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O novo choque

do petróleo
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O novo choque
do petróleo
Os choques no preço do
petróleo sempre tiveram
um efeito danoso à
economia global.

Por mais que a


matéria-prima venha
sendo substituída nos
últimos anos por fontes
alternativas e renováveis,
os grandes produtores
globais ainda detêm um
forte poder geopolítico.

Há meio século um
fenômeno tem se
repetido: um fato
histórico mexe com o
preço da commodity. Se
entre os anos 1970 e
2008 o choque foi de
alta, a partir da crise do
subprime nos Estados
Unidos o valor do barril
despencou. Agora, a
pandemia do coronavírus
provocou o efeito inédito
de um petróleo
negociado com valores
negativos.

Compartilhe: Entenda o histórico das


crises e os efeitos para a
e | investidor economia.
Sumário
03 O inínico da nova
crise do petróleo

06 Um banho de
óleo negro

10 O petróleo abaixo
de US$ 0

13 Os produtores
em ação

15 WTI e Brent, dois


tipos bastante
diferentes

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01

O início da
nova crise do
petróleo

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O novo choque do petróleo | 04

O petróleo é um recurso natural extremamente


estratégico. Ele está diretamente ligado aos meios de
transporte com motores movidos a combustão, como a
gasolina, o óleo diesel e o querosene de aviação. A
matéria-prima também é chave para uma variedade de
aplicações, desde a indústria plástica e de borracha até
a criação de produtos farmacêuticos e cosméticos.

Por ser estratégico, o petróleo confere poder político e


econômico a diversas nações. A Arábia Saudita é líder
mundial na produção dessa matéria-prima, algo
importante para sua posição geopolítica nas decisões
sobre aumento ou redução de extração do óleo negro.
Na outra ponta estão os Estados Unidos, o maior
consumidor - e terceiro maior produtor global.

Desde os anos 1960, as políticas sobre a produção e a


venda do petróleo cabem à Opep (Organização dos
Países Exportadores de Petróleo), que atualmente é
formada por Angola, Arábia Saudita, Argélia, Catar,
Emirados Árabes Unidos, Equador, Irã, Iraque, Kuwait,
Líbia, Nigéria e Venezuela. O objetivo é controlar o valor
do barril de petróleo, regulando a produção para que o
preço não fique em baixa ou em alta por conta de
excesso ou redução de extração do óleo negro,
respectivamente.

Mas, desde a organização desses países na Opep,


alguns interesses acabam falando mais alto. A primeira
crise desencadeada por um desentendimento
geopolítico aconteceu no fim de 1973, quando os
Estados Unidos apoiaram Israel na Guerra do Yom
Kippur e os países árabes, como retaliação, fizeram o
preço da commodity subir 400%, de US$ 3 para US$ 12.

A segunda crise aconteceu no fim daquela década, em


1979, quando o Irã, então maior produtor da
commodity, passou por uma crise política que fez o
Aiatolá Khomeini assumir o poder. Seu desprezo pelos
países ocidentais ficou claro com a redução na oferta
do produto, fazendo o preço do barril de petróleo subir
para US$ 34.

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Se os anos 1980 ficaram marcados pela Guerra


Irã-Iraque, no início dos anos 1990 estourou a Guerra
do Golfo, com a invasão do Kuwait pelo Iraque do
ditador Saddam Hussein. Com a ajuda dos americanos
para expulsar os invasores do Kuwait, os iraquianos
incendiaram poços de petróleo, provocando uma crise
econômica global - o preço do barril tocava, pela
primeira vez, os US$ 40.

Durante mais de 10 anos,


o preço do barril do
petróleo ficou oscilando
próximo aos US$ 40.
Mas, entre 2003 e 2007,
o valor subiu para US$
90. O que parecia
impensável aconteceu
em menos de seis
meses: a commodity
rompeu a barreira dos
US$ 100 em 2008 e
caminhava para superar
os US$ 150.

