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APRENDENDO A SER FELIZ

MATEUS 4.23-5.12

INTRODUÇÃO

Estamos diante de um trecho que é um dos mais utilizados em toda a Bíblia. Um texto
que é muito falado, ensinado, pregado. O que seriam as bem-aventuranças? Por que será que
Jesus diz: “Bem-aventurados os pobres de espírito, bem-aventurados os que choram...”? Será
que Jesus está apresentando uma lista de atitudes ideais e que precisam ser desenvolvidas por
todos nós? O que seriam as bem-aventuranças? Seriam as bem-aventuranças condições que
levariam o indivíduo a alguma premiação? Desenvolva e terá o reino dos céus, receberá
consolo, receberá a terra por herança... Seriam as bem-aventuranças descritivas da saúde
mental de um indivíduo que uma vez praticando tudo o que ali há, viverá melhor em termos
psicoemocionais?
Para Champlin, as bem-aventuranças são promessas feitas aos discípulos fiéis do reino
dos céus. São leis de causa e efeito; ou seja, você se torna feliz se fizer isso ou aquilo. Mas
será que as bem-aventuranças são apenas promessas condicionais? Há outros comentaristas
como John Broadus que classificam as bem-aventuranças como manual do comportamento
dos discípulos de Jesus. Mas seriam as bem-aventuranças a súmula da ética cristã? Se o for
como ficariam os outros preceitos ensinados por Jesus e os apóstolos que são ditos como
imprescindíveis? Isso então significa que seremos felizes a partir do cumprimento desses
preceitos? Não reduziríamos, portanto, as bem-aventuranças num novo código, numa nova
lei, numa espécie de lei mosaica do NT? Estariam as bem-aventuranças dizendo que são
felizes apenas aqueles que desenvolvem todas as características descritas no texto? Numa
relação, diríamos, “toma-lá-dá-cá”? Se assim o for quem de nós poderia julgar-se possuidor
de todas as características descritas no texto? Então não somos felizes? Felicidade e nós, por
isso, são coisas absolutamente excludentes?
Eu confesso que até agora enxergava as bem-aventuranças como o estilo de vida ideal
para quem quer ser discípulo de Jesus. Um procedimento ético-moral do qual não podemos
escapar se queremos viver por excelência. Mas hoje o que desejo é olhar para as bem-
aventuranças sob uma perspectiva diferente. Quero olhar para esse texto considerando o
maior número possível de aspectos textuais, contextuais e estruturais, buscando em seus
pormenores o real sentido daquilo que Jesus quis ensinar aos seus discípulos, que na verdade
vai além da sua função orientadora do comportamento cristão. Por isso, fiz questão de ler a
partir do capítulo 4, verso 23 porque o capítulo 5 começa dizendo que Jesus “viu as
multidões”. E quem eram essas multidões? Essas multidões foram objeto da atenção de
Jesus, conforme os versos 23 e 24, “ensinando nas sinagogas deles, pregando as boas novas
do Reino e curando todas as enfermidades e doenças entre o povo. Notícias sobre ele se
espalharam por toda a Síria, e o povo lhe trouxe todos os que estavam padecendo vários
males e tormentos: endemoninhados, epiléticos e paralíticos; e ele os curou”.
Mas também poderia iniciar a leitura com o verso 17: Daí em diante Jesus começou a
pregar: ‘Arrependam-se, pois o Reino dos céus está próximo’”. Pois essas multidões se
reuniram em torno de Jesus por causa da mensagem que ele pregou, ou seja, a mensagem do
reino: “Arrependam-se, pois o Reino dos céus está próximo”. Jesus não usou o critério
“kronos”, cronológico, para o “está próximo”. O reino não é uma questão de tempo: daqui a
um dia, na semana que vem, no ano que vem; mas é uma questão geográfica: está próximo
no sentido de “está ao alcance”; não está ali nem acolá, está aqui ao alcance das mãos, é o
próprio Jesus. E este reino anunciado por Jesus se manifestou por meios práticos para que
todos tivessem a certeza de que ele é o Senhor do reino. Na sequência Jesus subiu ao monte,
