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Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 2

SIGLAS E ABREVIATURAS

A.H.A = Associação dos Hospitais Americanos

C.E.E = Conferência Episcopal Espanhola

CEECEDA = Conferência Episcopal Espanhola


Comissão Episcopal para a Defesa da Vida
C.P = Código Penal

C.P.E/P = Código Penal Espanhol/Português

C.P.C.E.A = Conselho Permanente da Conferência Episcopal


Alemã

DMD = Associação que nasceu em Espanha, em 1984, e


que significa «Direito a Morrer Dignamente»

E. = Eutanásia

E.U.A = Estados Unidos da América

EV = Encíclica “ Evangelium Vitae “ do Papa João


Paulo II. Exortação, à postura dos médicos frente a
um novo ramo da medicina e a uma nova
especialidade - Medicina de Acompanhamento

F.I.A.M.C = Federação Internacional das Assistências


Médicas Católicas

SEA = Associação que nasceu nos Estados Unidos, em


1938
«Sociedade da Eutanásia da América»

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Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 3

ABREVIATURAS DIVERSAS

AA. VV. Autores Vários

art. artigo

BAC Biblioteca de Autores Cristianos

cap. capitulo

cf. confira, conforme

ed. edição, editorial

(ed.) editor (refere-se mais concretamente a um autor)

nº número

OP Abreviatura de: Ordem dos Pregadores,

congregação religiosa vulgarmente conhecida por

Dominicanos

p. pp. página, páginas

séc. século

SP São Paulo

SPx São Pio X

[s.n.] sem nome

vol. volume

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APRESENTAÇÃO

Tudo tem o seu tempo

3 1“ Para tudo há um momento e


um tempo para cada coisa que
se deseja debaixo do céu:
2
tempo para nascer
e tempo para morrer,
tempo para plantar
e tempo para arrancar o plantio,
3
tempo para matar
e tempo para curar,
tempo para destruir
e tempo para edificar, ... “

Eclesiastes ( 3, 1-3 )

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INTRODUÇÃO

Ao iniciar este meu trabalho, não é minha intenção explicitar tudo o


que diz respeito à Eutanásia e a tudo o que à volta dela anda ligado, até
porque detrás disso tudo está o homem que é um eterno desconhecido.
Procuro antes mostrar ao leitor a evolução que o tema deste trabalho teve ao
longo dos tempos e da história.
Este trabalho divide-se em três partes ou capítulos:
No primeiro será tratado o problema da Distanásia e da Ortotanásia;
no segundo deixar-nos-emos conduzir pelo que diz a história universal da
Eutanásia, sem deixar de referir as suas espécies mais faladas e conhecidas,
por assim dizer; por último, no terceiro debruçar-nos-emos de um modo geral
e sintético aos aspectos de âmbito: social, ético, medicinal, legal e religioso.
Sobre a Eutanásia, a palavra grega diz “boa-morte”, hoje em dia, ela é
entendida como, provocar a morte directa e deliberadamente aos doentes, por
compaixão e a fim de lhe aliviar os sofrimentos.
Hoje em dia proclama-se tanto os direitos fundamentais da pessoa,
entre os quais refulge o direito à vida, luta-se desesperadamente contra a
morte e contra o cancro, condena-se à morte ou à pena perpétua quem mata, e,
contudo, generalizam-se os métodos anticonceptivos mesmo abortivos,
legaliza-se o aborto, defende-se a eutanásia de crianças anormais, de
incuráveis, de doentes mentais ou de velhos.

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Falando de eutanásia, vamos aludir também à distanásia, (não deixar


morrer) ou prolongamento de qualquer tipo de vida a qualquer preço, e à
ortotanásia, ou o direito a morrer com dignidade.
Ao longo dos tempos falou-se em eutanásia, ainda que o termo variasse
de autor para autor, importava mais saber o que se queria dizer com uma
expressão concreta.
Pretende-se com o último capítulo, acima de tudo, com vários aspectos
que vão ser apontados, dizer sobretudo o essencial que as várias posições e
pontos de vista dizem: como este ou aquele aspecto reage ao tema; se se
verificava um progresso ou um retrossesso; se há uma mudança significativa
em relação ao que se pretende. É verdade, que nos vão aparecer com certeza,
várias opiniões e resultados, uns positivos e outros negativos, uns que nos dão
ânimo e incentivo, outros que nos deixarão desiludidos e com vontade de
desistir. Mas na sua maioria a opinião é unânime: a vida de cada ser humano
deve ser respeitada, assim como a sua liberdade, a sua dignidade, a sua
decisão e sobretudo, os seus direitos.
Uma coisa temos de admitir, o homem precisa da medicina, mas a
medicina não pode ter a pretensão de dominar o homem.
Que todos nós, cristãos, possamos olhar com admiração o progresso,
que em alguns campos se tem vindo a verificar, como por exemplo, no campo
das descobertas e inovações da medicina. E, partindo delas, em tudo o mais,
possamos ver a gloriosa criação de Deus.

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CAPÍTULO I

1  A MORTE HUMANA E O PROLONGAMENTO DA VIDA

1.1 - O Direito a Morrer com Dignidade ( Ortotanásia )

O termo utilizado para designar o direito a morrer com dignidade é


Ortotanásia.
Este termo vem de dois vocábulos gregos («orthos», recto, e
«thánatos», morte) e que em sentido literal, significa a actuação correcta
perante a morte, ou melhor, desejar que alguém morra em paz. Esta estaria tão
afastada da eutanásia, no sentido aqui apontado, como da distanásia. É um
termo que não se utiliza muito nas nossas sociedades; mas o facto de ter sido
criado, mostra a necessidade de recorrer a uma palavra diferente de
«Eutanásia» para designar precisamente a “boa morte”.
O termo Ortotanásia supõe que a vida seja respeitada acima de tudo,
por um lado, e, por outro, o mesmo direito que essa pessoa e essa vida têm a
morrer com dignidade e sem sofrimento.
Esta palavra foi utilizada pela primeira vez, segundo consta, por
Boskan, em 1950.
Primeiro este morrer enquanto «acção humana» e mais actualmente
com a expressão «morrer com dignidade», adquire outros sinónimos, tais
como: «morte digna do homem; morrer humanamente; direito à própria

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agonia; morrer serenamente; morte à antiga; morte ideal, etc»1. Todas estas
expressões se resumem à já referida Ortotanásia.
A expressão «direito a morrer» aparece pela primeira vez na
«Declaração dos direitos do enfermo», editado em 1973 pela Associação dos
Hospitais Americanos (A.H.A).
Contudo, esta expressão não deve ser entendida como um direito da
eutanásia, mas entendê-la de um modo mais racional, é o que se pretende.
Agora que, de um modo geral, definimos a palavraOrtotanásia, vamo-
2
nos debruçar, ainda que de maneira reduzida, sobre as exigências e
argumentos 3 que nos são dados, do direito a morrer com dignadade.
As exigências, são feitas acima de tudo, pela sociedade,que
resumidamente apontamos:

1. Pôr ao serviço do doente todos os meios disponíveis pela medicina,


com a intenção de lhe diminuir a dor e prolongar a vida.
2. Não tirar ao doente a possibilidade de morrer como «acção pessoal» :
já que este está destinado a ela.
3. Não esconder a morte, o que acontece na sociedade de hoje: visto
que esta se pratica na clandestinidade.
4. Ter um serviço hospitalar adequado para que a morte se torne num
acontecimento consciente; ao mesmo tempo favorecer uma assistência e uma
vivência humano-religiosa da morte.

