha, a partir da
combinação e separação desses dados. Em suma, a razão seria o hábito de
associar ideias por semelhança ou diferença.

Um excelente exemplo desse hábito seria a casualidade que foi analisada


por David Hume. Para esse filósofo, quando observamos a repetição
incessante de algo, passamos a criar princípios que expliquem esse
fenômeno, como é o caso da ebulição – inicialmente colocamos água
em um recipiente e levamos ao fogo, observamos que em determinado
tempo a temperatura da água se eleva e ela entra em ebulição. Indiferente
de quantas vezes realizamos essa experiência, o resultado é sempre igual.
A partir disso, formulamos a teoria que a água entra em ebulição a 100
°C; seria assim que nascem as ciências: por associar causas, efeitos e
consequências, a partir da repetição das experiências.

Ao demonstrar o princípio da causalidade, Hume também afirma que


a experiência não apenas fornece os dados para a razão, mas também os
princípios racionais advêm da experiência. Dessa forma, o argumento
racionalista dos princípios racionais cai por terra. Além disso, Hume

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argumenta que se existissem ideias inatas, então todos teríamos as
mesmas ideias, não havendo conflito de opiniões, pois partiríamos
sempre dos mesmos princípios.

Mas afinal, quem tem razão? O racionalismo se depara com a crítica de


que sendo as ideias inatas iguais, então elas não poderiam mudar e são
iguais para todo mundo. Porém, isso não se verifica. Além disso, se as
ideias inatas são verdadeiras, então nem mesmo a razão poderia mudá-las,
e não é isso que ocorre, pois observamos sempre o avanço das ciências a
partir da refutação de ideias que outrora eram consideradas universais.

O empirismo possui um limite claro ao declarar que os princípios


científicos advêm da experiência, a partir de hábitos psicológicos que
associam as percepções às ideias. Então, não é possível falar em um
conhecimento verdadeiro, pois quando pensamos um conhecimento
verdadeiro, ele seria independente da nossa vontade, forma de pensar ou
querer, e esse conhecimento o empirismo não oferece.

Mas afinal, o que isso tem a ver com educação? Que diferença faz saber se
a razão é inata ou se origina-se da experiência? Se você analisar melhor essa
questão, verá que ela está no centro das nossas teorias educacionais, pois se
a criança já nasce com ideias inatas, o papel da escola seria apenas direcionar
essas ideias, não teria muito o que ensinar à criança. Por outro lado, se a
criança é uma tábula rasa, então quaisquer experiências ou conhecimento
que a criança possua antes de chegar na escola deve ser ignorado.

Você deve estar se perguntando: como fica então? Afinal, qual a origem
da razão e a fonte do conhecimento verdadeiro? Na próxima unidade,
estudaremos um filósofo que ofereceu uma solução para esse impasse,
e até hoje aceitamos, mesmo com ressalvas, a solução para esse dilema
oferecida por Immanuel Kant, o filósofo de Königsberg.

www.esab.edu.br 106
Resumo

Caro aluno,

As seis unidades que estudamos compreendem um período riquíssimo


da filosofia. Nesse panorama filosófico observamos as várias matizes
que a filosofia assume historicamente, iniciamos com a escolástica e a
retomada da cultura clássica e finalizamos com as principais discussões
do Iluminismo, que é um divisor de águas na filosofia.

Na unidade 13, você observou como apesar dos limites impostos pela
Igreja os intelectuais cristãos reconciliaram a fé e a razão buscando a
solução para o problema dos universais. Além do mais, verificamos
como houve uma retomada da cultura clássica especialmente a partir dos
pensadores árabes e, por fim, acompanhamos os dilemas das primeiras
instituições de ensino superior, dilemas estes presentes até os dias atuais.

Na unidade 14, você foi apresentado a Tomás de Aquino, um influente


pensador cristão que de forma magistral realizou uma releitura de
Aristóteles a partir da doutrina cristã. Aquino não apenas reabilitou
Aristóteles perante a cristandade, mas retomou toda uma corrente
filosófica que dava primazia aos sentidos na busca pelo conhecimento.

Na unidade 16, você verificou as mudanças sociais, culturais, políticas e


econômicas trazidas pelo iluminismo e renascentismo, a reviravolta nas
artes a partir da retomada dos clássicos deu nova vida à cultura europeia,
além dos ideais humanistas fomentarem revoluções que moldaram o
mundo como ele é hoje. Todos esses eventos marcaram o fim da idade
moderna e o começo do capitalismo.

www.esab.edu.br 107
Na unidade 17, você foi apresentado a Rousseau, um pensador
emblemático não apenas pela sua teoria política e pedagógica, mas muito
mais pelo seu humanismo, a sua teoria pedagógica tão antiga e ao mesmo
tempo tão atual, por não tratar a criança como um adulto em miniatura,
buscando antes de tudo realizar a natureza humana, o qual foi um dos
temas estudados e será muito debatido durante toda a sua formação.

Na unidade 18, você acompanhou o embate épico entre racionalistas e


empiristas. Essa batalha no campo das ideias rendeu muitos frutos para a
filosofia e, apesar das soluções apresentadas, ainda hoje desconfiamos da
teoria Racionalista, de que as ideias são inatas e a fonte do conhecimento
verdadeiro seria apenas e exclusivamente a razão. Ao mesmo tempo
temos dificuldade em aceitar a teoria Empirista, de que nascemos como
uma tábula rasa, e que somente a partir da experiência é que chegamos
as ideias e ao conhecimento. Além de tudo, sempre suspeitamos que o
conhecimento advindo da experiência pode ser bom, mas talvez não seja
o melhor conhecimento.

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Kant e a solução para o dilema
19 moderno
Objetivo
Apresentar a teoria epistemológica kantiana a partir da revolução
copernicana empreendida por Kant e a teoria pedagógica.

Immanuel Kant (1724-1804) não foi apenas um dos maiores filósofos


iluministas, mas figura também em qualquer lista dos mais importantes
filósofos de todos os tempos. A sua filosofia é um divisor de águas
na filosofia alemã. Kant apresentou respostas brilhantes para os mais
diversos problemas epistemológicos realizando uma síntese entre os
racionalistas e os empiristas. Além disso, buscou fundamentar a ética
em um princípio universal de moralidade chamado de “imperativo
categórico”, que será apresentado a você a seguir.

Vamos conhecer melhor esse filósofo e sua teoria. Kant nasceu, viveu e
morreu em Königsberg, na antiga Prússia. Alguns comentadores arriscam
dizer que ele nunca saiu da sua cidade natal. No entanto, Königsberg
era uma cidade portuária e um importante entreposto comercial,
assim, Kant travou conhecimento com pessoas de toda a Europa.
Famoso por ser extremamente metódico, o filósofo passou a vida indo
da universidade para casa e de casa para a universidade, e desse modo
produziu uma série de escritos que revolucionaram a filosofia, entre os
quais a “Crítica da razão pura” e a “Metafísica dos costumes”.

Voltamos então para a questão que tanto atormentou os empiristas


e racionalistas: “Qual a origem da razão e a fonte do conhecimento
verdadeiro?” Para responder a essa questão, Kant realizou uma revolução
copernicana no conhecimento: invertendo o centro da análise do
problema do conhecimento, o filósofo de Königsberg argumentou que
os empiristas e os racionalistas, às voltas com a questão do conhecimento
verdadeiro, agiam como quem intentasse assar um frango e no lugar de
girar o frango girasse o forno em volta dele.

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Como Kant fez essa revolução? Simples: no lugar de se preocupar
em definir o que é a verdade, ou o que é o conhecimento, o que é
Deus e muitas outras questões que atormentaram os filósofos antes
dele, começou se perguntando sobre o que é a razão e o que ela pode
conhecer e sobre o que é a experiência e o que ela pode conhecer. Dessa
forma, ele inverteu a questão: ao invés de se perguntar “o que é” das
coisas, Kant pergunta “Como nós conhecemos as coisas?”.

Ao se perguntar pelos limites do conhecimento da experiência e da razão,


Kant foca sua atenção no sujeito do conhecimento, ou seja, no humano,
no ser que pergunta “o que é”, e define a razão como sendo uma
estrutura vazia, sem conteúdo, mas com uma forma delimitada, uma
estrutura que seria universal, pois todos possuímos essa estrutura inata.
De acordo com Chauí (1996), a razão seria, portanto, constituída de três
estruturas.

a. Estrutura da sensibilidade: seria a forma da percepção sensível.


A partir dessa estrutura, percebemos as coisas com suas dimensões
e características próprias; ela nos mostra as coisas organizadas no
espaço, ou seja, pouco importa se divergimos sobre cores, tamanhos,
posições etc., todos nós vemos as coisas distribuídas espacialmente,
assim, o conceito de espaço seria inato, não dependeria da
experiência, já estaria em nossa mente. Além do espaço, outro
conceito que estaria em nossa mente seria o conceito de tempo, já
que percebemos as coisas ocorrendo em um instante ou em instantes
sucessivos. Podemos até não perceber o tempo, mas as coisas se
apresentam para nós organizadas no tempo. Logo, o tempo também
seria inato. Em suma, a partir da percepção que recebe os conteúdos
da experiência sensível, a estrutura da sensibilidade organiza esses
dados, como espaço ou tempo, e essa organização dos objetos é
inata, universal e não depende da experiência.

b. Estrutura do entendimento: essa estrutura seria responsável


por organizar os dados recebidos pela percepção, e que já foram
separados em espaço e tempo, em determinadas categorias, sem as
quais não seria possível falar em conhecimento. Essas categorias
seriam: qualidade, quantidade, causalidade, finalidade, verdade,
falsidade, universalidade e particularidade. Novamente, podemos

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discordar no resultado da aplicação dessas categorias, mas é inegável
que elas sejam essenciais para o conhecimento; sendo categorias
inatas, elas seriam meras estruturas vazias que são preenchidas com
os dados recebidos pela percepção.

c. Estrutura da razão: essa estrutura seria a razão mesma, pois não


se relaciona nem com a sensibilidade nem com o entendimento,
seria uma estrutura reguladora e controladora da sensibilidade e do
entendimento.

Para Kant, todo o conhecimento se dá a partir dessas três estruturas.


Interessante é observar que em momento algum o filósofo afirma que as
coisas são espaciais, temporais, qualitativas, verdadeiras etc., estas seriam
características do nosso entendimento e não das coisas. É aqui que se
evidencia a revolução copernicana de Kant, pois para ele não é possível
conhecer as coisas em si, apenas conhecemos como elas interagem com
as nossas estruturas. O conhecimento seria, portanto, mediado por essas
estruturas.

Com o argumento de que conhecemos apenas os objetos do


conhecimento quando este recebe formas e categorias do nosso
entendimento, Kant aponta como principal equívoco dos empiristas e
dos racionalistas a pretensão de conhecer as coisas em si – para Descartes
a realidade era espacial em si, e Hume, por exemplo, afirmava que a
realidade em si era estruturada temporalmente.

