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Euclides Martins Balancin Ivo Storniolo COMO LER | O LIVRO DE MIQUEIAS | Um profeta contra o latifindio 22 edi¢o ancin slo niolo yein lo lo niolo 2 ! ; oe f = BIBLIOTECA O ancin Edicées Paulinas ITESP g & rman Os textos bblicos sdo tirados da Biblia Sagrada — Edigdo Pastoral, Edigies Paulinas, 1990, | 02853 IIMA @ EDIGOES PAULINAS TELEX (11) 39464 (PSSP BR) Rua Dr. Pinto Ferraz, 183, 04117 SAO PAULO — SP END. TELEGR.: PAULINOS © EDICGOES PAULINAS — Sao Paulo — 1990 ISBN 85-05-01181-3 Edigées “COMO LER A BIBLIA” « apareceu um eunuco ettope, ministro de Canda- ce, rainha da Etiépia... Tinha ido a Jerusalém em peregrinagdo, e estava voltando para casa. Ia sen- tado em seu carro, lendo o profeta Isatas. Entéo 0 Espirito disse a Filipe: ‘Aproxime-se desse carroeo acompanhe’. Filipe correu, ouviu o eunuco ler o profeta Isaias, e perguntou: Vocé entende oque esté lendo?’ O eunuco respondeu: ‘Como posso entender, se ninguém me explica?’ Entéo convidou Filipe a subir e a sentar-se junto a ele. ...Entéo 0 eunuco disse a Filipe: Por favor, me explique: de quem o profeta esté dizendo isso? Ele fala de si mesmo, ou se refere a outra pessoa? Entéo Filipe foi explicando” (At 8,27-31.34-35a). A série “Como ler a Biblia” 6, ao mesmo tempo, simples e ousada. E simples porque nao pretende ser um comentdrio a cada livro da Biblia, e sim uma chave de leitura, uma espécie de lanterna que nos ajuda a focalizar ea enxergar, no seuconjunto, um ou mais livros biblicos. Mas é também uma proposta ousada, pois estimula a ler os textos com os pés no 5 chao da existéncia, jamais perdendo de vista os anseios de vida e liberdade do nosso povo. Nao temos a pretensao de ser como Filipe, pois a Biblia nao pertence aos estudiosos, mas ao povo. Nossa tarefa esta sendo a de nos aproximar do povo, acompanhé-lo, sentar junto a ele escutando, pergun- tando eindicando possiveis caminhos para a compre- ensdo. Para tanto tivemos a coragem de sintetizar, num subtitulo, o possivel eixo em torno do qual gira o livro em questao. Preparamos estes optisculos para as pessoas que se retinem em torno da Biblia, fato este que traduza presenga do Espirito em nossa caminhada. Como o etiope que volta para casa, o povo busca hoje o modo adequado de encarnar a Biblia na vida e na socieda- de. Nossoesforgo éjustamente o de ajuda-loa entender 0 que esta lendo enquanto prossegue sua viagem na esperanga e na alegria (cf. At 8,39). Para tanto, estes livrinhos partem sempre da situag&o que os gerou, abrindo pistas para sua compreensdo no hoje da nossa caminhada. Esperamos que essa série traga novas luzes para as pessoas e comunidades, fazendo ressoar de novo o louvor de Jesus: “Eu te louvo, Pai, Senhor do céue da terra, porque escondeste essas coisas aos sdbios e inteligentes, e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, porque assim foi de teu agrado” (Mt 11,25-26). A EDITORA rista: og » po © povo, 1o povo, ergun- ompre- fetizar, al gira as que aduza yom0 0 >» modo. cieda- tender em na , estes serou, je da ; para 10V0 0 weda 10s & , Pai, TORA Inrropu¢Ao O LIVRO E 0 TEMPO DE MIQUEIAS O que chamamos livro do profeta Miquéias é, na verdade, um complexo de escritos, cuja feigao final é aque temoshoje. Os estudiosos distinguem af escritos de épocas diversas, sendo que se poderia falar de textos do profeta Miquéias propriamente dito e tex- tos que outros autores mais tarde acrescentaram ao livro. O profeta Miquéias e o seu tempo Conforme Mq 1,7, Miquéiasé origindriodeMorasti, uma vila nointerior doreinodeJuda. Essa localidade se encontrava na Planicie, a regidéo mais fértil e produtiva do pafs. Grande parte da produgao de trigo ecevada safa dos campos ai cultivados. O profetaera, portanto, de origem camponesa e isso pode-se perce- ber através de sua linguagem e dos temas por ele abordados. A mengao dos reis Joatéo, Acaz e Ezequias dao a entender que Miquéias desenvolveu sua atividade profética durante um longo tempo, talvez entre os anos 740-700 a.C. Ele era, portanto, contemporaneo de Isafas. Enquanto este era da cidade e tinha men. talidade urbana, Miquéias, sendo camponés, busca. va na cidade as raizes dos males que atingiam o campo. Era assim um porta-voz dos interesses dos camponeses. Além do problema permanente da exploragao do campo pela cidade, a sua regido enfrentava o proble. ma da guerra: a Assiria era uma grande poténcia na 6poca e cobigava néo sé as terras férteis da Judéia, mas também 0 acesso ao Egito, que se conseguia através dessa regido. Assim, os problemas se acumu- laram: campo explorado pela cidade, e ambos cobica- dos pelo estrangeiro. Os textos que pertencem ao profeta Miquéias propriamente dito e que viveu nessa época sao: 1,2- 2,11; 3,1-12; 6,1-7,7. Acréscimos posteriores Miquéias fazia severas criticas A cidade e aos governantes, anunciando sua ruina. Autores poste- riores tentaram criar, a partir da atividade de Miquéias, um caminho novo. Sua preocupagao era apresentar uma perspectiva de esperanga, desde que houvesse um chefe e a cidade se alicergasse em bases justas. Vendo as ameagas do profeta ja realizadas, eles procuraram trazer uma nova esperanga. Esses acréscimos entremeiam os ordculos de Miquéias, 8 quias dio a a atividade ez entre og emporaneo tinha men- nés, busca- atingiam o resses dos loracao do ao proble- oténcia na la Judéia, conseguia se acumu- os cobiga- Miquéias so: 1,2- le e aos 2s poste- Jade de do era sde que m bases jizadas, . Esses quéias, temperando com esperanga as palavras mais duras do profeta. Os textos que foram acrescentados estao em 2,12- 13; 4,1-5,14; 7,8-20. Lendo 0 livro na sua fei¢do global Em vez deler o livro