Bancos de investimento chegaram a cravar que US$ 150


era o novo normal e analistas russos afirmaram, à
época, que projetavam o barril do petróleo a US$ 250
em pouco tempo. Mas, a crise do subprime nos
Estados Unidos, que quase levou o sistema financeiro
global à falência, fez a commodity despencar em um
mês para menos de US$ 70.

O corte, à época, chegou a 60% e foi considerado um


ponto fora da curva. Um deslize tão forte parecia
impossível com o preço do barril de petróleo rondando
a casa dos US$ 20. Somente uma conjunção de fatores
poderia ocasionar algo parecido, como uma briga entre
produtores, excesso de produção e uma pandemia que
fizesse a procura ser reduzida da noite para o dia.
É isso o que vamos mostrar nas próximas páginas: o
que fez o petróleo ser vendido abaixo de zero
desencadeando uma nova crise.

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Um banho de
óleo negro

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A pandemia do coronavírus começava a se espalhar


pelo mundo quando dois dos principais países
produtores de petróleo resolveram medir forças e dar
início ao conflito mais traumático para a commodity
desde a Guerra do Golfo, no início dos anos 1990.
Arábia Saudita e Rússia – dois “petrorrivais” de longa
data – decidiram sentar em posições opostas na mesa
de negociação. Em vez de reduzir a produção para
atender ao apetite reduzido por petróleo, os sauditas e
os produtores aliados aumentaram a produção em um
conflito com Moscou, já que um acordo entre os russos
e a Opep sobre a redução da produção expirou.
Geralmente são os principais países produtores de
petróleo do mundo que entram em ação quando uma
grande queda nos preços deixa o mercado em crise.
Mas estes não são tempos normais, e a guerra do
petróleo parece longe do fim.

A pandemia, claro, desempenhou um papel crítico


nesse drama, mas também existem muitos conflitos
entre esses dois produtores e outra superpotência do
petróleo, os Estados Unidos, cuja crescente
importância como exportador de petróleo redefiniu a
indústria.

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Os analistas de estratégia de petróleo que


acompanham a Arábia Saudita disseram que a guerra
de preços com a Rússia foi desencadeada por
frustração pelo príncipe herdeiro Mohammed bin
Salman, o governante de fato do reino, com os russos
por não cumprir acordos anteriores de produção com o
objetivo de manter os preços altos. O príncipe herdeiro
Mohammed poderia estar procurando outros benefícios
também.

A longo prazo, o reino percebe que suas vastas


reservas de petróleo podem perder valor à medida que
a preocupação com a mudança climática se espalhar,
por isso deseja obter o máximo possível de suas
reservas para investir em outros setores.

O príncipe herdeiro também queria reduzir a


participação de mercado dos produtores de xisto dos
EUA, cujos custos de produção por barril são muito
maiores que os da Arábia Saudita.

É difícil ver como uma solução global pode ser


alcançada sem os Estados Unidos, agora uma das três
principais potências de petróleo. Os produtores
americanos e o governo Trump compartilham um
objetivo: equilibrar o mercado para estabilizar os
preços do petróleo e salvar o setor de uma onda de
falências e da potencial perda de mais de 100.000
empregos.

Mas há pouco campo em comum sobre como fazer isso


além do apoio da indústria ao pedido de Trump à
Arábia Saudita e à Rússia para reduzir a produção em
10 milhões de barris ou mais. Trump tem sido um
crítico da Opep e líder de torcida pelos preços mais
baixos da gasolina. Agora, diante de sugestões da
coordenação dos EUA com a Opep, ele sinalizou
resistência em forçar as empresas americanas a
abandonar a produção. Algumas empresas americanas,
no entanto, buscam alguma forma de coordenação.

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A Pioneer Natural Resources e a Parsley Energy, duas


empresas de petróleo de médio porte do Texas, pedem
à Texas Railroad Commission, o regulador estadual de
petróleo e gás, que imponha grandes cortes de
produção em todo o estado, que é de longe o maior
produtor dos EUA. A comissão planeja uma audiência
sobre os cortes propostos na terça-feira, 7, e uma
votação sobre a proposta uma semana depois, logo
após a Opep e seus países associados se reunirem.

