Você está na página 1de 401

See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.

net/publication/305641761

O Novo Éden. A fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e


cronistas desde a descoberta do rio Amazonas por Pinzón (1500) até o Tratado
de Santo Ildefonso (1777), com t...

Book · January 2002

CITATIONS READS

9 326

4 authors, including:

William Overal José Roberto Pujol Luz


Museu Paraense Emilio Goeldi - MPEG University of Brasília
64 PUBLICATIONS   1,881 CITATIONS    107 PUBLICATIONS   602 CITATIONS   

SEE PROFILE SEE PROFILE

Some of the authors of this publication are also working on these related projects:

Estudo de imaturos de Stratiomyidae Neotropicais. View project

All content following this page was uploaded by José Roberto Pujol Luz on 13 September 2017.

The user has requested enhancement of the downloaded file.


O NOVO ÉDEN
A Fauna da Amazônia Brasileira nos Relatos de Viajantes e
Cronistas desde a Descoberta do Rio Amazonas por Pinzón (1500)
até o Tratado de Santo Ildefonso (1777)
Museu Paraense Emílio Goeldi
Coleção Alexandre Rodrigues Ferreira

O NOVO ÉDEN
A Fauna da Amazônia Brasileira nos Relatos de Viajantes e
Cronistas desde a Descoberta do Rio Amazonas por Pinzón (1500)
até o Tratado de Santo Ildefonso (1777)

Com transcrição dos principais texos

Homenagem do Museu Paraense Emílio Goeldi ao


Quinto Centenário do Descobrimento do Rio Amazonas (Janeiro de 1500)
e ao Quinto Centenário do Descobrimento do Brasil (Abril de 1500)

Nelson Papavero
Dante Martins Teixeira
William Leslie Overal
José Roberto Pujol-Luz

Belém, Pará
2000
MUSEU PARAENSE EMÍLIO GOELDI

GOVERNO DO BRASIL
Pesidência da República
Presidente Fernando Henrique Cardoso

Ministério da Ciência e Tecnologia – MCT


Ministro Ronaldo Mota Sardenberg

Museu Paraense Emílio Goeldi - MPEG


Diretor Peter Mann de Toledo
Diretor Adjunto de Pesquisa David Conway Oren
Diretor Adjunto de Difusão Científica Antonio Carlos Lobo Soares

Comissão de Editoração Científica - COED


Presidente Lourdes Gonçalves Furtado
Editora-Chefe Iraneide Silva
Equipe Editorial Laïs Zumero, Iraneide Silva, Socorro Menezes
Bolsistas Roberto Silva, Sandoval Ferreira

Projeto Gráfico William Overal, Iraneide Silva


Editoração eletrônica Israel Gutemberg
Capa Mapa Guyane Portugaise, de S. de Bellin, 1764,
Paris (cedido por David Oren)

PATROCÍNIO

O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e


cronistas desde a descoberta do rio Amazonas por Pinzón (1500) até o
Tratado de Santo Idelfonso (1777) / Nelson Papavero ... [et al.]. –
Belém: Museu Paraense Emílio Goeldi, 2000.

381 p.: il. – (Coleção Alexandre Rodrigues Ferreira)

ISBN: 85-7098-063-9

1. Amazônia - Brasil - História natural. 2. Amazônia - Brasil -


História - Descobrimento e explorações. 3. Amazônia - Brasil - Viajantes. I.
Papavero, Nelson. II. Teixeira, Dante Martins. III. Overal, William Leslie.
IV. Pujol-Luz, José Roberto. V. Série.
CDD: 508.811

© Direitos de Cópia/Copyright 2000


Por/by CNPq/Museu Goeldi
Ao Revmo. Pe. Joaquin García Sanchez,
De Iquitos, Loreto, Peru,
Por seu trabalho apostólico,
Por sua esplêndida série
“Monumenta Amazonica”
E por resgatar a memória da Amazônia
Sumário

APRESENTAÇÃO
PREFÁCIO E AGRADECIMENTOS
1. O DESCOBRIMENTO DA FOZ DO RIO AMAZONAS POR PINZÓN (1500)
E A PRIMEIRA CITAÇÃO DE UM ANIMAL BRASILEIRO .............................................. 1
2. A VIAGEM DE DIOGO NUNES EM 1538 ....................................................................... 3
3. A VIAGEM DE ORELLANA RIO AMAZONAS ABAIXO NOS ANOS DE
1541 E 1542 E A CRÔNICA DE FREI GASPAR DE CARVAJAL ......................................... 7
O livro de Frei Gaspar de Carvajal .............................................................................. 8
As escassas referências a animais amazônicos ............................................................. 10
A lenda das Amazonas .................................................................................................. 11
A “Relación” de Frei Gaspar de Carvajal ........................................................................ 12
4. A RELAÇÃO DE FRANCISCO VÁZQUEZ SOBRE A VIAGEM DE PEDRO
DE URSÚA E LOPE DE AGUIRRE (1559-1561) PELO AMAZONAS .................................... 33
Manuscritos referentes à viagem de Ursúa e Aguirre .................................................... 34
Animais citados na crônica de Francisco Vásquez ......................................................... 35
Texto da ‘Relación’ de Francisco Vázquez ...................................................................... 35
5. NOTAS SOBRE RELATOS CURTOS DO SÉCULO XVII ..................................................... 79
William Davies (1614) ................................................................................................... 79
O ‘Reys-boeck’ de 1624 ................................................................................................. 79
‘Korte en Wonderlijke Beschryvinge’ .............................................................................. 80
6. A EXPLORAÇÃO DO AMAZONAS PELO SENHOR DE LA RAVARDIÈRE
(1613-1614) E A “HISTÓRIA DOS ANIMAIS E ÁRVORES DO MARANHÃO” ...................... 83
O livro de Claude d’Abbeville sobre o Maranhão (1614) ................................................. 84
Os portugueses recuperam o Maranhão ........................................................................ 85
Frei Cristóvão de Lisboa no Maranhão e no Pará .......................................................... 86
A História natural e moral do Maranhão de Frei Cristóvão de Lisboa ............................. 87
O Códice “Animaes do Maranhão” ................................................................................. 88
A hipótese de que os originais eram franceses .............................................................. 89
O texto relativo aos peixes do Pará e às aves ................................................................. 90
7. A “RELAZAOM DO QUE HÁ NO GRANDE RIO DAS AMAZONAS NOVAMENTE
DESCUBERTO”, DO CAPITÃO ANDRÉ FERREIRA (1616) ................................................ 99
8. SYMÃO ESTÁCIO DA SYLVEIRA E O “INTENTO DA JORNADA DO PARÁ” (1618) .......... 101
9. A “RELAÇÃO SUMÁRIA DAS COUSAS DO MARANHÃO”
DE SYMÃO ESTÁCIO DA SYLVEIRA (1624) .................................................................... 109
10. JOHN DAY E “A PUBLICATION OF GUIANA’S PLANTATION” (1632) .............................. 123
11. A VIAGEM DE PEDRO TEIXEIRA (1637-1639) ................................................................ 137
A descida do rio Amazonas pelos leigos franciscanos ................................................... 137
A primeira viagem pelo Amazonas acima, comandada por Pedro Teixeira ..................... 139
O vice-rei ordena a viagem de regresso, Amazonas abaixo ........................................... 142
Teixeira reembarca (16 de fevereiro de 1639). Ação contra os Encabelados .................. 142
Teixeira toma posse da Amazônia para a Coroa Portuguesa ......................................... 142
A chegada a Belém. Fim da vida de Teixeira ................................................................. 143
O relato do Pe. Alonso de Rojas .................................................................................... 143
O relato do Pe. de Acuña .............................................................................................. 143
O relato do Conde de Pagan ......................................................................................... 143
12. A “RELACIÓN DEL DESCUBRIMIENTO DEL RÍO DE LAS AMAZONAS”
DO PE. ALONSO DE ROJAS (1639?) ................................................................................ 145
13. O “NUEVO DESCUBRIMIENTO DEL GRAN RÍO DE LAS AMAZONAS”,
DO PADRE CRISTÓBAL DE ACUÑA (1641) .................................................................... 155
Lista dos animais citados ............................................................................................. 155
O texto do “Nuevo descubrimiento” .............................................................................. 158
14. AS MISSÕES DOS FRANCISCANOS E AS VIAGENS DE FREI LAUREANO
DE LA CRUZ (1647-1650) ............................................................................................... 191
15. A PREGAÇÃO AOS PEIXES, DO PE. ANTÔNIO VIEIRA (1654) ........................................ 219
16. A “DESCRIÇÃO DO ESTADO DO MARANHÃO, PARÁ, CORUPÁ E RIO DAS
AMAZONAS” DE MAURICIO DE HERIARTE (1662) ....................................................... 221
17. A PROPOSTA DE CRIAÇÃO DE UMA “NOVA ALEMANHA” NA AMAZÕNIA,
POR J. J. BECHER (1669) ................................................................................................ 239
18. A “CHRONICA DOS PADRES DA COMPANHIA DE JESUS NO ESTADO DO
MARANHÃO” DO PE. JOÃO FELIPE BETTENDORFF (1694-1698) ................................... 241
19. A RELAÇÃO DE FREI VITORIANO PIMENTEL SOBRE AS MISSÕES DO
RIO NEGRO E SOLIMÕES (1705) ................................................................................... 247
20. “A CRUISING VOYAGE” DE WOODGES ROGERS (1712) ................................................. 253
21. A VIAGEM DE LA CONDAMINE (1743) ......................................................................... 257
22. A “NAVEGAÇÃO FEITA DA CIDADE DO GRÃO-PARÁ ATÉ A BOCA DO
RIO DA MADEIRA” DE JOSÉ GONÇALVES DA FONSECA (1749) .................................... 267
23. DOIS OPÚSCULOS DE 1754 ........................................................................................... 271
A “Relaçam curioza do sitio do Grão-Para’ ................................................................... 271
A “Relaçam” de Caetano Paes da Silva ......................................................................... 272
24. A “VIAGEM E VISITA DO SERTÃO EM O BISPADO DO GRAM PARÁ”
DO BISPO DOM FREI JOÃO DE SÃO JOSEPH QUEIROZ (1761-1763) ............................... 273
25. O “ROTEIRO DA VIAGEM DA CIDADE DO PARÁ ÀS ÚLTIMAS COLÔNIAS DO
SERTÃO DA PROVINCIA”, DO PE. JOSÉ MONTEIRO DE NORONHA (1768) ..................... 281
26. FRANCISCO XAVIER RIBEIRO DE SAMPAIO E A PRIMEIRA RELAÇÃO DA
FAUNA DO RIO BRANCO (1774-1775) ............................................................................ 283
O Tratado de Madri ..................................................................................................... 283
A expedição de Sampaio ao rio Negro ........................................................................... 286
Lista dos animais do rio Branco ................................................................................... 287
27. O “TESOURO DESCOBERTO NO RIO AMAZONAS”
DO PE. JOÃO DANIEL (1758-1776) ................................................................................. 293
“Tesouro descoberto no máximo rio Amazonas” ........................................................... 294
Nomes de animais citados no “Tesouro” ....................................................................... 297
Os capítulos 14 a 29 da Primeira Parte do “Tesouro” ................................................... 299
ÍNDICE ONOMÁSTICO ........................................................................................................ 369
ÍNDICE DOS NOMES DE ANIMAIS ...................................................................................... 375
Apresentação

D iz-se que a memória do brasileiro é curta. Mas vêm aqui os autores do livro O Novo Éden:
A fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas desde o descobrimento do rio
Amazonas por Pinzón (1500) até o Tratado de Santo Ildefonso (1777) para provar que os zoólogos
reconhecem seus predecessores na tarefa de conferir nomes aos animais.
O livro contribui para desfazer o mito de que nossos antepassados portugueses e brasileiros
ignoravam a fauna e a natureza das terras por eles dominadas. A verdade é que El-Rei era
extremamente cioso das informações vindas das colônias, evitando sua divulgação; fechava a
Terra brasilis aos naturalistas estrangeiros, proibindo até Humboldt de pisar o Brasil. Evidências,
na forma de textos extraídos de arquivos e escritos dos séculos XVI, XVII e XVIII, alguns deles ora
publicados pela primeira vez, mostram claramente como nossa fauna veio a ser gradualmente
conhecida. Os autores, através de pesquisa profunda e de uma riqueza inesperada, dão vozes
renovadas aos viajantes e cronistas que, há tantos anos, se maravilharam com os animais da
região.
O Prof. Dr. Nelson Papavero, zoólogo, historiador e filósofo, tem uma longa relação com a
Amazônia e com o Museu Paraense Emílio Goeldi. Colaborador de longa data, foi Vice-Diretor de
Pesquisa do Museu entre 1985 e 1986 e desempenhou também o árduo cargo de Editor-Chefe no
mesmo período.
Os Profs. Drs. Dante Martins Teixeira, ornitólogo e historiador, e José Roberto Pujol-Luz,
entomólogo, são, respectivamente, pesquisadores do Museu Nacional da Universidade Federal do
Rio de Janeiro, e do Instituto de Biologia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. O Prof.
Teixeira já contribuiu para o Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi, enquanto o Dr. Pujol-Luz
vem pela primeira vez como autor em uma publicação do Museu Goeldi. Esperamos ter muitas
outras colaborações, com livros e artigos.
O Prof. Dr. William Leslie Overal é da casa. Entomólogo e etnobiólogo, trabalha no
Departamento de Zoologia do Museu Goeldi desde 1976. Seus interesses incluem estudos sobre
borboletas, vespas, abelhas, cupins, formigas, morcegos, índios e caboclos da Amazônia e estudos
da história da Zoologia. Foi Editor-Chefe do Museu entre 1990 e 1996 e Editor-Associado de
Zoologia de 1989 até a presente data.
Vale ressaltar aqui que os quatro autores são zoólogos atuantes, labutando na tarefa começada
há 500 anos e ainda em progresso, de dar a conhecer a imensa diversidade das espécies de
animais do Brasil. É uma tarefa gratificante estudar a fauna. É digno dos mais sensatos e sábios
proteger a fauna para estudos futuros. A Natureza é de todo o mundo e para todo tempo. Vamos
assegurar que a história da fauna da Amazônia do século XXI não se torne uma tragédia, manchada
pela exploração irracional, com extinção de espécies.
É com muito orgulho que o Museu Paraense Emílio Goeldi apresenta ao público este livro. É
nossa homenagem aos 500 anos de descobrimento do rio Amazonas e do Brasil. O livro é uma
viagem no espaço e no tempo. É a nossa história e a da fauna da nossa região. É uma ponte para
um outro mundo – aquele mundo, os séculos passados, que herdamos e que devemos cuidar.
Lembrem-se: estamos fazendo hoje a história de amanhã...

Peter Mann de Toledo


Diretor-Substituto do Museu Paraense Emílio Goeldi
Prefácio e Agradecimentos

E ste livro começou como um levantamento de certas fontes primárias, para a inclusão dos
nomes de animais citados por cronistas e viajantes num “Dicionário histórico dos animais do
Brasil”, ora em preparação (e alguns capítulos foram publicadas previamente, e em parte, na
revista Contribuições Avulsas sobre a História Natural do Brasil (Série História da História Natural),
editada pelo Instituto de Biologia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro), e também
como uma introdução a uma edição, em futuro próximo, do manuscrito de Antonio Giuseppe
Landi sobre a história natural da Amazônia (que por essa razão não é aqui incluído). As notas se
avolumaram. Sua transformação na presente obra deveu-se à oportunidade de uma profícua
estada junto ao Museu Paraense Emílio Goeldi, para ministrar um curso sobre história da biologia
comparada, gentilmente oferecida pelo Exmo. Sr. Diretor do Museu, Prof. Dr. Peter Mann de Toledo,
ao primeiro autor. Isto permitiu a consulta de obras importantes na Biblioteca dessa instituição e
a obtenção de outras informações e bibliografia graças ao Prof. Dr. William Leslie Overal, também
do Museu Paraense Emílio Goeldi. Resultou então esta obra, que reúne as principais fontes de
informação sobre a fauna amazônica, desde janeiro de 1500 até o Tratado de Santo Ildefonso, em
1777.
Como muitos dos textos compulsados são ou raros ou de difícil acesso aos zoólogos, são eles
reproduzidos neste livro, principalmente por interessarem também a botânicos, etnólogos, geógrafos
etc. Para facilitar a consulta, colocamos em negrito os nomes de animais neles citados. Não
comentamos esses nomes, nem damos a identificação das espécies; tais informações constarão do
“Dicionário” supracitado.
As figuras de animais foram tiradas do livro de A. E. Brehm, Merveilles de la Nature
(1885-1891).
Queremos agradecer ao Prof. Dr. Peter Mann de Toledo pelo inestimável apoio a este projeto;
e à sua secretária Tereza Lobão; às bibliotecárias da Biblioteca “Domingos Soares Ferreira Penna”
do Departamento de Documentação e Informação do Museu Paraense Emílio Goeldi, Ana Maria
de Fátima Oliveira, Berenice de Figueiredo Bacelar, Doralice dos Santos Romeiro, Eliete Amador
Alves da Silva, Fátima Petronilha Lemos Teles, Francileila Jatene Cavalcante da Silva, Melquíades
Antônia dos Santos, Olímpia Reis Resque e Vera Lúcia Souza Almeida, por sua atenção e esplêndido
atendimento; à Sra. Iraneide Silva, da Editoração do MPEG, pelo cuidado na publicação desta
obra. Nossos melhores agradecimentos igualmente à Sra. Maura de Corrêa e Castro, bibliotecária
do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro; a Dione Serripieri e Marta L. Zamana,
bibliotecárias do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo; e a Vera de Figueiredo Barbosa
e Antonio Carlos Gomes Lima, bibliotecários do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio
de Janeiro, sem cujo auxílio não conseguiríamos completar este livro.
Finalmente, queremos externar ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq) nossos agradecimentos pela concessão de bolsas de produtividade científica
aos autores Nelson Papavero, Dante Martins Teixeira e José Roberto Pujol-Luz, e de bolsas de
pesquisa a William Leslie Overal, que nos permitiram realizar este estudo.

Nelson Papavero*
Professor Visitante (Bolsista do CNPq)
Departamento de Biologia Animal
Instituto de Biologia
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
Seropédica, RJ

* Laboratório de Entomologia, Instituto de Ciências Biológicas e Ambientais, Universidade Santa Úrsula, Rua Fernando
Ferreri 75, 22231-040 Rio de Janeiro, RJ.
Capítulo 1

O DESCOBRIMENTO DA FOZ DO
RIO AMAZONAS POR PINZÓN (1500) E A PRIMEIRA
CITAÇÃO DE UM ANIMAL BRASILEIRO

G raças ao mapa-múndi elaborado em 1500 por Juan de la Cosa (cf. Cosa, 1900) foi possível
ao Capitão-de-Mar-e-Guerra Max Justo Guedes estabelecer os locais visitados pelo comandante
espanhol Vicente Yáñez Pinzón na costa do Brasil, nos dois primeiros meses do ano de 1500
(Guedes, 1975). Desconhecem-se completamente os antecedentes desta preciosa carta até sua
aquisição, em Paris, pelo Barão de Walckenaer, diplomata holandês, em cuja biblioteca foi estudada
pelo Barão Alexander von Humboldt em 1832, o primeiro a divulgá-la. A Carta de Juan de la Cosa
foi comprada em 1853, pelo Museu Naval de Madri (cf. Berwick y Alba, 1951).
Em seu brilhante artigo, Guedes demonstrou que o comandante espanhol, nos albores de
1500, esteve realmente na costa brasileira, meses antes que Pedro Álvares Cabral. Pinzón tocou
primeiramente na ponta de Mucuripe, no Ceará, a que chamou Santa Maria de la Consolación (ou
Cabo da Consolação). Dali partiu a frota costeando o Nordeste brasileiro, indo reconhecer o rio
fermoso, isto é, o Curu atual; logo adiante, no Camocim (ou Curuaú), chantaram uma cruz, pouco
depois avistada por Diego de Lepe, que comandava uma outra frota espanhola, conforme consta
da carta de Juan de la Cosa, onde o local foi batizado como o ro do se falla una cruz (“o rio onde se
acha uma cruz”). Pouco atrativa aos propósitos da expedição que buscava riquezas, a costa foi
rapidamente corrida até quarenta léguas antes do mar de água doce, foz de um rio ao qual mandaram
os batéis, sendo violentamente repelidos pelos silvícolas. Infelizmente, o rasgão do mapa impede-
nos de verificar se houve nele qualquer registro do fato. As demais cartas náuticas coevas nada de
especial mencionam. Permaneceu, no entanto, o registro da captura de trinta e seis escravos. A
carta de Girolamo de Verrazzano, de 1519, traz um Rio desclauos, junto ao maraon. É natural que
a pequena frota, maravilhada com o inusitado fenômeno da dulcificação das águas do Atlântico,
se tenha demorado algum tempo na foz do Amazonas, pois era esse o majestoso rio descoberto por
Pinzón, visitando as mútiplas ilhas que os indígenas chamavam, em seu conjunto, Mariatambal
(ou marina tubalo, segundo a capitulação de 5 de setembro de 1500). A Carta “Egerton 2803”
registra uma acurada exploração da região, sendo batizados muitos rios e outros acidentes na foz
do Amazonas. Parece arriscado atribuir tal toponímia a Pinzón, porque sabemos ter Diego de Lepe
alcançado seu compatriota exatamente no Ryo grande [Amazonas]. A partir do delta amazônico,
isto é, da costa de paricura, que marcava o linde ocidental da região, a prioridade dos descobrimentos
coube a Lepe, indo Pinzón na sua esteira. A ressaltar de modo especial, temos o topônimo de
Pinzón, Santa Maria de la mar dulce, que Juan de la Cosa registrou como G. de S. Mia, muito bem
caracterizado por el macareo, isto é, a pororoca, fenômeno cuja ação foi sofrida pelas caravelas de
Pinzón. Deixando para trás o Amazonas, Pinzón rumou aproximadamente ao norte, conforme era
obrigado pela orientação da costa. Cinqüenta léguas adiante, ou umas 130 milhas, descontado o
exagero da estima de Pinzón, era recobrada a Estrela Polar. Se contarmos aquelas 130 milhas a
partir do Cabo Norte, tal recuperação deve ter-se dado quase pelos 4° N, o que é perfeitamente
normal. Pouco depois, deve ter a frota ultrapassado o Oiapoque, região que muito provavelmente
corresponde à tierra de S. Ambrosio de Juan de la Cosa. Após múltiplas peripécias, regressou
Pinzón a Palos, em Espanha, com apenas duas caravelas e pouquíssimos lucros, representados por
escravos, e uns quantos quintais de pau-brasil (Guedes, 1975: 215-216).
Sabemos através dos relatos dessa expedição escritos por Pedro Martyr (1511, 1516, 1530;
cf. também Martir de Angleria, 1964), que, em fevereiro de 1500, Vicente Yáñez Pinzón capturou
uma fêmea de mucura, ou gambá (Didelphis, marsupial da fam. Didelphidae) com filhotes, no rio
Amazonas, provavelmente na baía de Marajó (Bueno, 1998: 19-20). Foi, pois, a mucura o primeiro
animal da América do Sul capturado e descrito por um europeu, sob a designação de Animal
monstrosum. Na edição em língua espanhola de Martir (1964: 189) podemos ler a descrição desse
estranho animal:
2 O descobrimento da foz do Rio Amazonas por Pinzón (1500) e a Primeira citação de um animal brasileiro...

“Entre dichos árboles se halló un animal monstruoso, con cara de zorra, cola de cercopiteco,
orejas de murciélago, manos humanas y pies como de mona, que adonde quiera que va lleva sus hijos
en un repliegue exterior del vientre, a modo de bolsa grande. Tu mismo viste conmigo este animal,
aunque muerto, le diste vueltas y admiraste aquella bolsa, que cual segundo vientre y recurso nuevo
de la naturaleza, les permite librar a sus hijos, llevándolos consigo, de los cazadores o del ataque de
los animales violentos y rapaces. Dicen que los que han tenido ocasión de observarlo, que dicho
animal lleva siempre sus crías dentro de esa bolsa-vientre sin sacarlos de ella sino para que retocen
o darles de mamar, hasta que aprenden a buscarse por sí mismos el sustento. Habían capturado los
nuestros al animal con sus cachorros, pero éstos pronto murieron en las naves; sobrevivióles su
madre algunos meses, pero tampoco pudo al fin soportar un cambio tan grande de clima y de alimentos”.

A descoberta dos marsupiais no Novo Mundo, e posteriormente nas Índias Orientais, levaria
os naturalistas a uma intrincada controvérsia sobre a reprodução desses animais. Entre os séculos
XVI e XIX nasceriam três diferentes hipóteses básicas para explicar tal fenômeno, as quais
propuseram sucessivamente que estes mamíferos (1) geravam seus filhotes por partenogênese na
própria bolsa; (2) davam à luz “corpos indiferenciados” que eram vertidos na bolsa pela fêmea e se
prendiam às tetas para dar início ao seu desenvolvimento; (3) traziam ao mundo filhotes
“imperfeitos” ou “prematuros” destinados a sofrer uma “segunda gestação”, os quais seriam
transportados ativamente pela mãe ao marsúpio. Ao contrário do que se poderia supor, maiores
detalhes sobre a natureza da reprodução dos marsupiais só foram estabelecidos no começo do
século XX, o que não impediu a sobrevivência, em âmbito popular, das três hipóteses supracitadas
até os dias de hoje (cf. Teixeira & Papavero, 1999).

Referências
Berwick y Alba, J. M. P. C. M. S. F., 10o. Duque de, 1951. Mapas españoles de América. Siglos XV-XVII.
Madrid.
Bueno, E., 1998. Náufragos, traficantes e degredados. As primeiras expedições ao Brasil, 1500-1531. Editora
Objetiva, Rio de Janeiro.
Cosa, Juan de la, 1900. Mapa-múndi, 1500, in BRASIL, Tratados Guiana Francesa, Frontière entre le Brésil
et la Guyane Française. Atlas. A. Lahure, Paris.
Guedes, M. J., 1975. As primeiras expedições de reconhecimento da costa brasileira, pp. 179-221, figs., in
BRASIL, Ministério da Marinha, História Naval Brasileira. Primeiro Volume. Tomo I. Serviço de
Documentação Geral da Marinha, Rio de Janeiro.
Martir de Angleria, P., 1964. Decadas del Nuevo Mundo. Tomo I. José Porrúa e Hijos, Sucs. México, D. F.
Martyr, P., 1511. P. Martyris Angli Mediolanensis Opera Legatio babylonica Occeani Decas Poemata
Epigrammata. Jacobû Corumberger Alemanû, Hispali [= Sevilla]. [la. ed. da primeira “Década” de Piero
Martire di Anghiera}.
Martyr, P., 1516. Ioannes reffus foroliuensis Archiepûs Cñsentim: legat. apo. ad lectorê de Orbe Nouo. Accipe
non noti praeclara uolumina mundi Oceani: & Magnas noscito lector opes. Plurima debetur typhis tibi
gratia: gentes ignotas: & aues que uebis orbe nouo. Magna quoq. authori referenda est gratia nostro: Qui
facit haec cunctis regna uidenda locis. Autor. Siste pedem lector: breuibus compacta libella haec lege:
principibus uabriis de cimoq. leoni Pontifi summo inscripta. hic noua multa uidebis. Oceani magnas terras;
uasta aequora: linguas haectenus ignotas: atq. aurea saecula nosces: Et gentes nudas expertes seminis
atri: Mortiferi nummi: gemmisq. auroq. Feracem torrentum zonam: percat ueneranda uetustas. De Orbe
nouo Decades. Cura & diligentia uiri celebris Magistri Antonii Nebrissensis historici-regii fuerunt haetres
ptotonotarii Petri martyris decades impressae in contubernio Arnaldi Guillelmi in illustri oppido carpetanae
puîciae cõplutõ quod uulgariter dicitur Alcala pfectû est nonis Nouembris An. 1516. [la. ed. das “Décadas”
II e III, e segunda da “Década” I].
Martyr, P., 1530. De Orbe Novo Petri Martyris ab Angleria Mediolanensis Protonotaij Cesaris senatoris Decades.
Michaele d’Eguia. [la. ed. das “Décadas” I-VIII].
Teixeira, D. M. & N. Papavero, 1999. The problem of marsupial reproduction: A brief historical review.
Historia naturalis, Seropédica 2(11): 285-303, 2 figs.
Capítulo 2

A VIAGEM DE DIOGO NUNES EM 1538

C omo enfatizou Porro (1993: 30), a primeira expedição a entrar na Amazônia brasileira a
partir dos Andes não foi a de Orellana, em 1542, historiada por Gaspar de Carvajal [ver Cap. 3],
propalada por diversos autores. Quatro anos antes dela, num desdobramento da malograda
expedição de Alonso Mercadillo ao rio Marañón, um destacamento de 25 homens, entre eles o
português Diogo Nunes, passou do rio Huallaga ao Marañón ou Alto Amazonas e desceu o
grande rio pelo menos até chegar, em território que viria a ser brasileiro, à região situada entre
Tefé e Coari. Era esta a ‘província’ de Machifaro, amplamente descrita por Carvajal e pelos
cronistas da expedição de Ursua e Aguirre (1561) [ver Cap. 4].
Informa-nos ainda esse autor que o itinerário da expedição de Alonso Mercadillo tem por
única fonte o livro de Cieza de León (1554), e que uma reconstituição desse itinerário foi publicado
por Jiménez de la Espada (1895). Diz ainda Porro (l. c.):

“Antigo companheiro de Francisco Pizarro na (Carta de Luís Sarmiento ao príncipe Filipe em


conquista do Peru, Mercadillo recebeu dele, em Madri, de Lisboa a 8 de novembro de 1553, apud
1537, a incumbência de organizar uma expedição Capistrano de Abreu em nota a Varnhagen,
aos índios Chupacho e Iscaicinga, nas vertentes História, I: 207, nossa tradução). Despertado o
orientais dos Andes. Saiu no ano seguinte do distrito interesse da corte, esse Diogo Nunes encaminhou
de Huánuco, com 185 homens a pé e a cavalo, ao rei, provavelmente naquele mesmo ano de 1553
‘ferreiros e carpinteiros para fazer barcos se para ou no seguinte, uma carta ou apontamento em que
os rios fossem necessários’, e foi seguindo o curso falava das terras que havia descoberto, sugerindo-
do Huallaga que, até então inexplorado, corre rumo lhe a conquista e oferecendo-se para realizá-la em
norte para desaguar no Marañón. No baixo curso determinadas condições. Varnhagen encontrou a
do Huallaga, viu-se Mercadillo na ‘província’ dos carta no Arquivo Real de Lisboa e a transcreveu
Maina, que se estendia para o norte incluindo todo para o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro,
o leque de formadores do Amazonas compreendidos que a publicou em 1840 no volume II da Revista.
entre o Javari e o Putumayo-Içá. Aqui os Em 1924 o texto foi reeditado, acrescido de algumas
expedicionários ‘concordaram que seria coisa palavras que haviam escapado à transcrição de
acertada enviar a descobrir o caminho com guias Varnhagen, na História da colonização portuguesa
naturais daquela população; e logo saíram os do Brasil.
espanhóis em quadrilhas a procurá-lo, e pelo melhor
Diogo Nunes informa no apontamento que
que viram que podiam caminhar, caminharam’.
saiu do Peru com Mercadillo e chegou à província
Cieza de León, até aqui citado a partir de Jiménez
de Machifaro; dá breves mas importantes notícias
de la Espada, nada diz sobre o rumo desses
sobre o aspecto geral da terra e do povo, sobre o
destacamentos avançados. Conclui a narrativa
comércio intertribal (com entrepostos de cerâmica
dizendo que, no acampamento de Mercadillo, alguns
e peixe seco e ‘...caminhos muito abertos de muito
dos seus comandados, impacientes com a
seguidos porque corre muita gente por eles’) e sobre
insistência do capitão em querer abrir caminho por
as relações que os índios de Machifaro mantinham
terras tão inóspitas, amotinaram-se e o prenderam,
com as tribos vizinhas. Nesse contexto, uma das
pondo fim à malograda expedição.
principais contribuições de Diogo Nunes à etno-
O que aconteceu com os exploradores que história amazônica é a notícia que dá dos ‘14.000
Mercadillo havia despachado à frente antes de ser índios’ que, naqueles anos, chegariam a
preso tornou-se conhecido por uma via totalmente Chachapoyas, no Peru. A narrativa trai uma
inesperada. Entre os portugueses que evidente interpolação quando o autor diz que
acompanharam Tomé de Souza de regresso à ‘Depois que saímos desta terra vieram atrás de nós
metrópole em 1552, havia um certo Diogo Nunes, 14.000 índios para saber que gente éramos, e no
mameluco ‘...que se criou pela terra do Brasil caminho (foram dizimados por outras tribos) e ao
adiante e diz que esteve no Peru e que do Peru veio cabo de certo tempo foram a um povo de cristãos
ali (na Capitania de São Vicente) por terra (...) e que, que é no Peru, que se chama as Chachapoas’.
de onde estão os portugueses no Brasil, em mui Ocorre que a chegada dos Tupi brasileiros ao Peru
poucos dias por terra irão onde dizem que há minas deu-se dez a onze anos depois que Nunes estivera
de ouro e de prata do que dez vezes no Peru’ em Machifaro, onde a sua estada parece ter sido
4 A Viagem de Diego Nunes em 1538

breve, pois ‘...visto a terra ser tão boa viemos a dar incorporados à tribo de Machifaro; diversos deles
conta ao nosso capitão onde o tínhamos deixado. E foram aprisionados e o próprio Nunes levou consigo
não o achamos (...) e todos nos tornamos ao Peru’. alguns no regresso ao Peru. Dez anos mais tarde
No obstante esse deslize, é grande a importância do eles encontrariam os 300 Tupi chegados a
depoimento de Diogo Nunes em relação à famosa Chachapoyas em 1549, e se reconheceram’... porque
migração dos Tupi pelo Amazonas, pois ele fornece eram todos de uma só terra e de um só senhor. E a
evidências concretas de que não se tratou, como o relação da terra (do Brasil) que eu tinha sabido dos
dão a entender as outras fontes (...) (Gasca, Aguilar meus índos e a que estes (recém-chegados) me deram
y Córdoba) de uma migração, mas de pelo menos era toda uma’.
duas e provavelmente mais vagas sucessivas ao Drumond reeditou e comentou o documento
longo de muitos anos. Ao contrário das fontes (“A carta de Diogo Nunes”, 1950), sugerindo com
espanholas, que se baseiam exclusivamente naquilo boas razões que o ponto de partida dos Tupi teria
que os índios chegados ao Peru contaram, com a sido o litoral de Pernambuco. Errou porém ao fazê-
previsível dose de imaginação, a respeito de sua los sair em 1539, porque as fontes mais antigas
viagem, Diogo Nunes encontrou os Tupi em falam em 12 a 14 anos de viagem, com a chegada
Machifaro; um contingente deles enfrentou de fato ao Peru em 1549, e não percebeu a inconsistência
os espanhóis, aparentemente na condição de cativos de em 1538 já estarem em Machifaro...”.

Na breve Carta de Diogo Nunes a D. João III de Portugal (Nunes, 1921-1924) vamos encontrar
as primeiras menções a animais do vale amazônico. Transcrevemo-la na seqüência.

CARTA DE DIOGO NUNES A D. JOÃO III DE PORTUGAL

“Apontamento do que V. A. quer saber. Machifalo). De um destes índios tive em minha


companhia 14 ou 15 anos.
No ano de (15)38 fui com um capitão que se
diz Mercadilho e saímos do Peru a descobrir e Depois que saímos desta terra vieram atrás
passamos muitas terras despovoadas até onde este de nós 14 mil índios para saber que gente éramos,
capitão se ficou mal disposto. e no caminho toparam com outros índios de outro
senhor com quem tinham guerra e (estes) os
Então mandou 25 homens de (a) cavalo nos mataram a todos, que não ficaram mais que 300
quais fui eu por mandato do dito capitão e chegamos vivos, os quais se foram fugindo por um rio acima
a uma província ao cabo de 25 dias (onde) achamos em umas canoas, e ao cabo de certo tempo foram
boa terra e bem povoada de índios e rica de ouro a um povo de cristãos que é no Peru (e) que se
segundo o que vi e no que os índios traziam, que chama as Chachapoas. Haverá neste caminho por
bem parecia a terra abundosa de ouro, porque os onde vieram os índios até o Peru 500 léguas. E
índios traziam armas de ouro e braceletes nos estes índios se (re)conheceram com os outros que
braços. Esta gente era de guarnição porque tinham eu trouxe, porque eram todos de uma (só) terra e
guerra com os outros índios que já tínhamos deixado de um (só) senhor. E a relação da terra que eu
atrás. Puseram-se em nos defender tinha sabido dos meus índios e a que estes me
que não entrássemos (i. é, a nos proibir que deram era toda uma. E estes 300 índios ficam
entrássemos) na terra e então os desbaratamos por agora no Peru.
força d’armas e entramos na terra. E estes índios Nesta província de Machifaro que eu vi se
seriam até cinco ou seis mil e ali se tomaram muitos podem povoar cinco ou seis vilas mui ricas, porque
deles entre os quais vinham outros índios de outras sem dúvida há nela muito ouro. E ao que ela me
línguas e terras, como pareceu pelos línguas que pareceu, é tão bondosa de mantimentos e sã como
levávamos conosco. Esta província onde eu cheguei a do Peru. Esta terra está entre o rio da Prata e o
se chama Machifalo [sic]. Brasil pela terra adentro. Por esta terra vem o rio
Estes índios que ali tomamos nos deram conta grande das Amazonas, e na paragem desta terra
que eram de outro senhor que estava adiante deste tem este rio muitas ilhas no rio e bem povoadas e
de que eram vassalos. gente bem luzidia. E da outra banda do rio há muita
povoação da mesma gente, de maneira que de uma
Estes dois senhores têm guerra um com outro banda e de outra está bem povoado.
e se cativam uns a outros e os tomam por escravos.
Os mantimentos desta terra é o mais, que
Visto a terra ser tão boa nos viemos a dar conta a
aqui se chama milho, e caçabe (acaçaby, beiju),
nosso capitão onde o tínhamos deixado; e não o
que serve de pão, e disto há muita quantidade.
achamos porque os seus o haviam preso sobre
Há neste rio muito pescado de toda sorte como
(i. é, devido a) certa diferença que entre ele e os
em Espanha, (por)que em cada povo que chegam
seus haviam tido e o levaram ao Peru preso; e a acham muitas casas cheias de pescado seco que
esta causa não se provou esta província e (é) porque eles levam a vender pelo sertão e têm suas
todos nos tornamos ao Peru. contratações com outros índios. Vão os caminhos
Trouxe comigo certos índios destas províncias, muito abertos de muito seguidos porque corre
de quem me informei do que havia adiante (de muita gente por eles.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 5

Há carnes montesas nesta terra; veados, antas, bergatins (mais de 300 léguas), porque o rio vai chão
porcos monteses, patos e outras castas muitas. Tive e muito bom.
notícia que até o rio da Prata, nesta mesma terra,
havia ovelhas como as do Peru, que é o melhor sinal Haverá 300 léguas desde esta província até o
que nestas partes pode haver, porque onde há ovelhas mar e sai este rio à costa do Brasil.
há todo o mais em abastança. T ambém poderei ir por São Vicente
Por este rio há de prover esta terra, porque atravessando pelas cabeçadas (i. é, cabeceiras) do
podem ir navios por ele até onde se poderá povoar Brasil, tudo por terra firme, porém há muita terra
uma vila que seja porto e escala de toda esta terra, que andar, e não se podem levar as coisas
porque sobe a maré 200 léguas rio acima; e desde necessárias para conquistar e povoar como
porto onde se povoar a primeira vila, subirão (se pode) por este rio (...).”

Referências
Cieza de León, P. de, 1554. Guerras civiles del Perú. Tomo I: Guerra de las Salinas. García Rico, Madrid.
Drumond, C., 1950. A carta de Diogo Nunes e a migração dos Tupi-Guaranis para o Peru. Revta de História,
São Paulo 1(1): 95-120.
Jiménez de la Espada, M., 1895. La jornada del capitán Mercadillo a los indios Chupachos é Iscaicingas.
Boln Soc. geogr. Madrid 37: 197-237.
Nunes, D., 1840. Apontamento do que V. A. quer saber (carta a D. João III de Portugal). Revta Inst. hist.
geogr. brasil., Rio de Janeiro 2: 365-369 (3ª ed., 1916, pp. 375-379).
Nunes, D., 1921-1924. Apontamento do que V. A. quer saber (carta a D. João III de Portugal), pp. 365-369,
in História da colonização portuguesa do Brasil, Vol. 3. Porto.
Porro, A., 1993. As crônicas do Rio Amazonas. Notas etno-históricas sobre as antigas populações indígenas
da Amazônia. Vozes, Petrópolis.
Varnhagen, F. A., 1959. História geral do Brasil (6ª ed. Integral, com notas de Capistrano de Abreu e Rodolfo
Garcia). Melhoramentos, São Paulo.
Capítulo 3
A VIAGEM DE ORELLANA RIO AMAZONAS
ABAIXO NOS ANOS DE 1541 E 1542 E A
CRÔNICA DE FREI GASPAR DE CARVAJAL

Segundo Díaz-Maderuelo (1986: 28-30) e Smith (1990), nasceu Francisco de Orellana em


Trujillo, na Estremadura, Espanha, por volta de 1511. Passou muito jovem às Índias Ocidentais,
pois são-lhe atribuídas algumas aventuras na América Central, mais concretamente em terras
nicaraguenses, ao redor de 1527. O mais importante desse batismo americano de Orellana é que
precisamente chega em um momento de verdadeira ebulição de idéias e ações em busca de um
estreito que comunicasse os dois oceanos. As promessas de recompensa que Carlos I mantinha a
este respeito deveram incidir decisivamente em um jovem de dezesseis anos. Também foi um fator
desencadeador de sua futura conduta o contacto que manteve com Francisco Ruiz, companheiro
de Diego de Ordás em sua entrada em Pária. Por outro lado, a chegada do jovem Orellana na
América veio coincidir com a de Pedro de Alvarado, constante indagador de uma rota conveniente
para as especiarias. A mentalidade descobridora que o jovem nativo da Estremadura deveu conhecer,
em freqüentes conversas sobre projetos mui diversos, teve que influir poderosamente em seu
ânimo, e veio a orientar sua personalidade para o caminho da aventura.
Resta ainda um aspecto de sua formação que se forjará nas terras do Peru: sua preparação
como soldado. Orellana deve ter passado ao Peru antes de 1535, quiçá com Alvarado, ou com
Almagro, ou, mais provavelmente, com Pedro Álvarez de Holguín. A formação militar de Orellana
consolidar-se-á entre 1532 e 1538, quando tinha entre vinte e um e vinte e sete anos. Sua fogosidade
nas batalhas levou-o a perder um olho, por causa de uma flechada, por ocasião de seus vinte e
quatro anos. Foi nessa época que se pôs em contacto com os mais famosos conquistadores do
Peru.
Incrementou as tropas de Hernando Pizarro na batalha das Salinas com 500 homens, e
nesse momento já era capitão. Depois dessa batalha, Francisco de Pizarro enviou Orellana a
povoar a cidade de Santiago de Guayaquil, fundada por Belalcázar, e logo arrasada pelos indígenas.
Em Guayaquil tomou contacto com uma região que antecipava, de alguma maneira, o que seria o
cenário de sua aventura posterior. Intuiu, além disso, o valor estratégico da bacia do Guayas,
sobretudo porque servia de ligação entre as terras do sul e as do maciço equatoriano. Por essa
época começaria a embriagar-se com as notícias legendárias de regiões repletas de riquezas, que
se divulgavam na área de influência de Quito, cuja demarcação se encontrava sob o comando de
seu parente Gonzalo Pizarro. Começava a cobrar força nele a crença em uma série de lendas, que
haveria de converter-se em pouco tempo nos mitos propulsores de grandes expedições: eram
estes os relatos sobre o País da Canela e do reino do El Dorado. Ademais, aos ouvidos de Orellana
deviam ressoar as palavras de Belalcázar acerca da existência de uma possível via de comunicação
entre Quito e o Mar do Norte.
Graças a um acordo entre Gonzalo Pizarro e Orellana, organizou-se uma expedição para
buscar o País da Canela. Na mente de Pizarro estava a velha idéia de estabelecer relações com a
região de Macas e Quizna, os limites da região caneleira, empresa que já intentara Gonzalo Díaz
Pineda.
Vários meses depois de haver iniciado a viagem, as notícias dadas pelos indígenas da existência
de um grande despovoado, águas abaixo, fizeram com que Orellana se separasse de Pizarro com
meia centena de homens, para buscar provisões. A descida do rio foi contada detalhadamente por
Frei Gaspar de Carvajal, que acompanhou Orellana. Todos os acontecimentos constam de sua
relação e o frade detém-se em mostrar a impossibilidade de regressar ao ponto de encontro
combinado com Pizarro, para dissipar qualquer dúvida sobre a retidão das ações do capitão da
expedição.
8 A Viagem de Orellana Rio Amazonas abaixo nos anos de 1541 e 1542...

Gaspar de Carvajal nasceu em Trujillo, na Espanha, em 1504. Deve ter ingressado muito
jovem na Ordem de São Domingos de Guzmán. Ao final do ano de 1536 fez parte de um grupo de
oito dominicanos que se transladaram às Índias Ocidentais, chegando à capital panamenha de
Nombre de Dios. Segundo Toribio Medina, em 1538 achava-se já em Lima, cujo bispo, Frei Vicente
de Valverde, também dominicano, era precisamente quem havia solicitado a vinda dos frades à
“Ciudad de los Reyes”. Em Lima Frei Gaspar deve ter conhecido Gonzalo Pizarro, quando este se
encontrava de passagem, dirigindo-se até sua governação de Quito, e com ele partiu, para servi-lo
como capelão. Carvajal adentrou-se pelas selvas do oriente equatoriano com Pizarro, mas ao
separar-se Orellana deste capitão, Carvajal seguiu viagem com este, tornando-se a mais importante
testemunha da aventura e o relator desse feito. Durante a viagem Carvajal recebeu duas flechadas,
ambas no dia de São João de 1542, uma das quais custou-lhe a perda de um olho. Ao término da
primeira navegação pelo Amazonas, uma vez chegados os expedicionários à ilha de Cubagua, na
Venezuela, Carvajal teve notícia da morte de Frei Vicente de Valverde e decidiu regressar ao Peru.
Ali interou-se das acusações de traição que pesavam contra Orellana e sem dúvida este fato
decidiu-o a redatar o relato dos acontecimentos. Em 1554 encontrava-se no convento de Lima,
passando a Prior de Cuzco em 1548, de onde foi enviado a Tucumán (na Argentina) como protetor
dos índios. Em 1557 foi eleito provincial da Ordem de São Domingos no Peru. Morreu no convento
de Lima em 1584, depois de uma vida rica em acontecimentos (Díaz-Maderuelo, 1986: 26-27).
Das páginas do dominicano [Carvajal] depreende-se também que Orellana havia adquirido
certa habilidade no trato com os indígenas, assim como uma curiosa facilidade para entender
suas línguas, às vezes por meio da elaboração de vocabulários. Com simplicidade, Frei Gaspar
ressalta as qualidades pessoais e militares do descobridor. Ao longo do relato mostra-se também
um elemento fundamental para se entender a atitude do capitão: trata-se de sua ânsia descobridora.
Se, em princípio, parece que a busca da canela era o motivo mais imediato da expedição, desde o
momento da separação da comitiva de Pizarro, a idéia de alcançar a saída para o mar perfila-se
como a finalidade primordial da viagem, apesar de, isto sim, vestida pelas tramas legendárias do
ouro de Omágua e do reino das Amazonas.
Depois da expedição chegou Orellana a Cubágua (na Venezuela), a 11 de setembro de 1542;
o outro bergantim havia chegado dois dias antes. Daí passou a Santo Domingo, onde teve ocasião
de conhecer Gonzalo Fernández de Oviedo. Pouco depois regressou à corte de Espanha, em busca
de capitulações para governar as regiões descobertas. Obteve a Capitulação de 13 de fevereiro de
1544, firmada pelo príncipe, na ausência de Carlos I, pela qual se lhe davam 200 léguas a oeste da
desembocadura do Grande Rio.
A 11 de maio de 1545 empreendeu o caminho de volta para a América do Sul. A 20 de
dezembro chegava novamente ao Amazonas, que agora tentaria navegar da boca até Quito, segundo
o testemunho de Francisco de Guzmán, companheiro de Orellana, que relatou essa nova expedição.
A morte, entretanto, surprendeu-o pouco mais além da atual cidade de Santarém, no Pará. A
iniciativa de povoar essas regiões fracassava com a morte do capitão. Tardaria quase um século
até que se iniciasse a efetiva ocupação do Amazonas pelos europeus.

O livro de Frei Gaspar de Carvajal


O relato de Frei Gaspar de Carvajal chegou-nos através de duas cópias, de diferentes épocas.
Tradicionalmente conhecia-se uma, conservada na Biblioteca da Real Academia de História,
que formava parte do acervo da coleção Juan Bautista Muñoz. A cópia foi escrita em fólios de
papel gvarro, numerados de 68 a 113. Ao pé do fólio 68 existe uma anotação do próprio Muñoz,
que afirma: “Aquí se interrumpe bruscamente la relación, sin duda, porque faltan los cuatro
pliegos interiores del primer cuaderno de esta copia”. No fólio 83 interrompe-se novamente o
texto na linha 15 e há um espaço em branco de uns 5 cm.
A outra cópia, escrita em caracteres do Século XVI, pertenceu ao Duque de T’Serclaes de
Tilly, e conserva-se atualmente na Biblioteca Nacional de Madri (Res. 257), por doação, em 1961,
do Duque de T’Serclaes, José Pérez de Gusmán y Escrivá de Romaní.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 9

A relação de Carvajal foi conhecida de Gonzalo Fernández de Oviedo, que a incluiu em sua
Historia General de las Indias, na qual ocupa as páginas 541-574 do tomo IV da edição de Madri
(1851). Este mesmo autor escreveu uma carta, datada de 22 de janeiro de 1543, ao Cardeal
Bembo, dando-lhe a notícia da expedição de Orellana (publicada por Asensio, 1951). Pedro Cieza
de León também relatou a façanha de Orellana, em La Guerra de Chipas, livro segundo da quarta
parte de sua monumental Crónica del Perú. Toribio de Ortiguera, cronista da expedição de Ursúa
e Aguirre, incluiu as notícias dessa navegação pelo Amazonas em sua Jornada del Río Marañón,
escrita entre 1581 e 1586, e publicada em 1908 por Manuel Serrano Sanz, na Nueva Biblioteca de
Autores Españoles (tomo II, pp. 305-422). Uma nova edição dessa crônica, com estudo preliminar
de Mario Hernandez Sánchez Barba, viu a luz na Biblioteca de Autores Españoles, continuação da
coleção Rivadanera, tomo CCXVI, Madri, 1968.
Referiram-se também à viagem de Pizarro e Orellana a Historia General de las Indias, de
Francisco López de Gómara (1932); Agustín de Zárate, em sua Historia del Descubrimiento y
Conquista del Perú (1944); Garcilaso de la Vega, em seu Comentarios Reales (1918-19), e Antonio
de Herrera, na Década VII de sua Historia General de los Hechos de los Castellanos en las Islas y
Tierra Firme del Mar Océano (1934).
As viagens de Pizarro e Orellana foram traduzidas para o inglês por Markham (1859).
No que diz respeito às edições da relação de Carvajal, a primeira, e uma das de maior interesse
das realizadas até agora, é a que se deve à pena do historiador chileno José Toribio Medina, que
publicou o manuscrito pertencente ao Duque de T’Serclaes, com uma introdução histórica e citando
importantes documentos, entre os quais se encontram a carta de Gonzalo Pizarro ao Rei, datada
de 3 de setembro de 1542, em Tomebamba; os documentos apresentados por Orellana ao Conselho
das Índias; as cartas de Frei Pablo de Torres e Francisco de Orellana ao Imperador, e as capitulações
de Orellana para sua viagem de regresso. Desta edição, feita em Madri em 1894, existe uma
tradução para o inglês, por Bertram T. Lee, para a American Geographical Society, publicada em
Nova Iorque por H. C. Heaton (1934).
Em 1941 surgiu uma versão em português, a cargo do brasileiro Cândido de Melo-Leitão, que
incluía, ademais, a relação de Alonso de Rojas sobre a viagem de Pedro Teixeira e a de Cristóbal de
Acuña sobre sua própria navegação. Junto a um breve prefácio aparecem abundantes notas
explicativas e esclarecedoras do texto, que, entretanto, contêm algumas inexatidões devidas à
pretensão de atualizar as expressões.
Raúl Reyes Reyes realizou uma edição em Quito (1942), que incluía também a versão de
Fernández de Oviedo. Do mesmo ano é a obra de Tomas de Vega y Toral: El Descubrimiento y
primer viaje por el río de las Amazonas, publicada na cidade de Cuenca (Equador). Com prólogo
de Antonio Ballesteros y Beretta, o Consejo de la Hispanidad realizou uma edição da Relación
que escribió Fr. Gaspar de Carvajal, fraile de la Orden de St. Domingo de Guzmán del nuevo
descubrimiento del famoso río Grande que descubrió por muy gran ventura el capitán Francisco
de Orellana desde su nacimiento hasta salir a la mar, com cincuenta y siete hombres que trajo
consigo y se echó a su ventura por el dicho río, y por el nombre del capitán que le descubrió se
llamó el Río de Orellana. Nessa obra se reproduzia a edição de Medina, com notas do capitão de
navio e acadêmico da Real Academia de Historia, Julio Guillén Tato, relativas aos termos
marítimos da Relação. A edição, publicada em Madri em 1944, incluía, além disso, facsímiles e
documentos selecionados no Archivo de Indias por Manuel Ballesteros Gaibrois, assim como a
relação dos companheiros de Orellana.
Uma nova edição do relato de Carvajal foi publicada em Cáceres pelo Departamento Provincial
de Seminarios, com proêmio de Domingo Sánchez Loro, em 1952. A Jorge Hernández Millares
deve-se uma edição mexicana, com introdução e notas de intenção divulgadora, da Relación del
nuevo descubrimiento del famoso río Grande de las Amazonas, que reproduz o texto da cópia de
Muñoz, completado com as contribuições de Medina em sua edição da cópia do Duque de T’Serclaes;
a obra apareceu em 1955, publicada pelo Fondo de Cultura Económica do México.
Em 1958, o paleógrafo equatoriano Jorge A. Garcés reproduziu a edição realizada pelo Consejo
de Hispanidad de Madri (1944), e transcreveu os documentos compilados por Manuel Ballesteros
Gaibrois. Esta nova edição, com prólogo de Roberto Páez, viu a luz em Quito na data mencionada,
e sua versão do texto de Carvajal é a que apresentou Díaz Maderuelo em 1986.
10 A Viagem de Orellana Rio Amazonas abaixo nos anos de 1541 e 1542...

As escassas referências a animais amazônicos


O relato de Frei Carvajal faz apenas algumas fugazes referências a nomes de animais
amazônicos, quase sempre considerados desde o ponto de vista da alimentação (os expedicionários
padeceram incrivelmente de fome) ou utilizados em artefatos pelos indígenas. São eles os seguintes
(entre parênteses o número da página do livro de Díaz-Maderuelo, 1986, em que consta o relato de
Carvajal):

1. “mosquitos” - “El Capitán holgó mucho con la resistencia, donde hallamos mucha comida, en
comida y más con la buena razón de los indios, especial pescado, que desto se halló tanto y en
y así nos fuimos a aposentar y dormimos aquella abundancia que pudiéramos cargar bien
noche en el ya dicho pueblo, donde no nos nuestros bergantines, y éste tenían los
faltaron abundancia de mosquitos, que fué indios a secar para llevar dentro a la tierra a
cabsa [arcaísmo, causa] de que otro día de vender” (74).
mañana el Capitán se fuese a outro pueblo 8. “ovejas del Perú” (lhamas?) - (87) - na terra
mayor que parecía más abajo” (51).
das Amazonas.
2. “perdices” e “tortugas” - “venían a nos traer de 9. “camellos” (?) - “en esta tierra, según
comer; y comenzaron a sacar de sus canoas entendimos, hay camellos que los cargan” (87).
muchas perdices como las de nuestra España,
sino que son mayores, y muchas tortugas, que 10. [antas] - “dice que hay otros animales, los cuales
son tan grandes como adargas, y otr os no supimos entender, que son del tamaño de
pescados” (52). Carvajal refere-se aqui a alguma un caballo y que tienen el pelo de un geme y la
espécie de T inamidae e a uma tartaruga, pata hendida y que los tienen atados, y que
impossível de identificar. destos hay pocos” (87).
3. “tortugas”, “manatís”, “perdices”, “gatos”, 11. “pájaro que decía ‘huí’ ” - “Aquí se avisa de
“monos” - “mandó sacar de sus canoas mucha una cosa no de poco espanto y adivinación a
cantidad de comida, así de tortugas, como de los que la vimos, y fue que a hora de vísperas
manatís y otros pescados, y perdices y gatos y se puso sobre un árbol debajo del cual
monos asados” (53). estábamos aposentados un pájaro del cual
nunca oímos más del canto, que a muy gran
4. “lagartos” (jacarés), “manatís”, “dantas” (antas)
priesa hacía, y distintamente decía ‘huí’, y esto
- “no habíamos andado mucho cuando vimos
dijo tres veces dándose muy gran priesa.
venir por el río arriba muy gran cantidad de
canoas, todas puestas a punto de guerra, lucidas, También sé decir que este mismo pájaro o outro
y con sus pabeses, que son conchas de lagartos, oímos en nuestra compañía desde el primer
y de cueros de manatís y de dantas, tan altos pueblo donde hicimos los clavos, y era tan
como un hombre, porque todos los cubren” (60). cierto, que notando que estábamos cerca del
poblado, al cuarto de alba nos lo decía de esta
5. “tortugas” - y como había gran cantidad manera: ‘huí’, y esto muchas veces: quiere decir
de comida, así de tortugas en corrales y que era tan cierta esta ave en su canto que lo
albergues de agua y mucha carne y pescado y
teníamos ya por tan cierto como que lo
bizcocho...” (62).
viéramos; y así era que cuando se oían nuestros
6. “papagayos”, “guacamayos” - “el indio dijo que compañeros se alegraban, y en especial si había
ellos eran subjetos y tributarios a las amazonas, falta de comida, y se aparejaban a ir todos a
y que no las servían de outra cosa sino de punto de guerra. Aquí nos dejó esta ave, que
plumas de papagayos y de guacamayos para nunca la oímos más” (89-90).
forros de los techos de las casas de sus
12. “danta” – ‘y fue así, que un día sobre tarde
adoratorios, y que los pueblos que ellos tenían
allí, y que adoraban en ello como en cosa que apareció que venía por el río una danta muerta,
era insignia de su señora, que es la que manda tamaña como una mula, y visto por el Capitán,
toda la tierra de las dichas mujeres. Hallóse mandó a ciertos compañeros que se la trujesen
también en esta misma plaza una casa no muy y tomasen una canoa para traerla, y la trujeron
pequeña, dentro de la cual había muchas y se repartió por todos los compañeros, de
vestiduras de plumas de diversos colores, las manera que a cada uno le cupo de comer para
cuales vestían los indios para celebrar sus cinco o seis días, que no fue poco sino mucho
fiestas y bailar cuando se querían regocijar remedio para todos. Esta danta venía recién
delante deste tablón ya dicho, y allí ofrecían sus muerta, porque estaba caliente y no traía
sacrificios con su dañada intención” (73). ninguna herida” (94).
7. “pescado” - “Miércoles víspera de Corpus 13. “Caracolejos” e “cangrejos bermejuelos” - no
Christi, siete días de junio el Capitán mandó se comía sino lo que se mariscaba a la lengua
tomar puerto en una población pequeña que del agua, que eran unos caracolejos y unos
estaba sobre el dicho río, y así se tomó sin cangrejos bermejuelos del tamaño de ranas”.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 11

A lenda das Amazonas


Foi no relato de Carvajal que apareceu a lenda das mulheres guerreiras da América do Sul
tropical, também chamadas Amazonas, como as da mitologia clássica – que deram o nome à
gigantesca região banhada pela bacia do rio homônimo. Carvajal diz o seguinte (pp. 85-87):

“En este asiento el Capitán tomó al indio que es otro su servisio sino oro y plata, y las demás
se había tomado arriba, porque ya le entendía por mujeres plebeyas se sirven en vasijas de palo,
un vocabulario que había fecho y le preguntó que excepto lo que llega al fuego, que es de barro. Dijo
de dónde era natural: el indio dijo que de aquel que en la cabecera y principal ciudad en donde
pueblo donde le habían tomado; el Capitán le dijo reside la señora hay cinco casas muy grandes que
que cómo se llamaba el señor desa tierra, y el indio son adoratorios y casas dedicadas al Sol, las cuales
le respondió que se llamaba Couynco, y que era ellas llaman caranaín y en estas casas por dentro
muy gran señor y que señoreaba hasta donde están del suelo hasta medio estado en alto
estábamos, que como dicho tengo, había ciento planchadas de gruesos techos aforrados de
cincuenta leguas. El Capitán le preguntó qué pinturas de diversos colores, y que en estas casas
mujeres eran aquellas (que) habían venido a les tienen muchos ídolos de oro y de plata en figura
ayudar y darnos guerra: el indio dijo que eran unas de mujeres, y mucha cantería de oro y de plata
mujeres que residían la tierra adentro siete para el servicio del Sol; y andan vestidas de ropa
jornadas de la costa, y por ser este señor Couynco de lana muy fina, porque en esta tierra hay muchas
sujeto a ellas, habían venido a guardar la costa. El ovejas de las del Perú; su traje es unas mantas
Capitán le preguntó si estas mujeres eran casadas: ceñidas desde los pechos hasta abajo, encima
el indio dijo que no. El Capitán le preguntó que de echadas y otras como manto abrochadas por
qué manera viven: el indio respondió que, como delante con muchos cordones; traen el cabello
dicho tiene, estaban la tierra adentro, y que él había tendido en su tierra y puestas en la cabeza unas
estado muchas veces allí y había visto su trato y coronas de oro tan anchas como dos dedos y
vivienda, que como su vasallo iba a llevar el tributo aquellos sus colores. Dijo más: que en esta tierra,
cuando el señor lo enviaba. El Capitán preguntó si según entendimos, hay camellos que los cargan, y
estas mujeres eran muchas: el indio dijo que sí, y dice que hay otros animales, los cuales no supimos
que él sabía por nombre setenta pueblos, y contólos entender, que son del tamaño de un caballo y que
delante de los que allí estábamos, y que en algunos tienen el pelo de un geme y la pata hendida y que
había estado. El Capitán le dijo que si estos pueblos los tienen atados, y que destos hay pocos. Dice
eran de paja: el indio dijo que no, sino de piedra y que hay en esta tierra dos lagunas de agua salgada,
con sus puertas, y que de un pueblo a otro iban de que ellas hacen sal. Dice que tienen una orden
caminos cercados de una parte y de otra y a trechos que, en poniéndose el sol, no há de quedar indio
por ellos puestos guardas porque no pueda entrar macho en todas estas ciudades que no salga afuera
nadie sin que pague derechos. El Capitán le y se valla a sus tierras: más dice, que muchas
preguntó si estas mujeres parían; el indio dijo que provincias de indios a ellas comarcanas los tienen
sí. El Capitán le dijo que como no siendo casadas, ellas subjetos y los hacen tributar y que les sirvan,
ni residía hombre entre ellas, se empreñaban: Él y otras hay con quien tienen guerra, y especial con
dijo que estas indias participan con indios en la que ya dijimos, y los traen para tener que hacer
tiempos y cuando les viene aquella gana juntan con ellos: éstos dicen que son muy grandes de
mucha copia de gente de guerra y van a dar guerra cuerpo y blancos y mucha gente, y que todo lo que
a un muy gran señor que reside y tiene su tierra aquí há dicho há visto por muchas veces, como
junto a la destas mujeres y por fuerza los traen a hombre que iba y venía cada día; y todo lo que este
sus tierras y tienen consigo aquel tiempo que se indio dijo y más nos habían dicho a nosotros a
les antoja, y después que se hacen preñadas les seis leguas de Quito, y por las ver vienen muchos
tornan a enviar a su tierra sin les hacer otro mal; indios el río abajo mil y cuatrocientas leguas; y así
y después, cuando viene el tiempo que han de parir, nos decían arriba los indios que el que hubiese de
que si paren hijo le matan y le envían a sus padres, bajar a la tierra de estas mujeres había de ir
y si hija, la crían con muy gran solemnidad y la muchacho y volver viejo. La tierra dice ser fría y
imponen en las cosas de la guerra. Dijo más, que que hay poca leña, y muy abundosa de todas
entre todas estas mujeres hay una señora que comidas; también dice otras muchas cosas, y que
subjeta y tiene todas las demás debajo de su mano cada día va descubriendo más porque es un indio
y jurisdicción, la cual señora se llama Coñori. Dijo de mucha razón y muy entendido y así lo son todos
que hay muy grandísima riqueza de oro y plata y los demás (de aquella) tierra, según lo habemos
que todas las señoras principales y de manera no dicho.”
12 A Viagem de Orellana Rio Amazonas abaixo nos anos de 1541 e 1542...

A “Relación” de Frei Gaspar de Carvajal


“RELACIÓN QUE ESCRIBIÓ FR. GASPAR DE CARVAJAL, FRAILE DE LA ORDEN DE SANTO DOMINGO
DE GUZMAN, DEL NUEVO DESCUBRIMIENTO DEL FAMOSO RÍO GRANDE QUE DESCUBRIÓ POR MUY
GRAN VENTURA EL CAPITÁN FRANCISCO DE ORELLANA DESDE SU NACIMIENTO HASTA SALIR A LA
MAR, CON CINCUENTA Y SIETE HOMBRES QUE TRAJO CONSIGO Y SE ECHÓ A SU VENTURA POR EL
DICHO RÍO, Y POR EL NOMBRE DEL CAPITÁN QUE LE DESCUBRIÓ SE LLAMÓ EL RÍO DE ORELLANA

Para que mejor se entienda todo el suceso hombre a quien Dios quiso dar parte de un tan nuevo
desta jornada, se ha de presuponer que este Capitán y nunca visto descubrimiento, como es este que
Francisco de Orellana era Capitán y Teniente de adelante diré. Después que el dicho Capitán llegó
Gobernador en la ciudad de Santiago la que él en al dicho Gonzalo Pizarro, que era Gobernador, fue
nombre de Su Majestad, pobló y conquistó a su en persona a descubrir la canela, y no halló tierra
costa, y de la Villa Nueva de Puerto Viejo, que es en ni disposición donde a Su Majestad pudiese hacer
las provincias del Perú; y por la mucha noticia que servicio, y así determinó de pasar adelante, y el dicho
se tenía de una tierra donde se hacía canela, por Capitán Orellana en su seguimiento con la demás
servir a Su Majestad en el descubrimiento de la gente, y alcanzó al dicho Gobernador en un pueblo
dicha canela, sabiendo que Gonzalo Pizarro, en que se llamaba Guema, que estaba en unas Cabañas
nombre del Marqués venía a gobernar a Quito y a ciento treinta leguas de Quito, y allí se tornaron a
la dicha tierra que dicho Capitán tenía a cargo; y juntar; y el dicho Gobernador, queriendo enviar por
para ir al descubrimiento de la dicha tierra, que a el río abajo a descubrir, hubo pareceres que no lo
la villa de Quito, donde estaba el dicho Gonzalo hiciese, porque no era cosa para seguir un río y
Pizarro a le ver y meter en la posesión de la dicha dejar las cabanas que caen a las espaldas de la villa
tierra. Hecho esto, el dicho Capitán dijo al dicho
de Pasto y Popayán, en que había muchos caminos;
Gonzalo Pizarro cómo quería ir con él en servicio de
y todavía el dicho Gobernador quiso seguir el dicho
Su Majestad y llevar sus amigos y gastar su hacienda
río, por el cual anduvimos veinte leguas, al cabo de
para mejor servir; y esto concertado, el dicho Capitán
las cuales hallamos unas poblaciones no grandes,
se volvió a retornar a la dicha tierra que a cargo
y aquí determinó el dicho Gonzalo Pizarro se hiciese
tenía y a dejar en quietud y sosiego las dichas ciudad
un barco para navegar el río de un cabo al otro por
y villa, y para seguir la dicha jornada gastó sobre
comida que ya aquel río tenía media legua de ancho;
cuarenta mil pesos de oro en cosas necesarias, y,
y aunque el dicho Capitán era de parecer que no se
aderezado se partió para la Villa de Quito, donde
hiciese el dicho barco por algunos buenos respetos,
dejó al dicho Gonzalo Pizarro, y cuando llegó, le falló
sino que diesen vuelta a las dichas cabañas y
que era ya partido, de cuya causa el Capitán estuvo
siguiésemos los caminos que iban al dicho ya
en alguna confusión de lo que había de hacer, y se
poblado, el dicho Gonzalo Pizarro no quiso sino que
determinó de pasar adelante y lo seguir [MS roto],
se pusiese en obra el dicho barco; y así, el Capitán
aunque los vecinos de la tierra se lo estorbaban por
Orellana visto esto, anduvo por todo el real sacando
haber de pasar por tierra muy belicosa y fragosa y
hierro para clavos y echando a cada uno la madera
que temían lo matasen, como habían hecho a otros
que había de traer, y desta manera y con el trabajo
que habían ido con muy gran copia de gente; pero
de todos se hizo el dicho barco, en el cual metió el
no obstante esto por servir a su Majestad, determinó
dicho Gobernador Pizarro alguna ropa y indios
con todo este riesgo de seguir tras el dicho
dolientes y seguimos el río abajo otras cincuenta
Gobernador; y así padeciendo muchos trabajos, así
leguas, al cabo de las cuales se nos acabó el
de hambres como de guerras que los indios le daban,
que por no llevar más de veinte y tres hombres poblado y íbamos ya con muy gran necesidad y
muchas veces le ponían en tanto aprieto que falta de comida, de cuya cabsa todos los
pensaron ser perdidos y muertos en manos de ellos compañeros iban muy descontentos y platicaban
y con este trabajo caminó [MS roto], leguas desde el de se volver y no pasar adelante, porque se tenía
Quito, en el término de las cuales perdió cuanto noticia que había gran despoblado, y el Capitán
llevaba, de manera que cuando alcanzó al dicho Orellana, viendo lo que pasaba y la gran necesidad
Gonzalo Pizarro no llevaba sino una espada y una en que todos estaban, y que había perdido todo
rodela, y sus compañeros por el consiguiente y desta cuanto tenía, le pareció que no cumplía con su
manera entró en la provincia de Motín, donde estaba honra dar la vuelta sobre tanta pérdida, y así se
el dicho Gonzalo Pizarro con su real, y allí se juntó fue al dicho Gober nador y le dijo cómo él
con él y fue en demanda de la dicha canela; y aunque determinaba de dejar lo poco que allí tenía y seguir
esto que he dicho hasta aquí no lo vi ni me hallé en río abajo, y que si la ventura le favoreciese en que
ello, pero informéme de todos los que venían con el cerca hallase poblado y comida con que todos se
dicho Capitán, porque estaba yo con el dicho pudiesen remediar, que él se lo haría saber, y que
Gonzalo Pizarro y le vi entrar a él y sus compañeros si viese que se tardaba, que no hiciese cuenta dél,
de la manera que dicho tengo; pero lo que de aquí y que, entre tanto, que se retrajese atrás donde
en adelante dijere será como testigo de vista y hubiese comida, y que allí le esperase tres o cuatro
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 13

días, o el tiempo que le pareciese, y que si no viniese, que comieron algunas hierbas no conocidas, los
que no hiciese cuenta dél; y con esto el dicho cuales estuvieron a punto de muerte, porque
Gobernador le dijo que hiciese lo que le pareciese; y estaban como locos y no tenían seso; pero como
así, el Capitán Orellana tomó consigo cincuenta y Nuestro Señor era servido que siguiésemos nuestro
siete hombres con los cuales se metió en el barco viaje, no murió ninguno. Con esta fatiga dicha iban
ya dicho y en ciertas canoas que a los indios se algunos compañeros muy desmayados a los cuales
habían tomado, y comenzó a seguir su río abajo el Capitán animaba y decía que se esforzasen y
con propósito de luego dar la vuelta, si comida se tuviesen confianza en Nuestro señor, que pues él
hallase; lo cual salió al contrario de como todos nos había echado por aquel río, tendría bien de nos
pensábamos; porque no fallamos comida en sacar a buen puerto: de tal manera animó a los
doscientas leguas, ni nosotros la hallábamos, de compañeros que recibiesen aquel trabajo. El día de
cuya cabsa padecimos muy gran necesidad, como año nuevo de cuarenta y dos pareció a ciertos
adelante se dirá; y así, íbamos caminando compañeros de los nuestros que habían oído
suplicando a Nuestro Señor tuviese por bien de nos tambores de indios, y algunos lo afirmaban y otros
encaminar en aquella jornada de manera que decían que no; pero algún tanto se alegraron con
pudiésemos volver a nuestros compañeros. El esto y caminaron con mucha (más) diligencia de la
segundo día que salimos y nos apartamos de acostumbrada; y como a lo cierto aquel día ni otro
nuestros compañeros nos hubiésemos de perder en no se viese poblado, vióse ser imaginación, como
medio del río, porque el barco dio en un palo y en la verdad lo era; y desta cabsa, así los enfermos
sumióle una tabla, de manera que a no estar cerca como los sanos, desmayaban en tanta manera, que
de tierra acabáramos allí nuestra jornada; pero les parecía que ya no podían escapar; pero con las
púsose luego remedio en sacarse de agua y ponerle palabras que el Capitán les decía los sustentaba, y
un pedazo de tabla, y luego comenzamos nuestro como Nuestro Dios es padre de misericordia y de
camino con muy gran priesa; y como el río corría toda consolación, que repara y socorre al que le
mucho andábamos a veinte y a veinte y cinco leguas, llama en el tiempo de la mayor necesidad: y es, que
porque ya el río iba crecido y aumentando así, por estando lunes en la noche que se contaron ocho del
cabsa de otros muchos ríos que entraban en él por mes de enero, comiendo ciertas raíces montesinas,
la mano diestra hacia el sur. Caminamos tres días oyeron muy claramente atambores, de muy lejos de
sin poblado ninguno. Viendo que nos habíamos donde nosotros estábamos, y el Capitán fue el que
alejado de donde nuestros compañeros habían los oyó primero y lo dijo a los compañeros, y todos
quedado y que se nos había acabado lo poco que de escucharon y, certificados, fue tanta el alegría que
comer traíamos para nuestro camino tan incierto todos sintieron, que todo el trabajo pasado echaron
como el que facíamos, púsose en plática entre el en olvido porque ya estábamos en tierra y que ya
Capitán y los compañeros la dificultad, y la vuelta, no podíamos morir de hambre. El Capitán proveyó
y la falta de la comida, porque como pensábamos luego en que por cuartos nos velásemos con mucha
de dar luego la vuelta, no metimos de comer; pero orden, porque [MS roto] podría ser los indios
en confianza que no podíamos estar lejos, habernos sentido y venir de noche y dar sobre el
acordamos de pasar adelante, y esto no con poco real, como ellos suelen hacer; y así, aquella noche
trabajo de todos, y como otro ni otro día no se hallase hubo muy gran vela, no durmiendo el Capitán,
comida ni señal de población, con parecer del pareciendo que aquella noche sobrepujaba a las
Capitán, dije yo una misa, como se dice en la mar, demás, porque deseaban tanto el día por verse
encomendando a Nuestro Señor nuestras personas hartos de raíces. Siquiera venida la mañana, el
y vidas, y suplicándole, como indigno, nos sacase Capitán mandó que se aderezase la pólvora y
de tan manifiesto trabajo y perdición, porque ya se arcabuces y ballestas, y que todos fuesen a punto
nos traslucía, porque aunque quisiésemos volver de armarse, porque a la verdad aquí ninguno de los
agua arriba no era posible por la gran corriente, compañeros estaba sin mucho cuidado por hacer
pues tentar de ir por tierra era imposible: de manera lo que debían. El Capitán tenía el suyo y el de todos;
que estábamos en gran peligro de muerte a cabsa y así por la mañana, todo muy bien aderezado e
de la gran hambre que padecimos; y así, estando puesto en orden, comenzamos a caminar en
buscando el consejo de lo que se debía de hacer, demanda del pueblo. Al cabo de dos leguas que
platicando nuestra aflición y trabajos, acordóse que habíamos ido el río abajo vimos venir por el río arriba
eligiésemos de dos males el que al capitán y a todos cuatro canoas llenas de indios a ver y requerir la
pareciese menor, que fue ir adelante y seguir el río tierra, y como nos vieron, dan la vuelta a gran priesa,
o morir o ver lo que en él había, confiando en Nuestro dando arma, en tal manera que en menos de un
Señor que tendría por bien de conservar nuestras cuarto de hora oímos en los pueblos muchos
vidas fasta ver nuestro remedio; y entre tanto, a atambores que apellidaban la tierra, porque se oyen
falta de otros mantenimientos, vinimos a tan gran de muy lejos y son tan bien concertados, que tienen
necesidad que no comíamos sino cueros, cintas y su contra y tenor y triple: y luego el Capitán mandó
suelas de zapatos cocidos con algunas hierbas, de que a muy gran priesa remasen los compañeros que
manera que era tanta nuestra flaqueza que sobre llevaban los remos en las manos, porque llegásemos
los pies no nos podíamos tener, que unos a gatas y al primer pueblo antes que las gentes se recogiesen;
otros con bordones se metieron en las montañas a y así fue que a muy gran priesa comenzamos a
buscar algunas raíces que comer, y algunos hubo caminar, y llegamos al pueblo a donde los indios
14 A Viagem de Orellana Rio Amazonas abaixo nos anos de 1541 e 1542...

todos estaban esperando a defender y guardar sus así de día como de noche, hubiese mucho recaudo
casas, y el Capitán mandó que con muy gran orden porque los indios no diesen en nosotros ni hubiese
saltasen todos en tierra y que todos mirasen por descuido ni flojedad por donde tomasen ánimo de
uno y uno por todos, y que ninguno se desmandase nos acometer de noche o de día. Otro día a hora de
y como buenos mirasen lo que tenían entre manos vísperas vino el dicho Cacique y trujo consigo otros
y que cada uno hiciese lo que era obligado: fue tanto
tres o cuatro señores, que los demás no pudieron
el ánimo que todos cobraron en viendo el pueblo,
venir por estar lejos, que otro día vendrían; el
que olvidaron toda fatiga pasada, y los indios dejaron
Capitán les hizo el mismo recebimiento que al
el pueblo con toda la comida que en él había, que
no fue poco reparo y amparo para nosotros. Antes primero y les habló muy largo de parte de Su
que los compañeros comiesen, aunque tenían harta Majestad y en su nombre tomó la posesión de la
necesidad, mandó el Capitán que corriesen todos el dicha tierra; y así fizo a todos los demás que después
pueblo, porque después, estando recogiendo comida en esta provincia vinieron, porque, como dije, eran
y descansando, no revolviesen los indios sobre trece, y en todos tomó posesión en nombre de Su
nosotros y nos hiciesen daño, y así se hizo. Aquí Majestad. Viendo el Capitán que toda la gente y
comenzaron los compañeros a se vengar de lo señores de la tierra tenían de paz y consigo que
pasado, porque no hacían sino comer de lo que los convenía al buen tratamiento, todos holgaban de
indios tenían guisado para así beber de sus brevajes venir en paz; y así tomó posesión en ellos y en la
y esto con tanta agonía que no pensaban verse dicha tierra en nombre de Su Majestad; y después
hartos; y no se hacía esto muy al descuido, porque de esto fecho mandó juntar a sus compañeros para
aunque comían como hombres lo que habían
les hablar en lo que convenía a su jornada y
menester, no olvidaban de tener cuidado de lo que
salvamiento y sus vidas, haciéndoles un largo
les era necesario para defender sus personas, que
todos andaban sobre aviso, las rodelas al hombro y razonamiento, esforzándoles con muy grandes
las espadas debajo de los sobacos mirando si los palabras. Después de hecho este razonamiento el
indios revolvían sobre nosotros; y así estuvimos en Capitán, los compañeros quedaron muy contentos
este descanso, que tal se puede llamar para nosotros por ver el buen ánimo que el Capitán en si tenía y
según el trabajo (que) habíamos pasado, fasta dos ver con cuánta paciencia sufría los trabajos en que
horas después del medio día, que los indios estaba, y le dijeron también muy buenas palabras,
comenzaron de venir por el agua a ver qué cosa era, y con las palabras que el Capitán les decía andaban
y así andaban como bobos por el río; y visto esto tan contentos que ninguna cosa de lo que trabajaban
por el Capitán, púsose sobre la barranca del río y no sentían.
en su lengua, que en alguna manera los entendía,
comenzó de fablar con ellos y decir que no tuviesen Después que los compañeros estuvieron
temor y que llegasen, que les querían hablar; y así reformados algún tanto de la hambre y trabajo
llegaron dos indios hasta donde estaba el Capitán, pasado, estando para trabajar el Capitán, viendo que
y les halagó y quitó el temor y les dio de lo que era necesario proveer lo de adelante, mandó llamar
tenía, y dijo que les fuesen a llamar al señor, que le a todos sus compañeros, y les tornó a decir que ya
quería hablar, y que ningún temor tuviese que le veían que con el barco que llevábamos e canoas, si
hiciese mal ninguno; y así los indios tomaron lo que Dios fuese servido de nos aportar a la mar, no
les fue dado y fueron luego a decirlo a su señor, el podíamos en ellos salir a salvamento y por esto era
que vino luego muy lucido donde el Capitán y los necesario procurar con diligencia de hacer otro
compañeros estaban y fue muy buen recebido del bergantín, que fuese de más porte para que
Capitán y de todos, y le abrazaron, y el mesmo pudiésemos navegar, y aunque no había entre
Cacique mostró tener en sí mucho contentamiento
nosotros maestro que supiese de tal oficio, porque lo
en ver el buen recibimiento que se le facía. Luego el
que más dificultoso hallábamos era el hacer los
Capitán le mandó dar de vestir y otras cosas conque
clavos; y en este tiempo los indios no dejaban de
él mucho se holgó; y después quedó tan contento
que dijo que mirase el Capitán de que tenía acudir y venir al Capitán y le traer de comer muy
necesidad, que él se lo daría, y el Capitán le dijo largo y con tanta orden como si toda su vida hubieran
que de ninguna cosa más que de comida lo mandase servido; y venían con sus joyas y patenas de oro y
proveer; y luego el cacique mandó que trujesen jamás el Capitán consintió tomar nada, ni aun
comida sus indios, y aun com muy gran brevedad solamente mirarlo, porque los indios no entendiesen
trajeron abundantemente lo que fue necesario así que lo teníamos en algo, y mientras en esto nos
de carnes, perdices, pavas y pescados de muchas descuidábamos, más oro se echaba a cuesta.
maneras; y después de esto, el Capitán lo agradeció
mucho al Cacique y le dijo que se fuese con Dios, y Aquí nos dieron noticia de las amazonas y de
que le llamase a todos los señores de aquella tierra, la riqueza que abajo hay, y el que la dio fue un indio
que eran trece, porque a todos juntos les quería señor llamado Aparia, viejo que decía haber estado
hablar y decir la cabsa de su venida; y él aunque en aquella tierra, y también nos dio noticia de otro
les dijo que otro día serían todos con el Capitán, y señor que estaba apartado del río, metido en la tierra
que él los iba a llamar, y se partía muy contento, el adentro, el cual decía poseer muy gran riqueza de
Capitán quedó dando orden en lo que convenía a él oro: este señor se llama Ica; nunca le vimos, porque
y a sus compañeros, ordenando las velas para que, como digo, se nos quedó desviado del río.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 15

E por no perder el tiempo ni gastar la comida no habíamos andado obra de veinte leguas cuando
en balde, acordó el Capitán que luego se pusiese se juntó con nuestro río otro por la diestra mano,
por obra lo que se había de hacer, y así mandó no muy grande en el cual río tenía su asiento un
aparejar lo necesario, y los compañeros dijeron que principal señor llamado Irrimorrany, por ser indio
querían comenzar luego su obra; y hubo entre y señor de mucha razón y haber venido a ver al
nosotros dos hombres a los cuales no se debe poco, Capitán y a le traer de comer, quiso ir a su tierra,
por hacer lo que nunca aprendieron, y parecieron pero también fue por cabsa de que venía el río muy
ante el Capitán y le dijeron que ellos, con ayuda de recio y con grande avenida; y aquí estuvimos en
Nuestro señor, harían los clavos que fuesen punto de nos perder, porque al entrar, que entraba
menester, que mandasen a otros hacer carbón. este río en el que nosotros navegábamos, peleaba
Estos dos compañeros se llamaban el uno Juan de la una agua con la otra y traía mucha madera de
Alcántara fidalgo, natural de la villa de Alcántara, y un cabo a otro, que era trabajo navegar por él,
el otro Sebastián Rodríguez, natural de Galicia; y el porque hacía muchos remolinos y nos traía a un
Capitán se lo agradeció prometiéndoles el galardón cabo y a otro; pero con harto trabajo salimos deste
y pago de tan gran obra; y luego mandó facer unos peligro sin poder tomar el pueblo, y pasamos
fuelles de borceguíes, y así todas las demás adelante, donde teníamos nueva de otro pueblo que
herramientas, y los demás compañeros mandó que nos decían que estaba de allí doscientas leguas,
de tres en tres diesen buena hornada de carbón, lo porque todo lo demás era desierto, y así las
cual se puso luego por obra, y tomó cada uno su caminamos con mucho trabajo de nuestras personas
herramienta y se iban al monte a cortar leña y la padeciendo muchas necesidades y peligros muy
traer a cuestas desde el monte hasta el pueblo, que notables, entre los cuales nos acaeció un desmán y
habría media legua, y hacían sus hoyos, y esto con no pequeña alteración para en el tiempo en que
muy gran trabajo. Como estaban flacos y no diestros
estábamos, y fue que dos canoas donde iban once
en aquel oficio, no podían sufrir la carga, y los demás
españoles de los nuestros se perdieron entre unas
compañeros que no tenían fuerza para cortar
islas sin saber dónde estábamos ni los poder topar:
madera, sonaban los fuelles y otros acarreaban
anduvieron dos días perdidos sin nos poder topar,
agua, y el Capitán trabajaba en todo, de manera
y nosotros, pensando nunca los cobrar, estábamos
que todos teníamos en qué entender. Dióse tan
con muy gran pasión; pero al cabo deste dicho
buena manera nuestra compañía en ese pueblo en
tiempo fue Nuestro Señor servido que nos topamos,
la fabrica desta obra, que en veinte días, mediante
que no fue poca el alegría entre todos, y así
Dios, se hicieron dos mil clavos muy buenos y otras
estábamos con tanta alegría que nos parecía que
cosas, y dejó el Capitán la obra del bergantín para
donde hallase más oportunidad y mejor aparejo. todo el trabajo pasado se nos había olvidado.
Después de haber un día descansado a donde los
Detuvímonos en este pueblo más de lo topamos, mandó el Capitán que caminásemos.
habíamos de estar, comiendo lo que teníamos, de
tal manera que fue parte para que desde en Otro día, a las diez horas, llegamos a unas
poblaciones en las cuales estaban los indios en
adelante pasásemos muy gran necesidad, y esto
sus casas, y por no alborotar no quiso el Capitán
fue por ver si por alguna vía o manera podíamos
que llegásemos allá, y mandó a un compañero que
saber nueva del real; y visto que no, el Capitán
fuese con otros veinte a donde los indios estaban y
acordó de dar mil castellanos a seis compañeros si
que no saltasen en sus casas ni saliesen en tierra,
juntarse quisiesen y dar la nueva al Gobernador
sino que con mucho amor les dijesen la gran
Gonzalo Pizarro, y demás desto les darían dos
necesidad en que íbamos, y que nos diesen de
negros que les ayudasen a remar y algunos indios
comer y que viniesen a hablar al Capitán, que
para que llevasen cartas y le diesen de su parte
quedaba en medio del río, porque les quería dar de
nueva de lo que pasaba; y entre todos no se fallaron
lo que traía y decir la cabsa de su venida. Los indios
sino tres, porque todos temían la muerte que les
se estuvieron quedos y holgáronse mucho en ver
esperaba cierta, por lo que habían de tardar hasta
nuestros compañeros, y les dieron mucha comida
llegar a donde habían dejado al dicho Gobernador,
de tortugas y papagayos en abundancia, y les
y que él habría ya dado la vuelta, porque habían
dijeron que dijesen al Capitán que se fuese a
andado ciento cincuenta leguas desde que habían
aposentar a un pueblo que estaba despoblado de
dejado al Gobernador en nueve días que habían
la otra parte del río, y que otro día de mañana le
caminado.
irían a ver. El Capitán holgó mucho con la comida
Acabada la obra, y visto que la comida se nos y más con la buena razón de los indios, y así nos
agotaba y se nos habían muerto siete compañeros fuimos a aposentar y dormimos aquella noche en
de la hambrre pasada, partimos, día de Nuestra el ya dicho pueblo, donde no nos faltar on
Señora la Candelaria: metimos la comida que abundancia de mosquitos, que fue cabsa de que
pudimos, porque ya no era tiempo de estar más en otro día de mañana el Capitán se fuese a otro
aquel pueblo, lo uno, porque los naturales parecía pueblo mayor que parecía más abajo; y llegados
que se les hacía de mal, y querían dejarlos muy los indios no se pusieron en resistencia, antes
contentos, y lo otro porque no perdiésemos el tiempo estuvieron quedos, y allí folgamos tres días, a donde
y gastásemos la comida sin provecho, porque no los indios vinieron en paz a nos traer de comer
sabíamos si la habríamos menester; y así muy largo. Otro día, pasados los tres, salimos
comenzamos a caminar por esta dicha provincia, y deste pueblo y caminamos por nuestro río a vista
16 A Viagem de Orellana Rio Amazonas abaixo nos anos de 1541 e 1542...

de buenos pueblos; y yendo así, un domingo de sus canoas mucha cantidad de comida, así de
mañana, a una división que el río hacía, que se tortugas como de manatís y otros pescados, y
partía en dos partes, subieron a vernos unos indios perdices y gatos y monos asados. Viendo el Capitán
en cuatro o cinco canoas que venían cargados de el buen comedimiento del señor, le hizo un
mucha comida, e se llegaron cerca de donde venía razonamiento dándole a entender cómo éramos
el Capitán y pidieron licencia para llegar porque le cristianos y adorábamos un solo Dios el cual era
querían hablar al dicho Capitán, el cual mandó que criador de todas las cosas criadas, y que no éramos
llegasen; y así llegaron, le dijeron como ellos eran como ellos que andaban errados adorando en
principales vasallos de Aparia, y que por su piedras y bultos hechos; y sobre este caso les dijo
mandado venían a nos traer de comer; y comenzaron otras muchas cosas, y también les dijo como éramos
a sacar de sus canoas muchas perdices como las criados y vasallos del Emperador de los cristianos
de nuestra España, sino que son mayores, y muchas gran Rey de España, y se llamaba D. Carlos Nuestro
tortugas, que son tan grandes como adargas, y otros Señor, cuyo es el imperio de todas las Indias y otros
pescados. El Capitán se lo agradeció y les dio de lo muchos señoríos y reinos que hay en el mundo, y
que tenía, y después de se lo haber vendido, los que por su mandato íbamos a aquella tierra, y que
indios quedaron muy contentos de ver el buen le ibamos a dar razón de lo que habíamos visto en
tratamiento que se les hacia, y en ver que el Capitán ella; y estaban muy atentos y con mucha atención
les entendía su lengua, que no fue poco para que escuchando lo que el Capitán les decía, y le dijeron
nosotros saliésemos a puerto de claridad, que, a no que si ibamos a ver los amurianos, que en su lengua
la entender, tuviéramos por dificultosa nuestra los llaman coniupuyara, que quiere decir grandes
salida. Ya que los indios se querían despedir, dijeron señoras, que mirásemos lo que hacíamos, que
al Capitán que fuese al pueblo donde residía su éramos pocos y ellas muchas, que nos matarían;
principal señor, que como digo, se llamaba Aparia, que no estuviésemos en su tierra, que allí nos darían
y el Capitán les dijo que por cuál de los dos brazos
todo lo que hubiésemos menester. El Capitán les
había de ir, y ellos respondieron que ellos nos
dijo que no podía hacer otra cosa sino pasar de largo
guiarían, que fuésemos en su seguimiento; y así, a
para dar razón a quien le enviaba que era su Rey y
poco rato, vimos las poblaciones donde estaba el
Señor; y después que el Capitán habló, y que parecía
dicho señor, y caminando hacia allá el Capitán tornó
que los oyentes quedaban muy contentos, aquel
a preguntar a los indios que cuyas eran aquellas
principal señor preguntó que quién era aquél, y
poblaciones; los indios respondieron que allí estaba
queriéndose mejor informar de lo que se le decía,
el sobredicho su señor, y así comenzaron a irse hacia
por ver si el Capitán discrepaba de lo dicho, el cual
el pueblo a dar mandado como ibamos, y no tardó
le respondió lo mesmo que le había dado a entender
mucho que vimos salir del dicho pueblo muchos
y le dijo más que éramos hijos del Sol y que ibamos
indios a se embarcar en sus canoas, a manera de
hombres de guerra, y pareció querernos acometer. a aquel río, como ya le había dicho. Desto se
El Capitán mandó a sus compañeros, que veían la espantaron mucho los indios y mostraron mucha
muestra que los indios hacían, que fuesen a punto alegría, teniéndonos por santos o personas
con sus ar mas aparejadas, porque si nos celestiales, porque ellos adoran y tienen por su Dios
acometiesen no fuesen parte para nos hacer daño; al Sol, que ellos llaman Chise. Luego dijeron al
y con mucha orden, remando y a muy gran fuerza, Capitán que ellos eran suyos y que le querían servir,
abordamos en tierra, y los indios pareció desviarse. y que mirase de qué tenía necesidad él y sus
El Capitán saltó en tierra con sus armas, y tras él compañeros que él se lo daría muy de su voluntad.
los demás, y desto quedaron los indios muy El Capitán se lo agradeció mucho y mandó luego a
espantados y se llegaron más a tierra. El Capitán dar muchas cosas, y a los demás principales, y
como los entendiese, que, como dicho tengo, el quedaron tan contentos que dende en adelante
entender él la lengua, fue parte después de Dios, ninguna cosa el Capitán les pedía que luego no se
para no nos quedar en el río, que a no la entender, ni la daban; y se levantaban todos en pie, y dijeron al
los indios salieran de paz ni nosotros acertáramos Capitán que se aposentase en el pueblo, que ellos
en estas poblaciones; mas como era Nuestro Señor se lo dejarían desembarazado, y que se querían ir a
servido que tan gran secreto y descubrimiento se sus casas y que cada día vendrían a traernos de
ficiese y viniese a noticia de la Cesárea Majestad, y comer. El Capitán les mandó que viniesen todos los
con tanta dificultad, se descubrió, e por otra vía ni señores a verle, porque quería darles lo que tenía.
fuerza ni poderío humano era posible descubrirse El señor dijo que otro día vendrían y así vinieron
sin poner Dios en ello su mano, o sin que pasasen todos con muy grande abundancia de comida, y
muchos siglos y años. fueron bien recebidos y tratados por el Capitán, y a
Después que el Capitán llamó a los indios les todos juntos les tornó a hablar lo que primero había
dijo que no tuviesen temor, que saltasen en tierra, dicho al principal señor, y tomó posesión en nombre
y ellos así lo hicieron, que se llegaron junto a tierra, de Su Majestad en todos; y los señores eran veinte
mostrando en su semblante que se holgaban de y seis, y en señal de posesión mandó poner una
nuestra venida; y saltó el señor en tierra, y con él cruz muy alta, con la cual los indios se folgaron, y
muchos principales y señores que lo acompañaban, dende en adelante cada día los indios venían a
y pidió licencia al Capitán para se asentar, y así se traernos de comer y hablar con el Capitán, que desto
asentó, y toda su gente en pie, e mandó sacar de se folgaban ellos mucho.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 17

Figura 3.1. Araras (apud Brehm)


18 A Viagem de Orellana Rio Amazonas abaixo nos anos de 1541 e 1542...

Visto por el Capitán el buen aparejo y recibió muy bien, y primero que los hablase, les
disposición de la tierra y la buena voluntad de los mandó dar muchas joyas, que ellos tuvieron en
indios, mandó juntar a todos sus compañeros y les mucho y se folgaron. El Capitán les dijo todo lo que
dijo que pues había allí buen aparejo y voluntad en había dicho al señor Aparia, de lo cual los indios
los indios, que sería bien hacer un bergantín, y así quedaron no poco espantados; y los indios dijeron al
se puso por obra; y fallóse entre nosotros un Capitán que ellos se querían ir a dar respuesta a su
entallador llamado Diego Mexía, el cual, aunque no señor, que les diese licencia. El Capitán se las dio y
era su oficio, dio orden cómo se había de hacer; y que se fuesen en hora buena, y les dio muchas cosas
luego el Capitán mandó repartir por todos los que diesen a su principal señor y que le dijesen que
compañeros que cada uno trajese una cuaderna y el Capitán le rogaba mucho le viniese a ver, porque
dos estamenas, y a otros que trajesen la quilla, y a se holgaría mucho con él; y el1os dijeron que así lo
otros las rodas, ya otros que aserrasen tablas, de farían, y se fueron y nunca más supimos nuevas de
manera que todos tenían bien en que se ocupar, no dónde eran ni de qué tierra habían venido.
sin poco trabajo de sus personas, porque como era Posamos en este mismo asiento toda la
invierno y la madera estaba muy lejos, cada cual Cuar esma, donde se confesaron todos los
tomaba su hacha y iba al monte y cortaba lo que le compañeros con dos religiosos que allí estábamos,
cabía y lo acarreaba a cuestas, y mientras unos y yo prediqué todos los domingos y fiestas el
acarreaban, otros les hacían espaldas porque los Mandato, la Pasión y Resurrección, lo mejor que
indios no les ficiesen mal, y desta manera en siete Nuestro Redentor me quiso dar a entender con su
días se cortó toda la maderaje para el dicho gracia, y procuré de ayudar y esforzar lo que yo pude
bergantín; y acabada esta tarea, luego fue dada otra, a la perseveración de su buen ánimo a todos aquellos
que fue que mandó hacer carbón para hacer más hermanos y compañeros, acordándoles que eran
clavos y otras cosas. Era cosa maravillosa de ver cristianos y que servirían mucho a Dios y al
con cuánta alegría trabajaban nuestros compañeros Emperador en proseguir la empresa y comportar
y acarreaban el carbón, y así se proveyó todo lo con paciencia los trabajos presentes y por venir
demás necesario. No había hombre entre todos hasta salir con este nuevo descubrimiento, demás
nosotros que fuese acostumbrado a semejantes de ser esto lo que a sus vidas y honras tocaba; así
oficios; pero, no obstante todas estas dificultades, que en este propósito dije lo que me parecía
Nuestro Señor daba a todos ingenio para lo que se cumpliendo con mi oficio, y también porque me iba
había de hacer, pues que era para salvar las vidas, la vida en el buen suceso de nuestra peregrinación.
porque de allí saliéramos con el barco y canoas, También prediqué el domingo de Quasimodo, y
dando como dimos después en gente de guerra, ni puedo testificar con verdad que, así el Capitán como
nos pudiéramos defender ni salir del río en todos los demás compañeros tenían tanta clemencia
salvamento, y así pareció claramente que Dios y espíritu y santidad de devoción en Jesucristo y su
inspiró en el Capitán para que en este pueblo que sagrada fe, que bien mostró Nuestro Señor que era
he dicho se hiciese el bergantín, porque adelante su voluntad de nos socorrer. El Capitán me rogaba
era imposible, y éste se falló muy a propósito, porque que predicase y todos entendiesen en sus devociones
los indios no faltaron de siempre nos traer de comer con mucho fervor, como personas que lo habían muy
muy abundantemente de la manera que el Capitán bien menester de pedir a Dios misericortlia. Adobóse
se los pedía. Dióse tanta priesa en esta obra del también el barco pequeño, porque venía ya podrido,
bergantín que en treinta y cinco días se labró y se y así todo muy bien aderezado y puesto a punto, el
echó al agua calafateado con algodón e betunado Capitán mandó que todos estuviesen aparejados y
con pez, lo cual todos los indios traían porque el hiciesen matalotaje, porque con ayuda de Nuestro
Capitán se los pedía. No fue poca el alegría de Señor quería partirse el lunes adelante. Una cosa
nuestros compañeros por haber acabado aquello que nos aconteció en este pueblo no de poco espanto, y
tanto deseaban. Había tantos mosquitos en este fue que el miércoles de Tiniebla y el Jueves Santo y
pueblo que no nos podíamos valer de día ni de noche, viernes de la † nos hicieron los indios ayunar por
sin que los unos a los otros no sabíamos qué fuerza porque no nos trajeron de comer hasta el
hacernos, que con la buena posada no sentíamos sábado víspera de Pascua, y el Capitán les dijo que
el trabajo y con el deseo que teníamos de ver el fin por qué no nos habían traído de comer, y ellos
de nuestra jomada. En este medio tiempo, estando dijeron que porque no lo habían podido tomar; y
en esta obra, vinieron cuatro indios a ver al Capitán, así el sábado y domingo de Pascua, y domingo de
los cuales llegaron, y eran de estatura que cada uno Quasimodo, fue tanta la comida que trajeron, que
era más alto un palmo que el más alto cristiano, y la echábamos en el campo, y porque todo fuese
eran muy blancos y tenían muy buenos cabellos como convenía, y con toda orden, fizo alférez a un
que les llegaban a la cintura, muy enjoyados de oro hidalgo muy suficiente para el oficio llamado Alonso
y ropa; y traían mucha comida; y llegaron con tanta de Robles, el cual, después que llegamos a tierra
humildad que todos quedamos espantados de sus de guerra, el Capitán le mandaba saltar con
disposiciones y buena crianza; sacaron mucha algunos compáñeros a recoger comida para todos
comida y pusiéronla delante del Capitán, y le dijeron y el Capitán quedaba a guardar los bergantines,
como ellos eran vasallos de un señor muy grande, y los cuales eran en este viaje todo nuestro bien y
que por su mandado venían a ver quién éramos o amparo después de Dios, porque los indios no
qué queríamos o dónde íbamos; y el Capitán les deseaban otra cosa sino quitárnoslos.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 19

Partimos del asiento, y pueblo de Aparia con escribir si no tuviera tantos testigos que a ello se
el nuevo bergantín, el cual fue de diez y nueve goas hallaron presentes; y fue que un compañero ya
[“goas”, equivalente a três palmos de nove polegadas, nombrado, que es el que dio orden en el bergantín,
ou seja, 0,73 m. O bergantim teria, portanto, 12,87 tiró a una ave con una ballesta, que estaba en un
m], bastante para navegar por la mar, víspera del árbol junto al río, v saltó la nuez de la caja y cayó
Evangelista San Marcos, a veinte y cuatro de abril en el río, y estando en ninguna confianza de cobrar
del año sobredicho, que vinimos por las poblaciones la nuez, otro compañero llamado Contreras, echó
de aquel señorío de Aparia, las cuales duraron más un anzuelo en el río con una vara y sacó un pescado
de ochenta leguas, sin fallar indio de guerra, antes de cinco palmos, y como era grande y el anzuelo
el mismo Cacique vino a hablar y traer de comer al pequeño, fue menester sacarlo con maña, y, abierto,
Capitán y a nosotros, y holgamos en un pueblo suyo dentro del buche se halló la nuez de la ballesta, y
el sobredicho día de San Marcos, a donde el mismo así se reparó que no fue después poco menester,
señor vino a traernos muy largo de comer y el porque, después de Dios, las ballestas nos dieron
Capitán lo recibió muy bien, y no se le hizo mal las vidas.
tratamiento porque el intento y deseo del Capitán
Complidos doce días de mayo llegamos a las
era, porque si posible fuese, quedase en aquella
provincias de Machiparo, que es muy gran señor y
tierra y gente bárbara en buen respecto por haberla
de mucha gente y confina con otro señor tan grande
conocido y sin descontentamiento alguno, porque
llamado Omaga, y son amigos que se juntan para
desto sería servido Dios Nuestro Señor y el Rey
dar guerra a otros señores que están la tierra
Nuestro Señor, para que adelante, cuando a Su
adentro, que les vienen cada día a echar de sus
Majestad pluguiera con más facilidad nuestra
casas. Este Machiparo está asentado sobre el mismo
sagrada república y fe cristiana y la bandera de
río en una loma, y tiene muchas y grandes
Castilla se aumentase y la tierra se fallase más
poblaciones que juntan de pelea cincuenta mil
doméstica para pacificalla y ponella debajo de la
hombres de edad de treinta años hasta setenta,
obediencia de su Real Servicio, como conviniese,
porque los mozos no salen a la guerra ni en cuantas
porque junto con hacerse esto con buen tiento y
caridad, era asimismo para conservar lo necesario, batallas nosotros con ellos tuvimos no les vimos,
el buen tratamiento que se hiciese a los indios para sino fueron viejos, y éstos muy dispuestos, y tienen
poder pasar adelante y que no se usase el remedio bozos y no barbas.
de las armas sino cuando no se pudiese excusar la Antes que llegásemos a este pueblo con dos
defensión propia. En esta cabsa, aunque fallábamos leguas vimos estar blanqueando los pueblos, y no
los pueblos despoblados, viendo el buen tratamiento habíamos andado mucho cuando vimos venir por
que se les hacia, en toda la sobredicha provincia el río arriba muy gran cantidad de canoas, todas
nos proveyeron de mantenimientos. Desde a pocos puestas a punto de guerra, lucidas, y con sus
días cesaron los indios y en esto conocimos que
pabeses, que son de conchas de lagartos y de cueros
estábamos fuera del señorío y población de aquel
de manatís y de dantas, tan altos como un hombre,
gran señor Aparia; e temiendo el Capitán lo que
porque todos los cubren. Traían muy gran grita,
podía venir a causa del poco mantenimiento, mandó
tocando muchos atambores y trompetas de pa1o
caminar 1os bergantines con más priesa de la
acostumbrada. amenazándonos que nos habían de comer. Luego el
Capitán mandó que los dos bergantines se juntasen
Un día por la mañana que habíamos partido porque el uno al otro se favoreciese, y que todos
de un pueblo salieron a nosotros dos indios en una tomasen sus armas y mirasen lo que tenían delante
canoa y llegaron cerca del bergantín donde iba el y viesen la necesidad que tenían de defender sus
Capitán y entraron dentro, y el más viejo de ellos, personas y pelear por salir a buen puerto, y que
pensando el Capitán que sabía la tierra y que nos todos se encomendasen a Dios, que El nos ayudaría
podía llevar el río abajo, mandó que se quedara en aquella necesidad grande en que estábamos; y
dentro, y el otro envió a su casa, y comenzamos a en este medio tiempo los indios se venían acercando,
seguir nuestro río abajo, el cual el indio no sabía ni hechos sus escuadrones, para nos tomar en medio,
había navegado a causa de lo cual el Capitán mandó y así venían tan ordenadamente y con tanta
soltar y dar una canoa en que se volviese a su tierra.
soberbia, que parecía que ya nos tenían en las
De allí en adelante pasamos más trabajo y más
manos. Nuestros compañeros estaban todos con
hambre y despoblados que de antes, porque el río
tanto ánimo que les parecía que no bastaba para
venía de monte a monte y no hallábamos a donde
cada uno cuatro indios, y así llegaron los indios
dormir, ni menos se podía tomar ningún pescado,
así que nos era necesario comer nuestro hasta que nos comenzaron a defender. Luego el
acostumbrado manjar, que era de yerbas y de Capitán mandó que aparejasen los arcabuces y
cuando en cuando un poco de maíz tostado. ballestas. Aquí nos aconteció un desmán no pequeño
Viniendo caminando con nuestro acostumbrado para el tiempo en que estábamos, que fue que los
trabajo y mucha hambre, un día a mediodía arcabuceros hallaron húmeda la pólvora, a cabsa
llegamos a un asiento alto que pareció haber sido de lo cual no aprovecharon nada, y fue necesario
poblado y tener alguna disposición para buscar que la falta de los arcabuces supliesen las ballestas;
alguna comida o pescado, y fue aqueste día día de y así, comenzaron nuestros ballesteros a hacer algún
San Juan Ante-portam-latinam, que era seis de daño en los enemigos, porque estaban cerca y
mayo, y allí se siguió un caso que yo no le osaría nosotros temerosos; y visto (por) los indios que tanto
20 A Viagem de Orellana Rio Amazonas abaixo nos anos de 1541 e 1542...

daño se les hacía, comenzaron a detenerse, no a sus compañeros y acometiólos y aquí se detuvieron
mostrando punto de cobardía, antes parecía que mucho, porque los indios eran más de dos mil y los
les crecía el ánimo, y siempre les venía mucha gente compañeros que estaban con Cristóbal Maldonado
de socorro, y todas las veces que les venía nos no eran más que diez, y tuvieron bien que hacer
comenzaban a acometer tan osadamente que parecía para se defender. Al cabo dióse tan buena maña
que querían tomar a manos los bergantines. Desta que se desbarataron, y vuelven a coger la comida, y
manera fuimos peleando fasta llegar al pueblo, desta segunda pelea venían ya dos compañeros
donde había muy gran cantidad de gente puesta heridos; y como la tierra era muy poblada y de cada
sobre las barrancas en defensa de sus casas. Aquí día los indios se reformaban y rehacían, tornan a
tuvimos una batalla peligrosa, porque como había revolver sobre el dicho Cristóbal Maldonado tan
muchos indios por el agua y por la tierra y de todas denodadamente, que quisieron y pusieron por obra
partes nos daban cruda guerra; y así fue necesario, de tomar a manos a todos, y desta arremetida
aunque con riesgo al parecer de todas nuestras hirieron seis compañeros muy mal, unos pasados
personas, acometimos y tomamos el primer puesto brazos y a otros piernas, y al dicho Cristóbal
a donde los indios no dejaban de saltar en tierra a Maldonado pasaron un brazo y le dieron un varazo
nuestros compañeros, porque la defendían muy en el rostro. Aquí se vieron en muy gran aprieto y
animosamente; y si no fuera por las ballestas, que necesidad, porque los compañeros, como estaban
aquí hicieron señalados tiros, por donde pareció ser heridos y muy cansados (roto) no podían ir atrás ni
bien providencia Divina lo de la nuez de la ballesta, adelante, y así pensaron todos de ser muertos, y
no se ganara el puerto; así, con esta ayuda ya dicha decían que no se volviesen a donde estaba su
cabordaron los bergantines en tierra y saltaran al Capitán, y el dicho Cristóbal Maldonado les dijo que
agua la mitad de nuestros compañeros y dieron en no pensasen en tal cosa, porque él no pensaba de
1os indios de tal manera que 1os hicieran huir, y la volver a donde estaba su Capitán quedando los
otra mitad quedó en los bergantines defendiéndolos indios con victoria; y así recogió de los compañeros
de la otra gente que andaba en el agua, que no los que estaban para pelear, y se puso en defensa, y
dejaban, aunque estaba ganada la tierra, de pelear, peleó tan animosamente que fue para que los indios
y aunque se les hacía daño con las ballestas, no no matasen a todos nuestros compañeros.
por eso dejaban de seguir su mal propósito. Ganado
En este tiempo los indios habían venido por la
el principio de la población, el Capitán mandó al
parte arriba a dar por dos partes a donde estaba
Alférez que con veinte y cinco hombres corriesen la
nuestro Capitán, y como estábamos todos cansados
población y echasen los indios de ella y mirasen si
del mucho pelear y descuidados, pensando que
había comida, porque pensaba de descansar en el
teníamos las espaldas seguras por andar Cristóbal
sobre dicho pueblo cinco o seis días para nos
Maldonado fuera, pareció que Nuestro Señor alumbró
reformar del trabajo pasado; y así fue el alférez y
al Capitán para que enviase al sobredicho, que a no
corrió media legua por el pueblo adelante, y esto no
sin trabajo, porque aunque los indios se retraían, le enviar, o no se hallar donde se halló, tengo por
íbanse defendiendo como hombres que les pesaba cierto que corríamos mucho riesgo de las vidas; y,
salir de sus casas; y como los indios, cuando no como digo, nuestro capitán y todos estábamos
salen con su intención al principio, siempre huyen descuidados y desarmados, de tal manera, que los
hasta la segunda instancia a revolver en sí, iban, indios tuvieron lugar de entrar en el pueblo a dar
como digo, huyendo; y visto por el dicho Alférez la en nosotros sin que fuesen sentidos; y en este tiempo
mucha población y gente, acordó de no pasar los vio un compañero nuestro llamado Cristóbal de
adelante, sino dar la vuelta y decir al Capitán lo Aguilar, el cual se puso delante, peleando muy
que pasaba, y así volvió sin que los indios le ficiesen animadamente, dando alarma la cual oyó nuesto
mal, y llegado al principio de la población, halló que Capitán, el cual salió a ver lo que era, desarmado,
el Capitán estaba aposentado en las casas y todavía con una espada en la mano, y vio que tenían 1os
le daban la guerra por el agua, y le dijo todo lo que indios cercadas todas las casas donde estaban
pasaba y como había gran cantidad de comida, así nuestros compañeros; y demás desto estaban en la
de tortugas en corrales y albergues de agua y mucha plaza un escuadrón de más de quinientos indios.
carne y pescado y bizcocho, y esto en tal abundancia El Capitán comenzó a dar voces, y así salieron
que había para comer un real de mil hombres un nuestros compañeros tras el Capitán y acometieron
año; y visto por el Capitán el buen puerto, acordó al escuadrón con tanto denuedo, que los
de recoger comida para descansar, como dicho desbarataron, haciendo daño en los indios, pero no
tengo, y para esto mandó llamar a Cristóbal dejaron de pelear y defender de manera que hirieron
Maldonado y le dijo que tomase una docena de nueve compañeros de malas feridas, y al cabo de
compañeros y fuese a coger toda la comida que dos horas que andábamos peleando, los indios
pudiese; y así fue, y cuando llegó halló que los indios fueron vencidos y desbaratados y los nuestros muy
andaban por el pueblo sacando la comida que cansados. En este encuentro se señalaron muchos
tenían. El dicho Cristóbal Maldonado trabajó de de nuestros compañeros, que antes no habían visto
recoger la comida, y teniendo recogidas más de mil para lo que eran y no los teníamos en tanto, porque
tortugas, revuelven los indios y de segunda vez venía todos mostrar on bien la necesidad en que
ya mucha cantidad de gente y muy determinados estábamos, porque hubo hombre que con una daga
de nos matar y pasar adelante a dar a donde se metió en medio de los enemigos y peleó tan bien
eestábamos con el Capitán; y visto por el dicho que todos nos espantamos, y salió con un muslo
Cristóbal Maldonado la revuelta de los indios, llamó atravesado. Este se llama Blas de Medina.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 21

Después de pasado esto, envió el Capitán a porque nos llevaban antecogidos. Así fuimos fasta
saber qué era de Cristóbal Maldonado y cómo le que fue el día, que nos vimos en medio de muchas
iba, al cual toparon en el camino, que venía ya y muy grandes poblaciones, donde siempre salían
donde estaba el Capitán, él e todos heridos; y un indios de refresco y se quedaban los que iban
compañero que se llamaba Pedro de Ampudia, que cansados. A hora de mediodía, que ya nuestros
se halló con él, dende a ocho días murió de las compañeros no podían remar íbamos todos muy
heridas: era natural de Ciudad Rodrigo. quebrantados de la mala noche y guerra que los
indios nos habían dado. El Capitán, porque la gente
Llegado el dicho Cristóbal Maldonado donde tomase un poco de descanso y comiese, mandó que
estaba el Capitán, aquí mandó el Capitán que los nos metiésemos en una isla poblada que estaba en
heridos se curasen, que eran diez y ocho, y no había medio del río, y en comenzando a guisar de comer;
otra cura sino cierto ensalmo, y con ayuda de allí vinier on mucha cantidad de canoas y
Nuestro Señor, dentro de quince días todos estaban acometiéronnos tres veces, de tal manera que nos
sanos, excepto el que murió. Estando en esto pusieron en grande aprieto. Visto por los indios
vinieron a decir al Capitán cómo los indios revolvían que por el agua no nos podían desbaratar,
y que estaban junto a nosotros en un paso acordaron de nos acometer por la tierra y agua,
aguardando a se rehacer; y para que los echasen porque, como había muchos indios, había para
de allí mandó el Capitán a un caballero llamado todo. El Capitán, viendo lo que los indios
Cristóbal Enríquez que fuese allá con quince ordenaban, acordó de no los esperar en tierra, y
hombres el cual fue, y en llegando, a un arcabucero así se embarcó y se hizo a largo de río, porque allí
que llevaba le pasaron una pierna; de manera que se pensaba mejor defender y así comenzamos de
perdimos un arcabucero, porque dende en adelante caminar y no nos dejando de seguir y dar muchos
no nos pudimos aprovechar de él. Luego el dicho combates los indios, porque destas poblaciones se
Cristóbal Enríquez envió a saber al Capitán lo que habían ya juntado muchos indios y por tierra ya
pasaba y que le enviase más gente, porque 1os no tenía cuenta la gente que parecía. Andaban entre
indios eran muchos y cada hora se reformaban; y esta gente y canoas de guerra cuatro o cinco
el Capitán envió luego a mandar al dicho Cristóbal hechiceros todos encalados y las bocas llenas de
Enríquez que, no mostrando que se retraía, se ceniza, que echaban al aire, en las manos unos
viniese poco a poco donde estaban, porque no guisopos, con los cuales andaban echando agua
estaban en tiempo de poner a riesgo la vida de un por el río a manera de hechizos, y después que
español ni convenía, ni tampoco él ni sus habían dado una vuelta a nuestros bergantines de
compañeros iban a conquistar la tierra ni su la manera dicha, llamaban a la gente de guerra, y
intención lo era, sino, pues Dios les había traído luego comenzaban a tocar sus cornetas y trompetas
por este río abajo, descubrir la tierra para que en de palo y atambores y con muy gran grita nos
su tiempo y cuando la voluntad de Dios Nuestro acometían; pero, como dicho tengo, los arcabuces
Señor y de Su Majestad fuese, la enviase a y ballestas, después de Dios eran nuestro amparo;
conquistar. Y así, aquel día, después de recogida y así nos llevaron desta manera fasta nos meter en
la gente, el Capitán les habló refiriéndoles los una angostura en un brazal del río. Aquí nos
trabajos pasados y esforzándolos para en los de pusieron en muy gran aprieto, e tanto, que no sé
porvenir, encarg ándoles que evitasen los si quedara alguno de nosotros, porque nos tenían
acontecimientos de los indios por los peligros que echada una celada en tierra, y desde allí nos
se podían seguir; y se determinó de seguir todavía abarcaban. Los del agua se determinaron de barrer
el río abajo, y comenzó a embarcar comida, y con nosotros, e yendo ya muy determinados de lo
después de embarcada, mandó al Capitán que los facer, estando ya muy juntos, venía adelante e1
heridos se embarcasen, y los que no podían ir por Capitán general señalándose muy como hombre,
su pie mandó que los envolviesen en unas mantas al cual un compañero de los nuestros llamado
y los tornasen otros a cuestas, como que llevaban Celis, tuvo ojo en él y le tiró con un arcabúz y le
carga de maíz, porque no embarcasen cojeando y dio por mitad de los pechos, que lo mató; y luego
en verlo los indios cobraran tanto ánimo que no su gente desmayó y acudieron a ver a su señor, y
nos dejaran embarcar; y después desto echó, en este medio tiempo tuvimos lugar de salir a lo
estando los bergantines a punto y desarmados y ancho del río; pero todavía nos siguieron dos días
los remos en las manos, bajó el Capitán con mucha y dos noches sin nos dejar reposar, que tanto
orden con los compañeros, y se embarcaron, y se tardamos en salir de la población deste gran señor
hizo a lo largo del río, y no estaría un tiro de piedra llamado Machiparo, que al parecer de todos duró
cuando vienen más de cuatrocientos indios por el más de ochenta leguas, que era toda una lengua,
agua y por la tierra, y como los de la tierra no se estas todas pobladas, que no había de poblado a
podían aprovechar de nosotros no servían sino de poblado un tiro de ballesta, y el que más lejos no
dar voces y gritos: y los de agua no dejaban de estaría media legua, y hubo pueblo que duró cinco
acometer, como hombres que estaban lastimados, leguas sin restañar casa de casa que era cosa
con mucha furia; pero nuestros compañeros con maravillosa de ver: como íbamos de pasada e
las ballestas (y) arcabúces defendían tan bien los huyendo no tuvimos lugar de saber qué es lo que
bergantines que hacían tener afuera aquella mala había en la tierra adentr o; pero, según la
gente. Esto sería a puesta de sol, y desta manera disposición y parecer de ella, debe ser la más
acometiéndonos de rato en rato, siguiéndonos toda poblada que se ha visto, y así nos lo decían los
la noche, que un momento no nos dejaban reparar, indios de la provincia de Aparia, que había un
22 A Viagem de Orellana Rio Amazonas abaixo nos anos de 1541 e 1542...

grandísimo señor la tierra adentro hacia el sur, que entrar por el río otro río muy poderoso y más grande
se llamaba Ica, y que éste tenía muy gran riqueza a la diestra mano: tanto era de grande que a la
de oro y plata; y esta noticia traímos muy buena y entrada hacía tres islas, de cabsa de las cuales le
cierta. pusimos el río de la Trinidad; y en estas juntas de
uno y de otro hahía muchas y muy grandes
Desta manera y con este trabajo salimos de la
poblaciones y muy linda tierra de Omagua, y por
provincia y gran señorío de Machiparo y llegamos a
ser los pueblos tantos y tan grandes y haber tanta
otro no menor, que era el comienzo de Oniguayal, y
gente, no quiso el capitán tomar puerto, y así
al principio y entrada de su tierra estaba un pueblo
pasamos todo aquel día por poblado con alguna
de manera de guarnición, no muy grande, en un
guerra, porque por el agua nos la daban tan cruda
alto sobre el río, a donde había mucha gente de
que nos hacían ir por medio del río; y muchas veces
guerra; y viendo el capitán que ni él ni sus
los indios se ponían a platicar con nosotros, y como
compañeros no podían soportar el mucho trabajo,
no los entendíamos, no sabíamos lo que nos decían.
que no solamente era la guerra, más, juntamente
A hora de vísperas allegamos a un pueblo que estaba
con ella, era hambre, que los indios, aunque
sobre una harranca, y por nos parecer pequeño
teníamos que comer no nos dejaban por la
demasiada guerra que nos daban, acordó de tomar mandó el capitán que lo tomásemos, y porque
el dicho pueblo, y así mandó enderezar los también porque tenía en sí tan buena vista que
bergantines hacia el puerto, y los indios visto, que parecía ser recreación de algún señor de la tierra
les querían tomar el pueblo, acordaron de se poner de adentro; y así enderezamos a lo tomar y los indios
en toda resistencia; y así fue que llegando junto al se defendieron más de una hora, pero al cabo fueron
puerto, los indios comenzaron a despender de su vencidos e nosotros señoreados del pueblo, donde
almacén, de tal manera que nos hacían detener; y fallamos muy gran cantidad de comida, de la cual
visto el Capitán la defensión de los indios, mandó nos proveímos. En este pueblo estaba una casa de
que a muy gran priesa jugasen las ballestas y placer, dentro de la cual había mucha loza de
arcabuces, y remasen para cabordar en tierra; y diversas hechuras, así de tinajas como de cántaros
desta manera hicieron lugar y fueron parte para muy grandes de más de veinte y cinco arrobas, y
que los bergantines cabordasen a nuestros otras vasijas pequeñas como platos y escudillas y
compañeros y saltasen en tierra y pelearon después candeleros desta loza de la mejor que se ha visto en
en tierra de tal manera que hicieron huir a los indios, el mundo, porque la de Málaga no se iguala con
y así quedó el pueblo por nosotros con la comida ella, porque es toda vidriada y esmaltada de todos
que tenía. Este pueblo estaba fuerte, y por estar colores y tan vivas que espantan, y demás desto los
tal, dijo el Capitán que quería reposar allí tres o dibujos y pinturas que en ellas hacen son tan
cuatro días y hacer algún matalotaje para adelante, compasados que naturalmente labran y dibujan todo
y así folgamos desta manera y con este propósito, como lo romano; y allí nos dijeron los indios que
aunque no sin falta de guerra, y tan peligrosa, que todo lo que en esta casa había de barro lo había en
en un día a las diez horas allegó muy gran cantidad la tierra adentro de oro y de plata, y que el1os nos
de canoas a tomar y desamarrar los bergantines llevarían allá, que era cerca; y en esta casa se
que estaban en el puerto, y a no proveer el Capitán hallaron dos ídolos tejidos de pluma de diversa
de ballesteros que con brevedad saltasen dentro, manera, que ponían espanto, y eran de estatura de
creemos que no fuéramos parte a los defender; y gigante y tenían en los brazos metidos en los molledos
así, con la ayuda de Nuestro Señor y con la buena unas ruedas a manera de arandelas, y los mismos
maña y ventura de nuestros ballesteros, hízose tenían en las pantorrillas junto a las rodillas; tenían
algún daño en los indios, que tuvieron por bien de las orejas horadadas y muy grandes, a manera de
se hacer afuera y volver a sus casas: así quedamos los indios del Cuzco y mayores. Esta generación de
descansando dándonos buena posada, comiendo a gentes reside en la tierra adentro y es la que posee la
discresión, y estuvimos tres días en este puehlo. riqueza ya dicha, y por memoria los tienen allí: y
Había muchos caminos que entraban la tierra también se halló en este pueblo oro y plata; pero
adentro muy reales, de cabsa de lo cual el Capitán como nuestra intención no era sino de buscar de
se temía y mandó que nos aparejásemos, porque comer y procurar cómo salvásemos las vidas y
no quería estar más allí, porque podría ser de la diésemos noticia de tan grande cosa, no curábamos
estada recebir daño. ni se nos daba nada por ninguna riqueza.
Dicho esto por el capitán, todos comenzaron a Deste pueblo salían muchos caminos y muy
se aderezar para se partir cuando les fuese reales para la tierra adentro: el Capitán quiso saber
mandado. Habíamos andado desde que salimos de dónde iban, y para aquesto tomó consigo a Cristóbal
Aparia a este dicho pueblo trescientas cuarenta Maldonado y al Alférez y a otros compañeros, y
leguas, en que las doscientas fueron sin ningún comenzó a entrar por ellos, y no había andado media
poblado: fallamos en este pueblo muy gran cantidad legua cuando los caminos eran más reales y
de bizcocho muy bueno, que los indios hacen de mayores; y visto el capitán esto, acordó de se volver,
maíz y de ayuca y mucha fruta de todos géneros. porque vido que no era cordura pasar adelante; y
Volviendo a la historia, digo que el Domingo así volvió donde estaban los bergantines, y cuando
después de la Ascensión de Nuestro Señor salimos llegó se ponía ya el sol, y el Capitán dijo a sus
deste dicho pueblo y comenzamos a caminar y no compañeros que convenía partir luego de allí porque
hubimos andado obra de dos leguas cuando vimos no convenía en tierra tan poblada dormir noche, y
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 23

que luego se embarcasen todos; y así fue que, metida Sábado víspera de la Santísima Trinidad, el
la comida y todos dentro de los bergantines, Capitán mandó tomar puerto en un pueblo donde
comenzamos a caminar ya que era noche, y toda 1os indios se pusieron en defensa; pero, a pesar de
ella fuimos pasando muchos y muy grandes pueblos ello, los echamos de sus casas, y aquí nos proveímos
fasta que vino el día, que habíamos andado más de de comida y aún se fallaron algunas gallinas. Este
veinte leguas, que por huir dello poblado no hacían mismo día, saliendo de allí, prosiguiendo nuestro
nuestros compañeros sino remar, y mientras más viaje, vimos una boca de otro río grande a la mano
andábamos, más poblada y mejor hallábamos la siniestra, que entraba en el que nosotros
tierra, y así íbamos siempre desviados de tierra por navegábamos, el agua del cual era negra como tinta,
no dar lugar a que los indios saliesen a nosotros. y por esto le pusimos el nombre del Río Negro, el
cual corría tanto y con tanta ferocidad que en más
Fuimos caminando por esta tierra y señorío de veinte leguas hacía raya en la otra agua sin
de Omagua más de cien leguas, al cabo de las cuales revolver la una con la otra. Este mismo día vimos
allegamos a otra tierra de otro señor llamado otros pueblos no muy grandes. Otro día siguiente
Paguana, el cual tiene mucha gente y muy de la Trinidad holgó el Capitán y todos en unas
doméstica, porque llegamos al principio de su pesquerías de un pueblo que estaba en una loma,
poblado a un pueblo que tendría más de dos leguas donde se falló mucho pescado, que fue socorro y
de largo, a donde los indios nos esperaron en sus gran recreación para nuestros españoles, porque
casas sin hacer mal ni daño, antes nos daban de lo había días que no habían tenido tal pasada. Este
que tenían. Deste pueblo iban muchos caminos la pueblo estaba en una loma apartada del río, como
tierra adentro, porque el señor no reside sobre río, en frontera de otras gentes que les daban guerra,
y dijéronnos los indios que fuésemos allá, que se porque estaba fortificado de una muralla de maderos
holgaría mucho con nosotros. En esta tierra este gruesos, y al tiempo que nuestros compañeros
señor tiene muchas ovejas de las del Perú y es muy subieron a este pueblo para tomar comida, los indios
rico de plata, según todos los indios nos decían, y lo quisieron defender y se hicieron fuertes dentro
la tierra es muy alegre y vistosa y muy abundosa de de aquella cerca, la cual tenía no más que una
todas comidas y frutas, como son piñas y peras, puerta y comenzáronse a defender con muy gran
que en lengua de la Nueva-España se llaman ánimo; más como nos víamos en necesidad,
aguacates y ciruelas y guanas y otras muchas y determinamos de acometerlos, y así, en esta
muy buenas frutas. determinación, se acometió por la dicha puerta, y
entrando dentro sin ningún riesgo, dieron en los
Salimos desta población y fuimos caminando indios y pelearon con ellos hasta los desbaratar, y
siempre por muy gran poblado, que hubo día que luego recogieron comida que había en cantidad.
pasamos más de veinte pueblos; y esto por la banda
El lunes adelante partimos de allí, pasando
donde nosotros íbamos, porque la otra no la podíamos
siempre por muy grandes poblaciones y provincias
ver por ser el río grande; y así, íbamos dos días por
proveyéndonos de comida lo mejor que podíamos
la banda diestra y después atravesábamos e íbamos
cuando nos faltaba. Este día tomamos puerto en
otros dos días por la mano siniestra, que mientras
un pueblo mediano, donde la gente nos esperó. En
víamos lo uno no víamos lo otro.
este pueblo estaba una plaza muy grande, y en
El lunes de Pascua de Espíritu Santo, por la medio de la plaza estaba un tablón grande de diez
mañana, pasamos a vista y junto a un pueblo muy pies en cuadro, figurada y labrada de relieve una
grande y muy vicioso, y tenía muchos barrios, y en ciudad murada con su cerca y con una puerta. En
cada barrio un desembarcadero al río, y en cada esta puerta estaban dos torres muy altas de cabo
desembarcadero había muy gran copia de indios, y con sus ventanas, y cada torre tenía una puerta
este pueblo duraba más de dos leguas y media, que frontera la una de la otra, y en cada puerta estaban
siempre fue de la manera dicha; y por ser tantos los dos columnas y toda esta obra ya dicha estaba
indios de aquel pueblo, mandó el Capitán que nos cargada sobre dos leones muy feroces que miraban
hacia atrás, como recatados el uno del otro, los
pasásemos adelante sin les hacer mal y sin les
cuales tenían en los brazos y uñas toda la obra, en
acometer; pero ellos, visto que nos pasábamos sin
medio de la cual había una plaza redonda: en medio
les hacer mal, se embarcaron en sus canoas y nos
desta plaza estaba un agujero por donde ofrecían
acometieron, pero con su daño, que las ballestas y
y echaban chicha para el sol, que es el vino que
arcabuces los hicieron volver a sus casas y nos ellos beben, y el sol es quien ellos adoran y tienen
dejaron ir nuestro río-abajo. Este mesmo día por su dios. En fin, el edificio era cosa mucho de
tomamos un pueblo pequeño, donde fallamos ver, y el Capitán, y todos nosotros espantados de
comida, y aquí se nos acabó la provincia del ya dicho tan gran casa, preguntó a un indio que aquí se
señor llamado Paguana, y entramos en otra tomó, qué era aquello o por qué memoria tenían
provincia muy más belicosa y de mucha gente y aquello en la plaza, y el indio dijo que ellos eran
que nos daba mucha guerra. Desta provincia no subjetos y tributarios a las amazonas, y que no las
supimos cómo se llama el señor de ella; pero es una servían de otra cosa sino de plumas de papagayos
gente mediana de cuerpo muy bien tratada, y tiene y de guacamayos para forros de los techos de las
sus paveses de palo y defienden sus personas muy casas de sus adoratorios, y que los pueblos que
como hombres. ellos tenían eran de aquella manera, y que por
24 A Viagem de Orellana Rio Amazonas abaixo nos anos de 1541 e 1542...

memoria lo tenían allí, y que adoraban en el1o como casas, porque cuando saltamos no había mujeres,
en cosa que era insignia de su señora, que es la que porque los indios eran idos a entender en sus
manda toda la tierra de las dichas mujeres. Hallóse grangerías; y así, siendo hora, volvíanse, y, como
también en esta misma plaza una casa no muy hallaron sus casas en poder de quien no conocían,
pequeña, dentro de la cual había muchas vestiduras quedaron muy espantados y comenzaron a decir que
de plumas de diversos colores, las cuales vestían nos saliésemos de ellas y juntamente con decir esto
los indios para celebrar sus fiestas y bailar cuando acuerdan y ponen por obra de nos acometer, y así
se querían regocijar delante deste tablón ya dicho, lo hicieron; pero al tiempo que ellos entraban por el
y allí ofrecían sus sacrificios con su dañada real, halláronse delante de los indios cuatro o cinco
intención. compañeros los cuales pelearon tan bien que fueron
parte para que los indios no se atreviesen a entrar
Salimos luego deste pueblo y dimos luego en donde estaba nuestra gente, y así los hicieron huir,
otro muy grande que tenía el mismo tablón y divisa y cuando el Capitán salió no había qué hacer. Esto
que es dicha: este pueblo se defendió mucho, y por era ya de noche, y sospechando el Capitán lo que
espacio de más de una hora no nos dejaron saltar podía ser, mandó que las velas se doblasen y todos
en tierra; pero al cabo hubimos de saltar, y como durmiesen armados, y así se hizo; pero a media
los indios eran muchos y cada hora crecían, no se noche, a hora que la luna salía, revuelven los indios
querían rendir; pero visto el daño que se les hacía, en muy gran cantidad sobre nosotros y dan por tres
acordaron de huir, y entonces tuvimos lugar aunque partes a nuestro real: cuando fueron sentidos tenían
no mucho, para buscar alguna comida, porque ya heridas las velas y andaban entre nosotros, y como
los indios se revolvían sobre nosotros; pero nuestro dieron alarma salió el Capitán dando voces diciendo:
Capitán no quiso que aguardásemos, pues que no - Vergüenza, vergüenza caballeros, que son nadie;
podíamos ganar nada en la mercaduría, y así mandó a ellos -; y así nuestros compañeros se levantaron y
que nos embarcásemos e nos fuésemos, y así fue. con muy gran furia acometieron a aquella gente,
que, aunque era de noche, fueron desbaratados
Partidos de aquí pasamos por otros muchos porque no podían sufrir a nuestros compañeros y
pueblos donde los indios nos atendían de guerra, así huyeron. El Capitán pensando que habían de
como gente belicosa con sus armas y paveses en revolver, mandó echarles una celada por donde
las manos, dándonos grita, diciendo que por qué habían de venir, y los demás que no durmiesen, y
huíamos, que allí nos estaba aguardando; pero el mandó que los heridos se curasen, y yo los curé,
Capitán no quería acometer donde vía que no porque el Capitán andaba de una parte a otra dando
podíamos ganar honra, especial llevando alguna orden a lo que convenía para salvación de nuestras
comida, y cuando ésta había, en cualquier parte vidas, que en esto siempre se desvelaba; y a no ser
aventuraba su persona y las de los compañeros; tan sabio en las cosas de la guerra, que parecía que
y así, en algunas partes, ellos desde tierra y Nuestro Señor le administraba en lo que debía de
nosotros desde el agua, nos dábamos guerra; pero hacer, muchas veces nos mataran: y desta manera
como los indios eran muchos, hacían pared y estuvimos toda la noche, y venido el día mandó el
nuestros arcabuces y ballestas les hacían daño y Capitán que nos embarcásemos y nos fuésemos y
así pasábamos adelante, dejándoles la mandó que ciertas piezas que allí se habían tomado,
información ya dicha. que se ahorcasen, y así fue; y esto porque los indios
de adelante nos cobrasen temor y no nos
Miércoles víspera de Corpus Cristi, siete días acometiesen. Nosotros embarcamos, y hechos a lo
de junio el Capitán mandó tomar puerto en una largo del río llegaban al pueblo muchos indios a dar
población pequeña que estaba sobre el dicho río, y en nosotros, y también por el agua venían muchas
así se tomó sin resistencia, donde hallamos mucha canoas; pero ya, como íbamos a lo largo, no tuvieron
comida, en especial pescado, que desto se halló tanto lugar de poner por obra su mala intención.
y en abundancia que pudiéramos cargar bien
nuestros bergantines, y éste tenían los indios a secar Este día nos metimos en un monte y holgamos
para llevar dentro a la tierra a vender; y viendo todos el siguiente, y otro día proseguimos nuestro viaje, y
no habíamos andado cuatro leguas, cuando vimos
los compañeros que el pueblo era pequeño, rogaron
por la mano diestra entrar un muy grande y
al Capitán que holgase allí, pues era víspera de tan
poderoso río, tanto era mayor que el que nosotros
gran fiesta. El Capitán, como hombre que sabía las
llevábamos, y por ser tan grande le pusimos el Río
cosas de los indios, dijo que no hablasen en tal cosa
Grande [rio Madeira]; y pasamos adelante, y a la
porque no lo pensaba hacer, que aunque el pueblo mano siniestra vimos estar unas poblaciones muy
les parecía pequeño, tenía gran comarca de donde grandes sobre una loma que llegaba al río y por las
le podían venir a favorecer y hacer daño en nosotros, ver mandó el Capitán que enderezásemos hacia allá,
sino que nos fuésemos como solíamos hacer y irnos y fuimos; y visto por los indios que íbamos hacia
a dormir a las montañas; y nuestros compañeros allá, acordaron, según pareció, de no se mostrar,
se lo tornaron a pedir por merced que holgase allí. sino estarse en celada, pensando que saltaríamos
El Capitán, visto que todos lo pedían, aunque contra en tierra, y para esta tenían limpios los caminos
su voluntad, concedió en lo que pedían, y así que bajaban el río. El Capitán y algunos
estuvimos en este pueblo holgando hasta la hora compañeros conocieron la ruindad que tenían
que el sol se ponía, que los indios venían a ver sus armada y mandó que nos fuésemos de largo; y los
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 25

indios, visto que nos pasábamos de largo, levántanse Caminamos nuestro río abajo sin tomar
más de cinco indios con sus armas y empiezan a pueblo, porque llevábamos de comer, y al cabo de
darnos grita y a desafiarnos y a dar con las armas algunos días salimos desta provincia, a la salida de
unas en otras, y con esto hacían tan gran ruido que la cual estaba una muy gran población, por donde
parecía hundirse el río. Pasamos adelante y, obra la india nos dijo dónde habíamos de ir a donde
estaban los cristianos; pero como nosotros no
de media legua, dimos en otro mayor pueblo; pero
éramos parte, acordamos de pasar adelante, que
aquí nos hicimos a largo del río. Es esta tierra
para los sacar de donde estaban su tiempo vendrá.
templada y de muy buena disposición: no supimos
su trato, porque no nos dieron lugar a ello; y aquí Deste pueblo salieron dos indios de una canoa
se acabó esta generación, y dimos en otra que nos y llegaron al bergantín donde venía nuestro capitán,
fatigó poco. Pasamos adelante y siempre por sin armas, y llegaron a reconocer y estuvieron
poblado, y una mañana a hora de las ocho vimos mirando; y por mucho que nuestro capitán los llamó
sobre un alto una hermosa población, que al parecer que entrasen dentro y les daba muchas cosas, nunca
quisieron, antes, señalando la tierra adentro, se
debía ser cabeza de algún gran señor, y por la ver
volvieron.
quisiéramos, aunque con riesgo llegar allá; pero no
fue posible porque tenía una isla delante, y cuando Dormimos esta noche fronteros de este pueblo,
quisimos entrar habíamos dejado la entrada arriba: dentro en nuestros bergantines, y venido el día y
y desta cabsa pasamos a vista de ella mirándola. comenzando a caminar, sale del pueblo mucha gente
En este pueblo había siete picotas (que) nosotros y embárcanse y vienen a nos acometer al medio río,
vimos que estaban en trechos por el pueblo y en las por donde nosotros íbamos. Estos indios tienen ya
flechas, y con ellas pelean. Tomamos nuestro
picotas, clavadas, muchas cabezas de muertos, a
camino sin los esperar; fuimos caminando tomando
cuya cabsa le pusimos a esta provincia por nombre
comida donde veíamos que no la podían defender y
la Provincia de las Picotas, que duraba por el río
al cabo de cuatro o cinco días fuimos a tomar un
abajo setenta leguas. Bajaban deste pueblo al río pueblo donde los indios no se defendieron. Aquí se
caminos hechos a manos, y de una parte y de otra halló mucho maíz (y asimismo se halló mucha
sembrados árboles de fruta, por donde parecía ser avena), de lo que los indios hacen pan, y muy buen
gran señor el de esta tierra. vino a manera de cerveza, y ésta hay en mucha
abundancia. Hallóse en este pueblo una bodega
Pasamos adelante y otro día dimos en otro
deste vino, que no se holgaron poco nuestros
pueblo del mismo arte, y como tuviésemos necesidad
compañeros, y hallóse muy buena ropa de algodón.
de comida, fuenos forzado acometerle, y los indios Hallóse también en este pueblo un adoratorio,
se escondieron porque saltásemos en tierra, y así dentro del cual había muchas divisas de armas para
saltaron nuestros compañeros, y visto los indios que la guerra colgadas, y sobre todas, en lo alto, estaban
ya estaban en tierra, salen de su celada con muy dos mitras muy bien a lo naturalmente fechas, como
gran furia. Venía adelante el Capitán o señor de ellos las de los obispos: eran tejidas y no sabemos de
animándolos con muy gran grita. Un ballestero de qué, porque ello no era algodón ni lana y tenían
los nuestros tuvo ojo en este señor y tiróle y matóle; muchos colores.
y visto los indios aquello, acordaron de no esperar Pasamos adelante deste pueblo y fuimos a
sino huir, y otros hacerse fuertes dentro de sus dormir a la otra banda del río, como era nuestra
casas, y de ellas se defendían y pelaban como perros costumbre, al monte, y allí vinieron muchos indios
dañados. Visto el capitán que no se querían rendir a darnos guerra por el agua; pero a mal de su grado
y que no nos habían hecho daño y heridos algunos dieron vuelta. Martes a veinte y dos de junio vimos
de nuestros compañeros, mandó poner fuego a las mucha población de la banda siniestra del río,
casas donde estaban los indios, y así salieron de porque estaban blanqueando las casas, que íbamos
por medio del río: quisimos ir allá, pero no pudimos
ellas y huyeron y hubo lugar de recoger comida,
por cabsa de la mucha corriente y olas más
que en este pueblo, loado Nuestro Señor, no faltó, trabajosas y más en la mar andaban.
parque había muchas tortugas de las ya dichas y
Miércoles siguiente tomamos un pueblo que
muchos pavos y papagayos y muy gran abundancia,
estaba en medio de un arroyo pequeño en un muy
pues pan y maíz, de esto no se escribe; y salimos de
gran llano de más de cuatro leguas. Tenía este
aquí y luego nos fuimos a una isla a descansar y pueblo su asiento todo en una calle, y una plaza en
gozar de lo que habíamos tomado. Tomóse en este medio, las casas de una parte y otra, y hallamos
pueblo una india de mucha razón, y dijo que cerca mucha comida; y este pueblo, por estar de la manera
de aquí y la tierra adentro estaban muchos ya dicha, le llamamos el pueblo de la Calle.
cristianos como nosotros y 1os tenía un señor que Jueves siguiente pasamos por otros pueblos
los había traído el rio abajo; y nos dijo cómo entre medianos y no curamos de parar allí. Todos estos
ellos había dos mujeres blancas, y que otros tenían pueb1os son estancias de pescadores de la tierra
indias y hijos en ellas: éstos son los que se perdieron adentr o. Desta manera íbamos caminando
de Diego de Ordás, a lo que se cree, por las señas buscando un apacible asiento para festejar y
que daban, que era a la banda del Norte. regocijar la fiesta del bienaventurado san Juan
26 A Viagem de Orellana Rio Amazonas abaixo nos anos de 1541 e 1542...

Bautista, precursor de Cristo, y quiso Dios que en nosotros, que andaban peleando delante de todos
doblando una punta que el río hacía, vimos en la los indios como capitanas, y peleaban ellas tan
costa adelante muchos y muy grandes pueblos que animosamente que los indios no osaban volver las
estaban blanqueando. Aquí dimos de golpe en la espaldas, y al que las volvía delante de nosotros le
buena tierra y señorío de las amazonas. Estos mataban a palos, y ésta es la cabsa por donde los
pueblos ya dichos estaban avisados y sabían de indios se defendían tanto. Estas mujeres son muy
nuestra ida, de cuya cabsa nos salieron a recibir al blancas y altas, y tienen muy largo el cabello y
camino por el agua, no con buena intención, y como entrenzado y revuelto a la cabeza; y son muy
llegaron cerca del capitán, quisiera traerlos de paz membrudas y andan desnudas en cueros, tapadas
y así los comenzó a hablar y llamar; pero ellos se sus vergüenzas con sus arcos y flechas en las manos
rieron y hacían burla de nosotros e se nos acercaban haciendo tanta guerra como diez indios; y en verdad
y decían que anduviésemos y que allí abajo nos que hubo mujer de éstas que metió un palmo de
aguardaban, y que allí nos habían de tomar a todos flecha por uno de los bergantines, y otras que menos,
y llevar a las amazonas. El Capitán, enojado de la que parecían nuestros bergantines puerco espín.
soberbia de los indios, mandó que les tirasen con
Tornando a nuestro propósito y pelea, fue
las ballestas y arcabuces, porque pensasen y
Nuestro Señor servido de dar fuerza y ánimo a
supiesen que teníamos con qué les ofender; y así se
nuestros compañeros, que mataron siete u ocho, que
les hizo daño y dan la vuelta hacia el pueblo a dar
estas vimos de las amazonas, a cabsa de lo cual los
la nueva de lo que habían visto: nosotros no dejamos
indios desmayaron y fueron vencidos y desbaratados
de caminar y acercar a los pueblos, y antes que
con harto daño de sus personas; y porque venían de
allegásemos con más de media legua había por la
otros pueblos mucha gente de socorro y se habían
lengua del agua a trechos muchos escuadrones de
de revolver, porque ya se tornaban (a) apellidar,
indios, y como nosotros íbamos andando, ellos se
mandó el Capitán que a muy gran priesa se
iban juntando y acercando a sus poblaciones.
embarcase la gente, porque no quería poner arrisco
Estaba en medio deste pueblo muy gran copia de
la vida de todos, y así se embarcaron no sin zozobra
gente, hecho un buen escuadrón, y el Capitán
porque ya los indios empezaban a pelear, y más que
mandó que fuesen 1os bergantines a cabordar donde
por el agua venía mucha flota de canoas, y así nos
estaba aquella gente para buscar comida, y así fue
hicimos a largo del río y dejamos la tierra.
que, en comenzándonos a llegar a tierra, los indios
comienzan a defender su pueblo y nos flechar, y Tenemos andadas de donde salimos y dejamos
como la gente era mucha, parecía que llovían a Gonzalo Pizarro mil y cuatrocientas leguas, antes
flechas; pero nuestros arcabuceros y ballesteros no de más que de menos, y no sabemos lo que falta
estaban ociosos, porque no hacían sino tirar, y aquí a la mar. En este pueblo ya dicho se tomó un
aunque mataban muchos, no los sentían, porque indio trompeta que andaba entre la gente, que era
con todo el daño que se les hacía andaban unos de edad de fasta treinta años, el cual, en tomándole,
peleando y otros bailando: y aquí estuvimos en muy comenzó a decir al Capitán muchas cosas de la tierra
poco de nos perder todos, porque como había tantas adientro y le llevó consigo.
flechas, nuestros compañeros tenían harto que
Hechos como dicho tengo, a largo del río, nos
hacer en se amparar de ellas sin poder remar, de
dejamos ir al garete sin remar, porque nuestros
cabsa de 1o cual nos hicieron (tanto) daño, que antes
compañeros estaban tan cansados que no tenían
que saltásemos en tierra nos hirieron a cinco, de
fuerzas para tener los remos; y yendo por el río,
los cuales, yo fui el uno que me dieron con una
que habíamos andado fasta un tiro de ballesta,
flecha por una ijada que me llegó a lo hueco, y si no
descubrimos un pueblo no pequeño en el cual no
fuera por los hábitos allí me quedara. Visto el
parecía gente, de cuya cabsa todos los compañeros
peligro en que estábamos, comienza el Capitán a
pidieron al Capitán que fuese allá que tomaríamos
animar y a dar priesa a los de los remos que
alguna comida, pues en el pasado pueblo no nos
cabordasen, y así aunque con trabajo, llegamos a
la habían dejado tomar. El Capitán les dijo que no
cabordar, y nuestros compañeros se echaron al
quería, que aunque a ellos les parecía que no había
agua, que les daba a 1os pechos aquí fue una muy
gente, de allí nos habíamos más de guardar que
gran y peligrosa batalla, porque los indios andaban
más que donde claramente la víamos y así nos
mezclados con nuestros españoles, que se
defendían tan animosamente que era cosa tornamos a juntar, y yo juntamente con todos los
maravillosa de ver. Andúvose en esta pelea más de compañeros se lo pedimos de merced, y aunque
una hora, que los indios no perdían ánimo, antes éramos pasados del pueblo, el Capitán,
parecía que se les doblaba, aunque vían muchos concediendo su voluntad, mandó volver 1os
de los suyos muertos, y pasaban por encima de bergantines al pueblo, y como íbamos costeando
el1os y no hacían sino retraerse y tornar a revolver. la tierra, 1os indios en celada escondidos entre sus
Quiero que sepan cuál fue la cabsa por qué estos arboledas repartidos por sus escuadrones y
indios se defendían de tal manera. Han de saber estando por nos tomar en celada, y así, yendo junto
que ellos son subjetos y tributarios a las amazonas, a tierra, tuvieron lugar de nos acometer, y así
y sabida nuestra venida, vánles a pedir socorro y comenzaron a flechar tan bravamente que los unos
vinieron hasta diez o doce, que éstas vimos a los otros no nos víamos; mas como nuestros
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 27

españoles iban apercibidos desde Machiparo de que no saltásemos en tierra, porque podría ser los
buenos paveses, como ya hemos dicho, no nos indios dar sobre nosotros; y así, pasamos la noche
hicieron tanto daño cuanto nos hicieran sino en nuestros bergantines, y venida la mañana, el
viniéramos apercibidos de la tal defensa; y de todos Capitán mandó que caminásemos con mucha orden
en este pueblo no firieron sino a mí, que me dieron fasta salir de esta provincia de San Juan, que tiene
un flechazo por un ojo que pasó la flecha a la otra más de ciento cincuenta leguas de costa, pobladas
parte, de la cual herida he perdido el ojo y no estoy de la manera dicha. Y otro día, veinte y cinco de junio,
sin fatiga y falta de dolor, puesto que Nuestro Señor, pasamos por entre unas islas que pensamos que
sin yo merecerlo me ha querido otorgar la vida para estuvieran despobladas; pero después que nos
que me enmiende y le sirva mejor que fasta aquí; y hallamos en medio de ellas, fueron tantas las
en este medio tiempo habían ya saltado en tierra los poblaciones que en las dichas islas parecían y vimos,
españoles que venían en el barco pequeño; y como que nos pesó; y como nos vieran, salieron a nosotros
los indios eran tantos, teníanlos cercados, que si no al río sobre doscientas piraguas, que cada una trae
fuera porque el Capitán los socorrió con el bergantín veinte y treinta indios, y de ellas cuarenta, y destas
grande, se perdían y se los llevaban 1os indios; y así hubo muchas: venían muy lucidas con diversas
lo hicieran todavía antes que llegase el Capitán, si divisas y traían muchas trompetas y atambores, y
no se dieran tan buena maña en pelear con tanto órganos que tañen en la boca, y arrabeles que tienen
ánimo; pero ya estaban cansados y puestos en muy a tres cuerdas; y venían con tanto estruendo y grita
gran aprieto. El Capitán 1os recogió, y como me vido y con tanta orden, que estábamos espantados.
herido mandó embarcar la gente; y así se Cercár onnos entre ambos bergantines y
embarcaron, porque la gente era mucha y estaba muy acometiéronnos como hombres que nos pensaban
encar nizada, que la podían sufrir nuestros llevar; más salióles al revés, que nuestros
compañeros, y el Capitán temía perder alguno de arcabuceros y ballesteros les pusieron tales, como
ellos y no los quería poner en tal aventura porque eran muchos, que se holgaron de tenerse afuera; pues
bien sabía y traslucía la necesidad que había de tener en tierra era cosa maravillosa de ver los escuadrones
de ayuda, según la tierra era poblada, y convenía que estaban en los pueb1os, tañendo y bailando todos
conservar la vida de todos, porque no distaban un con unas palmas en las manos, mostrando muy gran
pueblo de otro distancia de media legua, y menos en alegría en ver que nos pasábamos de sus pueblos.
toda aquella banda del río de la mano diestra [várzeas Estas islas son altas, aunque no mucho, y de tierra
de Santarém], que es de la banda del sur; y más digo rasa, muy fértiles al parecer, y tan alegres de vista,
que la tierra adentro, a dos leguas, y más, y a menos, que aunque nosotros íbamos trabajados, no
parecían muy grandes ciudades que estaban dejábamos de nos alegrar. Esta isla, que es la mayor,
blanqueando, y demás de esto la tierra es tan buena, la fuimos costeando: terná en largo seis leguas
tan fértil y tan al natural como la de nuestra España, [situada entre Santarém e Alenquer], que está en el
porque nosotros entramos en ella por San Juan y ya medio río; el ancho no lo sabremos decir: y siempre
comenzaban los indios a quemar los campos. Es los indios nos fueron siguiendo hasta nos echar desta
tierra templada, a donde se cogerá mucho trigo y se provincia de San Juan que, como digo, tiene ciento
darán todos frutales: demás desto es aparejada para cincuenta leguas todas las cuales pasamos con
criar todo ganado, porque en ella hay muchas yerbas mucho trabajo de hambre, dejando aparte la guerra,
como en nuestra España, como es orégano y cardos porque, como era muy poblada, no hubo lugar de
de unos pintados y a rayas y otras muchas yerbas saltar en tierra. Toda esta isla fueron siempre las
muy buenas; los montes desta tierra son encinales y dichas piraguas y canoas en nuestro seguimiento
acometiéndonos cuando se les antojaba; pero como
alcornocales que llevan bellotas porque nosotros las
gustaban la fruta de nuestros tiros,íbannos
vimos, y robledales; la tierra es alta y hace lomas,
acompañando a trechos. Al cabo desta isla estaba
todas de sábanas; la yerba no es más alta de fasta la
mucho más poblado, de donde salieron de refresco
rodilla, y hay mucha caza de todos géneros.
muchas más piraguas a nos acometer: aquí el capitán
Volviendo a nuestro camino, el Capitán mandó viéndose en tan gran aprieto y deseando la paz con
que nos saliésemos a medio río por huir de lo esta gente, por ver si pudiéramos tomar algún rato
poblado, que era tanto que ponía grima. Llamamos de descanso, acordó de hablar y requerir a los indios
a esta provincia la provincia de San Juan, porque con la paz, y para traerlos a ella mandó echar en
en su día habíamos entrado en ella, y yo había una calabaza cierto rescate y arrojar1o al agua, y los
predicado por la mañana viniendo por el río, por indios lo tomaron, pero tuviéronlo en tan poco, que
alabanza de tan glorioso precursor de Cristo, y tengo hacían burla de ello; pero por eso no nos dejaron de
por averiguado que por su intercesión me otorgó seguir hasta nos echar de sus pueblos, que, como
Dios la vida. dicho habemos, eran muchos.