Sendo assim, Kant afirma que jamais saberemos como a realidade e as


coisas são em si, pois as categorias que utilizamos para analisar a realidade
e as coisas não pertencem às coisas em si, mas a nós como sujeitos do
conhecimento. Como? Para Kant, por exemplo, jamais saberemos se a
parede em nossa frente é branca, pois temos acesso a ela apenas a partir
das nossas categorias e uma delas é o branco que aplicamos à parede, mas
quanto à parede em si, não temos condições de conhecer.

Outra contribuição valiosíssima de Kant para a filosofia se deu no campo


da ética, pois ele formulou uma teoria ética que surpreende pela sua
pretensão de universalidade. A partir do conceito de “vontade boa”, que
seria a vontade de agir bem, pelo simples agir bem, sem coação externa,

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Kant traça uma série de pressupostos buscando o princípio universal de
moralidade. Esse princípio, chamado de “imperativo categórico”, não
possui uma única forma. Dentre as muitas formas com que é apresentado
o imperativo categórico, destacamos a seguinte: “Devemos agir sempre
com base nos princípios que gostaríamos que fossem aplicados a todas as
pessoas”.

Para analisar as ações de modo a julgar se estas são éticas ou não, Kant
propõe três passos:

a. o estabelecimento de regras subjetivas para guiar o agir;


b. a análise dessas regras a partir do imperativo categórico;
c. o estabelecimento de uma maneira de cumprir essas regras em
consonância com o imperativo categórico, de tal forma que essas
regras se tornem regras práticas.

Um exemplo da abrangência do imperativo categórico pode ser


observado na análise ética da “regra de ouro” da moral, que em sua forma
positiva diz o seguinte: “Faz aos outros o que queres que façam contigo”
ou, na sua forma negativa, “Não faz aos outros o que não queres que te
façam”. Kant observa como problemática a regra de ouro como princípio
ético, pois ela contém um certo relativismo ético, já que o que pode ser
bom para mim pode não ser bom para você. Por exemplo, como fica a
aplicação da regra de ouro no caso de um masoquista ou de um sádico?

Dessa forma, a ética kantiana busca, para além de qualquer relativismo,


criar bases éticas universais que pudessem ser aplicadas a todos os
humanos, indiferentemente das condições sociais ou históricas, porque
o imperativo categórico teria como base a razão, atributo este que
compartilhamos com todos os humanos.

Kant não escreveu apenas sobre epistemologia e ética. Em sua obra


“Sobre a pedagogia”, o filósofo defende uma educação para a autonomia,
maravilhosamente expressa no mote iluminista “sapere aude”, ousar
saber, ter a coragem de usar o entendimento. Segundo Aranha (2006),
as reflexões de Kant sobre a ética foram essenciais para a sua pedagogia,
pois a ideia de consciência moral, tão cara à ética kantiana, perpassa uma
educação que possibilite essa ética.

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Para Kant, a educação deveria possibilitar que as pessoas atingissem a
maioridade moral, com a capacidade de analisar moralmente as questões
a partir do seu entendimento. Essa maioridade seria atingida conforme
a criança fosse habituada a observar o que lhe é ordenado, e essa
obediência fosse uma “obediência voluntária”, ou seja, quando a criança
entende a necessidade de obedecer e não apenas de cumprir ordens.

Com isso, Kant nos auxilia a pensar a educação em nossos dias


especialmente a partir da autonomia do sujeito, ou seja, a educação
deve levar os estudantes a sapere aude, ousarem utilizar a sua capacidade
racional, construindo a sua autonomia.

Como iluminista, Kant foi um árduo defensor da educação laica,


preocupado com o sentido dado pela educação religiosa, pois a educação
deveria formar o humano para a maioridade moral e não para a religião.
Os pressupostos pedagógicos de Kant, com seu forte caráter ético,
influenciaram fortemente Piaget, um dos grandes teóricos da educação
contemporânea.

O Iluminismo lançou as bases para repensar desde o modo como


agimos socialmente até a nossa forma de produzir o conhecimento; os
pressupostos iluministas exercem sua influência até os dias atuais. No
século XIX, um grande intelectual realizou dura crítica à economia
clássica surgida no Iluminismo e, a partir dessa crítica, inaugurou uma
forma revolucionária de analisar a realidade. Estamos falando de Karl
Marx e o seu “materialismo histórico e dialético”, que serão tema da
nossa próxima unidade.

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O materialismo histórico e dialético
20 de Marx e Engels
Objetivo
Apresentar a teoria marxiana e sua influência na educação a partir da
filosofia da práxis.

Como você já deve ter estudado nas disciplinas de Antropologia,


Sociologia e Educação, o século XIX foi marcado pelo ápice da
Revolução Industrial, lembra? Por isso, uma questão das mais evidentes
na filosofia política daquele século refletia as condições de vida da
nova classe surgida com a Revolução Industrial: a classe operária ou
trabalhadora. A partir desse ponto, tornou-se indispensável questionar o
papel do Estado e observar a participação popular na vida política.

Considerando que o conhecimento – ou os critérios do que se considera


conhecimento – precisa ser observado em seu contexto histórico, os
grandes pensadores da época debruçaram-se sobre os questionamentos
kantianos, refletindo acerca da possibilidade de conhecer a realidade
como ela é. Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895)
apresentaram soluções originais e até hoje muito debatidas para essas
questões. Vamos conhecer um pouco da história desses pensadores e sua
filosofia?

Você já deve ter ouvido a expressão “marxismo” e talvez até mesmo


conheça alguns de seus preceitos. Mesmo assim, esperamos contribuir
para uma reflexão crítica acerca desse conceito. Em primeiro lugar, é
importante dizer que, apesar do termo derivar do nome Marx, Engels
inspirou e contribuiu com os fundamentos desta que é considerada uma
doutrina econômica, social e filosófica. Foi a partir do artigo “Esboço
de uma crítica à economia política”, publicado por Engels na revista em
que Marx trabalhava, que este voltou-se à economia e fez da economia
política a obsessão de uma vida.

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A parceria entre os dois foi muito rica intelectualmente, como
comprovam as obras escritas em conjunto, das quais podemos citar: o
famoso “Manifesto do Partido Comunista” e, ainda, “Ideologia Alemã” e
“Sagrada família”. Como Engels vinha de família abastada, foi, além de
parceiro intelectual, apoiador e financiador dos estudos de Marx. Este,
perseguido e exilado, só encontrou descanso em Londres – ironicamente
o berço da Revolução Industrial.

Por não poder dar conta de uma profunda reflexão da obra completa de
Marx e Engels, esta unidade abordará dois conceitos fundamentais para
se pensar a educação: alienação e ideologia.

A respeito desses conceitos, a questão fundamental apresentada pelos


filósofos é: “como conhecemos?”. A partir dessa interrogação, eles
desenvolvem uma intrincada teoria para explicar que nossos conhecimentos
da realidade são alienados e influenciados por uma ideologia.

Para sua reflexão


E então, você já havia parado para pensar em
“como conhecemos”? Que fatores você considera
serem basilares para a construção de nossa ideia
de realidade? Para os marxistas, a educação visa a
formação da consciência. Você concorda com isso?
As respostas a essas reflexões formam parte de sua
aprendizagem e são individuais, não precisando
ser comunicadas ou enviadas aos tutores.

Procuraremos elucidar melhor suas reflexões a esse respeito. Segundo


Chauí (1996), a teoria da alienação em Marx foi muito influenciada
por Ludwig Feuerbach (1804-1872), pois, segundo ele, alienamos
características que consideramos divinas a um ente superior. Esse filósofo,
ao analisar a origem das religiões, argumenta que os seres humanos criam
um ser superior (ao qual atribuem as melhores características humanas),
pois nem sempre encontram na natureza a origem e o significado de
sabedoria, poder, bondade etc.

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As características humanas que relegamos a esse ser superior são
superlativadas, ou seja, ele não apenas teria conhecimento, mas seria
onisciente – saberia de todas as coisas – e absoluto – a encarnação da
bondade e da justiça. Para Feuerbach, aos poucos damos vida a esse ser e
passamos a considerar que não fomos nós que o criamos, mas ele que nos
criou, por conceitualmente ser mais poderoso que nós.

Assim, a criatura se torna criador e passamos a servi-lo, adorá-lo, render-


lhe cultos e, por não nos reconhecermos neste outro (alienus, em latim)
que criamos, estamos alienados. Somos frutos de nossa própria alienação.
Em resumo, alienação pode ser considerada o processo em que criamos
algo, damos-lhe vida e depois o consideramos independente da nossa
vontade. É assim que esse algo se separa de nós e nos domina.

Ancorado no conceito de alienação, Marx ampliou a observação da


religião para a sociedade. Como outros pensadores que questionaram
sua realidade, Marx começou a incomodar a parcela da sociedade que
detinha o poder ao se perguntar por que aceitamos uma série de questões
como se fossem naturais.

Ele observou que passamos a considerar a economia e a política como


instituições, de forma que elas passassem a possuir vida própria e
pudessem instituir como devemos viver. Ainda hoje, algumas áreas de
estudo buscam suas “leis naturais”, ignorando que são instituições criadas
por nós e que, portanto, têm “leis” também criadas por nós.

Você já ouviu a frase “o sistema não aceitou”? Esse é um bom exemplo de


como um ente criado por seres humanos e com suas limitações adquire
vontade própria e torna-se superior, desconsiderando a possibilidade de
modificação da realidade. Você também deve ter ouvido que o mercado
de trabalho é cruel e desumano – talvez o produtor do desemprego e,
consequentemente, daqueles que se tornam a “corja” de uma sociedade
baseada no consumo: os desempregados. Ao responsabilizar o mercado, o
desemprego se torna aceitável.

Na busca pela origem da alienação social, Marx trouxe à tona um


conceito essencial na teoria marxista: o de historicidade. É a partir dele
que advém o entendimento de que ações, pensamentos, e instituições

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não são naturais e acabadas, mas construídos historicamente. Assim, se
algo é histórico ele não é, ele está sendo.

Estudo complementar
A alienação também ocorre no contexto
educacional, não apenas no trabalho. Perceba
como se dá este processo lendo o artigo
“Educação e alienação em Marx: contribuições
teórico-metodológicas para pensar a história da
educação”. Acesse clicando aqui.

Para Marx, toda e qualquer sociedade organiza suas relações sociais


por meio de uma divisão que ele chamou de divisão social do trabalho.
Essa divisão se inicia com a divisão sexual e vai se configurando e se
complexificando, multiplicando-se em muitas instituições sociais que
se tornam a estrutura fundamental da sociedade. A expressão deriva da
compreensão de que, para sobreviver, inicialmente os grupos humanos
dividem suas atividades de acordo com as necessidades e a capacidade de
cada um. É assim que surge a primeira instituição social: a família.