Apenas um dos três comissários manifestou apoio à


medida, à qual a Exxon Mobil e outros grandes
produtores se opõem. “O setor está totalmente em
desacordo”, disse Scott Sheffield, executivo-chefe da
Pioneer Natural Resource.

“O setor está
totalmente em
desacordo”
Scott Sheffield

Mike Sommers, presidente do American Petroleum


Institute, principal grupo de lobby de empresas de
petróleo, disse que a indústria se opõe às tarifas do
petróleo saudita e russo – uma sugestão de alguns
republicanos no Congresso – como uma violação à livre
empresa e ao livre comércio.

Por outro lado, Sommers disse que o excesso atual era


“80% uma questão de demanda relacionada ao
coronavírus” e que a produção dos EUA diminuiria
naturalmente à medida que os produtores cortassem
investimentos em exploração e produção.

Mas os Estados Unidos, a Rússia e a Arábia Saudita


estão prontos para concordar? A abordagem incomum
evidencia a turbulência nos mercados.

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03

O petróleo
abaixo de US$ 0

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A segunda-feira 20 de abril de 2020 ficará marcada na


história como o dia em que o petróleo foi negociado
pela primeira vez abaixo de US$ 0. Uma série de fatores
contribuiu para que a commodity passasse por esse
momento, que deixou analistas atônitos e investidores
perplexos.

A crise desencadeada pelo coronavírus reduziu a


demanda mundial de petróleo. Simplesmente, o
consumo despencou praticamente um terço da noite
para o dia. A produção global, contudo, foi inicialmente
acelerada no fim de março por Arábia Saudita e Rússia.

No dia 12 abril, os dois países entraram em um acordo


para cortar a produção em 10 milhões de barris por dia,
ou 10% da produção mundial, a partir de maio. O
resultado disso é: excesso de petróleo e esgotamento
gradual da capacidade de armazená-lo.
Soma-se a essa relação distorcida entre oferta e
procura o vencimento dos contratos de maio do WTI no
mercado futuro. Os negociadores pagam preços
variados, dependendo do tipo de petróleo bruto, de
onde vem e a data em que ele deve ser entregue.

Normalmente essas diferenças são pequenas e passam


despercebidas fora do mercado de energia.
“A desconexão entre as bolsas de valores e a realidade
econômica foi baseada em um otimismo que
dificilmente será verdadeiro”, escreveu Joshua Mahony,
analista sênior de mercados do banco suíço IG em
relatório.

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Sem ter onde estocar o petróleo comprado, muitos


investidores preferiram pagar para devolver os barris
comprados, o que levou ao preço negativo. Houve um
descasamento entre o mercado “de papel” (da bolsa) e
o “físico” (armazenamento do produto).

“É claro que esse momento é histórico e não poderia


ilustrar melhor a utopia de preços em que o mercado
está desde março, quando toda a escala do problema
de excesso de oferta começou a se tornar evidente,
mas o mercado permaneceu inconsciente”, escreveu
Louise Dickson, do Rystad Energy, em uma nota
reproduzida pelo Washington Post. “Desde então, os
traders enviaram preços cada vez mais altos para
especulações, esperanças, tweets e desejos. Mas agora
a realidade está afundando.”

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Os produtores
em ação

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No início de abril, a Opep+ (Organização dos Países


Exportadores de Petróleo e seus aliados) costurou um
acordo para reduzir em 9,7 milhões de barris por dia a
produção de petróleo. Cerca de 15 dias depois, o
ministro da energia da Rússia, Alexander Novak, disse
que o corte na produção da Opep+ deve ser de 15
milhões a 20 milhões de barris por dia. As medidas
passaram a valer em 1º de maio e deve ter efeitos
concretos (mesmo que limitados) sobre os estoques.