1
- VIDAL, Marciano - “Bioética: Estudios de Bioética racional”. Tecnos, cap. IV, p. 76.
2
- Nota: Resumo das exigências, por palavras minhas, cf. VIDAL - “Bioética :…”, p. 77.
3
- Nota: Sintese de alguns argumentos, que têm para nós um relevo especial, cf. Fr.
BERNARDO, O.P - “Bioética e Saúde”. Porto: [s.n], 1992. pp. 366-368.

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5. No que diz respeito ao «direito a morrer com dignidade» deve-se pôr


ao serviço do doente todos os meios possíveis para lhe aliviar a dor; ainda que
não se deva privar o doente de assumir a sua morte com dignidade.

Mais exigências se poderiam apontar, mas julgo que estas serão as mais
decisivas, de mais importância e que merecem um maior relevo da nossa
parte.
Até aqui falamos das exigências da Ortotanásia, agora vamos referir-
nos um pouco aos argumentos que estão a favor e que a fundamentam:

I. A vida humana é indisponível e é um Dom que Deus nos deu, logo


cada pessoa tem um dever para com ela (vida), salvaguardá-la de tudo o que a
possa tirar. Tanto a vida como a morte têm dimensões do âmbito: ontológico,
social, cultural e religioso. Cada um tem uma humanidade exclusiva e
irrepetível, por isso, deve aceitar quer os limites, quer os fracassos, porque
morrer é uma imposição á vida.
Do ponto de vista ético, a vida é um bem a conservar, por isso, não
deve ser eliminada.
II. A todo o ser humano foi-lhe dada a vida para ser feliz, livre e
responsável por ela. A sua liberdade psicológica, consiste em que, a pessoa se
torne consciente pelos seus actos, orientando as suas opções acerca dos fins e
dos meios a eles caducentes, nos limites impostos pelas circunstãncias da
vida.
III. Enquanto cada uma (pessoa), for capaz de pensar por si e ter
decisões livres e conscientes, deve ser respeitada. Mas para que isso seja
respeitado, temos que atender a uma responsabilidade mútua e recíproca, para

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isso, há que ter em conta certos códigos éticos, que servem de setas
orientadoras:
 «O médico deve recordar-se sempre da obrigação de preservar
a vida humana desde o momento da concepção» 4.
 «O doente tem direito de aceitar ou recusar determinado
tratamento após ter recebido informação adequada»
 «O doente tem direito a morrer com dignidade» 5.
IV. Quando um doente se confia a uma Equipa de Saúde, ou outra
identidade médica, faz como que um acordo, da qual constam entre outros, os
seguintes aspectos:
 Tem o direito e o dever de exigir que o tratem com todo o
respeito, dignidade, dedicação, além de o manterem informado dos
diagnósticos e prognósticos.
 Em casos de mais urgência, o doente ou a pessoa responsável
por ele, deve ser informada de possíveis recursos urgentes e suas
consequências.
 A partir do momento em que o doente fica ao cuidado de uma
Equipa Médica, esta tem a obrigação de zelar pela cura e recuperação do
mesmo, o mais rápido possivel. Contudo, pode e deve aliviar a dor, mas
sempre tendo em grau superior a vontade do doente, sabendo este o que se
passa.
 Todos os meios possiveis deverão ser utilizados enquanto se
pensar que é possivel a recuperação da integridade da pessoa, da sua
4
- Nº 7 do Código Internacional de Ética Médica - Sidney – 1968, in Fr. BERNARDO, O.P -
“Bioética e Saúde”. Porto: [s.n], 1992. p. 367.
5
- Alínea c) e e) da Declaração dos Direitos do Doente – 1981, in Fr. BERNARDO - “Bioética
…”, p. 367.
5

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consciência e liberdade, e que isso irá prolongar a sua vida e dar-lhe o devido
valor.

Resumindo aquilo que foi dito atrás, a Ortotanásia, devería significar a


meu ver, o uso racional dos meios humanos e técnicos para ajudar a pessoa no
termo da sua vida a assumir com dignidade e a possivel liberdade, os seus
limites e fim do ciclo biológico.

1.2 - Prolongar a vida (Distanásia), ou aliviar o sofrimento?

Prolongar a vida consciente e livre, é um dever de todos; prolongar o


sofrimento insignificante não faz sentido, é uma inútil desumanidade.
Do ponto de vista ético, tanto a Distanásia como a Eutanásia (será
desenvolvida no Cap. II), são comportamentos reprováveis, pois representam
dois tipos de manipulação que ultimamente reduzem a pessoa a objecto.
Mas, afinal o que se entende por Distanásia ? 6
Este termo vem de dois vocábulos gregos («dis», mal, algo mal feito, e
«thánatos», morte) e etimológicamente significa precisamente o contrário de
eutanásia. Consiste em atrasar o mais possivel o momento da morte, por todos
os meios possiveis, ainda que alguns deles sejam difíceis e custosos, e fossem
até provocar ainda mais dor ao doente, mas como se diz no velho ditado:
«Enquanto à vida, à esperança».

6
- AA. VV. - “Ética e Vida: Desafios actuales” , Ediciones Paulinas, nº 1, cap. XI, p. 223; Fr.
BERNARDO, O.P. - “Bioética e Saúde”, Porto: [s.n.],1992. P. 373; BLÁSQUEZ, N. - “Bioética
Fundamental”, BAC. Cap. XI, p. 516.

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Ainda assim, podemos falar de distanásia em dois sentidos: Num


sentido mais amplo e geral, e, num sentido mais estrito.
No primeiro fala-se de um modo amplo, em «deixar morrer» o doente,
como um modo mais recompensável, afastando qualquer meio ou tratamento
medicinal que possa provocar ainda mais sofrimento ao doente. No segundo,
é muito em parte, o contrário. Tenta-se prolongar a vida do doente a todo o
custo, pelos meios técnicos mais modernos, como seja a reanimação e a
prolongação artificial das constantes biológicas.
Acima fez-se referência a certas situações distanásicas. Agora tentarei,
de um modo particular, expôr mais concretamente essas situações:

A) Vidas mantidas mediante técnicas de reanimação

No que respeita a este ponto, podemos falar de várias situações: por


exemplo, a «morte clínica» (morte irreversível do cortéx cerebral) onde não
tem sentido, prolongar a vida desse paciente, que apenas ficou reduzido à
função vegetativa; quando não se dá o caso acima referido, mas outros, onde a
única maneira de prolongar a vida é por esta técnica, e onde os doentes ficam
reduzidos de qualquer maneira à vitalidade vegetativa.
Nestas situações, não só não é imoral, como é aconselhado suspender
tal tratamento.
No que se refere a isto, citemos a opinião do Papa Pio XII, em 1957:

«Se é evidente que a tentativa de reanimação constitui, na realidade,


para a família um tal peso que não só se pode em consciência impôr,

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ela pode insistir lícitamente para que o médico interrompa os seus


intentos, e o médico pode condescender lícitamente com este pedido.
Não há neste caso nenhuma disposição directa da vida do paciente,
nem eutanásia, a qual não sería lícita»7.

Por seu lado o cardeal Villot, secretário do Estado, numa carta que
escreveu em nome do Papa e que dirigiu ao secretário geral da F.I.A.M.C. em
1970 diz:

«Em muitos casos, não seria uma tortura inútil impôr a reanimação
vegetativa na última fase de uma doença incurável? O dever do
médico consiste mais em fazer o possível por abrandar a dor em vez
de alargar o maior tempo possível, com qualquer meio e em qualquer
condição, uma vida que já não é de todo humana e que se dirige
naturalmente para o seu fim».