Salimos a medio río; los indios por el agua Esta noche llegamos a dormir ya fuera de todo
fueron en nuestro seguimiento, porque el Capitán lo poblado a un robledal que estaba en un llano
mandó atravesar hacia una isla que estaba junto al río, donde no nos faltaron temerosas
despoblada, y fasta ser noche no nos dejaron los sospechas, porque vinieron indios a nos espiar, y
indios; y así nosotros llegamos a la isla a más de la tierra adentro había mucho poblado y caminos
diez horas de la noche, a donde el Capitán mandó que entraban a ella, de cuya cabsa el Capitán y
28 A Viagem de Orellana Rio Amazonas abaixo nos anos de 1541 e 1542...

todos estábamos en vela aguardando lo que nos podía de diversos co1ores, y que en estas casas tienen
venir. muchos ídolos de oro y de plata en figura de mujeres,
y mucha cantería de oro y de plata para el servicio
En este asiento el Capitán tomó al indio que del Sol; y andan vestidas de ropa de lana muy fina,
se había tomado arriba, porque ya le entendía por porque en esta tierra hay muchas ovejas de las del
un vocabulario que había fecho y le preguntó que Perú: su traje es unas mantas ceñidas desde los
de dónde era natural: el indio dijo que de aquel pechos hasta abajo, encima echadas y otras como
pueblo donde le habían tomado; el Capitán le dijo manto abrochadas por delante con muchos cordones;
que cómo se llamaba el señor desa tierra, y el indio traen el caballo tendido en su tierra y puestas en la
le respondió que se llamaba Couynco, y que era muy cabeza unas coronas de oro tan anchas como dos
gran señor y que señoreaba hasta donde estábamos, dedos y aquellos sus colores. Dijo más: que en esta
que como dicho tengo, había ciento cincuenta tierra, según entendimos, hay camellos que los
leguas. El Capitán le preguntó qué mujeres eran cargan, y dice que hay otros animales, los cuales no
aquellas (que) habían venido a les ayudar y darnos supimos entender, que son del tamaño de un caballo
guerra: el indio dijo que eran unas mujeres que y que tienen el pelo de un geme y la pata hendida y
residían la tierra adentro siete jornadas de la costa, que los tienen atados [prov. antas], y que destos hay
pocos. Dice que hay en esta tierra dos lagunas de
y por ser este señor Couynco sujeto a ellas, habían
agua salada, de que ellas hacen sal. Dice que tienen
venido a guardar la costa. El Capitán le preguntó si
una orden que, en poniéndose el sol, no ha de quedar
estas mujeres eran casadas: el indio dijo que no. El
indio macho en todas estas ciudades que no salga
Capitán le preguntó que de qué manera viven: el afuera y se valla a sus tierras: más dice, que muchas
indio respondió que, como dicho tiene, estaban la provincias de indios a ellas comarcanas los tienen
tierra adentro, y que él había estado muchas veces ellas subjetos y los hacen tributar y que les sirvan, y
allá y había visto su trato y vivienda, que como su otras hay con quien tienen guerra, y especial con la
vasallo iba a llevar el tributo cuando el señor lo que ya dijimos, y los traen para tener que hacer con
enviaba. El Capitán preguntó si estas mujeres eran ellos: éstos dicen que son muy grandes de cuerpo y
muchas: el indio dijo que sí, y que él sabía por blancos y mucha gente, y que todo lo que aquí ha
nombre setenta pueblos, y contólos delante de los dicho ha visto por muchas veces, como hombre que
que allí estábamos, y que en algunos había estado. iba y venía cada día; y todo lo que este indio dijo y
El Capitán le dijo que si estos pueblos eran de paja: más nos habían dicho a nosotros a seis leguas de
el indio dijo que no, sino de piedra y con sus puertas, Quito, porque de estas mujeres había allí muy gran
y que de un pueblo a otro iban caminos cercados noticia, y por las ver vienen muchos indios el río
de una parte y de otra y a trechos por ellos puestos abajo mil y cuatrocientas leguas; y así nos decían
guardas porque no pueda entrar nadie sin que pague arriba los indios que el que hubiese de bajar a la
tierra de estas mujeres había de ir muchacho y volver
derechos. El Capitán le preguntó si estas mujeres
viejo. La tierra dice que es fría y que hay muy poca
parían: el indio dijo que sí. El Capitán le dijo que
leña, y muy abundosa de todas comidas; también
como no siendo casadas, ni residía hombre entre dice otras muchas cosas, y que cada día, va
ellas, se empreñaban: él dijo que estas indias descubriendo más porque es un indio de mucha
participan con indios en tiempos y cuando les viene razón y muy entendido y así lo son todos los demás
aquella gana juntan mucha copia de gente de guerra (de aquella) tierra, según lo habemos dicho.
y van a dar guerra a un muy gran señor que reside
Otro día de mañana salimos deste asiento
y tiene su tierra junto a la destas mujeres y por del robledal no poco alegres, pensando que ya
fuerza los traen a sus tierras y tienen consigo aquel dejábamos atrás todo lo poblado y que teníamos
tiempo que se les antoja, y después que se hayan lugar para descansar de los trabajos pasados y
preñadas les tornan a enviar a su tierra sin les hacer presentes: y así comenzamos nuestro
otro mal; y después, cuando viene el tiempo que acostumbrado camino; pero no habíamos andado
han de parir, que si paren hijo le matan y le envían mucho, cuando a la mano siniestra vimos muy
a sus padres, y si hija, la crían com muy gran grandes provincias y poblaciones, y éstas estaban
solemnidad y la imponen en las cosas de la guerra. en la más alegre y vistosa tierra que en todo el río
Dijo más, que entre todas estas mujeres hay una vimos y descubrimos, porque era tierra alta de
señora que subjeta y tiene todas las demás debajo lomas y valles muy poblados, de las cuales dichas
de su mano y jurisdicción, la cual señora se llama provincias salió a nosotros a medio río muy gran
Coñori. Dijo que hay muy grandísima riqueza de copia de piraguas a nos ofender y dar guerra.
Estas gentes son tan grandes y mayores que muy
oro y plata y que todas las señoras principales y de
grandes hombres y andan trasquilados, y salieron
manera no es otro su servicio sino oro y plata, y las
todos tiznados de negro, a cuya cabsa la llamamos
demás mujeres plebeyas se sirven en vasijas de la Provincia de los Negros [Monte Alegre]. Salieron
pa1o, excepto lo que llega al fuego, que es barro. muy lucidos y acometiéronnos muchas veces pero
Dijo que en la cabecera y principal ciudad en donde no nos hicieron daño, y el1os no fueron sin él. No
reside la señora hay cinco casas muy grandes que tomamos ninguno de los dichos pueblos por no
son adoratorios y casas dedicadas al Sol, las cuales darnos lugar el Capitán por la demasiada gente
ellas llaman caranaín y en estas casas por de dentro que había. El Capitán preguntó al indio ya dicho
están del suelo hasta medio estado en alto cuya era aquella tierra y que quien la sujetaba, y
planchadas de gruesos techos aforrados de pinturas dijo que aquella tierra y poblaciones que se parecían
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 29

con otras muchas que no víamos, eran de un señor este mismo pájaro o otro oímos en nuestra compañía
muy grande que había nombre Arripuna, el cual desde el primer pueblo donde hicimos los clavos, y
señoreaba mucha tierra; que el río arriba y de traviesa era tan cierto, que notando que estábamos cerca de
tenía ochenta jornadas que había fasta una laguna poblado, al cuarto del alba nos lo decía de esta
que estaba a la parte del norte, la cual está muy manera: huí, y esto muchas veces: quiere decir que
poblada, y que la señorea otro señor que se llama era tan cierta esta ave en su canto que lo teníamos
Tinamostón; pero dice que éste es muy gran guerrero ya por tan cierto como que lo viéramos; y así era
y que comen carne humana, la cual no comen en que cuando se oían nuestros compañeros se
toda la demás tierra que hasta aquí hemos andado. alegraban, y en especial si había falta de comida, y
Este sobredicho señor no es de la laguna, sino es de se aparejaban a ir todos a punto de guerra. Aquí
otra. Es el que tiene en sí y en su tierra los cristianos nos dejó esta ave, que nunca la oímos más.
de que arriba tuvimos noticia, porque este dicho indio
los había visto; y dice que posee y tiene muy gran Luego mandó el capitán que nos partiésemos
riqueza de plata y con ella se sirven en toda la tierra, de este asiento porque le parecía que había mucha
pero que oro no lo alcanzan; y en verdad que la misma gente, y que a la noche, según parecía, tenían
tierra da crédito a todo lo que se dice, según la vista ordenado de dar en nosotros: fue noche que mandó
y parecer tiene. el Capitán que pasásemos atados a las ramas porque
no se halló lugar para dormir en tierra, y esto fue
Fuimos caminando por el río, y al cabo de dos permisión divina, que si hallaron que saltar en tierra
días dimos en un pueblo pequeño donde los indios pocos de nosotros quedaran o ninguno que pudiera
se nos defendieron, pero desbaratámosles y dar nueva del viaje, según pareció; y es que estando
tomámosles la comida y pasamos adelante, y otro como dicho tengo los indios vienen en nuestro
que estaba junto a él mayor: aquí se defendieron y seguimiento por tierra y agua, y así nos andaban
pelearon los indios por espacio de media hora, buscando con muy grande estruendo y así allegaron
también y con tanto ánimo, que antes que tuviésemos los indios a nosotros y estuvieron hablando que los
lugar de saltar en tierra, mataron dentro en el oíamos y víamos, y no permitió nuestro Señor que
bergantín grande un compañero que se llamaba nos acometiesen, porque a nos acometer no quedara
Antonio de Carranza, natural de Burgos. En este ninguno de nosotros; y así tenemos por cierto que
pueblo alcanzaban los indios alguna yerba ponzoñosa, Nuestro Señor los cegó para que no nos viesen; y
porque en la herida del dicho se conoció, porque al desta manera estuvimos fasta que vino el día, que
cabo de veinte y cuatro horas dio el ánima a Dios. el capitán mandó que comenzásemos a caminar.
Tornando a nuestro propósito, diré que se Aquí conocimos que estábamos no muy lejos de la
tomó el pueblo y recogimos todo el maíz que cupo mar, porque llegaba la repunta de la marea, de lo
en los bergantines, porque, como vimos la yerba, que no nos alegramos poco en saber que ya no
propusímonos de no saltar en tierra ni en poblado podíamos dejar de llegar a la mar.
sino fuese con demasiada necesidad, y así fuimos En comenzando a caminar, como dicho tengo,
con más aviso de que hasta allí habíamos traído. dende a un rato descubrimos un brazo de un río no
Caminamos con mucha priesa, desviándonos muy grande, por el cual vimos salir dos escuadrones
de poblado, y un día en la tarde fuimos a dormir en de piraguas y muy gran grita y alarido, y cada uno
un robledal que estaba a la boca de un río que de estos escuadrones se fue a los bergantines, y
entraba por la diestra mano en el de nuestra comenzaron a nos ofender y pelear como perros
navegación, que tenía una legua de ancho. El encarnizados; y si no fuera por las baranderas que
Capitán mandó atravesar para dormir a donde dicho se habían hecho atrás, saliéramos de esta
tengo, porque parecía junto a la costa de dicho río escaramuza bien diezmados; pero con esta defensa
no haber poblado y podíamos dormir sin haber y con el daño que nuestros ballesteros y arcabuceros
zozobra, aunque la tierra de dentro parecía muy les hacían fuimos parte, con el ayuda de Nuestro
poblada: desto no nos temíamos, y paramos en el Señor, para nos defender; pero al cabo no salimos
dicho robledal, y aquí mandó el Capitán poner a los sin daño, porque nos mataron outro compañero
bergantines unas barandas a manera de fosados llamado García de Soria, natural de Logroño; y en
para defensa de las flechas, y no nos valieron poco. verdad que no le entró la flecha medio dedo; pero
No había poco que estábamos en este dicho asiento, como traía ponzoña no duró veinte y cuatro horas, y
cuando viene mucha cantidad de canoas y piraguas dio el ánima a Nuestro Señor. Fuimos peleando desta
a se nos poner a vista, sin nos hacer otro mal, y manera desde que amaneció fasta que serían más
desta manera no hacían sino ir y venir. Estuvimos de las diez, que no nos dejaron un momento
en este asiento día y medio, y pensábamos de estar holgar, antes cada hora había mucha más
más. Aquí se avisó de una cosa no de poco espanto gente, tanto que el río andaba cuajado de
y adivinación a los que la vimos, y fue que a hora piraguas, y esto porque estábamos en tierra muy
de vísperas se puso sobre un árbol debajo del cual poblada y de un señor que se llamaba
estábamos aposentados un pájaro del cual nunca Nurandaluguaburabara. Sobre la barranca había
oímos más del canto, que a muy gran priesa hacía, muy gran copia de gente, que estaba mirando la
y distintamente decía huí, y esto dijo tres veces guazabara, así que como nos fuesen siguiendo
dándose muy gran priesa. También sé decir que íbannos poniendo en mucho aprieto, tanto que
30 A Viagem de Orellana Rio Amazonas abaixo nos anos de 1541 e 1542...

estaban ya cerca de los bergantines. Aquí se hicieron mandó el Capitán enderezar allá el bergantín grande;
dos tiros muy señalados con los arcabuces, que acertó a tomar el puerto bien y saltaron 1os
fueron parte para que aquella gente diablada nos compañeros en tierra; el pequeño, no vido un palo
dejase; y el uno hizo el Alférez que mató de un tiro que estaba cubierto con el agua, y dio tal golpe que
dos indios, y de temor deste trueno cayeron muchos una tabla se hizo pedazos, tanto que el barco se
al agua, de los cuales no escapó ninguno, porque anegó. Aquí nos vimos en muy grandísimo aprieto,
todos se mataron desde los bergantines: el otro hizo tanto que en todo el río no le tuvimos mayor, y
un vizcaíno llamado Perucho. Esta fue una cosa muy pensamos todos perecer, porque de todas partes nos
de ver, de cuya cabsa los indios nos dejaron y se golpeaba la fortuna; porque como nuestros
volvieron sin socorrer a los que andaban por el agua: compañeros saltaron en tierra, dieron en los indios
ninguno de éstos, como dicho tengo se escapó. y los hicieron huir, y creyendo que estaban seguros
comienzan a recoger comidas. Los indios como eran
Acabado esto, el Capitán mandó muchos revuelven sobre nuestros compañeros y
atravesásemos a la banda siniestra del río por huir danles tal mano que los hacen volver donde estaban
de lo poblado que parecía, y así se hizo: fuimos los bergantines, los indios en su seguimiento; pues
caminando por la dicha parte algunas leguas por en los bergantines poca seguridad tenían, porque
tierra mucho buena, excepto que a la lengua del el grande estaba en seco, que había bajado la marea,
agua no había poblado, que todo parecía la tierra y el pequeño anegado, como he dicho: y así
adentro; no supimos qué era la cabsa. Así fuimos estábamos en esta necesidad sin tener remedio sino
costeando: vimos lo poblado en parte donde no nos de sólo Dios y el de nuestras manos, que era el que
podíamos aprovechar dello y más se parecía unas nos había de valer y sacar de la necesidad en que
fortalezas sobre unos cerros y lomas peladas, que estábamos; y luego el Capitán ordenó de poner y
estarían del río dos o tres leguas; no supimos qué dar luego remedio como no recibiésemos daño, y
señor señoreaba esta tierra más de que el indio nos fue de manera que mandó dividir la gente, que fue
dijo que en aquellas fortalezas se hacían fuertes que la mitad de todos los compañeros peleasen con
cuando les daban guerra; pero no supimos quién los indios y los otros varasen el bergantín pequeño
era el que se las daba. y se adobase; y mandó luego que el grande se pusiese
en alto de manera que nadase, y quedó dentro el
Yendo caminando, mandó el Capitán que Capitán con solamenle los dos religiosos que
saltásemos en tierra por tomar alguna recreación y veníamos en su compañía y otro compañero a
ver la disposición de aquella tierra que tanto a guardar el dicho bergantín, y para defensa de los
nuestras vistas agradaba; y así paramos días en indios por la parte del río: así estábamos todos, no
este dicho asiento de donde el Capitán mandó que sin tener poco en que entender, de manera que
se fuesen a ver la tierra dentro de una legua por ver teníamos guerra por tierra y fortuna por agua; plugo
y saber qué tierra era; y así fueron, y no caminaron a Nuestro Señor Jesucristo ayudar nos y
una legua cuando los que iban dan la vuelta, dicen favorecernos como siempre a fecho en todo este
al Capitán cómo la tierra iba siempre mejorando viaje, y que nos ha traído como gente perdida, sin
porque era todo sábanas y los montes como dicho saber dónde estábamos ni dónde íbamos, ni qué
habemos, y parecía mucho más rastro de gente que habia de ser de nosotros Aquí se conoció muy
venía por allá a caza y que no era cosa de pasar particular y generalmente que usó nuestro Dios de
adelante: y así de la vuelta el Capitán se holgó. su misericordia, pues sin entender ninguno cómo
hizo la merced divina y con su imensa bondad y
Aquí comenzamos a dejar la buena tierra y providencia divina se remedió y se socorrió, de
sábanas y tierra alta, y comenzamos a entrar en manera que el bergantín se adobó y se echó una tabla,
tierra baja de muchas islas, aunque pobladas no y a este mismo tiempo huyó la gente de guerra, y en
tanto como las de arriba. Aquí dejó el Capitán la tres horas que se tardó la dicha obra no dejaron de
tierra firme y se metió en las islas, por las cuales pelear. ¡Oh inmenso y soberano Dios, cuántas veces
fue caminando, tomando de comer a donde veíamos nos vimos en trances de agonía tan cercanos a la
que sin daño se podía hacer; y por ser las islas muerte, que sin tu misericordia era imposible
muchas y muy grandes, nunca pudimos tornar a alcanzar fuerzas ni consejo de 1os vivos para quedar
tomar la tierra firme de una ni de la otra parte fasta con las vidas! De este pueblo sacamos alguna comida,
la mar, en que iríamos por entre las islas doscientas y vino tan justo el día con la necesidad, que la noche
leguas, todas las cuales, y aún ciento más sube la cerrada y nosotros acabados de embarcar todo fue
marea con mucha furia, en que por todas son uno. Esta noche dormimos en el mesmo río en los
trescientas de marea e mil y quinientas sin ella; de bergantines. El día siguiente tomamos puerto en un
manera que se montan las leguas que hemos andado monte. Aquí pusimos por obra de aderezar el
por este río, desde donde salimos hasta la mar, mil bergantín pequeño de manera que pudiese navegar,
y ochocientas leguas, antes más que menos. que tardamos en la dicha obra diez y ocho días, y de
nuevo se tornaron a hacer aquí clavos, donde de
Yendo caminando por nuestro acostumbrado nuevo nuestros compañeros no trabajaron poco; pero
camino, como salíamos muy faltos y con harta había muy gran falta de comida: comíamos el maíz
necesidad de comida, fuimos a tomar un pueblo el por granos contados. Asimismo estando en esta
cual estaba metido en un estero; hora de pleamar necesidad, mostró Nuestro Señor el particular
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 31

cuidado que tenía de nosotros pecadores, pues quiso inanes, que a no las hallar, todos pereceríamos de
proveer en esta necesidad como todo lo demás que hambre: así salimos muy faltos de bastimentos. En
tengo dicho; y fue así, que un día sobre tarde todos estos pueblos nos esperaban los indios sin
apareció que venía por el río una danta muerta, armas, porque es gente muy doméstica, y nos daban
tamaña como una mula, y visto por el Capitán, señas cómo habían visto cristianos. Estos indios
mandó a ciertos compañeros que se la trujesen y están a la boca del río por donde salimos, donde
tomasen una canoa para traerla, y la trujeron y se tomamos agua, cada uno un cántaro, y unos a medio
repartió por todos los compañeros; de manera que almuz de maíz tostado, y otros menos y otros com
a cada uno le cupo de comer para cinco o seis días, raíces, y de esta manera nos pusimos a punto de
que no fue poco sino mucho remedio para todos.
navegar por la mar por donde la aventura nos guiase
Esta danta venía recién muerta, porque estaba
y echase, por que nosotros no teníamos piloto ni
caliente y no traía ninguna herida.
aguja, ni carta ninguna de navegar, ni sabíamos
Acabado de adobar el bergantín y clavos, para por qué parte o a qué cabo habíamos de echar. Por
adobar el grande partimos de este asiento y fuimos todas estas cosas suplió nuestro maestro y redentor
caminando y buscando aparejos o playa para los Jesucristo, al cual teníamos por verdadero piloto y
sacar y adobar lo necesario. Día de San Salvador, guía, confiando en su Sacratísima Majestad que El
que es la transfiguración de Nuestro Redentor nos acarreara y llevara a tierra de cristianos. Toda
Jesucristo, hallamos la dicha playa que la gente que hay en este río que hemos pasado, como
buscábamos, a donde se adobaron de todo hemos dicho, es gente de mucha razón y hombres
entrambos bergantines y se les hizo sus jarcias de ingeniosos, según que vimos y parecían por todas
yerbas y cabos para la mar, y velas de las mantas las obras que hacen, así de bulto como dibujos y
en que dormíamos, y se les pusieron sus mástiles:
pinturas de todas las colores, muy vivísimas, que
tardóse de hacer la dicha obra catorce días de
es cosa maravillosa de ver.
continua y ordinaria penitencia por la mucha
hambre y poca comida que había, que no se comía Salimos de la boca de este río por entre dos
sino lo que se mariscaha a la lengua del agua, que islas [Caviana e Mexiana], que hahía de la una a la
eran unos caracolejos y unos cangrejos otra cuatro leguas por medio río, y todo él junto,
bermejuelos del tamaño de ranas; y éstos iban a según arriba le vimos, tendrá de punta a punta sobre
tomar la mitad de los compañeros y la otra mitad cincuenta leguas: mete en la mar el agua dulce más
quedaban trabajando: desta manera y con este de veinte y cinco leguas; crece y mengua seis o siete
trabajo concluimos la dicha obra, que no fue brazos. Salimos, como dije, a veinte y seis días del
pequeña alegría para nuestros compañeros, los que mes de agosto, día de San Luis; e hízonos tan buen
tenían echado aparte tan gran trabajo.
tiempo, que nunca por río ni por la mar tuvimos
Salimos de este asiento a ocho días del mes de aguaceros, que no fue poco milagro que Nuestro
agosto, bien o mal proveídos según nuestra poca Señor Dios obró con nosotros. Comenzamos a
posibilidad, porque muchas cosas nos faltaban de caminar con entrambos bergantines, unas veces a
que teníamos necesidad; pero como estábamos en vista de tierra y otras veces que la veíamos, más no
parte que no lo podíamos haber, pasábamos nuestro que supiésemos dónde, y el mismo día de la
trabajo como mejor podíamos. De aquí fuímos a la Degollación de San Juan en la noche se apartó el
vela guardando la marea, dando bordos a un cabo y un bergantín de otro, que nunca más nos podimos
a otro, que bien la había según por donde el río era ver, que pensamos que se hubiesen perdido, y al
andado, aunque íbamos entre islas, pues no
cabo de nueve días que navegábamos metiéronnos
estábamos en poco peligro cuando aguardábamos la
nuestros pecados en el golfo de Paria, pensando que
marea; pero como no teníamos rejones, estábamos
aquél era nuestro camino, y como nos hallamos
amarrados a unas piedras. Echábamos por portalles
dentro, quisimos tornar a salir a la mar: fue la salida
y teníamonos tan mal que nos acontecía muchas
veces garrar y volver el río arriba en una hora más tan dificultosa que tardamos en ella siete días, todos
que habíamos andado en todo el día. Quiso nuestro los cuales nunca dejaron los remos de las manos
Dios, no mirando a nuestros pecados, de nos sacar nuestros compañeros, y en todos estos siete días
de estos peligros y hacernos tantas mercedes que no no comimos sino fruta a manera de ciruelas, que se
per mitió que nos muriésemos de hambre ni llaman hogos; así que con mucho trabajo salimos
padeciésemos naufragio, del cual estábamos muy por las bocas del Dragón, que tales se pueden llamar
cerca muchas veces hallándonos en seco, ya todos para nosotros, porque por poco nos quedáramos
en el agua, pidiendo a Dios misericordia; y según las dentro. Salimos desta cárcel; fuimos caminando dos
veces que tocaron y se dieron golpes puédese creer días por la costa adelante, al cabo de los cuales, sin
que Dios, con su poder absoluto, nos quiso librar saber dónde estábamos, ni dónde íbamos, ni qué
porque nos enmendásemos o para otro misterio que había de ser de nosotros, aportamos a la isla de
su Divina Majestad guardado (tenía) que asi los Cubagua y ciudad de la Nueva Cádiz, donde
hombres no alcanzamos. Fuimos caminando hallamos nuestra compañía y pequeño bergantín,
continuamente por poblado, donde nos proveíamos de que había dos días que había llegado, porque ellos
alguna comida, aunque poca, porque los indios la tenían llegaron a nueve días de septiembre y nosotros
alzada; pero hallábamos algunas raíces que llamaban llegamos a once del dicho mes con el bergantín
32 A Viagem de Orellana Rio Amazonas abaixo nos anos de 1541 e 1542...

grande, donde venía nuestro Capitán: tanta fue el cuatrocientas cincuenta leguas por la altura, porque
alegría que los unos con los otros recebimos, que así lo hemos visto después que llegamos. En toda la
no sabré decir, porque ellos nos tenían a nosotros costa, aunque hay muchos ríos, son pequeños.
por perdidos y nosotros a ellos.
Yo Fray Gaspar de Carvajal, el menor de los
De una cosa estoy informado y certificado: que religiosos de la Orden de nuestro religioso Padre
así a ellos como a nosotros nos ha hecho Dios Santo Domingo, he querido tomar este poco trabajo
grandes mercedes y muy señaladas en nos traer en y suceso de nuestro camino y navegación, así para
este tiempo, que en otro los maderos que andan decirla y notificar la verdad en todo ello, como para
por la costa no nos dejaran navegar, porque es la quitar ocasiones a muchos que quieran contar esta
más peligrosa costa que se ha visto. Fuimos también nuestra peregrinación o al revés de cómo lo hemos
recebidos de los vecinos desta ciudad como si pasado y visto; y es verdad en todo (lo) que yo he
fuéramos sus hijos, porque nos abrigaron y escrito y contado, y porque la prodigalidad engendra
diéronnos lo que habíamos menester. fastidio, así, superficial y sumariamente, he relatado
lo que ha pasado por el Capitán Francisco de
Desta isla acordó el Capitán de ir a dar cuenta Orellana y por los hidalgos de su compañía y
a su Majestad deste nuevo y gran descubrimiento y compañeros que salimos con él del real de Gonza1o
deste río, el cual tenemos que es Marañón, porque Pizarro, hermano de don Francisco Pizarro, Marqués
hay desde la boca hasta la isla de Cubagua y Gobernador del Perú. Sea Dios Loado. Amén.

Referências
Asensio, E., 1951. La carta de Gonzalo Fernández de Oviedo al Cardenal Bembo sobre la navegación del
Amazonas, in seu Miscelánea americanista I: 107-115. Madrid.
Carvajal, Fray G. de, 1955. Relación del nuevo descubrimiento del famoso río Grande de las Amazonas.
Edición, introducción y notas de Jorge Hernández Millares. Fondo de Cultura Económica, México, D. F.
Carvajal, Fray G. de, 1958. Descubrimiento del Río de Orellana. Versión de Jorge A. Garcés G., prólogo de J.
Roberto Páez. Quito.
Díaz Maderuelo, R., 1986. G. de Carvajal, P. de Almesto y Alondo de Rojas. La aventura del Amazonas.
Edición de... Historia 16, Información y Revistas, S. A., Madrid.
Gil Munilla, L., 1954. Descubrimiento del Marañón. Escuela de Estudios Hispano-Americanos de Sevilla,
Sevilla.
Jos, E., 1942-1943. Centenario del Amazonas: La expedición de Orellana y sus problemas históricos. Revista
de Indias nos. 10-13.
Markham, C. R., 1859. “Expedition of Gonzalo Pizarro to the land of Cinnamon, A. D., 1539-42, translated
from the second part of Garcilaso Inca de la Vega’s ‘Royal Commentaries of Peru” & “The voyage of
Francisco de Orellana down the river of the Amazons, A. D. 1540-1, translated from the sixth decade of
Antonio de Herrera’s ‘General History of the Western Indies”, in seu Expeditions into the Valley of the
Amazons, 1539, 1540, 1639. Translated and edited, with notes, by C. R. Marckham. [Works edited by the
Hakluyt Society, First Series, vol. XXIV]. Burt Franklin Publisher, New York.
Medina, J. T., 1894. Descubrimiento del río de las Amazonas según la relación hasta ahora inédita de Fray
Gaspar de Carvajal, con otros documentos referentes a Francisco de Orellana y sus compañeros. Publicado
á expensas del Excmo. Sr. Duque de T’Serclaes de Tilly, com una introducción historica y algunas ilustraciones
por José Toribio Medina, de la Academia Chilena. Imprenta de E. Rasco, Sevilla.
Melo-Leitão, C. de, 1941. Gaspar de Carvajal, Alonso de Rojas e Cristobal de Acuña. Descobrimentos do Rio
das Amazonas. Traduzido e anotado por... Companhia Editora Nacional, São Paulo. [Col. Brasiliana, no.
203].
Rodríguez, M., 1990. El descubrimiento del Marañón. Edición, prólogo y notas de Angeles Durán. Alianza
Editorial, Madrid.
Smith, A., 1990. Capítulo 2. Francisco de Orellana, o primeiro a descer o Amazonas, pp. 55-115, in seu
Os conquistadores do Amazonas. Quatro séculos de exploração e aventura no maior rio do mundo. Editora
Best Seller, São Paulo.
Capítulo 4

A RELAÇÃO DE FRANCISCO VÁZQUEZ


SOBRE A VIAGEM DE PEDRO DE URSÚA E
LOPE DE AGUIRRE (1559-1561) PELO AMAZONAS

P edro de Ursúa deve ter nascido em Pamplona, na Espanha, por volta de 1526. Chegou
muito jovem em Cartagena de las Indias, na Colômbia, em companhia de seu primo Miguel Díaz
de Armendariz. Nessa cidade ouviu as fábulas do El Dorado, de certas pessoas que haviam viajado
em sua busca. Isto marcaria decisivamente sua vida posterior. Em 1548 foi encarregado de fundar
uma cidade na província de Chitareras, a que batizou de Pamplona. Em 1551 recebeu a nomeação
da “Justicia Mayor de Santa Marta”. Voltou a Santa Fé e recebeu novo encargo – pacificar os
índios Muso. Pouco depois fundou Tudela, em 1553. De novo em Santa Fé, esperou que lhe
autorizassem a viagem ao El Dorado, mas o Imperador havia proibido as entradas do Valle de
Nuestra Señora, supostamente a melhor rota para essa legendária região. Vítima de intrigas de
seu lugar-tenente, o Ouvidor Montaño, teve que refugiar-se no Panamá em 1556; ali conheceu o
novo Vice-rei do Peru, Marquês de Cañete, que lhe encomendou a redução de certos negros fugidos;
após submetê-los, transladou-se a Nombre de Dios e mais tarde a Lima, onde se achava em 1558.
Estes últimos acontecimentos valeram-lhe a confiança do Vice-rei, e desta forma conseguiu
organizar a campanha, tantas vezes desejada, a El Dorado.
Por ocasião da preparação da expedição, achava-se enamorado de uma mestiça de grande
beleza, dona Inés de Atienza, que decidiu levar na viagem, contra a opinião da maioria dos
expedicionários, muitos dos quais a culparam pelo trágico fim de Ursúa, que morreria assassinado,
por instigação de Aguirre, nos domínios de Machifaro, na madrugada do dia do Ano Novo de 1561.
Lope de Aguirre nasceu em Oñate, Guipúscoa, entre 1511 e 1516, já que em 1561 atribui-se-
lhe a idade de quarenta e cinco ou cinqüenta anos. Deve ter embarcado para as Índias Ocidentais
em 1536, com o cargo de “regidor”. Tudo parece indicar que chegou ao Peru quando a rivalidade
entre Pizarro e Almagro estava a ponto de concluir na batalha de Salinas, em 1538. Seu nome
surge associado à fundação da cidade de La Plata, em 1539. Participou da guerra de Chipas, e,
mais tarde, receberia o posto de sargento, sem dúvida pela fidelidade que demonstrara ao Vice-rei
Blasco Núñez Vela, notório por seu rigor na aplicação da legislação em favor dos indígenas, o que
lhe valeu uma violenta reação dos ouvidores e de grande número de cidadãos, em conseqüência
da qual foi encarcerado. Aguirre tomou parte de uma tentativa para libertá-lo, mas, descoberta a
trama, teve que refugiar-se em Cajamarca. Em 1546 acompanhou Melchor Verdugo a Honduras e
Panamá, e seus dados biográficos desaparecem até 1553, ano em que consta haver tomado parte
na rebelião de Sebastián de Castilla, que, fracassada, levou-o à prisão sob pena de morte; só
conseguiu livrar-se dela mediante o perdão oferecido aos que se alistassem contra uma nova
insurreição, desta vez a de Hernández Girón. Sua vida desordenada e as expressões de seu caráter
apaixonado valer-lhe-iam o apodo de Aguirre el loco.
Esses antecedentes biográficos, em que seu nome surge sempre vinculado de alguma maneira
a atos de rebeldia ou insurreição, cobrarão expressão mais acentuada quando entrou a formar
parte da expedição de Ursúa a El Dorado. Ao longo da navegação, sua ruptura não se dirige
somente contra Ursúa, mas vai muito além, e ele se rebela contra o próprio Rei de Espanha.
Empreende uma desabalada carreira Amazonas abaixo, com a idéia de regressar ao Peru para
substraí-lo do domínio da Coroa. As mortes se sucedem, a expedição assume o caráter de um ciclo
de violências que parece não ter fim, qualquer mínima suspeita de deserção é afogada em sangue;
a chegada à ilha de Margarita, na Venezuela, se reveste do mesmo tom de violência, cujo clímax é
atingido na “Tierra Firme”, quando Aguirre chega a matar sua própria filha, e só é concluída em
Barquisimeto, a 27 de outubro de 1561, com sua própria morte.
34 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

Manuscritos referentes à viagem de Ursúa e Aguirre


Javier Ortiz de la Tabla (in Vázquez, 1987: 34-35), listou os manuscritos originais escritos
por participantes da viagem de Ursúa e Aguirre (conhecidos como ‘marañones’). São eles:
1. A crônica de Francisco Vázquez encontra-se na Coleção de don Juan Bautista Muñoz, da Real
Academia de la Historia de Madrid (tomo 43, fols. 4-68 (A-115 no. 766)). Segundo o próprio
Muñoz, o manuscrito do século XVII por ele copiado e compulsado encontrava-se na Biblioteca
da Catedral de Sevilha. Outro Ms. desta crônica, quase idêntico ao da coleção Muñoz, encontra-
se na Biblioteca Nacional de Madri (Ms. 3199) e foi editado pelo marquês de Fuensanta del
Valle (1881). Cf. Vázquez, 1881, 1944, 1979, 1987.
2. Relación verdadera de todo lo que sucedió en la jornada de Amagua y Dorado... Autor: Pedrarias
de Almesto, copiando o texto de Vázquez. O manuscrito desta versão Vázquez-Almesto encontra-
se na Biblioteca Nacional de Madri (Ms. 3191). Cf. Gandia, 1944; Malfatti, 1952; Mampel &
Escandell, 1981; Díaz Maderuelo, 1986.
3. Relación de lo que sucedió en la jornada que le fue encargada al gobernador Pedro de Ursua
que se dezía el Dorado y las muertes y daños que en ella uvo después que los tiranos lo mataron
al dicho goberbador. Autor: Pedrarias de Almesto, independente do texto de Vázquez. Encontra-
se na Biblioteca Nacional de Paris (Ms. Esp. 325).
4. Relación breve hecha por Pedro de Monguia... de lo más sustancial... de la jornada del Gobernador
Orsua... e del alzamiento de Lope de Aguirre... Autor: Pedro de Monguía (Real Academia de la
Historia de Madrid, col. de don Juan Bautista Muñoz, tomo LXXXVIII). Cf. Monguía, 1885;
Mampel & Escandell, 1981.
5. Relación muy verdadera de todo lo sucedido en el río Marañón en la provincia del Dorado.
Autor: Gonzalo de Zúñiga (Real Academia de la Historia de Madrid, col. de don Juan Bautista
Muñoz, tomo LXXXVIII). Cf. Zúñiga, 1885; Mampel & Escandell, 1981.
6. Jornada del Río Marañón. Autor: Toribio de Ortiguera (aproveitando-se do texto de Almesto).
Cf. Ortiguera, 1909, 1968; Mampel & Escandell, 1981.
7. Esta es parte de una relación de un tirano que se dize Lope de Aguirre y no va entera porque no
ubo lugar. Autor: no texto diz-se filho de Juan Pérez, de Usanos, Guadalajara (Real Academia
de la Historia de Madrid, col. de don Juan Bautista Muñoz, tomo LXXXVIII).
8. Relación muy berdadera que trata de todo lo que acaeció en la entrada de Pedro de Orsua en
el descubrimiento del Dorado y Amagua y de la rebelión de don Hernando de Guzmán y del
muy cruel tirano Lope de Aguirre. Anônimo, mas atribuída por Jos ao ‘marañón’ Custodio
Hernández (Biblioteca Nacional de Madrid, Ms. 19525). Cf. Jos, 1927; Mampel & Escandell,
1981.
9. Relación de todo lo sucedido en la governación de Omagua que por outro nombre se llama el
Dorado des que fue encargada a Pedro de Ursua. Anônimo (Real Academia de la Historia de
Madrid, Papeles de Jesuítas, tomo 115). Cf. Jos, 1927; Mampel & Escandell, 1981.
10. Carta-relación de Juan de Vargas Zapata (Archivo General de Indias, Patronato, 29 Ramo 18).
Cf. Jos, 1927.
11. El Marañón. Autor: Diego de Aguilar y Córdoba. Ms. original na Biblioteca de la Universidad
de Oviedo. (Existe uma cópia no British Museum, Ms. Add. 17616). Cf. Jos, 1950.
12. Relación de la jornada del Dorado. Autor: o capitão Altamirano. Encontra-se incorparado à
obra de J. Vázques de Espinosa, Compendio y descripción de las Indias Occidentales, livro IV,
capítulos 9-16, cujo manuscrito se encontra na Biblioteca Vaticana (Roma), na Biblioteca
Barberiana (Barberianus Latinus 3584). Cf. Vázquez de Espinosa, 1942, 1948.
Existe, além disso, vasta bibliografia sobre este assunto; alguns títulos são apresentados na
“Bibliografia” abaixo.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 35

Animais citados na crônica de Francisco Vázquez


O texto da crônica da viagem de Ursúa e Aguirre por Francisco Vásquez, reproduzido abaixo,
foi retirado da sua edição de 1987.
As referências de Vázquez a animais são escassíssimas e incidentais (em negrito no texto
transcrito abaixo); um único capítulo (Discursos del río Marañón; Vázquez, 1987: 107-109) trata
um pouco mais da fauna:
“Tiene este río Marañón, según los que se precisan de entenderlo, más de 1.600 leguas
desde su nacimiento a la mar. Es tan grande y poderoso que no se puede escribir su grandeza;
anega en cualquier parte al tiempo de su creciente más de cien leguas de tierra llana fuera de su
madre; hay en él tanta cantidad de mosquitos, especialmente de los zancudos de noche y de
día, que es temeridad ver que los sufran los naturales. Hasta que llegamos al pueblo de las
tortugas tuvimos pocos aguaceros, y creo yo que este tiempo debe ser verano, si le hay porque
desde septiembre a navidad, de allí para abajo nos llovió mucho y vienen grandes aguaceros con
muchos truenos, y ordinariamente con tanto viento que causa en el río gran tormenta de olas
mayores que en el mar, que anegan las canoas o piraguas si no cogiesen con tiempo el abrigo de
la tierra, y aun en los bergantines nos vimos algunas veces en harto peligro, especialmente una
noche que nos pensamos anegar. Cuando llueve en los nacimientos de los ríos, que con este se
juntan, vienen grandes avenidas que anegan y cubren toda la tierra de la redonda, y el mes de
septiembre que empezamos a bajar, ya las crecientes comenzaban a venir de arriba, y en julio que
salimos a la mar aún no había acabado de vaciar, por manera que dura todo el año, que como la
distancia de los nacimientos es mucha, antes que acaben de vaciar unas torman a venir outra vez
de arriba otras. Es todo el río muy caliente en demasía, enfermo y mal poblado, porque en tanta
ditancia de tierra, en las poblaciones que nosotros vimos no puede haber de 150 indios arriba
que es bien poco; (...).acabadas de pasar las crecientes que vienen de arriba, hace el río muy
grandes playas, en las cuales se halla innumerable cantidad de huevos de tortugas hicoteas que
se pueden con ellos solos sustentar más de mil hombres. Hay así mismo a cierto tiempo mucha
tortuga y pájaros que se cogen en las playas muy grandes de muchas maneras, y hay muchos y
grandes pescados y muy sabrosos.”
O texto de Almesto (cf. Almesto, 1986) repete basicamente o de Vázquez.

Texto da “Relación” de Francisco Vázquez


RELACIÓN DE TODO LO QUE SUCEDIÒ EN LA JORNADA DE AMAGUA Y DORADO, QUE FUE A DESCUBRIR EL
GOBERNADOR PEDRO DE URSUA, CON PODERES Y COMISIONES QUE LE DIO EL VIRREY MARQUÉS DE CAÑETE
PRESIDENTE DE PERÚ. TRATASE, ASIMISMO, DEL ALZAMIENTO DE DON FERNANDO DE GUZMÁN Y LOPE DE AGUIRRE
Y OTROS TIRANOS.

En el año de 1559 siendo virrey y presidente carne humana, la cual todos ellos comen y se
del Perú el Marqués de Cañete, tuvo noticia de pierden por ella. Dieron relación que tardaron en
ciertas provincias que llaman Amagua y Dorado y venir hasta llegar al Peru por este rio arriba más de
con deseo de servir a Dios y a su Rey, encomendó diez años, y de los doce mil indios solamente llegaron
y dio poderes muy bastantes a un Caballero amigo al Perú hasta trescientos y con algunas mujeres, y
suyo llamado Pedro de Ursua, natural navarro, vinieron a dar en un pueblo de Chachapoyas, y así
para que fuese a descubrir las dichas provincias, se quedaron entre los españoles, y los demás que
y le nombró por Gobernador dellas, y le favoreció murieron en el dicho río fue en guerras que tuvieron
con dineros de la casa real. Esta noticia que hemos con los naturales que vivían en las riberas.
dicho destas províncias se tuvo y la dieron el
capitán Orellana y los que con él vinieron desde el Estos indios Brasiles contaron grandes cosas
Perú por el río Marañón abajo, donde decían que del río y de las provincias a él comarcanas,
estaban las dichas provincias, y también habían especialmente de la provincia de Amagua, así de la
dado la propia razón ciertos indios Brasiles que muchedumbre de naturales y riqueza que en ella
habían venido desde sus tierras por este río había, por lo cual pusieron deseo a muchas
Marañón arriba, descubriendo y conquistando personas de las ir a ver y descubrir. Y teniendo el
hasta que llegaron al Perú en el tiempo que presidía virrey larga noticia destas cosas, como atrás está
el licenciado Gasca. Dieron por relación estos indios referido, nombró por gobernador de las dichas
Brasiles, que viven en la costa del Brasil, que provincias al dicho Pedro de Ursua, el cual después
salieron de sus tierras más de diez o doce mil de de tener los dichos recaudos, hizo publicarlos por
ellos en muchas canoas con sus mujeres y hijos, y todos los más pueblos del Perú para que viniese a
con ellos dos españoles portugueses y el uno se noticia de todos, y luego se partió el dicho Pedro de
llamaba Mateo. Dijeron iban a buscar mejor tierra Ursua de la ciudad de Lima con hasta 24 hombres,
que la suya para su habitación; y según lo que yo lo más dellos oficiales de hacer navíos y doce negros
más bien creo a hartar sus malditos vientres de carpinteros y aserradores, y llevó asi mismo muchas
36 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

herramientas necesarias y clavazón y óxea y otras sobre el Perú; y estas fueron mentiras e invenciones
cosas a propósito para hacer navios, y con este de hombres sediciosos que no deseban otra cosa,
aparejo fue a la provincia de los Motilones, que es porque no se podía imaginar que al virrey le pasare
en las montañas del Perú a un río grande que por por la imaginación, por haber sido muy servidor de
alli pasa, adonde habían salido los indios Brasiles su Majestad; y lo mismo el dicho Pedro de Ursua, el
que habemos dicho, y buscando el sostento más cual andaba en todo este tiempo por el Perú
cómodo fundó un astillero en la barranca deste río buscando gente y dineros, sin haber vuelto al
veinte leguas abajo en un pueblo de españoles que astillero. Y entre algunas personas amigos suyos,
estaba poblado en la dicha provincia, llamado Santa unas a mil y a dos mil pesos, conque se comenzó
Cruz de la Pocoa, que habia poblado hacía un año aunque trabajosamente con algunas deudas y falta
el capitán Pedro Ramiro, y el dicho Pedro de Ursua de algunas cosas necesarias que le daban pena, y
dejó al dicho Pedro Ramiro por su teniente en el con todo esta iba cada día despachando soldados
armada, y a un maese Juan Corzo por un maestre que fuesen delante mientras él acaba negocios.
mayor de la obra, y los mandó que hiciesen ciertas
Al cabo de año y medio o poco más vino a un
barcas y navíos, y luego se tornó a la ciudad de
pueblo que llamaban Moyobamba, donde residía por
Lima a hacer gente y buscar lo que le faltaba para
Cura y vicario un clérigo llamado Pedro Portillo, el
el aviamiento de su jornada.
cual pueblo estaba cerca de su astillero; este clérigo
Esta província de los Motilones se llama así estaba rico y tratando y conversando con el dicho
porque solo estos indios se han hallado trasquilados gobernador, según se entendió, se acordó entre ellos
en todo el Perú. Es tierra muy fértil, en especial de que diese el gobernador orden como él fuese por Cura
maíz y algodón, y los indios andan vestidos de y vicario de la dicha armada a jornada que él le
costales. Este río que por ella pasa es muy prestaria dos mil pesos, y el gobernador se lo prometió
caudaloso, sin comparación mayor que cualquiera que se haría como él lo pedia; y teniendo por ciertos
de España; nace en el Perú en la provincia de los dos mil pesos, envió a comprar algunas cosas
Guánuco, pero no se puede navegar por él en más que le faltaban para su jornada y al tiempo de
de doscientas leguas, por posar por tierra muy pagarlas el clérigo se arrepintió de lo que había
áspera de mucha serranía y peñascos que causan prometido y no quiso dar los dineros, y vista por el
grandes saltos y mucha corriente. En esta provincia gobernador la ruindad de éste, movido de extrema
de los Motilones subieron por este río indios de los necesidad buscó manera para sacárselos, y entre él
Brasiles y desde aquí se fueron por tierra al pueblo y ciertos soldados suyos concertaron lo que diré.
de los Chachapoyas por donde tuvieron noticia
En aquella razón estaba D. Juan de Vargas
nuestros españoles de lo arriba dicho, y los Brasiles
soldado de la dicha jornada; a quien después hizo
viendose pocos se favorecieron de nuestra gente.
su teniente general, herido de uno o dos cuchilladas
Partido el gobernador Pedro de Ursua de su y retirado en la iglesia de dicho pueblo; el cual con
astillero para la ciudad de Lima, para acabar de D. Hernando de Guzmán y con Juan Alonso de la
aderezar su jornada, por la poca posibilidad que Bandera y un Pedro Alonso Casco y otro Pedro
tenía, en especial de dineros, a esta causa se detuvo Alonso de Miranda (mulato), por concierto hecho
por allá cerca de año y medio y estuvo en harto con el gobernador una noche muy oscura a la
poco de desbaratar la dicha jornada (que para él media noche desnudo, en camisa y con una vela
fuera harto mejor como adelante se dirá) porque al encendida fue en casa del dicho clérigo y llamó a
tiempo que andaba aprestándose, vino nueva de la puerta a muy grande priesa dando grandes
España que su Majestad había proveido por virrey golpes fingiendo alteración, y le dijo que Don Juan
a D. Diego de Azevedo con la cual nueva el Marqués de Vargas se estaba muriendo, que le rogaba por
de Cañete se había enfriado en alguna manera en el amor de Dios que fuese luego a confesar, y el
dar calor al dicho Pedro de Ursua para proseguir lo clérigo entendiendo trataba verdad, salió luego de
comenzado, y los oidores de la real audiencia y su casa medio desnudo a mucha priesa y llegando
algunos vecinos de cuenta decían, que no convenía a la iglesia que estaba algo fuera de la conversación
que se hiciese la dicha jornada, ni se hiciese junta del pueblo, los soldados arriba dichos estaban
de gentes en tal coyuntura. Estando los negocios escondidos con arcabuces y lanzas, y cogieron al
en estos términos medio suspensos, vino otra nueva clérigo dentro de la iglesia, y el gobemador que lo
de España que D. Diego de Azevedo había muerto estaba mirando encubiertamente, y el clérigo con
en Sevilla estando para embarcarse a servir su plaza temor que le matarían le hicieron firmar una libranza
de virrey, y con esta nueva el Marqués tornó a de dos mil pesos que ellos traían hecha para un
favorecer al dicho Ursua más que antes, aunque en mercader, en cuyo poder el clérigo tenía sus dineros
ésto no faltaron mordaces y maliciosos porque se y así desnudo como estaba, sin le dejar volver a su
dijo públicamente que el Marqués de Cañete casa ni hablar con nadie le hicieron subir en un
teniendo recelo de la cuenta que le venían a tomar, caballo y aquella noche contra su voluntad le llevaron
y que también enojado y afrentado de que su a los Motilones y allí le hicieron dar todo lo demás
Majestad en tan poco tiempo le removía el cargo, que le quedaba, que serían otros tres mil pesos. Este
quería en achaque de hacer la jornada juntar gente clérigo, según era fama, había hurtado toda esta
para alzarse con el Perú contra Su Majestad, y tener hacienda a su cuerpo, tratando mal su persona así
a Pedro de Ursua que era hechura suya por su en el comer como en el vestir por ahorrarlo, y así
capitán, para que acabada de juntar gente revolviese permitió Dios se perdesen los dineros y él murió
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 37

en la jornada laceradamente y el gobernador y todos cuatro con él, y sin dejarlo menear le quitaron las
los que hicieron la fuerza murieron a cuchillo sin armas, y el Diego de Frias mandó a un negro suyo
que ninguno saliese vivo de la jornada, que fue que venía con ellos que le diese garrote y así le
permisión de Dios. Hecho esto, el gobernador y sus ahogaron y le cortaron la cabeza, y venida la canoa
amigos echaron fama que el clérigo los había se pasaron a la otra banda y se pusieron en arma
ordenado le hiciera aquella fuerza porque no le con la gente, haciéndoles entender que el gobernador
tuviese a mal su prelado haber dejado el cargo que Pedro de Ursua los había mandado que matasen al
tenía sin su licencia y el pueblo sin sacerdote que Pedro Ramiro porque se queria alzar con las gentes
administrase los sacramentos. y el gobernador fue luego avisado deste suceso por
el mozo de Ramiro que huyó viendo muerto a su amo,
Partida del Gobernador de Moyobamba y también los dichos caudillos enviaron un mensajero
Partió el gobernador de Moyobamba para el amigo suyo al gobernador, porque supiese lo que
pueblo de Santa Cruz, que es en los Motilones, y pasaba, y no le enviaron a decir que lo habían muerto,
llegado allá, mientras se aderezaba la partida, sino que lo tenían preso porque iba alzado con la
porque había mucha gente y en el dicho pueblo no gente que se le había encomendado; pero como ya el
se podían todos sustentar, determinó de enviar gobernador estaba informado del caso por el mozo,
cuarenta o cincuenta soldados para que se sacó también el mensajero lo que había y sabiendo
entretuviesen en unos pueblos de indios Motilones del dicho mensajero que los dichos estaban en arma
que llaman los Tabalecos, y con esta gente dos se partió con gran brevedad solo para donde estaba
caudillos, el uno llamado Diego de Frias, criado del la gente y llegado que fue, los aseguró con buenas
virrey del Perú y muy su privado a quien enviaba palabras y halagos y desta suerte prendió a todos
por tesorero de la jornada, y al otro Francisco Díaz los cuatro que habían sido en la muerte del capitán
de Arles, de la tierra del gobernador y muy su amigo, Pedro Ramiro, y luego los llevó al pueblo de Santa
y mandó al capitán Pedro Ramiro su teniente y Cruz a donde guardándoles todos sus términos los
corregidor del dicho pueblo de Santa Cruz que como sentenció a muerte, forzando harto su voluntad por
hombre práctico en la tierra, y a quien los indios guardar justicia y sin admitir la apelación les cortó
tenían temor y respeto, fuere con ellos, y dándoles las cabezas. Fue este negocio de importancia, con
la orden de lo que habían de hacer, los dejase en los que el gobemador se acabó de acreditar con el virrey
dichos pueblos y se volviese. Y desto se corrieron y los oidores. Y sabido por todo el Perú este suceso,
mucho los caudillos de ser mandados por el Pedro los vecinos y más gente que tenían sospecha que el
Ramiro, y se volvieron los dos solos dejándole a él gobemador se queria alzar, como se ha dicho, la
en el camino con la gente; y también entre estos perdieron del todo y se aseguraron con esto que hizo;
dos que he dicho y el Pedro Ramiro había grandes y no dejó de haber pronósticos de algunas personas
enemistades, y la principal causa era todo envidia que dijeron que la dicha jornada no había de acabar
de ver al dicho Pedro Ramiro teniente general de la en bien pues comenzaba con sangre, y así sucedió
dicha armada, porque cada uno de los dichos como se verá adelante.
pretendia para sí el dicho cargo; y más que se Después deste suceso vinieron a donde
entendía que el dicho Pedro Ramiro dejaba el pueblo Motilones cuarenta soldados a juntarse con el
de Santa Cruz y se iba a la jornada con el gobernador gobernador Pedro de Ursua, a los cuales un
y llevaba el dicho cargo de teniente; y volviéndose gobernador, que se llamaba Juan de Salinas, que
los dos Caudillos, en el camino encontraron dos
pretendía hacer esta misma jornada, había dejado
soldados amigos suyos, el uno llamado Grijota y el
en cierta provincia para que allí le aguardasen, que
otro Fulano Martín, a los cuales dijeron los dichos
iba por más gente y sabiendo los soldados que el
caudillos entendían que Pedro Ramiro iba alzado
gobernador Ursua hacía la dicha jornada y no Juan
con la gente que llevaba a su cargo, y que quería
de Salinas, le vinieron a buscar muy lejos por este
meterse con ella la tierra a dentro a poblar una
rio de los Motilones arriba, hasta que toparon su
provincia que tenía noticia, y que harían servicio al
astillero; y con ellos y con los vecinos del pueblo de
Rey y al gobernador emprenderlo, y que si ellos les
Santa Cruz que se despobló y todos fueron a dicha
ayudaban, que volverían a procurarlo; los cuales
dichos dos soldados inducidos por los dos caudillos jornada. Juntó el gobernador Pedro de Ursua
y entendiendo que trataban verdad se profirieron trescientos hombres bien aderezados de todo lo
de ayudarlos, y dando la vuelta todos cuatro para necesario, con otros tantos caballos y algunos
donde estaba el capitán Ramiro con la gente, negros y otro mucho servicio de naturales, y cien
hallaron el aparejo confor me a sus dañadas arcabuceros y cuarenta ballesteros y mucha
voluntades, porque el Pedro Ramiro estaba solo a munición de pólvora y plomo, salitre y azufre. En
la barranca de un río, y toda la gente de la otra este tiempo vino a donde Motilones una Da. Inés
parte que habían pasado el río dos a dos y tres a moza y muy hermosa, la cual era amiga del
tres en una canoa pequeña, y el Pedro Ramiro se gobernador, y venía para irse con él a la dicha
había quedado a la postre solo con un mozo y estaba jornada, bien contra la opinión de los amigos del
aguardando a que volviese la canoa para pasar el gobernador que se lo estorbaban, y él lo hizo contra
río. A este tiempo, llegaron los dos caudillos con los la voluntad de todos, de lo cual pesó a la mayor
dos soldados, y haciendo acatamiento al capitán parte del campo, lo uno por el mal ejemplo y lo otro
estuvieron hablando los cuatro un rato y se sentaron porque se decía que la dicha Da. Inés tenía mala
todos en buena conversación, asegurando al dicho fama y peores hechos y mañas, la cual fue la causa
capitán con palabras amorosas, y estando así principal de la muerte del gobernador y de nuestra
hablando con él, a poco rato se abrazaron todos total destrucción.
38 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

Entretanto que el dicho gobernador andaba mucha comida, en especial de maíz y tomando
por el Perú juntando gente y aderezando lo que le muchas canoas que halló y algunos indios para
faltaba para el aviamiento de su jornada, la gente servicio, cargó todas las canoas de maíz y se volvió
de la mar y oficiales que habemos dicho que dejó en a la boca del río a donde había dejado al caudillo y
su astillero, hicieron once navíos grandes y al bergantín con la demás gente, y los halló muy
pequeños, y entre ellos había un género de barcas fatigados de hambre, tanto que se habían muerto
muy anchas y planudas, que llaman Chatas, que tres españoles y algunas piezas del servicio, y con
en cada una cabían a treinta y a cuarenta caballos, su venida se remediaron todos y allí esperaron al
y en las proas y en las popas mucho hato y gente. gobernador, el cual había quedado con lo restante
Todos estos navíos que digo, o por lo mucho que el de la gente en los Motilones, y recogiéndola al
gobernador se tardó; o por la ruín maña que se astillero, allí se detuvo más de lo que pensó por
dieron los oficiales y los que allí quedaron, o que la causa de que las barcas se quebraron y hubieron
tierra es muy lluviosa, se pudrieron de suerte que de hacer gran cantidad de balsas y una canoa grande
cuando los echaron al río se quebraron los más de con tres chatas que habían quedado y un bergantin
ellos, que solamente quedaron dos bergantines y nos hicimos y echamos el río abajo harto
tres chatas, y estos tan mal acondicionados que al descontentas por dejar los caballos y mucha ropa y
tiempo que los comenzaron a cargar se abrían y ganados y otras cosas que hacían mucho al caso,
quedaban dentro del agua, de manera que no los que por falta de las barcas no se pudieron llevar, y
echaron casi carga, y en sóla una chata la más recia con harto riesgo de nuestras vidas por ser el río
se pudieron llevar hasta veintisiete caballos, y todos muy poderoso en demasía y los navios que
los demás que fueron muchos, se quedaron en una llevábamos están quebrados y podridos y al tiempo
montaña perdidos. de la partida hubo algunos motines, dejando aparte
Llegado que fue al astillero el gobernador, que se quisieron volver al Perú, y entendiendo el
gobernador ésto prendió algunos de ellos y con otros
porque allí no había comida, y lo que se podía traer
disimuló, y sin que nadie se le huyese se embarcó
del pueblo de Santa Cruz y provincia de los
el 26 de septiembre de 1560.
Motilones era poco, porque con la mucha gente
estaba muy disipado, en el término de tres meses Embarcado el dicho gobernador con su gente,
antes de la partida de dicho gobernador; fue D. Juan el mismo día se echó el río abajo y comenzó a navegar
de Vargas su capitán con cien hombres en un y pasando un raudal grande en unos remansos que
bergantín y algunas balsas a un rio llamado Cocama, estaban un cuarto de legua del astillero, paró aquel
que se junta con este otro de los Motilones, el cual día para embarcar los caballos, y otro día por la
había descubierto Juan de Salinas y sabía que había mañana se partió, y pisando otros raudales y
en él mucha gente y comida, y le mandó que fuese remolinos, este día dió atrás toda la serranía y
cordilleras del Perú y se metió en la tierra llana,
arriba por él hasta la población y trajése la más
que duró casi hasta la mar del norte. otro dia por la
comida y canoas que pudiese, y porque hay mucha
mañana dio el bergantín que llevábamos en un bajo
población y también gran despoblado, y estos cien
y del golpe se le saltó un pedazo de quilla, y aunque
hombres que se adelantaban pudiesen llevar
el gobernador le vio quedar en seco, no por eso se
comida, que no la tenían, envió adelante del dicho detuvo a hacerle sacar ni socorrerle, antes caminó
D. Juan los treinta dellos en balsas, y en una canoa con la restante de la gente hasta llegar a los
grande con un caudillo y paniaguado suyo, llamado Caperuzos, donde había enviado adelante con cierta
García de Arce, a una provincia llamada los gente en canoas y balsas a un Lorenzo de Salduendo
Caperuzos, porque los indios de aquella tierra traen para que allí buscase alguna comida, que iba el
una manera de bonetes, que estará como veinte armada con gran necesidad de ella, y repartiendo
leguas del dicho astillero, porque en esta provincia la que allí hubo, que fue bien poca, esperó al
buscase comida, y con la que él hallase y el dicho bergantín. Los que en él venían se dieron tan buena
D. Juan de Vargas se podría aviar para algunos días; maña, que tapando ei agujero con mantas y lana,
pero el García de Arce, o que no halló comida en en dos dias con harto trabajo se juntaron con el
aquella provincia o como otros quisieron decir por gobernador y se detuvo allí la armada otros dos dias
no ir con el dicho Capitán D. Juan de Vargas y hacer adobando el bergantín y adobado le enviaron delante
cabeza de luego, sin aguardar en la dicha provincia, a la ligera con gente y por caudillo a un Pedro Alonso
ni en la boca del río Cocama como se habían Galeán a la boca de Cocama, para que diese aviso a
concertado, se echó el río abajo con los treinta D. Juan de Vargas de nuestra venida, porque la
soldados que llevaba y pasaron mas de trescientas mucha tardanza que habíamos hecho no diese
leguas de despoblado hasta llegar a una isla ocasión al dicho D. Juan y a los que con él habían
poblada, a la cual nosotros españoles la nombramos ido, hiciesen alguna cosa pareciéndoles que ya no
la isla de García de Arce por haberla él descubierto. iríamos, como lo pensaron.
Partió el dicho D. Juan de Vargas con el resto Partidos desta provincia de los Caperuzos
de la gente, que fueron sesenta soldados a principio fuimos sin ningún contraste desembarcando y
de julio del año 1560 y no hallando al García de durmiendo todas las noches en tierra hasta llegar
Arce en los Caperuzos, pasó hasta llegar al río de a la junta de un río que se junta con este otro de
Cocama, y dejando alguna gente de la que llevaba los Motilones que entra a la mano izquierda que
en la boca del río en guarda del bergantín y con un llamamos ei río de Bracarmonos porque pasa al
caudillo llamado Gonzalo Duarte, tomando la gente Perú por una provincia deste nombre. Es dos veces
más recta que tenía subieron veintidós jornadas, al mayor al parecer que el de los Motilones, juntase
cabo de las cuales toparon población y hallaron 120 leguas del astillero; nace este rio del Perú de
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 39

la misma provincia de Guanuco, viene cerca del comparación de lo que es, y aún mayor que todos
nacimiento deste otro de los Motilones, pasa este juntos estos otros. A mi parecer juntos estos tres
rio por Guanuco el viejo y de ahí va cada vez ríos tan poderosos con otros muchos pequeños y
haciéndose mayor por entre Cajamarca y arroyos y esteros que no cuento, hacen de aquí
Chachapoyas, y de ahí a los Bracamonos, júntase para abajo uno tan grande que no creo que pueda
aquí que será más de trescientas leguas de su haber otro tan grande en el mundo; extiéndese y
nacimiento. En las juntas deste río se detuvo el hace muchos brazos, hay en el de verano grandes
gobernador dos días y envió por él arriba a buscar playas en que se hallan muchos huevos de
en canoas población y comida, y no la halló. Partidos tortugas, hicoteas, lagartos y pájaros de los que
de las juntas destos sin acaecer cosa que de contar dijimos arriba, que al tiempo que son nuevos se
sea, llegamos a las juntas del otro río que viene sobre cogen a mano. En la junta deste río Cocama se
mano derecha que se llama de Cocama del nombre detuvo el gobernador ocho días con toda la armada,
de otra provincia por donde pasa, estará como aquí se reformó algo la gente que venía fatigada de
ochenta leguas de las juntas de Bracamonos, en la hambr e con la poca comida que quedaba;
boca deste rio hallamos a D. Juan de Vargas que quedaronse aquí muchas balsas de las que
habemos dicho vino delante con los 60 hombres a traíamos arriba dichas, porque no caminaban tanto
buscar comida, donde habían estado dos meses, como los barcos, y los que los traían tomaron allí
esperando al gobernador, y en este tiempo se comió mucha comida de la que tenía D. Juan de Vargas
la gente que allí estaba la mayor parte de la comida de lo que había traído de Cocama.
que habian traido de arriba de la dicha provincia de
Partió la armada de la boca deste río y al salir
Cocama y urdieron ciertos motines contra el dicho
della se quebró y anegó el bergantín en que había
D. Juan, unos decían que le qucrían matar y otros
venido delante el dicho D. Juan de Vargas, y apenas
que no sino dejarlo allí y salirse al Perú, que fuese
dió lugar a la gente que venía dentro para tomar
lo uno o lo otro o cualquicra de las dos cosas, con la
venida del gobernador y de la armada cesó todo, y tierra, y a fuerza de remos la tomaron, y volvieron
la gente unos con otros se alegraron y regocijaron muchas canoas que iban delante, y en ellas se
aunque no sin algún pesar de no saber nuevas de embarcó la gente y hato del bergantín, y él quedó
García de Arce que se había ido el río arriba con los allí anegado hecho pedazos, desde aquí caminó la
treinta hombres. Aqui se repartió la comida que allí armada cinco o seis días río abajo por los brazos de
había, a unos cupo mucho a otros poco, como por la mano derecha, parando todos los días a hora de
la mayor parte suele acaecer en semejantes vísperas o poco más tarde, y la gente saltaba en
repartimientos. Díjose que el gobernador y su amiga tierra a mariscar y buscar de comer y dormir los
Da. Inés y el D. Juan de Vargas tomaron tanto para que querían. A cabo deste tiempo un dia a medio
ellos solos como dieron a todos los demás de campo. día dimos de repente sobre unos indios que estaban
Este río de Cocama es muy caudaloso y es poco pescando en una playa despoblada con sus canoas
menos que el de Bracamonos y mayor de todo que y tenían tomadas más de cien tortugas grandes y
el de los Motilones, tiene mucho pescado de llegados muchos huevos dellas, y desque nos vieron
diferente clase y mucha tortuga, y en su playa hay se huyeron por el río con sus canoas y dejaron la
mucha cantidad de huevos de ésta, y en la misma presa. Aquí paró la armada y se repartieron las
playa se toma mucha cantidad de pájaros del tortugas y huevos entre todos. Partidos desta playa
tamaño de palominos que son muy gordos y hallamos otro río grande del tamaño al parecer del
sabrosos; nace este río de los reinos del Perú; cuales de los Motilones, viene de la mano izquierda, creyose
sean sus nacimientos, hay diferentes opiniones que era este río el de la canela por donde vino el
porque unos dicen ser Purima, Mancay y Yucay con Capitán Orellana, que nace del Perú de las espaldas
los ríos de Bilcar y Parios y Jaujas y otros muchos de Limbo de los Quijos, desde a dos o tres días
que con ellos se juntan. Y mi opinión y de otros es partimos de la junta deste río y dimos en una isla
que éste sea un rio grande que nace de las espaldas poblada de indios que fue la primera población que
de Chinchacocha en la misma provincia de en todo el río topamos desde los Caperuzos que había
Guanuco que pasa por los asientos o pueblos que más de trescientas leguas todas despobladas; en esta
llaman Pabeartambo y Guacabamba, junto con los isla hallamos a García de Arce que habemos dicho
ríos que parten de Tajamay, con otros muchos que atrás, el cual y los que con él venían pasaron gran
salen de los montes de aquellas comarcas y con necesidad y hambre por el gran despoblado que
los que vio y pasó el gobernador Gómez Arias en lo pasaron, y su principal mantenimiento fueron
que llaman de Ruparipa, y oso decir esto porque lagartos del água que mataba con la escopeta el dicho
he visto y pasado la una y otra tierra, y porque García de Arce que era maravilloso arcabucero;
estos ríos que digo con unos muchos que de razón perdieron dos hombres en el camino que salieron a
se han de juntar con ellos, bastan a hacer este río buscar comida y no parecieron, creyose que se
de Cocama y aún otro más poderoso y si fueran perdieron con la aspereza de la montaña y no supieron
Purima y Mancay con los demás arriba dichos que atinar a donde habian salido. Hallamos al dicho García
forzosamente se han de juntar todos en este río de de Arce y sus compañeros hechos fuertes en su
Cocama con los de Ruparipa, porque antes deste palenque que habían hecho delante de la puerta de
río de Cocama no hay otro ninguno que entre en el los bohíos por temor de los indios, que cada día les
de los Motilones que se pueda pensar que sean los venian a dar guerra, que sino fuera por el García de
de Ruparipa juntos por si fuera más poderoso sin Arce que con la escopeta les hacía gran daño
40 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

los hubieran muerto, y se dijo que en una guasábara los que viniesen los encaminasen a él, que él partiría
que los indios los dieron que los tenían en gran lo que trujesen con todos y así se hizo. Llámase
estrecho; el dicho García de Arce echó en su escopeta este pueblo Casari donde nos pusimos nombre a
dos pelotas ácidas con alambre, y de aquel tiro sólo toda la provincia. Deste pueblo abajo nos
de seis indios que venían en una canoa, mató los comenzaron a salir muchas canoas con comida,
cinco y hizo otros maravillosos tiros, con que se libró tortugas y pescados y otras cosas, y andaban entre
a sí y a sus compañeros. Estaban con tanto temor nosotros, pero algunos no osábamos rescatar con
de los indios, que viniendo un día de paz los indios, ellos, porque el gobernador lo había así mandado
pensando los nuestros que era cautela y que venían no sé a qué efecto, pero algunos secretamente los
a matarlos, por atemorizar a los indios, mataron rescataban y aún se lo tomaban sin rescate. Todos
dentro de un bohío más de 40 dellos a estocadas los pueblos que topábamos estaban sin gente, y los
por consejo y mandado del dicho García de Arce indios andaban huyendo por temor de nuestra
según se dijo. A esta isla llamamos la isla de García gente. En esta provincia prendió el gobernador a
de Arce estaria más de cien leguas de la boca de un Alonso de Montoya, y aun le echó en una collera,
Cocama y cerca del río que nosotros pensamos que porque dicen, y fue cierto, que él y otros querían
era el de la Canela. Había en estos pueblos treinta huir en canoas y volverse al Perú, que había al pie
casas o más. Los indios desta isla son bien agestados de quinientas leguas que navegar por el río arriba,
y dispuestos, andan vestidos de camisotas de pincel y fuera más acertado matarlo, como lo merecía por
labradas, las casas son cuadradas y grandes, sus éste y otros motines en que se había hallado, y por
armas son una manera de varas con puntas de odio que tenía al gobernador fue después el principal
palmar del tamaño de los dardos de Vizcaya, tíranlas hurdidor de su muerte, como adelante se verá. Tuvo
con una manera de brincos de palo que las hay en en ésto la condición el gobernador más que buena,
la mayor parte de las Índias, y las llaman atiraderas que no sólo no castigó a los que lo merecían, pero
de estoligue; al cacique desta isla llaman en su ni se halló que a ninguno de sus soldados dijese
lenguaje el Papá. Aquí comenzamos a hallar palabra fea ni de afrenta.
mosquitos zancudos aunque pocos; la comida En esta provincia de Casari determinó el
destos indios es algún maíz, y mucha yuca dulce y gobernador descubrir si en la tierra a dentro había
batatas; tienen matacas, que es yuca rallada, en algunos caminos o población; y haciendo alto en
hoyos debajo de la tierra a podrir, y dello hacen pan un pueblo, envió a un Pedro Alonso con cierta gente
y cierto brebage; todos sus tratos y caminos son a descubrir, el cual fue por un estero y allí tomó un
por el río en canoas. En esta isla se detuvo la armada camino en una montaña, y andando por él adentro
ocho días, aquí se desembarcaron los caballos que topó unos indios cargados con cavi y otras cosas,
desde el astillero no habían saltado en tierras y los cuales como vieron a los españoles se huyeron
habíanse muerto hasta allí dos o tres dellos. Desde todos, que no pudieron coger más que una india,
aquí envió el gobernador a descubrir y tomar que por señas les dijo que su pueblo estaría de allí
algunas guías y lenguas, y no se halló ni tomó nada. cinco días de camino, y porque se les acababa el
En esta isla se nos quedó anegada una de las tres término que el gobernador les había dado para ir y
chatas que traíamos que estaba ya perdida y volver, y porque ellos no tuvieron gana, volvieron
quebrada; aquí hizo el gobernador su teniente sin descubrir más, trayendo consigo la india, que
general a D. Juan de Vargas y a D. Fernando de era diferente en traje y lengua de la desta provincia.
Guzmán su alferez general. Partiose el gobernador Fue parecer de algunos que se acertaría en volver
desta isla de García de Arce por el brazo de la mano con aquella india a ver aquella tierra que ella decía,
derecha arrimado a la tierra firme; halló otras pero el gobernador no quiso detenerse, porque
muchas islas y pueblos sin gente, que con temor de llevábamos los navíos mal acondicionados y aún
dicho García de Arce y de la armada se habían huido, quebrados, y la principal noticia era Amagua donde
donde solamente hallábamos las sementeras de pensaba parar y porque no le faltaren los navíos
yuca y batatas, que todo lo demás estaba alzado; antes de llegar a ellos. Otro día nos venían muchos
hallándose algunas gallinas y gallos de cresta blanca indios en canoas, que como el gobernador había
y algunas guacamayas y papagayos blancos. Dimos dado a los primeros rescates, y no les habían hecho
en un pueblo el primero que topamos en la tierra daño, unos a otros se convocaban y venían a vernos
firme sobre mano derecha donde empezamos a ver y rescatar con nosotr os, aunque si no era
algunos indios por el río en canoas, que escondidamente no osábamos rescatar con ellos,
recatadamente nos venían desde lejos a mirar. En por lo que había mandado el gobernador, aunque
este pueblo nos vino a ver un cacique de paz con también disimulaba cuando sabía que algunos
algunos indios y trujo algunos pescados y tortugas; soldados habían rescatado. De aquí pasamos a otra
el gobernador les dio en recompensa dello alguna provincia que llamamos Maricuri del nombre de
chaquira y cuchillos por contentarles y traer de paz; otro pueblo: es toda una gente y un traje y ropa y
fuese luego y tras él vinieron luego otros indios y lengua y unas mismas casas y armas. Son todos
así mismo traían pescados y tortugas; a todos los estos indios amigos y confederados, y a mi me
indios que venían de paz daba el gobernador rescate parece que es toda una província y no dos, porque
de cuchillos y cuentas: mandó el gobernador que a toda la población va trabada sin que haya división
ningún indio de los que viniesen nadie les tomasen y que Casasi y Masicusi sean nombres de pueblos
ni rescatase nada de lo que traían, sino que a todos y no de provincias. Duró la población destas
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 41

Figura 4.1. Jacarés (apud Brehm)


42 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

provincias desde la isla de García de Arce hasta el arcabuceros y rodeleros que ninguno tirase sin
cabo de la que llamamos Manicari más de 190 su mandado, y él iba de delante de todos llamando
leguas, los pueblos todos en la barranca del río, sin a los indios con un paño blanco en una vara,
que se viese adentro más población, y por la mayor señalando que lo cogiesen, y el cacique deste
pequeños y desviados unos de otros a diez y a quince pueblo se llegó y tomó el paño y muy
leguas, poco más o menos. Los indios desta admirablemente se metió entre nuestra gente, y
provincia traen algunas joyas de oro fino, aunque algunos otros indios con él, y todos los demás
pequeñas, como son orejeras y caracusis en las indios se desviaron a un parte, y hechos una
narices y orejas; la gente destas províncias no es manera de escuadrón con sus armas en la mano
mucha según buena conjetura, porque en las se estuvieron un gran rato en una placeta hasta
poblaciones que nosotros vimos podrá haber como que llegó toda la armada; pidióle el gobernador
siete u ocho mil indios o diez mil a lo largo, que que nos diese una parte del pueblo con la comida
bien poca para tan larga tierra y tan mala. Hay en para nosotros y que en lo demás estuviesen ellos
esta provincia muchas frutas de la tierra buenas y con sus mujeres y hijos, que no les enojarían en
sabrosas, y muchos mosquitos de unos y de otros; nada. Aposentose toda la armada en el comedio
aquí se nos anegó el bergantín que nos había del pueblo a donde el gobernador les señaló,
quedado y nos quedaron solas las dos chatas. mandoles que no pasase nadie de allí, ni fuesen a
las casas de los indios a cosa ninguna. Había en
Pasada esta provincia que habemos dicho,
este pueblo, según se dijo, más de seis mil
dimos sin saberlo en un despoblado que nos duró
tortugas grandes que los indios tenían para su
nueve dias, a donde pasamos gran necesidad por
comer encerradas en unas lagunetas hechas a
no venir proveídos de comida; y la pasáramos mayor
mano, llenas de agua y cercadas a la redonda con
sino que Dios nos proveyó de mucho pescado que
un cerco de varas gruesas, porque no se pudiesen
se pescaba en el río con anzuelos, que alcanzaban
salir, y a la puerta de cada bohio había dos o tres
la mayor parte del campo. Fue ése un gran descuido
lagunetas llenas de las dichas tortugas. Hallose
del Gobernador y de los demás que mandaban en
gran cantidad de maíz recogido en los bohíos, y
el campo, por no examinar cada día las leguas y
en el campo había infinitas sementeras, yuca
guías hubo este devenido, que a durar más el
brava y otras comidas. Los indios no curando de
despoblado nos pudiéramos quedar burlados,
la seguridad que el gobernador les había dado
porque la pesquería duró poco y entramos en él
empezaron a poner en cobro sus comidas, así de
desproveídos de comida, que se pudiera traer mucha
las tortugas como del maíz de aquella parte del
de arriba si lo entendiéramos, y hubo algunos que
pueblo que se les había dejado para ellos, y llevarlo
no tuvieron que comer otra cosa sino verdolagas y
en canoas a esconder, lo cual visto por la gente
algunos bledos que se hallaban en la playa y pocos,
del campo empezaron también a ir a sus estancias
y no pudieron dejar de morir algunos en este
a traer la comida que hallaban, aunque contra la
despoblado. Hallamos otras dos bocas de ríos
voluntad del gobernador que se lo estorbaba, y
grandes, y no muy desviados el uno del otro;
sobre ello hechó presas algunos soldados y
conociose claro en que venían turbios y crecidos,
mestizos, y entre ellos a un criado de
que tenían cerca sus nacimientos, venían de la mano
D. Fernando de Guzmán, su alferez general, por
derecha, traían sus barrancas muy altas y bermejas,
lo cual dejaron de recoger más comida, y los indios
y el gobernador por la necesidad que llevaba de
acabaron de llevar toda la que quedó, que fue
comida no se quiso detener en ellos. Pasados estos
mucha; pero en lo que nos quedó, si se pusiera,
nueve días de despoblados, fue Dios servido que
buena orden y regla, había para muchos días, mas
dimos en un pueblo de indios, tal cual convenía
la gente sin orden lo desperdició y gastó muy
para remediar la mucha necesidad que traíamos;
presto, porque con mucha manteca y huevos de
este pueblo llamamos Machifaro, es pueblo grande
las tortugas y con la carne dellas y mucho maíz
el mayor que hasta allí habíamos visto, está sentado
que había, comían ordinariamente buñuelos y
sobre una barranca muy alta del río. Los indios deste
pasteles y muchos géneros de cazuelas y de
pueblo son de mediana disposición, andan desnudos
potajes y más era lo que se desperdiciaba que lo
del todo; sus armas son tiraderas de estolique, como
que comían, y hacían vino de maíz que bebían
las de arriba; son enemigos uno de otros y tienen
con que dieron presto cuenta de todo. Al
guerra con ellos; las casas son redondas y de vara
gobernador le pesó después por la mala orden que
en tierra, cubiertas de hoja de palma hasta el suelo
hubo, y al que primero faltó fue a él, y después lo
con cada dos puertas pequeñas; cogimos los de
andaba pidiendo a los que lo tenían.
repente y sin que hubiesen sabido de nosotros, pero
cuando nos vieron se apercibieron de guerra para En este pueblo nos detuvimos veinte y tantos
pelear, y echaron fuera sus mujeres, hijos y gente dias: tuvimos en él la Pasqua de navidad; envió
menuda, que no era para pelear, en canoas por el desde aquí el gobernador a descubrir a Pedro
río para más asegurarlos y nos esperaron en el Alonso, el cual fue con ciertas personas en canoas
pueblo de guerra lista 300 ó 400 indios. Llegó el por un estero de aguas negras, no de muy gran
gobernador en la delantera con un arcabuz en la boca que entra en el río; junto a este pueblo de
mano y con él otros arcabuceros y rodeleros, y aun sobre la mano derecha halló dentro una laguna
que pocos, los índios hicieron rostro a manera que tan grande y temerosa que les puso espanto,
los querían acometer al subir una barranca, pero el metiéronse tan a dentro por ella que por poco se
gobernador tubo gran sufrimiento, y mandó a los perdieran que no acertaban a salir, no vieron el fin
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 43

de ella ni hallaron nada. Acaeció en ese pueblo que falsa relación y mentían en toda la noticia que nos
los indios de la provincia de arriba, que son habían dado, porque habíamos andado por el río
enemigos y tienen guerra unos con otros, vinieron casi 700 leguas sin ver cosas de las que nos habían
hasta doscientos dellos bien apercibidos de guerra dicho, y asimesmo iba con nosotros uno de los
en 17 canoas a hacer salto en los deste pueblo, y soldados que habian bajado por el dicho río con el
castigarlos con cautiverio como entre ellos se capitán Orellana el cual no conoció la tierra y
acostumbra, y una noche sin ser sentidos dieron desatinaba la gente de la armada y la mayor parte
sobre este pueblo donde nosotros estábamos, que della desconfiaban de la noticia teniendo por burla
es el primero desta provincia de Machifaro, y como la jornada, y deseaban volver al Perú y decían que
nos reconocieron no se atrevieron a saltar en tierra no había más que buscar; lo cual entendido por el
por nuestro temor, y desde el río ya casi gobernador dijo que no pensase nadie tal, que los
amaneciendo nos dieron alborada con sus bocinas que entonces eran muchachos se habían de
y flautas y otros instrumentos de guerra, y en orden envejecer buscando la tierra y en esto mostró valor
se empezaron a volver por el río arriba hacia su y constancia, si en lo demás se supiera gobernar y
tierra sin que hubiesen hecho daño ninguno, pero guardar de sus enemigos, pues le avisaban y
antes que se fuesen el cacique deste pueblo de avisaron que pusiese guarda en su persona, no
Machifaro vino a muy gran priesa a demandar porque nadie de los que le aconsejaban supiese cosa
socorro al gobernador contra aquellos indios, cierta de motín, más de que conjeturaban lo que
diciendo que eran sus enemigos y muy valientes, y podía acaecer, y a esta razón el gobernador iba mal
que los venían a matar y destruir, y que les diese quisto con la mayor parte del campo, que eran ruínes
algunos cristianos que le ayudasen contra ellos, y y mal intencionados, porque no les dejaba robar y
el gobernador por contentarle envió a D. Juan de atar indios, ranchearles y matarlos a diestro y
Vargas su teniente con 50 hombres, los más siniestro, y decían que ya desde entonces tenía la
arcabuceros, en su ayuda, y atajándolos, que se residencia y también Da. Inés su amiga, quisieron
volvían por un estero, los cogieron en medio, los decir que le había hecho mudar la condición y
cuales viendo que no podían huir se apercibieron aunque le había hechizado, porque de muy afable y
de guerra y como vieron los españoles, dicen, que conversable que solía ser con todos, se había vuelto
hicieron señas de paz y no los entendieron o no grave y desabrido y enemigo de toda conversación;
quisieron, y comenzaron a disparar sus arcabuces, comía solo y pesábale que le estuviesen mirando
y los indios amigos que iban con ellos a flechas o comer; no convidaba a nadie; habíase hecho amigo
tirar sus varas, de suerte que a los indios que les de soledad y aun se alojaba siempre solo y apartado
fue forzoso dejar las canoas en que venían y se lo más que podía de la conversación del campo, y
metieron al monte, sin que pudiesen coger más de junto a su alojamiento la dicha Da. Inés, sólo a fin
cuatro o cinco; tomarónles todas las canoas; (según parecía) de que nadie le estorbase sus
entendiose que morirían todos a manos de los de amores y embebecido en ellos parecía que las cosas
Machifaro por estar sin canoas muy lejos de su tierra de la guerra y descubrimiento las tenía muy
y en gran despoblado. olvidadas, cosa cierto, muy contraria de lo que
siempre había hecho y usado. Había en su campo
En este pueblo hizo el gobernador Pedro de
algunos soldados que se habían querido amotinar
Ursua por sola su autoridad provisión y vicario a
para volverse al Perú, como habemos dicho, y
un Clérigo llamado Alonso Henao, diciendo que por
aunque se había probado y habían sido hallados y
el derecho de patronazgo que Su Majestad tiene en
sabido por el dicho gober nador, no fueron
estas partes de las Indias en todas las iglesias y
castigados conforme era razón, porque la pena que
obispados dellas y dignidades y otros benefícios, que
les dió fue hacerles que fuesen remando en el barco
él como su gobernador, y que tenía sus reales
donde iba su amiga, que fuera mejor colgarlos de
poderes, en defecto de prelado, podrá nombrar
un palo, porque tomaron aquello por afrenta ellos
provisor. Y la primera cosa que hizo el Señor provisor
y otros soldados no bien intencionados, que los
y vicario, después de aceptado el cargo, fue
indignaban diciendo que mejor fueran ahorcados
descomulgar al pedimento del gobernador a todos
que hacerles aquella afrenta por donde se
los soldados que le fuesen a cargo alguna cosa, así
comenzaron a hacer algunos borrones y descuidos
de herrarmientas, como de hachas, machetes,
en el campo, y el mayor fue el de su muerte, que
azuelas, barrenas, clavos y otras herramientas, de
aquí se la comenzaron a urdir, hallando los
ganados, cabras, puercos y gallinas y otras cosas,
traidores este aparejo de verlo mal quisto y
que luego lo manifestasen o trujesen ante él, lo cual
descuidado. Juntóse con esto la dañada condición
fue muy mormurado en el campo y a un altercado
de algunos soldados que traían su campo, que eran
entre algunos soldados que presumían de letras,
y habían sido traidores, y se habían hallado en el
diciendo que el gobernador no la pudo hacer, ni el
Perú en muchos motines contra al servicio de Su
Clérigo aceptar el cargo; túvose a gran poquedad y
Majestad: algunos de los cuales habían venido a
decían sus émulos que sólo para este efecto le había
esta jornada huyendo por delitos y traiciones que
nombrado por vicario, y no por otro fin ni provecho
habían cometido y tuvieron por último remedio
de los soldados.
venirse a esta jomada como está dicho, por
Aqui pareció a la mayor parte del campo que desviarse de la justicia que andaba en su busca; y
las guías que llevábamos (que eran ciertos indios otros que deseosos de los dichos motines habían
brasiles de los que arriba hemos dicho) habían dado venido a la dicha jomada, porque públicamente se
44 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

dijo, como hemos dicho, que el dicho gobernador muerto entre unas ollas en que le guisaban de
juntaba gente, no para jornada, sino para alzarse y comer; quisieron decir que el primero que le dio
revolver al Perú por industria del dicho virrey y estas herida y entró delante de todos, fue un Alonso de
tales por desechar de sí el trabajo de la dicha Montoya a quien él había tenido preso dos veces
jornada, entendiendo les había salido al revés su por dos motines que había querido hacer para huirse
bellaco pensamiento, deseosos de volverse al Perú con gente, y se le habían averiguado, y fuera más
andaban buscando e inventando como lo podían acertado haberlo colgado pues lo había merecido.
hacer. Y porque todos éstos que he dicho eran gente Después que hubieron muerto al gobernador, dieron
baja y de poca suerte, y los más oficiales de oficios grandes voces diciendo, libertad, libertad, viva el
bajos, no teniéndose ninguno por suficiente para Rey nuestro señor, muerto es el traidor tirano,
ser capitán y cabeza, a quien la gente obedeciese de queriendo encubrir su traición y maldad con las
buena gana, se concentraron con el D. Fernando voces del Rey, porque no se entendiese hasta tener
de Guzmán, que era alférez de Campo, porque hecho su hecho, y luego parte destos traidores
demás de ser caballero era tenido por virtuoso y fueron a muy gran priesa a matar a D. Juan de
bien quisto entre ellos, y porque no era vicioso ni Vargas, teniente del dicho gobernador, al cual
amigo de su opinión; y pusiéronle por delante la
toparon en el camino que venía al ruido y armado
prisión de un criado suyo mestizo que el gobernador
con un escaupil y su vara en la mano a saber qué
había mandado prender, como se ha dicho arriba,
cosa era aquella, y diciéndole palabras feas le
cosa por cierto bien liviana aunque ellos lo intimaron
quitaron la vara y le mandaron desarmar, y
mucho diciendo que aquella afrenta se había hecho
estándole desarmando, habiéndole quitado la una
al dicho D. Fernando y no a su criado, siendo él
manga del escaupil y estándole quitando la otra,
caballero y alférez general de la jornada y que no
eran hombres los que no sentían estas cosas y con llegó por detrás un Martin Pérez compañero destos
éstas y otras cosas que le dijeron, y la ambición de traidores y le dio una estocada al dicho D. Juan de
mandar, le movieron a que tomase su parecer dellos, Vargas por el lado, que le pasó todo el cuerpo, y
porque le prometieron que sería general y cabeza luego todos los demás le acabaron de matar, y con
de todo el campo, aunque primero que esto hiciesen el mismo apellido y voces, viva el Rey, y libertad, se
procuraron juntar de su bando cincuenta o sesenta fueron otra vez a la posada del gobernador. A las
amigos que fuesen de su opinión, y una noche con voces y ruido acudió mucha gente sin saber lo que
las más armas que pudiesen haber alzarse con los era, y como iban llegando los hacían los tiranos
navíos y canoas y volverse a la mar, y desde allí irse poner en escuadrón; luego se publicó la muerte del
al Perú; pero el tirano Lope de Aguirre y un Lorenzo gobernador y su teniente, sin que ninguno de los
de Salduendo, fueron de parecer que mejor era del campo, fuera de los traidores, supiese quiénes
matar al gobernador y alzarse con todo, y así fueron ni cuantos habían sido en matarle, antes cada uno
todos deste parecer, y que siendo el D. Fernando pensaba en sí, que la mayor parte del campo había
general y cabeza, podrían buscar la tierra y poblarla sido en ello, y cuando se vino a entender ya los
que en eso se hacía servicio a Su Majestad, y por el traidores tenían muchos amigos de su banda, y
gran descuido que el gobernador llevaba en el deseosos de revueltas, como ellos, y de volverse al
descubrimiento, poniendo otras cosas por delante, Perú. Luego parte destos traidores fueron por las
le habían muerto, y con esta entendían los traidores casas y aposentos del campo y hacían venir por
salvarse y así quedó acordado entre ellos. fuerza a toda la gente a el escuadrón, a donde
juntaron casi todo el campo y los desarmaron, y
quisieron matar a algunos amigos y criados del
Muerte del Gobernador Pedro de Ursua
gobernador y paniaguados suyos, y su alférez D.
Desta manera, que habemos dicho, se le Fernando no lo consintió.
comenzó a tratar la muerte al dicho Pedro de Ursua
entre sus mayores amigos y de quien más se fiaba. Aquella noche llamaron a D. Fernando general
Partió el gobernador deste pueblo de Machifaro bien del campo, y a Lope de Aguirre maese de campo, y
descuidado de la traición que le habían ordenado no consintieron que la gente del escuadrón hablase
los tiranos, pasada la pascua de navidad, y fue aquel sino a voces, y así lo mandaron, quisieron matar a
día a otro pueblo desta provincia de donde determinó algunos porque hablaban al oído; y luego sacaron
enviar a un Sancho Pizarro. Estaba este pueblo sin cierto vino que el gobernador tenía guardado para
gente, alzado por temor de nosotros en tierra decir misa y alguna necesidad, y entre ellos y la
adentro, y allí esperó al dicho Sancho Pizarro, y en gente del escuadrón se lo bebieron. Aquella misma
lo que allí nos detuvimos acabaron los conjurados noche enterraron al gobernador y su teniente, ambos
de concertar su maldad, y la efectuaron, porque la en un hoyo, y se estuvieron hasta la mañana en
noche de año nuevo, día de la circuncisión del Señor escuadrón.
y primero del año de 1561, a dos o tres horas de la
noche se juntaron con el dicho D. Fernando hasta Antes de la muerte del gobernador acaecieron
doce destos traidores, dejando prevenidos otros algunas cosas dignas de saber, y fueron que cinco
amigos y secuaces que en oyendo su voz y apellido, días antes que le matasen, un Comendador de San
acudiesen con sus armas y fueron al aposento del Juan llamado Juan Núñez de Guevara, muy su
gobernador, y hallándolo solo, como solía estar, amigo, hombre honrado, persona de crédito y viejo,
acostado en su cama, le dieron muchas estocadas que venía por soldado del campo, dijo que estando
y cuchilladas, y él se levantó y quiso huir y cayó una noche algo tarde paseándose a la puerta de
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 45

un bohío donde él posaba, por causa del calor que hubiera quien se atreviera a matarlo. Lo que el
hacía, vio pasar detrás del bohío del dicho gobernador respondió a esta carta no lo vi ni supe
gobernador, que estaba cerca del suyo, un bulto más, de que solo a uno de los nombrados en ella
como de persona, que dijo en una voz un tanto alta: echó fuera y a los demás llevó consigo, que después
Pedro de Ursua gobernador de Amagua y Dorado, le dieron la muerte, y así mismo este caballero le
Dios te perdone: Y esto sucedió en el pueblo de las escribió otra carta rogándole que porque la ida allá
Tortugas, y luego el dicho comendador fue a gran de Da. Inés era escandalosa, y de que pesaba a todos
priesa a conocer quien había dicho aquello, y dijo sus amigos, le diese convencimiento a que él hiciese
que se le desapareció de delante de los ojos y no vio quedar a la dicha Da. Inés que aún no estaba dentro
nadie, y luego al otro dia comunicó lo suso dicho de los Motilones, y que para esto él se daría buena
con algunos amigos suyos, y echaron sobre ello maña, que ella ni nadie entendiésen que el
algunos juicios y concluyeron que el gobernador gobernador había sido causa de su quedada; que él
estaba en aquella sazón malo, y que podría morir lo tomaba a su cargo, y no quería saber más de que
de aquella enfermedad, y no se lo osaron decir a él no le pesaba dellos. Yo vi así mismo esta carta,
porque no tomase alguna imaginación desto. y el gobernador no respondió a ella, antes envió
Atrévome a escribir esto por tener al dicho persona que llevase a la dicha Da. Inés con la
comendador por hombre de bien, y que diría en esto brevedad posible. Fueron estas dos cosas que si
la verdad, pues no le iba nada en ello. ambas o cualquiera dellas hiciera el gobernador,
Lo otro fue que un negro llamado Juan Primero oso afirmar que nunca sucediera lo que atrás se ha
que era esclavo de Juan Alonso de la Bandera, uno dicho, y la tierra, si alguna hay fuera descubierta, y
de los que fueron en la muerte del gobernador y sus amigos y servidores de su Majestad que allí
aún el más principal, entendió el día que le mataron, íbamos no hubiéramos padecido tantos trabajos, y
el trato, y la maldad que su amo y los demás traían se escusaran tantos daños sucedidos: mas el
y aquella tarde casi noche tres o cuatro veces fue a gobernador con su buen ánimo y condición nunca
avisar al dicho gobernador y le halló encerrado con pensó que había de suceder cosa de las dichas,
Da. Inés, y no pudo dar el aviso; y porque su amo porque bien se puede creer que si lo imaginara
no sintiese en lo que andaba, se volvió y avisó luego pusiera en ello remedio como cristiano, y más
a un negro del gobernador llamado Hernando, al yéndole la vida. Era como he dicho Pedro de Ursua
cual le dijo que lo dijese a su amo, y él se descuidó, natural navarro, y muy caballero, hijo del señor de
o se olvidó, y no se lo dijo, y desde a pocos días de la casa de Ursua, hombre de grande habilidad y
la muerte del gobernador lo supieron los tiranos, y experiencia en los descubrimientos, y entre indios
quisieron matar al dicho Juan Primero negro; y pobló y descubrió en el Nuevo Reyno de Navarra la
porque trabajaba en la obra de los bergantines que ciudad de Pamplona, anduvo en la conquista de los
hicieron no le mataron, diéronle más de 100 azotes Musos y los pobló y anduvo por capitán en la jornada
amarrado a un palo en una plaza delante de todo el de Tairona y en otras jornadas del Nuevo Reyno, y
campo, manifestando a todos la causa porque lo en Nombre de Dios y Panamá le encargó el dicho
azotaban. marqués de Cañete la guerra contra los negros
Acaeció mucho antes desto otra cosa, de lo cimarrones del Bayano que hacían gran daño en
cual como testigo de vista hago afirmación, y fue aquella tierra, lo cual hizo con tanta diligencia, y se
que antes que el gobernador se echase río abajo, dio tan buena maña y solicitud, que mató y destruyó
estando en los Motilones, un caballero muy principal muchos de los dichos negros y los demás dejó tan
del Perú llamado Pedro de Añasco, que había sido escarmentados, que por muchos días no osaron hacer
muchas veces capitán del Rey así contra amotinados más daño en la tierra, y acabada la guerra pasó al
contra su corona real como en descubrimientos, y Perú en fin del año 1558, habiendo entendido el
jornadas de indios, y éste como hombre de marqués de Cañete su suficiencia y habilidad le
experiencia conociendo los ánimos levantados de encargó la dicha jornada de Amagua y Dorado.
algunos soldados del campo del dicho gobernador,
Era Pedro de Ursua mozo de hasta 35 años,
que era muy grande amigo suyo, le escribió una
de mediana disposición y algo delicado, de cuerpo
carta, la cual yo vi, diciéndole que por diez hombres
menos no había de dejar de hacer su jornada, que bien proporcionado para el tamaño de su persona:
le rogaba ahincadamente que no metiese consigo a la cara alegre y hermosa y la barba taheña y bien
ciertos soldados de los que allá tenía; que los echase puesta y poblada, y era gentil hombre de buena
luego fuera, porque le parecía eran bulliciosos y plática y conversación; mostrábase muy afable y
desahogados, y que no convenía que los llevase y compañero de sus soldados: preciábase de andar
que si se le hacía mal echarlos fuera por ser soldados muy pulido y así era en todas sus cosas; parecía
pobres llevando tan rica noticia de la tierra; que los que tenía especial gracia en sus palabras, porque a
enviase a su casa dél, que por entonces él partiría todos los más que comunicaba los atraía a su
la capa con ellos, y que después de descubierta la voluntad; trataba los soldados bien y con mucha
tierra les podría hacer merced, y particularmente crianza. Fue más misericordioso que riguroso en
nombraba a Salduendo y a Lope de Aguirre y a Juan castigar sus excesos: sirvió a Su Majestad bien y
Alonso de la Bandera, y a otros que fueron fielmente, sin que en él se hallase cosa en contrario
principales causadores de su muerte, que si a éstos ni aun en el pensamiento, según lo que dél siempre
hubiera echado fuera, tengo por cierto que no se entendió.
46 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

Mientras tuvo estas condiciones arriba dichas, Galean capitanes de infantería, y Alonso Enríquez
fue siempre bien quisto de todos; pero como dicen de Orellana capitán de munición, Miguel Bobeda
la mucha compañía hace muy daño; dígolo porque almirante de la mar, Diego de Balcazar justicia
después que se juntó con la Da. Inés mudó mayor del campo, el cual al tiempo que le dieron la
costumbres y condición, porque tuvo algunos vicios vara dijo que la tomaba en nombre del Rey D. Felipe
y resabios, y ésto se le habia pegado, según se Nuestro Señor. Aunque esto que dijo supo mal a los
entendió, de la dicha Da. Inés, porque era público tiranos, disimularon con él por entonces porque aún
le tenía hechizado, lo cual ella sabia muy bien, y así no estaban bien declarados contra el real servicio.
se había trocado muy mucho en condición, porque Y desde a dos días vino Sancho Pizarro, que el
de muy franco que era se había hecho codicioso,
gobernador había enviado con gente a descubrir un
aunque cuando era menester era largo en dar y más
camino como se ha dicho, el cual y todos los demás
prometer, y si tenía necesidad de alguno hacíale
que con él fueron venían inocentes, de lo que había
grandes ofertas y promesas, y en alcanzando lo que
pretendía no cumplía su palabra, aunque este vicio pasado en el campo, porque los tiranos tenían
suele ser general en muchos capitanes de Indias. puestas guardas que no le diesen aviso, y llegado el
Si via alguna cosa que le daba a él gusto, que la dicho Pizarro le hicieron los tiranos sargento mayor,
tuviese algún soldado de los suyos, luego se la el cual había hallado en unas montañas unos dos
codiciaba y pedía o trataba ferias y procuraba verla pueblos tierra adentro sin gente y sin comida. Era
por todas vías; aprovechábase sin escrúpulo de lo esta junta la mayor parte de los oficiales y capitanes,
que era de todos, y pesábale que otros se así de los matadores como de los otros. Fueron de
aprovechasen de lo que era suyo, y algunas veces acuerdo y parecer que se debía buscar la tierra y
decía era prestado hasta que lo quisiese pedir, y noticia que Pedro de Ursua traía, y que la debían
que lo que a él le prestaban otros era dado, y con poblar, y que por este servicio Su Majestad
decirlo burlando lo hacía de veras. Fue ingrato en perdonaría a los matadores del gobernador, y que
alguna manera a sus amigos, y que habían hecho para esto debían hacer una información con los más
por él; usaba poca caridad con los enfermos y principales del campo, de cómo el gobernador iba
necesitados; guardaba los enojos y rencores por remiso y descuidado en buscar la tierra, y que no la
mucho tiempo; habíase hecho remiso y descuidado pretendía poblar y buscar, y otras mentiras y
en la buena gobernación y disciplina de su campo y maldades; y que conforme a esto todos los del campo
armada, y mal acondicionado y desabrido, que los diesen su parecer firmado, el cual se guardaría para
que primero le conocíamos, unos con otro, decíamos su descargo cuando fuese tiempo. Y el tirano Lope
que no era posible que fuera Pedro de Ursua, a que
de Aguirre y otros de su opinión, callaron por
no debía de estar en su propio juicio. Finalmente
entonces y no dieron parecer en ello, y los que más
era muy enamorado y dado a mujeres, por donde le
procuraban esto eran el D. Fernando y Alonso de
vino todo su daño. Vivió tres meses y seis dias desde
Montoya, y Juan Alonso de la Bandera. Hecha pues
que se embarcó en su astillero hasta que le mataron.
Enbarcóse a los 26 de setiembre de 1561 años. Los la información, como ellos la quisieron pintar para
que se hallaron aquella noche a matarle a él y a su autorizarlo con las firmas y parecer de todo el campo
teniente D. Juan de Vargas, según lo que se supo, firmó primero D. Fernando de Guzmán ‘general’, y
fueron los siguientes: D. Fernando de Guzmán, Juan el segundo Lope de Aguirre, el cual puso en su firma:
Alonso de la Bandera, Lorenzo de Salduendo, Alonso Lope de Aguirre traidor; y mostrándola a los otros
de Montoya, Miguel Serrano de Cáceres, Pedro de dijo: que qué locura y necedad era aquella de todos,
Miranda (mulato), Pedro Fernández, Martín Pérez, y que si habiendo muerto a un gobernador del Rey,
Diego de Torres, Cristóbal Hernández, Alonso de y que llevaba sus poderes y representaba su
Villena, Juan de Vargas (canario) y el cruel tirano persona, pensaba por aquella vía quitarse de la
Lope de Aguirre cabeza e inventor de maldades. culpa. Y que dado caso que hallasen la tierra y que
fuese mejor que el Perú, el primer Bachiller que a
Pasada aquella noche otro dia por la mañana
ella viniese les cortaría las cabezas a todos: que no
entraron los traidores en consulta con otros muchos
pensasen tal, sino que todos vendiesen antes que
que se babían hecho de su parte, y hicieron más
se las quitasen, que buena tierra era el Perú y buena
capitanes y oficiales de guerra que soldados. D.
jornada, y que allá tenían muchos amigos que los
Fernando de Guzmán era general, Lope de Aguirre
favorecían, y que esto era lo que a todos convenía.
maese de campo, Juan Alonso de la Bandera capitán
A lo cual replicó un Villena alférez general, uno de
de la guardia, Lorenzo de Salduendo y Cristóbal
Hernández y Miguel Serrano capitanes de infantería, los matadores del gobernador, diciendo que Lope
Alonso de Montoya capitán de a caballo y Alonso de de Aguirre decía bien y la verdad, y que no convenía
Villena alférez general, Pedro de Miranda mulato hacer otra cosa y que quien a él le había aconsejado
alguacil mayor, Pedro Hernández pagador mayor. aquello no era su amigo y soldado; a lo cual
Todos estos traidores fueron los que aquella noche respondió Juan Alonso de la Bandera y dijo que
fueron en matar a su gobemador. Fuera destos matar al dicho Gobernador Pedro de Ursua no había
hubo otros que aunque no se hallaron en la muerte, sido traición sino servicio del Rey, porque no quería
se confederaron con los matadores y tomaron ni pretendía descubrir la tierra que venía a buscar,
cargos y oficios en su campo, que fueron Sebastián trayendo tan buena gente, y habiendo gastado tanto
Gómez, piloto, portugués capitán de la mar, y el dinero de sus arcas, y que el que a él le llamase
comendador D. Juan de Guevara, y Pedro Alonso traidor mentía, y que se lo haría bueno, y se metería
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 47

con él, y los de la opinión de Lope de Aguirre hiciesen; en pocos días de más cien canoas que
quisieron responder a esto, pero su general y otros teníamos no nos quedaron veinte y las más ruines.
capitanes se pusieron de por medio y los
En este tiempo por consejo del tirano Lope de
apaciguaron, aunque el Juan Alonso volvió a repetir
Aguirre quiso D. Fernando de Guzmán que todo el
sobre el negocio, por ser buen soldado y brioso; no
campo le tuviese y eligiese por general, y para esto
faltaron malsines que indignaron al Lope de Aguirre
tenían prevenido sus amigos y aliados. Mandó juntar
diciendo la afrenta que se había hecho a él; ya esta
toda la gente del campo en una plaza junto a su
causa de allí adelante procuró la muerte al dicho posada: ya que estaba junta, y el tirano con sus
Juan Alonso con toda instancia, aunque no de amigos, y los de D. Fernando armados, este les hizo
persona a persona, por ser el Juan Alonso muy buen un razonamiento en la forma siguiente.
soldado, y para más que el dicho Aguirre, como lo
pensó lo puso por obra; y estando un día el Juan
Alonso en casa de D. Fernando de Guzmán jugando Razonamiento de D. Fernando de Guzmán
a los naipes, y Cristóbal Fernández con él, que era
Señores: muchos días ha que he deseado tratar
su amigo, el cual juego había ordenado el D.
con vuestras mercedes lo que ahora quiero hacer, y
Fernando a efecto de que se descuidasen y allí los es que yo tengo este cargo de general como vuestras
matasen, porque el traidor de Aguirre había dado mercedes saben, y no sé si contra la voluntad de
parte de la traición, que tenía acordada al dicho D. algunos; para lo cual, y para que entre nosotros
Fernando, y así por contentarlo fue consentidor en haya paz y conformidad, que desde ahora dejo el
la dicha muerte; así, estando descuidados el dicho cargo y me desisto de él, y lo mismo hacen estos
Juan Alonso y su compañero, entraron ciertos señores oficiales, para que vuestras mercedes
amigos del Lope de Aguirre ar mados y con libremente lo den a quienes les pareciere, y que sea
arcabuces, y el D. Fernando tenía prevenidos otros en pro y conformidad de todos.
soldados ocultamente, y el Lope de Aguirre entró
con los que llevaba para el efecto, y entre él y los Y dicho esto hincó en el suelo una partesana
demás mataron al Juan Alonso y un compañero a que tenía en la mano en señal de que se desistía del
estocadas lanzadas y arcabuzazos. Luego quedó cargo, y lo mismo hicieron sus oficiales y luego los
Lope de Aguirre muy contento entendiendo que amigos del dicho D. Fernando, primero, y tras ellos
había hecho una notable hazaña, y el D. Fernando la mayor parte del campo dijeron, que querían por
hizo capitán de infantería en lugar de Cristóbal su general al dicho D. Fernando de Guzmán, y él lo
Fernández, que antes lo era, a un Gonzalo Jiral de aceptó luego y les dio las gracias, y les dijo que cada
Fuentes muy su amigo y de su tierra. Con todas uno dijese libremente su parecer sin temor, que él
estas revueltas y alborotos siempre se entendía con que quisiese seguir la guerra del Perú, en que él y
gran priesa en la obra de los bergantines. En este sus compañeros estaban determinados de seguir,
asiento donde estábamos, mataron los indios a un había de firmar y jurar de la seguir, y obedecer a su
Sebastián Gómez capitán de la mar, y a un Molina, general y capitanes en lo que se les mandase, y que
y a otros Villarreal, Pedro Díaz y Mendoza, y a si fuesen tantos que pudiesen y quisiesen descubrir
Antonio Rodríguez, andando fuera del campo a la tierra y poblarla, que él los dejaría con un caudillo,
buscar que comer, y a pescar, porque los dichos el que ellos escogiesen, y que si fuesen pocos, que él
tiranos dieron la causa, porque estando los indios los sacaría a la primera tierra de paz donde pudiesen
de aquella provincia de Machifaro en paz, y que quedar, y que él los aseguraba a todos sobre su fe y
venían a rescatar con nosotros, los tiranos, por palabra que no recibirian daño, por lo que dijesen
servirse de ellos los engañaron, y hicieron con maña todos los más del campo eso se haría. No faltaron
y halagos meter en un bohío más de 50 de ellos con algunos, que por temor de que los matasen firmaron
achaque de quererlos ver, y estando dentro los y juraron la guerra del Perú, salvo algunos que
cogieron todos y los cercaron, y echaron en disimuladamente quedaron sin firmar, porque los
prisiones, los cuales de ahí a cuatro días se huyeron tiranos en esta junta no se acordaron dellos. Hubo
todos que no quedó casi ninguno dellos, y por esta en esta junta tres soldados que claramente dijeron a
causa se alzaron y mataron a los arriba dichos, y los tiranos que no los querían seguir en nada contra
su Majestad, que el uno fue Francisco Vázquez y Juan
no sólo se siguió este daño sino otros muchos,
de Cabañas, y Juan de Vargas Zapata: y no quisieron
porque no volvieron más a rescatar con nosotros, y
firmar ni jurar. Luego los dichos tiranos y su general
padecimos necesidad de comida, que ellos primero
dijeron a los tres dichos soldados que pues no querían
nos la traían a trueque de bien poco rescate, y de
seguir la guerra que no habían menester armas, y se
noche nos hurtaban las canoas y no osaban salir
las quitaron y mandaron que de ahí adelante no las
del campo sino muchos soldados juntos a buscar
trujesen.
comida, y primero salían cuatro o cinco solos; y
también se oyó y tuvo por cierto que Lope de Aguirre Otro día después se juntaron en casa de D.
pareciéndole que de la gente se podían huir algunos Fernando su general el maese de campo y los
en las canoas, que tentamos muchas y muy buenas, capitanes y oficiales de la guerra y habiendo dicho
y que siendo así no podría haber efecto su dañada una misa un clérigo llamado Alonso Henao, en
intención, él mismo de noche encubiertamente presencia de todos, acabada la misa, el dicho clérigo
desataba las canoas y echaba el río abajo y publicaba les tomó a todos estos oficiales juramento solemne
que los indios las hurtaban; y que ellos o él lo sobre una ara consagrada, y un misal en que todos
48 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

pusieron sus manos y juraron que unos a otros se salario de a diez y a veinte pesos en su caja y
ayudarían y favorecerían y serían unánimes y haciendas; y sus cartas empezaban: D. Fernando
conforrnes en la guerra del Perú que tenían entre de Guzmán por la gracia de Dios Príncipe de Tierra
manos, y que entre ellos no habría revueltas ni Firme y Perú. Y leyendo las dichas cartas que se
rencores, y esto se hizo por las revueltas pasadas pregonaban primero su secretario y luego los demás
que había habido entre Juan Alonso de la Bandera del campo, se quitaban la gorra cuando nombraban
y el tirano Aguirre, pareciéndoles que con esto se a D. Fernando, como si nombraran al Rey D. Felipe
evitaría motines, y juró primero el D. Fernando y Nuestro Señor, y con tanta reverencia y acatamiento.
luego Lope de Aguirre, y tras ellos todos los demás Antes de partirse deste puerto, hizo su sargento
capitanes, alférez y sargentos, y todos los demás mayor a un Martín Pérez que dijimos arriba había
oficiales del campo; el cual juramento no solo no se sido con él y los demás en la muerte de Pedro de
cumpliò, sino que como si hubieran jurado al
Ursua, que fue el que dio las estacadas a D. Juan
contrario, pareció que lo hicieron peor porque
de Vargas, como se ha dicho, el cual era grande
siempre hubo entre ellos mayores revueltas
amigo del Lope de Aguirre maese de campo, y a
discordias y enemistades, que hasta allí habia
Sancho Pizarro hizo capitán de a caballo. Hasta este
habido.
pueblo de los bergantines vinieron muy bien algunas
En este mismo asiento donde a pocos días el barcas que habíamos sacado del astillero, aunque
tirano Lope de Aguirre hizo un dia juntar toda la venían mal hechas, que no tenían más facción que
gente en una plaza, ante la puerta del D. Fernando unas barcas cuadradas y de palos verdes, y pudieron
su general, y según dijeron algunos sin darle parte, ir hasta la mar más seguramente que los barcos; y
y según otros quisieron decir, inducido por un cierto siendo ellas bien hechas y de buena madera
Gonzalo Duarte que era su mayordomo, y por gruesa y seca las tengo por mejores navios para el
Lorenzo de Salduendo su capitán de guardia, dio a río que otros, y más sin riesgo, salvo que el tomar el
ello consentimiento; y después de juntar toda la puerto con ellas es algo trabajoso, pero llevando ellas
gente del campo, el Lope de Aguirre les hizo el su facción como digo no sería tan trabajoso.
razonamiento siguiente.
A cabo de tres meses que habían estado en
este pueblo de los bergantines, en el cual pasaron
Razonamiento del tirano Lope de Aguirre todas las cosas que habemos dicho, se acabaron
Señores mios, ya vuesas mercedes saben y dos navíos sin cubiertas ni obras muertas grandes
vieron como el otro dia por general consentimiento y hermosos según decían, que en cada vaso de ellos
hicimos a D. Fernando de Guzmán nuestro general, se podía armar un navio de 300 toneles, y partieron
y lo firmamos de nuestros nombres, y que a algunos de allí con propósito de ir a tiranizar Perú, y el orden,
que hubo que no quisieron firmar ni seguir la guerra que ellos decían habían de tener, era procurar salir
se les dio licencia y les habemos hecho y hacemos a la mar con brevedad, y por la necesidad que
el tratamiento que a nuestros her manos, y llebaban de bastimentos tomar tierra en la isla
partiremos con ellos las capas, y si algunos de Margarita, y en tres o cuatro días tomar la comida y
vuestras mercedes los que firmaron el otro día se agua necesaria, y luego partir para Nombre de Dios
han arrepentido, díganlo sin temor ninguno, que lo y tomar puerto en un río que llaman del Factor, que
mismo haremos con ellos. Y todos los que allí está muy cercano a Nombre de Dios, y de allí de
estaban dijeron que querían seguir lo que habían noche ir por tierra al puerto, y antes que los sintiesen
comenzado y tras esto dijo que para que la guerra tomar éste y sierra de Capira, que es paso para
llevase mejor fundamento y más autoridad, convenía Panamá, porque nadie pudiese dar aviso, y tomando
que hicieren y tuvieren por su príncipe a D. este paso con alguna gente, los demás dar sobre el
Fernando de Guzmán, y para coronarle por Rey
pueblo de Nombre de Dios y tomarle, robarle y
desde entonces en llegando al Perú, para esto era
abrasarle, y luego matar todos los sospechosos, y
menester que se desnaturalizasen de los reinos de
sin más detención al instante ir sobre Panamá, hacer
España y negasen el vasallaje que debían al Rey D.
lo mismo y tomar todos los navíos que hubiese en
Felipe, y que él desde allí decía que no le conocía, ni
el puerto porque no tuviesen aviso en el Perú de su
le había visto, ni le tenía, ni quería, por Rey y que
venida, y llevar toda la artillería que hubiese en
elegía por su Príncipe y Rey natural a D. Fernando
de Guzmán, y como a tal le iba a besar la mano, Nombre de Dios y hacer allí una galera y otros navíos
que todos le siguiesen y hiciesen lo mismo. Y luego de armada, y decían ellos que allí se les había de
se fue hacia una casa donde estaba el dicho D. juntar toda la gente de Veraguas, y otros muchos
Fernando, y todos tras él; y primero Lope de Aguirre, españoles de Nicaragua y de otras partes, y más de
y luego todos los demás, pidieron la mano al dicho mil negros a quienes ellos habían de dar armas y
D. Fernando, y le llamaron de Excelencia; y el libertad. Y con estos aderezos de guerra y gente
abrazaba a todos y no daba a nadie la mano, mostró decían que en muy pocos días habían de tener todo
placer y holgó con el nuevo nombre y ditado. Luego el Perú por suyo, el cual habían empezado ya a
puso casa de Príncipe con muchos oficiales y gentiles repartir entr e ellos, y no solamente los
hombres que le servían y acompañaban. Comió repartimientos, mas las mujeres de los vecinos todas
desde entonces solo, y servíase con ceremonias; las que eran más hermosas; cada uno escogía para
cobró alguna gravedad con el nuevo nombre, dio sí la que más le agradaba, y en todo esto no contaban
nuevas condutas a sus capitanes, señalándoles suceso malo ni contrario que les pudiese acaecer, ni
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 49

consideraban el gran poder de Dios, que aunque Villena que habemos dicho que le tenía desde que
por algún tiempo permita y sufra semejantes y mataron al gobernador, poniendo algunos defectos
crueles tiranos para castigo de los pecados de los en la persona de este, diciendo que había sido mozo
hombres, al fin los castiga y dá el pago que sus de algunos vecinos del Perú, y que aquel era
crueldades y malas obras merecen; ni menos se preeminente cargo que se había de dar a un hombre
acordaban, que aunque su Majestad del Rey D. principal; y su príncipe hizo su maestre sala al dicho
Felipe nuestro señor está con su persona lejos destas Villena, y por entonces no se dio a nadie el citado
partes de las Indias, tiene en ellas muchos y muy cargo de alférez.
leales servidores y ministros, y que por el nombre Pasada pascua de resurrección partimos deste
ha de ser acatado y reverenciado de los buenos y pueblo y caminamos otro día, y a la tarde dimos en
temido de los malos en todas las partes de su reino otro pueblo de indios mayor que ninguno de los que
y aun en otros. hasta allí habiamos topado, porque tenía más de
dos leguas de larga, las casas en renglera una a
Partidos deste pueblo de los bergantines, una prolongadas por la barranca del río, sin haber
fueron aquel día a otro pueblo desta misma dentro más casas ni población; los indios se habían
provincia, y desde allí fue la armada por un brazo huido del pueblo, y nos habían dejado las casas
del río, que va sobre mano izquierda desviando a la con infinitas comidas de maíz, y estos indios andan
tierra firme de mano derecha, que siempre habíamos del todo desnudos, tienen las mismas armas de los
costeado; esto por apartarnos de la noticia y de arriba; sus casas son cuadradas y pequeñas
población de Amagua, que según teníamos por cubiertas con hojas de palmas. En las espaldas deste
relación estaba en la tierra firme de mano derecha, pueblo un tiro de ballesta de la barranca del río,
y esto hicieron el tirano Lope de Aguirre y otros de hay una laguna o estero grande que así mismo va
su opinión, pareciéndoles que si acaso tomásemos prolongado el pueblo por sus espaldas, de manera
tierra buena que nos diese deseo de poblar, que este pueblo está en una muy angosta y larga
estorbaríamos su mala pretensión y propósito. Y a isla; es casi toda la tierra anegadiza, no solamente
cabo de tres dias y una noche que caminamos por las casas sino también algunas sementeras
los brazos de mano izquierda, todos despoblados, pequeñas junto a ellas; hay aquí muchos mosquitos
dimos en un pueblo de pocas casas y muchos zancudos y mucha comida, y aún hay un género de
mosquitos; el pueblo es pequeño y la tierra mala y vino que los indios beben confeccionado con muchas
anegadiza, las casas cuadradas y grandes por la cosas: ponen los indios a madurar en tinajas
mayor parte, y cubiertas con paja de cabañas, grandes, algunas de veinte arrobas y más, una
manera de mazamorra espesa, y en estas tinajas
aunque nosotros no vimos éstas; la gente deste
hierve a manera de vino de España hasta que está
pueblo nos sintió y se huyeron todos; hallamos en
hecho, y entonces lo sacan y echan alguna agua y
este pueblo algún maíz, y cazabe y pescado asado
colado beben dello, es tan fuerte que emborracha si
en barbacoa, y en el río se tomaba mucho pescado
no lo templan con agua; tenían los indios mucha
con anzuelos, y los indios deste pueblo vinieron
cantidad de ello, y los españoles y negros e indios
luego a rescatar con nosotos: son desnudos y tienen del campo se lo bebieron en pocos dias, todo es de
las mismas armas que los de arriba, y porque la muy buen sabor, y el color de vino o lo que después
gente venía fatigada de hambre de la esterilidad que nos aposentamos en este pueblo, nos vinieron
pasada, y como un capitán Alonso de Montoya había los indios de paz y se nos mostraron muy familiares
ido por otro brazo a buscar comida con cierta gente y rescataron con nosotros gran cantidad de pescado,
en canoas, porque era semana santa, mandaron y tortugas y puercos de monte y algunos manatíes y
determinaron los tiranos y su príncipe posar allí otras cosas, y aún se alquilaban para moler maíz y
ocho días por esperar al dicho capitán Montoya, y otras obras, y andaban sin ningún miedo entre
porque la gente se reformase de la hambre pasada; nosotros, y se metían en nuestros ranchos, o por
en este pueblo tuvimos la pascua de resurrección. mejor decir en sus casas, donde estábamos
aposentados; eran sutilísimos ladrones que de noche
Mató aquí el tirano Lope de Aguirre a Pedro
nos hurtaban de debajo de las cabezas donde
Alonso de Castro alguacil mayor que había sido del
dormíamos la ropa y armas y otras muchas cosas;
gobernador Pedro de Ursua, porque dijeron que con estaban tan hechos que aunque los soldados por
enojo el dicho Pedro Alonso, ya que los tiranos no causa de los hurtos que hacían los arcabuceaban
habían hecho caso del, ni héchole capitán como a y mataban algunos y los prendían, no por eso
otros (lo cual él deseaba) dijo hablando con un dejaban de venir a rescatar, ni los podíamos echar
Villatoro, haciéndose de las barbas un verso latino de nosotros, antes venían a rescatar los puercos
que dice: ‘audaces fortuna invat timidos que repellit’, con manatíes y tortugas; había en este pueblo
que quiere decir ‘a los atrevidos favorece la fortuna, mucha madera de grandes vigas de cedro que los
y a los cobardes desecha y abate’, y no faltando indios tenían recogidas, de las que el río trae de
quien lo dijo a Lope de Aguirre, luego hizo dar garrote arriba en sus crecientes para hacer dellas canoas.
al Pedro Alonso, y así mismo al Villatoro; sabido Aquí determinaron los tiranos y su príncipe de alzar
por su príncipe D. Fernando envió a mandar que y echar una cubierta a los bergantines por el buen
no los matasen, y así escapó el Villatoro porque el aparejo que de comida y de madera hallaron, y
Pedro Alonso estaba ya colgado. En este pueblo le porque pareció a la gente de la mar que así
quitaron el cargo de alférez general a Alonso de convenía, lo uno porque alzando los barcos
50 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

ensanchaban y cabían más holgadamente la gente que no tenía por tan amigos les quitaba las armas,
y lastre, y porque iban más seguros para la fingiendo que eran descuidados o que habían
navegación de la mar. Alojose aqui el campo muy cometido delitos, y las daba a sus amigos, y éstos
dividido y mal por causa de estar las casas, como eran los herederos universales y forzosos de todos
habemos dicho prolongadas de una en una por la los que en el campo morian y él mataba, y con esto
barranca del rio; había de un cabo a otro de lo que comenzó este tirano a ensoberbecerse, de manera
ocupaba el campo más de un cuarto de legua, río que no quería que su príncipe le fuese en cosa a la
abajo; en los postreros bohíos se aposentó su mano, y que él lo quería hacer y ordenar todo a su
príncipe con su casa, oficiales y gentileshombres, y voluntad. Quiso aquí matar a Gonzalo Duarte
cerca de los más capitanes, y en medio el tirano mayordomo mayor del príncipe, por ciertos enojos
Lope de Aguirre maese de campo, y junto a él los y porque había pedido a su príncipe una provisión
bergantines para hacer dar priesa a la obra, y de para que Lope de Aguirre ni otros oficiales tuviesen
allí para adelante toda la demás gente. Comenzose con el cuenta ninguna, ni el fuese sujeto a ellos
la obra de los bergantines con mucha priesa y para cosa ninguna, sino solamente a su príncipe,
cuidado; trabajaban los oficiales y negros en ella y se la dio y Lope de Aguirre enojado desto y de otras
españoles repartidos como arriba se ha dicho; cosas le prendió para matarle, y su príncipe se lo
tardose en hacer lo que faltaba a los bergantines quitó, y el tirano muy enojado se tendió en el suelo
más de un mes. En este asiento arrepentido ya D. y decía a su príncipe que le diese su preso que le
Fernando de Guzmán del yerro que había hecho y quería castigar y hacer justicia dél, y que no se
todos los demás sus oficiales en haber muerto a su levantaría de allí si no se lo daba, y sacó la espada
gobernador, y viendo el mal camino que llevaban, de la vaina, y dijo que con aquélla le cortase su
deseando ver si podrían remediarlo, entraron un excelencia la cabeza y que vería más acertado antes
día en consulta sin llamar al tirano Lope de Aguirre, que estorbarle aquello que convenía al servicio de
ni a ninguno de sus amigos, y acordaron segunda su alteza; y él le dijo que se fuese que él se informaría
vez buscar la tierra y poblarla, y como para hacer dello y haría justicia. Luego los capitanes de campo
esto el mayor estorbo que tenían era Lope de Aguirre se pusieron de por medio y los hicieron amigos al
y algunos de sus amigos que deseaban la guerra Lope de Aguirre y Gonzalo Duarte; y en estas
del Perú, acordaron que debían matarlos, y fue amistades se descubrió una cosa que hasta allí
opinión de los más que fuese luego sin salir de allí, había estado oculta, y fue que el Gonzalo deseando
enviándolos a llamar para aquella consulta antes la amistad de Aguirre, para atraerle a ellos le hacía
que los sintiesen; pero un Alonso de Montoya fue cargo, y le dijo públicamente que bien sabía el Lope
de parecer que lo debían guardar para mejor de Aguirre que en los motines había tratado con él
conyuntura, porque Lope de Aguirre tenía siempre que matasen a Pedro de Ursua y hicieron general a
consigo muchos amigos, y que sería mejor, pues ya D. Fernando de Guzmán, y que Lope de Aguirre
faltaba poco para acabar los bergantines; cuando había de ser su maese de campo, y al Gonzalo Duarte
fuesen navegando, y el Lope de Aguirrc muchas le prometió hacerle capitán, y que aunque no se
veces iba a visitar a su príncipe a su bergantín, y había efectuado, él lo había tenido tan secreto que
que allí le podrían matar a su salvo sin daño ni hasta allí nadie lo había sabido, a lo cual respondió
peligro de ellos ni de otros, y esto le pareció bien a Lope de Aguirre qué decía verdad y así se abrazaron
su príncipe que aborrecía el peligro, y con esta y fueron amigos, y si ello fue así, cierto fue gran
deter minación se salier on desta consulta maldad del Duarte no avisar de el1o a Pedro de
encomendando el secreto desto a todos; pero el Ursua que le tenía por íntimo amigo, y hacía mucho
tirano se dio mejor maña a acabarlos a ellos como caso dél en su campo.
se verá adelante.
En este comedio poco antes que se acabasen
los bergantines, hubo ciertas pasiones entre Lope
Muerte de D. Fernando de Guzmán de Aguirre y el capitán de la guardia de su Príncipe,
que era Lorenzo de Salduendo, el cual se había
En este comedio que hemos dicho, el tirano amancebado con Da. Inés que había sido manceba
Lope de Aguirre maese de campo entendía en llegar del gobernador, y tenían por comadre a una Da.
amigos, y hizo una compañia de cuarenta soldados María de Sotomayor mestiza, y por lugares en
de sus mayores amigos, y los más aderezados de donde habían de ir estas mujer es en los
todo el campo porque aunque él no sabía nada de bergantines; y ciertos colchones que querían llevar,
lo que se había tratado contra él en casa de su el maese de campo no quería que decía que
príncipe, por causa de no le haber llamado como ocupaba mucho, por lo cual enojado el Salduendo
otras veces, tuvo recelo como hombre cauteloso que dijo delante de las dichas mujeres arrojando una
era, y a esta causa andaba desde aquel día con lanza que tenía en la mano: mercedes me ha de hacer
mucho recelo y cuenta y todos los de su parte y Lope de Aguirre. Vivamos sin el pesiatal. Juntose
toda la demás gente que restó, se partió igualmente con esto que la dicha Da. Inés dicen que había dicho
entre los demás capitanes de su príncipe, sin que un día antes enterrando una mestiza que había
unos tuviesen más soldados que otros, con estos muerto en su casa, Dios te perdona hija, que antes
cuarenta soldados y amigos de su compañía, y con de muchos dias tendrás muchos compañeros.
otros muchos que cada día se llegaban de las demás Todo lo cual vino a saber el Lope de Aguirre y por
compañías, a quienes el daba las mejores armas esta y porque entre ellos hubo malos tercetos, el
del campo, de cotas, espadas y arcabuces, y a los maese de campo determinó matar al Lorenzo de
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 51

Salduendo, y juntando para ello sus amigos tuvo de campo no pudiese ser avisado de aquella junta,
noticia dello su Príncipe, y enviando con toda mandó echar un bando que pena de la vida de todos
diligencia llamar a Salduendo, y sabido por él lo los que tuviesen canoas, las trujesen aquella noche
que pasaba, envió a Gonzalo Giral de Fuentes, su a su posada, poniendo en unos pasos ciertas
capitán, para que hablase y apaciguase al Lope de guardias; y esto hizo para que ni por tierra ni por
Aguirre. Dicho Gonzalo Giral topó en el camino al el río no supiese nada su príncipe. Luego a prima
dicho Aguirre con todos sus amigos armados que noche fue a matar al capitán Alonso de Montoya y
venían a matar al Salduendo, y no le pudo apaciguar al almirante Miguel Robledo que estaban bien
porque iba muy bravo y enojado; halló al dicho descuidados en sus posadas, y allí los mataron casi
Salduendo con su príncipe rogándole que le sin que nadie lo sintiese a estocadas y a lanzadas.
defendiese de Lope de Aguirre, y a que apedillase Mató primero a éstos porque estaban alojados a la
su gente, y el traidor del tirano no le dio ese lugar parte de arriba del campo, de manera que entre
que delante de su príncipe lo mató a estocadas y ellos y su príncipe estaba Lope de Aguirre alojado,
lanzadas sin tenerle respeto ni dársele nada dél y porque éstos entretanto que iban a matar a su
aunque le rogaba y mandaba que no lo hiciese, y príncipe y a los demás capitanes que posaban
luego mandó a un sargento suyo llamado Antón abajo, no les hiciesen algún estorbo, y en
Llamoso, y a un Francisco de Carrión mestizo que acabándolos de matar quiso ir luego a matar a su
fuesen a matar a D. Inés, los cuales fueron y la príncipe, como lo tenía determinado, y repartió sus
mataron a estocadas y cuchilladas, y robaron cuanto amigos, de manera que a cada diez o doce dellos
tenía que fue notable lástima. Muerto el Salduendo, dio cargo de que nombradamente matasen a uno
el tirano le dijo a su príncipe muchas desvergiienzas, de los que él quería, pero sus amigos se lo
y entre otras que no se había de fiar de ningún estorbaron diciendo que no era entonces tiempo
que hacía la noche muy oscura y que ellos mismos
sevillano, que mirase por sí, que él haría lo mismo,
unos a otros se matarían sin conocerse. Tuvo el
y de allí adelante si le llamasen a consulta de guerra
tirano toda aquella noche bien apercibido su
que había de llevar cincuenta hombres amigos bien
persona, y la de los suyos velándose dentro en los
armados, y que a él le valdría más gastar de los
bergantines, y metida dentro toda la munición de
guijarros de Pariacaca que comer buñuelos que le
remos y hato para que si su príncipe lo sintiese y
daba Gonzalo Duarte su mayordomo, y otras cosas juntase gente, y el tirano viese que no podía salir
de mucha desvergüenza. Pasado este enojo quiso y con su intento irse en los bergantines con los
procuró aplicar a su príncipe para mejor hacer su amigos que tenía dentro, y dejar allí a los demás
maldad, y le quiso dar algunas satisfacciones y aislados, sin navíos ni canoas en que le pudiesen
disculpas, y la causa porque había muerto al seguir. Tuvo toda aquella noche guardas en los
Salduendo delante dél, diciendo que éste había caminos que no dejasen pasar a nadie que le
querido matar un tan bueno y leal servidor de su pudiese dar aviso y púdolo muy bien hacer porque
excelencia como él era, que no le debía pesar, que aquel asiento del campo era, como se ha dicho isla
él estaba vivo para guardarle y servirle más fielmente y muy angosta, y con las crecientes estaba casi
que otro ninguno; pero su príncipe a más no poder anegada, y había pasos bien estrechos que con
mostró quedar satisfecho, antes desde aquel día sin facilidad se podían guardar y con esto casi nadie
estarlo anduvo siempre espantado; y demudado el de los que tenía el Aguirre consigo sabía que quería
gesto, y el tirano Aguirre siempre buscaba y llegaba matar a su príncipe, sino a solos los capitanes. Y
más amigos; andaba siempre acompañado de más al otro día en amaneciendo dejando guardas en
de sesenta armados, y publicaba que lo hacía para los bergantines, fue con todos sus amigos a casa
guardar a su príncipe, pero ambos vivían bien de su príncipe que desto estaba bien descuidado,
recatados y se temían el uno al otro. Dijose por cosa y no tuvo razón, pues ya el tirano le había avisado,
cierta que un Gonzalo Giral de Fuentes capitán de y toda la gente que en el camino topaba llevaba
D. Fernando y otro Alonso de Villena maestresala, consigo, y decía a todos que iba a castigar ciertos
que habían estado en la consulta arriba dicha, en amotinados y que al príncipe su Señor todos le
que su príncipe y capitanes trataron de matar al acatasen y reverenciasen como a tal y solamente
tirano viéndole muy pujante de amigos, estos dos había comunicado el negocio con Martín Pérez
secretamente le avisaron dello, por lo cual el traidor sargento mayor, y con Juan de Aguirre, sus muy
se dio más priesa en matar a su príncipe, aunque íntimos amigos, que a vuelta de los otros matasen
antes desto ya él lo tenía determinado. En este a su príncipe, y de camino antes de llegar a la
tiempo envió a llamar su príncipe al maese de campo posada de su príncipe mató este cruel tirano por
para que fuese a consejo de guerra, y él le respondió sus manos a un clérigo de misa llamado Alonso de
que ya no era tiempo, y no quiso ir a su llamado. Henao, al cual halló en su cama acostado y le dio
una estocada que le paró todo el cuerpo y la cama
Acabados ya del todo los bergantines, ya que hasta hincar la espada en la barbacoa, y sin
se querían partir de aquel pueblo, determinó el detenerse más fue en casa de su príncipe, el cual
tirano matar a su príncipe y a todos los capitanes estaba en la cama, y al ruido que traían ya que
de la consulta; para lo cual juntó una noche la más llegaban a la puerta, se levantó en camisa y viendo
gente que pudo, así de sus amigos como de otros, a su maese de campo delante, dice que le dijo: qué
diciéndoles a todos que quería castigar ciertos es esto padre mío? Y el tirano le dijo que estuviese
capitanes que hacían motín contra su príncipe, y quedo, y él y sus amigos mataron al capitán Miguel
para que este que estaba bien desviado del maese Serrano y a Gonzalo Duarte, y a un Baltasar
52 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

Toscano, y a la vuelta los dichos Martín Pérez y Juan quitó el cargo a Gonzalo Giral, mandó luego echar
de Aguirre mataron a su príncipe D. Fernando a bando por todo el campo, que so pena de la vida
estocadas y arcabuzazos. Y así feneció la locura y nadie de allí por delante hablase en secreto, ni
vanidad de su principado y pereció allí la gravedad echase mano a la espada, ni a otras armas delante
que había tomado y todas sus cuentas salieron de él, ni en el escuadrón, y se estuvo en el bergantín
vanas. dos días que allí se estuvo con sus amigos, y de su
guardia, sin salir de allí. De ahí a dos días que los
Fue ese D. Fernando de Guzmán natural de
tiranos mataron a su príncipe, salieron de aquel
Sevilla: era hijo, según se decía, del veinticuatro
Esquibel y de Da. N. de Guzmán su mujer; era pueblo o asiento, y caminamos ocho días y siete
hombre de buena estatura, bien hecho y fornido de noches sin parar. Parecióse aquí sobre mano
miembros; sería de edad de veinticinco años poco derecha una cordillera no muy alta de cabañas y
más o menos, era en alguna manera gentil hombre, sierras peladas, y había en esta cordillera grandes
de ánimo reposado y aún descuidado; era virtuoso, humos, y divisábanse algunas poblaciones orilla del
enemigo de toda crueldad, no consentía que sus río; allí dijeron las guías que estaba Amagua y las
capitanes matasen a nadie; estorbaba muchas tierras buenas que ellos nos habían dicho. Mandó
muertes y daños en su campo; fuera desto era el tirano que nadie hablase con las guías; pasamos
vicioso, g1otón, amigo de comer y beber, algo desviados desta tierra, por este otro brazo de
especialmente fruta, buñuelos y pasteles, y dulces, la tierra que nos había desviado el tirano.
y en buscar estas cosas se desvelaba; y cualquiera Aquí vimos algunas poblaciones en islas de
que le quisiese tener por amigo con cualquiera indios desnudos y flecheros, y en la primera
destas cosas fácilmente lo podía alcanzar y traerle salieron por agua en un pueblo donde se hallaron
a su voluntad. Fue demasiadamente ingrato a su muchas iguanas atadas por las casas de los indios,
gobernador Pedro de Ursua, que siempte le había y más abajo se nos juntó el brazo que venía sobre
honrado y tenido en mucha reputación, y hecho su mano derecha que habíamos dejado arriba. Vimos
alférez general, que era el mayor cargo de su campo, por aquí así mismo sobre mano izquierda una
y él le mató por sola su ambición. Duróle el mando cordillera de cabañas y sierras peladas, aunque
en la tiranía con nombre de general y después de por allí no nos parecía que había poblaciones como
príncipe, casi cinco meses, que en ellos no tuvo
en la mano derecha. Estas dos cordilleras, una de
tiempo de hartarse de buñuelos y otras cosas en
una banda y otra de otra, hacen por aquí recoger
que ponía su felicidad, que fue desde primero de
el río en alguna manera, aunque no tanto que no
enero de 1561, que mataron al gobernador, hasta
sea incomparable su anchura y grandeza. Al cabo
22 de mayo del dicho año que el tirano y sus amigos
deste trampa dimos en un pueblo grande de indios
le mataron a él.
que está sobre mano derccha, en una barranca muy
Habiendo pues el tirano Lope de Aguirre grande del río y muy alta; son estes indios
muerto los que hemos dicho arriba que fueron por desnudos y flecheros, son Caribes, llámanse los
todos siete, con los de la noche antes, y entre ellos Arnaquines, son bien dispuestos, tienen yerba muy
a su príncipe y a un clérigo de misa después de la mala y casas de adoración con oratorios para sus
muerte del D. Fernando juntó toda la gente en una ritos e idolatrías, y a la puerta de cada casa destas
plaza, y él bien rodeado y guardado de más de 80 hay dos sacrificaderos, a donde nos pareció a
de sus amigos muy bien armados, les dijo a todos, nosotros que debían de degollar los indios que
que nadie se alborotase por lo que habían visto, sacrificaban: en el uno estaba pintado en una tabla
que aquellas eran cosas que la guerra causaba, y el Sol y figura de hombre a los hombros, en el otro
porque su príncipe y los demás no sabían gobernar estaba pintada la Luna y una figura de mujer; están
habían muerto como mozos, y que no quería tratar todos llenos de sangre humana a nuestro parecer,
dello más, sino que les rogaba que le tuviesen por y esto se sacó por conyectura que no tuvimos a
amigo y compañero, y entendiesen que de allí quién lo preguntar por falta de lenguas; hallamos
adelante la guerra iría derecha: y acabó llamándose en este pueblo pedazos de una guarnición de
general, dio luego nuevos cargos y oficios. A Martín espada y clavos y otras cosas de hierro, a la llegada
Pérez, que antes era sargento mayor, hizo su maese deste pueblo envió el tirano más de 30 hombres
de campo, y a Juan Gómez Calafate, almirante de delante con canoas y piraguas, y los indios
la mar, y a un Juan González carpintero sargento esperaron a la orilla del río con sus armas: dijeron que
mayor. Quitó la conducta de capitán al Comendador esperaban de paz porque no hicieron muestra de pelear,
Juan de Guevara, y dióla a un Diego de Trujillo que mas los cristianos que iban en las canoas les tiraron
antes era su alférez, y al Guevara prometió que muchos arcabuzazos, hirieron o mataron algunos y
llegando al Nombre de Dios le daria 20 mil pesos luego se huyeron sin pelear ni tirar flecha, y dejaron el
para que de allí se fuese a España. Hizo a un Diego pueblo con todo lo que en él tenían, que no sacaron
Tirado capitán de a caballo, el cual lo aceptó contra cosa de sus casas, y no se pudo coger más de una
su voluntad, y persuadido del dicho tirano y por india y un indio, y a éste le hirió Juan González,
temor que no le matase, y a otro Nicolao de Loraya sargento mayor, con una de sus propias flechas,
capitán de su guardia. Quitó la vara de alguacil para probar la hierba, y otro día a aquella hora
mayor al Juan López Serrato y dióla a un Carrión murió sin haberle dado herida más de cuanto le
mestizo, casado en el Perú con una india; dejó con sacó sangre. Después que los indios hubieron
las conductas de capitanes a Pedro Alonso Galean, puesto sus mujeres y hijos en cobros, venían cada
y a Sancho Pizarro que antes lo era de su príncipe; día a la redonda del pueblo, pero no nos osaron
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 53

Figura 4.2. Iguana (apud Brehm)


54 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

acometer, y después cogió otro indio y le dio el tirano no fuese de su guardia o muy grande amigo suyo, o
una o dos hachas y machetes y otras cosillas, y por de los demás tiranos sus amigos. Aquí por
señas le dijo que hablase a sus compañeros que consentimiento y voluntad del tirano y con su
viniesen de paz que no les haría mal, y nos enviaron licencia, hirió a traición un N. Madrigal a Juan López
los indios dos mensajeros, el uno cojo de un pie y el Serrato alguacil mayor que había sido de D.
otro contrahecho de un lado, y traía cada cerdos, Fernando, porque mucho tiempo antes de esto,
papagayos y un poco de pescado, y por seña; nos dicen que el Juan López había afrentado al Madrigal,
dijeron que los indios venían todos de paz, pero no y dióle con su lanzòn cuatro o cinco heridas por
aguardamos a ello que nos fuimos luego sin esperar detrás al bajar del bergantín, donde estaba el tirano,
más. T ienen estos indios tierra alta y llana y delante de él el tirano hizo cierto ademán de
anegadiza, y cabañas entre una montaña muy rara prender al Madrigal porque no se entendiese lo había
de alcornoques; este pueblo está en la tierra firme mandado, y luego lo soltó; y estando el Juan López
de mano derecha. Hallóse en este pueblo gran casi sano de las heridas, los que le curaban, por
cantidad de maíz colgado en las casas en manojos, mandado de Lope de Aguirre, le echaron cosas con
y mucha cantidad de amaca de red, y muchas redes que pasmó y murió.
de caza, y otros muchos cordeles y sogas de que se Partidos deste pueblo, que llamamos de la
hizo jarcia; halláronse muchos palos cortados para Jarcia, fuimos por el río abajo cinco o seis días, y
mástiles y entenas, y muchos cántaros y tinajas para yendo navegando mandó el tirano al sargento Antón
el agua; hiciéronse en este pueblo las velas de manta Llamoso que matase al comendador D. Juan de
de algodón, y sábanas de ruán, y otras cosas de Guevara: fue la causa, porque dijo que también era
lienzo que se recogieron entre los soldados e indios en el motín con Diego Trujillo y Juan González, el
del campo: en este pueblo reconocimos la mar que cual dicho Llamoso le dio con una daga tres
sube hasta él, y aún se creyó que mucho más arriba, puñaladas estando descuidado al bordo del navío,
que estará más de 200 leguas de la mar. Cuando y le cogió por la horcajadura y le echó al río donde
llegamos a este pueblo se nos huyeron dos guías murió ahogado pidiendo a voces confesión, y el
que traíamos desde el Perú, que eran los indios tirano lo miraba con mucho placer, y juntándose
brasiles que hemos dicho, que subieron por el rio con el otro bergantín lo contó a la gente de él, que
arriba, por donde nos pareció que los indios deste no lo había visto por grande hazaña: llegamos a unas
pueblo son de los dichos brasiles, que debe de estar casas fuertes que por allí tienen estos indios hechas
cerca de ellos, porque de otra manera no se osaran de barbacoa, altas y cercadas de tablas de palma, y
huir las dichas guías entre indios que comen carne en lo alto tienen troneras para flechas, y en una de
humana; detuviéronse en este pueblo doce días, ellas nos hirieron los indios cuatro o cinco personas
haciendo la jarcia y enmastelando los navíos. En de veinte que se habían adelantado con un caudillo,
este tiempo mató el tirano a un Monteverde hicieron retirar a los soldados y cuando llegó la
flamenco, porque le pareció que andaba tibio en la armada a esta casa ya los indios se habían huido.
guerra y se temió no le siguiera; amaneció un dia No hallamos comida ninguna en las casas, ni
muerto y puesto un rótulo en el pecho que decía: sementeras, y a lo que nos pareció estos indios se
por amotinadorcillo, y después algunos quisieron sustentan con solo pescado, y con ello rescatan las
decir que el Monteverde era luterano. Mató al tiempo demás cosas de comida; entre otras hallamos aquí
de la partida deste Pueblo a un Juan de Cabañas sal cocida, que fue la primera que vimos en todo el
que fue de los tres que se habían declarado y dicho río de los Caperuzos hasta aquí, que serán mil
que no querían seguir a los tiranos, y no quisieron trescientas leguas, que ni los indios la conocen ni
firmar como se ha dicho. Mató así mismo al capitán comen, en esta casa nos detuvimos tres dias
Diego Trujillo, y a Juan González, sargento mayor, acabando algunas cosas que faltaban a los
a los cuales había dado los cargos el propio cuando bergantines: esta casa está metida en un estero
mataron a su príncipe; la causa, según se dijo de arriba pequeño, desviada del río tres tiros o más de
las muertes, fue porque allegaban amigos y el tirano arcabuz, y en islas. Al salir que queríamos de aquí
se temió dellos, aunque echó mano de que lo querían aparecieron en el rio muchas piraguas y indios, que
matar. Muertos los dichos, hizo capitán en lugar de al parecer venían más de ciento con infinitos indios
Trujillo a un Cristóbal García Calafate, y sargento de guerra: pensamos que nos venían a acometer, y
mayor a un Juan Tello. apercebímonos de guerra y ellos se desviaron de
Todo el tiempo que se detuvieron en este nosotros y salimos a ellos, pero como estábamos en
aquel estero tan arriba, cuando llegamos a la madre
pueblo estuvieron los tiranos sin salir de los
del río se habían desaparecido, y nunca más los
bergantines con su guardia y amigos, en el uno su
vimos ni supimos donde tenían sus poblaciones.
maese de campo, y en el otro el tirano Lope de
Aguirre, y no dejaban dormir ni estar dentro a Partidos de aquí anduvimos perdidos entre
ninguno de los sospechosos. Al salir de aquí muchas islas y brazos del río que no sabíamos hacia
desarmó toda la gente que le pareció sospechosa donde corría, porque las crecientes con las mareas
quitándoles las espadas y dagas y arcabuces, y eran tan grandes y continuas arriba como abajo, y
todos sus amigos y los de su guardia iban armados, los pilotos y gente de la mar que allí habían
y las armas que quitó las llevaba todas con muchas desatinado y no entendían el río ni conocían las
sogas en un alcarete que había en la popa de cada mareas, salieron ciertos de ellos en dos piraguas a
bergantín, donde no consentía llegar a ninguno que reconocer unas puntas, y al cabo de muchas dudas
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 55

y pareceres, que unos decían que habían de ir a un mar. Todo el más tiempo, que son seis meses largos,
cabo y otros a otr o, fue Dios servido que nos detuvimos en hacer los bergantines, buscar
acertásemos y empezásemos a caminar; dimos en comida y descansar. Pasamos gran necesidad de
un pueblo de indios pequeño que está poblado en hambre y sed por la mar, tanto, que creo que si nos
una isla de Cabaña a la barranca del río, los indios durara la navegación cuatro o cinco días más
deste pueblo nos salieron de paz y rescataron con muriera la mitad de la gente, aunque no fueran de
nosotros, andan desnudos y traen en los pies unas los amigos del tirano, que estos siempre venían
suelas de cuero de venado atadas con cuerdas a mejor proveídos, y quitaban de los otros para ellos;
manera de las ujotas del Perú; traen estos indios y con todo eso se nos murieron dos o tres soldados
los cabellos cortados a líneas redondas, y la primera de hambre.
línea hace un espacio redondo en lo alto de la corona,
de forma que una corona de fraile, salvo que este Discursos del río Marañón
espacio es lleno y la línea cortada, y más abajo otra
y otra, todas las cuales caben en la cabeza. Tiene este río Marañón, según los que se
precian de entenderlo, más de 1.600 leguas desde
En este pueblo dejó este cruel tirano casi cien su nacimiento a la mar. Es tan grande y poderoso
piezas ladinas cristianas de las que habían quedado que no se puede escribir su grandeza; anega en
del servicio que trujeron del Perú, diciendo que no cualquier parte al tiempo de su creciente más de
cabían en los bergantines y que era peligroso ir por cien leguas de tierra llana fuera de su madre; hay
la mar tanta gente, y que para tantos faltaría el agua en él tanta cantidad de mosquitos, especialmente
y comida. Fue esta una gran crueldad, porque los de los zancudos de noche y de día, que es temeridad
indios de allí por ser caribes los comerían, o la tierra ver que los sufran los naturales. Hasta que llegamos
por ser mala y enferma los acabaría presto. Aqui al pueblo de las tortugas tuvimos pocos aguaceros,
mató el tirano a Pedro Gutiérrez y Pedro Palomo y creo yo que este tiempo debe ser verano, si le hay
soldados, porque dijo que habían dicho el uno al porque desde septiembre a navidad, de allí para
otro: las piezas nos dejan aquí? Hágase lo que se ha abajo nos llovió mucho y vienen grandes aguaceros
de hacer y para satisfacción dio por testigo un negro, con muchos truenos, y ordinariamente con tanto
viento que causa en el río gran tormenta de olas
el cual dijo que se lo había oído, y a ellos mandó
mayores que en la mar, que anegan las canoas o
dar garrote, no embargante que el Palomo le rogaba
piraguas si no cogiesen con tiempo el abrigo de la
por amor de Dios que lo dejase vivo con las piezas,
tierra, y aun en los bergantines nos vimos algunas
que se haría ermitaño y las doctrinaria, pero él que veces en harto peligro, especialmente una noche que
no curaba de cristiandad no lo quiso hacer. Partidos nos pensamos anegar. Cuando llueve en los
deste pueblo a veces perdiéndonos, y a veces nacimientos de los ríos, que con este se juntan,
hallándonos, llegamos a la mar sin hallar más vienen grandes avenidas que anegan y cubren toda
poblados ni indios, aunque desde aquí en la la tierra de la redonda, y el mes de setiembre que
cordillera que he dicho de la mano izquierda vimos empezamos a bajar, ya las crecientes comenzaban
grandes humos y cabañas, y antes de llegar a la a venir de arriba, y en julio que salimos a la mar
mar pasamos grandes trabajos de peligros y aún no había acabado de vaciar, por manera que
tormentas y macareos; pasamos por muchos bajos dura todo el año, que como la distancia de los
y bancos que el río hace a la boca de la mar, tanto nacimientos es mucha, antes que acaben de vaciar
que algunas veces pasaban los bergantines topando unas tornan a venir otra vez de arriba otras. Es
por sola media barraca de agua; fue Dios servido todo el río muy caliente en demasía, enfermo y mal
que fuese el tiempo blando, y así pasaban arrastrando poblado, porque en tanta distancia de tierra, en las
por aquel lodo, que fue maravilla no hacerse pedazos; poblaciones que nosotros vimos no puede haber de
quedáronsenos aquí tres mozos y un español, y dos 150 indios arriba que es bien poco; hay en todos
mestizos que iban en una piragua que llevábamos, y los indios deste río muchas y muy buenas tinajas
la tormenta del río y la creciente los arrebató y volvió de barro, y toda loza, obradas con gran pulicia y
pintadas y labradas de mil facciones. No vimos en
hacia arriba sin que fuesen parte para tomar tierra
todo el río oro ni plata, si no fue en lo que llamamos
hasta que los perdimos de vista; nunca más los vimos,
Carari y Mascari que hay algunos indios traen
iban con ellos otros indios y cristianos, y en algunas
algunas orejeras y caracuris de oro y bien pocas y
islas se quedaron algunas canoas, que salían a chicas, pero los indios conocen oro y plata y lo tienen
mariscar. La creciente de la mar subió con tanta furia en mucho más que los otros metales, en que nos
que no les daba espacio para volverse a los pareció que los indios deben de tener noticia dello.
bergantines, y creímos que los ahogaba. Desde la En todo este río desde los Capenucos hasta la boca
boca deste río a la isla Margarita estuvimos diecisiete del mar no hallamos sal, ni los indios la tienen, ni
días, de manera que desde que nos embarcamos en comen, ni conocen, ni se les da nada por ella;
el castillo o astillero con nuestro gobernador Pedro acabadas de pasar las crecientes que vienen de
de Ursua hasta llegar a la Margarita, tardamos del arriba, hace el río muy grandes playas, en las
26 de setiembre de 1560 hasta 20 de julio de 1561 cuales se halla innumerable cantidad de huevos
que son diez meses menos cinco o seis días, de los de tortugas hicoteas que se pueden con ellos solos
cuales caminamos por este río y la mar tres meses y sutentar más de mil hombres. Hay así mismo a
veinte días, que son ciento diez jornadas, algunas cierto tiempo mucha tortuga y pájaros que se
más o menos: 93 ó 94 por el río y las demás por la cogen en las playas muy grandes de muchas
56 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

maneras, y hay muchos y grandes pescados y muy En este comedio el gobernador y vecinos de
sabrosos. Tiene la boca deste río según los pilotos la Margarita, habiendo visto los bergantines
que lo anduvieron con nosotros casi 80 leguas, y andaban alborotados, por no saber qué gente era,
todas de agua dulce; la boca es al parecer una sola; y enviaron una piragua por la mar y gente por tierra
tiene más de dos mil islas cerca de la boca de la a reconocerlos, y cuando llegaron hallaron al tirano
mar y las más dellas son anegadizas y bajan en Lope de Aguirre desembarcando la gente en tierra
tiempo de sus crecientes. y algunos de sus amigos, y toda la demás gente
dejó dentro del bergantín debajo de cubierta
escondida. Hablaron el tirano y sus amigos con
Como llegó el tirano a la isla Margarita dos o tres vecinos de la dicha isla, que allí vinieron,
a los cuales les dijeron y les hicieron creer que era
Lunes por la tarde a 20 de julio de 1561 llegó
gente que venía perdida del Marañón y que habían
el tirano Lope de Aguirre con sus malditos secuaces bajado del Perú en demanda de cierta noticia de
a la isla Margarita y los pilotos que traían no sabían cierta tierra que había en el dicho Marañón, y
el puerto principal, y tomaron los bergantines pidiéronles de comer y carne con muchos ruegos y
diferentes puertos. En el que venía el tirano Lope crianza, y los dichos vecinos mataron una o dos
de Aguirre tomó un puerto que llaman Paraguay, vacas y se las dieron, y a uno dellos llamado Gaspar
cuatro leguas del puerto, y el otro en que venía su Rodríguez, que le pareció al tirano más principal y
maese de campo Martín Pérez en otro puerto a la de mejor plática y conversación, le dio por
batida del norte, dos leguas del otro, y otras cuatro asegurarle y engañarle un capote de grana con unas
del puerto. Luego que tomó puerto este tirano, antes fajas anchas de oro y una copa de plata sobre
de saltar en tierra, mandó prender a un Gonzalo dorado, y a éste y a los demás dijo que no quería
Giral de Fuentes capitán que había sido de su más de tomar comida por sus dineros para tornar
príncipe D. Fernando y a otro Diego de Balcázar, al Perú, y luego aquella noche se supo esta nueva
que habemos dicho, que fue justicia mayor del en el pueblo por cartas escritas de los dichos
campo de los dichos tiranos, que antes le habían vecinos y aún decían más, que era gente muy rica
querido matar y se había escapado y a entrambos del Perú y que venían enfermos y muertos de
hambre, y que daban mucha plata y oro y joyas y
les mandó dar garrote sin confesión, y al Gonzalo
ropas que traían a trueque de comida, y que habían
Giral como no se ahogase tan presto le acabaron de
dado el capote y taza a Gaspar Rodríguez. Y sabido
matar con muchas puñaladas, porque daba voces lo susodicho en el pueblo de la Margarita, el
pidiendo confesión, y porque no le sintiesen ciertos gobernador D. Juan de Villandrando, movido según
vecinos de la isla que allí habían venido a reconocer se dijo de codicia, deseoso de haber algunas joyas
qué gente era, y los echaron en la mar. Luego aquella de las que dijeron que repartían los dichos tiranos,
tarde envió el tirano un soldado suyo que venía a y con él un Manuel Rodríguez alcalde ordinario, y
avisar al tirano donde y como habían tomado puerto, otro Andrés de Salamanca con el mismo deseo
y qué era lo que quería que hiciese, y envió a un partieron esa misma noche, a media noche para
Diego Lucero con una guía por otro camino, y Guachise, donde estaba el tirano Aguirre, y otro
pudiera también avisar al Gobernador y vecinos de día muy de mañana llegaron allá con otros, que en
la isla, y no quiso, antes se hizo su embajador el camino se les habían juntado, que irían también
fielmente, como amigo que mostró ser de los dichos con la misma pretensión y codicia, y el tirano luego
tiranos: y así mismo el maese de campo en llegando que los vió salió a recibirlos al camino con ciertos
en tierra echó fuera del bergantín a un Roberto de amigos suyos, y se les humilló tanto hasta hincar
Sosa Barbero, y a un Francisco Hernández piloto las rodillas y bajar a besar los pies al dicho
sólo, sin consentir que nadie saliese con ellos; y los gobernador y los que traía consigo hicieron lo
dichos salieron a buscar comida a unas estancias mismo; y a manera de les querer hacer servicio les
de más de media legua de allí con unos negros y tomaron los caballos y los ataron lejos de donde
ellos estaban, y el gober nador tuvo gran
fueron a la hora de vísperas y volvieron a media
cumplimiento con el dicho tirano, ofreciéndole a
noche con el mismo Rodriguez que lo toparon en el
su servicio persona y casa para que posase, y el
camino, y cualquiera destos cuatro pudiera avisar
tirano le respondió agradeciéndoselo mucho con
al puerto y vecinos dél si quisieran, y el tirano se
gran crianza y comedimiento; y después que
desbaratara luego y no hiciera el daño que hizo.
hubieron hablado un rato, el tirano Aguirre se
También dijeron que el tirano Aguirre luego como
desvió dellos y fue a hablar con sus amigos y
llegó en tierra echó fuera diez o doce de sus amigos, soldados, y después volvió a donde estaba el
y con ellos a Juan Gómez Calafate su almirante, los gobernador, y haciéndole otro acatamiento como
cuales fueron a las estancias y toparon vecinos de el primero le dijo: señor, los soldados del Perú
la isla y no les dijeron nada. Había llegado este siempre se han preciado más de buenas armas que
mensajero al bergantín del maese de campo, y luego no de ropas ni vestidos, aunque los tienen en harta
puso por obra lo que su general Lope de Aguirre le cantidad, suplican a vuestra merced les mande dar
mandaba, y a media noche hizo saltar en tierra la licencia para que lleven sus armas y arcabuces, y
gente, y luego caminó con ella con las guías que el D. Juan como era mozo y iba con codicia de joyas
había traído consigo el Rodríguez, y en desviándose le respondió que fuesen como ellos lo mandasen,
del bergantín mató a Sancho Pizarro y le dejó muerto aunque entonces poco le aprovechara decir otra
en el campo. cosa, porque ya estaba caído en lazo, y el tirano
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 57

volvió a sus soldados y les dijo: ea, Marañones, envió el tirano por todas las casas del pueblo a saber
limpiad vuestros arcabuces que ya tenéis licencia que mercaderías, y vino y comidas había, y algunas
para ir con vuestras armas, y a aquella hora cosas de las que había tomaron luego y las llevaron
dispararon gran suma de arcabucería haciendo a la fortaleza para repartirlas entre sí, y las demás
salva y parecieron muchas cotas y lanzotes y agujas, por inventario dejaban en las casas que las hallaban
y el tirano se fue otra vez a hablar con sus soldados, encerradas, llevando las llaves, y mandaban so pena
y el gobernador y los que con él estaban se apartaron de la vida que no tomasen nada dellas. Tomaban
un poco hablando entre ellos, que les parecía mal todas las armas que hallaban por las casas, hallaron
tantas armas y arcabuces, y trataban qué manera y tomaron mucha cantidad de ropa y otras
tendrían para quitárselas. Llegó otra vez el tirano mercaderías que estaban por de Su Majestad de un
con ciertos de sus soldados armados y les dijo, no navio sin registro que habían tomado en la dicha
con tanto acatamiento como primero, señores isla, y todas las repartieron entre sí. Hallaron la
nosotros vamos al Perú y vamos informados que isla la más rica que habrá estado desde que se pobló,
hay allá muchas guerras, y que aquí no nos han de de mercaderías y comida, y los vecinos muy
hacer vuestras mercedes tan buen tratamiento, ni proveídos de cosas de sus casas; la mayor parte de
nos han de dejar pasar allá, por tanto conviene que los cuales los tiranos robaron cuanto tenían, hasta
vuestras mcrcedes dejen las armas y que sean dejarlos desnudos que era lástima ver algunos
presos, y esto no más de para que con brevedad se dellos. Mandó luego el tirano buscar y recoger todas
nos dé aviamiento, y el dicho gobernador rehusó y las canoas y piraguas que había en la isla, y
se retiró un poco, diciendo qué es esto, qué es esto? quebrarlas todas, y esto porque no se huyese alguna
Pero poniéndoles en los pechos muchas lanzas y gente que diese aviso de su venida.
arcabuces les quitaron las armas y varas, y
Luego el dicho tirano echó en prisiones al
asimismo desarmaron y quitaron los caballos a
gobernador y al alcalde Manuel Rodríguez, y a un
algunos vecinos, y luego el dicho tirano mandó a
Gaspar de Plazuela mercader, porque dijeron que
gran priesa que toda su gente marchase camino del
había mandado esconder un barco que tenía que
Perú, y subiendo en el caballo del dicho gobernador,
había venido de Santo Domingo cargado, y lo
le dijo que subiese a las ancas y él no quiso como
quisieron matar, y lo hicieran si no viniera el barco.
estaba corajudo y enojado, y el tirano se apeó y dijo,
Algunos soldados que había en la isla, deseosos de
ea, pues marchemos todos a pie! Y habiendo
chirinolas, se juntaron con los dichos tiranos y les
caminado un poco toparon con el maese de campo
ayudaron a robar y a destruir, y recibieron dél pagas,
y la gente del otro bergantín, y el dicho D. Juan
y le prometieron de seguirle y ayudarle en todo y
cansado de venir a pie, y viendo lo poco que le
algunos mejor que sus amigos marañones. Estos le
aprovechaba el enojarse, subió a las ancas del
descubrieron muchas cosas que los vecinos tenían
caballo en que el tirano Lope de Aguirre venía, que
escondidas que como eran de la tierra no se les podía
le tornó a convidar que subiera; y desde a poco se
encubrir nada; y estos mismos le dieron aviso de
apartaron el maese de campo y otros soldados a
un navío grande que estaba cerca de allí en la costa
caballo y llegaron al puerto de la isla a hora de medio
de tierra firme, que le tenía un fray Francisco
día, y hallaron toda la gente descuidada, y segura
Montesinos, provincial de los frailes dominicos que
que no sabía nada de todo lo pasado, y entraron
estaba allí con cierta gente y tenía poblado un pueblo
por un valle corriendo encima de sus caballos, y
en Maracapaña entendiendo en la conversión de los
apellidaron libertad libertad, viva Lope de Aguirre,
naturales por mandado de Su Majestad, y le dijeron
y se metieron en la fortaleza que estaba abierta y se
al tirano que con facilidad y poca gente lo tomaría;
apoderaran della, y otros fueron por el mismo pueblo
y luego el tirano despachó un capitán suyo llamado
con el mismo apellido desarmando cuantos topaban Pedro de Munguía con 18 soldados para que fuese
y desde a poco llegó el tirano con la demás gente y a tomar el dicho navío, y llevaron por guía un negro
presos, y él y otros muchos fueron con hachas a de la isla muy diestro en aquella costa, y en el
cortar el rollo que estaba en la plaza del pueblo, y le camino tomaron el navio del Plazuela que estaba
dieron muchos hachazos, y como era de guayacán preso, y un Diego Hernández, portugués con cuatro
muy duro, no le acabaron de cortar que se cansaron, soldados se metió en él y lo llevó al tirano, y él con
y mientras lo cortaban decían muchas palabras los catorce siguió su viaje. Mandó el tirano a todos
contra nuestro Rey y Señor denostando su persona; los vecinos de la isla que con brevedad trajesen 600
y luego fueron a una casa donde estaba la caja de carneros, y algunos novillos, cazabe y maíz para el
las tres llaves de Su Majestad y sin pedir las llaves matalotaje, repartiendo entre cada uno tanto. Hizo
la hicieron pedazos y la quebraron, y lo que en ella así mismo repartimiento de todos sus soldados por
había robaron, rompiendo los libros de las cuentas las casas de los vecinos para que en cada una diesen
reales y hecho ésto, el tirano mandó echar bando de comer a tantos soldados, comían y estaban de
que todos los vecinos, estantes y habitantes en la día en las casas y el tirano en la fortaleza con toda
isla trujiesen luego ante sí las armas que tuviesen, su guardia y amigos, y de noche dormían en la
pena de muerte, y que los que estaban en el campo fortaleza todos juntos en una playa, y el tirano con
se recogiesen al pueblo so la misma pena, y no los que he dicho dentro della. Otro dia mandó
saliesen sin su licencia; y luego trajeron a la fortaleza ahorcar sin confesión a un Enríquez de Orellana
de casa de un mercader una pipa de vino, y en medio que era capitán de munición porque estaba mal con
de dos horas se la bebieron toda. Este mismo día él, y porque dijo que se había emborrachado el
58 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

día que entraron en la isla, y dio este cargo a Antón oidores, obispos, gobernadores y arzobispos,
Llamoso su sargento. Tenía siempre gran guardia letrados y procuradores que pudiese haber a las
en su perstona, y de noche en el pueblo y caminos manos, porque estos y frailes tenían destruidas las
había muchas centinelas, rondas y sobrerrondas Indias, y que había de matar a todas las malas
de a pie y de a caballo porque no saliese nadie sin mujeres de sus cuerpos, porque estas eran causa
que éllo supiese. Hizo un parlamento a los vecinos de grandes males y escándalos en el mundo; de que
de la isla amonestándoles que no huyesen porque por una que el gobernador había llevado consigo, le
no les quería hacer mal ni daño, sino que les pagaría habían muerto a él y a otros muchos. Luego mandó
muy bien lo que había tomado y lo demás que quemar y echar al través los bergantines que habia
tomase y preguntó como vendían las gallinas y traído a la isla, porque no se fuese alguno al Perú a
ganado. Fuéle dicho que las gallinas valían a dos dar aviso de su venida; y esto por parecerle que
reales, díjoles que eran baratas y que las vendiesen tenía cierto el navío del fraile, por haber enviado
a tres, y que el tomar ganados y cosas lo pagaría a por él a su capitán Munguía. Porque un vecino de
más precio que podía valer, y desta suerte si la isla llamado Alonso Pérez de Aguilera se huyó del
compraba alguna cosa no gastaba mucho tiempo pueblo, fue el dicho tirano en persona a su casa
en concentarse, antes liberalmente prometía por ello con muchos soldados así de los marañones como
todo lo que le pedían como hombre que no pensaba de los de la tierra que se juntaron, y se la hizo
pagarlo, más de darles contento. destejar y derribar, y le robaron cuanto tenía en la
casa y estancias y le mataron sus ganados; y al
Desembarcado que fue el tirano en esta isla séptimo o octavo día de su llegada a la isla mandó
se le huyeron cuatro soldadas deseosos de servir a matar a un capitán suyo de sus mayores amigos
Su Majestad y se escondieron en el monte, el uno llamado Juan de Juriaga vizcaino de su patria,
llamado Francisco Vázquez, y otro Gonzalo de porque era hombre de bien y se temió dél que le
Zúñiga, y otro Juan de Villatoro, y Luis Sánchez del dijeron que tenía y llegaba amigos, y que a su mesa
Castillo, por lo cual el dicho tirano andaba muy comían algunos soldados. Estando una noche
bravo, y pateaba y bramaba y culpaba al gobernador cenando con sus amigos en su posada, llegó el maese
y a los demás vecinos que tenía presos, diciendo de campo Martín Pérez con ciertos arcabuceros, y
que ellos tenían escondidos los dichos soldados, y levantándose el Juriaga de la mesa a recebirlos le
que no se les podían esconder en su tierra. Prometió dieron ciertos arcabuzazos de que murió, y así le
de dar por cada uno de los soldados doscientos pesos dejaron aquella noche, y otro día de mañana le
y otros prometimientos varios; decía más que la enterraron con gran pompa y banderas, arrastrando
redención de la isla estaba solo en que le trajesen y tocando a tambores roncos. Y como este tirano
aquellos cuatro soldados; y mandó a los que en la era malo y perverso, así era enemigo de los buenos
isla se le habían llegado que pues sabían la tierra y virtuosos, y poco a poco vino matando todos los
que pusieran diligencia de buscarlos acompañados más hombres de bien del campo temiéndose dellos;
de otros sus amigos marañones; y así mismo que si hacían oficios de buenos no habían de
algunos vecinos de la isla movidos por ventura de consentir que el mal hombre viviese entre ellos y
la codicia de la paga o de los ruegos de D. Juan su los mandase. Por consiguiente era amigo de la gente
gobernador que estaba preso y temeroso de la baja y mala, de los cuales se fiaba y los tenía por
muerte, y por el provecho de su patria a quien el grandes amigos, por parecerle que estos tales no
tirano amenazaba con daño y destrucción, los fueron tendrían ánimo para matarle, y que entre ellos vivía
a buscar, unos por una parte y otros por otra, y más seguro. Entendía los más de los días en hacer
aún con mandamientos del dicho gobernador para alardes y formar escuadrones, imponiendo la gente
que los prendiesen y trujesen ante el tirano pusieron como había de pelear; decíales que no habían de
gran diligencia en esto, y hallaron los dos dellos, al matar a ninguno de los que contra él viniesen, si no
Castillo y al Villatoro, y los trujeron presos al dicho fuese al Rey en persona, y que a los demás habían
tirano y luego el traidor los mandó colgar del rollo de desbaratar con mañas y ardides de guerra de
sin confesión, fue ese un mal caso porque muchos que se preciaba harto más que entendía. Esperaba
que querían huir no lo osaron hacer porque no por horas a su capitán Munguía a quien él había
sabían la tierra y vieron que los vecinos de quienes enviado a tomar el navío del fraile, y como le parecía
que tardaba estaba triste y teníalo a mala señal, y
pensaban favorecerse, buscaban y traían los que
amenazaba de muerte a todos los de la isla, y decía
huían. Al Francisco Vázquez y Gonzalo de Zúñiga,
que si el dicho capitán y soldados eran muertos o
aunque pusieron gran diligencia en buscarlos, ellos
presos que había de matar hasta los niños de toda
se escondieron tan bien que no los hallaron, y
la isla y asolar la tierra, y por ellos había de matar
principalmente por Dios que los ayudó.
mil frailes, y luego le vino nueva que el navío del
Este día mandó el tirano matar a un fraile fraile venía y no supo por quién, y estaba suspenso,
dominico que vio travesar por la plaza, y compelido hasta que de un negro que había venido en una
por ruegos de los de la isla lo dejó por entonces. piragua de Narcapaña, supo cierto como el capitán
Decía este tirano que tenía prometido de no dejar Munguía y los soldados que con él fueron se habían
vivo a ningún fraile de cuantos topase, salvo a los reducido todos al servicio de Su Majestad y avisado
mercenarios porque estos solo decía que no se el fraile de la venida del tirano y de todo lo que
entremetían en los negocios de las Indias, y que pensaba hacer, y que el fraile con ellos y con la
había de matar asimismo a todos los presidentes y demás gente que tenía venía en su navio a destruirle
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 59