“O mercado está iniciando o doloroso processo de


equilibrar a oferta com uma perspectiva de demanda
menor de cerca de 70 milhões de barris diários [barris
por dia]”, escreveu Reid Morrison, analista de energia
da PwC. “A situação econômica está travada sem uma
verdadeira clareza sobre o que está por vir, então não
há razão para esperar que a demanda aumente no
curto prazo”.

Esses esforços dificilmente farão com que o fenômeno


que ocorreu entre 17 e 20 de abril se repita. O petróleo
WTI para maio havia fechado a sexta-feira (17) cotado a
US$ 18,27 no mercado futuro. Na segunda-feira, o preço
do barril chegou a US$ 37,63 negativo, uma
desvalorização de US$ 55,90.

A negociação no campo negativo, contudo, foi restrita


ao contrato de maio, e, ainda que colabore para perdas
em outros contratos, não se reflete em cotações
abaixo de US$ 0 nos contratos mais líquidos. A agência
de classificação de risco Moody’s reafirmou que os
preços negativos foram uma anomalia. “O preço do WTI
que vimos era para o contrato futuro de maio que
vencia no dia seguinte e precisava ser entregue
fisicamente”, afirma Steve Wood, diretor administrativo
da Moody’s, que reforça dizendo que em um mercado
normal os contratos raramente são liquidados.

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05

WTI e Brent,
dois tipos
bastante
diferentes

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Ainda que a recessão econômica seja global, os


americanos sofrem mais por conta de uma
particularidade daquele mercado, em que predominam
os pequenos produtores de petróleo.

“O governo tem controle menor sobre eles, por isso é


mais difícil ajustar a produção à demanda. Em países
que têm grandes petroleiras, isso facilita um acordo”,
diz Patrícia Krause, economista da Coface para a
América Latina. “Com os estoques no máximo, chega
um ponto em que se paga para se livrar do excesso.
Não dá para jogar o petróleo no mar.”

“Não dá pra jogar


petróleo no mar”
Patrícia Krause

A economista assinala que o excesso de oferta naquele


país já vinha se desenhando nos meses anteriores à
explosão da pandemia. Os estoques cresceram 48% em
janeiro e fevereiro, por conta da demanda em queda.
Aqui cabe uma explicação sobre os tipos de petróleo,
que têm preços variados, dependendo do tipo de óleo
bruto, de onde vem e a data em que ele deve ser
entregue. O WTI, que é referência no mercado
americano. Negociado na Bolsa de Nova York, o West
Texas Intermediate que representa o produto extraído
no Golfo do México. Uma de suas principais
características é ser mais leve e fácil de ser refinado.

O petróleo WTI é comumente entregue em Cushing,


Oklahoma. Segundo a Agência de Informação
Energética dos Estados Unidos, as reservas de petróleo
no país subiram 19,25 milhões de barris na primeira
quinzena de abril. “A demanda era tão menor que a
oferta que as reservas atingiram entre 70% a 80% da
capacidade”, disse à AFP Jasper Lawler, do London
Capital Group. A Genscape, empresa de inteligência de

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mercado, informou que os estoques chegariam ao seu


limite máximo em maio.

Já o outro tipo é o Brent, que é o petróleo extraído do


Oriente Médio e do Mar do Norte e comercializado na
Bolsa de Londres. Esse é referência para o mercado
europeu e também para o brasileiro, pelas
características similares ao produto da Petrobras. Ao
contrário do WTI, esse óleo negro é mais pesado e por
isso o seu valor tende a ser menor.

“A Petrobras não é afetada diretamente porque tem


como referência o preço do óleo Brent, o que acaba
sendo uma blindagem”, afirma o analista Ilan Arbetman,
da Ativa Investimentos. “Por outro lado, a volatilidade
no preço do óleo WTI tira o ímpeto dos mercados
globais e isso repercute de alguma forma no Brasil.”

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Neste material:
e | investidor Jenne Andrade e Thiago Lasco
Reportagem

estadaoinvestidor Márcio Kroehn


Edição
einvestidor Priscila Soares
Design/Diagramação

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