Ao produzirem a vida, as famílias instituíram o comércio para realizar


suas trocas, inicialmente de itens de sobrevivência e, mais tarde, de
formulações culturais. É na construção da ideia de propriedade privada
que é possibilitada a acumulação de bens e, consequentemente, a
instituição do trabalho servil. Por meio do controle de bens, algumas
famílias controlam outras e arrogam-se o direito de impor leis a partir da
força. É assim que criamos a instituição do poder político e do Estado.

A fome, a sobrevivência miserável, a desigualdade de acesso a bens


públicos incomodam você? Para essa corrente filosófica, esses problemas
sociais são frutos de uma sociedade que os considera naturais. É a
sociedade que responsabiliza o indivíduo vitimado por sua miséria e
encontra justificativas simplistas para manter os benefícios de alguns.

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É essa estrutura que possibilita a alienação, na tentativa de justificar por
meio do mito a desigualdade social. O próprio mito fica comprometido,
pois as famílias ricas detêm o monopólio sobre sua narração e a
celebração dos ritos, criando assim a instituição social religiosa.

As famílias dominantes disputam terreno, plantações, riquezas entre si,


criando a guerra, em que o perdedor passa a ser escravo do vencedor. O
vencedor passa a acumular o domínio político, religioso, social, militar,
concentrando cada vez mais o poder e excluindo o restante do povo de
seu exercício.

É o desconhecimento desse processo de criação das instituições sociais,


a naturalização de sua existência, que é chamado por Marx de alienação
social. Ele aponta dois elementos fundamentais para a alienação social:
não nos reconhecemos como criadores das instituições – dessa forma,
aceitando a subordinação a este “ser superior” – e acreditamos que somos
totalmente livres, assim ignorando as condições sociais e históricas em
que nos encontramos. A essa forma particular de conhecimento e de
visão da realidade, a esse conhecimento derivado da alienação, Marx
chamou ideologia.

Para ele, seria a ideologia a responsável por ocultar e dissimular as


divisões sociais, remetendo à ideia de que somos todos iguais, ao mesmo
tempo em que dissemina os valores da classe dominante. O conceito
de meritocracia, por exemplo, pressupõe que todos possuem as mesmas
condições e, portanto, aquele que alcança o pódio tem o “mérito”,
venceu porque mereceu e não porque as condições sociais e materiais o
possibilitaram alcançar o mérito.

As instituições, condicionantes sociais e materiais, foram denominadas


por Marx como “condições materiais da vida”, ou estrutura econômica,
por se relacionarem diretamente com a forma pela qual produzimos
os bens e os serviços necessários para a reprodução da vida. A partir
dessa estrutura material, Marx afirma que criamos uma superestrutura
imaterial, que seria formada por religião, lei, ciência, ideologias etc. A
subordinação da superestrutura à estrutura foi o “pulo do gato” de Marx,
explanado na famosa frase: “Não é a consciência que determina a vida, é
a vida que determina a consciência”.

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O método marxista é chamado também de materialismo histórico dialético.
Materialista, por ter como base fundamental a economia; histórico, por pensar as
ações, as instituições e o próprio homem como frutos da história; e, por fim, dialético,
porque a história se forma a partir da luta de classes. Essa luta representa a busca das
classes subordinadas por alcançar o poder. A título de ilustração, observe o caso da
Revolução Francesa, tão aceso no imaginário da época.

Como você encara essa leitura materialista da realidade? Em que medida


esse debate desafia suas concepções transcendentais a respeito do
mundo em que vive? Essa reflexão é importante para todo ser humano
e fundamental para o profissional da educação que questiona seu papel
social, bem como o currículo com que trabalha.

Mas, e como essa teoria chega à educação hoje? Entre outras, foi a
partir da teoria de Marx que reflete a educação como instrumento
ideológico e alienante da superestrutura. Uma educação que representa
interesses de uma classe dominante. A partir de Marx podemos pensar
uma proposta de educação que desvele as instituições e denuncie a
ideologia, filosofia esta que é denominada “Filosofia da Práxis”. Práxis
seria a ação social, política e histórica de construção da vida, que tem
como objetivo a construção da “consciência de classe”. Por sua vez, esta é
alcançada quando os trabalhadores tomam consciência de sua condição
de trabalhadores e de que toda a riqueza da sociedade é produzida por
aqueles que não usufruem das benesses dessa produção.

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Saiba mais
Para pensar no desdobramento do marxismo
em outra área que pesquisa educação, procure
conhecer a vida e obra de Vygotsky. Considerado
um dos mais importantes pensadores da educação
contemporânea, ele encontrou em Marx as bases
da sua teoria da aprendizagem, ao alicerçar a
possibilidade de aprendizagem à ideia de que
somos seres históricos. Vygotsky é base educativa
de muitas escolas por meio da “Teoria Histórico-
Cultural”. Para conhecer mais sobre Vygotsky,
acesse o vídeo clicando aqui.

No contraponto dessa teoria crítica de influência universal, observaremos


na próxima unidade os reflexos do modelo de educação “tradicional” no
Brasil. Caso tenha se interessado em aprofundar o conhecimento das
teorias críticas, confira a obra de Paulo Freire (1921-1997), educador
brasileiro. Este, considerado o patrono da educação brasileira, recebeu
uma grande influência de Marx em sua teoria da educação.

Tarefa dissertativa
Caro estudante, convidamos você a acessar o
Ambiente Virtual de Aprendizagem e realizar a
tarefa dissertativa.

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21 A educação tradicional no Brasil
Objetivo
Apresentar a educação tradicional no Brasil, com base nas primeiras
formas educativas, controladas pela Igreja.

Os movimentos filosóficos, políticos e educacionais estudados até então,


apesar de se vincularem diretamente à Europa, espalharam-se por todo o
globo, fosse por meio da influência comercial e cultural europeia, ou por
meio da subordinação das colônias à metrópole a partir do século XVI.

No Brasil não foi diferente. Trinta anos após o “achamento”, com a


divisão do Brasil em capitanias hereditárias, os jesuítas, coordenados
pelo padre Manuel da Nóbrega (1517-1570), estruturaram as primeiras
unidades de ensino, que tinham como objetivo catequizar os índios e,
posteriormente, visando formar novos padres, passaram a alfabetizar e
educar os filhos dos imigrantes e mestiços que aqui viviam.

Mas, afinal, quem eram os jesuítas? Eles formavam uma ordem religiosa
fundada no movimento chamado Contrarreforma, que visava conter
os avanços da reforma protestante. Inácio de Loyola (1491-1556),
o fundador dessa ordem no século XVI, em um ímpeto religioso se
denominou “soldado de Cristo”, conceito do qual deriva o nome
“jesuíta”. Essa ordem religiosa, ao contrário das ordens tradicionais, não
se recolhia em mosteiros, mas imbuídos de forte ardor, os missionários
viviam junto aos fiéis defendendo o credo católico. Esse ideário filosófico
na formação desses jovens missionários (jovens jesuítas) para o “Novo
Mundo” reforçava a pregação do evangelho e no seu bojo um ideal de
formar “um homem bom” (visão ocidental cristã).

Com o tempo, a partir da criação de escolas, a ordem jesuítica passou a


voltar seus esforços missionários às crianças e às atividades educacionais,
aliás, esta é a sua principal característica: a ênfase na educação como

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instrumento evangelizador. Até a sua extinção, em 1773, os jesuítas
contavam com milhares de colégios espalhados por todo o globo.

Segundo Ghiraldelli (2003), a educação jesuítica possuía por base a


Ratio Studiorum, um plano de estudos que buscava articular as áreas
de Humanidades, Filosofia e Teologia. A educação jesuítica alcançou
relativo sucesso, principalmente e devido ao cuidado na preparação dos
professores e na sistematização de um método de ensino a partir da ratio.

Tal plano de estudos versava sobre regras práticas de ação pedagógica,


sobre a organização administrativa, a hierarquia, a função do professor,
os deveres do aluno etc. Essas regras dividiam o ensino em três fases.

a. Studia inferiora – Letras humanas: consistia em um curso de três


anos com ênfase em gramática, humanidades e retórica, além dos
ensinos de literatura clássica greco-latina.

b. Studia inferiora – Filosofia e ciências: possuía duração de


três anos, mas com ênfase nas disciplinas de filosofia, tais como
psicologia, metafísica, cosmologia, ciências da natureza etc.

c. Studia superiora: este curso, com duração de até quatro anos, visava
à formação do futuro padre; dessa forma, era focado em teologia,
além do estudo das literaturas clássicas.

E você tem ideia de como eram as aulas de cada studia? A didática


apregoada na ratio primava pela disciplina, repetição e rigidez, e as
classes eram divididas hierarquicamente até mesmo entre os alunos,
pois os melhores estudantes de cada turma se tornavam auxiliares dos
professores e recebiam títulos em cerimônias pomposas com a presença
dos familiares.

Os jesuítas incentivavam a competição e a disputa entre os estudantes e


as classes, buscando o desenvolvimento intelectual de cada indivíduo. Os
colégios jesuítas alcançaram fama de excelência na formação intelectual
e moral e, em busca dessa excelência, as férias escolares, por exemplo,
eram reduzidas para impedir que o contato com as famílias corrompesse
a moral já construída em cada criança.

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Em seu conjunto de regras, a ratio apregoava que os estudantes deveriam
evitar “questões novas” e “abstrações inúteis”, mesmo as que não
apresentavam perigo à fé e à moral, pois todo o conhecimento deveria
partir do mestre, que seria um modelo de retidão moral e de fé. Ademais,
os estudantes eram incentivados todos os dias, com exceção dos dias
santos, a repetir as lições até decorá-las, sob risco de punições para quem
não cumprisse com as normas.

O ambiente escolar, como extensão da Igreja, reivindicava o mesmo


respeito que o templo, sendo caracterizado como “templo do saber”.
Dessa forma, a ordem nos pátios, corredores e em todos os ambientes
era mantida a partir de severa vigilância dos estudantes, pelos próprios
estudantes e pelos supervisores.

Muitas foram as críticas dirigidas à pedagogia jesuítica, pois o ideal


humanista apregoado por essa pedagogia, segundo seus críticos, separou
a escola da vida, a ênfase nos clássicos não permitia que a educação
acompanhasse a evolução do seu tempo e, ademais, ciências como
geografia e matemática eram consideradas secundárias em relação à
filosofia e à teologia. Em suma, o ensino dos jesuítas não preparava o
estudante para a vida e para seu tempo.

A pedagogia tradicional com base na ratio ficou conhecida como


“pedagogia da essência”, por buscar realizar no estudante aquilo que seria,
em última instância, a sua essência de criatura divina, criada por Deus.
Desse modo, todo conhecimento deveria se subordinar ao criador.

