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MULHERES EM DISCURSO:

LUGARES DE ENUNCIAÇÃO E PROCESSOS DE SUBJETIVAÇÃO

Mónica Graciela ZOPPI FONTANA (UNICAMP / CNPq)


monzoppi@iel.unicamp.br mulheresdis@gmail.com
https://mulheresemdiscurso.wordpress.com/

Neste trabalho apresentamos o grupo de pesquisa Mulheres em Discurso (MulherDiS- CNPq,


processo 487140/2013-3), o qual tem por objetivo promover uma discussão sobre a produção e
interdição histórico-discursiva de lugares de enunciação para as mulheres, na sua relação
constitutiva com os processos de subjetivação/identificação do sujeito do discurso. Para isso,
considera-se a contradição de filiações de sentidos e memórias discursivas a partir das quais se
constroem as identificações, tanto de gênero, quanto outras historicamente entrelaçadas. A
problemática da mulher não é nova, porém a trazemos, aqui, vinculada à problemática mais
ampla do gênero e da produção de identificações de gênero na sua diversidade contemporânea, e
a compreendemos na sua relação constitutiva com os processos de interpelação ideológica e de
individuação que constituem o sujeito do discurso. Neste sentido, se coloca um desafio teórico
que é articular as identificações de gênero às identificações ideológicas que constituem a ilusão
subjetiva a partir da relação entre posições-sujeito e formações discursivas: que estatuto teórico
seria dado ao gênero nesse processo de constituição subjetiva? Que ordem de determinações
permite compreender a articulação das categorias de gênero, subjetividade, sexualidade e corpo?
Que discursos e que dispositivos intervêm para estabilizar sentidos e processos normalizadores
nessa articulação? Como se constituem novos sujeitos políticos em relação às identificações de
gênero? Por outro lado, os projetos desenvolvidos pelo grupo, que abordam práticas discursivas
de resistência e transformação, trazem para o debate as inflexões da relação entre teoria e prática
e, de forma mais atual e epistemologicamente mais instigante, a relação entre o lugar da
academia e o lugar dos movimentos sociais na produção de conhecimento legítimo para a
compreensão de praticas transformadoras da ordem social. Quem pode dizer (sobre), quem pode
interpretar, quem pode conceptualizar? A luta das mulheres negras, das mulheres indígenas, das
quilombolas, das transfeministas, da Marcha das Vadias, entre outras práticas atuais de
contestação da naturalização de lugares e representações sociais para a mulher na sua
diversidade de posições, coloca na arena a difícil questão da circulação do conhecimento e de
sua inscrição na prática política. Finalmente, a questão do corpo na sua materialidade e dos
processos discursivos que o interpretam se apresenta como mais um desafio teórico e de análise
instaurado pela problemática de gênero para os estudos discursivos. Neste sentido, as análises se
debruçam sobre: a estilização-exposição do corpo feminino na mídia audiovisual, em seriados e
publicidades; a questão da violência de gênero e da violência obstétrica que submete o corpo à
dominação física e simbólica; a exposição do corpo como prática de resistência em
manifestações de rua. No evento, discutiremos estes três grandes eixos de reflexão, sustentando
à discussão no quadro teórico a Análise Materialista do Discurso, considerando a contradição
constitutiva dos processos históricos e o equívoco que habita nas práticas discursivas.

Palavras-chave: feminismo; gênero; contradição ideológica; sujeito político; corporalidades;


processos de identificação.

São Carlos, Setembro de 2015


“NA HORA DE FAZER NÃO GRITOU”: PARTO E VIOLÊNCIA MÉDICA NOS
DISCURSOS FEMINISTAS CONTEMPORÂNEOS

Aline AZEVEDO BOCCHI (IEL/UNICAMP)


azevedo.aline@gmail.com

Examinamos, neste estudo, as categorias discursivas dos discursos feministas militantes