B) Situações em que o «deixar morrer» é recomendável

Temos ainda a consciência de que há algumas situações em que os


responsáveis pelos pacientes não têm a obrigação de lhes aumentar uma vida,
já sem sentido, e nas quais se pode deixar morrer o paciente.

«O direito a uma morte humana não deve significar que se busquem


todos os meios à disposição da medicina, mas com eles se obtém
como único resultado o de retardamento artificial da morte. Isto
7
- ASS, 49 (1957), p. 1030, in VIDAL, M. - “Bioética: Estudios de Bioética racional“, Tecnos,
cap. VI, p. 81.

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refere-se ao caso em que, por uma intervenção de carácter médico,


uma operação, por exemplo, a vida se prolonga realmente pouco e
com duros sofrimentos, até ao ponto que o enfermo, num breve
período da sua própria vida, se encontre submetido, a pesar da
operação ou justamente como resultado da mesma, a graves
transtornos físicos ou psicológicos [ …]. Se o paciente, seus parentes
e o médico, depois de haver superado todas as circunstâncias,
renunciam ao emprego da medicina e de medidas excepcionais, não
se lhes pode tirar e atribuir um direito lícito a dispôr da vida
humana»8.

Este texto refere-se mais explicitamente, ao caso chamado «doentes


terminais». De qualquer maneira deve-se alertar e chamar à atenção para a
diferença que há entre «deixar morrer» e «fazer morrer». Esta última
identificar-se-á mais com a eutanásia.

8
- Conselho Permanente da Conferência Episcopal Alemã (1974), Ecclesia, 25 (1975), pp. 1239-
1240, in VIDAL, M. - “Bioética …”, pp. 81-82.

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CAPÍTULO II

« Por eutanásia em sentido verdadeiro e próprio


se deve entender uma acção ou uma omissão que
por sua natureza e na intenção, causa a morte,
com o fim de eliminar qualquer dor »

João Paulo II (EV 65)

2  HISTÓRIA DA PALAVRA EUTANÁSIA

Antes de entrar propriamente no que se pretende expôr neste capítulo -


A História da Eutanásia, e, em jeito de introdução, dar uma definição de
eutanásia.
A palavra vem do grego, eu = boa, e thánatos = morte; que significa
boa morte, morte sem dor, morte sem angústia.

« Significa, etimológicamente, a morte fácil, sem dor, sem sofrimento.


Na linguagem corrente, corresponde a assassínio por piedade, a morte
agradecida. Consistíria na morte determinada e provocada pelo médico
assistente do doente portador de doença crónica, incurável, de prognóstico

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indiscutivelmente fatal e dolorosa, mas pressupondo sempre o consentimento


do próprio doente ou da fam … » 9.

2.1 - Da Antiguidade até aos nossos dias … 10

Na Antiguidade …

Nem sempre a palavra Eutanásia teve um significado exacto, mas o seu


conhecimento, ainda que por vezes indirecto, vem já desde há muitos séculos
atrás, como iremos ver.
Na Antiguidade, o termo Eutanásia significava, morte suave sem
sofrimentos extremos.
Mas para que nos possamos situar melhor na História, vamos dividir
esta realidade (eutanásia) em periodos e usos que lhe foram dando. Assim
temos fundamentalmente, três periodos ou usos distintos: 1º Uso inicial (1º
periodo), também chamada época grecoromana; 2º Uso ascético-religioso,
dentro do cristianismo e mais propriamente, desde a Idade Média até ao
Renascimento; 3º Uso do primeiro médico, mais conhecido como o periodo
que vai desde o Renascimento, sobretudo a partir do século XVI-XVII.

9
- Cf. LOGOS - Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, Verbo, p. 7.
10
- AA. VV. - “Eutanásia“ , C.E.E.C.E.D.A . Lisboa: Ed. S. Paulo, 1994. nº 17. p. 7/11-12; AA.
VV. - “Ética y Vida: Desafios Actuales” , Ed. Paulinas. nº 1. cap. XI. p. 223; PINTO, J. R. da
Costa, S. J. - “Questões Actuais e Ética Médica” , Braga: Editorial A.G., 3ª Ed. p. 283;
BLÁSQUEZ, N. - “Bioética Funadamental” , BAC. cap. XI. pp. 515-516/519; BLÁSQUEZ, F.
Javier; RUÍZ - “Perfiles ético-políticos de la sociedade Actual” , Editorial Verbo Divino, 1992.
cap. VI. p. 127-129; ALBURQUERQUE, E . - “Bioética: una opuesta por la vida” , Madrid:
Editorial CCS, 1997. cap. XIII. pp. 188-192; VIDAL, M. - “Bioética: Estudios de Bioética
racional” , Tecnos. cap. V. pp. 62-71.

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1º Pela história sabemos que se praticava em muitas culturas, por


razões e motivos diferentes. Neste sentido era possivel remontar até ao Antigo
Egipto, à grécia ou a Roma.
O primeiro que nos diz algo acerca disto é Hipócrates, pelo séc. V. Este
médico afirmou o seguinte:

«Jamais darei a alguém qualquer medicamento mortal, mesmo que muito


mo peçam».

Um século mais tarde, Platão e Aristóteles, dois filósofos bem nossos


conhecidos da filosofia, admitem a prática da Eutanásia.
Platão, que na sua obra a «República » e ao descrever o estado ideal,
mostrou outra realidade talvez mais desconhecida:

«Desejar-se-á morrer a quem não seja são de corpo»

Entre os romanos, o pensamento era idêntico, senão vejamos: Por


exemplo Epícuro, baseando esta prática num suporte racional baseado na
filosofia, dízia que a vida serve para buscar prazer, logo que a vida deixe de
ter tal sentido, então é melhor pôr fim a ela; entre os estóicos romanos,
Séneca, Epíceto e Marco Aurélio, passava-se o mesmo. Séneca, como já foi
dito, sendo representante do estoicismo,defendia que tem lógica e é razoável
pôr fim à vida para não sofrer.
Como a História ía evoluindo, também o conceito ía evoluindo
parcialmente com as mentalidades. Assim na Idade Média, com Averróis,
aparece uma nova explicação: Aludindo a imagem do corpo humano à

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sociedade, ele diz, que como é legítimo cortar uma perna doente, também um
corpo doente se torna inútil e por isso se deve pôr fim.
2º No que aqui diz respeito, podemos começar por dizer que, Deus é
Deus da vida e da morte, logo, o cristianismo ao ter contacto com povos da
antiguidade, transmitía-lhes a sua cultura e religião, estes ensinamentos,
trocavam-lhe completamente o sentido que eles tinham da vida e da morte.
Nos povos judeus e Islâmicos, domina o lema : ‘ A vida é de Deus, quem
intentar contra ela, desobedece à ordem de existência, que nos foi dada por
Ele ‘.
Só pelo que dissemos é possivel compreender porque no mundo
cristianizado, durante alguns séculos não se ouviu falar de Eutanásia.
Para eles a agonia e o sofrimento do paciente, são uma imitação de
Cristo, que unido a Ele se purifica para a outra vida. Por isso não é permitido
por nenhuma razão, quer ela seja directa ou indirecta, mudar o rumo e a vida
do doente.
Assim sendo, a E. (ou morrer bem, sem dor) é uma entrega sem
condições, uma aceitação e um oferecimento, à semelhança de Cristo na cruz.
3º É no periodo do renascimento que nós iremos encontrar as figuras,
talvez mais decisivas da história da E.; que esta irá ter um uso e uma prática
nova. Ela será, como que o último recurso da saúde e da vida do homem.
Sendo a morte o último passo da vida, merece o respeito de todos e ajuda com
os meios possiveis.
À medida que vai evoluindo o conceito de E., terá que se advertir na
sua elaboração, humanistas, médicos e físicos, que nos sécs. XVI-XVII,
andavam preocupados com o novo tipo de ciência e um novo conceito do
homem.

