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TEORIA DA GLOBALIZAÇÃO DE BAUMAN A EVOLUÇÃO DO DIREITO PENAL E O

PUNITIVISMO.

Thaís Fernanda Silva1

Muito tem se falado em globalização, especialmente a partir do fim do século XX, onde
houveram grandes transformações seja no âmbito tecnológico, econômico, social, dentre outros -
e, inevitavelmente trouxe consigo efeitos, sejam positivos ou negativos.
Não há dúvidas que uma das transformações, diz respeito ao Direito, e por conseguinte
ao nosso Direito Penal, o chamado, expansionismo penal que se caracteriza pela flexibilização de
garantias, relativização da política criminal, agravamento da pena para crimes já existentes,
criação de novos tipos penais, e sobretudo, pela extensão da tutela penal e bens jurídicos difusos.
Esse Direito penal, passou a ser utilizado como instrumento primeiro de controle social,
outrora era a ultima ratio, ou seja, passa a ser o direito penal um antídoto das possíveis mutações
sociais, que veem acompanhados pela opinião pública, com discurso legitimador de um direito
penal punitivista.
Por estes fatos, é que trazemos a globalização para discussão mas refletindo seu papel
frente aos malefícios, principalmente no que tange ao Direito Penal.
Bauman afirma que “O atributo da ‘abertura’, antes um produto precioso, ainda que frágil,
da corajosa mas estafante auto-afirmação, é associado, hoje, principalmente a um destino
irresistível -, aos efeitos não planejados e imprevistos da ‘globalização negativa’ -, ou seja, uma
globalização seletiva do comércio e do capital, vigilância e da informação, da violência e das
armas, do crime e do terrorismo; todos unânimes em seu desdém pelo princípio da soberania
territorial e em sua falta de respeito a qualquer fronteira entre Estados. Uma sociedade ‘aberta’ é
uma sociedade exposta aos golpes do ‘destino’.
A transição do século XX para o século XXI, quando a humanidade alcançou uma falsa
sensação de bem-estar e que também veio acompanhado de um extraordinário avanço
tecnológico e científico, no contraponto teve problemas sociais relacionados à segurança,
aumento da violência permaneceram, ou seja, o progresso civilizatório está em paralelo com o
crescimento da pobreza e outros problemas sociais, inclusive com a ampliação do
encarceramento, que andam lado a lado com o desenvolvimento.
Segundo a teoria de Bauman, a perversa abertura das sociedades impostas pela
globalização negativa é por si só a causa principal da injustiça, e, desse modo, indiretamente, do
conflito e da violência.

1
Bacharel em Direito pela Univesc, Lages/SC (2015); Mestranda em Direito pelo Programa de
Pós-Graduação em Direito da Universidade de Passo Fundo. Passo Fundo-RS. Advogada; e-
mail: thaisfernandasilva.adv@gmail.com
Isso porque a globalização também está atrelada com o consumismo, e quando não se
acompanha o consumo, mesmo que de forma inferior, passam a ser encarados como
transgressores da lei e perturbadores da ordem, os chamados “refugo humano”.
Assim, esta parcela da sociedade por não poder ser depositada em lixos, por não
fazerem parte de uma vida normal, ou dentro dos padrões impostos pela sociedade, assim, o papel
do direito penal nessa vertente, é de selecionar, marginalizar e excluir, a partir de uma noção da
realidade, artificialmente criada pelo discurso.
A população carcerária do Brasil hoje, é constituída, em sua grande maioria, de pessoas
das classes mais baixas. E o Direito Penal é ainda utilizado pelo poder político, como resposta
para quase todos os tipos de conflitos e problemas sociais, pois não cabe qualquer objetivo
educador, reformador, ou disciplinador, apenas o isolamento e a exclusão.
Portanto o que se percebe é que o encarceramento não tem relação direta com o
aumento das práticas criminosas, mas com o aumento dos miseráveis, que são totalmente
excluídos do universo do trabalho, que veio com a globalização.
Sobre esse ponto, Bauman alega que “Os cuidados com o “estado ordeiro”, outrora uma
tarefa complexa e intricada que refletia as variadas ambições e a ampla e multifacetada soberania
do estado, tendem a reduzir-se consequentemente à tarefa de combate ao crime. Nessa tarefa,
porém, um papel cada vez maior, com efeito o papel central, é atribuído à política de confinamento.
A essencialidade do combate ao crime não explica por si só o boom penitenciário; afinal, há
também outras maneiras de combater as reais ou supostas ameaças à segurança pessoal dos
cidadãos. Além disso, colocar mais gente na prisão, e por mais tempo, até aqui não se mostrou a
melhor maneira. É de supor, portanto, que outros fatores levam à escolha da prisão como prova
mais convincente de que de fato “algo foi feito”, de que as palavras correspondem à ação. Colocar
a prisão como estratégia crucial na luta pela segurança dos cidadãos significa atacar a questão
numa linguagem contemporânea, usar uma linguagem que é prontamente compreendida e invocar
uma experiência comumente conhecida.
É a força da classe que está no topo da pirâmide da sociedade, que detem o poder
econômico e os meios de produção contra os que não se encaixam na lógica do capitalismo, e o
discurso visa neutralizar as classes subalternas, visando estabelecer uma espécie de ordem, na
qual o ambiente é “organizado” de uma forma que, aqueles que detêm poder de consumo tenham
a primazia.
O Prof Aury Lopes Jr. ainda bem exemplifica a teoria de Bauman, fazendo um
comparativo prático e dinâmico, onde nos mostra o quão chocante é quando se vira noticia do
Jornal Nacional o fato de um grupo de favelados terem “descido do morro” e ‘invadido” um
shopping center no Rio de Janeiro, ou seja, enquanto estiverem no seu devido lugar, as coisas
estão em ordem mas, ao descerem o morro e invadirem o espaço da burguesia, esta feita a
desordem, a quebra da organização do ambiente.
A pobreza não está associada diretamente a criminalidade, mas sim “reproduz a
vitimização’ e a criminalização dos pobres, o desrespeito aos seus direitos e a sua falta de acesso
à justiça.
E este é outro ponto curioso, essa demarcação através da propaganda do espaço
destinado a cada classe o que na prática significa que se um indivíduo miserável penetrar em um
ambiente destinado aos membros das classes privilegiadas este representará uma ameaça,
motivo pelo qual Bauman lembra que a insegurança moderna em suas várias manifestações, é
caracterizada pelo medo dos crimes e dos criminosos.
Há uma obsessão por segurança que vem ganhando cada vez mais espaço, por
inclusive, a mídia fazer alarde e distorcer muitas questões, aliado a globalização, onde fatos
corriqueiros de um local ser de conhecimento de todos rapidamente, assim a complexidade da
vida urbana transforma indivíduos em seres aterrorizados por medos reais ou imaginários em
sujeitos inseguros.
E este medo é o que é necessário dentro de uma sociedade para que se fortaleça o
discurso do poder punitivo.

REFERENCIAS

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.


BAUMAN, Zygmunt. Globalização: As Consequências Humanas. trad. Marcus Penchel. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar, 1999.

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