original de Miquéias e depois os acréscimos a ele feitos, vamos tomd-lo no seu conjunto, vendo o que o livro, na sua redagao final, nos quer transmitir. Para isso, vamos enumerar alguns temas que nao seguirao a ordem original do livro, mas ofereceraio um roteiro, através do qual chegaremos & mensagem de Miquéias e a seu signi- ficado para 0 nosso tempo. | Primeira parte Os inimigos do povo 1 A CIDADE IDOLATRA Miquéias comega denunciando violentamente a injustiga da cidade (1,2-7). Ele convoca um processo de julgamento, onde personificara a acusagéo de Deus contra a cidade de Jerusalém, que era osimbolo do povo em alianga com Deus. Naquele tempo, ojulgamento tinha a forma de um debate ou briga judicial em que as partes interessa- das num acordo discutiam os problemas diante de testemunhas, que faziam as vezes de jurados. No texto, as testemunhas convocadas so a propria rea- lidade, que confirma a fidelidade de Deus contra a infidelidade daqueles que conduzem a nagiio (1,2-4). A acusagio Samaria era a capital do Reino de Israel ou Reino do Norte, também chamado Jacé. Tal cidade, com o reino todo, fora tomada pelos assirios em 722 a.C. E provavel que o profeta tivesse originalmente dirigido 13 <_ a cla essa acusacao. Mais tarde 0 ordculo é dirigiag também contra Jerusalém, a capital do R, eino de Juda ou Reino do Sul. Qual é a acusagio contra Jerusalém e Juda? Em poucas palavras: Jerusalém é o lugar alto de Juda (1,5). No Antigo Testamento, os “lugares altos” eram tradicionalmente os locais de culto as divindades ligadas a fertilidade da terra, onde a prostituigéio era o rito central. Era considerado um culto idolatries porque significava uma traicao ao culto a Javé. Ora, © culto a Javé era a prerrogativa central de Jerusa. lém, considerada o simbolo da alianga de Deus com seu povo. Desse modo, podemos perceber a violéncia da acusagao de Miquéias: de lugar de culto a Javé, Jerusalém se tornou o local da idolatria, da prostitui. go. Isso relembra o destino de Samaria, que 0 pro- feta promete também para Jerusalém: como conse- qiiéncia da idolatria, Jerusalém serA arrasada e ficard em ruinas (1,6-7). A corrupgiio da cidade Miquéias fala de prostituicao, e essa palavra nos lembra a infidelidade que se expressa no abandono do marido legitimo para correr atrés de outros amantes. E evidente que o profeta nao est criticando as prostitutas, mas toma a prostituigdo como simbolo da infidelidade para com Javé, uma vez que ela estava ligada aos cultos nos “lugares altos”. O profeta nao condena pura e simplesmente 0 po- vo da cidade. Sua acusagao vai contra os chefes ¢ 14 governantes, isto 6, aqueles que deveriam zelar pelo direito e pela retidao, ou seja, a justiga: “Ougam isto, chefes da casa de Jacé; prestem atenc¢do, governantes de Israel, vocés que tém horror ao direito e entortam tudo o que é reto; constréem Sido com sangue e Jerusalém com perversidade” (3,9-10). A acusagéo 6 direta. Chefes e governantes tém horror ao direito e entortam tudo 0 que é reto. Con- seqtiéncia? A cidade é construida com sangue e per- versidade. Em outras palavras, a cidade se edifica gragas ao crime perverso que consome vidas. Mas 0 profeta vai em frente: “Os chefes de vocés proferem sentenca a troco de suborno” (3,11). Nao sdo os mesmos chefes do v. 9. A mengao de “sentenca” mostra que se trata dos magistrados — os juizes que tém a fungao de administrar a justiga, defendendo o fraco e o pobre. Contudo, em vez de servir ao povo, eles servem a classe dominante em troca de suborno. Quando o pobre e o fraco nao podem contar mais com a protegao da justiga, com o que irdo contar? “Seus sacerdotes ensinam a troco de lucro” (3,1). No Antigo Testamento, os sacerdotes eram guar- dides do documento da Alianga e o interpretavam pa- ra as diversas situagdes. Quando uma pessoa tinha duividas a respeito do que fazer, consultava o sacer- 15 —_ ——————w rr raeeeere dote e este Ihe dava uma instrugao ou ensinamento (= lei). Contudo, também estes estdo corrompidos ¢ subordinam os ensinamentos ao dinheiro e aos in. teresses da classe dominante. Ou seja: esta os paga muito bem para que eles conduzam as situagdes de acordo com os interesses de quem os paga. “Seus profetas dao ordculos por dinheiro” (3,11). A fungo dos profetas de corte era assessorar o governo de modo que este pudesse governar com seguranga e prudentemente tomar atitudes oportu- nas que correspondessem a vontade de Deus. Contu- do, Miquéias denuncia tais profetas que, em troca de dinheiro e bajulagao, falsificam a vontade de Deus para agradar aqueles que os consultam. Magistrados, sacerdotes e profetas cram as colu- nas que sustentavam o direito e a justiga. Todavia, Miquéias denuncia que eles se corromperam comple- tamente, deixando de defender o povo para, em troca de privilégios, servir aos chefes e governantes que tém horror ao direito e entortam tudo o que é reto. Tornam-se assim ciémplices da perversidade e do derramamento de Sangue inocente. A suprema ousadia ORT en het A suprema ousadia da cidade e de seus chefes, apesar de toda a corrupeao que eles sustentam e promovem, é ainda terem a coragem de dizer que Deus est4 nomeio disso tudo. Emais ainda: que Deus os protege. E o mesmo que tornar Deus ciimplice da injustica e transformar a religiéo em mascara para esconder a corrupgio. ake Jerusalém é uma cidade idélatra porque esta sen- do construida com o sangue inocente e a injustiga. Em vez de cidade em alianga com Javé que dé a vida, ela se tornou a cidade dos interesses injustos que fabricam a morte. Continuando a pensar... 1. Quando é que um lugar considerado sagrado se transforma em antro de corrup¢ao? 2. Quando a cidade se corrompe, de quem é a culpa? 