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Podemos perceber por aqui que, primeiro, neste periodo não é tanto a
palavra como o conceito que estão em causa e segundo, usam-se aqui sentidos
e práticas distintas, não só na palavra, como no conceito. Isso o veremos a
seguir.
Neste periodo aparecem 3 figuras que deram um importante contributo
ao termo E..
O primeiro deles é Ambroise Paré (1509-1590), que admite um limite
para a intervenção do médico. «Nós tratamos das curas, mas só Deus é dono
da vida e da morte, da cura e da agonia, da angústia e da serenidade».
Outro é Francis Bacon, que avançou um pouco mais, ele que é
considerado o pai da ciência experimental. Nas suas obras “Novum Organum
” e “Nueva Atlantis ”, dá-nos distintas aproximações do conceito de E..
«Compete ao médico proporcionar a saúde e suavizar as penas e as dores,
não somente quando esse suavizamento pode levar à cura, mas também
quando pode servir para procurar uma morte tranquila e fácil». Houve quem
dissesse que ele seria o criador da palavra em sentido médico moderno, o que
não é verdade, pois esta palavra não aparece no texto latino.
Por último aparece Tomás Moro, deste, parece aparecer na verdade o
termo E. em toda a sua extensão e implicações.
Na obra “Utopia de Moro ” e no livro “Diálogo do Consolo ”,
encontramos já o conceito médico e moral da E..
Este último que é tido como o primeiro documento que centra o tema
dentro dos limites da medicina, da moral e da pessoa humana.

… até aos nossos dias

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Nos séculos XIX e XX, já não se pensa tanto no significado originário


do termo, mas, mais na maneira como a medicina pode actuar para aliviar a
dor e atenuar a angústia.
Agora é mais vista nestes séculos, como um ponto de confrontação
entre os vários pontos de vista: médico, ético, jurídico e social, assim se torna
novamente ambíguo, tanto o termo como a realidade.
Um filósofo contemporâneo, F. Nietzsche diz que a E. se deve
empregar para «os parasitas da sociedade, para esses enfermos, a quem nem
sequer convém mais viver mais tempo, pois vivem indignamente». Esta sua
maneira de pôr o problema, vai influenciar grandes discussões, mais tarde,
sobre o tema.
Hoje, contudo, a palavra adquiriu uma conotação negativa, sobretudo
desde que K. Binding e A. Hoche propuseram, sob o nome de E., a liquidação
planeada de pessoas inúteis, social e económicamente, como por exemplo:
doentes mentais e inválidos. Também no nosso tempo poderíamos falar ainda
em Hitler e da « eutanásia eugenésica », que ele estabeleceu em 1939, mas
como aqui íamos entrar dentro de outros campos, que não aqueles que nos
interessam tanto, vamos passar à frente.
Actualmente, e pondo as minhas palavras, no que muitos autores do
nosso tempo disseram e pensaram, dizemos que a E. em sentido estricto, quer
dizer, provocar directa e deliberadamente, a morte do doente por compaixão e
acabar com sofrimentos extremos, ou evitar que a, pessoas deficientes,
crianças anormais ou doentes incuráveis, se lhes prolonge uma vida que íria
ser penosa para elas e angustiante para quem toma conta deles.
Entende-se ainda o mesmo conceito de outra forma: sendo uma acção
ou omissão que, por sua natureza ou nas intenções, leva á morte com o intuito

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de aliviar o sofrimento. Assim sendo a E., encontra-se ao nível das intenções


e ao nível dos métodos empregados.
Para finalizar, poderíamos dizer ainda; mesmo que nas diversas épocas
o termo não fosse igual de autor para autor, o mais importante é saber o que
se queria dizer com uma expressão concreta. Mesmo assim, com tanta
diversidade, não se acaba aqui a coincidência nos pontos fulcrais e
fundamentais. Para que se saiba, nos dias de hoje, a E. ainda é considerada
ilegal em todo o mundo civilizado, ou pelo menos na sua maioria.

2.2 - Espécies de Eutanásia

Sendo a E. um termo que desde sempre se mostrou ambígua e gerou até


à actualidade, e ainda continua a gerar, uma certa confusão e reflexão. Deste
modo, para se falar em espécies de E., teremos que ter em conta, o critério
utilizado ou que se aplica, bem como o significado que se dá ao termo.
Não me vou alargar muito neste ponto e neste tema, visto que, a sua
importância não é tão acentuada como os outros temas. Também, podería cair
no erro de cometer falhas ao tentar explicar, ou obscurecer aquilo que parece
claro.
Desse modo, vou falar das várias espécies, de modo muito sintético,
fazendo apenas referência às mais utilizadas, e partindo de dois pontos de
vista: da parte de quem a pede, ou seja da vítima; e de quem a pratica, por ex.
um médico ou um enfermeiro.

Entre as espécies mais divulgadas e conhecidas, apresentamos estas:

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Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 23

 E. Voluntária
 E. Involuntária
 Agónica
 Perinatal
 Psíquica
 Social ou eugenésica
 Lenitiva
 E. Activa e Passiva
 E. Negativa e Positiva
 E. Directa e Indirecta
 Ampliação, Reanimação, Distanásia, etc.

Há quem junte a estes a Auto-Eutanásia, referindo-se ao suicídio, mas


na verdade, isto não se pode considerar uma forma de E.
A E. voluntária ou involuntária: se esta é pedida por quem lhe dá a
morte ou não; A E. agónica e lenitiva: estas são entendidas, como ajuda a
morrer sem dor e agonia, ou se interrompe a vida em fase terminal. A E.
perinatal, psíquica e social ou eugenésica, são as espécies que no passado
foram alvo de reacções por parte de movimentos sociais, políticos, racistas e
que no nosso século, se mantêm em políticas concretas, como por exemplo, o
nazismo ou outros. Para estas espécies de E., esta aplica-se àquelas pessoas
que não passam já de um peso para a sociedade, a quem já nem sequer
convém viver. Esta aplica-se, em casos concretos, como:

 recém-nascidos deformados ou deficientes;

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Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 24

 os doentes mentais, com lesões cerebrais irreversíveis;


 os que fazem parte de classes inferiores;
 os anciãos ou outros considerados improdutivos, etc.