contemporâneos, problematizando particularmente o lugar do testemunho em discursividades
que se formulam como críticas às formas de assistência médica à mulher durante o parto, ou
seja, discursividades que textualizam a violência médica contra a mulher e que defendem uma
assistência respeitosa e “humanizada” no que concerne às técnicas de parturição no Brasil e no
mundo. A partir das considerações de Shoshana Felman (2014) Anette Wieviorka (1998) sobre
o testemunho como “prática social imperativa”, interrogamo-nos acerca da “eficácia social do
testemunho na construção do relato histórico e na constituição da memória coletiva”
(Wieviorka, 1998): a contemporaneidade como “Era do testemunho” impõe aos analistas de
discurso a problematização acerca das redes de memória e das relações de poder implicadas
nestes relatos que testemunham a experiência do sujeito. Tal prática discursiva de escritura de si
e do outro permite “narrar um outra história”: elas tornam públicas e “transformam
politicamente em público abusos que foram vividos como privados e ocultados pelos sujeitos
individuais traumatizados” (Felman, 2014, p.27). Questionamos, assim, os modos de
apropriação desses testemunhos de violência pelos discursos feministas militantes por meio de
uma abordagem discursiva (Pêcheux, 1975, 1980) que permite a análise e problematização de
discursos designados como feministas e textualizados na materialidade significante digital.
Interessa-nos observar os processos históricos de assujeitamento da mulher na formação social
contemporânea, à partir de reflexões acerca da eficácia ideológica dos lugares de enunciação
(Zoppi-Fontana, 2001) de sujeitos historicamente oprimidos. Nosso objetivo central está em
trabalhar discursos de militância que circulam nas redes digitais de sentidos, refletindo sobre
seu potencial de resistência e práxis política, o qual reside na crítica aos processos de
significação estabilizados na sociedade. As análises procuram mostrar como os testemunhos de
violência são (re)formulados e circulam nas redes digitais de sentidos à partir de um corpus
composto por recortes de blogs e de postagens no Facebook. Tais (re)formulações nos mostram
que, longe de se constituir como um campo de neutralidade, as palavras tem um potencial
transformador, e que a luta política é antes de mais nada uma luta pelas palavras.

Palavras-chave: discursos feministas; violência; parto.

São Carlos, Setembro de 2015


O CORPO DO•A•S BRASILEIRO•A•S: PROCESSOS DE IDENTIFICAÇÃO
INTERSECIONAIS NO DISCURSO DO TURISMO

Glória da R. ABREU FRANÇA, (UNICAMP/ PARIS 13)


gloria.franca@gmail.com

Concentro minha pesquisa de doutorado em torno de discursos do turismo, produzidos na


França e no Brasil, sobre o•a•s brasileiro•a•s. Meu objeto se constrói a partir de discursos de
identificação do•a•s brasileiro•a•s no discurso do turismo e trago a proposta de efetuar, a partir
de tais discursos, recortes em torno de processos de identificação “gendrados”, racializados e
que remetem a uma determinada memória da colonização. Trata-se, desse modo, de uma
proposta teórico-metodológica, que é fruto de reflexões realizadas no grupo Mulheres em
Discurso/CNPq, de analisar as diversas formas de designação da população brasileira, a partir
desse “olhar” que se posiciona no âmbito da análise do discurso materialista, e que, a esse
campo de estudo, propõe uma contribuição dos diversos estudos queer, de gênero e da
epistemologia interseccional (Butler 1997, 2004, Dorlin, 2008, 2009, Floyd, 2013). Como
exemplo de alguns enunciados sobre o país e sua população que podem ser problematizados
tem-se : “todas as cores do país, mestiço por excelência”, a “música que faz ondular o corpo”,
“tous les fantasmes des touristes est la belle mulata”, “Petit, gros, sexy, jeune ou vieux, le
Brésilien est rarement complexé”, “les superbes mulâtresses habillées de 10cm² de tissu dans les
sambas les plus folles”, “a cidade orgulha-se do sangue alemão de sua gente”, “ostenta a
influência italiana”, “heranças africanas, evidentes na culinária, na capoeira e nos tambores”.
Utilizar a teoria queer e/ou de gênero interseccional como um campo disciplinar contributivo à
teoria do discurso é uma tentativa de ampliar, ou ainda visibilizar, aspectos já presentes na
noção de interpelação do sujeito, que é central na análise do discurso materialista, esta noção me
parece poder ser enriquecida, ou aprofundada, para que assim seja possível dar conta de
aspectos do corpus sobre o qual trabalho, como, por exemplo, analisar as designações do Brasil
e do•a•s brasileiro•a•s que os identificam, em particular, a partir de atributos ligados ao corpo,
(gestos, dança, vestimenta, costumes, gênero, questões raciais, etc). Objetivo desse modo
melhor compreender a produção, a formulação e a circulação dos discursos “interseccionais”, ou
seja, “gendrados”, racializados e (post)coloniais que identificam e categorizam o •a•s
brasileiro•a•s.

Palavras-chave: interseccionalidade; brasileiro•a•s; turismo.