3. Quais as instituigdes que deveriam zelar pela justica hoje, em beneficio do povo? Isso aconte- ce? 4. Quais as idolatrias que existem nas grandes cidades? 5. De que modo a religiao pode ser usada para disfarce da injustiga? Cite exemplos e frases que usam 0 nome de Deus para encobrir a injustiga. q | | 1 | { | | 2 QUANTO PIOR, MELHOR? Nao bastasse a corrupcdo interna, que deixa 0 povo sem possibilidade de recorrer a ninguém, ha também outras dificuldades. Nesse tempo, a Assiria estA continuamente de olho na Palestina, pois ai se encontra o corredor para chegar até o Egito, outra grande poténcia. Multiplicam-se as investidas do estrangeiro sobre um povo ja cheio de problemas. Além disso, a classe dominante do reino de Juda tira proveito da situagao, desapossando ainda mais os camponeses de suas casas e campos. A guerra devastadora (1,8-16) Numa das investidas dos assirios, a regiao natal do profeta Miquéias é assolada de norte a sul, colo- cando em perigo inclusive Jerusalém, a capital. O texto é bastante corrompido, mas nele podemos perceber que o profeta lamenta de forma poética a ruina de varias cidades do territério. E dificil tradu- 18 INN ee zir o texto, pois das cidades. Nocentroda ainterpretagac esta acontecen portas de Jeru esta atribuindc ea devastacao que essa desgr: a capital que Perguntamos, culpas tao gra que esta de fat Os aproveita Enquantoa um grupo que} povo. Pelo cont “planejando a campos, é os r Assim oprime: prietdrio e a Quem ées cidade que v propriedades vidas e provav lutar na gue! hoje chamam« 1 nao respeitan (2,1). Qual p que compra o! agirem livre zir o texto, pois ele usa jogo de palavras com os nomes das cidades. Nocentro da descrigdo das desgragas encontramos ainterpretagao profética que mostra o sentido do que esta acontecendo: “A desgraca desceu de Javé até as portas de Jerusalém” (1,12). Note-se que o profeta esta atribuindo & agao de Javé a invasao estrangeira e a devastago que ela provoca. O mais importante é que essa desgraca chega até as portas de Jerusalém, a capital que centraliza os poderes sobre o pais. Perguntamos, porém: Seré que o povo todo tem culpas to graves para ser julgado assim? Quem é que esta de fato sendo julgado? Os aproveitadores da situagao (2,1-5) Enquanto a guerra devasta a regido, encontramos ‘um grupo que ndo esta preocupado com a situagao do povo. Pelo contrério, estado deitados tranqiiilamente, “planejando a injustiga e tramando o mal... cobigam campos, e os roubam; querem uma casa, e a tomam. Assim oprimem ao homem e & sua familia, ao pro- prietério e @ sua heranca” (2,1-2). Quem 6 esse grupo? Ele é formado por gente da cidade que vai pouco a pouco se apossando das propriedades dos camponeses, enfraquecidos por di- vidas e provavelmente ausentes da propriedade para lutar na guerra. Trata-se, portanto, daqueles que hoje chamamos delatifundidrios. Na sua cobiga, eles ndo respeitam nada, pois “tém o poder em suas maos” (2,1). Qual poder? Certamente o poder econémico, que compra 0s outros poderes, abrindo caminho para agirem livremente, satisfazendo sua insacidvel 19 vmbicionam 840 © nimigos do meu povo: De quem vocés exigem & veste; a vocés tratam como se - yocés expulsam da felici- mulheres do meu povo, berdade que ew thes Por um nada vocés ortdvel” (2,8-10). “Sao voces 08? 4 sem o ™ dade de seus lares as mu» etiram dos seus filhos ali tinha dado para sempre... exigem uma hipoteca insup' Segundo o texto, oS métodos usados pelos latifun- didrios sao: — despojar completamente aquel: previvem. Nao se contentam com 0 P: tiram até a camisa; —tratam como inimigo 0 camponés pacifico, que vive tranqiiilamente em sua pequena propriedade, porque este atrapalha a sua sede de expandir seus latifiindios; — nao respeitam mulheres n cando-as de suas casas e reduzin' — cobram juros insuportaveis de modo camponés endividado tem que entregar sua proprie- dade para pagar a divida. eects tice aproveitadores da situagao dificil do 7 les, quanto pior o povo estiver, mais facil se torna conseguir 0 que eles desej ES i des dificei lesejam. E nas situa- g6es dificeis que os espertos mais a: it: enriquecer. proveitam para sé les que mal so- alet6, mas lhes em criangas, arran- do-as & escravidao; que o 20 eae O julgamento de Javé o:De quem . Agora entendemos por que o aaah ees a veste; g | ainvasdoestrangeira’ comojulgamento: le. De cont ete | Jerusalém (1,12). Na verdade, ole esta se referin loa nda felici. | esses latifundidrios aproveitadores: meu povo, | “Rstou planejando contra essa gente uma jue eu lhes | desgraga, da qual nao poderdo esconder o ada vocés / pescogo, nem poderéo andar de cabega } ” (2,8-10). | erguida. Seré um tempo de desgraga. Nesse I | dia, vdo zombar de vocés, cantando esta } s latifun- lamentagao: Fomos completamente saquea- t dos, a heranga do meu povo foi dada a outro; I » mal so- | quem ird devolvé-la? Os invasores é que sor- mas lhes | teiam nossos campos’. Por isso, vocé nao terd } | quem sorteie os lotes na assembléia de Javé } | (2,3-5). | fico, que i riedade, ) De que adianta aos latifundidrios acumularem } dir seus terras e bens se 0 invasor estrangeiro vai tomar tudo | isso para si? Os campos que eles roubam serdo aarran: | sorteados entre os inimigos. Af esta ° julgamento de avidio: Javé, realizando-se através dos movimentos da his- ’ | téria, para julgar e condenar a injustiga com que os que 0 | poderosos massacram o povo. No fim, eles acabam roprie- sendo massacrados pelo inimigo da mesma forma com que tinham massacrado 0 povo. ficil do - is facil i Se situa- Como vemos, o camponés é devorado por todos os ara se lados: explorado pelos poderosos latifundiarios, ma- logrado pelos seus governantes e espoliado pelo es- 21 ee I ee trangeiro, nao Ihe resta quase nenhuma chance de Sobreviver. O pior de tudo 6 que, na maioris das vezes, ele nem sabe contra quem lutar. Quais sao og / seus inimigos? Estes nao se expéem facilmente, poig $ fo 9 g i g i g ; 5 BR 5 i z : Continuando a pensar... wi 1. Nao temos guerra em nosso pais. Como os paises estrangeiros exploram nosso Povo camponés e se apropriam de suas terras? Como os latifundidrios fazem para aumentar as suas propriedades? Para onde vai o agri- cultor desapossado? 