No que se refere ao ponto de vista de quem pratica a E., podemos


distinguir entre outros: a E. activa e passiva, entendendo-se esta, se se
provoca a morte a alguém por acção ou omissão, que pela sua natureza ou
intenção causa a morte, com o intuito de aliviar o sofrimento; a E. directa e
indirecta, a primeira entendida como, o querer que a morte aconteça e a
segunda, pretende-se antes aliviar a dor física, ainda que isso lhe possa vir a
diminuir o tempo de existência. Devemos ainda advertir, que a E. indirecta
não deve ter-se em conta como E. propriamente.
As classificações que até aqui tentei clarificar, foram em conformidade,
por quem é partidário da E. e pelos que defendem a vida.
Foi para não criar mais confusão sobre a realidade do problema e antes
para ajudar a clarificar a questão, que não me debruçei, em outras divisões e
classificações.
No entanto, a minha opinião pessoal e crítica, aqui também conta
(talvez, até a que mais conta), por isso, queria dizer o seguinte: a minha
atitude aqui é de alguém diferente daqueles que provocam a E., quer seja das
várias espécies aqui referidas, quer seja, no sentido literal da palavra. Para tal
limito-me a fundamentar esta minha posição, invocando o 5º Mandamento da
Lei de Deus: “Não Matar” e uma passagem breve do Livro do Eclesiastes,
que diz a certo ponto: “ Há um tempo para viver e um tempo para morrer “.
A posição que eu aqui tomo, diz respeito, não só a este ponto, mas ao
próprio tema da E., porque como dizíam os antigos: só Deus tem poder para

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Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 25

dar ou tirar a vida e ninguém tem o direito de se fazer passar por Deus e muito
menos de tirar a vida e dar a morte a quem quer que seja. Quem assim
proceder, terá que um dia prestar contas a Deus.

CAPÍTULO III

3  ASPECTOS LEGAIS, DOUTRINAIS, SOCIAIS, MEDICINAIS E


ÉTICO-MORAIS DA EUTANÁSIA

3.1 - Aspectos Legais/Jurídicos da Eutanásia

Antes de entrarmos propriamente nos aspectos, convém dizer que como


o termo E. se tornou um pouco ambíguo, em alguns periodos, também agora
acontece quando se fala na sua legalização ou despenalização.
Quando aqui se fala em legalização, fala-se da E. propriamente dita, ou
seja «fazer morrer» um enfermo. Legalizar a E. supõe, reconhecer legalmente

VISEU MORAL PESSOAL 2000 / 2001


Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 26

a faculdade de acabar com a vida de uma pessoa que sofre. Durante muito
tempo, a E. foi penalizada legalmente em todos os países do mundo.
No decorrer da história, houve alturas em que se propôs a aceitação
legal e social da E.. Esses intentos, agora são retomados em alguns países, a
fim de conseguir essa despenalização, e o facto é que já há uma certa
tolerância em alguns. Contudo, nenhuma dessas propostas de legalização, até
ao momento, passaram para um texto legal.
Na Holanda e de modo semelhante na Austrália (esta desde 1995), a E.
é tolerada quando o sofrimento é muito e o paciente deseja a morte.
Entre os países que pretendem a verdadeira legalização da E. estão 2
projectos apresentados ao Parlamento Britânico (1936 e 1939), e um texto
votado em referendo favorávelmente no cantão suiço de Zurique, em 1977;
também ao governo holandês foi apresentado um projecto semelhante a este,
que foi aprovado no ano corrente ( 2000 ).
São muitas as razões que estes grupos e movimentos a favor da
legalização apresentam, nós vamos reduzi-los a um:  o direito de autonomia
da pessoa, ou seja, cada um é responsável pela sua vida e pela morte, já que o
homem é livre e tem um dignidade pessoal.
Vimos uma das razões mais fortes e invocadas para legalizar a E.,
agora veremos as razões que se apresentam a favor de não legalizar a E., e
não são assim tão poucas. A nós basta-nos referir duas ou três:

 Deus é o Senhor da vida e da morte, como Dom de Deus, ela deve ser
cuidada e favorecida, e nunca ter o intento de a tirar;
 Um mandamento que eu já referi atrás: “ não matarás ”;

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Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 27

 Toda a vida é inviolável em qualquer fase da vida, e exige-se o seu


respeito.

Cabe-nos agora, referir o que dizem as Constituições e o Código Penal,


no seu plano jurídico, sobre a E..
Então começaremos por perguntar:
 Reconhecem estes orgãos o direito à vida?
A resposta é Sim. A Constituição Espanhola (e a Portuguesa), no artigo
15, reconhecem o direito à vida a todo o ser humano; também o Código Penal
e outras leis protegem este mesmo direito, proíbindo qualquer intenção de
acabar com a vida, impondo severas penas a quem o pretender fazer 11.
Ainda assim, algumas leis já foram contra o princípio de protecção
absoluta da vida, permitindo e não castigando alguns casos de atentar contra a
vida (em caso de se zelar pela vida).
A vida é um bem jurídico irrenunciável, excluindo-se a disponibilidade
dela, por outros ou pela própria.
No que respeita ao C.P.E., as suas leis não fazem referência
directamente á palavra E..
Este (CP) não tem nenhuma lei especial sobre a E., porque considera
um «homicídio» qualquer tipo ou espécie de E..
Para as leis espanholas, matar é sempre um delito, seja qual for o
motivo12.
11
- O direito à vida é o primeiro dos direitos fundamentais consagrado na Constituição Portuguesa
cujo art. 24.º nº 1 proclama severamente que a vida humana é inviolável.
As leis ordinárias, muito especialmente o Código Penal, protegem esse direito, estipulando
penas contra quem atentar contra a vida humana.
12
- O C.P.P. embora sem empregar o termo «eutanásia», inclui, no seu art. 133.º, entre os factores
que podem diminuir sesívelmente a culpa do homicida, «a compaixão, o desespero, ou outro
motivo de relevante valor social ou moral», nos quais se insere necessáriamente a eutanásia activa.

VISEU MORAL PESSOAL 2000 / 2001


Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 28

Do meu ponto de vista, a verdadeira eutanásia não deve ser legalizada


ou despenalizada. Isto porque, a sua legalização viría a trazer mais
inconvenientes e implicações, que alguém jamais imaginou. Jamais alguém
pode falar aqui em vantagens, daí provenientes, já que matar é o crime mais
absurdo quem alguém pode ou deve pensar em fazer.

3.2 - Aspectos Doutrinais da Eutanásia

 “ Não Matarás “
( Ex. 20, 13; Mr. 5, 21; Lc. 18, 20; Rom. 13, 9)

Aqui, tal como no ponto anterior, põe-se a pergunta:


 Será a questão da E. um problema religioso ou moral?
A resposta aqui é mais lógica. A E. é um grave problema moral para
quem quer que seja, crente ou não. Por isso a moral cristã a condena em
absoluto.
A E. é aqui tida como um pecado que atenta contra o Homem e contra
Deus, já que ataca sem razão a dignidade humana. Por isso, e como já fiz
referência atrás, há um imperativo categórico que Deus nos deu e que deveria
ser mais que suficiente: “Não Matarás”. Ter uma posição contra a E. não
chega e nem é próprio só dos cristãos, mas estes vêem essa oposição de um
modo mais natural, porque alegam que a vida é um Dom gratuito de Deus e
por isso ninguém pode acabar com ela, ainda por cima se for de um inocente.
Vários documentos apontam a posição da igreja relativamente à E.,
entre eles, temos:

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Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 29

 A Declaração sobre a E. da Congregação para a Doutrina da Fé,


publicada a 5 de Maio de 1980;
 A Nota sobre a E., da Comissão Episcopal Espanhola, publicada a 15
de Abril de 1986;
 Síntese da Doutrina da Igreja sobre a E., da Conferência Episcopal
Espanhola, de 199313.