A ratio enfatizava que o aluno, a partir da ação pedagógica do professor,


com os exercícios constantes de leitura, as repetições, a memorização e
a declamação, deveria se esforçar ao máximo em seu estudo e atribuir
todas as suas conquistas a Deus, pois apenas o divino confere sentido de
existência. Nesse processo, aconteceria a interiorização do conhecimento
e a descoberta da divindade presente no ser humano, realizando-se assim
a essência do humano como criatura divina.

Para Luckesi (2004), o papel da escola nesse contexto era preparar


intelectualmente e moralmente o indivíduo para assumir um lugar na
sociedade. Não competia à escola questionar a sociedade ou preparar o

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estudante para indagar sobre a realidade social. O compromisso da escola
seria propagar o conhecimento e a cultura, os conteúdos difundidos
pela escola seriam o acúmulo histórico das experiências adultas no
mundo, sendo assim, não havia espaço para a criança na construção do
conhecimento.

Interessante observar que esse sistema de ensino pressupõe que a criança


possui a mesma capacidade de assimilação que o adulto, ainda que
a assimilação esteja em desenvolvimento, pois é a partir do treino e
da repetição que a criança atinge seu pleno potencial. Para garantir a
aprendizagem com um método tão passivo e mecânico, os professores
se valiam de uma autoridade absoluta em sala de aula, muitas vezes
utilizando castigos físicos para impor a disciplina.

Mesmo após a expulsão dos jesuítas do Brasil em 1759, como vimos na


unidade 16, a educação laica instituída prosseguiu a partir das bases já
lançadas pela Igreja, ou seja, promovendo repetições, a partir da rigidez
na disciplina, com um ensinamento livresco e intelectual desconectado
da realidade.

Mesmo nesses tempos conturbados, surgiram muitas propostas


pedagógicas para além da educação tradicional, por exemplo, a pedagogia
dos oratorianos, que se opunham à rigidez pedagógica tradicional e, em
consonância com o espírito do Renascimento, incentivavam as pesquisas
científicas, além de defender uma disciplina mais branda. Apesar de ser
uma sociedade religiosa, os oratorianos apregoavam um ensino leigo que
superasse a estreita visão religiosa do mundo propagada até então.

Outro pensador importante que muito influenciou aquela época foi


Johann Friedrich Herbart (1776-1841), com sua psicologia experimental,
defendendo a educação a partir de três princípios: governo, instrução
e disciplina. O governo seria o controle dos impulsos e paixões das
crianças, iniciando-as no mundo regrado dos adultos; a instrução seria
o desenvolvimento das habilidades e competências dos infantes; e a
disciplina seria a rigidez com a qual se deve manter a educação em busca
da formação do caráter e da moral.

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A educação tradicional nos legou a ênfase nos conteúdos, obviamente
que a rigidez, o academicismo e a transferência de conhecimento são
recusadas pela educação dos nossos dias, porém não podemos esquecer a
importância dos conteúdos para uma boa formação escolar. Sendo assim,
olhar com olhos críticos a educação tradicional nos possibilita observar
o mover educacional de forma mais ampla, buscando encontrar o meio
termo entre a ênfase nos conteúdos e a ênfase nos estudantes.

A educação tradicional ficou caracterizada pela rigidez na disciplina e


pela transferência do conhecimento pelo professor. Nela o professor,
como detentor de todo o conhecimento, repassa esse saber ao estudante,
que reproduz o conhecimento exatamente como recebeu. Mas essa
educação estática e passiva sofreu fortes críticas por não se adequar à
realidade das sociedades, cada vez mais urbanizadas. Um dos movimentos
pioneiros nessa crítica foi o movimento escolanovista, tema da nossa
próxima unidade.

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A filosofia e o movimento da Escola
22 Nova no Brasil
Objetivo
Compreender a influência das teorias psicológicas e da filosofia de
John Dewey na renovação escolar brasileira a partir do manifesto dos
pioneiros da educação.

Com a rápida urbanização e a democratização das sociedades ocidentais


no início do século XX, muitos foram os pensadores que buscaram uma
educação adequada para os novos tempos. Um movimento que levantou
a bandeira de uma educação voltada para a existência em detrimento
de uma educação para a essência, como apregoada pela educação
tradicional, foi o movimento Escola Nova ou escolanovista.

Mas o que seria essa educação para a existência? Como observamos


anteriormente, a educação tradicional visava realizar a essência do ser
humano; a educação religiosa visava realizar a essência do humano
subordinado a Deus; a educação da práxis tinha por objetivo formar a
consciência do trabalhador. A educação para a existência abdica desses
objetivos e se volta a educar o ser humano para a realidade dinâmica em
que o mundo se encontra, e dessa forma a educação era imbuída de um
forte caráter psicológico e individualista.

O movimento escolanovista denunciava a educação tradicional como


muito livresca e intelectual, sem sintonia com a realidade, além de ser
centrada no professor e caracterizada pela memorização dos conteúdos.
Aranha (2006) afirma que a classe burguesa, cuja ascensão ao poder se
deu desde a Revolução Francesa, necessitava de uma educação adequada
para um mundo em constante transformação e encontrou na Escola
Nova a resposta para seus anseios.

Esse movimento surgiu nos Estados Unidos e na Europa no final do


século XIX e se espalhou rapidamente pelo mundo, chegando ao Brasil
no início do século XX. Em 1899, visando integrar as diversas escolas

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novas, é fundado em Genebra o “Bureau Internacional de Escolas
Novas”, que apregoava uma série de princípios que deveriam ser seguidos
pelas escolas, caso estas desejassem pertencer ao movimento renovador da
educação.

Segundo o bureau, uma escola nova deveria ter como característica:


educação integral (moral, intelectual, técnica, cívica etc.), educação ativa,
educação prática, exercícios de autonomia, vida no campo, internato,
ensino individualizado etc. O método defendido centrava as atividades
pedagógicas nos estudantes como uma maneira de superar a formação
livresca tradicional; os estudantes eram incentivados a desenvolver suas
capacidades individuais.

No Brasil, o movimento aparece timidamente em 1920, quando Rui


Barbosa introduz essa nova forma de pensar a educação, porém ganha
corpo em 1932, quando é lançado o “Manifesto dos Pioneiros da
Educação Nova”, documento assinado e apoiado por 26 intelectuais
brasileiros. De acordo com Ghiraldelli (2003), o grupo dos pioneiros
era bastante heterogêneo, o que não os impediu de concordarem com
as linhas gerais da Escola Nova, especialmente com relação às críticas à
educação tradicional.

Partindo do pressuposto de que não há apenas uma educação, mas sim


uma educação para cada época, o manifesto defende que a educação
seja pensada a partir da realidade social na qual está inserida. Nesse caso
específico, o manifesto defende a educação fundamentada no trabalho,
pois, segundo seus pioneiros, o trabalho é a melhor escola de formação
moral.

O ponto alto do manifesto é a defesa do estudante, com o argumento


de que o professor necessita conhecer o estudante para que possa
desenvolver as suas melhores aptidões e não o moldar segundo uma
teoria de aprendizagem, pois, de acordo com o manifesto, as crianças
crescem de dentro para fora e, sendo assim, a escola deve propiciar
um ambiente saudável para esse crescimento, respeitando os limites da
própria criança.

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O manifesto traz em seu documento toda uma filosofia da educação e
uma concepção pedagógica. A proposta desses pioneiros era repensar
a educação a partir de critérios científicos, abolindo o empirismo tão
característico da educação tradicional. Um grande intelectual brasileiro
que assina o manifesto é Anísio Teixeira (1900-1971), que foi aluno de
John Dewey, o filósofo que lançou as bases filosóficas e epistemológicas
do movimento escolanovista.

John Dewey (1859-1952) foi um filósofo e pedagogo norte-americano


que, inspirado na filosofia pragmática de William James (1842-1910),
criou uma teoria denominada instrumentalismo, ou funcionalismo, que
foi de suma importância para a Escola Nova.

E o pragmatismo, o que seria?

O termo pragmático deriva do termo pragma, que em grego significa


ação ou prática. Logo, a filosofia pragmática é conhecida pela recusa das
verdades prontas e, na educação, pela recusa dos sistemas acabados e
absolutos. As teorias teriam valor a partir da sua aplicação, ou seja, uma
teoria é verdadeira quando a partir dela nos orientamos na realidade,
possibilitando a elaboração e construção das experiências.

Em suma, o pragmatismo vê as teorias como instrumentos e não


como respostas, pois a partir das teorias buscamos as respostas, sendo
critério para escolha das teorias a experiência. Como tudo se volta para
a experiência, então nada é estável, mas está em constante mudança, e
desse fato deriva o mote escolanovista “aprender a aprender”.

Além de grande intelectual e teórico, Dewey também organizou uma


escola experimental na qual aplicou suas teorias. Essa escola, que
funcionava na Universidade de Chicago, incentivava os estudantes a
aprender fazendo, e então as atividades nela desenvolvidas eram das mais
variadas, iam de artes até gastronomia.

Dewey defendia que os professores deveriam valorizar a capacidade


de pensar dos estudantes, preparando-os para questionar a realidade,
problematizando as experiências de tal forma que não existisse separação

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entre teoria e prática. A educação, portanto, deveria possibilitar que o
estudante resolvesse por si próprio os problemas que a vida lhe apresenta.
Aliás, esse filósofo pensava que a educação não deveria ser para a vida,
mas sim a própria vida, em um crescimento e aperfeiçoamento constante,
conforme acumulamos experiências.

Em um ensino que privilegia a experiência, o centro do processo


pedagógico se desloca do professor e centra-se no estudante, alterando
assim o papel do próprio professor, que passa a ser um incentivador do
estudante, acompanhando suas atividades e procurando desenvolver
suas capacidades, sem impor nenhum conhecimento, apenas propondo
situações-problema para que o estudante resolva.

Dewey também recusa a autoridade e a disciplina tão defendidas pela


educação tradicional. Ao contrário dessa concepção, o filósofo defende
a iniciativa e a independência, que deveriam possibilitar à criança a
autonomia, construindo assim todo um sentido para a prática democrática,
que seria muito mais que um governo, mas uma forma de vida.

Em consonância com a filosofia de Dewey, os pioneiros da educação


nova no Brasil defenderam que a escola não deveria servir a outros
interesses que não fossem os interesses do indivíduo. Desse modo,
traçaram duras críticas à educação religiosa, defendendo uma educação
laica, pública, gratuita e universal.

Hoje somos filhos do Movimento Escola Nova, pois defendemos a escola


pública, laica e totalmente subsidiada pelo Estado. Sobre a influência da
Escola Nova na educação não podemos esquecer o caráter formativo da
educação, pois além de construir a tão sonhada autonomia e socializar
o conhecimento a educação também necessita nos educar para a vida, a
partir de conhecimentos úteis para a vivência humana, como a formação
profissional.