3. O que pensar da ocupacao de terras? F roubo ou recuperagéio? > de das 0 Os ois pa- ém 3 UMA ESTRUTURA A SERVICO DO LATIFUNDIO Para conseguir 0 que querem, os latifundidrios contam com uma estrutura montada para colaborar com eles e usufruir os mesmos interesses. Trata-se das forgcas politicas, juridicas, econémicas e religio- sas sediadas na cidade, com seus interesses voltados & exploragdo do campo e dos camponeses. Toda forga dos textos estA na dentincia explicita que o profeta Miquéias faz para desmascarar os mecanismos ocul- tos que geram a miséria do povo do campo. t Chefes e governantes Em 3,1-3, Miquéias ataca aqueles que sao os maiores respons4veis pela organizagao social, e que por isso mesmo deveriam conhecer o direito. Contu- 23 on OS air viv ct nit EN ve ett nr TE TH PN PA EE ie DER do, sdo eles os primeiros a violar o direito ea triturar 0 povo: “Vocés séio gente que devora a carne do mey povo e 0 esfola; quebra seus ossos e os faz em pedagos, como carne na panela, como um cozido no caldeirao” (3,3). De fato, os chefes politicos so os primeiros respon- sdveis pelo bem-estar do povo que eles governam. Esse bem-estar significa proteger 0 povo que eles governam (relagaio internacional) e levar 0 povo a viver a justica eo direito (organizagao da sociedade), Ora, na Biblia, ajustiga 6 a defesa do fracoe do pobre. Um governo que enfraquece 0 povo esta diretamente contra a sua fungdo, principalmente quando esta lhe foi confiada pelo préprio povo. E o que dizer de um governo que se torna ctimplice dos grandes do pais ou de outros paises para entregar na mao deles 0 povo como presa facil? Assessores do governo Em 2,6-7 e 3,5-8, Miquéias denuncia os profetas que assessoram os governantes. A fungdo desses pro- fetas seria a de aconselhar o governante para que e- xerga um governo justo. Todavia, eles se desviam de sua fungao e, em troca de privilégios pessoais, pas- sam a aprovar e apoiar tudo o que o governo preten- de: “... extraviam o meu povo... anunciam a paz quando tém algo para mastigar, mas decla- ram guerra contra os que nada lhes poem na boca” (3,5). 24 — ee ay Te ee O pior de tudo é que esses assessores que traem 0 povo ainda tém a coragem de dizer que tudo esta bem, as coisas estdo corretas e que Deus abengoa tudo: “A desgraga néo caird sobre nés. Por acaso, a casa de Jacé foi amaldigoada? Acabou a ] paciéncia de Javé? E isso que ele costuma fazer? Por acaso, sua promessa nao é de \ béngao para quem vive com retidao?” (2,6-7). Contra esses “profetas” levanta-se Miquéias, 0 verdadeiro porta-voz do povo. Com efeito, a fungao do profeta legitimo é preservar os direitos do povo contra todos aqueles que os violam. O grupo que controla a economia A base da economia em Juda era a produg&o agricola, desenvolvida principalmente na regio da Planicie. Grande parte das terras, porém, pertencia aos latifundidrios que moravam em Jerusalém. O restante das terras pertencia a pequenos agriculto- res e arrendatdrios que tinham que vender seus produtos nas aldeias ou pequenas cidades. O comér- cio em Jerusalém era dominado pelos grandes produ- tores que, em geral, concentravam também os pro- dutos dos camponeses mais pobres. Dessa forma, } tanto as propriedades como sua produgdo cafam nas maos dos latifundidrios, que passavam também a \ dominar o comércio, estabelecendo a seu bel-prazer os pregos dos produtos. E a esse grupo que Miquéias dirige sua critica em 6,9-16: 25 Rene cc saith neta wie ial eta Pe ae an ean 7 { “Acaso posso tolerar a casa do impio com seus tesouros ganhos injustamente, com suas me- aie didas falsificadas e detestdveis? Acaso devo tende desculpar balangas viciadas, sacolas cheias todos de pesos adulterados? Os ricos prosperam com aexploragdo, os seus habitantes s6 falam mentirasetémna boca umalingua mentirosa” (6,10-12). Além de agambarcar as propriedades, apossar-se da produgio e controlar o comércio, ainda praticam a | fraude (falsificagdo de pesos e medidas). Como se vé, = agandncia nao tem fim. Quem sai perdendocom tudo di isso? a A corrupgao se reproduz (7,1-7) A constatagao que Miquéias faz sobre o seu tempo é amarga: “Nao hé um sé fiel em nosso pais, néo sobrow um tnico homem correto; esté todo mundo de tocaia,cada um caga um irméo para matar!” (7,2). | Apés analisar a corrup¢ao das estruturas e perce- | ber que todas elas colaboram para a miséria do povo, i o profeta da um passo a frente: nao resta nada de / aproveitavel, nem um cacho de uva ou um figo y i tempordo. Em outras palavras, quandoas estruturas ' de uma sociedade se corrompem, a tendéncia é a | corrupedo atingir indiscriminadamente a todos, nu- 1 26 ween on Be ee ma reprodugaéo tal que ninguém escapa. Desde o maior até o menor, a ideologia do sistema injusto tendea se reproduzir em todos os niveis, corrompendo todos os tipos de relagao. E 0 que constata o profeta: “Essa gente tem mdaos habilidosas para prati- car o mal: o principe exige, o juiz se deixa comprar, o grande mostra a sua ambigdo. E assim distorcem tudo” (7,3). E claro que as pessoas so capazes de ver e criticar essa realidade que atinge a vida do povo. Contudo, a distorgao de que fala o profeta pode penetrar de tal modo as pessoas que estas transportam a desconfi- anga para dentro dos relacionamentos mais intimos: “E vocés nao acreditem no amigo, ndoconfiem no companheiro; conserve a boca fechada mesmo ao lado daquela que dorme no seu ombro. Pois o filho insulta o préprio pai, a filha se revolta contra a mde, a nora contra a sogra; e os inimigos de uma pessoa sGo da propria casa” (7,5-6). Desse texto podemos tirar uma conclusao: a moralidade das pessoas depende diretamente da ética do sistema em que elas vivem. Se o sistema é injusto, tende a criar a injustig¢a em. todas as pessoas, pois uma arvore ma no da frutos bons. Nao se trata de culpa pessoal, mas de reprodugo que determina o pensamento e a agao. De alguma forma, todos se tornam ctimplices e responsdveis pela situacao. 