chamou seus discípulos à parte, porque viu ali pessoas que foram tocadas pela chegada do
reino (4.17). Então começa a ensiná-los.
Agora vejam, quando Jesus começa a falar sobre as bem-aventuranças ele não está
apresentando simplesmente um código ético, mas ele está olhando para aquela multidão lá
embaixo, considerando o momento que ela estava vivendo: opressão social, política e
econômica, tolidos em sua liberdade. Ensina as bem-aventuranças dizendo: “Meus discípulos
aprendam a primeira lição que vou lhes ensinar, com a chegada do reino, apesar de tudo isso
que vocês vivem e que essa multidão está vivendo, poderão ser bem-aventurados, felizes”. O
que Jesus não está dizendo é: “sejam pobres de espírito, chorem, sejam mansos e etc, para
serem felizes”. Ele está dizendo que apesar de serem pobres de espírito, de chorarem, de
serem mansos e etc, com a chegada do reino vocês são muito felizes.
John Parsons sugere que em vez de ler as declarações, por exemplo: "Bem-
aventurados os pobres de espírito" elas devem ser lidas como exclamações: "Oh, felicidade
dos pobres de espírito!". Cada frase inicial, portanto, não funciona como uma declaração
condicional, mas exprime uma realidade atual: "Oh, alegria dos pobres de espírito, dos que
choram, dos mansos, dos que têm fome e sede de justiça, dos misericordiosos, dos puros de
coração, daqueles que promovem a paz, daqueles que são perseguidos". Ou seja, como
podemos ser felizes apesar de... A razão é: o reino de Deus está entre nós.
Querido, o que quero dizer com tudo isso é que nas bem-aventuranças encontramos no
seu contexto, essência do viver. O início sobre como viver um cristianismo de maneira
extraordinária. Para Jesus as bem-aventuranças transcendem a compreensão de promessas.
São muito mais do que promessas. O interesse de Jesus é que seus discípulos manifestem o
reino assim como ele é. O reino não está interessado na religião, mas nas pessoas. O reino
não submete as pessoas à religião, mas submete as pessoas ao viver do reino. O reino não
promete mudança na estrutura social do tipo: você vai se enriquecer, não terá problemas,
gozará de uma saúde perfeita porque doença é de satanás, não; o reino diz você pode ser feliz
apesar de... Em outras palavras, as bem-aventuranças são um chamado para ser o que
ninguém quer ser: pobre de espírito, chorão, manso, perseguido e etc.
Primeiro pensemos no que quis dizer Jesus com cada bem-aventurança:
1. “BEM-AVENTURADOS OS POBRES DE ESPÍRITO” - O termo traduzido por "os pobres" é
derivado de uma palavra que significa "a rastejar como um mendigo". Essa palavra dá uma
imagem de alguém totalmente dependente da ajuda dos outros. Aqueles que estão
dolorosamente conscientes da necessidade da ajuda de Deus. Quando está esvaziado de si
mesmo. É o reconhecimento da pobreza espiritual ou a falência espiritual diante de Deus.
Nada tem a oferecer, nada a reivindicar. Aquele que não se vê em condições de orar
publicamente... É o lugar ao lado do publicano da parábola de Jesus, clamando com os olhos
baixos: "Deus, tem misericórdia de mim, pecador!"
2. “BEM-AVENTURADOS OS QUE CHORAM” - O choro como consequência direta de uma
emoção humana concede o favor de ser consolado? Não. O choro aqui denota a condição de
impotência frente a questões impossíveis. Aqueles pais que sentados na sala numa tarde de
domingo, como de costume, ouvem um som “bumm!” vindo do quarto do filho, e quando lá
chegam esse filho havia dado um tiro na boca... Eu fiz esse sepultamento! São os pais cujo
filho morreu quando estava na escola e um louco entrou atirando em todo mundo. É aquela
pessoa que foi ao médico e soube que está com câncer e resta poucos meses de vida. São
pessoas impotentes frente a questões impossíveis de lidar.
3. “BEM-AVENTURADOS OS MANSOS” – É aquele que é ofendido pelo chefe no trabalho,