Ainda que possua um caráter revolucionário (e até mesmo por isso), o


movimento escolanovista sofreu duras críticas. Segundo seus críticos, o
movimento partia de um “otimismo pedagógico” que beirava a utopia,
pois via a escola como um ambiente neutro que prepararia o indivíduo
para construir uma sociedade mais democrática, ignorando as pressões

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que esse indivíduo receberia por estar inserido em uma sociedade pouco
democrática.

Ademais, os críticos não viram com bons olhos essa centralidade


do processo educativo no estudante, pois se na escola tradicional a
centralidade era o mestre, argumentaram que centrar o ensino no
estudante logo após um período de rigidez pedagógica apenas incentivava
a insubordinação dos alunos. Denunciaram também que a ênfase no
processo, apregoada pela Escola Nova, abdicava dos conteúdos, que
seriam tão relevantes para a aprendizagem quanto o processo.

Esse movimento, que teve grande repercussão na educação do Brasil,


era liderado por um grupo de intelectuais brasileiros que naquela
época fundamentava seu pensamento social na filosofia positivista que
era tendência predominante na Europa e nos Estados Unidos. Sua
visibilidade na educação brasileira veio através do filtro dessas ideias no
bojo do pensamento pragmático bem representado por John Dewey.

Na próxima unidade, veremos como que das críticas à Escola Nova


e à Educação Tradicional surgiu uma pedagogia centrada na crítica
à sociedade, que propôs mudanças sociais a partir da educação –
especificamente, veremos o educador Paulo Freire e sua Pedagogia
Libertadora, na qual o aluno se torna “educando” e o professor
“educador”.

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Paulo Freire: a educação crítica no
23 Brasil
Objetivo
Apresentar as bases filosóficas da pedagogia freiriana: materialismo
histórico e dialético e idealismo hegeliano.

As propostas críticas à educação escolanovista encontraram seu ápice em


Paulo Reglus Neves Freire (1921-1997), educador e filósofo brasileiro
que sem sombra de dúvida pode ser considerado, se não o maior, um
dos maiores intelectuais e educadores brasileiros. Em abril de 2012,
foi sancionada a lei nº 12.612 que declarou Paulo Freire Patrono da
Educação Brasileira.

Paulo Freire também é um dos brasileiros mais homenageados de toda


história, pois recebeu 41 títulos de Doutor Honoris Causa das maiores
universidades do mundo, dentre as quais Harvard, Cambridge e Oxford.
Devido a suas ideias, Paulo Freire foi preso e exilado durante 16 anos
pelo regime político da ditadura militar imposta no Brasil a partir de
1964. Enquanto esteve exilado, tornou-se um cidadão do mundo,
contribuindo em várias frentes educacionais, desde o Chile, passando por
Suíça, Estados Unidos e Guiné Bissau.

A pedagogia freiriana, conhecida também como pedagogia libertadora ou


pedagogia do oprimido, de posse de elementos do materialismo histórico
e dialético de Marx, do existencialismo e até mesmo do idealismo
hegeliano, apresentou respostas autênticas às questões educativas e
propôs uma revolução a partir da educação.

Em Marx, Freire buscou a ideia de conscientizar o oprimido da opressão,


permitindo uma ação (práxis) transformadora; no existencialismo, Freire
encontrou a sua noção de humano, sempre inacabado, buscando fazer-
se no mundo; e, por fim, do idealismo hegeliano, Freire se apropriou da

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relação dialética entre opressor e oprimido. Vamos entender como isso se
apresenta em sua teoria educacional.

Segundo Aranha (2006), Freire, em sua obra “Pedagogia do Oprimido”,


observa a sociedade dividida entre oprimidos e opressores: de um lado
estão os que se beneficiam dos bens produzidos socialmente e de outro
os que são impedidos de usufruírem desses bens. Porém, como apenas
realizamos nossa natureza na medida em que temos acesso a esses bens,
de certa forma existiria um grupo que impediria o outro de realizar a sua
humanidade.

Um dos muitos bens necessários para a realização da nossa natureza


é a educação, e Paulo Freire denuncia a existência de duas educações,
caracterizadas por uma pedagogia do opressor, que visa apenas à
dominação, e uma pedagogia do oprimido, em que a educação seria
uma prática libertadora, conscientizando o oprimido do seu papel
de sujeito na história e sua possibilidade de superação desse lugar
e papel, instrumentalizado pela educação que media o processo de
conscientização e libertação.

A dificuldade em realizar uma pedagogia do oprimido se encontra no


próprio oprimido, pois este muitas vezes aceita sua condição de oprimido
e passa a justificá-la, desvalorizando-se, atribuindo a sua opressão a causas
naturais, defendendo a aparente superioridade dos opressores. Além
disso, muitos oprimidos, em sua admiração pelos opressores, almejam
não apenas se libertar, mas se tornar opressores também.

Da mesma forma, os opressores nem sempre possuem consciência de


que são opressores, mas buscam justificar naturalmente a opressão e até
mesmo intentam libertar individualmente os oprimidos, por acreditarem
que a opressão se dá devido às características de cada pessoa.

A libertação, portanto, deve partir dos oprimidos. Eles devem gestar


a sua liberdade e a sua pedagogia a partir da luta pela realização da
sua humanidade. A pedagogia do oprimido não pode ser imposta ou
transferida, ela tem de ser construída em um processo de conscientização
e politização.

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Interessante é observar que Freire recusa os termos “professor” e “aluno”,
preferindo os termos “educador” e “educando”, o que se justifica a partir
da etimologia da palavra professor, do latim profiteri, que significaria
“aquele que professa” ou “declara publicamente”. Para Freire, esse termo
estaria conectado com uma visão de transmissão de conhecimento, pois
o professor estaria comprometido em professar seu conhecimento e não
em construir o conhecimento juntamente com o aluno. O mesmo ocorre
com o termo “aluno”, que seria a junção dos termos “a” e “lúmen”,
ou seja, “sem luz” – o aluno dessa forma seria um ser desprovido de
conhecimento, sem luz alguma, e seria iluminado pelo conhecimento do
professor. Os termos “educador” e “educando” utilizados por Paulo Freire
denotariam a ideia de construção coletiva do conhecimento, lembrando
que, como vimos na unidade 1, o termo “educação” significa “trazer
para fora”, e esta seria uma tarefa social dividida entre o educador e o
educando.

A partir do compromisso social de construir coletivamente a educação,


Freire, em sua “Pedagogia do Oprimido”, traça duras críticas à concepção
de ensino tradicional, que ele chamou de “educação bancária”. Nela
o educador aparece como detentor do conhecimento e sua função é
transmitir esse conhecimento para o educando; o sujeito da educação é o
educador, enquanto o educando, como mero receptáculo, apenas recebe
e reproduz o que o educador ensina.

O termo “bancária” deriva do ato de o educador “depositar” o seu


conhecimento na mente dos educandos e realizar “saques” – quando
solicita que os educandos reproduzam o conteúdo exatamente como foi
depositado.

Para Freire, essa passividade do educando e o papel paternalista do


educador caracterizariam um mundo estático, harmônico, sem conflitos
ou contradições. Porém, a realidade é dinâmica, contraditória e dialética,
e sendo assim faz-se necessário superar essa relação hierarquizada
entre educador e educando. É o que fica claro em sua famosa máxima
que afirma não haver conhecimento maior ou melhor, mas sim
conhecimentos diferentes.

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De acordo com Luckesi (2004), o diálogo é o foco da relação entre
os sujeitos do processo educativo, por isso não são possíveis relações
hierarquizadas. Eliminar as relações de autoridade não significa que o
educador se ausente na relação pedagógica, mas sim que ele atua como
mediador, buscando assegurar que todos possam se fazer sujeitos do
processo educativo.

Merece destaque o famoso método Paulo Freire – que não pode ser
reduzido a um método de alfabetização, pois configura-se como um
processo coletivo de produção e socialização do conhecimento – que,
realizando uma leitura crítica da realidade, visa transformá-la em um
processo de “ação–reflexão–ação”.

Para Freire, o método seria antes de tudo uma forma de o educando “ler
o mundo”, desvelando suas estruturas e se posicionando como sujeito da
sua história. O método freiriano alcançou grande fama quando em 45
dias alfabetizou 300 adultos em um círculo de cultura no Rio Grande do
Norte.

Esse método recusa as famosas cartilhas de alfabetização, identificadas


como “roupas de tamanho único”, que não servem para todas as pessoas.
Para Freire, as pessoas, antes de saber ler as letras, já sabem ler o mundo,
e sendo assim, necessitamos partir dessa leitura de mundo para ensinar
a leitura das letras. Como as realidades sociais são distintas, o método
freiriano defende que primeiramente o educador necessita conhecer os
seus educandos e a realidade em que vivem, para só então situar-se como
educador e promover a alfabetização.

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O primeiro momento do método seria a busca pelos “temas geradores”, que seriam
palavras que estariam intimamente ligadas com a realidade social dos educandos. A
partir desses temas geradores são organizados círculos de cultura, nos quais se dialoga
sobre como aquele termo é visto pela comunidade e quais as suas implicações, surgindo
assim uma situação-problema, para só então passar para a representação alfabética do
tema gerador.
Essa “leitura” anterior do tema gerador, ou seja, quando o educador se apossa do
sentido do tema gerador e a partir dele problematiza sua realidade, possibilita que o
educando se conscientize e as palavras passem a ter um sentido maior do que a sua
simples forma alfabética.
A ênfase na realidade dos educandos se faz sentir até mesmo nas atividades pós-
alfabetização; quando se passa a analisar e interpretar pequenos textos, esses textos
necessitam versar sobre a realidade vivida pelos educandos, para que estes possam “ler”
e para que possam lhes fazer sentido para além das letras, em busca da conscientização
e da politização.

O método Freiriano possui um forte caráter político e ético: político por


se comprometer com uma visão de mundo – o educador não se apresenta
como um ser neutro que transmite o conhecimento, mas sim como
alguém comprometido politicamente com a comunidade –, ético porque
assume o compromisso com a transformação da realidade. A educação
como prática da liberdade deve possibilitar a libertação, não apenas a
construção do conhecimento.

Como um autêntico filósofo da educação, Paulo Freire pensou o sentido


da práxis educativa defendendo a formação do humano como ser
político que deve ser alçado à condição de sujeito da sua história. Ao
pensar a sociedade, Freire comprometeu a educação com a sua própria
transformação e com a transformação das relações sociais, buscando
formas mais éticas e humanísticas de se relacionar com o outro e com o
mundo.

Como você já deve ter observado, toda teoria é passível de crítica, aliás,
muitas vezes essa crítica possibilita um avanço da teoria por apresentar
a esta os seus limites. Com Paulo Freire não foi diferente, apesar do

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reconhecimento da sua pedagogia e do sucesso do seu método, muitas
foram as críticas dirigidas a sua produção intelectual.