27 te disso? Desanimar e acomoday. se? Achar que é impossivel uma mudanga? Talvez o caminho seja exatamente aquele que foi tomado pelo profeta: gritar, denunciar e exigir transformagies radicais. Eoquefazer diant kee A andlise profética termina com uma sentenga condenatéria: “Por isso, por culpa de vocés, Sido seré arada como um campo, Jerusalém se tornaré um montdo de ruinas, e o monte do Templo sera uma colina cheia de mato!” (3,12). E claro que o “vocés” nao se dirige indiscrimi- nadamentea todoo povo. Seguindo todas as dentincias feitas pelo profeta, percebemos que 0 “vocés” se refere aos mantenedores dessa ordem social injusta. De fato, a destruigdo da cidade significa a destruigao do sistema injusto que age a partir dela. A cidade sera arrasada porque toda essa injustiga que dela se espalha é uma prova de que ela se entregou a idolatria, tornando-se infiel ao Deus da Alianga, que “exige praticar o direito, amar a miseri- cérdia, caminhar humildemente como seu Deus” (6,8). 28 Continuando a pensar... 1. Todo latiftindio 6 um roubo. Por que, do que e de quem? 2. Que meios os poderosos usam hoje para preservar e aumentar os seus latiftin- dios? 8. Deus deu a terra para todos. O que impede que muitos tenham o seu pe- dacinho de chao? 4. Todo mundo, no campo e na cidade, acaba vitima dos latifundiarios. Por qué? 5. Por que o sistema injusto contamina todas as relagdes? O que fazer diante disso? 6. Explique a frase: “Sobre toda proprie- dade pesa uma hipoteca social” (Jodo Paulo II). 29 Segunda parte O Caminho da esperan¢a Fc NRE Rn A ERE We aE eS iat A EL Sat Eee Pe Ranh mes mata ae ae a EAE 1 A VERDADEIRA RELIGIAO No clima da Alianga, tudo o que acontece atinge os dois parceiros. Qualquer irregularidade é atribuida aos dois. Ora, os chefes corruptos tém a audacia de dizer que Javé esta do lado deles e os abengoa (2,7; 3,11). Isto equivale a tornar Deus cumplice da in- justiga, atribuindo-Ihe o mal produzido pelo préprio homem. Miquéias, porém, assume o lugar de Deus no de- bate judicial para condenar o verdadeiro culpado e absolver o inocente. “O que fiz contra vocé?” Mq 6,1-5 apresenta a autodefesa de Deus sob a forma de uma retrospectiva histérica, diante das testemunhas (“montanhas e colinas”, isto 6, a prépria realidade). Diante da injustiga do parceiro, Javé relembrao fato fundamental que deu origem ao povo: a libertagdo da escravidao e a lideranga até que o 33 povo chegasse a “terra onde corre leite e mel” (cf. Ex 3,8). O povo é colocado diante da queixa de Javé: “Meu povo, o que é que eu fiz contra vocé? Em que o maltratei? Responda-me’ (6,3), A gravidade da queixa, junto coma lembranga da libertagao, adquire toda sua forga senos lembrarmos que a libertagao era para sair da terra da Opressiio e construir uma sociedade justa, fraterna e igualité- ria. Tal era 0 desejo de Javé e também do Povo. Contudo, 0 que aconteceu? A terra Prometida, que era destinada a todos, tornou-se latifiindiona maode poucos, deixando o povo na miséria (cf. Is 5,8). Em outras palavras, Javé quer dizer que 0 povo renun- ciou 4 sua libertacdo e voltou atrds na histéria, recriando na propria terra prometida um novo Egito. \ Aurgéncia da conversao A dentincia de Javé corresponde a tomada de consciéncia do erro, e agora busca-se uma conversio que ainda nem se consegue vislumbrar: “Como me apresentar a Javé? Como é que vou me ajoelhar diante do Deus das alturas? Irei aelecom holocaustos, levando bezerros deum ano? Seré que milhares de carneiros ou a oferta de rios de azeite agradardo a Javé? Ou devo sacrificar o meu filho mais velho para pagar os meus erros, sacrificar o fruto das minhas entranhas para cobrir 0 meu peca- do?” (6,6-7). 34 Notemos qt de si uma idé culto e sacrific culpa através « na forma de ce Deus quer? A religiao qu: Miquéias dei “Ohom Javé exi misericc seu Deu. O texto pode caminhar humil e amar a miseri primeiro lugar u como desculpa y quer, sim, uma justia dele. Praticar o dir fraco e do pobre exploram. Amar comportamento fiel, capaz de ass explorado. A exi homens se cony: Para formar um: atravésda partill = LS Notemos que todas essas perguntas tém por tras de si uma idéia de religiao: satisfazer a Deus com culto e sacrificios, ou seja, resolver os problemas de culpa através de uma religiao entendida meramente na forma de ceriménias rituais. Sera que é isso que Deus quer? Areligiio que Deus quer Miquéias deixa bem claro qual é 0 desejo de Javé: “O homem, jé foi explicado 0 que é bom eo que Javé exige de vocé: praticar o direito, amar a misericérdia, caminhar humildemente como seu Deus” (6,8). O texto pode ser entendido do seguinte modo: caminhar humildemente com Deus €é praticar o direito e amar a misericérdia. Ou seja: Deus nao quer em primeiro lugar um culto dirigido a ele, muitas vezes como desculpa para a conduta injusta de vida. Ele quer, sim, uma vida nova que