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Para a condução desta aula, será necessário estar apropriado do conceito de mito da

democracia racial. Atribui-se à famosa obra de Gilberto Freyre, Casa grande e senzala,
publicada no ano de 1933, a quebra do estereótipo de que a mestiçagem era a grande causa do
atraso político, econômico e social brasileiro. Percebe-se inclusive que, no período pós-
Abolição e Proclamação da República, incentivava-se um branqueamento da população, por
meio das relações entre portugueses e negros. No entanto, Gilberto Freyre tenta romper com
este estigma racial e discriminatório, defendendo por meio de sua obra a mestiçagem da
população brasileira como algo positivo, que propiciou uma vivência pacífica entre as raças,
contribuindo assim para a diminuição das desigualdades sociais. Dentre outras palavras,
Gilberto Freyre apresentou na teoria um relato bem otimista com relação às relações raciais,
sugerindo a existência de uma democracia racial no Brasil, embora jamais tenha formulado o
conceito ou usado a expressão no livro.

No entanto o que se observou na prática foi que a teoria Freyriana contribui para divulgar um
Brasil tradicional que não admita a existência de preconceito e discriminação racial, uma
democracia racial. Foi o sociólogo Florestan Fernandes, na década de 1950, que passou a
contestar esta visão e a divulgar a imagem de um Brasil diferente da ideia de Gilberto Freyre,
ou seja, um país consciente das suas diferenças, carregado de racismo e desigualdade social,
desmascarando o “mito” da democracia racial brasileira, entendido aqui como um relato
fantasioso, uma lenda, algo que não possui comprovação.

Para se aprofundar sobre a discussão em torno do mito da democracia racial e da formação da


identidade nacional, indicamos as seguintes leituras:

BERNARDINO, Joaze. “Ação afirmativa e a rediscussão do mito da democracia racial no


Brasil”. Estud. afro-asiát., Rio de Janeiro, v. 24, n. 2, 2002.

COSTA, Sérgio. A mestiçagem e seus contrários: etnicidade e nacionalidade no Brasil


contemporâneo. Tempo soc., São Paulo, v. 13, n. 1, 2001.

FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime da
economia patriarcal. São Paulo: Global, 2006. FRY, Peter.
A persistência da raça. Ensaios antropológicos entre o Brasil e a África austral. Rio de
Janeiro, Civilização Brasileira, 2005.

FRY, Peter (Coord.). Divisões perigosas: políticas raciais no Brasil contemporâneo. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2007.

GOMES, Tiago de Melo. Afro-brasileiros e a construção da ideia de democracia racial nos


anos 1920. Linhas, vol. 8, n.1, Santa Catarina, 2007.

ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional. Brasília: Editora Brasiliense: 1985.

REIS, Fábio Wanderley. Mito e valor da democracia racial, in SOUZA, Jessé (org.).
Multiculturalismo e racismo: uma comparação Brasil – Estados Unidos. Brasília: Ed. Paralelo
15, pp. 221-232, 1997.

Objetivo
Desde meados do século XIX que inicia-se um movimento de construção de uma identidade
nacional brasileira, identidade esta que viria assegurar ao país uma imagem positiva diante
das nações europeias bem como proporcionar uma vivência interna pacífica entre os povos.
Dentro desta perspectiva, a discussão sobre raça assume um valor preponderante, exaltando as
contribuições das populações nativas para a formação da identidade brasileira. Por outro lado,
observa-se um incentivo ao “embranquecimento da população” e uma “europeização” dos
costumes, tendo em vista que enxergava-se na mestiçagem algo fundamentalmente negativo,
apenas podendo ser melhorada com um clareamento da sociedade.

Com a publicação do livro Casa grande e senzala, de Gilberto Freyre, em 1933, somada à
políticas governamentais iniciadas no governo Vargas que se perduraram até a instauração da
ditadura militar, começa a se desenhar uma nova solução para a questão racial no Brasil. Tal
compromisso consistiria na criação de condições infraestruturais que incorporassem a
população negra brasileira ao mercado de trabalho, ampliando a educação formal,
incentivando assim a quebra dos estereótipos do tempo da escravidão e do pós-Abolição. O
mito da democracia racial veio contribuir para amenizar um potencial conflito entre a
população branca e não branca, difundindo a falsa impressão de que os negros estariam
inseridos dentro da comunidade nacional, enquanto os antigos privilégios historicamente
construídos eram mantidos e continuavam mantendo a discriminação racial.

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