y hacerle guerra, por lo cual el tirano hacía grandes saliose fuera y pidiendo confesión y llamando al
bramuras y echaba espumarajos: decía grandes general lo acabaron de matar degollándolo con una
amenazas contra el fraile y los dichos soldados, y daga y así mismo dieron garrote al alcalde y otros
contra los de la isla, a los cuales mandó luego regidores y a un fraile dominico, y luego los ministros
prender a todos con sus mujeres, y los llevaron a la del diablo fueron y mataron al maese de campo en
fortaleza. Mandó luego echar más prisiones al la fortaleza y fue tan grande el escándalo, ruido y
gobernador D. Juan y a Manuel Rodríguez alcalde alboroto cuando le mataron que los vecinos y
y a los demás vecinos, para todos los que hubo mujeres de la isla que allí estaban presos en la dicha
prisiones, y tratando a todos mal de palabra decía fortaleza, entendieron que a todos los quería matar,
que había de hacer correr arroyos de sangre por la y en especial las mujeres que unas se metían debajo
plaza de la Margarita de los vecinos della, y luego de las camas y otras tras las puertas y en los
en caballos que había tomado a los vecinos mandó rincones de la fortaleza, y una Marina de Trujillo,
poner de sus soldados a trechos desde el pueblo mujer de un Fernando Riberos, se arrojó por una
hasta el puerto de la isla que llaman la Punta de las ventana abajo de la fortaleza a la calle, y dio gran
Piedras, donde tuvo nueva que venía a desembarcar golpe por ser mujer carnuda pero del miedo que
el dicho fraile: aqui volvió el cargo de alférez general
llevaba no lo sintió y se fue luego a esconder, y de
a Alonso de Villena, que antes lo era en tiempo de
las almenas de la dicha fortaleza se arrojaron un
su príncipe, que se lo había quitado como se ha
Domingo López y otro Antonio de Angulo, vecinos
dicho.
de la isla sin hacerse mal, se fueron huyendo al
monte; y el tirano se asomó a una ventana de la
Muerte del gobernador D. Juan de Villandrando fortaleza y desde allí dijo a la gente que estaba en la
plaza alborotados, que no sabían qué ruido era el
Un sábado a medio día fue avisado el tirano, de dentro de la fortaleza, como había muerto a
como el navío del fraile provincial había tomado el
Martín Pérez su hijo y maese de campo porque le
dicho puerto de la Punta de las Piedras, que es en
querían matar y no nombró al gobernador ni a los
dicha isla, cinco leguas del puerto y le dijeron que
demás, y así se sosegaron con esto que les dijo.
traía mucha gente de guerra con indios flecheros y
el cruel tirano muy enojado y bravo blasfemaba de A esta sazón estando el maese de campo
Dios y de sus santos; andaba muy orgulloso con muerto tendido en el suelo, y por muchas heridas
sus soldados, apercibiéndolos para pelear con el que tenía en la cabeza pareciéndosele los sesos y
fraile, pensando que traía mucha gente y con este corriendo sangre, un capitán de la munición del
temor y por prender más soldados porque no se le tirano, que era grande amigo suyo, llamado Antón
osasen huir y se pasasen al fraile, diciendo de los Llamoso, que había sido uno de los que dijeron al
enemigos lo menos, mandó que bajasen a una tirano que era en el concierto de matarlo con su
cámara baja que está en la dicha fortaleza a donde maese de campo, estaba allí, y estándole el tirano
estaba el gobernador y Manuel Rodríguez alcalde y diciendo, y vos hijo Antón Llamoso también dicen
un Cosme de León alguacil mayor y un N. Cáceres que queríales matar a vuestro padre, el cual negó
regidor y otro Juan Rodríguez criado del gobernador, con grandes reniegos y juramentos y pareciendo que
todos en las prisiones, y el tirano bajó donde estaban satisfacía más arremetió al cuerpo del maese de
harto afligidos y por consolarlos les dijo que no campo delante de todos, y tendiose sobre él y le
tuviesen miedo ni pena que él los prometía y daba chupó la sangre que por las heridas salía y a vueltas
su palabra, que aunque el fraile trujese más le chupó parte de los sesos diciendo: a este tirano
soldados que cordones y árboles había en la traidor beberle la sangre, que causó grande
Margarita (que no hay en ella otra cosa) y aunque admiración a todos. Quitó luego el tirano la capitanía
todos sus soldados muriesen, que ninguno dellos a un Nicolás de Sosaya, porque también se tuvo
había de morir, que tuviesen por cierto lo que él les sospecha que era con el maese de campo, diolo a
aseguraba, y con esto los dejó algo contentos y un Roberto de Sosaya Barbero muy su amigo.
consolados, pero el dicho tirano tenía tal condición, Mandó el tirano a todos los vecinos de la isla que
conforme a su mala vida y obras, que jamás a gran tenía presos que se fuesen a sus casas con sus
maravilla cumplía palabra que daba, y cuando mujeres, y que de ahí a delante viviesen seguros y
aseguraba a alguno entonces lo quería matar o sin miedo que ya eran acabadas todas las muertes
dañar como en estos se pareció este dia. En y crueldades, porque su maese de campo, a quien
anocheciendo mandó que se fuesen a sus casas el ya había muerto, las causaba todas: en lo cual
los vecinos de la isla y todas las mujeres que tenía mintió, porque el maese de campo no hacía cosa
presas porque no entendiesen lo que quería hacer; ninguna sin su mandado, y aún creo que matara
y después de todos idos a buen rato de la noche muchos más, sino que el maese de campo le
vino el dicho tirano donde estaba el gobernador y estorbaba con ruegos.
todos los que habemos dicho y un Francisco de
Carrión, alguacil mayor del dicho tirano, y con él Pasado todo esto que habemos dicho, un
otros soldados y negros con cordeles y garrotes y martes por la mañana llegó el navío del provincial
fueron primero al gobernador y le dijeron que se al puerto y surgió en este casi desviado media legua
encomendase a Dios que había morir, y él respondió de la fortaleza, y el dicho tirano como le vio surto
que como era aquello, que el general Lope de Aguirre pasó su gente en orden, y con cinco falconetes de
no había mandado tal, y el tirano a aquella razón bronce y uno de hierro, que tomó en esta isla, salió
60 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

por la playa adelante pensando que podían saltar sino fuera por su extremado oficial de hacer jarcia.
en tierra; y el dicho tirano y sus soldados de la tierra Rodrigo Gutiérrez es cierto hombre de bien si siempre
y los del fraile de unas piraguas en que habían no mirase al suelo, que es señal de gran traidor, y sí
entrado para hacer ademán de tomar tierra; se acaso ha aportado allá un Gonzalo de Zúñiga
llamaban unos a otros de traidores y se dijeron otras cejijunto, téngase vuestra paternidad por un gran
muchas palabras de afrenta, pero nunca saltaron chocarrero, y sus mañas estas: él se halló con Alvaro
en tierra, y así estuvieron todo aquel día en el puerto de Oyón en Popayán en el rebelión y alzamiento
con estandartes reates alzados en el navío; y visto contra Su Majestad y al tiempo que iban a pelear
por el tirano que no saltaban en tierra se voló con dejó a su capitán y se huyó, y ya que se escapó dello
su gente a la fortaleza y desde allí escribió una carta se halló en Perú en la ciudad de San Miguel de Pirura
al dicho provincial, que dice desta manera. con F. de Silva en un motín, y robó la caja del Rey y
mataron la justicia, y así mismo se le huyó. Hombre
es que mientras hay que comer es diligente, y al
Carta del Tirano Lope de Aguire al Padre Provincial
tiempo de la pelea huye siempre, aunque sus formas
Muy magnífico y reverendísimo señor. Mas no pueden huir. De solo un hombre me pesa que no
quisiéramos hacer a vuestra pater nidad el está aqui, y es Salguero porque teníamos gran
recibimiento con flores y ramos que no con arcabuces necesidad dél que nos guardara este ganado que lo
y tiros de artillería, por habernos aquí dicho muchas entiende bien. A mi buen amigo Martín Breno, y Antón
personas ser más que generoso en todo, y cierto por Pérez, y Antón Díaz besó las manos, y a Munguía y
las obras vemos que hoy en este día ser más de lo Artiaga, Dios los perdone; porque si estuvieran vivos
que nos decían, por ser tan amigo de las armas y y no hubieran muerto, no tengo por posible negarme,
ejercicio militar, como lo es vuestra paternidad, así cuya muerte o vida suplico a vuestra paternidad me
vemos que la cumbre de nuestra nobleza y virtud la haga saber, aunque también queríamos que todos
alcanzaron nuestros mayores con la espada en la fuésemos juntos, siendo vuestra pater nidad
mano. Yo no niego, ni menos todos estos señores que patriarca, porque decir puede creer en Dios el que no
aquí están, que no salimos del Perú para el rio es más que otro, no vale nada; y no vaya vuestra
Marañón a descubrir y poblar, dellos cojos y dellos paternidad a Santo Domingo, porque tenemos por
sanos, y por los muchos trabajos que hemos pasado cierto que le han de desposeer del trono en que está,
en el Perú, si halláramos tierra por miserable que y para eso césar o nihil. La respuesta suplico a
fuera paráramos en ella por darles descanso a estos vuestra paternidad me escriba, y tratémonos bien y
tristes cuerpos que están con más costuras que ropas ande la guerra, porque a los traidores Dios les dará
de romero; mas con la falta que digo y mucho trabajo la pena, y a los leales Dios los resucitará y el Rey,
que hemos pasado, hacemos cuenta que vivimos de aunque hasta ahora no habemos visto que el Rey
gracia según el río y la mar y la hambre nos han resucitara a ninguno, ni sana heridas, ni da dádivas.
amenazado con la muerte, y así los que vinieron Nuestro Señor la muy magnífica y reverendísima
contra nosotros hagan cuenta que vienen a pelear persona de vuestra paternidad guarde, y en gran
con los espíritus de los hombres muertos; y si los dignidad acreciente. Desta nuestra fortaleza de la
soldados de vuestra paternidad nos llaman traidores, Margarita besa las manos de vuestra paternidad su
débelos castigar que no digan tal cosa, porque servidor Lope de Aguirre.
acometer al Rey D. Felipe de Castilla no es sino de
A esta carta respondió el provincial, y yo no
generosos y de grande ánimo porque si nosotros
he visto la respuesta, mas de que en suma le decía
tuviéramos algunos ofícios ruines, diéramos orden a
las vidas, mas por nuestros hados no sabemos sino que Munguía y Artiaga estaban vivos y eran muy
hacer pelotas y amolar lanzas, que es la moneda que servidores del Rey y que ellos y todos se habían
por acá corre, si hay por allá necesidad deste pasado a su servicio como sus leales vasallos y
menudo, todavía proveeremos a vuestra paternidad que le rogaba por Dios que dejase de hacer más
con hacerle entender lo mucho que el Perú nos debe daño en la isla, y que principalmente le encargaba
y la mucha que tenemos para hacer lo que hacemos; la honra de los templos y mujeres. La venida del
creo que será imposible este efecto. No diré aquí nada, provincial al puerto hizo más daño que provecho
mañana placiendo a Dios enviaré a vuestra porque se dijo que si no viniera nunca el tirano
paternidad todos los traslados de los autos que entre matara a D. Juan de Villandrando ni a los demás
nosotros se han hecho, estando cada uno en su que mató, y ya que había venido saltara en tierra
libertad como estaban, y esto digo para que vean aunque fuera lejos del pueblo y se juntara con los
que descargo piensan dar esos señores que ahí están, vecinos de la isla, que mucho andaban al monte,
que juraron a D. Fernando de Guzmán por su Rey y que pudiera ser que algunos soldados del dicho
se desnaturalizaron de los reinos de España y se tirano viendo que tenían quien los favoreciese y
amotinaron y alzaron con un pueblo y usurparon la recogiese con la voz de Su Majestad en la isla, se
justicia, y los desarmaron a ellos y a otros muchos huyeran muchos que estaban contra su voluntad,
particulares y les robaron las haciendas, y entre y no se osaban ir por que no sabían la tierra ni
los demás Alonso Arias sargento mayor de D. donde guarecerse del tirano, ni lo osaban hacer,
Fernando y Rodrigo Gutiérrez su gentil hombre; de porque habían visto que los vecinos y gente de la
otros señores no hay para que hacer cuenta porque isla los buscaron y trajeron al tirano a algunos de
es chafalonía, aunque de Arias tampoco la hiciera los que se habían huido y desta manera el tirano
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 61

por ventura desbaratara y saliera de la isla más acreditarse en algo con los que estaban presentes,
presto y con menos poder que salió; pero en esto se que no porque se entendiese de él que castigaría a
há de formar el santo ce1o del provincial, que su ninguno que hiciese lo contrario, según su
intención fue buena y de aprovechar a todos, y los condición. Dijo aquí a sus soldados, que él había
demás atribuirse a Dios partido desta isla el hecho nuevo Rey, que había de hacer nueva ley para
provincial fue luego con toda brevedad a Santo en que viviesen sus secuaces y amigos.
Domingo a dar aviso de la venida del tirano, y de
Estándose acabando el navío se dijo que su
camino avisó a la Borburata y toda aquella costa de alférez general llamado Alonso de Villena le quería
tierra firme. matar y alzar bandera por el Rey y dando parte desto
Como el cruel tirano había quemado los a ciertos soldados del dicho tirano para que le
bergantines y echado a través en que vino a la isla, ayudasen, ellos se lo dijeron al dicho tirano, y que
teniendo por cierto que tomara su capitán Munguía enviando a matar al dicho su alférez, él lo sintió y
el navío del provincial y se lo trujera, y como su se huyó al monte, y lo que desto se creyó y tuvo por
pensamiento le salió contrario, viendo que en tres cierto en la dicha isla Margarita, y después de ido el
barcos que allí había tomado no podía irse toda la tirano se platicaba, fue que temiéndose de su muerte
gente por ser pequeños determinó acabar un navio el dicho Alonso de Villena, y que el dicho tirano le
que tenía armado el gober nador D. Juan de quería matar, que habia reñido con él y estaba dél
Villandrando, y enviando a buscar ciertos carpinteros enojado, y el Villena por el peligro se quisiera apartar
que andaban huídos por la isla, los mesmos vecinos de su compañía, y no lo osaba hacer porque era
se los trujeron y los hizo trabajar en el fiestas y uno de los tres que mataron a Pedro de Ursua, su
domingos hasta que se acabó la obra, que tardaron gobernador, y había sido muy de ánimo en todas
más de veinte dias. En ese tiempo derribó y quemó 1as cosas de la tiranía, porque temía que después
la justicia le mataría, y así teniendo ya determinada
muchas casas de vecinos de la isla que se habían
y aparejada su vida, dijo a ciertos soldados que él
ido al monte, y les robaron mucha ropa y hacienda y
quería matar al tirano y que lo avisasen, y dijo tan
les mataron todos sus ganados. Mató el tirano en
en público que el tirano por fuerza lo hubo de saber
ese tiempo a un Martín Díaz de Almendarez, primo
y luego se huyó como tenía acordado, al tiempo que
hermano del gobernador Pedro de Ursua, al cual el
el tirano estaba de camino porque no hubiese tiempo
dicho tirano desde que mataron al gobernador Ursua
para lo buscar, y eso lo hizo para tener alguna
le había traído a manera de preso y desarmado, y
manera de descargo con la justicia. Que le quisiese
habiéndolo dado licencia para que se quedase en la
matar, o no, eso se dijo y fue público en la dicha
isla, y que el Martín Díaz. se había ido del pueblo a isla después que de ella se fueron los tiranos. Mató
una estancia, envió el tirano a ciertos soldados que así mismo a un alférez de su guardia llamado
lo matasen, y ellos le dieron garrote y le mataron. Domínguez, que era amigo del dicho Villena, y se
Dijo el tirano a sus soldados que había muerto a pensó que era con él en el motín, matóle según se
Martín Díaz porque tenía propuesto de no dejar dijo Juan de Aguirre que era mayordomo del tirano,
enemigos atrás, y que su placer era matar enemigo y y el más su amigo y de su apellido; mató a otro
poner su vida por sus amigos. soldado llar mado Loaysa también de sus
En ese tiempo, que fue día de Nuestra Señora marañones, ahorcó a una mujer de un vecino de la
isla, llamada Ana de Rojas, porque dijeron al tirano,
de la Asunción, que llaman de agosto, fue el dicho
que el Villena entraba muchas veces en casa desta
tirano con todos sus soldados en ordenanza a la
mujer, y que allí se concentraba el motín, y que ella
iglesia mayor del pueblo a bendecir ciertas banderas era sabidora dello, y la ahorcaron en el rollo de la
de sus capitanes, y el iba adelante de la ordenanza plaza y la tiraron muchos arcabuzazos. Envió así
como capitán general, y acaso vio un rey de naipes mismo a matar al marido de la dicha Ana de Rojas,
en el suelo, al cual pateò y hizo pedazos diciendo que se llamaba Diego Gómez, que era un hombre
muchas blasfemias y palabras injuriosas en desacato viejo y enfermo que estaba curándose en una
del Rey Nuestro Señor, como otras veces solía, y no estancia, una legua del pueblo. Mataron a él y a un
solamente hacía esto, pero blasfemaba y renegaba fraile dominico que con él estaba, dándole garrote y
de Dios sumo Rey y Señor de todos, y así mismo robándole cuanto le hallaron en la estancia;
hacían otros muchos soldados amigos suyos que por volvieron al pueblo, donde el tirano mandó a estos
le imitar y dar contento blasfemaban y renegaban sus diabólicos ministros, que ya que habían muerto
continuamente del Rey y de Dios, y acabadas de un fraile, que matasen otro su compañero que estaba
bendecir las dichas banderas las entregó a sus allí en el pueblo, que era así mismo dominico, con el
cual este malvado se había confesado, y a la hora le
capitanes y alferez y les dijo que aquellas banderas
mataron estos traidores sayones, y le metieron en
que les daba las podían defender de todo el mundo,
una casa, y queriéndole matar, el fraile les rogó que
y que no les encargaba ni mandaba más de que
primero le dejasen un poco encomendarse a Dios, y
mirasen por la honra de los templos y de las mujeres, tendióse en el suelo boca abajo y rezó el salmo, misere
y que en los demás viviesen como les pareciese y en mei, y otras oraciones, aunque los traidores no le
la ley que quisiesen, que a nadie le iría a la mano; y dieron mucho espacio, y levantándose del suelo se
aún estas dos cosas de los templos y mujeres se creyó encomendó a Dios, y les dijo que aquella muerte él
que lo hizo más por no parecer del todo hereje, mal la tomaba por Dios, que se la diesen la más cruel
cristiano, como la fama corría y lo era, y para que pudiesen, y así le dieron garrote el cordel por
62 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

la boca hasta que se la hicieron pedazos, y como no de 1a mar, y el tirano echó mano a su espada sin
se ahogaba presto le pasaron el cordel al pescuezo. más razón, y le dio una cuchillada que casi le derribó
Creese piadosamente que el fraile murió mártir por un brazo en el suelo; otros dijeron que el tirano
algunas repreensiones que en la confesión debió de estaba enojado deste soldado porque había dicho
dar al dicho tirano; pasado esto, mandó el tirano que tres caballos y un macho que el tirano llevaba
ahorcar a un N. Somorrostro vecino de la isla, que en los bergantines ocupaban mucho, y que por amor
era un hombre viejo, porque cuando llegó el tirano a dellos no cabía la gente. Mandó luego que fuesen a
la isla se había ofrecido a ir con el dicho tirano, y al curar al dicho soldado, y llevándolo a curar se
partir se le pidió licencia para quedarse, y él se la arrepintió y mandó que le acabasen de matar, y así
dio, y así le dejó colgado en el rollo. lo hicieron. Luego fue este tirano con algunos de
Cuando casi ía el tirano de camino, ya el navio sus amigos a casa de un clérigo llamado Contreras,
en el agua mandó ahorcar a una mujer de la isla cura de la isla, y lo trujo a los navíos y lo embarcó
llamada N. de Chaves, porque de su casa se huyó consigo harto contra la voluntad el clérigo, aunque
un soldado de los que en esta isla se le llegaron, el tirano le prometió grandes dádivas y que le había
porque decía que esta mujer lo supo y no le dio de hacer obispo del Perú.
aviso. Muchos soldados de la isla, que se habían He contado todas las maldades, tiranías y
ofrecido a ir con el dicho tirano, viendo sus crueldades que este tirano hizo en la dicha isla
crueldades y tiranías se le habían ya huído, era tan Margarita; ahora diré lo que narró un sacerdote
cruel y malo que a los que no le habían hecho mal honrado de la dicha isla, lo cual es digno de contar
los mataba sin causa ninguna, como se ha dicho para tomar ejemplo, y fue, que antes que el tirano
atrás, y a otros que tampoco le habían hecho porque, llegase a la dicha isla algunos días, sucedió entre
que él no tenía voluntad ni causa de matarlos, ciertos soldados una pendencia, de suerte que el
porque nadie se escapase dél y tuviesen que contar uno de ellos afrentó al otro y luego se fue a retraer
los afrentaba, y mandó que le trajesen un mancebo
a la iglesia de la isla, a donde entendió estar seguro,
que estaba en la isla que no le había venido a ver, y
pero acudió luego el gobernador D. Juan de
en pena de su descuido mandó que lo rapasen la
Villandrando y los alcaldes y alguaciles y otra gente
barba lavándosela primero con orines hediondos, y
del pueblo que traía consigo, y procuró con muchas
le mandó que pagase al barbero, y le hizo traer cuatro
venas sacar al dicho retraido, y aunque los clérigos
gallinas por paga, y a otro soldado de sus marañones
se lo estorbaban no bastó, el retraído viendo que
llamado N. Cayado, que no era hombre de quien él
tan de hecho iba el negocio y que no le valía la casa
hacía cuenta, ni le quería matar, porque se descuidó
de Dios, abrazóse con la caja del Santísimo
un día de venir al escuadrón, le mandó así mismo
Sacramento muy aferrado con ella, pero no le bastó,
rapar la barba en el rollo de la plaza, y que se la
porque sin respeto ninguno le arrebataron y trujeron
lavasen con el mismo labatorio que a el otro.
por las gradas del altar arrastrandolo, y él con la
Ya que el navío estaba acabado del todo, y el caja del santísimo Sacramento rodando por aquel
tirano que se quería partir, vino a la isla un Francisco suelo, sin tener más respeto que si fuera un indio,
Fajardo, vecino de la provincia de Caracas, que es cosa que a todos los que allí se hallaron
en la gobernación de Venezuela, con cientos indios desapasionados puso en mucha admiración, y más
flecheros y herbolarios en socorro de los vecinos de a los clérigos que vían tratar a su Dios de aquella
la dicha isla, y se puso en un monte media legua suerte sin poderlo remediar, en este medio vino a la
del pueblo, entre las estancias, y dijeron que por dicha isla el provincial Montesinos y le contaron
esto no las quemó el dicho tirano, que tenía todo lo que había pasado, de lo cual el quedó bien
determinado de hacerlo porque no osó enviar gente admirado por ser hombre de buena vida y ejemplo,
a ello, porque no se le huyesen sus soldados, que y predicando un día el otro provincial en la iglesia
algunos lo habían comenzado a hacer; y ponía gran mayor de la dicha isla, entre otras cosas y
miedo a los soldados con el dicho Fajardo y sus reprensiones afeó este negocio, culpando al
indios, diciendo mataban a todos los que se huían, gobernador y a todos los que fueron en ello, y los
y que no perdonaban a nadie, y al tiempo que se dijo claramente: mirad señores y justicias la ofensa
quiso embarcar, con el temor que tuvo de que se le que habéis hecho contra nuestro Rey y Señor, y
huyesen sus marañones y que Francisco Fajardo al contra Dios; pues yo os doy mi palabra que del cielo
tiempo dél embarcar no diese en ellos con los indios, y de la tierra habéis de tener un castigo notable,
y con el alboroto y favor no se le pudiesen huir los que os acordéis dél para mientras fuéredes vivos.
que quisiesen, encerró la gente en la fortaleza y Acabado el sermón el provincial se fue su viaje a
cerrando la puerta de ella hizo un portillo por las tierra firme, y no pasó un mes cabal cuando el tirano
espaldas frontero de su navío, y por una escalera vino a la dicha isla y hizo el castigo que hemos
uno a uno hizo salir a todos y que luego se contado, cosa notoria es y sabida, permitir Nuestro
embarcasen, y estando casi toda la gente Señor Dios que venga un mal hombre a castigar a
embarcada, sino era el dicho tirano con algunos de sus siervos como aquí sucedió, que padecieron
sus amigos en la playa, llegó a él un soldado amigo muchos sin culpa, por la culpa y ofensas que los
suyo de los más prendados, que se llamaba Alonso otros hicieron. He querido decir esto para que se
Rodríguez almirante, y le dijo que se desviase un entienda la mucha reverencia que debemos
poco más afuera porque le mofaban todas las olas tener a nuestro Criador y Redentor y a su templo
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 63

de oración y a sus ministros y a los que gobiernan y navíos repartió la gente de quien él más se fiaba a
mandan repúblicas, como deben mirar estas cosas quien encomendó la guarda dellos, y los tres seguían
con mucho cuidado y cristiandad, porque haciendo al en que iba el tirano, que era el mayor y más ligero.
esto todas sus cosas irán bien encaminadas, y Antes de llegar a la Borburata tuvieron muchas
también se puede tomar ejemplo en el gobernador calmas y vientos contrarios por manera que tardaron
Pedro de Ursua y todos cuantos fueron en el agravio en llebar a la Borburata desde la dicha isla, ocho
que se le hizo al padre Portillo. días, que es camino que de ordinario se anda en
tres o cuatro; no hubo en todo el viaje cosa que de
Estuvo el tirano en la isla Margarita 40 dias y
contar sea, más que solo blasfemaban el tirano y
más, dejándola tan perdida y asolada y robada de
sus amigos, que como no tenían el tiempo como
servicio y ganado y comidas y otras cosas, que los
querían de Dios y de sus Santos y de los tiempos y
que en ella quedaron no pueden sustentarse sino
vientos decían herejías, y el tirano, algunas veces
con mucho trabajo, y habiendo hecho en ella las
enojado desto, decía que no creía en Dios si Dios
crueldades que he dicho y otras muchas más, mató
era bandolero, que hasta allí había sido de su bando
el tirano por el río, antes de llegar a esta isla viente
y que entonces se había pasado al de sus
y cinco hombres, y entre ellos al gobernador Pedro
contrarios. Amenazaba de muerte a los pilotos y
de Ursua y a D. Juan de Vargas, su teniente, y a
marineros que llevaban los navíos, porque entendía
Da. Inés, y a un Alonso de Henao clérigo, y al
le llevaban engañado, y que en ellos estaba la falta
comendador Guevara; todos los demás fueron su
de los vientos, y enojado con ellos decía que si Dios
príncipe, capitanes, almirantes, alférez y sargentos
había hecho el cielo para tan civil y ruin gente,
y otros oficiales que este tirano hizo y deshizo; y en
que no quería ir allá; y otras veces alzando los ojos
matando uno destos ponía otro en su lugar y bienes,
al cielo decía, Dios si algún bien me habéis de
armas y servicio; a todos los que mataba iban los
hacer, ahora le quiero y la gloria guardadla para
amigos y herederos forzosos y los llevaban, que eran
los santos; y diciendo estas y otras blasfemias llegó
todos los amigos privados del dicho tirano, y con
al pueblo de la dicha Borburata un domingo a los
esto los tenía propicios, y cada día llegaba más. Mató
siete de setiembre deste año, y en el puerto halló
en la isla Margarita otros catorce de sus marañones,
un navío de mercadurías, que sus dueños viendo
y once de los vecinos de la tierra con dos frailes y
venir al tirano le echaron a fondo con parte de la
dos mujeres, que son por todos cincuenta personas
carga que no pudieron sacar, y el tirano le mandó
los que mató hasta salir de la dicha isla, sin otros
poner fuego y se quemó hasta la gavia.
dos indios ladinos que allí mató, y a todos los más
destos sin confesión. Metió en dicha isla cuando
entró en ella, doscientos hombres muy pocos más De como llegó el tirano a la Borburata
con noventa arcabuces y veinte cotas y quedáronsele
en la dicha isla entre muertos y heridos y otros Domingo 7 de setiembre de 1561 llegó el tirano
dejados por la voluntad del tirano, con los que se Lope de Aguirre y sus marañones al puerto de la
pasaron al fraile con Munguía cincuenta y siete Borburata en la gobernación de Venezuela, y este
hombres, llegáronsele allí hasta once o doce. Halló mismo día hizo desembarcar toda la gente y se
en la isla cincuenta arcabuces y muchas lanzas y alojaron en la playa donde durmieron aquella noche
espadas y seis tiros de artillería, los cinco falconetes y otro día por la mañana envió alguna gente de sus
de bronce y uno de hierro; por esta cuenta sacó de amigos al pueblo, que estará media legua del puerto,
la isla Margarita hasta 160 hombres, y algunos de los cuales no hallaron nadie en todo el pueblo,
los que se huyeron llevarían hasta diez arcabuces, porque toda la gente se había huído al monte de
y quedarle y han hasta ciento y treinta arcabuces y temor del dicho tirano que ya sabían sus maldades;
las seis piezas de artillería, y llevaría casi cien piezas hallaron en el pueblo acaso un soldado de los
de indios y indias de dicha villa, los mejores que marañones que se habían pasado al fraile con
pudo haber; llevó trece caballos y un macho Munguía, llamado Francisco Martín Piloto, el cual
escogidos, y todas las sillas y aderezos de caballos le dijo que se volvió a la compañía del dicho tirano
que pudieron haber, que como supo que ya el Lope de Aguirre, y luego se lo llevaron al puerto y el
Nombre de Dios y Panamá estaban avisados, y que tirano le hizo muchas caricias, y le preguntó por el
él no era parte ya para ir por allí como habia suceso de Pedro de Munguía y Artiaga, y él le dijo
pensado, determinó irse a la Borburata y atravesar que Munguía y Artiaga y Alonso Gutiérrez los habían
toda la gobernación de Venezuela, y al Nuevo Reino engañado a todos los demás, y uno a uno les habían
de Granada y de allí al Perú, aunque también le quitado las armas, y des que los tuvieron así,
salió esta cuenta tan mala como la primera como apellidando la voz del Rey se hicieron con el fraile, y
adelante se dirá, de las sillas que de aquí se sacaron que él y los demás no pudieron hacer otra cosa por
para muchos caballos que pensaba tomar en la estar sin armas, y que él, sabido que había venido a
dicha gobernación. Partió el tirano Lope de Aguirre aquel puerto, le había venido a buscar; que si otra
de la isla Margarita dejándola asolada y destruída, cosa fuera tiempo había tenido para se esconder, y
un domingo postrero día de agosto, en el año 1561, que algunos compañeros suyos andaban por allí
con la gente, armas y municiones de arriba, llevó desnudos y muertos de hambre, y tenían el mismo
toda su gente repartida en cuatro escuadrones, los deseo que él, y que sabida su venida tenía por cierto
tres barcos pequeños y otro grande que era el que le vendrían a servir, y luego el tirano dio crédito a
había hecho en la Margarita, y en cada uno de los todo lo que dijo y le dio de vestir y escribió con él una
64 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

carta muy amorosa para los que él decía, y le mandó tan lejos; aviso Rey español donde cumple halla toda
que los fuese a buscar y dándoles la carta los trajese; justicia y rectitud para tan buenos vasallos como en
él fue y anduvo en busca dellos dos días, y se volvió estas tierras tienes, aunque yo, por no poder sufrir
diciendo que no los hallaba, este mismo día antes más las crueldades que hacen y usan estos tus
que el tirano fuese a la Borburata, mandó matar a oidores, visorrey y gobernadores, he salido de hecho
un portugués llamado Farias, que era de los que en con mis compañeros (cuyos nombres después diré)
la Margarita se le habían llegado; la causa que para de tu obedencia, desnaturalizándonos de nuestras
matarle tuvo dijeron que no fue otra sino haber tierras, que es España, y hacerte en estas partes las
preguntado este soldado si aquella tierra donde más crueles guerras que nuestras fuerzas pudieren
estaban era isla o tierra firme. sustentar y sufrir; y esto cree Rey y Señor nos ha
hecho el no poder sufrir los grandes pechos, apremios
Este día mandó el tirano ir toda la gente al
y castigos que nos dan estos tus ministros que por
pueblo y él se quedó el postrero de todos haciendo
remediar a sus hijos y criados nos han usurpado y
quemar los navíos que allí había traído, llegado que
robado nuestra fama, vida y honra, que es lástima,
fue al pueblo aposentó en él a su gente, y él vivía
oh Rey, el mal tratamiento que se nos ha hecho, y
más recatado que hasta allí y con mayor guarda
con su persona. Mandó buscar y recoger en el dicho así manco de mi pierna derecha de los arcabuzazos
pueblo y a la redonda todas las cabalgaduras que que me dieron en la batalla de Chucuniga con el
se pudiesen haber, que venían más de 25 ó 30, y mariscal Alonso de Alvarado siguiendo tu voz y
las más yeguas por domar, y ciertos soldados de los apellido contra Francisco Hernández Girón, rebelde
que fueron a buscarlas vinieron empuyados de las a tu servicio, como yo y mis compañeros al presente
puyas, de lo cual se enojó tanto el tirano que mandó somos y seremos hasta la muerte, porque ya de hecho
pregonar guerra a fuego y sangre contra el Rey de hemos alcanzado en este reino cuan cruel eres y
Castilla y sus vasallos, salvo aquellos que se quebrantador de fe y palabra, y tenemos en esta
quisiesen pasar a él, que a estos aseguraba, y a los tierra tus perdones por de menos crédito que los libros
demás todos que los matasen, so pena de que el de Martín Lutero, pues tu visorrey y marqués de
soldado de los suyos que no matase a los que topase Cañete, lujurioso, malo, ambicioso y tirano ahorcó a
le matasen a él. Prendieron este día un alcalde Martín de Robles, hombre señalado en tu servicio, y
ordinario del dicho pueblo, llamado Chaves, que le a Alvaro Tomás Vázquez, conquistador del Perú, y al
cogieron en un hato suyo, cuatro leguas del pueblo; triste Alonso Díaz, que trabajó más en el
detúvose aqui 18 dias domando las cabalgaduras descubrimiento deste reino que los exploradores de
para llevar en ellas la munición, y el tiempo que Moisés en el desierto, y Piedrahita, buen capitán, que
aquí se detuvo escribió una carta para su Majestad rompió muchas batallas en tu servicio, y aun en
el Rey D. Felipe, Nuestro Señor, tan mala y Pucará ellos te dieron la victoria, porque si no se
desvergonzada como él era, la cual envió desde la pasaban hoy fuera Francisco Hernández rey del Perú,
Valencia con el padre Contreras tomando dél y no tengas en mucho el servicio que tus oidores te
seguridad con juramentos que embiaría la dicha escriben haberte hecho, porque es muy gran fábula
carta a la audiencia real de Santo Domingo, para si llaman servicio haberte gastado ocho mil pesos de
que de allí fuese a manos de su Majestad, y dio tu real caja para sus vicios y maldades; castígalos
licencia al dicho Contreras para que de allí se como a malos que cierto lo son. Mira Rey español
volviese a la isla Margarita, y llevó la dicha carta y que no seas cruel a tus vasallos ni ingrato pues
la envió a Santo Domingo como había prometido, y estando tu Padre y tú en los reinos de Castilla sin
la carta dice desta manera. ninguna zozobra, te han dado tus vasallos a costa
de su sangre y haciendas tantos reinos y señoríos
como en estas partes tienes, y mira Rey y Señor que
Carta del tirano a su Majestad el Rey Felipe no puedes llevar con título de Rey justo ningún interés
natural español, hijo de Carlos invencible, Lope de destas partes donde no aventuraste nada, sin que
Aguirre tu mínimo vasallo, cristiano viejo de primero los que en ello han trabajado y sudado su
medianos padres, hijodalgo, natural vascongado en sangre, sean gratificados.
el reyno de España, en la villa de Oñate.
Por cierto tengo que van pocos reyes al infierno,
En mi mocedad pasé el mar océano a parte de que sois pocos que si muchos fuésedes ninguno
Perú por valer más con la lanza en la mano, y por podría ir al cielo, porque creo que allí seríades peores
cumplir con la deuda que debo de hombre de bien, y que luciferes según tenéis sed y hambre y ambición
así en 24 años te he hecho muchos servicios en el de hartaros de sangre humana, mas no me maravillo
Perú en conquista de indios y en poblar pueblos en ni hago caso de vosotros, pues os llamáis siempre a
tu servicio, especialmente en batallas y reencuentros menores de edad, y todo hombre inocente es loco y
que ha habido en tu nombre, siempre conforme a mis vuestro gobierno es aire; y solamente hago voto a
fuerzas y posible sin importunar a tus oficiales por Dios yo y mis 200 arcabuceros, marañones,
pagar, como parecerá por tus reales libros. Bien creo conquistadores, hijosdalgo de no dejar ministro tuyo
Excelentísimo Rey y Señor aunque para mi y mis a vida, porque ya sé hasta donde alcanza tu
compañeros no has sido tal, sino cruel e ingrato a clemencia, y el día de hoy nos hallamos los más bien
tan buenos servicios como has recibido de nosotros, aventurados de los nacidos, por estar como estamos
aunque también creo que te deben de engañar los en estas partes de Indias, teniendo la fe y
que te escriben desta parte destas Índias, como están mandamientos de Dios enteros y sin corrupción
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 65

como cristianos, manteniendo lo que predica la Santa que le vayan a pescar o a matar perdices y a traer
Madre Iglesia de Roma, y pretendemos, aunque frutas, todo el repartimiento tiene que hacer con
pecadores en la vida, recibir martirio por los ellos.
mandamientos de Dios.
En fe de cristiano te juro Rey y Señor que si no
A la salida que salirmos del río de las Amazonas pones remedio en las maldades desta tierra, que te
que se llama el Marañòn por otro nombre, vieron en ha de venir azote del cielo, y esto dígolo por avisarte
una isla poblada de cristianos llamada la Margarita de la verdad, aunque yo y mis compañeros no
unas relaciones que venían de España de la gran esperamos ni queremos de ti nada. Ay, ay, lástima
cisma de luteranos que hay en ella, que nos pusieron tan grande que César y Emperador, tu Padre,
temor y espanto pues aquí en nuestra compañia hubo conquistase con la fuerza de españoles la suprema
un alemán, llamado Monte Verde y le hice hacer Germania, y gastase tanta moneda llevada destas
pedazos. Los hados darán la paga a los cuerpos, Indias descubiertas por nosotros, y que no te duelas
pero donde nosotros estuviéremos cree Excelentísimo de nuestra vejez y cansancio, siquiera para matarnos
Príncipe que cumple que todos vivan perfectamente la hambre un día.
en la fe de Cristo.
Sabéis que vemos en estas partes, excelente
Especialmente tan grande es la disolución de Rey, que conquistaste a Alemania con armas, y
los frailes en estas partes, que cierto conviene que Alemania ha conquistado a España con vicios de que
venga sobre ellos tu ira y castigo, porque ya no hay cierto nos hallamos acá más contentos con maíz y
ninguno que presuma de menos que de gobernador. agua solo por estar apartados de tan mala erronía,
Mira Rey que no los creas pues las lágrimas que por que los que en ella han caído pueden estar con sus
allá echan delante de tu real persona, es para venir regalos; anden las guerras por donde anduvieren que
acá a mandar; si quieres saber la vida que por acá para los hombres se hicieron, mas en ningún tiempo
tienen, es entender en mercadurías, procurar y ni por adversidad que venga dejaremos de ser sujetos
adquirir bienes temporales, vender los sacramentos y obedientes a los preceptos de la santa lglesia de
de la iglesia por precios; enemigos de pobres, Roma. No podemos creer, excelente Rey y señor, que
incaritativos, ambiciosos, glotones y soberbios; de seas tan cruel para tan buenos vasallos como en
manera que, por mínimo que sea un fraile, pretende estas partes tienes, sino que estos tus malos ardores
mandar y gobernar estas tierras. Pon remedio Rey y y ministros lo deben de hacer sin tu consentimiento;
Señor porque destas cosas y malos ejemplos no está dígolo, excelente Rey y señor, porque en la Ciudad
impresa ni fijada la fe en los naturales, y más te de los Reyes, dos leguas della junto a la mar, se
digo que si esta disolución de los frailes no se quita descubrió una laguna donde se cria algún pescado,
de aquí no faltarán escándalos, aunque yo y mis que Dios permitió que fuese así, y estos tus malos
compañeros por la gran razón que tenemos nos oidores y oficiales de tu Real persona, por
hallamos determinados de morir; esto y otras cosas aprovecharse del pescado para sus regalos y vicios;
pasadas, singular Rey, tú has sido causa por no te la arriendan en tu nombre, dándonos a entender,
doler del trabajo de tus vasallos y no mirar lo mucho como si fuéramos inhábiles, que es tu voluntad; si
que les debes, que si tú no miras por ellos y te ello es así déjanos, señor, pescar algún pescado,
descuidas con estos tus oidores nunca se acertará siquiera porque trabajamos en descubrirla, porque
en el gobierno. Por cierto no hay para qué presentar el Rey de Castilla no tiene necesidad de 400 pesos
testigos más de avisarte como estos tus oidores tienen que es la cantidad por la que se arrienda; pues,
cada un año cuatro mil pesos de salario cada uno y esclarecido Rey, no pedimos mercedes en Córdoba,
ocho mil de costa, y a cabo de tres años tienen cada ni en Sevilla ni en Valladolid ni en toda España que
uno 60 mil pesos ahorrados, heredamientos y es tu patrimonio, duélete, Señor, de alimentar los
posesiones, y con todo esto si se contentasen con pobres cansados en los frutos y recibos desta tierra,
servirse como a hombres y que como a tales los y mira, Rey y Señor, que hay Dios para todos, e igual
sirvamos, medio mal y trabajo sería el nuestro, más justicia y premio, paraíso e infierno.
por nuestros pecados quieren que donde los En el año de 59 dio el marqués de Cañete la
encontramos nos hinquemos de rodillas y los
jornada del río de Amazonas que, por otra parte,
adoremos como a Nabucodonosor, cosa cierto
llamaron Amagua, a Pedro de Ursua navarro, y por
insufrible y no como hombre que estoy lastimado y
decir verdad, tardó en hacer navíos hasta el año de
manco de mis miembros en tu servicio, y mis
60 en la provincia de los Motilones que es término
compañeros viejos y cansados en lo mismo, te he de
del Perú, y porque los indios andan rapados a
dejar de avisar que no fíes en estos letrados tu
navaja se llaman Motilones; aunque estos navíos
conciencia, que no cumple a tu real servicio
por ser la tierra donde se hicieron lluviosa, al tiempo
descuidarte con estos que se les va todo el tiempo en
de echar los navíos al agua se quebraron los más
casar hijos y hijas y no entienden en otra cosa, y su
refrán entre ellos es muy común: a tuerto o a derecho dellos, hicimos balsas y dejamos los caballos y
nuestra casa hasta el techo. haciendas, y nos echamos por el río abajo con harto
riesgo de nuestras personas, luego topamos los más
Pues los frailes a ningún indio pobre quieren poderosísimos ríos del Perú, de manera que nos
predicar y están aposentados en los mejores vimos en golfo dulce, caminamos de prima faz 300
repartimientos del Perú, la vida que tienen es áspera leguas desde el embarcadero a donde
y fatigosa, porque cada uno dellos tiene por desembarcamos la primera vez. Fue ese mal
penitencia en sus cocinas una docena de muchachos gobernador tan perverso, ambicioso y miserable que
66 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

no le pudimos sufrir; y así por ser imposible relatar nuestras armas el premio que se nos debe, pues nos
sus maldades y por tenerme por parte en mi caso han negado lo que de derecho se nos debía. Hijo de
como me tendrás Rey y Señor, no diré más de que le fieles vasallos tuyos en tierra vascongada, y yo
matamos cierto bien breve, y luego a un mancebo, rebelde hasta la muerte por tu ingratitud: Lope de
caballero de Sevilla que se llamaba D. Ferrando de Aguirre el Peregrino.
Guzmán, le alzamos por nuestro rey y le juramos por
tal, como tu Real persona verá por las firmas de todos
los que en ella nos hallamos, que quedan en la isla Estando, pues, el tirano en la Borburata con
Margarita en estas Indias, a mí me nombraron por falta de cabalgaduras para llevar su munición,
su maese de campo, y porque no consentimos ni escribió una carta a los vecinos de la Nueva Valencia,
consentí en sus insultos y maldades me quisieron que estará nueve o diez leguas de allí que está tierra
matar, y yo maté al nuevo rey y capitán de su guardia, adentro, diciéndoles que no determinaba ir por su
y teniente general y a cuatro capitanes y a su pueblo sino por otr o camino derecho a
mayordomo, y a su capellán clérigo de misa y a una Barquisimiento [sic] y para Tocuyo, y para aviarse
mujer de la liga contra mí y a un comendador de tenía necesidad que cada vecino del pueblo le
Rodas, y a un almirante, y a dos alférez y a otros enviase un caballo y que se los pagaría muy bien en
cinco aliados suyos, y con intención de llevar la joyas de oro y plata, y que enviasen con los caballos
guerra adelante y morir en ella por las muchas persona de fiar que recibiese la paga; donde no que
crueldades que tus ministros usan con nosotros, no podía dejar de irse con ellos y los haría todo el
nombré de nuevo capitanes y sargento mayor y me daño que pudiese, pero los vecinos de la dicha Nueva
quisieron matar y yo los ahorqué luego a todos. Valencia no le respondieron. Mató en este pueblo
Caminando nuestra derrota, pasando todas estas de la Borburata a un mercader que habían cogido
muertes y malas venturas en este río Marañón, en el monte, llamado Pedro Núñez, porque se le
tardamos hasta la boca dél y hasta la mar más de quejó que un soldado de sus marañones le había
diez meses y medio; caminamos cien jornadas justas, tomado una barreta de oro de 60 pesos que tenía
anduvimos 1.500 leguas justas, es río grande y dentro de una botija de aceitunas enterrada, y que
temeroso, tiene de boca el río 80 leguas de agua dulce, el soldado debía de haber desenterrado la botija y
y no como dicen de muchos brazos y bajos, y 800 llevádola con el oro, y llamando al soldado el tirano
leguas de desierto sin género de poblado, como tu le preguntó por el oro y él nego diciendo que la botija
Majestad lo verá por una relación que habemos hecho no tenía tal cosa dentro, y queriendo averiguarlo
bien verdadera; en la derrota que corrimos tiene más preguntó al mercader qué señal tenía la botija, y el
de seis mil islas; sabe Dios como nos escapamos dijo que una tapadera bicada, y el soldado trujo uno
deste lago temeroso. tapadera de yeso y el tirano dijo al mercader que
quien en aquello mentía, también se presumía que
Avísote, Rey y Señor, no proveas ni consientas mentía en lo demás, y luego le mandó dar garrote
que se haga ninguna armada para este río tan mal por mentiroso, y la principal causa porque el tirano
afortunado; porque en fe de cristiano te juro, Rey y le mató fue porque cuando trujeron a este mercader
Señor, que si viniesen cien mil hombres ninguno del monte donde estaba, el tirano le habló muy bien
escape, por las relaciones falsas, y no hay en el río y le dijo que por qué se huía? Y él respondió que de
otra cosa que desesperar, especialmente para los miedo, y replicó el tirano y le dijo que le dijese que
chapetones de España. Los capitanes y oficiales que decían dél por allí, y el mercader rehusó y dijo que
al presente llevo y prometen morir en esta demanda nada; dijo el tirano que le dijese la verdad que decían.
como hombres lastimados, son: Juan Gerónimo de El mercader dijo: señor, dicen es vuestra Merced y
Espindola, genovés, capitán de infantería, Juan los que con él vienen luteranos malos y crueles, y el
Gómez almirante, Cristóbal García, capitán de tirano se enojó y le dijo: bárbaro necio, y se quitó
infantería, a los dos andaluces capitanes de a una ce!ada de acero que en la cabeza tenía y le amagó
caballo, Diego Tirado andaluz que tus oidores, Rey y a dar con ella y enojado desta le mató.
Señor, le quitaron con grande agravio indios que
había ganado con su lanza; mi capitán de mi guardia Mandó así mismo aquí ahorcar a un soldado
Roberto de Sosa y su alférez Nuño Fernández llamado Pérez, al cual halló el tirano fuera del pueblo
valenciano, Juan López de Ayala de Cuenca nuestro echado junto a un arroyo de agua que estaba malo,
pagador, alférez general Blas Gutiérrez, conquistador y preguntándole el tirano que qué hacía allí el
de 27 años, alférez natural de Sevilla, Custodio soldado le respondió que estaba muy malo, y el
Hernández alférez portugués, Diego de Torres alférez tirano le dijo, luego desta suerte señor Pérez no
navarro, sargento mayor Pedro Rodríguez Viso, Diego podréis seguir esta jornada, bueno será que os
de Figueroa, Cristóbal Rodríguez conquistador, Pedro quedéis, y el Pérez respondió como vuestra merced
de Rojas andaluz, Juan de Aucedo alférez de a mandare, y vuelto el tirano a su posada mandó a
caballo, Bartolomé Sánchez Paniagua nuestro sus ministros que se lo trujesen diciendo: tráiganme
barrachel, Diego Sánchez Bilbao nuestro proveedor, aquí a Pérez que está malo, le curaremos y haremos
y otros muchos hijosdalgo de esta liga ruegan a Dios algún regalo; y traído le mandó luego ahorcar,
Nuestro Señor te aumente siempre en bien; y ensalce porque quisiera este maldito tirano que ninguno
en prosperidad contra el turco, y francés y todos los mostrara voluntad de quedarse, sino que todos le
demás que en estas partes quisieren hacer guerra, y siguieran aunque fuese arrastrando, y rogáronle los
en esta nos dé Dios gracia que podamos alcanzar por más capitanes y amigos diese la vida a este
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 67

soldado, y él respondió muy enojado que nadie de sus amigos, pero ellos no quisieron o no se
rogase por hombre tíbio que estuviese en la guerra, atrevieron; pudo ser que no cayesen en ello, o que
y después de muerto le pusieron un rótulo que decía, Dios no fuese servido que por entonces muriese, y
por inútil y desaprovechado. Halláronse en este desta vuelta que hizo a la Borburata se le huyeron
pueblo de la Borburata algunas mercaderías tres soldados de sus marañones, llamados Rosales,
escondidas y enterradas, así palo y lienzo como Acosta y Jorge de Rodas, y con el mucho vino que
cosas de comer y muchas pipas de vino, todo lo llevaban el tirano y sus compañeros, no los echaron
cual los otros tiranos comieron y robaron, y no de ver menos hasta la mañana. Èn el entretanto
contentos con robar y beber el vino en más cantidad que volvió el tirano a la Borburata hubo en su campo
de lo que habían menester, cocían con ello la carne algún alboroto y revuelta, y la causa fue esta; en el
y guisaban sus comidas, y hubo algunos que lugar del alojamiento no había agua y fueronla a
desfondando las pipas por un lado, se metían buscar a la montaña a una quebrada lejos de allí a
desnudos a lavarse en ellas. donde ciertos indios del servicio del dicho tirano y
Estando ya de camino para la Nueva Valencia sus compañeros hallaron en el monte cierta
para donde se determinó ir, se le huyeron dos ranchería de gente que estaba por allí escondida,
soldados que habían siempre deseado el servicio de los cuales se huyeron sintiendo la gente que buscaba
su Majestad, el uno llamado Pedro de Arias, y el el agua; en esta ranchería hallaron cierto hato y
otro Diego de Alarcón, y por esta causa y por miedo casas, que los que allí estaban con la priesa de
de las puyas que decían que había muchas en los huirse se las habían dejado y entre estas cosas, una
caminos, envió aprehender la mujer e hijos de capa conocida de un Rodrigo Gutiérrez marañón
Chaves el alcalde que antes había prendido y le tenía que habemos dicho que se pasó al fraile con
consigo, diciéndole que si no le buscaba los dichos Munguía y una información de abono que había
soldados y se los llevaba a doquiera que estuviese, hecho ante la justicia de la Borburata, y en esta
que le había de llevar la dicha mujer y a una hija provanza había sido testigo el Francisco Martín
que tenía casada con un D. Julián de Mendoza, y piloto que habemos dicho, que era también de los
así mismo mandase a los indios que no pusiesen de Munguía y se había vuelto al servicio del tirano
puyas y quitasen las que habían puesto, y dejando en la Borburata, y como se leyese la provanza y se
el dicho aviso en la Borburata porque hiciese lo que viese en ella el dicho de Francisco Martín que
había mandado, salió del pueblo llevando la mujer abonaba mucho al Rodrigo Gutiérrez, un Juan de
y hija dei dicho alcalde, dejando el dicho pueblo Aguirre mayordomo del dicho tirano, y a quien el
quemado, destruido y robado; llevaba la munición había dejado al cargo del campo cuando volvió a la
y tiros de artillería cargados en las cabalgaduras Borburata, enojado del dicho Francisco Martín, por
que allí había tomado, y los soldados cargados con lo que había dicho en abono del Gutiérrez, le dio de
sus armas y hatos y comida, y la mujer y hija del puñaladas y acudiendo otros amigos del tirano le
dicho alcalde y la hija del dicho tirano y todas las mataron; un soldado llamado Arana de los amigos
demás mujeres que venían diez o doce a pie. Dejó y paniaguados del tirano le tiró un arcabuzazo y
en este pueblo por su voluntad tres soldados que errando al dicho Francisco Martín dio a otro soldado
estaban enfermos, un Paredes, y Marquina, y otro que estaba junto al preso, que decían que había
Jiménez. querido huir aquella noche llamado Antón García,
Luego que los vecinos de la Valencia supieron al dicho Arana no se le dio nada, y dijo que fuese a
que el dicho tirano había desembarcado en la su cuenta el muerto y que el general, su señor, le
Borburata y pretendía entrar la tierra a dentro, tendria por bien, y a esta causa hubo alborotos
temiendo sus crueldades y tiranías de que ya porque unos lo alababan por bueno y otros lo
estaban avisados, se fueron al monte con sus vituperaban, pero el Arana, como buen amigo y
mujeres y hijos y haciendas desamparando su servidor del tirano, fue a gran priesa a la Borburata
pueblo y caminando el tirano camino de la dicha y le avisó de todo que lo que había en su campo, y
Valencia por una sierra arriba y muy áspera, que el se volvió a él con toda brevedad y se holgó de lo
tiene tres leguas de subida y una de bajada, ya que hecho. Otro día por la mañana partió de allí para la
se vio en cubierto de la mar, paró y mandó que se Nueva Valencia a donde por el mal camino y aspereza
alojase allí el campo, y en siendo noche, tomando de la tierra, los soldados dejaron la parte del hato
consigo 25 ó 30 arcabuceros volvió al pueblo de la que llevaban a cuestas, y así mismo se quedaron
Borburata y llegado que fue al pueblo dividió sus allí ciertos tiros de artillería de hierro que no los
soldados unos por una parte y otros por otra, y pudieron subir las cabalgaduras que los llevaban,
mandó buscar las casas del pueblo y que prendiesen trabajaron mucho sus amigos y secuaces en subir
a todos cuantos hallasen, y él solo también se puso la munición cargándola y descargándola muchas
a buscar su parte, y no hallaron a nadie, y veces, y aliviando las cargas a las cabalgaduras que
ciertamente los que aquella noche fueron con él no se les cansaban, y repartieron entre sí las cargas
se yo como se pueden escusar de culpa, porque que quitaban y ellos lo llevaban a cuestas y el mismo
nunca hasta allí había habido mejor coyuntura para Lope de Aguirre iba así mismo cargado con mucho
le matar, si los que con él iban desearan el servicio peso de la munición; y trabajó aquí tanto que cayó
de Dios y de su Majestad por haberse quedado solo muy malo y tanto que aquel día, que llegó a la
buscando las casas, y con la abundancia de vino Valencia, se apeó de un caballo en que iba no se
que había se había emborrachado, y con facilidad pudiendo tener en la silla, y se tendió en el suelo
pudieran matarlo allí que estaba fuera de la guardia como muerto y algunos soldados, que con él se
68 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

hallaron, lo llevaron ellos mismos a cuestas, y cercana, se sentó en el suelo y no se quería levantar,
aquestos y otros le hacían sombra con una bandera y el D. Julián le dijo que anduviese, sino que con su
a manera de palios, cosa cierto vergonzosa y mala, cabeza pagaría al tirano, y el Pedro Arias respondió
y de que no se puede excusar de culpa, pues tuvieron que hiciese lo que quisiese que él no podía más,
la ocasión en la mano, porque no llevaba guardia y que le cortase la cabeza que lo tendría por mejor
fuera más fácil de matar que un pollo, porque como que no ir delante del tirano, que él tenía por bien
estaba malo, había enviado delante para que morir por haber salido a servir a Dios y al Rey, y el
tomasen a la Nueva Valencia a todos sus amigos y D. Julián fue a él y con un espada le comenzó a
capitanes, y aun decían que el tirano fatigado con cortar la cabeza por la garganta, y como D. Pedro
su enfermedad decía a voces matadme, matadme Arias vio que iba de veras y se sintió herido le rogó
que tampoco puedo ir en la hamaca y en viendo al D. Júlián le dejase y no le matase, y asi le dejó y
alguna sombra se arrojaba en ella y se tendía en el comenzó a caminar con su herida en el pescuezo.
suelo, y así le llevaron a cuestas más de media legua Llegados a la Valencia, el tirano mandó hacer
algunos de los que ahora blasonan y se publican cuartos al Diego de Alarcón, y le llevaron desde la
por muy servidores de Su Majestad y hasta que posada del tirano al rollo de la plaza de la Valencia
vinieron algunos negros de los que habían enviado por las calles con un pregón que decía: esta es la
a llamar, y así llegó desde la Borburata hasta la justicia que manda hacer Lope de Aguirre, fuerte
Valencia en seis días, que serán nueve o diez leguas, caudillo de la noble gente marañona, a este hombre
donde así mismo estuvo muy malo algunos días, y por leal sevidor del Rey de Castilla mandarle hacer
sus capitanes y los de su guardia y amigos andaban, cuartos, quien tal hace que tal pague, y así le
por se fuera entendiendo en cosas que les mandaba, cortaron la cabeza, y hecho cuartos le pusieron en
y él estaba en la cama y muchas veces se quedó con palos por los caminos y la cabeza en el rollo, y
solo dos arcabuceros de guardia, y todos los que pasando el tirano por la plaza y viendo la cabeza en
querían entraban en su aposento sin estorbo el rollo, dijo a voces: allá estáis amigo Alarcón. Cómo
ninguno, y el tirano estaba casi muerto y no hubo no viene el Rey de Castela a resucitaros? Y
ninguno que le acabase, y desde ha pocos días el inspirando Dios en el dicho tirano perdonó al Pedro
tirano convaleció y quedó bueno de su enfermedad. Arias y le mandó curar la herida de la garganta,
cosa cierto insólita, y que hasta allí el tirano no
Hallaron este pueblo de Valencia también
aconstumbraba a hacer con nadie. Envió deste
despoblado como el de Borburata y alrededor dél se
hallaron ciertas yeguas y potros; aquí estuvieron pueblo a su capitán, Pedro García, con gente a una
quince días o más domando las cabalgaduras que laguna muy poderosa de agua dulce que estaba
todas eran socarreras para llevar su artillería y cerca de la dicha Valencia poco más de una legua,
munición, y para en que fuesen algunos de sus que se llama Acarigua que hay en ella muchas islas
capitanes y amigos. Como viese el tirano que toda pobladas de indios, y le habían dicho al tirano que
la gente de los pueblos por donde hasta allí había algunos vecinos de la Valencia estaban allí
venido se huían y ninguno se venía a él como escondidos y que tenían allí la mayor parte de la
pensaba que fuera, blasfemaba y renegando decía ropa y hacienda de todo el pueblo, y le mandó que
muchas veces que la gente de aquella tierra eran en todo caso procurase entrar dentro y prendiese a
peores que bárbaros, pusilánimes y cobardes, y que los que hallase y trujese la ropa, fue Dios servido
no creía tal y que como era posible que nadie hasta que no hubiese efecto, porque ciertas balsas de caña
allí se le hubiese pasado, y que aquestos solos que hicieron no pudieron sustentar peso sobre el
rehusaban la guerra que desde el principio del agua, que luego se sumían e iban al fondo en
mundo los hombres habían armado y seguido, y entrando en ellas, y así se volvieron sin hacer nada
aun en el cielo la había habido entre los ángeles, y tras esto el dicho alcalde Chaves envió a decir al
cuando echaron dél al lucifer, y así se quejaba desto tirano que tenía preso a Rodrigo Gutiérrez, que
este tirano como si él fuera bueno y llevara alguna enviase por él que no tenía con quien enviarlo al
empresa santa y buena. cual dicho alcalde prendió en la iglesia de la
Borburata que se había cogido a ella por temor del
Aquí mandó ahorcar a un soldado de sus dicho alcalde y dentro en la iglesia le prendió y le
marañones llamado Gonzalo Pagador porque salió tenía a recaudo con prisiones esperando a que
un tiro de arcabuz fuera del pueblo a coger unos enviase por él el tirano, el cual envió luego a
papagayos, porque había mandado que nadie saliese Francisco de Carrión, su alguacil mayor, con doce
sin su licencia. Desde a pocos días vino de la soldados para que se lo trujesen preso, pero el
Borburata a la dicha Valencia su yerno del alcalde Gutiérrez se dio tan buena maña que se soltó de las
de la Borburata Chaves, llamado D. Julián de prisiones antes que llegase el alguacil y los demás,
Mendoza, cuya mujer y suegra estaban en poder que le valió la vida, y se volvieron los soldados sin
del tirano y traía presos en una cadena los dos él, de que se sintió mucho el tirano y riñó al alguacil
soldados que dijimos que se habían huido en la mayor y soldados porque no habían muerto al dicho
Borburata, que eran Pedro Arias y Diego de Alarcón, Chaves por haber dejado ir al preso; y de ahí a
que el dicho alcalde y su yerno se dieron tan buena pocos dias, según se dijo, el dicho alcalde Chaves
maña que los prendieron, y trayéndolos el dicho D. envió a avisar al tirano por una carta, como el
Julián por el camino, el Pedro Arias o porque se gobernador Pablo Collado y el mariscal Gutiérrez
cansó o por probar si por aquella vía le dejaban de de la Peña, vecino del Tocuyo, y otros caballeros
llevar al tirano, temiendo la muerte que tenía de la tierra a dentro daban orden de juntar gente
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 69

para desbaratar al dicho tirano, que había de pasar porque les dio noticia de muchas cosas del tirano,
por fuerza por sus pueblos, y para esto el gobernador de la gente y armas y poder que traía, y dijo como
había nombrado capitàn general de campo del Rey muchos soldados venían por fuerza con él y por
al dicho mariscal Gutiérrez de la Peña, y al capitán temor, y que en viendo el campo y estandarte de Su
Diego García de Paredes por maese de campo, y asi Majestad se habían de pasar a él, con lo cual y otras
nombró los demás capitanes y se había alzado el cosas que dio cuenta se holgaron y perdieron el
estandarte real y habían avisado basta al Nuevo temor, porque creían antes que traía mucho más
Reino de Granada, se les había ofrecido aquella poder, y le enviaron al Tocuyo que diese cuenta desto
ocasión que se les enviase socorro; que fue cosa al gobernador que estaba allí malo, y habiéndolo
mal hecha para un alcalde del Rey. Sabida por el hecho se volvió al campo del Rey.
tirano esta nueva apresuró luego su partida, y la
Partió el tirano de la Valencia para
noche antes que se partiese, mandó que toda su
gente fuese a dormir a un cercado de Bahazeques Barraquesinieto [sic], y en el camino bien cerca de
de una casa a donde el posaba; aquella noche mandó Valencia se le huyeron ocho o diez soldados y se
matar secretamente a tres soldados de sus fueron al monte, por lo cual el tirano blasfemaba y
marañones, el uno llamado Benito Díaz, porque renegaba; a los dos días que caminó dio en unas
había dicho que tenía un pariente en el Nuevo Reino, rancherías de negros de los vecinos de la
y a un N. de Lora, y a otro Cigarra, porque los tenía gobernación, y por hacer allí comida se detuvo un
por sospechosos y temió que se huyesen, y a la día, y principalmente para recoger si pudiese los
mañana, cuando se partió de allí, mandó poner dichos negros, de los cuales él se pensaba ayudar,
fuego a una casa donde estaban los muertos, y luego y traía en su campo 15 ó 20 dellos con su capitán,
partió para Barequisimeto por el camino de la tierra, y decía que eran libres y daba libertad a los que se
dejando el dicho pueblo de Valencia quemado y le juntasen; hacíales tan bueno y mejor tratamiento
destruido, llevando muchas cabalgaduras y que a los españoles, y con estos favores hacía mil
habiendo muerto mucho ganado, vacas terneras y robos y maldades, y el tirano se holgaba dello, pero
carneros. aquí le salió vano su intento, porque los dueños
destos negros, sabida su venida, los pusieron en
cobro, prosiguiendo el otro día su camino, al subir
Como fue muerto y desbaratado el tirano Lope de una cuesta llovió un aguacero, y como la cuesta
de Aguirre era lodosa y las cabalgaduras que llevaban la carga
Entretanto que Lope de Aguirre estuvo en la y munición eran yeguas e iban cansadas, arrollaban
Valencia domando potros, que fue primero su oficio y no podían pasar; el tirano renegaba y decía muchas
blasfemias contra Dios Nuestro Señor que ponía
en el Perú, los vecinos de toda la gobernación se
miedo a los que le oían, y entre otras decía muy
convocaron y daban priesa para resistir al dicho
enojado: piensa Dios que porque llueva no tengo de
tirano. Para esto, como hemos dicho, nombró el
ir al Perú y destruir el mundo, pues engañado está
gobernador Pablo Collado al dicho Gutiérrez de la
conmigo; y en error y otras blasfemias estuvo hasta
Peña por capitán general del campo del Rey, y a
que con azadones hicieron escalones para que
Diego García de Paredes por maese de campo,
subiesen las cabalgaduras, y en el ínterin los de su
diéronse tan buena maña que en pocos días se
guardia caminaron mucho, pensando que todos los
juntaron más de 150 hombres de a caballo deseosos
seguían, y cuando el tirano acabó de subir arriba, a
de servir a su Rey y Señor y defender sus casas; y
lo alto otra vez, como no vio casi ningún soldado
también vino a este socorro el capitán Bravo, vecino
volvió a blasfemar otra vez y a decir herejías, y dijo
de la ciudad de Mérida, del Nuevo Reino, y trujo 30
a Juan de Aguirre y a su capitán de la guardia y a
hombres de a caballo muy bien aderezados, de
otros amigos que estaban con él: yo, señores,
manera que había al pie de 200 hombres de a caballo
profetizo, que si no se nos llegan en esta gobernación
sin los peones, que estuvieron casi mes y medio
40 ó 50 soldados no lleguemos al reino, según
esperando la venida del dicho tirano, y estando
conozco las voluntades en mis marañones, y fue
suspensos aguardándole, que estaban algo dudosos
con grande enojo y priesa hasta alcanzar la
si vendría que no tenían noticia de su ida cierta,
vanguardia, y habiéndolos ultrajado y vituperado y
fue Dios servido, que vino a su campo un soldado
dicho muchas afrentas y oprobios los hizo volver
de los marañones, que había venido con el dicho
atrás a dormir a lo alto de la cuesta.
tirano hasta la isla Margarita y de allí se había huido,
llamado Pedro Alonso Galean, hombre viejo y de Habiendo llegado al valle de las Damas, que
crédito, que habiendo una canoa se embarcó para será como diez leguas de Barraquisinieto [sic], halló
tierra firme, y desde Maracapana a la Borburata y a junto a un río un bohío de maíz de que el tirano se
la Valencia, donde estuvo escondido cuando llegó holgó mucho, porque ya los empezaba a faltar la
allí el tirano, y dejándolo en la Valencia se vino comida, detúvose aqui un día, desconfiado de sus
delante a Barraquesinieto [sic] al campo de Su marañones entró en consulta con sus capitanes y
Majestad, y como algunos del campo estaban amigos para matar a los sospechosos y enfermos,
temerosos y recatados, dijeron que no se debían que serían más de 40 personas y quedarse con sólo
fiar del dicho Pedro Alonso, que podía ser echadizo ciento de los más sus amigos; pero algunos de la
para que los espiase, y al principio tuvieron este consulta le fueron a la mano, movidos por Dios,
recato, mas después en su trato y conversación porque no ejecutase tan gran maldad, y así por
echaron de ver su sencillez , y se holgaron con él entonces no ejecutó nada. Otro día de mañana saltó
70 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

de allí y caminó a muy gran priesa hasta la noche ni de toda la gobernación más que la comida y
que paró en una acequia de agua, este día vio algunas cabalgaduras pagándoselas, y que a quien
corredores del campo de Su Majestad, que estaban le siguiese le haría buen tratamiento y daría de
en Barraquisinieto [sic], ocho leguas del tirano comer en el Perú, y si se huían prometía de
aguardándole, porque sabida en el campo la venida quemarles y asolarles el pueblo y destruir los
del tirano saltó Diego García de Paredes maese de ganados y sementeras y hacer pedazos todos los
campo con ciertos soldados a reconocer y hacer que pudiese haber a las manos. Esta carta se recibió
algún daño de camino si pudiese, y en este valle, en en el campo del Rey y no se hizo caso della porque
un paso de montaña, se toparon de repente los unos estaban avisados del poder y fuerzas del tirano;
con los otros, que los del Rey eran catorce a quince aquella noche, como se ha dicho, durmió allí el
de a caballo, y como los del tirano dieron armas, tirano, y otro día por la mañana, miércoles 22 de
quisieron los del Rey revolver apriesa, y por ser el octubre de 1561, caminó al pueblo de
camino estrecho se embarazaron y hicieron una Barraquiisinieto [sic] y mandó públicamente a sus
mazamorra, y dejaron con la priesa de revolver dos soldados, que cualquiera soldado que saliese del
lanzas y ciertas caperuzas monteras, y se retiraron campo tres pasos, que le matasen a arcabuzazos, y
a unas cabañas atrás donde durmieron aquella ya que llegaba cerca del pueblo vio la gente de Su
noche, y vistos por el tirano y los demás soldados, Majestad cerca de sí, que lo estaban aguardando
los corredores del campo de Su Majestad se pusieron en lo alto de una barranca del otro cabo del otro
en orden, y mandó el tirano que los arcabuceros camino a cabo del pueblo, de manera que entre los
encendiesen las cuerdas, porque los cogieron tan unos y los otros estaba el pueblo, y el tirano
descuidados los corredores que no se halló en todo aguardando en la playa del río recogiendo y
el campo más de una o dos cuerdas encendidas y poniendo en orden su gente, y con dos banderas de
habiendo descansado aquí tres o cuatro horas, el campo y dos estandartes, y otras dos banderas, que
tirano mofaba de la gente del Rey, y decía: mirad por todas eran seis tendidas, comenzó a caminar a
marañones a que tierra os ha traído Dios, y en la nuestra gente con el recuaje y servicio a las espaldas,
que os queríades quedar, mirad que medrados están y ya que llegaban cerca, mandó disparar gran salva
los soldados del Rey, y esto decía burlando de las de arcabucería echando grandes cargas para que
lanzas y monteras que eran grasientas y viejas, y a diesen mayor respuesta, pensando con aquello
cabo deste tiempo con la luna clara que hacía poner temor a los nuestros, luego mandó dar otra
camino toda la noche, llevando puestas guardas a vez carga y echar pelotas con hilo de alambre para
los soldados sospechosos porque no se huyesen, y que hiciesen más daño. Los nuestros como vieron
ya que llegaban cerca de donde estaban durmiendo el tirano cerca, comenzaron a bajar con el estandarte
los soldados de Su Majestad, fueron dellos sentidos, real alzado por la barranca a lo llano, y el tirano lo
y viendo que ya no podían hacer ningún daño al mismo, y se juntaron en el pueblo y en las calles
tirano por haber sido sentidos, se volvieron a su dél, entre unos y otros se trabó escaramuza, de
campo con la demás gente donde estaba su general manera que faltó poco para venir en rompimiento,
apercibido, y contó a éste el maese de campo lo que pero el general y capitanes de Su Majestad hicieron
les había pasado con el tirano, y a donde quedaba, retirar el campo para aguardar a mejor coyuntura,
y uno de los soldados que había ido, corrido en y fue bien acordado, porque recibieron mucho daño,
alguna manera de haber dejado la lanza, el general ya que los del tirano por no saber si hallarían
le llamó y le dio otra, y al compañero también, y les misericordia en el campo del Rey pelearon todos y
dijo: señores no tengáis pena de eso; al tiempo de como eran arcabuceros tenían mucha defensa con
pelear no quiero yo que se caigan las lanzas, que las casas, y así los del campo de Su Majestad se
desotra manera no importa nada, no habiendo retiraron a la barranca y el tirano se quedó en el
podido más, quedaron muy contentos los soldados pueblo y alojó su campo en una cuadra cercada de
por el buen término del general. Viendo los del Rey tapias de altos de más de dos tapias, almenado todo
que el tirano se iba acercando, y que por estar dentro a la redonda, que eran las casas del capitán Damián
del pueblo y ser todos arcabuceros los del tirano, y del Barrio, vecino del pueblo; lo cual hizo el tirano
los del Rey de a caballo, les tendría ventaja el tirano, para estar más guardado de los de a caballo, y por
determinaron de salir a lo raso cerca de unas tener allí también los soldados sospechosos que no
cabañas anchas y llanas, cerca del dicho pueblo, y se pudiesen huir al campo de Su Majestad, que era
llevaron todo el bastimento necesario para ellos y lo que siempre desearon.
sus caballos, y se alojaron en una quiebra donde
Retirados los de Su Majestad a la barranca,
había agua en medio de las dichas cabañas.
se estuvieron un rato allí por ver lo que hacía e1
Caminó el tirano toda aquella noche, y otro tirano y ver si algunos soldados se pasaban a ellos,
día por la tarde a hora de vísperas llegó legua y y como nadie venía, se volvieron a su alojamiento,
media de Barrraquisinieto [sic]; aquella noche paró dejando sobre el campo del tirano diez o doce
allí y mandó sentar su artillería al camino del dicho hombres por corredores; y en esto el maese de
pueblo, y puesta su guardia y centinelas, envió una campo, Paredes, sin ser visto del tirano con ocho de
carta a los vecinos de Barraquisinieto [sic] con un a caballo dio en su retaguardia y les tomó cierto
indio ladino del Perú, en que les decía que no se bagaje que venía muy atrás, y cuatro cabalgaduras
huyesen ni dejasen su pueblo, que él les prometía cargadas con ropa y pólvora y alguna munición de
que a nadie haría mal ni daño, y que no quería dellos artillería, que hizo harto provecho a los del Rey que
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 71

no había munición para los pocos arcabuceros que los cuales trujeron sus arcabuces y dieron
había. Después de haberse aposentado como se ha esperanzas de que se pasarían otros muchos, a los
dicho, el tirano en el cercado, salieron algunos cuales dos soldados hicieron buen acogimiento, y
soldados por las casas del pueblo a recoger lo que dieron caballos para que fuesen con los corredores
en ellas había, y en las dichas casas hallaron a dar aviso y ánimo a los otros para que se pasasen.
muchas cédulas de perdón que decían que el
La noche siguiente envió el tirano al capitán
gobernador de aquella provincia, Pablo Collado, en
de su guardia Roberto de Sosa y al capitán Cristóbal
nombre de Su Majestad, perdonaba a todos los que
García con otros amigos y paniaguados suyos y
se pasasen a su real servicio, de todos y cualesquier
hasta 60 arcabuceros a que buscasen con diligencia
delitos que hubiesen cometido en la dicha tiranía, y
el lugar donde estaba el campo de Su Majestad, y
algunas destas cédulas fueron a manos del tirano
de camino hiciesen todo el daño que pudiesen y
que algunos de sus amigos se las llevaron, y
trujesen caballos que era de lo que tenía necesidad;
haciendo recoger su gente les hizo un parlamento
y que el otro día de mañana él acudiría con su gente
largo diciéndoles, que considerasen las muertes y
al socorro; y algunos destos soldados no sabían a
daños que habían hecho, que ni aún el Rey de
que iban, mas de a buscar cabalgaduras y ganados,
justicia les podía perdonar, cuanto y más un que así se había publicado, y caminando aquella
gobernadorcillo bachillerejo de dos nominativos, y noche, fueron sentidos de un capitán Diego Roque
que aquello era para engañarlos. que venía a servir a Su Majestad del pueblo de Nerva,
Andando pues los soldados del tirano por el con nueve compañeros, y andando por aquella
pueblo después de haber recogido lo que por las cabaña buscando el campo del Rey, conociólos como
casas hallaron, las mandó quemar el tirano, y venían a pie que eran de los tiranos, y fue dando
estándose quemando una casa cerca de la iglesia, grandes voces a tino muy apriesa a donde le pareció
saltó el fuego en la iglesia y se quemó toda, y el que estaba el campo del Rey hasta que encontró a
tirano mandó sacar los ornamentos, las imágenes y los corredores, y todos juntos fueron a dar noticia
los guardó y se quemó toda la dicha iglesia, y casi al campo del Rey, que aunque tenía buenas guardas
todo el pueblo, que no quedaron sino unas pocas y centinelas, estaban algo descuidadas, y mas de
de casas a un lado del pueblo, las cuales quemaron aquella emboscada o asalto del tirano. Salió el
la gente del Rey porque los eran de daño a ellos, y general y toda la gente de a caballo, y salieron en
provechosas al tirano para la guerra. Aquella noche busca de los tiranos, y no los topando en gran rato,
durmieron los dos campos, cada uno con mucho por ser de noche, acordaron que el maese de campo
cuidado, y otro día al alba, jueves, dieron los del quedase con 60 hombres de a caballo buscando los
Rey con cinco arcabuceros solos que había a los tiranos, y hallándolos no se quitasen de sobre ellos
dichos tiranos, y como el Lope de Aguirre sintió el hasta la mañana, y el general se volvió a su
rebato, mandó que todos callasen y estuviesen alojamiento con la demás gente, y el maese de campo
puestos, y en amaneciendo echó hasta 40 con la suya anduvo casi toda la noche buscando
arcabuceros suyos y les mandó que escondidamente los tiranos, que como vieron que habían sido
fuesen por una quebrada arriba, y acometiesen a sentidos se escondieron en un vallete de cabaña
los que los habían dado arma, y ellos lo hicieron alta pequeña donde no podían ser vistos sin pasar
tan bien que sin ser vistos dieron sobre ellos, y entre por ellos, el maese de campo, cansado de buscarlos
todos hubo una brava escaramuza, y sin haber se volvió al campo donde estuvieron toda la noche
tenido de ninguna parte se retiraron ambos campos. sin reposar, venida la mañana fue descubierta la
gente del tirano en la cabaña, y todo el campo del
Este mismo día jueves, ya tarde, vino al campo Rey dio sobre ellos, y ellos no osando esperar en lo
el gobernador Pablo Collado que había estado malo llano enviaron a pedir socorro al tirano, y se retiraron
en el Tocuyo, y entonces llegó también el capitán a una barranca de un río que es alta, de montaña,
Pedro Bravo con sus 30 hombres de a caballo, todos y allí se hicieron fuertes por temor de los caballos.
muy buena gente y con muy grandes deseos de No tardó mucho el tirano con el socorro, que llegando
servir a Su Majestad de que se holgaron todos el mensajer o vino luego con 25 soldados
mucho; y se hallaron con más ánimo y menos arcabuceros y la bandera de su guardia tendida,
miedo del tirano, y con razón, porque había en el que era negra con dos espadas sangrientas en
campo del Rey 180 hombres de a caballo de bien y medio, de ella, y tocando una trompeta y tambor,
de vergüenza y que deseaban el servicio de Su juntándose con los demás tiranos, salieron todos
Majestad y defenderse a sí y a sus hijos y mujeres. a lo llano, y entre los unos y los otros se trabó una
En todo este tiempo hubo siempre corredores de brava y hermosa escaramuza, aunque para [ilegível]
los del Rey sobre los del tirano, por no dejarles a los tiranos de la barranca a lo llano, los de su
tomar provisión ni comida, y por si querían algunos Majestad se iban retirando, y el tirano con su gente
soldados pasarse a la banda de los del Rey como lo los seguía muy apriesa, y después que estuvieron
había dicho Pedro Alonso. Aunque había algunos en lo llano, el campo de Su Majestad revolvió sobre
soldados deseos de pasarse al Rey, no podían ellos con gran ánimo y brío, aquí se trabó la
porque los tenía encerrados en aquel corral, y con escaramuza muy brava y reñida, de suerte que la
guardias de sus amigos. AI tercer día que fue gente del tirano se empezó a turbar viéndose
viernes, se pasaron dos soldados al campo del Rey acometer por todas partes, que casi los tenían
del tirano, el uno García Rengel; y el otro Guerrero, cercados; en este tiempo un capitán de a caballo
72 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

del tirano, llamado Diego Tirado, andando, haciendo Otro día siguiente, sábado, determinó con
algunas arremetidas contra el campo del Rey, una algunos de sus amigos hacer una gran crueldad, y
vez dio una carrera más larga de lo que solía y se fue que hizo una lista de todos los soldados
pasó a él diciendo a voces: viva el Rey, viva el Rey. sospechosos y enfermos, que serían más de 50
Caballeros, a donde van? Retírense que los matarán hombres, para matarlos a todos, y con los que
a todos, que van perdidos y aunque los del Rey quedasen retirarse a la mar y buscar algún navío,
pudieran en esta escaramuza herir y matar algunos para matándolos, tomar otra derrota; y teniendo
de los tiranos por tenerlos en la cabaña rasa, no lo desarmados a los que había de matar, comunicó
quisieron hacer, porque ya sabían que algunos su intención con sus amigos, los cuales
tenían voluntad de pasarse al Rey, y si hirieran a considerando su perdición, por acreditarse en algo
algunos, pudiera ser quitárseles la voluntad, y fue con intención que tenían de pasarse al campo del
buen acuerdo. De la ida del capitán Tirado recibió Rey, se lo estorbaron con buenas razones, diciendo
el tirano mucho enojo, y por entonces, por no que como se podían conocer los sospechosos? Que
desmayar a los suyos, porque era el dicho capitán pensando que eran unos serían otros, y que mataría
de los mayores amigos y confiados del tirano, los a los que quizá le seguirían, y que lo mirase por
dijo que lo había enviado con cierta embajada al Diego Tirado, que era de quien el más se fiaba, y le
campo del Rey y sosegaron por entonces, mas viendo había dejado el primero, y que no era aquel tiempo
que no volvía tomaron más ánimo los que tenían de matar a nadie porque si lo hacía los que
deseo de pasarse y a los demás pesó mucho. quedasen vivos temerían otro tanto y se huirían;
Luego que llegó el capitán Diego Tirado al con esto y otras cosas que le dijeron se sosegó y se
campo del Rey, se holgaron mucho el gobernador y estuvo en el fuerte desde que se pasó Diego Tirado
los demás, y le dio el gobernador un buen caballo que fue viernes hasta el lunes sin salir dél,
en que él solía andar, y mandó a los demás capitanes previniendo su partida, y mandó que ninguno
no hiciese ninguno más de lo que ordenase el dicho saliese fuera, ni a buscar comida, por lo cual estos
Tirado, y él dijo que se estuviesen quedos que él dias se pasó gran hambre en el campo del tirano,
desbarataría al tirano, y el gobernador subió en la que se comieron unos muletos y perros que
yegua del dicho capitán que era flaca y mala, y como mataron y aun se comieran las cabalgaduras si no
el Tirado se vio en buen caballo, fue a la escaramuza lo estorbara el tirano, porque eran menester para
con las demás gente, y dando voces a los del tirano llevar la carga.
decía: caballeros a la bandera real y al Rey, qué
En este tiempo se pasaron ciertos soldados
hacemos que ese tirano mató al gobemador Pedro
del tirano al campo del Rey, los cuales avisaron
de Ursua y ha muerto a muchos amigos y deudos?
como el tirano deseaba volverse a la Borburata,
Al Rey, al Rey, que hasta que le veamos muerto a
por lo cual salió el maese de campo el lunes por la
ese tirano le tengo de seguir. Hizo retirar el campo,
porque dijo que sin matar ni herir a nadie ni dar mañana y se puso sobre los del tirano para ver lo
batalla se habían de pasar los del tirano a él, como que hacían; y el mismo lunes por la mañana, 27
lo hicieron. Valió mucho este Tirado para el buen de octubre de 1561, teniendo el tirano desarmada
suceso, y en esta escaramuza ni en las demás gran parte de su gente, y entre ellos de los
ningún soldado del Rey se perdió ni hirió, y de los capitanes, ya cargada la munición y armas en las
del tirano salieron dos heridos, con haber andado cabalgaduras, y queriendo caminar hacia la mar,
todos revueltos y ser del tirano todos arcabuceros, ninguno de los suyos le quiso seguir, diciendo todos
y en el campo del Rey no haber más de seis o siete. a una voz que era mejor caminar de noche; y tras
esto los desarmados empezaron a decir que donde
Visto por el tirano la pasada de su capitán habían de ir sin armas? Y que no era bien acordado
Tirado, en quien él fiaba más que en ninguno de los volver atrás, que les diesen sus armas, y pasasen
suyos, y un arcabuzazo que le habían dado a su adelante. EI tirano viendo sus voluntades y
yegua, que le espantó y turbó harto, y el ánimo con deseando contentarlos y probar si le iba mejor, y
que le acometían del campo del Rey, y que sus viendo que algunos de sus marañones en algunos
marañones andaban muy tibios, y que en todos sus coloquios le respondían atrevidamente, y no
famosos arcabuceros ninguno había herido un hallando, aunque quiso matarlos, quien le ayudase,
caballo siquiera de los del campo del Rey, luego
dio a todos las armas y dijo que se hiciese como
comenzó a conocer su perdición, y deseando el
ellos querían. Hubo algunos que no las quisieron
remedio, apeado de la yegua que le habían muerto
tomar, y el mismo tirano se lo fue a rogar y les
entre las piernas, con la lanza en la mano empezó a
recoger su gente, ayudándole algunos de sus amigos pidió perdón, diciendo que un solo yerro bien se
a palos y lanzadas, y a mucha priesa, llevándolos podía perdonar, como si hubiera sido aquel sólo.
por delante, se fue a su fuerte porque no se lo Tomaron todos sus armas, y a este tiempo pareció
tomasen, y llegado a él comenzó a vituperar a sus sobre la barranca el maese de campo de Su
soldados, llamándoles de cobardes y para poco, y Majestad, con la gente que habemos dicho, a los
decia, marañones, a las estrellas tiráis, y luego cuales los tiranos empezaron a tirar arcabuzazos,
comenzó a desar mar a algunos de los más y hirieron en el pescuezo al caballo en que venía el
sospechosos, y puso gran guardia porque no se le capitán Pedro Bravo de Molina, que sola esta herida
huyesen. se recibió en el campo del Rey. Y a esta hora, que
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 73

sería poco antes de mediodía, dijeron los soldados compañía, y quedará dél la memoria eterna que
del tirano que querían ir a trabar escaramuza con quedó del maldito Judas, para que blasfemen y
la gente del Rey, y echarlos de allí, que se les escupan del más perverso hombre que ha nacido
acercaban mucho; y luego salieron, y el tirano los en el mundo.
salió a mirar desde la puerta del cercado, y estando
Aquí hubo contemplativos que reprobaron lo
en esto su capitán Espindola cogiendo consigo a
que el maese de campo hizo en matarlo, diciendo
algunos de sus amigos a vista del tirano y de los
que porque estaba mal con el gobernador, lo había
demás comenzó a decir a voces al Rey, caballeros,
muerto por atribuirse a sí la victoria; sea lo uno o lo
al Rey! y se comenzó a ir hasta la barranca donde
otro él lo hizo como buen soldado en esta ocasión, y
estaba el maese de campo, y tras él la mayor parte
que allí estaba; y el tirano con harto dolor y tristeza es digno de que sus servicios sean premiados.
los miraba como se le iban, y volviendo al cercado Muerto el tirano le fue cortada la cabeza y salió con
halló que todos los más que allí habían quedado se ella al encuentro al gobernador que ya venía con su
habían ido por una puerta de bajareques, que estaba gente, Custodio Hernández, y luego mandó el
en las espaldas del cercado, y viéndose solo sin gobernador hacer cuartos y ponerle en cuatro
ninguno de sus marañones, desesperado, revestido caminos alrededor de Barraquisinieto [sic], y su
el demonio en él, hizo una crueldad mayor que todas cabeza fue llevada a la ciudad del Tocuyo y puesta
las demás, que fue dar de puñaladas a una sola en el rollo en una jaula de hierro en medio de la
hija que traía en el campo mestiza y muy hermosa, plaza, y la mano derecha llevó el capitán Pedro Bravo
que se miraba en ella, y cuando la mató dijo que lo a Mérida, y la izquierda a Valencia, como si fueran
hacía porque no se quedase en el campo y la reliquias de algún santo, con que se cumplió bien
llamasen hija del tirano entre sus enemigos. Y a su profecía que era lo que el deseaba, que fuera
esta sazón, yendo paseando el tirano en la casa mejor echarlo a los perros para que presto lo
donde posaba dentro del cercado, llegaron algunos comieran y pereciera su fama de un hombre que la
soldados de sus marañones, que eran de los que se quería ganar con infamia.
habían huido antes con otros del campo del Rey, y Decía este tirano maldito algunas veces, que
él como los vio se rindió luego, y dio las armas a un ya sabía de cierto que su alma no se podía salvar, y
Custodio Hernández marañón y muy su amigo; y a que estando vivo ardía en los infiernos, y pues no
este tiempo llegó el maese de campo con su gente, y podía ser más negro el cuervo que sus alas que había
se horrorizaron todos de la crueldad que había hecho de hacer cuantas crueldades y maldades pudiese,
en matar su mesma hija, y él respondió lo que por donde sonase el nombre de Aguirre. Otras veces
dijimos arriba, y que mejor era que habiendo él de decía que Dios tenía el cielo para quien bien le
morir no quedase ella viva para ser puta de todos. sirviese, y la tierra para quien más pudiese, y que
Pidió al maese de campo y a sus marañones que no mostrase el Rey de Castilla el testamento de Adán,
le matasen que le llevasen primero al gobernador, si le había dejado él esta tierras de las Índias. Decía
que tenía que hablar con él cosas que convenían al más, que no dejasen los hombres de hacer todo lo
servicio de Su Majestad, pero dos de sus marañones, que su apetito les pidiese por miedo del infierno,
y no poco culpados en la tiranía, por temor que no que para ir al cielo sólo bastaba creer en Dios, y
dijese algo con que los dañase, y también porque el que no quería él soldados muy rezadores, sino que
maese de campo gustó dello, el uno Custodio si fuese menester jugasen con el demonio el alma a
Hernández, y el otro Cristóbal Galindo, que traían los dados, y otras muchas herejías.
dos arcabuces cargados, le tiraron uno tras otro y
Murió el dicho tirano un lunes a los 27 de
al primer arcabuzazo que le dio algo alto encima del
octubre de 1561. Desde ahí a seis dias que llegó a
pecho, dijo: no es este nada; y a otro, que le dio en
la ciudad de la Nueva Segovia de Barraquisinieto
medio del pecho, dijo: este sí, y cayó muerto luego
[sic], habiendo mandado él solo en su tiranía desde
sin hablar otra palabra, con las muestras de un
22 de mayo del dicho año que mató a D. Fernando
hereje o gentil, fundado en vanidad, pareciéndole
de Guzmán, su príncipe, hasta el dia que murió,
que su bienaventuranza estaba más en que le
que fueron cinco meses y cinco días, habiendo
tuviesen por animoso que por cristiano, porque
muerto más de 60 hombres, y entre ellos dos frailes,
había dicho muchas veces que cuando no pudiese
un clérigo y cuatro mujeres con su hija. Dijo tres
pasar al Perú y destruir y matar a todos los que
dias antes de su muerte estas palabras: si yo tengo
contra él fuesen, que a lo menos quedaría eterna
de ser desbaratado en esta gober nación de
en la memoria de los hombres la fama de sus
Venezuela, ni creo en la fe de Dios ni en la secta de
crueldades; y que su cabeza sería puesta en el rollo
Mahoma ni Lutero ni la gentilidad, ni tengo que hay
para que su memoria no pereciese, y con esto se
más de nacer y morir. Murió descomulgado sin
contentaba, y así se cumplió a la letra, y su ánima
arrepentimiento, y de muchas excomuniones
fue a los infiernos, donde él decia muchas veces
reservadas a Su Santidad, por donde se puede
que deseaba ir, porque allá estaba Julio César y
colegir cual estaría su alma.
Alejandro Magno y otros valientes capitanes, y que
en el cielo estaban pescadores y carpinteros y gente Era este tirano Lope de Aguirre hombre de
de poco brío. EI fue al inferno a hacerles perpetua hasta 50 años pequeño de cuerpo, y de muy poco,
74 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

mal agestado y chupada la cara, los ojos, que si quedaron en la dicha gobernación, y otros se fueron
miraban de rijo le bullían, en especial estando al Nuevo Reino de Granada.
enojado; era de agudo y vivo ingenio para ser hombre
No dejó de haber algunas pesadumbres entre
sin letras. Fue natural de la ciudad de Oñate, no se
el gobernador y maese de campo sobre los despojos
han podido conocer sus padres, más de lo que dice
del tirano, pero el general lo apaciguó todo y hubo
en la carta que escribió a Su Majestad. No dio
paz. Después de algunos dias, el dicho Gutiérrez de
muestras de una sola virtud, era bullicioso y
la Peña, general que era del campo del Rey, se avió
determinado en cuadrilla, gran sufridor de trabajos, para ir a España, y así mismo el maese de campo,
especialmente del sueño: en todo el tiempo de su llevando bastantes informaciones del servicio que
tiranía, no le vieron dormir sino un rato de día; habían hecho al Rey en haber desbaratado y muerto
caminaba mucho a pie y cargado; sufría muchas un tirano tan malo, y lo que es más rue sin haber
armas a cuestas; era naturalmente enemigo de costado ninguna muerte ni herida a los del Rey, ni
virtud, y amador de toda maldad; era frementido y un solo real de su caja, sino a costa de los dichos
engañador, aunque los que mataba pedían vecinos que como leales vasallos y servidores de Su
confesión, y hubiese aparejo, no lo quería consentir; Majestad, porque en el Nuevo Reino de Granada se
nunca dijo bien de nadie, ni aun de sus amigos, y gastó en gente y armas que se hicieron contra este
finalmente todos los vicios del mundo juntos, y tirano cantidad de monedas, y en la isla de santo
ninguna bondad tenía. Domingo vino el capitán Ojeda con gente y armas a
Residiò en el Perú este tirano más de 20 años; la Borburata, aunque cuando llegó ya el tirano le
su oficio era domar potros suyos y ajenos, fue habia desbaratado, no embargante que se debe
siempre amigo de revueltas, y se halló casi en todos estimar el cuidado que tuvo la Audiencia.
los motines que hubo en su tiempo; y no sé de Llegados a España estos caballer os su
servicios que haya hecho a Su Majestad, porque Majestad estimó mucho el servicio que le habían
aunque fue en algunas ocasiones se escondió, hecho, y al general le dio el título de mariscal de la
cuando fue con el capitán Holguin, y en otra se dicha gobernación, y 7 leguas de tierra de las que él
quedó. Fue de los que mataron al general Inojosa quisiese escoger en el Tocuyo: y más, le dio sus
corregidor de las Charcas, fue llamado a pregones armas y las del tirano, que eran una bandera negra
y sentenciado a muerte, sino que despues gozó de con dos espadas sangrientas, y que en el término
un perdón general que dieron los oidores del Perú a de las dichas siete leguas pudiese poner horca y
todos los que se metiesen debajo del estandarte real, cuchillo, como tierra propia suya. AI dicho Diego
y por gozar del perdón fue con el mariscal en el García de Paredes le dio la gobernación perpetua
alzamiento del tirano Francisco Hernández y de Popayán, pero no la gozó, porque viniéndola a
entonces le hirieron en una pierna. Después estuvo servir le mataron indios en la provincia de Caracas,
preso porque se dijo que con un Lorenzo de como se verá en su historia de la ciudad de la Nueva
Salduendo, que habemos dicho arriba que él mató, Segovia de Barraquisinieto [sic]. Fue a España un
se quería alzar; era bullicioso y amigo de quimeras hidalgo, llamado Gonzalo de los Ríos, hombre de
y llamábanle en el Perú Aguirre el loco, y como se prendas, soldado de los descubridores desta
ordenó esta jorrnada de Pedro de Ursua, vino en gobernación, diole su Majestad la tesorería perpetua
ella porque ya no cabía en el Perú, y quizà fue mas desta gobernación, y le mandó dar para la iglesia
por entender que era para alzarse, que con ánimo de la dicha ciudad ornamentos y campanas, y lo
de servir a Su Majestad, y como vio, después que que más fuese menester, atento a que el tirano había
Pedro de Ursua iba con ánimo de servir al Rey, le quemado la dicha iglesia. Fue servicio este que se
mató y alzó por príncipe al D. Fernando y hizo las hizo su Majestad digno de remuneración porque no
demás muertes y males que hemos dicho, y esto lo solo se sirvió al Rey, sino a Dios Nuestro señor, el
digo para que se eche de ver cuan benignamente lo cual se sirva de dar el premio a todos de sus trabajos,
trataron los ministros de Su Majestad pudiendo como siempre hace.
haberle ahorcado muchas veces por sus delitos, y
Esta relación hizo el Bachiller Francisco
porque él se quejaba que habia servido mucho a su
Vázquez, soldado del dicho tirano, uno de los que
Majestad sin haber sido premiado, para que se vea
no quisieron jurar a D. Fernando de Guzmán por
como y cuando sirvió, y en que fue defraudado o
su príncipe, ni negar su Rey y señor, ni patria. Es
agraviado.
digno de crédito por ser hombre de bien y de verdad.
Acabado de desbaratar el tirano cruel y malo, Vino siempre con el tirano y le trató muy bien a él y
el gobernador y capitán general y demás capitanes a los demás, que no quisieron ser en el rebelión, y
se fueron al Tocuyo, donde residían, y los vecinos fue la causa, como se ha dicho, que primero que se
de Barraquisinieto [sic] tornaron a reedificar su rebelasen el tirano y D. Fernando, amonestaron a
pueblo, y los de Mérida también se fueron; de todo el campo, a que cada uno manifestase su
manera que quedó la tierra sosegada con la muerte voluntad, y que al que no quisiese ser en el rebelión
de tan mal hombre, y los tiranos que con él venían no le harían fuerza, por cuya causa no están libres
se fue cada uno a buscar su ventura, y algunos se de culpa los que siguieron al tirano.”
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 75

Referências
Adonias, I., 1963. A cartografia da região amazônica. Catálogo descritivo, 1500-1961, 2 vols. Rio de Janeiro.
Aguado, Fray P. de, 1918. Historia de Venezuela escrita en 1561. Edición de Jerónimo Bécquer, 2 vols. Madrid.
Almesto, P. de, 1881. Relación verdadera de todo lo que sucedió en la jornada de Omagua y Dorado que el
gobernador Pedro de Orsúa fue a descubrir por poderes y comisiones que le dio el visorey Marqués de
Cañete, desde el Pirú, por un río que llaman de Amazonas, que por otro nombre se dice el río Marañón, el
cual tiene su nascimiento en el Pirú, y entra en el mar cerca del Brasil. Trátase asimismo del alzamiento de
don Fernando de Guzmán y Lope de Aguirre, y de las crueldades de estos perversos tiranos. [Editado pelo
Marquês de la Fuensanta del Valle]. Colección de Bibliófilos Españoles, tomo XX. Madrid.
Almesto, P. de, 1909. Relación verdadera de todo lo que sucedió en la jornada de Omagua y Dorado que el
gobernador Pedro de Orsúa fue a descubrir por poderes y comisiones que le dio el visorey Marqués de
Cañete, desde el Pirú, por un río que llaman de Amazonas, que por otro nombre se dice el río Marañón, el
cual tiene su nascimiento en el Pirú, y entra en el mar cerca del Brasil. Trátase asimismo del alzamiento de
don Fernando de Guzmán y Lope de Aguirre, y de las crueldades de estos perversos tiranos. [Editado por
Manuel Serrano Sanz]. Nueva Biblioteca de Autores Españoles, tomo XV. Madrid.
Almesto, P. de, 1986. Relación verdadera de todo lo que sucedió en la jornada de Omagua y Dorado que el
gobernador Pedro de Orsúa fue a descubrir por poderes y comisiones que le dio el visorey Marqués de
Cañete, desde el Pirú, por un río que llaman de Amazonas, que por otro nombre se dice el río Marañón,
el cual tiene su nascimiento en el Pirú, y entra en el mar cerca del Brasil. Trátase asimismo del alzamiento
de don Fernando de Guzmán y Lope de Aguirre, y de las cueldades de estos perversos tiranos, pp. 99-
223, in Díaz Maderuelo, R., G. de Carvajal, P. de Almesto y Alonso de Rojas. La aventura del Amazonas.
Historia 16, Información y Revistas, S. A., Madrid.
Amezaga, E., 1957. Yo, demonio... Andanzas y naveganzas de Lope de Aguirre, fuerte caudillo de los invencibles
marañones. Bilbao.
Arciniega, R., 1946. Dos rebeldes españoles en el Perú. Buenos Aires.
Arteche, J. de, 1951. Lope de Aguirre, traidor. La tragedia del fuerte caudillo de los invencibles marañones.
Biblioteca Vascongada de Amigos del País, San Sebastián.
Arzans de Orsua y Vela, B., 1964-1965. Historia de la Villa Imperial de Potosí [Ed. De Lewis Hanke & Gunnar
Mendoza], 3 vols. México, D. F.
Bandelier, A. F., 1893. The gilded man (ElDorado) and other pictures of the Spanish occupancy of America.
New York.
Bayle, C., 1943. ElDorado fantasma. Madrid.
Bayo, C., s. d. Los caballeros de ElDorado. Madrid.
Bayo, C., 1913. Los Marañones. Madrid.
Benítez Vinuesa, L., 1945. Argonautas de la selva. México, D. F.
Bollaert, W., ed., 1861. The expedition of Pedro de Ursua and Lope de Aguirre in search of ElDorado and
Omagua in 1560-61. Hakluyt Society, London.
Booy, T. de, 1919. Lope de Aguirre. The Am. hist. Rev. Nov. 1919.
Borregan, A ., 1948. Crónica de la conquista del Perú [Ed. Por Rafael Loredo]. Sevilla.
Briceño Picon, A ., 1903. El tirano Aguirre. Paris & México, D. F.
Brindis Pérez, C., 1927. Lope de Aguirre, precursor de las libertades hispanoamericanas. Ciudad Bolívar.
Burmeister, L. G., 1941. Lope de Aguirre y la jornada de los Marañones. Buenos Aires.
Busto Duthurburu, J. A . de, 1963. Francisco de Orellana. Lope de Aguirre. Biblioteca Hombres del Perú, vol.
XXI. Lima.
Cabello Balboa, M., 1920. Historia del Perú [Ed. Por Horacio H. Urteaga & Carlos A . Romero]. Lima.
Campra, R. & A . Morino, 1981. Lo Sventurato viaggio di Lope de Aguirre . Dalla cronaca al mito, in Letterature
d’America 2(6). Roma.
Caro Baroja, J., 1968. El señor Inquisidor y otras vidas por oficio. Alianza Editorial [El Libro de Bolsillo 114],
Madrid.
76 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

Campo, L. del, 1970. Pedro de Ursua, conquistador español del siglo XVI. Ensayo biográfico. Pamplona.
Chapman, W., 1967. The golden dream: Seekers of ElDorado. Indianapolis, Kansas City & New York.
Cieza de León, P., 1984-1985. Obras completas. La crónica del Perú. Las guerras civiles peruanas [Ed. por
Carmelo Sáenz de Santa María], 2 vols. Madrid.
Cortesão, J., 1947. A lenda do lago Dourado e das Amazonas. Bolm geogr. brasil. 4(2).
Crovetto, P. L. & E. Franco, eds., 1982. Aguirre il traditore. Gênova.
Cuervo, A . B., 1892. Colección de documentos inéditos sobre la geografía y la historia de Colombia. Bogotá.
Cuneo Vidal, R., 1925. Las leyendas geográficas del Perú de los Incas: ElDorado, las Amazonas, Jauja. Boln
Acad. Hist., Madrid.
Díaz Maderuelo, R., 1986. G. de Carvajal, P. de Almesto y Alonso de Rojas. La aventura del Amazonas.
Historia 16, Información y Revistas, S. A., Madrid. [Crónicas de América XIX].
Febres Cordero, J., 1947. Los Dorados y el Parima. Caracas.
Fernández, D., 1963-1965. Historia del Perú, in Juan Pérez de Tudela, ed., Crónicas del Perú, 5 vols. Madrid.
Fuensanta del Valle, Marqués de la, 1881. Relación verdadera de la jornada de Omagua y ElDorado. Colección
de Bibliófilos Españoles XX. Madrid.
Galindez, J., 1948. Dos nuevas biografías sobre Lope de Aguirre. Euskojakintza 2(4-5).
Gandia, E. de, 1946. Historia critica de los mitos y leyendas de la conquista americana. Buenos Aires.
Garate, J., 1953-1955. Como ven los vascos a Lope de Aguirre. Boln. Amer. Est. Vascos 14, 16, 17, 20.
Garcilaso de la Veja, 1939. Historia general del Perú, 2 vols. Buenos Aires.
Gómez Pérez, M. del C., 1984. Pedro de Heredia y Cartagena de las Indias. Sevilla.
Gutiérrez de Santa Clara, 1963-1965. Quinquenarios o historia de las guerras civiles del Perú, in Juán Pérez
de Tudela, ed., Crónicas del Perú, 5 vols. Madrid.
Hagen, V. W. von, 1974. The golden man: The quest for el Dorado. Farnborough, Hampshire.
Hemming, J., 1984. En busca de ElDorado. Barcelona.
Ispizua, S. de, 1918. Los Vascos en América, in Historia de América 2(5). Madrid.
Jerez, F. de, 1946-1947. Verdadera relación de la conquista del Perú y provincia del Cuzco, llamada la Nueva
Castilla, in Enrique de Vedia, ed., Historiadores primitivos de Indias, 2 vols. Madrid.
Jiménez de la Espada, M., 1965. Relaciones geográficas de Indias, 3 vols. Madrid.
Jos, E., 1927. La expedición de Ursúa al Dorado. La rebelión de Lope de Aguirre y el itinerario de los Marañones.
Huesca.
Jos, E., 1942-1943. Centenario del Amazonas. La expedición de Orellana y sus problemas históricos, Fuentes
y bibliografía. Revta de Indias 11-14.
Jos, E., 1950. Ciencia y osadía sobre Lope de Aguirre, el peregrino, con documentos inéditos. Escuela de
Estudios Hispano-Americanos de Sevilla, Sevilla.
Lastres, J. B. & C. Alberto Seguin, 1942. Lope de Aguirre el rebelde. Estudio histórico-psicológico. Buenos
Aires.
Levillier, R., 1976. El Paititi, ElDorado y las Amazonas. Buenos Aires.
Lizárraga, R. de, 1968. Descripción breve de toda la tierra del Perú, Tucumán, Río de la Plata y Chile [Est.
preliminar de Mario Hernández Sánchez-Barba]. Biblioteca de Autores Españoles CCXVI. Madrid.
Lockhart, J., 1982. El mundo hispanoamericano, 1532-1560. México, D. F.
Lohmann Villena, G., 1956. El Marañón. Revta de Indias 1956: 271-302.
Lopez, C. F., 1947. Lope de Aguirre el peregrino, apellidado el Tirano. Primer caudillo libertario de América.
Historia de su vida. Caracas.
Malfatti, C., 1952. Tres relaciones de viajes por el río Marañón, llamado también de las Amazonas. Barcelona.
Mampez González, E. & N. Escandell Tur, eds., 1981. Lopes de Aguirre. Crónicas, 1559-1561. Barcelona.
Martinengo, A ., 1974. Il soldato-cronista Pedrarias de Almesto, ovvero storia di una riabilitazione letteraria.
Misc. Studi ispanici, Pisa 3.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 77

Martínez Mendoza, J., 1967. La leyenda de El Dorado. Su historia e influencia en la Venezuela antigua.
Caracas.
Monguía, P. de, 1885. Relación breve fecha por Pedro de Monguía... de lo más sustancial... de la jornada del
Gobernador Orsúa... e del alzamiento de Lope de Aguirre [1651]. Colección de Documentos inéditos relativos
al descubrimiento, conquista y organización de las antiguas posesiones españolas en América y Oceanía,
del Archivo de Indias, Tomo IV, pp. 191-215. Madrid.
Moreno Echeverria, J. M., 1968. Los Marañones. Barcelona.
Montesinos, F., 1906. Anales del Perú [Ed. Por Victor M. Maurtua], 2 vols. Madrid.
Morales Padrón, F., 1963. Historia del descubrimiento y conquista de América. Madrid.
Muñoz de San Pedro, M., 1953. Tres testigos de la conquista del Perú. Buenos Aires.
Naipaul, V. S., 1969. The loss of El Dorado. A History. London.
Oramas, L. R., 1947. En pos de ElDorado. Caracas.
Ortiguera, T. de, 1909. Jornada del río Marañón. {Editado por M. Serrano y Sanz]. Nueva Biblioteca de
Autores Españoles, Madrid.
Ortiguera, T. de, 1968. Jornada del río Marañón. [Estudio preliminar de D. Mario Hernández Sánchez-Barba].
Biblioteca de Autores Españoles, Tomo CCXVI (pp. 215-358). Madrid.
Otero Silva, M., 1979. Lope de Aguirre, príncipe de la libertad. Barcelona.
Pérez de Tudela, J., ed., 1963-1965. Crónicas del Perú, 5 vols. Madrid.
Posada, E., 1925. ElDorado: L’homme doré. Liège.
Porras Barrenechea, R., 1937. Las relaciones primitivas de la conquista del Perú. Paris.
Porras Barrenechea, R., 1962. Los cronistas del Perú, 1528-1650. Lima.
Ramos Pérez, D., 1954. Examen crítico de las noticias sobre el mito del Dorado. Cultura universit., Caracas
41: 19-58.
Ramos Pérez, D., 1958. Lope de Aguirre en Cartagena de Indias y su primera rebelión. Revta de Indias 73-
74: 511-540.
Ramos Pérez, D., 1973. El mito del Dorado, su génesis y proceso, con el ‘Discovery’ de Walter Raleigh (traducción
de Betty Moore) y otros papeles doradistas. Caracas.
Rodríguez, J. M., 1919. ElDorado. Boln Hist. Antigu. Bogotá 12(138): 354-361.
Ruiz, H., 1957. Esencia del mito Dorado. Estudios americanos 14: 71-72.
Ruiz, H., 1959. La búsqueda de El Dorado por Guyana. Anuario Estud. amer. 1959: 1-166.
Rumazo González, J., 1946. La región amazónica del Ecuador en el siglo XVI. Anuario Estud. amer. 3: 1-268.
Sender, R. J., 1967. La aventura equinocial de Lope de Aguirre. Madrid.
Serrano y Sanz, M., 1909. Relación verdadera de la jornada de Omagua y ElDorado, in Historiadores de
Indias. Tomo II. Nueva Biblioteca de Autores Españoles XV. Madrid.
Silveira, S. E. da, 1624. Relação sumaria das cousas do Maranhão. Lisboa.
Simón, Fray P. de, 1963. Noticias historiales de las conquistas de Tierra Firme en las Indias Occidentales, 2
vols. Academia Nacional de Historia, Caracas.
Southey, R., 1812. History of Lope de Aguirre. Edinburgh.
Southey, R., 1821. The Expedition of Orsua; and the crimes of Aguirre. By Robert Southey, Esq. LL. D. Poet
Laureate. Printed for Longman, Hurst, Rees, Orme, and Brown, London. [Este trabalho foi publicado
inicialmente no Edinburgh Annual Register, Vol. 3, parte 2: foi grandemente aumentado ao ser publicado
como livro].
Sprague de Camp, L. & W. Ley, 1960. De la Atlántida a ElDorado. Barcelona.
Torrente Ballester, G., 1940. Lope de Aguirre, el peregrino. Biografía. Madrid.
Torrente Ballester, G., 1941. Lope de Aguirre. Crónica dramática de la historia americana. Entre jornadas.
Ediciones Escorial, Madrid.
78 A Relação de Francisco Vázques sobre a Viagem de Pedro de Ursúa e Lopes de Aguirre...

Trujillo, D. de, 1948. Relación del descubrimiento del reino del Perú [Ed. Por Raúl Porras Barrenechea].
Sevilla.
Urreiztieta, I., 1959-61. En torno a Lope de Aguirre. Boln amer. 37-40, 42-46.
Uslar Pietri, A ., 1947. El camino de ElDorado. Buenos Aires.
Vargas Ugarte, R., 1966. Historia general del Perú, 6 vols. Barcelona.
Vásquez, F., 1881. Relación verdadera de todo lo que sucedió en la jornada de Amagua y Dorado que el
Gobernador Pedro de Orsúa fue a descubrir... trátase así mismo del alçamiento de don Hernando de Guzmán
y Lope de Aguirre y otros tiranos. (Editado pelo Marquês de la Fuensanta del Valle]. Colección de Bibliófilos
Españoles, tomo XX. Madrid.
Vázquez, F., 1944. Jornada de Omagua y Dorado. [Prólogo de Enrique de Gandía]. Colección Austral de
Espasa-Calpe, Buenos Aires. [2ª ed., 1945].
Vázquez, F., 1979. Jornada de Omagua y Dorado. Crónica de Lope de Aguirre, el peregrino. Miraguano Editores,
Madrid.
Vázquez, F., 1987. El Dorado: Crónica de la expedición de Pedro de Ursua y Lope de Aguirre [Intr. y notas de
Javier Ortiz de la Tabla]. Alianza Editorial [Libro de Bolsillo1246], Madrid.
Vázquez de Espinosa, A., 1942. Description of the West Indies [Ed. by Charles Upson Clarke]. Smithson.
Misc. Collns 102.
Vázquez de Espinosa, A., 1948. Compendio y descripción de las Indias Occidentales [Ed. Por Charles Upson
Clarke]. Smithson. misc. Collns 108.
Zapata Gollán, A., 1963. Mito y superstición en la conquista de América. Buenos Aires.
Zárate, A. de, 1946-1947. Historia del descubrimiento y conquista de la provincia del Perú, in Enrique de
Vedia, ed., Historiadores primitivos de Indias, 2 vols. Madrid.
Zúñiga, G. de, 1885. Relación muy verdadera de todo lo sucedido en el río Marañón en la provincia del
Dorado. Colección de Documentos inéditos relativos al descubrimiento, conquista y organización de las
antiguas posesiones españolas en América y Oceanía, del Archivo de Indias, Tomo IV, pp. 215-282.
Capítulo 5

NOTAS SOBRE RELATOS CURTOS DO SÉCULO XVII

William Davies (1614)


Segundo Moraes (1983: 248), “Davies was taken prisoner near Tunis by galleys belonging to
the Duke of Florence, and was kept as a slave for over eight years. Robert Thornton, captain of an
Italian ship, brought him aboard his ship as physician to an expedition to the Amazon, with the
Duke’s permission. After many adventures Davies returned to England, where he wrote this little
book (1614). The Amazon is described in Chapter 5, in which Davies writes about the animals of
the region [negrito nosso], but dwells mainly on the manners and customs of the Indians. The
Relation was reprinted in Churchill’s Collection of Voyages, Vol. I, pp. 473-588 (3rd ed.).

O “Reys-boeck” de 1624
Este opúsculo (Figura 5.1), com 66 páginas não numeradas, 1 mapa e 5 pranchas desdobráveis,
traz, no fol. 31, uma prancha intitulada “Brasilia Sept. Amazones, Orinoque”. Segundo Moraes
(1983: 734-735), “This work is signed ‘N. V. G.”, which Tiele believed to be ‘Nicolas van Geelkerchen’
of Leyden, printer of the Spilbergen Journal, 1619 edition. The words ‘By Ian Canin’, as well as the
titles of two plates, were printed at a later date. Brazil is described in the third part, and the fourth
is concerned with Guyana, the Amazon, and Maranhão. The Brazilian part was printed separately
in 1644. See Beschrijvinghe vande Lande Brasilien (Anon., 1644).”
Não sabemos se essa obra cita animais.

Figura 5.1. Frontispício de ‘Reys-boeck’ (1624)


80 Notas sobre Relatos curtos do Século XVII

“Korte en Wonderlijcke Beschryvinge”


Este panfleto (Anon., s.d., Figura 5.2), de 16 páginas, com 11 ilustrações no texto, e uma
vinheta na página de rosto, segundo Moraes (1983: 436), contém uma descrição do Amazonas,
com quatro ilustrações, que começa na página 10. Descreve-se aqui um monstro que “vive próximo
do lago Parima” e as mulheres chamadas “Amazonas”. Foi publicado anonimamente, sem data.

Figura 5.2. Frontispício de ‘Korte en Wonderlycke Beschryvinge’


O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 81

Referências
Anônimo, [s.d.]. Korte en wonderlijcke Beschryvinge, van de seltsame Wanschepsels van Menschen, die
ghevouden worden in het Coninckrijck Guianae, aen het Meyr Parime. Als mede van de Satyrs, en van de
Vrouwen die Amazoonen genoemt worden, daer van de oude Historien gewach maecken. Gillis Joosten
Saeghman, Amsterdam.
Anônimo, 1624. Reys-boeck van het rijcke Brasilien, Rio de la Plata ende Magellanes daer in te sien is de
gheleghentheyt van hare Landen unde Steden haren handel ende wandel met de vruchten unde
vruchtbaerheyt der selver: Alles met copere platen uytghebeelt. Als oock de leste reyse van den Heer van
Dort, met het ver-overen vande Baeye de todos los Santos, tsamen ghestelt door N. G. Ghedruckt in’t Jaer
onses Heeren Anno 1624. By Ian Canin.
Anônimo, 1644. Beschrijvinghe vande Landen van Brasilien ende het veroveren van Bahia de todos los Santos.
Voor de Weduwe van Zalig: Cornelis Lodewijcksz vander Plasse, Boeckvercoopster by de Beurs.
t’Amstelredam.
[Churchill], 1744. A collection of voyages and travels, some now first printed from original manuscripts, others
now first published in English. In six volumes. To which is prefixed, an introductory discourse (supposed to
be written by the celebrated Mr. Locke) intitled, The whole History of Navigation from its Original to this
time. Illustrated with near three thousand Maps and Cuts, curiously engraved on Copper. The third edition.
[Vol. I, Pt. 8: “True Relation of the travels... and captivity of William Davis, Barber-Surgeon of London, under
the Duke of Florence”]. Printed by Assignment from Messrs. Churchill, for Henry Lintot: and John Osborn,
London.
Davies, W., 1614. A true relation of the travailes and most miserable Captiuitie of William Davies, Barber-
Surgeon of London, vnder the Duke of Florence. VVherein is truly set downe the manner of his taking, the
longtime of his slauerie, and meanes of his deliuerie, after eight yeeres, and ten moneths Captiuitie in the
Gallies. Discovering many mayne Landes, Illandes, Riuers, Cities, and townes, of the Christians and Infidels,
the conditions of the people, and the manner of their Countrey: with many more strange things, as in the
Booke is briefly and plainely expressed. By William Dauies, Barber-Surgeon of London, and borne in the
Citie of Hereford, 20 pp. London. Nicholas Bourne, London.
Moraes, R. B. de, 1983. Bibliographia brasiliana. Rare books about Brazil published from 1504 to 1900 and
works by Brazilian authors of the Colonial period. Revised and enlarged edition. [2nd vol.] M-Z. UCLA
Latin American Center Publications, University of California, Los Angeles & Livraria Kosmos Editôra, Rio
de Janeiro.
Capítulo 6

A EXPLORAÇÃO DO AMAZONAS PELO


SENHOR DE LA RAVARDIÈRE (1613-1614) E A
“HISTÓRIA DOS ANIMAIS E ÁRVORES DO MARANHÃO”

A idéia de uma ocupação francesa do atual Estado do Maranhão, no nordeste do Brasil, foi
primeiro concebida pelo aventureiro Jacques Riffault, de Dieppe, que, pelo final do século XVI,
praticava incursões piratas naquelas costas. Riffault tinha obtido tão habilmente a amizade das
tribos locais (Tupinambá), que um chefete índio, Ovirapire (Ovyrapive segundo Berredo, 1849:38),
sugeriu-lhe que devera estabelecer-se naquela região, oferecendo-se a ajudar-lhe de todas as
maneiras possíveis. Riffault adotou incontinenti a idéia, e levou Ovirapire consigo de volta à
França.
Na França, mostrando os produtos de suas incursões, e com o auxílio de pessoas influentes,
aparelhou três navios, com os quais, em 1594, retornou ao Brasil, chegando a 14 de maio (Berredo,
1849: 38; Frei Vicente de Nossa Senhora dos Prazeres, 1891). Destes navios, um perdeu-se nos
escolhos da barra da ilha do Maranhão. Riffault foi excelentemente bem recebido pelos índios
Tupinambá, e após um certo tempo regressou à França. Parte da tripulação foi deixada em terra,
sob o comando de Charles des Vaux (ou de Vaux). O que aconteceu posteriormente com Riffault
não se sabe; o Pe. José de Morais (1860) crê que tenha morrido no mar, vítima de suas atividades
de pirataria.
Charles des Vaux nascera na Touraine, filho mais jovem de uma nobre família, e a América
era-lhe um meio de construir sua própria fortuna. Além disso, como diz Le Gentil (1832: 561-
562), teria sido atraído pelo “prazer sempre renovado de entrar na selva, de pescar e caçar com os
índios, atividades tão ao gosto da nobreza”. Conseguiu fazer muitos amigos entre os Tupinambá
do Maranhão (seu nome indígena seria Itajiba, ou seja, braço de pedra, ou braço de ferro, graças
às suas qualidades guerreiras), prometendo-lhes a proteção dos franceses contra os portugueses,
e instruí-los na verdadeira religião e nos costumes da Europa. Uma vez assim preparado o terreno
para uma ocupação francesa da ilha, navegou de volta à França, para comunicar ao rei Henry IV
seu grandioso projeto.
Tentado pela promessa de riquezas, mas assim mesmo hesitando em crer inteiramente num
aventureiro, Henry IV enviou a Daniel de la Touche, Senhor de la Ravardière, com des Vaux, a
investigar a verdadeira situação, prometendo que, se tudo fosse confirmado, ordenaria a fundação
de uma colônia naquelas plagas. La Ravardière já havia explorado a costa da Guiana, com Jean
Mocquet, que descreveria profusa e confusamente suas viagens no livro Voyages en Afrique, Asie,
Indes Orientales et Occidentales (1616), reeditado quatro vezes. Ao regressar da viagem, La
Ravardière trouxera consigo à França, como testemunha de seus feitos, um chefe índio, Iapoco, e
imediatamente a sua chegada obteve de Henry IV o posto de lugar-tenente do rei para colonizar
Caiena. Preparava-se para esta empresa, quando, ao saber do que andava propalando des Vaux,
não hesitou em abandonar seu projeto inicial. La Ravardière e des Vaux passaram seis semanas
no Maranhão, e, como tudo o que este último relatara fora confirmado, voltaram à França.
Entrementes, Henry IV fora assassinado (a 14 de maio de 1610) pelo fanático Jacques
Ravaillac. Louis XIII, seu filho, tinha então nove anos, e Marie de Médicis assumiu a Regência.
Demasiado ocupada com outros afazeres, a Rainha não tinha tempo para ouvir La Ravardière e
Des Vaux, mas o primeiro obteve-lhe a autorização de organizar uma companhia privada para
colonizar a ilha do Maranhão, que foi-lhe concedida a 1º de outubro de 1610 – devia estabelecer
uma colônia ao sul da equinocial, com a extensão de 50 léguas de cada lado de um forte que
teria de construir na ilha.
84 A Exploração do Amazonas pelo Senhor de La Ravardière (1613-1614)...

La Ravardière, o Almirante François de Razilly, Seigneur des Aumers, e Nicolas de Harlay de


Sancy, Baron de la Motte et de Gros-Bois, foram nomeados tenente-generais do Rei nas Índias
Ocidentais e terras do Brasil, pela Rainha Regente Marie de Médicis. Muitos nobres e outras
pessoas se prontificaram a participar da aventura. Quanto ao lado espiritual da empresa, e por
especial solicitação de Razilly, a Rainha Regente dirigiu-se a Frei Leonardo, provincial da Ordem
dos Capuchinhos, pedindo-lhe enviar como missionários ao Maranhão quatro frades. A mensagem
da Rainha foi lida publicamente no refeitório do convento da Rue Saint Honoré, em Paris, e 40
frades se ofereceram para a tarefa. O Provincial escolheu entre eles os Freis Claude d’Abbeville,
Arsène de Paris, Ambroise d’Amiens e Yves d’Évreux, este último como superior.
Três navios foram preparados para essa missão - La Régente, comandado por La Ravardière,
em cuja companhia iam Charles des Vaux e Razilly; La Charlotte, comandado pelo Baron de
Sancy; e o Sainte Anne, cujo capitão era o irmão de Razilly. Deixaram o porto de Cancale (na
Bretagne) a 19 de março de 1612. A 24 de junho aportaram na ilha de Fernando de Noronha,
onde permaneceram até 8 de julho. A 11 desse mês viram pela primeira vez as costas do Brasil,
seguindo-as depois constantemente, até chegarem à ilha de Upameri (que batizaram de Sainte
Anne) a 26 de julho. Ali encontraram-se com três outros navios de Dieppe. Des Vaux desceu a
terra para fazer contacto com os índios, tendo sido confirmado de sua colaboração. Pouco mais
tarde, um dos três corsários franceses trazia os padres à ilha do Maranhão, onde começaram a
construção de um convento, assim como a de um forte que foi chamado ‘Saint Louis’, uma
homenagem ao Rei de França, Louis XIII. Esta foi a origem da cidade de São Luís, agora a capital
do Estado do Maranhão (Berredo, 1749; Southey, 1971).

O livro de Claude d’Abbeville sobre o Maranhão (1614)


O Frei Claude d’Abbeville permaneceu apenas quatro meses nas costas do Maranhão,
regressando à França com Razilly, que levou consigo seis índios Tupinambá não-batizados, para
dar aos parisienses o espetáculo da cristianização desses selvagens. Tudo isto com o fito de obter
mais apoio para a aventura da France Equinoxiale, e para relatar os primeiros sucessos obtidos.
Dois anos mais tarde (1614), Claude d’Abbeville publicava seu livro Histoire de la Mission des
Pères Capvcins en l’Isle de Maragnan et terres circonuoisines, com muitas notícias acerca da região,
e com cinco capítulos sobre os produtos naturais da terra (Cap. xxxviii: Das coisas comumente
achadas na Ilha do Maranhão e vizinhanças e em primeiro lugar das árvores frutíferas; Cap. xxxix:
Dos animais encontrados na Ilha do Maranhão e vizinhanças, e em primeiro lugar das aves; Cap. xl:
Dos peixes achados no Maranhão; Cap. xli: Animais terrestres do Maranhão; Cap. xlii: Dos animais
imperfeitos do Maranhão), sem contar abundantes dados sobre os índios Tupinambá dessa região.
“É uma maravilha”, comenta Rodolfo Garcia (Garcia, in d’Abbeville, 1945: 9-12), “como, no curto
lapso de tempo de sua estada no Maranhão, Claude d’Abbeville tenha sido capaz de adquirir a
imensa quantidade de conhecimentos que transmitiu à posteridade. Sem dúvida de grande valor
foram-lhe as informações que, provavelmente, foram proporcionadas por Charles des Vaux e David
Migan [nosso itálico], com uma grande experiência do Brasil”.
Este David Migan citado por Rodolgo Garcia era nativo de Dieppe e, como muitos outros na
Normandia de fins do século XVI, viera tentar sua fortuna entre os selvagens do Brasil (Denis,
1864: 400, nota 35). Ele tornou-se um dos truchements dos franceses durante a ocupação do
Maranhão. Os truchements, ou intérpretes, eram assim chamados a partir de uma palavra derivada
do árabe turdjuman, originadora do português turgimão; a etimologia, diz Petrone Moisés (1996:
151, rodapé) está certamente relacionado a fato de os intérpretes empregados pelos europeus
(especialmente pelos portugueses) em suas explorações das costas africanas, serem árabes. Migan
retornou à França com Razilly, e foi responsável pela tradução, para a Rainha Regente, do discurso
feito pelo cacique Tupinambá Itapucu (Denis, l. c.). Regressou depois ao Brasil, onde morreu
numa peleja contra os portugueses, por ocasião da retomada de São Luís.
É na verdade surpreendente como, em período tão limitado, viajando quase todo o tempo,
Frei Claude d’Abbeville possa ter dominado a língua Tupi, escrevendo sobre geografia, botânica,
zoologia, etnologia (incluindo o conhecimento de astronomia dos índios). Nossa hipótese é que ele
muito provavelmente incluiu em seu livro informações de outras fontes (de des Vaux ou de Migan,
como sugerido por Rodolfo Garcia), sem devidamente reconhecer a devida autoria. No livro escrito
por Frei Yves d’Évreux (1615), que passou oito anos no Maranhão, apenas constam alguns
comentários primários e ingênuos sobre as plantas e animais (Cap. xxxix: Singularidades de algumas
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 85

árvores do Maranhão; Cap.xl: Dos peixes, aves e lagartos que se acham nessas terras; Cap. xli: Da
pesca no Piry; Cap. xliii: Da caça de ratos, formigas e lagartos; Cap. xliv: Das aranhas, cigarras e
mosquitos; Cap. xlv: Dos grilos, camaleões e moscas; Cap. xlvi: Dos jaguares e macacos do Brasil;
Cap. xlvii: Das águias, aves grandes e pequenas daquele país) e muito raramente achamos um
nome Tupi para plantas ou animais, apenas sendo usados nomes franceses.
Frei Yves d’Évreux informa-nos também que o Seigneur de la Ravardière partiu do Maranhão
a 8 de julho de 1613, para explorar a foz do Amazonas, no atual Estado do Pará, permanecendo
nessa região até uma data desconhecida do ano de 1614, quando teve notícia de que os portugueses
haviam começado a campanha de recuperação do Maranhão.
Segundo Ferdinand Denis (in d’Évreux, 1929: 55), La Ravardière ordenou que se escrevesse
um relatório sobre o Amazonas. Esse relatório nunca foi publicado, e não se sabe o paradeiro do
manuscrito. Uma parte dos resultados dessa expedição, como veremos na seqüência, deve fazer
parte do material levado a Portugal por Frei Cristóvão de Lisboa.

Os portugueses recuperam o Maranhão


Os portugueses, comandados por Jerônimo de Albuquerque, finalmente ganharam a
campanha, e a 3 de novembro de 1615, La Ravardière foi intimado a render a colônia e o forte,
abandonando toda a artilharia e as munições, dentro e fora do forte, e todos os navios, grandes e
pequenos, sem receber nenhuma indenização. Os franceses foram enviados de volta a seu país em
duas naves, separadamente, deixando reféns. Os que se haviam casado com mulheres índias
puderam permanecer no Brasil.
Durante essa época, na França, um casamento entre Louis XIII e uma princesa de Espanha
estava sendo considerado, e todas as hostilidades entre os dois países tiveram que cessar. A
publicação de um livro que contava a invasão francesa de uma colônia espanhola (o Maranhão)
não mais podia ser tolerada, e houve ordens para que o livro de d’Évreux, que estava sendo
impresso, fosse destruído, e tudo o que se relacionava à aventura da França Equinocial fosse
esquecido. Como comentou Raeders (1958); “Le père Yves, rétiré à Rouen ou à Evreux, sans être
passé par Paris, reçut, probablement, l’ordre de garder le silence dans sa retraite. Seul, François
Razilly résista courageusement contre l’imposition de l’oubli. De plus, sachant que le livre composé
par le père Yves ‘allait être détruit complètement bien qu’il fut imprimé dans son intégrité, il se
transporta à l’imprimérie de Huby pour s’y faire remettre un exemplaire du livre; soit qu’il n’y ait
pas mis assez de diligence dans ses démarches, soit que la destruction de l’oeuvre fut commencée,
les feuilles qu’il parvint à se faire délivrer, où qu’un de ses agents se procura par subtils moyens,
ne purent être réunies sans qu’on eut à déplorer la perte de divers fragments; des lacunes assez
importantes ne permirent point d’en former un exemplaire complet. L’Amiral fit imprimer sa
protestation, autre part sans doute que dans les ateliers de la rue Saint-Jacques; il la joignit au
livre qu’il fit relier magnifiquement aux armes de la Maison de France, et il alla le porter, non pas
à Marie de Médicis, l’ancienne protectrice de la colonie du Maranham, mais à Louis XIII’. Ferdinand
Denis, l’auteur de cet exposé, avance que le roi ‘lut peut être quelques pages du beau volume que
Razilly venait de lui offrir, mais à cela se borna l’interêt qu’il lui accorda. Le livre du P. Yves accolé
à celui du P. Claude, dont il était la suite, fut déposé sur les rayons de la bibliothèque, et tout le
monde l’y laissa dormir’. Et c’est là que le même Ferdinand Denis, bibliothéquaire en chef de
Sainte Geneviève, grand ami du Brésil, l’initiateur des études brésiliennes en France, alla l’y
chercher, pour le publier en 1864”.
Alguns anos mais tarde, La Ravardière, caído em desgraça, podia ser visto em Lisboa, pedindo
mercês alegando serviços à Coroa Portuguesa, por haver entregue o Forte de São Luís e sua
artilharia (Southey, 1971: 111).
Os portugueses receberam ordens de expulsar todos os franceses do norte do Brasil, incluindo
os que estavam no Pará. A essa região foi enviado Francisco Caldeira de Castelo Branco, com 150
homens, dez peças de artilharia e três naves. Com Castelo Branco seguiu um piloto francês, o
famoso Charles des Vaux (Abreu, 1988: 111-112; Petrone-Moisés, 1996: 161). A expedição saiu
no dia de Natal, e em 1616 entrou pela boca do Amazonas, fundando a cidade de Belém.
Não temos idéia do que depois sucedeu com des Vaux, mas é muito provável que tenha
permanecido no Maranhão até sua morte.
86 A Exploração do Amazonas pelo Senhor de La Ravardière (1613-1614)...

Jerônimo de Albuquerque permaneceu posteriormente no Maranhão, construindo uma cidade


em torno do forte de São Luís. Depois de sua morte (com 70 anos de idade), o governo do Maranhão
passou por várias mãos. Em 1621 Maranhão e Pará foram unidos sob um mesmo Estado,
dependente diretamente da Coroa Espanhola, e independente do Governo Geral do Brasil, uma
situação que perdurou até 1777.

Frei Cristóvão de Lisboa no Maranhão e no Pará


Ao final do reinado de Felipe III de Espanha (Felipe II de Portugal) (1621) e o início do reinado
de Felipe IV de Espanha (Felipe III de Portugal), a Inquisição espanhola estava exercendo seu
brutal domínio em Portugal (que nesse tempo era parte do império espanhol). Quase todos os
comerciantes judeus do Porto tinham sido presos, e muitas dessas vítimas tinham agentes
comerciais no Brasil (na maioria “cristãos-novos”), representando séria preocupação para o Santo
Ofício (Southey, 1971: 305). Ordenou pois o monarca espanhol que a Inquisição se dirigisse ao
Maranhão, entre outros pontos do Brasil, “para assistir a coisas relativas a nossa santa fé”, e
ordenou-se aos frades do Convento de Santo Antônio de Portalegre da Província da Piedade, em
Portugal, que assumissem esse encargo.
Frei Cristóvão de Lisboa (para sua biografia ver Walter, in Lisboa, 1967: 10-14) apresentou-
se como voluntário para essa missão, e foi nomeado ‘Inquisidor Apostólico e Custódio do
Maranhão’. Ele e seus subordinados deixaram Lisboa a 15 de março de 1625, no mesmo navio
ocupado por Francisco Coelho de Carvalho, o novo Governador do Maranhão. Chegaram a Recife,
Pernambuco, a 2 de maio. Frei Cristóvão continuou viagem a Fortaleza, no Ceará, e então até
São Luís do Maranhão, onde desembarcou a 16 de agosto. Ali fundou um convento (Santa
Margarida), inaugurado a fevereiro de 1626. Uma de suas funções em São Luís era “exterminar
todos os vestígios da presença anterior dos franceses, levando-o ao extremo de queimar muitos
livros, que encontrou pertencentes aos hereges franceses...” (Walter, in Lisboa, 1967: 13; itálico
original).
Ora, nossa hipótese é que ele achou nessa ocasião, ao purgar livros e outros papéis deixados
pelos franceses na pressa de irem embora, após sua derrota por Jerônimo de Albuquerque, algumas
gravuras de animais e plantas, preparadas por algum francês anônimo (talvez des Vaux, ou algum
artista que acompanhava des Vaux em suas viagens) e um manuscrito sobre o mesmo assunto,
que foram publicados em 1967, sob o nome de Frei Cristóvão. As pranchas, indubitavelmente,
foram feitas por um francês, que conhecia a língua Tupi, pois todos os nomes estão escritos em
Tupi, naturalmente com ortografia francesa. Só para dar um exemplo, todas as vezes, a palavra
tupi “açu” ou “guaçu” (asu no português da época) aparece escrita “ouassou”; além disto, muitos
dos nomes originais escritos nas pranchas concordam aproximadamente com a grafia dada por
Claude d’Abbeville (1614). Walter (in Lisboa, 1967: 27) admite que a cultura universitária de Frei
Cristóvão era sólida, mas do ponto de vista da teologia; não era uma cultura que lhe permitisse
escrever sobre flora e fauna usando os preceitos científicos vigentes na época; e que parece tampouco
ter dotes artísticos suficientes para elaborar as pranchas que nos deixou. Assim, diz Walter, teve
que pedir a alguém que o ajudasse, e não sabemos se para isso concorreu algum de seus
companheiros. Supondo-se que algum dos frades sob o seu comando tivesse preparado os desenhos,
por que os nomes de animais e plantas estão consistemente escritos com grafia francesa, e não em
português? Por que, até na folha de rosto do manuscrito, onde está o título em português, Historia
dos animaes, e arvores do/ Maranhão./ Pelo muito Reverendo Padre Fr. Chris-/tovão de Lisboa
Calificador do Santo/ Officio, e fundador da Custodia do/ Maranhão da Recoleção de/ Santo Antonio
de/ Lisboa/ Anno...”), na margem superior esquerda está escrito, em francês claro, “S t. Louis de
Maranhan/ vil. du Brésil”? Para alguém ansioso em livrar-se das “heresias” francesas, o emprego
da língua francesa seria, no mínimo, um paradoxo!
Uma vez completadas as providências em São Luís, Frei Cristóvão decidiu ir a Belém, também
sob sua jurisdição, chegando a essa cidade a 29 de abril de 1625. Continuando pelo Amazonas
acima, foi até o rio Tocantins, regressando depois ao Maranhão (Walter in Lisboa, 1967: 12-13).
Sua próxima viagem levou-o ao Ceará, em data desconhecida (Walter in Lisboa, 1967: 13). Duas
vezes mais esteve no Pará, a última vez em 1630 (Walter in Lisboa, 1967: 14).
Frei Cristóvão regressou a Portugal em 1635.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 87

A História Natural e Moral do Maranhão de Frei Cristóvão de Lisboa


Walter (in Lisboa, 1967: 17-21) insiste que Frei Cristóvão tinha a intenção de escrever uma
história do Maranhão. Tal assertiva se baseia em várias evidências. Em primeiro lugar, no final de
uma biografia de Frei Cristóvão diz-se que:
“frey christouão (...) compos das Couzas do Maranhão hum Liuro que ainda não Sahio a
lux, Com grande noticia de toda a Geographia e diserpção (sic) do Governo do Maranhão, com a
das plantas, Animaes, E homens, Seus Custumes E ritos, Suas inclinassois, Suas Guerras E
tudo o mais que se pode Saber delles athe o prezente E com a Rellasão dos sucessos,
descubrimentos Guerras, E Gouerno dos nossos Portuguezes desde a primeira entrada que fizerão
naquellas partes, athe o tempo prezente, obra de grande trabalho E Coriosidade, Com que o
Autor mostra bem que Vio, E que Sentio o que Soube escrever”.
Em segundo lugar, escreveu Frei Cristóvão a seu irmão, o historiador e chantre da Sé de
Évora (Portugal), Manuel Severim de Faria, pedindo-lhe instruções sobre a maneira de escrever
um livro sobre história. Em um autógrafo de Manuel Severim de Faria, reproduzido por Walter (in
Lisboa, 1967: 18-21), está mencionado um livro sobre o Maranhão (cf. op. cit., p. 20, sob
“2o. Livro”).
Em terceiro lugar, numa missiva enviada por Frei Cristóvão a este seu irmão, datada do
Maranhão, 20 de janeiro de 1627, consta o seguinte:
“...e tirei o Caderno dos que uou fazendo uma historia destas partes não me fiqua original
mais que as relações escriptas e ouuidas o estilo limareis uos la, que Eu não tiue tempo para isso,
e guardai mo. Este original uai mui aiustado com a uerdade, não digo mais que as necessarias
para a historia calando o mais e dizendo, o menos, uai tambem a relação de tudo o que fis com
outra desta Conquista, e da do Pará, e dos indios della nesta podeis acrescentar algûa couza do
grande fruto que se faz neles, que nisso uou diminuto, de tudo escolhei o que uos parecer para
mandardes ao Duque, e a Dom Duarte, porem estes papeis uão so por hûa uia porque sou pessoa
ocupadissima não tenho quem me treslade, meu Companheiro assas faz em escreuer o que escreue
mando tambem as amostras de todos os paos, as das cabaças que he a baixela dos Indios no Pará
hûa Cortiça, de hû pao que cheira se vos parecer mandar algûa Couza a estes dous senhores na
forma em que uão o fazei porque com isto me paresse cumpro com a obrigação de lhes mostrar as
Couzas da terra, o tratado das Aues plantas, peixes, e animaes, ando apurando e Concertando e
uai isto debuxado tambem, e não se pode arriscar porque iá o não hei de poder tornar a
reformar”[nosso itálico].
Uma vez em Lisboa, Frei Cristóvão, em meio a seus deveres religiosos (chegou a Bispo),
continuou, aparentemente, a trabalhar em seu livro, intitulado História natural e moral do Maranhão,
que deveria publicar-se em quatro volumes. Sentindo que sua vida chegava ao fim (morreu a 14
de abril de 1652), deixou, em 1650, a Frei Diogo de Penalva, seu superior, instruções sobre o
destino que deveria ser dado a seus livros (Carta em que Frei Christouão de Lixboa escreueo ao
Prouinsial estando para morrer sobre os seus liuros; cf. Walter in Lisboa, 1967: 25), entre as quais
declara estes importantes fatos:
“Compus tambem a Historia, natural e moral do Maranhão em Quatro volumes, trabalhei
no que se compadecia com a Historia aproueitar no espiritual, e temporal aos que a lerem prometeu
me Antonio de Albuquerque 100 cruzados para ella por ueses; Estymarei que Vossa paternidade
queira fazer hûa supplica ao Principe a quem o dediquei, que mandando me Sua Mag.de dar 100
cruzados cada anno do Bispado donde me Ellegeu postos na mão do Sindico, se podem Gastar
nesta impressão em fazer se que sera Gloria de Deos & honra da prouinsia para este livro mandei
fazer trinta e tantas estampas, das que troixe tiradas pello natural, que troixe nú livro, o quoal
dei a Ioam Bauptista oriues do ouro, o quoal fes duas estampas que me parece lhe estam paGas,
pode continuar com as mais se Vossa paternidade for seruido. (...). o Capitam Baltesar de fontes
me deu o sitio de Graça em que fundei o Conuento do Pará, e me prometeu me auia de aiudar, a
sair com este liuro do Maranhão a lux: Eu lhe prometi De fazer mensão nelle, depois de me uir, foi
este capitam promouido em a Capitania do Comutá e depois dos Toquantins, Esta memoria se Eu
a não deixar feita no liuro o Irmão deffinidor frei Gabriel esta a sua Conta fase la”.
Tal como comentado por Walter (in Lisboa, 1967: 28), Frei Cristóvão selecionara, apenas 30
e poucos desenhos de plantas e animais, dos 259 que ora existem, para ilustrar seu livro. Walter
mostrou, de maneira muito engenhosa, que em realidade deveriam ser 44, todos aqueles marcados
nas pranchas originais com a expressão “estampa”. Foram gravadas duas pranchas experimentais
pelo então notável artífice João Baptista (cuja biografia foi publicada por Costa, 1925). Diz Walter
(l. c.) que o manuscrito original de Frei Cristóvão perdeu-se, provavelmente por ocasião do grande
88 A Exploração do Amazonas pelo Senhor de La Ravardière (1613-1614)...

terremoto de Lisboa, em 1755. Crê esse autor que, felizmente, porque haviam sido deixados com
o Mestre João Baptista, os desenhos e o manuscrito que ora temos se salvaram do desastre.
O que aconteceu com esse material desde que foi deixado com Mestre João Baptista até 1933
permanece um mistério.

O Códice Animaes do Maranhão


Em novembro de 1933 foram redescobertos os desenhos e o manuscrito, que foram mostrados
em 1934, por ocasião da Exposição Colonial Portuguesa no Porto (Pina, 1942; Pina dá um resumo
do códice, publica seu índice e alguns desenhos). A 17 de fevereiro de 1934, o Diretor do Arquivo
Histórico Ultramarino de Lisboa informava o Governo Português que João da Silva Coelho,
proprietário da Livraria Coelho, propunha vender o códice à Nação, pela quantia de 3.500$000. O
precioso manuscrito foi adquirido nesse mesmo ano de 1934. Várias tentativas de publicar esse
material malograram. Nesse ínterim, foi o códice mencionado por Reis (1940) e Rizzini (1946). Em
1950 e 1952, Luísa da Fonseca publicou alguns artigos sobre Frei Cristóvão. Outros dados sobre
o frei surgiram no livro de Kiemen (1854).
Apenas em 1967 seria publicado o códice (Lisboa, 1967).
Esse Códice, ora na seção de “Reservados” da Biblioteca do Arquivo Histórico Ultramarino
em Lisboa, mede 0,30 x 0,22 cm, está encadernado em pergaminho amarelo, e tem no dorso, em
escrita do século XVII, em tinta marrom, Animaes do Maranhão. Contém 198 fólios, em boas
condições. A página de rosto tem escrito, como mencionado acima, em sua margem superior
esquerda, “St. Louis de Maragnan/ vil. du Brésil” e abaixo “Historia dos animaes, e arvores do/
Maranhão/ Pelo muito Reverendo Padre Fr. Christo-/vão de Lisboa Calificador do Santo/ Officio, e
fundador da Custodia do/ Maranhão da Recolecção de/ Santo Antonio de/ Liboa/ Anno...”.
Os três fólios seguintes, sem numeração, apresentam uma ordem mais ou menos alfabética dos
nomes que aparecem no texto do códice. Os 164 fólios seguintes, todos numerados, contêm vários
desenhos, alguns a lápis e cobertos com tinta, um ou outro esboço a lápis; os fólios 29, 30, 31, 61
e 70 estão em branco; o fólio 35 foi arrancado. Os seguintes 30 fólios contêm um texto, relativo às
espécies figuradas, estando o fólio 171 em branco.
Notam-se três ou quatro escritas diferentes no códice. A primeira pode-se atribuir a Frei
Cristóvão (que aparentemente preparou o índice). Na segunda foram escritos os nomes originais
que aparecem nas pranchas, e que foram substituídos, quase em sua maioria,
subseqüentemente, por uma terceira escrita, provavelmente pertencente à pessoa que reviu
as pranchas e que aparentemente traduziu o texto francês original (hoje perdido). Na quarta
escrita estão escritos alguns poucos nomes (p. ex., “tatu” na pl. 65). O texto, em péssima
escrita, como já notado por Walter (in Lisboa, 1967: 9), está também em péssimo português,
“ou melhor, num Português que chama atenção para a pouca cultura que deve ter possuído o
autor” (Walter, l. c.). Walter (in Lisboa, 1967: 27) declara que tampouco o texto foi escrito por
Frei Cristóvão, sendo possível que tenha sido composto pelo companheiro a que se fez referência
antes, e que teria compilado por ele a partir dos relatos de algum português que falava sobre
as espécies figuradas e outras, quando lhe vinham à memória. Comenta ainda Walter que
parecia-lhe ser o autor dos comentários um europeu [cf., p. ex. Folio 166r, de nossa europa],
com um profundo conhecimento da região por nela ter vivido por muitos anos, conhecendo
bastante bem a língua nativa, e que tinha tido contacto com os franceses [e.g., Fol. 179v: os
franceses levaram desta terra]; supõe ainda Walter tratar -se de uma pessoa de condição
modesta, como se depreende da simplicidade das descrições, da forma de expressão, e de
algumas observações espontâneas indicativas dessa condição [e.g., Fol. 180v: para fazer latadas
para os fidalgos]. Ressalva mui honestamente Walter que um fato depõe contra a nacionalidade
portuguesa do autor; encontram-se no texto, vez ou outra, além de referências à França, uma
ou outra palavra escritas à francesa, um exemplo notório sendo a palavra serizes em vez de
cerejas [Fol. 179r]. Isto faz-nos pensar, conclui Walter, que o colaborador de Frei Cristóvão
fosse um português que havia mantido contacto com os franceses, tendo-lhes fornecido muitos
dos elementos que, mais tarde, pôs à disposição do Custódio.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 89

A hipótese de que os originais eram franceses


Pensamos, ao contrário de Walter, que é muito provável que o manuscrito que ora existe seja
uma tradução de um manuscrito original escrito em francês, feito por algum francês residente no
Maranhão, que, sem dúvida, vivera por longos anos nessa região, e tinha bom conhecimento de
Tupi. Esse manuscrito, ora perdido, serviu de base para a tradução que ora conhecemos,
provavelmente feita por um francês semi-letrado que conhecia um pouco (muito pouco) de
português, que fez um massacre extraordinário do original. Quando não sabia traduzir uma
expressão francesa, adaptava-a de modo extremamente grosseiro ao português; exemplo notável
é a expressão “sarafarsarlhem”, que aparece no Fol. 190v, sob “Cabure”, e que sem dúvida é o
francês “scarifier” [ver abaixo transcrição do texto, na seção abaixo]. No texto sob “Arara” (Fol.
191v), inventou a expressão “imsiantes”, escrita foneticamente (em francês; leia-se “anciantes”)
para corresponder ao francês “ancients” (antigos). Este trecho, ademais, é muito importante, do
nosso ponto de vista, por manter, mais que qualquer outro, o sabor da língua original do manuscrito;
com efeito, pode-se recuperar quase integralmente o original das duas últimas sentenças:
“et s’ils étoient enseignés à parler ils parleroient comme perroquets. Je m’étonne de ce que les
ancients romains, si curieux qu’ils ont [amortalhado] et enterré un corbeau et dit répons [parce-qu’il]
parloit, feroient-ils s’ils auroient ces oiseaux?”. Isto explicaria o número não muito grande, mas
apreciável, de expressões francesas (tal como o caso de serizes) deixadas no manuscrito. Para
adaptar o texto original aos propósitos de Frei Cristóvão, adaptou às vezes “França” para “Portugal”.
O autor do texto francês original era pessoa de certa cultura, e conhecia também muito bem
os clássicos romanos, como também se depreende do texto sob “Arara” (Fol. 191v), e sua citação
do caso do corvo (ver nota abaixo).
Quanto às figuras, mostramos em um artigo (Papavero et al., 1999) que os nomes originais
tupis estão todos escritos com ortografia francesa, sendo depois, infelizmente, estropiados e
rasurados por Frei Cristóvão ou por seu “ajudante”.
A total ignorância de Frei Cristóvão sobre os nomes dos animais é patente no Índice por ele
preparado. Exemplos suficientes podem ser consultados em Papavero et al., 1999 e Teixeira &
Papavero, 2000.
Em resumo, nossa hipótese é que tanto o manuscrito original (agora perdido) como as pranchas
foram provavelmente executados muito tempo antes da chegada de Frei Cristóvão ao Maranhão,
possivelmente por ordem de La Ravardière, depois da partida de Claude d’Abbeville para a França,
sem dúvida contando com o indispensável concurso de des Vaux, para mostrar as riquezas naturais
da região, tentando levantar mais fundos para a aventura da França Equinocial. Este intento foi
duplamente frustrado, pela recuperação do Maranhão pelos portugueses, e pelo casamento de
Louis XIII com uma princesa espanhola, e a resultante censura de assuntos relativos à invasão
francesa de uma colônia espanhola. Na pressa de abandonar a ilha, esses originais foram
abandonados em algum lugar, onde os descobriu Frei Cristóvão, ou um de seus agentes, durante
a tarefa de expurgar São Luís de escritos “heréticos” deixados pelos franceses. Ao conceber a idéia
de escrever uma história do Maranhão, Frei Cristóvão deve ter pensado em utilizar esse material,
para suprir sua total ignorância de assuntos biológicos, e fez com que um francês qualquer, com
muito pouco traquejo em português, “traduzisse” o manuscrito, cotejando-o com as ilustrações,
tarefa desastrosa, que resultou inclusive na perda total ou parcial, ou distorção, de muitos nomes
tupis originalmente escritos nas pranchas.
De qualquer modo, Frei Cristóvão, apesar de não ser o autor do códice, teve o mérito de
salvar um importante documento, a primeira monografia da fauna e flora do Maranhão, e as
primeiras ilustrações de animais do Baixo Amazonas.
Ocuparam-se da identificação dos animais representados no códice “Animais do Maranhão”
os zoólogos Ávila-Pires (1989), Carvalho (1964), Frade (1966, 1984), Nomura (1996), Oren (1990),
Pinto (1979). Comentários sobre essas identificações foram feitos por Papavero et al., 1999 e
Teixeira & Papavero, 2000.
90 A Exploração do Amazonas pelo Senhor de La Ravardière (1613-1614)...

Texto relativo aos peixes do Pará e às aves


PEIXES: ACARA [Fols. 56, 175 vo]. tê hû palmo he sadio
“PIRAIUI [Fols. 44, 175]. Piraiui quer dizer tê hû espelho no raboo he dourado per fora o
bagre grande. He de 7 ou oito palmos de comprido espelho.
E proporcionalmente grosso he de pelle he bom para PIRAURUCA [Fols. 57, 175 vo]. he de 8 palmos
comer toma-se a linha. de gramdes escamas he muito carregado não se
VACU [Fol. 175]. He paixe [sic] armado que se come senão com muita necessidade he muito gordo
não paresse hua frecha de 3 ou 4 palmos de a cor pardo pera o rabo he tirante a uermelho.
comprido he de cor parda pela barriga tira a amarelo AMURE [Fols. 58, 175 vo]. he de hû palmo de
he bom para comer toma-se a linha tem o olho uerde. comprido descama pequena tira a pardo no pescoço
ARUANA [Fols. 48, 175] he tres palmos de hu pouco preto.
comprido as escamas grandes a cor de prata comese IEIU [Fols. 58, 175 vo]. ieiu he de hû grande
a barbatunha [sic] tem uermelhas. palmo de escama de cor pardo he peixe mui cheio
UPIAUA [Fols. 49, 175]. he de meio palmo de de ouas E mui bom pera comer.
comprido tem os olhos que tirão a uermelho he bom IUNDIA [Fols. 59, 175 vo]. iundia he de hû grao
pera comer a escama per sima do pescoro [sic] he palmo de pele he de mui bom gosto.
parda. ARAMAÇA [Fols. 59, 175 vo]. Aramaça he a
VAREM [Fols. 49, 175]. he peixe de hû palmo modo desolhas he de palmo e meio de comprido.
de comprindo [sic] parece se com a tainha. COROBLAN [Fols. 59, 175 vo].
CUCUNARE [Fols. 50, 175]. he peixe de 3 ou PIAN [Fols. 60, 175 vo].
4 palmos de comprido as escamas são pequenas
tira a preto E ouro tem hus espelho no rabo no meio JURARA DO PARRA [sic] [Fols. 60, 175 vo]. he
preto e a derredor tira a ouro he o melhor peixe hû modo de peixe conforme a tartarugua do mar
desta terra. salgado as cores são desformes que são parda e
amarellas e dellas ai algûas muito grandes e sendo
TARERIRE [Fols. 50, 175]. he peixe de dous uiuas tem mas olor a carne ou peixe dela se come e
palmos de comprido de escama pequena tem dentes dellas se faz muita mãoteiga muito boa que pera
agudos a cor he parda E tira a uerde a barbatanas comer serue e pera candea.
E rabo com tiras de preto cubetas [sic].
PIRA MOTA [Fol. 175 vo]. he hû peixe como hû
SIAUM [Fols. 50, 175]. he peixe de hû palmo bagre e he de dous athe tres palmos de comprido
de pele da cor de bagre he bom pera comer. tem os olhos prettos e a cor e paresenca he como de
MANII [Fols. 51, 175]. he 2 palmos he de pele bagre.”
E como bagre he bom pera comer.
SUI [Fols. 52, 175]. he 3 pal[mos] cor pardo E AVES
preto he d[e] co[mer]. “TEIEIU [Fols. 74, 184]. O teieieu he pasaro
CAYEIYU [Fols. 52, 175]. he peixe desta forma muite grãode tem o corpo grãode como hûa ouelha
e maneira que esta pintado tem aqueles esporois tem o biquo de hûo grãode palmo e o biquo he preto
com que pica qualquer cousa que sente iunto a si. e a cabeca preta sem pena e o pesquoso uermelho
IACUNDA [Fols. 53, 175]. he peixe de pardo e sem pena e o sorpo [sic] todo bramquo e hele tem
uerde os olhos são uermelhos há tres castas delle os peis de dous palmos gramdes e cão pretos eles
são de 2 palmos e meio de comprido a outra casta fazem os filhos em riba de pauos muito grossos e
muito altos e fazem tres e quoatro filhos e uiuem de
diferenca se que têm no rabo hû espelho a outra
peixe e tem no bucho grandes peixes de palmo e
casta he raiada de preto azulado são bõs pera comer.
meio ou dous palmos he passaro muito duro que
PYRAIAGUARA [Fols. 54, 175]. he especie de parese carne de uaqua os filhos he muito bom
porco marinho no sabor he como porco comer.
principalmente o figado tem as partes genitais como
YABORU [Fols. 75, 184]. Yaboru, he pasoro
o porco tem noue palmos de comprido e grosso nesta
mais pequeno hû pouquo que o teieiu he todo
proporcão face do rabo manteiga as femeias parem
bramquo fora as pomtas das azas e os peis e o biquo
como os animais tem hû buraco asima do naris por
que cão pardos que tirão de preto e uiue de peixe e
onde respira e lanca algua [sic].
fazem ceus filhos em riba de grãodes pauus e fazem
VACARI [Fols. 55, 175 vo]. he peixe armado de tres ou quoatro filhos e há muitogrãode camtidade
laminas he de cor pardo salpicado de preto a pedra deles e dos teieius que todas as bordas dos rios
parece hû penhasco tofa he de 3 pal[mos] he de estão cheias e uemdo os estar não dirão senão que
co[mer]. cão omenis uestidos de brãoquo com chapeus na
MOANI [Fols. 55, 175 vo]. he peixe de hû palmo cabesa e são tambem duros e os filhos he muito
he de c[omer]. bom comer.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 91

MAGUARIM [Fols. 76, 184 vo]. o maguarim tem a cabesa a feicão de pato de portugual são cor
quer dizer [em branco no MS] e he pasaro da cor de de laramia e rozado e preto e tem os peis uermelhos
simza tirãodo de brãquo e tem os peis e o biquo o biquo pardo e há muito gramde camtidade deles a
pardo e amarelo ele uiue de peixe e tem tres penas lomguo do mar e perizes e fazem os filhos em riba
em riba da cabesa mas elas não são tam bomas dos pauuos e fazem tres e coatro e os ouos cão
como as da nossa tera e he pera comer muito guordo bramquos pimtados de uermelho e cão bomis de
e bom comer e há muito grãode camtidade e fazem comer.
dous e tres filhos e os ouos são uerde mar.
ATIAUSU [Fols. 89, 94, 185 vo, 191 vo]. Atiausu
GURATIMGUAOSU [Fols. 77, 184 v o ]. he tamanho como hûa pomba quoamdo uão
guratimguaosu são pasaros brancos que ca tem per auoando por riba dauguoa leua o bico aberto
garcas e he toda brãoqua como neue fora o biquo e tomando peixe as costas des na a cabesa ate o rabo
os peis que tem pardos e amarelos e uerde ao lomguo he preto e as pomtas das azas e pela barigoa
dos olhos e he hû pasoro muito estimado polas bramquo e o biquo amarelo he pasoro muito guordo
penas que ele tem e heram as milhores e he muito bom comer mas não sei quoamtos filhos
merquadarias que os estramieiros tinham nesta tera fazem porque os não tenho uisto eu creio que fazem
eu creio que nosso senhor lhe pos os penachos em
os filhos na costa do mar.
riba das costas emtre as azas pera as guardar de
não quebrarem e he pasoro que se mantem de peixe VPEQUA [Fols. 81, 186]. Vpequa quer dizer
e he pasoro tamanho como maguarim e faz tres o pato he preto pelas costas e pardo pela barigua e as
quoatro filhos e os ouos cam uerde mar e fazem os azas pimtadas de bramquo e algumis cam todos
filhos em riba de aruores pequenas a borda do mar pretos e he hû dos pacaros milhores de comer desta
e há muita camtidade deles e he bom comer. terra e fazem os filhos em buraquos de paos e fazem
noue e des filhos e tamto que os tirão roman nos
GURATIMGUAMERIM [Fols. 78, 185].
guratimguamerim he garsa pequena he toda com os bicos leuam a borda do rio pera comerem.
bramqua como neue parese tamanha como hûa POTERI [Fols. 81, 186]. O Poteri quer dizer
gualinha mas quoamdo tem as penas fora não tem marequa e há de tres castas como en nosa [oropa,
mais quarne que hûa pomba ela tem penacho muito riscado] europa e há pouqua deferemsa na çor [sic]
fino e muito prezado em framsa e tem muita gramde e feitio senão terem o rabo mais direito que as do
camtidade delas a lomguo do mar e rios de augua nosa [oropa, riscado] europa e tem muito gramde
doce e fazem os filhos como as outras e tem os peis camtidade que a tera aomde elas fazem mais
e o biquo como as outras e fazem criasão duas uezes aseitacão toda esta cuberta que a mim me aconteseo
no ano e são bomas de comer. dum tiro matar trimta e tres fora as que esquaparão
ACARA OBU [Fols. 78, 185]. acara obu he hû que quomeram as piranhas e he hû pasoro tam
pasoro tamanho como a garsa pequena mas he todo gordo que não se podem asar e he muito bom comer.
pardo cor de simza e tem panachos tambem mas GUARAHÛ [Fols. 82, 186 v o]. guarahû he
não sam tam finos como as da guarsa e fazem os pasoro tamanho como hûa gualinha pequena he
filhos como as guarsas e os ouos cão azuis e fazem todo uerde e preto e he bom comer e faz tres filhos
dous filhos e he bom de comer.
e faz em riba das aruoreas [sic] seus ouos são
MIGUA [Fols. 79, 185]. migua he hû pasoro pimtados de preto.
tamanho como hû gramde capão pardo pela barrigua
AUAPESSOCA [Fols. 82, 186 vo]. Auapessoca
e pelo pesquoso e pelas azas preta e bramquo por
he pasorro tamanho como hûa pomba do mato tem
baixo e as pomtas das azas e o rabo preto eles amdão
os peis muito compridos a comparasam do corpo e
sempre na auguoa nadamdo e com o corpo debaixo
daguoa e o pesquoco e a cabesa fora dauguoa eles tem a modo de crista de gualo uermelha e barbas e
fazem tres filhos e os ouos cam e há muito gramde o biquo laramiado e as pomtas das azas amarelas e
camidade e andam em bãdos em riba dos laguos de o papo tambem amarelo e o corpo he uermelho
auguoa dose e comem peixe e he muito bom comer. escuro ele tem dous esporamis como de gualo
debaixo das azas com que mata o peixe e a sua
AIAPA [Fols. 79, 185 vo]. aiapa he como hûa
abiatasão [sic] he nos laguos e fazem os filhos em
pata femia he pardo tiramdo de preto e he hû pasoro
riba de folhas que estão sobre a auguoa sem outra
mais guolozo que se pode uer que não desquamsa
couza nenhua e os ouos cam branquos pimtados
ate que não tem a barigua cheia e amtomses se uai
de preto e fazem simquo ou seus filhos e ce come e
por em riba de hû pau com as azas abertas e o biquo
ao uento pera esmoer mais depresa o peixe que ele tem os peis pardos.
tem comido ele faz ceus filhos como a mjnua poin CARÃO [Fols. 83, 186 v o]. Carão he hûo
hûs pazinhos em riba de hûao [sic] aruere e ali poin [sic]pasoro tamanho com hûm capam he pardo
os ouos e faz tres filhose os ouos são e cão muito mesturado de preto he pasoro que sempre anda
guordos e he muito bom comer. nos perizes e alaguoas e come de hûs buzios que
AGAGA [Fols. 80, 185 v o ]. Agaga he a há no peri[ze] e he muito bom comer fazem dous
colhereira he mahor que hû pato he bramqua cor filhos os ouos cão bramquos e fazem em riba das
de carne e nos emcotros das azas rozada e o maxo arueres.
92 A Exploração do Amazonas pelo Senhor de La Ravardière (1613-1614)...