espelhe a prdépria justiga dele. Praticar o direito é exercer a justiga em defesa do fraco e do pobre contra aqueles que os oprimem e exploram. Amar a misericérdia é ser coerente com o comportamento de Javé na Alianga: a solidariedade fiel, capaz de assumir a causa do povo empobrecido e explorado. A exigéncia de Deus, portanto, 6 que os homens se convertam da relagéio de desigualdade para formar uma relagdo social justa e igualitaria, através da partilha de um sistema econdmico onde os 35 bens s&o distribuidos de tal maneira que gerem vida para todos, e onde todos possam participar de fato do arranjo social e das decisdes que encaminham gq histéria do povo. ae ok ok Ao Deus que interpela, relembrando sua fidelida- de e agaio libertadora, o Povo deve responder com a pratica da justiga, que eliminaa opress&o e coloca as bases para uma nova sociedade. O culto celebrativo s6 tem sentido quando é expressao da justiga vivida na pratica, pois néo hé nenhum sentido oferecer alguma coisa a Deus, quando ndo se procura viver segundo o seu projeto. A Deus ninguém pode enga- nar, nem subornar, pois ele néio se cala e denuncia a injustiga. Continuando a pensar... 1. Por que Deus recorda o fato do Exodo diante da situagdo no tempo de Miquéias? 2. Deus néo quer apenas o culto dentro de um templo. O que ele realmente exige? 8. O que vocé entende por religido? 4. Viver com Deus 6 praticar a justiga e a misericérdia. De que forma podemos tradu- zirisso dentro do sistema econémicoe politico em que vivemos? 36 2 A TRANSFORMACAO DA CIDADE O movimento de conversao nao é algo puramente individual, mas uma transformagado das relagdes que atinge toda a sociedade. A cidade antiga, fundada sobre a idolatria e a corrupgao, deve ser destruida para que, em seu lugar, aparega uma cidade nova fundada na justiga. Esse é o horizonte para o qual devem caminhar todas as nossas cidades. A destruigao da cidade injusta Miquéias havia predito que, por causa da injusti- ga, Jerusalém seria completamente destruida: “Por culpa de vocés, Siéo seré arada como um campo, Jerusalém se tornaré um montéo de ruinas, eo monte do Templo seré uma colina cheia de mato!” (3,12). De fato, Jerusalém foi tomada pelos babilénios em 586 a.C. e a previsdo do profeta se realizou. Muitos foram levados para 0 exilio na Babilénia e ai percebe- ram com nitidez a dentincia do profetae ojulgamento 37 de Deus (4,9-10). Poderiamos pensar que 0 povo fora exilado indiscriminadamente. Todavia, 0 costume era exilar a classe dominante, detentora dos meios de produgao e da organizagao politica do pais invadido, O povo em geral, e principalmente 0 povo pobre, permanecia na terra, trabalhando para pagar tribu- tos ao dominador estrangeiro (cf. 2Rs 25,12). Do desespero renasce a esperanga Presa dos grandes impérios, Jerusalém parece chegar ao seu fim na histéria. E a forma dela expe- rimentar o julgamento de Deus por todos os crimes que cometera. Todavia, o julgamento ndo é o fim: Jerusalém se reerguerd e, por sua vez, fard o julga- mento das nagées que a destrufram: “Levante-se, capital de Sido! Pise o trigo, pois eu lhe dou chifres de ferro e cascos de bronze, para que vocé possa esmagar povos numero- sos! A renda deles vocé vai consagrar a Javé, eas riquezas deles ao Senhor de todaa terra!” (4,13). Amesma esperanga nervosa reaparece em 7,8-20. A cidade, personificada, reage contra o opressor estrangeiro (veja S] 137). Ela reconhece o seu pecado e espera que Javé a liberte: “Devo suportar a célera de Javé, porque pe- quei contra ele, até que ele julgue a minha causa e me faca justica, até que me leve para a luz e eu contemple a sua justiga” (7,9). 38 3 ; Esses textos nos fazem pensar na maneira como Deus dirige a histéria. Ele se serve denagéesinimigas para castigar os crimes e infidelidades do seu povo. Todavia, as nagdes nado podem ultrapassar o seu papel de instrumento, aproveitando-se do seu poder para explorar e dominar. Caso contrario, elas prépri- 4 as sero julgadas e condenadas. Aesperanga é reforgada pela confianga no perdao, | que possibilitara a volta para o clima da Alianga: “Ele nos perdoard de novo: calcaré a seus pés as nossas faltas e jogard no fundo do mar todos os nossos pecados. Conservaras a fide- lidade para com Jacé e 0 amor para com Abrado, conforme juraste a nossos pais, desde os tempos antigos” (7,19-20). O resto fiel O exilio, na verdade, 6 uma grande depuragao do povo de Deus. Embora dominado pelas nagées, um pequeno resto ou grupo permanece fiel ou redescobre o projeto de Javé, mantendo-o vivo entre as nagées. Por isso ele é como 0 orvalho ou as chuvas, leao forte entre feras selvagens (5,6-8). Sua forga nao reside no poder, mas no conhecimento do projeto de Javé, capaz de destruir a guerra e a idolatria (5,9-14). Dessa forma, como testemunha do Deus verdadeiro, o resto fiel se torna semente de um futuro novo, aberto para a paz e vida para todos. 