São Carlos, Setembro de 2015


POR UMA TOMADA DE POSIÇÃO FEMINISTA E ANTIRRACISTA NA ANÁLISE
DE DISCURSO

Mariana Jafet CESTARI (IEL/Unicamp)


marianajcestari@gmail.com

Em defesa da reflexividade e da práxis nas ciências humanas, o artigo propõe-se a


discutir elementos que embasem uma tomada de posição feminista e antirracista na Análise de
Discurso (AD), estabelecendo um diálogo contributivo com outras propostas epistemológicas,
em especial aquelas denominadas feministas negras (hooks, 1983; Gonzalez, 1984; Bairros,
1995; Collins, 2000; Cardoso, 2012). Para isso, parte das proposições de Pêcheux (1982) sobre
a divisão social do trabalho de leitura e os modos de administração, hierarquização e controle da
interpretação, bem como das formulações do autor (Pêcheux, 1983) sobre a explicitação da/o
analista do discurso como sujeito-leitor, assumindo efeitos de identificação como um gesto de
responsabilidade diante de interpretações sem margem. Esta tomada de posição emergiu como
um gesto politico e teórico no processo de análise das lutas empreendidas por mulheres negras
intelectuais/ativistas pelos sentidos das palavras para significar sua experiência, em
deslocamentos contingentes sob e contra a dominação ideológica, constituindo um lugar de
enunciação (categoria trabalhada por Zoppi-Fontana, 2002). As discussões empreendidas
perpassam os efeitos da exclusão de experiências e pontos de vista de grupos sociais na
academia e a divisão desigual do direito de enunciar neste âmbito de produção, legitimação e
circulação de discursos. Indagando o potencial transformador da reflexividade que se instaura
como efeito da identificação aos feminismos negros, dedico-me às implicações desta tomada de
posição para o(s) projeto(s), agenda(s) de pesquisa, modo(s) de produção de conhecimento na
AD diante de discursos classistas e racializados de gênero (o conjunto de discursos que
produzem e fazem circular imagens de gênero-raça-classe-sexualidade). Neste percurso, elenco
desafios epistemológicos impostos à AD pela complexidade do sujeito mulheres negras que
reivindica voz e visibilidade próprias, afirmando sua posição de sujeito da produção de
conhecimento e sujeito político. São eles: 1) questões éticas e políticas em torno de dizer sobre
o outro e pelo outro quando se analisam os discursos políticos que reivindicam um lugar de
dizer próprio; 2) constituição do corpus, considerando as práticas discursivas em uma
encruzilhada de memórias de sentidos e de materialidades da linguagem, de modo a romper com
critérios prévios sobre o que são práticas políticas; 3) teorização acerca do processo de
constituição do sujeito no/do discurso em uma sociedade com desigualdades sociais, raciais, de
gênero, histórico de expropriação colonial e séculos de escravidão, considerando as imbricações
de raça-gênero-classe-sexualidade nos processos de subjetivação.

Palavras-chave: Subjetivação; Feminismos Negros; Reflexividade.

São Carlos, Setembro de 2015


MARCHA DAS VADIAS: UM MOVIMENTO, A LÍNGUA, A HISTÓRIA.

Tyara VERIATO CHAVES (UNICAMP)


tyarajpb@hotmail.com

Tendo em vista o surgimento do movimento Marcha das Vadias em 2011 no Brasil e sua
filiação ao movimento SlutWalk no Canadá, que localiza sua origem nos dizeres de um agente
de polícia em Toronto ao afirmar que “women should avoid dressing like sluts in order not to be
victimized”, este trabalho se volta para as disputas de sentido que envolvem a presença das
mulheres no espaço público a partir da seguinte pergunta: como os sentidos de ‘vadia’ se
constituem no movimento Marcha das Vadias? Para tanto, propomos pensar a apropriação
militante da palavra ‘vadia’ buscando desenvolver uma reflexão sobre a textualização do
político tendo como trajeto de pesquisa três eixos: 1. Os modos de subjetivação no discurso
através da relação entre língua, sujeito e história; 2. A noção de acontecimento discursivo
(PÊCHEUX, 1983) em que buscaremos problematizar a tomada da palavra, o jogo entre falar e
‘ser falada’, de modo a apreender deslocamentos que produzem uma ruptura na memória sobre
a vadia 3. O funcionamento da memória discursiva nas relações históricas que significam as
mulheres no espaço público, bem como o processo de construção e legitimação do sujeito vadia
social e politicamente na Marcha. No intuito de percorrer tais trajetos de sentido, situamo-nos
no horizonte teórico da Análise do Discurso materialista proposta por Michel Pêcheux, que
considera a constituição ideológica dos sentidos instaurando um campo de reflexão que leva em
conta as relações entre a realidade histórica, a materialidade da língua e a existência do sujeito.
Ao mesmo tempo, promovemos diálogos com campos do saber que giram em torno da
incorporação da categoria gênero, problematizando a sexualização da experiência humana no
discurso, a exemplo da História das Mulheres e dos Estudos de Gênero. (Mulheres em Discurso
- CNPq, 487140/2013-3).

Palavras-chave: Análise do discurso; acontecimento discursivo; Marcha das Vadias; mulheres;


espaço público.

São Carlos, Setembro de 2015

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