TOITOY [Fols. 83, 187]. toitoy he pasoro YAMDU [Fols. 88, 188]. Yamdu quer dizer uma
tamanho como hû timtilhô e he pardo tira de pasoro o mais grãode desta tera mas não cão
bramquo pela barigua e há muito gramde camtidade tamanhos que as de afrequa nem as penas não cão
a lomguoa do mar e ilhas e quamdo o tempo quer tam bomas nem riquas não seruem mais que pera
xouer aboam em bamdos que todo o ceo parese que os negros pera porem nas costas quoamdo bebem o
esta cuberto e he pasiro muito gordo e bom comer uinho elas cão todas pardas e crião os filhos em as
eles fazem os filhos ao lomguo do mar na costa mas
campinas no chao e poem muito grãode camtidade
eu não sei nos ui numqua.
de ouos e algumas fazem coremta ou simquoenta
GUARIAMA [Fols. 84, 187]. guariama he ouos que sam muito bomis de comer que quamdo
pasoro tamanho como hua pomba he pardo cor de hû omem come dous não pode mais comer e comem
simza ao lomgo da cabesa e mais pera o corpo ce pouquas a clara tira azul cabeca e pernas são
bramquo no papo amarelo diguo azul e na barigua mui moles.
amarelo pelas costas pardo raiado de bramquo
fazem os filhos em buraquos na tera o lomguo do YNAMBUASU (Fol. 188). ynambuasu quer
rio os ouos cam branquos e fazem dous filhos e dizer perdis ela he tamanha como hû capam gramde
fazem nos metidos hûa boma braca pela tera demtro. e fazem seus filhos em riba da tera os peis dos paus
GUOARA [Fols. 84, 187]. guoara he pasoro e fazem des e doze ouos cam azuis uerde mar e os
tamanho como hûa gualinha uermelho como gram ouos cam melhores que ouos de gualinha e he hû
por todo o corpo os peis uermelhos como sangue e pasoro dos milhores desta ter[a] pe[ra] comer e he
o biquo cor de carne e as pomtas das penas e as pardo.
azas pretas eles fazem seus filhos como as garsas e GURAAUSU [Fols. 89, 188]. ho guraausu he
fazem quoatro e simquo filhos e os ouos sam hûa guauiam e he tamanho como hû pequeno peru
branquos pimtados de pardo e o seu natural he
he todo pardo e tem os peis de hû gramde plalmo e
serem pretos de primeiro e depois pardos e
tem as unhas muito gramdes e mata uiados e outros
uermelhos e bramquos e depois se sererem [sic] de
quatorze ou quinze mezes se tornão todos uermelhos bixos ele não faz mais que hum filho e o ouo he
cor de gram e tem muito gramde camtidade nesta bramquo e os negros os estimam muito pera fazer
tera do maranham e he guosto eu los coamdo fazem suas frexarias e são ralos [sic].MOTIM [Fols. 90, 188
os filhos que se atirão hûa arquabuzada que se vo]. O motum he pasoro tamanho como hû peru tem
aleuamtão parese que todo o seu [sic] esta uermelho hû panaxo em riba da quabesa todo em guoruinho
e he muito bom comer. todo reto eles ceriam muito estimado em nosso
TAMATIAN [Fols. 85, 187 vo]. tamatian nome [oropo, riscado] Europa pera fazer panaxos aos
de [...] he hû pasaro de tamanho de hûa galinha de fidalguos ele he preto fora a barriga que é branqua
cor sinzento e o biquo pretto a pluma da cabesa e e a pomta do rabo e tem o biquo pardo e os olhos
bramqua e tem hûs sinais brancos a modo de amarelos e a femia tem o panaxo pimtado de
orelhas tãobem branco os olhos são a modo de cor bramquo e tem a barigua parda tiramdo damarelo
laranjado os pes amarellos e crião en cima dos eles cão cempre em companhia maxo e femia eles
mangues em muitas ilhas crião tres e coatro filhos fazem os filhos em riba dos paus e fazem dous filhos
os ouos são de cor uerde mar e serue pera comer e os ouos cão (...) he boma carne de comer parece
tem plumas pequenas pardas. se com a carne de capam não tem mais que ser
ARASARIJ [Fols. 86, 187 vo]. Arasarij he hûa mais dura a carne he carregadissa pessima pera
que do feitio de tocano tem o biquo grande amarelo feridas.
pela partte de cima e de baixo branco e pretto a CARAQOPITAM [Fol. 199 vo]. Caraquopitam da
cabesa athe juntto aos encontros das azas he de cor de hûa perdiz e do tamanho e tem o biquo e os
cor rozado e dahj o mais corpo he amarelo color e peis pardo tiramdo de uerde e he hû pasoro muito
as azas e pernas tem cor pretta a modo de uerde e
bom quomer tam bom como a perdis e milhor fazem
fin do rabo he muito uermelho e o mesmo a
quoatro e simquo filhos e fazem no cham os filhos
redondeza dos olhos cria em buraquos que faz en
paus os ouos são brancos. os ouos cam rozados e tem o biquo e ó lomguo uerde.

GUAHI [Fols. 86, 187 vo]. guahi he hû pasaro IAQU [Fols. 91, 188 vo]. O iaqu he pasoro
de grandeza de hûa pomba de cor pretta saluo a tamanho como hûa gualinha e he pardo e a
bariga athe a cabesa cor branca com hûas raias graguamta uermelha até o lomguo do biquo e o biquo
uermelhas as ponttas das azas são amarellas e a pardo tiramdo dmarelo e tem os peis pardos cor de
pena de baixo uermelha o rabo preto as pernas a cinza e tem a guoela saimdo do peito e uai pera riba
modo de cor azul o biqup he grande de cor amarela do estamoguo e torna a uirar e uai ao biquo eles
sauo o premcipio que comesa da cabesa que he a cão sempre maxo e femia em companhia ele o podem
uermelho e por baixo azul e por cima os olhos azuis. Ter em hû dos milhores pasoros desta tera e tem a
APIHA [Fol. 188]. Apiha he hûa que de carne muito bramqua e guostoza e fazem dous filhos
grãodeza de hua meltroa tem a cabesa e as azas e em riba dos ramos das arueres e os ouos cão
rabo pretto e o mais corpo cor branco o biquo de bramquos crião em casa.
cor rozado e os olhos e a ponta do biquo e pardo e ARACOAN [Fols. 91, 184 vo]. Aracoan he hû
cria 4 e sinco filhos os ouos são brancos. pasoro tamanho como hûa franguainha e da cor de
Comesaremos aguora prlos pasoros que estão feisão do iayreu e tem o mesmo guosto e cabor [sic]
pelos matos e quampinas. Primeiramente e faz dous filhos e os ouos sam branquos.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 93

TINGUARA [Fols. 91, 189]. tinguara he pasoro INAMBU MERIM [Fols. 95, 190 vo]. Inambu
da grosor diguo tamanho como hû canarinho todo merim, he a perdiz desta terra há de duas castas
preto fora a croa da cabesa que tem uermelho em esta he do mesmo tamanho das de Portugal e da
riba do pesquoso azul cor de seda azul e tem os mesma cor o bico e os pes he pardo tirão de azul,
peis e o biquo pardo e fazem dous filhos e os ouos não tem o gosto das nossas perdizes a carne he
sam branquos ele camta hûa camtigua que he branca e hû dos bons comeres desta terra. Fazem
os filhos em sima da terra como as de portugal. Os
guosto ouui lo.
ouos são de cor purpura e faz 9. e des filhos e gritão
YAPEHI [Fols. 92, 189]. Yapehi he pasoro assi de dia como de noite.
tamanho como hûa melroa he todo preto fora metade
ARARUNA [Fols. 95, 190 vo]. Araruna. He
das azas e sobre a rabadilha e a metade do rabo passaro do tamanho de hû capão tem o bico E os
que he damarelo tozado tem o biqup e os peis como pes de papagayo, tem o rabo de dous Palmos E de
branquos ele faz seus filhos depomdurados nos azul todo uestido. o Inuês da Pena he de cor preta.
pauos a modo dum saquo piqueno faz tres filhos e o redor do bico E olhos todo amarello. Fazem os
os ouos cam bramquos pimtados de pardos e fazem filhos num buraco de Pao. Tem soo hû filho E os
muitos os linhos [sic] iuntos num pau e he pasoro ouos são brancos. O comer seu são cocos E palmitos.
que quamdo ele he mando fala. E me espanto podecem quebra los pera fortaleza
que a natureza deu a este fruito que nos não
OPEQU [Fols. 92, 189 vo]. Opequ he hû pasoro
podemos quebrar sem instrumentos sua carne he
mahor que hûa melroa tem a cabesa uermelha pelo
mui dura e negra. todas suas penas seruem aos
papo e as azas e o rabo preto e em riba das costas indios pera seus aparastos [sic] e frecharia.
bramquo a barigua bramqua raiada de pardo tem
os peis e o biquo pardo cor de simza e uai atrepamdo CABURE [Fols. 96, 190 vo]. Cabure he pasoro
do tamanho de hûa melro [sic] pardo como framselho
pelos pauos e uai piquamdo neles que não parese
he aparesem mais de noute que de dia fazem dous
aenão tarapina que cortam madeira e mais tiram
filhos e fazem seus filhos em buraquos de pauos e
mel dos pauos eles fazem seus filhos em buraquos
os ouos são bramquos e os saluarguemis [sic;
dos pauus efazem dous filhos e os ouos sam sauvages] lhe tiram os peis pera fazerem mezinhas
bramquos. aos filhos pera matarem quasa e as mezinhas que
TOCANO [Fols. 93, 189 vo]. tocano he hû cão he sarafasarlhem [sic; scarifier] os brasos com
pasoro tamanho como hûa fragao [sic] ou mahor e os peis deste pasoro.
tem o biquo muito gramde em comparacao do sorpo GURAUNA [Fols. 96, 191]. gurauna, tem a cor
[sic] do biquo ate ao rabo preto e do biquo ate o toda rouxa claro: as Pontas das azas E o rabo preto
estamaguo amarelo e pela borda do amarelo do tamanho de hûa piquena melroa do nosso
uermelho e o mais corpo preto e o lomguo dos olhos Portugal faz 4. Filhos seus ouos são brancos pintão
sem pena e cor de carne e o biquo preto e peguado de vermelho E bõ pera comer.
ao biquo hû raio damarelo e hû omrado pasoro desta ORUCURÉA [Fols. 97, 191]. Orucurêa. he
tera e faz seus filhos em buraquos dos paus e fazem passaro do tamanho de hûa Piquena cruya E da
seus filhos diguo fazem dous filhos e os ouos cão mesma feisão. A cor he parda natural ao françelho
bramquos. do nosso purtugal e aparese mais de noute que de
VREPE [Fols. 93, 190]. Vrepe he como o dia e os saluaguemis [sic; sauvages] falam com ele
toquano mas he hû pouquo mais pequeno e he uerde e dizem que lhe respomde aquilo que eles lhe
desna a cabesa ate o rabo e pela bamda de baixo do pergumtam e fazem seus filhos em buraquos de paus
biquo ate o estamogo amarelo cor de ouro e o rabo e fazem dous filhos e seus ouos são bramquos.
he uerde tira de preto e o biquo raiado de bramquo SAY [Fols. 97, 191]. Say. he pasaro Piquenno
como amarelo e pela bamda de demtro do biquo de tamanho de hû Pintasirgo: tem a cabessa azul
uermelho e tem a limgua muito estreitinha que ce cor celeste E todo o corpo uerde, tem bico E pes
parece como hûa pena e se tira muito comprida eles pardo cor de cinza. Este faz soo dous filhos seus
são dous dos mais fremozos pasoros que há nesta ouos são brancos.
tera e eu creio que deos tomou prazer a os fazer. CANINDE [Fols. 98, 191]. Caninde. he Passaro
HURUUASU [FOLS. 94, 190]. hurauasu he he mui fermozo da grossura de hû capão. tem no rabo
[sic] passaro de rapina como francelho como hûa dous Palmos de comprido. Desde o bico pera baixo
melroa he hû bilhafre hele he todo preto so a cabesa he tão amarello como fino ouro. E todo o mais resto
e os peis que tem de cor de laramia as penas do de sima isto he costas E azas azul çeleste. De
rabo perto do cu bramquas ele tem o biquo pardo e Maneira da cor uerde mar de maneira que paresse
he hû dos fermozos guauiamis desta tera que se ele uestir hû fatto de ouro fino E per sobre si hû
farregoulo de Damasco azul, o Inves das Penas assi
estiuera em iropo [sic] ualeria muito pera os fidalgos
nas azas como nas demais tudo he amarello. he
eles cão ralos [sic] e se axam pouquo.
passaro fermozissimo posto ao sol. tem o mesmo
ATIAUSU [Fols. 80, 94, 185 vo, 191 vo]. atiausu gosto da arara de que já dissemos. faz so hû filho
he mais gramde algûua couza que hûa melroa he nas tocas dos Paos. seu comer são coas etc.a como
pardo e amarelo tem o biquo e os peis pardo sor as araras. Os saluajes os estimão muito pelas cores
[sic] de simza. E faz dous filhos seus ouos são de suas Penas de que elles fazê braçeoletes,
brancos. capassetes etc.a com que fazem seus folguedos.
94 A Exploração do Amazonas pelo Senhor de La Ravardière (1613-1614)...

GUANIBU [Fols. 98, 191 vo]. guanibu he hû desta tera e quoamdo os ensinam a falar falam muito
pasoro deste tamanho que aqui esta pimtado e tem bem e fazem os filhos como os outros.
de duas castas e há hum que tem o rabo como hûa JIMDAIA [Fols. 101, 192]. jimdaia he
forqua e este que tem o rabo como forqua he pardo papaguaio tamanho como este que ariba anomeio e
pelo rabo e as azas o resto do sorpo [sic] pimtado de tem o rabo de hûa poleguada e tem o biquo e os
muitas cores poproro [sic] e uerde e pardo e amarelo peis como o papaguaio e des no biquo ate o
e ouro que estamdo ao sol parese oro mustarado estamoguo amarelo cor de laramia e o mais do corpo
[sic] e outro he desta cor pardo tira de bramquo e o rabo uerde eles fazem os filhos como os outros.
pela barigua e as azas e o rabo dum pardo tiramdo TOHIM HITE [Fols. 102, 192 vo]. tohim hite he
de preto e o resto do corpo uerde parecemdo ouro e hû pequeno paoaguaio he todo uerde tiramdo a metade
he o mais pequeno pasoro desta tera ele quoamdo das azas que tem amarelo e tem o biquo e os peis
uai aboamdo parese hum borcatim eles fazem bramquos cor de carne e he hû dos fermozos pasoros
muitos filhos e os ouos sam branquos. desta tera e fala muito bem e fazem os filhos em
ARARA [Fols. 99, 191 vo]. Arara hete [sic] he buraquos dos pauos e fazem simquo ou seis filhos.
tamanha como o canide e tem o biquo e os peis TOHI [Fols. 102, 193]. tohi tamanho como este
como papaguaio e tem o rabo de dous palmos de que ariba anomeio e he todo uerde fora a croa da
comprido ele [tem, riscado] o lomguo do biquo e dos cabesa que he cor de laramia e fazem seus filhos
olhos não tem pena he cor de carne o pesquozo e a como os outros.
barigua uermelho as azas e o rabo uermelho AIURUIU [Fols. 102, 193]. Aiuruiu he
pimtadas damarelo e azul e uerde e uermelho e os papaguaio he mais pequeno que iuruquariqua e he
olhos não se emfadam de os olhar e os saluaguemis tem o sorpo [sic] todo amarelo e as pomtas das azas
as estimão muito pelas cores de suas penas de que uerdes e he hû pasoro que saben muito bem falar e
eles fazem brasaletes e capassetes ettta que fazem faz seus filhos como os outros.
seus folguedos e com que eles gornecem as espadas HAIURU HITE [Fols. 103, 193]. haiuru hite he
da guerra e fazem os filhos em buraquos de paus e papaguaio tamanha como hûa framgua e he todo
não fazem mais que hum e estes tres pasoros cam uerde e a cabesa azul e amarelo e o meio das asas
os mais mamsos desta tera e se eles istiueram [s’ils tem algumas pequenas penas uermelhas e he hum
étoient] emsinados falaram como papaguaio eu me pasoro muito estimado nesta tera e em toda a parte
espanto como os imsiamtes [ancients] romanos e que pasa milhor o mar fazem os filhos em buraquos
foram tão coriozos de amortalharem hû corvo e o dos paus e não fazem mais que dous e os ouos cam
emterrarem e dizerem respocios [sic] por falar (1) que bramquos e amda cempre maxo e femia em
fizeram eles se tiueram estes pasoros. [que feroient- companhia.
ils s’ils auroient ces oiseaux?]. QUEREIUHI [Fols. 103, 193]. quereiuhi he
ARASOARE [Fols. 99, 192]. Arasoare he pasaro pasoro tamanho como hû timtilhão de portugual e
tem o biquo e os peis dum pardo preto e depois do
pouquo mahor que hû quanario e a quor he parda
biquo e despois do biquo ate o rabo por riba das
tra damarelo tem os peis e o biquo azul tiramdo de
costas azul claro as penas gramdes das azas e o
uerde e os ouos bramquos pimtados de pardo e
rabo preto e o papo paploro [sic; pourpre] e do papo
fazem tres filhos e fazem nos em riba dos ramos. ate o rabo azul e he hû pasoro muito istimado emtre
AYURU QUURIQUA [Fols. 100, 192]. Ayuru os negros e lhe seruem de por no estamoguo
quuriqua he papagaio tamanho como hûa pomba e quoamdo fazem seus pareseis [sic].
he todo uerde fora a cabesa que tem amarela e azul YOROTI [Fls. 104, 193 vo]. yoroti he pomba do
as pomtas das azas amarelas tiramdo dazul pardo mato he ta[ma]nha como a de nosso [oropa, riscado]
as penas do rabo uerde e amarelo cor de laranja europa e tem a mesma cor tem a mesma uirtude
eles fazem os filhos em buraquos de pauos fazem como as de nosa europa que quamdo o macho more
tres e quoatro filhos os ouos são bramquos e não se torna a femia a cazar e tambem quãode a
quoando os emsinão falam muito bem. femia more não se tor[na] o maxo a cazar e despois
que hû fiqua ueuuo não se pom mais em riba das
MARAQUANA [Fols. 100, 192]. maraquana he
ramas uerdes e os negros as dam a comer as
pasoro tamanho como papaguio [sic] tem o rabo dum molheres pera não terem comuercasão com outro
palmo de comprido tem o biquo e os peis como omem e fazem dous filhos.
papaguaio e he uerde tiramdo damarelo e pardo e
CHERIUIUBA [Fols. 104, 193 vo]. cheriuiuba
uerde mar e he hû pacoro que faz muita perda aos
he pasoro do tamanho do outro e he todo azul
lauradores pera apor [sic] o milo que o quome todo
tiramdo uerde mar dene baixo do biquo ate o
que sempre o amdam estar a olhar e sempre amdam
estamogo e cor de laramia e as penas gramdes das
maxo e femea em companhia e fazem os filhos como azas e o rabo preto e os peis e o biquo pardo e os
os outros e tambem quamdo os ensinam falam. negros o tm em muita estima como o outro e sam
PAPAGAIO XIA [Fols. 101, 192]. papagaio xia muito ralos [sic] e ce uem pouquos.
papaguaio tamanho como hûa melroa tem a cabesa PUQUASU [Fols. 105, 193 vo]. puquasu he
e o pesquozo ate o estamoguo anil e o mais corpo pomba braba do nosso portugual da mesma forma
uerde o rabo e as pontas das azas uerde mar e azul e feito e he muito bom comer e sam ralas [sic] e se
em carnal e he hû dos mum [sic] fermozos pasoros uem pouquas e fazem dous filhos.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 95

POQUOHI [Fos. 105, 194]. poquohi he hûa general’). Octavian, full of admiration for the
pequena pomba e da mesma cor e há muito gramde corteous (officiosus) bird, bought it for 20,000
camtidade e he muito bom comer e fazem dous filhos sesterces. But one of the workman’s mates, annoyed
e os ouos cam bramquos. that none of this bounty had come his way, told
ANU [Fols. 106, 194]. Anu he hû pasoro Caesar that the man had another crow and asked
tamanho como o punho e he todo preto e a sua him to order it to be produced. When it arrived it
abitacão he pelas capueiras e a bordas dos rios ele repeated the lesson he had learnt: ave victor
não se quo[me] e fazem quoatro filhos. imperator Antoni (‘Hail Antony, victorious general’).
Octavian, far from being angry, merely told the
TIHEMIRIM [Fols. 106, 194]. tihemirim he hû
pasarinho tamanho como hû canario e he todo preto owner of the crow to share the money with his mate;
fora a cabesa que tem uermelha como camgue e and he bought both a parrot and a pie that gave
camtam muito bem camtiguas do mato. him the same greeting. All this encouraged a cobbler
to try to teach a crow to give a similar salutation;
AMDURA [Fols. 107, 194]. Amdura e ho and exasperated when the bird often made no
morseguo e há muito gramde camtidade e sam muito
response he used to say ‘All my labour and expense
grãodes e seruem de cerugianis nesta tera que se
wasted’. At last the crow began to repeat its lesson.
hûa pesoa dorme com os peis descubertos uem
But when Octavian heard it as he was passing by,
morder nos dedos dos peis e prinsipalmente no dedo
he said: ‘I’ve enough people greeting me like that at
gramde e faz botar muito samgue e eu creio que
home’. Whereupon the bird, remembering the words
eles fazem a iemte dormir que não nos centem
morder e loguo de hûa ues que mordem leuam hû that it had heard its master utter in complaint, came
bocado da carne fora. out with ‘All my labour and expense wasted’. At this
Octavian burst out laughing and had the crow
MAYRIA [Fols. 107, 194]. mayria he hû bought for a higher price than he had ever paid for
pasarinho do tamanho de hû canario he todo preto a bird before. Suetonius declares that a few months
fora a cabesa que tem branqua como neue e camta
before Domitian’s assassination a crow alighted on
sua camtigua do mato e faz dous ou tres filhos.
the Capitol and announced in Greek ‘All will be well’
IACAMI [Fols. 108, 194 vo]. he este passoro (estai panta kalos) [Domitianus, 13, 2]; and Pliny
tamanho como hû capão da cabeca para baixo tira says that in his own day in Rome there was a crow
a preto pela garganta que parece rozado testado as from Baetica in southern Spain which belonged to
costas tem parda os pes tirão a uerde o ninho o faz a knight and was remarkable for its very black colour
no chão os ouos são brancos E tira 4 ou 5 filhos and for its ability to repeat sentences and words,
canta por ambas as partes. constantly adding to its repertory [Historia naturalis
MUTUM DO PARÁ [Fols. 109, 194 vo]. mutum X, 60(124)].”
do Para são de tres castas [he do tama[n]ho d[e]] hû Mas o fato a que se refere o autor anônimo do
Peru o Pico he curuo rombo E uermelho todo he
texto (o corvo amortalhado, enterrado e pranteado)
preto dirando a bariga que he branca mosqueado
é contado desta forma por Toynbee (1973: 274-275):
de preto o rabo branco os pes tirão a uermelho.
“Pliny also relates the tale of a talking raven in
O OUTRO MOTUM [Fols. 90, 188 vo]. o outro Tiberius’ time [Historia naturalis X, 60 (121-3)]. This
motum he do mesmo tamanho em tudo he bird, hatched in a nest on the Temple of Castor and
semelhante tirado que tem hua crista muito grande Pollux, flew down to a cobbler’s shop nearby, took
E grossa o bico he amarelo do papo abaixo he up its abode there, and soon picked up the habit of
emcamusado [sic] os pes são uermelhos o resto do talking. Every morning it flew to the speakers’
corpo preto ambos são passaros bons para comer a
platform (rostra) in the Forum and greeted first
carne dura há muitos passaros destes o ninhos fa
Tiberius, Germanicus and Drusus Caesar by name
los aruores [sic] os ouos são brancos tira 4 ou simco
and then the Roman public passing by: then it
filhos.”
returned to the shop. This performance it kept up
continuously for several years. But the owner of the
Nota referente à Arara next-door shop, perhaps jealous of the bird or
(1) Os antigos romanos tinham aparentemente anoyed at the mess that it made, killed it. Public
um vasto repertório de estórias de corvos falantes. indignation at this outrage reached such a pitch
Assim, T oynbee (1973: 273-274) diz que: that the murderer was driven fr om the
“Macrobius [Satires II, 4, 29, 30] has the story how, neighbourhood and ultimately done away with.
on Octavian’s return to Rome after his defeat of Meanwhile, crowds of people attended the raven’s
Antony at Actium, a workman came up to him funeral: the corpse was carried on a draped bier,
holding a crow which he had taught to say ave borne by two negroes and preceded by a piper, to its
Caesar victor imperator (‘Hail Caesar, victorious pyre by the Appian Way [itálico nosso].”
96 A Exploração do Amazonas pelo Senhor de La Ravardière (1613-1614)...

Referências
d’Abbeville, C., 1614. Histoire de la missions des Peres Capvcins en l’Isle de Maragnan et terres circonuoisines.
François Huby, Paris. [A facsimilar edition was made by the Akademische Druck- und Verlagsanstalt,
Graz, Austria, 1963].
d’Abbeville, C., 1945. História da Missão dos Padres Capuchinhos na Ilha do Maranhão e terras circunvizinhas;
em que se trata das singularidades admiráveis e dos costumes estranhos dos índios habitantes do país.
Tradução de Sérgio Milliet. Introdução e notas de Rodolfo Garcia. Livraria Martins Editora [Biblioteca Histórica
Brasileira, XV], São Paulo.
Abreu, C. de, 1988. Capítulos de história colonial (1500-1800) (7a ed., revista, anotada e prefaciada por José
Honório Rodrigues). Editora Itatiaia Limitada & Editora da Universidade de São Paulo.
Almaça, C., 1993. The beginning of Portuguese Carcinology, pp. 31-39, 8 figs., in Truesdale, F., ed., History
of Carcinology. A. A. Balkema, Rooterdam/Brookfield.
Almeida, C. M. de, 1860. Memória para a história do extinto Estado do Maranhão, cujo territorio compreende
hoje Piauí, Grão-Pará e Amazonas. 2 vols. Typ. do Comércio de Brito e Braga, Rio de Janeiro. (2nd ed.,
1874). [The first volume contains the História da Companhia de Jesus na extinta Província do Maranhão e
Pará, by Father José de Moraes; the second contains the Relação sumária das cousas do Maranhão, by
Captain Simão Estácio da Silveira, the Nuevo Descubrimieno del Gran rio de las Amazonas, by Father
Cristóbal de Acuña, and Jornada do Maranhão by Diogo de Campos Moreno].
Anon., 1907a. Informação de Martim Soares Moreno sobre o Maranhão (1613). An. Bibl. nac. Rio de Janeiro
26: 149-192.
Anon., 1907b. Documentos sobre a expedição de Jerônimo de Albuquerque ao Maranhão (1616). An. Bibl.
nac. Rio de Janeiro 26: 261-304.
Anon., 1907c. Diversos documentos sobre o Maranhão e o Pará (1612-1615). An. Bibl. nac. Rio de Janeiro
26: 305-337.
Ávila-Pires, F. D., 1989. Mamíferos da França Equinoxial (Maranhão, Brasil). Revta bras. Zool., Curitiba
6(3): 423-442, 15 figs.
Berredo, B. P. de, 1749. Annaes do Estado do Maranhão, em que se dá noticia do seu descobrimento, e tudo
o mais que nelle tem sucedido desde o anno em que foy descuberto até o de 1718. Francisco Luiz Ameno,
Lisboa.
Berredo, B. P. de, 1849. Annaes historicos do Estado do Maranhão, em que se da noticia do seu descobrimento,
e tudo o mais que nelle tem sucedido desde o anno em que foy descuberto até o de 1718 offerecidos ao
Augustissimo Monarca D. João V, nosso senhor. Typ. Maranhense, São Luís do Maranhão.
Carvalho, J. P., 1964. Comentário sôbre os peixes mencionados na obra “História dos animais e árvores do
Maranhão” de Frei Christóvão de Lisboa. Arqos Est. Biol. Mar. Univ. Ceará, Fortaleza 4(1): 1-39.
Chavane de Dalmassy, H., 1936. Les Français de Maranhao. Revue Quest. Hist., Paris 127: 46-76.
Costa, J. C. R. da, 1925. João Baptista, gravador português do século XVII (1628-1680). Imprensa da
Universidade, Coimbra.
d’Évreux, Y., 1615. Svite de l’Histoire des Choses plus Memorables, advenuës en Maragnan, ès années 1613
& 1614. Second traité. Imprimerie de François Huby, Paris.
d’Évreux, Y., 1864. Voyage dans le Nord du Brésil fait durant les années 1613 & 1614 par le Père Yves
d’Évreux, publié d’après l’exemplaire unique conservé à la Bibliothèque Imperiale de Paris, avec une
introduction et des notes par M. Ferdinand Denis. A. Franck & Albert L. Herold, Frankfurt & Paris.
d’Évreux, Y., 1929. Viagem ao norte do Brasil. Tradução do Dr. Cesar Augusto Marques. Livraria Leite Ribeiro
[Bibliotheca de Escriptores Maranhenses, II], Rio de Janeiro.
Faria, F. L. de, 1961. Os primeiros missionários do Maranhão. Achegas para a história dos capuchinhos
franceses que aí estiveram de 1612 a 1615, pp. 83-216, in O Centro de Estudos Históricos Ultramarinos e
as comemorações henriquinas. Lisboa.
Fonseca, L. da, 1950. Frei Cristóvão de Lisboa, O. F. M., missionary and natural historian of Brazil. The
Americas, Washington, D. C. 7(2): 216-220.
Fonseca, L. da, 1952. Two petitions of frei Cristóvão de Lisboa, O. F. M. custos of Maranhão, to the King
(October, 1623). The Americas, Washington, D. C. 8(3): 353-359.
Frade, F., 1966. Comentários zoológicos relativos à História dos animais e árvores do Maranhão (1625-
1631), de Frei Cristóvão de Lisboa. I. Mamíferos. Garcia de Orta, Lisboa 14(3): 345-350, 4 pls.
Frade, F., 1984. Comentários zoológicos relativos à História dos animais e árvores do Maranhão (1625-
1631), de Frei Cristóvão de Lisboa. II. Aves. Garcia de Orta, Sér. Zool. Lisboa 11 (3): 343-350, 4 pls.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 97

Francisco de Nossa Senhora dos Prazeres, Frei, 1891. Poranduba Maranhense [MS from 1820]. Revta Inst.
hist. geogr. brasil. 54: 4-281.
Kiemen, M. C., 1954. The Indian policy of Portugal in the Amazon Region, 1614-1693. Washington, D. C.
Le Gentil, G., 1932. La France Equinoxiale (1593-1615). Biblos, Coimbra 8(1-4): 555-578.
Lisboa, C. de, 1967. História dos animais e árvores do Maranhão. Estudo e notas do Dr. Jaime Walter. Prefácio
de Albero Iria, Director do Arquivo Histórico Ultramarino. Publicação do Arquivo Histório Ultramarino e
Centro de Estudos Históricos Ultramarinos, Lisboa.
Lisboa, C. de, 1998. História dos animais e árvores do Maranhão (3ª edição. Crítica textual e notas de Jormas
Moraes). Academia Maranhense de Letras (Documentos Maranhenses 2), São Luís do Maranhão.
Machado, D. B., 1930. Biblioteca Lusitana (2a. ed.), Tomo I. Lisboa.
Marcgrave, G., 1648. Historiae rerum naturalium Brasiliae, libri octo... Ioannes de Laet, antuerpianus, in
ordine digessit & annotationes addidit, multas & varias ab auctore omissa supllevit & illustravit, l + (2) +
293 pp., 3 p. n. n. com índice, in Piso, G., Historia naturalis Brasiliae, Auspicio et beneficio Illustriss. I.
Mauritii Com. Nassau illius Provinciae et Maris summi Praefecti adornata. In qua non tantum Plantae et
Animalia, sed et Indigenarum morbi, ingenia et mores describuntur et iconibus supra quingentas illustrantur.
Franciscum Hackium & Lud. Elzevirium, Lugdun. Batavorum & Amstelodami.
Martius, C. F. P. von, 1863. Glossaria Linguarum Brasiliensium. Druck von Junge & Sohn, Erlangen.
Mocquet, J., 1616-1617. Voyages en Afrique, Asie, Indes Orientales et Occidentales. Heuqueville, Paris.
Morais, J. de, 1860. História da Companhia de Jesus na extinta provincia do Maranhão e Pará. Typ. do
Commercio de Brito & Braga, Rio de Janeiro. [First tome of Almeida, C. M. de, 1860, q. v.].
Nomura, H., 1996. História da Zoologia no Brasil: Século XVII. Primeira parte. [Coleção Mossoroense, Série C,
Vol. 914]. Mossoró.
Oren, D., 1990. As aves maranhenses do manuscrito (1625-1631) de Frei Cristóvão de Lisboa. Ararajuba,
Rio de Janeiro 1: 43-56.
Papavero, N., D. M. Teixeira & J. L. de Figueiredo, 1999a. Frei Cristóvao de Lisboa not the author of “História
dos animais e árvores do Maranhão”. I. Introduction and comments on Plates 1-60. Contr. avulsas Hist.
nat. Brasil (Hist. Hist. nat.), Seropédica 6: 1-12.
Perrone-Moisés, B., 1996. Relações preciosas: Franceses e Ameríndios no Seculo XVII. Unpublished Ph.D.
thesis. Departamento de Antropologia Social, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas,
Universidade de São Paulo, São Paulo.
Pina, L. de, 1942. Para a história da História Natural Brasileira. Brasília, Coimbra 1:
Pina, L. de, 1945. As ciências na história do Império Colonial Português (séculos XV a XIX). Porto.
Pinto, O. M. de O., 1979. A Ornitologia no Brasil através das idades (Século XVI a século XIX). [Brasiliensia
Documenta Vol. XIII]. Revista dos Tribunais, São Paulo.
Raeders, G., 1958. Les Capucins français, missionaires du Maranham (1612-1614). J. franç. du Brésil (2e.
Sér., Éd. Spéc. Hors-série), Rio de Janeiro: (unpaged [pp. 41-43]).
Reis, A. C. F., 1940. A política de Portugal Amazônico. Belém.
Rizzini, C., 1946. O livro, o jornal e a tipografia no Brasil, 1500-1822, com um breve estudo geral sbre a
informação, meios de comunicação, correio, catequese, ensino, socidades literárias, maçonaria, etc. Livraria
Kosmos Editora, Rio de Janeiro.
Southey, R., 1981. História do Brasil. Vol. 1. Editora Itatiaia Limitada & Editora da Universidade de
São Paulo, Belo Horizonte.
Tavares, N. S., 1993. Towards the history of pre-Linnaean carcinology in Brazil, pp. -29, 8 pls., in Truesdale,
F., ed., History of Carcinology. A. A. Balkema, Rotterdam/Brookfield.
Teixeira, D. M., 1993. Brasil Holandês. Dutch Brazil. Theatrum Rerum Naturalium Brasiliae. Icones Aquatilium.
Icones Volatilium. Editorax Index, Rio de Janeiro..
Teixeira, D. M., 1995. Libri Principis, vols I e II. Editora Index, Rio de Janeiro.
Teixeira, D. M., 1998: Brasil Holandês. A coleção Niedenthal. Animaux et Oiseaux, Naturalien-Buch de Jacob
Wilhelm Griebe. Vol. 1. Coleção Niedenthal. Oiseaux et Insectes. Editora Index, Rio de Janeiro.
Teixeira, D. M. & N.Papavero, 2000. Frei Cristóvão de Lisboa not the author of “História dos animais e
árvores do Maranhão”. II. Contr. avulsas Hist. nat. Brasil (Hist. Hist. nat.), Seropédica (em impressão).
Toynbee, J. M. C., 1973. Animals in Roman life and art. Thames and Hudson, London and Southampton.
Willeke, V., 1970. Frei Cristóvão de Lisboa. Revta Inst. hist. geogr. brasil. 289: 112.
Capítulo 7

A “RELAZAOM DO QUE HÁ NO GRANDE


RIO DAS AMAZONAS NOVAMENTE DESCUBERTO”
DO CAPITÃO ANDRÉ PEREIRA (1616)

O texto que transcrevemos abaixo, cujo original se encontra na Biblioteca Real de Madri, foi
ali copiado por Rudolf Schuller, em setembro de 1911, cópia esta que faz parte do Fundo Rudolf
Schuller, pertencente ao acervo da Biblioteca “Domingos Soares Ferreira Penna” do Departamento
de Documentação e Informação do Museu Paraense Emílio Goeldi (cf. Projeto Arquivo Permanente
do Museu Paraense Emílio Goeldi, 1987). Não temos notícia de que tenha sido publicado antes,
permanecendo inédito até agora.
O capitão André Pereira, que participou da expedição que fundou o Forte do Presépio na
cidade de Belém em 1616 (ver capítulo anterior), dá notícia desse sucesso ao Rei de Espanha.
Apenas dois animais são citados: “ostras” (mais corretamente moluscos bivalvos de água doce) e
“castores” (talvez ariranhas).

“RELAZAOM DO QUE HÁ NO GRANDE RIO DAS AMAZONAS


NOVAMENTE DESCUBERTO. ANNO DE 1616

Primeiramente depois que ò capitaom maior, Por todas aquellas partes mostravaom as
Alexandre de Moura deu fin no Maranhaom à ò que terras serem fertilisimas de Madeiras, è na bondade
tocava à ò servizo do Rey em deitar fora à ò enemigo dellas cheias todas as Ilhas de muita caza [caça]; è
como fez, è tendo à terra pacifica, è povoadas as chegando no sitio à onde fizemos fortaleza por el
fortalezas como lhe pareceo necessario, pos por obra Rey nosso senhor, que será 35 leguoas pello Rio
mandar fazer este novo descobrimento do grande asima pera ò Sul, por parecer elle à ò capitaom mor
Rio das Amazonas, è pera tambem se saver ò que bom sitio trabalhando nella se soube de hum
avia no Cavo do Norte, conforme à ordem que pera Frances que alli andava fugido à os do Maranhaom,
isso levava do Governador Geral do Brasil Gaspar como em huas Aldeas do Gentio que estaom pello
de Sousa; è asi mandou 150 homens em tres Rio mais asima andava hum Framengo, que alli
companhias, è por capitaom mor dellas à Francisco tinhaom deixado outros pera ter aprendido a lingua
è adquirido asi ò Gentio pera seus tratos, è que
Caldeira de castel branco em tres embarcazoens.
tambem esperava por hum yrmaom seu povoarem
Partimos para esta jornada dia de Natal pasado,
naquella parte onde agora está à nossa fortaleza, è
em que deu principio à esta era de 1616. Correndo
donde havia poucos dias se tinham ido tres
sempre à costa, è dando fundo todas as noites,
embarcazoens de Framengos, como à ò depois
tomando as conhecenzas da terra, è sondando confesou à mesmo Framengo.
sempre fazendo Roteiros pello Piloto Antonio Vizente
Cochado, de que elle dará boa relazaom por ser à à O Capitãom mor Francisco Caldeyra, à
quem o dito Capitaom mor Alexandre de Moura mandou vir à este dito Framengo, do qual tivemos
mandou por Piloto mor deste descubrimento à esta certa relazaom dos enemigos olandeses, è framengos
nesta costa [sic]. que estavaom no cabo do Norte, de que tinhamos
muita noticia, è como estariaom 250 homens até
Chegados à este grande Rio, è tendo andado 300 repartidos em duas fortalezas de Madeira, è
150 leguoas pella costa; è o Rio tem [de] largo como tinhaom elles engenhos de Azucar de que
120 leguoas tudo agoa doce até entrar no mar 60 carregaraom alguns navios com ò mais que à terra
leguoas; en aquelle tempo trazia muy furioso da de si.
corrente por ser inverno: entrou à armada por Soubemos mais de alguns Gentios que de muito
hum brazo estreito que está na ponta à que longe pello Rio asima vinhaom à ver os Portugueses à
chamaom de sapanara, na parte de leste, è naom ver [sic] seus amigos, como à ò pé de huas serras que
dando fe da mais largura do Rio fomos sempre estavaom da nossa fortaleza 150 leguoas estavaom
por antre Ilhas caminhando pello Rio asima, è 15 vellas com muita gente fortificandose, tendo
falando com o gentio que avia naquellas partes, molheres consigo como ya vinhaom à su [sic] efeito.
que facilmente com boa vontade aceitava nosa Estas serras diz o Gentio que saom escaluadas com
amisade dizendo que nós heramos os verdadeiros mato, è alguns homens experimentados dizem que
valentes pelo muito que tinhamos feito com os estas saom as serras, que alli vem dar do
Franceses, è mais Nazoens, que naquella costa Peru como muitas cartas de marear tambem ò
eram nosos enemigos. mostraraom, è que há ouro nellas, è mais metaes.
100 A “Realazaom” do Capitão André Pereira (1616)

Tevi [sic] o Capitaom mor duas perolas, como outras sortes de madeiras que naom faltam,
querendo mandar avisar disto à sua Magestade, as Tabaco; dizem que há castores [sic] è este Capitam
quais diz hum capitam frances que alli foi digo as frances que alli nos serve de lingoa dize lhe deraom
quais lhe deu hum Indio que dize as achase comendo húa pelle de hum mui fina.
ostras asadas, à as deitara fora naom estimando ò
Das entradas è saidas deste Rio, do fundo, è
que era, dizendo que as ostras que tinhaom muito
tudo ò mais que he necessario pera entrar Armada
daquello, havia 70 pello Rio asima, em fundo de
è sair delle tem o Piloto Antonio Vizente feito seus
hua braza [braça] [.] Á ò Senhor Marques Dalemquer
Roteiros em forma de que dará razaom pois he arte
vieraom estas duas perolas algum tanto escuras por
serem assadas na forma que digo; è a casca das sua.
ostras em que ellas nacem he madre perola mui Havendo ò capitaom mor Francisco Caldeira
fina. de Castello-branco de mandar dicto aviso à sua
Neste Rio se acharaom tambem duas pedras Magestade depois de termos feito a fortaleza em que
antes de virmos à elle de muito preso [preço], as fica a gente dita, nos mandou à Andres Pereyra è à
quais diz hum capitaom Frances que alli foi por Antonio da Fonseca capitaom de infanteria cada
lingua [muito provavelmente Charles des Vaux, cf. hum de sua companhia dar daquelle Presidio
seção 6.3 acima] foraom robadas de hum Ingres ao parecendolhe acertava assim è por no discurso da
Frances que as levava, è corre demanda en Inglaterra viagem aver entre elles paixoens, Antonio de Fonseca
sobre ellas, è que estavam avaliadas em muitos se ficou na Ilha Terceira, naom querendo dar fim à
cruzados. sua viagem na conformidade que vinhaom na não
em que em Santo Domingo se embarcaraom, sendo
O Rio pareze capaz pera mui grandes couzas
mui seguro, è se deixou ficar com alguns papeis
por ser da largura que digo; as terras muito
fertilisimas com muita diversidade de Madeiras – que tinha em sua mão, sendo requerido se
como as do Brasil, è mais aventajadas por serem embarcasse, pello que importava ser el Rey avisado,
arvores notavelmente grandes, entre as quaes há è naom querendo dar os papeis à ò dito Andre Pereira
hum pào à que o Gentio chama Cotiara mui se veio na dita nao, trazendo consigo ò Piloto que
lindamente dibujado è gracioso à vista. Há neste pera a entrada deste Rio era necesario, è esta mostra
Rio em todas as partes delle muito Gentio por que trouxe ao Senhor Marques Dalemquer è viso
extremo de diversas nazoens, ò mais delle mui bem Rey [vice-rei] de Portugal, por cuya via lhe foi
encarado sem barba, trazem os homens cabello embiado Capitaom mor francisco caldeira.
comprido como molheres, è de mui perto ò parecem Esta he a verdade, è ò que ha neste famoso
de que pode ser nasceria o emgano que dizem das Rio, sem ver nos papeis que ficaraom na maom de
Amazonas; pois naom há outra cousa de que à este outro Capitaom cousa algúa mais de considerazaom
proposito se pudesse deitar maom. somente à petizaom que se faz de socorrer pera
As mercadurias que este Gentio vende à òs aquella gente, è que Sua Magestade faza vista à que
olandeses saom, Algodaon, tinta de oroco [urucum], for servido como cousa sua &ª O Capitam Andre
que he como Gram, algúa Pita, è este pao Cotiara Pereira.”

Referência
Projeto Arquivo Permanente do Museu Paraense Emílio Goeldi, 1987. Inventário analítico do Fundo Rudolf
Schuller. Museu Paraense Emílio Goeldi, Belém.
Capítulo 8

SYMÃO ESTÁCIO DA SYLVEIRA E O


“INTENTO DA JORNADA DO PARÁ” (1618)

N ada se sabe sobre a vida e a formação de Simão (ou Symão) Estácio da Sylveira, a não ser
que chegou ao Brasil em 11 de abril de 1619, comandando a nau capitânia da expedição de
Jorge de Lemos de Betancor, dos Açores, que planejava estabelecer famílias açorianas no
Maranhão e no Grão-Pará. Diz Damasceno (1974: 98): “era homem da confiança do empresário
[Betancor], a quem esse, aprontando-se para passar logo ao Pará, pretendia entregar o cuidado
dos colonos recém-chegados (...). ...sabe-se que, tão logo desembarcados os colonos, assentou-
se a criação da câmara, saindo por eleitores quatro pessoas das de Betancor e dois conquistadores
da terra, o sargento-mor Afonso Gonçalves e o capitão Bento Maciel Parente; os seis escolheram
a Simão Estácio da Silveira para juiz, juntamente com Jorge da Costa Machado. A câmara, que
não obtivera resposta à carta em que anunciava sua criação, voltava à presença de El-Rei,
incumbindo ao capitão Simão Estácio de que pessoalmente pleiteasse despacho e resolução das
coisas de que dava conta, e pedia fosse Sua Majestade servido ‘mandallo ouvir e favorecer a
cerqua dos negocios desta conquista e seus particulares porque se ofereceo per isto cõ bom
animo’. Pela mesma ocasião, escreve ao Reino o capitão-mor daquela conquista, Diogo da Costa
Machado, pedindo que sobre quanto expunha se mandasse ouvir o mesmo capitão, ‘que como
pessoa de vista poderá informar mais largamente ao qual dey poder e a camara para acistir aos
negocios desta comqista por não haver tido resposta de outras que escrevy antes desta’. Assim,
chegado ao Maranhão em abril de 1619, como comandante de navio, já em dezembro, certamente,
estaria Simão Estácio voltando a Lisboa como procurador das coisas do Maranhão e de seus
negócios particulares. Nessa condição, assina a petição que Rodolfo R. Schuller copiou em Londres
e Rodolfo Garcia publicou [1919: 91-99]. Trata-se de um documento datado de Madri a 15 de
junho de 1626, no qual se oferecia para abrir um novo caminho por uno de los rios de Marañón,
por donde con seguro, y en quatro meses se vêga a España desde el Pirú a prata lá extraída,
abandonando-se a rota do Panamá. Pelo documento se vê, embora firmando-o com o título que lhe
outorgara sete anos antes a câmara do Maranhão, Simão Estácio tratava de interesses particulares:
a troco de tal serviço, pretendia entre outras coisas o arrendamento do pau-brasil e que, como
fiança prevista em regimento, mandasse el-rei aceitar-se o que lhe devia a Real Fazenda. Vê-se
também que o posto de capitão (de uso generalizado, aliás) lhe adviria não da militância em terra
(...) mas do trato naval: plático en las cosas del mar, se diz dele, que têgo mucha noticia de las del
Marañon, como parece de mi relacion que he impresso [cf. Sylveira, 1624]. Pelo arrendamento do
negócio do pau-brasil oferecia 24 contos de réis, que seriam consignados à empresa de comunicação
interiorana Peru-Grão Pará, sob as seguintes condições, entre outras: levantamento de 500 homens,
armados e pagos por ele, destinados a desalojarem os holandeses do Cabo do Norte; fundação de
uma cidade no dito lugar, onde introduziria 100 casais (500 almas) e 100 cabeças de gado;
construção de um forte al uso de la tierra (isto é, de taipa de pilão); introdução, na dita conquista,
de 200 novas pessoas a cada ano do contrato e levantamento de duas novas povoações rio acima,
com 30 homens armados cada qual. Para tanto, pleiteava que se lhe concedesse o poder de levantar
gente nos Açores; provisões e privilégios e cartas para governadores, capitães-mores e justiças
das referidas ilhas, como se hizo en favor de Jorge de Lemos de Betancour. Aspirava assim, Simão
Estácio, a seguir o caminho de seu antigo empresário – de resto, o caminho de todos os
colonizadores, – enfeixando nas mãos o poder de coerção e justiça, inclusive morte cível e privação
de ofícios. Entretanto, mais rico de dados pessoais que os precedentes, é o documento, mais
antigo que a petição, intitulado ‘Intentos da jornada do Pará’, que a Biblioteca Nacional inseriu no
vol. 26 de seus Anais. Nem a introdução ao volume se refere ao escrito nem o índice lhe consigna
autoria; apenas pela assinatura ao final se fica sabendo da relação entre o manuscrito
102 Symão Estácio da Sylveira e o “Intento da Jornada do Pará” (1618)

e Simão Estácio. Datado em Lisboa a 21 de setembro de 1618, depreende-se logo que o documento
tem a ver com a empresa de Jorge de Lemos de Betancor, a quem procurava instruir sobre as
coisas do Maranhão, ao mesmo tempo que revelava compromissos de ordem prática assumidos
pelo comandante, como escolha do sítio para povoação, assistência técnica aos colonos, estímulo
da agricultura, etc. O capitão mostrava conhecimentos de engenharia e familiaridade com as
ordenações ao cuidar da fundação do novo síitio: ‘que seia inclinado ao nacente et ao norte à
beira do Rio com bom surgidouro a vista da serra que seja defensauel laurado dos ventos’;
‘situação das ruas ao Norte de boa largura com suas praças nobres, fabricas, arquitectura e
fortificação de tudo pera comodidade fortaleza e nobresa da cidade’. Propunha-se orientar na
‘resguarda da agricultura’, isso ‘per que há muitos annos que sou professor da agricultura
ajudando a meu pay na [sic] que escrevia’, e ensinar a descobrir minas, fundir metais, fabricar
salitre e pólvora. Não lhe faltava pendor para o desenho, já que se determinava ‘observar as
islhas, as prayas, e o gentio descreuendo tudo, e dibuxando como sey fazer’. Uma passagem
desses ‘Intentos’ (1618) mostra que era antiga a idéia da ligação Lima-Pará, que encurtaria a
viagem da prata para a Espanha, como vimos pela petição de 1626. Reduzido o gentio, contava
Simão Estácio abrir pelo Rio Maranhão ‘ûa grande porta as riquesas do Perú por onde deção a
Espanha sem os grandes trabalhos e imensas despezas com que se acarretao ao mar do sul e de
lima por mar a Portobello, e dahi per terra a Habana e mar do Norte donde vem nas frotas de
noua Espanha’. Tais intentos, pensava consegui-los à sombra de Betancor, embora reconhecesse
ser grande o cabedal necessário à empresa. A exposição termina pela súplica de lhe poder dirigir
‘por premisia de meus trabalhos’ um tratado que escrevia ‘deste descobrimento que la espero
acabar’. Dos elementos biográficos levantados se depreende ter Simão Estácio da Silveira várias
qualificações: professor de agricultura, capitão de navio, cronista, desbravador... A primeira
delas, amplia-se pelo conhecimento da mineração e se completa pelo do desenho; a segunda,
ambígua, de certro modo, se tomada no sentido geral, precisa-se, no caso de Simão Estácio,
pelas reiterações quanto à experiência da vida naval: conhecimento da costa norte do Brasil,
familiarização com a hidrografia amazônica, informação quanto a possibilidades de fixação
agrícola rio-acima, etc. Da vocação de cronista, parece ter ficado apenas, em lugar de um tratado
ou de uma história do novo descobrimento, a Relação sumária das cousas do Maranhão. Quanto
ao atributo de desbravador, mais de um indício nos leva a crer que estivesse antes em propósitos
que em realizações: as promessas feitas a Jorge de Lemos de Betancor, nos ‘Intentos’, beiravam
a fantasia e faziam da terra a imagem do paraíso, onde tudo seriam facilidades, se posto sob
seus cuidados; grandioso, mas inexequível, era o projeto de desbravamento e colonização da
rota fluvial do Pará, pela qual haveria de descer a prata do Potosí. Os simples números com que
joga, na previsão do estabelecimento de núcleos populacionais, evidenciam o irrealismo de Simão
Estácio, pois sabemos que os levantamentos que se faziam para outros sítios, a evasão de soldados
não pagos, a falta de provisões e ferramentas combinavam-se na constante rarefação populacional.
A esse irrealismo se deve que a petição de 1626 não tenha provavelmente recebido despacho
satisfatório. Entretanto, o que pretendeu Simão Estácio alcançou, de certo modo, Bento Maciel
Parente, ex capitão-mor do Pará, este sim, desbravador e homem de pés plantados na terra. Por
uma cédula real daquele mesmo ano, era Parente despachado para ‘conquistar el gran Rio de las
Amazonas, y echar de alli à los enemigos’, conforme se oferecera. Para tanto, se lhe assegurava
gente, armas e munições com que pudesse povoar a terra, administrar o gentio e ‘buscar a los
Olandeses adonde se supiese que estan’. Simão Estácio pensava no transporte da prata distante;
Bento Maciel Parente, na encomenda dos índios próximos... (...) a Relação sumária se antecipa
de alguns anos à História dos animais e árvores do Maranhão, de Frei Cristóvão de Lisboa [cf.
Papavero et al., 1999] (...). Se a Relação sumaria não tem a valorização iconográfica da obra de
Frei Cristóvão de Lisboa, tem sobre outros escritos da época a vantagem da inteireza, que permite
a vejamos como peça acabada dentro de sua finalidade.”
Neste capítulo transcrevemos o “Intento da Jornada do Pará” de 1618, acompanhado da
tradução inglesa e notas feitas pela historiadora J. Lorimer (1989: 178-184), que auxilia
grandemente a entender certas passagens desse texto seiscentista. São poucos os animais citados
por Sylveira, como geralmente acontece, aliás, com os escritos da época. Neste caso, além disto,
não sabemos se o autor já tinha vindo ao Brasil, e deles tivera conhecimento, ou se somente os
cita a partir de escritos de outrem. Permanece esta incógnita.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 103

Texto original do “Intento da Jornada do Pará” Tradução de Lorimer (1989: 178-184)


(1618)
“Firstly we must carry to the north the
“Primeiramente se há de leuar por Norte á exaltation and propagation of our holy Catholic Faith
exaltaçao, e propagaçao da nossa Fé Catholica, e and the conversion of the Indians settled in the
converçao do gentio morador da terra com animo region in the spirit of charity and disinterest,
de caridade e desinteresado; porque este he o titulo because this is the title and escutcheon of the
e brazao da fundaçao, e instituiçao deste Reyno nas foundation and institution of this ream in the words
palauras que nosso senhor Jesu Christo disse á El that our lord Jesus Christ said to the King Dom
Rey Dom Afonso Henriquez nos campos de Ourique, Alfonso Henrique on the fields of Ourique when he
quando nelle instituyo esta coroa com titulo e invested him with this crown, the title and mandate
pretexto de leuar o seu S to nome a gentes to carry his holy name to foreign peoples, saying
estrangeiras, dizendo que aos vassalos delle tinha that he had prepared and chosen the king’s vassals
aparelhado, e os escolhera pera seus operarios pera for his labourers in remote lands, and other words
terras remotas, e outras palauras que denotao o which mean the same thing1. Thus God creating
mesmo 1 , e assi foi Dios criando esta naçao this Portuguese nation on the shores of the ocean
Portuguesa nas ribeiras do oceano de tao pequenos from such small beginnings, expanding and
principios, ampliandoos, e fauorecendoos ate favouring them until they expelled from this land
lançarem do Reyno, e de toda Espanha os perfidos and all of Spain the perfidious Mahometans, and
Mafomistas, e passarem à pos elles em Africa, onde then they passed on to Africa where they took from
se lhes tomarao muitas cidades, que despois them many cities, and later they departed to pursue
largarao per seguirem á empresa da conquista, the enterprise, conquest, navigation and commerce
nauegaçao, e comercio de Ethiopia, Arabia, Persia, of Ethiopia, Arabia, Persia, India and Brazil so that
India e Brasil para que forao criados.
they were settled.
Isto se vio bem no descubrimento do Oriente
This can well be seen in the discovery of the
que tanto tem florecido por este intento com que o
East that has so flourished by this design. The most
Serenissimo Infante Dom Henrique a elle emviou
serene Prince Dom Henrique sent the first
os primeiros Portugueses, que chegarao ao Cabo
Portuguese there, who arrived at Cabo Verde in the
Verde no anno de 1420 a pos os quais Joao
year 1420, after whom João Goncalves and Tristão
goncalues e tristao vas, passarao a India2, á cuyo
Vas reached India2, at the which discoveries the most
descobrimento os Sumos Potifices acrescentarao
excellent Pontiffs added, with their apostolic
com sua Apostolica bencao todos os descobrimentos
blessing, all the previous discoveries of the Canaries,
das Canarias em diante ate que no tempo del Rey
until, in the time of King Dom João II, Christóvão
Dom Joao 2o. por Christouao Colon descobrir a terra
Colon discovered the land of the new world, found
do nouo mundo, achado antes pello grande Americo
before by the great Americo Vespucio3. The Spanish
Vespucio3 o Papa Alexandre Espanhol determinou
Pope, Alexandre, determined the dispute over this
as duuidas que sobre isto recrecerao entre Portugal
between Portugal and Castile with the line which
e Castela com a linha que lançou de Polo á polo
runs from Pole to Pole four hundred and seventy
quatro centas e setenta leguoas a loeste das islas
do cabo verde, que demarcao pello meridiano entre leagues to the west of the islands of Cabo Verde
o Brasil e Indias, que parte pella Ribeira do Rio da that demarcates by the meridian between Brazil and
prata e pella deste nouo Rio, e nouo descobrimento the Indies. The which stretches from the Rio da Prata
do Para, conforme a qual demarcacao aiudando- [River Plate] to this new river and the new discovery
nos alcança algua terra do cabo do Norte e toda á of Pará, accordingly the which demarcation,
largura do Rio, que são cento e vinte leguoas, e ilhas favouring us, extends from some territory of the
delle ate terra de seis graos e dous terços da parte Cabo do Norte, all the mouth of the river, which is
do sud, e dahi cortando direitamente pello sertao one hundred and twenty leagues, and its islands to
no Norte sud differe á linha em perjuizo pella boca six and two thirds degrees South. From there cutting
do Rio da prata com toda a largura delle e algua directly north-south through the sertao the line exits
pequena terra de cabo branco4. by the mouth of the Rio da Prata with all its estuary
and some small territory of Cabo Branco4.
E com esta demarcacao, se divide á provincia
do Brasil pertencente á Coroa de Portugal das Indias And with this demarcation the province of
Occidentales á Coroa de Castella. Brazil, belonging to the crown of Portugal, was
divided from the West Indies, belonging to the crown
Este rio Pará a que chamamos das Amazonas
of Castile.
tem dous nacimentos hum do Rio de Orelhana de
quem tomou o nome, por ser este Francisco de The river Pará which we call the river Amazon
Orelhana o primeiro que desembarcou no mar do has two sources one the rio de Orelhana from
Norte, e nace em Quito e serras do nouo Reyno de whence it took its name, this Francisco Orelhana
Granada espaldas da cidade de Santa Féé i corre being the first to disemboque into the North Sea,
por mais de nouenta leguoas, com muitas, e grandes and it begins in Quito in the mountains of the New
voltas, al este; outro que chamao do Maranhao, por Kingdom of Granada behind the city of Santa Fé
ser chamar o Capitao Castelhano, que o descubrio and runs for more than ninety leagues with many
em seu nacimento, que he hum pouco ao Norte do windings to the east. The other which is called
serro de Potosi e nace nas serras do Perú na Maranhão, named after the Spanish captain who
104 Symão Estácio da Sylveira e o “Intento da Jornada do Pará” (1618)

prouincia de Cusco, e correndo mais de setecentas discovered its source, which is a little to the north
leguas ao Nordeste com menos volta se ajunta com of Mount Potosí, and it is born in the mountains of
o de Orelhana mais de quatrocentas leguoas antes Peru in the Province of Cusco [Cuzco] and running
de emtrar no mar, e ambos fazem o nouo archipelago more than seven hundred leagues to the northeast
entre o Brasil e Cumana. Cuyas islhas ficao with fewer meanders it joins the Orelhana more
pertencendo á Coroa de Portugal5. than four hundred leagues before entering the sea.
A terra que acompanha á Ribeira deste Rio e Both form a new archipelago between Brazil and
hum valle chao de mais de trezentas leguoas de Cumaná; whose islands belong to the crown of
cumprido de grandissima abundancia, fertilidade e Portugal5.
arboredo com muitras aguoas e pouoaçoes ate á
The land on the margins of this river is a valley
terra que chamao de Coca, que he de montes, e
of more than three hundred leagues in breadth of
logo se segue Çumaço que os castelhanos chamao
da terra da Canella, por razao de certas aruores very great abundance, and fertility, trees, with many
aromaticas que nella há como grandes louros que rivers and settlements up to the territory called Coca,
dao hunos cachos de frutos como casulho, he a wehere it is mountainous, and then follows Cumaco,
milhor canella; á terra he aspera mas abundante e which the Spaniards call the land of cinamon
rica, a qual descubrió Gonçalo Piçarro com duzentos because of certain aromatic trees there as large
castelhanos, quando com Orelhana seguio o Rio Laurels that give good clusters of fruit like seed pods.
abaixo, elle achou hum salto, ou cachoeira de mais It is the best cinammon. The country is rough but
de duzentos estadios6 de alto, cuya Queda fazia tanto abundant and rich. Goncalo Picarro [Pizarro]
ruido que sed ouuia mais de seis legoas, e discovered it with two hundred Spaniards when,
descubrindo o Rio o veyo meter em terra, onde vem with Orellana, he followed the river downstream.
todo junto por hua gruta muito espreita, permeia, e He found a cataract that he estimated to be more
caminha com grande furia, e ronco e em alguas than two hundred stadia6 high, whose fall made so
partes he cuberto per sima7. much noise that it could be heard more than six
Está á barra do Rio hum grao da Equinocial8 leagues away, and exploring the river he saw it enter
pera o sul, e na costa há dous veroes e dous invernos a region where it all runs together into a very narrow
cada anno e duas nouidades que casi se alcançao cleft, permeating and running with great furor and
hua a outra, e tudo o que os nossos samearao se roring and in some places it is covered over7.
deu com grande bondade 9, melois, pepinos 10,
The mouth of the river is 1° South of the
ortaliças, fauas e feijoes11 há milho muito bom, que
Equator8. On the coast there are two summers and
se da todo o anno e algua mandioqua no distrito da
two winters each year and two springs that nearly
cidade de Beleem e se espera que dara à terra trigo,
e vinho, arroz, e tudo o mais per sua fecundidade, run into one another, and everything that our people
grandes lauores de asucar e grandes criaçoes de sowed grew with great abundance9. There are many
gado, especialmente nas islhas e nos planos, das and very good melons, cucumbers10, vegetables,
ovelhas do Perú, onde seruem de acarretar e leua broad beans and green beans11 are very plentiful
hua hum homem quatro e seis leguas gentilmente12. and good which grow all year round, and some
manioc in the district of the city of Belém. It is hoped
A nauegação he a mais facil de todas as do
that the land will produce wheat, wine, rice and, all
Brasil o canal excelente, e muito capaz àlem dos
muitos outros per onde o Rio desemboca no mar, the more because of its fecundity, great sugar
cuya foz he agua doce per mais de quarenta legoas plantations, and great breeding of livestock,
ao mar. especially on the islands and flats, from the sheep
of Peru, where they are used for cartage and carry a
O que os nossos han descuberto da fertilidade
man four to six leagues easily12.
e abundancia e salubridade da terra, parece que
denota o nome que tem de Amazonas em Its navigation is the easiest in all Brazil, the
contraposiçao da errada opiniao dos antigos que channel excellent and capacious as well as the many
chamarao Plaga solis cuique e a tiverao per zona others through which the river spills into the sea.
inhabitavel13; por que não era todo auer Amazonas, Its mouth has sweet water for more than forty
e estando à terra tao vesinha da equinocial, e muito leagues into the ocean.
temperada fresca e sadia, como os nossos hao visto;
According to what our people have discovered
estando duzentos homens nouamente chegados
about the fertility, abundance and salubriousness
muitos meses ao Sol e sereno comendo as frutas, e
of the land, it seems it upholds the reputation which
variando as aguas sem nenhum adoecer e as febres
the Amazon has in contradiction to the erroneous
se tirao banhandose nas aguas. A terra promete
grandez riquezas i per que como he constelaçao opinions of the ancients who called it the sole land
quente Oriental a onde o sol nace per cima do mar of the Sun and held it to be uninhabited zone13.
há de auer nella muito cobre que ya se vay Inasmuch as there were no Amazons at all and the
descubrindo, ouro e outros metaes, esmeraldas, territory is very close to the equinoctial, it is very
cristal, pedras de leuar [sic; pedras de sevar, ímã] temperate, fresh and healthy as our people have
e outras preciosas, salitre e outros mineraes, e no seen, being two hundred men, newly arrived,
Rio perlas, de que ya se virao e acharao bons passing many months in the sun and open air,
principios14. eating the fruits and drinking the waters without
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 105

Há no Rio tartarugas de boa carne de que se anyone falling sick, and the fevers disappear by
faz manteiga muito boa do ovo dellas 15 muita bathing in the waters. The earth promises great
diuersidade de peixe algunos muito grandes, e todos riches, and because it has a hot, oriental
muito bons pescados solhos, e o peixe boy16, cuyo constellation where the sun rises above the sea,
coiro he de proueito. Há muita quantidade e there must be much copper in it, which is already
diversidade de porcos e algunos se matao being discovered, and gold and other metals,
atrauessando os braços do Rio em magotes17; há emeralds, crystal, [pedras de levar] and other
muitos veados 18, muitas antas 19, pacas, como
precious stones, saltpetre and other minerals and
lebres 20 , gibatos e coatis mayores que ellas 21 ,
pearls in the river, of which we have already seen
apercas como coelhos22, lindos bugios, e saguis há
and made good beginnings14.
muitos patos, galinhas, crioulas pequenas,
galinholas brauas, rollas, pombas, motus, como There are turtles in the river with good meat.
Perus, Jacus, baracoas 23 como galinhas muito Very good oil is made from their eggs15. There is a
tocanos em moncoes como tordos, Aletos e garças. great variety of fish, some very large and all of them
E outras muitas aues e papagaios de comer e de good, flatfish and manatees16, whose hide is useful.
fermosas penas. There is a great quantity and diversity of wild-pigs;
Há mais infinitas fruitas, Ananases, batatas some are killed when they cross the arms of the
inhames24, cajus como macaris, mangabas25, como river in herds17. There are many hinds18, tapirs19,
uuas de que se faz vinho e vinagre, anhas como pacas like hares20, gibatos and coatis larger than
amendoas no sabor que durao secas, cocos de que them 21 , aperca like rabbits 22 , fine apes and
se faz aceyte infinito26 mil bellas arbores de muito monkeys, many ducks, hens, little chickens, wild
prestimo, há infinitas madeiras grandissimas há hens, turtle doves, pigeons, mutuns like turkeys,
paodarco, cotiara, que quer dizer pao pintado as jacus, aracuas23 like hens, many toucans in [flocks]
aruores das anhas são como castanheiros he pao like thrushes, finches and herons and many other
amarello, pao Santo, pao do Brasil, angelim, paos birds and parrots for eating and beautiful feathers.
de rosa, pao vermelho, pao preto como euano e
outras infinitas madeiras27 que subem ao ceo, per There is an infinity of fruits: pineapples,
baixo das quaes não nace mato, até estes paos que yams24, cashews like macaris, mangabas25 with
fazem tinta amarella, vermelha, laranjada e vernis others to make wine and vinegar from, nuts like
muito bom, e breu resina e almasega, em quantidade almonds in flavor which last when dried, palm nuts
muita seda, muito algodao e pita e barro ordinario, from which to make an infinite amount of oil26,
cal de ostras e outro barro como verde, e muito thousands of beautiful trees of great usefulness
precioso, e tudo o que não está muy perto, uem and infinite great timbers. There is pao de reo,
com muita facilidade pellos Rios que todos são cotiara, which is to say pao pintado, both are like
nauegaveis. chestnuts, pao amarello, pao santo, pao do Brasil,
O gentio da terra he brioso, engenhoso et em angelim, paos de rosa, pao vermelho, pao preto like
alguas polido mais que outro do Brasil muito facil e [... blank space in the translation that should be
tratauel, que deseja e procura nossa amizade e nos “ebony”], and other infinite kinds of trees27 which
entregao os filhos para os doutrinarmos com os reach to the heavens, beneath which there is no
quaes se deue usar toda á justiça, e caridade pera undergrowth. From these woods yellow, vermilion
os edificar e lhes conquistar os animos, perque nella and orange dye is made, and very good varnish,
estao cifradas todas as virtudes, e com ella mais pitch, resin and mastic in great quantity. There is
que com as armas se conquista, como diz á much cotton, pita, ordinary clay, oyster shell lime
sabiduria. Esta mesma deue hauer na justiça and other kind of green clay which is very costly,
distributiua no premio dos benemeritos na and everything which is not very close-by is found
conquista, e reparticao das terras, em cuyo beneficio with great ease by the rivers which are all navigable.
he muito necessaria a observancia da agricultura e
experiencia dos climas da terra. The natives of this region are spirited,
ingenious and somewhat more polished than the
Quanto aos mais particulares espero com o
others in Brazil, very easy and tractable, who desire
fauor de Dios ser de validade na fundaçao do nouo
to procure our friendship and give us their children
posto na eleisao do sitio, que seia inclinado ao
to instruct, and we sould use all justice and charity
nascente et ao norte à beira do Rio com bom
surgidouro a vista da serra que seja defensauel to edify them and conquer their souls, because in
laurado dos ventos não muito difficultoso ao seruiço it is counted all the virtues, and one conquers more
de bom ceo que se conhecera pella valentoa e through charity than through arms as the scripture
disposiçao dos naturaes onde ouuer muitos velhos, says. The same must prevail in the judicial
vecinho de boas aguas que traga queda pera mouer distribution of rewards to the well-deserving in the
a moenda e outros usos, situaçao das ruas ao Norte conquest and the partition of the land, for the
de boa largura com suas preças nobres, fabricas, benefit of which it is necessary to study the
arquitectura e fortificaçao de tudo pera comodidade cultivation and the experience of the climate of the
fortaleza e nobresa da cidade28. territory.
106 Symão Estácio da Sylveira e o “Intento da Jornada do Pará” (1618)

Na qual podem os moradores logo nestes As to the rest of the particulars I hope with
principios aproueitarse muito das madeiras, assi the favour of God to be of worth in the foundation
pera descobrirem as terras, que aonde as há of the new post, in the selection of the site, which
mayores são melhores, como para seus usos e should be: inclined to the east and the north on the
fundaçao e tambem pera vir carga pera o Reyno bank of the river; with good anchorage in sight of
pera o que lhes ordenarei serras de agoa, e os the cliff; defensible; washed by the breezes, not very
instituirei na resguarda da agricultura conforme difficult with the service of a good climate which
ao nouo clima e temperamento do ceo, e lhes darei
may be known by the valor and disposition of the
modo pera compor os aruoredos, para abrir as
natives where there are many old people; close to
terras aralas, e regalas onde for necessario, e
good water with a fall to move the mill and for other
proueitalas com as plantas e sementes que
uses; situated with all the streets of good width
amar em, e obrar tudo em uniao com mais
abundancia e menos trabalho; per que há muitos running north, with the noble squares, workshops,
annos que sou proprietario da agricultura ajudando architecture and fortifications of all for the comfort,
a meu pay na que escreuia, a qual com o endurance and nobility of the city28.
conhecimento desta terra, frutas e drogas della The residence of which, at the very beginning,
espero acabar inculcando neste Reyno todas as que can take great advantage of the timbers, and thus
há pella reondesa do mundo, que nelle possa ser discover the region. Where there are greater ones
de proueito. will be better both for their employment and
Ensinarlheshey a buscar as minas, foundation and also to send as cargo home, for the
conhecellas e abrilas, a fundir os metaes, e a fabrica which I will provide saws or sawyers, and will
do salitre e poluora; e ao gentio na cultura de tudo, instruct them in the practice of agriculture in
e do linho canhamo para que laurandose o ferro conformity with the new climate and the nature of
que ya se tem mostrado no Maranhao e outras the atmosphere, and show them ways to form the
partes do Brasil e nouo descobrimento se espera groves of trees to open up arable lands and irrigate
fique facil fazer embarcacoes pera seruico daquelle where it may be necessary, and to improve them
estado e aiuda deste Reyno, que tao cansado está with the plants and seeds needed. All will work
que com muita agencia e grande fabrica de together with more abundance and less toil. For
ministros senao acha hum pendendo toda a many years I have been a teacher of agriculture
sustancia delle da nauegaçao e comercio. helping my country by what I wrote. With the
E nas primeiras embarcaçoes espero vadear knowledge of this region, its fruits and drugs, I hope
o rio descubrilo á loeste, e pella outra ribeira contra to end by inculcating into this realm all the things
agoa; obseruar as islhas, as prayas, e o gentio which there are in the round world which may be of
descreuendo tudo, e dibuxandoo como sey fazer e use to it.
achados os passos e reducido o gentio a abrir por I will instruct them to look for mines, to
este Rio hua grande porta as riquesas do Perú por recognize and open them, to forge the metals, and
onde deçao a Espanha sem os grandes trabalhos e make saltpetre and gunpowder. And I will instruct
imensas despezas com que se acarretao ao mar do the natives in the cultivation of everything, and of
sud e de lima por mar a Portobello, e dahi por terra good flax and hemp, and in working iron which has
a Habana e mar do Norte donde vem nas frotas de
already been done in the Maranhão and other parts
noua Espanha cuyo comercio se começa ya a
of Brazil and new discoveries. I hope it may be easy
introducir desdo rio da prata; de cuyo nacimento
to build ships for the service of that state and of
han decido alguos castelhanos aos nossos.
this kingdom...
Ainda que pera esta empresa se requer é
I hope to cross the river in the first vessels to
grande cabidal de valia e de fazienda espero em
discover it towards the west and along the opposite
sua diuina magestade de conseguir estes intentos
bank upstream, observing the islands and
a sombra de V. S. e com seu fauor, que não pode
sandbanks and the Indians, describing everything
faltar a taes deseios e pa isso me fara V. S. merce
dar licença para lhe dirigir por premisia de meus and revealing how it is made. Having
trabalhos hum tratado que vou escreuendo deste found the passages and subdued the Indians, I hope
descobrimiento que la espero acabar pera que to open by this river a great port to the riches of
chegando per meyo de V. S. á noticia de sua Peru, by which they may descend to Spain without
magestade tenha algum lustre e merecimiento i pois the great travails and immense costs with which
a doutrina de Tullio a honra fomenta as boas artes they are conveyed in the South sea from Lima to
e assi cobro muita confiança que em V. S. onde há Portobello, and from thence by land to Habana and
tanta fidalguia há sempre as minhas posto que the North sea from whence it comes the flotas of
indignas de achar acolhimento e amparo que Dios New Spain. This trade is already beginning from Rio
á V. S. per muitos annos em Lisboa 21 de Setembro da Prata, whose source some Spaniards have
de 1618. revealed to us.
Simao Estacio da Sylveira” Lisboa, 21 September, 1618
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 107

Notas de Lorimer (1989) varieties are said to be somewhat like a cucumber.


1
The battle of Ouric or Ourique, 25th July 1139, It is, however, a plant of more temperate climates,
in which Prince Afonso Henriques defeated the Sauer, “Cultivated plants” HSAI, 1963, VI.520.
Moorish governor of Santarém and assumed the 11
For the various kinds of beans native to the lower
title of King of Portugal. Amazon, see ibid., pp. 498-504. Estácio da
2
Dinis Dias reached Cape Verde in 1441. Tristão Sylveiras “broad bean” may be the jack bean
Vaz Teixeira reached Madeira in 1419. (Canavalia ensifor mis) or the lima bean
3
Amerigo Vespucci. (Phaseolus lunatus).
12
4
The northern boundary betwen Brazil and the Presumably he means the llama (Lama glama
Spanish Indies as created by the meridian drawn glama) here which was used as a pack, though
through the Atlantic 370 leagues West of the Cape not as a riding, animal by the Inca.
Verde islands in the Treaty of Tordesilhas, 1494, 13
For a good discussion of the perception of
remained a matter of dispute between the two classical geographers about the nature of the
crowns throughout the sixteenth century. The torrid zone, see E. H. Warmington, Greek
issue was not made any easier by the frequent
geography (London, 1934), passim; H. E. Tozer,
confusion of the Maranhão and the Amazon. It
A history of ancient geography (New York, 1971),
was resolved by default after the establishment
passim.
of Belém in 1616, when the Spanish crown
14
allowed its Portuguese sujects to infiltrate the Ibid.
lower Amazon, although it was not yet willing to 15
The river turthe (Podocnemis expansa). The
cede Cabo do Norte officially to the Portuguese.
females lay their eggs on the sandbanks of the
The Consejo de Indias still claimed the Maranhão
lower Amazon during low water in November. To
as the proper location of the northern limit of
render them into oil the eggs are crushed, allowed
Brazil in 1621. The mouth of the Amazon and
the coastline between Cabo do Norte and the Rio to stand in the sun for some hours, and the
de Vicente Pinzón passed to Portugal in 1637 with ensuing oil was then skimmed off, Gilmore,
the creation of the captaincy of Cabo do Norte. “Fauna and ethonozoology”, HSAI, VI.400-2.
See Lorimer, “English trade and exploration”, 16
Soles (Pleuronectiformes). Although a marine fish
1973, ch. 1. they are found in the low-lying waters of the
5
Estácio da Sylveira’s claims are as excessive as Amazon basin, Golding, The fishes and the forst,
they are muddled here. It is not clear how he 1980, p. 38. The manatee (Trichechus inunguis)
derived the existence of the archipelago. He or “peixe-boi” was significant for its flesh, hide
appears to be confusing the Orellana with the and fat, Gilmore, “Fauna and ethnozzology”,
Orinoco and, at the same time, trying to describe HSAI, Vi. P. 381.
the Orellana and Maranhão as separate coastal 17
Peccaries (Tayassu tajacu and T. pecari).
effluents of a single mainstream. Raleigh and
18
Thevet had believed this to be the case (...). If Deer. The small brocket deer (Mazama), is found
this was Estácio da Sylveira’s intention he failed in the region as is the Pampa deer (Ozotoceros
to make it clear. His account turns the old view bezoarcticus).
upon its head, giving the river two distinct sources 19
Tapirus americanus.
in the interior insteasd of two discrete branches
20
entering the Atlantic. The paca (Cuniculus paca) is a highly desirable
6
A stadium is a measure of length approximately food animal because of its white meat.
21
220 metres. Presumably he means the coati (Nasua rufa or N.
7
Estácio da Sylveira’s account here seems to have narica), a tropical carnivore related to the racoon.
been taken from Gar cilaso de la Vega’s I canot identify the other animal with any
Commentarios reales de los Incas, pt. II, bk. 3, certainty.
published in 1617. For the relevant translation 22
Possibly the agouti (Dasyprocta).
of the relevant extracts, see C. R. Makham, ed., 23
Mutums (Cracidae, Crax, Mitu), are large, almost
Expeditions into the valley of the Amazons, 1539,
1540, 1639 (London, 1859), pp. 6-9. turkey-sized, flocking, jungle birds, jacus and
aracuas are guans (Penelope, Ortalis) flocking
8
Incorrect, if he means the Amazon here. The Pará grouse-like birds.
enters the Atlantic between 0°45’S. and
24
0°30’S. Ordinary yams (Dioscorea alata, cayenensis and
9
batatas) are native to the Old World introduced
On the lower Amazon the distinctly dry season into Brazil with the African slave trade. Estácio
occurs between July and September. Belém da Sylveira probably means the sweet potato
receives 90-100´´ annual precipitation.
(Ipomoea batatas) here.
10
Cucumber (Cucumis sativis), native to S. Asia, is 25
Hancornia speciosa.
the literal translation of this word. “Pepino” is
26
also the common name for the Solanum Oil can be extracted from several palm fuits by a
muricatum, or “melon pear”. The best tasting crushing and boiling process.
108 Symão Estácio da Sylveira e o “Intento da Jornada do Pará” (1618)

27
It is impossible to judge whether Estácio da (C. macrocarpa) or Brazil redwood (Brosium
Sylveira has any definite species in mind when paraense) or (Caesalpinia brasiliensis) from which
he lists these trees. “Pao de reo” may be the pau a red dye is extracted; pao preto now refers to E.
de rainha - Pará porcupine wood (Centrolobium Indian sosewood (Dalbergia latifolia), probably a
Paraense) [sic; Lorimer equivocou-se; é o pau- species of rosewood is meant here.
d’arco, como consta do documento em 28
Presumably Estácio da Silveira is talking about
português]; cotiara - angelim-coco; pao amarello the laying out of a pr oper settlement or
- Brazilian box or stinkwood (Euxylophora municipality of Belém, which was to be developed
Paraensis); pao santo-lignumvitae (Guajacum under the shelter of the original blockhouse, Fort
sanctum); angelim - (Andira sp.); paos de rosa - of the Manger, sited on a bluff five to ten metres
possibly Ceará rosewood (Dalbergia Cearensis) or high. There is no mention of a second Portuguese
Jacaranda do Pará (Dalbergia spruceana); pao settlement in the Amazon, before S. Antonio do
ver melho - possibly a Cedrella ver melha Gurupá was founded in 1623.

Referências
Almeida, C. M. de, 1960. Memorias para a historia do extinto Estado do Maranhão. Vol. 2 [pp. 1-31]. Rio de
Janeiro.
Damasceno, D., 1974. Simão Estácio, capitão de navio, procurador das coisas do Maranhão. Anais Bibl.
nac. Rio de Janeiro 94: 97-103.
Garcia, R., 1919. “Petição de Symão Estacio da Sylveira”. Mss. do Museo Britannico de Londres. Revta. Inst.
hist. Geogr. Brasil 83 (“1918”): 91-99.
Gilmore, R. M., 1963. Fauna and ethnozoology of South America. Handbook of South American Indian
6: 345-464.
Golding, M., 1980. The fishes and the forest. Berkeley.
Lorimer, J., 1973. English trade and exploration in Trinidad and Guiana, 1569-1648. Unpublished Ph. D.
tesis, University of Liverpool.
Lorimer, J., 1989. English and Irish settlement on the River Amazon, 1550-1646. The Hakluyt Society, London.
Papavero, N., D. M. Teixeira & J. L. de Figueiredo, 1999. Frei Cristóvão de Lisboa not the author of “História
dos animais e árvores do Maranhão”. 1. Introduction and comments on plates 1-60. Contr. Avulsas Hist.
nat. Brasil (Hist. Hist. nat.) 6: 1-12.
Sauer, C. O., 1963. Cultivated plants of South and Central America. Handbook of South American Indians 6:
487-543.
Sylveira, S. E. da, 1624. Relação sumaria das cousas do Maranhão. Escripta pello Capitão Symão Estacio da
Sylveira. Dirigida aos pobres deste Reyno de Portugal. Gonçalo da Vinha, Lisboa.
Sylveira, S. E. da, 1904. Intentos da jornada do Pará. Anais Bibl. nac. Rio de Janeiro 26: 361-366.
Capítulo 9

A “RELAÇÃO SUMÁRIA DAS COUSAS DO MARANHÃO”


DE SYMÃO ESTÁCIO DA SYLVEIRA (1624)

Para dados gerais sobre Symão Estácio da Sylveira, ver o capítulo anterior. Damasceno
(1974: 103) comenta que “A Relação sumária constitui até hoje uma obra de tal raridade, que
poucos bibliógrafos tiveram oportunidade de lhe ver algum exemplar. Os registros bibliográficos
mais recentes localizam-lhe três unidades: duas na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro e outra
na Universidade Católica de Washington. Entretanto, dois novos exemplares devem ser
acrescentados a esse número: o do Museu Britânico, de que já em 1903 dera notícia Oliveira
Lima, e o sevilhano, de que fala Schuller em nota final à cópia da petição de Simão Estácio sobre
o transporte da prata do Potosí. (...) assinale-se que, dos exemplares da Biblioteca Nacional, o da
Seção de Manuscritos é duplamente mais interessante que o outro: primeiro, por manter a feição
gráfica original, com folhas de largas margens, que medem 290 X 205 mm, ao passo que o da col.
Barbosa Machado teve reduzido seu tamanho para atender à conveniência de arranjamento e
encadernação de peças fisicamente heterogêneas; e segundo, por apresentar uma série de notas
manuscritas à margem, que revelam uma leitura crítica da obra e são praticamente contemporâneas
dela (1630). Tais notas devem ter sido lançadas na Corte, por alguém que estaria a par da situação
geral do Estado do Maranhão”. Foi este exemplar que Damasceno publicou facsimilarmente em
1974, e que aqui reproduzimos. Ainda segundo esse autor, da Relação sumária das cousas do
Maranhão assinalam-se as seguintes edições:
1. Princeps, de 1624;
2. In Almeida, 1874: 1-31. Na pág. 32 dessa obra uma indicação tipográfica revela ter tido a
Relação sumária composição em separado: Parahyba do Sul. – Typ. de C. M. de A. – Rua Coqueiros
n. 1. Texto anotado pelo editor;
3. Na Revista do Instituto do Ceará, 1905, sem o prólogo e as licenças;
4. Imprensa Nacional, Lisboa, 1911. Edição limitada a 60 exemplares, como informa Borba
de Morais [1958(II): 263, 264]. A edição, a cargo de Eugênio do Canto, se fez pelo exemplar adquirido
por Oliveira Lima no leilão da col. Azambuja e incorporado depois à Lima Library da Universidade
Católica de Washington;
5. Massachusetts Historical Society Boston, 1929. Edição facsimilitada.

Lista dos animais citados na “Relação sumária”


Sylveira é o primeiro a produzir uma razoável lista de nomes de animais, embora cite-os, a
quase todos, desde um ponto de vista puramente gastronômico:
1. “há infinidade de porcos bravos assi dos nossos 3. “Há muitas antas verdadeiras, que são como
jaualis de Espanha, como de outra casta de vacas piquenas cõ o rosto como ellas: mas sê
cochjnos mais pequenos, & cabeçudos, q’ tê o cornos, & o beiço debaixo muy cõprido, & não
embigo nas costas, è andão em grãdes magotes, sahê se não denoite”.
& se matão muito facilmête, de que pella mór 4. “Há muitas Pacas, que respondê cà as nossas
parte se sustêta a cõquista; & por húa faca de lebres, mas saõ muito melhores; porque a sua
cabo de pao amarello (ou por outro semelhante carne he mais brãda, alva, & gorda, & tê hûs
resgate) dá o Gentjo da aldea do Monjm, hum couros como leytaõ, & saõ muito carnudas, è
destes porcos, & por toda a terra firma, há gostosas, assadas, & cozidas, è de todo modo,
grande copia delles”. tambê fogê para a coua, è se achã húa alagoa,
2. “Hà veàdos pella terra dentro, & por aquellas quando as perseguê se salvã nella”.
Ilhas, hà muitas gazellas, que cada dia vem 5. “Há cotyas que saõ como os nossos coelhos, è
mortas à cidade”. melhores, & cõ a orelha de gato como a paca”.
110 A “Relação Sumária” de Symão Estácio da Sylveira (1624)

Figura 9. 1. Frontispício da Relação sumária das cousas do Maranhão de Symão Estacio da Sylveira (1624)
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 111

6. “Hà tatús de diuersos generos, q’ saõ armados mina, porque saõ muito bõs, é sadios. Tãbê as
de cõchas, como laminas dû cauallo darmas, cõchas dos juraràs saõ de proueito.
tamanhas como hû gozo, & tãbê se encouão, & 27. “Há muito erubins”.
he gostosa carne”. 28. “solhos”.
7. “Há jubatis, q’ saõ como càgados, mas grãdes, 29. “camaroupins”.
& muito ovados por sima, a carne he muito
30. Pyràguivas”.
Sádia, & o figado grãde em sua quãtidade, è o
mais regalado comer, q’ a natureza criou”. 31. “chernes”.
8. “Hà apercas”. 32. “meros”.
9. “Patos, porque hà muitos brauos, muitas 33. “Hà pescadas de tres castas, bicudas, da linha,
gallinholas, & marrecas, & outros infinitos è outras que tê o couro como chamalote de
paçaros d’agoa que cõ hû pao se deixão matar, ceda”.
& tambê se cação lindamête lançãdo cabaços 34. “há coruinas”.
nas alagoas (até q’ avezê a elles) è depois se 35. “abroteas”.
mete hû Indio pella agoa cõ hum cabaço na 36. “enxareos”.
cabeça, & buraços [sic] nos olhos, & chegãdo a
37. “douradas”.
elles mansamête, os vay mergulhãdo pellas
pernas, & debaixo da agoa lhes troce o 38. “pargos”.
pescoço”. 39. “bonitos”.
10. “Há nãbus, como as perdizes de cà”. 40. “caçoês”.
11. “há muitas Emas em bãdos pellas cãpinas”. 41. “arrayas”.
12. “há muitas rolas”. 42. “bagres”.
13. “muitos motus, como pirùs, cõ o bico groço, ê 43. “moreyas”
vermelho”. 44. “enxarrocos”.
14. “jacus”. 45. “pãpanos”.
15. “è aracoas, como gallinhas”. 46. “enxadas”.
16. muitos tocános”. 47. “sargos”.
17. “é mõçoês, como cá os tordos”. 48. “peixes pedras”.
18. “papagayos”. 49. “requeimes”.
19. “araras”. 50. “choupas”.
20. “corycas”. 51. “peixes reys”.
21. “garçotas”. 52. “lingoados”.
22. “aletos”. 53. “peixe gallo”
23. “garças”. 54. “agulhas”.
24. “& outras muy reaes aues de rapina”. 55. “roballo”.
25. “Entre todos os pescados, he notauel o peixe 56. “inguias”.
boy, porq’ em taçalhos sem osso, nem espinha, 57. “eirós”.
se tirão de hum destes peixes, cinco, & seis
58. “polvos”.
arrobas de carne, q’ mais o parece q’ peixe, & o
peixe he do feitio de hû boy sem pernas, com o 59. “há infinidade de fataças”
rabo redondo como hûa botija, de que se tira 60. “& mugens em tãta copia, que saltão denoite
muito azeite, & este dizem ser o peixe molher, nas canoas, de maneira que lhes vem fogindo,
cujos ossos na India retê o sangue no corpo & lançando o peixe ao mar, por se não irem ao
ferido, quando saõ da femea donzella, cozido cõ fundo”.
couves parece boa vitella, & como tal fez as 61. “carãguejos, de diuersas sortes, è os da terra
sopas, & assado, & em pão, he excellente, & são os melhores”
muito mais para estimar salgado pera 62. “ostras do lodo, & de pedras”
matalotajes, porque toma pouco sal, & he muito 63. “grandes camaroês”
gordo, & saboroso, & atè dos couros se podê
fazer muitas cousas de grande prestimo”. 64. “buzios de muitas sortes”
26. “Em segûdo lugar he excellente cousa o jurará, 65. “mexilhoês”
q’ assi chamão a hûs grandes càgados da agoa 66. “berbigoês”
doce, q’ se comê tambê por peixe, sendo elles 67. “longueiroês”
mais carnosos, que hû porco, è os lõbos 68. “ameijoas”
assados, & de vinhadalhos, saõ de ventagê, & 69. “perseues em pedras”
se faz delles sarapetèl té cõ torresmos, & muita
70. “caramujos”
manteiga, que excede a de vacas: saõ grandes,
há muitos, & tomãose facilmête, & durão em 71. “pernambins”
casa sem comer mais de hû mes, & pellas 72. “& no Parà muita quantidade das cõchas de
prayas se achão suas ninhadas deouos, & madre perola: em que se achão muitas perolas,
outras vezes de tartarugas do mar (q’ tãbê há & aljofres”
muitas) que tê quatrocêtos ouos, & mais q’ hûa 73. “ouriços”
112 A “Relação Sumária” de Symão Estácio da Sylveira (1624)

Figura 9.2. Emas (apud Brehm)


O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 113

Texto da Relação sumária

“RELACAÕ SÛMARIA DAS COVSAS DO MARANHÃO. ESCRITA PELLO CAPITÃO SYMÃO


ESTACIO DA SYLUEIRA. DIRIGIDA AOS POBRES DESTE REYNO DE PORTUGAL.

PROLOGO grandesas desta Conquista, q’ se assi he, como se


deve crer hûa pessoa calificada e testimunha de
Qvando fui a esta Conquista no anno de 1618,
vista, & esperiencia, esta terra virá a ser muy
se aballarão muitas pessoas das Ilhas a meu
habitada de Christãos, & com ajuda do Ceo nella se
exemplo, parecendolhes que pois eu sem obrigaçoês,
verà o nome de Iesu Christo muy venerado, &
a q’ hir buscar remedio deixaua o regallo de Lixboa,
dillatada; pello q’ não pode esta breve Relação deixar
& me hia ao Maranhão não seria sem algum
de influir huns dezejos muy apostados, & efficazes
fundamento. Na nao de que fui por Capitão se
de taõ louvavel empresa, nos animos dos ouzados,
embarcarão perto de trezentas pessoas, algûs com
& incançaveis Portugueses, que noutros tempos
muitas filhas donzellas, que logo em chegando
emprenderaõ cõ menos esperanças, cousas mais
cazarão todas, & tiuerão vida, que cà lhes estaua
difficultosas, q’ a outras naçoês pareciaõ temerarias,
muy impossibilitada, & se lhes derão duas legoas
& segûdo algûs pragentos, ou envejosos da gloria
de terra. Folgara de os ter agora aquj todos, para
Portuguesa, barbaras, & impossiueis. Em S.
testimunhas do que digo nesta Relação; mas
Domingos de Lixboa a 8. de Março de 624.
reportome ao que escrevem, & aos q’ de lá vierão,
que aquj andão chorando por tornarem. E se ainda Fr. Thomas de S. Domingos, Magister
houver alguns que suspirem por Portugal, & pellas
Podese imprimir.
couves do Aegypto (ou porque o amor da patria os
Em Lixboa a 8. de Março de 624.
Provoca, ou porque sò na Gloria nos hauemos de
O Bispo
aquietar) quizeramlhe levar agora de nouo outras
tãtas testimunhas, que lhes forão là cõtar, o que cà
Podese imprimir esta Relação.
vay: para os acallentar Eu não determinava publicar
Lixboa a 8. de Março de 624.
esta Relação sem hir diante de todos, abonando com
Damião Viegas
as obras a verdade do que nella digo; mas quem me
estorva esse bem (que devem ser meus pecados) não Que se possa imprimir esta Relação, &
permitirà Deus que o impida tambem aos pobres depois de impressa, torne para se taxar
deste Reyno. Aos que esta Relação (& as mais & sem isso não correrà, a 9. de março de 624.
informaçoês que tomarem) persuadir, a que vão viver D. de Mello. V. Caldeira
nesta terra, peço, em recompensa do bom animo com
que lha offereço, que quando se nella virem contentes, Taixão esta Relação em 30. reis em papel.
& sem necessidade, roguem a Deus, que me leve Diniz de Mello. V. Caldeira
tambem a serlhes companheiro, Que eu, quando os
Esta Relação concorda com o seu orginal [sic].
vir hir, direi cõ o Poeta.
Fr. Thomas de S. Domingos, Magister
Viuite faelices, quibus est fortuna peracta.
Iam sua; nos alia ex alijs in fata vocamur.
COMEÇA A RELAÇÃO
Deus escolha a todos o melhor. Em Lixboa a 7. de
Demarcação
Março de 1624.
O Maranhão he hûa conquista muito
grandiosa, & dillatada, cuja gouer nação S.
Symão Estacio da Sylueira.
Magestade tem demarcado desde o Cearà (que està
EM LISBOA. Com todas as licenças necessarias. Por em tres graos & hum terço da parte do Sul) atè o
Geraldo da Vinha. Anno de 1624 vltimo marco do Brazil, que està em dous graos da
bãda do Norte; em que há de costa perto de
quatrocentas legoas até o Rio de Vicente Yenes
Licenças
Pinçon, honde dizem estar um pedaço de marmore
Vi por mandado do Illustrissimo Senhor com as armas de Portugal desta parte, & as de
Inquisidor Geràl, esta Relação do Maranhão, Castella da outra mandado alj fixar pella Cesarea
composta por o Capitão Symão Estacio da Sylveyra, Magestade do Emperador Carlos V. corre delle a
& não tem couza contra nossa santa Fè, ou bons costa a Leste Quarta a Sueste. Tomou este nome de
costumes, pareceme que se lhe deve de dar a licença Maranhão do Capitão que descobrio seu nascimento
que pede, porque brevemente, & sem affectação de no Pirù, & pera o Sul tem mais de quinhentas legoas
encarecimentos, que outros custumão, diz as pello certão.
114 A “Relação Sumária” de Symão Estácio da Sylveira (1624)

Primeiros descobridores. grande, & partindo daqui foy ter a Guacenduba, que
he a terra firme que fica da parte de Leste, da Ilha
No descobrimento desta conquista tem S.
de Saõ Luis, onde estauão os Franceses, os quaes
Magestade, & os Senhores Reys passados metido
vendo as nossas embarcaçoens, & sabendo pellos
muito cabedal, assim por terra, como por mar. Por
Indios, que traziaõ por espias, a pouca gente
terra foy em seu descobrimento Gabriel Soares com
Portuguesa que hauia na jornada: logo dalj a poucas
muita gente, & chegando atè as cabeceiras do Rio
noites derão nelles, & lhe tomarão as embarcaçoês
S. Frãcisco, & à Serra Verde, perto de trezentas
com os mantimentos que hauia, & da hy a oito dias
legoas pello Certão escontra [sic] o Pirú perto da
nellas mesmas, & nas suas determinaraõ passar
gouernação que là chamão Charcas, na qual jornada
contra os Portugueses desda Ilha à terra firme,
se perderão muitos, & despois disto se fizerão algûas
aonde ao desembarcar os nossos como gente
entradas pellos do Rio de Ianeiro, honde tambem
desenganada que não tinha nenhum remedio, nem
andarão annos sem conseguir nada. Atè que o
mantimentos, derão nos Franceses, & quis Deos
Gouernador daquelle estado Dom Diogo de Menezes,
fauorecellos, que sendo a este tempo menos de
sabendo o cabedal, que pouco antes do seu tempo
trezentos homês, venceraõ, matarão, & prenderão
tinha metido neste descobrimento Pero Coelho de
Sousa, & as guerras em que andou com o Mel a muitos dos Franceses. E pudera soceder muito
Redondo nas Serras de Goapana, & que entre ao cõtrario; se elles se não aselerarão em passar da
aquelle Gentjo hauia noticias do Maranhaõ Ilha à terra em busca dos nossos com intento de
(entendendo que estes descobridores deuião andar não derixar nenhum pera trazer nouas. E assim este
perto delle) mandou conseruar as amizades que elle desprezo em que puserão tão pouca gente de hûa
deixou feitas com o Gentjo do Cearà, pello Capitão parte: & da outra a resolição, & aperto dos
Martim Soares Moreno, que hauia andado na Portugueses, vêdo que nem pera onde retirar, nem
companhia do ditto Pero Coelho naquellas guerras: para esperar alj hauia remedio; forão tudo meyos
& pera isto lhe deu hum barco, & alguns que Deos tomou para lhes dar esta não esperada
companheiros cõ que residio tres annos no Cearà, vitoria, com que ficaraõ senhores do campo, &
& adquirio Pilotos & nouas noticias do Maranhão. puseraõ em fugida mais de tres mil Indios frècheiros,
que estauaõ em fauor dos Franceses, despois de
O Gouernador Gaspar de Sousa, socedendo matarem dos Indios mais de quinhentos, & perto
naquelle gouerno mandou (por particulares ordês de cem Franceses.
de S. Magestade) a Ieronymo de Albuquerque com
cem homês por mar em quatro barcos proseguir esta
empresa. O qual discorrendo a costa auante do Socorros, & expuganação.
Cearà, foy até o buraco das tartarugas, & alj fez Aqui teue o Capitaõ Mór algûs socorros de
hum presidio, & hua cerca, & se tornou a pedir mantimentos de Parnambuco, & deste Reyno foy
mais gente, & cabedal pera passar ao Maranhão, com o capitaõ Miguel de Siqueira Sanhudo, & da
enuiando entre tãto a descobrilo pello capitaõ Bahya, com o capitão Francisco Caldeira de
Martim Soares Moreno, num barco, o qual o Castellobrãco, com cujo fauor tratarão os
reconheceo, & por via de Indias trouxe recado a este Portugueses de passar à Ilha de Saõ Luis, Y como
Reyno, q’ estauaõ alj Franceses em quãtidade, cõ o já o capitaõ mór tinha feito pazes com o Frances,
qual auizo mandou S. Magestade ordem ao dito não houue da sua parte resistencia; porque estauão
Gouernador geràl que tornasse a enuiar a este em tregoas por catorze mezes, & enuiaraõ seus
descobrimento, & conquista, ao ditto Ieronymo de Embaixadores a Espanha, & França, para que os
Albuquerque; & pera isso lhe deu mais gente, &
serenissimos Reys (como ir mãos em ar mas)
moniçoens com que em tres nauios, & cinco barcos
determinassem esta lide; & por se dillatar a
veyo atè onde deixara o presidio, no qual se hauia
resoluçaõ, foy Alexandre de Mora com hûa armada
jà prouado a mão com os Franceses, que hiaõ em
de Pernambuco no anno de mil & seiscentos, &
hûa grande não a pouoar em o Maranhão, &
quinze, & naõ com pouca difficuldade, & perigos do
desembarcando aquj em terra como duzentos homês
bem armados para consumirem os nossos quarêta, mar, entrou no Maranhaõ pella barra do Peryà, onde
que estauaõ na cerca: lhe sahio o capitaõ Manoel (por ainda se naõ saberem aquellas barras)
de Sousa d’Eça, com dezoito homens, & metidos encalharão algûas vezes, mas sem dano, & com sua
em hum charco por entre huas junqueiras, & chegada se entregaraõ os mais Franceses do
carriços que na Praya fazia hûa Ribeira, os Maranhaõ, que estauaõ em tregoas, com pacto de
deteuerão, a todos, matando alguns, & os fizerã se lhes dar passagem, & matalotagem pera França,
tornar a embarcar mal contentes. em cuja entrega naõ faltarão competencias; por
parecer a Ieronymo de Albuquerque, & a seus
companheiros, que a elles se deuia aquella gloria,
Entrada no Maranhão,
que a tinhão trabalhado.
& batalha com os Franceses.
Ieronymo de Albuquerque, se ajuntou aqui
Primeiras noticias das
com os seus, & ordenada algûas cousas necessarias
riquesas do Maranhão.
a jornada fez recenha de sua gente, & se achou com
até [400: correção na margem de texto rasurado] Esta Prouincia sempre foy muito requestada,
Portuguezes, & duzentos e vinte Indios amigos, que & desejada, & já em tempo dos serenissimos Reys
trouxera consigo de Parnambuco, Parahyba, Rio de Portugal ell-Rey Dom Manoel, & el-Rey Dom Ioão
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 115

III se hauia metido muito cabedal neste Reyno por sua ambição, & desembocando pello Rio do Parà,
descobrir & pouoar o Maranhão, & não sem grandes veyo a Espanha: onde disse tanto das grandesas, &
motivos. Por que nû trattado que Pero de Magalhaês, muitas riquesas desta terra, que o Emperador Carlos
escreueo das cousas do Brazil no anno de mil & V. o despachou por Almirante deste descobrimento,
quinhentos & setenta & cinco, refere que indo certa & lhe mandou ordenar para isso hûa boa armada,
nação deste Gentjo buscando nouas terras em que que não foy de effeito por elle morrer nas Canarias.
habitar (que se deu natural saõ como siganos amigos
de andar pello mundo) atrauesaraõ algûas jornadas
pera o Ponête, onde encontrando com outra nasção Descobrimento de Luis de Mello da Sylua.
sua contraria, que lhes sahio pellas espaldas, & Luis de Mello da Sylua, filho do Alcayde mór
sendo mais poderosos, os obrigaraõ a meterse muito Deluas, andaua na costa do Brazil por aventureiro,
pello certão, & dos trabalhos do caminho, è dos à descobrir algûa boa capitania, que pedir a Dom
conflictos da guerra morrerão muitos, & os que
Ioão III & sendo forçado dos geraès, à vir discorrer
escaparão forão tèr a hûa terra, onde hauia
esta costa do Maranhão, lhe pareceo a terra muito
pouoaçoês muy grandes, & de muitos vezinhos,
excellente, pello que aportou na Ilha de Margarjta,
entre os quaes herão tantas as riquezas, q’ hauia,
ruas muito cõpridas de ouriuezes, q’ sò se occupavão onde achou alguns do bergantim de Orelhada [sic],
em laurar peças de ouro, & pedraria, com os quaes que lhe disseraõ tanto da terra dentro, como
se detiuerão alguns tempos, & vendolhes leuar testemunhas de vista: que o obrigarão a vir, à grã
ferramentas, lhes perguntarão de quem, ou porque peça, pedir a Sua Alteza, aquella capitania, para a
meyos as hauião; & elles os informarão; como da conquistàr, & povoàr, & para isso se lhe aviou hûa
parte do Oriête ao lõgo do mar habitauão huns armada de tres nauios, & duas caravellas, com que
brancos que tinhaõ barba, de que as alcançauaõ: foy ter ao Maranhão, em cujos baixos, se perdeo a
entaõ lhe deraõ os outros os mesmos sinaes dos armada, & elle, & alguns que escaparaõ em ûa
Castelhanos do Pirù, dizendo-lhe, que tambem da carauella, que ficou fora do perigo, tornaraõ a este
outra parte do Ponête tinhaõ noticia hauer gente Reyno, & por ficar muito gastado desta jornada o
semelhante, & lhe deraõ a troco das ferramentas, despachou elRèy Dom Ioão II. para a India, donde
certas rodelas todas chapeadas de ouro, & ornadas vindo rico, & com grande animo de tornar a esta
cõ esmeraldas, pedindolhe que as leuassem para empreza, se perdeo na nao Saõ Francisco, de que
mostrar aquellas gentes, que tinhaõ as ferramêtas, naõ houue mais nouas.
& que lhes disessem, que se atroco daquellas peças,
& outras semelhantes lhes quizessem leuar Por estas, & outras informaçoês, Ioão de
ferramentas, & ter comunicação com elles, que o Barros, famoso historiador, que teue noticias desta
fizessem, que estauaõ prestes pera os receberem terra, com quem escriuia della hûa Decada,
com muito boa vontade, & que partidos dalj foraõ intitulada santa Cruz; se moueo a pedir a Elrey esta
ter ao Rio das Amazonas, & nauegando por elle capitania, & armãdo com Fernão d’Aluares de
assima dous annos chegaraõ a Prouincia de Quito Andrade, thezoureiro mór deste Reyno, & Ayres da
(terra do Pirù) onde logo foraõ conhecidos por gente Cunha, mandou em companhia deste dous filhos
do Brazil, & contaraõ sua jornada, & offereceaõ as seus, no anno de quinhentos, & trinta & cinco, a
rodellas que foraõ vendidas por grande preço. E qual armada hera de nouecêtos homês, em q’
conforme ao que este Autor discorre desta jornada entrauão, cêto & treze de cauallo, & là se perdeo
(que elle testifica como cousa muito certa) estas esta frota, & a gête, q’ escapou (depois de fazerê na
gentes ricas, deuem ser os habitadores do lago ilha de S. Luis, (onde agora se chama, o boqueiraõ)
dourado, em cujo descobrimento se haõ consûmido hûa fortaleza, de que ainda alj estão algûs vestigios,
infinitas gentes, & capitaês Castelhanos, & vem a em que se vê pedras brãcas das de Alcantra) os
cajr no certão do nosso Maranhaõ, a que os do Pirù consûmio o têpo, ou algûa desordem cõ o Gentjo,
chamaõ Paytiti, & Dourado. sem ficar outro rasto mais, que descobrirmos agora
hû Gentjo, na comarca de entre o Rio Monim, & o
Iornada de Gonçalo Piçàrro, Rio Itapicorù, que em tudo he differente do outro
& Francisco de Orelhana. Gentjo da terra, porque vivê em sobrados, comê pão
de milho zaburro, & não vzão da farinha da
Por estas, & outras informaçoês semelhantes,
Mandioca; nê de arco, è frechas, & por diuiza criaõ
se mouéo tambem Gonçallo Piçarro (que foy o que
barbas, como os Portugueses, & por isso os
despois se quis leuantar com o Pirù) a vin [sic] (algûs
annos antes deste sucesso) em descobrimento da circûvezinhjos, lhe chamão barbados como os que
Canella, que achou hauer muita em terra de atras fica ditto, & os de Mexico chamauão, aos
Çumàco, que (conforme os finaes) he a mesma que cõpanheiros de Fernão Cortés, & tem hûas espadas,
a da India, segundo confere Antonio Galuão, & como háchas, & dizem que saõ descentes [sic] de
tambem Gonçallo Piçarro, & os seus vierão achàr Brancos, a que elles chamão Peròs, parece por
Gentjo que trataua ouro em quantidade, & do muito memoria de algû Pedro notauel, de que conseruaõ
que delle houueraõ, procedeo à necessidade de fazer aquelle nome; he cõ tudo Gêtjo taõ barbaro, ou mais
o bergantim, em que meto a bagajem, & pos por que o outro; e porê não quizerão nunca paz, nê tratto
cabo o capitão Francisco de Orelhana, o qual leuado cõ os Franceses, dizendo, que elles não heraõ
mais do pezo do bergantim que das correntes do verdadeiros Peròs. E quãdo souberaõ, que os
Rio (que tomou por desculpa) se deixou leuar de Portugueses estauão no Maranhão, tratarão de os
116 A “Relação Sumária” de Symão Estácio da Sylveira (1624)

vir vèr, & fazer pazes com elles, & dizião, que estes de mil legoas de decida desde o Pirù. Ao qual Sua
eraõ os seus Peròs dezejados, de q’ elles heraõ Magestade, pode mãdar abrir hûa porta por este
descendêtes; & pello menos, serão filhos das Indias, Rio, por onde cõ grãde cõmodidade, & breuidade,
& de algûs Brãcos, que os houueraõ, antes de se venhão as riquezas delle a Espanha, sem os
consumirê nesta conquista; assi como tambem incõueniêtes de as traginar por terra ao mar do Sul,
agora achamos infinitos filhos, & filhas dos & por elle a Panamà, & dalj outra ves, a Nombre de
Franceses, do tempo que aqui habitàraõ. Dios, & dalj, na frota a Espanha, que tudo saõ
trabalhosas, & difficultosas escallas.
Franceses no Maranhão.
Estes Frãceses tãbê vierã aquj povoàr, movidos Descripção do Maranhão,
de noticias desta terra è de hauer nella grãdes suas terras, & Rios.
riquezas, porq’ hauia mais de vinte annos, q’ vinhão O sitio do Maranhão he hûa Bahya, que olha
a estas barras de suas pilhagês, è tinhaõ aquj hûa para o Norte, & terà como quarenta, & duas legoas
ladroeira, onde espalmavaõ, & breavaõ cõ a da ponta do Peryhà, até a ponta do Cumà, demtro
almeçega da terra, que tãbê como o breu serue. E em sy encerra perto de vinte Ilhas, & Ilheos. A de S.
como do alheo sempre a mão he mais larga, cõ que Luis (onde agora estão os Portugueses) tem vinte &
furtavão nesta costa, tinhaõ nesta Ilha grande duas legoas de comprimento, & sete de largo, e sahe
comercio, & correspondencia com mais de trinta desta Bahya como lingoa, com a ponta de Arassoagi,
aldèyas, q’ nella hauia de Gentjo Tupynãbà, & atroco ao Norte, ao longo desta hà outras Ilhas de cinco,
de seus resgates, havião delles muito algodão, seis, sete, & mais, & menos legoas, como saõ a das
tabaco, pimenta, salçaparrilha, paos de tintas, & Guayavas, a do Maçame, a de Sãta Anna, a de la
outras madeiras de estima, & hûa tinta vermelha Tuche (que he peninsula de Gaspar de Sousa, que
muito fina, q’ se chama urucù, & refazêdo suas foy Governador daquelle estado, que terà seis legoas)
matalotagês cõ os mãtimentos da terra, se hião hûa que se deu a hum Cirurgião, que terà quatro
alastrados disto, atè que no anno de seiscêtos, & legoas, & outra chamada das Pacas, de que Sua
dez, hû Carlos de Vóhus [Charles des Vaux] Frances, Magestade me fez merce, que serà, de atè duas
que se criára entre estes indios, & hera grande legoas. Por detras destas Ilhas desaguão, nesta
tapijar, & practico na sua lingoa (à que o Gentjo Bahya, cinco Rios caudalosos, & todos navegaueis,
pos nome Itàjubà, que quer dizer braço de ferro) que saõ o Monim, o Itapicorù, pello qual asima vinte
veyo a Frãça, & com os muitos gabos que disse da legoas temos hûa fortaleza, com quarenta soldados,
terra, & informaçoês que deu de hauer nela minas & alguns moradores, & hua aldeya, ou duas cõ a
de ouro, & de prata, & de todo os metaes, & Perolas, gênte de Bento Maciel. O Mearim, q’ vê por
& outras muitas riquizas [sic], persuadio a hum fermosissimas campinas de Maçapèz, onde andão
Fidalgo Frances, por nome de Danièl de la Tuxe [de muitos bandos de Emas. O Pynarè, que dizem nasce
la Touche] Monsiur de la Rauardiéra [Ravardière], muito perto do Pirù. E o Maracù, que se deriva por
que fosse conquistar, & povoar esta provincia, o qual muitos, & muy espaçosos lagos; em todos, & cada
para isso fez liga, cõ outros dous: Razalli [Razilly] & hû destes rios se pode fundar hum Reyno
Ferloj [sic; Harlay (de Sancy)]: & cõvocando todos, opulentissimo; porque tê nobissimas agoas, muitos
seus amigos, & parentes se vierão ao Maranhão no pescados, muito excellentes terras, muitas
anno de seiscentos & doze, trazendo (posto que madeiras, muitas fruitas, muitas caças. Afora estes,
luteranos), dous frades capuchos de S. Francisco hà outros muitos rios menores, & ribeiras, que
(Religiosos de grande virtude) que começarão a tambem desaguão nesta Bahya, & na entrada do
cathequizàr o Gêtjo; & desta companhia herão os Maracù, hà hûas salinas grandes, fabricadas pella
quinhentos homês, que alj estauão. natureza, a onde em hûs lagos, que secão quando
as aguas andão baixas, coalha muito sal, q’ ainda
Descobrimento do grã Pará, que não he tam alvo, he bom, & bastante, pera o
famoso Rio das Amazonas. vzo cõmum.
Alexandre de Moura, despois de lançar os
Franceses, para Frãça pella noticia, que entre elles Estado das cousas do Maranhão.
achou do graõ Parà, famoso Rio das Amazonas,
mandou descobrillo por Francisco Caldeyra de Há hoje, no Maranhão, quatro fortalezas, &
Castellobrãco, o qual indo pello Rio assima, como ao longo dellas mais de trezêtos vizinhos,
vinte legoas, fez hûa fortaleza, no sitio que melhor Portugueses. A Cidade de S. Luis à sõbra das
lhe parecéo, & alj se fortificou, & teue trezentos fortalezas, S. Phylippe, & S. Frãcisco. Itapari, á
homês a sua ordem algûs annos, nos quaes se sõbra da fortaleza, S. Ioseph, & os que estão no
fizeraõ algûas entradas por estes Rios, & terras, & Itapicorù, à sõbra da fortaleza chamada Nossa
se descobrirão muitas cousas, de que o ditto Senhora da Conceição. Allê dos quaes hà duas
Francisco Caldeira, mandou aquj copiosas relaçoês estancias de moradores, hûa no sitio, que chamão
encarecendo muito, marauilhas deste Rio, & na dos Franceses, onde se deixarão ficar alguns, que
verdade, he muy famoso, & hà nelle mais de cê Ilhas, despois cazarão cõ molheres das Ilhas, & são
& outras grandezas, & excellencias muy notaueis, ferreiros, & gente de prestimo à conquista, & os
& he o mayor Rio, que hà em toda a redondeza da que melhor sabem a terra. E outra na aldea de
terra, & tem cento & vinte legoas de boca, & mais Arassoai em companhia do capitão Branco que alj
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 117

està. T ambem hà nove aldeas de Gentjo Maranhaõ da parte do Ponente, chamada o Cumà,
circûmvezinhas, que fortalecem, acompanhaõ, & correndo cêto & vinte legoas, que hà até o Separatà,
seruem aos Portugueses de pescadores, caçadores, que he a ponta da barra do Pará, da parte de Leste,
& de outros mesteres, & todas tem suas Igrejas se vem à achar justamente na linha equinocial. Toda
muito fermosas, & dezejão muito ser, Christãos, & esta costa he bonissima, forrada de bellissimas
agora vão frades capuchos, para os cathequizar, Ilhas, & estremadas Bahyas muito abrigadas,
allem de que já là estão padres da Companhia. or nada de caudelosos rios, & ribeiras, &
fresquissimos arvoredos, cujos madeiros sobem ao
Administração dos Indios Ceo, & saõ infinitos. Esta Provincia habitavão os
Tupinambàs, em muitas aldeas, que os Portugueses
E para esta terra hir em grande crescimento, atravessavão, hindo, & vindo do Maranhão ao Parà.
conuinha que Sua Magestade, desse estas aldeas à Atè q’ no anno de seiscentos & dezoito (ou
administradorès cazados, & de cabedàl; assi para escandalizados de nossa vizinhãça ou mouidos de
que haja na conquista com que premiar os sua fereza) ordenaraõ em hûa mesma noite, matar
benemeritos, como para os Indios terê quê acuda todos os brancos, que entre elles andavão
por elles, & trate de os fazer Christãos, & os ampare, espalhados por differentes lugares & os q’ estavão
& cõserve, & os faça arreigar na terra, & cultivalla, em hû presidio no Cumà, & de effeito o puzerão ê
& os tenha destros, & prõptos para qualquer execução, pondo logo ao Parà hû muy apertado
occazião, & os taes administradores, devê residir
cerco, do qual sahyo o capitão Manoel Soares
nas aldeas, & obrigarse a sustêtar Igreja, & clerigo
d’Almeida a pedir socorro ao Brazil, & com sua boa
cõ algû moderado seruiço, que para isso recebão de
diligêcia lhe foy Ieronymo Fragozo de Albuquerque
cada Gentjo, cada mês, como se faz nas Indias; que
Capitão mór do Parà, cõ soldados de Pernãbuco, &
he o principal meyo de a povoação dellas hir em tão
ainda achou os nossos cercados, & cõ grande fome,
grande augmento, que por mais que digão, quê vay
& depois de os remediar, seguio o Gentjo perto de
intereçado nos Indios trata de os conservar, & ter
duzentas legoas pellas ribeiras do Pará assima,
contentes, porque se não vão pella terra dentro,
aonde elle morreo, depois de se fazerem nesta
como tem hido por esta falta muitas aldeas, que
jor nada muito honrrados feitos por todos,
hauia no Maranhão, mais de trinta, quando nelle
especialmente pellos capitães, Custodio Valente, &
entrarão os Portuguezes, & todas fugirão de nossos
tratos, elles sabem o porque, & eu digo, que he por Pero Teixeyra, & outros que assinalarão muito suas
não terem dono proprio, que doutra maneira não pessoas, q’ a brevidade desta Relação não sofre
falta quem lhes faça màs practicas contra os recitar agora, fallohemos de todos em particular na
Portugueses, por vsurpar para sy estas historia do Brazil, que entendo em escreuer.
administraçoês, que pertencem aos que as ganharão
cõ as armas nas mãos, & não he em dano do Gentjo Conquista dos Tupinambás
ser governado por hum capitão honrado, que os
E por terra foy o Capitão Bento Maciel Parente
ampare, & adestre, que tambem os povos de
desde o Maranhão cõ oitêta homês, & seiscêtos
Portugal, saõ governados por ministros de Sua
Indios frècheiros das aldeas do Maranhão è fez neste
Magestade.
Gentjo grandes estragos, & os mais delles
descõpostos de suas aldeas, & fugitivos pellos
Cõmodidades do Maranhão. mattos cahirão nas mãos dos Tapuyas (outra nação
Com tudo vay o Maranhão cada dia em sua contraria) que cõ esta occazião matarão,
crescimento, & a terra mostrando sua fertilidade, comerão, e cativarão quãtos acharão, & se entêde,
& fecûdia: & saó feitas muitas roçarias de farinhas, q’ passarião de quinhêtas mil almas os mortos, &
& outras culturas, & hà já muitas cazas de telha, cativos. Algûs que escaparão se forão valer dos
muito boas ollarias, muitas caças, pescarias, Portugueses ao Parà pedindo paz, & misericordia,
mariscos, frutas, mel, hortas, sal, & lenha, & algûas & o padre Vigario Manoel Fulgueira de Mendoça, os
criaçoês, & outras muitas cousas, como adiante fez ajûtar em hûa aldea no Separarà, prometendolhe
diremos, cõ que vivê cõtentes em grandissima amparallos alj, se elles fossê fieis: como parece serão,
abundancia, & cada dia se vay em nobrecendo a por serê poucos, & estarem assàs escarmentados,
terra com Igrejas, & outros edificios particulares, & & com isto ficou, & està esta Provincia posta em
a Camara do Maranhaõ tem perto de cem mil reis paz, que com pouco receyo se pode hoje povoàr em
de renda de foros da sua legoa de terra que se lhe qualquer parte della. Principalmente he excellente,
tomou ao longo da Cidade, sò falta comercio de posto a Bahya de S. Ioão, & melhor que este he o
navios, em que os homês se valhão do que teverem, Cayté (que na lingoa da terra, quer dizer mata real)
& hajão a troco o que lhes falta, que como houver porque na verdade o he de grandes frutaes, é
hû navio na terra, logo começará a florescer & arvoredos. E neste sitio diz que há minas de prata
mostrar as grandezas de sua fertilidade. de importancia, que fundem quasi a metade em
prata; Pello menos assi fundio hûa pedra que eu vi,
que disserão ser destas minas, & agora hera
Arrumação da costa do Maranhão, ao Pará.
oportuna occasião de mandar aquj povoàr; porque
Do Maranhaõ atè o Parà corre a costa a Loeste, ainda anda o Gentjo da terra espalhado, & quando
Quarta a Noroeste, de maneira, que de dous graos eu passey para o Parà fazião, fogos à carauella, que
da parte do Sul, em que està a ponta da barra do hera sinal de quererem paz.
118 A “Relação Sumária” de Symão Estácio da Sylveira (1624)

Estado do gram Parà. & sempre està o campo, & arvoredo verde, cargado
O Parà ainda está como fronteira porque há de infinita diversidade de frutas, cujos nomes,
muitos Rios, & muita gentilidade por elles, & pellas sabores, & feiçoês, excedem a toda a declaração
Ilhas que saõ infinitas, de que se não ouzão fiar; & humana. Sempre os dias saõ iguaes com as noites:
assy não povoão, senaõ à sombra da fortaleza, & de que procede hum suauissimo temperamento,
por isso não há ainda tantas roçarias; mas a tudo nem quente, nem frio. Os ventos cursão de ordinario
suprirà a vizinhança do Maranhão, donde em grande do Nascente, & vem com o Sol, & com elle crescem,
abundancia lhe pode vir toda a farinha, & outras & se poê, de maneira, que se o meyo dia tras algûa
cousas, com que se podem resgatar muitas peças calma (que não chega a ser nunca tão rigurosa como
das que legitimamête saõ cativas, conforme as leys a do nosso Estio) aquella natural viraçaõ, que então
de S. Magestade (que saõ as que nos resgatamos do sopra mais, o tempera, & mitiga de modo, que a
poder de seus inimigos, quando os tem cativos para calma, se não sente, nem há frio, se não de noite; &
os comerem) & cõ pouco cabedal se podem haver só não por naõ ver a cara dùm Inverno no deste
aquj muitas destas, cõ que ajudar muito o augmento nosso clima, se podia estar nù no Maranhaõ, cuja
do Maranhão, onde saõ de muito serviço, & salubridade sarà evidente a quem considerar quanto
prestimo. Da outra parte do Para se chama o cabo a nòs, nos saõ gratos, & sàdios os seus ares: quando
do Norte, donde residem Olandezes em suas là himos, & que os naturaes dalj vindo aos nossos,
colonias. E o anno passado mandou aquj hum delles logo morrem.
o capitão Bento Maciel, de dous, que là tomou: dos
quaes soubemos como he excellente aquella terra,
& elles se aproveitaõ muito della, não só em Pureza das aguas.
escalarem alj os navios que vaõ infestar aquelles O infinito numero de fontes, que esta terra
mares, mas entrando por aquelles ryos aque chamaõ produze, saõ tãbê muita parte de sua frescura.
Curupàp. Donde se diz que tiraõ ouro da maõ do Porque como o Sol, aquj de mais perto vezinha cõ a
Gentjo, & outras cousas, & que tem muitos escravos terra, tê ella os poros mais abertos, para brotar
de navios de Angolla, que tomaraõ indo para Indias. fontes, & a cada passo se achão correndo mil ribeiras
da mais clara, & pura agua, que o humano apetito
Cõveniencia dos navios sabe dezejar, & tão sàdia, que onde cà se veda a
que vão de Angolla a Indias. muitos doêtes, là lhe serue de mezinha, porque no
Aos quaes navios de escravos, serà de meyo das sezoês, & dos destemperamentos, & outras
grandissima vtilidade escallar no Maranhão, pellas doenças, vimos muitas vezes, saràr com agua, &
muitas mais cõmodidades que alj tem, que em nas febres, sarão pella mòr parte lauandose cõ ella.
nenhûa outra parte. A primeira, he ficarem dalj mais Affirmome como de vista, que nenhûas aguas destas
nauegados em Indias, & haverem de chegar là cõ as nossas partes, podem cõpetir em nada com as desta
peças, que aqui resfrescarem muito inteiras, & terra: de que faz grande encarecimêto o Padre Ioseph
vendaveis, o que não tem nos outros portos do da Costa, na sua historia natural, & moral das
Brazil; porque para socorro estão muito cedo, & para Indias, & me serão testimunhas, as reliquias das
lustre das peças ficão longe. Allem desta barra ser aguadas que aquj chegarão, das quaes, por grande
muito excellente cõ os ventos de longo da costa, excellencia, se fizerão presentes, sendo muitos mais
que saõ tão largos para entrar, como para sahir a os petitorios.
toda a hora, sempre Lestes em popa para o
Maranhão, & dalj para Indias, vão em oito, dez dias, Fertilidade da terra.
& dentro tem bonissimos portos, cõ vento por sima
da terra, para espalmar, & varar. Muito aparelho O terreno desta Prouincia, hè geralmente de
para calafetar, & almècega da terra, com que brear hûa terra golfeira, & muito criançosa, toda cheya
em muita quantidade, que por ser amargosa, de grandissimos arvoredos, que testificão sua
preserva do guzano, mais que o breo, & assi o vzauão fecûdia; tãbê hà nella muitas varzias de terras
os Franceses, & hoje o fazem os nossos navios que groças, & de maçapez, aonde não leua arvoredo, se
aquj vão. Tambem como he terra nova não valê os não hervaçaes muito fortes, em alguns dos quaes
mantimentos nada, & por não haver saca delles saõ postas canas d’açucar, que excedê a todas as
(como nos outros portos) há grandissima mais do Estado do Brazil, em groçùra, & grandeza,
abundancia de tudo, de modo que podê aquj refazer, que pella mayor parte, saõ de dez, è doze Palmos de
& reformar suas armaçoês, cõ mais regallo para os comprido, & algûas de mais. E allem de ser toda
negros do que nos outros portos acharão para suas esta terra muito viçosa, ajudão muito a sua
proprias pessoas. E para q’ a todos seja notoria à fertilidade, os quotidianos regadios, com que o Ceo
abundancia desta terra, o mostrarei nos capitulos a refresca, porque ordinariamente chove cada dia,
seguintes. ou cada dous, sem se vestir o Ceo de luto como cà:
mas em mangas d’agua, como as chuvas da
Primavera, que nella parece continua. A terra he
Salubridade do Ceo chã, pouco montuosa, & tão brãda, que por viço se
A excellencia desta terra, consiste em muitas pode andar descalço. Deste clima, & deste terreno
cousas notorias. A primeira, no amenissimo Ceo, & debaixo da Zona torrida (de que os antiguos não
saluberrimo àr, de que goza, ahonde sêpre he verão, teverão noticia, & forão de parecer, q’ seria
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 119

inhabitavel) depios [sic] que a experiencia mostrou trigo, em estar sempre na terra crecendo todo o
o desengano, houve authores, q’ imaginarão, que anno, em que o trigo està mingoãdo nos graneis, &
aquj devia ser o Parayzo de deleites, onde nossos em estar sempre feita em boa sezão, que não està o
primeiros Paes forão gerados. E o ditto padre Ioseph paõ passados oito dias, & em respeito dos
da Costa o contradiz cõ a Escritura Sagrada Portugueses, se avãtaja, principalmête em sobejar
sòmente: & no demais bem reconhece, que he naquellas partes (donde elles a carregão para fora)
merecedor este clima daquele predicamêto, como quãdo na nossa patriá nos falta o trigo
se pode ver no cap. Quatorze, do segundo livro da ordinariamête, & o comemos todo o anno, pella mão
sua historia assima referida. de estrãgeiros, que cõ elle se fazem poderozos, &
por elle nos levão tudo quanto trazemos da India, &
da China, & nê isso basta, para termos paõ, & assi
Pão.
temos os Portugueses, menos aução de desprezar a
Diz o Sagrado Euangelho, que naõ sò com o Mandioca, que as outras nasçoês do mundo,
paõ vive o homê, em mais espiritual sentido. Porem considerando, que he ella tal mantimento, que
naõ serà muito alheo de nosso intento, se hauendo no Maranhão muito milho zaburro, &
moralizarmos este passo: entêdêdo pello paõ o muito excellente arròs em quantidade, não se faz lá
mãtimêto quotidiano, è pello homê, o genero cazo de nenhum delles para paõ: sêdo boa verdade,
humano, pois que das quatto [sic] partes do mûdo, que se o cà tiueramos em abundancia, não fora tão
as tres, naõ vzão de trigo; toda esta grande Azia, duro o cativeiro de comermos o paõ pella mão do
vive pella mayor parte cõ arrós, essa Africa, cõ arrós, estrangeiro.
& cõ milhos, & outras semilhas, & essa America, cõ
mahis (q’ he milho zaburro) & cõ Mandioca, que o
bêauêturado Apostolo S. Thomè, lhes industriou Vinho.
(sêgundo tradiçoês) vivê taõ contêtes, como nòs cõ Odiosa empreza serà persuadir à muitas
o nosso paõ de trigo; do qual diz Galeno, que he a gentes deste mundo, que he boa terra o Maranhão,
peyor couza de que nos podemos fartar. E já pode se lhes houver de de [sic] cõfessar, q’ não há là vinho;
ser, que por isto as nasçoês que comê muito paõ, & assi sò aos desapaixonados, ouzarei a dizer, q’
saõ muito malenconizàdas, & a Portuguesa, mais lhes não faltarà de carreto, è q’ o que là chega, he
que todas: naõ porque tenha mais paõ, que as muito melhor q’ o mais estimado do Reyno, porq’ o
outras; mas parece, que pella mesma rezaõ, que refina o clima, è o sobe muito de põto; & não se
nos custa mais caro, & nos vem de carreto fazemos desconsolê os amigos desta fruta, porque o
mais estima delle, & como cousa que nos falta, a Maranhão, os brinda cõ vinho de Palma q’ na terra
temos por mais precioza, & por isto nos empregàmos as há, de todos os generos, de que se faz vinho por
mais em comer paõ, & verdadeiramête, elle he o todo o mûdo a q’ na India chamaõ vrràca, è sura, q’
que nosso Senhor nos ensinou a pedir, & a materia he muito doce, è alegra, é aquêta, è delle se faz
em que sua Diuina Magestade cõsagrou seu arrobe, mel, açucar, è vinagre. Hà vinho de mel,
Sacratissimo Corpo, è o de que faz mêçaõ o muito excellête cousa, para os resfriados, opillados,
Euãgelho, para cõprêhêder o sustêto do hòmê. Porê hasmaticos, è boubaticos. Hà tãbê hûa fruta, q’ chaõ
o segûdo lugar depois do trigo pertence à Mandioca, cajùs, q’ lãça muito sûmo, è em mosto, he mais
que he farinha de hûas rayzes muito ferteys, muito doce que o das uvas, è depois de cozido (porq’ serue
sàdias, & muito substanciaes, das quaes se fazê tãto como o das uvas) fica palhete muito claro, è
muitras sortes de farinha, hûa muito fina, & taõ bello, porê azedo, è quãto a mym à mingoa de
branca, & mais, que a do trigo de Alêtejo, a que heruolarios; que se lhe buscarê algûa casca, ou
chamaõ carimà, de que fazê bollos, que chamaõ cousa cõ que o cozer (que a meu parecer deue ser
beijùs, & biscouto, que chamaõ caçave, & filhòs, & amargoza) ou se em mosto o arrobarê, é cõ o arrobe
bolinhollos, & sobretudo, hû caldo, como de o cozerê do modo que fique doce, na fermosura, &
almidaõ, mas muito melhor, q’ chamão mingào, & effeitos hé tã bõ como o das uvas. E cõ tudo ninguê
engomaõ cõ elle, como cõ a goma muito fina de trigo. perca as esperãças de ter là vinho de uvas, porq’ na
Fasse mais destas raizes, a farinha fresca q’ tira as terra, se dá parreras, è uvas todo o anno, porque
saudades do paõ molle, & a farinha ordinaria, que todo o anno hè veraõ; & essa he a cauza, de se naõ
chamão de guerrà, q’ serue de matalotagês, & como vindimàr, porque como vaõ sêpre dãdo, è sêpre
cà chega já velha, & mascavada do mar lhe chama frorescêdo, è estando outras em agraço, è hà poucas
o pouo farinha de pao, merecêdo este mantimento parreiras, estimaõnas pera comer, & naõ se
outro nome de muita estima, porq’ della se fazem persuadem a que possa hauer vindimas. Mas eu
bollos, paõ, biscouto, & cuscùs muito excellente, & cuido, que se se pozerem muitas parreiras, em
cõ ella se sustêta mais gête, que cõ o pão de trigo, quantidade (pois naõ faltaõ terras, & aruores a que
que vivê mais annos, que nós, & vay a Angolla, em as arrimár) que poderão vindimàr cada mês, & q’
quãtidade de navios carregados, & vem cõ ella assi pello diuerso do anno recolheraõ muito vinho.
matallotados, milhàres de almas outra vez ao Brazil, As mais industrias desta materia se encomêdão aos
& a Indias, & a este Reyno, & tudo pode soportar deuotos do licor, q’ se os q’ o saõ neste Reyno là
tam bõ mãtimêto. Pella qual causa, Luis Mendes de passarem, eu lhes asseguro, q’ se não deitê às
Vasconcellos do Cõselho de sua Magestade, è escuras, porque alem dos sobreditos, hà outros
governador de Angolla, na sua arte militar, lhe dà o muitos vinhos, que os Indios faze [sic] do milho
segûdo lugar, depois do trigo, como quê bê penetrou zaburro, & de outras frutas, com que elles se alegraõ,
as excellêcias desta semilha, que se aventaja do & fazem suas ordinarias borracheiras.
120 A “Relação Sumária” de Symão Estácio da Sylveira (1624)

Carne. os de Portugal, è outras diuersidades de caças muito


Posto que até agora, não hà no Maranhão estremadas, q’ a breuidade desta relação, não sofre
muitas criações de gado, toda via, essas vacas, que descreuer, basta que cõ hû Indio caçador que haja
alj foraõ ter (as primeiras por ordê do Governador nûa caza de grãde familia; tê hû assougue cõtinuo
geral do Brazil Gaspar de Sousa) tê multiplicado para sy, è para os vizinhos, & não trato agora mais,
grandemente & dado mostras de valente producção, que do q’ se come, porque alem destes, há outros
porque as crias vão sempre sêdo mayores que as muitos animaes, è bichos de q’ espero fazer larga
mãyes. E logo ao segundo anno emprenhão as relação na historia do Brazil, mas naõ se intimide
femeas, & os nouilhos saõ de robusta estatura, tãbê cõ os resear, porq’ lhes affirmo que cà entre nós há
as cabras saõ de grãde multiplico, que muitos bichos mais peçonhêtos, & nocivos, deq’
ordinariamente parem de dous em dous, & as crias nesta terra haõ de ficar liures aquelles, que sua boa
medraõ muito, & já há algûs criadores particulares sorte là guyar.
que tem bastante copia, pera se inçar a terra (ainda
que seria grande beneficio, entra agora nos Aves.
principios mais gado) para em menos annos, vermos
nesta conquista à abundancia, que hà de criaçoês Há muitas, & muy excellentes gallinhas,
por todo o Estado, onde tãbem foraõ de principio cazeiras, tamanhas como pirùs, que multiplicaõ
leuadas de carreto, & a terra as abraçou de maneira, grandemête, há põbas manças, muito fermosas que
que quasi não vale a carne dinheiro, & hûa vaca em alj ficaraõ dos Franceses, que tãbê tinhão muita
pè muito fermosa, val hoje no Rio grande, dous mil criação de pirùs, que nesta terra se daraõ melhor
reis, donde em seis dias se vay ao Maranhão, que que em nenhûa outra, & Patos; porque hà muitos
tem tanto, & melhor aparelho que as outras partes brauos, muitas gallinholas, & marrecas, & outros
do Brazil, por causa das fermosas campinas, muitas infinitos paçaros d’agoa que cõ hû pao se deixão
eruagens, & salgados, & excellentes ribeiras, de que matar, & tambê se cação lindamête lançãdo cabaços
a terra he enriquecida. Não chegarão là ainda nas alagoas (até q’ avezê a elles) è depois se mete
cauallos, nê ovelhas: os porcos multiplicarão tanto, hû Indio pella agoa cõ hum cabaço na cabeça, &
que já hà muitos lavradores, que tê cem cabeças, & buraços [sic] nos olhos, & chegãdo a elles
saõ muito grandes & de bonissima carne, qual he mansamête, os vay mergulhãdo pellas pernas, &
toda a deste genero no Brazil, onde he notorio, que debaixo da agoa lhes troce o pescoço. Há nãbus,
se dà aos doentes, & para este gado tê a terra grande como as perdizes de cà. Os Indios tinhaõ entre sy,
disposiçaõ, pellos muitos, & continuos frutàes que gallinhas de criação, mas ratinhas, há muitas Emas
nella hà todo o anno, & principalmête, porque nella em bãdos pellas cãpinas, há muitas rolas, muitos
se dà a junça cõ que nas Ilhas Terceiras os cevão, motus, como pirùs, cõ o bico groço, ê vermelho,
tambê, & melhor, que nas mesmas Ilhas. Por sima jacus, è aracoas, como gallinhas, muitos tocànos,
disto hà infinidade de porcos bravos assi dos nossos é mõçoês, como cà os tordos, & alê destes, há outros
jaualis de Espanha, como de outra casta de cochjnos muitos passaros, huns vermelhos, outros amarellos,
mais pequenos, & cabeçudos, q’’ tê o embigo nas papagayos, araras, corycas, garçotas, & outros de
costas, é andão em grãdes magotes, & se matão varias, & fermosissimas penas, aletos, & garças, &
muito facilmête, de que pella mór parte se sustêta a outras muy reaes aues de rapina; de q’ largamête
cõquista; & por hûa faca de cabo de pao amarello diremos na historia.
ou por outro semelhante resgate) dà o Gentjo da
aldea do Monjm, hum destes porcos, & por toda a Pescados
terra firme, há grande copia delles. Hà veàdos pella
terra dentro, & por aquellas Ilhas, hà muitas Entre todos os pecados, he notauel o peixe
gazellas, que cada dia vem mortas à cidade. Há boy, porq’ em taçalhos sem osso, nem espinha, se
muitas antas verdadeiras, que saõ como vacas tirão de um destes peixes, cinco & seis arrobas de
piquenas cõ o rosto como ellas: mas sê cornos, & o carne, q’ mais o parece q’ peixe, & o peixe he do
beiço de baixo muy cõprido, & naõ sahê se não feitio de hû boy sem pernas, com o rabo redondo
denoite. Há muitas Pacas, que respondê cà as como hûa botija, de que se tira muito azeite, & este
nossas lebres. Mas são muito melhores; porque a dizem ser o peixe molher, cujos ossos na India retê
sua carne he mais brãda, alva, & gorda, & tê hûs o sangue no corpo ferido, quando saõ da femea
couros como leytão, & saõ muito carnudas, è donzella, cozido cõ couves parece boa vitella, & como
gostosas, assadas, & cozidas, è de todo o modo, tal faz as sopas, & assado, & em pão, he excellente,
tambê fogê para a coua, e se achã hûa lagoa, quando & muito mais para estimar salgado pera matalotajês,
as perseguê se salvã nella. Há cotyas que saõ como porque toma pouca sal, & he muito gordo, &
os nossos coelhos, è melhores, & cõ a orelha de saboroso, & atè dos couros se podê fazer muitas
gato como a paca. Hà tatùs de diuersos generos, q’ cousas de grande prestimo. Em segûdo lugar he
saõ armados de cõchas, como laminas dû cauallo excellente cousa o jurarà, q’ assi chamão a hûs
darmas, tamanhas como hû bõ gozo, & tãbê se grandes càgados da agoa doce, q’ se comê tambê
encouão, & he gostosa carne. Há jubatis [sic], q’ por peixe, sendo elles mais carnosos, que hû porco,
saõ como càgados, mas grãdes, & muito ovados por à os lõbos assados, & de vinhadalhos, saõ de
cima, a carne he muito sàdia, o figado grãde em ventagê, & se faz delles sarapetèl tê cõ torresmos,
sua quãtidade, è o mais regalado comer q’ a natureza & muita manteiga, que excede a de vacas: saõ
criou. Hà apercas [sic], è coelhos mais piquenos q’ grandes, há muitos, & tomãose facilmête,
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 121

& duraõ em casa sem comer mais de hû mês, & Aruores, & frutas.
pellas prayas se achão suas ninhadas de ouos, & Toda a sorte de aruores despinho, larangeiras,
outras vezes de tartarugas do mar (q’ tãbê há cidreiras, limoeiros, zamboas, toranjas, & limas se
muitas) que tê quatrocêtos ouos, & mais q’ hûa dão nesta terra estremadamente, & tãbê romeiras,
mina, porque saõ muito bõs, é sadios. Tãbê as parreiras, & figueiras, & marmeleiros se dão em todo
cõchas dos juraràs saõ de proueito. Há muitos o Brazil, & já eu deixei algûas nascidas no Maranhão
erubins [sic], çolhos, camaroupins. Pyràguivas, q’ deuê já dar fruto: por que a terra cria muito
chernes, meros, q’ todos saõ peixes de hûa, atè depreça as aruores. Tãbê ficauão nascidos muitos
tres é quatro arrobas. Hà pescadas de tres castas, coqueiros de cocos q’ vierão de Parnambuco, & a
bicudas, da linha, è outras que tê o couro como terra tê infinidade de palmeiras muito grandes, &
chamalote de ceda, há coruinas, abroteas, de todas as castas, de que se vsão dos Palmitos,
enxareos, douradas, pargos, bonitos, cações, que por regallo, ou para hûa necessidade seruem.
arrayas, bagres, moreyas, enxarrocos, pãpanos, E leyo nas historias das Indias que em terras desta
enxadas, sargos, peixes pedras, requeimes, altura há oliueiras, & durasnos, & amoreiras de que
laurão muita seda. Haja curiosos que o procurem,
choupas, peixes reys, lingoados, peixe gallo,
& não sejamos nós pera menos, pois Deos nos deu
agulhas, roballo, bodião, inguias, eiròs, polvos, &
tão boa terra q’ tambem nas Indias não hauia isto,
outra diuersidade de pescados, que cà não
& de Espanha se leuou, & hoje tem la tudo o q’ há
conhecemos; & por isso os não nomeyo, & sobre
em Espanha, como o refere o ditto padre Ioseph da
todos há infinidade de fataças, & mugens em tãta Costa no liuro quarto de sua historia das Indias
copia, que faltão denoite nas canoas, de maneira capit. 31, 32. que terra q’ deu a junça, & os melloês,
que lhes vem fogindo, & lançando o peixe ao mar, & tudo o mais que fica ditto, com ventagem dos de
por se não irem ao fundo. ca, tambem dará o demais se lho leuarem a têpo, &
cõ modo: sê isto há infinitos frutos naturaes da terra
Mariscos como saõ os cajus: mangauas cõ sabor de souas,
mas mayores & milhores. Guayauas, Araçases,
Há muitos carãguejos, de diuersas sortes, è cajàses, guajarases, pacóuas, & Bananas, Bacoris,
os da terra são os melhores: ostras do lodo, & de coquinhos de Palma; & outros de fazer azeite, como
pedras, grandes camaroês: buzios de muitas sortes, os de Guiné; & hûas frutas em cachos, como uvas
mexilhoês, berbigoês, longueiroês, ameijoas, roxas, outras como peras, outras como frutas nouas,
perseues em pedras, & caramujos, pernambins, & q’ chamão tuturubás; as Anhàs do Parà (que nascem
no Parà muita quantidade das cõchas de madre nûas aruores como castanheiros & assi encandeão,
perola: em que se achão muitas perolas, & aljofres, mas saõ tres, & quatro tanto mayores) he a fruta
ouriços, & outros muitos mariscos em grande mais excellente q’ há no mûdo de seco, porque saõ
copia. muito grandes, muito gostosas, & durão dous, &
tres annos, & há infinitas. Afirmarãome q’ hauia as
mãgas da India, & os Durioês de Malaca, & eu o crj;
Legumes, & ortaliças. porque a terra està na mesma altura que Malaca.
Há muito, & bõ arròs, muito milho zaburro, & Fallar nas madeiras, & na grãdeza, & deuersidade
outro branco, muitos feijoês, & fauas de diuersas das aruores he hû infinito. Basta saber que a terra
castas, amendoins muito gostosos para regallo, he toda pella mor parte cuberta de tão altos
muitas batatas de cores por dêtro, & por fora, aruoredos que se vão as nuuês, & tã bastas, q’ não
amarellas, roxas larãjadas, brãcas, & vermelhas, & aparece o Ceo em muitas legoas de terra, & que há
todas melhores q’ as das Ilhas Terceiras, & a jûca madeiros de dez, & doze braças de pè em redondo,
dellas se da com vêtagê. Milhor q’ as batatas saõ as & destes muitos, & que gèralmente saõ todos tão
macacheiras tãbê raizes mais cõpridas a modo direitos como sirios, & tã grosos no Pé como na põta,
Mandioca q’ assadas, & cozidas saõ muito boas, & & quasi todos dão frutos, hûs grãdes, outros em
cachos, outros redõdos, outros quarteados; quaes
sàdias. Há melloês excellêtes, pipinos, balãcias, &
agros, outros doces, hûs cõ casca dura, outros
abobaras de diuersas castas, & bugangos, a q’ la
molles cõ caruoços & cõ peuides, hûs q’ se querê
chamão geremùs, nabos, & rabãos, couues,
de cama: outros alporcados, outros assados. Em
coentros, endros, segurelha, & çebollas se dão tãbê
que tudo se està mostrãdo a magnificêcia, &
naquella terra. O afamado Ananás tê aqui seu lugar,
marauilhas do criador. Entre estas aruores há
porq’ nasce nûas eruas como a nossa babosa, do madeiras de varias cor es brancas, pretas,
tamanho de hû pipino, & do lauor de hû pinho verde, adamascadas, ver melhas, roxas, rosadas, &
& chegãdo a ser amarello rescêde, è he o rey das amarellas: todas estas cõ cores, & lustre de muita
frutas. Tudo isto se dà todo o anno de maneira, q’ perfeição hûas muito duras, outras molles: outras
se cada mez vão pondo meloeiros cada lûa colhe q’ cheirão a alhos & o fruto tê o mesmo sabor, &
mellões, è já fica dito a fecûdia das canas de açucar, picãte, outras q’ parecê caãbuco cõ sua odorifera
por isso não trato mais dellas, q’ dizer que há já rasina, aqui o pao da rosa, os cedros, os louros, as
muitas, & que muito cedo hà o Maranhão de mandar murtas, os anjelins, & outros infinitos de contar:
aqui muitos nauios de açucar. algûs dão tintas, outros daõ balsamos, & oleos
122 A “Relação Sumária” de Symão Estácio da Sylveira (1624)

cheirosos, & almecegas, & tacama, & tacaranha, que entrarão na terra dizem que hà cravo como o
& outras mil diuersidades de cousas em que não de Ternate, em grandes matas, & o clima he
há tomar pè, mais que louuar a gloria de quem as aparelhado para se crer tudo delle, que em fim he
criou, tão bellas, & fermozas todo o anno verdes, Pirù Oriêtal & está na mesma altura que as Ilhas
& com folhas, & frutos. do Crauo, & se pode cuidar da bõdade de tal terra
que darà quanto lhe lançarem atè açafraõ. Podese
fazer azeite das palmas de Guinè, que as há em
Drogas
quantidade, & o dos rabos do peixe boy he muito
Temse por cousa certa que há minas de ouro sofrivel, & a manteiga dos Iurarás excede a todas,
& prata, & outros metaes nesta terra, & pedras de & pera as cãdeas hà muita sera, & muito oleo de
muito preço, & serras de christal, è outras de salitre, Copahiva que alumia melhor que o de oliva, & he
& de sal da terra, tambem há muitas salinas do cheiroso, & dão hûa botija por hûa faca.
mar, há barreiras de excellente barro, de que val
Eu me resolvo, que esta he a melhor terra do
hûa telha hû real, & pedreyras de jaspe branco,
mundo, donde os naturaes saõ muito fortes, & vivem
verde, & negro de que eu trouxe as mostras a Sua
muitos annos, & constanos, que do q’ correrão os
Megestade, hà muito mel, & cerà por aquellas
Portugueses, o melhor he o Brazil, & o Maranhão
arvores: muita almecegà, & anime, & oleos
he Brazil melhor, & mais perto de Portugal, que todos
cheirosos, & se os sobesemos compor, cuidarei que
os outros portos daquelle estado, em derrota muito
se poderia fazer beijoim de boninas, que de
facil à navegação donde se há de hir é vinte dias
semelhantes rasinas deve ser feito. Tãbê sospeito
ordinariamête. E por ser esta terra tal, a fez Sua
que o almiscar que vê da China deve ser composto
Magestade, governo separado do Brazil. E tem
dalgûa parte, ou partes de certos lagartos grandes,
mandado que se cõtrattê os provimentos desta
que hà por estes ryos cujas orelhas, & mais partes
conquista, a qual envia hora dignamête, por primeiro
glãdolosas mirradas, tem o mesmo cheiro, & mais
vehemente, & duralhe sempre. Não sabemos nos Governador, a Francisco Coelho de Carualho,
fazello, ou pello menos contra fazello. Os mais dos Fidalgo tão qualificado & de tantas partes, & o fez
animaes do campo nesta terra tem pedras bahazares do seu conselho, & com elle enuia outras pessoas
no bucho, como em Indias. Hà muito algodão, muito de muita importancia, com hû grande socorro de
tabaco excellente, canafistolas bravas, salçaparrilha, soldados, armas, & pagamentos. Permitta Deus que
a herva de se faz o anil em Indias, pita muito rica, tudo seja para seu santo seruiço, & de Sua
gengivre, Pimenta em grande quantidade. Pao de Magestade, & para augmento da Christãdade neste
salcifras. Pello de Gõçallo Piçarro me consta, q’ hà Gentjo, & aproveitamêto dos vassallos deste Reyno.
canella da mesma que em Ceilão, alguns Brancos LAVS DEO.”

Referências
Almeida, C. M. de, 1960. Memórias para a história do extinto Estado do Maranhão. Vol. 2 [pp. 1-31]. Rio de
Janeiro.
Damasceno, D., 1974. Simão Estácio, capitão de navio, procurador das coisas do Maranhão. Anais Bibl.
nac. Rio de Janeiro 94: 97-103.
Sylveira, S. E. da, 1624. Relação sumaria das cousas do Maranhão. Escripta pello Capitão Symão Estacio da
Sylveira. Dirigida aos pobres deste Reyno de Portugal. Gonçalo da Vinha, Lisboa.
Capítulo 10

JOHN DAY E “A PUBLICATION


OF GUIANA’S PLANTATION” (1632)

Desde a metade do Século XVI estiveram os ingleses interessados na possibilidade de explorar


os fabulosos recursos do grande rio das Amazonas. Durante a primeira metade do Século XVII,
ingleses e irlandeses envidaram persistentes esforços para manter entrepostos comerciais e
plantações na região. Desde pelo menos 1612 a 1632, habitaram povoações ao longo do canal
norte do estuário, desde o Cabo do Norte até o equador, obtendo lucros consideráveis com tabaco,
tintas e madeira. Os lucros eram de tal monta que, quando os portugueses tornaram essas incursões
demasiado arriscadas, antigos plantadores ingleses e irlandeses tentaram voltar para essa região
obtendo uma licença especial primeiramente da Espanha e depois da coroa portuguesa. Os
irlandeses obtiveram essa permissão em meados de 1640. A fascinante história dessas tentativas
de colonização do estuário do Amazonas por esses povos foi contada no brilhante livro de Joyce
Lorimer, English and Irish settlement on the River Amazon, 1550-1646 (1989). Ficamos sabendo
nessa obra (pp. 103-108) que:

“In the summer of 1631, Thomas Howard, earl of Berkshire, [...] prepared to swell [the
number of colonists] by sending out a body of settlers to the Amazon. Berkshire appears to have
headed up a syndicate formed for the enterprise. John Day, a gentleman of Windsor, was one of
his partners. [...]. He attempted to launch his own joint-stock company in 1632 [...]. ...the earl
of Berkshire published his prospectus for a joint-stock company to raise funds for his plantation.
The pamphlet was drafted by John Day, who himself intended to settle on the Amazon with his
family and friends. The prospects of the Amazon were described in glowing terms. Drawing
heavily on Robert Harcourt’s Relation [1613] and the Guiana material in Purchas, Day stressed
the abundance of foodstuffs and merchandasible commodities. The Amazon, unlike ‘most former
plantations except new England... adventured only upon hope of one commoditie (as namely
Tobacco), would yield more than one cash crop. He noted, and this had certainly been true
before 1629, that most of these things could be acquired by Indian labour with very little effort
on the part of the white settlers. Berkshire now intended to send out ‘this summer’ a new
supply of men and women. He hoped particularly to attract skilled craftsmen, who could not
only supply the everyday needs of the colonists’ households but also run the sugar mills and
mines, undertake shipbuilding, and produce the timber, dyes and drugs which would bring
lucrative returns. As he set out the terms by which venturers might enter the company, Day
could not ignore the question of the proximity of the Portuguese which would certainly discourage
some potential participants. Influenced by the arguments of Robert Harcourt’s Relation, Day
offered two responses to those who might raise this problem. Firstly, the Amazon was big
enough for the English to settle out of the way of the Portuguese. Secondly, the Portuguese
presented no serious threat as long as the English colonists were well supplied with provisions,
arms and ammunition..”

Parece que essa tentativa falhou, ou pela falta de fundos, ou pelas notícias vindas da Amazônia,
contando as campanhas feitas pelos Portugueses contra estabelecimentos ingleses já existentes.
De qualquer maneira, sobreveio até nós o documento de John Day, “A publication of Guiana’s
plantation”, com dados interessantíssimos e a menção de alguns animais. Esse raro escrito foi
republicado por Lorimer (pp. 366-379), e é aqui transcrito, acompanhado de uma tradução para o
português.
124 John Day e “A Publication of Guiana’s Plantation” (1632)

Texto de “A publication of Guiana’s plantation” de John Day

P. 1 P. 1
To all faithfull, and well affected Christians A todos os Cristãos fiéis e bem-intencionados
FOR as much as diverse of this Nation are POIS como muitos desta Nação já partiram
departed hence into forraine Countries, as well for para terras estrangeiras, tanto para a propagação
the propagation of Gods truth (most likely) as their da verdade divina (mais especialmente) quanto para
owne private benefit, whereby the word of the Lord seu próprio benefício privado, de modo que a palavra
might bee fulfilled in those Heathen (through Gods do Senhor seja ouvida por esses Pagãos (através da
infinite goodness & mercy)... Neither is it to be infinita bondade & misericórdia de Deus)... Também
doubted, but that there are divers yet remaining, não é de duvidar que há diversos que
which retaine the like Christian resolution, but permaneceram, e que mantêm a mesma resolução
cristã, mas

P. 2 P. 2
want of true knowledge of a plantation (that may cuja falta de um verdadeiro conhecimento de uma
proove profitable to the Church of God & them- plantação (que possa ser útil para o Igreja de Deus
themselves) causeth such to live heere like plants, & para eles mesmos) fá-los viver aqui como certos
which many times prove lesse fruitfull in their vegetais que muitas vezes mostram ser menos
naturall soile, then when they are removed to places frutíferos em seu solo natural, do que quando
better liking them, for which cause I have thought transplantados para lugares que os preferem, e para
good at this present, to discover briefly (to all such seu bem pensei neste momento mostrar brevemente
as are wel affected) the knowledge of a most hopefull (a todos aqueles que quiserem) a notícia de uma
plantation newly undertaken by the right honorable plantação mui esperançosa recentemente tentada
the Earle of Barkeshire (Knight of the most noble pelo Mui Honorável Conde de Barkeshire (Cavaleiro
order of the Garter) and company, for that famous da honorabilíssima Ordem da Jarreteira) e
river of the Amazones in America, as by that which companhia, no famoso rio das Amazonas na
followeth may appeare. América, tal como aparecerá no que segue.
But before I proceede further herein, I thinke Mas antes de que nisto prossiga, penso não
it not amisse to speake somewhat of the lawfullnesse ser inútil dizer algo sobre a legalidade de plantações
of plantations in forraine countries, wherby such em países estrangeiros, para que os que têm dúvidas
as make doubt thereof, may be beetter [sic] satisfied quanto a isto possam ser melhor esclarecidos.
herewith.
Ora, no tocante às plantações há dois
Now in plantations there are these two princípios a serem considerados: primeiro, se é legal
principalls to be considered: first, whether it be mudar-se de um lugar ou país para outro; segundo,
lawfull to remove from one place or countrey to se é legal possuir uma região já habitada por outrem:
another, secondly, whether it be lawfull to possesse com relação ao primeiro...
a countrey already inhabited by others: touching
the former...
P. 3 P. 3
wee may gather, that men may lawfully remoove with podemos dizer, que as pessoas podem mudar-se
their familyes from one place to another, and that legalmente com suas famílias de um lugar a outro,
for divers causes; as here the Children of the Prophet e isto por diversas causas, como fez o povo do
did, by reason of the straitnesse1 of the land wherein Profeta, em razão da pequenez1 da terra onde viviam:
they dwelt: and it is to be feared that e é de temer que

P. 4 P. 4
many also among us have as great cause to doe the muitos dentre nós tenham muita razão de fazer o
like, by reason of the daily increasing of all sorts of mesmo, em virtude do crescimeno diário de todas
people, whereby cittyes townes and countries, are as classes de pessoas, com as quais as cidades
so thronged, that men can hardly live well one by principais e o interior, estão tão apinhados, que os
another, as appeareth by the general complaynt of homens não podem viver bem uns com os outro, tal
many in these tymes. como se depreende da queixa generalizada de muitos
nestes tempos.

P. 5 P. 5
It remayneth in the next place, that I shew the Resta-me mostrar em seguida, a legalidade de
lawfulnesse of possessing a countrey already possuir uma região já habitada por outrem, que é
inhabited by others, which is our second question: nossa segunda questão.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 125

True it is, that all men through Adams fall were É verdade que todos os homens, através da
deprived of the glory of God, and worlds good, until queda de Adão, foram privados da glória de Deus,
by Christ the use of the creatures was againe e dos bens terrenos, até que, com Cristo, foi
restored to all beleevers, therfore the right of that reestabelecido o uso das coisas criadas a todos os
which we possesse, commeth now to us by Christ, crentes, e portanto o direito daquilo que possuímos
for which cause, the heathen have no right to that vem-nos de Cristo, e por esta razão os pagãos não
which they deeme theirs, notwithstanding, the Lord têm direito ao que clamam ser seu, não obstante
hath beene pleased to suffer to live on earth with ter o Senhor ficado satisfeito em aguentar viver na
his, and not to be rooted out from the place of their terra com eles, sem desenraizá-los do lugar em que
habitations untill the day of harvest, during which habitavam até o dia da colheita, durante cujo tempo
time the Land wherein such have lived hath beene a Terra em que eles haviam vivido fora chamada
called theirs... sua...
P. 6 P. 6
from whence we may gather, that God permitteth do que podemos concluir que Deus não permite aos
not his to dispossesse a people or nation of their seus privar um povo da posse de sua antiga
ancient habitatiou [sic] for habitação para aumentar seus próprios limites;
todavia, se for necessário que o povo de Deus tenha
the enlarging of their owne borders; nevertheless, if
such shall bee willing that Gods people shall inhabit que viver com eles... Neste caso os homens podem
with them... In such a case [sic] men may doubtlesse indubitavelmente possuir uma região já habitada
possesse a country already inhabited by others. But por outrem. De todo modo, os habitantes da Guiana
the inhabitants of Guiana are willing that our nation estão ansiosos para que nossa nação vá habitar essa
should inhabit that goodly and spatious country boa e espaçosa região com eles (tal como está mais
with them (as appeareth more fully in Mr. Harcourts extensamente na relação do Sr. Harcourt sobre a
relation of Guiana dedicated to the Kings most Guiana, dedicada à excelentíssima Majestade do Rei,
excellent Majestie, 16262). Therefore without all 16262). Portanto, sem questão alguma, as plantações
question, the plantations there made of late by our lá feitas ultimamente por nossa nação são legais.
nation are lawfull. Tendo assim brevemente demonstrado a
Thus having briefly shewed the lawfullnesse legalidade das plantações em países estrangeiros,
of the plantations in forraine Countries, for the para a melhor satisfação dos que tiham dúvidas,
better satisfying of such as make doubt thereof, I vou em seguida falar algo sobre a natureza do rio,
come to the next place to speake somewhat of the das qualidades da terra, do clima, e do povo da
nature of the river, qualitie of the land, climate, and Guiana, com as provisões que servem para o
people of Guiana, with the provision for mans sustento do homem, e dos produtos que ali crescem,
sustenance, and commodities therein growing fazendo assim com que os que as ignoram podem
whereby such as are ignorant of the same, might ser encorajados a essa aventura para seu próprio
bee encouraged to adventure for the good of bem, e daquele dos
themselves, and of

P. 7 P. 7
those poore natives, which sit still in darknesse, pobres nativos, que ainda estão na escuridão, e na
and in the shadow of death. sombra da morte.
As touching that great and famous River of No tocante ao grande e famoso Rio das
the Amazones in America, it is called for the Amazonas na América, ele é chamado, por sua
excellencie thereof, (by Joseph Acosta) the Empresse excelência, (por Joseph d’Acosta) a Imperatriz e a
and Queene of all Flouds, and for the large extent Rainha de todas as Torrentes, e por sua grande
of the same, it is called by the others the sweet Sea, extensão, é denominado por outros o Mar doce,
supposed to bee the greatest River (not onely of all supondo-se ser o maior Rio (não só de toda a Índia,
India, but also) of the whole world; it is said to flow mas também) de todo o mundo; diz-se que flui da
from the Mountaines of Peru, and runneth with Montanhas do Peru, e que corre com muitos
many windings and turnings for the space of 1500 meandros e voltas pelo espaço de 1500 léguas, tendo
leagues, containing at the mouth thereof neare sixtie em sua desembocadura cerca de sessenta léguas
leagues in breadth; in it are many Ilands, divers of de largura, e nela muitas Ilhas, várias delas
which are inhabited by the Indians; it doth ebbe habitadas pelos Índios; tem fluxo e refluxo por
and flowe neare three hundred leagues3, and hath aproximadamente trezentas léguas3, e tem em si
in it greate store of excellent fishes for the use of uma grande cópia de excelentes peixes para o uso
man: of which more shall bee said hereafter, when do homem: deles falar-se-á mais adiante, quando
wee shall come to speake of the provisions of the viermos a dizer das provisões da região para o
country for mans sustenance. sustento do homem.
The quality of the land is of divers kindes, as A qualidade da terra é de diversas espécies,
low, middle, and mountainous, (as here with us) it baixa, média, e montanhosa, (e assim como entre
aboundeth in woods in divers sorts, having plaines nós) abunda em florestas de várias sortes, tendo
126 John Day e “A Publication of Guiana’s Plantation” (1632)

in some parts thereof, with plentie of grasse, besides planícies em algumas partes, com abundância de
pleasant streames of fresh waters, all which are very capim, além de prazeirosos riachos de águas doces,
needfull and fitting for a plantation4. tudo isto muito necessário e próprio para uma
plantação4.
The earth in those parts is of sundry mixtures,
as blacke mould, clay, rossey 5, and such like, A terra nessas partes é de várias texturas,
besides stone for building if occasion serve. como terra preta, argila, pantanosa, e outras, além
de pedras de construção se surge a oportunidade.
The seasons there differ much from ours, for
the dry weather which wee call there summer, As estações ali diferem muito das nossas, pois
beginneth about August, and the raines and a estação seca, que nós chamamos de verão, começa
windes, which we account there winter, begin about ao redor de Agosto, e a das chuvas e ventos, que ali
Febru- consideramos como inverno, começa por volta de
Feve-
P. 8 P. 8
arie; which latter season is termed by us their winter, reiro; esta última estação é por nós chamada seu
by reason of the raines then falling extraordinarie, inverno, em razão das chuvas que então caem de
and not by reason of the coldnesse of the weather; modo extraordinário, e não em razão da frialdade
for there are no frostes or snowes, as with ushere, do tempo, pois não existem geadas ou neves, como
but a continually spring and summer season: for aqui, mas sim uma contínua estação de primavera
no sooner doe the leaves wither and fall away, but e verão: pois tão logo as folhas secam e caem,
presently it beginnes to spring againe, as here with imediatamente começam a crescer de novo, tal como
us some yeares it seemeth the like; for when our aqui se passa em certos anos, quando o outono se
autumne proves somewhat warme, then commonly mostra algo quente, então comumente aparece uma
appeareth a second spring, which yet never segunda primavera, que entretanto nunca chega à
commeth to perfection, and that by reason of the perfeição, isto em virtude de o sol declinar de nosso
suns declining from our horizon, and the cold horizonte, e por o frio do inverno logo se aproximar,
winters present approaching, which causeth alwayes o que sempre faz com que nossa tardia primavera
our latter spring to keepe backe, untill the time of se interrompa, até o tempo da estação de verão: o
our summer season: which is Guiana is not so, for que na Guiana não ocorre, pois há pouco diferença
there is little difference of heat and cold throughout entre calor e frio através de todo o ano, se não um
the yeare, but a most pleasant growing weather, prazeiroso tempo favorável, que comumente torna
which commonly causeth those parts to bee much aquelas partes muito mais frutíferas do que
more fuitfull then many other parts of the world. quaisquer outras no mundo.
The day and night are there alwaies equall, O dia e noite são ali sempre iguais, o Sol
the Sunne rising at six of the clocke in the morning, nascendo às seis da manhã, e pondo-se às seis da
and setting at six in the evening or neare thereabout tarde ou quase, em quase todo o ano6.
the yeare throughout6.
As provisões de boca são muitas; em primeiro,
The provisions for diet are many, as first, the a raiz chamada Mandioca, de que os Guianenses
roote called Cassavie, of which the Guianians make fazem seu pão; há igualmente uma espécie de grande
their bread; there is likewise a kinde of great wheat trigo chamado Milho, que atinge um grande
called Maix, it yeeldeth great increase, and maketh tamanho e produz uma excelente farinha para o pão:
excellent meale, or flower for bread: of the aforesaid da supracitada Mandioca, e deste milho, faz-se uma
Cassavie, and this wheat, is made a sort of drinke espécie de bebida chamada Paranaw, muito parecida
called Paranaw, much like the best march beare à melhor cerveja nossa; têm também outras
here with us; other sorts also they

P. 9 P. 9
have, which for brevity sake I omit here to speake espécies, que por brevidade deixo de mencionar
of7. aqui7.
There are Deere of divers sorts, wilde Swine8, Há Veados de diversas espécies, Porcos 8
Hares and Conies9 in great plenty, besides which selvagens, Lebres e Coelhos9 em grande abundância,
there is a great beast called Maipury [sic] which in além de uma grande besta chamada Tapir, que no
taste is like beefe, and will take salt10; there is also gosto é como carne, e pode ser salgada10; há outra
another creature which usually commeth into the criatura que usualmente vive na água doce, e que se
fresh waters, and feedeth upon the grasse and alimenta de capim e ervas nos pântanos, (e é por
weedes in the marshes, (and is called by us sea- nós chamada de Vaca-marinha), sendo no gosto como
Cows) being in tast like beefe, and will also take carne, e também pode ser salgada, como a primeira11;
salt, as the former11; of these there are great store destas há grande quantidade na estação devida, e
in their seasons, they will serve wel for the victualling elas também servem para abastecer os navios que
of ships homeward bound, as of late hath beene voltam para casa, como se demonstrou ultimamente.
proved.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 127

Of fowles there be divers kindes, namely, wild- De aves há diversas espécies, ou seja, patos
duckes, wilde-geese, hennes, cranes, storkes, selvagens, gansos selvagens, galinhas, grous,
pheasants, partridges, pigeons, stockdoves, parrats cegonhas, faisões, perdizes, pombas de menor e
of sundry sorts, besides ravenous fowles, and maior porte, papagaios de variadas espécies, além
hawkes, with divers other sorts not knowne in these de aves de rapina, e gaviões, com diversas outras
parts12. espécies desconhecidas nestas partes12.