Como nos é pedido para falarmos das situações e documentos mais


recentes, vou resumir aqui, o assunto dos pontos principais que estão neste
último documento:
1. É ilícito matar um doente, quer seja para lhe aliviar o sofrimento ou
por petição do mesmo. Ninguém que tome conta dele tem o direito de tirar a
vida e dar a morte a um enfermo.
2. Do mesmo modo, vai contra a moral, dar a morte a alguém por acção
ou por omissão.
3. Não é permitido que se recuse um tratamento ao doente quando este
lhe pode salvar a vida, ou apenas dar melhoras parciais. Ou seja, não se deve
fugir ao tratamento quando existe uma possivel cura, ainda que se possa pará-
lo se ele se torna insuficiente ou impotente para a cura.
4. Não é necessário submeter o doente terminal ou irreversível a
possiveis operações se não existir uma forte possibilidade de melhorar a sua
vida.
5. Admite-se o uso de analgésicos a fim de aliviar a dor, e com a
intenção de o ajudar, não de lhe diminuir o tempo de vida.
- ALBURQUERQUE, E. - “Bioética: una opuesta por la vida” , Madrid: Editorial CCS, 1997,
13

Cap. XIII, pp. 204-205.

VISEU MORAL PESSOAL 2000 / 2001


Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 30

6. É permitido, pôr de lado os tratamentos quando o doente se encontra


em coma irreversível ou o cérebro perdeu a sua total funcionalidade.
Já não é lícito quando o doente ainda tem actividade cerebral, ou se
essa omissão provocar a morte imediata.
7. Todos os pontos são importantes, mas este quanto a mim, tem um
especial relevo, porque diz que os inválidos, ou como já lhe chamaram “peso
da sociedade” e com malformações, têm os mesmos direitos que os outros,
essencialmente no que respeita à aceitação dos tratamentos.
Na fase pré-natal ou pós-natal, tem que se dar as mesmas curas que a
fetos sem nenhuma menos valia.
8. Quando se fala do Estado, este não pode manipular a legalização da
E. como se fosse propriedade sua, pois esta não lhe pertence e além disso, a
existência de um ser humano supera o poder do indivíduo e do Estado, já que
é um dom de Deus e só Ele tem poder para tal.
9. « A E. é um crime contra a vida humana e contra a lei divina,de que
se fazem cúmplices todos os que interferem na decisão e execução do acto
homicida ».

Com esta Declaração espera-se encontrar o bom senso de tantos


homens de boa vontade que, para além das diferenças filosóficas e
ideológicas, possuem uma viva consciência dos direitos da pessoa humana.

3.3 - Aspectos Sociais da Eutanásia

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Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 31

No seio das nossas sociedades surgem a este respeito inúmeras


perguntas, as quais, algumas delas são de resposta ambígua e de grande
complexidade, outras existem que não se chega a um acordo de ambas as
partes. Uma das perguntas que se pode e deve pôr em primeiro lugar é:
Será a E. uma questão da sociedade, e que a ela diz respeito?
A E. foi na Antiguidade e ao longo da história um problema que
sempre disse respeito à sociedade, sendo um problema social e de grande
importância.
Mas com a influência do cristianismo, acabou-se com a maioria dessas
práticas contra a vida. Deixando até princípios do séc. XX de ser um
problema social, contudo alguns grupos e movimentos voltaram a pô-la como
um problema social, ao querer a sua legalização.
Já no nosso século, criaram-se grupos em defesa da E., que pretendiam
a abolição de certas leis, mas a serem recusados em muitos países. Este tipo
de grupos, usava para tal uma mentalidade de relativização do respeito que o
ser humano deve ter, e que aos poucos vão influenciando a sociedade.
Mas, quais seríam então os efeitos que a legalização da E. causaria na
sociedade?
Alguns séculos atrás ela não era legal em nenhum país, mas isso agora
já não é bem assim, e senão, vejamos um exemplo concreto, que se passa na
Holanda.
A princípio admitiu a prática da E. em casos extremos, depois obteve-
se cobertura legal. Os casos para as quais se permitia e era legal o uso da E.,
eram como que, uma solução para «casos limites» de «vida vegetativa»,
«intensificação terapêutica» etc, que passaria a ser um caso normal. Dentro
da psicologia explica-se assim: o que é pemitido e deixa de ser, passa a ser

VISEU MORAL PESSOAL 2000 / 2001


Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 32

normal, e ajuda a acabar com situações embaraçosas e torna-se assunto para


certas ideologias defenderem. É o que se passa desde há alguns anos na
Holanda. Agora uma testemunha desta realidade, um médico holandês,
Richard Fenigsen, diz o que se passa. Aqui ficam alguns ‘tristes’ números, de
uma realidade que é vivida hoje em dia e que isso de algum modo faça as
sociedades de hoje reflectirem melhor na situação.
A E. activa voluntária é praticada em 5 mil doentes por ano. Este
número se se tiver em conta doentes de hospitais, vai até aos 10 mil, tendo já
atingido, 18 mil e 20 mil casos por ano. Segundo se sabe 81% dos médicos
holandeses já a praticou, 28 % realizou-a em 2 doentes por ano e 14 % em 3 a
5 doentes.
Também na Holanda há pessoas que fazem um “testamento vital ”, em
certos momentos da sua vida, depois, este foi trocado por um «cartão de
crédito para uma morte fácil» e já em 1981 havía 30 mil pessoas que o
tinham, hoje prevê-se que esse é extremamente mais alto. Também quanto à
E. activa, a sociedade holandesa é maioritáriamente favorável. Em 1985, 70%
dos holandeses eram a favor, em 1986 eram já 76 % …
O que esta sociedade não quer ver é que ao legalizar os casos que atrás
referi, um dia destes, esta alastra-se a outros casos, que não os referidos como,
eliminar uma pessoa que é um peso para a sociedade ou um deficiente,
alegando que se lhe está a evitar a dor e o sofrimento, e a ter dele compaixão,
o que não é verdade.
Em geral, hoje em dia, o que se denota já nas nossas sociedades é uma
notória divisão, entre os que estãoa favor da não legalização e de acordo com
a Doutrina da Igreja, ou seja a favor da vida, e os que estão a favor da

VISEU MORAL PESSOAL 2000 / 2001


Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 33

despenalização, da legalização, indo contra a Doutrina da Igreja, ou seja, a


favor da destruição da vida humana.
Em relação a estes últimos, aparecem nos finais do séc. XIX e já no
nosso também, movimentos e grupos sociais a favor da legalização da E..
Primeiro em Inglaterra, depois no inicio do século nos E.U.A. Aqui em 1903,
mil médicos pedem a sua legalização. Depois em 1936 e 1947 a Inglaterra
apresenta 2 projectos de lei, que foram recusados.Também aqui se cria em
1935 a associação «Exit » e em 1838 nos E.U.A a «Sociedade da Eutanásia
na América », ambas em favor da sua legalização. Hoje em dia existem
movimentos em mais de 20 países.
Em 1934 aparece em Espanha a associação «DMD », que pretende a
livre escolha da pessoa para dispôr do seu corpo.
Ambas pretendem uma só coisa: pressionar a opinião social em favor
de um objectivo - a legalização da E..
De qualquer maneira, defender a vida em oposição à E. é um dever da
sociedade em geral e não só dos que se pronuncíam contra a sua legalização.
Assim sendo as sociedades têm a obrigação de pôr ao dispôr da vida,
todos os meios para a salvar e não para a matar, para que não se ponha em
prática tal prática, que é um forma de matar e um atentado contra a vida.

3.4 - A Medicina perante a Eutanásia: seus Aspectos

 Será a E. um problema Médico?