Inicialmente, as críticas foram dirigidas ao forte teor político do seu


método (essa foi na realidade a causa da sua prisão e exílio), suas ideias
foram consideradas subversivas e perigosas, muitos dizem que seu
método seria uma espécie de “doutrinação esquerdista”. Além disso,
algumas críticas consideravam suas teorias utópicas, sem a possibilidade
de massificação, capazes de ser aplicadas apenas a pequenos grupos.

Mesmo sendo um cristão fervoroso, Freire recebeu críticas da Igreja


Católica devido ao uso do materialismo histórico e dialético em seu
método, pois a Igreja via na doutrina marxista um teor ateísta. Ao
mesmo tempo em que recebeu críticas da Igreja, Paulo Freire também
recebeu críticas dos seus companheiros marxistas, devido à sua estreita
ligação com a Igreja. Foi nesse ambiente dialético e contraditório de
críticas que ele gestou a pedagogia que nos inspira até os dias atuais.

Paulo Freire nos compromete com uma educação para a mudança, uma
educação em que se reconheçam todos os humanos como sujeitos da sua
história. Essa pedagogia do reconhecimento encontra eco nas filosofias
ditas pós-modernas, que defenderam o reconhecimento de minorias até
então excluídas dos processos sociais. Este será o tema da nossa próxima
unidade.

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24 A educação na pós-modernidade
Objetivo
Apresentar as teorias inclusivistas da pós-modernidade e as
discussões de gênero e identidade.

A tão anunciada pós-modernidade bate à porta, porém ainda hoje temos


dificuldade de situá-la, ponderá-la, delimitar sua abrangência. Hoje tudo
se apresenta tão pós-moderno e ao mesmo tempo tradicional. Como
ficam a filosofia e a educação então?

Tarefa ingrata é solicitar à filosofia para falar do futuro, ou explanar sobre


o presente. A filosofia, caracterizada como a “Coruja de Atenas”, alça
voos apenas ao entardecer – isso significa que a filosofia necessita de que
os fatos ocorram para então analisá-los e emitir seus juízos, ainda que o
marxismo defenda que a filosofia deva ser como o “galo da madrugada” e
anunciar o novo dia que surge.

Entre corujas e galos, nesta unidade falaremos da filosofia em nossos


dias com a pretensão de especular os seus rumos nestes tempos pós-
modernos. Para isso, inicialmente necessitamos situar este conceito:
afinal, o que é pós-moderno?

Para entender, inicialmente vamos recapitular o que é moderno e assim


ver o que se situa após ele. Como abordamos nas unidades que tratam
do Iluminismo e do Renascimento, a modernidade foi caracterizada pela
pretensão de subordinar tudo à razão, apreender toda a realidade social.
Basta lembrarmos da pretensão dos empiristas e racionalistas em buscar
as bases da razão e o fundamento do conhecimento verdadeiro. Contudo,
sendo esta a modernidade, o que se situa após ela?

Como observamos, já com Kant se inicia um movimento que


desconfia da prepotência da razão. Em Marx, isso se consolida ao
afirmar que nossos conhecimentos são determinados por ideologias e

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alienação. A partir dessas e de muitas outras questões no século XX, os
pensadores passaram a questionar as pretensões da razão e a validade do
conhecimento.

Sendo assim, uma das principais características da pós-modernidade


é a desconstrução dos princípios de razão, sujeito, ordem, Estado,
sociedade etc. Segundo Aranha (2006), as transformações sociais
ocorridas na sociedade a partir do advento da ciência moderna e da
tecnologia mudaram a forma com a qual lidamos com o conhecimento.
A globalização cultural e as trocas intensas de comunicação e informação
entre os mais distintos povos nos levam a reconhecer uma pluralidade de
valores e de comportamentos que questionam as estruturas tradicionais
do nosso conhecimento.

Nestes tempos em que tudo muda rapidamente ou, como disse Marx,
em que “tudo o que é sólido se desmancha no ar”, novos desafios se
apresentam à educação e à filosofia. Pensando esse período como “era das
incertezas”, em 1999 a Unesco solicitou ao filósofo francês Edgar Morin
(1921-) que elaborasse princípios para se repensar a educação neste
século, e o resultado de tal tarefa materializou-se no livro “Os sete saberes
necessários à educação do futuro”. Tais saberes seriam:

a. as cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão;


b. os princípios do conhecimento pertinente;
c. ensinar a condição humana;
d. ensinar a identidade terrena;
e. enfrentar as incertezas;
f. ensinar a compreensão;
g. a ética do gênero humano.

A questão que permeia a obra de Morin (2000) seria o abdicar das nossas
certezas e construir novos pressupostos condizentes com a época em
que vivemos, pressupostos estes que abordem o humano em sua forma
integral e pense o mundo como pátria-terra, possibilitando pensamentos
e ações globais, construindo uma nova ética, que se configuraria como
uma “antropoética”, ou ética do gênero humano. Uma ética planetária na
visão de Boff (teólogo, filósofo e escritor brasileiro contemporâneo).

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Morin (2000) defende um conhecimento que seja capaz de abordar os
problemas globais, pois o conhecimento difundido nos dias atuais é
fragmentado, e até mesmo microfragmentado; as hiperespecializações
não dão conta das questões gerais e fundamentais que se apresentam,
por isso são necessárias abordagens “inter-poli-transdisciplinares”, que
abarquem as partes e o todo da complexidade atual.

As pretensões de pensamento e ação global de Morin aparentemente


esbarram na ênfase nas identidades tão presente em nossos dias, porém,
para Morin (2000), a construção da identidade deve se dar a partir da
compreensão do outro, e não estamos falando de um outro distante,
exótico, que necessita ser “aceito ou modificado”. O outro se encontra
compartilhando os mesmos ambientes que nós, em nossas salas de aula, o
outro salta aos olhos quando observamos a diversidade humana.

Com essa diversidade tão presente devemos nos questionar: que


pressupostos éticos podemos ensinar para pessoas com crenças e vivências
tão distintas? Que respostas e análises podemos oferecer à exclusão social
tão gritante? Como abordar sexualidade, gênero, violência, intolerância
religiosa, etnia, raça, territorialidade, patrimônio cultural das minoritárias
comunidades tradicionais, nacionalidades e identidades entre outros,
sem sermos ingênuos, paternalistas, preconceituosos e/ou inclusivistas e/
ou exclusivistas? Todas essas questões se relacionam diretamente com a
realidade pós-moderna.

Estudo complementar
Leia o capítulo 4 de “Os quatro pilares da
educação”, de Jacques Delors, no Relatório para a
UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação
para o século XXI, feito em 2010. Nele você vai
encontrar os novos dilemas e desafios do futuro da
educação do Brasil. Disponível clicando aqui.

www.esab.edu.br 139
Uma das discussões mais fecundas em nossos dias é a discussão sobre
identidades. Essa discussão se iniciou no século XIX e se estende até
hoje, a partir de uma série de pesquisas e estudos multiculturais que se
concretizaram em um movimento denominado multiculturalismo. Esse
movimento ou corrente filosófica se desenvolveu a partir das análises dos
conflitos étnico-raciais, políticos e sociais.

O objetivo dos intelectuais multiculturalistas é afirmar o reconhecimento


do outro, das diferentes culturas, se configurando até mesmo como uma
estratégia política de reconhecimento e representação da diversidade
cultural. A dificuldade em situar o multiculturalismo está em desvincular
a corrente de pensamento da atuação política e militante nas lutas pelos
direitos das minorias.

Você pode observar, por exemplo, nas discussões de gênero que a partir
dos estudos realizados nas últimas décadas se desconstruíram o mito de
sexo frágil e os estereótipos do masculino e do feminino. Essas análises
fomentaram uma série de movimentos que, para além do feminismo,
defendem um papel social diferenciado para a mulher, reivindicando
mais do que direitos iguais, como é o caso da Lei Maria da Penha, que
protege a mulher nos casos de agressão familiar.

As discussões sobre diversidade das últimas décadas, entre outras ressalta


a necessidade de afirmar a identidade a partir das diferenças e não mais a
partir dos conceitos gerais homogeneizantes. As diferenças passam então
a ser ressaltadas como um dos elementos da identidade dos indivíduos a
ser considerada.

Observe o caso dos indígenas: no imaginário comum existe apenas um


índio, que é aquele sujeito que anda seminu e usa instrumentos da idade
da pedra. Porém, são centenas de tribos espalhadas por muitos territórios
e com culturas tão distintas entre si que a categoria “índio” não parece
abarcar todos esses povos.

Os diálogos sobre identidade – ou identidades, pois não podemos


reduzir o conceito de identidade a um sentido singular – estão apenas
começando. Todos os dias observamos o surgimento de novos grupos
identitários que se estruturam a partir de relações sociais e valores

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distintos do restante da sociedade, desafiando-nos à compreensão para
além da aceitação, como aponta Morin (2000).

Além disso, não podemos nos olvidar da influência das TICs –


Tecnologias de Informação e Comunicação – na educação e na
sociedade. Nesta era da informação, qual o papel do professor diante
da avalanche de informações? Como orientar nossos estudantes nesse
“informar”? Essas reflexões apontam para um papel cada vez mais
mediador e orientador do professor, pois, além de receber informações,
nossos estudantes necessitam transformar as informações em
conhecimento, dando-lhes sentido.

Como Morin (2000) salienta em sua epistemologia, o nosso desafio


hoje é “aprender a aprender” para sobreviver em um mundo onde nada
é estável, e para além das nossas necessidades individuais, também
necessitamos avançar na compreensão do outro e assim construir um
mundo onde caibam todos.

Atividade
Chegou a hora de você testar seus conhecimentos
em relação às unidade 17 a 24. Para isso, dirija-se
ao Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) e
responda às questões. Além de revisar o conteúdo,
você estará se preparando para a prova. Bom
trabalho!

www.esab.edu.br 141
Resumo

Nestas últimas seis unidades realizamos um passeio desde a filosofia


moderna e a sua pretensão universalizante, passando pela educação
tradicional e crítica no Brasil, até chegarmos nesta era das incertezas, os
ditos tempos pós-modernos atuais.

Na unidade 19, você foi apresentado a Immanuel Kant e sua solução


para o problema dos modernos. Ao realizar sua revolução copernicana,
Kant limitou nossa capacidade de compreensão ao argumentar que não
é possível conhecer a realidade como ela é. A partir de sua busca pelos
princípios universais da ética, Kant pensou uma pedagogia que levasse o
homem à maioridade moral.

Na unidade 20, observamos a filosofia revolucionária de Marx e Engels,


que, ao buscarem conscientizar os trabalhadores da condição de explorados
em que se encontravam, elaboraram um método para a análise da realidade
denominado materialismo histórico e dialético, no intento de vencer a
alienação e as ideologias, realizando uma filosofia da práxis.