The variety of fish is great13, as first, mullet14, A variedade de peixes é grande13, de início,
sea-breame 15 , soale 16 , scate 17, thornebacke 18 , tainhas 14, gorazes 15, linguados 16, raias (scate 17,
swordfish19, seale20, a fish like a sammon, but thornback18), peixe-espada19, focas20, um peixe como
differing in coulour21, shrimpes22, lobsters23, and o salmão, mas diferente na cor 21 , camarões 22,
oysters24, other sorts there are, besides freshwater lagostas23, e ostras24, e há outros tipos, além dos de
fish of many kindes, which in these parts of Europe água doce de muitas espécies que nestas partes da
are not knowne to us. Europa são-nos desconhecidos.

The fruites there growing25 are the Pina 26, As frutas que ali crescem 25 são Abacaxi 26,
Plantana27, Medler28, Plumbes and Nuts of divers Banana27, Nêsperas28, Ameixas e Nozes de diversos
kindes, beside store of Potatoes29, as for the Pina, it tipos, além de uma quantidade de Batatas29, quanto
exceedeth all other fruites in those parts, being in ao Abacaxi, supera todas as outras frutas nessas
taste much like ripe straberries [sic] with clarret partes, no gosto muito mais como morangos maduros
wine and sugar; the Plantana tasteth like an old com vinho clarete e açúcar; a Banana tem gosto de
pippin30, the medlers exceede ours in greatnesse, uma velha maçã30; as Nêsperas ultrapassam as
and the nuts in sweet- nossas em grandeza, e as nozes em doçu-

P. 10 P. 10

nesse. ra.

Having thus briefly touched the severall sorts Tendo assim brevemente citado as várias
of provisions necessary for mans sustenance, it espécies de provisões necessárias para o sustento
remaineth I shew the varietie of commodities 31 do homem, resta-me mostrar a variedade de
therein growing for the treate of Merchandise, which produtos 31 que ali cresce para o comércio de
in short time (by Gods assisting our endeavours) Mercadorias, que em pouco tempo (se Deus assistir
may bee brought to returne great profit to the a nossos esforços) poderão tornar -se de grande
undertakers. proveito para os investidores.
O primeiro produto de valor que ali cresce é a
The first commodity of estimation there
cana-de-açúcar; da qual em certas partes há
growing are sugar-canes, whereof in some parts
quantidades, a qual pela plantação ordenada e pela
there are store, which by orderly planting and
construção de obras adequadas, para ferver e fazer
erecting of convenient workes, for boyling and
açúcar, poderá (pela bênção de Deus) trazer
making of sugars, may (through Gods bleassing) bee
anualmente grande benefício aos aventureiros, como
returned yearely great profit to the adventurers, as
o planio de cana feito antes na Barbária pelos
the plantation of sugarcanes made heretofore in
Mouros, e desde então no Brasil pelos Portugueses
Barbary by the Moores, and since that in Brasseile
pode testemunhar.
by the Portingals may witnesse.
Há também algodão crescendo, da mais fina
There is also cotton wooll growing of the finest espécie; é um produto mui proveitoso, para fazer
sort, it is a profitable commodity, for the making of fustões, morim e pavios de velas.
fustians, callicoes and candle-wicke.
Há um cânhamo natural, ou linho, de grande
There is a naturall hempe, or flax, of great use, utilidade, muito parecido com seda crua, e chamado
it is much like raw silke, and is called of some silke- por alguns de capim-seda32.
grasse32.
Há igualmente muitos produtos para tingir,
There are likewise many commodities for diers, como uma fruta vermelha chamada Urucu, que
as namely a red berry called Anotto, which dieth a tinge de um perfeito castanho-amarelado a seda, e
perfect oringe-tawny in silke, and a yallow in cloath, de um amarelo os panos, da qual se obtém grande
of which there may bee gotten good store every cópia em todas as estações33, pois eu mesmo com
season33; for my selfe with some others setting forth alguns outros aparelhamos antes um navio para
a ship formerly for those parts, (by way of trade) essas partes, (por via de comércio) recebemos na
received upon returne, above three thousand waight volta mais de três mil pesos do dito Urucu, que
of the said Anotto, which then bore a good price então obteve um bom preço aqui, mas muito melhor
here, but much better in nos
128 John Day e “A Publication of Guiana’s Plantation” (1632)

P. 11 P. 11
the Neatherlands, other dyes there are (besides hope Países Baixos; há outras tintas (além da esperança
of Cutcheneale) which at this present I purpose de Cochonilha) que no momento pretendo passar
briefly to passe over. por cima.
There are likewise found of late, store of De igual modo, achou-se ultimamente
Nutmegs growing34, with their Mace, some of which quantidades de Noz-moscada34, alguma dela recebi
I have received [sic] upon returne of my foresaid de volta de minha supracitada aventura, e ninguém
adventure, which noe man (I suppose) byt my selfe (suponho) senão eu mesmo pode mostrar coisa igual,
can shew the like, excepting some gentlemen, which com exceção de certos cavalheiros, que, a pedido,
upon request have received some of mee, which no receberam algumas de mim, e que sem dúvida
doubt may in short time bee brought to a more fuller podem em curto tempo ser levadas a uma maior
perfection, by either cropping the old trees and perfeição, ou pela poda das árvores velhas ou pela
draning the waters from them, or by transplanting retirada das águas delas, ou pelo transplante das
the young trees, as by experience is commonly árvores novas, como se vê comumente pela
seene, how that nature is much helped by art and experiência, que a natureza muito é auxiliada pela
industry. arte e indústria.
There is likewise, Gumma, Lemina35, Barrata, Há igualmente Almécega35, Balata, Pimenta da
Ginnipepper 36 , long Pepper 37 , Cascia fistula, Guiné36, pimentas alongadas37, Canafístula, Tabaco,
Tobacco, spleene stones, speckled wood, Hony and pedras para o baço, Muirapinima, Mel e cera 38.
wax38.
Quanto aos minerais, ou minas de metais, é
As for mineralls, or mynes of mettals, it is very muito provável que essa região ofereça vários, não
likely this country affordeth many, not onely of the apenas dos mais comuns, mas também dos mais
basest, but also of the richest, which hereafter may ricos, que posteriormente serão descobertos, se
come to bee discovered, if God shall be pleased, Deus for servido, e que nos dê para sua glória, ou
which hee grant to his glory, and our good, or that senão que permaneçam para sempre escondidos.
otherwise they may ever lied hid.
Agora no tocante à natureza desse povo, são
Now as touching the nature of these people geralmente considerados inofensíveis, de bom trato,
they are generally held harmelesse, tractable, trusty, confiáveis, e muito laboriosos39; neste respeito
and somewhat laborious39; in which respect they diferem muito dos outros Americanos, e o que se
differ much from all other Americans, and which is lhes mais aprecia é que há boa esperança de sua
better to bee liked in them, there is good hope conversão para a fé Cristã,...
conceived of their conversion to the Christian faith,...

P. 12 P. 12
so have some of these poore ignorant soules desired E algumas dessas pobres almas ignorantes
Captaine Charles Leigh, to send into England for pediram ao Capitão Charles Leigh para buscar na
some men to teach them to pray [Purchas, p. 102140]; Inglaterra alguns homens para ensiná-los a orar
since which, one being converted, and became a [Purchas, p. 102140]; desde então, um deles tendo
Christian, being at the point of death, desired some sido convertido, tornou-se um cristão, e estando a
of our nation then present, to sing a Psalme with ponto de morrer, desejou que alguém de nossa nação
him, which being ended, hee told them hee could então presente cantasse-lhe um Salmo, o qual
not live, & did withall acknowledg [sic], that he had terminado, disse ele que não podia viver, &
been a wicked sinner, but did hope that hee should testemunhou que tinha sido um iníquo pecador, mas
bee saved by the precious blood of our Savior Jesus que esperava ser salvo pelo precioso sangue de
Christ; and moreover, hee desired all of them there nosso Salvador Jesus Cristo; e, além disso, desejava
present, to beare witnesse that hee died a Christian. que todos os presentes testemunhassem que morria
Yea said hee, a Christian of England41. como Cristão. Sim, disse, um Cristão da Inglaterra41.

[P. 13] [P. 13]


P. 14 P. 14
As for the temper of the climate42 it exceedeth Quanto à temperança do clima42, nunca excede
not so in heate as some men have thought of it, for tanto em calor quanto muitos pensam, pois apesar
though the scituation be in part under the de a situação ser em parte sob a equinocial, ainda
equinoctial, yet it is habitable, as appeareth by the assim é habitável, como surge da experiência de
experience of our countrymen, which have lived in nossos patrícios, que viveram naquelas partes, e o
those parts, and found it healthfull, and pleasant; acharam saudável, e agradável; pois Deus em sua
for God in wisdome hath so ordered the heavens in sabedoria ordenou de tal maneira os céus em seu
their horizon, as that by meanes of a brieze (or fresh horizonte, que por meio de uma brisa (ou fresca
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 129

gale of winde) blowing in the day time43, it quallifieth rajada ou vento) que sopra durante o dia43, ela
the heate, and maketh the climate much more abranda o calor, e torna o clima muito mais
temperate, as with us is often the like in heate of temperado do que entre nós no calor do verão.
summer.
Além disto o orvalho que comumente cai à
Besides the dewes there falling commonly in noite, auxilia muito a esfriar aquele clima,
the night, addeth much to the cooling of that climate,

P. 15 P. 15
and which is to bee noted, the continued absence E, o que deve ser também notado, é que a
of the Sunne from the horizon, for the space of twelve contínua ausência do Sol no horizonte, pelo espaço
hours every day, cannot but cause the temper of de doze horas por dia, só pode causar a temperança
that clymate to be moderate, there being a perfect do clima a ser moderada, havendo uma perfeita
mixture of heat and cold, each qualifiing the other mistura de calor e frio, cada qual moderando o outro
in the space of twelve twentie foure hours by na no espaço de vinte e quatro horas, por uma igual
equall division of day and night, as before hath beene divisão de dia e noite, como já se havia mostrado
shewed. anteriormente.

Their houses are built (most commonly) in Suas casas são construídas (mui comumente)
length, like our barnes here with us, some of which de comprido, tal como nossos celeiros, algumas
are so large, as they containe in them above an delas são tão grandes, que contêm dentro delas uma
hundred persons, having therein hanging beds, (in centena de pessoas, que ali têm suas camas pênseis,
which they lie) called hamackoes, made of cotten (nas quais se deitam) chamadas redes, feitas de
woll very artificially44, their vessels for use are made algodão muito artifciosamente44; sua louça utilitária
some of clay, of which sort some are so great that é feita de argila, algumas delas são tão grandes que
they will containe more than one hogshead of water. podem conter mais de um tonel de água.

They will worke a month or more for an axe of Eles trabalham um mês ou dois em troca de
eighteene or twentie pence price; for which they will um machado de dezoito a vinte pences cada; por
fell your timber, cleare your ground, plant your sugar um deles cortar-lhes-ão madeira, limpar-lhes-ão o
canes, Anotto, and Cotten trees, and build your terreno, plantar-lhes-ão cana de açúcar, Urucu, e
house after their fashion: which in other plantations Algodoeiros, e construir-lhes-ão casas à sua moda,
o que não acontece nas outras plantações45, pois
is not so45, for in all other our plantations, the
em todas nossas plantações os aventureiros são
adventurers are enforced to carry men over to doe
forçados a transportar homens para fazer-lhes o
their worke for them, least otherwise they be driven
trabalho, se não têm que fazer eles mesmos o
to worke themselves, as Virginia, St. Christophers,
trabalho, como na Virgínia, em St. Chrisophers, nova
new England; with others can weitnesse.
Inglaterra, como outros podem testemunhar.
Besides which, in most former plantations
Além disso, na maioria das plantações, exceto
except new England, men have adventured onely
na nova Inglaterra, os homens se aventuraram
upon hope of one commoditie (as namely Tobacco46)
unicamente em troca de um só produto (ou seja,
but here are many more commodities than one (as
Tabaco46), mas aqui há muito mais produtos do que
esse (como

P. 16 P. 16
hath beene shewed) therefore in this plantation more já se mostrou) e em consequência esta plantação é
hopefull then all others: the foundation of which mais esperançosa que todas as outras: sua criação
being already laid, may give men better estando já feita, podemos dar aos homens coragem
incouragment to become joynt adventurers herein, para ali se tornarem aventureiros associados,
especially being thereupon presently intressed in especialmente estando agora interessados no
the shipping stocke, and profits of the said carregamento dos navios, e nos lucros da dita
plantation; for the preservation thereof, we have not plantação, para a salvaguarda disso, não só
onely sent divers honest and able men (marren and enviamos vários homens honestos e hábeis
other) but also some peeces of great ordnance, with (“marren” [?] e outros) mas também algumas peças
ammunition, and other materials very usefull de grande calibre, com munição, e outros materiais
towards building of a fort, for the better securing of muito úteis para a construção de um forte, para
our planters persons from the danger of an enemy; melhor assegurar as pessoas de nossos plantadores
having moreover caused a pinnace to bee sent to contra o perigo de um inimigo, havendo ademais
abide with the Colony in the river, for their better feito enviar uma pinaça para permanecer na
safetie and trade in the country47; intending likewise Colônia, no rio, para sua maior segurança e para o
this summer (if God shall bee pleased) to sett out a comércio com a região47, pretendendo igualmente
new supply of more men (as arteficers este verão (se aprouver a Deus) instalar um novo
130 John Day e “A Publication of Guiana’s Plantation” (1632)

and others) besides women, as also more ordnance, conjunto de homens (como artífices e outros), além
ammunition, and other materials, fitting for the de mulheres, assim como mais armamento, munição,
defence of the plantation, besides another shipp, e outros materiais, adequados para a defesa da
greater than the former, to stay and abide there plantação, além de outro navio, maior que o primeiro,
together with the Colony in the river, for their better para permanecer e ficar junto à Colônia no rio, para
defence and trade in the country aforesaid: in which sua melhor defesa e comércio com a região
supply I also purpose (God willing) to goe with my supracitada: em cujo grupo espero (se Deus quiser)
wife and friends, to inhabit some part of that ir com minha mulher e amigos, para habitar alguma
spacious and goodly contrie. parte dessa espaçosa e boa região.
[Object.] But here some may object for feare of [Objeção] Mas aqui alguns podem objetar o
the enemy. [Answ.] Answer, it is no other then what medo do inimigo. [Resp.] Respondo que é o mesmo
hath bin usually vented at the first setting forth of que foi assinalado desde que por primeira vez
al our plantations for America, as Virginia and others estabelecemos nossas plantações na América, como
can witnesse; and if there were so great cause to a Virgínia e outras podem testemunhar; e se
feare (as some have houvesse tão grande causa a temer (como alguns

P. 17 P. 17
supposed) men would not assuredly have supuseram) os homens seguramente não se teriam
adventured so feebly; but this plantation here aventurado tão francamente, mas esta plantação
mentioned is farre from the Spaniards habitation, aqui mencionada está longe da habitação dos
and therefore lesse cause to be feared. Espanhóis, e portanto uma causa a menos a ser
temida.
[Object.] But yet it may bee further objected,
that though the Spanyard bee somewhat farre [Objeção] Mas ainda assim pode-se objetar que,
distant, yet the Portugals in Brasill (being neare unto apesar de os Espanhóis estarem algo distantes, os
it) may prove as ill neighbours as the other. [Answ.] Portugueses no Brasil (estando perto dela) podem
Answer, if wee consider the spatiouness of the ser tão maus vizinhos quanto os outros. [Resp.]
country (being supposed to be more then twenty Respondo que, se consideramos a vastidão da região
times greater then this kingdome of England) wee (que se supõe ser mais de vinte vezes maior do que
have no such great cause to feare them; for if wee este reino da Inglaterra), não temos grande razão
like not their neighbourhood, (there being roome para temê-los, pois se não gostarmos de sua
enough, and divers goodly rivers besides in the vizinhança, (existindo espaço suficiente, e vários
country) wee may (if we please) goe further out of bons rios adicionais na região), podemos (se
their reach, where no doubt (through Gods assisting queremos) afastar-nos de seu alcance, até onde,
of our indeavours) wee may come to returne as great indubitavelmente (com a ajuda de Deus, assistindo-
profit (by meanes of sugar canes and such like nos em nossos esforços) podemos voltar a obter um
commodities growing in those partes) as in the river grande lucro (por meio de cana de açúcar e outros
aforesaid: for to speake truly, it were great produtos tais que crescem nessas partes) tanto
weaknesse in any to presume to sit neare an enemy, quanto no rio supracitado: pois, para falar a verdade,
and have not sufficient strength to oppose him, or seria uma grande fraqueza se alguém se assentasse
having roome enough to go out of his reach, will próximo de um inimigo, sem ter a força suficiente
notwithstanding abide neare him; yet I deny not, para a ele se opor, ou, tendo espaço suficiente para
but that a Colony may bee able to subsist neare an ficar-lhe fora de alcance, sem embargo ficar perto
enemy by meanes of fortification, and especially dele; ainda assim não nego que uma Colônia possa
when they are such as feare God, being provided ser apta a subsistir perto de um inimigo por meio
with amunition, victuall, and all other things de fortificações, especialmente quando são gente
needfull for the defence of the same: for to raise a temente a Deus, providas de munição, vitualhas, e
fort for the reliefe of a Colony, and not to victuall it, todas as outras coisas necessárias para a defesa da
(as some have carelesly neglected through mesma: pois erigir um forte para a defesa da Colônia,
indiscretion 48) were to make it (with such) our e não supri-lo (como alguns fizeram negligentemente
peoples por indiscrição) seria para o dano (com tal coisa)

P. 18 P. 18
grave, and not their preservation: and if an hundred da nossa gente, e não para sua preservação, e se
of our nation, or thereabout (having neither fort, nor uma centena de nossa nação, ou perto disto (não
artillery for defence) were able (not long since) by tendo um forte, nem artilharia para a defesa)
meanes of the natives, to cause about eighteene puderam, usando os nativos, fazer com que cerca de
hundred of the enemy to retrayte, and abandon the mil e oitocentos inimigos se retirassem, e
river, with losse of many of their lives49; how much abandonassem o rio, com a perda de muitas vidas49,
more then being fortified, and fityted with all things quanto mais se forem fortificados, e providos de todas
needfull for the defence of the same, may wee bee as coisas necessárias para a defesa da mesma;
better able, (through the helpe of the almighty) to poderíamos melhor (com a ajuda do todo-poderoso)
repell and beat backe a more potent power. repelir e bater um poder muito mais potente.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 131

Now as the raising of forts for the defence of Ora, quanto à ereção de fortes para a defesa
Colonies, and neglect of storing of them with victuall, das Colônias, e a negligência em supri-los com
and other things needfull for the preservation of the vitualhas, e outras coisas necessárias para a
same, sheweth the great indiscretion of some sort preservação dos mesmos, mostra a grande
of people: So in like manner, is their folly as great, indiscrição de uma certa espécie de pessoas. Da
who looking after present profit, neglect planting mesma maneira, seria sua loucura tão grande, se,
provisions needfull for the preservation of their lives: só mirando o presente, não plantassem as provisões
which wee taking into consideration, have given necessárias para a preservação de suas vidas: pois
expresse charge, that first of all they take care to nós, então, levando isto em consideração, demos
plant provisions needfull for sustentation, whereby ordens expressas para que primeiramente eles se
they may bee able in short time to subsist encarreguem de plantar provisões necessárias para
themselves, without helpe of the natives, which o sustento, de modo que possam estar aptos, em
usually furnish our English plantations with store pouco tempo, a subsistir por si sós sem a ajuda dos
of provisions for diet, at marvelous low rates; yet navios, que usualmente suprem as plantações
notwithstanding wee have sent thither some few Inglesas com uma quantidade de provisões para a
cattell for breed, besids other creaturs, which in dieta, a preços maravilhosamente baixos; não
those parts have not yet beene heard of by us to obstante, enviamos para lá algum gado para criar,
have beene amongst them. além de outras bestas, que nunca soubemos haver
existido entre eles.
And if any man shall desire to bee further
satisfied concer ning the proceed of the said E se alguém deseja ser mais informado sobre
plantation, as coisas da dita plantação,

P. 19 P. 19
or shall make doubt of anything, they may please ou tenha dúvidas sobre qualquer coisa, pode por
to repaire to the place of meeting (hereafter favor comparecer no lugar de reunião (mencionado
mentioned) and there receive further satisfaction. logo a seguir) e ali receber posteriores informações;
Now as toucheth the manner of the adventure, Agora, quanto às modalidades da aventura,
it is as followeth. são como segue.
Every one that shall be admitted into the Qualquer um que for admitido na Colônia, ou
Colony, or company of the Right Honorable the Earle companhia do Honorabilíssimo Conde de Barksheire
of Barksheire for his plantaion in Guiana, is to be para sua plantação na Guiana, será admitido em
admitted one of these three wayes, that is to say: uma destas três modalidades, ou seja: ou em pessoa
either in person and purse, or in purse, or in person e bolsa, ou em bolsa, ou em pessoa somente. Os
onely. The first are called personall adventurers, primeiros são chamados aventureiros pessoais, os
the second, purse adventurers, and ther latter are segundos, aventureiros de bolsa, e os últimos são
servants to the Colony. servos da Colônia.
Concerning the former, they are such as not A respeito dos primeiros, são tais que não só
onely adventure their persons, but also their purses; aventuram suas pessoas, mas também suas bolsas,
of which sort none may bee admitted under fifty e neste tipo só podem ser admitidos ao pagar pelo
pounds at least, put into the joynt stocke (being a menos cinqüenta libras, colocadas no fundo comum
single share) in consideration whereof, every such (em uma só parcela), em virtude de que, cada
adventurer is to have for his personal service (over aventureiro desses terá para seu serviço pessoal
and above the profits of his stocke of adventure) his (ademais dos lucros do fundo de aventura) seu
transportation and diet free, (both in the passage transporte e alimentação grátis, (tanto na travessia
and country) besides a certaine stipend or yearly como na região) além de um certo subsídio ou
allowance (as others) toward the maintenance of his contribuição anual (e outros) para a manutenção
apparrell & bedding, and also aleventh part of a de seu vestuário & roupa de cama; e também onze
twelfth, of all the profits that shall arise by the dove avos de todos os lucros que surjam pela
industry and labours of the Collony beyond sea; and indústria e trabalhos da Colônia além-mar; e por
lastly, a proportion of land over and besides his último, uma parte da terra relativa e superior a sua
stocke of adventure of fifty poundes, or more as every parte no fundo de aventura de cinquënta libras, ou
one pleaseth to put in, whose respect in the Collony, mais, de acorsdo com o que alguém quiser pôr, e
is held fitting to be measured according to the que, na Colônia, será medida de acordo com a
greatnesse of every mans adventure, worth and grandeza da aventura de cada um, valor e qualidade.
qualitie.

P. 20 P. 20
As for those which are called purse Quanto aqueles que são chamados
adventurers, they are such which adventure their aventureiros de bolsa, são aqueles que aventuram
monies but not their persons, whose names, and seu dinheiro mas não suas pessoas, cujos nomes, e
summes adventured, are not onely registered, but somas, são não apenas registrados, mas também
132 John Day e “A Publication of Guiana’s Plantation” (1632)

also acknowledged by indenture under seale, by reconhecidos por contrato selado, por Autoridade
Authority from the said Earle, (for their better do dito Conde, (para sua melhor segurança e maior
security, and more assurance of faithfull dealing) garantia de um negócio honesto) como sócios
to become joynt adventurers with the said Earle and aventureiros do dito Conde e companhia, da
company, for his plantation aforesaid, and that at plantação supracitada, e a cada retribuição (durante
every returne, (during the terme of five yeares) after o termo de cinco anos) após a primeira retribuição
the first retur ne from the plantation, every da plantação, cada aventureiro, seus herdeiros,
adventurer, his heyres, executors, administrators testamenteiros, administradores ou procuradores,
or assignes, shall receive the profits of his stocke of receberão os lucros relativos à sua aplicação, e
adventure, and shal the first returne from the depois da primeira retribuição da plantação (após
plantation (after five yares shall be expired) receive terem expirado os cinco anos) receberão o justo saldo
out the just residue and remainder of his stocke of e o restante de sua aplicação, & os juros dela, ou,
adventure, & profits thereof, or may if he please, se quiser, continuará por um prazo maior do que o
continue the same longer in the joynt stocke then mencionado no fundo comum, para lucros
the terme aforesaid, for his further benefit: and shall adicionais: e terá, além disso, disponível para seu
have moreover, set forth for his use a proportion of uso uma parte de terra correspondente a seu
lande correspondent to his said stocke of adventure: investimento, e para que cada aventureiro, seus
and to the ende that every adventurer, his heires, herdeir os, executores, administradores e
executors, administrators and assignes may clearely procuradores possam constatar claramente que
see, that they have the due proportion of the profits tiveram a parte devida dos lucros de sua aventura,
of their adventure, it is covenanted in the said é garantido no contrato que os herdeiros, executores,
indenture, that the heires, executors, administrators administradores & procuradores terão, a cada
& assignes shal upon every setting forth & return, aplicação & retribuição, vistas da soma total dos
see the full summe of all the disbursements, and desembolsos, e receitas de tempos em tempos, pagas
receits from time to time, paid and received, touching e recebidas, concernente ao uso de seu fundo
the proceede of the said joynt stocke, and plantation: conjunto, e da plantação: desta maneira, cada
which in like manner, every adventurer, as well aventureiro, seja pessoal, servo, ou outro, terá um
personall, servant, as other, hath the

P. 21 P. 21
like indenture for their better satisfaction, and more contrato idêntico para sua melhor satisfação, e mais
assurance of faithfull dealing, as aforesaid. segurança de um negócio honesto, como já dito.
Now concerning the latter, which are servants Agora, em relação aos últimos, que são os servos
to the collony, they are such, which adventuring da colônia, são aqueles que, aventurando apenas
onely their persons, are bounde by indenture to suas pessoas, são obrigados por contrato a servir o
serve the said Earle and company in the plantation dito Conde e companhia na plantação por cinco anos,
five yeares, in consideration whereof, the said em consideração do que, os ditos servos (sejam
servantes, (as well wives, maides, as men) are to mulheres casadas, solteiras, ou homens) terão seu
have their transportation thither free, as also their transporte para lá grátis, assim como sua
diet, lodging and apparrell, and all other materialls alimentação, alojamento e vestuário, e todos os outros
needfull, provided for them, at the charge of the materiais necessários, providenciados para eles, às
joynt stock, for the terme aforesaid (apparrelling custas do fundo comum, pelo período supracitado
themselves here for the first yeare) and to receive (vestindo-os aqui pelo primeiro ano) e receberão, além
moreover, (for their beter incouragement) a twelfth disso (para seu encorajamento) um doze avos de todos
part of all the profits that shall arise by their labours os lucros que surgirem de seus trabalhos e indústria,
and industry, and the women a fifteenth (as of e as mulheres um quinze avos (do açúcar, noz-
sugars, nutmegs, mace, cotton wools, Anottoes, moscada, flor de noz-moscada, algodão, Urucu, mel,
honey, wax, tobacco, mineralls, and all other such cera, tabaco, minerais; e todos os outros produtos
like commodities, as shall be gotten in the que tal, que serão conseguidos na plantação, da
plantation, in manner aforesaid), as also at the end maneira supracitada); e também, ao termo de cinco
and terme of five yeares, ever man servant to have anos, cada servo homem terá um uniforme, e o uso
livery, and season of thirty, and some forty acres of de trinta a cinqüenta acres de terra, e as mulheres
land, and women twenty, which said landes are to vinte, terras estas que deverão ser postas à sua
be set forth for their use, by the governour, or disposição pelo governador, governadores e conselho
governours, and councell then being. então existente.
And to the end that every one may know what E para que cada qual possa saber os lucros
profits are due unto them by reason of their service, que lhe são devidos em razão de seu serviço, ser-
it shall be free for them to make choyse of any two lhes-á facultado escolher quaisquer dois ou três
or three amongst themselves, which shall once in entre eles, que, uma vez ao ano, mais ou menos
the yeare, or thereabout (upon reasonable request (depois de fazer um pedido razoável ao governador,
made to the governour, or governours then being) ou governadores então existentes), conferir as
see the acompts, and what is due unto them up contas, e ver o que lhes é devido
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 133

P. 22 P. 22
on the foote of the same, for their better satisfaction na base delas, para sua maior satisfação e para
and avoyding of suspition. evitar suspeitas.
And furthermore all such servants, as shall Além disto, todos os servos, que são artífices.
bee artificers. As Suger-cane, and Vine planters: Como plantadores de cana, e de vinhas: doceiros,
sugar bakers, Druggists, Dyers, Lapidaries, droguistas, tintureiros, lapidários, mineradores,
Minerallmen, Refiners, Founders, Potashe makers, refinadores, fundidores, fabricadores de potassa,
Barbersurgeons, Ingeners, Gunners, Survayers, cirurgiões-barbeiros, engenheiros, atiradores,
Shipwrightes, Millwrightes, Carpenters, Joyners, agrimensores, trabalhadores em estaleiros,
Coopers, Turners, Wheelers, Sawyers, Oare makers, construtores de moinhos, carpinteiros, marceneiros,
Blacke-smiths, Locke-smiths, Gunn-smiths, Pike- tanoeiros, tor neiros, carpinteir os de rodas,
makers, Armorers, Cutlers, Edge-toole-makers, serradores, construtores de remos, ferreiros,
Ropers, sayle-makers, Mariners, Net-makers, serralheiros, ar meiros, fazedores de lanças,
Fishermen, Bakers, Butchers, Brewers, Distillers cuteleiros, ferramenteiros, cordoeiros, veleiros,
of hot-waters, felt-makers, Spinsters, Weavers, pescadores, padeiros, açougueiros, cervejeiros,
Taylers, Tanners, Curriers, Tawyers of Furres, distiladores de aguardentes, fabricadores de feltro,
Fellmongers, Girdlers, Glovers, Shoomakers, fiandeiros, tecelões, alfaiates, curtidores, surradores
Potters, Mason, Bricke-makers, Bricke-layers, de couros, curtidores com alume, peleiros, cinteiros,
Basket-makers, Thatchers, and such like; are to luveiros, sapateiros, ceramistas, pedreiros, oleiros,
receive a ninth part of a twelfth (more than others, assentadores de tijolos, cesteiros, colmadores, e
which are no artificers, of all the profits that shall quejandos, deverão receber nove doze avos (mais
arise by their labours, and industry) as a reconpence que outros, que não são artífices, de todos os lucros
of their severall arts for their furher incouragement. que surgirem de seus trabalhos, e indústria) como
recompensa de suas várias artes, para seu ulterior
And lastly, it shall and may bee free for every
encorajamento.
servent appertaining to the colony, to put into the
joynt stocke such summes of mony, as they shall E por último, todo servo pertecente à
be able from under fifty pounds to five (as already colônia pode e estará livre para fazê-lo, pôr no fundo
some have done) the receit of which summes being comum qualquer soma de dinheiro, desde menos
acknowledged by indenture, shall be as sufficient a de cinqüenta libras até cinco (como alguns já
warrant for them to receive the just profit of the fizeram), sendo o recebimento dessas somas
same, correspondent to their severall stockes of certificado em contrato, e que será suficiente para
adventure, as to any otherbefore mentioned. garantir-lhes o recebimento do lucro justo dela,
correspondente a seus vários fundos de aventura,
assim como o mencionado para os outros.

P. 23 P. 23
And now to conclude, seeing that workes of E agora, para concluir, constatando que
this nature require some time for preparation of empreedimentos desta natureza precisam de algum
shipping, and all other things needfull for tempo para serem embarcados, assim como todas
transportation, and that the summer season is most as outras coisas necessárias para o transporte, e
convenient for the performance of the same: it is que a estação estival é a mais conveniente para a
therefore thought fitting to give notice to all such, execução da mesma: pensamos ser adequado
as shal become willing adventurours with the said anunciar a todos os que pretendem se tornar
Earle and company, to bring in their stockes of aventureiros com o dito Conde e companhia, que
adventure, (so soone as conveniently they may, and tragam eus fundos de aventura (tão logo seja
the sooner the better, for the reasons afgoresaid) to possível, e quanto mais cedo melhor, pelas razões
the place of meeting appointed to be kept Pikemaker supracitadas) ao lugar de encontro designado, que
in Phillip lane neare Cripplegate: London: which first sertá no Pikemaker, na travessa Phillip próxima de
meeting is appointed on thursday the first of March Cripplegate, em Londres: o primeiro encontro será
(at two of the clocke in the afternoone) and so to na quinta-feira primeiro de Março (às duas da
continue every thursday after, untill such time as tarde), devendo continuar depois a cada quinta-feira,
the joynt stocke, number of adventurers, and até quando o fundo comum, e o número de
servants shall be full. aventureiros, seja completado.
134 John Day e “A Publication of Guiana’s Plantation” (1632)

Notas de Lorimer (1989)

1 18
Limited amount, scarcity. Not found in the lower Amazon according to
2
Golding, 1980, ch. 2.
Day refers here to Harcourt, Relation, 1626, pp.
19
14-15. A ray with spines on the back and tail. The fresh-
3
water sting-rays, Potamotrygon, Rajiformes, are
Day is paraphrasing Harcourt, Relation, 1626: about 1 metre long, the tail constituting half the
pp. 4-7, in Harris, Relation, 1928, pp. 68-9, 245- total length, with a spine near the centre of the
6. dorsal sur face; Gilmore, “Fauna and
4
Paraphrase of Harcourt, Relation, 1626, pp. 34- ethnozoology”, HSAI, 1963, VI.408.
5, in Harris, Relation, 1928, pp. 93-4. 20
Sawfish, Pristidae, Rajiformes, are found in the
5
Marshy, from ross meaning marsh or morass. Amazon, according to Golding, 1980, p. 38.
21
6
From Harcourt, Relation, 1626, pp. 28-30, in Gilmore, “Fauna and ethnozoology”, HSAI, 1963,
Harris, Relation, 1928: pp. 89-90, 134, 149. VI.378-9 states that seals mostly herd off the
southern coasts of South America.
7
Paraphrase of Harcourt, Relation, 1626, pp. 35-
22
6, in Harris, Relation, 1928, pp. 94-5, 151. Probably a reference to one of the species of
unarmoured catfish in the Amazon. The Dorada
8
Based on Harcourt, Relation, 1626, pp. 37-8, in “gilded one”, Brachyplatystoma flavicans, has
Harris, 1928, pp. 95-6, 98, 151-3. delicious flesh. This could alternatively be a
9
Harcourt described two kinds of wild pig “the one description of the pirarucu, Arapaima gigas, up
small, by the Indians called Pockiero, which hath to three metres long with tasty pink flesh;
the navile in the backe; the the other is called Gilmore, “Fauna and ethnozology”, HSAI, 1963,
Painqo, and is as faire and large as any we have VI.411.
in England”. The former is the Peccary, Tayassu 23
Fresh water shrimp are found in the lower
pecari identifiable by its dorsal gland or “navile Amazon.
in the backe. Harcourt’s “Paingo” is a larger 24
species of peccary, probably the Tayassu tajacu. A spiny, clawless lobster, Panulirus is native to
See Harcourt, Relation, 1626 in Harris, Relation, the Antilles and the east coast of South America.
95, no. 6. 25
Many visitors to the Guiana noted the oysters in
10
Rabbits. Harcourt, Relation, 1626, p. 37 and the mangrove swamps.
Harris, Relation, 1928, pp. 95-6. The paca 26
Paraphrase of Harcourt, Relation, 1626, p. 40 in
resembles a hare as does the agouti, Dasyprocta Harris, Relation, 1928, pp. 98-9.
agouti.
27
Pineapple.
11
Maipury or Tapir. Day is using Harcourt’s
28
Relation, 1626, p. 38 in Harris, Relation, 1928, Plaintain. Harris, Relation, 1928, p. 98, n. 3, feels
pp. 96, n. 4, 151-2, n. 1. that Harcourt, Day’s source, was describing a
banana.
12
Paraphrased from Harcourt, Relation, 1626, pp. 29
39-40 in Harris, Relation, 1928, p. 98, ns. 1, 2, Harris, Relation, 1928, n. 5, suggests that this
and p. 153. fruit is the Sapodilla or Achras, Sapotaceae. Like
de Medlar, Vauqueria, it is only suitable to eat
13
Paraphrase of Harcourt, Relation, 1626, pp. 38- when it appears to be overripe.
9 in Harris, Relation, 1928, p. 96, n. 9, and 97, 30
ns. 1, 2. As Harris notes, Harcourt applies English A name for various types of apple grown from
names to the wild fowl of Guiana. Day copied the seed.
greater part of them into A PUBLICATION. 31
The following eight paragraphs are largely
14
From Harcourt, Relation, 1626, p. 30 in Harris, paraphrased from Harcourt, Relation, 1626, pp.
Relation, 1928, pp. 97-8, 152. 40-50 in Harris, Relation, 1928, pp. 99-105, 153-
7.
15
Gilmore, “Fauna and ethnozoology”, HSAI, 1963, 32
VI.409 states that mullet, Mugilidae are This allusion to flax, or “silke-glass” as Harcourt
commonly found throughout the coastal, calls it below, presumably refers to the hemp fibre
of any of the bromeliaceous plants.
brackish and fresh waters of the Caribbean and
South America. 33
The Arua, like the Tupinamba and many of the
16 tribes of Amazonia and the Guianas, painted their
Of the family Sparidae, not found in the Amazon
bodies with vegetable dyes, most commonly using
acording to Golding, Fishes of the Forest, 2980,
the red pulp of the berry of the Urucu/Annotto
ch. 2.
or Bixa orellana, and the black dye from the
17
The marine sole of the family Soleidae and order unripe fruit of the genipapa or Genipa americana.
Pleuronectiformes has been found in the fresh See Lévi-Strauss, “Use of wild plants”, in HSAI,
waters of the lower Amazon: Golding, 1980, p. 38. 1963, VI.477-9.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 135

42
34
Brazilian nutmeg, Cryptocarya moschata. The following two paragraphs are constructed from
35
Harcourt, Relation, 1626, pp. 30, 34, in Harris,
Earlier Harcourt expands “The sweet gummes of Relation, pp. 89-90.
inestimable value & strange operation in Phisick
& Chirurgery, are innumerable; there is yellow 43
Day, courtesy of Harcourt, refers to the morning
Amber, Gumma-Lemnia, Colliman, or Carriman, sea breeze which refreshes the coastal area of
Barratta, and many more which I omit”. the Guianas daily, see Harris, Relation, 1928: p.
Ambergris is an aromatic resin specific for certain 93, n. 1. Strong easterly breezes prevail in the
complaints; Gum elemi, Protium heptaphyllum, lower Amazon during the dry season.
P. guianense, a white-greenish resin. “Colliman,
44
or Carriman”, copaiba, Copaifera officinalis, a Paraphrased from “The relation of Master John
black, pitch-like resin, Harcourt said to be good Wilson of Wansteed in Essex, one of the last ten
for the cold, giddiness, back pain and gout. that returned into England from Wiapoco in
“Barratta” or Balata, Manilkara bidentata, was Guiana 1606, in Purchas his pilgrimes, 1625, IV,
excelent in the “cure of greene wounds”. See bk. 6, 1263.
Harcourt, Relation, 1613, p. 33, 1626, pp. 44-5; 45
Day’s statement is a rather free interpretation of
Harris, Relation, 1928, pp. 101-2. Wilson’s acount of his experience amongst the
36
Cayenne pepper acquired from the dried and Indians of the Wiapoco in the early 1600’s. “At
ground seeds and husks of a species of Capsicum, our returne to Wyapoco we gave to the Indians
especially C. annuum and C. frutescens. for their paines, and providing of us victuals in
Described by Harcourt, Relation, 1626, p. 46, in our journey na Axe, for which they would have
Harris, Relation, 1928, pp. 155-6 as “codded travelled with us two or three moneths time...
Pepper which commonly is called Guinea pepper: And for an Axe they found us victuals two
It is a good Spice for many uses: the Indians make moneths time at our houses, as Bread, and
an excellent Sauce therewith, which they Drinke, and Crabbes, and Fish, and all such
ordinarily use with their meate, and we have kinde of flesh as they killed for themselves, for
found it very good and wholesome. the same price. “The relation of Master John
Wilson of Wansteed in Essex, one of the last ten
37
Prepared from the immature fruit spikes of the that returned from Wiapoco in Guiana 1606”, in
allied plants Piper officinarum and P. longum. Purchas his pilgrimes, 1625, IV, bk. 6, 1263.
Harcourt, Relation, 1626, p. 46, in Harris,
46
Relation, 1928, p. 156, says “I have had a good North American colonies, like Virginia, had
testimony of another sorte of Spice, commonly experienced great difficulty in establishing a cash
called Long-pepper, which beareth (amongst the crop in their early years. The Guiana ventures
Druggists) a better price then the former [Guinea were a notable exception. The tropical forests
pepper]. provided instantly profitable returns.
47
38
Harcourt, Relation, 1613, pp. 28-9, 1626, p. 36, Day refers to Fry’s settlement. According to
Harris, Relation, 1928, p. 95, comments on the Jácome Raymundo de Noronha’s “Report” ([in
“great store of hony in the Country... being taken Lorimer] pp. 379-84), Fry’s group went out in the
out of trees and buries in the earth... The hony Barche Andevor and two patahes, one of the latter
and the waxe, are also good commodities for remaining in the river with the colonists.
merchandise”. 48
Day may have been alluding to the disorders which
39
Hard working. preceded the collapse of North fort.
40
The account of this incident is found in “Captaine 49
Day is relying on Harcourt’s account of the
Charles Leigh his voyage to Guiana and Portuguese assault on the foreign colonies in the
plantation there” in Purchas his pilgrimes, 1625, Amazon in 1623, which at that time left the
IV, bk. 6, 1251, and “Captaine Charles Leigh’s English and Irish settlements largely unscathed.
Letter to Sir Olave Leigh his Brother”, ibid., p.
50
1253. Tawyers worked skins into leather by soaking
them in alum and salt.
41
Harcourt, Relation, 1626, pp. 9-10, in Harris,
51
Relation, 1928, p. 147. Dealers in skins and hides.
136 John Day e “A Publication of Guiana’s Plantation” (1632)

Referências

Day, J., 1632. A publication of Guiana’s plantation, newly undertaken by the Right Honorable the Earle of
Barkshire (Knight of the most noble order of the Garter) and Company for that most famous River of the
Amazones in America. Wherein is briefly shewed the lawfulness of plantations for forraine Countries; hope
of the natives conversion; nature of the River; qualitie of the Land, Climate, and people of Guiana; with the
provisions for mans sustenance, and commodities therin growing for the trade of Merchandise: and manner
of the Adventure. With an answer to some objections touching feare of the Enemie. Printed by William Jones
for Thomas Paine, London.

Gilmore, R. M., 1963. Fauna and ethnozology of South America. Handbook of South American Indians 6:
345-464.

Golding, M., 1980. The fishes and the forest. Berkeley.

Harcourt, R., 1613. A relation of a voyage to Guiana, describing the climate, situation, fertilitie, prouisions and
commodities of that country, containing seuen provinces and other signiories within that territory; together
with the manners, customes, behaviors and description of the people. The pattent for the plantation of which
country, His Majestie hath granted to the said Robert Harcourt vnder the great seale. John Beale, for W.
Welby, London. [2nd ed., 1626].

Harris, C. A., ed., 1928. A relation of a voyage to Guiana by Robert Harcourt, 1613. Hakluyt Society, 2nd Ser.,
I.X, London.

Levi-Strauss, C., 1963. The use of wild plants in tropical South America. Handbook of South American
Indians 6: 465-486.

Lorimer, J., 1989. English and Irish settlement on the River Amazon, 1550-1646. The Hakluyt Society, London.

Purchas, S., 1625. Hakluytus posthumus or Purchas his pilgrimes. 4 vols.

Purchas, S., 1625a. Captaine Charles Leigh his voyage to Guiana and plantation there, p. 1251, in Purchas
his Pilgrims 4 (Book 6).

Purchas, S., 1625b. Captaine Charles Leigh’s Letter to Sir Olave Leigh his Brother, p. 1253, in Purchas his
Pilgrims 4 (Book 6).

Purchas, S., 1625c. The relation of Master John Wilson of Wansted in Essex, one of the last ten that returned
into England of the Wiapoco in the early 1600s, p. 1263, in Purchas his Pilgrims 4 (Book 6).

Williamson, J. A., 1923. English colonies in Guiana and on the Amazon 1604-1668, Oxford.
Capítulo 11

A VIAGEM DE PEDRO TEIXEIRA (1637-1639)

“Depois que os Filippes occuparam Portugal, foi um dos cuidados da côrte de Madrid descobrir
inteiramente o rio Amazonas, com o fim de communicar o Perú com as nossas colonias do Brazil
e Pará, e poderem transportar os generos daquelle continente pelos nossos portos, e pelo meio do
Amazonas lhes fica mais facil e commodo, a respeito das grandes difficuldades, que encontram
na conducção para os seus. Fizeram-se varias expedições, tanto pelo Pará, como pela parte do
Perú, mas todas infructuosas, até que enfim, o capitão-mór Pedro Teixeira, da guarnição do Pará,
mandado pelo governador Jacome Raymundo de Noronha, navegou o rio Amazonas, e entrou na
cidade de Quito. N’aquelle tempo foi reputada esta descoberta de não menor valor, que as que se
chamam famosas. Em Quito foi recebido Pedro Teixeira com grandes applausos. Olhava-se para
elle como para um homem extraordinario, superior aos perigos e difficuldades, que achou naquella
expedição, que se podem ver na relação, que della há escripta. Enfim, Pedro Teixeira adquiriu
immortal fama, e se pôz ao lado dos heróes da nossa historia; brilhando o seu nome nos annaes
portuguezes com tão distincta gloria como a dos Gamas e Cabraes. Na volta, pois, daquella viagem,
no rio Nápo, defronte das bocainas do rio do Ouro, ou Aguarico, plantou um marco, conforme as
suas instrucções, para servir de limite entre as colonias portuguezas e hespanholas, e logo tomou
posse pela Coroa de Portugal daquelle logar, e dos mais que se incluíam dentro dos mesmos
limites e demarcação. Fez-se de tanto um auto solemne, que se registrou nos livros da camara do
Pará, cuja copia se acha nos annaes historicos de Berredo”. (F. X. R. de Sampaio, in Anon.,
1839).

P edro Teixeira (Reis, 1938; Smith, 1990) nasceu em Castanheda, localidade situada próxima
de Coimbra, em Portugal. Acompanhou a expedição de Caldeira de Castelo Branco para fundar
Belém. A partir de 1616 suas ações mais notáveis se definem pelo enfrentamento dos holandeses,
que começavam a interessar-se pelo comércio dos produtos amazônicos, para o que tentavam
estabelecer feitorias na costa e nas margens do Amazonas. Em 1625 desalojou os holandeses de
seu forte no rio Xingu e expulsou alguns ingleses que se haviam assentado ao longo da margem
esquerda do Amazonas. Em 1626 subiu um bom trecho do Tapajós com o propósito de submeter
as populações de suas margens à escravidão. Três anos mais tarde, apoderou-se da fortaleza de
Tocujós, um assentamento inglês, segundo Markham, e holandês na opinião do Pe. Figueira. Por
essa época havia se produzido alguma tentativa de remontar o curso do Amazonas, como a do
Capitão-mor do Pará, Bento Maciel Parente, que obteve uma licença para tal fim, mas que resultou
em uma empresa falida, de igual que a iniciativa de Francisco Coelho de Carvalho, governador do
Maranhão e do Pará, que a tentou em 1633. O ambiente que se criara deve ter interessado Teixeira,
e neste estado de coisas chegou ao delta a expedição dos leigos franciscanos Diego de Brieva (Frei
Laureano de la Cruz chama-o consistentemente de Domingo de Brieva; cf. cap. 14) e Andrés de
Toledo (cf. Maldonado, s. d. [Fig. 11.1]; Marcellino da Civezza, 1879; ver também a relação de Frei
Laureano de la Cruz, cap. 14), que asseguraram ter descido o grande rio desde Quito.

A descida do Amazonas pelos leigos franciscanos


Com efeito, em 1635, esclarece Southey (1981: 429-430):
“tinha sida enviada de Quito aos índios do rio Aguárico uma missão franciscana. Um
capitão chamado Juan de Palacios ofereceu-se com alguns poucos soldados para escoltá-la,
compartindo os perigos e a glória da expedição, que chegou à província dos índios Encabelados,
onde o Aguárico faz junção com o Napo, demorando-se ali alguns meses a tentar sem resultado
a obra da conversão. De cansados, retiraram-se alguns missionários, mas o maior número
persistiu na empresa, até que Palacios foi assassinado pelos selvagens; então fugiram possuídos
de terror. Dois irmãos leigos e seis soldados perderam porém o ânimo ao pensarem na tremenda
jornada de regresso ao Peru, e, desesperando de vencê-la, entregaram-se ao rio, como antes já
fizera Orellana. Diego de Brieba e Andrés de Toledo eram os nomes dos frades; os dos soldados
138 A Viagem de Pedro Teixeira (1637-1639)

Figura 11.1. Frontispício do livro de Maldonado (s.d.), contando a viagem,


Amazonas abaixo, dos leigos franciscanos Diego de Brieba e Andrés
de Toledo
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 139

não os guardou a história. Todos chegaram a Belém sãos e salvos. Assim foi segunda vez navegado
o Amazonas de Quito até ao mar, e contudo pouco ou nada se ficou sabendo do seu curso. Tão
desfigurada com as fábulas do descobridor e adulterada com as mentiras do dominicano [Carvajal]
que o acompanhara, havia sido a história da primeira viagem, que o mais para que servia era
para induzir aventureiros em erros. Ursua entrara no rio-mar pelo Ucaiali e pelo Huallaga, mas o
diário que desta estranha expedição se escrevera, somente se ocupava com as atrocidades de
Aguirre, poucas informações dando a respeito da extensa tira de país por ele recorrida. Quanto a
estes últimos viajantes, vinham todos transidos de terror, e ao tornarem a ver-se entre cristãos,
só puderam dar uma vaga relação de nações antropófagas, a que haviam escapado. A única coisa
que resultava clara, era que nada obstruía a navegação deste poderoso rio por um curso de mais
de três mil milhas.
Fácil é de imaginar com que espanto não seriam vistos estes homens em Belém, e quão
cordialmente recebidos. Foram remetidos para S. Luís, onde o governador os interrogasse em pessoa.
(...) nada (...) pareceu mais próprio [ao governador Jacome Raymundo de Noronha] que explorar a
navegação interna entre o Brasil e o Peru, e tal aliança cimentar com os naturais, que jamais se
atrevessem os holandeses a atentar por esta via contra o Potosi. Serviço era este que a corte
especialmente recomendara (...). Também se diz que por este tempo resolvia o governador espanhol
um projeto de trazer os tesouros do Peru, Quito, Popaian e até do Novo Reino pelo rio gigante a Belém,
de onde achariam para a Europa mais curto e seguro caminho. De tão feliz e inesperada oportunidade
de levar avante este importantíssimo objeto lançou Raimundo ávida mão.
Declararam-se os viajantes prontos a volver bem acompanhados a Quito pelo mesmo caminho
que haviam trazido, e consequentemente preparou-se uma expedição, de que Teixeira havia de
ser o chefe. Receando sempre uma invasão dos holandeses, não queria o povo do Pará separar-se
de uma porção tão considerável da sua força, qual a que tinha sido fixada para este serviço, e
sobresteve-se na partida, enquanto contra ela se mandava uma representação a S. Luís; mas
peremptória foi a resposta de Raymundo.”

A primeira viagem pelo Amazonas acima, comandada por Pedro Teixeira


Em pouco tempo, organizou-se a expedição que por primeira vez conseguiria subir o curso do
Amazonas, sob o comando de Teixeira. Partiu ele do Maranhão a 25 de julho de 1637, passando
por Belém do Pará a 28 de outubro de 1637, com setenta soldados e mil e duzentos flecheiros e
remadores indígenas, perfazendo com mulheres e escravos um total de duas mil pessoas, que se
embarcaram em quarenta e cinco canoas.
Continua Southey (p. 431):
“Mais do que eram capazes de prestar haviam tomado sobre si os guias; a corrente os
trouxera para baixo, e enquanto ela os arrastava, estavam seguros de se acharem na verdadeira
estrada; mas encontrar passagem pelos intrincados canais deste prodigioso rio acima, era obra
de muita paciência e grande dificuldade. Muitos dos índios desertaram, e todo o esforço, toda
influência, toda a arte de Teixeira foi precisa para impedir que o resto os seguisse. O estratagema
que melhor efeito surtia, era asserverar-lhes que estavam a chegar ao termo da viagem, e mandou
Bento Rodrigues de Oliveira com oito canoas adiante, como para preparar quartéis. Era este
brasileiro de nascimento, acostumado a semelhante modo de viajar, e senhor da língua tupi, que
falava como a materna; criara-se entre os naturais, e, homem de grande penetração, entendia-
lhes a natureza e os olhares como a linguagem, de sorte que muito o respeitavam os índios,
crendo dele que lhes sabia ler no pensamento. Foi ele reconhecendo o caminho e deixando sinais
e instruções em todos os pontos e estâncias do rio, o que aos outros servia de não pequena
excitação para que prosseguissem a ver dia por dia as novas que nestas estações encontravam; e
Teixeira sempre a levantar-lhes os espíritos abatidos com protestações de que mais um bocado
de perseverança chegaria ao termo da viagem. Assim foram avançando até que a 3 de julho do
ano seguinte [1638] chegaram ao lugar onde Palacios tinha sido morto, e aqui, tendo por necessário
assegurar-se a retirada, postou o comandante a maior parte do seu pequeno exército sobre as
margens de formoso rio, onde caía na grande corrente, e o comando deu-o a Pedro da Costa
Favela e Pedro Baião de Abreu. Com o resto seguiu para Paiamino, primeiro estabelecimento dos
castelhanos nesta direção, e que fica na província de Quixos, a cerca de oitenta léguas de Quito.
Aqui deixara Bento Rodrigues suas canoas e recado que partia por terra para Quito. Seguiu-o
Teixeira por país montanhoso e agreste até alcançar Baeza, lugar então chamado cidade, mas
hoje um deserto. Já então se sabia da sua vinda, e ordens eram dadas para supri-lo de todo o
necessário a ele e à sua gente. Ao aproximar-se de Quito, o clero, a câmara, e os moradores lhe
saíram ao encontro em procissão; corridas de touros se deram em memória da sua viagem, e
enquanto com as honras que merecia o festejavam, remetiam ao vice-rei do Peru o diário e mapa
do rio por ele preparados”.
140 A Viagem de Pedro Teixeira (1637-1639)

A 2 de janeiro de 1639 Pedro Teixeira redigiu, em Quito, uma Relação da sua jornada Amazonas
acima, endereçada ao presidente da Audiência de Quito. O manuscrito dessa Relação encontra-se
na Biblioteca da Ajuda, em Lisboa, e foi publicado por Jaime Cortezão (1950), sendo traduzido por
Porro (1993: 120-125), que aqui transcrevemos. Há nela algumas referências, poucas e incidentais,
a animais:

“RELAÇÃO DO RIO DAS AMAZONAS [POR PEDRO TEIXEIRA]

Nesse grande sítio tem Sua Majestade uma verdes e se tirarão metais se os buscarem; neste
fortaleza que chamam ‘O Presépio’, situada na Curupá faz desaguadouro o grande rio de Parnayva
Cidade de Belém; dista do mar 25 léguas [e] fica na que corre ao sul; terá de largo três quartos de légua,
banda do leste, numa ponta de terra firme mui lindas águas e melhores terras, de uma parte e de
saudável e fertilíssima de todos os frutos da terra e outra muito cheia de índios corpulentos, os rostos
muitos de Espanha, como são melões, melancias, pintados de riscos tão cerrados que ficam
pepinos, hortaliças, romãs, laranjas, cidras, limas enegrecidos e têm por nome Seruna [Juruna], que
doces, toranjas, figos, algumas uvas de cachos tão quer dizer boca negra; é gente tão valorosa que
grandes que pesam três e quatro libras, e tudo com quando saem em suas canoas à guerra levam as
tão lindo sabor que excede às de Espanha. Está mulheres consigo e tão confiantes nelas que pelejam
situada a dita fortaleza sobre uma grande enseada os maridos e elas fiam seus algodões conversando
que ali faz o rio, tendo à vista três caudalosos rios; umas com outras. Não há ninguém que dê relação
o primeiro se chama Capim, o segundo Oscaza do nascimento desse rio, a não ser que vem de muita
[Acará?], o terceiro Moysu [Moju], todos abundantes terra adentro.
de alguns peixes e muita caça do mato. Tem a
enseada fundo limpo, de seis até vinte braças Atravessando esse rio vai-se correndo terra até
próximo à terra e deibaixo da artilharia, ainda que os Tapajós, que distam oitenta léguas do Curupá, e
aberta a baía. Tem algumas ilhas de onde com pouco todo esse caminho é despovoado sobre o rio, mas a
custo se pode defender; tem ainda outro sítio, na duas ou três léguas terra adentro são incontáveis
costa da mesma parte do leste, que os índios os índios que há; usam já, todos os deste quadrante,
chamam Porto do Sol, que é o melhor do mundo de flechas ervadas tão venenosas que vertendo
para sua defesa, e basta para sê-lo estar no mar; mesmo um pouco de sangue não há remédio algum,
perto há muitíssimas choças dos portugueses, feitas nem os que as usam o conhecem; são todos
com escravos deles, e alguns povoados de índios notavelmente carniceiros, comendo-se uns aos
libertos. outros como fazem todos os do rio. Os tapajós estão
situados na boca de um grande rio que para mim é
A segunda fortaleza está situada no Curupá,
braço do de Pernaíba porque a mim o afirmam
a 100 léguas da cidade de Belém; a povoação tem
alguns naturais. Terá este povoado de 15.000
por nome São José; o forte Santo Antônio está
moradores [vecinos] para cima [e] no rio
também por este lado. Atributase [atravessa-se] para
muitíssimos. Aqui trataram mal os religiosos de São
ir lá, Camutá, o rio dos ocatins, o rio de Yguape, o
Francisco que desceram desta cidade de Quito,
rio de Pacaja, o rio de Guanapus, todos rios mui
tirando-lhe o hábito ao padre Fr. Andrés de Toledo
caudalosos e com tal número de índios de diferentes
dando-lhe alguns empurrões, e ele lhes pôs o nome
nações que é impossível podê-los nomear; o [rio] de
de baruirrojas [barbaroxas?] por as terem tingidas
Tocantins, por outro nome das Pedras, tem fama
e riscadas [as faces?] como os Xeruuna [Juruna].
de conter muitas riquezas, e por não haver gente
Neste mesmo povoado mataram alguns homens de
não se tem sabido a verdade. Esta fortaleza do
Francisco de Orellana, que ainda hoje há árvores
Curupá tem fama, [mas] não defende coisa alguma
das estacas de sua cerca; no mesmo lugar fizemos
por estar sobre uma grande barranca; é somente
as nossas [pousadas?] quando lá viemos.
para conservação dos índios alforriados que vivem
ali próximos, e para correr a costa do cabo do Norte, Deixando este rio caminhamos para oeste
por onde continuamente entram os inimigos a umas 80 léguas, tendo o rio sempre de duas léguas
povoar e comerciar com os Aruaca, Aragoazi, Comaú a duas e meia de largura até um estreito que não
e todos os moradores de Tocusingue [Tauregue?]. É tem mais que um quarto de légua, mas tão fundo
uma mata de mais de 50 léguas até Genipapo, pela que a 80 braças não se pôde tomá-lo. Tem lindas
beira do rio, e mais de 150 léguas pela terra adentro; praias para fortalezas e defesa do rio e lindos sítios
tem umas 15 nações de índios diferentes e cada junto à terra e ainda que despovoado junto ao rio
nação tem grande número de povoados, gente muito de uma banda e outra, bem perto daí é tanto o
irmanada com os estrangeiros e mui grandes gentio como nas demais partes. Deste sítio para
soldados [guerreiros] e por sê-lo, e em defesa de cima volta a alargar-se o rio com tal largura que
seus compadres [estrangeiros] lhes custou a vida a nos foi mister vir sempre pela mão esquerda [de
mais de 15.000 almas; toda a dita terra [é] mui plana quem sobe] para não desviar do nosso rumo, e
de savanas com mui grandes pastos para gado, e assim de outra parte [a margem norte] até o rio
as mais terras [próprias para] tudo que lhes Negro não darei razão. Havia 120 léguas deste sítio
enviarem para o sustento humano; [é] terra arenosa [o estreito de Óbidos] até os Tupinambá; esta nação
e há algumas matas, principalmente de Yuaguoara é de gente mui feroz carniceira e nunca quis
coru até Genipapo, donde dizem que saem as pedras conhecer sujeição; por isso vieram fugidos do Brasil
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 141

rompendo por terra e conquistando grande número pusemos o nome de Rio do Ouro por terem os
de gentios até chegar ao grande rio e sítio onde hoje moradores quantidade feito em panmetas
vivem. Eles nos deram muitas notícias das [palhetas?] que traziam nas orelhas e narizes e do
Amazonas, muito averiguadas, que estavam qual trouxemos algum para cá, e feito o exame
somente a seis jornadas dali; como não as vi só o achou-se ser algum vasinilla [?] e outro ouro de 21
afirmo por verdade; haverá dessa gente e de outras quilates e mais, e de tudo isso há muitíssima
diversas nações que eles [elas?] têm sujeitas ao seu quantidade porque todos os índios o trazem, e muito
domínio uns 300 povoados e mais não terão, e até cobre, de que não tratei por ser conhecido. Lindo
500 ou 800 casales [casais, casas?] cada um. Aqui gentio o que o usa, bem arrumadas as suas
se acabam as flechas ervadas perigosas e ainda que mulheres, de bons modos e confiantes trazendo de
pouco por todo o rio as haja, não matam como as comer a nossos remadores e aos soldados.
sobreditas. E [fomos] caminhando dali por outros sete dias
Desta [regi]ão até o rio que, segundo as sem gente no rio até o primeiro povoado dos
Omágua, havendo no meio [do caminho] um grande
infomações, nasce no Cusco, haverá 40 léguas; o
rio que chamam das Barreiras por tê-las grandes
rio [é] muito caudaloso e de muita profundidade.
na boca; corre ao sul [e] não dão os naturais relação
Pusemo-lhe o nome de Madeira, pela muita que
do seu nascimento, somente que vem de muito longe
trazia consigo. Tivemos informações de haver nas
e [é] todo povoado de muito gentio e valentes, porque
[suas] cabeceiras espanhóis e padres e suínos e
nenhum se atreve a (...); dizem [que vem] também
muito gado; o rumo que ele segue e os demais rios
do Peru. Ao cabo dessas [sete] jornadas começam
de importância e suas alturas os declarará o piloto-
os Omáguas que usam as cabeças chatas; ocuparão
mor, que por ser ofício seu não tratei de guardá-los
de longitude do rio 100 léguas e terão de povoados
de memória. Haverá daqui até o rio [Negro] umas
400, pouco mais ou menos; gente mui carniceira, e
60 léguas; terá [este] na boca pouco mais de meia suposto que todos os do rio o são e se comem uns a
légua, mas a pouca distância para dentro vai outros, esses passam da conta porque não usam
aumentando com largura de duas a três léguas; no de outra carne senão a humana e têm por troféu as
que andei por ele, que foram duas jornadas, este caveiras dos que matam penduradas em suas casas
rio é notável pela grandeza e muita profundidade, e são tão grandes comedores que a grossura da gente
que sem ser verão, no tempo que entrei nele não os faz todos pelados [?] e essa gente desceu fugida
lhe vi baixios nem coroa alguma; a água é muito dos Quijos; a maioria dos povoados são grandes e
má para se beber por ser mui grossa, mas entram abundantes de todo o necessário.
nele muitíssimos rios de água clara e boa de se
beber; não corre nada o rio [?] e está [t]ão] enegrecido Deixando esses povoados, até o Rio Napo nos
que parece fino azeviche e [mais] colhendo um pouco Quijos, é todo o rio despovoado nas margens, mas
dela é clara como as demais. Tem estreitos para se terra adentro não há terra despovoada, assim como
fazer todas as defesas que se quiserem, com muita em todo o rio, atrevo-me a afirmar, é incontável a
pedra para fortalezas e casarios, lindas praias para gente que há. É incrível a fertilidade desse rio,
fazendas; as terras prometem muita fertilidade pelo porque tem muitos peixes de diferentes qualidades,
que vi; nos povoados de índios que conheci são muitas carnes do mato, muitíssima mandioca e
tantos [os índios] que não me atrevo a lhes dar o ainda muitíssimas frutas de diferentes castas,
número; [é] gente de guerra, mais política que os grande número de tartarugas [e] madeiras em
grande número de diversos tipos; há muitíssimos
demais que até ali vivem; em seu poder encontrei
rios que descem ao rio tanto de uma parte como de
alguns pedacinhos de prata metidos em madeiras
outra; entre eles o grande rio Tungurágua e outro,
que traziam nas orelhas, mas pouca quantidade [de
o Curaray, dos quais aqui há notícia em todo o rio;
prata?] tem o rio, assim como pouco peixe, mas
[há] grande número de casos [?} de duas ou três
muita tartaruga e muitíssima caça; pusemo-lhe o
castas; há também grande quantidade de algodão,
nome de Santa Luzia porque no seu dia chegamos
de que fazem os moradores suas camisetas e mantas
lá; aqui fizemos 500 fanegas de farinha de mandioca
de que se servem. Todo esse grande rio é navegável
para nosso resgate [suprimento], por haver e podem chegar embarcações grandes até o rio do
muitíssima, e milho, que [é] o sustento de todos os Ouro partindo de Curupá com as monões que
moradores de um e outro rio. começam pelo [dia de] São João, e com elas pode-se
Deixei contentes e satisfeitos todos os vencer a correnteza, e dali para cá se pode navegar
motradores do rio de Santa Luzia com dádivas de senão a remo, por falta de ventos, que começam ali
machados, cosillas [ou ‘cuchillos’ = facas?], anzóis, a ser contrários, que é fundo [e] até o Napo há muito
miçangas, pentes e outras coisas, por me parecer (...). Há neste rio mais de 30.000 ilhas e muitas
assim conveniente ao serviço de S. M. pelo muito delas habitadas e mui grandes; pelas muitas voltas
que aquelas partes prometem. E saindo dali voltei que faz há tão grande número de léguas que por
a buscar o caminho do rio Marañón, e metido nele vezes, chegando a cinco e seis graus ao sul e muito
ao (...) equinocial [?].
caminhei sete dias [no] despovoado, embora tenha
encontrado nuitas canoas de que não pude tomar A cidade do Pará está ao sul em dois terços [de
fala, e ao cabo delas entrei no princípio da máquina grau] menos alguns minutos. Os holandeses têm
do gentio que está assentado sobre o rio, tão vizinho chegado sondando [explorando] até o sítio de caça
um do outro que em 300 léguas de caminho pode- Juro [?}, quatro jornadas inteiras acima do Tapajós
se dizer [que] é somente um povoado e termina onde e têm feito muitíssimo esforço para povoá-lo.
142 A Viagem de Pedro Teixeira (1637-1639)

Todo esse grande rio é mui saudável porque advertidas imaginadas somente pelo inimigo a ser
não tem calor rigoroso nem frio que obrigue a por ali mais curso [?], a causa é porque nunca têm
aumentar as roupas; prova de [que é] sadio [é] não sabido [?] até hoje o Porto do Sol, e por essa causa
haver um enfermo em toda a máquina de povoados não o cursam. E da outra banda, além dos muitos
que há. baixios que tem, a cada hora mudam-se os canais,
A quantidade de léguas não a declaro, nem as com tanto perigo que não há ano em que não se
conveniências da máquina dos rios que entram no percam navios por causa da pororoca, que é tão
grande Marañón, porque como tenho dito não tomei impetuosa que colhendo um navio surto, ainda que
de memória seus rumos nem alturas, uma vez que esteja a quatro amarras o faz em pedaços; e disso só
o piloto-mor o fez e disso dará relação o sobredito. eu posso dar verdadeira relação, por tê-lo navegado
e experimentado por algumas vezes e encontrado
Suposto que esse grande rio tem 83 léguas de navios de grande porte perdidos; e todo o contido
boca, desde a sua ponta irá se parar até a ponta de
nessa relação o certifico e juro pelos Santos
Araguoari; com tudo isso é defensável, porque na
Evangelhos ser tudo verdade por ter andado nele e
costa não pode ficar o inimigo por causa das muitas
visto com meus olhos e me ter certificado de muitas
correntezas [e] entrando [pelo rio], como tudo são
ilhas e canais diferentes, ainda que pelas armas coisas para não parecer fabuloso.
não se possa impedir sua presença, com balsas de Feita nesta cidade de São Francisco de Quito
fogo [?] não pode passar nenhuma, e suposto que a aos dois dias do mês de janeiro de mil seiscentos e
S. M. lhe têm enviado relação e eu o grande canal trinta e nove anos.
que dá na parte que chamam cabo do Norte são
O Capitão Pedro Teixeira.”

O vice-rei ordena a viagem de regresso, Amazonas abaixo


Continua dizendo Southey (pp. 431-432):
“Ao conde de Chinchon, então vice-rei, de tão grande consequência pareceu esta expedição
no estado em que se achavam os negócios, que deu ordem a Teixeira para voltar pelo mesmo
caminho, a verificar e aperfeiçoar a sua planta, levando consigo duas pessoas, que, seguindo
para Madri, apresentassem a el-rei as informações colhidas. Alguma dificuldade houve em achar
estas pessoas. Juan Vasques de Acuña, corregedor de Quito, ofereceu sua pessoa e fazenda para
este serviço, requerendo que se lhe permitisse fornecer à sua custa tudo o necessário; não se
aceitou a oferta, quiçá por ser indispensável ali a sua presença; outros aventureiros qualificados
para o cargo não apareciam, até que recorrendo-se ao provincial dos jesuítas, nomeou este o Pe.
Cristóbal de Acuña, irmão do corregedor, e então reitor do colégio de Cuenca, e o Pe. Andrés de
Artieda, professor de teologia nas escolas de Quito. Levaram ordem de levantar a planta do rio,
notando quanto houvesse que notar. Acompanharam-nos quatro religiosos da ordem de Nossa
Senhora das Mercês, um dos quais, por nome Fr. Pedro de la Rua Cirne, fundou mais tarde
conventos da sua regra em Belém e S. Luís”.

Teixeira reembarca (16 de fevereiro de 1639). Ação contra os Encabelados


“Tão difícil achara Teixeira o caminho de Paiamino, que na volta preferiu embarcar perto
dum estabelecimento chamado Archidona, sobre uma das correntes que formam o Napo, e onde
ainda hoje os missionários das bandas de Quito costumam fazê-lo para ir às poucas reduções
que têm sobre este rio. Não pequena alegria causou a sua chegada a Pedro da Costa e ao
destacamento que com ele estava. Por muito tempo não se haviam conservado em termos amigáveis
os Encabelados: temiam os selvagens, que neles se vingasse a morte de Palacios, e os portugueses
não iam longe de aproveitar a ocasião para a desforra. Rebentara a guerra, muitos dos naturais
haviam sido mortos, e mais de setecentos feitos prisioneiros. O nome vernáculo desta nação
ninguém o refere; os espanhóis lhe puseram nome do costume singular de deixar crescer os
cabelos até incômodo comprimento, às vezes até debaixo do joelho, moda comum a ambos os
sexos. Viviam em contínua guerra com tribos limítrofes da mesma margem do rio. Por arma
tinham o dardo, e eram antropófagos; cobriam de folhas de palmeiras suas casas, arte em que
revelavam bastante engenho” (Southey, 1981: 432).

Teixeira toma posse da Amazônia para a Coroa Portuguesa


“Aqui se deteve Teixeira alguns meses, tirando vingança desta gente, e construindo novas
canoas, por terem sido destruídas com a guerra a maior parte das que ali deixara. E aqui,
segundo os portugueses, tomou ele posse das suas descobertas para a Coroa de Portugal em
nome de Filipe IV, tomando mãos cheias de terra, e atirando-a ao ar, enquanto proclamava que
se alguém soubesse de causa justa ou impedimento, que a esta posse se opusesse, aparecesse
e o declarasse ao escrivão. Não se apresentando contraditor algum, apanhou o escrivão terra,
que pôs nas mãos de Teixeira, fazendo assim entrega e apreensão para a coroa de Portugal”
(Southey, 1981: 433).
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 143

A chegada a Belém. Fim da vida de Teixeira


A 12 de dezembro de 1639 entrou Teixeira na cidade de Belém, onde foi recebido com as
merecidas honras.
Parece ser que a 28 de fevereiro de 1640 Pedro Teixeira tomou posse do cargo de Capitão-mor
e Governador do Pará, que exerceria até maio de 1641. Nesse momento seu desejo era regressar a
Portugal, pelo que, segundo conta Bernardo Pereira Berredo, deixou o governo do Pará a Francisco
Cordovil Camacho. Quando preparava sua viagem a Lisboa, uma moléstia, contraída pouco tempo
antes, tirou-lhe a vida (Díaz Maderuelo, 1986: 32-33).

O relato do Pe. Alonso Rojas


Será visto no capítulo seguinte.

O relato do Pe. de Acuña


O relato da viagem de Teixeira pelo Amazonas abaixo foi publicado pelo Pe. Cristóbal de
Acuña em 1641. Dele ocupar-nos-emos no capítulo 13.

O relato do Conde Pagan


Blaise François de Pagan, Conde de Merveilles, nasceu em 1604 e morreu em Paris em 1665.
Engenheiro militar, distinguiu-se nas batalhas de Montauban (1621) e Nancy (1633) e serviu
como marechal-de-campo em Portugal em 1642. Perdeu um olho na batalha de 1621 e o outro
numa batalha em 1643. Passou a viver em Paris, após deixar Portugal, e, apesar de sua cegueira,
dedicou-se ao estudo de matemática, história e geografia. Em 1646 publicou seu Traité des
Fortifications, que gozou de grande sucesso e foi traduzido para o holandês, tendo aparecido uma
segunda edição francesa. Escreveu também Theorie des plantes (1657) e Tables astronomiques
(1658). Em 1655 publicou Relation historique et geographique de la grande riviere des Amazones
dans l’Amerique, que teve uma segunda edição no ano seguinte, tendo sido traduzido para o inglês
em 1661. Como não tivemos acesso a essa obra, não sabemos se nela são feitos comentários aos
animais amazônicos.
Muitos consideram este livro de Pagan como uma versão meramente parafraseada de Acuña.
Todavia, uma leitura mais atenta revela outras fontes, como o autor, de fato, declara no título:
“extraite de divers autheurs et reduite en meilleure forme”. O valor da obra de Pagan é demonstrado
na dedicatória ao Cardeal Mazarino, na qual ele o urge a tomar posse do Amazonas e estabelecer
várias colônias. Demonstra que essa aventura não seria difícil e que grandes exércitos e muitas
peças de artilharia não seriam necessários. Os mapas publicados por Pagan foram de grande
importância. O Barão do Rio Branco citou Pagan no segundo volume de seu Second Mémoire (pp.
85-94) e reproduziu o mapa em seu Atlas (Moraes, 1983: 646).
La Condamine (1751: 192, nota) escreveu o seguinte sobre a obra de Pagan:
“Ce n’est que depuis peu de temps que j’ai pu rencontrer un exemplaire de la Relation
française de la rivière des Amazones, par le Comte de Pagan, imprimée à Paris en 1655, quinze
ans après celle du Père d’Acuña avoit à Madrid en 1640, & que M. de Gomberville, de l‘Acad.
Françoise, traduit en 1682. J’ai trouvé dans celle du Comte de Pagan une petite carte fort
défectueuse de la rivière des Amazones, mais antérieure à celle du P. Fritz, & qui ne se trouve
point dans l’édition espagnole du Père d’Acuña. Quelques uns ont pris la Relation du Comte de
Pagan, qui ne cite personne, pour une paraphrase du Père d’Acuña, mais comme Pagan contredit
& relève cet Auteur en divers endroits, il faut necessairement qu’il ait eu d’autres memoires. Il y
a tout apparence qu’il les avoit acquis en Portugal, où il fut envoyé pour servir en qualité de
Maréchal-de-camp en 1642, deux ans après la revolution qui mit la maison de Bragance sur le
thrône; il est probable qu’il les aura tirés de quelqu’un des Portugais de l’expedition de Pedro
Teixeira, Lieutenant du Roi, ou Capitam-mor du Pará, qui avoit remonté l’Amazone en 1637, &
fait le voyage de Quito. Peut-être même Pagan aura-t-il eu communication de quelques mémoires
envoyés directement du Pará à la cour de Lisbonne, pour suppléer à ceux que de Jesuite espagnol,
nommé par l’Audiance royale de Quito pour accompagner Teixeira dans son retour, avoit apportés
à Madrid à Philippe II [sic, IV] dont le Portugal venait de secouer le joug”.
144 A Viagem de Pedro Teixeira (1637-1639)

Referências
Anon., 1839. Extracto da Viagem que em visita e correição das povoações da Capitania de S. José do Rio
Negro, fez o ouvidor, e intendente geral da mesma Francisco Xavier Ribeiro de Sampaio, nos annos de
1774 e 1775. Revta Inst. hist. geogr. Brasil 1(2): 100-122.
Brunet, J. C., 1865. Manuel du Libraire et de l’Amateur de Livres... Tome Quatrième. Librairie de Firmin
Didot Freres, Paris. [Data a la. edição de Pagan de 1656].
Cortezão, J., 1950. O significado da expedição de Pedro Teixeira à luz de novos documentos, pp. 173-204, in
Anais do IV Congresso de História Nacional, Rio de Janeiro, 21-28 de abril de 1948, Vol. 3 (Tomo especial
no. 28 da Revista do Instituto histórico e geográfico brasileiro, em 5 volumes), Rio de Janeiro.
Da Civezza, Fr. M., 1879. Saggio di bibliografia geografica storica etnografica sanfrancescana per Fr. Marcellino
da Civezza M. O. In Prato per Ranieri Guasti.
Díaz Maderuelo, R., 1986. G. de Carvajal, P. de Almesto y Alonso de Rojas. La aventura del Amazonas.
Historia 16, Información y Revistas, S. A., Madrid.
Jiménez de la Espada, M., 1880-1889. Viaje del Capitán Pedro Texeira aguas arriba del Río de las Amazonas
(1638-1639) [sic]. Boln Soc. geogr. Madrid 9: 209-231, 1880; 13: 192-218, 266-275, 417-447, 1882; 26:
159-193, 1889.
Jiménez de la Espada, M., 1889. Viaje del capitan Pedro Texera, aguas arriba del Rio de las Amazonas (1638-
1639). Publicado por... Imprenta de Fontanet, Madrid.
[Maldonado, J.], s.d. Relacion del primer descubrimiento del Rio de las Amazonas, por outro nombre, del
Marañon, hecho por la Religion de nuestro padre San Francisco, por medio de los Religiosos de la Prouincia
de S. Francisco de Quito. Para informe de la Catolica Magestad del Rey Nuestro Señor, y su Real Consejo de
las Indias. S. ed., s. l. [Diz Moraes (1983: 511) sobre o livro de Maldonado: “This Relacion bears neither
the name of the printer, nor the place of printing, nor the date. It must have appeared in 1642, as it refers
to Christovão de Acuña’s book as having been ‘sacado por estos dias’. It was presumably printed in
Madrid, with the aim of explaining to the Court the actions of the Franciscan Order, and as is the case
with all documents of this kind, it bears no imprint. This account is the only contemporary printed
document to narrate the famous journey made by the Franciscans, Diego de Brieva and André de Toledo,
who sailed down the Amazon River in October, 1636, and arrived in Pará in February, 1637. Brazilian
historians do not cite this work. The account of the journey is based on the ‘Descubrimiento del rio
Marañon, llamado de las Amazonas, hecho por la Religion de S. Francisco’, a manuscript published in
1878 by Friar Marcelino de Civezza, and other sources. I have not compared the text of these two douments,
but read first one and then the other, with an interval of several years between, and believe they are very
similar. The Relacion contains a dedication, or preface, signed ‘Fr. Ioseph Maldonado’. Friar José Maldonado
was ‘Comisario General de las Indias’, and wrote from Quito. It is divided into five chapters, the first ones
relating the travels of the Franciscans between 1632 and 1635 in the upper Amazon, and next follows the
descent of Diego de Brieva and André de Toledo down the river to Pará, accompanied by six Portuguese
soldiers and two Indians. The last two chapters deal with the journey up the Amazon by Pedro Teixeira,
the welcome he received in Quito, and his return to Pará. It is evident that this document is of great
importance and full of valuable information. It is also of the greatest rarity. [...]. I know only of the copy in
the New York Public Library”].
Moraes, R. B. de, 1983. Bibliographia brasiliana. Rare books about Brazil published from 1504 to 1900 and
works by Brazilian authors of the Colonial period. Revised and enlarged edition. [2nd vol.] M-Z. UCLA Latin
American Center Publications, University of California, Los Angeles & Livraria Kosmos Editôra, Rio de
Janeiro.
Pagan, B. F. de, 1655. Relation historique et geographique de la grande riviere des Amazones dans l’Amerique
par le Comte de Pagan. Estraicte de divers Autheurs, & reduite en meilleure forme. Avec la Carte d’icelle
Riviere, & de ses Provinces. Cardin Besongne, Paris. [2a. ed., 1656, com apenas esta frase diferente no
título: “Avec la carte de la mesme Riviere, et de ses Provinces”].
Pagan. B. F. de, 1661. An historical & geographical description of the great country & river of the Amazons in
America. Drawn of divers authors, and reduced into a better form, with a map of the river, and of its provinces,
being that place which Sr. Walter Raleigh intended to conquer and plant, when he made his voyage to
Guiana. Written in French by the Count of Pagan, and dedicated to Cardinal Mazarine, in order to a conquest
by the Cardinal’s motion to be undertaken. And now translated into English by William Hamilton, and
humbly offered to His Magesty, as worthy his consideration. John Stakey, London.
Porro, A., 1993. As crônicas do rio Amazonas. Tradução, introdução e notas etno-históricas sobre as antigas
populações indígenas da Amazônia. Vozes, Petrópolis.
Reis, A., 1938. A grande aventura de Pedro Teixeira pelas aguas do Rio-Rei. Revta Inst. hist. geogr. Brasil 6(1-
2): 333-349.
Smith, A., 1990. Capítulo 4. Pedro Teixeira. Tornando o Amazonas português, pp. 171-196, in seu Os
conquistadores do Amazonas. Quatro séculos de exploração e aventura no maior rio do mundo. Editora
Best Seller, São Paulo.
Southey, R., 1981. História do Brasil. Vol. I. Editora Itatiaia & Editora da Universidade de São Paulo, Belo
Horizonte.
Capítulo 12

A “RELACIÓN DEL DESCUBRIMIENTO DEL


RÍO DE LAS AMAZONAS” DO PE. ALONSO DE ROJAS (1639?)

O texto atribuído ao Pe. Alonso Rojas, Relación del descubrimiento del Río de las Amazonas,
hoy S. Francisco de Quito, y declaración del mapa donde está pintado, a primeira fonte a documentar
a viagem feita pelo Capitão Pedro Teixeira desde a foz do Amazonas até Quito, está na Biblioteca
Nacional de Paris. Na Biblioteca Nacional de Madri existe uma cópia (Ms. 5859), que traz anexo
um mapa do Amazonas.
Alguns autores atribuíram erroneamente a autoria do manuscrito a D. Martín de Saavedra y
Guzmán, presidente da Audiência de Santa Fé, porque existe uma carta sua antecedendo a
“Relación”. Jiménez de la Espada (1889), entretanto, ao publicar o manuscrito de Madri, apontou
o Pe. Alonso de Rojas, da Companhia de Jesus, como seu autor mais provável, baseado numa
afirmação de Antonio de León Pinelo; e ressaltou ainda que vários parágrafos da “Relación” haviam
sido citados pelo Pe. Cristóbal de Acuña, em seu Nuevo descubrimiento del gran río de las Amazonas
(1641; os capítulos XX, XXI, XXII, XXIII reproduzem os parágrafos 2, 3, 5, 7 e 8 da “Relación”).
Quanto ao mapa citado nesse texto, está perdido na cópia de Paris, mas existe na de Madri.
Jiménez de la Espada atribuiu-o ao piloto da expedição de Teixeira, Bento da Costa (ou Benito de
Acosta), baseado numa afirmação do Pe. Laureano de la Cruz (1942). Bento da Costa parece
também ter sido o informante do Pe. Alonso Rojas, segundo se depreende da leitura do texto.
Melo-Leitão (1941) publicou uma tradução desse texto em português.
Segundo Díaz-Maderuelo (1986: 23): “La copia manuscrita de la Biblioteca Nacional de Madrid
se compone de 31 folios numerados, com letra bastante clara; probablemente se trata de una
copia contemporánea del original. Lleva el título de Descubrimiento del Río de las Amazonas y sus
dilitadas (sic) Provincias, que precede a una carta de D. Martín de Saavedra y Guzmán al conde de
Castrillo, presidente del Consejo Real de las Indias; outra carta al rey; un capítulo de una carta
del presidente de la Audiencia de Quito al del Nuevo Reyno, y la cédula de Felipe II al virrey del
Perú, Marqués de Cañete. Seguidamente comienza la Relación del Descubrimiento del río de las
Amazonas, hoy San Francisco de Quito, y declaración del mapa donde está pintado. Desde aquí el
texto se divide en 29 párrafos sin numerar. Todos los folios llevan un doble perfil que enmarca el
texto, com adornos en las partes superior e inferior”. Esse MS foi editado por Díaz-Maderuelo.
Como a carta de D. Martin de Saavedra y Guzmán é datada de 23 de junho de 1639, e partes
do texto da Relación, como já dito antes, foram citados por Cristóbal de Acuña, pode-se pensar
que o texto tenha sido escrito em fins de 1639. Nada se sabe sobre o Pe. Alonso Rojas.
Na seqüência transcrevemos o texto original da Relación (manuscrito de Madri). Notar-se-á
que apenas poucas referências são feitas a animais, e quase sempre desde o ponto de vista da
alimentação.

“RELACION DEL DESCUBRIMIENTO DEL RIO DE LAS AMAZONAS,


HOY S. FRANCISCO DEL QUITO, Y DECLARACION DEL MAPA DONDE ESTA PINTADO”

“La ciudad de S. Francisco de Quito en los y gobierno de esta ciudad famosa, hoy llave de la
reinos del Perú, no sólo famosa por su sitio y por nueva Cristiandad, es la que asigna ministros
edificada sobre montes en la más alta cordillera que evangélicos que llevan la fe de Cristo por aquellas
corre por todo este nuevo orbe, sino también por extendidas provincias, sujetando a las llaves de
cabeza de su provincia y asiento de la real Audiencia, S. Pedro más almas que las que hasta ahora
es hoy, por elección del cielo, de las más felices conocen a Dios en la América; es la que que há de
ciudades del mundo. Nueva Menfis que Dios há dar capitanes valientes que sujeten todas estas
elegido por metrópoli de un dilatado imperio, por el provincias, y los gobernadores que las rijan.
que se há descubierto en las vastísimas regiones Prueba de su fidelidad e de que, señora, há de
del río de las Amazonas; por tenerlo a su jurisdicción sujetar a todas las naciones ahora descubiertas,
146 A “Relación del Descubrimiento del Rio de las Amazonas” do Pe. Alonso de Rojas (1639?)

es que corriendo el río Grande de las Amazonas más es de 40 brazas, número que señala el mapa hasta
de 2.500 leguas, no se avecina tanto a ninguna este río Negro, no porque en todas partes tenga 40
ciudad de las Indias, cuyos muros llegará a besar a brazas de fondo, sino porque son muchas más, y
no impedirlo las ásperas montañas. Pero llegarán señalanse en éstos para significar su profundidad
cerca; el embarcadero principal del río dista de la y para dar a entender que el más bajo será de 40
ciudad de Quito ocho días de camino, corta distancia brazas; y así, por toda esta distancia puden navegar
en regiones tan extendidas. Bien se pueden gloriar navíos de enemigos, deseosos de descubrirle;
Babilonia de sus muros, Nínive de su grandeza, navegación a que no impiede la angostura del río,
Athenas de sus letras, Contantinopla de su imperio, pues, como habemos dicho, está muy esplayado y
que Quito las vence por llave de la Cristiandad y participa de las brisas del mar. Después que el río
por conquistadora del Mundo. A esta ciudad, pues, Negro se le há juntado, baja mucho el de las
pertenece el descubrimiento del río grande de que Amazonas, subiendo al Oriente, y tiene de fondo
ahora hablamos. las brazas que señalan los números del río.
El de las Amazonas, hoy S. Francisco del Quito, Todo este río está poblado de islas, unas
corre de Oriente a Poniente, esto es, como dice el grandes, pequeñas otras, tantas en número, que
navegante, Leste a Oeste [sic]. Desde la provincia no se pueden contar; de suerte que no se navega
de Los Quijos, en el reino de Quito, hasta desaguar distancia de una legua sin encontrar con islas. El
en el mar del Norte, hace siempre su curso vecino a mapa las señala con unas Oes verdes. Las mayores
la Equinoccial, a la banda del Sur, por dos grados, islas de este río son 4 ó 5 leguas de largo, otras de
3, 4, 5, 6 y dos tercios, en la mayor altura. Tiene de 3, otras, de 2, otras de 1 y otras muy pequeñas; y a
largo de la dicha provincia de los Quijos hasta la estas baña el río, cuando cresce a las avenidas, por
mar, donde desagua por una boca, 1.600 leguas grandes que sean. Estas islas grandes habitan indios
castellanas; esto es, por la orilla que se acerca a la
en diferentes poblaciones y aldeas; las pequeñas
Equinoccial, porque por la contraria orilla serán más
cultivan aprovechándose de ellas para sembrar
de las leguas, por tener más vueltas y senos el río,
yucas y maíz en grande cantidad; y para que con
que todo él camina culebreando por tan luengo
las avenidas y crecientes no se pierda el fruto y el
espacio; y así, en el mapa que va con esta Relación,
trabajo de la sementera, usan de la traza siguiente.
se atiende por longitud por la orilla que está vecina
– Cavan en la tierra unos sillos o cuevas muy
a la Equinoccial.
profundas y allí echan la yuca y la tapan muy bien,
La longitud deste río desde su nacimiento cuando las aguas bañan la isla; y después que se
hasta llegar (a lo) descubierto de la provincia de los retiran y se descubre la tierra la sacan y comen,
Quijos se ignora. Hay quien piensa que es su origen porque no se há podrido com la humedad. Siempre
en las provincias del Cuzco y sierras dél; otros dicen la necesidad fue invencionera, y así si enseñó a la
que cerca del Potosí. La causa de esta variedad es, hormiga a fabricar trojes en las entrañas de la tierra,
porque a sus principios es my ganchoso y dividido para guardar su grano y el alimento, qué mucho
en diferentes brazos y no se conoce el principio a el diese traza al indio bárbaro para que previniese su
cual se agregan los otros ríos; y si tiene su origen o daño y guardase su sustento? Pues es cierto que la
principio en el Cuzco o Potosí, será toda su longitud Providencia divina más cuida de los hombres que
desde su nacimiento a su ocaso de más de 2.500 de los pájaros.
leguas. De latitud o ancho es muy vario en lo
Desaguan en este famoso río en la distancia
descubierto, porque por unas partes se explaya una
dicha de las 1.600 leguas otros muchos ríos y muy
legua, por otra dos, por otra tres, y por la boca,
caudalosos, los que llegan a tributarle en sus
cuando llega a desaguar en el mar, pagándole
corrientes en las primeras 300 leguas; subiendo
tributo, parece que quiere disimular su vasallaje y
hasta el fin de las 1.600 descubiertas, son también
no conocerse inferior al mar y se convierte en un
sin número los ríos en desaguar. Los principales
nuevo Océano, explayándose 84 leguas. El mayor
señala el mapa con sus nombres en las dos orillas
estrecho donde este río recoge sus aguas es de media
del río. Los más caudalosos son tres, dos a la banda
legua, en altura de dos grados y dos tercios, lugar
del Sur; al uno llaman el río de la Madera por la
que sin duda previno la Providencia divina,
mucha que trae de ordinario, y tiene la boca una
estrechando el dilatado mar (llamémosle así), y
legua. A la banda del Norte está un río muy grande
dando nombre a la congregación de sus aguas, de
con legua y media de boca y las aguas tan negras,
río; disimulo que usó, para que en su angostura se
que se distinguen de otras, efecto que dio nombre
pudiese fabricar una fortaleza, aunque venga muy al río llamándole Negro. El piloto mayor, de quien
poderosa. Dista esta angostura 300 leguas del mar después hablaremos, que navegó dos o tres días
donde desagua el río, y desde la boca se puede dar por este río Negro, dice que según la noticia que
aviso al fuerte (si allí se fabricase) con canoas y pudo tener de algunos indios, nace este río de unas
embarcaciones pequeñas, de la venida de los sierras vecinas al Nuevo Reyno de Granada y que
enemigos, en 10 ó 12 días. en su origen se divide en dos brazos; el uno de ellos
La profundidad del río es grande, como se verá con el nombre de río Negro desagua después de largo
en el mapa por los números que están señalados curso en el de las Amazonas, el outro viene a
dentro del río. Por partes no se halla fondo desde la desaguar en el mar del Norte a vista de la isla de la
boca, cuando desagua en el mar, subiendo hasta el Trinidad, y piensan que este río es el famoso río
río Negro, distancia de casi 600 leguas. Lo más bajo Orinoco. Los demás ríos que perdiendo sua
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 147

nombres mueren en el de las Amazonas, son los españoles, y en cierto encuentro que los indios
comunes y casi iguales; cuyos nombres señala el tuvieron con ellos, mataron al capitán Juan de
mapa en las bocas de los ríos; y la distancia que Palacios. Hallándose sin caudillo, desampararon la
hay de río a río señala a la orilla de los ríos, cuando provincia soldados y religiosos dividiéndose en dos
desaguan en el río grande. cuadrillas. Algunos de los religiosos y parte de los
Este es el famoso río de las Amazonas que corre soldados se volvieron a Quito, otros seis soldados
y baña las más fértiles y pobladas tierras que tiene con dos religiosos legos, llamados Fr. Andrés de
el imperio del Perú, y sin usar de hipérboles, lo Toledo y Fr. Domingo de Brieva, en una canoa se
podemos calificar por el mayor y más célebre río del dejaron llevar de la corriente río abajo, no con outro
Orbe. Porque si el Ganges riega toda la India y por intento, a lo que pienso, más que llevados del divino
caudaloso oscurece el mar cuando desagua en él, impulso y obligados de la falta de mantenimiento.
haciéndole que se llame Sinu Gangetico y por outro Echaron de ver que Dios favorecía este viaje,
nombre golfo de Bengala; si el Eufrates, por río porque los ayudó en algunos sucesos milagrosos.
caudaloso de la Siria y parte de la Persia, es las El primero fue, que dudando cuál orilla del río
delicias de aquellos reinos; si el Nilo riega la mayor seguirían, echaron suertes com muchos Sanctos
parte de África, fecundándola con sus corrientes, el escritos en papel y salió por dos veces san Joseph a
río de las Amazonas riega más extendidos reinos, mano derecha, que cae a la banda del Sur. El
fecunda más vegas, sustenta más hombres, segundo fue, que abriéndoseles la canoa,
aumenta con sus aguas a más caudolosos océanos; embarcación pequeña y vieja, Fr. Domingo, religioso
sólo le falta para vencerlos en felicidad, tener su de conocida virtud, la tocó com la mano invocando
origen en el Paraíso, como de aquellos ríos afirman el favor divino y la dio sana, de suerte que pudieron
gravísimos doctores que lo tuvieron. Del Ganges navegar en ella. El tercero, que llegando al fuerte
dicen las historias que desaguan en él treinta de portugueses, de que después hablaremos, libres
famosos ríos y que tiene arenas de or o: de innumerables peligros, la canoa se hundió en la
innumerables ríos desaguan en el de las Amazonas, orilla de la mar sin ser más de provecho, como quien
arenas de oro tiene, tierras riega que atesoran dice, hasta allí fue útil, y que pues ya los dejaba en
innumerables riquezas. El Eufrates se llama así a tierra de cristianos y con otras embarcaciones, ella,
letificando, como notó San Ambrosio, porque con como inútil, se iba a pique. El cuarto, que entrando
sus corrientes alegra los campos, de suerte que (si) en tierras de innumerables bárbaros y muchos
los riega este año asegura abundante cosecha para dellos caribes, no les hicieron mal. Más antes les
el que viene. Del río de las Amazonas afirman los dieron sustento para su viaje. El quinto, afirman
que le han descubierto, que sus campos parecen los soldados de Fr. Domingo, llevado de los indios a
paraísos y sus islas jardines, y que si ayuda el arte que visitase sus enfermos, invocaba sobre ellos el
a la fecundidad del suelo, serán entretenidos dulcísimo nombre de Jesús y con el contacto de
paraísos y sus islas jardines. sus manos los daba sanos. No dudo yo que Dios
La felicidad de la tierra que riega el Nilo celebra hiciese estos milagros; lo que se extrañará es, que a
Luciano en estos versos: Terra suis contenta bonis, vista de aquellos infieles no les hiciera argumento,
non indigna mercis – Aut Jovis; in solo tanta est a mi ver, claro, que Dios quiere dilatar su fe entre
fiducia Nilo! [A terra, satisfeita de seus bens, não aquellas gentes.
necessitava nem das mercês de Júpiter, tal é sua Llegaron después de muchos días de
confiança no Nilo]. No necesitan las provincias navegación los religiosos y soldados al Gran Pará,
vecinas del río de las Amazonas de los extraños población de portugueses, y de allí pasaron al
bienes; el río es abundante de pesca, los montes de Marañón, cabeza del gobierno, y lo que resultó de
caza, los aires de aves, los árboles de frutas, los su llegada fue, que el gobernador portugués de
campos de mieses, la tierra de minas, como después
aquellas provincias envió una armada de 47 canoas,
veremos. Este nuevo Ganges, pues, este alegre
con general, soldados y muchos indios, al
Eufrates, este fecundo Nilo, es el que Dios há
descubrimiento cierto del río, los cuales llegaron a
descubierto en este siglo para gloria de la Corona
Quito, como después diremos. A la boca del río de
de España y para bien de infinitas almas.
las Amazonas, a la orilla que cae a la parte del Sur,
La causa de su descubrimiento fue la en medio grado de altura hay una población de
siguiente. Muchas veces inquietó el deseo de portugueses que llaman la ciudad del Gran Pará.
descubrirle así por el mar como por los reinos de Tiene esta ciudad para su defensa un castillo
Quito y nunca llegaron los deseos a navegarlo todo; fabricado sobre un peñol, a la boca del río que hace
porque, aunque muchos, no llegaron a cumplir sus cara al mar, y una ensenada delante en figura de
deseos. Finalmente, el celo de la salud de las almas media herradura. Tiene el fuerte parapetos que caen
pudo más que la cudicia del oro. Arrojándose el río al río y a la ensenada, cubiertos de teja hasta la
abajo algunos religiosos en compañía de soldados retirada de las piezas, para la defensa de las cureñas
españoles, cuyo caudillo era el capitán Juan de en que están encavalgadas veinte piezas de artillería,
Palacios, llegaron a la provincia de los Encabellados, las dos de hasta 30 libras de bala, 18 de a 8, de a
numerosa mucho, donde se alojaron, deseosos los 10 y 12 libras de bala. Y en la plaza de armas,
religiosos de su conversión y los españoles de aunque pequeña, casa de vivienda para el capitán y
ayudarles. De allí, por justas causas, se volvieron a outra casa separada para la munición, labrada
Quito algunos de los religiosos, otros quedaron con de piedra. Está labrado todo el fuerte con
148 A “Relación del Descubrimiento del Rio de las Amazonas” do Pe. Alonso de Rojas (1639?)

muralla de terrapleno sobre cimientos de cantería e doctrinas y pueblos son los religiosos los curas. Hará
con foso, y en la puerta no hay puente levadizo, tres años que salió del Gran Pará para España un
pero tiene reducto de dos puertas con troneras. Hay Padre de la Compañia, llamado Luís Figueira,
dificultad en la entrada de los navíos en este puerto hombre grave y anciano, el cual fue a informar al
y ordinariamente esperan marea para no tocar en rey del estado destas provincias y particularmente
los arrecifes que arroja la punta de la ensenada. de algunas islas que están en el río de las Amazonas,
Subiendo el río arriba 40 leguas, hay outra para que se acudan con ministros evangélicos que
población pequeña de portugueses a la banda del enseñen la fe a los naturales dellas, que son casi
Sur, que llaman Conmutá [Cametá], la cual no tiene infinitos, y con menos que con muchos ministros
defensa ni fuerte. Más arriba, cien leguas dél está no se puede acudir a todos. Tenía este Padre orden
el castillo de los portugueses adonde llegaron los de S. M. que le informara del estado de las
dos religiosos y seis soldados que dijimos bajaban provincias, y así fue a hacerlos personalmente.
derrotados por el río; está fabricada la dicha fortaleza En estas poblaciones de portugueses hay
en un lugar alto, a la orilla del río, con plataforma y pocas mujeres que sean de su calidad; si vinieren
en ella cuatro piezas de artillería de hierro colado, de España, serían bien recibidas. Los indios que
la una de 4 y la otra de 5 y la otra de 7 y la otra de están reducidos en las tierras que poseen los
8 libras de bala, puestas en carretones de madera portugueses y los que son amigos y pueden,
bajos encarados al río, con parapetos hasta los convertidos, recibir la fe católica, son mas de un
pechos. Luego se sigue la plaza de armas y una millión. Hablan diferentes lenguas y entienden todos
casa de munición, en donde vive el condestable de una general que corre toda la costa de Brasil; y esta
la artillería; y todo el dicho sitio está cercado de lengua entienden también muchas naciones de
muralla con cimientos de piedra. Por la parte de indios del río de las Amazonas, subiendo por el río
afuera tiene foso y en la entrada puente levadiza de más de 400 leguas.
madera; de manera que, levantando la puente, está La ciudad del Marañón fue primero fundación
bien defendido el dicho fuerte. Fuera dél viven los de franceses, a los cuales venció y echó de aquel
soldados portugueses y los indios amigos, y allí cerca punto Jerónimo de Albuquerque y después Gaspar
del fuerte hay otras poblaciones de indios subjetos de Sosa. Los dos entraron en la ciudad y mataron
a los soldados. Hasta este castillo há llegado algunas 600 hombres al enemigo y lo despojaron; y vinieron
veces el enemigo holandés y se hace fuerte en la al Brasil, porque supieron que el enemigo estaba
orilla contraria, que cae a la banda del Norte; y poblado en aquel paraje y desde allí infestaban las
cuando los soldados portugueses los han visto costas del Brasil, haciendo presas de importancia;
alojados, han dado sobre ellos más de diez veces en y desde ese tiempo no há vuelto el enemigo a poseer
diferentes años y los han vencido y quitado los la tierra. Había en la isla del Marañón, que tiene 18
fuertes que habían fabricado y aprisionado a los leguas de box [perímetro], más de setenta aldeas de
que quedaron vivos; de suerte que en ocasión indios y en cada una más de 300 de pelea, cuando
llegaron a tener cautivos en su poder más de 1.600 el portugués la entró. Algunos años después vinieron
holandeses; y entre los despojos cogieron una nao los portugueses conquistando los indios de la costa
grande con 20 piezas de artillería, en donde venía hasta el paraje adonde solían venir navíos de
el gran piloto Matamatigo, que por orden de los holandeses y franceses, pero no tenían poblaciones,
gobernadores de las islas rebeldes venía a descubrir y así le fue fácil al portugués edificar ciudad en la
de propósito este río y llegó con su nao hasta la boca del río de las Amazonas. De parte de los indios
provincia de los Trapajosos, que dista 200 leguas hubo contradicción y con ellos tuvieron encuentros
del Gran Pará. y batallas los portugueses con muertes de muchos
Desde el Gran Pará corriendo la costa del mar soldados y de gran número de indios. Desde la
a la banda del Sur por el rumbo de Leste Sueste, fundación del Gran Pará hasta hoy, que habrá 18
distante 130 leguas hay una ciudad llamada S. Luís años, están aquellas provincias por la de la Corona
del Marañón en una isla que está en la boca del río de Portugal.
Marañón, que desagua en el mar. Es este paraje de Con la llegada de los dos religiosos de S.
altura de dos grados e dos tercios, al Sur. Esta Francisco y los seis soldados y noticias que dieron
ciudad es metrópoli de todas las poblaciones que del río que habían navegado, determinó el gobernador
tiene el portugués en estas partes, en donde asiste enviar gente práctica que lo descubriese todo y llegase
el gobernador. Hay en la ciudad del Marañón tres hasta la ciudad de Quito. Para esto nombró por
conventos de religiosos, de San Francisco uno, otro general de este descubrimiento a Pedro Texera, el
de Ntra. Sra. del Carmen y outro de la Compañia de cual en 47 canoas de mucho porte y con 70 soldados
Jesús. En la ciudad del Gran Pará hay dos portugueses y 1.200 indios de boga y guerra, que
conventos, uno de frailes Franciscos y otro de con las mujeres y muchachos de servicio serían por
Carmelitas. En todo este gubierno y sus poblaciones todos 2.500 personas, partieron del Gran Pará en
no hay más de seis clérigos sacerdotes, que descubrimiento del río a principio de agosto del año de
administran los sacramentos por operarios para tan 1637. Duró la navegación hasta llegar a Quito tanto
copiosa mies. Como es posible que puedan los tiempo, porque venían con grande espacio descubriendo
ministros del Evangelio, celosos de la salvación de los ríos y marcando los puertos. El dicho piloto mayor,
las almas, tolerar tal desamparo? En todas las que tiene medidas todas las jornadas y distancias,
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 149

dice que se podría navegar el río, subiendo por él, Los indios Omaguas visten camisetas y mantas
en dos meses. Todo este río de las Amazonas, en de algodón pintadas con pincel y de diversos colores,
las islas, en las orillas y en la tierra adentro, está azul, amarillo, anaranjado, verde y colorado, muy
poblado de indios y tantos en número, que para finos, de donde se colije que hay madera o yerbas.
significar su multitud, dijo el piloto mayor de esta En las orillas del río de las Amazonas, espacio de
armada, Benito de Acosta, hombre práctico en estos treinta leguas, uno de los seis soldados que bajaron
descubrimientos, que navegó el río y todos los que el río con los dos religiosos de S. Francisco sabía
en él entran hasta llegar a Quito, marcando la tierra hablar la lengua de los Omaguas, y así, encontrando
y adviertiendo sus propiedades, que son tantos e con indias en una canoa, les puso unas gargantillas
tan sin número los indios, que si desde el aire de avalorio y otros dijes y les dijo en su lengua que
dejaren caer una aguja, há de dar en cabeza de indio no les haría mal, porque no era gente de guerra,
y no en el suelo. Tanto es (su) numerosidad, que no que les dijesen a sus maridos que les trujiesen
pudiendo caber en tierra firme, los arrojan a las comida, y ellas les respondieron que ya habían oído
islas. Y no sólo el río de las Amazonas está tan decir que los hombres barbados no les hacían mal,
poblado de gente, sino también los ríos que en él que ellas irían a hacer que les trujesen comida; y
desaguan, por los cuales navegó el dicho piloto tres fueron y brevemente vinieron adonde estaba este
y cuatro días y dice que cada uno de estos ríos es soldado con sus compañeros, más de quinientos
un reino muy poblado y el río grande un mundo indios hombres y mujeres cargados de maíz, yucas
entero mayor que lo descubierto hasta ahora en toda y tortugas. Estos indios dijeron al soldado que los
la América. De suerte que tiene por cierto que son entendía, que en la banda del Norte, adonde ellos
más los indios de estos ríos que todo el restante de iban una vez cada año, había unas mujeres y se
las Indias descubierto; porque las provincias no estaban con ellas dos meses, y si de las juntas
tienen número y la tierra adentro está tan poblada habían parido hijos, se los traían consigo, y las hijas
como las orillas; de suerte que si todos los sacerdotes quedaban con su madre, y que eran unas mujeres
que hoy hay en las Indias se ocupasen en la labor que no tenían más de un pecho, muy grandes de
de tan extendida viña, estuvieran bien ocupados y cuerpo, y que decían que los hombres barbados eran
faltaran ministros. suas parientes, que se los llevasen allá. A estas
indias llaman comúnmente las Amazonas. [Nota:
Hasta ahora no hay otros cristianos en estos Nesta passagem é introduzida pela primeira vez a
ríos sino con los pocos que los portugueses han idéia de que as Amazonas possuíam só um seio, e
convertido en el Marañón y en el Gran Pará y en las que eram aparentadas aos brancos!].
demás sus poblaciones. A muchos destos dotrinan
los Padres de la Compañía, que andan en perpetuas Estos mismos soldados y dos religiosos,
misiones, visitándolos, convirtiéndolos, cuando bajaron el río, llegaron a unas muy dilatadas
baptizándolos, porque de outro modo no pueden pr ovincias, cuyos habitadores llaman los
acudir con todos ni estar en puesto fijo, por la falta portugueses los Estrapajosos. Estos agasajaron a
que hay de operarios; y sin aquestos puestos que los religiosos y soldados y por señas les dijeron que
visitan, tienen algunas dotrinas proprias suyas. fuesen con ellos por un río arriba, en cuya orilla
Preguntado Fray Domingo, religioso de quien arriba hallaron una población grande. Entráronlos en una
hablamos, si en el Pará y tierras que había visto halló casa muy grande com maderas labradas, con galdas
michos cristianos, respondió: Desengáñense, no hay [?], con mantas de algodón entretejidas en ellas hilos
cristianos en este gran mundo descubierto sino son de diversos colores, en donde pusieron una hamaca
los que doctrinan los benditos Padres de la Compañía para cada uno de los huéspedes, de palmito, labrada
de Jesús. Todo este copioso rebaño está sin pastor, con diferenters colores, y les dieron de comer cazave
vendido a sus vicios y subjeto al Demonio, y pescado. En esta población vieron los soldados
condenándose cada día infinitas almas por falta de calaveras de hombres, arcabuces, pistolas y camisas
obreros evangélicos, dejando el campo libre a Lucifer, de lienzo, y avisando desto después a los
para que reine en tas vastas provincias y sea adorado portugueses, les dijeron que aquellos indios habían
de aquellos miserables que viven en tinieblas y muerto algunos holandeses, que llegaron hasta
sombra de la muerte, sin que haya quien los alumbre aquellas provincias, cuyas eran aquellas calaveras
con la luz del santo Evangelio. y armas.

Las naciones que habitan en el rio principal y Unas naciones con otras tienen continuas
sus adjuntos, son muchas y de diferentes guerras. Usan de flechas, dardos y otras amas
costumbres, las más no son belicosas, algunas semejanres a éstas. Los Omaguas juegan bien del
tienen valor, pero ninguna de ellas es muy brava ni dardo, porque son muy diestros en este género de
fiera; esto se entiende en lo descubierto, porque no armas. Los Trapajosos usan de flecha y veneno tan
hay noticia de las demás naciones que habitan la fino y eficaz, que no tiene contrayerba. Muchas
tierra firme. Todos son idólatras que adoran dioses destas naciones o las más son caribes, muy
falsos, no tienen ritos ni cerimonias para venerarlos, aficionadas a carne humana, y así se comen a los
ni templos de sus ídolos, ni sacerdotes. A los que cautivan en la guerra, y ésta es causa principal
hechiceros temen, a quienes consultan, y éstos al de sus guerras; y también pelean por quitarse las
Demonio, de quien reciben oráculos y con embustes tierras los unos a los otros.
engañan a los miserables indios. Casi todas estas Muchas veces en el tiempo que duró la
naciones andan desnudas, los hombres en todo el navegación de la armadilla, ni viniesen portugueses
cuerpo, las mujeres de la cintura para arriba; lo a ella, vinieron gran suma de indios a ella, con
restante tapan con unas como pampanillas. canoas pequeñas, mostrándose afables con los
150 A “Relación del Descubrimiento del Rio de las Amazonas” do Pe. Alonso de Rojas (1639?)

portugueses, porque, aunque a los principios camelote de aguas, con ondas negras, de que se
temían, por la novedad de la gente, que no habían labran canoas y escritorios muy curiosos.
visto outra vez, a quienes ellos llamaban hijos del Tienen los indios mucha carne de monte, como
sol, después que comunicaban con los soldados y son dantas, venados, puercos monteses, ycoteas,
recibían de los algunos dijes como cuchillos, pacas, conejos y otros animales comestibles. Hay
anzuelos y muchas veces pedazos de paño roto, que en la montaña gran suma de monas de diferentes
colgaban al cuello como reliquia, les traían después maneras, algunas tan grandes, que muerta una, no
refresco de maíz, yuca, camotes, plátanos, cañas la pudo cargar un negro. En el Marañón hay algunos
dulces y mucho pescado, todo esto en abundancia caballos y yeguas; espérase multipliquen estos
y liberalmente, sin pedir paga. Nunca acometieron ganados de suerte que llenen los campos, según son
los indios en el río ni fuéra del a los españoles, y si de fértiles. Del Brasil trujeron los portugueses al
alguna vez saltaban en tierra los soldados y se principio de las fundaciones cabras y puercos, de
entraban por la montaña distancia de una legua a que hay gran cantidad, trujeron también un carnero
descubrir la tierra, iban delante indios amigos, a y una oveja, y aunque la oveja parió, no crió el
quienes acometían los de la tierra, pero en llegando cordero, porque con el vicio de la tierra estaba tan
los soldados, huían enemigos, y después, llamados, gorda, que no le dio leche y le dejó morir; y así no
venían de paz y ofrecían sustento com liberalidad. multiplicaron. Hay muchas aves en la montaña y
Las orillas todas destos ríos están pobladas árboles del río, regaladas, para el sustento humano,
todas de árboles tan altos, que suben a las nubes. como son pavas del monte, paujíes y perdices tan
Es llana la tierra al principio, y después se van grandes como gallinas, en grande abundancia;
levantando unas sierras muy altas, por partes se algunas matan flechándolas, otras, levantándolas
descubre a los campos con valles o sabana, sin de sus puestos, vienen revoleando a caer en el río y
árboles, y algunos matorrales. Todo lo que anduvo allí cogen a manos. En el Pará y Marañón hay
por la tierra adentro el piloto mayor en diferentes muchas gallinas de España. Todas estas provincias
partes del río, es montaña limpia de matorrales y son abundantes de mantenimientos y capaces de que
poblada de muy buenos árboles; éstos son altos y si en ellas se sembrasen las semillas de España, se
gruesos. Hay mucha diferencia de maderas de que darían con abundancia. Las frutas son muchas y
se pueden fabricar navíos en cualquier parte en la diferentes, todas las que son propias de Indias
distancia toda deste río. Las especies de árboles son mejores y más regaladas que en otras partes. En
muchas, cedros, ceibos y otros de grandísimo algunas provincias hay caña dulce muy alta y muy
grueso. Hay en algunas orillas palo de campeche, gruesa y por todo el río infinidad de cacao, tanto
granadillo y palo colorado que parece brasil y gran que se pueden cargar naos; de tabaco hay mucho,
cantidad de zarzaparrilla. Hay muchas resinas en y beneficiado es muy bueno. Todas las provincias
los árboles, en tanta abundancia, que con ella brean vecinas a este río son de tal temple, que ni hay calor
las canoas y se pueden brear muchos navíos. La que enfade ni frío que fatigue, ni variedad que sea
fabrica de las naos se facilita con estas montañas, molesta, sino una primavera continua. A las
así por la grande abundancia de maderas y brea, mañanas hace algún frío y todo el año es uniforme,
como por el mucho algodón que se coge y teje y por que no varían los tiempos por estas tierras.
tener muy grande abundacia de pencas, de que se Debajo de la línea los días son iguales. Los campos
hace la pita, y árboles de palmas, de que se puede que no están con sementeras, producen flores y los
haver jarcia tan fuerte como de cáñamo. De los más llevan gran cantidad de batatas sin beneficio
árboles, por ser muy gruesos, se labran con facilidad de la tierra, sino que de suyo las produce. La
canoas. En las provincias de Marañón y Pará se montaña por partes es espesa y abierta, y todo el
fabrican canoas. En las provincias de Marañón y río están entoldadas sus orillas de árboles y
Pará se fabrican de grande porte. El modo de palmares, que rinden cocos en abundancia. De las
labrarlas es la forma siguiente: cortan el tronco del palmas hacen los indios vino regalado. Frutas
árbol dándole el largo que quiere y el ancho todo silvestres hay muchas por la mañana y a la orilla
del tronco, y después de haberle chaportado del río, y en los troncos de los árboles se coge gran
[desmochado] las ramas, le van escavando por de cantidad de miel de abejas. La cera es prieta, y
dentro, dejándole de boca media vara; por allí lo beneficiada, terná color amarillo. En el Marañón y
desentrañan, y luego llenan al hueco de agua Pará no se gasta otra para misas. Hállase miel en
caliente y lo cercan de fuera con fuego, con lo cual todo el río, que es regalo para el que navegare. Todos
el madero se ablanda de manera, que poniendole los años son apacibles y la tierra un retrato de la
dentro unos palos, le van abriendo todo lo que que Dios prometió a su pueblo, y a tener los
quieren y dejan el plano grueso cuatro o seis dedos ganados de Judea, dijéramos que la regaban
y los costados dos y tres; de suerte que vienen a arroyos de leche y miel. Afirmó el piloto mayor,
tener estas canoas de ancho, las más angostas, dos que por muchas alabanzas que digan del río y sus
varas, y las más ordinarias nueve palmos. Y después provincias, son más los bienes que hay en ellas, y
que les há dado todo el ancho que quieren, quitan si el arte ayudara a la naturaleza, pudieran labrarse
el agua y el fuego y se vuelve a enderezar el madero. jardines en donde ni la diversidad de temples ni
Algunas embarcaciones destas son capaces de cien las inclemencias de los tiempos pudieran ofender
hombres. Entre los árboles deste río hay uno que a los hombres. En la provincia llamada Culimán
llaman los portugueses burapiniona [muirapinima], [Solimões], vecina a los Omaguas, que corre más
de tanta estima como el palo del brasil; madera muy de 200 leguas, es cierto hay oro y mucho; colíjese
galana, porque toda ella está ondeada, como de que los indios traen planchas de oro colgadas
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 151

Figura 12.1. Macacos-aranha (apud Brehm)


152 A “Relación del Descubrimiento del Rio de las Amazonas” do Pe. Alonso de Rojas (1639?)

en las orejas y narices, de las cuales rescataron provincia de los Trapajosos. Alrededor de estos
algunas los portugueses en cantidad de más de 50 galpones vieron los portugueses muchas calaveras
ducados de los que llegaban a la playa, porque no de hombres; sospecharon serían de gente que
entraron la tierra adentro, y preguntándoles que de habían muerto y comido. Las hamacas donde
dónde sacaron aquel oro, respondieron que de unas duermen son de hojas de árboles o de pajas.
sierras allí vecinas, en donde lo había en tanta El piloto mayor, principal descubridor deste
abundancia, que si con los picos que traían las río, dice conviene mucho que S. M. mande edificar
manos cavasen la tierra, sacarían lo que quisiesen. un fuerte en el lugar y estrecho señalado y ponga
El mismo color de la tierra de esta provincia y otras en él presidio para impedir el paso al enemigo
indica que es tierra de oro. Entre las demás holandés, para que no suba por el río y se apodere
planchas, hallaron una que traía un indio en las de sus provincias, que como la embarcación es fácil,
orejas pendiente de un hilo de oro muy fino y muy apacible el río, los mantenimientos abundantes y
bien labrado, cuya labor no la pudo hacer sino quien los indios poco belicosos, será fácil al enemigo
supiese del arte de platero. No se pudo saber su navegar este río y aprovecharse de las riquezas y
artífice, por no haber lengua que preguntase a los frutos de la tierra.
indios; presúmese hay por aquellas provincias Esta fortaleza servirá de custodia material de
algunos naturales que llaman plateros. Hallaron tan extendidas provincias. A la espiritual custodia
también los soldados en algunas partes plata y convida Dios, por Isaías, a los mismos evangélicos,
señales de ella y mucho cobre, y se presume ser para que cultiven su viña, para que la guarden y la
tierra de muy ricos minerales y que, como está en defiendan: Ite (dice, capítulo 18), angeli veloces, ad
poder de bárbaros, no se aprovechan de su riqueza. gentem convulsam et dilaceratam, ad populum
Por todas partes corre este famoso río manso terribilem, ad gente expelinea. Por los ángeles cierto
y ledo, de suerte que todo es navegable, sin corriente es que de ordinario se entienden en las divinas letras
que impida a las embarcaciones, y por más que se los apóstoles y ministros del Evangelio; la frase ad
estrechen las aguas, nunca el río olvida su gentem expectantem seu lineae, lineae admite el
mansuedumbre, antes más bien por la parte más siguiente sentido, ‘Angeles míos, - dice Dios a los
angosta, que es el de media legua, en donde van las operarios de su viña que cultiváis el campo de mi
aguas de innumerables ríos encanaladas, es la iglesia y, misioneros del Evangelio, lo lleváis por
remotas provincias, apresurad los pasos, acelerad
corriente más mansa, sin que haya ni sumidero de
los vuelos ad gentem expectantem seu linea, line;
las aguas ni olaje que asombre: ordinaria condición
esto es, como explica Mendoza, ad gentem super
de ríos grandes, que mientras más fondo tienen,
quam est (?) Linea, ut destrua. Visitad veloces la
más disimulan el ruído, seguros de su riqueza y
gente que está en el extremo peligro de su salud,
caudal, de que hacen vana ostentacioón los arroyos
condenada sin duda a eternos castigos, si no los
pequeños, pues desde que se despeñan de las socorren los ministros evangélicos”. O querrá decir:
montañas las fuentecillas, bajan dando voces y ‘Id veloces, angeles míos, a las innumerables
avisando que tienen caudal de agua. Admira ver la provincias sobre las cuales tengo yo echados mis
grandeza deste río, que, como rey de los otros, jamás cordeles para edificar una nueva Iglesia; libradla
quiere descomponerse y antes guarda su magestad de la infelicidad con que vive y fabricad en ella el
con pasos graves; si ya no es que decimos, que no edificio de la fe; id a la gente que vive debajo de la
alterarse las olas, no hervir las aguas, ni rifar los Línea y para visitar sus provincias se pasa muchas
ríos cuando se encuentran este grande de las veces la Equinoccial; id ad gentem convulsam et
Amazonas ni cuando se estrechan en la angostura, dilaceratam, a una gente miserable, entregada a las
lo hacen para convidar a los ministros evangélicos, manos de sus vicios, a quien destroncan sus
facilitándoles el paso, para que lo naveguen y visiten pasiones; ad gentem expectantem, a las naciones
sus provincias, ofreciendo llevarlos sobre sus que aguardan nuestro socorro’.
hombros con toda seguridad y regalarlos con toda
Quién, según esto, no ejecutará el orden de
la fecundidad de sus campos.
Dios que intima su pr ofeta? A quien no
En todas las orillas de este gran río tienen sus enternecerán los suspiros de la gente que aguarda?
poblaciones los indios, unas grandes, pequeñas Quien, si tiene celo de la gloria Divina, consentirá
otras; de ordinario viven apartados en diferentes que el Demonio cause tan miserable destrozo en
rancherías. Una población hallaron los portugueses las almas? Quien no se apresurará los vuelos como
tan grande por una y outra banda del río, que ángel, que para socorrer a la gente que vive debajo
navegando todo un día a vista suya y comenzando de la Línea quiere Dios que sean veloces los pasos:
la navegación tres horas antes del día hasta que se ite, angeli veloces? Y para que no haya remoras
puso el sol. No pudieron dar fin a los edificios ni que retarden los de los ministros, todo le hace fácil
hallar llugar en que alojarse que no estuviese Dios, porque los infieles están aguardando abiertas
ocupado con casas y unas continuadas con otras. las puertas para recibirlos; la embarcación del río
Los que descubrieron la longitud de esta población los convida con su facilidad, las aguas con su
no pudieron saber si era muy ancha; el piloto dice pescado, la tierra con sus regalos y el temple con
que le pareció angosta. Las casas y edificios de todos su apacibilidad. Y pues Dios con tanto afecto
los indios son de madera, labradas con curiosidad exhorta a esta misión, confío en su Divina Magestad
y cubiertas de palmas; ninguna hay de piedra ni que han de venir infinitos misioneros que saquen
cubierta de teja. Por dentro están limpias y con aseo; de la sombra de la muerte estas almas y las lleven
no tienen alhajas sino son las que dijimos de la al cielo, haciendo oficio de ángeles”.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 153

Referências
Cruz, Laureano de la, 1942. Nuevo descubrimiento del río Marañón, llamado de las Amazonas, hecho por
religiosos de San Francisco, año de 1651. Biblioteca Amazonas, no. VII, Quito.
Diáz-Maderuelo, R., 1986. G. de Carvajal, P. de Almesto y Alonso de Rojas. La aventura del Amazonas.
Historia 16, Información y Revistas, S. A., Madrid.
Jiménez de la Espada, M., 1880-1889. Viaje del Capitán Pedro Texeira aguas arriba del Río de las Amazonas
(1638-1639) [sic]. Boln Soc. geogr. Madrid 9: 209-231, 1880; 13: 192-218, 266-275, 417-447, 1882; 26:
159-193, 1889.
Jiménez de la Espada, M., 1889. Viaje del Capitán Pedro Texeira aguas arriba del Río de las Amazonas.
Imprenta de Fortanet, Madrid.
Malfatti, C., 1952. Tres relaciones de viajes por el río Marañón, llamado también de las Amazonas. Barcelona.
Melo-Leitão, C. de, 1941. Descobrimentos do Rio das Amazonas. Companhia Editora Nacional, São Paulo.
[Col. Brasiliana, no. 203].
Capítulo 13

O “NUEVO DESCUBRIMIENTO DEL GRAN RÍO DE LAS


AMAZONAS” DO PADRE CRISTÓBAL DE ACUÑA (1641)

V imos no capítulo 11 os antecedentes que levaram o Pe. Cristóbal de Acuña a participar da


viagem de Pedro Teixeira pelo Amazonas abaixo, em 1639. Sua relação da viagem foi publicada em
1641 [Figura 13.1], e está transcrita abaixo. Muitos bibliófilos afirmaram ter sido essa edição
suprimida pelo governo espanhol, por haver sido publicada um ano após a separação de Portugal
da Espanha, e porque já não era aceitável à política de Felipe IV divulgar as notícias da
navegabilidade do Amazonas e a intenção dos espanhóis de tornar esse grande rio a via de
escoamento das riquezas do Peru, via o Pará. Sommervogel (1890, vol. 1, 41), entretanto, diz que
essa declaração, externada por Gomberville em sua tradução do livro de Acuña (1682), é pura
invenção desse autor. A razão da raridade do livro de Acuña, segundo o Pe. Manuel Rodrigues, em
seu El Marañón y Amazonas (1684), é que foram impressos poucos exemplares. Rich (1832) diz
que “não se pretendia provavelmente que fosse posto à venda, já que não tem as licenças e privilégios
usualmente prefixados a livros publicados nesse tempo”. A verdade é que por volta de 1684 este
livro era já extremamente raro. Gomberville teve que usar uma cópia achada com grande dificuldade,
e sabia da existência de apenas uma outra, na Biblioteca do Vaticano. Na segunda metade do
Século XIX, entretanto, com o aumento dos coletores de “Americanas”, começou-se a buscar por
todas as partes livros sobre a América, e umas quantas cópias do “Descubrimiento” apareceram
(Moraes, 1983: 11). Traduções para o inglês foram feitas em 1698 e 1859 (esta por Markham);
Melo-Leitão (1941) traduziu-o para o português, e uma outra edição em português surgiu
recentemente (1994); o original espanhol foi reproduzido em Iquitos, Peru, na série “Monumenta
amazonica” (Acuña, 1986).
Ao final de seu livro, Acuña incluiu um “Memorial”, apresentado ao Rei de Espanha, urgindo-
o a tomar posse do vale amazônico, antes que os Portugueses o fizessem. Este trecho profético,
impresso em duas páginas não numeradas (Acuña, s.d.; Figura 13.2), foi publicado separadamente,
antes do livro de 1641, sem lugar, sem editor e sem data, tanta era a urgência conferida por Acuña
em aconselhar o Rei a tomar providências para a ocupação da Amazônia.

Lista dos animais citados


São poucos os nomes de animais citados no “Nuevo Descubrimiento”. São eles:
l. anta – cap. xxviii;
2. cangrejos – cap. lxxxii;
3. cotia – cap. xxviii;
4. iguana – cap. xxviii;
5. paca – cap. xxviii;
6. pato – cap. xxviii;
7. pejebuey – cap. xxv;
8. peraque [poraquê] – cap. xxvii;
9. perdiz [Tinamidae] – cap. xxviii;
10. puerco montaraz – cap. xxviii;
11. tortuga – cap. xxvi;
12. venado – cap. xxviii;
13. yagoti [jabuti] – cap. xxviii
156 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

Figura 13.1. Frontispício de Nvevo descvbrimiento del Gran Río de las Amazonas de
Cristóbal de Acuña (1641)
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 157

Figura 13.2. Primeira parte do folheto de duas páginas publicado por Acuña (antes de 1641),
instando o Rei de Espanha a ocupar a Amazônia, antes que o fizessem os
portugueses ou os holandeses.
158 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

O texto do “Nuevo descubrimiento”

“NVEVO DESCVBRIMIENTO DEL GRAN RIO DE LAS AMAZONAS. POR EL PADRE


CHRSTOVAL [SIC] DE ACUÑA, RELIGIOSO DE LA COMPAÑIA DE IESUS, Y CALIFICADOR DE LA
SUPREMA GENERAL INQUISICIÓN. AL QVAL FVE, Y SE HIZO POR ORDEN DE SU MAGESTAD,
EL AÑO DE 1639. POR LA PROVINCIA DE QVITO EN LOS REYNOS DEL PERÙ.
AL EXCELENTISSIMO SEÑOR CONDE DUQUE DE OLIUARES.
¿A quién (señor) debemos acudir, con este Al Lector
nuevo mundo descubierto, sino al que en sus
Nacieron (curioso lector) tan hermanados en las
hombros, por aliviar los de su dueño, sustentara
cosas grandes, la novedad y el descrédito, que no
gustoso, si pudiera todo el restante de él? ¿Qué outro
parecen sino gemelos de un parto; y que por el mismo
Atlante no se rindiera a tamaña carga, sino el que
caso que en lo nuevo, repara con cuidado la
con esfuerzo más que varonil, há echado el pecho a
mayores y desmedidos pesos? ¿Quién por celoso admiración, peligra el crédito en el acenso de los más
que se ostente de los acrescentamientos de su Rey, acordados. Y aunque es verdad, que la eficacia de la
no se retirara, recelando nuevas dificultades, sino curiosidad natural, nos inclina a saber novedades,
el que cuanto mayores, más las apetece, para que la incertidumbre de su puntualidad, priva el
más luzca su amor, más su fidelidad? ¿Y quién, para entendimiento, del mayor deleite, de que sin duda
decirlo de una vez, sino el Excelentísimo Señor gozara si persuadido de lo cierto, depusiera toda la
Conde Duque, podrá patrocinar tan grandiosa perplejidad en lo dudoso.
empresa, de que Deseando, pues, sacar a vista de todos, el nuevo
depende la conversión de infinitas almas, el descubrimiento del gran Río de las Amazonas, a que
acrescentamiento de la Real Corona, y la defensa y por orden de su Majestad fuí, como después verás y
guarda de todos los tesoros del Perú? temiéndome, de que aunque por lo nuevo, sería
En manos, pues, de Vuestra Excelencia ofrezco apetecido: con todo no dejaría de padecer recelos, en
este nuevo descubrimiento del gran Río de las lo puntual, quise asegurarte lo uno y lo outro.
Amazonas, a que por orden de su Majestad fui, con
Lo primero, con prometerte un nuevo mundo,
cuidado, averigüé, y con toda puntualidad recopilé
en breves hojas, siendo digno de volúmenes enteros: Naciones nuevas, Reinos nuevos, ocupaciones
para que añadida esta preciosa piedra a la Corona nuevas, modo de vivir nuevo, y para decirlo, en una
de nuestro gran Rey Felipe IV que Dios nos guarde, palabra, un Río de agua dulce navegado por más de
por tan sublime Artífice, mejor asiente, mas luzca, mil trescientas leguas, todo desde su nacimiento
y para siempre permanezca. hasta su fin, lleno de novedades.
Bien puede Vuestra Excelencia aceptar el Lo segundo, con ponerle delante de los ojos las
ofrecimiento, seguro de que es en todo grande, y obligaciones de mi persona, de Religioso de la
más de lo que sin duda parece, que a no ser así, ni Compañía de Jesús, de Sacerdote, de Legado de su
yo le ofrecería, ni mereciera aceptación de tales Majestad, y otras, que ni a ti te importa el saberlas,
manos. Porque si el dilatado Imperio de Etiopía, se ni a mi el decirlas: y si con todo este te persuadieres,
alza con tan glorioso renombre, por ocupar su a que la afición de lo que con algún cuidado trabaje,
jurisdición espacio de novecientas leguas. Si la gran me adelanta; oye a los que de afuera, con testimonio
China, por encerrar en dos mil de circuito, quince jurados, acreditan esta Relación. Vale.
diferentes Reinos, espanta al mundo su grandeza.
Y si la longitud que del Perú se publica, se reduce a
Certificación
términos de mil quinientas leguas que se miden
desde el Nuevo Reino de Granada hasta los últimos Del Capitán Mayor de este Descubrimiento
fines del de Chile. Con cuanta más razón adquirirá Pedro Texeira
todo lo descubierto, título de grande, el Río de las Pedro Texeira, Capitán Mayor al presente de
Amazonas, pues en el espacio de casi cuatro mil
esta Capitanía del gran Pará, y Cabo que fué de la
leguas de contor no, encierra más de ciento
gente de guerra, que fué en el descubrimiento del
cincuenta naciones de lenguas diferentes, suficiente
Río de las Amazonas, de ida, y de vuelta, hasta la
cada una de ellas a hacer por sí sola un dilatado
Reino, y todas juntas un nuevo y poderoso Imperio, ciudad de San Francisco del Quito, en los Reinos
que favorecido y amparado a la sombra de Vuestra del Perú.
Excelencia podrá parecer grande en los ojos de su Certifico, y afirmo con juramento, por los
Majestad, a cuyos pies, y los de Vuestra Excelencia Santos Evangelios, que es verdad, que por orden de
ofrezco, para esta conquista mi persona, y las de su Majestad, y por particular provisión despachada
otros muchos de mi religión, si de nosotros se quiere por Real Audiencia de Quito, vino en mi compañía
servir Vuestra Excelencia, cuya vida prospere el desde dicha Ciudad, hasta la del Pará, el Reverendo
Cielo, con los aumentos, que su persona, celo y Padre Cristóbal de Acuña, Religioso de la Compañía
fidelidad merecen. de Jesús, con su compañero el Reverendo Padre
Andrés de Artieda, en el cual viaje, cumplieron
De Vuestra Excelencia criado entrambos así en lo tocante al servicio de su
Majestad, a que eran unidos, como buenos y fieles
Cristóbal de Acuña vasallos suyos, notando y advirtiendo todo lo
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 159

necesario para dar entera y cumplida cuenta del Clausula


descubrimiento, a que se debe dar entero crédito, De la Provision Real que dió la Audiencia de Quito
mejor que a outro ninguno, de los que fueron en la en numbre de su Majestad, para este
dicha jornada. Y en lo tocante a las obligaciones de Descubrimiento
su Hábito, y servicio de Dios, acudieron siempre, como
acostumbran los de su Religión; predicando, En conformidad de lo cual fué por los dichos
confesando, y doctrinando a todos los del ejército, mi presidente y oidores, acordado, que debía mandar
componiéndoles con sus dudas, amistándoles dar esta mi carta, y provisión Real, para vos, y cada
en sus rencillas, animándoles en sus trabajos uno de vos, la dicha razon; y yo he tenido por bien,
y pacificándoles en sus discusiones, como verdaderos y os mando, que siendo con ella requeridos, por los
padres de todos; pasando las mismas incomodidades dichos Padres Cristóbal de Acuña y Andrés de
y trabajos que cualquiera de los soldados particulares, Artieda, Religiosos de la Compañía de Jesús, o por
así en la comida como en todo lo demás. cualquiera de ellos, veáis los autos junto insertos, y
en su cumplimiento, les daréis, y haréis se les dé
Y no sólo hicieron los dichos pares esta jornada todo el oído breve y buen pasaje que hubieren
a su costa, sin que su Majestad les diese algún menester, para el mejor cumplimiento de su misión,
socorro para ella, sino que antes, todo lo que ellos
viaje, buenos efectos que de él espero han de
traían, así de sustento, como de medicinas, era
resultar, sin que en ello les sea puesto estorbo, ni
común de todos los necesitados, a quienes acudieron
impedimiento alguno, por ninguna causa ni razón
siempre con muy grande caridad y amor.
que sea, pues de lo contrario me tendré por
Y por ser verdad todo lo aquí contenido, dí disconforme.
esta certificación, firmada de mi mano y sellada con
Y ruego, y encargo a vos el dicho Padre
el sello de mis armas,
Cristóbal de Acuña, que en cumplimiento de lo
En esta ciudad de Pará, a tres de Marzo de mil proveído por los dichos mi Presidente y oidores, y
seiscientos cuarenta años. en conformidad del nombramiento en primer lugar
en vos hecho por vuestro Prelado y de lo que por su
El Capitán Mayor
petición tiene ofrecido. Habiéndonos sido entregada
Pedro Texeira esta mi carta, por parte de dicho mi Fiscal, véaislo
en ella contenido, y lo guardéis, cumpláis y ejecutéis;
Certificación y en su cumplimiento, partáis de esta mi corte con
el dicho vuestro compañero, para la dicha Provincia
Del Reverendo Padre Comisario de las Mercedes
del Pará, en compañía del Capitán Pedro de Texeira,
Fray Pedro de la Rúa, Religioso de nuestra y demás gente de milicia que con él va, teniendo,
Señora de las Mercedes, Comisario general de mi como habéis de tener, particular cuidado de
Orden en los Estados de Marañón, y Pará: describir con la mayor claridad que os fuere posible,
Certifico a todos que la presente vieren, como la distancia de leguas, provincias, poblaciones de
los Reverendos Padres Cristóbal de Acuña y Andrés indios, ríos y parajes particulares, que hay desde la
de Artieda su compañero, Religiosos de la Compañía primera embarcación hasta la dicha ciudad y puerto
de Jesús, vinieron desde la Provincia de Quito, en del Pará; informándoos con la mayor certeza que
compañía de la armada Portuguesa, que de vuelta pudiéreis de ello, para dar bastante noticia, como
del descubrimiento del Río de las Amazonas, bajó testigo de vista de mi Real Consejo de las Indias, de
por él hasta la Ciudad de Pará, Costa del Brasil, y todo; y que se tenga la necesaria de las dichas
Gobierno de Marañón; acudiendo en todo el tiempo provincias, como mando las hagáis, pareciendo
que duró el viaje, como verdaderos hijos de su personalmente con esta mi carta, de parte de la
religión, confesando, predicando, y consolando a dicha mi Audiencia de Quito, ante los mi Presidente
todos los del ejército, y acudiéndoles en todas sus y oidores del dicho mi Real Consejo: y siendo
enfermedades y necesidades, como verdaderos necesario informar de ello a mi Real persona, lo
padres de todos. haréis, enviando relación de todo al Acuerdo de la
Cumpliendo juntamente con lo que por parte dicha Audiencia de Quito.
de la Real Audiencia de Quito, en nombre de su Y por vuestra falta de dicho Padre Andrés de
Majestad, se les había encomendado en lo tocante Artieda, con el cuidado y puntualidad, que de
a hacer averiguación de las cosas principales del vuestras personas, y celo con que los de vuestra
dicho Río de las Amazonas, que hizo el Reverendo Religión acostumbran servirme, confío: y como es
Padre Cristóbal de Acuña, con el cuidado que se negocio tan importante al servicio de Dios nuestro
verá por la relación, a que juzgo se debe dar entero Señor, y nuestro, bien, y conversión de tantas almas,
crédito, por ser persona desinteresada, y que sólo como se tiene noticia hay en las dichas provincias
movido del servicio de Dios, y del Rey, emprendió nuevamente descubiertas, que de hacerlo así, y
jornada tan trabajosa. cumplir, me tendré de vos, y de la dicha vuestra
De todo lo cual puedo dar fe, como testigo de Religión, por bien servido.
vista, que por todo el camino vinimos juntos. Dada en Quito, a veinticuatro días del mes de
Y por ser verdad dí ésta firmada de mi nombre, Enero de mil seiscienos treinta y nueve años.
y sellada con el sello de mi Religión. El Licenciado don Alonso Pérez de Salazar. –
En esta ciudad del Pará, a diecinueve días de Doctor don Antonio Rodríguez de San Isidro y
Marzo, de mil seiscientos cuarenta años. Manrique. – El Licenciado don Alfonso de Mesa y
Ayala. – El Licenciado don Juan de Valdés y Llano.
Comisario – El Licenciado don Gerónimo Ortiz Zapata. –
Fray Pedro de Santa María y de la Rua. Secretario Juan Cornejo.
160 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

RELACION un tirano cosa de tanta importancia a nuestro Rey


I. NOTICIAS DE ESTE GRAN RIO y Señor), sino que dejándose llevar de brazos de el,
vino a desembarcar por la costa enfrente de la Isla
Casi con las primeras visitas de aquella parte de la Trinidad, en tierra firme de las Indias de
de la América, que hoy tiene nombre de Perú, Castilla; donde por orden de su Majestad le quitaron
nacieron en nuestra España, aunque por confusas la vida, y le sembraron las casas de sal, que hoy día
noticias, encendidos deseos del descubrimiento del se muestran en aquellas partes.
gran Río de las Amazonas, llamado, por error común,
entre los poco vistos en la Geografía, río del
Marañón, no sólo por las muchas riquezas, de que IV. INTENTAN OTROS ESTE DESCUBRIMIENTO
fué siempre sospechoso; ni por la multitud de gente Estos mismos deseos del descubrimiento de
que mantenían sus orillas, ni por la fertilidad de este río, obligaron al sargento mayor Vicente de los
sus tierras, y temples apacibles de su habitación, Reyes Villalobos, gobernador y capitán-general de
sino principalmente, por entender, con no pequeños loos Quixos, jurisdicción de la Provincia de Quito,
fundamentos, que él era la única canal, y como calle para que se ofreciese con buenos partidos, a
mayor, que corriendo por el riñón del Perú, se principiarle por aquellas partes: en cuya
sustentaba de todas las vertientes que al mar del conformidad, despachó la católica persona de
Norte tributan sus encumbradas cordilleras. nuestro gran rey Felipe Cuarto, que hoy vive, y viva
felices años, en el de veintiuno, una cédula a la Real
II. DESCUBRE FRANCISCO DE ORELLANA ESTE RÍO Audiencia y Cancillería de San Francisco del Quito,
para que se capitulasen las condiciones que para el
Estos deseos solicitaron el corazón de dicho descubrimiento fuesen convenientes, que por
Francisco de Orellana, a que el año de mil quinientos acabar en este interin el dicho Gobernador su oficio
cuarenta en cierta embarcación, y con algunos no tuvieron efecto. Como ni tampoco le tuvieron los
compañeros, se fiase de las corrientes de este gran ardientes deseos de Alfonso de Miranda, a quién le
río (que desde entonces, tomó también el nombre sucedió en el cargo, por atajárselos la muerte. Que
de Orellana) y pasando a España, por la relación también atajó los lucidos empleos, en que el General
que de sus grandezas dió, la Cesarea Majestad del Joseph de Villamayor Maldonado, Gobernador
Emperador Carlos Quinto, le mandó dar tres navíos mucho antes que los dos, del mismo Gobierno de
con gente y todo lo necesario, para que le volviese a los Quixos, gastó lo mejor de su vida, con ardiente
poblar en su Real nombre, a que salió el año celo de sujetar a Dios, y al Rey, la multitud de
cuarenta y nueve, si bien con tan adversa fortuna, naciones que cofusas noticias publicaban en este
que muriéndose la mitad de los soldados en las río, poniendo en ejecución por muchas partes con
Canarias e Islas de Cabo Verde, con los demás que no pequeños logros sus deseos.
cada día se le iban disminuyendo, llegó a la boca de
este gran río, tal falto de gente, que le fué forzoso
dejar dos navíos que hasta aquel punto había V. INTENTA BENITO MACIEL ESTE DESCU-
conservado, y no sintiéndose con fuerzas para más, BRIMIENTO
en dos lanchas de buen porte, que fabricó, con toda Solicitaron estos mismos deseos, no sólo los
su gente, prosiguió sus intentos, entrando el río ánimos de los castellanos, por las partes del Perú,
arriba, que a pocas leguas reconoció no habían de sino que extendiéndose a las costas del Brasil,
tener buen fín: y así reduciéndose todos a una sola habitación de portugueses, quisieron con el celo que
embarcación, se retiraron por la Costa de Caracas, siempre tienen de aumentar su Corona, comenzando
hasta dar en la Margarita, adonde acabaron todos, desde la boca de este río, buscar su origen y
y con ellos las esperanzas, de que su Majestad desentrañarse de sus grandezas, a que se ofreció
entrase en posesión de lo que tanto se deseaba y en Benito Maciel Pariente, Capitán Mayor que entonces
sí procedía. había sido del Pará, y al presente Gobernador del
Marañón. En cuya conformidad se le despachó el
año de veintiséis una Real Cédula, para que llevase
III. ENTRA POR ESTE RÍO EL TIRANO LOPE DE
hasta el fin sus intentos, los cuales cesaron por
AGUIRRE
querer su Majestad servirse de su persona en la
Volviéronse a avivar estas esperanzas veinte guerra de Pernambuco.
años después, que fué el de quinientos sesenta, con
la entrada que por orden del Virrey del Perú hizo a
este gran río el general Pedro de Orsúa, arrojándose VI. MANDASELE A FRANCISCO COELHO QUE
con buen ejército a sus aguas, para ser testigo de HAGA ESTA ENTRADA
vista de las grandezas, que sólo por noticias, se No parece que se aquietaba el corazón de
publicaban de él; pero con tan mal suceso, que fué nuestro gran Rey hasta ver ejecutada cosa que tanto
muerto a traición por el tirano Lope de Aguirre, el se deseaba, y ella de sí prometía. Y aunque se
cual levantándose no sólo por General, sino también desbarataban todos los caminos y trazas, que a este
por Rey, y prosiguiendo el viaje comenzado, no fin ordenaba la humana prudencia, no por esto
permitió Dios que acertase a la principal boca, por dejaba de insistir en el intento principal, a cuya
donde este gran río desagua en el océano, (que causa despachó por los años de treinta y tres, o
desdecía de la fidelidad de los españoles, descubrir treinta y cuatro, una Real Cédula, a Francisco
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 161

Coelho de Caraballo, que a la sazón estaba por VIII. LLEGAN LOS DOS RELIGIOSOS AL MARAÑÓN
Gobernador del Marañón y Pará, con expreso Favoreció Dios los intentos de estos dos
mandato de que luego se hiciese el dicho religiosos, y después de muchos días de navegación
descubrimiento, y que no habiendo a quien enviar, en que experimentaron bien su providencia, llegaron
fuese él en persona a ponerlo en ejecución; tanto a la ciudad del Pará, población de portugueses, que
como esto deseaba su Majestad se eefectuase, cosa está situada cuarenta leguas de donde este río
que por todas partes se intentaba, y por ninguna desemboca en el Océano, jurisdición del Gobierno
llegaba a debida ejecución, pero tampoco la tuvo del Marañón; hsbiendo pasado sin lesión alguna por
en esta ocasion, por no juzgarse el Gobernador con inmensas provincias de bárbaros y muchas de ellas
fuerzas suficientes para poder dividirlas, en caribes, que comen carne humana, recibiendo de
tiempos que el holandés infestaba cada dia sus ellos el necesario mantenimiento, para llevar al fin
costas, y apenas tenía gente para poderle resistir lo comenzado. Pasaron luego a la ciudad de San
la entrada. Pero no hay que espantarse de que Luís del Marañón, donde el Gobernador asistía, que
humanas trazas se desbaraten, cuando las divinas entonces era Giácomo Raymundo de Noroña, electo
tenían ya dipuesto el modo casi milagroso con que a mi ver, mas por providencia divina, que por la voz
se había de hacer este grandioso descubrimiento, del pueblo, pues ningún otro rompiera con tantas
que fué como aquí diré: dificultades, ni se opusiera a tan contrarios
pareceres, que no tuviera el celo y obligaciones que
VII. NAVEGAN ESTE RÍO DOS RELIGIOSOS DE a él le corrían, de servir desinteresadamente en este
SAN FRANCISCO descubrimiento a su Dios, y a su Rey. A este, pues,
dieron los dos religiosos noticia de su viaje, que fué
Está la ciudad de San Francisco de Quito, que como de personas que venían cada día huyendo de
es una de las más famosas de toda la América, las manos de la muerte, y lo que más pudieron
edfificada sobre montes, en la más alta cordillera, aclarar, fué decir que venían del Perú, que habían
que corre por todo aquel nuevo orbe, aun no medio visto muchos indios, y que se atreverían a volver
grado a la banda del sur de la línea equinoccial, por donde habían bajado, habiendo quien quisiese
cabeza de una provincia, la más fértil, más seguir esta derrota.
abundante, más regalada, y de mejores temples que
otra ninguna del Perú, y que en multitud de
naturales, policía, buena enseñanza y cristiandad IX. ES NOMBRADO PARA LA CONQUISTA PEDRO DE
de ellos, a todas se aventaja. TEXEIRA
De esta ciudad, pues, por los años de treinta Confuso quedaba en este estado nuestro
y cinco, treinta y seis, y principios del treinta y ocho, descubrimiento, y mal podía su Majestad tomar
salieron ciertos religiosos de San Francisco, por resolución de lo que convenía a su Real servicio, si
orden de sus superiores en compañía del Capitán el Gobernador, como ya dije, no tomara pechos al
Juan de Palacios, y otros soldados, para proseguir aclarar estas sombras, y contra el parecer de todos
éstos en lo temporal, y aquéllos en lo espiritual, con enviar gente por el río arriba, hasta la ciudad de
el descubrimiento de este río, que ya hacía más de Quito, que con más atención y menos recelos,
treinta años, principiaron los Padres de la Compañía notasen todo lo que hallasen en él, digno de
de Jesús, por los Cofanes, donde los naturales atención.
mataron cruelmente al Padre Rafel Ferrer, en pago Para esta empresa nombró por cabeza y
de la doctrina que les enseñaba. Llegando, pues, caudillo de todos a Pedro Texeira, Capitán por su
los dichos religiosos de San Francisco a la Provincia Majestad de los descubrimientos, persona a quien
de los Encabelados, numerosa mucho en gente, pero el Cielo sin duda tenía escogida para esta ocasión,
bien estrecha para el encendido celo con que estos pues sola su prudencia y sus obligaciones, pudieran
siervos de Dios, como siempre acostumbran, la acabar lo que él trabajó e hizo, en servicio de su
pretendían reducir al gremio de la Iglesia: asistieron Rey en esta jornada, no sólo con gastos y pérdidas
entre los naturales algunos meses, y viendo el de su hacienda, sino también con mucho dispendio
tiempo que perdían, y que la mies no la tenía aún de su salud, si bien nada de esto es cosa nueva, en
Dios sazonada, se volvieron unos a su Convento de quien por tantos años que há que sirve a su
Quito, quedando los otros en campañía de los pocos Majestad, nunca se há granjeado otros intereses que
soldados que quisieron asistir al lado de su Capitán, dar honrada cuenta de todo lo que que se le há
que a pocos días vieron por sus ojos muerto a manos encargado, que há sido mucho, y en ocasiones de
de aquellos a quienes iban a hacer tanto bien; con no poca importancia.
que les fué imperioso desamparar la tierra, y
enderezando su viaje a Quito todos los demás, dos
religiosos legos llamados Fray Domingo de Brieva y X. COMIENZA SU VIAJE PEDRO TEXEIRA
Fray Andrés de Toledo, con seis soldados en una Salió, pues, este buen caudillo de los confines
embarcación pequeña, se dejaron llevar de la del Pará, a los veintiocho días de octubre de mil
corriente río abajo, no con otro intento, a lo que se seiscientos treinta y siete años, con cuarenta y siete
puede imaginar, que llevados del divino impulso que canoas de buen porte (embarcaciones de que
entre tan flacos instrumentos, tenía librado el primer adelante se dirá) y en ellas setenta soldados
descubrimiento de este río. portugueses, mil doscientos indios de boga y
162 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

guerra, que con las mujeres y muchachos de servicio hasta tener nueva orden; quedó también con la suya
pasarían todas de dos mil personas. Duró el viaje el Capitán Pedro Bayón; personas ambas que bien
cerca de un año, así por la fuerza de las corrientes, mostraron en esta ocasión el valor con que tantos
como también por el tiempo, que en hacer años habían ejercitado la milicia, y la fidelidad con
mantenimientos para tan numeroso ejército, era que obedecían las órdenes de sus mayores, pues a
fuerza se gastase, y principalmente por caminar sin pie quedo esperaron once meses, sin jamás intentar
guías ciertas, que les pudiesen enderezar sin rodeos, otra cosa, con ser la tierra enfer ma, los
ni dilaciones, por los rumbos mas breves, por los mantenimientos ningunos, sino los que se buscaban
cuales debieran seguir su camino por ser éste tan debajo de las armas, y esos tan cortos que apenas
cumplido, y por las incomodidades que en él se
parece podían ser suficientes a sustentar la vida;
pasaban, comenzaron los indios amigos a mostrar
pero bien satisfecho estaba el Capitán Mayor de los
poco gusto de proseguirlo, y de hecho, algunos se
que dejaba en semejantes riesgos, que sola la muerte
volvieron a sus tierras. Receloso el Capitán Mayor
de que no hiciesen los demás lo mismo, y le dejasen les podría apartar del cumplimiento de sus órdenes.
imposibilitado de proseguir su viaje, usó de
industria, ya que rigor ni fuerza bastaba a conservar XIII. LLEGA EL CAPITÁN MAYOR A QUITO
los que estaban titubeando; y aunque se hallaba a
Con esta confianza, y pocos compañeros
la mitad del camino, fingió estar muy próximo al
prosiguió Pedro Texeira en seguimiento de su
término, y aprestando ocho canoas bien guarnecidas
de bogas y soldados, las mandó ir adelante, como Coronel, que ya halló estaba días había en la ciudad
aposentadoras de lo restante del ejército, y a la de Quito; donde fueron bien recibidos y agasajados,
verdad, no eran sino descubridoras del mejor camino así de lo secular como de lo eclesiástico, mostrando
en que mil veces dudoso de lo cierto, alucinaban. todos el gozo que tenían de ver en sus tiempos, y
por vasallos de su Majestad, no sólo descubierto,
sino también navegado, desde su fin hasta sus
XI. ADELÁNTASE EL CORONEL BENITO
principios, el afamado río de las Amazonas.
RODRÍGUEZ
No tuvieron la menor parte de estos regocijos,
Nombró Pedro Texeira por cabo de esta
todas las religiones de aquella ciudad, que son
cuadrilla, al Coronel Benito Rodríguez de Olivera,
muchas, y muy autorizadas, ofreciéndose cada una
hijo del Brasil, y pesona que como criada toda su
por sí, con obreros fieles, que desde luego entrasen
vida entre los naturales, les tiene calados los
trabajando en la grande e inculta viña de inmensos
pensamientos y con pequeñas muestras adivina lo
bárbaros, de que por sus nuevos descubrimientos
que tienen en el corazón, con que es conocido,
se les daba noticia.
temido y respetado de todos los indios de aquellas
conquistas, y en el presente descubrimiento importó
no poco su persona, para llevarle al fin con la XIV. RESOLUCÓN DEL VIRREY DEL PERÚ
felicidad que se hizo. Llegó, pues, el Coronel con su Recibida en aquella Real Audiencia de Quito
escuadra, después de vencidas muchas dificultades, la noticia, que bastaba para hacer pleno concepto
al Puerto de Payamino, día de San Juan, a los de lo mucho que a ambas Majestades divina y
veinticuatro de junio de mil seiscientos treinta y humana, importaba el acudir luego al buen
ocho, que es la primera habitación de castellanos, despacho de negocio tan grande, no se atrevieron
que por aquellas partes sujeta a la provincia de los
los señores Presidente y oidores de ella a resolver
Quixos, jurisdicción de Quito, se avecina a las orillas
nada, sin primero dar aviso al Virrey del Perú, que
del este gran río. Si bien por el de Napo (de que
a la sazón era el Conde de Chinchón, el cual después
después se hará mención) hubiera tenido toda la
de consultado el caso con la gente más práctica de
armada mejores puertos, más abastecimientos y
la ciudad de Lima, corte de aquel nuevo mundo,
menos pérdidas, so sólo de indios sino también de
haciendas. resolvió por carta suya para el Presidente de Quito
(que era el Licenciado D. Alonso Pérez de Salazar)
su fecha a los diez de noviembre de seiscientos
XII. DEJA EL CAPITÁN EL EJÉRCITO EN LOS treinta y ocho, que el Capitán Mayor Pedro Texeira,
ENCABELADOS
con toda su gente se volviese luego, por el mismo
Siempre iba siguiendo el Capitán Mayor los camino que había venido a la ciudad de Pará,
rastros y avios que su Coronel le dejaba en las dándoles todo lo necesario para el viaje, por la falta
dormidas, con que alentados de nuevo, cada día de tan buenos capitanes y soldados, sin duda harían
pensaban, sería el siguiente, el postrero de la
en aquellas fronteras, que tan infestadas son de
jornada. Sustentados por estas esperanzas llegaron
ordinario en el enemigo holandés, mandando
a un río (de que ya dijimos arriba) poblado todo de
naturales; de paz, en tiempos pasados, pero ya juntamente, que si fuese posible, se dispusiesen las
rebeldes por la muerte del Capitán Palacios. Pareció cosas de suerte, que fuesen en su campañía dos
este sitio apacible, para dejar allí situada toda la personas tales, a quienes se pudiese dar fe por la
fuerza del ejército, y nombrando por Capitán y Cabo Corona de Castilla, de todo lo descubierto, y de lo
de todos a Pedro de Acosta Fauela, que con la demás que a la vuelta del viaje se fuese
compañía que llevaba a su cargo, hiciese allí pie fijo descubriendo.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 163

XV. EL GENERAL D. JUAN DE ACUÑA SE OFRECE A Quito. Aceptado por los señores de aquella Real
LA JORNADA Audiencia el nombramiento de los dichos dos
En confusión puso a todos la ejecución de esta religiosos de la Compañía de Jesús, se les mandó
última orden del Virrey, por los muchos dar una Real Provisión (cuya cláusula pusimos al
inconvenientes, que mirado a prima faz principio) en que se les manda, que siendo con ella
representaba. Si bien no faltaron seculares celosos requeridos, luego al punto partan de la ciudad de
del servicio de su Majestad, que atropellándolo todo San Francisco del Quito, en compañía del Capitán
deseaba ser cada cual uno de los que se nombrasen Mayor Pedro Teixeira, y llegando a la del Pará, pasen
para tamaña empresa. Pero el que entre todos se a España a dar cuenta de todo lo que con cuidado
mostró más fervoroso de nuevas ocasiones en que hubieren notado en el discurso del viaje al Rey
proseguir en servicio de su Rey, lo que ya por más nuestro señor en su Real persona.
de treinta años él había hecho, y sus antepasados
por toda la vida, fué D. Juan Vásquez de Acuña, XVII. SALEN LOS PADRES DE QUITO
Caballero del Hábito de Calatrava, Teniente de
Ofreciendo luego los dichos Padres lo que se
Capitán General del Virrey del Perú, y Corregidor
les mandaba, y a los dieciséis días de febrero de mil
actual, por su Majestad, de españoles y naturales,
seiscientos treinta y nueve, dieron principio a tan
en la misma ciudad de Quito y su comarca, el cual
luengo viaje, que duró por espacio de diez meses,
ofrecía, no sólo su persona, pero juntamente su
hasta entrar en la ciudad del Pará, donde tomaron
hacienda para a su costa levantar gente, pagar
puerto a los doce de diciembre del mismo año.
soldados, comprar mantenimientos, disponer
pertrechos, y hacer todos los gastos necesarios para Después de haber hollado con sus plantas los
tan cumplido viaje, sólo con el interés que siempre encumbrados cerros, que con el licor de sus venas,
tuvo, de que su Rey y señor fuese servido. No surtió alimentan y dan el primer sustento a este gran río;
efecto su buen deseo, por no darle licencia quien y caminando sobre sus ondas hasta donde dilatado
podía, que atendiendo a la falta que podría hacer, en ochenta y cuatro leguas de boca, paga caudaloso
dejando el oficio que ejercía actualmente, se le negó. tributo al mar océano; después de haber notado con
Si bien no quiso Dios que tan honrados deseos muy particular cuidado todo lo que en él hay digno
quedasen del todo frustrados disponiendo las cosas de advertencia; después de haber marcado sus
de suerte que ya que él no iba, fuese en su lugar el alturas, señallado por sus nombres los ríos que le
Padre Cristóbal de Acuña, Religioso de la Compañía tributan, reconocido las naciones que se sustentan
de Jesús, su hermano; teniendo a gran dicha poder en sus orillas; visto la fertilidad, gozando sus
por este modo ofrecer al servicio de su Majestad mantenimientos, experimentando sus temples,
cosa que tanto estimaba, y le tocaba tan de cerca, comunicado con sus naturales, y finalmente,
lo cual sucedió de esta manera: después de no haber dejado cosa de las en él
contenidas de que no puedan ser testigos oculares.