Esta é a pergunta, que tal como nos pontos anteriores, aqui colocamos
como ponto de partida e como meio de reflexão. Segundo se pensa, a E. não é

VISEU MORAL PESSOAL 2000 / 2001


Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 34

propriamente um problema médico e nem tem que o ser, ainda que esta afecte
e muito o mundo da medicina.
A E. não é óbviamente uma forma de medicina, mas sim de homicídio,
no entanto, sendo ela praticada por um médico, então este está a negar os
princípios básicos da medicina.
A E. torna-se aqui a negação da Medicina, visto que esta tem o
compromisso de curar o doente ou acompanhá-lo, quando esta já não lhe dá
esperança, ora se em vez de zelar pela vida, dá-lhe a morte, vai contra os seus
princípios. Devemos lembrar que a E. não é um recurso à medicina, esta é
substítuida pela E., logo sendo esta uma negação da medicina, volta-se contra
o médico que a pratica.
Deste modo o médico nunca deve, de forma intencional e directa,
provocar a morte ou ajudar o doente a suicidar-se.
Pelo contrário a medicina ou os médicos devem sempre e acima de
tudo ter em conta os direitos que o doente tem e fazer por os cumprir. Eis
alguns desses direitos, que o médico deve ter em conta:

 Todo o doente tem direito a que o médico lhe explique a situação em


que se encontra, que este respeite a sua liberdade de consciência;
 Tem o direito a não sofrer em vão;
 Tem também o direito de decisão próprio sobre tratamentos ou
intervenções;
 O direito a ser acompanhado por quem o trata, com toda a confiança,
etc.

VISEU MORAL PESSOAL 2000 / 2001


Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 35

Todo o pessoal médico assistente deve respeitar a liberdade que todo o


doente tem.
Mas há outros aspectos do ponto de vista médico que devem ser postos
em acção, em favor de ajudar sempre o doente a não sofrer e se possivel de
lhe prolongar a vida.
Por exemplo: em primeiro lugar, todo o médico, como profissional ao
serviço da medicina é responsável pela vida que tem nas suas mãos; tem o
dever e a obrigação de pôr todos os meios que a medicina tiver, ao dispôr e
em favor da cura do doente, ou pelo menos de lhe aliviar a dor e o sofrimento,
sem que isso lhe possa tirar a vida; deve ter uma opinião da situação do
doente, mas, respeitando sempre a decisão do doente; não é permitido a
nenhum médico, que zelando pelo seu compromisso à medicina (dar a vida e
a cura e nunca a morte), que de forma directa ou involuntária, por acção ou
por omissão, tire a vida a alguém ou lhe negue meios de cura ou de
prolongamento da vida; a medicina deve estar ao serviço dos doentes de
qualquer espécie, e não estes a servir de cobaias para experiências médicas ou
melhor, ao serviço da medicina.
Assim como a medicina e os médicos devem estar ao serviço de quem
sofre, e contra qualquer acto homicida ou suicida, também os familiares,
amigos, sociedade, leis civis ou religiosas, devem defender isso com vigor,
unidos todos por um único sentimento:
Respeitar a Vida, quer ela esteja no seu início ou se aproxime do fim.

3.5 - Aspectos e Questões Ético-Morais da Eutanásia

VISEU MORAL PESSOAL 2000 / 2001


Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 36

A reflexão ética que se tem feito em relação à E., principalmente nos


periodos de mudança cultural, ajudou a corrigir muitas deformações e
deficiências morais induzidas por uma falsa compreensão da religião: pensa-
se na procura da liberdade, da tolerância, da democracia.
Do ponto de vista ético, a maioria dos autores e a doutrina da Igreja,
condenam qualquer tipo de E., dizendo mais, que esta é inaceitável, porque é
uma ofensa à dignidade da pessoa que leva à inviolabilidade da vida humana
e à indisponibilidade fundamental da pessoa, consequentemente. Por isso não
é permitido a ninguém dar ou autorizar a morte, e nem sequer requerê-la para
si.
Mas as entidades que referimos acima não condenam a distanásia em
todos as situações, e permite, por tanto, o abandono da técnica quando esta é
desproporcionada ou que já não se justifica.
Nenhuma pessoa ou autoridade tem o direito sobre a vida de alguém,
porque o homem como pessoa é uma realidade autónoma, responsável pelo
seu destino e, como tal, fim e nunca meio.
São levantadas pelo médico várias questões do ponto de vista ético-
moral:

 Devo continuar a prolongar esta vida?


 Sou obrigado a usar todos os meios terapêuticos para com este
doente?
 Posso e/ou devo suspender a reanimação a este doente?

Para discernir éticamente estas questões, vamo-nos orientar num duplo


critério:

VISEU MORAL PESSOAL 2000 / 2001


Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 37

 O primeiro, é que o conceito de vida humana não se limita e reduz


apenas ao de vida biológica, logo, o médico não está ao serviço do organismo
doente, mas da pessoa doente, que exige pela sua óbvia dignidade de pessoa,
respeito pelos seus maiores valores (vida, liberdade, amor, solidariedade, etc);
 O segundo, é que o dever ético do respeito pela vida, pode
converter-se em determinadas circunstâncias, no dever ético de aceitar a
morte, quer da parte do doente, quer da parte do médico, e assim exigir ou
implicar um não à forçada sobrevivência de qualquer maneira.
Resumindo o que foi dito e o que diz a Ética quanto á E., devemos
dizer que tanto a E. como a distanásia são comportamentos éticamente
reprováveis, pois representam dois tipos de manipulação que têm vindo a
reduzir a pessoa a objecto.
Podemos acrescentar ainda o que a ética diz: que temos o dever de
respeitar a vida, a dignidade da pessoa e ninguém tem o direito de acabar com
ela ou de a maltratar.
Todas as questões éticas são regidas por leis e comportamentos a ter, a
sua solução passa pelo que diz a moral católica e a moral divina.

CONCLUSÃO
( Apreciação Crítica )

VISEU MORAL PESSOAL 2000 / 2001


Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 38

Há séculos que, filósofos, cientistas e médicos, estudam o homem e a


vida, procurando dar uma definição aceitável da sua globalidade: natureza,
origem e fim último.
O que acontece, é que nem sempre se tem em conta a dignidade e a
liberdade da pessoa humana, mas, pelo contrário, se usa e abusa da vida
humana e da pessoa, manipulando-a e tornando-a como propriedade sua,
fazendo dela um objecto.
Costuma dizer-se: “mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”. Aqui
nem sempre isso acontece, vão-se mudando os tempos, mas as vontades
permanecem vivas e por vezes, para pior.
Na realidade, a vida não é vista como um dom de Deus, como se
pensava no mundo cristianizado, mas é vista como algo que pertence ao
homem, e da qual ele pode tomar a decisão de fazer o que bem entender.
Mas, como nós sabemos isso não é verdade, a vida e a morte pertencem
a Deus, nós temos o dever e a obrigação de zelar pela nossa vida e ajudar a
defender a dos outros. A morte, só Deus tem o poder de a dar e mais ninguém.
Quem for contra este princípio divino, está a cometer um pecado gravíssimo e
eu pergunto: - será que também não merecería essa pessoa, a morte, como
castigo de Deus? Mas, Deus é infinito Amor e sempre pronto a perdoar,
jamais tomaría uma atitude de vingança!
Foi por isto e por muitas mais razões, que desde há muito tempo a
Igreja se tem manifestado em documentos que nós temos conhecimento,
como por exemplo: a publicação em 1993 da Conferência Episcopal
Espanhola, entre outros documentos, onde se resume e actualiza a atitude
apologética, neste campo, por parte da Igreja. O termo é aplicado à
‘liquidação’ de pessoas inúteis. Significa dar a morte por compaixão a