engole aquele “boi” com chifre e tudo, e quando chega em casa diz pra esposa: “Por que não
disse isso e isso pra aquele sujeito? Quem ele pensa que é?”. Este manso não é aquele
incapaz de sentir raiva ou desprovido de nervosismo ou agressividade, mas é o tímido, o
vacilante, o tido como covarde, quem gritar mais alto com ele, leva.
4. “BEM-AVENTURADOS OS QUE TEM FOME E SEDE DE JUSTIÇA” – Os que foram pisados
pelos poderosos. Os que tem fome e sede de justiça são os que se recusam a usar as armar
das trevas pra se dar bem, e são prejudicados por isso. (Salmo 73)... São aqueles que fizeram
uma besteira e não conseguem dormir a noite sendo consumidos pela culpa. O seu coração
será apaziguado na medida em que for feito justiça.
5. “BEM-AVENTURADOS OS MISERICORDIOSOS” - É aquele que ajuda, e todo mundo pensa
que ele é bobo. É aquele que ajuda e acaba saindo perdendo.
6. “BEM-AVENTURADOS OS PUROS DE CORAÇÃO” - É o perfeccionista. Aquele que não
consegue conviver com nada errado. Esse é um espinho na carne de quem está perto dele, e é
um espinho na carne dele mesmo. Ele não consegue dormir quando sabe que alguma coisa
está errada. Se tiver alguma coisa errada ele vê mesmo. É a mulher que além de ver, fala.
Esse não consegue conviver com o errado.
7. “BEM-AVENTURADOS OS PERSEGUIDOS POR CAUSA DA JUSTIÇA” - É o que vai
enquadrar tudo depois de ver o que está errado. Vai querer resolver, confrontar...
8. “BEM-AVENTURADOS OS PACIFICADORES” - É o cara que vai separar a brigar e apanha
dos dois.
Jesus não está dizendo que você tem que ser tudo isso para ser feliz, mas está dizendo
que você pode ser feliz mesmo sendo assim. Para Dietrich Bonhoeffer o reino é a libertação
do ser humano de todos os preceitos humanos, de tudo quanto oprime, sobrecarrega, provoca
preocupações e tormentos à consciência. Neste caso, as bem-aventuranças não são
condições, mas são promessas. Sendo assim, as bem-aventuranças proclamam que no reino:
1. A FELICIDADE É DÁDIVA - Ela acontece não por méritos. Não é conquista. É dádiva
apesar de nós. Vem você dizer que é pobre de espírito... que é pacificador... A felicidade está
no tocar do reino de Deus no coração do indivíduo...
2. A FELICIDADE INCLUI PESSOAS ALÉM DE NÓS - A felicidade também é para os diferentes
de nós. Felicidade não é apenas para pessoas boas como nós. O reino é inclusivo. A mulher
adúltera... O filho pródigo... Quem são os excluídos do nosso tempo?... Esse é o reino de
Deus.
3. A FELICIDADE DO REINO NÃO DESCREVE SENTIMENTOS, MAS PESSOAS FELIZES – Jesus
não está falando de um sentimento de felicidade, mas de pessoas felizes. É o cara que se deu
bem na vida... Jesus diz que o cara que se deu bem na vida, o bem-aventurado é o cara
tocado pelo reino. Esse cara de vez em quando é perseguido... sofre... mas é feliz porque foi
alcançado pelo reino...
Portanto, ser um cristão extraordinário é:
1. ABRAÇAR O QUE O MUNDO REPUDIA E REPUDIAR O QUE O MUNDO ABRAÇA.
2. DIZER NÃO ÀS REALIDADES EXTERNAS, MAS SIM ÀS REALIDADES INTERNAS.
Jesus não disse que bem-aventurados são os ricos. Essa felicidade não está centrada
em coisas externas. As riquezas não satisfazem. Deus colocou a eternidade no coração do
homem. Nem todo o ouro da terra poderia preencher o vazio da nossa alma. A verdadeira
felicidade não está centrada na posse das bênçãos, mas se acha na fruição da intimidade com
o abençoador. Um homem pode morar num palácio e não se deleitar nele. Pode ter o
domínio de um reino e não ter paz na alma.
3. DESFRUTA DA REALIDADE DO PRESENTE E NÃO SE FRUSTRA COM A DEMORA DO
FUTURO.

Jesus não disse: Bem-aventurados serão os.... Ele disse: Bem-aventurados os.... Os
crentes não serão felizes apenas quando chegarem ao céu; eles já são felizes agora,
independentemente do contexto...

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