XVI. NOMBRA LA REAL AUDIENCIA AL PADRE Como a tales, pues, como a personas que
CRISTÓBAL DE ACUÑA PARA ESTA JORNADA tantas obligaciones nos corren de ser puntuales en
lo que se nos há encomendado, pido yo a los que
Siendo el Licenciado Suárez de Poago, Fiscal leyeren esta relación, me den crédito que es justo,
de la Real Cancillería de Quito, ya de partida la pues yo soy uno de ellos, y en nombre y por parecer
portuguesa armada, y considerando como fiel de entrambos, tomé la pluma para escribirla.
ministro de su Majestad los muchos útiles y
Digo esto por las que podrá ser saquen otros a
ningunos incovenientes que se podían seguir de que
luz, quizá no tan ajustadas a la verdad como
dos religiosos de la Compañía de Jesús le
convenía. Esta lo será, y tanto, que por ningún caso
acompañasen a España, para dar cierta relación de
pondré en ella cosa de que no pueda con la cara
todo en el Real Consejo de las Indias, y siendo
descubierta atestiguar con más de cincuenta
necesario al Rey nuestro señor en su Real persona,
españoles, castellanos y portugueses, que hicieron
como lo pensó el Fiscal, así lo propuso en el real el mismo viaje, afirmando lo cierto por cierto, y lo
acuerdo, y pareciendo a todos bien la propuesta, se dudoso por tal, para que en cosa tan grave, y de
dió noticia de ello al Provincial de la Compañía de tanta importancia, nadie se arroje a creer más de lo
Jesús, que a la sazón era el Padre Francisco de que en esta relación se afirma.
Fuentes, el cual estimando la honra que se hacía a
su religión, en fiar de ella cosa de tanta importancia,
y codicioso de que por esta vía se le abrise puerta, a XVIII. EL RÍO DE LAS AMAZONAS ES EL MAYOR DEL
que sus hijos entrasen a llevar la nueva luz del Santo ORBE
Evangelio, a tanto número de almas, que en este Es el famoso Río de las Amazonas, que corre y
gran río, yacen en la sombra de la muerte, nombró baña las más ricas, fértiles y pobladas tierras de
en primer lugar, para esta empresa, al Padre todo el Imperio del Perú; el que de hoy en adelante
Cristóbal de Acuña, religioso profeso, y actual Rector podemos, sin usar de hipérboles, calificar por el
del Colegio de la Compañía de la ciudad de Cuenca, mayor y más célebre del orbe. Porque si el Ganges
jurisdicción de Quito; y, en segundo lugar, y por su riega toda la India, y por caudaloso oscurece el mar
compañero, al Padre Andrés de Artieda, Lector de cuando desagua en él, haciéndole que pierda el
Teología de dicho Colegio de la misma ciudad de nombre y se llame Sinu-Gangético, por otro nombre
164 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

Golfo de Bengala; si el Eufrates, por río afamado de Por otras muchas partes quiere el Perú alzarse
la Siria, y parte de la Persia, es delicia de aquellos con el pincipio y nacimiento de este gran Río,
reinos; si el Nilo riega lo mejor del Africa, celebrándole y festejándole como al Rey de los
fecundándola con sus corrientes, el Río de las demás. Pero de hoy en adelante no lo permitirá la
Amazonas riega más extendidos reinos, fecunda más ciudad de San Francisco de Quito, pues a ocho
vegas, sustenta más hombres, y aumenta con sua leguas de su asiento tiene encerrado este tesoro, a
aguas más caudalosos Océanos; sólo les falta para las faldas de la Cordillera, que divide la juridicción
vencerlos en felicidad, tener su origen en el Pacífico, del Gobierno de los Quijos, al pie de dos cerros,
como de aquel os lo afirman grandes autores. llamado el uno Guamaná y el otro Pulca, distantes
Del Ganges dicen las historias, que desaguan entre sí aun no dos leguas, de los cuales da éste
en él treinta caudalosos ríos y que en sus playas se por madre al recién nacido una gran laguna; y aquél
ven arenas de oro; innumerables ríos desaguan en otro, aunque no de tanto bojeo, si bien de mucho
el de las Amazonas, arenas de oro tiene, y tierras fondo, que agujereando un cerro que, enviadioso
riega, que atesoran en si infinitas riquezas. del tesoro, que de sí ofrecía, con la fuerza de un
terremoto se le echó encima, pretendiendo ahogar
El Eufrates se llama así, como notó San en sus principios tan grandes esperanzas, como de
Ambrosio, a letificando, porque con sus corrientes aquel pequeño lago se prometían al mundo. De estas
alegra los campos, de suerte que los que riega este dos lagunas, que caen veinte minutos debajo de la
año, aseguran abundante cosecha para el siguiente. línea Equinoccial a la banda del Sur, tiene su
Del Río de las Amazonas, se puede afirmar principio el gran Río de las Amazonas.
que sus orillas son en la fertilidad Paraísos, y si el
arte ayuda a la fecundidad del suelo, será todo él XX. SU CURSO, LATITUD Y LONGITUD
un conjunto de apacibles jardines. La felicidad de
la tierra que riega el Nilo, celebró Lucano en estos Nace su curso este Río, de Oeste a Este, como
versos: dice el navegante, esto es, de Poniente a Oriente,
vecino siempre a la Equinoccial la banda del Sur,
Terra suis contenta bonis, non indigna mercis por dos grados, tres, cuatro, cinco, y dos tercios en
Aut souis: in falo, tanta est fiducia Nilo. la mayor altura. Tiene de largo desde su nacimiento
hasta que desagua en el mar, mil trescientos
No necesitan las provincias vecinas al Rio de
cincuenta y seis leguas Castellanas, bien medidas,
las Amazonas de los aires de aves, de árboles de
y, según Orellana, mil ochocientas. Camina siempre
frutas, los campos de mieses, la tierra de minas, y
culebreando en vueltas muy dilatadas, y como señor
los naturales que le habitan de grandes habilidades,
absoluto de todos los otros ríos que en él entran,
y agudos ingenios, para todo lo que les importa,
tiene repartidos sus brazos, que son como fieles
como iremos viendo en el discurso de esta historia.
ejecutores suyos, por medio de los cuales sale al
encuentro, y cobrando de ellos el debido tributo de
XIX. NACIMIENTO DEL RÍO DE LAS AMAZONAS sus aguas, los vuelve a incorporar en el Canal
Dando, pues, principio a ella por el nacimiento principal. Y es cosa digna de notar, cuál es el
y origen de este gran Río de las Amazonas, hasta huésped que recibe, tales son los Aposentadores
ahora oculto siempre, queriendo cada tierra hacerse que le despacha; de suerte que con ordinarios
madre de tal hijo atribuyendo a sus entrañas los brazos, recibe los más comunes Ríos, acrescentando
primeros sustentos que le dan ser, nombrándole con otros mayores para los de más cuenta; y a algunos
nombre de Río Marañón, error tan asentado en son tales, que casi se le pueden poner hombro con
aquellas partes, que la ciudad de los Reyes del hombro, él mismo en persona con toda su corriente
Emporio de todas las de América, se gloría de que les sale a ofrecer el hospedaje. De latitud y anchura
las Cordilleras de Guanaco de los Caballeros, a es muy vario, porque por unas partes se explaya
distancia de setenta leguas de su sitio, dan cuna y una legua, por otras dos, y por otras mucho más,
cortan los primeros pañales de una laguna, que allí guardando tanta estrechura en tantas leguas, para,
está, a este afamado río. Y a la verdad, no va muy con más licencia, dilatado en ochenta y cuatro de
fuera de camino, pues ya que no sea este su orígen boca, ponerse barba a barba con el mar Océano.
del Río de las Amazonas, lo es, al menos de uno de
los más famosos, que él convierte en su propia XXI. ESTRECHURA Y FONDO DEL RÍO
sustancia, y alimentado de sus aguas, corre más El mayor estrecho donde este Río recoge sus
brioso, su carrera. aguas, es de poco más de un cuarto de legua, en
Quiere también el nuevo reino de Granada altura de dos grados y dos tercios. Lugar, sin duda,
aumentar su crédito, prohijando a las vertientes del que previno la divina Providencia, estrechando este
Macoa, el primer nacimiento de este Río, que en su dilatado mar dulce, para que en su angostura se
origen llaman los naturales el grande Caqueta, si pudiese fabricar una fortaleza que impida el paso
bien con ningún fundamento, pues en más de a cualquier Armada enemiga, por muchas fuerzas
setecientas leguas, no se ven las caras de estos dos que traiga, si acaso entrare por la principal boca
Ríos, y cuando se encuentran, como reconociendo de este gran Río; que entrando por el Río Negro, en
a su mayor, torciendo el Caqueta su curso, viene a el mismo se habrá de poner la defensa. Está esta
pagar vasallaje al del Amazonas. angostura a trescientas leguas de la Balsa, de
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 165

donde, en ocho días, con embarcaciones ligeras, a echándolas en agua las deshacen; y cocidas al fuego,
vela y remo se puede dar aviso mucho antes que el las dan el punto que han menester; reposan este
Enemigo les dé vista. caldo, y frío, es de ordinario vino que ellos usan y a
La profundidad de este Río es grande, y en veces es tan fuerte como si fuera de uva; que les
partes tal que no se halla fondo; desde la boca hasta embriaga y hace perder el juicio. Con este vino
el río Negro, que es espacio de casi seiscientas celebran sus fiestas, lloran sus muertos, reciben
leguas, nunca le faltan treinta o cuarenta brazas de sus huéspedes, hacen sus sementeras, y las cogen.
altura en el Canal principal; de ahí arriba va Y, finalmente, no hay ocasión en que se junten que
variando más, ya con veinte, ya con doce, y ya con no sea éste el azogue que los recoge, y la liga que
ocho brazas muy a sus principios, fondos suficientes les detiene. Hacen también, aunque no es tan
para cualesquira embarcación, que aunque la ordinario, otros géneros de vinos que, como son tan
corriente impida, no faltan de ordinario todos los inclinados a la embriaguez, como los tahúres, que
días tres, cuatro horas de brisas fuertes, y a veces nunca les falta de qué echar mano; ellos la echan
por todo el día con qué vencerla. de cualquier fruta silvestre, que abundan en los
árboles, que deshacen en agua, la dan con su sumo
XXII. ISLAS, Y SU FERTILIDAD, Y FRUTAS tal sabor e fuerza, que muchas veces excede a la
cerveza, bebida tan usada en todas las Naciones
Todo este Río está poblado de Islas, unas Extranjeras. Guardan estos vinos, unos en tinajas
grandes, pequeñas otras, tantas en número que no muy grandes de barro, como las de nuestra España;
se pueden contar, porque se encuentran a cada otros en pipas pequeñas, que labran de una pieza,
paso; las ordinarias son de cuatro o cinco leguas, de socavados trancos, y otros en vasijas grandes
otras hay de diez y de veinte; y la que habitan los que tejen de yerbas, dándoles por dentro y por fuera
Tupinambás (de quienes hablaremos después), tiene
tal betún, que no se les pierde gota de licor que en
más de seis leguas de circunferencia; hay también
ellas recogen.
otras muchas muy pequeñas que les sirven a los
naturales para hacer de ellas sus sementeras,
teniendo en las mayores su habitación. Estas islas XXIV. FRUTAS QUE TIENEN
de menor porte, y a veces las mayores o mucha parte Las viandas que acompañan este pan, y vino,
de ellas, baña todos los años el Río, fertilizándolas son muchas, no sólo de frutas, como Plátanos,
de suerte con sus lamas, que no pueden jamás Piñas, Guayabas, Avíos, Castañas muy sabrosas,
alegar título de estériles, aunque por muchos años
que llaman en el Perú Castañas de la Sierra, y a la
continuados, se les pida el ordinario fruto, que es
verdad más parecen esto, que no aquello, si bien
el maíz, y la yuca, o mandioca, común sustento de
las llaman así por nacer en unos cocos que se
todos, y de que tienen mucha abundancia; y aunque
asemejan al erizo de la Castaña, tienen Palmas de
al parecer estaba expuesta a gran disminución y
diversos géneros que producen unos sazonados
pérdida, con tan poderosas avenidas la naturaleza,
cocos, y otras sabrosos dátiles, que aunque
madre común de todos, dió a estos Bárbaros medio
fácil para su conservación. Cogen la yuca, que son silvestres, son de muy buen gusto, y otras muchas
unas raíces, de que se hace el cazabe, pan ordinario diferencias de frutas, propias todas de tierras
en todas aquellas costas del Brasil, y cavando en la calientes. Tienen también raíces de mucho sustento,
tierra unas cuevas, o silos hondos, las sepultan en como son batatas, yuca mansa que llaman los
ellos, dejándolos muy bien tapados todo el tiempo Portugueses, Macachera, Carás, criadillas de tierra,
que duren las crescientes, las cuales pasadas, las y otras que asadas o cocidas, no sólo son tan
sacan y benefician para su sustento, sin que por gustosas, sino substanciales.
eso pierdan un punto de su valor. Y si la naturaleza
enseñó a la hormiga a guardar como en trojes en XXV. PESCADOS DE ESTE RÍO Y DEL PEJEBUEY
las entrañas de la tierra el grano, que há de ser su
alimento todo el año, qué mucho diese traza al indio, Con todo, de lo que más se alimentan, y lo
por más bárbaro que sea, para prevenir su daño, y que como dicen les hace plato, es el inmenso
guardar su sustento; puesto es cierto que la Divina pescado, que con increíble abundancia cada día
Providencia más cuida de los hombres que de los cogen a manos llenas de este Río. Pero entre todos,
animales brutos. el que como Rey se señorea y está poblado en todo
el Río, desde sus primeros principios hasta que
desagua en los mares, es el Pejebuey, pescado que
XXIII. GÉNEROS DE BEBIDAS QUE USAN el gusto sólo le queda el nombre de tal, pues no hay
Este es, como ya dije, el cotidiano pan, que persona que cuando lo come no le tenga por
siempre acompaña las demás viandas. Y no sólo sazonada carne; es tan grande como un becerro de
sirve de comida, sino juntamente de bebida, a que año y medio, y en la cabeza, a tener astas y orejas,
son, en general, muy inclinados todos los naturales, no se diferenciaría de él; tiene por todo el cuerpo
para lo cual hacen unas grandes tortas delgadas, algunos pelos, no muy largos, a modo de cerdas
que, cocidas en horno, se abizcochan, de suerte que blancas, y muévese en el agua con dos brazos cortos,
duran muchos meses; guardan éstas en lo más alto que en forma de palas le sirven de remos, debajo de
de sus casas para tenerlas libres de las humedades los cuales muestra la hembra sus pechos, con que
de la tierra, y cuando las quieren aprovechar, mantiene con leche los hijos que pare.
166 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

Del cuero, que es muy grueso, hacen adargas las mata, de ordinario, más de doscientos huevos
los guerreros, tan fuertes, que bien curado, no le cada una, algo mayores, y casi tan buenos como
pasa una bala de arcabuz. los de gallina, aunque más duros de digestión. Están
a sus tiempos tan gordas que de dos solas se saca
Susténtase ese pescado sólo de yerba que pace,
una botija de manteca, que templsda con sal, es
como si fuera buey verdadero, de donde cobra su
tan buena y más gustosa y dura mucho más que la
carne tan buen gusto, y es de tanto sustancia que,
cocida de vacas; sirve para freir pescado, y para
con pequeña cantidad, queda una persona más
cualesquiera género de guisados que por acá pueden
satisfecha, y con más fuerzas que si comiera doblado
aprovechar la mejor y más delicada manteca de
de carnero.
todas.
Debajo del agua detiene poco el resuello, y asi Cogen estas tortugas en tanta abundancia,
dondequiera que anda, saca a menudo el hocico para que no hay corral de estos que no tenga de cien
cobrar nuevo aliento, de donde le viene su total tortugas para arriba, con que jamás saben estos
destrucción, pues él mismo se va mostrando a su bárbaros qué cosa sean hambres, pues una sola
enemigo; vénle los Indios, y siguiéndole en canoas basta para satisfacer una familia por mucha gente
pequeñas, le aguardan a que, queriendo espirar, que tenga.
saque la cabeza, y clavándole sus arpones, que
XXVII. MODOS DE PESCAR QUE USAN
hacen de conchas, le quitan la vida; divídenle en
partes medianas que, asadas sobre parrillas de palo, Con más facilidad gozan los moradores de este
duran sin interrupción más de un mês. Río de todos los géneros de pescado que en sí
encierra, pues nunca recelando que les há de faltar
No hacen de él cecina para todo el año (que
para el siguiente día, no se previenen en el
son de mucho precio), por no tener sal en
antecedente, sino que con lo que hoy cogen,
abundancia, que la que usan para templar sus
sustentados disponen para comer mañana otra
comidas es muy poca y hecha de cenizas de cierto cosecha.
género de palmas, que más es salitre que sal.
El modo de pescar es diverso, conforme a la
variedad del tiempo, y las crecientes o menguantes
XXVI. TORTUGAS DEL RÍO Y COMO LAS GUARDAN de las aguas; y así cuando éstas bajan tanto que ya
Mas ya que no les es dado conservar por los lagos se secan, sin permitirles comunicacón con
mucho tiempo estas cecinas, no les falta industria el Río, usan de un género de torbisco, que en
para tener carne fresca todo el invierno, que aunque aquellas costas llaman Timbó, del grosor de un
no es tan gustosa como aquélla, es más sana, y no brazo, poco más o menos, y tan fuerte, que
de menos provecho. machacados dos o tres palos de éstos y batiendo
con ellos el agua, que en tanto sustenta en aquellos
Hacen para estos unos corrales grandes, lagos el pescado, apenas llega éste a gustar de su
cercados de palos, cavados por dentro, de suerte vigor, cuando sobre aguado todo se deja coger con
que, como lagunas de poco fundo, conserven las manos.
siempre en sí el agua llovediza.
Pero el ordinario modo con que en todos
Hecho esto, al tiempo que las tortugas salen a tiempos y ocasiones son dueños de cuantos
deshuevar a las playas, ellos también dejan sus pescados sustenta este abastecido Río, es con las
casas y, emboscándose en los puestos conocidos, flechas que con una mano disparan de una paleta
que ellas más frecuentan, esperan a que, saliendo que en ella tienen, y clavadas en el pez les hace el
a tierra, comience cada una a ocuparse de componer oficio de boya, para conocer a dónde después de
la cueva donde pretende dejar los huesos; salen a herida se retira la presa, a que con presteza se
la sazón los Indios, ganan la parte de la playa por arrojan, y asiéndola la recogen en las canoas; y este
donde han de hacer su retirada al agua, y dando de modo de pescado no se estrecha a uno o a otro
improviso sobre ellas en breve tiempo se ven señores género particular de pescado, sino tan en general,
de mucha cantidad, con no más trabajo que islas se extiende a todos, que ni los unos por grandes ni
volviendo de abajo arriba, y sin poderse menear, los otros por pequeños, son privilegiados, más antes,
las tienen todo el tiempo que quieren, hasta que, todos pasan por un rasero.
ensartadas todas por unos agujeros que las hacen
Con ser estos pescados de tan diversos
en el casco, en varios cordeles, y echadas al agua,
géneros (como ya dije) son de muy buenos gustos,
bogando ellos en canoas, las llevan a remolque sin
y muchos de ellos de particularísimas propiedades,
ningún trabajo hasta meterlas en los corrales que
como lo es la de un pez que los Indios le llaman
tienen dispuestos, donde sueltas todas, las dan por
Peraque, que es al modo de una muy grande
prisión aquella estrecha cárcel, y sustentádolas con
anguila, o, por mejor decir, como un pequeño
ramas y hojas de árboles las tienen vivas todo el
congrio, el cual tiene tal propiedad, que mientras
tiempo que las han menester.
esté vivo, cuantos le tocan tiemblan luego el cuerpo
Son estas tortugas tan grandes y mayores que mientras el contacto dura, como si tuvieran un
rodelas de buen tamaño; es su carne de cava tierna; recio frío de cuartanas, cesando todo en el instante
tienen las hembras dentro del buche cuando que de él se apartan.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 167

XXVIII. CAZAS DEL MONTE, Y AVES DE QUE SE contrario, invierno, al en que por alguna causa se
SUSTENTAN impiden sus cosechas. Estas son dos al año en este
Pudiera ser que hastiados estos naturales, Río, no sólo en los maíces uno de sus principales
siempre con sólo pescado, aunque tan bueno, sustentos, sino también en otras semillas propias
apetecieran, siquira de cuanto en cuanto, alguna de la tierra. Verdad es que las más cercanas a las
carne, y así les previno la naturaleza sus antojos, Cordilleras de Quito gozan de más calor que lo
poblándoles la Tierra-Firme, con muchos géneros restante del río, por las muchas brisas que de
de cazas como son: Antas, que son del tamaño de ordinario refrescan lo más cercano a las costas de
una mula de un año, y muy parecidas a ella en el la mar, si bien este calor cuando mayor es tanto
color y disposición, y el gusto de la carne no se como lo ordinario de Guayaquil, Panamá o
diferencia del de la vaca, aunque toca algo en dulce. Cartagena, templándose en gran parte con los
continuos aguaceros de casi cada día, haciéndoles
Hay también puercos montaraces, no jabalíes,
a todas estas tierras gran ventaja en conservar por
uno y otro género muy diverso, que tiene el ombligo
mucho tiempo sus mantenimientos incorruptos,
en el lomo, de que están pobladas casi todas las
como lo experimentamos en las hostias, con que
Indias; es muy buena carne y muy sana, como
cada día decíamos misa, que después de cinco meses
también lo es la de otra especie de estos mismos
y medio que salieron de Quito, estaban tan frescas
animales, que se hallan en muchas partes, muy
semejantes a los caseros nuestros. Hay Venados, como si fueran de pocos días hechas y por acabarse
Pacas, Cotías, Iguanas, Yagotís, y otros animales, a este tiempo, no experimentamos todo lo que en
propios de las Indias, de buenas carnes y de buen adelante pudieran durar, cosa que espanta a los
gusto, que poco se echan de menos las más que tenemos corridos diferentes temples de las
regaladas de Europa. Hay perdices en los campos y Indias, y sabemos por experiencia la facilidad con
crían en sus casas algunas gallinas de las nuestras, que en tierras cálidas se corrompen, aun cosas de
cuya semilla bajó del Perú, y de unos a otros se ha más sustancia. No son los soles de este río, con
ido extendiendo por todo el Río, el cual en muchos avecindarse tanto a la equinoccial, nocivos, ni se
lagos que hace, les sustenta infinidad de patos y conocen serenos que hagan daño, de que puedo ser
otras aves de agua, para cuando ellos quieran buen testigo, pues raras veces en todo el tiempo
aprovecharse de ellas. Y lo que más admira es el que por él navigué, dejé de pasar las noches de claro
poco trabajo que cuestan todas estas cosas, como en claro, a su inclemencia, sin que jamás me
se puede colegir de lo que cada día causase un dolor de cabeza, que en otras partes,
experimentáramos en nuestro Real, de donde, sólo un pequeño rayo de la luna los suele causar
después de llegar a la dormida, y después de muy desmedidos, si bien es verdad que en sus
ocupados los Indios amigos que nos acompañaban, primeras entradas, casi todos los que veníamos de
en hacer barracas suficientes para todo el tierras frías, tuvimos cuatro calenturas, que con
alojamiento, en que se consumía mucho tiempo, se otras tantas sangrías nos dejaron libres. Ni tampoco
repartían unos por tierra, con perros, en busca de hay en este río, aires corruptos, que con repentinas
caza, y otros por agua, con solo sus arcos y flechas; calidades dejan lisiados a aquellos a quienes más
y en pocas horas veíamos venir a éstos cargados de hieren, como a costa de su salud, y a veces de la
pescado, y a aquéllos con caza suficiente para que vida, los sientes muchos, casi en todo lo descubierto
todos quedásemos satisfechos. Lo cual no era un del Perú. Y a no tener la plaga de mosquitos, de
día u otro, sino todos cuantos duró el viaje, que fué que abunda en muchos parajes, se pudiera llamar
tan cumplido como ya dije. Maravilla digna de a boca llena un dilatado paraíso.
admiración y que sólo se pude atribuir a la Paternal
Providencia de aquel Señor, que con solos cinco XXX. DISPOSICION DE LA TIERRA Y DROGAS
panes y pocos peces sustentó cinco mil hombres, MEDICINALES
quedándole el brazo sano y las manos llenas, para
mayores liberalidades. De esta apacibilidad de temples, nace sin duda
la frescura de todas sus orillas, que coronadas de
varios y hermosos árboles, parece que a porfía están
XXIX. CLIMA Y TEMPLE DEL RÍO de continuo dibujando nuevos países, en que la
El clima de este río, y todas las provincias a él naturaleza se esmere y el arte aprenda.
circunvecinas, es templado: de suerte que ni hay Y aunque en lo común es tierra baja, tiene
calor que enfade, ni frío que fatigue, ni variedad
también altos bien proporcionados, campiñas
que sea molesta; porque aunque se reconoce algún
desembarazadas de arboledas y cubiertas de flores;
género de invierno, no es tanto, causado de la
valles que siempre conservan la humedad y en lo
variedad de los planetas, y curso del sol, que siempre
más retirado, cerros tales, que pueden con razón
nace y se pone a una misma hora, como de las
pasar con nombres de cordilleras.
inundaciones de las aguas, que con sus humedades
impiden por algunos meses las sementeras y frutos En estos incultos bosques, tienen los naturales
de la tierra, por los cuales nos regimos de ordinario librada sus dolencias, la mejor botica de simples
en aquellas partes del Perú, de tan diferentes que hay en lo descubierto; por que aquí se coge la
temples, para conocer y distinguir el verano del más gruesa cañafístula que en parte alguna, la
invierno, de suerte que todo el tiempo que la tierra zarzaparrilla más perfecta, las gomas y resinas
nos produce frutos, llamamos verano; y por el saludables, mas en abundancia; la miel de abejas
168 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

silvestres, más a cada paso; y tanto, que apenas se España, y en donde quiera que saben qué cosa es
llega a paraje donde no la haya, gastándola, no sólo chocolate; el cual beneficiado, es de tanto provecho,
en medicinas, para que es muy saludable, sino que a cada pie de árbol, corresponde de renta todos
también sustentándose con ella, por ser de lindo los años, libre de todo gasto, ocho reales de plata; y
gusto y aprovechando la cera, que aunque es negra, se ve bien con cuán poco trabajo se cultivan estos
es buena y arde tan bien como cualquiera otra. Aquí árboles en este río, pues sin ningún beneficio del
el aceite de Andiroba, que es un árbol, que no tiene arte, sola la naturaleza les llena de abundantes
precio para curar heridas. Aquí al de Copaíba, que frutos. El tercer género es el tabaco, de que se halla
también lo es, no iguala el mejor bálsamo; aquí se gran cantidad y muy crecido entre los moradores
hallan mil géneros de hierbas y árboles de de sus riberas; y si se cultivase con el cuidado que
particularísimos efectos; y hay aún por descubrir pide esta semilla, sería de los mejores del mundo,
otras muchas, que pudiera salir segundo porque a juicio de los que lo entienden, la tierra y
Dioscorides y tercero Plinio, y todos tuvieran bien temples es todo lo que se puede desear para
que hacer en averiguar sus propiedades. grandiosa cosecha. Las mayores, que a mi ver, se
debieran entablar en este Río, son las de azúcar,
que és el cuarto género, que como más noble, más
XXXI. MADERAS Y ADEREZOS PARA NAVIOS
pr ovechoso, más seguro y de mayores
Los árboles en este río, son sin número, tan acrescentamientos para la Corona Real, y más en
altos, que se suben a las nubes; tan gruesos, que tiempos que tanto há caído el trato del Brasil, se
pone espanto. Cedro medí con mis manos de treinta debiera tomar más a pechos, y procurar luego a los
palmos de circuito; son todos por la mayor parte princpios entablar muchos ingenios, que en breve
tan buenas maderas, que no se pueden desear tiempo restaurasen las pérdidas de aquella costa.
mejores, porque son cedros, ceibos, palo hierro, palo Para lo cual no fuera menester, ni mucho tiempo,
colorado y otros muchos, reconocidos ya en aquellas ni mucho trabajo, ni lo que hoy se recela, mucha
partes y experimentados por los mejores del mundo costa; pues la tierra para caña dlce, es la más famosa
para fabricar embarcaciones, las cuales en este río, que hay en todo el Brasil, como lo podemos
mejor y con menos costo que en parte ninguna, se atestiguar los que hemos recorrido aquellas partes:
podrán, acabadas y perfectas, echar al agua, sin porque es toda ella un mazapé continuado, que es
que se necesite de nuestra Europa sino sólo hierro por lo que los labradores de estas plantas se
para el corazón. Porque aquí están las maderas a desvelan, y con las inundaciones de este rio, que
pedir de boca: así la jarcia tan fuerte como la de nunca duran sino pocos días, quedan tan
cáñamo, de ciertas cortezas de árboles, de que se fertilizadas, que antes se puede temer el demasiado
hacen amarras, que solas ellas sujetan las naves vicio.
en tormentas deshechas, aquí la pez y brea tan
Y no será nuevo en aquella tierra llevar caña
perfecta como la arábiga; aquí el aceite, así de
dulce, pues por todo este dilatado río, desde sus
árboles como de pescados, para darla punto y
principios, siempre la fuímos encontrando que
templar su dureza. Aquí se saca estopa excelente,
parece daba desde entonces muestra de lo mucho
que llaman embira, que para calafatear las naves, y
que después se multiplicará cuando se quieran
juntamente para cuerda de arcabuz no se conoce
hacer ingenios para labrarla. Estos serían de muy
otra mejor. Aquí el algodón para el velamen, es la
poco costo, por tener, como dije, las maderas a la
semilla que mejor producen los campos, y aquí,
mano, y el agua en abundancia y sólo se necesitarían
finalmente, está la multitud de gente que después
cobres, que con mucha facilidad contribuyera
diremos, con que no falta nada para fabricar cuantos
nuestra España, codiciosa del buen retorno que por
galeones se quisieren poner en astillero.
ellos había de recibir.

XXXII. CUATRO GÉNEROS DE COSAS PROVE-


XXXIII. DE OTROS GÉNEROS DE ESTIMA QUE AQUÍ
CHOSAS QUE HAY EN ESTE RÍO
SE HALLAN
Hay en este gran río de las Amazonas, cuatro
No sólo ests géneros podían prometerse en este
géneros que cultivados, serán sin duda suficientes
nuevo mundo descubierto con que enriquecer a todo
para enriquecer, no a uno, sino a muchos reinos,
el orbe, sino también otros muchos, que aunque de
de los cuales es el primero maderas, que fuera de
menor cuantía, no dejarían de ayudar con su
haber muchos de tanta curiosidad y estima como el contribución, al aumento de la Corona Real, como
mejor ébano, hay tantas de las comunes para son el algodón que se coge en abundancia, el urucú,
embarcaciones, que juntamente se podrán sacar que es lo que tienen perfecto colorado, que os
para otras partes, seguros siempre de que por extranjeros estiman grandemente, la cañafístola, la
muchas que se saquen, jamás se podrán agotar. El zarzaparrilla, los aceites que compiten con los
segundo género es el cacao, de que están sus orillas mejores bálsamos en el efecto de curar heridas, las
tan llenas, que algunas veces las madera que para gomas y resinas olorosas, la pita de que se saca el
el alojamiento de todo el ejército, se cortaban, más estimado hilo, de que hay grande abundancia,
apenas eran otras que las de los árboles que y otros muchos que cada día há de ir sacando a luz
producen este tan estimado fruto de la Nueva la necesidad y la codicia.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 169

XXXIV. RIQUEZAS DE ESTE RÍO cuatrocientas, que nunca se sale a la población de


No trato de las muchas minas de oro y plata, españoles encontrando siempre naciones diferentes,
de que se tiene noticia en lo descubierto, y que se fuerza es que le concedamos de anchura, por lo
descubrirán forzosamente en adelante, que si mi menos, cuatrocientas leguas en lo más estrecho,
juicio no me engaña han de ser más y más ricas que con las mil trescientas cincuenta y seis, o según
que todas las del Perú, aunque entren en ellas las Orellana mil ochocientas de longitud, le darán por
del afamado cerro de Potosí. Y no digo esto al aire y circuito, según buena aritmética, muy poco menos
sin fundamento, llevado sólo, como pensará alguno, de las cuatro mil que ya dije.
de la fición que muestro a engrandecer este ríol,
sino estribando en la razón y la experiencia; ésta la XXXVI. MULTITUD DE GENTE Y DE DIFERENTES
tengo del oro que en algunos indios de este río NACIONES
encontramos, y de las noticias que nos dieron de
Todo este nuevo mundo, llamámosle así, está
sus minas; aquélla me obliga a formar este
habitado de bárbaros de distintas provincias y
argumento.
naciones, de las que puedo dar fe, nombrándolas
El Río de las Amazonas, recibe en sí las con sus nombres, y señalándoles sus sitios, unas
vertientes todas de las tierras más ricas de la de vista, y otras por informaciones de todos los
América, pues por la banda del sur desaguan en el indios que en ellas habían estado, pasan de ciento
caudaloso río, que descienden de cerca del Potosí cincuenta, todos de lenguas diferentes, tan dilatadas
unos, otros de Guanuco, cordillera que se avecina y pobladas de moradores como las que vimos por
a la ciudad de Lima; del Cuzco otros, y otros de todo este camino, de que después diremos.
Cuenca y Gibaros, que es la tierra más rica de oro,
Están tan continuadas estas naciones, que de
que hay en lo descubierto.
los últimos pueblos de las unas, en muchas de ellas,
De suerte, que por esta parte de cuantos ríos, se oyen labrar los palos en las otras, sin que
cuantos manantiales, cuantos arroyos, cuantas vecindad tanta les obligue a hacer paces,
fuentecillas vierten en el océano en el espacio de conservando perpetuamente continuas guerras, en
seiscientas leguas que hay desde Potosí a Quito, que cada día se matan y cativan innumerables
todos rinden vasallaje y pagan parias a este río, como almas. Desagüe ordinario de tanta multitud, sin el
también lo hacen todos los que bajan del nuevo cual ya no cupieran en aquella tierra. Pero aunque
Reino de Granada, no inferior en oro a todos los entre sí se muestran belicosos y de bríos, ningunos
demás. tienen para con el español, como se notó en todo el
viaje, en que jamás bárbaro se atrevió a usar contra
Si este río, pues, es la calle Mayor y el principal
los nuestros de otra defensa de la que de ordinario
camino por donde se sube a las mayores riquezas
están los cobardes prevenidos, que es la huída que
del Perú, bien puedo afirmar que es el principal
tienen muy a la mano, por navegar en unas
dueño de todas.
embarcaciones tan ligeras, que en abordando a
Fuera de que, si el lago dorado tiene el oro tierra las cargan en los hombros, y arrojándose con
que la opinión le atribuye; si las Amazonas habitan, ellas a un lago, de los muchos que el río tiene, dejan
como atestiguan muchos, entre las mayores riquezas burlado a cualquier enemigo que con su
del orbe; si los tocantines en piedras de precio y embarcación no pueda hacer otro tanto.
abundancia de oro, son tan afamados del francés;
si los Omaguas con sus haberes alborotan al Perú,
XXXVII. ARMAS DE QUE USAN LOS INDIOS
y despachó luego un Virrey con grueso ejército a
Pedro de Orsúa en busca de ellos, en este gran río Sus armas son, en unos, azagayas medianas,
está todo encerrado; aquí el lago dorado, aquí las y dardos labrados de maderas fuertes, bien
Amazonas, aquí los tocantines, y aquí los ricos aguzadas, y todas las puntas, que tiradas con
Omaguas, como adelante se dirá. Y aquí finalmente destreza, pasan facilidad al enemigo.
está depositado el inmenso tesoro que la majestad En otros, son estólicas, arma en que los
de Dios tiene guardado para enriquecer con él la de guerreros del Inca, gran Rey del Perú, eran muy
nuestro gran Rey y señor Felipe Cuarto. diestros; son estas estólicas unos palos tabledos,
de una vara de largo, y tres dedos de ancho, en
XXXV. SON CUATRO MIL LEGUAS DE CIRCUITO LO cuyo remate, a la parte de arriba, fijan un diente de
DESCUBIERTO hueso, en que hace presa una flecha de nueve
palmos, con la punta también de hueso, o de palo
Tiene de circuito este dilatado Imperio, según
muy fuerte, que labrado en forma de harpón, queda
buena cosmografía, al pie de cuatro mil leguas, y
como garrocha, pendiente de aquel a quien hiere;
no pienso que me alargo mucho, porque ni sólo de
longitud, medidas con cuidado, tiene mil trescientas ésta cogen con la mano derecha en que tienen la
cincuenta y seis, conforme a Orellana, que fué el estólica por la parte inferior, y fijándola en el diente
primero que le navegó, mil ochocientas; y por cada superior, la disparan con tal fuerza y acierto, que a
río que en él entra una y otra banda, según buenas cincuenta pasos no yerran tiro.
informaciones de los naturales que pueblan sus Com estas armas pelean, con éstas flechan la
bocas en más de doscientas leguas por cada caza, y con éstas son señores de cualquier pescado,
banda, y por muchas partes; ni aun en más de por más que se les quiera ocultar entre las ondas:
170 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

y lo que más admira, con éstas clavan las tortugas, Com estas herramientas labran tan
cuando huyendo de ser reconocidas, sólo de cuando perfectamente, no sólo sus canoas, sino también
en cuando, y por un muy breve espacio muestran sus mesas, tablas, asientos y otras cosas, como si
la cabeza encima de las aguas, atravesándolas el tuvieran los mejores instrumentos de nuestra
cuello, que es sólo en lo que por estar libre de las España.
conchas se puede hacer el tiro.
En algunas naciones son estas hechas de
Usan también para su defensa de rodelas, que piedra, que labrada a poder de brazos, la acegazan
hacen de cañas bravas, hendidas por medio, y de suerte que con menos recelos de quebrarse y
tejidas apretadamente unas con otras, que aunque más en breve que con las otras de tortuga, cortan
son más ligeras, no son tan fuertes como las otras cualquier árbol, por grueso que sea.
que ya dije, de cuero de pejebuey.
Sus escoplos, gubias, y cinceles para obras
Algunas de estas naciones usan de arcos y delicadas, que las hacen con gran primor, son
flecha, arma que entre las demás es siempre dientes y colmillos de animales, que encavados en
respetada, por la fuerza y presteza con que hiere. sus palos, no hacen menos bien su oficio, que los
Abundan de yerbas venenosas, de que hacen de fino acero.
en algunas naciones una ponzoña tan eficaz, que
Casi todos tienen en sus provincias algodón,
enarboladas con ella las flechas, en llegando a sacar
unos más, otros menos; pero no todos le aprovechan
sangre, quitan juntamente la vida.
para vestirse de él, mas antes los mas desnudos,
así hombres como mujeres, sin que la vergüenza
XXXVIII. SU COMERCIO ES POR EL AGUA EN natural les obligue a no querer parecer que están
CANOAS en el estado de la inocencia.
Todos los que viven a las orillas de este gran
río, están polados en grandes poblaciones, y como XL. DE SUS RITOS Y DIOSES QUE ADORAN
venecianos o mejicanos, todo su trato es por agua,
en embarcaciones pequeñas, que se llaman canoas; Los ritos de toda esta gentilidad, son casi en
éstas de ordinario son de cedro, de que la general unos mismos; adoran ídolos, que fabrican
providencia de Dios les proveyó abundantemente, con sus manos, atribuyendo a unos el poder sobre
sin que les cueste trabajo de cortarlos, ni sacarlos las aguas, y así les ponen por divisa un pescado en
del monte, evitándose con las avenidas del río, que la mano; a otros escogen por dueños de las
para suplir esta necesidad los arranca de las más sementeras, y a otros por valedores de sus batallas.
distantes cordilleras del Perú, y se los pone a las Dicen que estos dioses bajaron del cielo, para
puertas de sus casas, donde cada uno escoge lo acompañarlos y hacerles bien: no usan de alguna
que más a cuenta le parece. ceremonia para adorarlos, mas antes les tienen
Y es de admirar, ver que entre tanta infinidad olvidados en un rincón hasta el tiempo que los han
de indios, que cada uno necesita, por lo menos para menester, y así cuando han de ir a la guerra, llevan
su familia, de uno o de dos palos, de que labra una en la proa de las canoas el ídolo en quien tienen
o dos canoas, como de hecho las tienen, a ninguno puestas las esperanzas de la victoria; y cuando salen
le cuesta más trabajo, que saliendo a la orilla, a hacer sus pesquerías, echan mano de aquel a
echarle un lazo cuando va pasando, y amarrarle a quien tienen entregado el dominio de las aguas, pero
los mismos umbrales de sus puertas, donde queda ni en unos ni en otros fían tanto, que no reconozcan,
preso, hasta que habiendo ya bajado las aguas, y pueda haber otro mayor.
aplicando cada uno su industria y trabajo, labra la
embarcación de que tiene necesidad. Colijo esto de los que nos sucedió con uno de
estos bárbaros, si bien esto no lo mostraba ser en
la agudeza de su discurso; el cual habiendo oído
XXXIX. LAS HERRAMIENTAS QUE USAN algunas cosas del poder de nuestro Dios, y visto
Las herramientas de que usan para labrar, no por sus ojos que subiendo el río arriba nuestro
sólo sus canoas, sino sus casas y lo demás que han ejército, y pasando por medio de tantas naciones
menester, son hachas y azuelas, no fraguadas por tan belicosas, volvía sin recibir daño de ninguna; lo
buenos oficiales en las herrerías de Vizcaya, sino cual juzgaba, era fuerza y poder del Dios que le regía,
forjadas en las fraguas de sus entendimientos, llegó con grandes ansias de pedir al Capitán Mayor,
teniendo por maestra como en las otras cosas, a la y a nosotros, que en pago del hospedaje y buen
necesidad. Esta les enseñó a cortar el casco más agasajo que nos hacía, no quería otra merced, sino
fuerte de la tortuga, que es la parte del pecho; una que le dejásemos allí un Dios de los nuestros, que
plancha de un palmo de largo, y algo menos de como tan poderosos en todo le guardase a él y sus
ancho, que curada al humo y sacándola el filo en vasallos en paz y con salud, y justamente les pudiese
una piedra, la fijan en su hastil, y con ella, como acudir con el necesario mantenimiento de que
con una buena hacha, aunque no con tanta necesitaban.
presteza, cortan lo que se les antoja. No faltó quien lo quisiese consolar, con dejar
De este mismo metal hacen las azuelas, en su pueblo enarbolado el Estandarte de la Cruz,
sirviéndose de cabo para ellas, una quijada de cosa que acostumbraban hacer los portugueses
pejebuey, que la naturaleza formó con su vuelta, a entre los gentiles, no con tan buen celo como la
propósito para el efecto. acción muestra e suyo, sirviéndoles el santo palo
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 171

de la cruz, levantado en alto a título y capa, para menos, sino que como señores de todo ese gran río,
colorear sus mayores injusticias, como son las tornasen una y muchas veces a navegarle y probarle;
continuas esclavitudes de los pobrecitos indios, que y que habiendo de ser esto así, no quería andar
como mansos corderos, los llevan en rebaños a sus siempre sobresaltado a sombra de tejado, sino salir
casas para venderlos los unos, y servirse con rigor desde luego a reconocer de grado por amigos a los
de los otros. que los demás habrían de recibir por fuerza.
Levantan, pues, como digo, estos portugueses Discurso bueno, y que permitirá la Majestad
la santa cruz, y en pago del buen recibimiento de de Dios, le veamos algún día puesto en ejecución.
los naturales que en sus pueblos les hacen, la fijan
en lo más levantado del lugar, diciéndoles que la XLII. DE LOS HECHICEROS QUE HAY
han de conservar siempre intacta; sucede por algún
Prosiguiendo con el hilo de nuestra historia, y
acontecimiento, o que la cruz con el tiempo se cayó
volviendo a los ritos de estas naciones, es para notar
y deshizo, o que maliciosamente ellos por ser gentiles
la grande estima en que todos tienen a sus
y no reconocer estima en ella la derribaron: con que
hechiceros; no tanto por amor que les muestren,
luego les dan los portugueses la sentencia, y los
como por el recelo con que siempre viven de los
condenan a todos los de aquel pueblo por esclavos
daños que les pueden hacer. Tienen para que usen
perpetuos, no sólo por sua vida, sino por todos sus
de sus supersticiones y hablen con el demonio, que
descendientes.
les es muy ordinario, una casa que sólo sirve de
Por esta causa no consentí yo que se levantase esto, donde con cierto género de veneración, como
la santa cruz, y juntamente por no dar al bárbaro si fueran reliquias de santos, van recogiendo todos
que nos pedía un Dios, ocasión de idolatrar, los huesos de los hechiceros que mueren, los cuales
atribuyendo a aquel madero el poder y deidad del tienen colgados en el aire, en las mismas hamacas
que en él nos redimió. en que ellos dormían en vida. Estos son sus
Si bien le consolé con asegurarle que nuestro Maestros, sus predicadores, sus consejeros y sus
Dios le haría siempre compañía, que le pidiera lo guías; a éstos acuden en sus dudas para que se las
que había menester, y fiase de él, que algún día le declaren, y de éstos necesitan en sus mayores
traería a su verdadero conocimiento. enemistades, para que les den yerbas venenosas
con que tomar venganza de sus enemigos. En al
Bien persuadido estaba este indio de que no
enterrar sus difuntos son varios entre sí; por que
eran sus dioses los más poderosos de la tierra, pues
unos los tienen dentro de sus mismas casas,
quería libremente le dejasen otro mayor a quien
teniendo siempre en todas las ocasiones presente
obedecer.
la memoria de la muerte, que si con este fin lo
hiciesen, las tendrían sin duda más ajustadas. Otros
XLI. UN INDIO SE HACÍA DIOS en hogueras grandes, no sólo queman los cadáveres,
Del mismo parecer que el pasado, aunque de sino juntamente con ellos cuanto poseyeron en vida.
mayor malicia, se mostró otro bárbaro: el cual no Y así los unos como los otros, celebran sus exequias
reconociendo poder ni deidad en sus ídolos, él por muchos días con continuos llantos,
mismo se hacía dios de toda aquella tierra. intererumpidos con grandes borracheras.
De este tuvimos algunas leguas antes de llegar
a su habitación noticia, y despachándose nueva, XLIII. SON ESTOS INDIOS DE APACIBLES
de que se la traímos del verdadero Dios, y más NATURALES
poderoso que no él, le rogamos nos esperase a pie Es a una mano toda esta gentilidad, de buena
quedo. disposición, bien ajestados y de color tan tostado
Hízolo así, y apenas llegaron nuestras como los del Brasil, tienen buenos entendimientos
embarcaciones a tomar puerto en sus riberas, y raras habilidades para cualquiera cosa de manos.
cuando codiciosos de saber del nuevo Dios, salió Son mansos y de apacibles naturales, como
en persona a preguntar por él. se experimentaba con los que una vez salían al
Pero aunque se le declaró quién era, como no encuentro, que con gran confianza conversaban,
le pudo ver con sus ojos, quedóse en su ceguera comían y bebían entre los nuestros, sin jamas
haciéndose hijo del Sol, adonde con el espíritu recelarse de nada.
afirmaba ir todas las noches para mejor disponer al Dábannos sus casas en que vivir, recogiéndose
día siguiente del universal gobierno que le incumbía. ellos todos juntos en una, o dos de las mayores del
Tal era la malicia y soberbia de este bárbaro. pueblo; y con recibir infinitos agravios de nuestros
Mejor discurso y entendimiento mostró otro indios amigos, sin que fuera posible evitarlos, nunca
que, preguntado por qué causa estando sus correspondían con malas obras.
compañeros retirados en el monte, recelosos de la Todo lo cual junto con la poca afición y
vecindad de los españoles, él sólo con algunos sus mestras que dan de ella, de todo lo tocante al culto
parientes salía tan sin temor a meterse en sus de sus dioses: prometen grandes esperanzas de que
manos, respondió que consideraba, que gente que si se les diese noticia del verdadero Creador de los
había subido una vez por medio de tantos enemigos, Cielos y tierra, con poca dificultad abrazarían su
y volvía a bajar sin lesión alguna, no era posible santa ley.
172 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

XLIV. TRÁTASE EN ESPECIAL DE LAS COSAS DEL Corre siempre por el rumbo del de las
RÍO Y DE SUS ENTRADAS Amazonas, acompañándole, aunque a lo largo y
Hablado he hasta aquí en general de todo lo echado en él de cuando en cuando algunos brazos,
tocante a este gran Río de las Amazonas. Razón será que pudiera bien ser cada uno, cuerpo de cualquiera
ya ir descendiendo en particular a declarar sus otro caudaloso río; hasta que recogiendo todas sus
fuerzas, en altura de cuatro grados, pecho por tierra
entradas, a nombrar puertos, averiguar las aguas
se le rinde. Pero uno de estos brazos que más se
de que se alimenta, desentrañar sus tierras, señalar
avecina a la provincia de los Aguas, de cabeza chata,
sus alturas, notar las propiedades de sus naciones,
es por donde se há de salir a gozar de las grandezas
y finalmente no dejar cosa digna de saberse, que como
de nuestro gran Río de las Amazonas, porque al
testigo de vista y persona enviada de su Majestad, a
que se dejare llevar de los que más se incluyan a la
sólo hacer inquisición de todo; podré quizá mejor
banda del norte, há de sucederle lo que los años
que otros dar con bastantes fundamentos, razón de
pasados al Capitán Fernán Pérez de Quesada, que
lo que tomé a mi cargo.
habiendo entrado por este río con trescientos
No trato aquí de la principal entrada de este hombres, y dejándose llevar a la parte de Santa Fe,
río por el mar océano en las costas del gran Pará; dió en la provincia de Algodonal, y con ir tan
que esa, há ya muchos tiempos, que como conocida, reforzado de gente, le fué imperioso retirarse con
y que cae debajo de la línea equinoccial en los más prisa de la que había llevado en la entrada.
últimos fines del Brasil: es cursada y sabida de todos
La segunda puerta, que por la parte del norte
los que quieren navegar a aquellas partes.
podemos señalar a este río, es por la ciudad de Pasto,
Ni tampoco hago mención de propósito de la jurisdicción también del Gobierno de Popayán, de
por donde el tirano Lope de Aguirre salió enfrente donde atravesando la cordillera con algunos
de la Trinidad, por ser esa transversal, y que inconvenientes de mal camino a pie, que de a cavallo
derechamente no se entra por ella a este río, sino es imposible llegando a Putumayo, y navegando de
que teniendo a otras por madre principal, de lance río abajo, se vendrán a salir al de las Amazonas, en
en lance, se viene a dar en brazos, que de él derivan altura de dos grados y medio, a las trescientas
su origen. treinta leguas del Puerto del Napo.
Sólo es mi intento sacar en limpio, y señalar Por este mismo camino, saliendo como dije de
con el dedo todas las puertas por donde de las partes la ciudad de Pasto, y pasada la cordillera,
del Perú, pueden los moradores de aquellas acercándose a los Lucumbios, que están no muy
conquistas tener entrada cierta a este gran río: al lejos del río, llamado Aguarico, por otro nombre Río
cual, como ya dije por la una y otra banda de sus del Oro, se puede salir por él a este principal, casi
riberas, le comunican a otro número de otros muy debajo de la línea, en el principio de la provincia de
caudalosos, por cuyas corrientes es fuerza quien los Encabellados, que es a las noventa leguas del
las siguiere que venga a dar en este principal: pero dicho puerto de Napo.
como de cierto no se sabe en qué ciudades o
provincias traigan sus primeros principios, no se XLVI. OTRAS ENTRADAS
puede tratar cosa fija de sus entradas.
La puerta que para este gran río está debajo
Pero lo podrá hacer en algunas ocho, en que de la equinoccial, cae en el Gobierno de los Quixos,
ningún versado en aquellas tierras, podrá dificultar: más cercana a Quito, en la ciudad de los Cofanes,
tres de estas hacia la banda del nuevo Reino de de donde por el Río de la Coca, se coge desde luego
Granada, que está en este río a la parte del norte; a el canal principal del nuestro de las Amazonas, si
la del sur veremos otras cuatro, y una debajo de la bien por muchas corrientes que trae, hasta
misma línea equinoccial. encontrarse con el de Napo, no es tan buena la
navegación como será por las demás partes que
XLV. DE TRES ENTRADAS QUE HAY POR EL participan la banda del sur.
NUEVO REINO De las cuales, la primera de todas, aunque no
La primera entrada que por la parte que cae al la mejor, es por la Ciudad de Avila, en el mismo
nuevo Reino de Granada, está descubierta para este Gobierno de los Quixos, de donde tres jornadas por
inmenso piélago de aguas dulces, es por la provincia tierra se viene a dar en el Río Payamino, por donde
de Micoá, que pertenece al Gobernador de Popayán; la armada portuguesa salió a tomar puerto en la
siguiendo las corrientes del gran Río Caquéta, que jurisdicción de Quito.
es el dueño y señor de todas las vertientes que de Desemboca este río entre el de Napo y la Coca,
parte de Santa Fe de Bogotá, Timaná, y el Caguan, en aquel paraje que llaman las Juntas de los Ríos,
se le allegan; muy afamado entre los naturales, por a las veinticinco leguas del puerto de Napo.
las grandes provincias de gentiles que sustentan
Mejor puerta abrimos a esta misma armada,
sus orillas.
para la vuelta de su viaje, que no la que a la subida,
Este río tiene muchos brazos por dilatadas con mucho trabajo y pérdidas, había descubierto,
naciones, y volviéndolos a incorporar en el principal, que es por la ciudad de Ar chidona, en la
hace gran multitud de islas, habitadas todas de Gobernación también de los Quixos, y jurisdicción
infinitos bárbaros. de Quito, en donde a sólo un día de camino, a pie
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 173

por ser invierno, que en tiempo de verano, a caballo linea, es de maravillar, que así él, como otros
se pudiera andar, dimos en el puerto de Napo, río muchos que en varias cordilleras coronan aquellas
caudaloso y en quien los vecinos de todo aquel poblaciones siempre cubiertas de nieve, sirven de
gobierno, tienen librado su tesoro, sacando todos templar el calor con que forzosamente, según afirma
los años de sus orillas el oro que necesitan para San Agustín, la tórrida zona había de hacer aquellas
sus gastos. tierras inhabitables, quedando con este refrigerio
Es muy abastecido de pescado, y sus riberas de las más apacibles y templadas de todo lo
de caza, de buenas tierras, que agradecidas a poco descubierto.
trabajo de los labradores, rinden colmados frutos. Corre este Río de Napo, desde su nacimiento
Y este es el principal camino por donde con entre grandes peñascos, con que no es navegable
más comodidades y menos trabajos podrán bajar al hasta que en el puerto donde los vecinos de
Río de las Amazonas todos los que por la provincia Archidona tienen las rancherías de sus indios, más
de Quito, le quisieron navegar. humano y menos bullicioso, consiente sobre sus
hombros ordinarias canoas con que se tragina y
Porque aunque por allá se dice que cerca del aunque desde este sitio, por cuatro o cinco leguas
pueblo de Ambato, que está a dieciocho leguas de la no olvida sus humos humildes luego hasta
ciudad de Quito camino de Río Bamba, hay entrada incorporarse con el Río de la Coca, que es a espacio
a un río que sale a este principal, si no la impide de veinticinco leguas con mucho fondo y gran
algún salto que haga las corrientes; es muy a serenidad, ofrece buen pasaje a mejores
propósito esta bajada por venir a salir al dicho río, embarcaciones. Y está la junta de los ríos donde
setenta y siete leguas más abajo del puerto de Napo, Francisco de Orellana con los suyos fabricó el barco
con que se ahorrará todo el camino de los Quixos. con que navegó por este Río de las Amazonas.

XLVII. OTRAS ENTRADAS A ESTE RÍO XLIX. AQUÍ MATARON AL CAPITÁN PALACIOS
Por la parte de la Provincia de Macas, que cae Cuarenta y siete leguas de estas juntas a la
debajo de la misma jurisdicción y gobierno, de cuyas banda del sur está Anéte, población que fué del
sierras baja Río Curaray, siguiendo su raudal, se Capitán Juan de Palacios, muerto a manos de los
puede también salir al de las Amazonas, en altura naturales, como ya dijimos.
de dos grados, ciento cincuenta leguas de Napo,
distancia que está bien poblada de diferentes Y a los dieciocho de este sitio desemboca a la
naciones. banda del norte del Río Aguarico bien conocido,
así por su temple menos sano, como por el oro que
Y esta es la séptima entrada por este río. de él se saca, de que tomó también nombre de Río
La octava y última, es por Santiago de las de Oro.
Montañas, y Provincia de los Maynas, tierras que Y en su boca de la una y la otra banda, da
baña uno de los caudalosos ríos, que al de las principio la gran Provincia de los Encabellados, que
Amazonas tributan, en ellas con nombre de corriendo por el norte por más de ciento ochenta
Marañon; y en su boca, y muchas leguas antes, de leguas, y gozando siempre de las aguas del gran
Tumburagua. Río de las Amazonas, explaya por caudalosos lagos,
Es este río tal, que más de trescientas leguas desde sus primeras noticias influyó ardientes deseos
de donde en cuatro grados desagua en el principal, de sujetarla a toda la jurisdicción de Quito, por la
se recela su navegación, así por su profundidad multitud de grandes gentiles de que está poblada, y
como por sus precipitadas corrientes: mas con las de hecho en varias ocasiones se comenzó a poner
grandes noticias de los muchos bárbaros que por obra, si bien la última en que el Capitán Juan
sustenta, mayores dificultades allanan los celosos de Palacios lo intentaba, le salió tan mal como ya
de la honra de Dios, y del bien de las almas, en vimos.
busca de las cuales entraron a él a los principios
del año de mil seiscientos treinta y ocho, dos L. AQUÍ QUEDÓ LA ARMADA POR TUGUESA,
religiosos de mi religión, por los Maynas, de quienes PROVINCIA DE LOS ENCABELLADOS
tuve muchas cartas en que no acababan de
encarecer su grandeza, y las innumerables En esta provincia a la boca del Río de los
provincias de que cada día iban teniendo mayores Encabellados, que cae veinte leguas más abajo del
noticias. de Aguarico, donde allí tiene su principio, quedaron
a pie quedo por espacio de once meses cuarenta
Júntase este río con el principal de las
soldados de la portuguesa armada, con más de
Amazonas, a las doscientas treinta leguas del puerto
trescientos indios amigos, de los que llevaban en
de Napo.
su compañía.
Y aunque a los principios hallaron buena
XLVIII. RÍO DE NAPO acogida en los naturales de la tierra, y por la paga,
Tiene su origen éste, tantas veces por mi recibían de ellos los mantenimientos necesarios, no
nombrado Río de Napo a las faldas de un páramo duró por mucho tiempo tanta confianza en pechos
que llaman de Antezana, que cae dieciocho leguas en que aún todavía hervía la saña conque habían
de la Ciudad de Quito; y aunque tan vecino a la derramado la sangre del capitán español, y
174 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

como ésta por su parte también pedía venganza otro muy abundante de muchos géneros de
contra sus agresores, recelosos de que les había de pescados que hasta la boca de este río, no se conocen
castigar su atrevimiento, con pequeña ocasión se en el Amazonas.
alborotaron, y matando tres de nuestros indios se
pusieron en armas para defender sus personas y
LI. PROVINCIA DE LOS AGUAS
tierras.
Sesenta leguas más abajo de Tunguragua
No se descuidaron los portugueses, que como
comienza la mejor y más dilatada provincia de
mal sufridos y peor acostumbrados a semejantes
cuantas en todo este gran río encontramos, que es
libertades de los indios, quisieron luego poner por
la de los Aguas, llamados comúnmente Omaguas,
obra el castigo de ésta. Toman las armas y con sus
impropio nombre que les pusieron quitándoles el
ordinarios bríos, dan en ellos de tal suerte, que con
nativo, y ajustado a su habitación, que es a la parte
pocas muertes cogieron vivas más de setenta
de afuera, que esto quiere decir Aguas.
personas, las cuales tuvieron presas hasta que
muertas unas y huidas otras, no quedó ninguna. T iene esta provincia de longitud más de
doscientas leguas, continuándose sus poblaciones
Puesto en este estado el portugués escuadrón,
tan a menudo, que apenas se pierde una de vista,
y que si quería comer lo había forzosamente de
cuando ya se descubre otra.
buscar de las manos del enemigo, o si no perecer,
determinaron hacer correrías la tierra adentro, y Su anchura es, al parecer, poca, pues no pasa
por fuerza o de grado redimir su vejación. de la que tiene el río, en cuyas islas, que son
Entraban unos y otros quedaban en el Real, y muchas, y algunas muy grandes, tienen su
así éstos como aquéllos, no dejaban de ser habitación: pero considerando, que todas, o están
molestados por el enemigo, que huyendo la suya pobladas, o cultivadas, por lo menos para el sustento
asudía a hacer todo el daño que le era posible, como de estos naturales, se podrá hacer un cálculo de
lo hizo en muchas embarcaciones, destrozando unas los muchos indios que en tan cumplida distancia
y haciendo pedazos las más flacas. se alimentan.

Y no fué este el mayor daño que de él se recibió, Es esta gente la de más razón y mejor gobierno
sino el que sus emboscadas causaban contra que hay en todo el río, ganancia que les granjearon
nuestros indios, degollando los que pudieron hallar los que de ellos estuvieron de paz, no hace muchos
a las manos; si bien pagaron con tres dobladas vidas años, en el gobierno de los Quixos, de donde
de los suyos las que quitaron a los nuestros. obligados por el mal trato que se les daba, se dejaron
venir el río abajo, hasta encontrarse con la fuerza
Castigo pequeño para los rigurosos que suelen
de los de su nación; e introduciendo en ellos algo
ejecutar los portugueses en semejantes casos.
de lo que habían aprendido de los españoles, les
Llamaron a estos indios con nombre de pusieron en alguna policía.
Encabellados, los primeros españoles que los
Andan todos con decencia vestidos, así
descubrieron, por los largos cabellos, que así
hombres como mujeres, las cuales del mucho
hombres como mujeres usan, que a algunas les
algodón que cultivan tejen no sólo la ropa que han
pasan de las rodillas.
de usar, sino otra mucha que les sirve de trato para
Sus armas son dardos, su habitación, casas las naciones vecinas, que con razón codician el
pajizas hechas con curiosidad, y sus trabajo de tan sutiles tejedoras; hacen paños muy
mantenimientos los ordinarios de todo el río. vistosos, no sólo tejidos de diversos colores, sino
Tiene continuas guerras con las naciones pintados con estos mismos tan sutilmente, que
circunvecinas, que son los Seños, Becabas, Tamas, apenas se distingue lo uno de lo otro.
Chufias y Rumos.
Son tan sujetos y obedientes a sus principales
Corren enfrente de esta Provincia de los caciques, que no es menester más de una palabra
Encabellados por la banda del sur, las de los para ver luego ejecutado lo que ordenan.
Auixiras, Jurufunes, Zaparas, e Iquitos, que
Son todos de cabeza chata, que causa fealdad
encerrados entre las aguas de este río y el de Curaray
en los varones, si bien las mujeres mejor lo
fenecen.
encubren con el mucho cabello; y está en ellos tan
Donde también entrambos se convierten en entablado el uso de tener las cabezas aplastadas,
uno, que es a las cuarenta leguas de los que desde que nacen las criaturas, se las meten
Encabellados en casi dos grados de altura. en prensa, cogiéndoles por la frente con una tabla
Ochenta leguas de Curaray a la misma banda, pequeña, que sirviendo de cuna, recibe todo el
desemboca el famoso Río Tunguragua, que ya dije cuerpo del recién nacido, el cual puesto de espaldas
arriba, bajaba por los Maynas con el nombre de sobre ésta y apretado fuertemente con la otra,
Marañón; hácese respetar del de las Amazonas de queda con el cerebro y la frente tan llanos como la
tal suerte, que con tener éste todo su caudal junto, palma de la mano, y como estas apreturas no dan
detiene algunas leguas antes su ordinario curso, lugar a que la cabeza crezca más que por los lados,
dando lugar a que aquél, explayado por más de una viene a desproporcionarse. De manera que más
legua de boca, le entre a besar la mano, pagándole parece mitra de obispo mal formada que cabeza de
no sólo el ordinario tributo que de todos cobra, sino persona.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 175

T iene por la una y la otra parte del río No quiero con esto negar que hay en este río
continuas guerras con las provincias extrañas, que gente Caribe, que en ocasiones no tiene horror de
por la del Sur, entre otros, son los Curinas, tantos comer carne humana.
en número, que no sólo se defienden por la parte Lo que quiero persuadir, es no que no existen
del río, de la infinita multitud de los Aguas, sino en todo él carnicerías públicas, en que todo el año
que juntamente sustentan las armas contra las se pesa carne de indios como publican los que a
demás naciones, que por la parte de tierra les dan título de evitar semejante crueldad la usan ellos
continuada batería. mayor, haciendo con sus rigores y amenazas
esclavos a los que no lo son.
Por la banda del Norte, tienen estos Aguas por
contrarios a los Teamas, que según buenas
informaciones, no son menos, ni de menos bríos LIII. SITIO FRÍO EN QUE SE PODRÁ COGER TRIGO
que los Curinas, pues también sustentan guerras a A las cien leguas, poco más o menos, de las
los enemigos que tienen por tierra adentro. primeras poblaciones de estos Aguas (que caen tres
grados de la Equinoccial) y vienen a ser el riñón de
LII. USO DE LOS ESCLAVOS QUE CAUTIVAN esta dilatada provincia, llegamos a un pueblo, donde
estuvimos tres días, con tán buen frío, que los
De los esclavos que estos Aguas cautivan en nacidos y criados en las más frías zonas de España,
sus batallas, se sirven para todo lo que han hubimos menester añadir ropa a la ordinaria.
menester, cobrándoles tanto amor que comen con
Causó admiración mudanza tan repentina de
ellos en un mismo plato, y tratarles de que los temples y preguntando a los naturales si aquello
vendan es cosa que lo sienten mucho, como por era cosa extraordinaria en aquella población, me
experiencia lo vimos en muchas ocasiones. aseguraron que no, porque todos los años por
Llegábamos a un pueblo de estos indios y nos espacio de tres lunas, que así cuentan ellos y es lo
recibían no sólo con muestras de paz, sino con mismo que decir tres meses, experimentan todos
danzas y gran regocijo y ofrecían cuanto tenían para los años aquellos fríos, que conforme a lo que ellos
nuestro sustento con gran liberalidad. afirmaron son los de junio, julio y agosto. Pero yo
aun no bien satisfecho de su dicho, quise con más
Comprábanseles paños, tejidos y labrados, que fundamento hacer inquisición de la causa de frío
con voluntad daban; tratábaseles de venta de las tan penetrante, y hallé que lo era una gran sierra, o
canoas, que son sus caballos ligeros en que andan páramo, que a la banda del Sur la tierra adentro
y al punto salían a concierto. está situada, por la cual pasan todos aquellos tres
Pero en nombrándoles esclavos y apretán- meses los vientos, y helados con la fuerza de la nieve
doles a que los vendiesen, bona opus, bis labor ést, de que está cubierta, causan tales efectos en la tierra
circunvecina.
aquí era el descompadrar, aquí el entristecerse, aquí
las trazas de encubrirlos, y aquí el procurarse zafar Y siendo esto así, no hay duda sino que en
de nuestras manos; muestras ciertas de que más este sitio se dará muy buen trigo, y todas las demás
los estiman a ellos solos y más sienten el venderlos semillas y frutas que produce la comarca de Quito,
que deshacerse de todo lo demás que poseen. que aunque situada debajo de la linea, semejantes
aires pasados por nuevos cerros, la habilitan a tales
Y no diga nadie que el no querer vender los maravillas.
indios sus esclavos, nace de tenerlos para comer
en sus borracheras, que es dicho común con muy
poco fundamento, de los portugueses, que andan LIV. RÍO PUTUMAYO Y NACIONES QUE EN ÉL Y EN
YETAÚ HAY
metidos en este trato, y con esto quieren colorear
su injusticia. Diez y seis leguas de estas poblaciones a la
banda del Norte desemboca el gran río Putumayo,
Porque a lo menos en esta nación, ya
bien conocido en el gobierno de Popayan, por ser
averigüé con dos indios de los que habían subido tan caudaloso, que antes de desaguar en el del
con los mismos portugueses, y eran naturales del Amazonas, entran en él treinta caudalosos ríos:
Pará, los cuales huídos desde Quito vinieron a llámanle los naturales en este paraje Uza.
ser cautivos de estos Aguas, con quienes
Desciende de las cordilleras de Pasto hacia el
estuvieron ocho meses y fueron a algunas guerras
nuevo reino de Granada, tiene mucho oro y según
en su compañía (tiempo bastante para conocer
nos afirmaron, está muy poblado de gentiles, por
sus costumbres). cuya causa se retiraron con alguna pérdida los
Estos aseguraron qué jamás les habían visto españoles que por él bajaron hace pocos años.
comer los esclavos que traían, sino que lo que Los nombres de las provincias que le habitan,
usaban con los más principales y valientes, era son: Yurunas, Guaricús, Yacariguaras, Parianas,
matarlos en sus fiestas y juntas generales, recelando Ziyus, Atuais, Cunas, y los que más a sus principios
mayores daños si les conservaban la vida; y de una y otra banda, como señores de este río, le
arrojando los cuerpos en el río, guardaban por trofeo pueblan, son los Omaguas, a quienes los Aguas de
las cabezas en sus casas, que eran las que por todo las islas llaman Omaguasyeté, que quiere decir
el camino veníamos encontrando. Omaguas verdaderos.
176 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

A las cincuenta leguas de esta boca, en la parte LVI. PROVINCIA DONDE SE HALLÓ ORO
contraria, encontramos la de un hermoso y Veinte y ocho leguas más abajo del río Yurua,
caudaloso río, que trayendo su origen de hacia el a la misma banda del Sur, en tierras de muy altas
Cuzco, fenece en el de las Amazonas en altura de barrancas, da principio la muy poblada nación de
tres grados y medio; llámanle los naturales Yetaú, y los Curuzirarís, que siguiendo siempre una ribera
tiene entre ellos mucho renombre, así por sus corre por espacio de ochenta leguas, tan
riquezas, como por la multitud de naciones que continuadas sus poblaciones, que apenas se
sustenta, como son las Tipunas, Gunarús, Ozuanas, pasaban cuatro horas sin encontrar otras de nuevo,
Morúas, Naunas, Conomomas, Marianas y los y a veces por espacio de medio día entero no
últimos que más se avecinan a los españoles que cesábamos de mirar sus rancherías.
pueblan el Perú son los Omaguas, que dicen son
De éstas, las más hallábamos sin gente, que
gente riquísima de oro, que traen en grandes
con nuevas falsas de que veníamos destruyendo,
planchas pendientes de las orejas y narices, y si no matando y cautivando, casi todos estaban
me engaña mi discurso, según lo que leí en la retirados a los montes, fuera de que ellos son de
historia del tirano Lope de Aguirre, esta era la suyo de naturales más esquivos que otros
provincia de los Omaguas, en cuyo descubrimiento ningunos de este río.
iba Pedro de Orsúa, enviado del virrey del Perú, por
Si bien no muestran menos gobierno y policía,
las muchas noticias que de sus haberes había
según se echó de ver, así por los muchos
publicado la fama. Pero el no encontrar con ella,
mantenimientos de que estaban prevenidos, como
nació de que tomando su entrada por un brazo de
también por las alhajas de sus casas, que para el
río que sale algunas leguas más abajo, cuando
beneficio de las cosas tocantes a la vida, eran de las
desembocó en el de Amazonas, ya quedaban estas
mejores de todo el río.
naciones tan arriba, que les fué imposible el volver
a ellas receloso del ímpetu de las corrientes y, Tienen en las barracas donde moran muy buen
principalmente, por el poco gusto con que ya sus barro para todo género de vasijas, y aprovechándose
soldados titubeaban. de él, fabrican grandes ollerías, en que labran
tinajas, ollas, homos en que cuecen sus harinas.
Es este río de Yetaú muy abundante de pesca Cazuelas, jarros, lebrillos y hasta sartenes bien
y caza, y que según las informaciones de sus formadas, teniendo todo esto prevenido para trato
moradores, se puede navegar por él con facilidad, común con las demás naciones, que obligadas de la
por ser de suficiente fondo y las corrientes necesidad que de estos géneros pasan en sus tierras,
moderadas. vienen a hacer grandes cargazones de ellos,
recibiendo por paga las cosas de que ellos necesitan.
LV. FIN DE LA PROVINCIA DE LOS AGUAS Y RÍO A la primera aldea de esta nación, viniendo
DEL CUZCO río abajo, llamaron los portugueses, a la subida,
Siguiendo el curso de nuestro río principal, aldea del Or o, por haber hallado en ella y
dimos a las catorce leguas en la última población rescatado alguno, que en planchas pequeñas
de la dilatada provincia de los Aguas, que fenece traían los indios pendientes de las narices y orejas,
con un lugar muy populoso y de muchos soldados, que en Quito se probó y halló ser de veinte y un
quilates mucho de ello.
en fin, como primera fuerza que por esta parte
resiste el ímpetu de sus contrarios, de los cuales en Como los naturales vieran la codicia de los
espacio de cincuenta y cuatro leguas ningunos soldados y que tan a pecho se tomaba el hacer
pueblan las riberas del río, de suerte que de él se de diligencia para que se les entregasen más de
vista a sus rancherías, mas algo retirados adentro aquellas planchitas, luego las recogieron todas, sin
en la tierra firme, por pequeños brazuelos, salen a que más pareciese ninguna, lo cual observaron
buscar de él lo que necesitan. también a la vuelta.

Estos son en la banda del Norte los Curis y De suerte, que aunque vimos muchos indios,
sólo uno trajo dos orejas de oro, bien pequeñas,
Guayrabas, y en la del Sur, Cachiguarás y Tucuriys.
que yo le rescaté.
Pero aunque como digo no pudimos dar vista a estas
naciones, dímosla a la boca del río, que con razón
le podemos llamar del Cuzco, pues según un LVII. MINAS DE ORO
regimiento de esta navegación, que vi de Francisco No se pudo a la subida de la armada averiguar
de Orellana, está Norte-Sur con la misma ciudad con fundamento cosa alguna de cuantas se
del Cuzco. Entra en el de Amazonas en cinco grados encontraron en este río, porque jamás tuvieron
de altura, y a las veinte y cuatro leguas del último lenguas con quienes hacer la inquisición, y si de
pueblo de los Aguas: llámanle los naturales Yurúa, algo les pareció a los portugueses que podían dar
que tendiéndose hasta sus orillas, queda como razón, era de lo que por señas habían entendido,
aislada entre ambos ríos. Y éste es por donde Pedro las cuales eran tan inciertas, que cada uno las
de Orsúa bajó del Perú, si mi fantasía no me engaña. aplicaba a lo que tenía en su pensamiento.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 177

Todo lo cual cesó a la vuelta, queriendo nuestro Es la altura de la boca de este río de dos grados
Señor favorecer a esta jornada, con prevenirla de y medio: como también la de una población, que
ordinario de buenas lenguas, por medio de los cuales cuatro leguas más abajo, en la banda del Sur, está
se averiguó todo lo que se contiene en esta relación. situada, sobre una gran barranca, al desembocar
La que a mí dieron de las minas de donde se de un caudaloso y claro río que los naturales llaman
Tapí y tiene en sus riberas mucha multitud de
sacaba este oro, es la que aquí diré.
gentiles que llaman Paguanas.
Enfrente de esta aldea, algo más arriba, a la
Son todas las tierras que, como dije, por
banda del Norte, entre un río llamado Yurupazí,
espacio de ochenta leguas ocupan esta nación de
subiendo por el mismo y atravesando en cierto
los Curuzirarí, muy altas, de lindas campiñas, y
paraje por tierra tres días de camino hasta llegar a
yerbas para ganados, arboladas no muy cerradas,
otro que se llama Yupura, por él se entra en el
abundantes lagos y que prometen muchas y buenas
Yquiari, que es el río del Oro, donde del pie de una
comodidades a los que la poblaren.
sierra que allí está, lo sacan los naturales en gran
cantidad, y este oro, todo es en puntas y granos de
buen tamaño, de los cuales forman a fuerza de LX. LAGO DORADO
batirlo, las planchas que ya dijimos cuelgan de las Veinte leguas del Río Tapí, desagua en el de
orejas y narices. las Amazonas el Catuá, que formando en la boca
Los naturales que contratan con los que sacan un gran lago de agua verde, trae él su origen de
este oro, se llaman Managús, y los mismos que muchas leguas de tierra adentro a la banda del Sur,
habitan el río y se ocupan en sacarlo, Yumaguaris, tan pobladas sus orillas de bárbaros, como todas
que quiere decir sacadores de metal; porque Yuma, las demás. Si bien le hace ventaja en multitud de
es el metal, Guaris los que lo sacan, y llaman todo naciones diversas, otro río, que con nombre de
género de metales con este nombre general de Yuma, Araganaruba, seis leguas más abajo, sale a la parte
y así para cualquiera herramienta de las nuestras, del Norte, por el cual también se comunica el
como eran hachas, machetes y cuchillos, usaban Yupura, de que arriba tratamos.
de este mismo vocablo Yuma. Llámanse estas naciones Yaguanais, Mucunes,
Dificultosa parece la entrada a estas minas Mapiarús, Aguaynaús, Hutrunas, Mariarúas,
por los inconvenientes que muestra en mudar ríos Yamarúas, Terarús, Liguiyas, Guanapuris, Piras,
y abrir caminos por tierra, y así no me satisface Mopiritus, Ignaranis, Aturiaris, Macaguas, Mafipias,
hasta descubrir otra mucho más fácil, de que Guayacaris, Anduras, Caguaraús, Maraymumas y
adelante diremos. Guanibis.
Entre estas naciones, que todas son de
LVIII. USAN OREJAS Y NARICES AGUJEREADAS diferentes lenguas, según las noticias que por la
parte del nuevo Reino de Granada hay, está el
Estan estos bárbaros desnudos todos, así deseado lago Dorado, que tan inquietos tiene los
hombres como mujeres, sin que les sirva su riqueza ánimos de toda la gente del Perú. No lo afirmo de
más que de un pequeño atavío con que adornar cierto, pero algún día querrá Dios que salgamos de
orejas y narices, que casi todos tienen agujereadas, esta perplejidad. Porque no la haya con el nombre
y en las orejas lo afectan tanto, que a muchos les de un río que sale a la banda del Norte, diez y seis
cabe todo el puño por el agujero que en la parte de leguas de Aragatuba, y se llama como él, se debe
abajo, donde suelen pender los zarcillos, tienen, advertir que entrambos a dos son uno mismo, que
trayéndole de ordinario ocupado con un mazo de por dos distintos brazos de un nombre desaguan
ajustadas hojas, que en él por gala acostumbran. en el de las Amazonas. Y a las veinte y dos leguas
Por la banda de enfrente de todas estas de este brazo último da fin la populosa y rica nación
poblaciones altas, es tierra llana, a una mano, y de Curuzirarís, pobladores de uno de los mejores
tan cerrada, así de otros ríos, como de los brazos migajones de tierra que en todo este gran río
que el Caqueta tiende por sus orillas, que aislada encontramos.
en grandes lagos corre por muchas leguas, hasta
que todos incorporados en el río Negro, se juntan LXI. PROVINCIA DE YORIMAN
con el principal.
Dos leguas más abajo comienza la más
Están pobladas estas islas de muchas nombrada y belicosa nación de todo el Río de las
naciones, pero la que más se extiende por ser más Amazonas, y con quien en sus primeras entradas,
populosa, es la de los Zuanas. atemorizaban a toda la armada portuguesa, que
es la de Yoriman. Está a la banda del Sur ocupando
no sólo la tierra firme de sus orillas, sino también
LIX. ENTRADA A LAS MINAS DEL ORO
mucha parte de sus islas, y aunque de longitud se
Catorce leguas de esta aldea que llamamos del estrecha en pocas más de sesenta leguas, como se
Oro, a la banda del Norte, sale la boca del Río aprovecha de las islas y tierra firme está tan
Yupura, que es por donde se entra en el del Oro, y sobrada de gente, que en ninguna parte vimos
esta es la más cierta y derecha entrada para con juntos más bárbaros que en ella. Son comúnmente
brevedad llegar a dar vista a la tierra que tan liberal más bien agestados y de mejores talles que los
ofrece sus tesoros. otros; andan desnudos como ellos, y se echa de
178 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

ver que fian de su valor, pues con gran seguridad desnudos, traen grandes patenas de oro en las orejas
entraban y salían entre los nuestros, viniendo cada y narices y para llegar a sus pueblos son necesarios
día al Real más de doscientas canoas cargadas de dos meses continuos de camino desde la boca del
niños y mujeres, con frutas, pescados, harinas y Cuchiguará.
otras cosas, que con abalorios, agujas y cuchillos
Por el de las Amazonas abajo, a la banda del
se les rescataban.
Sur, corren los Caripunás, y Zurinas, la más curiosa
Está la primera población de esta provincia gente que hay en todo él, en labrar de manos, sin
situada sobre la boca de un río cristalino, que más herramienta que las que arriba dije, hacen
muestra ser muy caudaloso por la gran fuerza con bancos forjados en forma de animales, con tanto
que impele las aguas del principal. Estará, sin duda, primor y tan acomodados para tener el cuerpo con
como todos los demás, sustentando en sus riberas descanso, que ni la comodidad ni el ingenio los
otras innumerables naciones, de que no supimos pudiera fingir mejores.
los nombres por caminar de paso por su boca.
Labran estólicas, que son sus armas, de palos
muy vistosos, tan delicadamente que con razón las
LXII. UN PUEBLO DE MÁS DE UNA LEGUA DE codician las demás naciones.
LARGO
Y lo que más es, sacan de un tosco leño un
Veinte y dos leguas de la primera población de idolillo tan al natural, que tuvieran bien que
Yoriman, tiene su sitio la mayor que en todo el río aprender de ellos muchos de nuestros escultores.
encontramos, ocupando sus casas más de una legua
de largo; y no vive en cada casa una sola familia, Y no sólo les son todas estas obras de
como de ordinario sucede en nuestra España, sino entretenimiento y comodidad propia, sino también
que las menos que debajo de cada techo se de mucho provecho, hallando a trueque de ellas,
sustentan son cuatro o cinco, y muchas veces más, entre las demás, todo lo que han menester.
de donde se podrá colegir la multitud de todo este
pueblo, el cual pacífico en sus casas nos aguardó LXIV. RÍO BASURURÚ Y SUS NACIONES
sin salir persona de ellas, dándonos todos los
mantenimientos que hubimos menester, de que ya Treinta y dos leguas de donde desagua este
el ejército necesitaba. Río Cuchiguará lo hace también, a la banda del
Norte otro, con nombre entre los naturales de
Aquí estuvimos cinco días, y en ellos se
Basururú, que dividiendo la tierra adentro en
hicieron para matalotaje, pasadas de quinientas
grandes lagos, la tiene toda partida en muchas islas,
fanegas de harina de mandioca, con que hubo de
las cuales todas pueblan infinitas naciones.
comer para todo lo restante del camino. Este
proseguimos, topando muy a menudo poblaciones Son tierras altas y que nunca se anegan por
de esta misma nación. Pero donde existe junta la mayores inundaciones que haya, muy fértiles de
mayor fuerza de ella, es treinta leguas más abajo, mantenimientos, así de maíces, mandioca y frutas,
en una gran isla, cercada de un brazo que arroja el como también de cazas y pescados, con que los
río principal, en busca de otro que le viene a pagar naturales viven hartos y se multiplican cada día
tributo, y juntamente por las riberas de este nuevo más.
huesped, donde son tantos estos naturales, que con
Llámanse, en general, todas las naciones que
razón, aunque no sea más que por su multitud, son
habitan este dilatado sitio, Carabayanas y, en
temidos y respetados de todos los demás.
particular, las provincias en que están divididos son
las siguientes:
LXIII. RÍO DE LOS GIGANTES
Caraguanas, Pocoanas, Urayarís, Mafuca-
Diez leguas adelante del sitio referido, da fin ruanas, Quererús, Cotacarianas, Moacaranas,
la provificia de Yoriman. Y pasadas otras dos, Yaribarus, Yarucaguacus, Cumaruruayanas y
desemboca en la banda del Sur un famoso río, que Curuanaris.
los indios llaman Cuchiguará.
Usan estos indios de arco y flecha; hay entre
Es navegable, aunque en partes con algunas algunos de ellos herramientas de hierro, como son
piedras; tiene mucho pescado, gran suma de hachas, machetes, podones y cuchillos, y
tortugas, abundancia de maiz y mandioca y todo lo preguntando con cuidado por los lenguas, de donde
necesario para facilitar su entrada. les vienen, responden que las compran de los
Está poblado este río de varias naciones, que naturales que por aquella parte están más cercanos
comenzando por su boca y prosiguiendo por él al mar, a los cuales se las dan unos hombres blancos
arriba, son las siguientes: como nosotros, que usan nuestras mismas armas,
Los Cachiguaras, que toman el mismo nombre espadas y arcabuces, que en la costa del mar tienen
del río; Cumayaris, Guaquiaris, Cuyariyayanas, su habitación y que sólo se distinguen de nosotros
Curucurus, Quatanfis, Mutuanis y, por fin y remate por el cabello, que a una mano lo tienen todos
de todos, están los Curiguerés, que según las amarillo, señas bastantes para poder darse cuenta
informaciones de los que los habían visto y que se con claridad que son los holandeses, que en la boca
ofrecían a llevarnos a su tierra, son gigantes de diez del Río Dulce, o el Felipe, hace días tienen tomada
y seis palmos de altura, muy valientes, andan posesión.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 179

Y el año de treinta y ocho, dieron con fuerza Yanmas, Guanamos, Carapanaris, Guarianacaguas,
de gente en la Guayana, jurisdicción del nuevo reino Azerabarís, Curupatabas y los que primero pueblan
de Granada, y no sólo se apoderaron de ella, sino un brazo que este río arroja, por donde, según
que fué tan de improviso, que no pudiendo los informaciones, se viene a salir al Río Grande, en
nuestros sacar el Santísimo Sacramento, quedó cuya boca en el mar del Norte, están los holandeses
cautivo en poder de sus enemigos, que como sabían con los Guanranaquazanas.
cuan estimada es esta prenda entre los católicos, Usan todas estas naciones de arco y flechas,
esperaban un gran rescate por ella, y el que se les muchas de ellas enherboladas con ponzoña.
aparejaba cuando salimos de aquellas partes, eran
buenas compañías de soldados, que con ánimo Son todas las de este río tierras altas, de lindo
cristiano iban a dar las vidas por rescatar a su Señor, migajón y que cultivadas prometen cualesquier
con cuyo favor se lograrían, sin duda, tan buenos frutos, aun de los de nuestra Europa en algunas
deseos. partes; tienen muchas y buenas campiñas cubiertas
de sazonados pastos, para poder en ellas pastar
innumerables cabezas de ganado.
LXV. RÍO NEGRO
Produce grandes árboles de buenas maderas
Aun no treinta leguas cabales más abajo de para todo género de embarcaciones y edificios, que
Basururú, en la misma banda del Norte, en altura no sólo con ellas, sino también con muy buena
de cuatro grados, sale al encuentro del de las piedra de que este sitio abunda, se pueden edificar.
Amazonas el mayor y más hermoso río que en más
de mil trescientas leguas le rinde vasallaje. Están sus orillas pobladas de todo género de
caza; verdad es que el pescado en este río no es
Si bien como tan poderoso en su entrada, que tanto como en el de las Amazonas, a causa de ser
es de legua y media de ancho, parece que se corre sus aguas tan claras, si bien en lagos que la tierra
de reconocer otro mayor, y aunque el de las adentro hace, siempre se coge a manos llenas.
Amazonas con todo su caudal le echa los brazos,
no queriéndolo sujetar hombro con hombro, sin Tiene en su boca buenos sitios para fortalezas
respeto alguno, señoreando de la mitad de todo el y mucha piedra para fabricarlas, con que se podrá
río, le acompaña por más de doce leguas, defender la entrada al enemigo que quisiere salir
distinguiéndose claramente las aguas unas de las por él al principal.
otras, hasta que no sufriendo el de las Amazonas Aunque yo juzgo que no en este paraje, sino
tantas mayorías, revolviéndole en sus turbias muchas leguas más adentro, en el brazo que
hondas le hace entrar por camino y reconocer por desemboca al Río Grande, que ya mencioné, desagua
dueño al que él quería avasallar. en el océano, es donde más seguramente se debiera
Llamaron los portugueses, y con mucha razón, poner toda defensa, con que quedaba del todo
a este gran río el Negro, porque en su boca y muchas cerrado el paso al enemigo para todo este nuevo
leguas más adentro, el mucho fondo que tiene y la mundo, que, sin duda, codicioso ha de intentar en
claridad del agua que de inmensos lagos en él vierte, algún tiempo.
le hacen parecer tan negras sus hondas como si de No me atrevo a afirmar si el río grande en quien
propósito estuvieran teñidas, si bien fuera de su desemboca este brazo del Negro es dulce o el Felipe,
natural son cristalinas. aunque mucho me inclino a este segundo, según
Hace su curso de Oeste a Este en sus buenas demarcaciones, pues este es el primer río
comienzos, aunque las vueltas son tantas que a de consideración que, pasadas algunas leguas entra
distancias muy cortas muda rumbos diferentes; el en el mar después del Cabo del Norte; lo que puedo
que trae por muchas leguas antes de entrar en el asegurar terminantemente, es que en ninguna forma
de las Amazonas es el de Poniente a Oriente. es el Orinoco, cuya principal boca cae enfrente de
Llámanle los naturales que le habitan, Curiacurú. la Isla de la Trinidad, más de cien leguas más abajo
de donde desagua el Río de Felipe, por el cual salió
Si bien los Tupinambas, de quienes después a la mar del Norte Lope de Aguirre, y si él lo navegó,
diremos, le pusieron por nombre Uruna, que en su podrá también otro cualquiera entrar por donde una
lengua quiere decir agua negra. vez se abrió camino.
Como también llamaron al principal de las
Amazonas en este paraje, Paranaguazú, que significa LXVI. INTENTAN LOS PORTUGUESESES ENTRAR
río grande a distinción de otro menor pero muy POR EL RÍO NEGRO
caudaloso, que llaman Paranamirí, esto es río
Situada estaba la armada portuguesa de vuelta
pequeño que desagua a la banda del Sur, una legua
de viaje, en la boca del Río Negro, a los doce de
antes que el Río Negro, que afirman estar muy
Octubre de seiscientos y treinta y nueve, cuando
poblado de diferentes naciones, la última de las
considerándose los soldados ya como a las puertas
cuales está vestida y usan sombreros, señal cierta
de sus casas y volviendo los ojos no sobre los
de que se avecinan a los españoles del Perú.
acrecentamientos que traían, que no eran ningunos,
Los que lo están a las aguas del Río Negro son sino sobre las pérdidas que en espacio de más
grandes provincias, a saber: los Canizuarís, de dos años que habían andado en este
Aguayras, Yacuncaraes, Cahuayapitis, Manacarús, descubrimiento, habían tenido, que no eran pocas.
180 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

Y enterados, por otra parte, que los servicios Como más largamenta constará por la dicha
hechos a Su Majestad en estas conquistas ninguna Real provisión, que en nuestro poder viene y siendo
satisfacción habían de tener en tierras donde los necesario estamos prestos para mostrarla a todos,
que más sangre han derramado en semejantes como lo hicimos a algunas de las principales cabezas
ocasiones están hoy aniquilados y muriendo de de este ejército.
hambre por no poder parecer delante de quien los
Al presente, habiendo entendido por dicho de
pudiera premiar, determinaron atraer a su voluntad
muchos y por las velas que se disponen para la
la del Capitán Mayor, persuadiéndole que ya que
su pobreza les obligaba a buscar algún remedio con navegación, que el Capitán Mayor Pedro Texeira, y
que poder pasar y las noticias de los muchos los demás capitanes y oficiales mayores de esta
esclavos que en el interior de este Río Negro poseían dicha armada, en cuya compañía venimos por
los naturales, ofrecía la ocasión en la mano no mandato de Su Majestad, intentan dilatar más el
permitiesen dejarla pasar sin aprovecharse de ella, viaje entrándose por el Río Negro, en cuya boca al
dando orden de que la gente siguiese esta derrota, presente nos hallamos, con designio de rescatar
pues con los muchos esclavos que de este río se piezas esclavas de él, para llevarlas por tales a
sacase, cuando no llevasen otra cosa, serían bien haciendas del Pará y Marañón, como acostumbran
recibidos de los del Pará, y sin ellos, sin duda, serian hacer en todas las entradas que desde el dicho Pará
tenidos por hombres para poco, pues pasando por hacen a los naturales que habitan en sus confines.
tantas y tan diferentes naciones y habiendo Y porque en esto se ha de gastar forzosamente
encontrado tantos esclavos, se salían con las manos mucho tiempo, a dicho de personas experimentadas
vacias y más habiendo hombres en estas conquistas en semejantes entradas, y ha de haber otros muchos
que a las puertas de sus casas saben hacer esclavos inconvenientes.
de que se sirven.
Por acudir a la obligación que nos corre y para
Muestras daba el Capitán Mayor de quererles descargo nuestro ante la real persona de Su
dar el gusto, quizá porque ellos eran muchos y él Majestad, en nombre suyo, hablando con el
solo, y así dio permiso de que se pusiesen velas en
acatamiento debido, requerimos al Capitán Mayor
las embarcaciones, porque el viento en popa
Pedro Texeira, al Coronel Benito Rodríguez de
favorable para la entrada las pedía.
Olivera, al Sargento Mayor Felipe de Matos, a los
Alborozados estaban todos con esta Capitanes Pedro de Acosta y Pedro Bayón y a los
determinación y nadie se prometía menos que demás oficiales vivos, que al presente se hallan
mucho número de esclavos y persona hubo que no gobernando este ejército en la boca de este Río
se contentaba él solo si no llegaban a trescientos Negro.
los que le tocasen de su parte.
Que por cuanto ya su Majestad tiene noticia,
Cuidado y no pequeño me pudiera dar esta por la Real Audiencia de la Ciudad de Quito y por
resolución, a no conocer el noble ánimo de nuestro su Virrey del Perú, del despacho de nuestras
caudillo, que desinteresado de semejantes empleos, personas para los fines de susodichos y de la
estaba yo muy confiado de que seguiría en primer brevedad con que se esperaba, habíamos de llegar
lugar lo que fuese en servicio de ambas Majestades. a su real presencia, pues según el dicho Capitán
Con esta confianza, después de haber dicho Mayor Pedro Texeira y otros muchos de su
misa recogiéndome aparte con mi compañero, compañía, aseguraron a los señores de la dicha Real
deseoso de por todas vías impedir intentos tan Audiencia de Quito, que habíamos de estar en el
descaminados, hicimos el papel siguiente. Pará dentro de dos meses y medio, de aquí a seis
días se cumplirán ocho meses, que salimos de dicha
LXVII. REQUERIMIENTO HECHO AL EJÉRCITO ciudad de Quito, y aun faltan seiscientas leguas,
desde este puerto al de Pará, de cuya dilación
Los padres Cristóbal de Acuña y Andrés de pueden resultar muchos y graves inconvenientes,
Artieda, religiosos de la Compañía de Jesús, como son el dilatar Su Majestad la fortificación de
personas a quienes el Rey nuestro señor, por una este río, que tantos años hace desea se descubra,
real provisión despachada por su Real Audiencia esperando la brevedad con que nosotros habíamos
de la Ciudad de San Francisco de Quito, en los de llegar con las informaciones de él, y en el ínterin
Reinos del Perú, a veinte y cuatro días del mes de apoderarse el enemigo de sus principales entradas,
Enero de este presente año de mil seiscientos treinta cosa que resultará gran perjuicio a su Real Corona.
y nueve, manda y encarga que habiendo venido en
compañía de esta armada portuguesa por todo este Y juntamente tan buenos y esforzados
gran Río de las Amazonas, nuevamente descubierto, capitanes, como aquí van, harán, sin duda, con
tomemos noticia suficiente y la más clara que ser tantas dilaciones, gran falta a la fortaleza del Pará,
pueda, de las naciones que en él habitan, ríos que adonde si el enemigo llegase, estando ellos ausentes,
se le juntan y lo demás necesario para que en el sería muy cierta su pérdida.
Real Consejo de las Indias se haga pleno concepto Además de esto, los indios de este Río Negro,
de este empresa y que habiéndolo hecho así con la donde se pretende entrar, son a juicio de todos
mayor brevedad posible pasásemos a España a dar gente muy belicosa y de arco y flecha armada con
cuenta a Su Majestad de todo, sin que persona que nos podrán hacer mucho daño, y más viendo
alguna nos pueda impedir la ejecución de todo lo la poca fuerza de los indios amigos que nos han
referido. quedado, muchos de los cuales están enfermos y
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 181

otros son muchachos sin experiencia de guerra y nos dé testimonio de todo lo que en este
todos a una mano con ningún gusto de hacer la requerimiento se contiene y de lo que a él nos fuere
dicha entrada, de la que puede resultar la total respondido.
perdición de este ejército, fuera de que yendo con
poco gusto podrá ser que se nos huyan, como lo
LXVIII. PROSIGUE EL VIAJE Y DEL RÍO DE LA
han hecho los más de los que salieron del Pará y
MADERA
más viéndose ya a las puertas de sus casas.
Hecho este papel y comunicado con el Capitán
Aquí añadimos que los esclavos que se
Mayor, alegrándose él mucho de tener ya quien se
pretendan sacar, hay mucha dificultad si se puede
pusiese de su parte y reconociendo la fuerza de las
hacer con buena conciencia (excepto los que fuesen
razones, mandó al instante recoger las velas, cesar
necesarios para lenguas), porque esta tierra es
con las prevenciones y disponer para que el siguiente
nueva y aunque haya cédulas de Su Majestad (como
día, volviendo a desembocar por la boca del Río
se dice) para sacar esclavos, esto es en la jurisdicción
Negro, prosiguiésemos todos por el de las Amazonas
circunvecina del Pará y Marañón y con las demás
abajo nuestro viaje.
calidades que se requieren, y estos de este río no se
sabe a qué jurisdicción pertenezcan. Hicímoslo así y a cuarenta y cuatro leguas
dimos con el gran Río de la Madera, llamado así de
Y dado el caso que ninguna de las dichas
los portugueses por la mucha y gruesa que traía
razones haga fuerza y que se consiguiese el fin que
cuando lo pasaron, pero su nombre propio entre
de la dicha jornada se desea, que es sacar gran
los naturales que lo habitan es Cayarí.
cantidad de esclavos, estos mismos, por las pocas
fuerzas que para guardarlos y defenderlos de ellos Desciende de la banda del Sur y según lo que
tenemos al presente, podrá ser que sean la total averiguamos, se forma de dos caudalosos ríos que
ruina y destrucción de todos. algunas leguas adentro se le juntan, por los cuales,
según buenas demarcaciones y según las señas de
Por todo lo cual y por lo demás que ofrecerse
los Tupinambás, que por él bajaron, es por donde
pudiera en servicio de las dos Majestades divina y
más en breve que por parte alguna se ha de
humana y perjuicio de la salvación de tanta
descubrir salida a los más cercanos ríos de la
inmensidad de almas como hay en este río.
comarca de Potosí.
De nuevo una y otra vez volvemos a requerir
De las naciones de este río, que son muchas,
al dicho Capitán Mayor Pedro Texeira, Coronel,
las primeras se nombran Zurinas y Cayanas, y luego
Sargento Mayor, Capitanes y Oficiales vivos que al
se van siguiendo los Urutihans, Anamaris,
presente gobiernan este ejército, que no dando lugar
Guarinumas, Curanaris, Erepunacas y Abacatis.
a dilaciones que no sean del servicio de Dios y de
Su Majestad, con toda la brevedad se procure que Y desde la boca de este río, corriendo por el de
prosigamos nuestro viaje del Pará, para de allí pasar las Amazonas abajo lo pueblan los Zapucayas,
a España a cumplir con el fin y obligaciones de Urubutingas, que son muy curiosos en labrar cosas
nuestra legacía y se pueda acudir con brevedad, de madera; tras éstos se siguen los Guaranaguacas,
teniéndolo así Su Majestad por bien a la salvación Maraguas, Quimaus, Burais, Punouys, Oreguatus,
de tantas almas como se han descubierto en este Aperas y otros cuyos nombres no pude con certeza
nuevo mundo, que miserables yacen en la sombra averiguar.
de la muerte.
Y si lo dicho no fuese suficiente para obligar LXIX. ISLA GRANDE DE LOS TUPINAMBÁS
a que todos juntos prosigamos nuestro viaje con
Veinte y ocho leguas de la boca de este río,
la dicha brevedad, requerimos de nuevo con la Real
provisión que para ello traemos al dicho Capitán caminando siempre por la misma banda del Sur,
Mayor Pedro Texeira y a los demás oficiales del está una hermosa isla que tiene sesenta de largo y
ejército, que para ello tuvieren mano, quedándonos consiguientemente más de ciento de circuito,
el avío necesario y todo buen pasaje para resguardo poblada toda de los valientes Tupinambás, gente
de nuestras personas, se nos permita proseguir que de las conquistas del Brasil, en tierras de
sin detención nuestro viaje, que aunque sea con Pernambuco, salieron derrotados muchos años ha,
riesgo de enemigos, lo posponemos todo por huyendo del rigor con que los portugueses les iban
cumplir con lo que Su Majestad nos manda en su sujetando.
Real provisión. Salieron tan gran número de ellos, que
Y haciendo lo contrario, protestamos de todos despoblando a un mismo tiempo ochenta y cuatro
los daños e inconvenientes que de la dilación que aldeas donde estaban situados, no quedó de todos
hubiere en la dicha jornada se siguieren y de dar ellos ni una criatura que no trajesen en su
cuenta de ello al Real Consejo de las Indias y a su compañía.
Real persona del Rey nuestro señor, como se nos Cogieron siempre a mano izquierda las faldas
manda lo hagamos. de la Cordillera, que viniendo desde el estrecho de
Y últimamente para resguardo de nuestras Magallanes ciñen toda la América: y descabezando
personas, y muestras de que deseamos cumplir cuantos ríos tributan de ella en el Océano, llegaron
efectivamente con lo que somos mandados, pedimos algunos a entrarse con españoles del Perú que
se le ordene al escribano nombrado de este ejército, habitaban en las cabezas del Río de la Madera.
182 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

Estuvieron con ellos algún tiempo, y porque A la banda de enfrente, que es la del Norte,
un español azotó a uno, por haberle muerto una dicen que están continuadas siete provincias bien
vaca, aprovechándose de la ocasión del Río, se pobladas, pero que por ser gente para poco, y que
arrojaron todos por sus corrientes, viniendo a dar sólo se sustentan con frutas y animalillos silvestres,
en la Isla que al presente habitan. sin jamás sustentar guerras entre sí, ni con otros,
Hablan estos Indios la lengua general del no hacen de ellos caso.
Brasil, que también corre entre casi todos los de las También afirman que con otra nación que
conquistas del Marañón y Pará. confina con esta tuvieron paces mucho tiempo,
Dicen también que como salieron tantos, que habiendo comercio entre ellos de lo que cada una
no pudiendo por aquellos desiertos sustentarse en su provincia abundaba, y lo principal de que los
todos juntos, se fueron dividiendo en tan dilatado Tupinambás se proveían era de sal, que los amigos
camino, que por lo menos será de más de les traían por sus rescates, que afirmaban venirles
novecientas leguas, quedando unos a poblar unas de otras tierras vecinas a las suyas, cosa que si se
tierras y otros otras, de quienes sin duda estarán descubriese sería de grande utilidad para la
bien llenas todas aquellas Cordilleras. conquista y poblaciones de este Río.
Son gente de gran brío en la guerra, y bien lo Y cuanto aquí no se halle, se ha de descubrir
mostraron los que llegaron a estos parajes, donde en grande abundancia en un río de los que bajan
al presente habitan, pues siendo ellos, sin de hacia el Perú; de donde el año de treinta y siete,
comparación, muchos menos que los naturales de estando ya en la ciudad de Lima, salieron dos
este Río, de tal suerte les asolaron, y sujetaron a hombres que de lance en lance, aportaron por
todos aquellos con quienes tuvieron guerras, que aquellas partes, a cierto paraje, donde bajando por
consumiendo naciones enteras, a otras obligaron a uno de los ríos, que en este principal desaguan,
dejar de miedo su natural, e irse peregrinos a tierras dieron con un gran cerro todo de sal, de que los
extrañas. moradores tenían el estanco, sustentándose ricos y
Usan estos Indios de arco y flecha, que con abundantes, con las pagas que por ella recibían, de
destreza disparan. los que de más lejos la venían a contratar.
Son de corazones nobles e hidalgados, si bien Y no es nuevo en el Perú, y en todas sus
como ya casi todos los que al presente hay, son hijos Cordilleras, tener cerros de sal de piedra excelente,
y nietos de los primeros pobladores, ya se van pues esta es la que en todo él se gasta, sacándola
acomodando a las bajezas y mañas de los de la de su natural con barretas aceradas, en pedazos
tierra, con cuya sangre están mezclados. tan grandes, que tienen a cinco y seis arrobas
cada uno.
Mostráronnos todos grande agasajo, dando
muestras de que en breve se habían de reducir a Ocupa esta provincia de los Tupinambás
vivir entre los Indios amigos del Pará; cosa que será setenta y seis leguas de largo, que fenece en una
sin duda muy útil para conquistar todas las demás buena población que está situada en tres grados de
naciones de este Río, si se hubiere de poblar; pues altura, como también lo estaba la primera de los
a sólo el nombre de Tupinambás no hay ninguna Indios Aguas de que ya hicimos arriba mención.
de ellas que no se rinda.
LXXI. DAN NOTICIAS DE LAS AMAZONAS
LXX. NOTICIAS QUE DIERON LOS TUPINAMBÁS Con el dicho también de estos Tupinambás,
De estos Indios Tupinambás como de gente confirmamos las largas noticias que por todo este
de más razón y que no necesitan de intérpretes, río traíamos de las afamadas Amazonas, de quienes
por correr, como ya dije, entre ellos la lengua él tomó el nombre de sus primeros principios, no
general, que muchos de los mismos portugueses conociéndole por otro ninguno, sino por éste, todos
hablan con eminencia, por ser nacidos y criados los cosmógrafos que de él hasta hoy han tratado.
en aquellas costas tuvimos algunas noticias que Y fuera cosa de admiración que sin muy graves
aquí diré; como gente que tiene corrido y sujeto fundamentos, hubiera usurpado el nombre de Río
todo lo circunvecino a su jurisdicción, se pueden de las Amazonas, pudiéndole cualquiera dar en
tener por ciertas. rostro, de que por él se quería hacer famoso, con no
Dicen que cercanos a su habitación, a la banda más razón que de vestirse de lo ajeno.
del Sur en tierra firme, viven, entre otras, dos
No me lo persuado yo de su nobleza, ni es
naciones, la una de enanos, tan chicos como
creíble, que teniendo este gran río tantas grandezas
criaturas muy tiernas, que se llaman Guayazís, la
de que echar mano, sólo quisiese gloriarse del título
otra de una gente que todos ellos tienen los pies al
que no le competía. Bajeza ordinaria, de quien no
revés, de suerte que quien no conociendo los
valiendo por sus brazos alcanza la honra que decea,
quisiese seguir sus huellas, caminaría siempre al
la procura mendigar del vecino.
contrario que ellos, llámanse Mutayus, y les son
tributarios a estos Tupinambás, de hachas de piedra Los fundamentos que hay para asegurar
para el desmonte de los árboles, cuando quieren provincia de Amazonas en este río, son tantas, y
cultivar la tierra, que las hacen muy curiosas, y de tan fuertes que sería faltar a la fe humana el no
continuo se ocupan de labrarlas. darles crédito.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 183

Y no trato de las graves informaciones, que camas en que ellos duermen, la llevan a su casa, y
por orden de la Real Audiencia de Quito, se hicieron colgándola en parte donde el dueño la conozca, le
con los naturales que le habitaron muchos años, reciben por huésped aquellos pocos días, después
de todo lo que en sus riveras contenía; en que una de los cuales ellos se vuelven a sus tierras,
de las principales cosas que se aseguran, era el estar continuando todos los años este viaje por el mismo
poblado de una provincia de mujeres guerreras, que tiempo.
sustentándose solas sin varones, con quienes, no Las hijas hembras que de este ayuntamiento
más a ciertos tiempos tenía cohabitación, vivían en nacen, conservan y crían entre si mismas que son
sus pueblos, cultivando sus tierras, y alcanzando las que han de llevar adelante el valor, y costumbres
con el trabajo de sus manos todo lo necesario para de su nación, pero los hijos varones no hay tanta
su sustento. certeza de lo que con ellos hacen.
Tampoco hago mención de las que por el nuevo Un Indio, que siendo pequeño, había ido con
Reino de Granada, en la Ciudad de Pasto, se hicieron su padre a esta entrada, afirmó que los hijos varones
con algunos Indios, y en particular con una India, los entregaban a sus padres, cuando el siguiente
que dijo haber ella misma estado en sus tierras año volvían a sus tierras. Pero los demás, y es lo
donde estas mujeres están pobladas; conviniendo que parece más cierto por ser dicho más común,
en todo con lo que ya se sabía por los primeros dicen que en reconociéndoles por tales les quitan la
dichos. vida.
Sólo echo mano de lo que oí con mis oídos, y El tiempo descubrirá la verdad, y si éstas son
con cuidado averigué desde que pusimos los pies las Amazonas afamadas de los historiadores, tesoros
en este Río. En que no hay generalmente cosa más encierran en su comarca para enriquecer a todo el
común, y que nadie la ignora, que decir habitan en mundo.
él estas mujeres, dando señas tan particulares, que
conviniendo todas en unas mismas, no es creíble Está la boca de este río que pueblan las
se pudiese una mentira haber entablado en tantas Amazonas, a dos grados y medio de altura.
lenguas y en tantas naciones, con tantos colores de
verdad. LXXIII. ESTRECHURA DE TODO EL RÍO
Pero donde más luz tuvimos del sitio donde Pasada la boca de este Río de las Amazonas y
viven estas mujeres, de sus costumbres, de los corriendo veinte y cuatro leguas del principal,
Indios que las comunican, de los caminos por donde desagua a la misma banda del Norte, otro mediano,
se entra a sus tierras, y de los naturales que los que se llama Urixamina, que sale a aquel paraje,
pueblan, (que es la que aquí daré) fué en la última donde como ya dije arriba, se estrecha este gran
aldea donde da fin la provincia de los Tupinambás. Río, en espacio de poco más de un cuarto de legua.
Donde ofrece apacibles sitios para plantar, de una
LXXII. RÍO DE LAS AMAZONAS y otra banda, dos fortalezas, que no sólo impiden el
paso al enemigo, que por parte del mar le intentare,
Treinta y seis leguas de esta Aldea, corriendo
sino que también, sirviendo de Aduanas, se registre
Río abajo, está a la banda del Norte el de las
Amazonas, que con nombre de Río Canuris es en ellas todo lo que por este Río de las Amazonas, si
conocido entre aquellos naturales. se pueblare, será fuerza que baje del Perú.

Toma este río el nombre de los primeros Indios Desde este paraje que está, como arriba dije,
que sustenta en su boca, a quienes se siguen los más de trescientas y sesenta leguas de la mar, se
Ápantos, que hablan la lengua general de todo el comienza a sentir sus mareas, reconociéndose todos
Brasil. Tras éstos están sitiados los Taguaus, y los los días crecientes y menguantes, aunque no tan a
últimos, que son los que comunican con las mismas las claras como de algunas leguas más adelante.
Amazonas, son los Guacarás.
Tienen estas mujeres varoniles su asiento LXXIV. RÍO Y NACION DE TAPAJOSOS
entre grandes montes y eminentes cerros, de los Cuarenta leguas de esta estrechura desemboca
cuales el que más se descuella entre los otros, y por la banda del Sur, el grande y vistoso Río de los
que como más soberbio es combatido de los vientos, Tapajosos, tomando el nombre de la nación, y
con más rigor, a cuya causa toda la vida se muestra
provincia que sustenta en sus orillas, que es muy
escalvado y limpio de yerba, se llama Yacamiaba.
poblada de bárbaros, en buenas tierras, y de
Son mujeres de gran valor, y que siempre se abundantes mantenimientos.
han conservado sin ordinario comercio de varones,
Son estos Tapajosos, gente de bríos y que les
y aun cuando éstos por concierto que con ellas
temen muchas veces de las naciones circunvecinas,
tienen, vienen cada año a sus tierras, los reciben
porque usan de tal ponzoña en sus flechas, que con
con las armas en la mano, que son arcos y flechas,
sólo llegar a sacar sangre, quitan sin remedio la vida.
que juegan por algún espacio de tiempo, hasta que
satisfechas de que vienen de paz los conocidos, y Y a esta causa los mismos portugueses les
dejando las armas, acuden todas a las canoas, o recelaron la comunicación por mucho tiempo,
embarcaciones de los huéspedes y cogiendo cada deseando por bien atraerles a su amistad, a que
una la hamaca que halla más a mano, que son las nunca salieron del todo, porque les obligaban con
184 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

ella a dejar su natural, y venirse a poblar entre los Amenazan los Indios acorralados, y temerosos,
ya pacíficos, cosa que sienten mucho estas naciones. atemorízanles de nuevo con nuevos rigores; para
Si bien en sus tierras recibían con gran agasajo a que ofrezcan Esclavos, asegurándoles que con esto
los nuestros, como lo experimentamos alojados no sólo quedarían libres, sino amigos suyos y
junto a un pueblo suyo, de más de quinientas cargados de herramientas y lienzo de algodón que
familias, de donde en todo el día no cesaron de venir les darían por ellos.
a rescatar gallinas, patos, hamacas, pescado,
¿Qué habían de hacer los miserables, presos
harinas, frutas y otras cosas; con tanta seguridad,
ellos, quitadas las armas, saqueadas sus casas,
que mujeres, y niños, no se apartaban de nosotros,
ofreciendo que si los dejasen en sus tierras, viniesen oprimidas sus mujeres, e hijos, sino rendirse a todo
muy enhorabuena a poblarlas los portugueses, que lo que ellos quisiesen hacer?
los recibirían y servirían de paz toda la vida. Ofrecen mil esclavos, envían por ellos, que con
el alboroto de la tierra se habían puesto en cobro, y
LXXV. OPRESIÓN QUE HICIERON LOS POR TU- no pudiendo juntar más de pocos más de doscientos,
GUESES entréganlos, y con palabra de que cumplirán los
restantes, dejan libres a los que por verse así
No bastaron los humildes ofrecimientos de ofrecieran sus mismos hijos por esclavos, como
estos Tapajosos, para personas tan interesadas muchas veces ha acontecido. Despachan todos estos
como son las de estas conquistas, y que sólo al Marañón y Pará, que yo vi con mis ojos, y
emprenden dificultades con la codicia de los esclavos saboreados de la presa, disponen luego otra mayor
que esperan rescatar, para que fuesen admitidos, o
entronación más adentro del Río de las Amazonas,
por lo menos puestos en toda razón y conveniencia.
donde serán sin duda mayores las crueldades,
Si no que sospechando tenía esta nación muchos
porque van menos personas de valor, que puedan
en su servicio trataron con toda fuerza, a titulo de
ir a la mano del que lleva el cargo de todos. Con que
rebeldes, irles a ofrecer cruda guerra.
quedará el Río tan alborotado, que cuando Su
Ésta se estaba disponiendo cuando llegamos Majestad quiera que se pacifique, habrá de tener
de nuestra jornada al fuerte del Destierro, donde se muy grandes dificultades, siendo así que como yo
juntaba la gente para tan inhumana facción. le dejé cuando salí de él, a muy poca costa se pudiera
Y aunque por los mejores medios que pude, la hacer.
procuré, ya que no impedir, a lo menos suspender Estas son las conquistas del Pará, este es el
hasta que hubiese nueva orden de Su Majestad, el trato de que se sustentan y esta la justísima causa
sargento mayor del Estado, cabo, y caudillo de todos, porque todos andan arrastrados, sin tener un pan
que era Benito Maciel, hijo del Gobernador me dio que comer.
su palabra de que no proseguiría con su intento,
hasta tener aviso de su padre. Y si no fuera por los servicios que han hecho a
entrambos majestades divina y humana en resistir
Apenas volví la cabeza, cuando con la más
valerosamente al enemigo holandés, que varias veces
gente que pudo, en una lancha con piezas de
ha vencido en aquella tierra, ya Nuestro Señor la
artillería y en otras embarcaciones menores, dando
tuviera asolada.
sobre ellos de improviso, les ofreció cruda guerra,
si no querían buena paz. Volviendo, pues, a lo de los Tapajosos, y al
famoso río que baña sus riberas, digo que es de tan
Ésta admitieron luego ellos con buena
buen fondo, que por él arriba muchas leguas, subió
voluntad, como siempre la habían ofrecido, rendidos
en tiempos atrás una nave inglesa de gran porte,
a todo lo que quisiesen disponer de sus personas.
que pretendiendo hacer asiento en esta provincia y
Mándales entregar todas las flechas herbadas entablar cosechas de tabacos con los naturales, les
de ponzoña, que tenían, que era de lo que más se ofrecieron buenos partidos; pero ellos dando de
podía recelar, a que los miserables obedecieron luego improviso en los ingleses no aceptaron otro, que
al punto; y viéndolos ya desarmados cogen gran matar a los que pudieron haber a las manos, y
cantidad de bárbaros y enciérranlos todos en un aprovechándose de sus armas, que hoy en día
corral con suficiente guarda, sueltan los Indios tienen, les hicieron dejar la tierra más rápido de lo
amigos que llevaban, que para hacer mal cada uno que habían venido, excusando la gente que quedó
es un diablo desatado, que en breve tiempo en la nave, con hacerse luego a la vela, otro
saquearon todo el pueblo, sin dejar cosa en él que encuentro semejante, en que del todo quedasen
no asolasen; aprovechándose, como me contó quien consumidos.
lo había visto, de las hijas y mujeres de los afligidos
presos, a vista de sus mismos ojos: y haciendo cosas
que me aseguró esta persona, que es bien antigua LXXVI. CURUPATUBA
en aquellas conquistas, que por no verlas, no sólo A pocas más de cuarenta leguas de la boca
dejaría de comprar esclavos, pero que aun daría de del Río de los Tapajosos, está el de Curupatuba,
balde los que poseía. que desaguando en el principal de las Amazonas, a
No paró aquí la crueldad de los portugueses, la banda del Norte, da nombre a la primera
que como iba envuelta en codicia de esclavos, no población, o aldea, que de paz tienen los portugueses
quedaba satisfecha hasta verse señora de ellos. a devoción de su corona.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 185

No muestra este río ser muy caudaloso de artillería; que para lo que toca a defender el Río, no
aguas, pero sí de tesoros si los naturales de él no sirve de nada, autorizando sólo la dicha Capitanía,
nos engañan; los cuales afirman que subiendo por y teniendo en algún temor los indios que de ella se
este río, que ellos llaman con nombre de Iriquiriqui, van reduciendo.
camino de seis días, se halla gran cantidad de oro,
que lo cogen en las orillas de un riacho pequeño, Este fuerte quitó Benito Maciel con brazo de
que baña las faldas de un mediano cerro, llamado Gobernador del Curupá, que cae treinta leguas más
Iacuaracuru. abajo, donde por muchos años estuvo situado en
muy buen sitio, y donde las naves enemigas venían
Dicen también que cerca de éste está otro sitio
a reconocer de ordinario.
cuyo nombre es Picuro, donde han sacado otras
veces otro metal más duro que el oro, de color
blanco, que sin duda es plata, de que labraron LXXVIII. RÍO PARANAIBA
antiguamente hachas y cuchillos, pero que viendo
Diez leguas más abajo del río Ginipape sale a
no ser de provecho, y que luego se mellaban, no
la banda del Sur, uno muy vistoso, y caudaloso,
hicieron más caso de él.
que con dos leguas de boca, entra rindiendo parias
Hay en este mismo distrito dos sierras; que la al principal, llámanle los naturales Paranaiba; están
una, según las señas que dan los Indios, es de en sus riberas algunas poblaciones de indios amigos,
azufre, y de la otra, que se llama Paraguaxo,
que teniendo asiento en sus primeras entradas,
aseguran que cuando le da el sol, y también en las
obedecen las órdenes de los portugueses que los
noches claras, resplandece de suerte que toda ella
gobiernan. Y en lo más interior viven otros muchos,
parece esmaltada de rica pedrería; y de cuando en
cuando revienta con grandes estruendos, muestra de quienes, y de lo demás que este río contiene,
cierta de que en sí encierra piedras de mucho valor. aun no hay suficientes noticias.

LXXVII. RÍO GINIPAPE LXXIX. RÍO PACAXA


No promete menos tesoros, según noticias Desde dos leguas más abajo del Ginipape
comunes, el río de Ginipape, que corriendo por la comienza a dividirse en grandes brazos el Río de las
misma banda del Norte desemboca en el de las Amazonas que causan la multitud de Islas, que
Amazonas, a las sesenta leguas más abajo de la hasta desembocar en el Océano en él se conocen,
aldea de Curupatuba. De quien dicen los Indios pobladas todas de diferentes naciones y lenguas; si
tanto, del mucho oro que en sus orillas se puede bien las más entienden la general de aquella costa.
recoger, que si ello es así, sólo este río dejará atrás
con sus haberes, los mayores de todo el Perú. Son estas Islas tantas, y las naciones que las
habitan tan diversas, que sólo para ellas era
Las tierras que este río riega, son de la menester una nueva historia.
capitanía de Benito Maciel Pariente, Gobernador de
Marañón, que fuera de ser ellos sólos, más que toda Con todo nombraré aquí algunas de las más
España junta, y haber en ellas muchas noticias de conocidas, como son las de los Tapuyas, Anaxiates,
minas, son en sí por la mayor parte del mejor Mayanafes, Engaibas, Bocas, Juanes, y las de los
migajón, y para rendir mayores frutos, y provechos valientes Pacaxás, que en las riberas del Río, de
que cuentas hay en este inmenso Río de las quien tomaron nombre, que sale ochenta leguas del
Amazonas. Paranaíba, a la misma banda, tienen su habitación,
Están todas a la banda del Norte; contienen y en tanto número así de aldeas como de moradores,
en sí grandes provincias de bárbaros; y lo que es según afirman los portugueses que allá estuvieron,
más de estima, encierran debajo de su jurisdicción, como cualquiera otra de las más pobladas de
las afamadas y dilatadas tierras del Tucujú, tan nuestro Río.
suspirado, y tantas veces poblado, aunque con su
daño, del enemigo holandés, que reconociendo en LXXX. POBLACIÓN DE CONMUTÁ
ellas las mayores comodidades del mundo, para
enriquecer sus moradores jamás las puede olvidar. A cuarenta leguas del Pacaxá está situada la
aldea del Conmutá, que en aquellas conquistas fué
Son no sólo a propósito para grandes cosechas
en tiempos pasados de grande fama, así por sus
de tabacos, y capaces de las mejores de lo
descubierto para muchos ingenios de azúcar, y muchos moradores como por ser allí donde de
agradecidas con sus mantenimientos, a cualquier ordinario se aprestaban las armadas, cuando
pequeño cultivo, que en ellas haya, sino también habían de hacer sus correrías.
de excelentes campiñas, que con abundantes pastos Pero ya no le ha quedado ni gente, por haberse
sustentaran infinitos ganados. mudado a otras tierras, ni mantenimientos por no
En esta Capitanía, seis leguas de donde haber quien los cultive, ni otra cosa más que el sitio
desagua Ginipape, el Río arriba de las Amazonas, con pocos naturales siempre bueno, y que con su
está un fuerte de portugueses, que llaman del apacibilidad y linda vista, está brindando hermosura
Destierro, con treinta soldados y algunas piezas de y comodidades a los que le quisieren poblar.
186 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

LXXXI. RIO DE LOS TOCANTINES LXXXIII. ENTRA EN EL MAR EL RIO DE LAS


A las espaldas del Conmutá desemboca el río AMAZONAS
de los Tocantines, que aunque en aquellas partes Veinte y seis leguas de la Isla del Sol, debajo
tiene nombre de rico, y al parecer con algunos de la línea Equinoccial, explayado en ochenta y
encarecimientos, ninguno ha conocido su caudal, cuatro de bocal teniendo por la banda del Sur al
sino sólo el francés, que cuando poblaba sus costas, Zaparará, y por la contraria al Cabo del Norte,
cargaba naves de sola la tierra que de sus orillas
desagua en el Océano el mayor piélago de aguas
sacaba, para beneficiarla en la suya, enrique-
dulces que hay en lo descubierto, el más caudaloso
ciéndola. Sin atreverse jamás a mostrar tales tesoros
Río de todo el Orbe: el Fénix de los Ríos, el verdadero
a los bárbaros, que en él habitan, receloso de que
haciendo de ellos la estima que era razón, sin duda Marañón, tan suspirado, y nunca acertado de los
los defenderían con las armas para no dejarse del Perú, el Orellana antiguo, y para decirlo de una
desposeer de tantas riquezas. vez, el gran Río de las Amazonas.
A las cabezadas de este Río aportaron ciertos Después de haber bañado con sus aguas mil
soldados portugueses, que desde Pernambuco, con trescientas cincuenta y seis leguas de longitud:
un sacerdote en su compañía, atravesaron todas después de sustentar en sus riberas infinitas
las faldas de la Cordillera, en busca de nuevas naciones de bárbaros; después de fertilizar
conquistas, y queriendo por él abajo navegar hasta inmensas tierras; y después de haber pasado por el
darle fin, ellos le tuvieron desastrado a manos de riñón de todo el Perú, y como canal principal,
los Tocantines, en cuyo poder se halló no ha muchos recogido en sí lo mejor, y más rico de todas las
años el caliz, con que el buen sacerdote les decía vertientes.
misa en sus peregrinaciones.
Este es en suma el nuevo descubriminto de
este gran Río, que encerrando en sí grandiosos
LXXXII. EL PARÁ tesoros a nadie excluye; más antes, a todo género
Treinta leguas del Conmutá tiene su asiento de gente convida liberal a que se aproveche de ellos.
la fortaleza del gran Pará, poblada y gobernada por
Al pobre ofrece sustento, al trabajador,
portugueses.
satisfacción de su trabajo; al mercader, empleos; al
Hay en ella Capitán Mayor, que es sobre todos soldado, ocasiones de valer; al rico, mayores
los de aquella Capitanía, y a quienes están sujetos acrecentamientos; al noble, honras; al poderoso,
otros tres Capitanes de infantería, que de ordinario estados; y al mismo Rey un nuevo Imperio.
asisten con sus compañías, para la defensa de
aquella plaza. Pero quienes más interesados se ha de mostrar
en esta conquista, son los celosos de la honra de
Si bien así éstos como aquél, en todo obedecen
Dios, y bien de las almas, pues tanta multitud de
al Gobernador del Marañón, que tiene su asiento
ellas, está ya clamando, por fieles ministros del
más de ciento y treinta leguas la Costa arriba hacia
el Brasil, de que hacen graves inconvenientes en el Santo Evangelio, para que con la claridad de él, se
Gobierno del Pará, que si este río se puebla será les ahuyenten las sombras de la muerte, en que ha
fuerza quede por dueño de él, como quien tiene en tanto tiempo que miserables yacen.
su mano la llave de todo. Y nadie se excuse de esta empresa, pues para
Y aunque es verdad, que el sitio donde al todos hay campo descubierto, y por muchos
presente está no es, a juicio de muchos, el mejor trabajadores que se conduzcan la mies será mayor;
que se podía escoger, habiendo de ir este y siempre necesitará esta nueva viña de nuevos y
descubrimiento adelante, será fácil mudarle a la Isla fervorosos obreros para que la cultiven; basta
del Sol, catorce leguas más a la mar; puesto, en sujetarla toda debajo de las llaves de la Iglesia
quien todos tienen los ojos, por los muchos cómodos Romana. A que sin duda nuestro Grande, y Católico
que ofrece para la vida humana así de capacidad y Rey Felipe IV, que Dios nos guarde muchos, y felices
bondad en la tierra. Para el sustento de la población, años, acudirá de su parte, con la liberalidad que
como también por la comodidad de los navíos que a acostumbra en lo temporal, para el sustento de
ella aportasen, que en una ensenada, segura de
ministros tales. Y la Santidad de nuestro muy Santo
todos contrastes, pueden estar todo el tiempo que
Padre Urbano VIII de gloriosa memoria, como Padre,
quisieren, y cuando se hubiesen de hacer a la vela,
y Cabeza que hoy es de la Iglesia, se muestra en lo
con la primera plena mar quedan desembocados de
todos los bajos que hacen dificultosos estos puestos, espiritual no menos liberal y benigno, teniendo a
que no es pequeña comodidad. grande dicha que en sus tiempos se abra anchurosa
puerta, para reducir al rebaño de la Iglesia, de una
Es esta Isla de más de diez leguas de circuito,
vez, más naciones juntas, y más populosas, de
de buenas aguas, mucho pescado de la mar, y del
cuantas en toda la América, desde sus primeros
río, gran multitud de cangrejos, sustento ordinario
principios, se descubrieron.
de los Indios, y gente pobre; y al presente es de las
principales a donde van del Pará de ordinario a cazar
la carne que han menester para su sustento. Laus Deo Virginiqve Matri.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 187

MEMORIAL PRESENTADO EN EL REAL CONSEJO DE LAS INDIAS, SOBRE EL


DICHO DESCUBRIMIENTO DESPUÉS DE LA REBELIÓN DE PORTUGAL [Figura 13.2]

SEÑOR: De que resultarán los provechos siguientes:


Cristóbal de Acuña, religioso de la Compañía Lo primero, y que siempre lo es en el
de Jesús, que vino por orden de Vuestra Majestad, cristianísimo pecho de Vuestra Majestad, dará sin
al descubrimiento del gran Río de las Amazonas, más dilaciones, principio con la conversión de un
cuidadoso siempre de los mayores aumentos de su nuevo mundo de infieles que miserables yacen en
Real Corona, y receloso de que acontecimientos la sombra de la muerte: obra tan del servicio de
menos favorables, vistos a nuestras puertas, Dios, que no se puede ofrecer otra que más le agrade,
ahoguen e impidan el lucimiento de sus afectuosos y tal que por ella se dará por obligada a establecer
servicios, dice: Que aunque es verdad, que la con perpetuidad la Corona de Vuestra Majestad, y
principal puerta de aquel nuevo mundo descubierto, de nuevo dilatarla a mayores imperio.
para más en breve comenzar a gozar de los Lo segundo, ahorráranse muchos gastos, que
provechosos y ricos frutos, que liberal ofrece, es la como forzosos, eran inexcusables, si esta conquista
boca principal de él, por la parte que por eso menos se hubiera de hacer como se intentaba, por la boca
sazonada, para que de presente se procure esta del Río: en conducir soldados, pr evenir
entrada. embarcaciones, juntar pertrechos, y disponer todo
lo necesario para formar nuevas poblaciones, que
Pero que no por eso debe Vuestra Majestad
sin duda habían de ser muchas.
desistir, ni dilatar la profesión de este gran Río, pues
con más facilidad y muchos menos gastos lo podrá Lo cual todo se excusa con mandar que se
hacer por la provincia de Quito, en los Reinos del comience esta conquista por las entradas de Quito,
Perú, por las mismas entradas por donde él, y sus pues los particulares a quienes se cometieren, harán
compañeros bajaron. con gusto todo el gasto, y sólo necesitarán para lo
espiritual de ella, de obreros, y ministros aptos del
De que resultarán sin duda grandes servicios Evangelio, que Vuestra Majestad envíe de España
de Dios nuestro Señor, y de Vuestra Majestad, y se por la extrema necesidad que de ellos hay en
evitarán, no menos inconvenientes, que de no aquellas partes.
ejecutarlo en breve, en breve se experimentarán, y
quizá sin remedio. Lo tercero, comenzará Vuestra Majestad a
poseer y gozar de lo que todos los señores Reyes
Lo cual se podrá efectuar sin gastos sus predecesores, desde el señor Emperador Carlos
considerables de la Real Hacienda, con sólo enviar V que Dios haya, digno bisabuelo de Vuestra
orden a la Cancillería de Quito, para que capitule Majestad, desearon, y con no pocos gastos, y
las entradas que más convenga, por los ríos que en diligencias procuraron sujetar a su Real Corona.
su jurisdicción desaguan en este principal, con
Para lo cual el año de mil quinientos cuarenta
algunas de las muchas personas, que a su costa se y nueve, el mismo señor Emperador Carlos V, mandó
ofrecen a hacer estas conquistas, sólo por los dar a Francisco de Orellana tres navíos con
intereses que de ella se sacan, como son las suficiente gente, y pertrechos, para que en su Real
encomiendas de los Indios, repartir tierras, proveer nombre tomase posesión de este gran Río de las
oficios, y otros semejantes. Amazonas, (que nueve años antes él mismo había
Cometiendo juntamente lo espiritual de ellas, navegado), por los muchos útiles que de ejecutarlo
en lo tocante a la conversión, y enseñanza de los así se esperaban; si bien las tormentas, y muerte
naturales, a los religiosos de la Compañía de Jesús, de casi todos los soldados, les obligaron a que
cuyo instituto es éste, y a que con no pequeño titulo, reducidos a una breve embarcación arribasen a la
en este particular descubrimiento, pueden mostrar Margarita, donde con su mal suceso, cesaron las
algún derecho, pues sus hijos, no sólo han aclarado, esperanzas que de muchos buenos se prometía
a costa de sus trabajos, y desvelos, y aun de muchos España, si les hubiera corrido mejor fortuna.
ducados, las sombras de un nuevo y dilatado Y Vuestra Majestad desde los primeros
Imperio, que bañado de este grandioso Río, ofrece principios de su Reinado, que sea por muchos, y
crecidos aumentos a la Real Corona de Vuestra felicísimos años, ocupó su desvelo en la consecución
Majestad, sino que por posesión de más de cuarenta de esto mismo, cometiendo la ejecución de este
años, adquirida con la sangre del dichoso Padre descubrimiento a varias personas, como consta en
Rafael Ferrer, derramada por los naturales, a sus Reales Cédulas, despachadas en esta
quienes en los principios de este Río predicaba, se conformidad, por los años de veinte y uno, y veinte
les debe. y seis, y treinta y cuatro.
Continuando el no perder este derecho los La de veinte y uno, despachada a la Real
Padres de la Compañía, que por Santiago de las Audiencia y Cancillería de Quito, para que se
Montañas, ha años que cultivan con su doctrina capitulasen las condiciones que para el dicho
los principales raudales de esta nueva conquista; descubrimiento fuesen convenientes, con el sargento
que para continuar se necesita en aquella provincia mayor Vicente de Reyes Villalobos, Gobernador, y
de Quito, nuevos obreros de Europa, que les ayuden Capitán General en aquella sazón de los Quixos,
en tan copiosa mies. jurisdicción de Quito, que por llegarle sucesor en el
A que sin duda acudirá Vuestra Majestad con gobierno, no tuvo efecto.
la piedad que siempre, y la liberalidad que pide la La de veinte y seis, despachada en favor de
necesidad extrema de tanta inmensidad de naciones Benito Maciel Pariente, portugués de nación, para
diferentes. que por las provincias de Marañón y gran Pará,
188 O “Nuevo Descubrimento del Gran Río de las Amazonas” do Padre Cristóbal de Acuña (1641)

que caen a la boca de este Río, comenzase su quiera que hay minas, u otras granjerías de
descubrimiento, que tampoco se puso por obra, por importancia, que dependen de su trabajo personal,
haberle mandado acudir a la guerra de Pernambuco. como lo podemos afirmar los que hemos corrido
La de treinta y cuatro, despachada a Francisco aquellas partes, y cada día van en tanta
Coello de Caravallo, portugués, Gobernador que disminución, que en breves años, por faltar ellos
entonces era del Marañón, y Pará, con expresa orden habrán de cesar, o por lo menos disminuirse en gran
de que con toda la brevedad con personas de parte, los muchos intereses que a su existencia
confianza y sí necesario fuese, el mismo diese están anexos, daño sin duda grande, y que Vuestra
principio, por aquellas partes, a lo que tanto se Majestad con esfuerzo debiera prevenir con tiempo,
deseaba, que nunca surtió efecto. y remediar por todos los medios posibles, que no
hay, ni se pueden imaginar otros, que tomar muy a
Y el presente, queriéndolo así Vuestra pecho la conquista y conversión de este nuevo
Majestad, tendrá feliz ejecución y en adelante se mundo, donde son tantos los naturales que le
verán cada día mayores logros de lo que tan habitan, que podrán poblar de nuevo todo lo
ardientes deseos prometía. despoblado del Perú: que si se sujetan al yugo del
Lo cuarto, cerrarse con esto la puerta, a que Santo Evangelio y con general paz, cesarán las
ninguno de los del Perú, intente arrojarse con los continuas guerras con que cada día se consumen
tesoros por la corriente de este Río, por excusar los unos a otros Se aumentarán de suerte, que
derechos que por Cartagena se pagan a Vuestra rompiendo por cortos los límites que al presente los
Majestad, y huir de los riesgos de corsarios, que encierran, será forzoso el dilatarse por más
casi siempre son ordinarios por aquellas partes, que espaciosos reinos.
es cierto lo han de pretender, ocasionados de la Y cuando con ellos solos se beneficiarán las
facilidad con que lo podrán ejecutar, a que en ningún muchas minas, y demás intereses que en sus
modo se atreverá nadie, asegurados los puestos naciones ofrece la fertilidad de la tierra, se debiera,
principales de sus entradas, como de hecho lo cual otro nuevo Perú, aceptar luego su conquista, y
quedarán, con las personas que por ellos con más la facilidad que aquí se ofrece.
comenzaren la conquista.
Lo octavo, si sucediese que los portugueses
Lo quinto, impedirse ha el trato, y que están en la boca de este río (que todo se puede
comunicación que tanto desean entablar los presumir de su poca cristiandad, y menos lealtad)
portugueses, que asisten en la boca de este río, con quisiesen, ayudados de algunas naciones belicosas
los que su nación del Perú, que en estos tiempos que tienen sujetas, penetrar por él arriba hasta llegar
seria bien perjudicial. a lo poblado del Perú, o nuevo reino de Granada,
Y en ninguna manera se atreverán a intentarlo; aunque es verdad que por algunas partes hallarán
si supiesen desde luego, se prevenía con tiempo su resistencia, por otras muchas la hubiera muy poca,
malicia, tomando las entradas de él. por salir a pueblos muy faltos de gente, y en fin
pisarán aquellas tierras vasallos desleales de
Y de que intentan esta comunicación los Vuestra Majestad, que en reinos tan distantes,
portugueses de aquella costa del Marañón, y Pará, pudiera sólo este nombre de desleales, causar
cónstame, con toda claridad, y como testigo de lo gravísimos daños. Pues si unidos con el holandés
que oí tratar muchas veces entre ellos los podré como lo están muchos del Brasil, intentasen
afirmar como cosa sin duda. semejante atrevimiento, ya se ve el cuidado que
Lo sexto reduciendo Vuestra Majestad a su pudiera dar. Y que el holandés desde muchos años
obediencia las principales naciones de este río y en ha, y aunque procure con veras señorearse de este
especial las que habitan en sus islas y orillas que gran río, es cosa tan cierta, que no dudó afirmarlo y
son muy belicosas y que con valor ayudarán al que publicarlo, Juan Laeth, autor holandés, en el libro
una vez reconocieren por dueño; en que habrá poca que intituló Vtriusque America, que sacó a luz el
o ninguna resistencia por las muchas guerras que año de treinta y tres, donde en el libro 17 cap. 15 in
de continuo tienen unas con otras y sujeta una lo fine dice estas palabras;
estarán con facilidad las demás; podrá por el mismo “Verum tamen, tan hi (scilicet Angeli, etc.
río abajo, mejor aun que por la mar, echar de la Hibrini) quám nostri (scilicet Belgi) a Portugalis, é
boca de él a cualesquiera otros, que con siniestro Pará venientibus, in opinato opresi, etc., fugati, non
titulo la posean, y asegurar por este camino los leve damnum fuerunt perpesi, ad quod refaciendum
muchos riquísimos frutos, y que de él se esperan, est, viribus, institutum repetere, etc, vrgere
que esto se dilatará el gozarlo, lo que se dilate el satagunt.”
poseerlo. Y en el mismo libro, cap. 2, dice:
Y dado caso que con brevedad, como “Post annum anten, 1615 Portugali ad
esperamos, se ponga freno, y castigue el mal mirado Paraetipam, qui sine dubio huius, magni. fluminis
atrevimiento de los portugueses, y quede ramus est, caeperuntun colere, vt ante diximus, etc-
desembarazada la boca de este río, para que por animum, ad caetera forté adijciente, nisi ab Angelis,
ella se prosiga la conquista. etc. Belgis nostris impediantur.”
Comenzada esta ya por las entradas de Quito, De donde se colige bien claro, que el dilatar el
se hará más fácil y necesitará de menos gastos para holandés la conquista de este gran río de las
concluirse con felicidad. Amazonas, de que en entrambos lugares habla el
Lo séptimo, se debe advertir con muy autor, es a más no poder, y no porque le falten
particular cuidado, que ya los indios en todo el Perú, deseos, y estima de lo mucho que en ejecutarlo ha
y en casi todo lo descubierto, y en especial en donde de interesar.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 189

Prevenga pues Vuestra Majestad, tan graves aseguraba Vuestra Majestad de una vez sus flotas,
daños, que este su fiel vasallo le propone, y no y sin recelos de corsarios, ponía en salvo todos sus
permita se dé lugar a que algún día lloremos tesoros, por lo menos hasta llegar al Pará; de donde
pérdidas, en lo que al presente se nos ofrecen en veinte y cuatro días, por mar ancho, con galeones,
crecidas ganancias. hechos en el mismo río, a todos tiempos se ponían
Finalmente, si andando el tiempo, sujeto y en España, sin que enemigo alguno les pueda
allanado ya el paso de este gran río, y aclaradas las guardar a la salida, por ser la costa del Pará tal,
entradas que en él hay por todo el Perú, la quisiese que ni dos días pueden los navíos fuera del río
reducir a este viaje cuantas de aquellas partes resistir a las corrientes de la mar. Con que cesarán
enriquece a España, me gloriaría yo de haber hecho de una vez los continuos cuidados que cada día nos
a Vuestra Majestad uno de los mayores, y más causa tan peligroso y dilatado viaje como es el de
provechosos servicios, que de vasallo se pudieran Cartagena.
esperar, con que no sólo se ahorraban gran suma Todo, señor, se remediará con lo que tengo
de ducados, en inmensos gastos, que serán propuesto en este memorial: a que sólo añado, que
inexcusables mientras durare el trajín de Panamá la mayor parte del buen suceso en esta materia,
y Cartagena, que por este río por ser por agua, y será la brevedad en la ejecución. Y si yo para algo
ayudar sus corrientes serían muy moderados. Sino fuere de provecho, siempre estaré a los pies de
que también (que es lo de más consideración) Vuestra Majestad.”

Referências
Acuña, C. de, [s. d., 1640?]. Señor. Christoval de Acuña, Religioso de la Compañía de Iesus, que vino por orden
de V. Magestad, al descubrimiento del grã Rio de las Amazonas... [folheto com 2 páginas]. S. e., s. l.
Acuña, C. de, 1641. Nvevo descvbrimiento del Gran Rio de las Amazonas. Por el Padre Chrstoval [sic] de
Acuña, Religioso de la Compañía de Iesus, y Calificador de la Suprema General Inquisicion. Al qual fue, y
se hizo por orden de su Magestad, el año de 1639. Por la Provincia de Quito en los Reynos del Perú. Al
Excellentissimo Señor Conde Duque de Olivares. Imprenta del Reyno, Madrid.
Acuña, C. de, 1682. Relation de la riviere des Amazones traduite par feu Mr. de Gomberville de l’Academie
Françoise. Sur l’original espagnol du P. Christophe d’Acuña Jesuite. Avec une Dissertation sur la riviere des
Amazones pour servir de preface. Chez la Veuve Louis Billaire, Paris.
Acuña, C. de, 1698. Voyages and discoveries in South America. The first up the river of Amazons to Quito in
Peru, and back again to Brazil, perform’d at the Command of the King of Spain, by Christopher d’Acugna.
The second up the river of Plata, and thence by land to the Mines of Potosi, by Mons. Acarete. The third from
Cayenne into Guiana, in search of the lake of Parima, reputed the richest place in the world. By M. Grillet
and Bechamel. Done into English from the Originals, being the only Account of those parts hithertro extant.
The whole illustrated with Notes and Maps. S. Bucklin, London.
Acuña, C. de, 1986. Nuevo descubrimiento del Gran Rio del Amazonas, en el Año 1639, pp. 25-107, in Figueroa,
F. de et al., Informes de jesuitas en el Amazonas, 1660-1684. Monumenta Amazónica, Iquitos.
Acuña, C. de, 1994. Novo descobrimento do grande Rio das Amazonas. Madri – Imprensa do Reino – 1641.
[Tradução de Helena Ferreira. Revisão técnica de Moacyr Werneck de Castro. Revisão de José Pedro Pinto].
Agir, Rio de Janeiro.
Markham, C. R., 1859. Expeditions into the Valley of the Amazonas, 1539, 1540, 1639. Translated and
edited, with notes, by Clements R. Markham, F. R. G. S. author of ‘Cuzco and Lima’. Printed for the Hakluyt
Society, London.
Melo-Leitão, C. de. 1941. Descobrimentos do Rio das Amazonas. Companhia Editora Nacional, São Paulo.
[Col. Brasiliana, no. 203].
Rich, O., 1832. A catalogue of books, relating principally to America, arranged under the years in which they
were printed. O. Rich, London.
Rodríguez, M., 1684. El Marañon y Amazonas. Historia de los descubrimientos, entradas, y reduccion de
naciones, trabajos malogrados de algunos conquistadores, y dichosos de otros, asi temporales, como
espirituales, en las dilatadas montañas, y mayores ríos de la America. Escrita por el padre Manuel Rodriguez
de la Compañía de Iesus, procurador general de las provincias de Indias en la Corte de Madrid. Imprenta
de Antonio Gonçales de Reyes, Madrid. [Pp. 100-141: relato do Pe. Acuña].
Rodríguez, M., 1990. El descubrimiento del Marañón. [Edición, prólogo y notas de Angeles Durán]. Alianza
Editorial [Alianza Universidad no. 654], Madrid.
Sommervogel, C., 1890. Bibliothèque de la Compagnie de Jesus. Première partie: Bibliographie par les Péres
Augustin et Aloys de Backer. Seconde partie: Histoire par le Père Auguste Carayon. Nouvelle Edition par
Carlos Sommervogel S. J. Strasbourgeois publiée par la Province de Belgique. Oscar Schepens, Bruxelles
& Alphonse Picard, Paris, 11 vols.
Capítulo 14

AS MISSÕES DOS FRANCISCANOS E AS VIAGENS


DE FREI LAUREANO DE LA CRUZ (1647-1651)

F rei Laureano Montes de Oca de la Cruz deve ter sido natural de Quito, onde começou o
noviciado em 1633; nada se sabe de sua vida, a não ser o que consta de seu manuscrito de 62
páginas in fólio “Nuevo descubrimiento del río de Marañon”, que se encontrava na Biblioteca
Nacional de Madri, tendo sido publicado pela primeira vez em 1879, por Frei Marcellino Da Civezza.
Foi reeditado por Frei Francisco M. Compte (1885). Uma outra edição saiu em Madri em 1900.
Como destaca Porro (1993: 127), o escrito de Frei Laureano de la Cruz é o primeiro documento
etno-histórico do alto Amazonas ou depoimento de um europeu que viveu na região durante um
período prolongado, em contacto constante com a população indígena.
Se do ponto de vista zoológico é negligível, o “Nuevo descubrimiento”, por outro lado, é uma
preciosa obra do ponto de vista humano, relatando detalhadamente as reiteradas, obstinadas e
infrutíferas tentativas feitas pelos frades franciscanos de catequizar os índios, as rivalidades entre
a sua ordem e os jesuítas, as intrigas da corte em Quito, detalhes importantes das viagens de
Pedro Teixeira rio Amazonas acima e abaixo; é o primeiro a descrever o encontro das águas do rio
Negro e do Amazonas, etc.

“NUEVO DESCUBRIMIENTO DEL RÍO DE MARAÑÓN LLAMADO DE LAS AMAZONAS HECHO


POR LA RELIGIÓN DE S. FRANCISCO AÑO DE 1651, SIENDO MISIONERO EL PADRE FR.
LAUREANO DE LA CRUZ Y EL PADRE JUAN DE QUINCOCES, ESCRITO POR LA OBEDIENCIA
DE LOS SUPERIORES EN MADRID AÑO DE 1653, POR FR. LAUREANO DE LA CRUZ, HIJO DE
LA PROVINCIA DE QUITO, DE LA ORDEN DE S. FRANCISCO.