7 A cidade justa O sonho do resto fiel do povo é a restauragao da cidade, agora em bases justas. Dessa forma, Jerusa- 39 SoG cE ACes vie fost noose Aetna RA GEA Bi el Povos ¢ VO: lém se torna o centro de convergéncia de nagées que irao buscar nela um caminho no “Vamos correndo para o monte de Ja o Templo do Deus de Jaco; at apre seus caminhos, para seguirmosos se (4,2). vé, para nderemos US Tumos” O texto, portanto, expressa a esperanga Nao s6 nacional, mas de todos, de que um dia a cidade ge torne o lugar da justiga. O profeta explica: “Porque de Sido saird a lei e de Jerusalém vir a palavra de Javé! Ele seré o juiz da multidao dos povos, e dard sentencas para as nagées poderosas, até para as mais distantes, De suas espadas vGo fazer enxadas e de suas langas farao foices. Um povo nao vai mais pegar em armas contra outro, nunca mais aprenderdoa fazer a guerra. Cada um poderé sentar-se debaixo da sua parreira ou da sua figueira, sem ser perturbado, pois assim disse a boca de Javé dos exércitos” (4,2-4). A esperanga 6 que um dia a cidade viva segundo 0 projeto de Javé. Isso significa a paz como fruto da justiga, e portanto o fim do conflito entre cidade e campo: é o fim da luta competitiva e o inicio de uma era de producdo abundante, pois as armas serao transformadas em instrumentos para a produgao da vida. O grande sonho é que, de fato, o camponés possa usufruir tranqtiilamente da sua produgao. Quem iré construir essa cidade justa? Em 4,6-8, 0 40 a a a profeta responde que éoresto pobre, fracoe fiel. Besse povo, inspirado pelo projeto de Javé, que trara uma esperanga nova para todos, pois, consciente do que eraa cidade injusta, poderd construir uma sociedade diferente, governada pela justiga e pelo direito. ae ake O profeta Miquéias criticara violentamente a ci- dade, porque é dela que os poderosos controlam tudo segundo os seus interesses. Os textos acima citados so posteriores a Miquéias. A cidade-capital foi destruida, conforme ele anunciara. Agora, espera-se uma nova cidade, néo mais para explorar e oprimir opovo,mas para exprimir a legitima vocagdio humana: a partilha dos bens e da liberdade, dando lugar a um sistema econdmico e politico que, de fato, traga liberdade e vida para todos. Continuando a pensar... 1. De que forma a cidade injusta podera ser destruida? 2. Basta que a cidade injusta seja destruida? 3. O que vocé entende por “resto fiel”? 4, Séio os poderosos da economia e da politica que ndo constréem uma sociedade justa? Por qué? 5. Somente o projeto de Javé pode levar 0 povo A justia e A paz. Comente. 3 ESPERA DE UM CHEFE JUSTO Miquéias havia denunciado e condenado ainjusti- ¢a dos chefes e poderosos que abusavam do poder, sacrificando o povo. Esses chefes, mais tarde, incor- reram na sentenga profética que previa a sua ruina. De fato, com 0 exilio, os chefes perderam seu poder e, depois do exilio, por muito tempo, ndo houve mais autonomia politica e econémica em Juda. O povo ficou A espera de um lider que o chefiasse na construgao de uma nova sociedade. Essa expecta- tiva reflete-se num texto pés-exilico que encontra- mos no livro de Miquéias: “Mas vocé, Belém de Efrata, tao pequena entre as cidades de Judd! E de vocé que saird para mim aquele que hd de ser o chefe de Israel! A origem dele é antiga, desde tempos remotos... De pé, ele governard com a prépria forga de Javé, com a majestade do nome de 42 Ox LL S—_—— lll ooo Eo Javé, seu Deus. E habitarao tranqitilos, pois ele estenderdé o seu poder até as extremidades da terra. Ele préprio sera a paz” (5,1.3-4). O texto contém varias informagées. Belém é uma pequena cidade, uma espécie de periferia. De l4 saiu Davi, o lider popular que depois se tornou rei. Lem- brando-se de Belém e dizendo que o futuro chefe é de origem antiga, o texto coloca a figura de Davi como ideal do chefe esperado. Essa expectativa se funda- menta na fungdo politica exercida conforme um contrato com 0 povo: o povo paga tributos em troca de beneficios, entre os quais a protegao contraosinimigos ¢ a organizagao social conforme a justica e o direito. E isso que confere ao rei a propria autoridade de Javé. Assegurado por esse contrato, 0 povo poderé iiilo, certo de que o seu chefe nao o Nesse texto encontramosa expectativa popular de todos os tempos e lugares. Ela é simples, mas fun- damental, pois inclui o mais necessdrio para 0 povo diante dos seus governantes. Todavia, o que se vé na historia 6 uma longa sucessao de rupturas desse contrato: muitas vezes é o proprio governante que entrega 0 povo a0 inimigo, e é ele proprio quem instaura um clima de injustiga e violagao do direito. O evangelista Mateus relembra 0 texto do livro de Miquéias para demonstrar o messianismo de Jesus. Dessa forma, Jesus 6 visto como lider justo que ira chefiar o novo povo de Deus, ensinando-lhe o cami- 43 nho da justica. Depois de Jesus, a histéria fico um modelo concreto de exercicio de autorida serve ao bem comum, libertando o povo para a vije O desafio continua aberto para todos aqueles, poly ticos ou religiosos, que exercem qualquer forma dy autoridade. Javé sé confirma a autoridade daqueles que exercem a justiga. a com, ide que Continuando a pensar... 1. Como deveria ser um governante justo? 2. De onde esperar que venha um governante justo? 8. Hoje em dia, que tipo de contrato existe entre os governantes e 0 povo? 4. Jesus subverteu a idéia de autoridade. O que é uma autoridade, segundo Jesus? 44 uu com, le que | Vida, Polf- na de ueles 13 23 33 37 42 iNDICE “Como ler a Biblia” Introdugéo: O livro e o tempo de Miquéias PRIMEIRA PARTE: OS INIMIGOS DO POVO 1, A cidade idélatra 2. Quanto pior, melhor? 