Na unidade 21, iniciamos os nossos estudos sobre a educação no Brasil


e observamos como era configurada a educação religiosa promovida
pelos jesuítas. Essa educação baseada na Ratio Studiorium, centrada na
disciplina, na repetição e na rigidez formou várias gerações de brasileiros
em uma educação humanista, visando realizar a essência do humano
como criatura divina.

Na unidade 22, conhecemos o movimento Escola Nova, que propunha


mudanças radicais na educação, visando atualizar a pedagogia aos novos
tempos sociais. Nessa unidade, observamos o “Manifesto dos Pioneiros
da Escola Nova”, em que um conjunto de intelectuais brasileiros
defendeu as bases de outra educação, mais voltada aos processos e ao
estudante do que ao conteúdo e ao professor.

www.esab.edu.br 142
Na unidade 23, conhecemos o grande educador Paulo Freire. Esse
herói da educação nos legou uma filosofia da educação humanista que
valorizava os sujeitos do processo de ensino-aprendizagem e também um
método de alfabetização que ia para além do “ler as letras”, levando os
sujeitos a “lerem o mundo”.

Na unidade 24 dialogamos com a pós-modernidade, observamos que a


filosofia e a educação se voltam para afirmar o sujeito diante do ímpeto
homogeneizante das culturas de massa e da era da informação. A pós-
modernidade defende a identidade a partir da diferença e a educação
como uma formação para aprender a aprender.

www.esab.edu.br 143
Glossário

Achamento
O termo “Achamento” deriva do pressuposto de que os portugueses
acharam as terras brasileiras, e não as descobriram, porque o Brasil
existia muito antes dos portugueses aportarem em nossas praias. O que
havia aqui não era uma terra de ninguém, mas de uma série de povos
organizados e distribuídos em centenas de nações. R

Adam Smith (1723-1790)


Economista e filósofo escocês. Teve como cenário para a sua vida o
atribulado Século das Luzes, o século XVIII. R

Alquimia
É uma prática antiga que combina elementos da Química, Antropologia,
Astrologia, Magia, Filosofia, Metalurgia, Matemática, Misticismo e
Religião. Existem quatro objetivos principais na sua prática. Um deles
seria a transmutação dos metais inferiores ao ouro, o outro a obtenção
do Elixir da Longa Vida, um remédio que curaria todas as coisas e daria
vida longa àqueles que o ingerissem. Ambos os objetivos poderiam
ser alcançados ao obter a pedra filosofal, uma substância mística. O
terceiro objetivo era criar vida humana artificial, os homunculus. O
quarto objetivo era fazer com que a realeza conseguisse enriquecer mais
rapidamente (este último talvez unicamente para assegurar a existência
dela, não sendo um objetivo filosófico). R

Alexandre, o Grande (356-323 a.C.)


Foi rei da Macedônia, o mais célebre conquistador do mundo antigo. R

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Amônio Saccas (175-242 d.C.)
Filósofo de Alexandria, considerado como o fundador da escola
neoplatônica. Plotino (205-270 d.C.), como seu discípulo, reuniu suas
ideias. R

Apolo
Uma das principais divindades greco-romanas, filho de Zeus e Leto, e
irmão gêmeo de Ártemis. R

Apologéticos/Apologia
Discurso ou escrito laudatório para justificar ou defender alguém ou
alguma coisa. R

Aporia
Quando duas razões contrárias são racionais. R

Aristocrático
Pertencente à aristocracia, que seria literalmente o governo dos melhores
onde o poder é exercido por um grupo denominado e reconhecido como
um grupo elitista. R

Arquimedes de Siracusa (287-212 a.C.)


Matemático, físico, astrônomo; um dos principais cientistas da
antiguidade. R

Ascese
Isolamento, prática da renúncia ao prazer ou mesmo a não satisfação de
algumas necessidades primárias como processo de santificação pessoal e
mortificação do corpo. R

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Benjamin Franklin (1706-1790)
Jornalista, editor, autor, filantropo, abolicionista, funcionário público,
cientista, diplomata, inventor e enxadrista estadunidense. Foi um
dos líderes da Revolução Americana, conhecido por suas citações e
experiências com a eletricidade. R

Camões, Luís de (aprox. 1524-1580)


Poeta português, considerado como um dos maiores representantes da
literatura portuguesa e da poesia ocidental. Sua obra mais conhecida é a
epopeia “Os Lusíadas”. R

Ceticismo
Descrença. R

Classe operária ou trabalhadora


A principal característica desta classe seria que seus membros não
possuem nenhum meio de vida exceto sua força de trabalho, que é
vendida em busca de recursos para sobreviver. R

Concupiscência
Desejo, cobiça, ambição. R

David Hume (1711-1776)


Filósofo, historiador e ensaísta escocês que se tornou célebre por seu
empirismo radical e seu ceticismo filosófico. Ao lado de John Locke e
George Berkeley, Hume compõe a famosa tríade do empirismo britânico,
sendo considerado um dos mais importantes pensadores do chamado
iluminismo escocês e da própria filosofia ocidental. R

Décio, Caio Méssio Quinto Trajano (201-251)


Foi imperador romano entre os anos de 249 e 251, precedido por Filipe,
o Árabe (204-249). R

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Denis Diderot (1713-1784)
Filósofo e escritor francês, foi um dos primeiros autores que fazem da
literatura um ofício, mas sem esquecer jamais que era um filósofo. R

Devir
Conceito filosófico que qualifica a mudança constante, a perenidade de
algo ou alguém. R

Diáspora judaica
Termo que significa as expulsões forçadas dos judeus pelo mundo e, por
consequência disso, as diversas comunidades judaicas espalhadas por
Israel, Líbano e Jordânia. R

Diógenes de Sínope, o Cínico (aprox. 408-323 a.C)


Filósofo discípulo de Antístenes, buscava a autossuficiência em uma vida
sem luxúria como virtude. Sua obra consiste em anedotas intituladas
Vidas e opiniões de filósofos eminentes. R

Ditadura militar
A ditadura no Brasil foi um período da história política brasileira
iniciado com o golpe militar de 1º de abril de 1964, que resultou
no afastamento do presidente do Brasil, João Goulart, assumindo
provisoriamente o presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli
e em definitivo, o marechal Castelo Branco. Tal regime ditatorial contou
ao todo com cinco presidentes e uma junta governativa, estendendo-se
do ano de 1964 até 1985, ano da eleição indireta do civil Tancredo Neves
para a Presidência da República. R

Dúvida hiperbólica
Conceito central em Descartes, o termo hiberbólica significa exagerada
ou dada a exageros; dessa forma, a dúvida hiperbólica seria a dúvida
constante que este pensador coloca acerca da veracidade das coisas,
ainda que suas dúvidas fossem filosoficamente construídas, não sendo

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um simples duvidar. O objetivo maior de Descartes era encontrar um
conhecimento do qual não se pudesse duvidar. R

Economia política
Este termo originalmente designa o estudo das relações de produção,
especialmente entre as duas classes principais da sociedade capitalista:
os capitalistas e os proletários. A terminologia “economia política” foi
paulatinamente substituída por economia. R

Empírica
Baseada na experiência, exclusivamente. R

Epicuro de Samos (341-270 a.C.)


Filósofo helenista influenciado por Demócrito e Pirro. R

Epistemológico/epistemologia
Disciplina da filosofia que estuda a teoria do conhecimento,
perguntando-se “O que é o conhecimento?” e “O que é possível
conhecer?”. R

Escola
É um termo largamente utilizado no meio acadêmico para caracterizar
um conjunto de pensadores ou de seus discípulos. No mesmo sentido,
você pode encontrar também o termo corrente. R

Estoico, estoicismo
Escola de filosofia grega, fundada por Zenão de Cítio (334-262 a.C.) em
Atenas no início do século III. R

Ética
Filosofia voltada aos estudos sobre os valores morais e ideais do
comportamento humano. R

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Euclides (360-295 a.C.)
Foi professor, matemático e escritor; conhecido como o “Pai da
Geometria”, viveu grande parte da sua vida em Alexandria. R

Eudaimonia
A felicidade, o bem-estar, o desenvolvimento humano; Filosofia
antropológica. R

Existencialismo
Doutrina filosófica que tem como seu principal representante Jean Paul
Sartre; entre muitas questões, afirma que o homem adentra ao mundo
como ser inacabado e, a partir da sua existência, constrói a sua essência,
tornando-se realmente humano. Em suma, o humano é o início e o fim
de toda reflexão existencialista. R

Feuerbach, Ludwig Andreas (1804-1872)


Filósofo alemão, é reconhecido por sua teologia humanista e pela
influência que o seu pensamento exerceu sobre Marx. R

Filosofia antropológica
Ramo da filosofia que estuda a estrutura essencial do homem. R

Filosofia clássica
A experiência de Atenas é chamada filosofia clássica, pois essa cidade
foi adotada pelas sociedades ocidentais como o berço da civilização
ocidental. R

Frege, Gottlob (1848-1925)


Foi um matemático, lógico e filósofo alemão. R

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George Berkeley (1685-1753)
Bispo de Cloyne, foi um dos maiores filósofos do início do período
moderno. Ele foi um brilhante crítico de seus predecessores,
particularmente de Descartes, Malebranche e Locke. R

Hedonismo
É uma teoria ou doutrina filosófico-moral que afirma ser o prazer o
supremo bem da vida humana. R

Heresia
É a doutrina ou linha de pensamento contrária ou diferente de um credo
ou sistema de um ou mais credos religiosos que pressuponha(m) um
sistema doutrinal organizado ou ortodoxo. R

Idealismo hegeliano
Doutrina filosófica de Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831).
A complexidade das teorias de Hegel não pode ser sintetizada em
uma ferramenta de glossário, mas Paulo Freire se apropria da dialética
hegeliana quando fala da condição de “servo e senhor”, em que os dois
mutuamente justificam a servidão, tornando-a natural. R

Ideologia
Maneira de pensar que caracteriza um indivíduo ou um grupo de
pessoas: ideologia socialista, por exemplo. R

Indelével
Algo que não pode ser apagado. R

Jonh Locke (1632 a 1704)


Filósofo inglês e ideólogo do liberalismo, sendo considerado o principal
representante do empirismo britânico e um dos principais teóricos do
contrato social. R

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Kant, Immanuel (1724-1804)
Foi um filósofo prussiano; geralmente considerado como o último
grande filósofo dos princípios da era moderna. Indiscutivelmente, um
dos pensadores mais influentes da história da filosofia. R

Lei Maria da Penha (2006)


A lei nº 11.340 decretada pelo Congresso Nacional; o nome da lei deriva
da história de Maria da Penha Maia Fernandes, que foi espancada de
forma brutal e violenta diariamente pelo marido durante seis anos de
casamento, mas lutou incansavelmente até que o mesmo fosse preso;
dentre as várias mudanças promovidas pela lei está o aumento no rigor
das punições das agressões contra a mulher quando ocorridas no âmbito
doméstico ou familiar. R