ADVERTIMIENTO PARA LOS LECTORES NUEVO DESCUBRIMIENTO


DEL MARAÑÓN AÑO 1654
No escribo esta relación para que la crean
todos, sino para que la crean mis superiores, y creo Para honra y gloria de Dios Nuestro Señor, en
la creeran, pues el día que me la mandaron escribir el año de nuestra salud, 1633 año, los Religiosos de
me dieron confianza de su creencia. Teniendo pues la Santa Provincia de nuestro seráfico Padre, San
crédito mis Prelados de lo que dijere aquí y de las Francisco de Quito en el reyno del Perú de las Indias
necesidades espirituales que padecen las infinitas occidentales, dieron principio al descubri-miento de
almas, que viven sin Dios en los parages de nuestros las provincias y naciones de Indios infieles que
descubrimientos, no importa que los otros no la habitan en las faldas y vertientes de las sierras y
crean, que si creela necesidad del menesteroso el
cordilleras de la provincia del Quito y de las de
que há de dar el remedio, la fe de los otros no hace
Popayan de los Cuixos y Macas, de donde nacen y
falta para nada. En estos tiempos veo que todos los
apercebimientos que hacen los que escriben tienen su principio muchos caudalosos rios,
relaciones de cosas extraordinarias para grangear principalmente el grande Rio de Napo, que es el mayor
crédito en los que han de leer sus escritos, no de todos los que por aquella parte se han descubierto,
persuaden mas que una ciega incredulidad, nacida el cual corre y hace su curso con los demas, que
de la demasiada afectación en buscar credito (que entran en el del Poniente hacia donde tienen su origen
la afectación cuidadosa suele hacer sospechosa la del Oriente, por un lado de la linea equinocial,
verdad), o nacida del mal ejemplo que les dieron apartandose muy poco de ella hacia la vanda de el
otros, los cuales asegurando que unicamente Sur, hasta entrar en el Mar Oceano, como adelante
escriban lo que vieron, nunca se vió lo que diremos. Dieron principio los dichos Religiosos al
escribieron: o de una onstinación no nacida sino dicho descubrimiento, movidos de el espíritu divino,
natural, para no creer que haya en otra parte lo que y con las noticias que tuvieron de las primeras
nunca han visto en su tierra. Lejisimo ando yo de
naciones de Gentiles que pueblan aquellos rios, y
mendigar este credito de la cortesia de los otros,
primero que otras las del rio Putumayo, como son
pues si me mandaron escribir los mismos que me
conocen dentro de casa, ya sabran la autoridad que los Zeños, y Pecabas, que algunos Españoles vecinos
puede tener mi testimonio, y para los que son fuera de los Sucumbios del gobierno de Popayan habían
de casa no escribimos; los que profesamos vivir sin reconocido y comunicado, andando por aquellas
amor proprio, no hacemos ningun reparo no ser partes buscando Indios cristianos fugitivos de sus
creídos, gozandonos solamente en el testimonio de encomiendas. Movidos pues de el amor de Nuestro
nuestra conciencia. Señor y con deseo de la propagación de nuestra
192 As Missões dos Franciscanos e as Viagens de Frei Laureano de La Cruz (1647-1651)

santa Fe y conversión de aquella gentilidad, Con mucho gusto recibieron los naturales de
habiendo lo primero encomendado muy de veras a aquella provincia á los Religiosos, los cuales por
Nuestro Señor en la santa oración, ejercicio muy medio de las lenguas que llevaban les dieron razón
frecuentado de los Siervos de Nuestro Señor, se de quienes eran, y a lo que iban á su tierra, que era
convincieron y concertaron cinco compañeros, hijos a tratar del remedio de sus almas. Habiendo oido
de la dicha Provincia y de los Conventos de San esto y entendidolo bien, los Indios Seños
Pablo y de la Recolección de San Diego de Quito; y mostrandose agradecidos, llevaron a los siervos de
Dios á sus casas que tienen algo apartadas del rio,
segun y como nuestro Serafico Padre San Francisco
á donde les dieron una en que morasen y regalaron
dispone y ordena en el último capítulo de su
con lo que pudieron. Contentos los Religiosos con
evangelica Regla, pidieron licencia a su Prelado, y
este buen principio, comenzaron a aprender la
Ministro Provincial, que entonces lo era el Rev. Padre lengua de aquellos Gentiles, y se ocuparon al tiempo
Fray Pedro Dorado, el cual como tan celoso de la que con ellos estuvieron, en predicarles y darles
honra de Dios, de nuestra sagrada Religion y bien conocimiento del verdadero Dios por medio del
de las almas, les concedió licencia, y su bendición interprete; y juntamente bautizaron algunos niños
con grande gusto, y consuelo espiritual, habiendo en el articulo de la muerte, en que tuvieron hecha
lo primero tratado y conferido con los Señores de la para el cielo, hasta que obligados de la necesidad
Real Audiencia de aquella ciudad, los cuales como por haberse vuelto los Españoles a los Sucumbios,
tan cristianos, y fieles Ministros de su Magestad, de donde habían salido en su compañia, y tambien
en su real nombre aprobaron, y tenieron por bueno huidosele el Indio interprete de la lengua, viendose
aquel santo viage, y juntamente aceptaron el imposibilitado de poder pasar adelante en lo
ofrecimiento que para lo de adelante hizo el Rev. comenzado, aunque no sin dolor de sus corazones,
Padre Provincial de su persona, y de los Religiosos dejaron entonces el evangelico ejercicio, y se
de aquella Santa Provincia en nombre de la Religión volvieron por el rio Putumayo arriba, por donde
Serafica. habian bajado á la ciudad de Ecija de los
Sucumbios, con mucho trabajo, y de alli pasaron
Despachados ya con provisiones de la Real a la ciudad de Quito á dar razón de lo sucedido, y
Audiencia, con la benedición de Dios y de sus á prevenirse de mejor disposición para volver y
Prelados, llevandose tras si los corazones de los continuar la obra de el Señor ya comenzada. Este
Religiosos sus hermanos, salieron de la ciudad de fuè el primero descubrimiento y la primera entrada,
Quito a los ultimos del més de Agosto, los cinco que los Religiosos de la Provincia de Nuestro Padre
Religiosos, llamados el Padre Fray Francisco San Francisco de Quito hicieron y los primeros
Anguita, Comisario, y el Padre Fray Lorenzo Ministros de Dios que en aquellas partes tan
Cararubia, Sacerdotes, y los Hermanos Fray remotas plantaron el arbol de la santa Cuz,
Domingo Brieva, Fray Pedro de Moya y Fray Pedro ofrecieron a Dios el santo sacrificio de la Misa, y
Pecador, Legos, ellos solos sin compañia de administraron Sacramentos. Y si no se les hubiera
soldados, ni otra ayuda de costa temporal, puesta ido el Indio interprete, con animo estaban los
en Dios toda su confianza, el cual los llevó con bien siervos de Dios de no dejar de la mano aquella
a la ciudad de Ecija, en la provincia de los evangelica obra; mas justos son sus juicios. En
Sucumbios, que está de la otra vanda de la llegando a su casa el miserable interprete huido
se ahorcó de un arbol; y si este no fuè castigo de
cordillera, hacia el Oriente, distancia de 60 leguas
Dios, á lo menos lo parece.
de la ciudad de Quito, todo por tierra y los mas de
ello, por muy mal camino. Bien recibidos fueron los Habiendo llegado á la ciudad de Quito los cinco
obreros del Señor de los vecinos y moradores de la Religiosos, muy fatigados del largo y penoso camino,
ciudad de Ecija, y todos con mucho amor los y alguno de ellos enfermo, y hecho relación de lo
hospedaron y regalaron los dias que alli estuvieron, sucedido en su viage á sus Prelados, y á la Real
contentisimos de que los hijos de nuestro Padre San Audiencia, á pocos dias que descansaron, con
Francisco se empleasen en tan santo ejercicio, y se nuevas fuerzas, y deseos de la salvación de aquellas
comenzase por aquella parte a obrar en la viña del pobres almas que ya habian visto y esperimentado,
pidieron para continuar su comenzada obra licencia
Señor, que ellos mucho deseaban. Acudieron todos
al Reverendo Provincial, que ya lo era en aquella
a tratar de aviarlos en virtud de las cedulas que
santa Provincia, el Reverendo Padre Fray Pedro
para esto llevaban, y movidos del amor de Dios
Becerra, el cual muy gozoso de ver el fervoroso animo
proveyeronlos bastantemente de canoas, Indios de sus hijos, les concedió la licencia que pedian,
remeros y lenguas, y algunos españoles que por su habiendolo ya comunicado con los Señores de Real
devoción los quisieron seguir. Embarcaronse en el Audiencia, que todos con buena voluntad
puerto que llaman de la Quebrada, y navegando por convinieron que se continuase aquella santa Misión
el rio llamado Putumayo uno de los que entran en por ser mucho del servicio de Dios y de su Magestad;
el grande de Napo, y tiene su principio en la y para ello revalidaron las primeras cedulas, y
provincia de los Sucumbios y Moesa, gobierno de despacharon a los Religiosos que fueron cuatro,
Popayan, llegaron á los once dias de su navegación llamados, el Padre Fray Lorenzo Fernandez,
a una provincia de Indios llamados Seños, poblada Comisario, y el Padre Fray Juan Caycedo, y los
su tierra firme á la parte del Norte, no muy lejos de Hermanos Fray Domingo Brieba y Fray Pedro
la linea equinocial. Pecador. Salieron estos obreros del Señor segunda
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 193

vez de la ciudad de Quito, y de el Convento de San Fernandez, Comisario, y el Hermano, Fray Domingo
Pablo, para la provincia de los Sucumbios, a los Brieva, para la provincia de los Cofanes, que está
ultimos meses del año del Señor 1635, de la misma 40 leguas de Ecija, caminando por la falda de la
suerte y manera que salieron los primeros. Habiendo cordillera hasta la banda del Sur, y el Hermano Fray
llegado con bien á la ciudad de Ecija, la Justicia y Pedro Pecador, dejando al Padre Fray Antonio
vecinos de ella, recibieron á los Religiosos con mucho Caycedo en Ecija, partió para Mocoa, provincia de
gusto, y en breve tiempo los aviaron y proveyeron Popayan, hacia la vanda del Norte, en busca del
de embarcaciones y de buenas lenguas y mas cuatro Gobernador de ella a dar cuenta del estado en que
Españoles que les acompañasen. Con este buen estaba la obra del Señor, y a pedirle ayuda para
despacho se embarcaron los siervos de Dios, y llevarla adelante. Lo cual no les fuè concedido, por
demas compañia en el Rio llamado de San Miguel, que no estaba de Dios, sin cuya voluntad nada se
uno de los que entran en el Putumayo, por donde mueve. Volviose el Hermano Fr. Pedro de Pecador á
se hizo la entrada primera. Navegaron por el en los Sucumbios, a donde le aguardaba el compañero,
busca de los Indios Seños, donde se habia ya dado y considerandose ya despedidos de volver á entrar
principio á la predicación del santo Evangelio, por en la provincia de los Seños, que era lo que mas
ser aquella provincia conocida, muy dilatada y de cuidado les daba por su disposición, determinaron
mucha gente, segun los Religiosos ya habian visto irse el Padre Fray Antonio Caycedo a la ciudad de
y entendido. Quito, como lo hizo por el camino por donde habian
Al cabo de ocho dias de navegación llegaron a venido, y el Hermano Fray Pedro Pecador en
reconocer unas poblaciones de Indios llamados seguimiento de su Comisario, á los Cofanes.
Becabas, poblados al parecer de Islas que hay entre Habiendo pues llegado el Padre Fray Lorenzo
estos rios, y no tantos en numero como los Seños. Fernandez, Comisario y el Hermano Fray Domingo
Y por parecerles á los siervos del Señor conveniente Brieva á la ciudad de Alcalá del Rio del Oro, por
que estos Indios por estar mas cerca y ser mejor otro nombre de los Cofanes, les recibió en ella y en
gente que los otros, se procurasen reducir primero, su casa el Capitan Gabriel Machacón vecino
tomaron puerto en sus poblaciones, y ellos los encomendero y uno de los primeros conquistadores
recibieron con muestras de mucha alegria, y de aquella provincia y actual Teniente General de
agasajaron en sus casas acudiendoles con el ella, y los onró y regaló con mucho amor y caridad,
sustento necesario y juntamente recibiendo bien su hasta que estuvieron para ponerse en camino, para
predicación y doctrina; de lo cual dieron muchas la ciudad de Quito, para donde se partieron por la
gracias a Nuestro Señor. Con grandes esperanzas provincia de los Quijos que está en la falda de las
de la conversión de aquella gentilidad estaban los cordilleras, continuada con las obras que ya hemos
siervos del Señor, ocupandose en aprender la lengua dicho, á dar cuenta de lo sucedido, y prontamente
de los indios Becabas, y en instruirlos en los tratar lo que con el Teniente General de los Cofanes
misterios de nuestra santa Fè y bautizar los niños habian comunicado, de lo cual diremos mas
que morian y tambien algunos adultos, habiendolos adelante. Llegó tambien el Hermano Fray Pedro
primero dispuesto para ello, en lo cual tuvieron muy Pecador á la ciudad de Alcalá y a la casa del Capitan
buenos sucesos; cuando repentinamente è Gabriel Machacon y sabido como los compañeros
ignorando la causa, dieron en el pequeño rebaño se habian ido ya á el Quito aunque tuvo de ello algun
aquellos crueles barbaros fustigados del demonio, sentimiento, detuvo alli algunos dias,
y con sus armas, que son dardos y macanas, los encomendando á Nuestro Señor su obra en la santa
hirieron y dejaron muy maltratados y huyeron. Fuè oración y ordinarios ejercicios. En este tiempo,
Nuestro Señor servido de guardar sin lesión á uno comunicando con el Capitan Gabriel Machacon y
de estos sus siervos para que curase y socorriese a otras personas que alli estaban, alcanzó á saber
los demas compañeros, lo cual hizo con mucha como en el gran rio de Napo andaba un Capitan
caridad. Habiendo pues considerado este repentino Juan de Palacios, con una compañia de soldados
suceso los servos de Dios, temiendo que los Indios Españoles é Indios amigos, ocupados por orden del
volviesen a acabarlos de matar, asi como estaban dicho Teniente General en buscar y reducir a
caminaron para el rio adonde tenian las canoas, muchos Indios cristianos huidos de las
procurando con la ayuda de Dios guardar sus vidas Encomiendas de aquella provincia, y tambien le
para mejor servirle. Embarcar onse luego y dieron noticia de como en el rio Napo habia muchos
caminando por el rio por donde habian bajado, Indios Gentiles, todo lo cual movió al siervo de Dios
llegaron aunque con mucha incomodidad, y trabajo a quererlo ver por sus ojos antes de pasar a Quito.
a los Sucumbios y ciudad de Ecija, á donde los Y poniendolo en ejecucion, pidió al Capitan y
vecinos de ella, lastimados de sus trabajos los Teniente General le mandase dar avio de comer y
cuidaron con toda caridad, y esta fuè la segunda gente que lo llevase adonde estaba el Capitan Juan
entrada y descubrimiento. de Palacios y su gente.
Muy aflijidos estaban los cuatro compañeros, De muy buena gana acudió el Capitan Gabriel
siervos de Dios, viendo al parecer frustrados sus Machacon á la peticion del Hermano Fray Pedro
intentos, y no pudiendo sufrir sus corazones el dejar Pecador y con toda brevedad lo avió de lo necesario
aquella obra de la mano, trataron de buscar medios y lo despachó por el rio de Aguarico, llamado de el
para continuarla, y para esto habiendo ya mejorado oro por haber en él mucha cantidad. Habiendo pues
de las heridas se partieron, el Padre Fray Lorenzo navegado por él hacia abajo siete u ocho dias,
194 As Missões dos Franciscanos e as Viagens de Frei Laureano de La Cruz (1647-1651)

desembarcaron en el gran rio de Napo, por el cual estado otras veces, y tenia de paz una provincia de
yendo hacia arriba navegaron cuatro dias, y al cabo Indios infieles llamados Abixiras, de los cuales tenia
de ellos llegaron á un sitio llamado del Real de Anete, buenas lenguas, que le enviasen Religiosos que
adonde estaba el Capitan Juan de Palacios con toda predicasen la palabra de Dios en aquella provincia
su gente. Mucho se holgaron todos con la llegada y que él los acompañaria con su gente, y ayudaria
del siervo de Dios á aquellas partes, donde jamas cuanto le fuese posible para que aquellos Gentiles
habia llegado otro ningun religioso. Estimó mucho viniesen al verdadeo conocimiento de su Dios y
el Capitan Juan Palacios la llegada del Hermano Señor. Grande cosa fuè aquesta para volver á
Fray Pedro Pecador, que fuè en tiempo que tenia él encender los corazones de los siervos del Señor, que
mucha necesidad, por que de la mucha gente que parecia haberse refriado con los sucesos pasados.
se habia reunido asi cristianos como Indios, estaban Y sin sufrir mas dilaciones, luego se trató de hacer
los mas enfer mos y necesitados de remedio tercera entrada, teniendose por mas cierta que las
espiritual y temporal. Luego comenzó el obrero del dos primeras, por ir al parecer de cosa hecha. Para
Señor á trabajar en la viña, curando á los enfermos, lo cual se aprontaron cinco Religiosos hijos del
para lo cual le dio Nuestro Señor particular gracia. Convento de Recoleccion de San Diego de la ciudad
Rezabalos y enseñabalos la Doctrina Cristiana, de Quito; llamados el Padre Fray Juan Calderon,
bautizaba los niños que estaban para morir, y Comisario, el Padre Fray Laureano de la Cruz (que
algunos Indios grandes catequisandolos primero, en soy yo), y los Hermanos Fray Domingo Brieva, Fray
que tuvo el Siervo de Dios muy buena cosecha. Este Pedro de la Cruz y Fray Francisco Piña; los cuales
fuè el primer Religioso de nuestro Padre San con la bendicion de Dios y de sus Prelados, y buenos
Francisco y de la Provincia de Quito, que puso los despachos de la Real Audiencia, salieron de Quito
pies en el gran rio de Napo, llamado por otro nombre para los Cofanes en 29 de diciembre de 1636 años
de el Marañón, y este es el rio tan nombrado y el dia de Santo Tomás Cantuariense.
que, como dijimos, tien su origen y principio en las
Hay desde la ciudad de Quito á la de Alcalá de
cordilleras cercanas á la ciudad de Quito (que está
los Cofanes mas de 50 leguas de camino por tierra,
fundada cerca de ellas, medio grado de la linea
equinocial hacia el Sur), y este es el que camina para por la Cordillera que está ocho leguas de Quito,
hasta entrar en el mar Oceano por un lado de la y por la Provincia de los Quijos, que se sigue luego
linea. Apartandose muy poco de ella por la vanda caminando casi siempre al Oriente, por sierras y
del Sur, recogiendo é incorporando en si todas las valles de mucha arboleda y aspereza. Hay en esta
aguas que vierten las cordilleras del Perú, que corren Provincia de los Quijos muchos rios muy rapidos
desde el Nuevo Reyno de Granada casi Norte Sur, que corren por peñas y se pasan algunos por
hasta la Imperial de Potosi, y tiene de longitud mas puentes de maderas, y otros por unas puentes de
de 600 leguas, y este es finalmente el que tiene desde Bejucos (que son como maromas) que se crian entre
su principio hasta entrar en la mar 1300 leguas de aquellas arboledas, las cuiales se amarran en los
largo y de ancho unas dos o tres, y en partes mas y arboles que estan en las orillas de una y otra vanda.
en partes menos, y el que en sus principios es muy Las unas y las otras se pasan con trabajo y riezgo,
rico de oro, y en lo restante de muchas almas y si del todo se quitasen se haria imposible el paso.
criaturas de Dios necesitadas de remedio. En este Habiendo pues los siervos de Nuestro Señor pasado
gran rio de Napo ó Marañon, y en el sitio del Real de por estos trabajosos caminos, llegaron con bien á
Anete y en campañia del Capitan Juan de Palacios la ciudad de Alcalá, donde estaba el Capitan Gabriel
y toda su gente, dejaremos por ahora al Hermano Machacon á cuyo pedimento habian ido, y el buen
Fray Pedro Pecador, ocupado en sus ejercicios de caballero y la demas gente de el lugar los recibieron
caridad y puntualmente tratando de reconocer las con grande alegria, hospedaron y regalaron con
naciones de Infieles que habitan en sus primeras mucho amor, y caridad; y habiendo descansado
orillas, y pasaremos á la ciudad de Quito á saber de algunos dias, y en ellos tratado y conferido sobre la
la llegada de el Padre Comisario Fray Lorenzo entrada á la provincia de los Abixiras, se determinó
Fernandez y sus compañeros. que fuesen los Religiosos, al rio grande de Napo,
Grande desconsuelo causó en la Santa adonde estaba el Capitan Juan de Palacios para que
Provincia de Quito la vuelta de los Religiosos, que enviase canoas y gente para hacer el viaje, y
seg[...]o ver se volvieron de la segunda mision sin entretanto se hiciesen otras nuevas, y se previniesen
haber conseguido lo que tanto se deseaba, si bien las demas cosas necesarias, como en efecto se hizo.
se templó algo el justo sentimiento con saber que el Nombró para esto, el Padre Comisario Fray Juan
Hermano Fray Pedro Pecador quedaba todavia, como Calderon al Hermano Fr. Domingo Brieva y Fr. Pedro
por prenda de la obra y que no se habia dejado del de la Cruz, y para que, de camino, supiesen del
todo de la mano; y lo que mas es una carta que el Hermano Fr. Pedro Pecador (que es el religioso que
Capitan Gabriel Machacon, Teniente General de la dejamos en la compáñia del Capian Palacios), los
provincia de los Cofanes (movido de los fervorosos cuales bien aviados por el Teniente General, con
deseos, y santo celo de los Religiosos, que en su una canoa, y la gente necesaria, se embarcaron en
casa habia tenido) escribió al Reverendo Padre el rio de Aguarico, que está cerca de esta ciudad de
Provincial Fray Pedro Becerra, en la cual se ofrece Alcalá, y caminando por él hacia abajo ocho dias,
á si en persona con sus soldados, Indios y todo lo desembocaron en el grande de Napo, ciudad de
necesario al gran rio de Napo, adonde él ya habia Alcalá, y caminando por él cuatro dias, llegaron á
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 195

el Real de Anete, adonde hallaron al Capitan Juan Quito, cuando llegaron á Anete los Hermanos Fray
de Palacios, y su gente que los recibieron con mucho Domingo Brieva y Fray Pedro de la Cruz. Mucho
gusto, teniendo á buena suerte ver tan á menudo consuelo recibieron el Padre Comisario Fray Juan
Frailes Franciscos en aquellas partes, y mas cuando Calderon y sus compañeros con estas buenas
supieron á lo que iban por las cartas que llevaban, nuevas, y tratando con el Capitan Gabriel Machacon
y orden para que despachasen canoas á los Cofanes, que se dispusiese el viage que ya era tiempo dandole
para hacer la entrada á los Indios Abixiras; lo cual para ello toda prisa, no pudo ser por entonces por
hizo el Capitan dentro de pocos dias, aunque no no tener suficientes embarcaciones, y estar
envió tantas cuantas eran necesarias, por traerlas esperando de Quito algunas cosas que para la
por allá ocupadas. entrada habia enviado á buscar. No fuè posible
Quedaron con el Capitan Juan de Palacios los detener al Padre Comisario y sus compañeros en
dos Religiosos y con su gente para hacerles cmpañia, los Cofanes, y asi pidieron al Teniente General que
y para ocuparse en los ejercicios de caridad en que les diese avio para irse al rio grande de Napo, adonde
se habia ocupado antes el Hermano Fray Pedro estaba el Capitan Juan de Palacios y demas
Pecador. De quien ya es tiempo que tratemos, compañia, y que alli le aguardarian hasta que bajase
entretanto que las canoas y gente van a los Cofanes, con la demas gente para hacer la entrada. Hizose
que tardaran por lo menos um més, por que lo que asi y sin dar lugar a mas dilaciones se aprestaron
se camina en un dia rio abajo, se anda en tres rio tres canoas y la gente necesaria de Indios y
arriba, por ir en contra de las corrientes. Estando Españoles, y por cabo de ellos un vecino de aquella
el Hermano Fray Pedro Pecador en el sitio de Anete ciudad llamado Pedro Bermudez. Y caminando los
con el Capitan Juan de Palacios y su gente, ocupado, Religiosos y demas compañia dos dias por tierra,
como ya dijimos ariba, supo de el dicho Capitan llegaron al puerto de la Concepción del rio Aguarico,
que habia pocos dias que con algunas de sus canoas en donde estaban las canoas, en las cuales se
y gente habia entrado en una provincia de Indios embarcaron, y navegando rio abajo desembarcaron
infieles llamados Icajnates (que por traer el cabello á los diez dias en el grande de Napo, el cual vá ya
largo les pusieron nombre de Encabellados), y que por aquel parage tan grande, que con serlo mucho
habia sentado paces con ellos. Esto sabido por el el de Aguarico, es en su comparación un pequeño
siervo de Nuestro Señor, le rogó lo llevase allá para arroyo. Por él arriba, caminaron los siervos del Señor
verlos y la disposición de la tierra, lo que hizo de y demas compañeros un dia de camino, y llegaron
muy buena gana, y para ello mandó aprestar sus á un sitio llamado el Real de San Francisco, adonde
canoas y la gente necesaria, y embarcandose todos habia hecho su primer asiento el Capitan Juan de
caminaron por el gran Rio del Napo abajo dos dias, Palacios. En este parage se detuvieron los Religiosos
y dejando á la mano isquierda el Rio de Aguarico, con el Capitan Pedro Bermudez y demas gente y
por donde habian bajado, que es á la vanda del despacharon una canoa al Real de Anete con aviso
Norte, á pocas leguas y á la misma vanda, tomaron de su llegada para el Capitan Palacios y compañeros;
puerto en los Encabellados, los cuales salieron luego los cuales bajaron luego muy contentos, y habiendo
á recibir al Capitan Juan de Palacios, y él les dió llegado con mucha alegria, los unos y los otros se
cuenta de quien era aquel Padre, con la lengua que dieron los parabienes. Alli estuvieron juntos unos
llevaban. El siervo de Nuestro Señor, viendo la pocos de dias, en los cuales tratando de la entrada
docilidad de aquellos Gentiles, y los muchos que de los Abixiras, pareció á los mas de aquella
alli se juntaron, trató de darles luz del verdadero compañia ser mas aproposito la de los Encabellados,
Dios por medio de los interpretes, y ensenãndoles
y aunque no se determinó nada por entonces, pidió
un santo Crucifijo, hizo que todos lo adorasen, y
el Padre Comisario Fray Juan Calderon al Capitan,
otras buenas diligencias, en que se ocupó de que
que pues estaban de espacio y la provincia de los
alli estuvieron, de lo cual el siervo de Dios no cabia
Encabellados tan cerca, gustaria mucho los fuesen
de contento. Despidieronse de los Encabellados y
á ver entretanto que el Capitan Gabriel Machacon y
embarcandose en sus canoas, caminaron por el
su gente bajaban á este rio y el Hermano Fray Pedro
grande Rio Napo arriba, y en pocos dias llegaron al
Real de Anete, donde el Capitan hizo informaciones Pecador volvia de Quito.
con los de su compañia de la buena disposición de Concedieronle su petición al Padre Comisario,
aquella provincia y gentes Encabelladas, y con ellas y habiendo primero confesado y comulgado todos,
y sus cartas para la Real Audiencia, despachó al se hizo la entrada en los Encabelados; siendo esta
Hermano Fray Pedro, el cual bien aviado salió de la segunda que hicieron los Religiosos todos, se hizo
Anete y caminó por el gran rio de Napo arriba para la entrada en los Encabellados; siendo esta la
la ciudad de Quito; siendo el primero Religioso e segunda que hicieron los Religiosos de nuestro Padre
hijo de nuestro Padre San Francisco, que entró en San Francisco, hijos de la ciudad de Quito, y los
la provincia de los Encabellados, y que navegó el que tercera vez navegaron el gran rio de Napo, desde
gran rio del Napo y de el Marañón. su puerto, que es el de Archidona, hasta la boca del
Llegaron las canoas y gentes despachadas por rio de Aguarico, de donde comienzan sus
el Capitan Juan de Palacios á la ciudad de Alcalá poblaciones, y se van continuando por aquella vanda
de los Cofanes, con sus cartas y aviso de lo que (que es la del Norte) por el gran rio de Napo abajo,
habia pasado en los Encabellados, y de como el distancia de 150 leguas, entrando aqui la
Hermano fray Pedro Pecador era ya partido para provincia que llaman de los Rumos, que por ser
196 As Missões dos Franciscanos e as Viagens de Frei Laureano de La Cruz (1647-1651)

toda esta tierra continuada y todos estos Gentiles y lenguas, predicaron á aquellos Gentiles, y les dieron
hablar una misma lengua, se puede tener toda esta noticia de quienes eran y de como venian á
gente por una misma nacion. Tiene de anchura esta enseñarles las cosas de Dios y á hacerlos cristianos
provincia treinta leguas, por partes mas, y por partes si ellos quisiesen, y que para esto se quedarian con
menos; confina por sus espaldas con el rio Putumayo ellos. Todos respondieron que se holgaban mucho
(de quien ya dijimos), el cual divide esta nacion de y que se quedasen con ellos los regalarian y
la de los Seños, que están á la otra orilla. acudirian á lo que se les mandase. Juntó el Padre
La Provincia de los Indios Abixiras, que era Comisario sus compañeros, y habiendolo consultado
donde habiamos de entrar, está poblada de en el con Dios y con ellos, se determinó que se quedasen,
gran rio de Napo, yendo por él hacia abajo, á la puesto que se había de entrar despues cuando el
mano derecha, que es á la vanda del Sur, y tiene su Hermano Fray Pedro Pecador viniese; en lo cual no
principio en el mismo parage que la de los se puso ninguna duda. Los Capitanes vinieron a
Encabellados, y se van continuando poblaciones por ello, aunque con algun temor y recelo, y dejando á
más de cincuenta leguas, dicen que es provincia de los Religiosos solos y con una India lengua para
mucha gente. Todas estas tierras son llanas y de interprete, se volvieron á salir de la provincia y se
mucha arboleda, si bien donde ellos tienen sus fueron al Real de San Francisco, y al de Anete, á
casas, que serán dos ó tres leguas apartadas de el esperar al Capitan Gabriel Machacon y al Hermano
rio, es la montaña mas clara. Sus poblaciones están Fray Pedr o Pecador; para con sus venidas
partidas en aldeillas de á cuatro, de a seis y de á determinar que conviniese. Alegres y contentos en
ocho casas, y en cada una vive uno ó dos Indios el Señor se quedaron los siervos de Dios entre
con sus mugeres y hijos. Las aldeas estarán aquellos lobos; y por su mansedumbre ovejas, se
apartadas las unas de las otras un cuarto de legua, ocuparon en el ministerio evangelico desde 17 de
media legua y una legua. Las casas son de madera Junio hasta 26 de Agosto del dicho año, ocupandose
y cubiertas de palmas y abiertas todas. Andan todos en aprender la lengua de los Indios, en enseñarles
estos Indios desnudos, duermen en jamacas y á rezar, á que ellos acudian mal. Curaban los
sustentanse de maiz, que cogen en abundancia, y enfermos, bautizaban los niños y procuraban
de yucas, que son unas raices que sembran, de que componer las disensiones que entre ellos se ofrecian,
hacen mucho Casabe, y de chontaruras, que es una en lo cual nada gustaban por la mala inclinación
fruta de palmas que ellos cultivan, y estos géneros que todos tienen á pelear y a matarse unos á otros.
y otros semejantes que hay en esta Provincia le En este poco tiempo fuimos reconociendo
sirven de comida y de bebida. Tienen miel de abejas algunas aldeas, yendo con los dueños de ellas, y
que se cria en los huecos de los arboles, aunque asi llamados de dos en dos, yendo unos y quedando
no usan de la cera. Tienen mucho pescado, caza otros. Hicieron algunas juntas y bailes celebrando
de monte y fruta de la tierra. Tienen mucho tabaco, nuestra venida, y juntarianse para esto de cada vez
de que todos usan fumandolo en humo. Prometen de 300 á 400 indios en unas casas muy grandes,
estas tierras cultivadas otros géneros, arroz, cacao, que para este efecto tienen, con muchos bancos, en
cañas dulces y buen algodón, como ya se vido alguno que se sientan á la traza de escuela de muchachos.
de que usan para ceñirse los brazos y piernas, con En estas juntas aunque beben de sus vinos y de
unas fajas que las Indias hilan y tesen, y dicen hacen unas aguas que cuecen de raices, no se embriagan,
esto para ser ligeros y fuertes. ni tal cosa vimos, en el tiempo que alli estuvimos.
No tienen idolos, ni adoracion ninguna; mas usan
de algunas hechicerias, para lo cual hay entre ellos
A los 14 dias de el més de Junio de 1637, algunos viejos que con sus embustes engañan á los
tomaron puerto los dos Capitanes, con los Religiosos otros, y por ellos les tienen algun respeto. Pero
y demas compañia, en un riachuelo que sale de la obligacion no la tienen á nadie, ni entre ellos hay
provincia de los Encabellados, y se le puso por principales, ni cabeza, ni gobierno y muy poca
nombre Rio de Sant’Antonio, por haber llegado á su policia. Tienen á dos mugeres, y algunos á mas, y
boca el dia antes que fuè el de su fiesta, y dicho otros hay que no tienen mas de una. Quieren
Misa en aquel parage, que estará del rio de Aguarico muchisimo a sus hijos, á cuya causa se crian con
20 leguas mas abajo. Tomose alli puerto por estar mucha libertad y desenvoltura. Conservamonos con
cerca las casas de los Indios, á las cuales llegó la esta gente con buena paz y amistad y recibimos de
compañía cristiana, y al mismo parage adonde el muchos de ellos muy buenas cosas; pero otros nos
Capitan Juan de Palacios había entrado con el dieron mucho á merecer. Dejemos esto en este
Hermano Fray Pedro Pecador. Salieron luego los estado, y pasemos á Quito, á saber como le vá de
Indios muy alegres á recibirlos, y fueron viniendo despacio al Hermano Fray Pedro Pecador.
por su orden de aquellas aldeillas primeras en Llegó el siervo del Señor á la ciudad de Quito
cuadrillas de á ocho, de á diez y de á doce, con y fuè de todos bien recibido, y las buenas nuevas
algunas mugeres y muchachos, trayendo todos de que llevó fueron de mucho consuelo. Trató luego
las comidas que tenian, y palmas en las manos en de negociar á lo que iba con toda prisa y cuidado.
señal de la paz que tenian asentada. Dieronles De la Orden fuè despachado, aun que ya la
algunas niñerias con que fueron muy contentos. Provincia habia dado los Religiosos, y puesto que
Estuvieron en este sitio los Capitanes y demas gente no se podian hacer dos entradas á un tiempo, por
tres dias, y en ellos los Religiosos, por medio de las no haber gente y disposición para ellas que se
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 197

hiciese la entrada con los que allá ya estaban, y á la aldea donde los Religiosos estaban juntos, como
que si les pues fuesen menester mas, los los habian dejado aunque enfermos. Grande fuè el
asignalarian, avisando de ello. De la Real Audiencia regocijo de los unos y de los otros dando gracias á
le fuè concedido lo que pedia el Capitan Juan Nuestro Señor. Desenterraron los ornamentos, que
Palacios, que fuè darle permiso para que entrase los siervos de Dios habian enterrado muchos dias
con 30 hombres voluntarios á la provincia de los habia y guardaban de bajo de tierra por temor de
Encabellados, á hacer escolta, y á asistir á los que los Indios Encabellados, que son muy atrevidos,
Religiosos (que enviaba á pedir), para que con no se los quitasen y profanasen. Dijeron Misa y
seguridad pudiesen predicar y redimir aquella ofrecieron el santo Sacrificio á Dios Nuestro Señor
Gentilidad al gremio de la Iglesia, y para ello le en hacimiento de gracias, y por los buenos sucesos
nombraron por cabo de los 30 soldados, y en nombre de aquella conversión. Fuè mucha la gente que a la
de su Magestad le prometieron hacer merced de venida del Capitan se juntó de todas partes por verle,
socorro y ayuda de costas si fuese necesario, siendo y por tocar algo de lo que traía que darles, como
avisado de los buenos progresos de la entrada de avalorios y cascabelas, de que son muy amigos y
los Encabellados. Con estos buenos despachos y cuchillos y herramientas que les fuè poco á poco
con un compañero que el Reverendo Padre Provincial repartiendo. En esta aldea, que era pequeña
Fray Pedro le dió para que le ayudase, llamado Fray estuvieron cuatro dias, y por no ser sitio acomodado
Andres de Toledo, y con algunos soldados, que á su para tanta gente, se mudaron de alli una legua á
devoción, y por servir á Dios, quisieron acompañarle otra aldea mayor, de mas casas y mejor sitio. Alli se
bien proveidos de bastimentos y demas cosas hizo palenque y pareciendoles á toda esta compañia
necesarias para el viage, que los devotos de la ciudad ser aquella provincia y tierra de consideración, de
de Quito con liberalidad le ofrecieron de limosna, comum confor midad y con animo de no
salió de la dicha ciudad el Hermano Fray Pedro desampararla, tomó el Capitan Juan de Palacios y
Pecador para los Quijos, adonde tambien vió algunos la demas compañia posesión de ella en nombre de
devotos que de buena voluntad quisieron acompañar su Magestad (que Dios guarde) y los Religiosos en
á los siervos de Nuestro Señor. Y con ellos y los nombre de la Santa Madre Iglesia, con las
demás, todos juntos, se embarcaron en el Rio de ceremonias acostumbradas, y con muy general
Ávila, y por él salieron al grande de Napo en las regocijo, y pusieron por nombre á este lugar la
canoas y con la gente que los Encomenderos de Ciudad de San Diego de Alcalá. Los Religiosos no
aquella Provincia dieron de muy buena gana, sin cesaron de hacer posible con los Indios, aunque por
otro interes que el servicio de Dios. Caminaron los ser tantos los que entraban y salian en el Real, y
siervos de Nuestro Señor con este acompañamento grande el ruido que hacian, no se hacia lo que se
por el gran rio de Napo abajo y en pocos dias llegaron quisiera. Asi se pasaron algunos dias esperando
al Real de Anete, donde hallaron al Capitan Juan mejor disposición, asi de salud, como de el poner
del Palacios con su gente, el cual los recibió con en orden las cosas de aquella conversión. Cuando
grande alegria y muy contento con el buen despacho por muerte de un vecino de la ciudad de Ávila,
que el Hermano Fray Pedro Pecador le traia, se trató llamado el Capitan Juan de Aguilar, los deudos y
luego, con toda la presteza de hacer la entrada, y amigos que alli estaban (o por que no hubo orden
más cuando supieron los recién llegados como el de cojer luego de .... mucho oro) trataron de volverse
Padre Fray Juan Calderon, Comisario, y sus á sus casas á los Quijos. Procuraron los Religiosos
compañeros habian quedado solos en los divertir esta determinación y no fuè posible, ni el
Encabellados. Nombró el Capitan Palacios los Capitan Juan de Palacios los pudo detener que esto
oficiales necesarios, y ajustando el numero de los hacen hombres voluntarios. Salieronse de la
treinta soldados de su comisión con algunos de los provincia y llevaronse consigo los Indios amigos que
que tenia, prevenidas ya las embarcaciones y muy habian traido, y en verdad que hicieron falta los
bien aviados, subieron con muy buenos alientos del unos y los otros. El Padre Comisario Fray Juan
Real de Anete, y caminaron por el gran rio de Napo Calderon y el Hermano Fray Pedro de la Cruz,
abajo, llegaron al Real de San Francisco, á la junta tambien se salieron con estes hombres, por estar
de Aguarico, a donde hallaron al Capitan Gabriel enfermos, y unos se fueron por los Quijos, dejando
Machacon, Teniente General de los Cofanes, que bien aflijidos á los demas que por ser pocos
habia bajado para hacer la entrada á la provincia recelaban lo que despues sucedió. Acordose que
de los Abixiras, como lo habia prometido, mas viendo para remediar esta necesidad fuese á Quito el
la buena disposición con que se iba a los Hermano Fray Pedro Pecador á dar cuenta de los
Encabellados, y que ya estaban allá los Religiosos, hechos, y pedir socorro á la Real Audiencia. Lo cual
dejando su entrada para mejor ocasión, si se el siervo de Dios hizo de muy buena gana, y se partió
ofreciese adelante, despidiendose de todos se volvió con los demas luego, dejando con su ida algo
a los Cofanes por el Rio Aguarico por donde habia consolados á los que quedabamos, esperando en
bajado. Nuestro Señor que por este medio vendria socorro
Prosiguieron el Capitan Juan de Palacios y y no se malograrian tan buenos principios.
demas compañeros su viage por el gran rio Napo Por la ausencia de el Padre Fray Juan
abajo, y al dia siguiente llegaron al puerto de San Calderon, sucedió en la Comisaria el Padre Fray
Antonio de los Encabellados, durmieron alli aquella Laureano de la Cruz (que soy yo). Quedaronse en
noche y el otro dia que fuè 26 de agosto del dicho mi compañia los Hermanos Fray Domingo de Brieva
año, entraron por el camino que siempre, y llegaron y Fray Francisco de Piña y Fray Andres de Toledo,
198 As Missões dos Franciscanos e as Viagens de Frei Laureano de La Cruz (1647-1651)

quedando el Capitan Juan de Palacios con 18 divertirlos, y para evitar peligros á que se querian
soldados y cosa de 60 Indios y alguna chusma. arrojar, hice aquella noche, cuando todos dormian,
Procuramos lo posible conservarnos en buena paz que un soldado echase por el rio abajo una canoa
con los Indios Encabellados. Acudieron como de grande, que teniamos, y asi se hizo, con que otro dia
antes á los ejercicios ordinarios y procurabamos que por faltar la canoa grande en que los soldados se
todos estuviesen consolados. Diole gana al Capitan querian ir, se templó algo su determinación. Mas no
Palacios de que nos mudasemos de este sitio á otro paró en esto ni fuè posible el detenerlos, antes
mejor y mas cerca de el rio por las canoas y por la conviniendose seis de ellos, aprestaron otra canoa,
pesqueria; hizose asi (que no debiera) y mudados, aunque pequeña, y con dos Indios que las dieron, se
en pocos dias se mudaron tambien los Indios con aviaron, para irse. El Hermano Fray Domingo de
algunos agravios que les hicieron que aunque á Brieva y Fray Andres de Toledo, con mejor espiritu y
nosotros no nos parecian grandes, para ellos si lo mas animo que el mio, movidos de las noticias que
eran, por ser gente tan hidalga que aun de sus les habian dado de muchas naciones de Gentiles que
mismos hermanos no sufren un papirote. Fueronse habia en nuestro rio de Napo o del Marañón abajo,
retirando y ya no venian á vernos ni traían el hallando esta ocasión no la quisieron perder. Y
sustento como solian, lo cual tuvimos á novedad y aprovechandose de una clausula de nuestra patente
novedad de mucho cuidado, Encomendamos á en que el Reverendo Padre Provincial ordenaba que
Nuestro Señor y cada dia esparabamos el golpe, los Religiosos de la Mision que quisiesen salirse á
cuando el dia de Santa Brigida á 8 de octubre de Quito se saliesen, y los que quisiesen quedar se
1637, tuvimos aviso que los Encabellados venian quedasen, con la bendición de Dios y grandes
de mano armada sobre nosotros. Inquietose la gente esperanzas del descubrimiento de aquellas naciones
con esta nueva y trataron de prevenirse con sus y su conversión, partieron por Rio grande, rio abajo,
armas, mas el Capitan, mas valeroso que prudente, a 17 de octubre del dicho año, vispera del Evangelista
hizo que se quietasen todos y que no tuviesen miedo. San Lucas, con los seis soldados y dos Indios en la
Estando en esta quietud, aunque no sin recelos, canoa pequeña. Acompañemos a los siervos de
dentro de media hora tocaron á rebato y dieron sobre Nuestro Señor, y despues subiremos el rio arriba para
nosotros tantos Indios, que fuè misericordia de Dios el Real de Anete.
no acabar nos á todos. El Capitan con su Caminan pues los dos Religiosos por el gran
acostumbrado corage, con solo espada y rodela rio de Napo o Marañón, juntos con sus compañeros,
embistió él y dos compañeros con los Encabellados
y al segundo dia de navegación hallaron en una
que le cogieron por aquella parte y haciendo ... en
playa la canoa grande que yo hice echar por el rio
ellos, los fuè siguiendo y á pocos pasos se halló
abajo. Embarcaronse en ella dejando la otra que
cercado de una grande emboscada, que matandole
llevaban, y prosiguieron su viage. Huyeronseles
y haciendole pedazos se lo llevaron. Los demas
luego los dos Indios que les habian dado; y ellos
soldados con los arcabuces, dieron una rociada al
solos y bien desprevenidos pasaron adelante en
enemigo, con que matandoles algunos hicieron
prosecución de su descubrimiento. Ya habian
retirar á los demas. A este mismo tiempo se nos
caminado los siervos de Dios 200 leguas sin ver
cayó un fuerte de madera que se estaba haciendo,
con el peso de la gente que se subió en él, y de este gente ninguna (por estar poblados los Gentiles que
trabajo y de la pelea quedamos muchos lastimados por alli hay apartados de el ro), cuando llegaron á
y heridos. No murió mas que el Capitan, que nos la provincia de los Omaguas (de quien despues
lastimó mucho, y una India que la mataron los palos diremos), adonde fuer on proveidos de
de el fuerte. Los heridos se curaron, y con alguna mantenimientos de que iban necesitados. Fueron
mejoria, al tercero dia nos salimos todos con harto continuando su viage, reconociendo las poblaciones
trabajo y riesgo al puerto donde estaban las canoas, de Gentiles, y pasando adelante sin estorvo ni
y embarcandonos en ellas salimos á nuestro gran contradicción alguna. Cerca de las conquistas de
rio á una isla que alli cerca estaba, á esperar al Portugal (sin haber hallado Dorado alguno ni casa
Padre Fray Pedro Pecador y el socorro que habia del Sol) llegaron a una provincia que llaman de los
ido á buscar. T apajosos [Tapajós], adonde sus moradores
codiciosos y atrevidos desnudaron a los pobres y
Puestos ya en salvo y dado gracias á Nuestro
les quitaron lo poco que llevaban; de esta manera
Señor, tratamos de irnos al Real de Anete, por ser
mejor sitio y tener alli casas y que comer, lo cual no prosiguieron su viage hasta que pocas leguas de
habia en la isla. Estando ya para partir, salieron alli, al cabo de tres meses que habian navegado,
unos de aquellos soldados con una novedad que llegaron á una plaza de Portugueses que se llama
me causó mucho cuidado, y fuè el caso que entre Curupá, que es la primera de sus poblaciones y la
ellos estaba un Portugues, llamado Francisco que está mas cerca de donde desemboca nuestro
Hernandez, marinero que decia haber estado en el gran rio en el Mar. Alli fueron muy bien recibidos, y
Gran Pará, allà por la costa del Brasil, y que nuestro el Capitan mayor de aquella plaza, llamado Juan
rio de Napo iba sin duda á salir a aquellas partes, y Pereira de Caceres, persona de mucha caridad, los
que estando allà habia tenido noticias que en medio hizo vestir a todos y regalarlos. Y para memoria de
de aquellos reinos estaba el Dorado y la casa de el este descubrimiento, casi milagroso de aquellos
Sol, y que si bajasen por nuestro rio darian en siervos de Dios, mandó que se sacase fuera de el
aquellas grandezas, con lo cual inclinó los animos agua aquella canoa en que habian venido, y se
de algunos codiciosos. Yo procuré cuanto pude pusiese junto á la Iglesia. No fuè posible, aunque
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 199

con mucha gente se trabajó para sacarla, y asi se vieja y quebrada. Diose orden que fuesemos en esta
quedó en aquella misma adonde tomaron puerto. embarcacion los Religiosos, cuatro Españoles y los
Contaré otro prodigio y misericordia de Dios que tres Indios con sus mugeres, para remar, y la demas
les sucedió navegando el rio abajo, y fuè que se les gente marchar por tierra. Hizose asi y fuimos
abrió la canoa à la larga, de popa á proa (que aunque caminando con mucho trabajo los unos y los otros,
era nueva era de madera debil), con lo cual todos se y tardamos en llegar al Real de Anete, mas de treinta
vieron muy aflijidos y desconsolados. Tomó entonces dias, siendo camino de seis. Sustentonos Nuestro
uno de los Religiosos con gran fè un poco de lodo, y Señor todo este tiempo con huevos de tortuga que
en nombre de la Santísima Trinidad pasó con él la hallabamos por aquellas playas, y con algunos
mano por la rotura de la canoa, pescadillos, con frutas del monte y cogollos de
y luego al punto se cerró como estaba de antes, con palmas, que con trabajo se buscaban. Llegados que
que dando gracias á Dios hicieron su viage fuimos al sitio de Anete, hallamos alli mucho maiz,
á salvamiento. Despues de haber estado yuca, plátanos y patatas que comer, y casas en que
descansando y reformandose en aquella plaza de alvergarnos y descansar. Dentro de pocos dias nos
Curupá, el buen Capitan mayor les avió y despachó llegó una canoa de los Quijos con un Donado que
á la ciudad del Gran Pará, desde donde los enviaron nosotros habiamos despachado de los Encabellados
á la de San Luis de Marañón, adonde estaba el para Quito, cuando nos quedamos solo, con aviso
Gobernador de aquel estado, que entonces lo era de nuestra entrada, y venia de vuelta en busca
Jacome Raymundo de Noroña. nuestra con muy buen socorro de bastimento y
cosas de que teniamos necesidad, que el Reverendo
Llegados que fueron los Hermanos Fray Padre Provincial y personas devotas nos enviaban
Domingo de Brieva y Fray Andres de Toledo y los de Quito. De este Donado supimos como el Padre
seis soldados sus compañeros á la ciudad de Fray Juan Calderon y su compañero, enfermos
Marañón, el Gobernador de ella hizo muchas pasaron á Quito, á curarse y que el Hermano Fray
caricias, y los agasajó y regaló con mucho amor. Pedro Pecador habia ido mucho adelante á buscar
Sabido ya de donde venian y de que manera, y sus el socorro y dar cuenta de como quedabamos en los
buenos intentos, trató luego de poner en ejecución Encabellados muy necesitados. Recibimos esta
unas Reales cedulas que tenia de su Magestad (que caridad y despachamos luego el mismo Donado en
Dios guarde), en que mandaba descubriese aquel la propia canoa, á dar aviso de la muerte del Capitan
gran rio, que por alli llamaban de las Amazonas, Juan de Palacios, de la salida que hicimos, de como
por las grandes noticias que de él se tenian. los demas compañeros fueron el rio abajo, de como
Despachó primero al Hermano Fray Andres de se huyeron los Indios, y que nosotros con aquella
Toledo á España con sus cartas y aviso de la llegada poca gente aguardabamos alli la resolución de Quito.
de aquellos siervos de Dios, de como quedaba Partiose el hermano Donado, y antes de llegar al
aprestada una armada para despacharla con el puerto de Ávila en los Quijos encontró tres canoas
Hermano Fray Domingo Brieva por el rio por donde bien aviadas, por el Teniente de aquella ciudad,
habia bajado, para que se viese mas despacio y llamado el Capitan Lanzobeja despachaba á
reconociesen las naciones de Gentiles y todas las buscarnos, porque tuvo aviso de todo lo ya referido
demas cosas que en aquel gran rio viese, digno de por unmozo y dos Indios de nuestra compañia, que
advertencia, para dar cuenta de todo á su Magestad partieron para Ávila con una canoilla, cuando se
y a su Real Consejo. El Hermano Fray Andres de huyeron los demas y nos dejaron solos en aquellas
Toledo embarcó para Lisboa y de alli pasó á esta playas.
Corte, y habiendo cumplido con su legacia se quedó
Llegaron las tres canoas á Anete Pascua de
en España. El Hermano Fray Domingo Brieva quedó
Natividad, la cual celebramos con tanto gusto, como
en la ciudad de el Marañón para ser guia y norte de
tuvieramos si fuera aquel socorr o el que
la armada que ya se estaba aprestando con toda
esparábamos de Quito y hubieramos de entrar á
consideración, por ser el viage largo y dificultoso y
los Encabellados á proseguir nuestra obra. Venian
no haber de parar de alli hasta llegar a Quito, como
estas canoas y gente á cargo de un vecino de Ávila
adelante diremos. Ahora dejemos esto en este
llamado Pedro de Azaque, el cual dió cuenta como
estado, y volvamos á las Islas de los Encabelados
el Capitan Lanzobeja, asi como le despachó á él con
en busca de los compañeros que allà quedaron de
las canoas á buscarnos, despachó también aviso
partida para el Real de Anete.
de el alzamieno de los Encabellados y muerte de el
Quedaron en aquellas playas el Padre Fray Capitan Palacios y todo lo demas á la Real Audiencia
Laureano de la Cruz y el Hermano Fray Francisco de Quito. Con lo cual comenzamos perder las
de Piña con la poca gente que habia quedado, no esperanzas de el socorso y entrada que
con pequeño cuidado por los compañeros que iban esperabamos, como en efecto sucedió. Porque
navegando el rio abajo. Encomendaronlo todo á apenas llegaron los avisos á Quito, asi el que hizo el
Nuestro Señor, y fueron subiendo por el rio de Napo Teniente, como el que que yo hice con el Donado
arriba para el Real de Anete. A poco camino andado, cuando se sospendió el viage, que ya el Hermano
los Indios amigos que eran del Capitan difunto, y Fray Pedro Pecador trataba de hacer con la gente y
otros mas que tenian cogidos, se fueron huyendo y bastimento que con beneplácito de los Señores de
llevandose las canoas, de tal suerte que vinimos à la Real Audiencia y licencia de los Prelados, ya iba
quedar solos diez Españoles, nosotros los dos juntando para efecto de el socorro y de lo que se
Religiosos, con no mas de tres Indios y algunas pretendia. Con que paró la obra de todo punto
Indias y muchachos, y con sola una canoa, y esa dejandolo todo á Dios, que sabe lo que conviene.
200 As Missões dos Franciscanos e as Viagens de Frei Laureano de La Cruz (1647-1651)

Dispuso luego el cabo Pedro de Azaque que todos Francisco de Quito, numerando las leguas que habia
los que alli estabamos nos embarcasemos para la de uno a otro y nombrandolos por sus nombres,
ciudad de Ávila en las canoas que él trajo y en que marcando y tomando la altura de los parages y
nosotros alli teniamos, que asi era orden del sondando nuestro rio por su canal principal,
Teniente Lanzobeja. Hizose el matalotage que se advirtiendo con toda atención las poblaciones de
pudo para el camino, y la vispera de año nuevo, Gentiles que iban encontrando, y tomando noticia
que fuè el de 1638, nos embarcamos, y comenzamos de algunas otras que estaban apartadas de nuestro
nuestro viage por gran rio dos dias de camino, por rio la tierra adentro y lo que en ellos habia o podia
otro rio menor, de mucha corriente y piedras y muy haber de provecho. Finalmente iban obrando aquello
malo de navegar. Estando en este puerto que se para que fueron enviados, pues no iban de otra cosa,
llama de la Concepción, ya de partida para la ciudad y para ello llevaron un buen piloto que con todo
de Ávila, que está diatancia de tres dias de mas cuidado iba haciendo todo lo referido.
camino por tierra, llegó alli el Hermano Fray Pedro
Esta fuè la segunda vez que los hijos de
Pecador en busca nuestra por una patente del
Reverendo Padre Provincial Fray Pedro Becerra, en nuestro Serafico Padre navegaron el gran Rio de San
la que nos mandaba ir a su presencia como lo Francisco de el Quito, y la tercera seria cuando volvió
hicimos con mucha puntualidad, y gracias á Nuestro la armada de Quito al Pará, y ellos con ella. Habrian
Señor, en pocos dias llegamos. Dimos cuenta de todo ya caminado casi 800 leguas, cuando pareciendole
lo sucedido con tanto sentimiento de todos, que ya al General asi convenir, despachó á el Coronel Benito
bien lo sabian. Pedimos licencia para irnos á nuestra Rodriguez con 8 canoas y la gente necesaria, para
Recolección á recogernos y entregar lo todo á cumplir con el orden que llevaba, y hacer con esta
Nuestro Señor, y á esperar nuevas de nuestro Fray diligencia mas cierto su viage, por que mucha de su
Diego Brieva, que ya es tiempo de irle á buscar. gente ya cansada con el mucho trabajo y
descomodidades que pasaban, se quisieran volver
Despachada por el Gobernador de el Marañón
al Pará, como se volvieron algunos, que se huyeron.
Jacome de Noroña, la ar mada que dejamos
Con esta buena traza fueron continuando su camino
apuntada con 40 canoas de buen porte y 1200 Indios
hasta que llegaron á las islas del Puerto de San
remeros, y de pelea setenta y tantos Portugueses y
Antonio de los Encabellados. Aqui se quedó la mayor
mas cuatro Castellanos de los seis que bajaron con
parte de la armada á cargo de el Capitan Pedro de
los Religiosos, todo a cargo de el General Pedro
Acosta. Y el General, con algunos compañeros y el
Tejeira, persona de toda satisfacción, llevando por
Padre Fray Agustin de las Llagas, partieron para
guia á Dios Nuestro Señor y al Hermano Fray
Quito, siguiendo siempre el Coronel y su compañia,
Domingo Brieva y por Capellan al Padre Fray
que con el Hermano Fray Domingo Brieva, y uno de
Augustin de las Llagas, hijo de una de las provincias
sus compañeros, platico en aquellos rios y puertos
de nuestro Padre San Francisco de Portugal, y
Presidente del Convento de San Antonio de el Gran de los Quijos que los guiaban, iban delante. Llegó
Pará. Junto y apercibido ya todo esto y las cosas esta primera escuadra hasta diez leguas mas abajo
necesarias para tan largo viage en la plaza de el de el puerto de Archidona (que se llama de Napo),
Curupá que es la ultima que tiene aquel estado, y de adonde por las muchas piedras y corriente de
está mas cercana á la boca que tiene nuestro gran nuestro gran rio, no fuè posible pasar á tomar
rio, que ya no tiene otro nombre que el que los puerto. Fueles forzoso volver atras para entrar por
Portugueses con mucha razón le pusieron, de San otro rio mas hondable, que se llama Payansino, á
Francisco de el Quito, por haberlo descubierto y tomar puerto en el de Xini, que está tres dias de
navegado los Religiosos de Nuestro Padre San mal camino de la ciudad de Ávila. Aqui llegaron á
Francisco y de la Provincia de el Quito. Y ya de aqui 24 de junio de 1839, dia de San Juan Bautista.
adelante no le hemos de nombrar de otra manera, Dejaron en este parage las canoas y marcharon el
pues tan justamente le conviene el nombre de el Coronel, el Hermano Fray Domingo Brieva y demas
Rio de San Francisco de el Quito. A los 17 dias del compañia para Ávila, adonde llegaron, muy
més de octubre de 1638 salió la armada Portuguesa necesitados. Estaba en esta ciudad por Teniente un
de la plaza de el Curupá con fervorosos alientos de vecino Encomendero llamado el Capitan Sebastian
toda aquella gran compañia, con animo de morir Diaz, el cual los recibió con su acostumbrada
antes que dejar de llegar a la ciudad de Quito, segun caridad y los socorrió y remedió sus necesidades,
las órdenes que llevaban. Caminaron á vela y remo como pudo, y no como el quisiera, por ser la tierra
algunas leguas, hasta que fallandoles los vientos falta de bastimentos, y los huespedes muchos. Visto
(que no los hay sino cerca de el Mar) les fuè forzoso por el Hermano Fray Domingo Brieva la presente
andar este camino y hacer este viage á fuerza de necesidad, y que habia de ser mayor con la llegada
remos, que es cosa trabajosísima, y mas con canoas de la armada que los venia siguiendo, partió con
tan grandes como llevaban, y si no fueran tales no toda prisa á Quito, asi para procurar el remedio,
pudiera hacerse este viage. Llevaba cada una de como para dar cuenta de su venida. El Capitan
ellas 20 remeros, y algunas á mas, y muy pocas á Sebastian Diaz despachó aviso luego de la llegada
menos. Desde luego fueron con mucha cuenta y de los Portugueses á los nuestros de la Real
razon, reconociendo todos los rios que por Audiencia de Quito, y de la falta de bastimentos
entrambos lados iban entrando en el nuestro de San que habia en aquella tierra para socorrernos.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 201

Llegó este aviso y el Hermano Fray Domingo la Real Audiencia á su despacho á el Virrey del Perú,
casi á un tiempo á la ciudad de Quito, y se conmovió que entonces era el Conde de Chinchon, á quien
toda con tal novedad. Informado de todo lo ya dicho hicieron informe y dieron de todo bastante cuenta.
el Reverendo Padre Provincial, que ya lo era el Padre Al Padre Fray Agustin de las Llagas lo llevamos á
Fray Martin de Ochoa, y el Reverendo Padre Fray nuestro Convento de nuestro Padre San Francisco
Pedro Dorado (que fuè el primero que despachó de San Pablo de Quito, adonde con todo amor y
Religiosos para estos descubrimientos) fueron caridad fuè recibido de todos, y por que venia
juntamente con el Hermano Fray Domingo á dar enfermo de los trabajos de el camino, lo llevamos á
cuenta de todo á los Señores de la Real Audiencia y la enfermaria, adonde se le acudió con todo cuidado
á manifestarles la necesidad de aquella gente que hasta que estuvo sano. El Piloto de la armada
habia venido por orden de su Magestad y en su Portuguesa, á pedimento de aquellos Señores, hizo
servicio, traidos por nuestros Frailes, para que una mapa de nuestro gran rio como persona que lo
fuesen servidos de los mandar socorrer. Los Señores habia marcado y tanteado bien, como ya dijimos,
acudieron luego con muy buena voluntad y en que fué de mucho gusto para todos los que lo vieron.
nombre de su Magestad despacharon 600 pesos que Yo lo vi muchas veces y cotejandolo con su original,
se sacaron de sus Reales cajas, y nombrando una me parece está cabal, y verdadero. Despues de hecho
persona de toda satisfacción, llamada Juan de esto y el descubrimiento acabado, se fuè el Piloto á
Golibar, los entregaron, y con asistencia del la ciudad de los Reyes en campañia del Padre Fray
Hermano Fray Pedro Pecador se emplearon en Pedro Dorado, que en este tiempo partió para Lima
mantenimientos y en todo lo que fuè necesario, y à negocios de la Orden.
con toda prisa fueron á llevarlo á los Quijos para Dentro de pocos dias llegó aviso á Quito del
soccorro de las escuadras Portuguesas, por que ya Capitan Pedro de Acosta, á cuyo cuidado quedó la
habian llegado; el General Pedro Tejeira, y el Padre mayor parte de la armada Portuguesa, de como
Fray Augustin de las Llagas, y demas compañeros entrando en los Encabellados, con su gente, á
que dijimos venían en seguimiento de los primeros. buscar mantenimientos, de que necesitaban, le
Algunos Portugueses habian ya llegado á Quito habian muerto algunos de sus Indios cristianos, y
cuando salió el socorro, y otros venian caminando que su gente habia prendido cosa de 60
en tropas, y el Hermano Fray Pedro Pecador los iba Encabellados, para hacer justicia de ellos, y por no
socorriendo como los iba encontrando, dandoles lo estar ciertos si eran aquellos los agresores no los
que habian menester, y pasando adelante con lo habia castigado, que los Señores de la Real
demas hasta alcanzar los ultimos, que fueron el Audiencia enviasen orden de lo que se habia de
General y sus compañeros, de los cuales supo como hacer. Tambien invió el dicho Capitan y sus
se les habian muerto muchos Indios de hambre y compañeros á pedir á su General Pedro Tejeira que
de el trabajo de el camino. Supo tambien que el les enviase al Padre Fray Augustin de las Llagas,
General y compañeros habian hecho matar un Capellan de la Armada, para que alli les diese Misa
caballo que les habia dado el Teniente de Ávila para y los confesase, que por falta de Ministros se habian
que en el subiesen á ratos los mas necesitadoa y muerto algunos sin confesion. A lo primero
que se lo habian comido todo. A tanto como esto
mandaron los Señores que por la duda que habia
llegó su necesidad. Finalmente con el buen socorro
que aquellos Indios Encabellados fuesen culpados
que se les envió se alentaron y pudieron muy bien
en las muertes de que avisaban, que los remitiesen
llegar á la ciudad de Quito, a donde fueron muy
luego á aquella ciudad, y se repartiesen en los
bien recibidos.
Conventos de los Religiosos. Para lo segundo
Juntaronse el General Pedro Tejeira, el Padre hicieron el General y sus Oficiales una petición, en
Fray Augustin de las Llagas y algunos oficiales de que pidieron al Reverendo Provincial y al Definitorio
la armada, y fueron el Maese de campo, el Sargento un Religioso sacerdote para que fuesen a las Islas
mayor, el Coronel, y otros con alguna de su gente, de los Encabellados a consolar á aquella gente de
en un lugar de Indios cerca de la ciudad de Quito, y su armada, por no estar el Padre Fray Augustin de
desde alli caminaron con algunas personas que los las Llagas para ponerse en camino. Vista por el
acompañaron, hasta llegar á un llano que se llama Definitorio, y por el Padre Provincial á quien se
Anaquitos y está junto á la dicha ciudad, adonde remitió fuera de el Quito la justa peticion de los
los salieron á recibir Don Juan de Acuña, Corregidor Portugueses, nombraron luego para esta Mision al
de Quito y Teniente de Capitan General, con muchas Padre Fray Laureano de la Cruz y por su compañero
personas de cuenta, todos á caballo, y otra mucha al Hermano Fray Francisco Piña, y con toda
gente de á piè y habiendose saludado con mucha brevedad salimos de Quito con la benedicion de Dios
cortesia, puestos todos en orden entraron en la y de los Prelados. El General Pedro Tejeira nos dió
ciudad y fueron á las canoas Reales, adonde los un Alferes para que con la gente que fuese menester
Señores Presidentes y Oidores recibieron las cedulas y con buen matalotage, que ellos y nosotros
de su Magestad y ordenes que llevaba el dicho juntamos, fuesemos à los Encabellados. Fuimos
General, en cuya conformidad había hecho aquel delante yo y mi compañero y un soldado Portugues,
viage, dando en breve cuenta de todo. Mandaron y en 10 dias llegamos à la ciudad de Archidona en
los Señores darle casa y proveer de lo necesario al los Quijos, que está un dia de camino del puerto de
General y á su gente, y despues se les señaló tantos Napo, adonde nos habiamos de embarcar, y alli
pesos cada dia para su sustento. Por ser este negocio estuvimos esperando algunos dias, en tanto que la
de mucha importancia, remitieron los Señores de gente que nos habia de llevar, llegaba y se juntaba.
202 As Missões dos Franciscanos e as Viagens de Frei Laureano de La Cruz (1647-1651)

Estando ya aprestados y para irnos embarcar, patente al Hermano Fray Domingo de Brieva, para
nos alcanzó una carta del Reverendo Padre que en la armada Portuguesa, en que habia venido
Provincial, en que nos mandaba volver à Quito, por a Quito, volviese al Gran Pará, y de alli se embarcase
que habia venido el despacho de Virrey de Lima en para España, y como persona de todo crédito y que
que mandaba que se volviese al Pará el General con habia hecho el descubrimiento y navegado tres veces
toda su armada. Y supuesto que los Portugueses se (con esta) el gran Rio de San Francisco del Quito,
volvian à sus casas, nos volvieremos nosotros à la vsto y considerado lo que en él y sus Riveras habia,
nuestra, que ya el Padre Fray Agustin estaba con hiciese de todo relación y diese buena cuenta à su
fuerzas para hacer su viage y se andaba ya aviando Magestad (que Dios guarde) y su Real Consejo, pues
con la demas gente para embarcarse. Con eso ninguno lo podia hacer mejor y con mas certeza. La
salimos luego de Archidona para Quito, y fuimos patente es la que se sigue.
encontrando en el camino muchos de los de à Quito.
Llegamos con bien al Convento de San Pablo, y no
‘Fray Martin Ochoa, de la Regular Observancia,
hallamos al Reverendo Padre Provincial, que se
Comisario y Calificador de esto Santo Oficio de la
habia ido à visitar algunos Conventos, aunque no
Inquisición, Ministro Provincial y siervo de los Frayles
tardó mucho. Supe como el Señor Virrey habia
Menores de esta Santa Provincia de nuestro Padre
enviado orden para que dos personas de toda
San Francisco de el Quito, à nuestro carisimo
satisfacción fuesen en la armada Portuguesa hasta
Hermano Fray Domingo de Brieva, Religioso lego,
el Gran Pará y viesen con cuidado y consideración
salud y gracia en Nuestro Señor. Experimentando en
todo aquello de que le habia hecho relacion y que
Vuesa caridad el gran celo que há de la conversión
pasasen de alli à España y diesen cuenta de ello a
de las almas; y que se reduzcan al conocimiento de
su Real Magestad y Señores de su Consejo. Supe
Dios y à la observancia de la ley Evangelica, y
tambien que el Reverendo Padre Provincial de la
atendiendo juntamente à las grandes mercedes, y
Compañia de Jesus habia ofrecido por una petición
favores que la Magestad divina hà hecho à los
para tal Mision al Padre Cristoval de Acuña y al
Religiosos hijos de nuestro Padre San Francisco y à
Padre Andrés de Artieda, personas de mucha cuenta
esta su santa Provincia del Quito, descubriendo
en aquella provincia y muy grandes siervos de el
grande multitud de infieles, tierras tan incognitas,
Señor, à los cuales los Señores de la Real Audiencia
rios y navegaciones tan deseadas y pretendidas de
despacharon con sus provisiones y recados
nuestros catolicos Reyes; siendo justo que la
necesarios. Supe tambien como el Licenciado Perez
Magestad Catolica, y nuestros Prelados superiores
de Salazar, Presidente de aquella Audiencia,
conozcan que esta empresa se há conseguido por
pretendió la conquista de nuestros descubrimientos
medio de Religiosos que han salido de esta santa
para un hijo suyo, en compañia de el General Don
Provincia de Quito, que celosos de la conversion de
José de Acuña, Corregidor de Quito, para lo cual
aquellos Infieles otras veces y con tan fervorosas
fuè grande conveniencia que el Padre Cristoval
instancias han entrado en sus tierras, teniendo en
Acuña su hermano hiciese este viage, que otro
poco sus vidas por que ellos alcanzasen el
ninguno seria tan a proposito, para solicitar sus
conocimiento de la salud eterna. Y asimismo por lo
pretenciones. Lo que negociaron los siervos de Dios
que Vuesa caridad tiene de esta conversion que es
no he sabido, mas supe de cierto que el General
la experiencia y conocimiento de aquellas tierras, por
Don Juan de Acuña fuè de Quito à Potosi Corregidor
haber estado otras veces ya en ellas con otros
y el Licenciado D. Alonso Perez de Salazar por
Religiosos, à conseguir los fines referidos por conocer
Presidente de los Charcas, con que se puso silencio
y haber venido en compañia de la armada que llegó
à este negocio.
à esta ciudad de Quito de la provincia del Gran Pará,
Salen ultimamente de Quito el General Pedro donde Vuesa caridad fuè, y à cuya instancia vinieron
Tejeira y toda su gente, menos algunos compañeros el General y soldados que residen en aquellas tierras,
que se le quedaron. Salen los Padres de la Compañia pertenecientes à la Corona de Portugal, para que se
de Jesus y otros Padres de nuestra Señora de la enterasen en la navegacion de el gran rio de el Napo
Merced, que à pedimento de los Portugueses fueron (que hoy se intitula San Francisco de el Quito por los
à fundar al Gran Pará; solo de la Religión de San Religiosos que lo descubrieron), y estando de partida
Francisco, siendo la mas interesada, no salen mas la dicha armada para volverse à las ciudades de el
que el Padre Fray Agustin de las Llagas, Capellan Pará y Marañón, de donde salieron, y habiendome
de la Armada. Con todo fuè Nestro Señor servido pedido con notable instancia el General y soldados,
que el Reverendo Padre Provincial Fray Martin de por el consuelo espiritual suyo, y de los Indios
Ochoa volviese à este tiempo de su visita y habiendo cristianos que trajeron, los vaya Vuesa caridad
sabido el despacho que habian hecho los Señores acompañando y enterandose mas bien de las
de la Real Audiencia y lo demas que hemos dicho, y provincias y navegaciones de los rios; por tanto con
que los Portugueses iban desconsolados por no parecer de el Definitorio de esta Provincia, y en virtud
llevar Religiosos de nuestro Orden, juntó luego su de la Constitucion general, que nos da facultades
Definitorio, y habiendo consultado el caso, se para enviar à los reynos de España uno o mas
determinó que el Hermano Fray Domingo Brieva Religiosos à negocios que se ofrezcan, concedemos à
viniese a esta Corte à dar cuenta de todo à su Vuesa caridad licencia para que pueda volverse con
Magestad y Real Consejo. En esta conformidad la dicha armada y que vaya por el gran rio referido,
dispachó el Reverendo Padre Provincial con su hasta llegar à la provincia de el Gran Pará à los
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 203

demas lugares de ella, y en hallando embarcacion aun que no lo trajeran perdieran antes la vida que
pueda pasar à los reynos de España à la presencia tocarle, sino para reverenciarlo. Estimó mucho el
de nuestros Reverendos Padres Ministro General y siervo de Dios esta accion y la del Gobernador, y
Comisario General de Indias, y dará cuenta de este despidiendose de ellos, diò por todo muchas gracias
descubrimiento de el gran rio de Napo, y con su à Nuestro Señor y prosiguiò su camino tan deseado.
parecer postrarse à los pies de nuestro catolico Rey Llegó el Hermano Fray Domingo Brieva à la
y à su Real Consejo de Indias, y harà informes con ciudad de Archidona, adonde halló toda aquella
gran legalidad y fidelidad, de todos los rios, buena compania, que todos alegres de su venida le
navegables y tierras que con tanto trabajo há dieron los parabienes y juntos se fueron à embarcar
descubierto. Y para mayor espedicion de las cosas, al puerto de Napo, que está de alli un dia de camino
que se ofrecieren en las dichas tierras y navegaciones por tierra (à donde los vecinos de Archidona tienen
de el gran rio de el Napo; pedirá Vuesa caridad à poblados los mas de sus Indios). Embarcaronse en
nuestro Reverendo Padre Comisario General de canoas pequeñas para pasar las primeras horas de
Indias, todos los pedimentos necesarios, y porque nuestro gran rio; por que alli por su mucha corriente
en viage tan largo no carezca de merito, le impongo o piedras no da lugar à mayores embarcaciones.
el de la santa obediencia, y se lo mando en virtud de Juntemos ahora esta dificultad con las demas que
el Espiritu Santo. Que es dado en nuestro Convento hemos dicho de los puertos de los Quijos, y de sus
de San Pablo de Quito en 1 de marzo de 1639 años, caminos, y hallaremos tan dificultoso por alli el paso
firmado de nuestro nombre, sellado con el sello mayor para estrangeras naciones, que lo podremos tener
de nuestro oficio y refrendado de nuestro Secretario por imposible, y al Perù por muy seguro de
– Fray Martin Ochoa, Ministro Provincial. – Por enemigos, à lo menos por esta parte. Habiendo pues
mandado de nuestro Padre Provincial – Fray Cristoval navegado tres dias el rio grande, llegaron a la junta
Saguer, Secretario’. de la Coca, y es un rio que recoge la mayor parte de
las aguas de la provincia de los Quijos, y se junta
Salió el Hermano Fray Domingo Brieva de la con el nuestro à las 25 leguas de el puerto de Napo,
ciudad de Quito, cuatro dias despues que se le diò este es rio de mucha corriente y piedras, y de
la dicha licencia y patente con la bendicion de Dios ninguna manera navegable. Aqui esperaron las
y de sus Prelados, en seguimiento de los compañeros canoas grandes que los Portugueses habian dejado
que ya se habian ido delante. Y llegado à la ciudad à la subida en el rio de Payansino, que està muy
de Baeza, cabeza del gobierno de los Quijos y Macas, cerca de la junta de las Cocas, en el puerto de Xini,
halló alli al Gobernador de aquel partido D. de que ya dijimos. Llegadas las canoas se
Francisco Mogollon de Ovando, el cual (aunque con embarcaron en ellas y navegando por nuestro Rio
mucho sentimiento y pena) le hizo notificar una de San Francisco abajo, en pocos dias llegaron al
providencia de los Señores de la Real Audiencia de puerto de San Antonio de los Encabellados, donde
Quito, en que mandaban que de ninguna manera hallaron al Capitan Pedro de Acosta con lo restante
pasase el tal Religioso à España, ni outra persona de la armada que con su llegada fueron muy
alguna mas que los que yà habian pasado. Con consolados y regalados con lo que les llevaban de
grande paciencia sufriò este golpe el siervo de Dios, Quito, y luego todos juntos prosiguieron su viage
y mas considerando de donde podia venir. con mucho alivio, po que navegando rio abajo, y al
Encomendólo à Nuestro Señor y por su amor amor del agua, se trabaja poco, y como ya este
repartió à los pobres todo el matalotage que llevaba descubrimiento estaba hecho, tuvieron muy poco
para su viage de limosna que los bienhechores le que hacer à la vuelta.
habian hecho caridad. Y aquella noche solo y con Habiendo navegado la armada Portuguesa
su bordon, y con su patente colgada al cuello, saliò casi 10 meses, llegaron à la plaza de Curupá, y de
de Baeza en prosecucion de su viage, confiado en alli sin detenerse pasaron al Gran Pará, donde se
aquel divino Señor, por cuyo amor se ofrecia à quedó el Padre Fray Agustin de las Llagas en su
tantos trabajos, que le sacaria bien de todos. El Convento y los Padres de la Merced en una casa
dia siguiente de mañana echando menos el que les dieron (que fue el principio de su fundacion)
Gobernador al Hermano Fray Domingo, y sabiendo y algunos compañeros soldados. Y lo restante de la
que se habia ido, mandó por cumplir con el orden armada pasó a la ciudad de el Marañón y con ellos
que tenia, que tantos soldados fuesen trás de él el Hermano Fray Domingo Brieva, aunque con
pero con orden secreta de que se lo alcanzaban lo mucho trabajo por ir con una pierna quebrada y
dejasen ir su camino y que no se le impidiesen, por muy maltratada de un arbol que le cayó encima,
que sabia muy bien la verdad de todas las cosas. casi en lo ultimo de nuestro gran rio, no muchas
Alcanzaron los soldados à nuestro Religioso y dicenle leguas del Curupá. Llegados con bien al Marañón,
que vuelva con ellos à Baeza, que asi conviene, mas donde ya era Gobernador Benito Maciel Parente,
el siervo de Dios, sin ninguna turbaccion les enseñó se embarcó nuestro Religioso para la ciudad de
su patente y les dijo que convenia su cumplimiento, Lisboa, adonde llegó à salvamento, y desde alli à
y que de ninguna manera volveria paso atrás, que esta Corte trabajosamente, y habiendo llegado el
si querian llevarlo que lo agarrasen à cuestas; y siervo de Dios, sin ninguna dilacion, como cosa que
sentandose en el suelo esperó à que los soldados tanto deseaba, puesto à los pies de su Magestad
hiciesen de èl lo que quisiesen. Ellos le dijeron el (que Dios guarde) hizo relacion y diò cuenta de
orden secreto que traian de el Gobernador y que nuestro descubrimiento, y asimismo à su Real
204 As Missões dos Franciscanos e as Viagens de Frei Laureano de La Cruz (1647-1651)

Consejo, asi de palabra como por escrito, disponer aquella gente infiel, y poner la obra del
patrocinandolo nuestro Reverendo Padre Fray Señor en estado, que cuando volviese à Quito el
Joseph Maldonado, Comisario General de todas las Hermano Fray Domingo, fuese su entrada, y la
Indias, que como dueño de esta obra, la valió y tomó conversion de aquellos Indios mas facil con lo que
à su cuenta, à quien ya el Hermano Fray Domingo ya se hubiese obrado y trabajado.
Brieva habia dado bastante razon de su venida y Con esta patente y muy consolado el Hermano
tomado su santa benedicion. Dejemos todo en este Fray Pedro Pecador, me fuè à buscar al Convento
estado, que à buen seguro que tenga todo buen de Recoleccion de Quito, dónde yo estaba, por saber
despacho, pues está en tan buenas manos, y si yo deseaba lo mismo; comumicolo conmigo, yo y
volvamos à la Provincia de Quinto y Convento de él con el Reverendo Padre Provincial, que entonces
San Pablo y hallaremos en el algunos Hermanos lo era segunda vez el Padre Fray Pedro Dorado, el
nuestros, compañeros de nuestro descubrimiento, cual nos amonestó (pudiendolo mandar) que
que por la tardanza del Hermano Fray Domingo aguardasemos al Hermano Fray Domingo Brieva,
padecen algunos desconsuelos, si bien como siervos que ya tenia nuevas que habia salido de España
de Dios los llevan con paciencia, con todo eso por bien despachado, y que en llegando se haria la
haber tenido noticias que los Religiosos de la entrada con mejor acierto y disposIcion; hicimoslo
Provincia de nuestro Padre San Francisco de los asi y cada uno se fuè a su celda à encomendarlo a
doce Apóstoles de Lima hacian mucho fruto Nuestro Señor. Pasados tres o cuatro meses volvió
espiritual en la Provincia de los Indios Panataguas, el siervo de Dios Fray Pedro Pecador con su fervoroso
que es de Infieles, cercanos à las cordilleras de la espiritu à tratar de la entrada, por que no venia el
ciudad de Guanuco pocas leguas de Lima, querian Hermano Fray Domingo y pareciendole que se perdia
si les diesen licencia irlos à ayudar, por no haber tiempo. El Reverendo Padre Provincial viendo su
encontrado disposicion en la obra de nuestro perseverancia, lo despachó à la Villa de San Miguel
descubrimiento. de Ibarra, 15 leguas de Quito, adonde estaban los
En el año de nuestro Salvador de 1641 por el Religiosos sacerdotes que deseaban tener parte en
mes de febrero con licencia y benedicion del la obra (en un Convento de Recoleccion que alli
Reverendo Padre Fray Joseph de Cisner os, tenemos), con orden para que el uno de ellos le
Comisario General de el Perù, salieron de la ciudad acompañase. Llegó el siervo de Dios al Convento,
de Quito dos Religiosos, hijos de la Recoleccion de habló con los Religiosos para efecto de la entrada, y
San Diego, llamados Fray Pedro de la Cruz y Fray no se concertaron, quizas por gozar de mejor
Francisco de Piña (compañeros nuestros que lo ocasion, como yo habia hecho. Tuvo aqui nuevas el
fueron en la entrada de los Encabellados) para la Hermano Fray Pedro de como en la ciudad de Pasto
ciudad de los Reyes, cabeza y corte del reino del (que está de la dicha Villa 50 leguas, y de Quito 65,
Perù (que està de Quito 300 leguas caminando caminando hacia el Nuevo Reyno de Granada, que
siempre al Sur) para entrar con los Religiosos de la es à la vanda del Norte) se estaba ordenando una
santa Provincia de Lima à la de los Panataguas y entrada por el Gobernador de Popayan para la
otras de Infieles ya descubiertas y por descubrir, y provincia de los Ceños, adonde el siervo de Dios
con ellos trabajar en la viña de el Señor. Llegados habia ya entrado y deseaba entrar de nuevo. Partio
que fueron los siervos de Dios à la ciudad de los luego para allá solo con un Donado Indio por
Reyes, les diò el Señor un buen compañero, compañero, y habiendo avisado al Reverendo Padre
sacerdote de buen espiritu, que con licencia de su Provincial de su determinacion, se fuè con aquella
prelado los acompañó, y los tres apostolicamente compañia de soldados à los Sucumbios y ciudad de
partieron de Lima para los Panataguas ya Ecija y de alli por el rio Putumayo a los Ceños, a
convertidos por los Religiosos de aquella Provincia, donde iba aquella gente con animo de poblar y
y por hacer mayor servicio a Nuestro Señor entraron pacificar aquella nacion. Llegados que fueron al
mas dentro à una grande de Indios infieles de que puerto y playa de la dicha provincia, se desavinieron
tuvieron noticia. De estos tres Religiosos tuvimos
aquellos hombres y de tal suerte lo hicieron que
en diferentes tiempos diferentes nuevas, unas de
unos por el rio arriba y otros por el rio abajo se
que los habian muerto aquellos bàrbaros, otras, que
desaparecieron todos, y no survió de mas su entrada
los habian recibido bien y que estaban vivos
que de inquietar los Indios, y de perderse muchos
trabajando en el ministerio apostólico y bien
de ellos, que esto hacen hombres voluntarios.
queridos de aquellos naturales. Aquellas tierras
Nuestro Hermano Fray Pedro Pecador viendo este
estan allà muy remotas, y nosotros hà mucho tiempo
desavio, con la bendicion de Dios y con un
que salimos de nuestra provincia de Quito, y asi no
compañero, se fuè el rio abajo à salir à la provincia
hemos sabido mas, de lo referido. Un año despues
de haber ido à esta Mision los dichos dos Religiosos de los Omagua (para donde era su patente) como
de nuestra Provincia con santa emulacion y deseos en efecto salió. De esta provincia y del Hermano
de trabajar en la viña del Señor, el Hermano Fray Fray Pedro Pecador diremos mas adelante.
Pedro Pecador, el primero descubridor de nuestro Fuè Nuestro Señor servido que el Hermano
gran Rio de San Francisco de Quito y de el Fray Domingo Brieva, con su pierna quebrada, pero
Putumayo, alcanzó licencia del Reverendo Padre muy esforzado en el Señor, llegase à Quito, al cabo
Comisario General Fray Joseph de Cisneros, para de mas de tres años que tardó en su viage, fuè de
con un sacerdote entrar en la provincia de los todos muy bien recibido, por que todos le queriamos
Omaguas (de que tuvimos grandes noticias) para mucho. Dio cuenta de su buen despacho y
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 205

presentose en la Real Audiencia una cedula Real de hecho merced por dos vidas. La cual pacificacion,
su Magestad, su data en 18 de setiembre de 1641, por no poderla hacer el dicho General Don Pedro
en que mandaba que se hiciese la pacificacion de Vaca, por sus achaques y falta de dineros, capituló
las naciones de Infieles de nuestro Rio de San con el Maese de Campo, Antonio Carreño, mercader
Francisco de el Quito, por aquellas personas que à y no de mucho caudal para que tomase el trabajo y
sus costas lo quisiesen hacer, prometiendoles las hisiese la tal pacificacion y conquista à su costa
mercedes que se suelen hacer à los conquistadores con sus conveniencias, que consta por instrumentos
segun la ordenacion antigua, y que para su efecto que entonces se hisieron, y se hallaban en el oficio
capitulasen con la Audiencia de Quito. Los Señores de Cabildo de la ciudad de Loja, donde el General
de la dicha Real Audiencia obedecieron la Real Don Pedro Vaca tiene su casa y asistencia. Salieron
cedula con las ceremonias acostumbradas y la pues los dos Religiosos de Quito con la benedicion
hicieron publicar. De alli algunos meses se publicó de Dios y la de nuestro Padre Provincial, que
otra cedula Real despachada en 31 de diciembre de entonces era de aquella provincia el Reverendo Padre
1642 en orden à que se guardase y cumpliese lo Fray Francisco Becerra, para la reducion en lo
ordenado y mandado por su Magestad en su Real espiritual de los indios Xivaros, à peticion del Maese
cedula primera, que los Religiosos de nuestro Padre de Campo Antonio Carreño, que con mucha
San Francisco y los de la Compañia de Jesus se instancia lo diligenció, prometiendo que no entraria
aplicasen a la predicacion y conversion de los en la dicha provincia de los Xivaros otros ningunos
naturales de nuestro gran rio, sin que se Religiosos mas que los de nuestra Serafica Orden,
embarazasen los unos à los otros. Muchos dias y habiendo llegado con bien à la ciudad de Cuenca,
esperaron los siervos del Señor, hijos de nuestro que está 60 leguas de Quito, donde se estaba
Padre San Francisco de la Provincia de Quito, à que disponiendo la entrada, y disponiendo para ella todo
se efectuase lo que su Magestad mandaba en sus lo necesario, ayudaron para su buen efecto en todo
Reales cedulas, lo cual no fue posible ni hubo
lo que pudieron, aunque no se pudo hacer por donde
persona alguna que se ofreciera à hacer la tal
y como se habia tratado. Habian de hacer la entrada
conquista quizas temiendo los gastos y por no estar
à la pacificacion de los Xivaros por Cuenca, Macas
ciertos de los provechos temporales (que estos son
y por Zamora, repartiendose la gente en tres tropas
los que mueven muchas veces à algunos mas que
para coger los Indios en medio y con mas facilidad
el amor de Dios y salvacion de las almas). Los siervos
hacer la conquista. Para esto el Maese de Campo
de Dios con su acostumbrado celo, no dejaban de
Antonio Carreño, se habia convenido con los vecinos
diligencias cuanto podian el volver a entrar, aunque
de la ciudad de Macas para que con sus Indios
fuesen solos à continuar la obra de Nuestro Señor,
ayudasen por aquella parte. No quiso venir en ello
yà comenzada y tanto trabajada. No surtió efecto
el Gobernador de aquel partido, que entonces lo era
por entonces su santa pretension, por el reparo que
(N.) Santander, con que faltó esta ayuda, que era la
se hacia, segun ya se habia esperimentado, que en
mas necesaria y faltaron tambien los Indios de
no tomando esta conquista y pacificacion, su Real
Zamora por no haberlos querido dar el Corregidor
Magestad à su cuidado, mandandola hacer à su
costa con oficiales y gente pagada, y con la de la ciudad de Loja, llamado el Capitan Diego de
disposicion conveniente, no era posible (moralmente Castro, sin cuya ayuda no se podia conseguir lo
hablando) hacer cosa de consideracion, y ello es asi que se pretendia, como en efecto no se consiguió.
verdad, y asi lo siento segun Dios; y que se procure El Maese de Campo Carreño y demas oficiales
lo primero la gloria y honra de Dios y la salvacion y compañeros de la entrada, que todos eran
de las almas, que lo demas serà a su tiempo y a él voluntarios, o iban à ella de muy buena gana (con
dará su fruto la tierra. Dios nuestro Señor que es el esperanzas de grandes intereses), por que no se les
dueño de todo, y por quien se há de hacer, lo malograsen los gastos que tenian hechos se
sasonará todo de al suerte que se halle mas y se determinaron à hacer la entrada todos juntos por
goce mucho, mucho mas de lo que se piensa. Cuenca, con intento de llegar à las primeras
Esperemos en su divina Magestad que tendrá esto poblaciones de los Xivaros, y alli hacer alto y
muy felices sucesos, si se hace como se há dicho. fortificarse lo mejor que pudiesen, y luego pedir
Salieron de la ciudad de Quito y del Convento soccorro à las ciudades vecinas, para con él y con
de Recoleccion de San Diego à los primeros dias de otras trazas lograr sus esperanzas. Sucedioles esto
el mes de mayo de 1645 dos Religiosos sacerdotes muy al contrario, por que habiendo entrado con
llamados el Padre Fray Laureano de la Cruz (que mucho trabajo, por ser el tiempo riguroso y
soy yo) y el Padre Fray Andres Fernandez para entrar dificultoso el camino, y llegado à las primeras casas
à la reduccion y pacificacion de la provincia que que se hallaron vacias, salvo una en que se halló
llaman de los Xivaros, que se iba à hacer por la una India con sus niños y otros dos muchachos,
ciudad de Cuenca y otras partes, por orden de Don que tambien se cogieron, antes de fortificarse, que
Pedro Vaca de la Cadena, Gobernador, y Capitan era lo que tenian determinado, por faltar Indios
General de la provincia de los Maynas y Jeveros, à trabajadores, que se les habian huido los que
cuyo cuidado estaba el hacer la conquista y sacaron de Cuenca, y por haberles muerto los
pacificacion de los dichos Xivaros por muerte de su Xivaros dos Españoles, por un descuido que
padre Don Diego Vaca de la Cadena, à quien la tuvieron; trataron luego de volverse à salir y dejar
Magestad de Felipe tercero (que esté en gloria) habia la obra de la mano, aun antes de dar principio.
206 As Missões dos Franciscanos e as Viagens de Frei Laureano de La Cruz (1647-1651)

Algunos contrarios pareceres hubo, acerca de la almas, poco mas o menos, que cada una de ellos
salida, y ultimamente se resolvieron y volvieron vale mas que todo el mundo. Son todos ellos hijos y
todos à Cuenca, los mas de ellos encontrados y nietos de Cristianos, y estando esta provincia
desavenidos. Casi de esta manera há sucedido otras convertida y pacificada como las demas, y poblada
veces que se há intentado esta conquista y de Españoles, y dónde su Real Magestad tenia sus
pacificacion, por entrarla à hacer gente voluntaria, casas y oficiales Reales, en la ciudad de Logroño, se
que de ordinario hacen lo que quieren. Los Religiosos revelaron los dichos Xivaros, y matando à los
entramos y salimos con los demas, y no servimos Españoles, sin escaparse vivos mas que dos o tres
en este viage mas que de acompañarlos de decirles que huyeron, se alzaron con la tierra mas há de 70
Misa, de administrarles los santos Sacramentos y años, y se han estado alzados hasta hoy y se estaran
de apaciguarlos en sus discordias, aunque no assim, si su Magestad (que Dios guarde) no lo
sucedia siempre como quiseramos. El Maese de remedia. El segundo genero es la mayor riqueza de
Campo Antonio Carreño se fuè à la ciudad de Lima oro que tiene todo el Perù, como consta, no de
à pedir al Virrey del Perù favor, que era entonces el noticias, sino de esperiencias. Por que en aquellos
Marques de Mancera, para volver à hacer la dicha años que estuvo la provincia pacífica (que no fueron
conquista (mas no se há hecho nada, como ya lo muchos) se dieron de quintos à su Real Magestad
hemos sabido). Nosotros los Religiosos nos volvimos las partidas que se hallan en los libros Reales en la
à la ciudad de Quito y à nuestro Convento à comarca de Quito, que son muchas y muy grandes.
encomendarlo à Nuestro Señor. Ahora será bien que Y de esto se podrá inferir lo mucho que los vecinos
digamos que cosa es la provincia de los Xivaros, lo encomenderos de los Xivaros sacarian en aquel
que hay en ella, y lo que sentimos, segun Dios. tiempo. El Tesoro espiritual y temporal há mas de
Es la provincia de los Xivaros 80 leguas de la 70 años que està escondido, no en tierra incognita
ciudad de Quito, à las vandas del Sur, caminando y apartada, sino à las puertas de casas y en medio
hacia Lima, dentro de la jurisdiccion y distrito de la de nuestras poblaciones cristianas, como hemos
Real Audiencia de la dicha ciudad, metida entre dos referido y es cosa cierta. El dueño de todo es su
cordilleras, que la cercan, y tienen en medio à la Real Magestad, y por haberse hecho merced de la
traza de un valle, pero muy grande, por que tendrá reduccion y pacificacion de aquellos pobres
al parecer 10 ó 12 leguas de ancho y mas de 40 de naturales (que engañados de el demonio se alzaron)
largo, toda tierra de arbolado y muy doblada de al General Don Diego Vaca de la Cadena y a su hijo
muchas lomas y rios pequeños que la dividen. Pasa Don Pedro, se han malogrado muchas almas (que
por medio de esta provincia un rio que tiene su se deben mucho llorar), y tanta riqueza como se há
prncipio cerca de los Macus, y la va prolungando à dejado de sacar de aquella tierra, que hubiera sido
la larga hasta que entra por el Pongo, que así se de mucho importe à la Real Corona, y sus aumentos,
llama una grande avertura que hizo el diluvio en mas con mucha facilidad se pudiera hacer la dicha
una de las cordilleras que cercan la dicha provincia conquista y reduccion, si su Real Magestad mandare
de los Xivaros, que es la que está por la mano que se haga por su cuenta, y à su costa, que mayores
izquierda hacia el oriente, la cual está despoblada dificultades venceran su gran poder y fuerza,
por su mucha aspereza. En desembocando esse rio ayudado con la divina gracia, à quien sea la gloria
de los Xivaros, con otros que se le allegan por el de todo.
dicho Pongo de los Maynas, corre por tierra llana, En el año de nuestra Redencion de 1647, en
toda de arbolado, hasta entrar en nuestro Rio de el mes de mayo, movidos del amor de Dios, y puesta
San Francisco de Quito à las 230 leguas mas abajo en él toda su confianza, salieron de la ciudad de
del puerto del Napo, por la vanda de el Sur. Por la Quito cuatro Religiosos, hijos de nuestro Padre San
mano derecha hacia el poniente la otra vanda de Francisco del Convento de San Diego de la dicha
nuestra cordillera principal, tienen los Xivaros por ciudad, para ir à una provincia de Indios infieles
vecina la ciudad de Cuenca, que estará de ellos llamados Omaguas, que abitan en las Islas del Rio
distancia de 26 leguas, y la ciudad de Tamora, que de San Francisco de Quito, y estan 800 leguas abajo
está otras tantas. En esto medio estan poblados los de su nacimiento, adonde el Hermano Fray Domingo
tales Xivaros, à la una y otra vanda del rio que ya Brieva havia estado varias veces cuando lo discubrió
dijimos, la coge por medio à lo largo, en aldeillas de y navegó. Salieron pues los cuatro Religiosos
pocas casas de madera y cubiertas de palma. Es llamados el Padre Fray Laureano de la Cruz,
tierra muy fértil y abundante en los mantenimientos Comisario, el Padre Fray Juan de Quincoces, y los
necesarios de la tierra; tiene mucha caza y buen Hermanos Fray Domingo Brieva y Fray Diego
pescado y es de muy lindo temple. Tiene cerca à Ordoñez, à procurar la conversion y remedio de
Cuenca y à Loja que la pueden proveer con mucha aquellas pobres almas, que segun tuvimos noticias,
abundancia de los mantenimientos que le faltaren, debian de ser muchos millares, por que decian ser
como se hacia cuando la tenian poblada nuestros aquella provincia de los Omaguas de más de 200
Españoles. Que no será pequeña ayuda de costas leguas de largo, y de tal suerte poblada, que casi se
para sus pobladores. veian las mas poblaciones de las otras, no muy
Los dos generos mas principales que la dificultosa, al parecer, su reduccion por ser gente
provincia de los Xivaros tiene son 200 Indios de apacible, politica, y la de mas razon y gobierno de
lanza (que dicen los Baquianos que habrá) y 400 todo nuestro gran rio, que tenian Caciques
mugeres y muchachos, que por todos eran 600 principales, à quien estaban muy obedientes, y
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 207

tenian comercio y comunicacion con las naciones descubrimiento del rio de las Amazonas y sus
vecinas, y otras cosas, que nos obligaron à hacer poblaciones, procurando se dispongan y apliquen a
de esta nacion y provincia un muy elevado ello con particular celo de los dichos Religiosos de
concepto. Y si ello fuese asi verdad por lo que San Francisco y de la Compañia de Jesus y los de
entendimos de las relaciones, hubiera sido esta la Santo Domingo, cuando sea menester à cultivar y
mejor entrada que se hubiera hecho en todo el Perù. estender la fé y predicar el santo Evangelio, y se
Salimos con la benedicion de Dios y de el Reverendo ayuden unos à otrros con tal fervor y conformidad
Padre Fray Juan de Durana, Comisario General que por este medio se consiga la reducion de los
de el Perù, vencidas ya muchas dificultades y naturales, pacificacion y poblacion de aquellas
contradicciones, que para hacer esta entrada provincias, que asi conviene al servicio de Dios y mio,
ofrecieron, por no hacerse con gente de guarnicion y para que mejor se pueda conseguir lo referido, se
como convenia para el efecto de nuestra pretension, ordena al Obispo de esa ciudad, que por su parte lo
y verdaderamente que no se hiciera si no fuera por ayude y fomente para que resulten los buenos efectos
una cedula Real que su Magestad mandó despachar que deseo. Echa en Madrid à 12 de abril de 1646
à su Real Audiencia de Quito, en que ultimamente años; Io el Rey. Por mandar de el Rey nuestro Señor
mandaba que por todos los caminos y medios Don Gabriel de Ocaña y Alarcon.
posibes se procurase la reduccion y conversion de
todos los habitadores de nuestro gran rio, por
Aunque sabian por esperiencia los dichos
medio de la predicacion del santo Evangelio; en
Religiosos, que la tal pacificacion y reduccion no se
vista de la cual los Señores de la Audiencia dieron
habia de conseguir sin armas y gente que fuese
licencia y despacharon sus provisiones para que
conquistando y doblando las naciones de Infieles
se hiciese la dicha entrada. La cedula Real es la
de nuestro rio de San Francisco, con todo eso se
que sigue.
ofrecieron à hacer este viage, solo por la buena
disposicion, que segun los informes, parecia tener
EL REY la provincia de los Omaguas, pareciendoles que
Presidente y Oidores de mi Audiencia Real de aprendiendo la lengua, acariciandolos y
la ciudad de San Francisco en la Provincia de Quito, atrayendolos al conocimiento de Dios, y obediencia
por cedula de 18 de setiembre del año pasado de à su Magstad, con toda suavidad y amor, y hallando
1641, os enviè à mandar miraseis que personas en ser cierto lo que decian las relaciones, reconocida
esa provincia que quisiesen encargarse de la bien la tierra y las cosas de ella, visto su disposicion
pacificacion y poblacion de las del rio de las ser tan buena como se habia entendido, entablarse
Amazonas, y que habiendo tratado con ellas, alli con los dichos Indios y avisar à su Magestad y à
hiciesedes los asientos y capitulos y capitulaciones su Real Audiencia de Quito para que siendo servidos,
que conveniesen, guardando en todo lo dispuesto mandase enviar gente que poblase la dicha
por una carta y provision del Rey mi señor abuelo provincia, y pedir por merced que aquellos Indios
(que santa gloria haya), su data, en el Bosque de Omaguas, habiendose ya convertido y hechos
Segovia à 13 de julio de el año pasado de 1573, y cristianos y vasallos de su Magestad, fuesen de su
las demas cedulas y provisiones Reales, que, en Real corona, y no se encomendasen à los pobladores
razon de semejantes poblaciones estan dadas. Y (como estan los del Perù), para que con ellos (por
por otra mi cedula de 31 de diciembre del año ser buenos canoeros e inclinados à las armas) y
pasado de 1642 os enviè à mandar procediesedes con los Españoles soldados se fuesen conquistando
à la ejecucion y complimiento de la dicha cédula y reduciendo las demas naciones. Este fuè nuestro
con toda puntualidad y cuidado, disponiendolo de intento y para esto trabajamos lo que Dios sabe en
forma que en la conversion de los naturales no se deligenciar esta ultima entrada, como consta por
embarazasen ni encontrasen los Religiosos de San los autos que se hicieron en esta razón, y se hallarán
Francisco con los de la Compañia de Jesus, sino que juntos con las tres Reales cédulas de su Magestad
unos y otros pudiesen obrar en la conversion y en el Archivo de la Real Audiencia de Quito y en los
doctrina de los Indios, que era lo que principalmente oficios de Don Juan Cornejo y Antonio Sanchez
se habia de mirar por ambas Religiones, mostrando Maldonado, escribanos de Camara, con otros
el celo que tenian de el servicio de Dios y mio, y bien muchos autos que se hicieron por las otras entradas
de aquellos naturales, como mas particularmente se que los Religiosos de nuestro Padre San Francisco
contiene en las dichas mis cédulas à que me refiero. de la Provincia de Quito han hecho, que son las que
Y por que mi intencion y voluntad es que procedan hemos referido. Salimos finalmente de la dicha
por los caminos y medios que fueren posibes se ciudad y Convento con muchas esperanzas de muy
consiga la reduccion de los habitadores de aquella buenos sucesos, muy buen proveidos de
tierra por medio de la predicacion de el santo bastimentos y de vestuarios y otras cosas necesarias
Evangelio para que dejen la gentilidad ydolatrica, para nuestro uso, de que nuestros bienhechores nos
que hoy siguen; y habiendose visto en mi Consejo proveyeron con mucha caridad. Llevamos asimismo
Real de las Indias, y consultandome sobre ello, he ornamentos para celebrar, e imagenes para hacer
acordado mandaros, y ordenaros, como por la Iglesia, como quien iba muy de asiento en
presente os ordeno y mando, pongais particular conformidad con los informes, mas no tuvimos
cuidado en la pacificacion, conversion y ventura, como diremos.
208 As Missões dos Franciscanos e as Viagens de Frei Laureano de La Cruz (1647-1651)

Habiendo pasado la cordillera de Quito y Quijos, de donde se há de comenzar à hacer la


Páramos de los Quijos, llegamos a la ciudad de conquista, si nuestro Señor es servido que se haya
Baeza, donde hallamos al Capitan Bernabé Hidalgo de hacer. Dificultoso parece por ser tierra de
de Pinto, Teniente General de aquel partido, el cual montaña y por estar la gente tan mal poblada y sin
con mucho amor hizo que nos diesen el avio orden ni gobierno, mas con la ayuda de Nuestro
necesario para pasar a la ciudad de Archidona, que Señor todo sea para bien. A la vanda del Sur 80
está de alli 20 leguas, adonde habiendo llegado con leguas mas abajo del Curaray, desemboca un grande
bien, nos recibió y hospedó en su casa, el Licenciado rio en el nuestro de San Francisco que tendrá una
Pedro Ballejo, Cura de la dicha ciudad y nos hizo legua de boca, llamanle los naturales Paramanguaso
mucha caridad. Alli nos detuvimos muchos dias por [sic; Paraná-guaçu], que quiere decir Rio Grande.
estar los Indios que nos habian de llevar ocupados Este es el Marañón, que baja de el Perú por eso se
en la Demora, que asi llaman al tiempo en que se llama nuestro rio de Napo de Marañón y despues
saca el oro. Por lo que habiendo acabado y prevenido que nuestros Frayles lo descubrieron y navegaron
de todo lo necesario de camas y gente para el viage, se llama de San Francisco de el Quito. Juntanse
por el Capitan Diego Diaz de Paz, vecino con el rio Marañón el rio de los Xivaros, el de los
encomendero de Archidona y de Ávila y bienhechor Maguas, y otros antes de entrar en el nuestro. Estre
nuestro; él en persona con su gente, y todo lo demas, estas juntas de estos rios está una provincia de
nos fuimos à embarcar al puerto de Napo que está Infieles, que se llaman Aguanatios, y son tambien
de Archidona un dia de camino. Ocupamos nos el Omaguas, de cabezas chatas. Setenta leguas mas
tiempo que estuvimos esperando este avio en abajo de estas juntas está la provincia de los
escribir y aprender parte de la lengua Omagua, con Omaguas, que tanto cuidado nos dieron y son los
que llevamos muy bien principio y nos fuè con esto que ibamos a buscar.
no muy dificultoso el aprenderla. Embarcamonos Cerca de las dichas juntas, dia de Santa
en el puerto de Napo al 27 de setiembre del dicho Teresa, à quince de octubre, encontramos diez
año y comenzamos à navegar por nuestro gran Rio canoas con 50 Indios Omaguas de la provincia que
de San Francisco del Quito (siendo este su primer nosotros ibamos à buscar, que segun ellos nos
puerto navegable, por que desde aqui à su dijeron iban a una provincia de Indios que se llaman
nacimiento, que no hay muchas leguas, corre mucho Icagnates (y son los Rumos y Encabellados que
y por entre muchas peñas), y à los dos dias de nustra dijimos) a matar y robar como supimos lo tenian de
navegacion llegamos à la junta de el rio de la Coca, costumbre. Algunos de ellos huyeron cuando vieron
que está del puerto de donde saliemos 28 leguas. nuestras canoas y la mayor parte de ellos conociendo
Habiendo ya pasado por los rios de Archidona, de ser Españoles (que ellos llaman Caripunas)
Ávila y Payansinos, que son los que hemos dicho esperaron y saltando todos en tierra en una playa
que salen de la provincia de los Quijos, todos por la los saludamos, y abrazamos con muestras de amor,
vanda de el Norte, y es à la mano izquierda y ellos hicieron lo mismo con nosotros. Hablamosles
caminando nuestro rio abajo. En este parage dicen con las lenguas que llevabamos, y dijimosles como
que fabricó Orellana el bergantin con que navegó ibamos en busca de ellos para que fuesemos amigos
por nuestro gran rio y fuè à salir à la Margarita. y enseñarles las cosas de Dios y hacerlos cristianos
Iendo pues prosiguiendo nuestro viage, à las para que se salvasen y que si gustaban nos
47 leguas de la [j]unta de la Coca, hacia la vanda quedariamos los Religiosos nuestros con ellos.
del Sur, que es a la mano derecha, caminando por Dijeron que si y que holgaban mucho de ello.
nuestro rio abajo, pasamos el Real de Anete, adonde Persuadimoslos à que dejasen aquel mal viage que
dijimos tuvo su asistencia el Capitan Juan de iban à hacer y que nos fuesemos juntos à sus casas.
Palacios con su gente. Pocas leguas mas abajo Hicieronlo asi y llamando à los que se habian
desemboca en el nuestro un rio, al parecer no muy escondido y muy contentos nos fuimos todos juntos
grande, en el cual dicen está una provincia de Indios por nuestro rio abajo. A los 19 de octubre, dia de
Omaguas, de cabezas chatas, de donde los vecinos San Pedro de Alcántara, llegamos à la provincia de
de la ciudad de Archidona han sacado algunos, de los Omaguas y à la Isla primera de ella llamada
que se sirven. A las 18 leguas de Anete à la vanda Piramota, y nosotros la llamamos de San Pedro de
del nuestro, desemboca el rio Aguarico y se junta Alcántara por haber llegado à ella en sua dia. Con
con el grande nuestro, y de alli comienzan las muestras de mucho gusto nos recibieron los dichos
primeras provincias y naciones de Infieles que Indios y luego nos hospedaron en una de sus casas,
pueblan el gran Rio de San Francisco del Quito; por que para ello desocuparon, y al Capitan Diego Diaz
la vanda del nuestro los Encabellados y Rumas que de Paz, y para su gente dieron otra, y en ella y en
todo es uno, por la otra vanda, que es la del Sur, la nuestra compañia estuvieron los Españoles no mas
de los Abiginas; fenece esta nacion y provincia en que cuatro dias, los cuales los Omaguas nos
un rio, que se llama Guraray, que desemboca y entra regalaron a todos en lo que tenian, y eso con muy
en el nuestro por la propia vanda de el Sur y tendrá buena voluntad. Levantamos un altar y en él
de ancho como un cuarto de legua. En este rio, dicen ofrecimos a el Padre Eterno el santo Sacrificio de la
que hay muchos Gentiles y hay personas que han Misa. Plantamos el arbol santo de la Cruz y en el
llegado à sus poblaciones, y se llaman Equitos. Estas nombre de Dios Nuestro Señor tomamos posesion
son las primeras poblaciones de Infieles y mas de aquellas tierras que nuestra Santa Madre Iglesia,
cercanas al distrito de Quito, y jurisdicion de los y por nuestro catolico Rey, y por todo dimos à
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 209

Nuestro Señor muchas gracias. Procuramos luego son yucas, maiz y las otras frutas ordinarias de la
informarnos de la gente y demas cosas de la tierra y mucho pescado de que abundan aquellos
Provincia y no fuè posible saber cosa cierta por rios. Dormimos alli una noche y el dia siguiente
entonces, solamente entendimos de ellos que la seguimos adelante y llegamos à outro pueblo
gente era mucha, la cual dejamos para su tiempo, llamado Mayti con solas ocho casas en una isla mas
remitiendolo à la vista. grande que las primeras, 9 leguas de el otro pueblo
La Isla de San Pedro de Alcántara tendrá de de Sacayey; paramos sin llegar à él y à cuatro leguas
largo dos leguas y de ancho menos de media. Y asi andadas llegamos à una isla tambien grande con
está como las demas (que seran de este porte y un pueblo de 46 casas llamado Caraûte, que tendria
algunas mucho mayores) estan pobladas de muy 40 vecinos y mas sus mugeres y muchachos que
alta y espesa arboleda. Tenian sus casas, que eran por todos llegarian à 120 almas. Aqui me recibieron
28, en la orilla del rio, hechas de madera y cubiertas muy bien y regalaron con lo que pudieron, y yo les
de palmichas, que allá llaman Pinagua, todas correspondia à estos como à los demas con avalorios,
puestas en hilera à manera de Galeras entotoladas cascabeles, anzuelos y otras muchas menudencias
con las oproas hacia el rio, todas muy juntas las semejantes que ellos estiman mucho. En este
unas con las otras, y cada una con dos puertas, lugarcito pequeño estuvimos tres dias y al cabo de
una para el rio y otra para el monte. Vivian en cada ellos volvimos al pueblo de Mayrti que habiamos
una de estas casas dos, tres y cuatro vecinos, que pasado sin estar en él; llegamos, y sus vecinos, que
se llaman Indios de lanzas, y serian por todos 80, y serian 20, nos recibieron muy alegres y acudieron
de mugeres y muchachos habia como 250. De todo como los demas. Aqui dormimos por la noche y en
esto dimos aviso à nuestros Prelados y à la Real ella fuè Nuestro Señor servido consolarnos con un
Audiencia de Quito por el Capitan Diego Diaz de la niño que hallamos ya casi para espirar, que
Paz, el cual nos tenia prometido que vendria a bautizado se fuè al cielo, y fuè este el primero de los
visitarnos con su gente una vez cada año por los que bautizamos en aquella provincia que no fueron
veranos, y con esta conformidad prometimos para pocas gracias à Dios. Salimos de este pueblecito y
la primera vez que nos viniese à ver, tener vista y llegamos al otro donde hicimos noche y al otro dia
tanteada la dicha provincia, para dar cuenta de todo. fuimos à dormir à San Pedro de Alcántara, adonde
Partió el Capitan Diego Diaz y su gente para Quito, hallamos à nuestros compañeros alegres en Nuestro
dejandonos un Indio Omagua cristiano con su
Señor, y yo me holgué mucho de hallarlos buenos.
muger para intterprete, y nosotros quedamos solos
Diles cuenta de lo que pasaba y no dejó de
y muy consolados en nuestro Señor por vernos como
aguarsenos el gusto con lo que ibamos viendo tan
deseabamos, si bien con alguna pena, de que lo que
diferente de lo que teniamos entendido segundo los
viamos no conformaba con las relaciones, mas
informes.
encomendamoslo à Dios, y remitimoslo à la vista y
esperiencia, Aquella misma noche despues que el Dentro de pocos dias llegó adonde estabamos
Capitan y demas gente se habian ido se nos huyeron una canoa con siete Indios del pueblo de Caraûte.
el Indio y su muger, que habia quedado en nuestra Donde ya habia estado yo, que venian à buscarnos
compañia, para interpretes de la lengua, con que para llevarme à su lugarcillo, diciendo que gustaban
quedamos de el todo puestos en las manos de Dios. de nuestras compañias y para que le pusieramos
Fuimos prosiguiendo con nuestra obra y una Cruz, como habiamos hecho en San Pedro de
aprovechonos mucho lo que ya traiamos aprendido Alcántara. Fuime de buena gana con ellos, llevando
y escrito de la lengua, y con ese principio y buena con migo al Donadito mi compañero, dejando à los
diligencia fuimos a prisa aprendiendola, y obrando demas como la otra vez, ocupados en aprender la
aquello à que habiamos ido, y lo que tanto trabajo lengua y en conservar y aumentar la amistad de los
nos costaba. A los cuatro meses poco mas que Indios y cuidando de los Seños que morían para
asistimos juntos en este pueblecillo con esta gente, bautizarlos, que estos fueron los ejercicios en que
que nos acudió muy bien, di orden de ir à reconocer nos ocupamos el tiempo que estuvimos en aquella
algunos de los pueblos mas cercanos a este, y provincia, ultra de los de obligacion y devocion, que
habiendolo consultado con nuestros compañeros, es lo primero. Llegamos al pueblo de Caraûte,
dejandolos encargados estos Indios que quedaron, adonde ibamos, y donde estuvimos los dias que
con 30 de ellos, que me acompañaron en sus canoas dijimos. Pusimos la santa Cruz y todos la adoraron
y en una que nos dejó el Capitan, hicimos esta y besaron, de la suerte que yo los enseñé, con que
primera salida. se consolaron. De aqui pasamos a otro pueblo que
Salimos de San Pedro de Alcántara, llevando estaria de este ocho leguas, en otra isla muy grande
en mi compañia un Donadito Indio de Quito, por mi y tenia 22 casas y en ellas cosa de 50 indios con
intérprete y compañero, dejando otro allá con los mas chusmas. De este pasamos à otro que estaba
compañeros, y caminando por nuestro Rio de San 10 leguas mas abajo con 9 casas y en ellas como 16
Francisco de el Quito hacia abajo, llegamos en el pesonas entre grandes y pequeños muy afligidos
mismo dia à un pueblo pequeño de 14 casas llamado porque se les habian muerto los demas (aunque
Sacayey en otra isla semejante à la primera, que algunos huyeran) de una gran peste de viruelas que
tendria 30 Indios y mas sus mugeres y muchachos, les habia dado à todos, de que ya ellos estaban
que no eran muchos. Estaba esta isla de la otra convalecentes. Dieronme por nuevas que toda la
ocho leguas, recibieronnos bien sus moradores y provincia de alli para abajo estaba apestada y que
acudiéronnos con el sustento que ellos tienen, como se habia muerto mucha gente. Con esto nos
210 As Missões dos Franciscanos e as Viagens de Frei Laureano de La Cruz (1647-1651)

volvimos atras al lugarcito de Caraûte, à donde ya cuidadosos de nosotros. Hallamoslos buenos y todo
à este tiempo se iba anegando toda la tierra con las el lugarcillo sano, y libre de la peste, siendo solo
avenidas y de sus allegados, que esto sucede en este el que se libró de ella en toda la provincia.
aquellas islas casi todos los años. Hicieron los Indios Acabados ya los referidos trabajos, quise volver à
dentro de sus mismas casas unos techados de caminar y descubrir lo restante de la provincia
madera que ellos llaman luzas y encima de ellos porque nos decian los Indios que abajo estaba lo
estubimos tres meses que fueron los de abril, mayo grueso de la gente, y no pude porque enfermaron
y junio con mas de seis palmos de agua debajo. dos compañeros, y no me atrevi a dejarlos. Cuando
Entraban y salian las canoas dentro de las casas y a cabo de 17 meses de nuestra llegada à estos
de noche quedaban debajo de los tablados. Iban en Omaguas, à los 14 de marzo del 1649 llegó el
ellas los Indios por el monte adentro à buscar frutas Capitan Diego Diaz de Paz con su gente, y canoas, y
de palmas y de otros arboles, y pescado para comer, con un Religioso que el Reverendo Padre Fray
porque los mantenimientos que tenian sembrados, Fernando de Cozar, Provincial, nos envió con muy
casi todos se perdieron. buen socorro y una patente con que nos mandaba
En este tiempo estando como estabamos que si se hacia fruto en aquellas tierras, o habia
anegados una noche con un grande viento, agua y esperanza de hacerse, perseverasemos en ellas, y
truenos que vino de el rio para arriba, llegó a nuestro que sino que nos volviesemos à nuestra Provincia.
pueblo de Caraûte la peste rio abajo y el dia siguiente Lo que hicimos fuè enviar los dos compañeros
amaneceron heridos de ella un mozuelo, y una India enfermos, que eran los Hermanos Fray Domingo
vieja, en casas diferentes, y de estos se fuè Brieva, y Fr. Diego Ordoñez à Quito, quedandose
cundiendo y pegando en los demas de tal suerte en nuestra compañia el Hermano que nos trajo el
que en poco mas de un mes, no quedó en todo el socorro, llamado Fray Francisco Gonzalez. Y
lugarcito persona grande o pequeña que no cayese escribimos al Reverendo Padre Provincial lo poco
miserablemente, hasta el Donadito mi compañero que hasta entonces habiamos visto y que nos
no se escapó de este trabajo. Solo a mi Dios fuè quedabamos para ver lo demas, que nos decian era
servido que no tocase, andando como andube entre mucho, y que en habiendolo visto, tratado, y
aquellos miserables apestados de enfermedad tan considerado, a otro viaje que viniese a vernos el
pegajosa y tan asquerosa que solo el ver el miserable Capitan Diego Diaz, resolveriamos lo que se habia
estado de los tales enfermos, y su mal olor, bastaba de hacer, de tal suerte que si fuese cosa de
para matar. Otro trabajo se nos allegó a estos importancia como nos habian dicho, nos
(aunque no duró mucho), y fuè que cubriendose toda quedariamos y enviariamos à pedir ayuda, y sino
la tierra de muy espesa neblina, que venia de hacia fuese asi, nos volveriamos à nuestros conventos y
el Mar, y caminaba para las cordilleras, con un con esto despachamos al Capitan, compañeros, y
recisimo aire, y agua menuda que los Indios llaman demas gente, que estubieron con nosotros solos tres
Jocamari, y quiere decir tiempo frio, y lo dias.
esperimentan dos o tres veces cada año, y cada vez
dos, tres, o cuatro dias sin verse el Sol, ni aun casi Pocos dias despues de ido el Capitan y demas
luz. Temporal fuè aqueste tan frio que no habia ropa compañia, dejando en nuestro pueblecito de San
con que repararlo y que nos obligó à calentar el agua Pedro de Alcántara los compañeros que eran el Padre
para poderla beber. Y aquellos miserables heridos Juan Quincoces, el Hermano Fray Francisco
de la peste, y todos llagados echados sobre aquellos Gonzalez, y un Donado haciendo de su parte lo que
tablados, desnudos, sin ningun genero de reparos era como siempre, yo y el otro Donadito mi
ni socorro temporal, sino era un poco de lumbre, y compañero bajamos, por nuestro Rio de San
no todos la alcanzaron, pasaronlo tan Francisco en nuestra canoa y con Indios bastantes,
desdichadamente que muchos murieron. Los aullidos con animo de ver y reconocer toda la provincia, y
que los enfermos daban, y los llantos que se hacian habiendo caminado 10 leguas dejamos los Indios
por los muertos, eran tales que se me representaban que llevabamos, por que temieron los matasen los
las penas que sus almas ya padecian de los unos propios de su nacion (que tales son que no se fian
que esperaban à los otros. No tenian aquellos los unos de los otros), y con otros, que nos quisieron
miserables medicina con que curarse mas que con acompañar caminamos nuestro rio abajo otras 60
unas cortezas de arboles y hojas de otros, que cocidas leguas, reconociendo los pueblos que hemos
se lavaban con el agua, mas casi no les fuè de encontrado (que eran pocos, y como los demas),
provecho. Los cuerpos de los muertos llevaban con hasta que llegamos al paraje donde desemboca y
un lazo arrastrando, y echabanlos en medio de el entra el nuestro el rio Putumayo, que fue el primero
rio. Y los que escaparon de la muerte, quedaron tales que nuestros Religiosos navegaron y por donde el
que en mucho tiempo no fueron de provecho para Hermano Fr. Pedro Pecador bajó desde los Zeños, y
nada. Sea Nuestro Señor bendito por todo. salió à esta provincia de los Omaguas. De este
Pasados cinco meses que estubimos en este paraje, y de un lugarcito que está cerca de él de 15
pueblecito, y pasda la inundacion que duró 3 meses, casas y poco mas de 30 Indios, no pasamos, ni fue
y la peste que duró casi otro tanto, y el frio, que posible, porque los Indios de él, especialmente uno
duró cerca de 4 dias habiendo muerto la terza parte llamado Mayrcatizi, grande hechicero, no nos
de aquella desventurada gente, y convalecida la dejaron pasar, diciendo que los Indios de mas abajo
demas, y nuestro Donadito ya sano, volvimos à nos habian de matar, con lo cual traté de
donde estaban nuestros compañeros harto informarme de lo restante de esta provincia, y hallé
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 211

segun el informe que nos hicieron, y lo que yo tenia de agua, lavamoslo, y cortamos la vid, que aun
visto, que no teniamos nada, y que nos habiamos estaba consus pares; envolvimoslo en unos paños,
engañado. Pues en 200 leguas que tienen de largo llevamoslo à nuestra casa, y fuè Nuestro Señor
los Omaguas con 34 pueblos pequeños no hallamos servido que viviese ocho dias. Sustentamoslo con
10 Indios cabales, fuera de sus mujeres y leche de otras Indias (que su madre nunca mas lo
muchachos qe no son muchos ni los pueden ser vió), al cabo de ello se lo llevó Dios para si, y nosotros
por lo que adelante diremos. Aqui preguntamos por le dimos muchas gracias. Con la esperiencia de el
el Hermano Fray Pedro Pecador y supimos como caso referido, creimos ser cierto lo que ya nos habian
habia llegado à esta provincia, y de ella pasado à dicho algunas veces los mismos Omaguas, que
otra que está 50 leguas mas abajo y se llama de los enterraban vivos à sus hijos acabados de nacer, ó
Aysuaces, con un mozo por compañero que seria el porque queriendolos padres hijo varon, nacia
Donado que sacó de Quito. Alli me dijeron que hembra, ó porque nacia uno estando la madre
estubieron mucho tiempo, y que quedandose el criando otro, y de esta suerte habian enterrado
mozo, llamado Pascual, acomodado con una India muchos y supimos que la madre de nuestro niño
infiel, se fuè por nuestro rio abajo el Hermano Fr. habia enterrado ya otros dos, y de otras madres de
Pedro Pecador solo en busca de los Portugueses (que à uno, de à dos y à tres. Reprendimosle este
los Indios llaman Caraygnas), quedandose alli el maleficio, y nos respondieron que siempre lo hacian
miserable Pascual hecho Indio y peor. asi, y que era entre ellos antigua costumbre.
Volvimos otra vez por nuestro Rio de San De lo dicho se podrá inferir la policia, razon, y
Francisco arriba y llegamos con bien à San Pedro buen gobierno de los Omaguas, y que no pueden
de Alcántara donde hallamos à nuestros ser muchos, por las razones ya dichas de matarse
compañeros, y habiendoles referido todo lo que unos à otros, de enterrar vivos à los hijos acabados
hemos dicho, y considerado de espacio à aquella de nacer, y fuera de los que mueren de enfermedades
provincia tan larga, y de tan poca gente y tan (que ellos no quieren creer sino que los hechiceros
apartados los unos de los otros, sin policia, razon, los matan) mueren tambien despedazados de tigres,
ni gobierno, sin principales Caziques, ni obediencia mordidos de viboras, y comidos de caimanes, que
à nadie, y que su comercio con los vecinos era todo esto vimos y entendimos en el tiempo que
matarse, y cautivarse unos à otros como lo vimos estubimos con ellos que fueron tres años cabales.
todos y esperimentamos bastantemente. Las islas La ropa que visten los Omaguas son los varones
donde habitan anegadizas, mucho calor e infinidad unas camisetas de algodon pintadas que les llegan
de mosquitos; y otras cosas con que se hacen las à la rodilla, y sin manga, y estas no les sirven lo
tales islas inhabitadas à lo menos para Españoles. mas del año por que sin ellas andan mas
Con resolucion nos determinamos volvernos a desembarazados. Las mujeres se envuelven en unas
nuestra provincia, pues no tubimos mas ventaja. mantillas de algodon tan cortas y angostas que les
Aguardabamos para el verano que ya se cercaba à honestan muy poco. El modo que tienen en
nuestro Capitan Diego Diaz, como nos lo habia aplastarse las cabezas es el siguiente. Toman la
prometido, ya dispuestos para irnos. Para lo cual criatura de pocos dias nacida, y ciñenle la cabeza
rescatamos cinco muchachos de los que tienen los por la parte del cerebro con una faja de algodon
Omaguas cautivos, que no hallamos mas para ancha, y por la frente con una planchuela que hacen
llevarlos à Quito, con algunos bordones, y pajaros, de cañas bravas, que les coge desde ojos hasta el
que los hay por alli muy buenos, mas no vino el cabello muy bien apretada, y de esta manera lo que
Capitan, aunque pasó el verano y tiempo en que la cabeza habia de crecer en redonda, crece para
habia de venir. Pareciendonos pues, que el no haber arriba y queda larga, chata, y muy desproporcionada.
venido à buscarnos seria por no haber podido más, Sustentanse los Omaguas de los mantenimientos
y que vendria por el año siguiente, encomendamos ordinarios de la tierra, de que ya hemos dicho. El
al Señor, y esperamos, ocupandonos este tiempo año que no se anega la tierra es muy fertil, mas el
en los acostumbrados ejercicios, especialmente en que se anega muy esteril. El pescado de estos rios
cuidar de los enfermos. Contaré para mayor gloria es mucho y bueno, y hay muchas tortugas, que es
de Dios, un caso admirable y estraño que me atrevo muy buen sustento, y tambien es buen sustento el
à decir que no há sucedido en el mundo otro peje buey, que es tan grande cada uno como un
semejante. Cerca de la casa de nuestra morada parió becerro, y tiene la cabeza de la misma hechura,
una India un niño, el cual acabado de nacer diò tan pacen yerba en las orillas de los rios, su carne es
grandes gritos que me obligó enviar los compañeros como de vaca, y de mucha sustancia. El modo de
à verlo. Fueron luego, y cuando llegaron le habian pescar, y de cazar aves y animales de aquellos
ya sus mismos padres enterrado vivo en un montes, la naturaleza y necesidad há enseñado à
montecillo cerca de su casa, asi que yo lo entendi sus habitadores. Lo ordinario son flechas,
fui allá con los muchachos y un compañero, y harpones, cerbatanas y lazos que ellos hacen à su
buscando en la parte donde le habia enterrado, modo. Un genero de ganado de cerda hay en todas
quiso Dios que lo hallamos al cabo de un largo cuarto aquellas tierras que tiene el ombligo en el lomo,
de hora que tardariamos buscarlo. Desenterramoslo y cuando los matan es necesario cortarseles
dando ya las ultimas boqueadas u bauticélo. Hecho luego, porque sino toma al olor la carne que es
esto, comenzó Juan, que asi le pusimos por nombre, muy sana y buena. Tambien hay unos animales que
à volver en si y tomar alientos. Hice traer un cantaro llamamos Dantas tan grandes como terneras, y
212 As Missões dos Franciscanos e as Viagens de Frei Laureano de La Cruz (1647-1651)

casi de la misma hechura, que sirve su carne de por donde desemboca en el Mar. Hicimos la canoa
sustento y los cueros para rodelas, y hacen de ellos de un arbol que tenia de grueso 19 palmos, y mas
los Indios con que se reparan cuando pelean. De de 100 de largo, y no era éste de los mayores. Los
estos generos y otros mas, que hay en aquellas mismos indios nos la ayudaron à hacer no sabiendo
montañas, gozan mucho los Indios que estan ellos lo que era. Salionos muy buena y teria de largo
poblados por la tierra firme, à donde el temple es 64 palmos y de ancho 5. Acabada la canoa y pasado
mejor, y donde no hay mosquitos, y son menos las ya el verano y tiempo en que esperabamos el socorro
plagas que en las islas de nuestros Omaguas. que no vino, dia de Santa Teresa por la noche, que
Finalmente la tierra firme es habitable, y las islas es à 15 de octubre de 1650, dejando la casa como
no, ésta promete proveernos, y de aquellas no se sigue se estaba, con todas las cosas de nuestro uso,
ninguno, y si los Omaguas han de tener remedio, há encomendada à unos viejos que nos querian bien,
de ser mudandolos todos à la tierra firme.
à quien llamabamos Abuelos, dijendo que ibamos à
En las dichas islas, y con todas las buscar tortugas à las playas, nos embarcamos los
incomodidades que hemos referido, pasamos tres tres compañeros Religiosos, los dos Donaditos, y
años, y nos conservó Nuestro Señor con los los cinco muchachos rescatados con un poco
miserables Omaguas en buena paz y amistad. bastimento que ocultamente habiamos hecho. Y con
Comiamos de lo que ellos comian, y nos daban de la bendicion de Dios no pudiendo navegar por
buena gana, que nunca nos faltó, y bebiamos de nuestro gran rio arriba por su mucha corriente y
los vinos que ellos hacian, à mas no poder, por no nuestras pocas fuerzas, nos dejamos ir rio abajo
ser nada limpios. Para reparo de los mosquitos con mucha suavbidad procurando con el ayuda y
usamos para dormir de unos toldos de lienzo, de favor de Dios guardar nuestras vidas para mejor
que tambien ellos usan, aunque de diferente
servirle. Dejamos una carta escrita y fijada en parte
materia, porque los hacen de los desechos de las
donde si venian los Españoles la pudiesen ver, en
mantas y camisas de que se visten. Y estos toldos
la cual dabamos cuenta de nuestra derrota, y de
tambien servian de reparo de unas avecillas
las causas que nos obligaron à desamparar aquella
nocturnas, que nosotros llamamos Murciélagos, y
ellos Aneras [andira], que muerden à la gente nacion que son las que ya en toda claridad tengo
estando durmiendo, y les chupan la sangre sin referida.
sentirlo. Para los mosquitos que molestan de dia, Ibamos en amor de Dios haciendo nuestro
y tambien para el calor, usamos de unos abanicos viaje, pasando sin detenernos en los pueblos de los
de plumas que ellos nos daban, y de que tambien Omagua donde ya eramos conocidos, y ellos nos
usaban, aunque no siempre sino en el tiempo de proveian del mantenimiento necesario, de tal suerte,
sus fiestas que son las borracheras, de que usan que con lo que nos daban, y nos otros llevabamos,
mucho desatinadamente, por que hacen unos lo pasamos bien. Pasada ya la mitad de esta
convites para solo beber vinos hechos de aquellas provincia, que está entre otras, que pueblan la tierra
raices que comen, y de maiz, y de patatas en tanta firme, como son à la vanda del Sur los Maynzunas
cantidad que tienen que beber en cada fiesta dos,
y Guaraycos, y à la del Norte los Jaunas, llegamos
tres, y cuatro dias, hombres y mujeres sin faltar
à donde desemboca el rio Putumayo, uno de los
ninguno, y un convite hecho y acabado por un
grandes que entran en nuestro Rio de San Francisco
vecino, se dispone luego otro por otro vecino, y de
y los Indion llaman Iza. No pudimos ver su boca por
esta suerte la mayor parte del año gastan en estas
impedirlo algunas islas que estan delante, ni menos
solemnidades (menos aquellos tiempos en que se
pudimos ver un paramo y sierras nevadas que los
inundan sus islas). Son las tales borracheras el
origen de todos los males de aquellos desdichados, Omaguas nos dijeron estaban hacia la banda de el
porque en ellas se hacen las consultas, y se decretan Sur, pero muy apartadas del rio por estar cuando
las muertes, cautiverios, y maldades que han de pasamos todo aquello cubierto de nieblas. Cincuenta
hacer y de hecho hacen. En estos tiempos y leguas mas abajo del Putumayo vimos un rio que
ocasiones no estabamos nosotros seguros, si Dios desemboca en el nuestro, hacia la banda del Sur,
no nos guardara, porque aunque los Omaguas no que me parece tendria de ancho un cuarto de legua,
estando embriagados, es gente apacible, en no tubimos a quien preguntar, y asi pasamos de
estandolo, se ponen tales, que no conocen à nadie, largo. El dia de antes que pasamos este rio, que
y no estan seguros padres ni madres, hijos ni despues supimos que se llamaba Jutae, nos salió
parientes. al encuentro una canoa con dos Indios Omaguas,
el uno de ellos mi conocido, y el que con otros antes,
Llegado ya el ultimo verano en que
esperabamos socorro de Quito, y que vinieran à me habia dado nuevas del Hermano Fray Pedro
buscarnos, aguardó por horas, se pasó casi todo, Pecador. Hice que llegasen a nuestra canoa, y
con que comenzamos à perder las esperanzas, y los hablando con él, me dijo, que los Indios Omaguas de
Indios à maquinar sobre nuestras vidas, como veian los ultimos pueblos habian muerto al miserable
que los Españoles no venian (que es lo que ellos Pascual (de quien dijimos), y un hijo suyo que estaba
mas temen por los arcabuces). Determinamos hacer en uno de ellos me daria razon mejor de todo. Diome
una canoa buena para irnos si pudiesemos por el nombre de su hijo y unos platanos y yo le di unos
nuestro rio arriba à nuestra provincia de Quito, y abalorios, y despidiendonos se fuè à un pueblo que
sino bajarnos por él abajo à huscar camino por la estaba alli cerca, y nos otros pasamos adelante
provincia de Caracas, que está no muchas leguas lastimados de la muerte de aquel pobrecillo Pascual.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 213

Llegamos en breve à los ultimos pueblos de la no llegamos à sus casas por que en su proceder
provincia de los Omaguas y hallamos al Indio hijo echamos de ver su mala intencion, y asi procuramos
del que encontramos, y de él supimos, que habian pasar de noche por sus poblaciones, aunque un
muerto à Pascual en una borrachera sobre quitarle temporal de viento por la popa tan fuerte que en
algunos trastillos con que habia venido, à restar poco tiempo, con una vela que armamos de una
por ventaja, algunas mantas para vestirse. Tambien manta, nos vimos libres de muchas canoas de Indios
nos dijeron que los Portugueses andaban cerca de que nos iban cercando, de que dimos muchas
alli en nuestro rio buscando oro. Aqui nos gracias a Dios. Pasada esta provincia de los
proveyeron de mucho bastimento con que pasamos Jorimanes, que es la demas gente y mas atrevida,
adelante. A las 24 leguas de los ultimos Omaguas que vimos, caminamos 70 leguas por nuestro rio,
vimos un rio al parecer no muy grande llamado sin ver gente, ni puieblos, sino arboledas, islas, y
Jurya [Juruá], que entra en el nuestro por la banda dos bocas de rios que entraban en el nuestro por la
de el Sur. A esta misma banda 28 leguas mas abajo una banda, y por la otra.
de este rio Jurya comienza la provincia de los
Habiendo pasado todo lo dicho, llegamos al
Aysuaris, à donde nuestro Hermano Fray Pedro
rio Negro que desemboca en el nuestro por la banda
Pecador estubo. Antes de llegar à las casas, que
del Norte, pusieronle este nombre nuestros
estan sobre gandes barrancos, encontramos algunos
Religiosos la primera vez que aqui llegaron, por ser
de sus moradores en canoas que usan, unos a
sus aguas al parecer muy negras, y causólo su
buscar tortugas, y otros à sus sementeras, que
mucho fondo, y ser muy clarra. Tendrá de ancho en
tienen en islas, y de ellos supimos, como el Hermano
su boca una legua, y el nuestro de San Francisco
Pecador habia estado con ellos mucho tiempo, y que
algo menos, aunque entra aqui todo él junto, pero
ya se habia ido nuestro rio abajo à los Portugueses
muy hondo. Este sitio de estas juntas es para muy
y que los Indios de su nacion lo habian ido llevando
ver, porque cerca de sus orillas (donde hay muchas
de unos pueblos en otros. Con esto pasamos
adelante, y tomamos puerto en dos parajes de esta piedras, cosa que no hay en todo el nuestro, sino
en su pincipio) tiene algunas sierras no muy altas,
nacion que cada uno tenia dos casas, à las cuales
y de la una, y otra, banda, muchas y muy altas
subimos à buscar mantenimientos, y hallamos poco
palmas, y muy gruesos y hermosos arboles, y lo
por que nos dijeron, que los Portugueses y su gente
les habian acabado los [que] tenian, y que ya iban que mas es, ver estos dos grandes rios juntarse el
de vuelta por nuestro rio abajo. Esta provincia uno con el otro, y asi juntos hacer su curso y camino
tendrá 80 leguas de largo, sus casas son de madera lado à lado algunas leguas, distinguiendose las unas
aguas de las otras sin revolverse, ocupando cada
y paja, todas cerradas con sola una puerta y esa
uno de ellos una legua, y los dos juntos, dos de
muy pequeña, y tapada por los mosquitos. Vanse
anchura. Despues de haber visto todo esto en que
continuando estas rancherias por las orillas de
nuestro rio, apartadas unas de otras como media gastamos un buen rato, nos metimos en nuestra
legua, à una, y a mas. La gente está toda desnuda canoa en medio de los dos rios, y asi comenzamos a
asi hombres como mujeres, hacen ollas y cantaros navegar, cuando à poco camino andado descubrimos
14 canoas de Indios infieles, que desembocaban por
y cuyas en que beben de unos calabazos que ellos
el rio Negro, y parecia que nos seguian. Dionos
crian, y estos generos truecan esos Aysuaris por
mucho cuidado, por que teniamos noticia que los
otros de que ellos necesitan con sus vecinos.
tales Indios eran muy Caribes, y que usaban de
Toda esta tierra es de arboleda aunque al parecer
flechas envenenadas y las tiraban con unos grandes
no muy espesa.
arcos que alcanzaban mucho con ellas. Mas Nuestro
Casi al fin de la dicha provincia, y à la misma Señor, a quien mucho debemos, fuè servido que ellos
banda desemboca en nuestro rio, otro no muy se divirtiesen por allá, y nosotros en poco tiempo
grande al parecer, llamado [....], en este, y en los los perdiesemos de vista. Á las 40 leguas mas abajo
que hemos dicho e iremos diciendo, hay noticias de de el rio Negro, pasamos, aunque apartados por la
nuevas naciones de Gentiles, pero como no boca de un grande rio, que por la banda de el Sur
entramos ni navegamos por ellos, no los vimos. A la desemboca en el nuestro, al cual pusimos por
banda del Norte pasamos otro rio que entra en el nombre Rio de la Madera, por la mucha que traia
nuestro pocas leguas mas abajo de el de Tapi que cuando nuestros Religiosos pasaron por el, y esto
dejamos à la otra banda, y en su boca hallamos un sucede de ordinario con los demas rios en tiempo
pueblo que tendria 40 casas, llamase el Rio de invierno, por que con las gandes avenidas de las
Aragatuva y sus habitadores Jaguanais. Aqui nos cordilleras, se derrumban muchos pedazos de tierra
dieron un poco de bastimento, y aqui nos acabó la de sus orillas, con los arboles que en si tienen, y
lengua, y no se pudo de aqui adelante hablar à los con algunos otros que se habian caidos, bajan por
Indios ni entenderlos. Pocas leguas mas abajo los rios abajo, hasta parar en las islas o en el Mar.
comienza hacia la banda del Sur y se va continuando Esto lo vimos en el tiempo que estubimos en los
por la una y otra banda de nuestro rio la provincia Omaguas, y vimos que salian los Indios al
que llaman de Joriman, que tiene de largo 60 leguas. encuentro, en conociendo que eran cedros, y
Llegamos à los primeros pueblos que serian de à echandoles uno lazo los arrimaban à tierra, y
20, y de à 24 casas cada uno, y sus habitadores passado el tiempo de las crecientes labraban de ellos
todos desnudos. Venian vernos cargados de armas, canoas con hachas de piedra, y otros instrumentos
que son unas flechas que tiran con sola una mano, hechos de conchas de tortugas y huesos de
y con un instrumento que llaman Palleta, de madera; animales.
214 As Missões dos Franciscanos e as Viagens de Frei Laureano de La Cruz (1647-1651)

Veinte y ocho leguas de el rio de la Madera Portuguesa. Al cabo de dos dias llegamos à un
está una provincia que llaman de los lugarcito de seis casas, situado en la boca de un
Tupinambaranes, à la banda del Sur, en un brazo mediano rio, que llamaban de los Condurises, y
de nuestro rio, que apartandose de su cuerpo este mismo nombre tenian sus habitadores.
principal se entra por la tierra firme adentro, y vuelve Supimos de ellos como la tropa de los Portugueses
à salir y juntarse otra vez con él à las 60 leguas mas se habia ya ido de alli à otra provincia 50 leguas
abajo, en cuya boca está el ultimo de los pueblos de mas abajo llamada de los Trapajosos [Tapajós]
los dichos Tupinambaranes. A este llegamos 6 dias pedimosles Indios para que nos llevasen allá, y
despues que pasamos el rio Negro, sin ver en todo mientras nos los buscaban, nos detuvimos alli casi
aquel camino gente ninguna. Y lo que siento de estos dos dias, dieronnos de comer de lo que tenian y
que parecen poblados es, que las naciones, que supimos que eran cristianos, como los que allá
habitan en tan dilatadas tierras (de que hay muchas dejamos. Antes que pasemos adelante, diremos que
noticias), estan apartadas de los rios, o por las rio es este, y lo que nos dijeron de él, y corre por
inundaiones, o por los mosquitos, como lo estan aquellas partes. En los Omaguas oimos decir, que
en el principio de nuestro gran rio. En este medio en nuestro grande rio abajo habia una provincia
camino se nos murió uno de los muchachos que de mujeres que vivian solas sin arones, y que solo
habiamos rescatado, bautizamosle, y pusimosle por tenian amistad con aquellos, que cada año por
nombre Ventura, y enterramosle en una isla de las cierto tiempo las iban ‘visitar, y que usaban de arco
muchas que hay por alli despobladas. Llegamos al y flecha y que eran muy valientes. Por medio de el
dicho pueblo de Tupinambaranes à los 10 dias de dicho soldado Portugues, supimos lo mismo, y
el més de noviembre del dicho año, despues de 26 tambien de otros, que nos lo dijeron; y que en este
dias que salimos de la isla de San Pedro de Alcántara rio que llaman los Cundurises muy arriba se decia
de los Omaguas, habiendo en ellos caminado mas estar las tales mujeres que se llamaban Amazonas.
de 600 leguas hallamos aqui un hombre blanco, y Todo esto, y algo mas que oimos, son tan solamente
bermejo en traje de Español. Holgamonos mucho noticias, mas nada de vista ni tal pudimos
de verlo, y mucho mas una Cruz que estaba junto à averiguar, ni de los Indios, ni de los Portugueses,
las casas. El hombre se espantó de vernos, de tal que de ordinario navegan por aquellos rios. De aqui
suerte, que aun no acertaba à hablar nos. se tomó ocasion para dar el tal nombre de las
Preguntamosle si era cristiano, y respondionos que Amazonas à nuestro gran Rio de San Francisco de
si, y que se llamaba Francisco. En la lengua el Quito, siendo asi que desde este rio pequeño de
conocimos que era Portugues, y ayudónos à salir las dichas Amazonas hasta el nacimiento de el
en tierra, y habiendonos saludado, nos dijo que grande nuestro hay cerca de 1... leguas, y desde
aquel pueblo era de Indios cristianos y que el habia este rio de las Amazonas à la mar, habrá poco mas
venido a buscar unos Indios huidos de otro pueblo, de 300. Y en comparacion de nuestro gran Rio de
que estaba de alli 56 leguas, à donde estaban una San Francisco, es que llaman de las Amazonas es
tropa de Portugueses que andaban rescatando muy pequeno rio.
Indios cautivos, y que ya estaba para volverse y nos Partimos de este dicho de los Condurises, ó
iriamos juntos. Adoramos la santa Cruz, y dando a rio de las Amazonas, con nuestro soldado Portugues,
Dios muchas gracias nos fuimos muy consolados à y con los Indios, que alli nos dieron, y al tercero dia
las casas. que navegamos por nuestro gran Rio de San
Salionos à recibir un Indio de buena presencia, Francisco abajo, llegamos al que llaman de los
con un baston en las manos, insignia que traen en Trapajosos [Tapajós], y entra en el nuestro por la
aquellas provincias los Indios principales, que en el banda de el Sur, y de la otra banda hallamos las
Perù se llaman Caziques; llamabase éste canoas y tropa de los Portugueses, y por cabo de
Jaguaramiri, que quiere decir Leon pequeño, y él, y ellos al Capitan Manuel de los Santos, uno de los
los que le acompañaban, hombres y mujeres, todos Oficiales de la armada Portuguesa, que fue à Quito
desnudos, y segun entendimos no tenian de con nuestro Hermano Fray Domingo, cuando
cristianos mas que el serlo y los nombres. Saludónos descubrió y navegó nuestro gran Rio. Admiraronse
por medio del soldado Portugues, y nosotros hicimos mucho de vernos, y recibieronnos con mucho amor,
lo mismo, y le dimos cuenta de nuestro viaje. Holgóse con mucha caridad nos regalaron, y acudieron à
mucho, e hizo que nos diesen mucho casabe, todas nuestras necesidades. Y por que no causase
pescado, tortugas, piñas, y vino de los que ellos nuestra venida en ellos alguna sospecha por ser
bebian. Dimosles algunas medallas y abalorios que Castellanos, mostramosles nuestras patentes, y
nos habian quedado, En este lugar que tendria 80 dimosles verdadera y bastante cuenta de nuestro
casas, estubimos cuatro dias. Todos nos fuimos con viaje y las causas de nuestra impensada venida,
nuestro Francisco Lopez Portugués, y mas tres con que al parecer quedaron satisfechos. Tratamos
Indios en nuestra canoa, en busca de la gente ultimamente de el orden que habiamos de tener
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 215

para pasar à la provincia de Caracas, que era la llaman asi à los que los Indios cautivan en sus
que pretendiamos. A lo cual nos respondieron, no guerrillas, que como son injustas, tambien lo son
ser posible hacer tal viaje, porque con el alzamiento los cativerios. Las razones con que los Portugueses
de Portugal, tambien se habia alzado el comercio y quieren paliar su iniquidad son decir que aquellos
comunicacion que antes tenian por aquellas partes Indios que ellos iban à rescatar los tienen ya sus
los Castellanos con ellos, que no habia otro remedio amos sentenciados a muerte para comerselos, y que
sino parar à la ciudad de el Marañón, à donde estaba les hacen buena obra en librarlos de la muerte, y
el Gobernador de aquel estado, que entonces era sacarlos à tierra de cristianos, à donde lo sean
Luis de Magallanes, para donde él ya estaba de aunque esclavos. No hay duda de que en los
partida, con una tropa, que nos llevaria de buena primeros de aquellas conquistas habria algo de esto,
gana en su compañia y en sus canoas, y que allá por lo cual se les dio permiso para que pudiesen
negociariamos de pasar à España, aunque no seria hacer los tales rescates, dando por cada pieza (que
esto muy facil por que habia en aquel estado mucha asi llaman à cualquiera persona) tres herramientas,
falta de sacerdotes, y de religiosos de nuestra Orden, una camisa y dos cuchillos, algo mas ò menos. Pero
y que nos habian de detener (como lo intentaron). el dia de hoy que vimos, y oimos a los mismos
Encomendamoslo à Nuestro Señor y puestos en sus Portugueses no hay tales Indios de cuerda, que asi
manos, y en las de los Portugueses, esperamos de se llamaban los que se habian de matar, y comer.
todo buenos sucesos. Preguntamos por nuestro Voy diciendo lo que vi, y lo que entendimos con toda
hermano Fray Pedro Pecador, y nos dijeron que no certeza. Los Indios con quienes se habian hechos
habia llegado à aquellas partes, ni tenian noticia de aquellas paces comenzaron à sentir mucho que los
el con que no podemos creer que se murió, o que lo pidiesen esclavos, y algunos de ellos huyeron,
mataron aquellos barbaros. Supimos mas de esta temiendo se hiciese con ellos lo que ya se habia
gente, que los Portugueses de quien allá en el fin de
hecho en otras partes con otros. No quedó alli mas
la provincia de los Omaguas tubimos nuevas, que
de un Indio principal, y algunos Indios, con él. Este
andaban en nuestro rio, era una armada, y por
trajo dos piezas, un mozuelo, y una muchacha, y
orden de el Duque de Verganza [Bragança], habia
por ellos le dieron sus herramientas. Y como no
ido al descubrimiento de unas minas de oro, muy
trajesen mas, se mostraron los Portugueses muy
ricas, de que le habian dado noticia, y que
enfadados, y dijeron que yo los oí Isino apremiamos
andubieron por aquellos rios mucho tiempo,
àestos, y usamos de rigor con ellos, no hemos de
buscandolas, y al cabo, sin hallar nada, y con mucha
hacer nada). Finalmente no se hizo más por
gente menos que se les murió, se volvieron à la
entonces, quizás por que estabamos alli los Frayles
ciudad de Marañon, de donde habian salido, y a
Franciscos. Fuimonos con esto, y antes que
donde despues vimos al que fuè por general preso,
llegasemos à los Trapajosos, se les huyeron las dos
y muy apretado por los gastos y desperdicios de la
piezas que habian rescatado.
dicha armada.
Llegamos al pueblo y hallamos à nuestros
Estubimos algunos dias en este paraje, en
compañeros, y la demas gente con otra tropa mas de
compañia de esta gente Portuguesa, y en un pueblo
Portugueses que andaba por alli ocupada en el mismo
de 10 casas, que en el habia de Indios amigos, pero
no cristianos, llamados T rapajosos, à donde ejercicio que los otros. Concertaronse las dos tropas
desnudaron à nuestr os Religiosos, y à sus para ir à cercar un pueblo, que decian los Indios
compañeros, la primera vez que por aqui pasaron. amigos, que era de esclavos suyos, que se les habian
En este tiempo se le ofició al Capitan Manuel de los rebelado, y que cogidos éstos que eran muchos,
Santos, cabo de la dicha tropa, ir dos dias de camino partirian, pues habria para todos. Hicieron asi,
de este sitio, à asentar unas paces entre los yendonos para ello à otro sitio mas abajo de
Trapajosos y otros Indios sus vecinos, que ya se los Trapajosos de donde se hizo la entrada, que
habian comenzado à hacer. Ofrecime à irle nosotros no pudimos estorbar, entraron y volvieron
acompañando, y el lo etimó mucho, y dejando ali à salir, sin presa ninguna, porque fueron sentidos, y
un Capitan y parte de su gente, con la mas lucida los Indios huyeron. De este modo nos dijeron que
fuimos a hacer este viaje. Yo llevé por mi compañero habian hecho estos y otros grandes presas é
al Hermano Fray Francisco Gonzalez y dejé alli al injustos cautiverios. Y lo que entendimos de esto
Padre Fray Juan Quincoces con los muchachos. es que los Indios amigos a quien los Portugueses
Llegamos à tomar puerto a una playa muy grande, pedian esclavos, vendo que sino los daban los
cerca del lugar donde los Indios estaban poblados, prendian, y con sus rigores les obligaban à dar sus
y alli salieron à recibir, y nos trajeron de comer, y mismos parientes (como algunas veces lo hicieron
se asentaron las paces, aunque mal, porque aquellos por redimir su vejacion) decian que tenian esclavos,
hombres no procuraban mas que sus mas que se les habian alzado y que si los
aprovechamientos temporales. Hechas las tales Portugueses les daban ayuda, irian à cogerlos para
paces, trataron luego de rescatar cautivos, que ellos darselos; y à la verdad no eran esclavos, sino otras
216 As Missões dos Franciscanos e as Viagens de Frei Laureano de La Cruz (1647-1651)

parcialidades con quienes ellos tenian sus guerrillas, todo. Hay en este dicho lugar un convento de
y con esta diabolica traza contentaban à los Nuestra Señora del Carmen, con dos Religiosos, y
Portugueses y se vengaban de sus enemigos. un clerigo, que hace oficio de Cura, y todos lo pasan
Tambien supimos que los Indios amigos y recien no con mucha abundancia por la falta de Indios.
convertidos ellos solos hacian sus armadas é iban Desde aqui se divide nuestro gran rio en muchos
à cativar la gente que podian de otras naciones para brazos, haciendo en los medios muchas islas, y
dar à los Portugueses o por la codicia de los rescates, vagicos de arenas, y asi camina hasta entrar en el
o por librarse de sus rigores. Asi no hay tropa alguna
mar Oceano que estaba de el Curupa cosa de 100
de las que salen à cautivar que no vuelvan cargadas
lguas. Dicen que tiene muchas leguas de anchura
de gente, los cuales venden por esclavos, y los
su boca, sus muchas bocas no las pongo aqui por
llaman Negros, teniendo en este buen trato los
no saber cuantas son. La entrada por ellas para
Gobernadores, y Capitanes mayores de aquellas
nuestro gran rio parece muy dificultosa para los
plazas la mayor parte. Los daños que de lo dicho se
sigue, ultra de el empeño de sus conciencias, y enemigos que lo quisiesen intentar por lo que hemos
ofensas de Dios, que es lo primero, son el mal referido. Salimos de esta plaza de Curupa para la
ejemplo que los Portugueses dan à los Indios ciudad de el gran Pará, que estará de ella 100 leguas
nuevamente convertidos, pues por contentarlos se caminando sempre por la banda de el Sur, dejando
matan y cautivan los unos à los otros; el odio grande à la de el Norte nuestro gran Rio de San Francisco
que aquella gentilidad há concebido contra el que lo perdemos de vista muchas leguas antes de el
hombre cristiano, por las injusticias que les han Pará; por algunos pueblos fuimos pasando por este
hecho; los muchos Indios que mueren de los que camino, y todos son pequeños. Tambien pasamos
injustamente sacan de sus naturales y hacen algunos rios, y el de mas cuenta es el de los
esclavos siendo libres. Tocantines.
A menoscabo de los Indios cristianos del Curupa,
Llegamos à la ciudad de el gran Pará y al
del Para y de el Marañon, que por ocuparlos en los
Convento de nuestro Padre San Francisco el dia
tales viajes de el trabajo de remar en las canoas, y
primero de febrero de 1651, en el cual hallamos a
de hambres, y muertos por los contrarios, se ban
Fray Agustin de las Llagas. Recibionos como buen
consumido y acabado. Con lo cual las aldeas de los
Indios cristianos están despobladas, y tambien las hermano con mucho amor, y caridad, y por estar
provincias de los Indios gentiles. Dios Nuestro Señor solo quisiera que nos quedasemos con él.
lo remedie y sea tan presto como yo lo deseo. Muy Acudieronnos muy bien en el tiempo que alli
grande escrupolo pidiera yo, si pasara éstas cosas estubimos, aunque no faltó quien nos tubiese por
en silencio, y mas habiendo firmes esperanzas que espias, por que solo el nombre de Castellanos les
de referirlas han de tener remedio, siendo Nuestro ocasiona sobresaltos. Tendrá esta ciudad entre
Señor servido, que aquella Corona de Portugal vecinos y soldados de presidio como 300 personas,
vuelva à su verdadero y legitimo dueño, que Dios un capitan mayor, y otros Oficiales de justicia y
guarde muchos años. milicia. Tiene tres conventos, uno de Nuestra Señora
Entre los desconsuelos que lo referido y otras del Carmen, y otro de la Merced, con pocos Frayles,
cosas nos causaban estando en compañia de aquella y todavia en los principios de su fundacion, el de
gente Portuguesa, fuè Nuestro Señor servido de Nuestro Padre San Francisco es el mayor y el mejor,
consolar à sus siervos con la buena cosecha que y de menos moradores. Hay iglesia matriz con un
les ofreció de niños enfermos en aquellos pueblos Canonigo que hace oficio de Cura y Vicario: la
por donde pasaron, y entre la gente que aquellas fortaleza no vi, dicen que es buena y de buena
tropas habian sacado, que bautizados murieron artilleria. Las cosechas de la tierra son de azucar, y
para vivir eternamente. De la provincia de los de tabaco que envian a Lisboa, para lo cual vienen
Trapajosos à la plaza de el Curupa habrá como 160 algunos navios à este puerto, y les traen vino, aceite,
leguas, estas andubimos en pocos dias, caminando harina, y ropa, y lo demas que necesitan, con que
siempre por la banda de el Sur, por la cual salen lo pasan bien en esta plaza. De esta ciudad de el
algunos rios que entran en el nuestro de San
Pará, pasamos a la de el Marañon, que está distancia
Francisco, y en particular uno que llaman
de 200 leguas caminando por la banda de el Sur,
Paranayva, que tendrá de ancho mas de una legua.
por la costa de el Mar hacia el Brasil en canoas
Pasamos por agunas aldeillas de pocos Indios de
paz, unos cristianos y otros infieles, y unos y otros grandes, y con mucho trabajo y riesgo. Llegamos à
sin sacerdotes ni quien se doliese de ellos. Llegamos la ciudad de San Luis y nos fuimos al Convento de
al Curupa vispera de Natividad de el Señor de el nuestro Padre San Francisco que alli tenemos, con
dicho año de 1650. Tendrá este lugar entre vecinos un solo Religioso, llamado el Padre Fray Francisco
y soldados 50 hombres, un fuerte con algunas piezas de el Presepio, recibiónos con mucho amor, y nos
de artilleria, y un Capitan mayor que lo gobierna regaló mucho el tiempo que alli estubimos.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 217

Visitamos al Gobernador Luis de Magallanes, librado de enemigos en las ocasiones que nos
dimosle cuenta de nuestro viaje, y de las causas de corrieron, llegados que fuimos y avisado el Duque de
nuestra venida à aquel estado, mostrandole nuestros Verganza [Bragança] (que los Portugueses llaman
papeles con que quedaban satisfechos. Pedimos Rey), ordenó que nos llevasen al Convento de nuestro
licencia para pasar à Lisboa, ya que no habia orden Padre San Francisco, donde de los Prelados de él, y
para Caracas, y tampoco hubo lugar, ni nos la dió, demas Religiosos nuestros hermanos fuimos bien
hasta pasado un año que nos hubieron entre ellos. recibidos y agasajados, (aunque por ser Castellano,
Tendrá esta ciudad de el Marañon la misma vesindad no sé lo que sentian cuando nos miraban). Los
y soldados que la de el Pará, poco mas. Tiene dos
primeros dias no nos permitieron que salisemos de
fuertes con buena artilleria, tiene dos Conventos, el
casa, mas enterados de la verdad de nuestro informe,
de nuestro Padre San Francisco, y otro de Nuestra
pudimos salir liberamente, y nos dieron pasaporte
Señora del Carmen. Tiene Iglesia matriz, con su Cura,
para Castilla por el Algarbe. Salimos de Lisboa bien
y Vicario, y la Hermandad de la Misericordia con un
avidos, y pasamos a Sevilla por Ayamonte y de alli a
Capellan. Los generos de la tierra son azucar,
esta Corte, y Convento de Nuestro Padre San
algodon, y algunas maderas preciosas, llevando à
Lisboa de donde se provee esta plaza como la de el Francisco, aunque por miedo y flaqueza con mucho
Pará. Pasado un año movió Dios Nuestro Señor al trabajo. Recibimos la bendicion de nuestros Prelados
Gobernador, para que nos diese licencia, contra la Superiores, que tanto deseabamos, dimos en breve
voluntad de muchos, que eran de contrario parecer, aunta de nuestro dilatado viaje, y de otros de que ya
y nos embarcó en un navio suyo nuevo, hecho en el tenian noticias, Mandaronme que escribiese todo, é
mismo Marañón que envió à Lisboa cargado de hiciese esta relacion, yo la he hecho de muy buena
azucar, muy bien acomodados y proveidos de gana, con estilo llano, sencillo, y verdadero;
bastimentos. Tardamos desde el puerto de Marañón alegraréme haber acertado, asi como lo he deseado,
hasta Lisboa 57 dias y llegamos con bien, domingo y que todo sea para gloria y honra de Dios Nuestro
de Ramos, 24 de marzo del 1652. Habiendonos Dios Señor. Amen.”

Referências
Cruz, L. de la, 1885. Nuevo descubrimiento del río de Marañón llamado de las Amazonas, hecho por la
religión de San Francisco, año de 1651, pp. 144-107, in Compte, N., Varones ilustres de la orden seráfica
en el Ecuador, Tomo I. Imprenta del Clero, Quito.
Cruz, L. de la, 1900. Nuevo descubrimiento del río de Marañón llamado de las Amazonas, hecho por la religión
de San Francisco, año de 1651. Biblioteca de la Irradiación, Madrid.
Da Civezza, M., 1879. Saggio di bibliografia geografica storica etnografica sanfrancescana. Ranieri Guasti,
Prato.
Porro, A., 1993. As crônicas do rio Amazonas. Tradução, introdução e notas etno-históricas sobre as antigas
populações indígenas da Amazônia. Vozes, Petrópolis.
Capítulo 15

A PREGAÇÃO AOS PEIXES,


DO PE. ANTÔNIO VIEIRA (1654)

O Pe. Antônio Vieira (1608-1697) não precisa de introdução. Conhecido como o melhor
escritor da língua portuguesa do Século XVII, era ainda algo mais: protetor dos índios do Brasil,
missionário nos sertões, orador sem igual em Portugal e Roma, confidente do Rei João IV, viajante
nos interiores amazônicos, diplomata em cortes européias e administrador dos Jesuitas. Personagem
importante para a história do Brasil (Moreira Neto, 1990), o Pe. Vieira viveu a realidade da Amazônia
e descreveu muitas paisagens da região. Em 1654, depois de uma missão ao rio Tocantins, quando
se decepcionou com a prática de escravizar os índios, regressou à cidade de São Luís do Maranhão,
onde em 13 de junho pregou contra os maus hábitos dos portugueses indolentes e mentirosos
daquela cidade e contra os maus tratos aos índios. O Sermão dos Peixes (Vieira, 1997: 134),
ostensivamente uma homenagem a Santo Antônio, é uma sátira violenta, da qual não ficaram fora
os peixes da Amazônia. Logo depois do sermão, Vieira achou por bem sair do Maranhão e viajou
para Portugal (Azevedo 1901). Neste trecho, preparado para publicação por Vieira em 1682, fala
do humilde tralhoto das praias paraenses.

“…Navegando daqui para o Pará – que é bem marítimas, que vivem naquelas praias; e como têm
não fiquem de fora os peixes da nossa costa – vi inimigos no mar e inimigos no ar, dobrou-lhes a
correr pela tona da água, de quando em quando, a natureza as sentinelas, e deu-lhes dois olhos, que
saltos, um cardume de peixinhos que não conhecia, direitamente olhassem para cima, para se vigiarem
e como me dissessem que os portugueses lhes das aves, e outros dois, que direitamente olhassem
chamavam quatro-olhos, quis averiguar para baixo, para se vigiarem dos peixes. Oh! que
ocularmente a razão deste nome, e achei que bem informara estes quatro olhos uma alma
verdadeiramente têm quatro olhos, em tudo cabais racional, e que bem empregada fora neles, melhor
e perfeitos. Dá graças a Deus, lhe disse, e louva a que em muitos homens! Esta é a pregação que me
liberalidade de sua divina Providência para contigo, fez aquele peixezinho, ensinando-me que, se tenho
pois às águias, que são as linces do ar, deu somente fé e uso de razão, só devo olhar direitamente para
dois olhos, e aos linces, que são as águias da terra, cima, e só direitamente para baixo: para cima
também, dois, e a ti peixinho, quatro. Mais me considerando que há céu, e para baixo, lembrando-
admirei ainda considerando nesta maravilha a me que há inferno. Não me alegou para isso passo
circunstância do lugar. Tantos instrumentos de vista da Escritura, mas então me ensinou o que quis dizer
a um bichinho do mar nas praias daquelas mesmas Davi em um, que eu não entendia: Voltai-me, Senhor,
terras vastíssimas, onde permite Deus que estejam os olhos, para que não vejam a vaidade (Sl 118,37).
vivendo em cegueira tantos milhares de gentes há Pois, Davi não podia voltar os seus olhos para onde
tantos séculos? Oh! quão altas e incompreensíveis quisesse? Do modo que ele queria, não. Ele queria
são as razões de Deus, e quão profundo o abismo voltados os seus olhos de modo que não vissem a
de seus juízos! vaidade, e isto não o podia fazer neste mundo para
Filosofando, pois, sobre a causa natural desta qualquer parte que voltasse os olhos, porque neste
providência, notei que aqueles quatro olhos estão mundo tudo é vaidade: Vaidade das vaidades, tudo
lançados um pouco fora do lugar ordinário, e cada é vaidade (Ecl 1,2). Logo, para não verem os olhos
par deles, unidos como os dois vidros de um relógio de Davi a vaidade, havia-lhos de voltar Deus de modo
de areia, em tal forma, que os da parte superior que só vissem e olhassem para o outro mundo, em
olham diretamente para cima, e os da parte inferior ambos seus hemisférios: ou para o de cima, olhando
diretamente para baixo. E a razão desta nova direitamente só para o céu, ou para o de baixo,
arquitectura é porque estes peixinhos, que sempre olhando direitamente só para o inferno. E esta é a
andam na super fície da água, não só são mercê que pedia a Deus aquele grande profeta, e
perseguidos dos outros peixes maiores do mar, esta a doutrina que me pregou aquele peixinho tão
senão também de grande quantidade de aves pequeno.”
220 A Pregação aos Peixes, de Pe. Antônio Vieira (1654)

Referências
Azevedo, João Lúcio. 1901. Os Jesuitas no Grão-Pará, suas missões e a colonização. Tavares Cardoso. Lisboa.
[Facsímile 1999. Belém, Governo de Estado do Pará, Secretaria de Cultura. Série Lendo o Pará]
Moreira Neto, Carlo de Araújo. 1992. Os principais grupos missionários que atuaram na Amazônia
entre 1607 e 1759. In: Hoorneart, Eduardo (coord.) História da igreja na Amazônia. Ed. Vozes, Petrópolis.
p.63-120.
Vieira, Antônio, Pe., S. J. 1997. Santo Antônio. Luz do Mundo. Nove Sermões. Ed. Vozes, Petrópolis.
Capítulo 16

A “DESCRIÇÃO DO ESTADO DO MARANHÃO,


PARÁ, CORUPÁ E RIO DAS AMAZONAS” DE
MAURICIO DE HERIARTE (1662)

M aurício de Heriarte foi um dos companheiros de Pedro Teixeira e assinou o auto de tomada
de posse das terras a que aquele capitão deu o nome de Província Franciscana (cf. o capítulo
número 14), em 16 de agosto de 1639. Era Ouvidor-Geral, Provedor-mor e Auditor do Maranhão,
onde morava. A Descrição do Estado do Maranhão, Pará, Corupá e Rio das Amazonas deve ter sido
escrita por mandado do Governador e Capitão-general Rui Vaz de Siqueira, que governou o Estado
de 26 de março de 1662 a 22 de junho de 1667, sucedendo a D. Pedro de Mello. O original foi
publicado por Varnhagen em 1874, conforme o manuscrito da Biblioteca Imperial de Viena, que
antes pertencera a Hohendorf, e republicado pelo mesmo autor em sua História Geral do Brasil
(1975).
Reproduzimos na seqüência o trabalho inteiro de Heriarte, tal como apareceu em Varnhagen
(1975), por ser pouco conhecido dos biólogos.