3. Uma estrutura a servigo do latifiindio SEGUNDA PARTE: O CAMINHO DA ESPERANCA 1. A verdadeira religiao 2. A transformacao da cidade 3. A espera de um chefe justo Série “COMO LER A BIBLIA” * Histéria do povo de Deus, Euclides M. Balancin * Como ler o livro do Eclesiastes, Ivo Storniolo - Euclides M. Balancin * Como ler o livro do Exodo, Euclides M. Balancin - Ivo Storniolo * Como ler o livro de Miquéias, Euclides M. Balancin - Ivo Storniolo * Como ler 0 evangelho de Mateus, Ivo Storniolo * Como ler o livro do Génesis, Ivo Storniolo - Euclides M. Balancin * Como ler o livro de Amés, Euclides M. Balancin - Ivo Storniolo * Como ler o livro de Jonas, Euclides M. Balancin - Ivo Storniolo * Como ler 0 livro de Habacuc, Euclides M. Balancin - Ivo Storniolo * Como ler o livro de Rute, Carlos Mesters * Como ler a primeira carta aos Tessalonicenses, José Bortolini * Como ler os livros de Samuel, Ivo Storniolo - Euclides M. Balancin Oni D Ediqao como ler aay O LIVRO DO GENESIS ORIGEM DA VIDA E DA HISTORIA Serre “Como Ler a Bir,” mes: ALFREDO Dos SANTOS OLIVA (ASO) - Caring : ema De Pauta Pepro(EPP)- Eucupes MarmnsB, aan “(eu - Féuix Moracuo (FM) - Ivo Storwio1o (I$) - José Bo; MB) RTO} Luiz Auzxanpne SoLaNo Rosst (LASR) - Myo Gran) Suicevuxt Nakanose (SN) Livros JA PUBLICADos Como ler 0 livre de Joe) Historia i oel, Lage Como ler o livro dean? Histéria do povo de Deus, EMB . cean me, 4s Pentareuco Como ler o livre de Jonge ASR Tivro do Génesis, IS-EMB Como ler o livro de Miquéias, Exp. Comolero a ns i b -IS Como ler o livro do E:xodo, EMB. Como lero tivro de ae ler 0 livro do Levitico, IS co lero loro dos Nimeros, IS __ Como ler... Habacue, EMB.ig Come ler 0 livro do Deuteronémio, an fas, LASR Historicos Como ler... Malaquias, SN Epp Como ler olivro de Josué, 18 g_EVANGELHOS E Aros Como ler o livro dos Sutzes, I — : wgelhos, FM Como ler o livro de Rute, CM Como ler 0 evangelho de Mateus, 15 Como leros livros de Samuel, ISEMB Como les evangelho de Marcos Como ler os livros dos Reis, IS ‘MB , Comoler... Esdras e Neemias, ASO Como ler o evan, 2 a igelho de Lucas, Is Game lero livro de Tobias, 1S-JB Como ler o evangetho de Joao, IB Como ler 0 livro de Judite, IS C le Atos dos Apést los, IS Como lero livro de Ester, 1S ome ler os Atos dos Apéstolos, Cannas DE Pauto & Apocauiess SaPtencuais : Como ler a carta aos Romanos, JB Como ter o tivro de J6, 18 Como ler a 14 carta aos Corintce, 3B (2m lero livre dos Salmos, MG Como ler a 28 carta aos Corintios, JB (ome lero Livro des Provérbios, IS Como ler a carta aos Galatas, 18 Como ler... Eelesiastes, ISEMB Como ler. a carta aos Filipenses, JB paMolero Cantico dos Cinticos TS. Como lera carta aos Colossenses, JB Be ee: Como ler @ primeira carta aos Tes: Como lero tivro da pabedoria, IS salonicensee Ih Como ler o livre do Eclesidstico, 18 Como ler a segunda carta aos Tes: Puoreras, Salonicenses, JB eh Cohn toro To Te ‘omo ler a 2% carta a Timéteo, Cong 2 stag fo NEP. Coma ler cars r ron Come toro oremtagses, LASR Como ler a carta a Filemon, JB moter lrg Daniel, Is Como ler a carta de Tiago, IS 70 de Oséias, EPP-SN Como ler 0 Apocalipse, JB Ivo Storniolo Euclides M. Balancin COMO LER O LIVRO DO GENESIS Origem da vida e da histéria 4 Ue y10 SA, Ae > [2 S S BIBLIOTECA O aa TESP ony Lose PAULUS “COMO LER A BIBLIA” “...apareceu um eunuco etiope, ministro de Canda- ce, rainha da Etiépia... Tinha ido a Jerusalém em peregrinacdo, e estava voltando para casa. Ia sen- tado em seu carro, lendo o profeta Isatas. Entéo o Espirito disse a Filipe: Aproxime-se desse carroeo acompanhe’. Filipe correu, ouviu o eunuco ler o profeta Isatas, e perguntou: ‘Vocé entende o que esté lendo?’ O eunuco respondeu: ‘Como posso entender, se ninguém me explica?’ Entdo convidou Filipe a subir e a sentar-se junto a ele. ...Entao o eunuco disse a Filipe: ‘Por favor, me explique: de quem o profeta esta dizendo isso? Ele fala de si mesmo, ou se refere a outra pessoa?’ Entao Filipe foi explicando” (At 8,27-31.34-35a). A série “Como ler a Biblia” 6, ao mesmo tempo, simples e ousada. E simples porque nao pretende ser um comentdrio a cada livro da Biblia, e sim uma chave de leitura, uma espécie de lanterna que nos ajuda a focalizar ea enxergar, no seu conjunto, um ou mais livros biblicos. Mas é também uma proposta ousada, pois estimula a ler os textos com os pés no 5 oe chao da existéncia, jamais perdendo de anseios de vida e liberdade do nosso Povo. Sta og Na&o temos a pretensdo de ser como Filipe, .: Biblia nao pertence aos estudiosos, mas os Pois Nossa tarefa esta sendo a de nos aproximar ae Povo, acompanhé-lo, sentar junto a ele escutando, pgeo tando eindicando possiveis caminhos para es oa ensdo. Para tanto tivemos a coragem de sinteti num subt{tulo, o possivel eixo em torno do qual a" o livro em questao. a Preparamos estes opuisculos para as pessoas que se retinem em torno da Biblia, fato este que traduz q presenga do Espirito em nossa caminhada. Como. etfope que volta para casa, 0 povo busca hoje o mode adequado deencarnar a Biblianavidaena sociedade Nosso esforgo é justamente o de ajuda-lo a entender 0 que esta lendo enquanto prossegue sua viagem na esperanga e na alegria (cf. At 8,39). Para tanto, estes livrinhos partem sempre da situagéio que os gerou, abrindo pistas para sua compreenséo no hoje da nossa caminhada. Esperamos que essa série traga novas luzes para as pessoas e comunidades, fazendo ressoar de novoo louvor de Jesus: “Eu te louvo, Pai, Senhor do céue da terra, porque escondeste essas coisas aos sdbios e inteligentes, e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, porque assim foi de teu agrado” (Mt 11,25-26). A EDITORA INTRODUCAO O LIVRO DAS ORIGENS Génesis é uma palavra grega que significa nasci- mento, origem. O primeiro livro da Biblia foi assim chamado porque nele encontramos as narrativas sobre as origens do mundo, da humanidade e do povo de Deus. Poderfamos pensar que essas narrativas sdio histéria no sentido atual daquilo que um historiador faz. Sdo antes reflexdes do povo sobre suas origens e a origem das coisas. Fazendo isso, porém, 0 povo mantém um olho na sua realidade presente e 0 outro no passado. O que vé aqui e agora, ele projeta no passado distante e até na origem. Seu interesse nao é tanto dar uma explicagao cientifica ou histérica sobre o passado, mas contar o passado para explicar idade que se vive no presente. joes nao seja histéria propriamente dita, er que 0 seu contetido é muito mais

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