Loyola, Inácio de (1491-1556)


Fundador da Companhia de Jesus, uma ordem religiosa católica romana
que teve grande importância na Reforma Católica e cujos membros são
conhecidos como os jesuítas. Atualmente, a Companhia de Jesus é a
maior ordem religiosa católica no mundo. R

Lutas fratricidas
Lutas travadas entre irmãos. R

Maiêutica
Significa conduzir, trazer para fora. R

Maniqueísmo
Uma filosofia religiosa sincrética e dualística, fundada e propagada por
Maniqueu, que divide o mundo simplesmente entre bom, ou Deus, e
mau, ou o diabo. R

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Marcião
Foi um dos mais proeminentes heresiarcas durante o Cristianismo
primitivo. Sua teologia (chamada marcionismo), que propunha dois
deuses distintos, um no Antigo Testamento e outro no Novo Testamento,
foi denunciada pelos Pais da Igreja e ele foi excomungado. R

Marquês de Condorcet, ou Marie Jean Antoine Nicolas de Caritat


(1743-1794)
Foi um político, revolucionário e matemático francês. Este grande
humanista é considerado o fundador do sistema educacional francês.
Sua defesa da liberdade econômica, tolerância religiosa, reformas legais e
educacionais fazem deste pensador uma figura típica do Iluminismo. R

Marquês de Pombal, ou Sebastião José de Carvalho e Melo (1699-


1782)
Nobre, diplomata e estadista português. Foi secretário de Estado do
Reino durante o reinado de D. José I (1750-1777), sendo considerado,
ainda hoje, uma das figuras mais controversas e carismáticas da História
Portuguesa. R

Marxismo
Conjunto de ideias filosóficas, econômicas, políticas e sociais elaboradas
em colaboração entre Karl Marx e Friedrich Engels; o marxismo
influenciou muitos setores, desde a política e a prática sindical até a
análise e interpretação de fatos sociais, morais, artísticos, históricos e
econômicos. R

Metafísica
Disciplina da Filosofia que estuda a essência dos seres. R

Mito
Exposição simbólica de um fato. R

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Montanhismo
Religião asceta que defendia o isolamento do indíviduo do mundo. R

Montesquieu ou Charles-Louis de Secondat (1689-1755)


Foi um influente político e filósofo que, assim como Voltaire, combateu
o absolutismo, realizando uma dura crítica a Maquiavel e ao pressuposto
maquiavélico de que o rei está acima das leis e da moralidade,
argumentando que o único instrumento que limita o poder é o próprio
poder. R

Morin, Edgar (1921-)


É um antropólogo, sociólogo e filósofo francês judeu. Autor de mais
de trinta livros, entre eles: “O método” (seis volumes), “Introdução
ao pensamento complexo”, “Ciência com consciência” e “Os sete
saberes necessários para a educação do futuro”. É considerado um dos
principais pensadores contemporâneos e um dos principais teóricos da
complexidade. R

Neoplatonismo
Foi uma corrente de pensamento iniciada no século III que se baseava
nos ensinamentos de Platão e dos platônicos, mas interpretando-os de
formas bastante diversificadas. R

Nóbrega, Manoel de (1517-1570)


Sacerdote jesuíta português, chefe da primeira missão jesuítica à América.
As cartas enviadas a seus superiores são documentos históricos sobre o
Brasil Colônia e a ação jesuítica no século XVI. R

Oráculo de Delfos
Situado em Delfos, o Oráculo de Delfos era dedicado principalmente a
Apolo e centrado num grande templo, ao qual vinham os antigos gregos
para colocar questões aos deuses. R

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Oratória
É a arte de falar em público, de forma estruturada e deliberada, com a
intenção de informar, influenciar ou entreter os ouvintes. R

Oratorianos
Sociedade de vida apostólica fundada em 1565, por São Filipe Néri; essa
sociedade é voltada para clérigos seculares, sem os votos de pobreza e
obediência; os seus membros dedicam-se à educação cristã e a obras de
caridade. R

Paideia
Segundo Werner Jaeger, era o “[...] processo de educação em sua forma
verdadeira, a forma natural e genuinamente humana” na Grécia antiga.R

Pais de Igreja
Historicamente, são considerados Pais da Igreja os líderes que
organizaram a doutrina cristã após a morte de Cristo. R

Patrística
Filosofia cristã dos sete primeiros séculos fundada pelos padres ou Pais da
Igreja, era uma doutrina das verdades da fé do Cristianismo. R

Paulo
Paulo de Tarso, também chamado de Apóstolo Paulo, Saulo de Tarso
ou São Paulo, foi um dos mais influentes escritores do cristianismo
primitivo, cujas obras compõem parte significativa do Novo Testamento.
R

Pax
A Pax Romana, expressão latina para “a paz romana”, é o longo período
de relativa paz experimentado pelo Império Romano, gerada pelas
armas e pelo autoritarismo, que se iniciou quando Augusto, em 29

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a.C., declarou o fim das guerras civis e que durou até o ano da morte de
Marco Aurélio, em 180 d.C. R

Pirro de Élis (360-270 a.C.)


Filósofo cético, pintor; viajou com o conquistador Alexandre em algumas
expedições ao Oriente. R

Pólis
Modelo das antigas cidades gregas. R

Princípio da causalidade
Causalidade é a relação entre um evento (a causa) e um segundo evento
(o efeito), sendo que o segundo evento é uma consequência do primeiro.
R

Refutar
Afirmar o oposto, negar, contestar argumentos. R

Relativismo
Segundo o qual todo conhecimento é relativo. R

Reminiscência
Capacidade de reter na memória. Lembrança quase apagada, vaga
recordação. R

República de Platão
Trata-se de um diálogo socrático escrito por Platão que trata da justiça e
da política de uma cidade fictícia. R

Retórica sofista
Habilidade verbal que os sofistas possuíam, usada para convencer os
interlocultores. R

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Revolução Americana
Movimento de ampla base popular, teve como principal motor a
burguesia colonial e levou à proclamação, no dia 4 de julho de 1776,
da independência das Treze Colônias – os Estados Unidos da América,
primeiro país dotado de uma constituição política escrita. R

Revolução Industrial
Foi uma série de mudanças tecnológicas que revolucionaram o processo
produtivo em nível econômico e social, especialmente a partir do uso do
vapor e do posterior uso da eletricidade como força motriz; iniciou-se
no Reino Unido no século XVIII e expandiu-se pelo mundo a partir do
século XIX. R

Robespierre (1758-1794)
Advogado e político francês, foi uma das personalidades mais
importantes da Revolução Francesa. R

Russel, Bertrand (1872-1970)


Matemático, político liberal e filósofo. R

Rússia Czarista
O Império Russo, conhecido também coloquialmente como Rússia,
foi um estado que existiu de 1721, quando o czar Pedro I, oriundo da
Casa Romanov, proclamou o império e iniciou o processo de expansão
territorial, até a Revolução Russa, de 1917, que depôs o czar Nicolau II.
Sucedeu o chamado domínio czarista, que antecedeu a União Soviética.
Por toda a sua existência esteve sob a soberania da dinastia Romanov. R

Teeteto
Diálogo platônico que aborda a natureza do conhecimento. R

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Teixeira, Anísio (1900-1971)
Foi um jurista, intelectual, educador e escritor brasileiro. Personagem
central na história da educação no Brasil, nas décadas de 1920 e 1930
difundiu os pressupostos do movimento da Escola Nova, que tinha como
princípio a ênfase no desenvolvimento do intelecto e na capacidade de
julgamento, em preferência à memorização. R

Teorema de Pitágoras
O teorema de Pitágoras é uma relação matemática entre os três lados de
qualquer triângulo retângulo. Na geometria euclidiana, o teorema afirma
que: “Em qualquer triângulo retângulo, o quadrado do comprimento da
hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos comprimentos dos catetos”.
R

Thomas Hobbes (1588-1679)


Matemático, teórico político, e filósofo inglês, autor de “Leviatã” (1651)
e “Do cidadão” (1651). R

Thomas Jefferson (1743-1826)


Foi o terceiro presidente dos Estados Unidos (1801-1809), e o principal
autor da declaração de independência (1776) daquele país. Jefferson foi
um dos mais influentes “Pais Fundadores” da nação, conhecido pela sua
promoção dos ideais do republicanismo nos Estados Unidos. R

Tomismo
O tomismo é a doutrina ou filosofia escolástica de São Tomás de Aquino
adotada oficialmente pela Igreja Católica e que se caracteriza, sobretudo,
pela tentativa de conciliar o aristotelismo com o cristianismo. R

Verve
Vigor de expressão; vivacidade no escrever e/ou no falar. R

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Voltaire ou François Marie Arouet (1694-1778)
Foi um ensaísta, romancista, dramaturgo e filósofo iluminista francês,
conhecido pelas suas duras críticas à Igreja e ao absolutismo. Foi um
árduo defensor dos direitos civis e das liberdades individuais, apesar do
seu ímpeto questionador e crítico. R

Vygotsky, Lev Semenovitch (1896-1934)


Foi um psicólogo bielo-russo muito importante em sua área, sendo
pioneiro na noção de que o desenvolvimento intelectual das crianças
ocorre em função das interações sociais e condições de vida. R

Whitehead, Alfred North (1861-1947)


Foi um filósofo e matemático britânico. R

Xenofonte (430-355 a.C.)


Foi um soldado, mercenário e discípulo de Sócrates. É conhecido pelos
seus escritos sobre a história do seu próprio tempo e pelos seus discursos
sobre Sócrates. R

Zenão (490/485-430 a.C.)


Foi um filósofo pré-socrático da escola eleática. Discípulo de Parmênides
de Eleia, defendeu, de modo apaixonado, a filosofia do mestre. R

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Referências

Bibliografia Básica:

ARANHA, M. L. de A. Filosofia da educação. 3. ed. rev. e ampl. São Paulo:


Moderna, 2006.

GHIRALDELLI Jr., P. A Nova Filosofia da Educação. Barueri, São Paulo:


Monole, 2014.

LUCKESI, Carlos Cipriano. Filosofia da educação. 2. ed. São Paulo: Cortez,


2004.

Bibliografia Complementar:

GADOTTI, Moacir. Pedagogia da práxis. São Paulo: Cortez, 2004

GHIRALDELLI Jr., P. Filosofia e História da Educação Brasileira. São Paulo:


Manole, 2009.

MATTAR, J. Introdução à Filosofia. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2010.

MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 2 ed. São Paulo:


Cortez; Brasília: UNESCO, 2011.

TRIGO, L. G. G. Pensamento Filosófico: um enfoque educacional. Curitiba:


Ibpex, 2009.

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