VISEU MORAL PESSOAL 2000 / 2001


Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 39

doentes mentais, ou incuráveis, etc., como quem mata um animal ferido ou


doente, para que não sofra. Nota-se logo a mentalidade materialista e
utilitarista que subjaz a esta concepção de vida.
A E. é definida nestes termos, como «acção ou omissão que, por sua
natureza ou nas intenções, provoca a morte, a fim de eliminar toda a dor».
Pouco difere, se se atenta directamente contra a vida ou se não se luta o
necessário contra a morte.
Qualquer processo é ilegítimo. As intenções é que podem variar.
Assim, também aqui é legítimo o princípio de duplo efeito, isto é, podem
usar-se narcóticos ou anlgésicos com a intenção directa de aliviar o
sofrimento do doente, embora isso possa acelarar indirectamente a morte. O
problema põe-se no caso de analgésicos que levam à perda de consciência,
pois o doente tem direito até ao fim, de tomar decisões.
O que foi dito em relação à opinião da Sociedade, ou melhor, dos
grupos e movimentos em geral, pode-se resumir a isto:
No nosso mundo materialista e hedonista: ‘perdeu-se totalmente o
sentido da morte, porque se perdeu o sentido da autêntica vida ’. Se para
além da morte fica o nada, a vida é também nada, absurda “paixão inútil ”.
Aqui só é possivel mudar algo, se as pessoas se mentalizarem de que:
Cristo, morto e ressuscitado, Vivo pela força de Deus, é a resposta total e
definitiva ao problema da vida e da morte. A morte tornar-se-ía uma ilusão,
porque a vitória pertencerá à Vida.
Mas eu penso que acima de tudo, quem tem que ser mais ilucidado e
ajudado a entender este problema, é o pessoal directa ou indirectamente,
ligado à medicina.

VISEU MORAL PESSOAL 2000 / 2001


Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 40

Afinal de contas, é a medicina que deve servir o homem e não o


homem servir de cobaia à medicina. A medicina, no bom sentido, deve ajudar
o homem a encarar a sua morte como fim e nunca como meio; mais, deve
antes, dar-lhe esperança, na cura e na vida, pondo todos os meios ao serviço
do homem.
O limite da medicina é o próprio homem, quando engendra
instrumentos que põem em risco, e até termo à sua própria vida.
Porém, deve-se vincar que nem sempre a culpa é do médico ou da
medicina, mas daqueles que utilizam os conhecimentos da mesma, mas de
uma forma detorpada, maléfica e destruidora....
Mais ainda, por vezes, a medicina também leva à desumanização,
porque o que importa não é o homem, mas sim o progresso. O homem está
assim ameaçado pelo progresso. Um progresso onde o homem não tem
palavra alguma a dizer. O homem é assim um ser manipulado e encontra-se
envolvido por uma atmosfera que o “sufoca “ e “mata ”. Diz Roger Garaudy,
que se o mundo continuar neste progresso malvado, daqui a 30 anos nós
seremos uns autênticos assassínos. Diz também ele, que estão criadas
situações de desumanização: em 1º lugar, o homem já morreu, porque se
esqueceram dele; em 2º lugar, vai morrendo, que é a morte real ou
provocada.
O progresso é um fim para si mesmo, o que interessa é que haja
progresso e não interessa a dignidade do homem em si mesmo, isto do ponto
de vista ético-moral é inaceitável.
Este progresso não contempla o homem, mas ameaça-o cada dia que
passa.

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Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 41

A situação pode parecer deseperada, mas não é bem assim! O mundo


será cada vez melhor apartir do momento que o homem tome consciência de
que não é um mero produtor ou consumidor, e que para se realizar tem que
fomentar a sua dignidade. É necessário moderar as partes, harmonizando os
contrários. Isto apesar de ser difícil e fatigante, o homem que consegue
equilíbrio é um homem plenamente realizado nas suas convicções. Urge
mentalizar as pessoas a animar espiritualmente as sociedades, dando-lhes
motivos de esperança. É urgente que os homens de boa vontade se enpenhem
sériamente numa profunda renovação da cultura, à luz de uma só
Antropologia e dos princípios do Evangelho.
Para fundamentar esta minha análise, refiro uma das mais marcantes
frases do Sumo Pontífice João Paulo II:

“Abri ao poder salvador de Cristo os vastos campos da cultura, da


civilização, do progresso. Não tenhais medo. Permiti a Cristo falar ao
homem “14.

 O AUTOR :

Luis António Pereira Santos

 Ass. _________________

14
- 1ª alocução após a eleição papal, 17 de Outubro de 1978.

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BIBLIOGRAFIA

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BLÁSQUEZ- RUIZ, F. J. - Perfiles ético-políticos de la sociedade


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(Madrid 1992), Coleccion: Textos; Seccion: Teologia, nº 10, cap. V,
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Fr. BERNARDO, OP - Bioética e Saúde, Livraria Torre de Marca,


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GAFO, Javier (ed.) - La Eutanasia y el arte de morir: Dilemas Éticos


de
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VIDAL, M. - Bioética: Estudios de bioética racional, Editorial Tecnos


S.A., (Madrid 1994), 2º Ed., cap. V/VI, pp. 62-82.

2. Enciclopédias

VERBO Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, Lisboa: Editorial

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3. Revistas

Encrucillada, Revista Galega de pensamento cristián, nº 106, Xaneiro-


Febreiro, 1998.

ÍNDICE

EUTANÁSIA: A MORTE HUMANA, PROLONGAMENTO DA VIDA E EUTANÁSIA

Pág.
SIGLAS DE COLECÇÕES, REVISTAS E DOCUMENTOS ------------------------------ 2

ABREVIATURAS DIVERSAS ----------------------------------------------------------- 3

APRESENTAÇÃO ---------------------------------------------------------------------- 4

INTRODUÇÃO ------------------------------------------------------------------------- 5

CAPITULO I

1. A MORTE HUMANA E O PROLONGAMENTO DA VIDA ------------- 7

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Eutanásia : A Morte Humana, Prolongamento da Vida e Eutanásia 45

1.1 - O Direito a Morrer com Dignidade (Ortotanásia) ----------- 7

1.2 - Prolongar a Vida (Distanásia), ou aliviar o sofrimento? -- 11

CAPITULO II

2. HISTÓRIA DA PALAVRA EUTANÁSIA -------------------------------- 15

2.1 - Da Antiguidade até aos Nossos dias -------------------------- 16

2.2 - Espécies de Eutanásia ------------------------------------------ 21

CAPITULO III

3. ASPECTOS LEGAIS, DOUTRINAIS, SOCIAIS, MEDICINAIS E


ÉTICO-MORAIS DA EUTANÁSIA ------------------------------------- 24

3.1 - Aspectos Legais/Jurídicos da Eutanásia --------------------- 24

3.2 - Aspectos Doutrinais da Eutanásia ---------------------------- 26

3.3 - Aspectos Sociais da Eutanásia -------------------------------- 29

3.4 - A Medicina perante a Eutanásia: seus Aspectos ------------ 32

3.5 - Aspectos e Questões Ético-Morais da Eutanásia ----------- 34

CONCLUSÃO - ( Apreciação Crítica ) -------------------------------------------- 36

BIBLIOGRAFIA ---------------------------------------------------------------------- 40

ÍNDICE ------------------------------------------------------------------------------- 42

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