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Pré-texto ...................................................................................................................... 1
1. O amor genuíno do paciente ................................................................................... 1
2. O amor e a paixão em Gradiva ............................................................................... 2
3. Resistência, sedução e neutralidade do analista .................................................... 3
4. O discurso amoroso, afinal ...................................................................................... 5
Bibliografia................................................................................................................... 6
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AMOR E PSICANÁLISE
(TRANSFERÊNCIA AMOROSA, TRANSFERÊNCIA ANALÍTICA)
Pré-texto
O que é o amor na psicanálise? A demanda amorosa adquire uma importância
fundamental na relação analítica. Ela é material básico para o tratamento, ao mesmo
tempo que é resistência, obstáculo à análise. Aparece com essa “dupla função”, ao
mesmo tempo, antagônica e complementar. Afinal, que amor é esse? É o mesmo
amor dos enamorados? É justa a distinção entre amor na transferência e amor fora
da análise?
Escreve Freud sobre a paciente, que por causa da “irrupção de uma apaixona-
da exigência de amor” fica sem possibilidade de compreensão interna (insight) e se
mostra absorvida pelo seu amor. Depois adverte que esta mudança ocorre muito
regularmente quando se está aproximando de uma recordação aflitiva ou de algum
fragmento reprimido da história da sua vida. A resistência começa a se utilizar do
amor, que já estava colocado na situação analítica, a fim de atrapalhar a continua-
ção do tratamento, desviando o interesse da paciente pelo trabalho e colocando o
analista “em posição canhestra.”
Não há dúvidas que o amor que o paciente dedica ao analista seja amor ‘genu-
íno’; embora ele seja característico na transferência, pois é intensificado, provocado
pela situação analítica e não leva tanto em conta a realidade.
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Pode-se pensar neste ponto, após a analogia entre o método curativo do per-
sonagem do texto e o do analista, em transferência amorosa na transferência analíti-
ca. A transferência (enquanto transporte de sentimentos) do amor infantil (desloca-
do) para a figura do analista é o material do trabalho que opera a partir do amor na
transferência. Dentro desta perspectiva o amor [passa a ter, uma importância fun-
damental para o trabalho analítico pois] não é só material de trabalho seja para o
analista como para o paciente, mas também é a base da relação entre o analista e o
paciente, que garante a análise.
“ela teria alcançado sucesso naquilo por que todos os pacientes lu-
tam na análise - teria tido êxito em atuar (acting out), em repetir na
vida real o que deveria apenas ter lembrado, reproduzido como ma-
terial psíquico e mantido dentro da esfera dos eventos psíquicos.” (5)
Não se trata de recusar a demanda de amor do paciente, não é isso que está
mais em questão. Por outro lado, o analista não deve responder a essa demanda de
amor. O que quer dizer com isso? O próprio Freud mostra o caminho:
O analisando ama seu analista por causa do que ele lhe confiou quando deci-
diu começar sua análise e o que ele confia ao analista é, antes de tudo e principal-
mente, o que ele não sabe de si. Assim, o analista deve responder ao amor do paci-
ente em termos de saber. Ele responde - interpreta - para fazer desse saber uma
verdade tal que mude o sujeito. É nesse sentido que os autores vão apontar que La-
can vai inverter a questão ao dizer que a resistência é obra do próprio analista e não
do paciente.
Na situação analítica o amor que está presente deve permitir ao paciente obter
respostas às suas perguntas, porém na condição de que o analista não se inclua
como o outro sujeito.
E então penso que não nos afastamos de Freud, pois segundo Laplanche e
Pontalis (6), “mesmo quando Freud vai mais longe no reconhecimento do caráter da
repetição na transferência, pois o paciente não pode recordar tudo o que está recal-
cado e é obrigado a repetir o recalcado como vivência no presente”, ele orienta o
psicanalista a levar o máximo de conteúdo possível para o campo da rememoração.
De modo que Freud sustentou como ideal a rememoração completa e quando esta é
impossível, pode o analista se valer das “construções”, tudo como esforço para “pre-
encher as lacunas” do passado infantil. Freud aposta no valor das palavras. Esse
esforço justifica-se, ainda segundo os autores, porque tudo que é essencial na trans-
ferência não é tanto a repetição do vivido na infância, quanto a realidade psíquica:
ou seja, mais profundamente, o desejo inconsciente e as fantasias conexas do sujei-
to.
Não há problemas em dizer que o amor é sempre aquele velho conhecido, afi-
nal ele tem mesmo origem nas primeiras relações infantis de todos nós. Ele pode
aparecer na situação analítica como em qualquer outra relação. O campo é sempre
o mesmo: a relação.
Porém o discurso amoroso tem sua especificidade e não deve ser reduzido aos
sintomas, segundo Barthes (1). Neste sentido, ele é e sempre será inatual e intratá-
vel. Assim, o discurso amoroso, não vai muito além de seu próprio enunciado. Ele
tem na sua relação peculiar com os signos o caráter de ser sempre uma declaração,
uma declaração de amor.
Aos olhos e ouvidos daquele que não ama, é pieguice, vazio. E talvez o discur-
so amoroso seja mesmo sempre vazio, e o enamorado sempre fadado a sofrer no
silêncio, já que o que fala não dá conta dos seus sentimentos.
Como, então, não compartilhar com Barthes quando ele escreve em seu livro?
“Freud à sua noiva: ‘A única coisa que me faz sofrer, é estar impos-
sibilitado de te provar o meu amor.’ E Gide: ‘No comportamento dela
tudo parecia dizer: já que ele não me ama, nada me importa. Ora, eu
a amava ainda e até mais do que nunca; mas não me era mais pos-
sível prová-lo. E isso era o mais terrível de tudo.’” (1)
Bibliografia
1- Barthes, Roland. Fragmentos de um discurso amoroso; vocábulo: “Gradiva”;
“Signos”; Ed. Francisco Alves; RJ, 1989.
2- Fédida, Pierre. ‘Amor e Morte na Transferência’; Clínica Psicanalítica; Ed. Escuta;
SP, 1988.
Freud, Sigmund. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas;
RJ, Imago, 1996:
3- “Delírios e sonhos na Gradiva de Jensen” (1907);
4- “A dinâmica da transferência” (1912);
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