Você está na página 1de 2

NOTA DE REPÚDIO

A Comissão de Direitos das Mulheres no Jiu-Jitsu (CDMJJ) vem a público expressar


o seu mais profundo repúdio a toda e qualquer manifestação de objetificação do corpo
feminino e estímulo à “cultura do estupro” no jiu-jitsu. Lutamos muito e todos os dias para
sermos respeitadas no tatame, tanto como profissionais quanto como praticantes.
Recebemos rotineiramente denúncias de mulheres sendo assediadas, estupradas,
violentadas, desrespeitadas, oprimidas e discriminadas, e vídeos como o gravado pelo MC
Hzim só corroboram para a “cultura de estupro” que existe em nossa sociedade, refletindo
diretamente no aumento de violências que as mulheres lutadoras de jiu-jitsu sofrem.

O vídeo em questão chama-se “FAIXA ROSA”, e já de início estimula o estereótipo de


uma postura feminina no tatame que não pode existir. Não existe faixa rosa no jiu-jitsu, e
as mulheres não treinam de maquiagem e de cabelo solto, muito menos de piercing. Saímos
das aulas muito suadas, sujas, com os cabelos desarrumados, e não existe romantismo,
muito menos sexualização, nos treinos de jiu-jitsu. Queremos ser elogiadas por nossa
técnica e não pela nossa imagem!

Estamos no tatame para treinar, não para flertar ou ser assediada. Uma pesquisa
feita na comunidade do jiu-jitsu demonstrou que 61% das entrevistadas já sofreram assédio
sexual no nosso esporte, onde 34,1% disseram ter sofrido assédio diretamente do
PROFESSOR! A CDMJJ, por inúmeras vezes, já divulgou na mídia denúncias de mulheres
que sofreram violências diversas no tatame e cenas como essas do clipe são gatilhos para
essas vítimas.

A TOLERÂNCIA ZERO precisa ser incentivada nas academias e cenas como essas
do clipe não podem ser normalizadas. Professores e líderes de equipes precisam ser rígidos
quanto à promoção do respeito no tatame. Aceitar que vídeos como este sejam gravados
em seu espaço é assegurar que em seu ambiente não existe respeito, o que o torna um
ambiente hostil e inseguro para as mulheres.

Apesar da liberdade artística ser assegurada constitucionalmente pelo artigo 5º, IX,
o qual garante ser “livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de
comunicação, independentemente de censura ou licença”, a liberdade artística precisa
respeitar limites para que a própria dignidade da pessoa humana seja respeitada.

Dentre outras restrições, a liberdade artística não pode ofender a honra ou a imagem
de terceiros. Restou evidente no vídeo que a honra e a imagem das mulheres praticantes
de jiu-jitsu foram ofendidas, haja vista a objetificação da mulher, a sensualização da
praticante descabida com a modalidade e as cenas de luta com conotação sexual,
elementos este que, além de estimular a sua absurda recorrência na realidade, também
podem servir de gatilho para inúmeras lutadoras que foram violentadas sexualmente no
ambiente da academia ou fora dele, por professores ou outros praticantes.

Só haverá redução dos casos de estupro e assédio no jiu-jitsu quando as


objetificações sexuais das mulheres no tatame acabarem. Quando a mulher é sexualizada
no esporte, demonstra uma imagem de que elas estão sempre ao dispor do homem, e que
ele tem o direito de a tocar — a chamada “cultura de estupro”. Precisamos enfrentar a
misoginia e o machismo com a coibição de veículos de informação que promovam essa
“cultura do estupro”.

Solicitamos encarecidamente aos envolvidos na produção e divulgação do clipe que


o apaguem e pedimos também que seja realizada uma retratação pública com a
comunidade do jiu-jitsu feminino, veiculada pelos mesmos instrumentos utilizados para
promover a mídia. Não vamos tolerar que NINGUÉM desrespeite a mulher lutadora de jiu-
jitsu!

Rio de Janeiro, 07 de setembro de 2021.

Luciana Neder
Fundadora e Presidente da CDMJJ

Você também pode gostar