“DESCRIPÇÃO DO ESTADO DO MARANHÃO, PARÁ, CORUPÁ E RIO DAS AMAZONAS”

Cidade de S. Luis do Maranhão levantaram com os Olandezes; e mortos muitos,


1 obrigaram aos demais se fossem, deixando a terra
Contém a cidade de S. Luis do Maranhão
aos Portuguezes, que com tanto valor os tiveram
pouco mais de seis centos moradores. Sua fundação
he sobre o mar, em um modo de enseada, que faz cercados dentro do seu quartel.
3
seu sitio alegre pela vista do mar. Cingem-a dous Restaurada a terra, tornaram a for mar
rios salgados, um pela banda direita, outro pela republica de novo, e nella se tem conservado athé o
banda esquerda, chamados, o da direita Tarú, e o presente, e com o favor divino se conservarão por
outro Abacanga. Seu clima he saudavel; seu temple muitos annos, se Sua Magestade a amparar, e pozer
não muito calido: está em hum gráo e meio ao Sul nella os olhos, e a mandar cultivar para que dê
da linha equinocial. fructo, e não seja como ovelha que cada anno se
2
Este sitio elegeram os Francezes que o trasquia, e lhe não deixam criar lan nem musgo.
habitaram pela banda do seu porto, em que tinham 4
Sua distancia e circuito hé uma ilha aprazivel
feito ladroeira e recolhimento dos piratas, que de dezoito legoas em roda, de fermosas praias, e
infestavam a costa das Indias Occidentaes, e a do ainda que tem quantidade de baixos que de si lança
Brasil. E para evitar este dano El Rei Felippe 3° ao mar, tem canaes grandes e fundos, e bôas
ordenou ao Governador Gaspar de Sousa (que no entradas de barra a quem navega com cuidado.
anno de 1614 governava o Brasil) mandasse gente
5
a este Estado para que desalojassem os Francezes, Teve esta ilha em si dezoito aldeias grandes
que nelle habitavam; e o dito Governadoz mandou de Indios forros de differentes naçoens Tapinambás,
a Jeronimo de Albuquerque com tresentos Tapuias, Tabajáras, Iguaranas; os quaes com as
Portuguezes, e alguns Indios Pernambucanos enfermidades das bexigas, que he peste nestas
Tabajáras, para o effeito, e se aposentou em uma partes, se consumiram e ficaram tres, que agora
terra a que chamam Santa Maria. Do que tendo os assistem aos Portuguezes com o seu trabalho,
Francezes noticia, os sahiram a buscar com seis pagando lhes a duas varas de algodão por mez a
centos homens, e quatro mil Indios de guerra: mas cada um Indio, e a quatro e seis, conforme o trabalho
os Portuguezes com grandissimo valor os venceram, em que os occupam.
e vieram desalojar desta cidade, e se fizeram 6
senhores e povoadores della, e ordenaram republica, Tem esta ilha bom sitio e assento: he plaina
conservando-se nella com abundancia de bens de muitas arvores, mui bôas madeiras para fabrica
espirituais e temporaes, athé o anno de 1640 [aliás de navios, a que chamam Pequis; de cuja fructa os
1642], que os Olandezes a tomaram, e possuiram moradores tiram manteiga, e se servem della para
ao tempo de hum anno, em que os moradores, frigir e temperar o comer, e fazer pão: he de muito
vendo-se affligidos, e seus templos profanados, com bom gosto. Tem bacorîs, inaubas, maçarandubas,
ajuda de Deos e com páos tostados por armas, se e outras de differentes castas.
222 A “Descrição” de Maurício de Heriarte (1662)

7 20
Tem muitas fructas, ananás, pacovas, No rio Mearî há tres engenhos de assucar.
batatas, canas de assucar, quarazes, guriazes, Sam as terras muito boas para canaviaes de assucar,
tamataranas, laxaces, melões, balancias, uvas, figos, e mui abundantes de mantimentos: tem formosos
romans, limoens, laranjas, e outras muitas. pastos para gados, boas madeiras, e pela terra
8
Dá arroz, jerzelin, de que fazem bom azeite dentro alguns Indios.
para comer: o pão que se come he de mandioca, de 21
O rio Pinaré baixa de terras mais altas e
que fazem a farinha; tem milho grosso e muita caça montuosas. Está mui povoado de Indios Guajaváras,
em seus montes, como são porcos, veados, pacas, he mui abundante de pescaria, e caça e de
cutias, tatús, e de outras castas. Há muitos generos mantimentos. Tem grandes madeiras de todo
de aves, papagaios, araras, pav os, motuns, genero. Em todos estes rios se podem fabricar
guarazes, colhereiras. engenho de assucar: sam todos mui apraziveis.
9
Seus rios teem muito peixe saboroso. Desde a ilha à bocca destes rios pode haver vinte e
10 quatro legoas dc caminho por mar.
Os moradores criam muito gado vacum,
22
porcos, galinhas, patos, cabras, perús. Tem muito Mais abaixo, cousa de quinze legoas desta
boas agoas. ilha pela banda do sul, estão outros dois rios que
11 são Itapecorú e Moni.
Há nesta cidade de S. Luis quatro conventos,
23
Sto. Antonio, o Carmo, as Mercês, o Collegio, Casa O Itapecorú está povoado, e terá cem
da Misericordia, N. Senhora do Desterro, S. João e moradores e seis engenhos de assucar: he rio grande
a Matriz, que he Nossa Senhora da Victoria. de agoa doce, mui abundante de caça, pesca, e
12
Sustentam os moradores dezeseis Confrarias, fructas e mais mantimentos: tem muitissimas
todas com o adorno possivel à possibilidade da terra. madeiras e boas: grandes pastos e muito gado dos
moradores della.
13
Tem a cidade pela barra dois baluartes com 24
artilharia para defensa della, e havia outra fortaleza Tem uma forlaleza na bocca de sua entrada,
sobre a barra que era a principal, e adonde os com doze peças de artilheria, e hum capitão com
Governadores moravam. O Olandez a desmantelou; quarenta soldados, e tem arriba dos engenhos uma
e com o tempo se acabou de arruinar, e se não casa forte com quatro peças de artilheria e dez
tornou a reedificar pelos poucos efeitos que oje tem soldados Portuguezes, e dez Indios, a respeito dos
a fazenda de Sua Magestade Real neste Estado, e Indios de corso, que muitas vezes fazem dano aos
serem muitas as praças, que nella assistem; engenhos e moradores.
Governador, Sargento-mór, Ouvidor-geral, Provedor, 25
Os Indios que infestam este rio são
e tres companhias pagas de Infantaria. Cururisos, Oroatisos, Imajanazes, todos de corso
14
No meio da barra em cima de numa corôa de que não tem casas, aldeias, nem roças, nem estão
arêa, que ali faz, se podera fazer huma fortaleza em hum logar: e para se fabricarem os canaviaes,
que a feche de forma que não possa entrar navio sem sobressalto destes Indios, se fez esta casa forte,
sem o meterem a pique. para refrear suas insolencias, aindaque algumas
15
vezes vêem de paz, a resgatar ferramenta e fio de
Dentro da Ilha estão dois engenhos de
algodão para atarem as frechas, pelo que dão
assucar, e seis molinetes de agoa-ardente: tem
papagaios, araras, porcos, jabotins, e alguns
quatro salinas: fazem os moradores tabaco em
escravos.
cantidade, e bom: he abundante de tudo: tem anil,
26
mas os moradores nam o sabem aproveitar: tem O rio de Moni he mui alegre e de boas terras
campeche em abundancia, e tatajuba, que dá tinta para fabricar engenhos, e sam melhores que as do
amarella; e muita madeira a que chamam Bum- Itapecorú. Tem na bocca tres engenhos de assucar
Cutiara, e páo-santo, que serve para escritorios, e he mui abundante de caça, tem excellentes
catres e outras obras semilhantes. Tem muita madeiras para fabrica de navios, pasto para gados,
laranja e limão e outras fructas silvestres em e uma fructa, a que chamam andiroba, que se parece
cantidade, e muito orucú, algodão e pita. à cola de Angola, de que os moradores fazem azeite
16 para se alumiarem; e ha tanta abundancia que por
Corre pela banda do Norte a terra firme, em
ella se teve conhecimento deste rio, donde dizem
que está huma villa, por nome Santo Antonio de
que os Francezes tiravam algumas pedras de valor:
Alcantara, ponta de Tapuitapera, que terá athé cento
as terras dentro são altas.
e vinte moradores. Tem seis engenhos de fazer
27
assucar: he capitania distincta: está pouco mais de Mais abaixo, cousa de vinte legoas, está a
tres legoas, que tanto terá de largo a bahia della à barra do Pereá, capaz para entrarem navios por
cidade de S. Luis: tem muito boas madeiras. dentro com as marés de enchente, supposto que na
17
baixa mar dão em secco, mas nam tem perigo por
He terra mais alta que a ilha; e he mui
ser o fundo mole de vaza.
abundante de tudo.
28
18
Cousa de seis legoas. por esta barra do Pereá
Correndo pela parte do poente, pela bahia
dentro. entra um rio salgado, em que estão humas
acima, estam tres rios: Maracú, Pinaré, e Mearî.
grandes salinas feitas da natureza, que dellas e de
19
O Maracú desce de huns grandes lagos, outras com que provê Deos estas partes se provêem
adonde os moradores vem fazer pescaria de assim os brancos, como os Indios de todas as
peixe boi e xerobim. naçoens, domesticas e barbaras.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 223

29
Na bocca desta barra está uma fortaleza, com feio se mostra, mais formoso parece ao seu uso.
artilheria e gente, para sua defensa, e para socorro Furão os narizes e os beiços e nelles põem pedras
dos navios que ali chegarem. verdes, a que chamão metaras, que têm em grande
30
São todas estas terras fertilissimas e estima.
abundantes, capazes de se fazerem grandes 40
As suas armas são arcos de frechas, e uns
povoações: assim pela costa como pela terra dentro páos lavrados a seu modo que lhes serve de espada,
promettem haver nellas metaes de consideração. a que chamão Tamarana, ou páo de jucar, com que
31
As minas de prata que o Flamengo fabricava quebram as cabeças de seus inimigos.
no Searà são em umas terras que vem correndo 41
Seu governo he por principaes, que são como
sobre o rio Moni, aonde se fez experiencia com pouco pais de familia, que governam seus parentes.
cabedal, e se tiraram algumas mostras de ouro e 42
Aquelle que entre elles se mostra mais feroz
prata, ainda que pouca.
e falla mais alto he mais temido e obedecido de todos.
32
No Itapecorú e Taboca-Mery em a ilha de S. Têm mui pouca vergonha, e muita malícia e vaidade.
Luis, tambem se fez experiencia, e se tirou ouro, e O seu sustento he a caça e a pesca, que com as
por falta de materiaes e negligencia dos moradores, frechas matão e com algumas redes pequenas, que
o não há; pois se contentam de viverem pobres. usão. São inimigos do trabalho.
33
E toda a dita ilha he de ferro, e pelo não 43
Os Mujaraguanos têm roças de mandioca,
fabricarem o compram carissimo, pelo que se ha de que fazem farinha. Seus desenfados e festas são
conhecido que o não haver nestas partes grandes emborracharem-se, e nestas borracheiras sucedem
cousas, he pela floxidade dos seus habitadores, e muitos danos assim de odios, como de mortes: he
pelo pouco calor que lhes tem dado os que as tem gente sem honra, nem primor: por pouco que lhe
governado athé agora. dão, entregão suas molheres e filhas a quem lhas
34
Do Pereà athé as serras do Camuci, a que pede. São grandes contratadores.
chamam as serras de Iguapába, ha cem legoas de 44
Quando alguem de sua naçam morre o poem
caminho, pela costa do mar, de formosas prayas,
em uma rede, e lhe fazem fogo ao redor athé que
donde sae muito ambar; e nessas prayas andam
fique assado, e emtanto seus parentes fazem grande
muitos Barbaros de corso, como são Cururis, e
carpinha, mostrando as cousas do defunto, como
outros que baixam às comedias da pesca, e de uma
he remo, arco, frechas, e outras cousas: e com o
fructa a que chamam Cajús, que pelo mez de
licor que destilla o corpo morto se unta a molher; e
Outubro e Novembro se colhe, de que fazem
estando assado lhe come a carne, e os ossos
cantidade de vinho os Aruatis e outros. Em este
guardam; e em caindo à molher a pingo com que se
districto ha quinze legoas de areaes, a que
commummente os homens do mar chamam lençóes. untou pisam os ossos, e os botão em vinho que fazem
de mandioca, e o bebem; e desta maneira tiram o
35
Ha cinco rios, a saber, o das Preguiças, dó que tinham pelo defunto.
Paramery, Paraguatú, Iguarassú, e Mamona. 45
Ar mando cavalheir os de dif ferentes
36
O Camuci, Parameri, Paraguatú, he so um maneiras, uns por que seus principaes os abalizam,
rio, e desagua ao mar por tres boccas divididas com outros por terem morto muitos homens, e lhes
ilhas pelo meio, e porisso parecem tres rios; e pela quebrado as cabeças com as suas Tamaranas
terra dentro há so hum caudeloso e de boas, (costume muito usado entre elles) depois de haverem
abundantes, agradaveis terras, mui povoadas de feito esta ceremonia, jejuão duas luas, e ao cabo
Indios de diversas naçoens e nelle se podem fazer dellas se ajuntão todos os da sua naçam, e fazem
grandes fazendas e povoações, se nelle entrarem os grande cantidade de vinho e bebem todos: e ao que
Portuguezes. se hade armar de cavalheiro o põem em uma rede
37
Na serra de Iguapába estam cantidade de em parte alta, de modo que nam possa descer, o ali
Indios Tabajáras, e Putiguaras que se recolheram o teem tres dias sem comer nem beber, dando lhe
do Brasil, depois de terem feito grandes insolencias pouco vinho ao sahir; e por acordo no cabo dos tres
aos Portuguezes em companhia dos Flamengos dias o descem, e com um couro de onça, ou de tigre
Olandezes. Vivem com grande vigilancia: na sua (de que há muitos nestas partes) em volta lhe dam
aldeia estão dois Religiosos da Companhia de Jesus: muitas pancadas pella cabeça, pella cara e por todo
permitta Deos que façam muito fructo nelles, e os o corpo; e feito, um dos mais velhos lhe faz uma
tragam ao gremio da Santa fé Catholica. pratica mui graciosa, e logo lhe dam molher, e ao
38
Todos os Indios, assim estes como os de S. cabo baile, e fica feito cavalheiro, e por tal acatado
Luis, e todos quantos ha, sam falsos, cobardes, entre elles; pode ter muitas molheres, com
traidores, carniceiros, crueis, amigos de novidades: conhecimento de que a primeira he a principal
seu Deos he a gula e a luxuria. Sam homicidas, molher e as demais concubinas.
mentirosos, aleivosos, gente de pouco credito e de 46
Dam-se guerra uma naçam com outra por
nenhuma caridade, sem conhecimento da fé. pouco mais que nada; aindaque sejão vizinhas e
39
Suas galas são pinctarem-se de vermelho, muito aparentadas; e os vencidos que ficão nas mãos
amarello, branco e negro, e vestirem huns capellos dos vencedores, são escravos: e aos mortos comem
de pennas de passaros de differentes cores. Andam assados ou cozidos, como se forão porcos, e dos
sempre nús, as molheres são incastas: o que mais escravos se servem, ou vendem a outras
224 A “Descrição” de Maurício de Heriarte (1662)

55
naçoens e às vezes em suas borracheiras e festas A ferramenta de que se servem commu-
os matão e os comem: a estes chamão escravos de mmente, he de pedra, que cortar uma arvore grossa
corda: outras vezes os casam com suas parentes, e lhe custa muito trabalho e por esta causa buscão
os filhos que delles procedem, chamão Apucazes, os brancos, e contratão com elles por gosarem da
aos quaes matam em tenra edade, e os comem como sua ferramenta, que estimão em muito.
se forão leitões, dizendo que sam filhos de seus 56
Da ilha de S. Luis do Maranhão athé a
inimigos.
Capitania do gram Pará por terra em direitura
47
Prezam-se de muito fallar com o demonio, e poderão ser cincoenta legoas de caminho. As terras
têm por mui certo o que lhe diz: entresi têm muitos que nelle se incluem sam boas e fertiles, abundantes
feiticeiros a que chamão Paiés, que lhes servem de de caça, e têm grandes pastos para gado vacum, e
fizicos em suas enfermidades, e os curão dellas bellas agoas. Seu clima he fresco. Segundo as
bebendo tabaco, e chupando a enfermidade. Elles calidades das terras mostrão que daram trigo se o
fazem umas casas mui pequenas, a que chamão plantarem.
Tocaias [sic], donde se recolhem sós, fazem suas 57
Tem grandes madeiras, e umas fermosas
ceremonias, e dizem que fallam com o Jurupari, que
matas, e muitas campinas para gados: supposto que
he o Diabo, e que lhe diz que fação tal e tal cousa, o
estam despovoadas de Indios, sam muito boas para
que guardam inviolavelmente.
serem habitadas, por ser salutifero seu clima.
48
Têm suas aldeias, em que assistem, mas nam 58
Da ilha de S. Luis de Maranhão athé a
guardão ley, nem preceito algum, nem têm
Capitania do gram Pará por costa do mar deve ter
conhecimento de Deos: entendem que morrendo se
de caminho cento cincoenta legoas.
acaba tudo: nam há nelles caridade para com seus
59
proximos: estimão em pouco suas vidas, e assim Correm de Leste a Oeste, e dá gram volta.
por qualquer causa se matão, sendo homicidas de Neste caminho ha trinta e seis bahias, ou enseadas,
si proprios: crião seus filhos sem castigo nem que fazem ao mar outras tantas boccas de rios, que
doutrina; têm infinitas superstições, e agouros em dam fim a seu curso nelle.
os animaes: quando se casão comprão as molheres 60
No meio deste caminho está uma povoaçam
por pedras verdes, a quem chamão Baraquitãs (e de Portuguezes chamada Corupi; toma o nome do
as estimão em muito) ou por escravos, ou por caens rio em cuja margem está situada. Terá athé cento e
de caça que criam em casa: e se a molher se faz vinte moradores, e cantidade de Indios Tapuias, e
adulterio contra sua vontade, as podem vender por Putuangas livres: tem dois engenho de assucar, e
escravas. he capaz de muito mais: mui abundante de caça e
49
De tudo isto os Padres da Companhia têm pesca, e fructas de terra. O pam he de farinha de
evitado muito, e os têm doutrinados em forma que mandioca e milho.
já nam usam commummente destas cousas, e se a 61
Toda esta costa foy povoada de Indios
fazem, os Padres os castigão. naturaes, porque em todas as bocas dos rios avia
50
São ingratissimos: nam conhecem o bem que grandes povoações delles que com o tempo se
se lhe faz, e o mal o trazem sempre na memoria, despovoaram, e se metteram pela terra dentro. Só
athé se vingarem: sam em tudo variaveis. em Jaguapipora se conserva uma aldeia grande, de
51
Os Indios de corso nam têm aldeias nem que he principal o Copauba, que tem o cuidado de
casas em que habitem, andão pellos montes, e beneficiar umas grandes salinas, que estam no
sustentam-se de caça, fructas agrestes e pesca: nam Maracaná, ou Guatapú, que dam cantidade de sal,
estam quietos em um lugar: sam mui corpulentos e que faz por conta de S. Magestade.
62
forçosos. A carne humana que comem he de seus Pode-se povoar esta costa por ser abundante
parentes, que em estando doentes, de forma que de sustento, supposto que suas barras não são
nam possam andar, os matão e os sepultão em suas capazes de navios grandes, pelos muitos baixos
barrigas. que tem.
52
A communicaçam que estes têm com suas 63
Nesta costa sahe muito ambar: e pella costa
molheres he por de traz, supposto que pela via do Pereá até o Seará, e pellas praças da ilha de S.
natural. Trazem seus filhos às costas athé que Luis do Maranhão e por dentro destas terras
possão andar pellos matos: uns e outros sam muito promette haver oiro, e o ha, conforme se vio pela
pobres: para cobrirem as molheres as partes experiencia, que nellas mandou fazer o Governador
vergonhosas o fazem com ramos de arvores. André Vidal de Negreiros, que por ser terra de
53 senhorio nam continuou com ella.
Têm estes Indios noticia do diluvio geral
(supposto que por differentes modos) e da criação
do Mundo, ainda que com grandes superstições. Cidade de Bellem
Todos se servem por mar com canôas, assim para a 64
A cidade de Bellem, capitania do gram Pará,
pescaria, como para a guerra, e outras cousas.
está assentada sobre o famoso rio, que chamão Pará,
54
Nam conhecem que tem alma, nem que há vinte cinco legoas da barra, cercada com quatro rios,
na outra vida quem lhe tome contas do bem nem do que por uma parte e outra a cingem; que sam
mal. Em tudo sam animaes o glotões. Sam grandes Guamá, Guajará, Capim, Mojú, que todos junctos
nadadores, assim as femeas, como os machos. desaguão no gram Pará.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 225

65
Seu assento he hum gráo ao sul da linha Tapuia. Morrerão muitos Indios na guerra, e outros
equinocial. Seu clima algum tanto quente, nam se retirarão pela terra dentro, e os que hoje assistem
muito enfermo a quem tiver conta comsigo e com aos Portuguezes, sam quinze povos trabalhando em
sua saude. suas granjarias por preço de duas varas de pano de
66
He alegre e cheia de arvores fructiferas, como algodão por cada mez, que he o que corre em toda
sam laranjas, limões, limas, beribases. esta terra, alem dos muitos escravos que resgatão
67
nos sertões, com que fazem os roçados e tabacos.
Esta cidade tem athé quatro centos vizinhos
74
moradores, que os mais delles assistem em suas Todos estes Indios teem as pr oprias
granjarias e roças. Tem quatro Conventos de qualidades dos de S. Luis do Maranhão.
Religiosos, S. Antonio, Car mo, Mercês e a 75
Da banda do Norte desta cidade corre o rio
Companhia de Jesus, Matriz, Misericordia, N. assima a ilha dos Engaibas, Anaijazes, Majanazes,
Senhora do Rosario, S. João, que todas sustentam Joanes, Mapuazes, naçoens mui bellicosas, e cada
os moradores com suas esmolas. dia têm assaltos nos povos amigos, e lhe fazem
68
Tem esta cidade uma fortaleza sobre o porto, grandes danos, e roubão nos caminhos e supposto
bastante defendida com tres companhias de que os Portuguezes têm ido por muitas vezes a
Infanteria, tem Capitão-mor, Ouvidor. Provedor, castiga-los às suas terras, por serem grandes e cheias
Almoxarife, e Escrivão Real, que tudo se sustenta de muitos rios e alagadas, as nam teem castigadas
da fazenda de S. Magestade. Tem sete engenhos de em forma: e assim perseveram elles em suas
fazer assucar. maldades e desaforos, fazendo todo o dano que podem
69
Seus moradores fazem muito tabaco: he mui aos Portuguezes e aos Indios seus amigos.
76
abundante de mantimentos da terra e fructas. À Estes Indios Engaibas tratam com a naçam
barra deste rio commummente chamão gran Pará; do Norte, e tambem os Indios Aroans, que vivem em
he perigosa pelas muitas baixas que tem, que bojam umas ilhas pequenas, vizinhas aos Engaibas, que
da bahia do Maracaná vinte legoas ao mar, e da um e outro estam no meio do rio Pará e do grande
ponta do Jaguipuco (terra dos Ingaibas, rio das Amazonas, e os dividem de um e outro.
commummente chamada a ilha dos Joanes pelos 77
Esta ilha dos Joanes e Engaibas tem mais
Indios que tem do proprio nome, que nella habitam)
de cem legoas em contorno; he de muito fresca e
mas tem canal bastante para navios de muito porte,
abundante de caça, de pesca, e de muitas fructas
que trazem practicos do Maranhão e esperão o Piloto
entre as quaes tem uma, que chamão acassa [sic],
da barra para entrar pelo rio athé chegarem à cidade,
que lhes serve de pam, e he bom sustento.
que está arriba vinte e cinco legoas pelo rio assima.
78
70 Não lhe falta milho e mandioca, algodam,
Há nesta cidade muito algodam e muito
cravo, que por ser silvestre nam he como o da India, pita, orocú, muito cacáo e grandes madeiras. He
por ser beneficiado, e se o for será o proprio; e S. capaz para se fazerem nella grandes engenhos de
Magestade terá nelle grande proveito. Os Moradores assucar, e tem bons pastos para gados e portos para
beneficião a casca das arvores a modo de canella navios.
79
que he mui boa, e mandão muita quantidade para Da cidade de Bellem, indo pello rio assima
o reino, adonde he estimada. caminho de oeste obra de trinta légoas, está a
71
Há muitas madeiras e boas de todas as Capitania de Camutá, terra de Senhorio, situada
castas, grandes pimenteiras de orucús que he a na bocca do rio dos Tocantins, e por outro nome rio
especie que se usa nos Indios a que chamão achiote. das Pedras. He habitada esta capitania de poucos
Ha muito cacáo, mas os moradores nam usão delle moradores brancos, nam por falta de serem as terras
pello nam saberem beneficiar, que he o melhor boas, mas por haverem poucos Portuguezes para
contrato que ha nas Indias de Castellla. Ha hervas se estenderem tanto.
mui salutiferas, que levão os mercadores por 80
Fazem nesta Capitania os melhores Tabacos
contrato, como he Jalapa e Almisque, e outras destas partes. Tem so hum engenho de assucar, e
similhantes. hum Convento de Padres da Companhia, que
72
São as terras do Pará firmes, e melhores que doutrinão os Indios daquellas aldeias, que sam
as de San Luis, mui fertiles em dar fructo, e todo o infinitas pelo rio dos Tocantins assima.
anno criam; porque todo o anno chove, supposto 81
Este rio dos Tocantins ou das Pedras he mui
que no veram nam he tanta a agoa. grande e aprazivel, mui povoado de Indios que os
73
São capazes de grandes povoações por serem mais, nam estam conquistados. Tem diferentes
terras larguissimas, e de muitos Indios, que quando naçoens, como sam Tocantins, Tacuanunas,
foi povoada de Portuguezes avia mais de 600 Tacunapes, Carajazes, Tapinambás, Paipais,
povoações de Indios Tapinambás e Tapuias, que Mariases, Catingas, Jacús e outros muitos. Tem
vendo que eram poucos os Portuguezes, se este rio mui grande corrente, e sam mui claras as
levantaram contra elles, e matarão duzentos e vinte agoas, tem algumas e cachoeiras perigosas. He
e dois, sendo seu Capitão-môr Francisco Caldeira abundante de grandes matas, e grossas madeiras:
de Castello Branco; mas os que ficarão com As terras sam altas e apraziveis. Dizem
muito valor, em que com muito trabalho, derão commummente que este rio, e o rio de Janeiro
grandes guerras aos Indios, e destruírão a nação ambos saem do lago Dourado. Tem muitos rios,
Tapinambá, que dominava sobre a outra naçam que nelle entrão e o fazem grande.
226 A “Descrição” de Maurício de Heriarte (1662)

82
He abundante de caça e peixe, com que os e Engaibas, Caguaras, Guanapús, nas quaes se
moradores se sustentão. Há nelle muitissimas podem fazer grandissimas fazendas, como sam
Tortugas de que os moradores se proveem, e as engenhos e plantas de cacáo, por serem algum tanto
guardão em curraes feitos na agoa para passarem o húmidas em partes, e terem muitas e boas madeiras
Inverno, em que vem mui caudeloso o dito rio: dellas para todas as obras.
fazem muita manteiga com que fazem pam, pasteis,
empadas e outras cousas similhantes.
Corupá
83
Há neste rio mui grandissimos pinhascos, e 91
A Capitania do Corupá está situada sobre o
nelle se ouvem grandissimos estrondos. Contam grande rio das Amazonas, a que os antigos dam o
seus moradores, que nelle há ouro e esmeraldas, e nome de Dourado. Está num terço de grau ao sul
que se não tem buscado por negligencia dos da linha equinocial. Seu clima he quente, mas não
moradores e dos que os governavão. Suas terras muito enfermo. Tem fortaleza com capitam e
são fertilissimas e seu clima saudavel e frio. soldados pagos da fazenda real, e tem alguns
84
Tem muitas aves de diferentes especies moradores.
agradaveis à vista, e suaves na melodia de seu canto, 92
Esta fortaleza serve de sentinela para que os
e boas para o sustento. Ha cantidade de Capiváras, estrangeiros não tenhão commercio com as naçoens
que he uma caça como porcos, que se criam na agoa, de Indios moradores deste rio, que sam infinitos, e
muitas Antas e todo o genero de caça e muitas cada dia vem náos do norte ao contrato, assim de
fructas agrestes, e das que se plantão para o madeiras, como de um pescado a que chamamos
sustento humano. Pode-se criar muito gado, e fazer peixe-boi, que levão a vender à ilha de Sam
grandes povoações, por serem suas terras Cristovam, outros veem fazer tabaco ao Tacuiú,
grandissimas. donde os Portuguezes, por muitas vezes, os
85
Os Indios morador es deste rio teem desalojarão e matarão.
grandissimas superstições, como os Engaibas, 93
Este rio he, a meu parecer, o maior do mundo:
aindaque nenhum delles adora cousa alguma: Sam entra no mar Oceano por uma bocca que tem cento
barbaros, grandes comedores de carne humana, e oitenta legoas como ha do Sapararà athé ao cabo
traidores em estremo. do Norte, e bota ao mar trinta legoas agoa doce. Tem
86
Os mais delles se prezão de feiticeiros, e que na bocca muitas ilhas, e as mais dellas povoadas;
falão com o Diabo. Dam a entender aos demais, que como são dos Engaibas, e dos mais de que está feita
o Diabo gosta de algumas cousas, as quaes todos menção, Arouans, Tacujús, Maraunas, Mariases, e
executão e guardão inviolavelmente, mais por temor outras muitas Naçoens que senhoreão este rio em
que outra cousa. À meia noute se levantão e mettem canôas, e tem grandes commercios uns com os
nos matos, dizem, que a falar com os Diabos, para outros, e todos com os estrangeiros, a quem sam
que se lhes ensine as cousas que lhes sam mui inclinados, e os mais dos annos veem a fazer
necessarias saber, assi as futuras, como os sucessos fortalezas na bocca deste rio pello muito interesse,
acontecidos, ou a compor musica ao seu uso para que delle tirão, assim do tabaco como de pescaria,
as suas festas e borracheiras que elles estimão orucú, madeiras, redes e escravos com que provêem
muito, e se esmerão nellas. alguns engenhos, que tem em Sam Cristovam e nas
87
Governão se por familias: tem suas aldeias, Barbadas, Martinica e Curaçáu, ilhas situadas na
casas e roças: dam guerra huns a outros, e se matão costa das Indias de Castella.
94
e cautivão por pouco mais de nada. Esta Capitania do Corupá tem cantidade de
88 povos; e aldeias de Indios de paz, que os Reverendos
Este rio cria em si grandissimas cobras,
Padres da Companhia doutrinão.
de agoa, que mais parecem serpentes, que
95
cobras. Sam suas terras mui abundantes de
mantimentos da terra, há pouco gado domestico,
pelos moradores o não criarem, que as terras sam
Da Capitania do Camutá athé a do Corupá capazes para isso.
89
Da Capitania do Camutá athé a capitania do 96
Pela banda direita deste rio, a que chamamos
Corupá haverá oitenta legoas, e na metade do a banda do Norte, corre a Capitania de Bento Maciel,
caminho está o rio do Pacaijá. Este rio he caudeloso, que por falta de gente nam está povoada: não tem
e tem tres braços grandes, todos povoados de Indios mais que uma feitura, em que contrata com os Indios
de lingua geral: he algum tanto doentio: suas terras moradores. Sam terras altas: tem muita cantidade
sam mui altas, e grandes terras montuosas. Aqui de serras escalvadas pella terra dentro. Dizem que
morreo o Padre Souto Maior da Companhia, indo a ha minas de metaes, mas nam se tem feito
cathequisar os Indios moradores deste rio. experiencia, nem se ham buscado athé agora.
90
Nelle se fez experiencia, e se achou algum 97
Nella se poz Bento Maciel, no tempo que
ouro, mas nam se continuou, por morrer o mineiro. governava, a fortaleza, que agora está no Corupá, e
Todas estas oitenta legoas, que ha da Capitania do a tiraram por ser a terra mui esteril e enferma, e se
Camutá athé a do Corupá, sam terras mui nam poder conservar, pelo que se tornou a passar
abundantes de sustento, e tudo se navega por rios para o Corupá; onde agora está, e dantes tinha
grandes, e bahias de agoa doce, adonde ha mui estado, e donde a tinha posta o Governador
grandes ilhas, e algumas aldeias de Tapuias, Bocas Francisco Coelho de Carvalho.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 227

108
Rio das Amazonas Pela terra dentro há quantidade de serras,
98 que nam sam muito altas.
Tem este grande rio das Amazonas tres
109
barras. A do Comaú he a melhor, e por onde se vai Este rio fica na propria costa em que está a
à fortaleza do Corupá, que estava quarenta legoas fortaleza do Corupá. A agoa delle he muito clara,
pelo rio assima, e por donde entram as náos mas pesada, que supposto, pella grandeza e veloz
estrangeiras muitas vezes. As outras sam: a de corrente que traz o rio das Amazonas, sam suas
Arranharam e a de Aguagaris; as quaes sam mui agoas mui barrentas, he muito boa agoa, e se tem
perigosas por causa das Pororocas, que colhendo pella melhor agoa que ha nestas partes, por vir de
uma nau, por grande que seja, a fazem em pedaços longe, e passar por salsaparrilha, de que este rio
e mettem a pique, e nellas se tem perdidos muitos tem grande quantidade.
estrangeiros.
99
A Pororoca sam umas tres marés tam Provincia de Corupatuba
110
grandissimas que por causa de muitos baixos que Deste rio de Paranaiba (que na lingoa dos
tem este rio na bocca se formão com a reponta da Indios quer dizcr mar ruim) à província de
enchente [da maré] com tam grande força e estrondo Corupatuba haverá cincoenta legoas.
que parece que se quiz subverter a terra; e tudo 111
Esta provincia tem um rio de menos
que acha e encontra, faz em pedaços; e em passando grandeza, que toma o nome della. He povoada de
ficão os baixos chãos de agoa com tanta corrente Indios barbaros.
que nem ha ancoras que possão suportar a força 112
Pelo rio há poucas aldeias, por quanto se
della. tem mettido pela terra dentro despois que Bento
100
São estas terras mui povoadas de Indios, e Maciel lhe mandou dar guerra por Pedro Teixeira,
mui abundantes de todos os mantimentos da terra. soldado antigo e conquistador: nestas aldeias
101 acodem os Padres da Companhia com o pasto da
He muito melhor clima que o da Capitania
doutrina christan.
de Bento Maciel.
113
102
As terras sam asperas de grandes serras,
Estam estas duas barras a pouco mais de
em que há poucas madeiras. He abundante de peixe,
cincoenta legoas da Capitania do Corupá, e todos
que lhe entra do rio das Amazonas. Tem alguma
os gentios que nestas barras assistem sam de guerra
caça, e nam tem muitos mantimentos, por serem
e nam querem commerciar com os Portuguezes, em partes as terras agrestes, onde estam estas
salvo por força, quando vão tropas a resgatar poucas aldeias, que he na bocca do rio. E vinte ou
escravos que entre si têm adquiridos pelas muitas trinta legoas pella terra dentro he fertilissima, e sam
guerras, que entre si tem umas naçoens com outras. mui povoadas de Indios Corupatubas, Carabocas,
103
Estes sam os mais bellicosos Indios, que ha Bubuizes, Mariáus e Serranos.
neste districto, e grandes traidores, homicidas, nam
tem adoração nenhuma: tem infinitas superstições. Provincia das Tapajós
Seu governo he por Principaes que sam como 114
Deste rio à provincia dos Tapajós haverá de
Regulos, ainda que pouco obedecidos de seus
caminho pouco mais de quarenta legoas pelo rio
subditos. Sam mal inclinados, nam conhecem o bem
das Amazonas assima.
que lhe fazem, e o mal nunca lhes esquece para
115
tirar vingança delle, porque sam em extremo Nam estam estas terras povoadas de Indios
vingativos. pella margem do rio, porquanto se retiraram do
commercio dos Portuguezes: por lhes evitarem suas
grandes maldades se metteram pella terra dentro.
Rio Paranaíba 116
Esta provincia dos Tapajós he muito grande,
104
Doze legoas do Corupá para o poente está o e a primeira aldeia está assentada na bocca de um
rio Paranaiba, caudeloso, e algum tanto enfermo, rio caudeloso e grande, que commummente se
por ser um clima muito quente. chama dos Tapajós.
105
Está mui povoado de Indios Guaiapes, 117
He a maior aldeia e povoaçam que por este
Caraus, Jurunás, Cuanis, e outras muitas naçoens. districto conhecemos athé agora. Bota de si 60 mil
106 arcos, quando manda dar guerra, e por ser muita a
Sam suas terras plainas, aindaque
cantidade de Indios Tapajós, sam temidos dos mais
montuosas de arvores. Tem infinitas madeiras de
Indios e naçoens e assim se teem feito soberanos
Cutaras Pinimas, que sam de muitos lavores,
daquelle districto. Sam corpulentos e mui grandes
Cedros, Louros, Piquis, Piquiranas, e muitas
e fortes. Suas armas sam arcos e frechas, como as
castanhas que se criam nos montes: são melhores
dos mais Indios destas partes, mas as frechas sam
que as nozes e amendoas. ervadas e venenosas, de modo que athé agora se
107
He mui abundante de mantimentos, caça e lhe não tem achado contra, e he a causa por onde
pesca, que he o natural sustento dos Indios e muitas os outros Indios os temem; porquanto em ferindo
e grandes tortugas. com as frechas nam ha remedio de vida.
228 A “Descrição” de Maurício de Heriarte (1662)

118
Este rio onde estam situados estes Indios fructas e alguma mandioca. Governão-se estes
Tapajós he mui caudeloso, e de apraziveis terras, e Indios por Principaes, em cada rancho um, com vinte
clarissimas agoas. Nam he de muito peixe: desce ou trinta casaes, e a todos os governa um Principal
do poente, e desagoa e mette no das Amazonas. Está grande sobre todos, de quem é mui obedecido.
mui povoado de Indios T apajós, Marautús, 125
Dão guerra estes a todos os demais daquelle
Caguanas, Orurucuzos, e outras muitas naçoens
circuito, de quem sam temidos. Tem muitos
de que athé agora nam temos communicaçam.
escravos: outros que vendem aos Portugumes por
119
Sam em estremo barbaros e mal inclinados. ferramentas para fazerem suas lavouras, e roças à
Teem idolos pintados em que adorão, e a quem pagão terra. Este rio era digno de se descobrir, porquanto
disimo das sementeiras, que sam de grandes mostra ser de muito proveito para estas conquistas.
milharadas, e he o seu sustento, que nam usão tanto
de mandioca para farinha, como as demais naçoens.
Do rio das Trombetas
120
Estando maduras as sementeiras, dá cada 126
um a decima, e tudo junto o mettem na casa em Da banda do norte, que he da outra banda
que teem os idolos, dizendo que aquilo he Potaba do rio das Amazonas, está o rio das Trombetas, mui
de Aura, que, na sua lingoa, he o nome do diabo: e povoado de Indios de diferentes naçoens; como sam
deste milho fazem todas as semanas cantidade de Conduris, Bobuis, Aroases, Tabaos, Curiatos, e
vinho. e à 5ª feria de noute o levam em grandes outros muitos; e todos com os proprios idolos,
vazilhas a uma eira, que detraz da sua aldeia tem ceremonias, e governo que tem os Tapajós.
muito limpa e aceada, na qual se ajuntão todos 127
Todos elles sam de pouca vergonha. Vivem
daquella nação, e com trombetas, e atabales tristes nús, assim os homens como as molheres, sem
e funestos, começão a tocar por espaço de uma hora, cobrirem as partes vergonhosas.
athé que vem um grandissimo terremoto, que parece 128
As terras deste rio das Trombetas (que os
vem derrubando as arvores e os montes, e com elle
vem o Diabo e se mette em um corro, que os Indios Portuguezes lhe deram este nome pelas muitas
tem feito para elle, e logo todos com a vinda do Diabo trombetas de que seus moradores usão com que
começã a bailar e cantar na sua lingoa, e a beber o fazem suas festas e borracheiras, a que sam mui
vinho athé que se acabe, e com isto os traz o inclinados) sam mais fartas de mandioca que as dos
Demonio enganados. Tapajós, e he de muita caça.
129
121
Quando morre algum destes Indios, o deitão Aproveitão-se todos do grande rio das
em uma rede, e lhe põem aos pés todos os bens que Amazonas; tem muita pescaria, pella muita
possuia na vida, e na cabeça a figura do Diabo feita abundancia que tem do peixe de todo o genero, e
a seu modo, lavrada de agulha como meia, e assim muito peixe boi, e tortugas.
os põem em umas casas que tem feitas só para elles, 130
As armas de que usão sam arcos e frechas.
aonde estam a mirrar e a consumir a carne: e os 131
No distrito deste rio ha cantidade de lagos
ossos moidos os botão em vinho, e seus parentes e
grandissimos, onde se cria grande cantidade de
mais povos o bebem.
arroz sem se semear; he bom, mas algum tanto
122
De tudo isto tem tirado em partes os R. dos vermelho por dentro, de que os Indios se aproveitão.
Padres da Companhia de Jesus, que os vam a Fazem delle vinho e contratão com outras naçoens.
doutrinar, de quando em tempo. 132
Têem estes Indios e os Tapajós finissimo
123
Athé esta província chegão náos de alto barro, de que fazem muito e boa louça de toda sorte,
bordo, e por este rio dos Tapajós vam quatro que entre os Portuguezes he de estima, e a levão a
jornadas a resgatar madeiras, redes, orucús, e outras provincias por contrato.
pedras verdes, que os Indios chamão buraquitas
[Baraquitâ], e os estrangeiros do norte estimam
muito; e commummente se diz que estas pedras se Provincia dos Tapinambaranas
lavrão, neste rio dos Tapajós, de um barro verde, 133
Da provincia dos Tapajós, pello rio das
que se cria debaixo da agoa, e debaixo della fazem Amazonas assima, está o rio dos Tapinambaranas:
contas redondas e compridas, vazos para beber, haverá cincoenta legoas de caminho.
assentos, passaros, rãs e outras figuras; e tirando- 134
o feito debaixo da agoa, ao ar, se endurece o tal Nam há mais de quatro povoações pella beira
barro de tal maneira que fica convertido em mui do rio Orurucuses, e Condurises: supposto que pella
durissima pedra verde: e he o melhor contracto terra dentro há cantidade de naçoens de Barbaros
destes Indios, e delles mui estimado. que communicam com estas aldeias, que estam
124
beira mar para alcançarem da nossa ferramenta.
O clima desta provincia he quente, de mui
135
boas e alegres terras, capazes para criar muitos A provincia dos Tapinambaranas está
gados, vacum, ovelhas, cabras e gado de corda. Tem situada em terra plaina que cae sobre o rio das
muitas serras, e pela falda dellas e por algumas ilhas Amazonas. Seu clima he quente e doentio, por estar
que tem este rio e o das Amazonas, se póde fazer debaixo da linha equinocial. Estes Indios fallam
grandes engenhos de assucar: por quanto as lingoa geral; que os mais do rio fallam differentes
crescentes do rio fructificam todas aquellas terras, lingoas, que por interpretes communicam com os
em que os Indios fazem suas roças de milho, e Portuguezes.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 229

136
He esta província ponto aonde as tropas 147
O sustento destes Indios he milho, arroz, e
que vam para o sertam se refazem do necessario alguma mandioca. Tem muitas fructas de varias
para chegarem a elle, e os que veem para chegarem castas, e pela terra dentro boas fontes e clarissimos
elles athé Corupá e Pará. Sam cantidades de aldeias arroios.
e povoaçoens; e os de sua naçam predominão e 148
teem sujeitas as outras naçoens, como sam Aratús, Esta gente não tem govemo em si: quem mais
Apacuitáras, Yaras, Goduis e Cariatos. Servem-se póde e mais valente se mostra, mais manda, por
delles como de seus vassallos, e elles lhe pagão ser mais temido. He gente pusilanime, e de pouco
tributo. espirito. São idolatras: tem casa de idolos, com as
137
pr oprias ceremonias dos T apajós:
Ha nesta provincia cantidade de salsafraz,
tem feiticeiros, que lhes annuncião seus agouros, e
e alguma salsaparrilha. He provincia mui abundante
superstições. Vivem nús. Suas armas sam arcos e
de mantimentos, e de boas e ferti-lissimas terras.
frechas ervadas, e algumas azagaias com que fazem
138
O principio destes Indios Tapinambaranas tiros.
nam foi de naturaes desse rio. Dizem que, no anno 149
de 1600, sairam seus antepassados do Brasil em O rio da Madeira he muito caudeloso, e de
tres tropas, em busca do Paraiso terreal (cousa de agoa muito clara. Vem este rio da província dos
barbaros) rompendo e conquistando terras, e que Serranos, que estam na cordilheira do Perú pella
havendo caminhado muito tempo chegárão àquelle banda do Paraguay. Nasce de muita cantidade de
sitio, que achárãa abundante, e cheio de Indios lagos, e veem desembocar no grande rio das
naturaes: e por ser bom o sitiárão e conquistárão Amazonas. He mui povoado de Indios barbaros de
os seus naturaes, avassallando-os, e com o tempo diferentes naçoens. Neste rio há hum barro mui
se casarão uns com os outros, e se aparentarão; cheiroso, de que fazem os moradores Igaçavas, que
mas nam deixão de conhecer os naturaes a sam como talhas grandes e pequenas, que a vender
superioridade que os Tapinamharanas teem nelles. levão a outras partes a troco de algodam e fio para
139
Sam os mais bellicosos Indios destas partes, atarem as frechas, e por milho e tabaco, e outras
mui senhores e liberaes, bem dispostos, mas muito cousas que lhes sam necessarias, supposto que nas
traidores, carniceiros, e era a gente que mais carne suas terras nam faltão. Tem muita pedra de bazar
humana comia nesse rio, do que a communicaçam de cameliões, que he melhor e maior que a que vem
dos Portuguezes os tem tirado em muita parte. da India oriental.
140
Seu governo he barbaro; nam têm adoraçam
alguma. Seu apetite he o seu Deos. Tem a sette e a Rio Negro
oito molheres. Aos que estam debaixo de seu 150
dominio, lhe dam as filhas por molheres. Sam Da bocca do rio da Madeira athé a bocca do
temidos de muitas naçoens por serem muito rio Negro trinta e cinco legoas de caminho pelo rio
vingativos. das Amazonas assima, e pela banda do sul do rio
sam as mais das terras alagadas e despovoadas, e
pela banda do Norte sam as terras altas e
Rio da Madeira montuosas, povoadas por dentro de Tanúas,
141
Desta provincia à bocca do rio da Madeira, Jaruaguis.
havera sessenta legoas de caminho pello rio das 151
O rio Negro he um caudeloso rio, e quasi
Amazonas assima. tam grande como o das Amazonas. Chamão-lhe
142
Sam estas terras mui alegres e de muita negro, supposto que suas agoas som clarissimas e
caça. Nam estam povoadas pella banda do sul do na bocca, onde se encontram com as agoas do rio
rio, e pella banda do norte ha muitas povoaçoens das Amazonas, que sam mui turbias, se misturão
pella terra dentro, de Araquizes, naçam mui grande, umas com as outras, e se fazem de côr de tinta à
que tem infinitas aldeias, e outras que se chamão vista; pelo que se lhe poz o nome.
Numas, naçam separada dos Araquizes. 152
He este rio mui fundo, e tem fermosissimas
143
As terras sam mui fertiles de mantimento e praias de areas, o que nam tem o das Amazonas,
de fructas. Tem em si grandes lagos, donde se colhe que todas sam de lodo e barro que a propria agoa
muito arroz. Seu clima he mais frio que quente, he tem deixado, e deixa, aindaque em partes dura.
153
saudavel. Este rio desce da banda do norte do rio das
144
O contrato destes Indios he de louça, remos Amazonas, e tem algumas ilhas pequenas de pouco
porto. Desce do novo reino de Granada, e entra no
e escravos, que trazem dos lagos de Araguaris, e do
mar Oceano por entre a Trindade e o Cabo do Norte.
rio do Orinoco, e do rio das Madeiras, que está da
Bota um braço grande ao rio das Amazonas, que he
banda do sul do rio das Amazonas.
por onde se entra nelle. Entra a maré com
145
Nestas terras e em todo o rio há muitas grandissima corrente neste rio, athé que
Antas, que sam como mullas, e de todo o genero encontrando a deste rio, pára nelle, e nam sóbe mais
de caça. assima.
146
Sam terras que mostrão poderem produzir 154
He este rio povoado de inumeravel gentio.
trigo e vinho, se o cultivarem nellas, tanto pella Tem um Principal na bocca, que fica nas duas
bondade das terras, como por haver poucas Amazonas, que he como o Rei, por nome Tabopari.
formigas destas que chamão ladras, que comem as Tem debaixo de seu dominio muitas aldeias de
sementeiras. diversas naçoens, e dellas he obedecido com grande
230 A “Descrição” de Maurício de Heriarte (1662)

respeito. Tem este rio formosas e agradaveis terras quentes; humas abundantes de mantimentos, outras
mais altas que as do rio das Amazonas, e tem muitas esteriles e pouco fructiferas. Tem em si muita
e boas madeiras para fabricar navios, e comodidade cantidade de lagos e rios caudelosos, que todos
para os fazer, que he muito fundo, e estar perto do desagoão no rio das Amazonas, e outras no rio Negro.
mar, e ser capaz para por elle entrarem náos de porte. 165
Este rio nam tem mosquito, como os mais
155
Tem grandes pastos. As terras sam mui das Amazonas, nem outro genero de praga ruim. As
abundantes de mantimentos de mandioca, milho, aldeias e povos dos naturaes deste rio sam grandes,
arroz, cantidade de diferentes fructas, muita caça e as casas redondas fortificadas com estacadas como
de diversos generos, de que se sustentão as naturaes, casas fortes.
supposto que tem pouco peixe; por ser muito fundo, 166
Povoando-se este rio de Portuguezes se póde
ou por ser a agoa delle fria, e os que nelle se pescão fazer um Imperio, e senhorear todo o das Amazonas
sam grandes. Tem muitas e grandissimas tartarugas. e mais rios.
156
As agoas são salutiferas por passarem por 167
He capaz de ter grande commercio por mar e
cantidade de salsaparrilha. O clima he saudavel e por terra, assim com as Indias de Castella, como com
fresco. Tem muitas e boas madeiras para obras o Perú, e com toda a Europa.
curiosas de diversas cores. Os naturaes sam
168
corpulenlos e fortes, agudos de engenho. Fazem Neste e no das Amazonas se podem fazer
grandes curiosidades de madeiras, sem terem muitissimos engenhos de assucar e lavrar-se muitos
ferramenta, só com ossos de animaes obrão quanto canaviaes, e muito tabaco, e outras drogas: como he
querem. cacáo, salsaparrilha, salsafraz, pita, orucû,
canafistula, e outras drogas.
157
Tem idolos de madeira a quem fazem honras
e reverencias. Tem infinitos agouros e superstições,
e seus feiticeiros, que os trazem embasbacados, que Provincia dos Agoas
a tudo quanto dizem dam credito. 169
Da bocca deste rio Negro à provincia dos
158
Estes tem guerra com os moradores do rio Agoas a que commummente chamam as Areas, por
da Madeira e das Amazonas. Usão de arcos e frechas ter muitas ilhas de arêa, haverá setenta legoas pello
ervadas, dardos de remesso. Servem pello rio em rio das Amazonas assima: e no districto deste
canôas mais grandes que as do rio das Amazonas. caminho há no rio muitas ilhas grandes e pequenas,
159 em que se podem fazer grandes canaviaes e muito
Pella banda do norte deste rio correm as
cacáo.
Indias de Castella, e os primeiros portos sam a
170
T rindade, Orinoco, Ponta de Araja, Cumaná, Esta provincia he mui povoada de gentios,
Cumagoto, e a Margarita e Caracas; e pella banda mui abastecida de sustento, carnes, peixe, milho,
do sul estam estrangeiros na bocca do rio, donde mandioca, castanhas, e diversas fructas.
tem algumas ilhas, que divide sua grandeza em 171
Estes Indios nam teem ferramenta, por
boccas mais pequenas.
estarem mais apartados dos Portuguezes.
160
Pello rio assima se vai ao novo reino de 172
Fazem as lavouras pella margem do rio,
Granada, que he a primeira provincia do Perú, e para
quando está baixo, e em quatro ou seis mezes cresce
a provincia dos Pastos, que das agoas desta provincia
tanta mandioca, como em outras partes de anno e
se forma este caudeloso rio: em elle se acha muita
caparosa. meio. Em crescendo o rio, arrancam todas as roças
e as enterrão debaixo da terra donde se conservam
161
Segundo o que mostrão as terras deve de ter todo o anno, e dahi vão tirando e comendo, athé que
metaes: entre os naturaes se acha algum ouro, que
passão as crescentes, para tornarem a plantar.
trazem pendurado nas orelhas e narizes, e cobre em
173
pedaços pequenos. São as terras desta provincia junto ao rio
162 baixas e por dentro altas mui agradaveis, e nellas se
Estes Indios vivem nús, como os mais destas
pódem fazer grandes fazendas de engenhos e criaçam
partes, e teem as mesmas calidades e governos, salvo
que sam governados muitos povos por um Senhor. de gados de toda sorte.
174
163
A terra da banda do sul deste rio, que cáe Nam lhe faltam madeiras de toda casta. Tem
sobre o rio das Amazonas he ilha, para dividir o rio muita salsaparrilha e canella, que como os Indios
Negro, e a das Amazonas da mais terra firzne. He nam usão della, nem a conhecem, he silvestre e mui
mui grande e povoada de inumeraveis Indios de grossa. Ha muito cacáo, de que fazem os Naturaes
diversas naçoens, e deve de ter em contorno (segundo vinho para suas barracheiras.
a grandeza que la se tem visto e andado) mais de 175
As armas destes Indios sam palhetas com
quinhentas legoas. que disparão mui grandes frechas, e saravatanas
164
As terras sam altas e agradaveis, em algumas com frechas ervadas, dardos de remesso. Sam em si
partes algum tanto frias, e em outras em estremo mui pusilanimes e cobardes.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 231

187
176
Sustentão-se com peixe e tartarugas de que Os naturaes sam de má natureza, nam
há muita cantidade. Nam comem carne que lh’o consentem, nem querem paz com outras naçoens.
vedão os ritos da [sic] suas leis, excepto carne Sam mui agudos de engenho, muito curiosos em
humana, de que sam mui carniceiros. Tem idolos labrar obras de madeira, com ferramenta de pedra,
de páo mui curiosos, e cada hum tem o ídolo que e ossos de animaes. Trazem chapeos feitos de
adóra em sua casa, sem terem casa particular para palma. Andam nûs como os de mais. As armas sam
palhetas, fr echas, e dar dos de r emesso.
elles. Tem muitos feiticeiros, que servem de
O governo, clima, e calidade da terra como o da
sacerdotes de idolos.
provincia dos Agoas.
177
Governam-se por familias e principaes: e o
que mais valente se mostra, he mais acatado e Rio do Ouro
obedecido, que tudo fazem por temor. Tem guerra 188
Nesta provincia está um rio a que chamam
com as naçoens circumvizinhas sobre as terras e
o rio do Ouro; por dizerem os Indios que por elle
comedias, e se cautivão huns aos outros por pouco
abaixo lhe vinham pedaços pequenos de ouro. He
mais de nada. pequeno, e povoado de huma naçam de Indios
178
Nam usão de farinha de mandioca para o Iguanaes, gente muito bem disposta, algum tanto
seu sustento, mas fazem della caçabe, como tambem branca, e de boas feições: e tem boa cantidade de
do milho. aldeas, ainda que pequenas. Teem estes contracto
179
de louça que levam a vender a outras partes. Entrou-
Nesta provincia ha muitos jacarés, e muitos se neste rio, e nam se achou ouro, nem signal delle,
mosquitos de diferentes castas, que, supposto os nem noticia alguma. Derão em cantidade de grandes
há em todo o rio, nesta provincia sam sem numero lagos com grandes ilhas no meio, mui apraziveis, e
e grandes, o que deve ser pellas muitas ilhas que com muita canafistula, e cacáo. O clima he mais
tem. Há grandes canaviais silvestres de frechas. frio que quente. As terras boas e abundantes; muita
Fazem estes Indios cantidade de sal de uma erva caça e pouco peixe.
que chamam Capinasú, e se assucára em paens, 189
As armas destes Indios sam palhetas,
que mais parece salitre que sal, e o levão a vender a frechas, e dardos de remesso ervados. Criam
outras naçoens. cantidade de galinhas. Vivem quietos por estarem
180
Tem esta provincia muitas e grandes aldeas sós neste rio, e nam aver nelle outra naçam que
de gentio, com dous generos de casas, umas grandes lhes dê guerra.
em que assistem de dia, e outras mui pequenas,
para dormirem de noute, por causa dos mosquitos. Provincia dos Carapunas
Nam dormem em redes como os mais deste rio, mas 190
Da provincia dos Sorimões à provincia dos
em camas feitas de palha. Carapunas haverá vinte legoas pello rio das
181
Seu clima he quente mas não he doentio, Amazonas assima, que traz por aqui grandissima
he saudavel, por ser lavado dos ventos e por ser o corrente, por serem as terras altas, e nam espraiar
tanto o rio.
rio por alli mui largo, e as terras juncto delle baixas,
191
adonde estam situados os povos e aldeas. Esta provincia consta de muitas aldeas
182
assentadas à margem do rio, em terras altas, e custa
Todo o seu serviço he com canôas pequenas, trabalho subir a ellas, por serem as ribanceiras
por causa dos lagos, que há nesta provincia muito a pique.
grandissimos. 192
As terras sam alegres, por serem as mais
dellas campinas, boas para criarem gados. Lavrão
Provincia dos Sorimões os naturaes cantidade de algodam, que levão por
183 contracto a outras partes e provincias, e muita louça
Nesta provincia das Sorimões havera trinta
de bom barro. Usão de palhetas, frechas, e dardos.
legoas. Todas sam terras baixas e de muitos lagos.
Sam grandes contratadores. Fazem as roças em
184
Estam povoadas de aldêas de Barbaros, em ilhas que estam no meio do rio. Proveem-se de
que dizem estam as Amazonas, e que os Indios que grande cantidade de tartarugas, para seu
vivem nestes lagos teem commercio com ellas: o que mantimento, que guardão em curraes. Vivem nús,
parece fabula, pois, entrando nelles e andando-os, supposto que alguns trazem camisas sem mangas,
se nam achárão taes Amazonas, senam cantidade que lhes vem por contrato da provincia dos
de Botos, a que os Indios chamam Para Jaguáras Cambebas. Governam-se por Principaes; e cada
[pirá-jaguaras]. hum governa sua familia, que toda vive em numa
185
grande casa, e sobre estes todos ha em cada aldeia
A canafistula, que he o que há nesta hum Principal, que a governa.
provincia, he infinita, e muita salsaparrilha, e 193
Sam idólatras: teem idolos feitos de madeira,
canella.
grandes e pequenos, a quem chamam Tururucari.
186
He esta provincia mui povoada de gentios Sacrificão-lhe Indios, que tomão na guerra. Untão
com muitas aldeas, abastecidas de mantimentos e o idolo com o sangue e comem a carne, a que sam
de muitas madeiras, de que fazem canôas pequenas mui inclinados. Os que fazem este sacrificio sam os
e as vendem a outras naçoens. Há muita cantidade feiticeiros, a quem elles teem em veneraçam, e
de cedros. guardão muito respeito.
232 A “Descrição” de Maurício de Heriarte (1662)

193
Há nesta provincia muito milho yabotim, de grandissima sujeição, e lhe chamão Tururucari, que
que se sustentão, que supposto em todo o rio os quer dizer o seu Deos; e elle por tal se teem [sic].
haja, aqui sam infinitos. Fallando com elle nos disse que havia nascido no
194
Aqui se achárão algumas medalhas de ouro céo, que por se parecer no corpo com aquelles Indios,
fino de vinte e quatro quilates, mas a terra nam vivia entre elles, mas que quando lhe parecia, ao
mostra haver ouro nella, o que deve vir das minas céo subia; e dizendo-lhe que, em quanto
do Nápo. estivessemos na sua aldeia se fosse, respondeo que,
ainda que ia, era com o espirito, que o corpo deixava
na aldeia. Dissemos-lhe que já que tão familiar era
Provincia dos Cambebas com o céo, que nos declarasse as cousas que lá
195
Desta provincia à provincia dos Maguas, a havia, que supposto eramos brancos nam sabiamos
que vulgarmente chamamos Cambebas, por terem nada de lá. Respondeo o Indio que as cousas do céo
as cabeças chatas (o que lhe fazem uns aos outros eram tam secretas que nam podia fallar dellas, e
sendo as crianças de peito) haverá dezoito legoas que assim nam lhe perguntassem mais nada.
pelo rio assima. 205
Abusão de barbaros, que o Demonio traz
196
He esta a melhor provincia, assim de sujeitos, fazendo nelles infernal carniçaria, e
sustento como de gente, de todas que há neste rio, semeando nelles grandes auguros e superstições.
o qual por despraiar muito, faz cantidade de ilhas, 206
As armas de que usão são arcos, frechas, e
grandes e pequenas, nas quaes os Naturaes teem palhetas, e lanças grandes com que vam dar guerra
suas povoações e aldeias mui grandes, fortificadas aos naturaes da terra firme, que são infinitos,
as casas com estacadas. cautivão muitos, e delles sacrificão alguns, e dos
197
Senhoreão os Indios da terra firme por nam mais se servem em suas lavouras.
terem canôas, ou que por nam usarem dellas, nam 207
O clima desta provincia he frio e saudavel:
vam às ilhas. he lavada dos ventos. Em ella se podem fazer
198
São mui abundantes de mantimentos, grandes engenhos de assucar, muito tabaco, cacáo,
fructas, peixe, tartarugas, de que os Naturaes se que ha infinito, e não usão delle em bebidas, mas
sustentão. Usão de muito tabaco e bom, que he o comem-o.
seu contrato. He gente cuidadosa, trabalhadora e 208
Há muita canafistula, algodão, urucú,
forte. Costumão andar vestidos com camisas e carajurú, cedros, louros, salsalparrilha.
calçoens, a seu uso: as molheres com mantas e 209
Conservão os Naturaes os dentes sãos, e sem
camisoens, em que mostrão ser mais honestas que
dôr, com uma herva, que entre si teem, com que os
os mais Indios do rio, que vivem nûs, e com
untão. Fazem grandes canôas de cedro, em que vão
deshonestidade.
a dar guerra aos Indios, naturaes da terra firme.
199
São as molheres grandes fiandeiras e 210
Os instrumentos com que fazem suas festas,
tecedeiras. Fazem as roupas que vestem, e muitas
sacrificios e bailes, a que são mui inclinados, são
que levão por trato a outras provincias.
trombetas de tristissimo som, feitas de tabocas, que
200
São todos idolatras e tem casa de Idolos, a são humas canas grossas ocas por dentro, e huns
que fazem sacrificio dos que cautivão na guerra. tambores de pau cavado por dentro, por ser o buraco
Untão os idolos com o sangue, e as cabeças dos pequeno, e com uns páos cobertos de resina os tocão
sacrificados teem em casas apartadas, que servem como atabales, que se ouvem muito longe. E ao som
só deste thesouro por tropheo de sua religião. Os destes instrumentos fazem seus bailes e sacrificios
corpos enterrão, por quanto estes Indios não comem ao Diabo, que os traz cegos sem conhecimento algum
carne humana, nem outro genero de carne. Seu de Deos.
sustento he peixe boi (de que há muito no rio das 211
Estes Indios e os mais deste rio das
Amazonas) e de mais genero de peixe, fructas e Amazonas teem conhecimento do diluvio universal,
muita mandioca que se come crua, cozida e assada. e da criação do mundo, por via de superstições
201
Não usão de farinha, senão caçabe. brutas, e de barbaros. E vendo o céo e sua
202 formosura, o sol, lua, estrellas e conhecendo-as
Teem infinitos escravos que lhes fazem as
pelos nomes, que em sua lingua lhes dão, não
lavouras nas margens do rio, com ferramentas de
chegão a conhecer a verdadeira causa das causas,
pedra e de casca de tartarugas. Mandão-os com
que he Deos verdadeiro, trino, e uno, e estão vivendo
grande imperio, e elles conhecem seu captiveiro, e
tão barbaramente.
obedecem com grande humildade. São estes Indios
212
mui feios por terem as cabeças chatas. São Quando morrem se enterrão pegado ao rio,
corpulentos, fortes, e tidos de todos por valentes, e com grandes ceremonias, e com tudo quanto teem
assim são temidos de todos os Indios comarcanos. de seu cabedal. E o que morre vai mettido em huma
203
canoa pequena, que dizem elles he para andar na
Não são amigos de estarem ociosos, em que
outra vida. E por estas abusoens, parece que
se conhece terem uso de razão.
permitte Deos, que todos estes Indios tenhão
204
Governão-se por Principaes nas aldeias; e grandes visoens, pois a cada passo se queixão que
no meio desta provincia, que he dilatada, há um virão os parentes, que morrerão, e o diabo que vem
Principal, ou rei delles, a que todos obedecem com a fallar com elles, e ensinar-lhe suas maldades, e
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 233

224
a faze-los mui lascivos, a que são mui inclinados. Contão por nós, que fazem em cordeis, e cada
Cada hum tem as molheres que lhe parece. São mui nó he hum anno ou dia, ou o que querem contar.
inclinados a matar, como o são todos, por qualquer 225
As tradiçoens de seus ritos ficão de paes e
cousa que se lhe faça. Se matão com hervas filhos, e as ceremonias e historias antigas a que
venenosas de que há nestas partes grande dão credito, sem terem outro archivo, que lhe lembre
quantidade, e outras mui salutiferas. as cousas passadas.
213
São mui inclinados à guerra, e teem-se por 226
Com as grandes correntes dos rios e do rio
mui valentes; em particular esta nação dos
das Amazonas aonde estão situados, se alagão
Cambebas, que como são muitos, são temidos dos
algumas vezes estas ilhas, mas nunca de maneira
mais, e assim se intitulão senhores de aquelle rio, e
que lhe faça damno, antes lhe serve de frutificar a
senhoreão mais provincias delle.
terra, com que dá grandes mantimentos, sem
214
Quando se casão, comprão as molheres a comparação que os outros annos. Elles teem suas
seus pais, e além de as pagarem, os servem cinco aldeias e povoações no mais alto das ilhas.
annos; e se as achão donzellas, ficão com ellas, 227
São grandes contratadores, mui inte-
senão as tornão a entregar; e lhe tomão o que havião
resseiros. Não dão nada sem o pagamento primeiro.
dado por ellas; mas não podem ter uma molher
Usão de arpões e anzoes feitos de osso, para a pesca,
comprada como esta, porquanto esta he a legitima,
que ainda que tenha muitas, as mais são e de redes pequenas, a que chamão Pusás.
concubinas, havidas das guerras, que ficão por Provincia dos Rombos
escravas, e servem a mulher legitima, e ao marido 228
Desta provincia athé a dos Rombos haverá
no que elle quer.
doze legoas pelas margens do rio. São as terras
Lago Negro baixas e alagadas, de sorte que não há, povoação
215
Da banda do norte desta provincia está hum por ellas.
229
grande lago, que, supposto nelle haja muitos, este Os Rombos estão oito ou dez legoas pela
he o maior de todos; he mui fundo; e, em havendo terra dentro, com suas aldeias em terras boas e
vento, faz grandes marés, a quem pusemos o nome enchutas de grandes matas.
de lago Negro; por ser agoa diferente da do rio. Está 230
São Indios corpulentos, fortes e bem
povoado de Indios por nome Capinas, sujeitos aos dispostos. As molheres, bem parecidas, mais
Cambebas, a que pagão tributo de muita frecharia brancas que os outros Indios.
ervada. 231
216
As armas são dardos de remesso, e rodelas,
Os que nos Cambebas, se tem por mais ou pavezes mui grandes, que fazem de couros de
valentes, fallão cantando, com hum tom melifluo. anta secos ao sol, que são fortissimos: apenas os
217
Estes Indios não usão de redes para dormir. passa huma bala de escopeta.
Todos dormem em camas toldadas, por se livrarem 232
Quando vão à guerra se armão com cortiça
dos mosquitos, que há muitos em todo este rio das
dos arvoredos. Andão nús: seu mantimento he
Amazonas.
milho, e caçabe e mandioca.
218
Se suas molheres são adulteras, as podem 233
Seu governo he por familias, e hum principal
matar livremente. No terreiro grande de suas aldeias,
sobre todos. Comem caça, que há por ali muita,
e em hum poste que está mettido no meio desta,
para cujo effeito crião cães.
que serve de nelle matarem as adulteras, e algum
234
escravo, que comette culpa contra seus senhores, Há nesta provincia cantidade de tigres,
ou querem fugir, ou fogem e os colhérão. pantheras, leõespardos, muitas antas em demasia,
219
e outros diversos animaes. As terras onde morão
Para ar mar cavalleir os os filhos dos
são altas, e de serras grandes e pequenas, de muitas
Principaes na tenra edade, amarrão no poste hum
fructas silvestres, formosas fontes, e rios pequenos.
Indio escravo, e o filho do Principal o vai matar assi
Teem muitas chontas, que he hum bom sustento.
amarrado.
235
220
A esta provincia forão vinte soldados e cem
Nesta provincia há grandes crocodilos,
Indios, a ver e a reconhecer a terra e a gente, e a
jacarés, e cobras de agoa, que se criam entre
prover de mantimentos.
aquellas ilhas. Mettem medo a quem as vê, que são
236
maiores que serpentes. Fazem alborotar o rio, de Chegamos a algumas aldeas pequenas,
maneira que não podem navegar as canoas em donde fugio a gente, e não pudérão colher mais que
quanto durão as marés que ellas causarão. um Indio corpulento; tão forte que seis dos nossos
221
não o podião deter, athé que hum soldado lhe deu
Há muitas iguanas, que são como cameliões, na cabeça com huma rodela, e deste modo esteve
muita cantidade de aves de diversas castas e quieto. Trazia huma negra com huma criança de
differentes côres. peito. A negra bem disposta e tinha sobre a natura
222
Crião estes Indios muitas galinhas e patos, dois testiculos tão grandes que lha cobrião, de que
capivaras, só por seu regalo, que os não comem; ficamos espantados, porque não se podia a tal India
por que pola manhã lhe cantem os gallos, os teem chamar hermafrodita.
por feiticeiros; porque dizem que advinhão o dia. 237
Delles tomámos lingoa por interpretes,
223
Exercitão os filhos em pequenos nas armas, dando-lhe algumas cousas com o que ficarão
em que saem muito dextros. quietos. Tornámos nosso caminho, e elles ficarão.
234 A “Descrição” de Maurício de Heriarte (1662)

Figura 16.1. Capivaras (apud Brehm)


O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 235

Provincia dos Icaguates Provincia dos Quixos


247
238
Desta provincia athé a dos Icaguates, a que Desta à provincia dos Quixos haverá cem
chamão os Encabelados por trazerem os cabellos legoas, pelo rio assima. No meio do caminho está a
mui compridos em demasia, que às vezes lhe provincia dos Pastos. e dos Saparas, e Poriazes. que
arrastão pelo chão, assim os homens como as por estarem pela terra dentro desviados do rio, se não
faz menção delles.
molheres, atados com cordas de moritim-auera.
248
Teem estes Indios as aldeias pela terra dentro. Usão Desagoão seus rios no das Amazonas,
de milho, mandioca e chontas; tem muita caça, e que são caudelosos, e todos descem da cordilheira do
pescaria, muitas fructas silvestres. A terra he boa, Perú.
249
mas tem muitos alagadissos e campinas. Há muita Chegando a esta provincia dos Quixos faz o rio
cantidade de Indios bem dispostos, mas de pouco das Amazonas tres boccas, em que se divide. Hum,
trabalho. por nome Coca, que toma o nome de huma erva, que
os Indios plantão e benificião com grande cuidado pela
239
Sua lei [em branco no original: prohibe] as falda do rio, por a comerem e levarem por contrato a
moças e mancebos que trabalhem, e que só tratem outras partes. O outro braço chama-se Payamino: e o
de fazerem filhos para acrescentar sua geração. Só outro Nápo.
os velhos e velhas trabalhão, e fazem grandes 250
Todos tres trazem grandissima corrente, por
lavouras para os moços, indaque com trabalho descerem daquellas grandissimas serras desta
grande por não terem ferramenta. provincia, que he a ultima que há neste rio, e donde
240
Nesta provincia estiverão oito mezes, em que elle nasce.
251
conhecerão os Indios não vivem junctos ao rio, por Esta provincia estava mui povoada dos
ser aquella parte doentia em extremo; e cada dia Espanhóes: com huns levantamentos, que os naturaes
adoecião os companheiros, com que foi forçado ir fizerão com grande guerra, que se lhe derão, se
para as aldeias dos Indios, que são muitas inda que consumirão muitos logares, que os Espanhóes tinhão,
pequenas. e não ficárão mais que tres, que hoje se conservão, e
são Avilla, Archidona, e Baeça.
241
A esta provincia descerão os Padres de S. 252
De Indios há cantidade, indaque não são tantos
Francisco, da cidade de Quito, a doutrinar, em como dantes havia, e os que há são pequenas aldeias.
companhia do mestre de campo Fr. Gordim, e do 253
He esta provincia fragosa, de altissimas serras
capitão Palacios, e por quanto os Indios matarão ao
e montes cobertos de arvores, mui fria em partes, em
dito Palacios, que era o cabeça interprete, se
outra quente. Tem infinitos rios que daquellas serras
tornarão a Quito, tendo feito já algum fructo, ainda nascem, e todos se ajuntão em hum, que he o das
que pouco. Amazonas. He hum tanto esteril de mantimentos, não
242
São estes Indios de pouco valor. As armas tem verão conhecido, todo o anno chóve; no mez de
são dardos de remesso, adargas com que se cobrem, Setembro seccão as agoas.
254
grandes lanças, feitas todas de páo. São grandes Tem esta provincia oitenta legoas de comprido,
ladrões e traidores como. Seus instrumentos são de malissimos caminhos, toda de serras, que sempre
tambores de pau, as casas pequenas, com as vão subindo, e muita cantidade de rios, que por não
paredes de casca de arvores. Andão nús, aindaque haverem pontes, nem vãos, pela grande furia que levão,
alguns trazem camisetas; as molheres cobrem as e com que se despenhão do alto das serras, se passão
partes vergonhosas com panos que fazem de uma por ama de humas cordas tecidas, a que chamão os
estopa que tirão das arvores. São amigas de naturaes pontes de Guanas.
255
concertar a cabeça com fitas que fazem de moritim. Athé chegar à cidade de Baeça, que é a cabeça
243 desta provincia, donde assiste o Governador. e dahi à
São mui sujos em seu comer, e mais que
cidade de S. Francisco de Quito haverá vinte legoas de
todos os outros: dormem em redes de moritim e de
melhor caminho, mais povoado, de mais sustento, e
tucú, feitas de diferentes modos que as dos mais
mais alegre, que he a primeira cidade e provincia dos
Indios do rio.
reinos do Perú, donde se dá muitissimo trigo, azeite,
244
São idolatras: teem idolos feitos de madeira vinho, e todo genero de fructas de Espanha, muitos
mettidos em covas nos campos, aonde vão fazer suas gados de toda sorte, preciosas lãs, linho, e todo o mais
ceremonias, e adorações ao diabo por mãos de seus necessario para a vida humana.
feidceiros. 256
Tem alguns engenhos de assucar, que se gasta
245
Comem carne humana, são mui vingativos, na terra. Não se contão as excellencias e grandezas do
mas de pouco animo. Perú, mais que o caminho e grandeza do rio das
246
Amazonas e seus districtos.
Usão enterrarem-se em cóvas com todo seu 257
Tornando à provincia dos Quixos, que he
cabedal, que he bem pouco, por serem pobres e
povoada de Indios fortes, corpulentos e bem a
preguiçosos, o que tudo levão para servirem na outra proporcionados, os quaes estão sujeitos aos Espanhóes,
vida. Poem-lhe de comer todos os dias na cóva, dizem por administrações, seu governo he politico, sua religião
que para ter forças para andar, isto usão por tempo christãa, elles mui devotos nella. Tem as igrejas mui
de um anno, e todos os mais deste rio fazem o adornadas, limpas, e com formosissimas imagens de
mesmo: ao cabo do qual, lhe pisão os ossos, e os N. Senhora, de quem são mui devotos, e de N. Senhor
queimão, e feitos cinza, os bebem em vinhos, com o crucificado. Vão capellães a doutrina-los, que por ser a
que tirão o dó. terra tam aspera não estão de assistencia nas aldeias.
236 A “Descrição” de Maurício de Heriarte (1662)

258
O sustento destes naturaes he milho; yuca, 263
Todo este rio das Amazonas he abundan-
chontas, e uma fructa a que chamão papas, que tissimo de sustento, assim de carne como de infinito
são como humas batatas, e alguma carne. Crião peixe, de diversas castas, muita mandioca, milho,
porcos e carneiras, mas poucos, por ser a terra arroz, diversidade de fructas, assim silvestres, como
aspera. Teem pouco peixe. Servem estes Indios de cultivadas.
carregar, pela aspereza dos caminhos não ser capaz 264
Tem este rio muitissimos jacarés, e
de cavalgaduras. Fazem muita roupa de algodão, tartarugas de disforme grandeza. He mui aprazivel
mantas, sellas e vestidos, que os Indios usão a que
e agradavel à vista.
chamão Hanacos, com que tratão de uma para outra
265
parte. Da provincia dos Cambebas para cima, tem,
259
pelas margens do rio, muitissimos sauces, que fazem
Nas cabeceiras de Nápo e Payamino, ao pé
a vista aprazivel e alegre. As agoas são alquanto
da cordilheira, se tira muito ouro de lavage, fino de
turbas, como as do Tejo, quando vem crescido, mas
vinte e quatro quilates, e o há em outros muitos
são mui salutiferas, por passarem por cantidade de
rios mais pequenos, que todos enriquecem aquella
salsaparrilha, e por vir batido de muito longe.
provincia.
266
260 O peixe que nella se cria he muito gostoso e
Da mais alta serra e ultima dos Quixos, a
que dão o nome de Páramo (que todo o anno está sadio.
267
coberta de neve, e della se vê a cidade de Quito, e Tem muita cantidade de aves, muita caça,
muitos povos e villas, por ser toda aquella terra que parece que a fez Deos tão abundante de
lavradia, sem arvores, e só as de fructas, e alguns sustento, que para que os barbaros que nelle habitão
pinheiros) nasce o grande rio das Amazonas de hum não tenhão desculpa, que, por falta de sustentos,
grandissimo chorro de agoa, que nasce do cume comão came humana.
deste Páramo, em cuja falda se retêm, e faz hum 268
Tem este rio em si grande cantidade de ilhas
lago de meia legoa de circuito, onde vão à caça das grandes, e pequenas, em que se póde fazer grandes
aves os Espanhóes, que por ali assistem; e lavouras de canaviaes de assucar, tabaco, cacáo,
junctando-se-lhe outras muitas agoas a este, vão urucú, carajurú, que são tinta que os estrangeiros
fazendo este caudeloso e espantoso rio que, ajudado vem a buscar.
de infinitos rios e muitos lagos que se lhe ajuntão, 269
faz hum mar largo de agoa doce, em que se póde Tem em si muito campeche, anil, pita,
navegar muitos annos, todo povoado de inumeraveis tatajuba, que dá tinta amarella.
270
barbaros, cheios de abusos, ritos e ceremonias Tem muitos e bons sitios para se fazerem
infernaes, com que o Diabo tem lavrado imperios grandes povoações.
de perdiças [sic]. 271
Só o que tem de máo he de ter muitos
mosquitos de diferentes generos e especies. Mas
O periodo do autor em o desmontando e continuando, cessa esta praga
261
Tenho contado o que no grandioso rio das que não he mais que pela beira do rio, e por dentro
Amazonas, e mais rios se inclue, advirtindo que não os não há.
disse mais que das terras, que pellas ourelas delle 272
Tem grandes cobras de agoa; na terra, onças,
se veem, athé oito ou dez legoas pela terra dentro; tigres, pantheras, 1eõespardos; muitas antas, porcos,
que se falára das inumeraveis que ha nestes sertões, veados, coelhos, tatús, cutias, pácas, capiváras,
tão povoadas de barbaros, de infinitas e diversas javotins, tamandoás, matamatas, bugios de diversas
castas e naçoens, fôra nunca acabar; pois nellas se castas, avestruzes, tiriuos, jaburús, iguanas,
podem estabelecer novos imperios. papagaios, aráras, canindés, mutús, muitos patos,
262
E como os catholicos reis de Espanha teem marrecas, e outras muitas e diversas aves: cantidade
povoado a banda do Occidente da cordilheira, que de galinhas, periazes, sauxazes, e outros muitos, todos
são as montanhas que por esta parte se chamão os bons para sustento da vida; por cuja razão he mui
Quixos, e pela outra os Andes, que vem a ser os facil de se povoar e conquistar este rio e todas as mais
reinos do Perú, donde se teem achado inumeraveis terras circumvizinhas a elle, pois que não faltando
riquezas, entendo que, passando-se esta banda do que comer, se póde levar todo o demais trabalho.
oriente, se devem de achar muitas mais: mas vivem 273
Intentando S. Magestade conquista-lo e
tão descuidados os moradores destas partes, ou seja povoa-lo, o hade ajudar a Divina Magestade do nosso
pela pouca curiosidade, que professão, ou pela poderosissimo Deos e Senhor, tomando-o por
pouca ajuda e favor que S. Magestade lhe tem dado instrumento para salvar tanta multidão de almas
athé agora, o que deve de ser pella pouca noticia, da gentilidade que nessas partes há.
que athé agora teve dellas, pelo que advirto a 274
S. Magestade que as não despreze, pois nellas se Os Padres da Companhia de Jesus tem
pódem fazer novos reinos em que se sirva a Deos começado a estender a fé nestas partes, com
(que he a primeira causa) e tenha a corôa novos grandissimo cuidado; e com tudo não entrarão em
acrescentamentos, considerando que nada se faz huma minima parte do canto, respeito da multidão,
sem trabalho; pois Euripedes o faz pai da fama, e que há.
275
sem elle se não alcança nada; e he força que Sua Deos nos empare, e nos dê valor e forças
Magestade metta cabedal e faça dispendio de sua para o servir, e converta estes barbaros, e os traga
fazenda para conseguir esta empresa, que os effeitos ao conhecimento de sua santissima fé, para que
destas partes são mui poucos, e não alcanção a todos gosemos da sua divina presença na outra vida,
sustentar Infantaria, que tem de guarnição nella. por todos os siglos dos siglos. Amen.”
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 237

Lista dos animais e produtos animais citados


(os números entre parênteses referem-se aos parágrafos do texto)

1. Ambar – 34, 63 24. Matamata – 272


2. Anta – 84, 146, 231, 272 25. Mosquitos – 165 (ausentes no rio Negro), 179,
3. Arara – 8, 272 180, 217, 271
4. Avestruz – 272 26. Motum – 8
5. Boto – 184 27. Mutú – 272
6. Bugio – 272 28. Onça – 45, 272
7. Camelião – 149 (e sua “pedra de bazar”), 221 29. Paca – 8, 272
8. Canindé – 272 30. Panthera – 234, 272
9. Capivara – 84, 272 31. Papagaio – 8, 272
10. Cobra – 88 32. Pato – 272
11. Cobra de agoa – 88, 220 33. Pavo – 8
12. Coelho – 272 34. Peixe-boi – 19, 82, 129, 200
13. Colhereira – 8 35. Pira-jaguara – 184
14. Crocodilo – 220 36. Porcos [selvagens] – 8, 272
15. Cutia – 8, 272 37. Serpente – 88
16. Formiga-ladra – 146 38. Tamandoá – 272
17. Guará (guarazes) – 8 39. Tartaruga – 155, 176, 192, 198, 262
18. Iguana – 221, 272 40. Tatú – 8, 272
19. Jaburú – 272 41. Tigre – 45, 234, 272
20. Jacaré – 179, 220, 264 42. Tiriuo – 272
21. Javotim – 272 43. Tortuga – 82, 107, 129
22. Leãopardo (leõespardos) – 234, 272 44. Veado – 8, 272
23. Marreca – 272 45. Xerobim – 19

Referências
Heriarte, M. de, 1874. Descripção do Estado do Maranhão, Pará, Corupá e rio das Amazonas, feita por Maurício
de Heriarte... no anno de 1662, por mandado do Governador-geral Diogo Vaz de Sequeira, dada à luz por
1a. vez [Editada por F. ª de Varnhagen, Visconde de Porto-Seguro]. Imprensa do filho de Carlos Gerold,
Vienna d’Austria.
Varnhagen, F. A. de, Visconde de Porto-Seguro, 1975. História geral do Brasil antes da sua separação e
independência de Portugal. Tomo Terceiro. Edições de Educação e Cultura, São Paulo.
Capítulo 17

A PROPOSTA DE CRIAÇÃO DE UMA “NOVA ALEMANHA”


NA AMAZÔNIA, POR J. J. BECHER (1669)

O célebre químico Johann Joachim Becher nasceu em Espira no ano de 1625, morrendo
em 1682. Perdeu o pai aos treze anos de idade, sendo forçado a dar lições de leitura e escrita
para ganhar a vida e sustentar a mãe e irmãos, o que lhe deixava apenas as noites livres para
estudar e educar-se. Entretanto, seus grandes dotes naturais e uma vontade férrea levaram-no
a vencer todos os obstáculos, fazendo-o adquirir vastos conhecimentos de física, química,
matemática e medicina. Com essa bagagem pôs-se a viajar pela Holanda, Suécia e Itália,
conhecendo os sábios mais famosos de seu tempo, sobretudo Descartes e o Padre Mersenne.
Trabalhou como professor de medicina na Universidade de Maiença em 1666, mas não tardou a
transferir-se para Munique onde assumiu, conforme suas próprias palavras, a direção do mais
belo laboratório existente na Alemanha e mesmo na Europa. Entretanto, sua excessiva vaidade,
extrema independência e espírito inquieto traziam inimigos de todas as partes e não lhe permitiam
fixar-se em um único lugar, levando-o de Munique a Viena para ocupar o cargo de conselheiro
da câmara de comércio, obtido graças aos préstimos do Conde de Zinzendorf. Logo caiu em
desgraça, estabelecendo-se em Haarlem em 1678, apresentando aos Estados Gerais diversos
projetos econômicos e industriais, tais como a transformação das areias das dunas em ouro e a
invenção de uma máquina para a dobagem da seda. Descontente por ter suas propostas
rechaçadas, partiu em 1680 para a Inglaterra, onde passou dois anos a estudar as minas da
Cornualha e da Escócia. Segundo alguns, terminou seus dias em Londres, enquanto outros
falam em um retorno à Alemanha a convite do Duque de Mecklenburg.
Becher insistia que a química deveria afastar-se da escolástica, dizendo sempre que “bom
peripatético, mau químico e vice-versa”. Sua reputação formou-se sobretudo graças à chamada
“teoria das três terras” ou dos três elementos, que distinguia a “terra vivificante” ou o elemento
terroso, a “terra mercurial” ou o elemento metálico e a “terra inflamável” ou elemento combustível.
Por não serem sempre idênticas e constituídas dos mesmos elementos, essas “terras” podiam
modificar-se e revestir-se dos mais variados caracteres. Além disso o químico alemão admitia a
existência de um “ácido universal” (acidum universale, solvens catholicum ou spiritus esurinus)
que era encontrado nas águas e nos sais. Ao que parece, foi o último químico célebre a acreditar
na transmutação dos metais, o que explica sua inacreditável proposta aos Estados Gerais da
Holanda de transformar a areia em ouro, sugestão baseada em uma experiência anterior que o
levaria a tomar como transmutação a simples extração de uma diminuta quantidade de ouro
naturalmente encontrada nas areias. Da mesma forma, pretendeu ter transformado a argila
calcinada com óleo em ferro, embora semelhante processo levasse apenas à obtenção do ferro
oriundo do óxido de ferro contido na argila e não na transformação da matéria orgânica em metal.
Além da famosa Actorum Laboratorii Chymici Monacensis, seu Physica subterranea libri duo (1681),
Becher publicu diversas obras, entre as quais um tratado de medicina em prosa e verso intitulado
Parnasus medicinalis (1663), as Institutiones chymiae prodromus, id est Oedipus chymicus (1664),
as Theses chymiae veritatem et possibilitatem transmutationis metallorum in aurum evincentes
(1675), o Tripus hermeticus fatidicus pandens oracula chymica (1689) e o Natur Kundige der Metallen
(1705) (Papavero et al., 1997: 193-194).
Segundo Moraes (1983: 93-94):
“Johan Joachim Becher, the famous physician, chemist, economist, and originator of several
plans for improving the state economy, was instructed by Friedrich Casimir, Count of Hanau, to
negotiate with the West India Company for the grant of a piece of land for German colonisation in
South America. The West India Company agreed upon the concession, with certain liberal
conditions, of thirty leagues of coastline and one hundred leagues towards the interior along the
Orinoco River or the Amazon. The agreement was signed in 1669. Becher wrote [a] pamphlet
240 A Proposta de Criação de uma ‘Nova Alemanha’ na Amazônia, por J.J. Becher (1669)

[Gründlicher Bericht..., 1669] as propaganda for the colonisation project. He describes the fertility
of the soil, the methods that should be employed in cultivation, and appeals enthusiastically to
German patriotism for the colonisation of this land, in order that on maps should appear not only
a New France, a New Spain, a New England, but also a New Germany. But the project was
violently criticised and never became a reality. Nevertheless, Becher in one of his books calls
himself the founder of German colonial policy.
This very rare pamphlet contains a curious map engraved by ‘J. P. Thelott, 1669’,
measuring 40 x 35. It is missing in many copies [...].
Another edition exists, ‘Gedruckt zu Frankfurt in Verlegung Wilhelm Serlins. Anno 1670’.”

A exemplo da “Relação Sumária das cousas do Maranhão” do Capitão Symão Estácio da


Sylveira, de 1624, e da “Publication of Guiana’s Plantation” de John Day, de 1632, o panfleto de
Becher tentava induzir migrantes a estabelecer-se na Amazônia. Infelizmente, por não termos
acesso a essa obra, não sabemos se trata dos animais amazônicos; decidimos, entretanto, incluir
uma breve referência a este interessante documento, na esperança de despertar a atenção de
algum historiador que desenvolva esta pesquisa.

Referências
Becher, J. J., 1669. Gründlicher Bericht von Beschaffenheit und Eingeschafft, Cultivirung und Bewohnung.
Privilegien und Beneficien desz in America zwischen dem Rio Orinoque und Rio de las Amazonas an der
vesten Küst in der Landschafft Guiana gelegenen, sich dreiszig Meil wegs breit an der See und hundert Meil
wegs in die Tiesse erstreckenden Strich Landes, welchen die Edle privilegirte West-Indische Compagnie
der vereinigten Niederlanden, mit authentischer Schrifft, licher Ratification und Permission Der Hochmogenden
Herren Staten General andem Hochgebohrnen, gegenwertig regirenden Herren, Herrn Frederich Casimir,
Grafen zu Hanaw, Kieneck, Zwenbrücken, Herrn zu Miuntzenberg, Liechtenberg und Ochsenstein,
Erbmarschall und Obervogt zu Strasburg. Wieanch na das desampttiche Hochgraf. Hausz von Hanaw mit
allen Regalien und Jurisdictionen, ewig underblich unter Gewissen in dieser Deduction publicirten Articuln
den 18 Julii 1669, cedirt und überlassen hat. Jedermanniglichen, absonderlich aber denen welchen daran
gelegen, zum Nachricht und gefallen in Truck gebeben. Johan Kuchenbercker, Franckfurt.
Moraes, R. B. de, 1983. Bibliographia brasiliana. Rare books about Brazil published from 1504 to 1900 and
works by Brazilian authors of the Colonial Period. Revised and enlarged edition. A – L. UCLA Latin American
Center Publications, University of California, Berkeley & Livraria Kosmos Editôra, Rio de Janeiro.
Papavero, N., D. M. Teixeira & M. de C. Ramos, 1997. A “Protogaea” de G. W. Leibniz (1749). Uma teoria sobre
a evolução da Terra e a origem dos fósseis. Editora Plêiade & Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado
de São Paulo, São Paulo.
Capítulo 18

A “CHRONICA DOS PADRES DA COMPANHIA


DE JESUS NO ESTADO DO MARANHÃO” DO
PE. JOÃO FELIPE BETTENDORFF (1694-1698)

J oão Felipe Bettendorff nasceu a 25 de agosto de 1627, em Luxemburgo. Em 1644 graduou-


se em Artes na Universidade de Tréveris, e estudou Direito na Itália. Três anos depois (no dia 5 de
novembro) ingressou na Companhia de Jesus, na Província Galo-Belga. Em 1660 embarcou em
Lisboa, a 24 de novembro, para as Missões do Maranhão e Grão-Pará, por influência do Pe. Antônio
Vieira. Iniciou sua vida missionária no ano seguinte, na aldeia dos Tapajós (hoje Santarém),
produzindo ali talvez o primeiro trabalho artístico na recém-construída igreja da missão: o retábulo
e pintura de N. S. da Conceição. Vítima, com outros padres, da perseguição de 1661, foi preso e
esteve para ser deportado, em 1662, para o reino, o que não se consumou. De 1668 a 1674, foi o
Reitor da Missão, passando então a Reitor do Colégio de N. S. da Luz, em São Luís do Maranhão.
No exercício de seu reitorado, executou trabalhos de pintura no seu colégio, fez representar comédias
e representações de encamisadas a cavalo. Em 1681, na aldeia de Gurupatuba (hoje Monte Alegre),
executou outro retábulo, pintando N. S. da Conceição, bem como o frontal do altar. Em 1684,
expulso das Missões, com seus companheiros jesuítas, transportou-se para o Estado do Brasil e
daí para o reino. Durante sua estada na corte, tratou da publicação de três obras na língua
brasílica – o Catecismo de Antônio de Araújo (1686), a Arte do Pe. Luís Figueira (1687) e o Compêndio,
que traz o seu nome (1687). A 17 de maio de 1688 embarcou em Lisboa de volta ao Estado do
Maranhão e Grão-Pará, provisionado comissário do Santo Ofício da Inquisição. Novamente Reitor
do Colégio de N. S. da Luz, em 1690, lançou a primeira pedra da nova igreja, hoje Catedral de São
Luís, deixando o debuxo do seu frontispício e retábulo “feitos por minha mão, para tudo se fazer
na conformidade indicada”. De 1690 a 1693 atuou como Superior das Missões. Em 1694 passou
a Reitor do Colégio de Santo Alexandre, em Belém, cargo que ocupou até sua morte. Ocupou-se
nesse período a escrever a Chronica, notando nela ainda os sucessos do ano da própria morte, até
“aos vinte e cinco de maio desse ano de mil seiscentos e noventa e oito”, que é a última linha de
seu livro. Morreu em 5 de agosto de 1698, em Belém do Grão-Pará.
A Chronica da Missão dos Padres da Companhia de Jesus no Estado do Maranhão ficou
inédita na Torre do Tombo, onde uma cópia foi obtida por Gonçalves Dias, sendo o texto publicado
apenas em 1909, na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (Bettendorff, 1909). Uma
edição facsimilar foi feita recentemente (Bettendorff, 1990), por uma feliz iniciativa da Fundação
Cultural do Pará Tancredo Neves, Secretaria de Estado da Cultura do Pará.
São os seguintes os trechos em que o Pe. Bettendorff fala dos animais amazônicos:

LIVRO 1º. DA ORIGEM DO NOME, DESCOBRI- “[Belém] Tem a cidade pela banda de riba os
MENTO, ESTADO E CAPITANIAS DO MARANHÃO rios Murutuçú, Guarapiranga, Mojú, e Acará, todos
não tão fecundos em peixe, como em cannas de
Capítulo 6º. Dá-se breve notícia da Capitania do assucar, tabacos, cacauzeiros, urucurizeiros, que
Maranhão, e outras que se acham até a do em suas terras se plantarem, como se vê nos
Grampará. Declaração breve dos termos ultimos do engenhos e outras fabricas que por elles se acham.
Estado, do numero de suas capitanias, e prestimos Não falta caça de porcos do matto, veados, cotias
dellas, e de suas missões que tem até a Capitania para o sustento dos moradores que as povôam; para
do Pará. banda de baixo, onde vão correndo para o mar,
quanto mais se afastam as terras e rios tanto mais
“[Vigia] ...os moradores da villa gozam dos bons abundantes de peixe e farinhas, até a villa da Vigia,
ares do mar, com seus peixes, ostras, caranguejos, posta sobre as entradas do mar” (p. 23).
e da fartura da terra pelo mantimento que produz Capítulo 8º. Da Capitania de Joannes pertencente
em abundancia...” (p. 21). ao donatario.
Capítulo 7º. Relatam-se as Capitanias e Missões do “[Marajó] Tem a ilha de Joannes bons ares,
Pará até a Capitania do Gurupá, com os bens que bôas aguas, boas terras e campinas de pastos, mas
n’ellas se acham. como por pouco frequentadas são asperas, e criam
242 A “Chronica” do Pe. João Felipe Bettendorff (1694-1698)

não sei que de peçonhento, não servem occorre logo um matto com duas pedras mui grandes
commumente para multiplicação de gados, por para altas e largas, das quaes uma é em forma de
morrer muito nellas; tem comtudo assaz campinas, arco, outra macissa toda, com um Sol entalhado
por uma banda, cheias de mangabeiras, que dão nella, e como não achei quem me desse razão destas
mangabas mui excellentes, e mais de jabutis, ou pedras, presumi commigo que seriam os marcos da
kagados, e suas mattas de caça de porcos Capitanis por aquella parte; logo ao pé deste alto
selvagens, e veados, e varios outros animaes correm por grandes espaços para baixo e à riba,
comestiveis, como também suas aguas e rios tão bellas e vistosas campinas para gado vaccum: si se
abundantes em peixe, que nas praias delle se faz o podessem limpar das cobras e bichos peçonhentos;
pesqueiro d’El-Rei que com as salgas que faz de estas no inverno se alagam em parte, e pelo verão
tainhas sustenta a cidade do Pará.” (pp. 15-26). se queimam todas, durando o fogo algum mez e mais
em que se destroe toda a immundicie que nellas
Capítulo 9º. Da Capitania do Cametá
há, servindo a terra em certas paragens para os
“Às espaldas de Cametá desemboca o rio dos indios plantarem nellas seus milhos, tirando mais
Tocantins, ao longo do qual há bôas terras, supposto outro proveito que é, seccando os lagos, terem
que não tem bôas para tabaco baxo, que ..... quanto peixe querem homens e mulheres, meninos
excellentes ares, aguas tão bôas que as de todos os e meninas, pondo uns cestos virados sobre elles
rios são ricas para beber e cheias de varias castas sendo pequenos, ou fechando-os sendo peixe maior,
de peixes, como tambem suas ilhas, mattas de caça, que transbordando o rio sae de toda a casta para os
e castanhas para banda de riba onde tambem se lagos onde fica, por se nçao retirar a tempo
faz cada anno a viração de uma grande multidão de quantidade delle; só os peixes bois que os há muito
tartarugas, as quaes supposto se acham pelas ilhas pelos rios das Amazonas, não sahem commumente
de todo o rio de frécha e covos, comtudo as que para os lagos, mas ficam nos igarapés maiores que
chamam de viração, principalmente se acham mais têm hervas pelos bordos, porque estas são seu
para as cabeceiras onde se vão buscar com tanto pasto ordinario, e mais gostoso; uma causa de
concurso de canôas e gentre, que as canôas ás vezes muita molestia nesta aldêa são os mosquitos que
passam de cincoenta e a gente de algumas mil desde as Ave-Marias da tarde perseguem até a
pessoas, e vêm commumente providas todas de suas manhã; mas fazendo-se casas de mosquitos que se
tartarugas que ajuntam em curraes á borda da agua fecham ao pôr e antes de se levantar o Sol, não se
quanto pode ser, servindo ahi de sustento pelo anno abrem senão muito depressa, tornando-se a fechar
todo ou ao menos para a maior parte delle.” (p. 27). do mesmo modo, não dá muita molestia” (p. 34).
Capítulo 10 º. Da Capitania do Gurupá e seus Capítulo 12º. Dá-se breve noticia das mais terras
prestimos onde há residencia da Companhia de Jesus até a
“São as suas aguas barrentas, porém as que ultima dellas
subministra um igarapé junto á fortaleza vindo da “[Região do Tapajós] Bebe-se agua do rio a qual
terra dentro, são excellentes e o peixe não falta a assentada não faz mal, não falta caça por seus
quem o manda buscar” (p. 30). mattos, que até coelhos, pombos e patos cá se
Capítulo 11º. Da Capitania do Norte ou de Bento acham; os rios abundam em peixe, até peixes bois
Maciel e tartarugas” (p. 36).

“O sitio do rio na fortaleza do Parú tem algum


tanto melhores ares, mas não tem terras, se bem LIVRO 2 º . DO QUE OBRARAM OS PADRES
que pelo rio a dentro as tem muito bôas, tem muito MISSIONARIOS, EM TEMPO DO GOVERNO DO
peixe, caça, cacáo, salsa, castanhas e para essa PRIMEIRO GOVERNADOR DO ESTADO, E DO
banda do rio das Amazonas peixe e tartaruga em SEGUNDO EM QUE SE FAZ A VIAGEM PARA
abundância” (p. 32). QUITO, E DO TERCEIRO EM QUE OS
HOLLANDEZES TOMARAM O MARANHÃO
“A aldêa de Urubuquara que está em um alto
ao pé de um monte, que sobe a modo de um pão de Capítulo 2º. Relata-se a viagem dos Portuguezes para
asscar, tem bôas mas poucas terras, muito bôas Quito e a volta de lá para o Pará com os Padres da
aguas e ares melhores, muito peixe e tartaruga (...); Companhia que tomaram cheia noticia do Rio das
uma jornada mais arriba está em um alto monte a Amazonas com suas terras, nações e costumes,
aldêa de Gurupatuba (...). Tem ares moderadamente conforme se refere neste capítulo tirado da relação
bons, aguas excellentes, carne, peixe e tartarugas do Padre Christovão da Cunha
em abundância...” (p. 33).
“Tem este bello rio [Tapajós] muitas nações
“Para a banda do Sul se descobre o rio das pela terra dentro e ricas minas de prata, com mui
Amazonas, com muitos altos mui vistosos; para bellas terras e mantimentos assim de mandioca,
banda do Leste, tambem se offerece parte do rio e milho, como caça, passaros, peixes, até peixe boi e
altos montes, e para banda do Oeste ou Poente tartarugas” (p. 59).
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 243

LIVRO 3º. DO QUE OS PADRES OBRARAM DESDE [Cametá] ...fizeram-nos os indios seus
O ANNO DE 1655 ATÉ O ANNO DE SUA PRIMEIRA presentes de peixe-boi assado e excellente, mas,
EXPULSÃO EM 1661 como não é tão sadio, comendo delle o Capitão-Mór
logo lhe deram febres, que lhe duraram muito tempo,
Capítulo 9. Missão do Padre Manoel de Souza pelo
Rio dos Jurunas com que, despedindo-se, voltou para sua fortaleza...”
(p. 160).
“É o rio dos Jurunas um dos mais nomeados
em o Estado pelo rio do Xingú para dentro, “[Tapajós] Em o dia seguinte vieram outros
declinando sua bocaina para Este, vindo o rio do principaes do sertão, tambem com suas dadivas de
Xingú, chamado Parahyba, da banda do Sul; são kagados e fructas, rogando-nos com muita instancia
suas aguas crystallinas e mui medicinaes para os quizessemos chegar ás suas terras para levantar a
que padecem dôr de pedra, porém só pelo inverno Santa Cruz e fazer-lhes egreja, como em as mais
se pode navegar seguramente pelas muitas aldêas dos Christãos...” (pp. 161-162).
cachoeiras que só em aquelle tempo se cobrem; não
Capítulo 11º. Manda o Governador Ruy Vaz de
se sabe ainda de certo donde tira a sua origem. Com
Siqueira tropa ao rio das Amazonas ao resgate dos
serem suas aguas clarissimas, abundam em
escravos, cujo cabo era Antonio Arnau, morador do
pescados de todo o genero, que os naturaes matam
á frécha, sem anzol nem rêde, porque se descobrem Maranhão, e leva um frade de Nossa Senhora das
claramente sem nenhuma difficuldade; tem praias Merces por misionario, mal succedido
de areias bellas e espaçosas, pelas quaes sahem [Índios ‘Aruaquizes’] Os indios que fizeram
em seus tempos principalmente outubro por deante, mais façanhas em a guerra e se aventajaram aos
milhares e milhares de tartarugas a desovar, como outros em esforço e valentia, antes de lhe darem
em o rio dos Tocanins e outros semelhantes, e são titulo de cavalleiro, fazem que padeça primeiro por
estas oordinario sustento dos que vivem á borda tempo de um mez grandes jejuns e abstinencias,
delle, e ainda dos da terra dentro, os quaes saem á
como um abstinente e solitario anachoreta, e depois,
viração dellas” (p. 115).
ajuntando muitos vinhos para a festa, para cujo
Capítulo 13º. Do que o Padre Francisco Gonçalves gasto se fintam os parentes e amigos, o trazem para
obrou como visitador obrou como visitador e o meio da aldêa e dahi o levam a pendurar em uma
particular em esta missão até a sua ditosa morte rede atada ao cume de uma casa, que tem mui bem
em Cametá ordenada de varias pennas e é toda de palma, nem
serve mais que para este ministerio; ahi se ocupam,
“[Lago no Rio Negro] Das perseguições e
trabalhos que padeceu em esta missão lhe originou uns com danças, outros com assobios e folias, em
um ... incruento, em que ganhou a corôa da gloria signal de alegria, porém os mais amigos e parentes
que em o Céo gozará, porquanto depois de estarem lhe dão muita pancada com umas pelles de onça e
dez mezes pelo interior do sertão se levantou um outros animaes que tem guardadas e arroladas para
contagio do qual todos adoeceram mortalmente, este fim, para experimentarem se é soffredor de
porquanto este rio tem muitos lagos pelo sertão que trabalhos e contente em o padecer; cuidam que este
todos se enchem de peixe, jacarés e outros animaes, é o maior favor que se lhe faz; o cavalleiro que se há
pelo rigor do inverno; mas com a força do verão, de armar está com tanta paciencia em as pancadas,
com a força das calmas que o sol causa em aquelle que não dá de si um gemido nem mostra ter
tempo, ficam todas as lagôas em secco e os animaes tor mento algum, e se houvesse algum que
que em ellas estavam mettidos, por falta de agua, mostrasse, ficava incapaz de tal honra e infamado
se acham mortos; esta grande mortandade de em geração.
pescado corrompe o ar, occasionando varias Depois destas ceremonias, trazem os velhos
enfermidades em a gente, que não é natural em executores dellas muita quantidade de formigas
aquelle sertão; a todos, assim indios como [tocandiras] e outros animaes e bichos que mordem
Portuguezes, acudia o Padre Missionario com grande muito, e levam ao padecente cavalleiro para que o
caridade, não só com os Sacramentos mas ainda mordam e maltratem.
com os medicamentos para cura de seus corpos;
como a necessidade era grande e os enfermos Acabado tudo isto, o tornam a pendurar mais,
muitos, elle lhes repartia a todos o sustento, por espaço de oito dias, ao cume mais alto da casa
servindo não só de medico e enfermeiro, mas nova, feita de palmas e para ser em todos
tambem dispenseiro e cozinheiro...” (p. 133). testemunhas de sua paciencia e perseverança em
aquelles martyrios que lhe dão, armam suas redes
debaixo delle, assistindo-lhe, e como estes oito dias
LIVRO 4 º . LEVANTAMENTO DO POVO DO são os ultimos, nelles lhe apertam mais o jejum,
MARANHÃO E PARÁ CONTRA OS PADRES DA tendo a casa ornada de quartos de carne de porco
COMPANHIA DE JESUS, EM QUANTO SE INSTITUE do matto, e andando seus parentes com outros
A MISSÃO DO RIO DAS AMAZONAS COM indios continuamente a comer e beber á sua vista,
MISSIONARIOS E RESIDENCIA EM OS TAPAJOZ com danças que fazem de noite e de dia, sem socego
Capítulo 1º. Manda o Padre Superior Antonio Vieira, algum, ao som de seus instrumentos barbaros,
por primeiro missionario do assento do rio das festejando sua ditosa sorte e dando- por muito
Amazonas com ordem de fazer residencia em os honrado da grande dignididade a que honrados o
Tapajoz ao Padre João Felippe levantam.
244 A “Chronica” do Pe. João Felipe Bettendorff (1694-1698)

O officio das velhas que nunca estão em casa quatrorze delles, e acharam uma arvore de tão
ociosas, é irem todas juntas em dança, com aguas desmedida grossura que tomada a medida della
cheirosas, ás tardes e manhãs a laval-o e todas lhe chegava a seis braças de róda; pararam ahi por ser
praticam que não desfalleça em os trabalhos que já tarde e começaram os indios a fazer suas
brevemente passam, pois só são apparenças para a assaduras, e comer de tal sorte que dentro em uma
honra que há de gozar entre elles, que até estes noite puzeram os quatorze porcos em a barriga, sem
barbaros não sabem dar premio sem merecimento, sobejar siquer um quartinho, que o Padre Poderoso
e assim o tem como cousa sagrada, levantando-o e lhes tinha mandado guardar, para tomar de
abaixando-o por umas pelles de tigre, sem ninguem madrugada um bocado, antes de se por em caminho;
ter ousado a tocal-o nem ainda com a mão” parecia cousa incrivel se os Padres o não contassem,
(pp. 210-211). e se não conhecesse a grande voracidade daquella
gente, a qual como é muito soffrega de fome, quando
Este é o mais antigo trecho que conhecemos lhe falta o necessario, assim faz excesso em comer,
sobre o uso das formigas tocandiras em ritos de quando tem com que se encher” (p. 277).
passagem dos índios brasileiros (veja-se sobre este
assunto Lenko & Papavero, 1996: 249-251. “Ao levantar do Sol, proseguiram sua viagem
por terra, seguindo o caminho que os levava pelo
matto dentro, e tendo caminhado um bom estirão,
Capítulo 17 º . Dá-se noticia da guerra que o chyegaram á vista de uma aldêa (...). ... em o dia
Governador Ruy Vaz de Siqueira mandou dar aos seguinte bem cedo, ao levantar da aurora, viram vir
Aruaquizes, das terras e genio daquelle Gentio e o Principal da aldêa para o terreiro, a limpal-o das
successo da tropa, com a morte lastimosa de um immundicies dos cães, que o tinham sujado á noite
Religioso de Nossa Senhora do Carmo passada e fazia isso como cousa de seu cargo e digna
de sua pessoa, e viram mais que afugentavam os
“Quando querem o pescado, vão todos [os
indios de si os mosquitos que havia, com um pouco
índios Ariaquizes] em almadia ao rio das Amazonas,
de azeite de cocos bravos ou inajazes, com tão feliz
de onde trazem muito peixe-boi, tartarugas, e varios
successo que, dizia o irmão Antonio Ribeiro, que o
peixes do rio, para o seu sustento (...); não há por
mesmo era assentarem-se esses animaesinhos sobre
este rio [dos Aruaquizes] mosquitos nem animaes
o que estava ntado delle, que cairem mortos todos
peçonhentos...” (pp. 233-234)
em o mesmo momento” (pp. 277-278).
“Trouxe o Padre Poderozo de lá um passaro
LIVRO 5º. DO QUE SE OBROU DO ANNO 1667 ATÉ
mui grande, que se chamava Aguia imperial ou real,
O ANNO 1684
a qual tinha pernas da grossura de um braço e comia
Capítulo 5º. O Padre Superor da Missão visita as de uma vez uma pacca, que é maior que uma lebre
aldêas todas, levando em sua companhia o Padre da Europa; mas como comia tanto quanto lhe
Pero Luiz e o Irmão Domingos da Costa davam, tambem passava muitos dias sem comer
bocado, quando lhe faltava” (p. 279).
“[Aldeia dos Tupinambaranas] Com isso fomos
dizer Missa, e fazer doutrina á aldêa aos indios todos,
e como lhes falamos da grande praga de mosquitos, LIVRO 6º. DAS COUSAS QUE SUCCEDERAM À
pediram-me que os excommungasse para que se MISSÃO EM TEMPO DO GOVERNO DO PADRE
retirassem para outra parte. Respondi-lhes dizendo: LUIZ GONSALVI, ROMANO
Filhos, os mosquitos estão em sua terra, não se lhe Capítulo 14º. Visita o Padre Iodoco Peres a Missão
dão de excommunhões como vós outros, que sois do rio das Amazonas, e chega ao rio da Madeira e
entendidos, tirae-vos daqui e mudae-vos pra outra logo depois vae visitar o Maranhão
parte. Assim o fizeram e se mudaram para terra
dentro, onde estão até o presente, em logar alegre, “É este rio da Madeira um dos mais famosos
de bons ares, terras, aguas, mantimentos, peixe, que há pelo Estado, por grande e espaçoso, porém
fructas, tartarugas, e com menos praga de demorado pelas caldeiras que tem, em que se somem
mosquitos” (p. 261). as canoas com tudo o que levam, havendo descuido
dos guias ou pilotos, e tem varias castas de peixe,
“Tendo eu por noticia que pelo sertão daquelle até peixe-boi, pirahybas, mas os indios não os
rio Xingú estava a nação dos Taconhapés, indios comem, sustentam-se de uma casta de peixe que
de lingua geral, mandei-lhe o Padre Pedro Poderozo chamam Tambaquiz, mui gostosos; as suas aguas
e o irmão Antonio Ribeiro, ambos bons linguas, para são as mesmas como as do rio das Amazonas 9...);
pratical-os a que se descessem para as aldêas mais as suas terras são boas para todo o genero de
chegadas á povoação dos brancos (...). Navegaram mantimentos, suas mattas teem muita caça de
os Padres em canôa bem equipada e provida, uns porcos, cotias, paccas e passaros; porem os rurizes
quatorze dias pelo rio [Amazonas] à riba (...). Logo não matam nem comem porco do matto, e só são
que puzeram o pé em terra, deram com uma vara amigos de passaros que teem por seu mais regalado
de tantos porcos do matto que mataram uns sustento” (p. 355).
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 245

LIVRO 8º. PÕE-SE A MISSÃO EM ESTADO MAIOR estando os remeiros com fome, sem eu ter o que lhes
E SUA ULTIMA CONSISTENCIA dar, vimos um bello peixe grande que vinha à tona
Capítulo 6º. Visito a residencia de Nossa Senhora d’agua para baixo e vivo ainda, e com um pequeno
da Conceição sobre o Rio Urubú, onde com licença espinho que lhe atravessava a garganta. Com isto
do Padre Iodoco Peres, assistia Frei Theodosio, tiveram que comer e de jantar; nem se contentou a
mercenario, e della volto para o Pará, visitando bondade e libealidade de Deus com dar-nos aquelle
Cametá e Mortigura peixe para a viagem do Parijó a Inhuaba, mas
offereceu-nos um bello veado para os indios comerem
“São os ares deste rio não tão doentios como
outros; as aguas do mesmo modo; as terras de uma pelo caminho de lá ao Pará. Ia este atravessando o
banda do rio das Amazonas para riba mais rio, quando, vendo-o eu sem saber o que era,
montuosas, e para baixo mais baixas e planas em perguntei aos remeiros que cousa era isto que vinha
algumas partes. O sustento ordinario, emquanto lá atravessando, e como responderam que era um
estive em companhia do padre missionario Frei veado, fomos a elle e o afogámos, levando-o para casa,
Theodosio, era peixe de moquem, ou tartaruga, das onde, guardada uma parte para si, deram a outra
quaes os indios vão fazer provimento para a banda para a viagem já assada.” (pp. 601-602).
do rio das Amazonas, de onde as trazem e guardam
em curraes para o sustento do anno” (p. 495). Capítulo 4º. Prepara-se o Padre Superior da Missão,
José Ferreira, e logo depois visita as residencias por
Capítulo 7º. Dá-se conta do estado da Missão do rio cima do Gram Pará
da Madeira e dos Tupinambaranas
“A primeira residencia que tomou foi a de S.
“[Aldeia dos Tupinambaranas] Tem ares e
Pedro e S.Paulo, em Inhuaba, aldêa de riba, sobre o
aguas bastantemente boas, terras fortes para
mandiocas, tem mattas abundantes em caça, fontes rio dos Tocantins e capitania do Cametá (...). Tinha
e rios fecundos em peixes, nem faltam tartarugas a o Padre notado que um escravo de Pero, filho de Lobo
umas jornadas de lá, porque são tantas que o Padre Quiraeté, se ausentava muitas vezes da missa dos
tinha aquelle anno umas mil por sua parte, em um domingos e dias santos; avisou disso a Pero, para
curral” (p. 498). que mandasse seu escravo que disto se emendasse;
avisou-o elle, mas o escravo, mal acostumado, não
Capítulo 13º. À Instancia do Governador e Cameras,
fez caso do aviso e, no dia seguinte, em vez de ir á
deputam-se duas tropas para o sertão, uma do Pará
e outra do Maranhão, e nomeio cabo para ellas egreja a ouvir missa primeiro, foi pescar em um lago
chegado á aldêa; tendo pegado um bello peixe,
“Em o anno 1691, fizeram-se duas entradas chamado tucunaré, vinha mui contente com elle pelo
para os regates pelo rio das Amazonas...” (p. 522). caminho, quando uma cobra lhe saltou no braço e o
“Andou esta tropa primeiro pelo rio dos Tapajós (...)
mordeu em tres partes, com que, querendo chegar á
e com estas esperanças lá se foi detendo abaixo de
casa, para se curar das morduras, inchou logo, de
umas cachoeiras, entre pragas de moscas e
mosquitos, que além das doenças iam molestando tal maneira, que desmaiou e morreu no caminho,
a todos, até que desenganados se retiraram e pelo matto dentro; vendo Pero, seu senhor, que
entraram pelo rio das Amazonas...” (pp. 523-524). tardava, nesse dia e no seguinte tambem, pegou em
seu arco e fréchas para ir ver o que era feito de seu
escravo: entrou pelo matto dentro e, tendo caminhado
LIVRO 10º. TRATA-SE DAS COUSAS DA MISSÃO
um pouco, deu com elle deitado no chão, com o peixe
ACONTECIDAS EM TEMPO DO SUPERIORADO DO
tucunaré a uma ilharga, o peixe fedorento, e elle com
PADRE JOSÉ FERREIRA
tres mordeduras terriveis no braço, inchado como
Capítulo 1º. É feito o Padre José Ferreira superior uma pipa, fallecido; trouxe-o e mandou-o enterrar,
da Missão e parte para o Grampará, onde dispõe conhecendo todos que isto era castigo de Deus, com
acerca da Missão do Cametá, em 1696 que punia o descuido desse miseravel, de não ouvir
“Dahi voltei para a residencia de Inhuaba (...). missa aos domingos e festas, ficando para emenda
Com isso, continuei minha viagem para riba, e dos mais indios da aldêa toda” (p. 609).

Referências
Bettendorff, J. F., 1909. Chronica da Missão dos Padres da Companhia de Jesus no Estado do Maranhão.
Revta Inst. hist. geogr. brasil. 72(1): 1-697.
Bettendorf, J. F., 1990. Crônica da Missão dos Padres da Companhia de Jesus no Estado do Maranhão.
Fundação Cultural do Pará Tancredo Neves, Secretaria de Estado da Cultura, Belém.
Lenko, K. & N.Papavero, 1996. Insetos no folclore [2ª edição]. Editora Plêiade & Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo, São Paulo.
Capítulo 19

A RELAÇÃO DE FREI VITORIANO PIMENTEL


SOBRE AS MISSÕES DO RIO NEGRO E SOLIMÕES (1705)

D a carta enviada ao rei de Portugal por Frei Vitoriano Pimentel, ex-vigário provincial da
Ordem do Carmo no Estado do Maranhão, escrita a 7 de setembro de 1705, dando contas da
jornada que fez ao sertão, “para impedir o Padre Samuel Fritz, da Companhia de Jesus, as descidas
que fazia pelo Rio das Amazonas abaixo”, constam apenas uma menção ao temível pium (díptero
da família Simuliidae) e outra aos mosquitos (Culicidae). Apesar disto, transcrevemos na seqüência
toda a carta, por ser pouco conhecida e por ilustrar a rivalidade entre Portugal e Espanha quanto
à posse da Amazônia, e a ação das ordens religiosas neste sentido. O manuscrito original está no
Arquivo Histórico Ultramarino de Lisboa; a transcrição, em português moderno, foi publicada nos
Anais da Biblioteca e Arquivo Público do Pará (Pimentel, 1983). Quanto à vida e viagens do
Pe. Samuel Fritz, consultem-se Maroni (1889-1892), Fritz (1918, com um belo estudo introdutório
de Rodolfo Garcia; 1967) e Porro (1993).

“RELAÇÂO QUE FAZ FREI VITORIANO PIMENTEL, EX-VIGÁRIO PROVINCIAL DA ORDEM DO


CARMO, NO ESTADO DO MARANHÃO, DAS MISSÔES DO RIO NEGRO E SOLIMÕES, QUE A SUA
RELIGIÂO TEM A SEU CARGO; E DA JORNADA QUE FEZ AO SERTÃO A IMPEDIR O PADRE
SAMUEL FRIZ [sic], DA COMPANHIA DE JESUS, AS DESCIDAS QUE FAZIA PELO RIO DAS
AMAZONAS: E DE COMO PRATICOU E SOSSEGOU TODO AQUELE GENTIO”

“No ano de 1688, foi o Padre Samuel Friz [sic], Depois foi servido Sua Magestade, que Deus
de nascimento allemão, enviado do Colégio da guarde, encarregou à minha Religião as Missões do
Companhia de Jesus, da Cidade de Quito, ao Rio Rio Negro, no ano de 1695; e indo o Padre Vigário
das Amazonas a missionar as aldeias dos Cambebas Provincial Frei Manoel da Esperança a visitá-los no
mais circunvizinhas àquelas partes, e adoecendo ano de 1967, em companhia do Governador Antônio
gravemente nesta sua missão se resolveu a vir pelo de Albquerque Coelho de Carvalho tiveram notícia de
rio abaixo por se aproveitar de sua veloz corrente, e que o Padre Samuel estava outra vez em cima nos
arrebatada velocidade, a buscar entr e os Solimões; à vista do que mandou o dito Governador
ao Capitão José Antunes da Fonseca fosse em
Portugueses o remédio de sua saúde. Chegando ao
companhia do dito Vigário Provincial a lançar o dito
Rio do Urubu achou uma tropa nossa, de que era
Padre fora daqueles distritos, e que ao dito Vigário
Cabo o Capitão-Mor André Pinheiro de Lacerda, e
Provincial desse posse deles para os povoar de
Capelão o Padre João Maria da Companhia, que o Missionários. Como Sua Magestade, que Deus guarde,
enviaram logo ao Pará, onde assistia o Governador lhe ordenava, fez-se esta diligência com alguma
Artur de Saá e Menezes o qual vendo que o dito repugnância da parte do dito Padre Samuel, que
Padre era estrangeiro, e aquele Estado estava mui protestava o direito da Coroa de Castella; mas
mal fortificado, o não deixou voltar para cima, sem finalmente houve de ceder como era bem; e
avisar a Sua Magestade, que Deus guarde. recolhendo-se para a sua Missão, desceu o Padre
Mandou o dito Senhor no ano de 1691, ao Vigário Provincial mortalmente enfermo para o Pará,
Governador Antônio de Albuquerque Coelho de e o Governador fez aviso de tudo a El-Rey, nosso
Carvalho que à custa de sua real fazenda mandasse Senhor, que foi servido agradecer ao dito Frei Manoel
da Esperança, por carta de 10 de Xbro [dezembro] de
repor ao Padre Samuel na sua Missão, advertindo-
1697 e por outrra de 11 de março de 1698 o serviço
o a que não descesse mais a intrometer -se nos
que lhe tinha feito naquela jornada, e no encontro
nossos distritos; e indo o Sargento-Mor Antônio de
que tivera com o dito Missionário Castelhano,
Miranda e Noronha a conduzi-lo, assim que o dito ordenando-lhe que por aquela parte adiantasse a
Padre se viu nas aldeias últimas dos Solimões, antes Missão o mais que lhe fosse possível; e ao Governador
de chegar ao dos Cambebas despediu o seu condutor ordenou o dito Senhor na mesma ocasião que se o
ameaçando-o com censuras se lhe não fizesse força Padre Samuel se intrometesse outra vez entre os
e violência em o subir mais para cima, com o que limites das nossas demarcações o mandasse prender,
houve de deixar quase 300 léguas mais abaixo da e fizesse remessa dele para este Reino, como consta
sua Missão. de uma carta que existe na Secretaria daquele Estado.
248 A Relação de Frei Vitoriano Pimentel sobre as Missões do Rio Negro e Solimões (1705)

Entrou logo por Vigário Provincial o Superior que as Missões que os religiosos do Carmo tem nos
Frei José de Lima, e em veneração das ordens reais Solimões que distam do Pará mais de 750 léguas,
que tinham ido a seu antecessor mandou para os estejam dentro dos limites de Portugal; se Portugal
Solimões por Missionários a Frei João Guilherme, e não tem mais de 87 léguas de comprimento pelo rio
a Frei Francisco de Santo Anastázio, e matando o acima, isto é, ressalvava ele, admitindo tudo quanto
gentio tiranamente a este seu Missionário se os AA. [autores] Portuguses querem, porque os
aproveitou o Padre Samuel deste incidente e desceu Castelhanos, e ainda alguns Portugueses dizem que
à primeira Aldeia do Solimões que confinava da sua o meridiano da demarcação de Portugal passa pela
parte, de que era principal um índio chamado Cidade de Belém do Grão Pará.
Manutá a quem disse que os Portugueses haviam
Tão apretado com isto procedia o Padre Samuel
de ir vingar a morte daquele religioso que seus
no seu manifesto, e enfronhado nestas razões
parentes haviam morto, e que tudo haviam de por a
começou a praticar todo aquele gentio a que se fosse
ferro e a fogo, e que se ele e seus vassalos se queriam
com ele para cima; porque lá não chegavam brancos,
segurar deste castigo fosse para onde ele estava;
que lhes dessem má vida, nem fizessem extorções
como de fato assim o fizeram subindo 300 léguas
tomando-lhes à força suas mulheres e filhas, como
pelo rio aima, deixando atrás 30 aldeias da nação
os Portugueses faziam, e ainda mal porque tanta
Cambebas; e estes são os habitadores da Missão de
verdade lhes falava, com cuja persuasão estavão e
Santa Maria Maior que de todas as que missiona o
Padre Samuel é a mais chegada a Quito, que é até a todos abalados para o seguirem se um Missionário
donde eu cheguei na jornada que fiz de que logo meu, ajudando de dois soldados, que acaso ali se
farei menção. acharam o não obviara, ameaçando-o que o havia
de remeter preso para baixo, se logo logo não subisse
Depois da morte deste religioso escreveu Sua para cima. A carta desse Missionário em que me
Majestade, que Deus guarde, ao Missionário Frei José dava esta conta, e o manifesto do Padre Samuel fiz
de Lima, ordenando-lhe por carta de 22 de janeiro presente ao Governador e não me contentando só
de 1700 procurasse prover os Solimões de mais com esta diligência o apresentei na Junta das
Missionários, o que lhe não foi possível fazer por neste Missões; mas como esse dano se poderia em um
tempo fazerem os Padres da Companhia desistência braço tão remoto, daquela conquista, sentia-se como
de algumas Missões, o que foi preciso acudir,
dor de braço, e só a mim me chegava ao coração
enquanto eles não tornaram a missionar; contudo,
por Sua Majestade, que Deus guarde, ter
indo o dito Padre Missionário ao sertão com intento
encarregado aquelas Missões e distritos à minha
de chegar aos Solimões, e ver o que tinha obrado o
Religião, e desejava muito de que a todo o tempo, e
Missionário Frei João Guilher me, adoeceu
principalmente no do meu Governo, se visse que
gravemente que não passou do Rio Negro, em voltar
nem o Carmo faltava ao que devia, nem eu
com vida ao Pará lhe fez Deus especial mercê.
desatendia às obrigações do cargo que ocupava.
Entrei eu então no governo daquela Vigairaria,
Assim me resolvi em ir pessoalmente visitar
e avisando a Sua Majestade, que Deus guarde, do
aquelas Missões, e avistar-me com o Padre Samuel
que se tinha obrado nas Missões do Rio Negro, e do
só a fim de sossegar aquele Gentio, e obviar
muito gentio que o Missionário dos Solimões tinha
descoberto de novo, foi o dito Senhor servido controvérsias aos meus Missionários, e para
ordenar -me por carta de 21 de abril de 1702 proceder com acerto que desejava requeri se
promovesse aquele a sertões de mais Missionários; convocasse Junta das Missões, em que propus a
e quase no mesmo tempo me chegou de cima do minha resolução, que me foi aprovada, resolvendo
sertão um manifesto do Padre Samuel em que diz todos fazia eu muito serviço a Deus e a Sua
que é nula e inválida a posse daqueles distritos. Se Majestade, que Deus guarde, em tomar aquela
deu aos religiosos Carmelitas, no ano de 1697, e empresa por minha conta; que para intimidar ao
que os Portugueses são intrusos possuidores Padre Samuel levasse a carta em que Sua Majestade,
daqueles sertões. E consequentemente lhe não que Deus guarde, ordenava ao Governador o
podíamos impedir o missionar ele aquelas aldeias mandasse preso para este Reino se continuasse em
como Missionário da Coroa de Castella, porque era descer pelo rio abaixo; que levasse mais ordem do
sem dúvida que aquelas terras estavam dentro de Governador para o Capitão Tenente da Fortaleza
suas demarcações, e muito fora dos limites da Coroa do Rio Negro ser executor desta ordem Real todas
de Portugal, porque dizia ele: as vezes que para isso fosse requerido por algum
Missionário do Carmo, de que tudo se fez termo em
Constava 1º que da ilha de Santo Antão até o
20 de outubro de 1702 em que assinaram todos os
Cabo de Santo Agostinho há três graus de longitude,
Ministros daquela Junta, como consta do Livro dos
como querem os mesmos Portugueses; e do Cabo
seus Registros à fl. 2.
de Santo Agostinho até o Rio das Amazonas 14 graus
e dois terços; com que para se inteirar a demarcação Com este Regimento parti para o sertão em 23
de Portugal faltam quatro graus e dois terços, que do mesmo mês de outubro, e a dois de novembro
importam 87 léguas, que hão de contar deste Rio cheguei à Fortaleza do Gurupá, que fica à mão
para o poente, por correr sempre com igualdade da esquerda do Rio das Amazonas, donde tem sua
equinocial com pouca declinação já ao norte, já ao principal residência os religiosos da Província da
sul; e sendo isto assim, dizia ele, como é possível Piedade.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 249

A 5 passei pela Fortaleza do Paru situada à melhor outro Missionário, como de fato receberam
mão direita do dito Rio, por cuja banda correm as e trataram, e esta é a Missão que hoje se chama de
Missões dos Religiosos de Santo Antônio. Ali passei Santo Alberto.
pela Fortaleza dos Tapaiós, que fica da parte A 13 do dito mês [dezembro de 1702] fui
esquerda do mesmo Rio, por cuja parte correm as prosseguindo a minha jornada, tão maltratado de
Missões dos Padres da Companhia de Jesus. A 16 uns mosquitos chamados Peúns [piuns] que não
passei pela boca do Topinambaranas. A 23 passei só levava a cara inchada, mas as mãos tão
pela boca do Rio da Madeira, que tudo fica na mesma apostemadas, que mais de um mês me destilaram
parte, e são tudo Missões da Companhia. A 24 passei peçonha sem poder de noite pegar no sono sem as
pelo Rio do Urubu que fica à mão direita do Rio das escaldar primeiro em água e sal, sendo assim que
Amazonas, donde estão as Missões dos Religiosos as levava em carne viva, mas tão insofrível era a
de Nossa Senhora das Mercês. comichão que tinha que antes queria dores que
A 27 do mês de novembro entrei pelo Rio Negro, padecê-la. A 14 me principiou uma terrível febre
que fica da mesma parte, donde achei duas Missões que me durou mais de onze meses fazendo nesse
da minha Religião, uma de Nossa Senhora do dilatado tempo muitas mudanças, e malignando
Carmo, outra de Santo Elias, e eregi outra de novo várias vezes.
com o título de São João Bautista [sic] o que A 22 deixando o rio das Amazonas entrei à
consegui pelas dádivas que dei; porque vesti a todos mão direita pelo Rio Jubará e cheguei à Missão de
os Principais, e a alguns Abatizados, aos quais Santo Ângelo que no ano primeiro do meu Governo
presenteei, com que todos ficaram contentes, tinha eu erecto de novo; aqui pratiquei esse gentio,
conduzindo muito para isto, verem que o interesse vesti ao Principal, e despendi com todos com mão
que eu obtinha no que lhe dava não era mais que a larga porque achei que tinham dado muita atenção
sua redução para que abraçassem mais carinho- às práticas do Padre Samuel, e depois de o sossegar
samente a nossa Santa Fé. Neste está uma Fortaleza, me passei véspera de natal para a Missão de Santa
logo à entrada da mão direita, e é a última e mais Tereza pouco distante desta. Aqui é donde as
longínqua que temos em todo o sertão; o qual se fez práticas do dito Padre tinham feito maior dano, e
a fim de impedir o comércio com os Holandeses de assim me foi necessário vestir não só o Principal
Syrinhame [Suriname] tinham com os habitadores senão também a um grande abalizado seu, e aos
daquele Rio, que ainda hoje continua da mesma mais presentes com a mesma largueza por
sorte, porque vi em seu poder machados, facas, e reconhecer neles ainda maior inclinação às
espelhos holandeses conduzidos por índios persuasões do Missionário Castelhano. Nesta
Bárbaros dos matos, porque os de Syrinhame ainda Missão estive 20 dias de cama sangrado e purgado
até agora chegaram a ter prática com os Índios do e gravemente enfermo.
Rio Negro, mais por respeito da distância, que por
Com pouca melhoria, mas com muita
medo da Fortaleza. Neste Rio que da fronte da
confiança em Deus parti a 15 de janeiro de 1703
Fortaleza terá três léguas de largo, padecem muito
para cima e a 17 cheguei aos Axuarizes, donde erigi
os Missionários por ser muito doentio, e todas as
nova Missão com o título de São José, vesti ao
vezes que enche e vaza são infalíveis as febres, e
certas as doenças; a água dele sendo clara parece Principal, e contentei a todos, e deixei-lhe ficar por
preta como tinta, até o verde das árvores propende Missionário um religioso que eles mesmos pediram,
para o negro; o gentio todo é de beiço furado; e eles porque já tnham muito conhecimento dele.
usam de muitas mulhere, elas de mui limitados A 18 cheguei à Aldeia de Peránamsai, donde
panos para a sua nudez; é gentio mui vario também fiz nova Missão com o título de Santa Maria
[andarilho]: um ano quer morar de uma parte, no de Pazis, e a este Principal dei o último vestido dos
segundo já se muda para a outra. Mas sempre para 13 que levei para o sertão, e presenteei aos mais
o novo domicílio; causa esta porque os Missionários com outras jóias, sendo tudo necessário para
vendo as Igrejas e residências que fazem malogrados aceitarem Missionário de melhor vontade, e
as fazem com pouco gosto e a menos custo. A mim menosprezarem as práticas do Padre Samuel, que
me sucedeu mandar fazer uma Igreja nova muito com tanta força fazia por levar todo esse gentio para
bastante nos Turumazes [Tarumãs] que são da cima para a sua missão. A 20 cheguei a uma aldeia
Missão de Santo Elias, e estando já quase acabada pequena, que era a última dos Solimões, e saltando
se mudaram eles para a outra banda, deixando ficar em terra não achei mais que caveiras frescas, miolos,
aquela Aldeia deserta. sangue e intestinos pelo terreiro; porque o Juma
Destas Missões do Rio Negro parti para os que é o gentio de corso que vive no mato sem
Solimões a 3 de dezembro, fazendo o meu caminho domicílio havia poucos dias que tinha dado guerra
pelo Rio das Amazonas, e a 10 do dito mês cherguei a esta pouca gente; e a não achar-se naquela aldeia
à Aldeia do Manutá, que com sua gente tinha já um homem branco com uma espingarda, que a
saído do mato donde se tinha embrenhado desde disparou, não escaparia uma só pessoa; levaram os
que haviam morto ao seu Missionário Frei Francisco mortos para o outra banda do Rio, e lá os estavam
de Santo Anastázio em cuja redução trabalhou comendo assados com seus costumados bailes e
muito o Missionário Frei João Guilherme; e para folguedos; eu vi as fogueiras, mas não me cheguei
tornar a domar este gentio vesti ao Principal e a seu tão perto que divisasse as pessoas; se bem que na
filho, e com todos os mais despendi das drogas que Aldeia de São Paulo, que missionava o Padre Samuel
que levava, para os obrigar a receberem e tratarem vi um Juma pintado de ver melho e branco
250 A Relação de Frei Vitoriano Pimentel sobre as Missões do Rio Negro e Solimões (1705)

com cinco buracos em cada beiço, com uns espinhos dali veriam quem eram seus compadres e amigos;
metidos pelos buracos e feição de dentes de javali, em cujos limites estavam, e em que terras viviam, e
que ainda não vi gentio nem mais horrível, nem mais com quem se haviam de achar para os ajudar a viver;
feio e medonho. e com estes argumentos e demarcações tão materiais
A 21 fui dar em uma Ilhota com os que tinham os fazia confessar que eram pertencentes aos
escapado da morte na aldeia desolada; e achei o Portugueses e não aos Hespanhóis, cuja
homem branco, que os tinha defendido em sua confirmação era ir repartindo por estas aldeias
companhia; reparti com toda esta gente das drogas machados, foices, facas, anzóis, alfinetes, agulhas,
que levava, e os pratiquei para se incorporarem na fitas, espelhos, relicários, anéis e pedaços de bacias
Missão de Santa Madalena de Pazis por ser a mais de arame para as suas arrecadas, e com estas
circunvizinha; assim como prometeram; mas houve dádivas e boas práticas os deixei também dispostos
quem nas minhas costas, com pouco temor de Deus para receberem missionários que acho nisto mais
e zelo do serviço de Sua Majestade, que Deus guarde, dificuldade que a de os não haver, que eles nenhuma
persuadiu o contrário; porque quem vai no sertão repugnância tem para os aceitar.
ao seu interesse não lhe convém que o gentio esteja Entrou o mês de fevereiro (1703), e ou fosse
debaixo da proteção de Missionários, senão sujeito porque o rio já enchia ou porque o clima assim o
à sua violência para se servirem dele muito à sua causava parecia a canoa hospitral, sem outro algum
vontade; donde vem que os Missionários além do remédio mais que o do céu. Contudo, pagando a
serviço que fazem a Deus fazem muito a El-Rei nosso
novos remeiros em todas as aldeias, cheguei a 7 do
Senhor em conservarem os Índios a que não fujam
dito mês à de São Paulo que é populosa, cujo Principal
para os matos porque é sem dúvida que se os
se chamava Leopoldo; todos aqui são batizados pelo
Missionários não foram já muitas aldeias não
Padre Samuel; daqui parti para cima tão mortalmente
existiram. Todos os Solimões usam de muitas
enfermo que em dia de Santa Apolônia vendo meu
mulheres, todos são de beiço furado, e as fêmeas
companheiro que também ia doente mas com algum
de mais a mais fazem tão grandes buracos nas
orelhas que lhe cabe por elas uma bola de fogo de alento mais que os remeiros de 16 que eram estavam
Aro; usam o mesmo vestido que no Rio Negro, e 13 doentes, e que a correnteza do rio já
aldeias que donde não vi mais cobertura que a de veementíssima, me perguntou com assaz sentimento,
nossos primeiros pais trouxeram no paraíso terreal se eu queria que nos aproveitássemos das águas para
em que se conservaram em graça. Todas as aldeias voltar para baixo, para que levando-me Deus me
se alagam no inverno, exceptuando a da Missão de enterrasse em terra firme; respondi a isto que a tibieza
Santa Tereza, porque como o Juma faz muito dano do meu espírito me ditou, e prosseguindo a jornada
na terra firme procuram os Solimões segurarem as cheguei a 12 do mês à Aldeia de Nossa Senhora de
vidas, vivendo nas Ilhas do Rio das Amazonas, e Guadelupe, e a 19 à Aldeia de São Joaquim,
quando estão alagadas andam de umas casas para metrópole das Missões do Padre Samuel; e a 21
as outras em canoas; e eis aqui porque as Igrejas quarta feira de cinza cheguei à Aldeia de Santa Maria
são de palmas, e os Missionários padecem tantas Maior; e aqui me recebeu o dito Padre mui
doenças. cortezmente mas com o susto que requeria ver ali
semelhantemente hóspede; e eu em o gosto de ver
A 22 do mesmo janeiro cheguei à primeira
que tinha chegado ao fim da minha jornada recobrei
aldeia de Cambebas assim chamados por terem a
alguns alentos na saúde.
cabeça chata à maneira de mitras, com as testas
amolgadas para dentro, cujo malefício lhe fazem Aqui então lhe mostrei quão frívolos eram os
assim que nascem, donde vem terem todos seu fundamentos com que pretendia ampliar os
senão nos olhos; é tanto o mosquitos nestes domínios de Castela; porque assim no número dos
distritos que parecem andam estes pobres cobertos graus, como nos rumos das demarcações tinham
de lepra; e quando isto sucede aos naturais, que os Sumos Pontífices em suas Bulas favorecido muito
padeceram por aqui os pobres Missionários? A mais do que ele dizia no seu manifesto aos
Deus ofereço eu o que me coube à minha parte Sereníssimos Reis de Portugal; mostrei-lhe também
desta mortificação. Não usa cada um mais do que como nós os Portugueses tomamos posse daqueles
de sua mulher e elas todas usam de panos para se Sertões no ano de 1639 metendo o marco que divide
cobrirem logo desde meninas, circunstâncias estas as duas Coroas junto ao Encavilhado, que é muito
que para a sua redução dão mui boas esperanças. mais acima donde o Padre agora missiona, para cujo
Fui pelo rio acima praticando todas as aldeias efeito se mandara uma tropa do Pará a Quito, em
desta Nação, que fazem número de 30, e em todas que fora por Cabo Pedro Teixeira, e em sua
achei machados, facas, velorios, traçados e vestidos companhia Fernão Mendes Gago, Manoel Cordeiro
dos Portugueses, que de mão em mão se passavam Jardim, e Luís Mendes, dos quais só o primeiro eu
aqueles distritos, e não vi nada que fosse de não conheci, e o último hoje vive; a vista do que
Castelhanos, mais que na 13ª aldeia uma caixa de acrescentava eu, tão fora estava de nós os
guerra que havia dado o Padre Samuel àquele Carmelitas estarmos fora dos nossos limites nas
Principal, o qual ainda que pagão me disse assim Missões dos Solimões que com sua Pde [propriedade]
que me viu ‘Alabado sea el Santísimo Sacramento’. estar quase 300 léguas acima ainda estava dentro
Aproveitando eu destes instrumentos que via das demarcações dos Portugueses donde o
portugueses nas suas mãos tão necessários para o consentíamos por não privar aquelas almas do pasto
seu modo de viver lhe perguntava que cousas tinham espiritual mas que a sua assistência nada era em
que tivesse sido dos Castelhanos, e como me prejuízo da nossa posse; porque a mesma podia ele,
responderam que nada os concluía dizendo-lhes que vir fazer dentro à Cidade do Pará, quando fosse
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 251

servido vir nos pregar de Missão. Adverti-lhe qual o [rincões] muito ocultos, em climas mui nocivos, e
fim que um Missionário devia ter no seu Ministério tudo isto os defende, assegura, e afoita o viverem,
era reduzir almas para Deus, e não pregar os graus não como é bem, senão como querem; sendo
e terços das demarcações, e intimei-lhe finalmente necessário um Padre Missionário que vive entre estes
que daquelas quatro aldeias que missionava não brutos tolerar-lhe este seu modo de vida sob pena
descesse para baixo, porque havia ordem para vir de acabarem de uma violenta morte; esperando
preso para este Reino, e então lhe fiz presente a carta sempre que o tempo juntamente com o seu desvelo
de Sua Majestade, que Deus guarde, as Ordens do abra os olhos a este gentilíssimo, cuja fé está ainda
Governador, e o Assento da Junta, a que ajuntei mais tão pouco radicada e tanto no princípio de sua
carta que lhe escrevi [sic] o Padre Antônio Coelho, instância, que querendo eu na Missão de São José
Superior da Companhia de Jesus, em que lhe dava batizar uma menina que estava doente não queria o
conta de tudo o que na dita Junta se tinha decidido; Pai que o fosse senão em uma pouca de água que ele
e lhe recordava visse nos Estatutos da Companhia trazia de sua casa; é sabida a razão era porque em
se incorria ou não nas penas da Congregação 5ª, umas doenças malignas que houveram naquela
decreto 79 com as explicações que fez a Congregação aldeia tinha o Missionário batizado 27 crianças in
7ª, decreto 46. E com tudo isso ficou o Padre Samuel articulo mortis, e como assim morreram todas, meteu-
tão amedrontado e receoso que até agora não desceu se-lhe na cabeça que o batismo os matava, e por isso
mais pelo rio abaixo, que era o principal intento deste este não queria que eu lhe batizasse a filha, senão
negócio; em que tive também sucesso, que o consegui naquela água, porque lha tinha benzido, ou para
sem faltar à urbanidade religiosa entre os limites de melhor dizer amaldiçoado. Um feiticeiro que havia
toda a modéstia e cortezia; e assim me constou o naquela aldeia lhe segurava que naquela água não
depois que o dito Padre me fazia mui carinhosas e perigava a sua filha.
honrosas ausências, que pagarei sempre com A novidade que há naqueles sertões é que os
publicar suas muitas virtudes certamente é um varão
Missionários dos Solimões não se contentando com
apostólico dotado de um zeloso e caritativo espírito,
os descobrimentos que fizeram a quatro anos pelo
por isso sentia estar ali havia tantos anos sem a sua
Rio Joruá, de que logo então avisei e fiz especial relação
imitação virem mais Missionários, e se queixava dos
foram o ano passado pelo Rio Jubará acima, que como
Castelhanos serem neste particular mui remissos,
que a sua intenção foi ampliar tanto aquelas Missões, já disse fica à mão direita do das Amazonas, e
que tinha já 9 signos para elas. navegando de ilha em ilha e de lago em lago já por
água branca, já por água preta, mas toda doce, no
Naquela sessão estava só porque seu fim de 6 semanas vieram sair ao Rio Negro que fica
companheiro o Padre Wenceslao Braer tinha ido a 200 léguas mais abaixo do Rio Jubará, e acharam em
Quito pelo Rio Negro, que corre circunvizinho a esta todas estas ilhas inumerável gentio que nunca tinha
Missão da parte direita do Rio das Amazonas, e me visto brancos, e com todo ele tiveram práticas que
disse ele que tinha levado o treslado do seu manifesto também foram importantíssimas por que por esta
à Audiência Real de Quito, dali distante 35 dias de parte é que os Holandeses de Syrinhame introduzem
jornada pouco mais ou menos, que creio que para
o seu negócio e comércio.
nós os Portugueses não serão tantos, porque
navegamos de dia e de noite, o que não fazem os No Rio Negro catequizou o Frei Joam Evangª
Castelhanos. Não sei agora se em Quito foi bem ouvido que agora é Vigário Provincial, a Nação dos
o Padre Wenceslao, porque a muita distância que vai Carapitenas que é mui guerreira e fazia muito dano
do Pará àquela Cidade embarga toda a notícia. aos habitantes daquele rio, e já lhe mandou
Missionário para os aldear, o que ele começava a fazer
Despedi-me do Padre Samuel a 23 de fevereiro
no tempo que lhe foi preciso descer para baixo e tomar
e era já neste tempo tal a correnteza do rio que em
posse do Governo daquela Vigairaria. Com que cada
7 dias desandava o caminho que para cima tinha
vez se dilata aquela Seara, e os obreiros cada vez são
feito em 35. Recolhi-me ao meu Convento do Pará
menos, porque uns morrem, outros vem em tal estado
em sábado de Ramos 31 de março, donde já me
que não podem voltar para cima, os que lá mandamos
faziam morto pelas novas que tinham vindo do
ordenar pela maior parte, ou os deixam ficar nesta
Sertão. Trouxe em minha companhia dois filhos de
Província de Portugal, ou se lhes concede licença para
dois Principais Cambebas cabeças chatas, que foram
irem para outras partes do Brasil; ao que sua
os primeiros que viu o Maranhão e Pará, os quais
Majestade, que Deus guarde, deve mandar atender
depois de estarem em minha companhia ano e meio
por serviço de Deus, e seu, bem da minha Religião e
e saberem já a língua geral e portuguesa muito bem
os mandei para as suas terras, um feito Capitão, aumento daquelas Missões.
outro Ajudante por Patente do Governador, vestindo- E no mais que podia dizer neste particular me
os e aviando-os à minha custa; e vendo os seus remeto a outro papel que em 28 do mês passado fiz
parentes tão acrescentados se oferecem já para por superior mandato que para isso tive, o qual me
virem com os Missionários ao Pará, porque viram obrigou também a fazer este com todas as miudezas
também que estes dois cá embaixo não adoeceram, que nele escrevo, que permita Deus de maior
o que era o seus pais mais abusam tanto do que se número e o domínio Português seja mais amplo, o
lhe tem ensinado, que achei alguns batizados, que tudo se verá se no Estado do Maranhão o
casados por seus diabólicos ritos com dez, doze espiritual se governar por eclesiásticos zelosos, e o
mulheres pagãs; sem que desta cegueira os possa temporal por Ministros desinteressados.
apartar nem o interesse do céu, nem o temor do
inferno, e muito menos o das armas Portuguesas; Carmo de Lisboa, de setembro 7 de 1705.
porque vivem em Sertões mui remotos em [rin]coins FREI VITORIANO PIMENTEL.”
252 A Relação de Frei Vitoriano Pimentel sobre as Missões do Rio Negro e Solimões (1705)

Recebeu Frei Vitoriano em resposta a seguinte carta de El-Rei:

“Frei Vitoriano Pimentel – El-Rei vos envio muito saudar. Mandando ver pelo meu Conselho
Ultramarino e junta das Missões a relação que mandastes da jornada que fizestes ao sertão a
impedir ao Padre Samuel Friz [sic] as descidas que fazia pelo Rio das Amazonas abaixo e de como
praticastes e sujeitastes todo esse gentio; Me pareceu agradecer-vos por esta o bem que vos houvestes
nesta diligência em que padecestes tantos trabalhos. Escrita em Lisboa a 15 de junho de 1706.
REI.
Para o Vigário Provincial do Carmo do Estado do Maranhão Conde de Elvas.
Por El-Rei
A Frei Vitoriano Pimentel Vigário Provincial do Carmo do Estado do Maranhão – 1ª Via.”

Referências
Fritz, S., 1918. O diário do Padre Samuel Fritz. Com introdução e notas de Rodolfo Garcia. Revta Inst. hist.
geogr. brasil. 81: 353-397.
Fritz, S., 1922. Journal of the travels and labours of Father Samuel Fritz in the river of the Amazons between
1686 and 1723. Translated from the Evora MS and edited by the Ver. Dr. George Edmundson. Hakluyt
Society, London. [Reedição facsimilar pela Klaus Reprint Ltd., 1967).
Maroni, P., 1889-1892. Noticias auténticas del famoso río Marañón y misión apostólica de la Compañía de
Jesus de la provincia de Quito en los dilatados bosques de dicho río. Escribíalas por los años de 1738 un
misionero de la misma Compañía y las publica ahora por primera vez Marcos Jiménez de la Espada. Boln
Soc. geogr. Madrid 28: 175-203, 383-454, 1889; 29: 73-119, 220-266, 1890; 30: 111-161, 193-235, 381-
405, 1891; 31: 22-77, 235-282, 1891; 32: 113-143, 1892; 33: 24-79, 1872.
Pimentel, V., 1983. Relação que faz Frei Vitoriano Pimentel das missões do Rio Negro e Solimões. Anais Bibl.
Arqu. públ. Pará, Belém 13: 402-416.
Porro, A., 1993. As crônicas do Rio Amazonas. Tradução, introdução e notas etno-históricas sobre as antigas
populações indígenas da Amazônia. Vozes, Petrópolis.
Capítulo 20

“A CRUISING VOYAGE”
DE WOODES ROGERS (1712)

U m “Account of Brazile” aparece às pp. 52-58 do livro “A Cruising Voyage”, de Woodes


Rogers (1712), seguido por uma descrição do Amazonas, que continua até a p. 74. O autor deve
citar animais, pois, como se verá logo em seguida, ilustrou um jacaré. Com efeito, Moraes (1983:
744-745) comenta: “This first edition [1712] is very rare. The second edition, with the same collation,
was published in London by Andrew Bell in 1718. A third edition marked ‘Second edition corrected’
was printed in London for Bernard Lintot; this differs from the other editions in that it has a new
title page and two plates, on pages 62 and 101, depicting an alligator and a crocodile. The maps
are the same.”

Falando da edição francesa de 1716, Moraes (1983: 745) comentou:

“Rogers was in command of an expedition ‘un petit nombre de figures pour s’accomoder au
consisting of two ships, the ‘Duke’ (flagship) and goût qui règne aujourd’hui’, but since ‘... le
the ‘Dutchess’ (commanded by Captain Edward volume seroit trop gros, s’il n’en faisoit qu’un
Cooke who also left an account of the voyage). seul, de sorte que pour en former deux
The expedition left Bristol in 1708 and returned raisonnables, il y a joint une Relation curieuse
home in 1711 after circumnavigating the world. des Amazones du Père d’Acuna, le Voyage des
The ships called at Angra dos Reis in Brazil in Pères Guillet et Bechamel à la Guyane & une
November 1708. Rogers and Cooke were well relation de ce dernier Païs...’. From the Brazilian
received by ‘Governor’ Rafael da Silva Lago and point of view this French edition is therefore
attended the procession commemorating the feast preferred to the original English edition as in
of Our Lady of Conception. Rogers describes the addition it contains the entire contents published
city and recounts many picturesque incidents. in the two volumes of the French Acuña edition
Pages 86-112 contain a description ‘du Brésil en of 1682. It is not, however, an exact reproduction
général, & de la manière dont les Hollandois le as it has been modified in places by the
perdirent. De la Rivière des Amazones...’. The translator. Two of the plates in this edition are
description is compiled from several works, of Brazilian interest: one is entitled ‘Habitans du
especially that by Nieuhof, which Rogers had Brésil et du pais des Amazones’, and the other,
taken with him on the voyage. Rogers’s work without a title, depicts a procession at Angra dos
became famous not merely because of the Reis. It contains a large map of the Amazon and
humour with which it was written but also part of South America made by Guillaume de l’Isle
because it contained a long account of a Scottish from the descriptions of Herrera, Laet, Acuña and
sailor who, having quarrelled with his captain, Father Manuel Rodriguez. This edition does not
was abandoned by him on Juan Fernandez Island reproduce Father Samuel Fritz’s map which
where he lived alone for four years and four appears in the Acuña. This edition is the first of
months until Rogers found him and brought him the French translations. It is sometimes bound
back. This sailor, called Alexander Selkirk, was in three volumes. A second edition exists printed
the prototype for Robinson Crusoe in Daniel in Amsterdam by Honoré et Chatelain, 1723, the
Defoe’s famous book. Roger’s narrative of the Supplement of which is that of the Veuve Marret
adventures of the future ‘Robinson Crusoe’ is very dated 1716. Roger’s voyage was translated into
curious and picturesque. This French edition is Dutch and published in Amsterdam in 1715,
a transation of the original English edition. The illustrated with 4 maps and 4 plates. This work
editor explains in the preface that, in addition to is sought after and uncommon and is rare with
the world map and the letters, he had engraved all the maps and plates”.
254 “A Cruising Voyage”de Woodes Rogers (1712)

O “Dictionary of Pirates” de Rogozinski (1995: 295-296) informa o seguinte:

“ROGERS, WOODES (English pirate, Pacific, cruising off Cape San Lucas. Rather than run out
Caribbean; 1679-1732) After a highly profitable raid of food, he reluctantly decided to leave for Asia. The
on South America’s Pacific coast, Rogers father, a next day, the lookout sighted Nuestra Señora de la
prosperous sea captain, moved from Poole to Bristol Encarnación Disengaño, the smaller of two ships
in about 1697. In 1705, Rogers married a daughter sent from Manila that year.
of the naval commander in the West Indies. He took
On January 1, 1710, the Duke captured the
over his father’s commander in the West Indies. He
Disengaño in a running gunfight. During the battle,
took over his father’s business interests and sent
a musket ball pierced Roger’s left cheek and
out PRIVATEERS to raid French shipping during
smashed out much of his upper jaw and many teeth.
the War of the Spanish Succession.
The Disengaño carried valuable Chinese goods and
T o encourage private looting of enemy news that the even richer Nuestra Señora de Begoña
commerce, the English government in 1708 gave was not far behind.
up its 20 percent share in their booty. Rogers
The Dutchess and Marquis sighted the Begoña
proposed an expedition to plunder South America
on January 4, and the battle continued for three
and to capture the MANILA GALLEON. Basil
days. Despite his wound, Rogers and the Duke joined
RINGROSE and William DAMPIER had recounted
the fight on January 6. But the 900-ton Begoña
buccaneer attacks along the same coast. Rogers
carried guns throwing 12-pound shot, twice the size
avoided the failures they described by careful
of the largest English shells. Rogers estimates that
planning and tight discipline.
at least 500 shots struck her strong hull without
Wealthy merchants in Bristol generously piercing it.
privisioned two 100-ton FRIGATES, and the 333
The Begoña’s passengers and 450 crewmen
English and Dutch crewmen received wages as well
resisted fiercely. Rogers writes that ‘150 of the Men
as shares in the BOOTY. Rogers commanded the
on board this great Ship were Europeans, several of
Duke, with Thomas Dover as second captain.
them had been formerly Pirates, and having now got
Stephen Courtney and Edward COOKE took charge
all their Wealth aboard, were resolved to defend it to
of the slightly smaller Dutchess. William Dampier
the last’. The Begoña’s defenders dropped firebombs
was pilot and navigator, and a council of officers
onto the lower English vessels. One exploded some
decided major issues.
ammunition on the Duke. A splinter entered Roger’s
Despite his relative inexperience, Rogers left foot, ‘part of my Heel bone being struck out and
proved a superb commander. Both brave and all under my ankle cut above half thro’.
physically tough, he won the support of his officers
through honesty and diplomacy. They also received Rogers broke off the attack on the Begoña
a generous alcohol ration, since Rogers knew that before his ships were destroyed. The Disengaño,
‘good liquor to sailors is preferable to clothing’. But renamed the Batchelor, was added to his squadron.
discipline was strict and maintained with the CAT Sailing in January 1710, Rogers returned to England
O’ NINE TAILS. A mutiny early in the voyage – Rogers in Octover 1711 via Guam, Java, and the Cape of
refuted to loot a neutral vessel – was formally Good Hope. The ships and booty were sold in 1713
suppressed, and gambling was forbidden. for nearly £ 150,000. Of the owner’s two-thirds, half
went on expenses (including bribes), but the net
The two ships left Ireland in September 1708,
profit was nearly 100 percent. Ordinary seamen got
took a Spanish prize in the Canaries, and entered
their wages, whatever PLUNDER they had picked
the Pacific around Cape Horn. In Februry 1709, they
up, and about £ 200 each in booty. As a captain,
rendezvoused at the JUÁN FERNÁNDEZ ISLANDS
Rogers received more than £ 1,600 but went
and rescued Alexander SELKIRK, the original
bankrupt before the money was distributed.
ROBINSON CRUSOE. To maintain secrecy, Rogers
avoided ports in Chile and Peru. He captured several Rogers published A Cruising Voyage Round the
Spanish and French prizes, keeping the largest as World in 1721. Although based on his journal, the
the Marquis. Guayaquil, Ecuador, was taken by book was edited by a professional author and
surprise in May. Atrocities were avoided, as Rogers’ perhaps by Daniel DEFOE. It was widely successful,
men pillaged the town and collected about 27,000 and served as a guidebook for later expeditions.
pesos in ramson. Fr om late 1713 to mid-1715, Rogers
Rogers learned that PANAMA was prepared for commanded a ship carrying slaves from Africa to
invasion. With stops at the Galápagos and Gorgona Sumatra. On his retur n, he unsuccessfully
Islands, he made for Lower California to await the recommended the creation of a law-abiding colony
Manila Galleon. His three ships and a captured bark at MADAGASCAR. He had more success with a
rendezvoused in October and spent seven weeks similar plan for the pirate base in the Bahamas.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 255

Late in 1717, the lords-proprietors of the Captain Cockram, were sent in pursuit. Although
Bahamas leased their property rights to Rogers for he had no authority to do so, Rogers convicted Augur
21 years. Rogers was named the first royal governor and eight others on December 16 and hanged them
and empowdered to pardon pirates surrendering the next day. Early in 1719, Rogers FLOGGED three
before September 1718. However, he did not receive islanders, who were plotting to murder him.
a salary, and he and other private investors paid After this rigorous and speedy justice, pirates
for the troops and settlers sent to the islands. avoided New Providence, but Rogers faced other
Rogers arrived at NEW PROVIDENCE threats. England went to war with Spain in December
ISLAND in July 1718, accompanied by a royal 1718, and a strong Spanish force attacked in
frigate, and two sloops. Under the warship’s guns, February 1720. The presence of English ships
only Charles VANE put up any resistance. Some prevented a frontal attack, and the musket volleys of
pirates left for other ports. Several hundred the former pirates repelled a landing east of Nassau.
accepted the royal pardon and were given jobs English officials ignored the Bahamas, and
building a fort and clearing roads. However, as Rogers returned in February 1721 to ask for aid.
Daniel Defoe put it, ‘it did not much suit the But his partners and the government refused to pay
inclination of the Pirates to be set to work’’. Many for the defense of New Providence. He was
sneaked away and resumed their former trade. imprisoned for debt and forced into bankruptcy.
When John AUGUR was sent for provisions, he
Roger’s successor as gover nor was less
instead pillaged two vessels and MAROONED their
forceful, and his overbearing wife monopolized
crews on an unhinhabited cay. retail trade. Rogers was reinstated as governor in
Since the three royal warships had left, two October 1728 and granted a salary. He died at
other ex-pirates, Benjamin HORNIGOLD and a Nassau in 1732.”

Referências
Moraes, R. B. de, 1983. Bibliographia Brasiliana. Rare books about Brazil published from 1504 to 1900 and
works by Brazilian authors of the Colonial Period. 2 vols. UCLA Latin American Center Publications,
University of California, Los Angeles & Livraria Kosmos Editôra, Rio de Janeiro.
Rogers, W., 1712. A cruising voyage round the world: First to the South-Sea, thence to the East-Indies, and
homewards by the Cape of Good Hope. Begun in 1708 and finish’d in 1711. Containing a journal of all the
remarkable transactions particularly of the taking of Puna and Guiaquil, of the Acapulco ship, and other
prizes; an account of Alexander Selkirk’s living alone four years an for months in an island, and a brief
description of several countries in our course noted for trade, especially in the South Sea. With maps of all
the Coast, from the best Spanish manuscript draughts and an introduction relating to the South Sea trade.
By Captain Woodes Rogers Commander in Chielf on this Expedition, with the ships Duke and Dutchess of
Bristol. Printed for A. Bell at the Cross-Keys and Bible in Cornhil, and B. Lintot. London.
Rogers, W., 1716. Voyage autour du monde commencé en 1708 et fini en 1711, par le capitaine Woode Rogers.
Traduit de l’anglois... où on a joint quelques pièces touchant la Rivière des Anazones et la Guiane. 2 vols.
Chez la Veuve de Paul Marret, Amsterdam.
Rogers, W., 1769. Vierjährige Reise nach Südsee von da nach Ostindien und weiter rumdum die Welt. Gethan
unter dem Schifspatron Kapitain William Dampier. Englisch gescrieben von seinem Gefährten Woodes Rogers,
Commandeur en Chef zweyer englischen Schiffe. Wegen ihrer Merkwürdigkeit aufs neue aus dem Original
herauss gezogen, und mit schönen Kupfern gezieret. Frankfurt & Leipzig.
Rogozinski, J., 1995. The Wordsworth Dictionary of Pirates. Wordsworth Editions, Ware, Hertfordshire.
Capítulo 21

A VIAGEM DE LA CONDAMINE (1743)

C harles Marie de La Condamine nasceu em Paris em 28 de janeiro de 1701. Começou muito


jovem a carreira militar e rapidamente a abandonou, dedicando-se às ciências físicas e naturais.
Era atraído sobretudo pela geografia e viagens. Em 1731, após sua eleição para a Academia de
Ciências (1730), participou da viagem científica de Duguay-Trouin pelo Mediterrâneo, que explorou
metodicamente a costa norte-africana e o litoral da Ásia Menor. Essa missão foi muito útil ao
jovem La Condamine, que experimentou uma metodologia de investigação. Foi designado pela
Academia de Ciências para medir um arco do meridiano no Equador. Maupertuis teria que fazer a
mesma medição na Lapônia. Ambas serviriam para confirmar a previsão de Newton de que a Terra
era achatada dos polos em direção ao equador.
O navio de guerra Portefaix largou de La Rochele a 16 de maio de 1735, levando a bordo a
tripulação e dez cientistas: Louis Godin, chefe nominal, e Pierre Bouger, ambos matemáticos e
astrônomos; Joseph de Jussieu, naturalista e médico; Couplet, geógrafo auxiliar; Hugot, relojoeiro;
Verguin, engenheiro; Morainville, técnico; Godin des Odonais, técnico; Seniergues, cirurgião; e La
Condamine. Ao desembarcarem em Cartagena de las Índias, na atual Colômbia, foram recebidos
com grande cortesia pelos funcionários espanhóis. Dois tenentes da Marinha espanhola – Jorge
Juan de Santacilla e Antonio de Ulloa, foram colocados à disposição dos franceses e encarregados
de vigiá-los.
A expedição devia atravessar o istmo do Panamá. Após uma viagem por mar entre Cartagena
e Porto Bello, na costa oriental do istmo, os exploradores foram pelo rio Chagres até Cruces; dali,
chegaram a pé ao Panamá, onde embarcaram para Manta e Guayaquil.
La Condamine, acompanhado de Bouger, deixou a expedição quando esta chegou a Manta,
na costa do Pacífico, a fim de começar seu trabalho de medida entre Manta e Quito: nos desertos
de Manabi, os cientistas observaram, em março de 1736, um eclipse de Lua, e determinaram
assim a posição exata daquela costa, situada no lugar mais ocidental da América do Sul, fazendo
medidas que permitiriam a retificação de todos os mapas anteriores. No trajeto, La Condamine
encontrou Pedro Vicente de Maldonado, explorador, educado no colégio dos jesuítas de Quito,
cartógrafo do Império colonial espanhol, matemático e bom conhecedor da terra, seus habitantes
e suas línguas; sua colaboração e amizade seriam muito preciosas para o cientista francês. Bouger
partiu de novo para Quito, enquanto La Condamine e Maldonado tomaram uma rota inexplorada
ao longo do rio Esmeraldas, onde descobriram a borracha. No México, Cortés já vira os astecas
jogar com bolas de borracha dura e elástica; Pedro Mártir e o cronista espanhol Juan de Torquemada
também haviam falado no assunto, mas seu relato não tivera continuidade. La Condamine descobriu
também a platina. A partir de Esmeraldas, a escalada dos Andes até Quito, sob chuva, exigiu os
maiores esforços. Assim que chegaram a Quito, La Condamine e Maldonado iniciaram os trabalhos
com os outros cientistas, mas foram interrompidos durante oito meses pelo governo local: a
expedição era suspeita de procurar tesouros incas! Com seus teodolitos, cadeias de agrimensura
e demais instrumentos, os exploradores mediram, levantaram mapas, determinaram temperaturas,
variações da pressão atmosférica, magnetismo terrestre, gravitação, velocidade do som e uma
série de outros dados.
Em 1739, chegaram a Cuenca, na época a segunda cidade de Quito, com 20 mil habitantes.
Ali, os viajantes foram informados de que a expedição de Maupertuis, enviada à Lapônia, cumprira
sua tarefa, obtendo resultados que confirmavam a tese de Newton: a Terra era realmente achatada
nos polos. Assim, a glória da primazia escapava aos membros da expedição do Peru. Os habitantes
de Cuenca, hostis aos franceses, suspeitos de buscar tesouros, assassinaram o Dr. Seniergues,
que tomara partido numa desavença que opunha duas famílias da cidade. Algum tempo depois do
motim, os tenentes Juan e Ulloa foram chamados de volta a Lima, pois eclodira uma guerra entre
Espanha e Inglaterra: duas frotas britânicas haviam sido enviadas à América do Sul; a primeira
capturara uma frota espanhola e a segunda fora rechaçada. Esses episódios acentuaram a
desconfiança da Espanha e dos habitantes das colônias, que sentiam a avidez agressiva dos
258 A Viagem de La Condamine (1743)

países europeus em relação aos territórios que eram seus. Um fidalgo de Quito, ignorante e rude
como eram na época muitos representantes da ‘nobreza’ nativa americana, chegou a perguntar:
‘O que, senão um ganho considerável, poderia incitar pessoas de categoria a levar uma vida tão
miserável, tão extraordinária e tão fatigante, a atravessar montanhas e desertos, a observar
estrelas?’
Outra prova de hostilidade dos espanhóis foi a destruição das pirâmides com as quais os
observadores haviam marcado a linha de base da triangulação. La Condamine e seus
companheiros foram arrastados ao tribunal. O julgamento só se realizou em 1742. A partir daí,
cientistas espanhóis deveriam ter seus nomes acrescentados aos documentos, e a bandeira com
as flores-de-lis deveria desaparecer. Então, em março de 1743, Bouger abandonou os trabalhos
que fizera com La Condamine, e embarcou em Cartagena para a França. La Condamine, liberado
de suas obrigações, resolveu aceitar as propostas de Maldonado: descer o Amazonas até o
Atlântico. Os dois exploradores dirigiram-se ao rio por Loja, onde recolheram sementes de quina,
e por Borja. Graças ao irmão mais velho de Maldonado, padre jesuíta, La Condamine entrou em
contacto com os jesuítas de Quito e teve acesso a arquivos secretos: viu ali o mapa da Amazônia
traçado pelo padre S. Fritz. Em 11 de maio de 1743, deixou Tarqui para juntar-se a Morainville
e Maldonado em La Laguna. A conselho de um amigo de Cuenca, não tomou o caminho habitual
para sair da cidade, evitando assim a emboscada que lhe armara León, o assassino de Seniergues,
que esperava retomar-lhe as peças e testemunhos do processo. Em La Laguna, La Condamine
encontrou apenas Maldonado, pois Morainville desaparecera entre Quito e La Laguna; nunca
mais foi visto!
La Condamine empreendeu a descida do Amazonas com Maldonado. Ao estudo aprofundado
do rio, que lhes tomava toda a atenção, os viajantes acrescentaram observações sobre os índios,
bem como a flora e a fauna que os rodeavam. Descobriram espécies desconhecidas na Europa,
como o golfinho de água doce ou o peixe-boi, e plantas utilizadas pelos indígenas de um modo que
fascinou La Condamine: especialmente o curare, veneno mortal com o qual os índios untavam
suas flechas, e outros produtos extraídos de plantas ou de peixes, e que serviam de inseticida,
medicamento, alimento, pintura ou talismã. Chegou à confluência do Amazonas com o Negro, em
agosto de 1743. Os exploradores reencontraram a civilização em Manaus. La Condamine deixou
Manaus no fim de setembro de 1743, dirigindo-se ao Pará, onde chegou dois meses depois. Chegou
a Caiena, finalmente, em fevereiro de 1744, de onde só embarcou para a França em agosto desse
ano, chegando a seu país em novembro.
Em 1745(a) foi publicado na Holanda, em Amsterdam, seu Extracto del diario de observaciones
hechas en el viage de la Provincia de Quito al Para, por el Rio de las Amazonas: Y del Para a
Cayana, Surinam y Amsterdam (republicado facsimilarmente em Quito, 1993) [Figuras 20.1 e
20.2]. Explica-nos Moraes (1983: 445), que,

“In the ‘Aviso al lector’ La Condamine explains that when returning home from his expedition
at the end of October, 1744, with the coast of France in sight, and thinking that he would arrive
in time to attend the section of the ‘Académie des Sciences’ of 14 November, he began to write a
shortened account of the observations he made during his return journey from Quito to Pará.
But storms and unfavourable winds prevented him from landing on time. On arriving in Amsterdam,
where he waited for his passport in order to continue to Paris, he finished writing the account,
and decided to translate it into Spaniard and have it printed to be sent to his friends in America
in ackowledgment of the many kindnesses he had received. He writes that he only required
copies to be printed for this purpose (‘no se tiraron mas exemplares que los destinados a este
fin’). He ends by begging indulgence for the imperfect translation and for the inexactitude of the
scientific facts, as, owing to the circumstances in which it was compiled, he was unable to verify
what he had written with his papers and he had not yet drawn his map of the Amazon. He
intended the French text to be read in the Academy of Sciences during the session after Easter.”

A 28 de abril de 1745 leu, perante a Academia de Ciências de Paris, a Relation abrégée d’un
voyage fait dans l’interieur de l’Amerique Meridionale depuis la côte de la Mer du Sud, jusqu’aux
côtes du Brésil & de la Guyane, en descendant la rivière des Amazones, publicado nesse mesmo
ano (1745b). (Minguet, in La Condamine, 1992: 9-16).
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 259

Figura 21.1. Frontispício do Extracto del diario de observaciones hechas


en el viagem de la Provincia de Quito al Para, por el rio de las
Amazonas, de Charles Marie de la Condamine (1745).
260 A Viagem de La Condamine (1743)

Figura 21.2. Facsimile da primeira página de texto do Extracto


de Charles Marie de La Condamine (1745).
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 261

Diz ainda Moraes (1983: 445):


“After printing the Extracto del Diario the publisher arranged that a leaf be printed, in
February, 1746, bearing a ‘Segundo aviso al lector....’, in which he states that he still had in his
possession the manuscript of the Extracto del Diario, which had been printed without any revision,
either by the author or by someone capable of correcting the errors in the translation, and the
work had appeared with many mistakes. He was therefore publishing an errata of the most
important errors. As at that time the French edition with the map had been printed in Paris, the
Dutch publisher attached a copy of this map to the Extracto del Diario.
This work is very rare and little known”.

O Extracto del Diario foi editado facsimilarmente em 1993, em Quito (La Condamine, 1993).
A Relation apareceu, ainda no século XVIII, em holandês (1746), inglês (1747) e alemão (1763).
La Condamine publicou, além disto, outras obras sobre sua viagem (1751a-b, 1752, 1778, s.d.).
Uma edição espanhola foi publicada no século XIX.

Quanto aos outros membros da expedição, comentou Moraes (1983: 446):


“This expedition became famous not only for its scientific findings, but also for a series of
tragic and picturesque circumstances which accompanied it, some attributable to chance and
others to the conflicting temperaments of the members.

After their return to France, Bouger, a man of uncertain temper, engaged in a controversy
with La Condamine which became famous and impassioned both learned and laymen. (Bouger
published the results of the expedition in a work printed in Paris, in 1749, entitled La figure de la
terre, determinée par les observations de Messieurs Bouger & de la Condamine... envoyés par
ordre du Roy au Perou pour observer aux environs de l’Equateur. Avec una relation abrégée de ce
voyage...).

Another member of the expedition, Louis Godin, a notable astronomer, was forced to remain
in Lima at the insistence of the viceroy in order to teach mathematics there. He was present at the
earthquake of 1746 which destroyed the city. Later, on returning to Europe to accept the position
of Director of the Maritime Academy in Cadiz, he witnessed the earthquake that destroyed Lisbon.

Joseph de Jussieu remained in Peru for thirty-six years, teaching and studying. He returned
to France an old and tired man without the strength to publish the results of these years of
observation.

Godin des Odonais, a young engineer from Berry, did not return to France with the expedition.
He married a wealthy heiress of Rio-Bamba in Quito, and after eight years of marriage, having
spent his wife’s entire dowry, he decided to make his fortune in the Guyanas. He sailed down the
Napo and Amazon Rivers, and lived for many years in Cayenne and Oyapock. Because of the
Seven Years War he was unable to return to Peru. He studied the wealth of the colony, and
attempted to acclimatize the Peruvian quinine and cinnamon. He also proposed to the French
government a plan for the navigation of the Amazon.

In 1770 Madame des Odonais, who had remained in Peru (separated from her husband for
twenty years) and whose eldest daughter had just died, decided to journey to her husband’s side.
She left Peru in the company of two brothers, a French physician, and Indian and Negro servants.
After hair-rising adventures in which all of her companions perished, she managed to reach
Loreto alone. From there she sailed down the Amazon in a Portuguese conveyance. She arrived in
Cayenne in 1773, met her husband, and together they returned to France. (For details of this epic
voyage, see Cortambert, Les illustres voyageuses, and a biography of Madame des Odonais by F.
Denis in the Magazin pitoresque, 1854).

Lastly, Seniergues, the surgeon of the expedition, was murdered in Cuencas. He became
involved with a woman, Madame Quesada, formerly attached to a certain Diego de León. Jealousy,
intrigue, and hatred of the foreigner lead easily to crime. La Condamine narrates this tragic
incident in the ‘Lettre... sur l’emeute populaire excitée en la ville de Cuenca...”, which, with a
plate, accompanies his Relation.”
262 A Viagem de La Condamine (1743)

La Condamine dedicou à fauna o capítulo XII de sua Rélation, que aqui incluímos, com base
na tradução de 1944:
“XII. Os peixes. Peixe-boi. Mixano. Lampreia-torpedo. Tartarugas e jabotis. Ervas que embriagam
os peixes. Crocodilos. - Tigres. Pumas. Ursos? Alces. Coatis. - Os símios. Os sagüis. - Os répteis.
A cascavel. A coral. A mãe d’água. – O verme-macaco (berne). – Os morcegos. – Pássaros.O colibri.
O tucano. Papagaios e araras. Papagaios envermelhecidos. O cauitao. O pássaro-trombeta. (...).
Ainda não falei dos peixes singulares, que se Vi nas cercanias do Pará uma espécie de
descobrem no Amazonas, nem das diferentes lampreia, cujo corpo como de ordinário é furado por
espécies de animais raros que se vêem nas suas um grande número de aberturas, mas que tem demais
margens. Este título sozinho forneceria assunto para a propriedade do torpedo; aquele que a toca com a
uma obra, e tal estudo pediria uma viagem especial, mão, ou mesmo com um pau, sente um choque
e um viajante que não tivesse outra ocupação. Não doloroso no braço, e não raro cai por terra, segundo
falarei senão dos mais notáveis. dizem. Não testemunhei este último fato. (...).
Em São Paulo de Omáguas desenhei, do As tartarugas do Amazonas são procura-
natural, o maior dos peixes d’água doce conhecidos, díssimas em Caiena, como mais delicada que
a que os Espanhóis e Portugueses deram o nome qualquer outra. Há-as de tamanhos diferentes, e de
de ‘vaca-marinha’, ou de ‘peixe-boi. Não se há de diversas espécies, e em tão grande abundância que
elas sós e mais os ovos poderiam abastecer aos
confundir com a foca [veau-marin, em francês]. Este
moradores daquelas margens. Há-as terrestres, que
de que se trata pasta a erva das margens do rio:
se chamam jabotis na língua do Brasil, e que
sua carne e gordura têm bastante semelhança com
preferem no Pará às de outra espécie. Todas se
a da vitela. A fêmea tem tetas com que amamenta
conservam, e sobretudo as últimas, fora d’água vários
os filhotes. Alguns tornaram a semelhança com o meses, sem alimentar-se aparentemente.
boi ainda mais completa, atribuindo-lhe chifres que
a natureza não lhe deu. Ele não é anfíbio A natureza parece ter favorecido a preguiça
propriamente, pois que não sai d’água, nem pode dos Índios, e ter ultrapassado suas necessidades:
fazê-lo porque tem duas nadadeiras muito perto da os lagos e os mangues que se encontram a cada
cabeça, em forma de barbatanas de 126 polegadas passo nas proximidades do Amazonas, e não raro
no interior das terras, são enchidos de peixes de
de comprimento, e que lhe fazem as vezes de braço
todas as qualidades, nos tempos do extrava-
e pernas: vi depois maiores. Os olhos desse animal
samento; e quando as águas baixam, aí eles ficam
não estão em proporção com o corpo: são redondos
encerrados como em tanques ou reservatórios
e não passam de três linhas de diâmetro. O buraco
naturais, e onde se pescam com a maior facilidade.
de suas orelhas é ainda menor, e parece um furo de
alfinete. Alguns supuseram-no particular ao Rio das Na província de Quito, nos diversos países
Amazonas; mas não é menos vulgar no Orinoco. atravessados pelo Amazonas, no Pará e em Caiena,
Encontra-se também, ainda que menos encontram-se várias espécies de plantas, diferentes
freqüentemente, no Oiapoque, e em vários outros das que são conhecidas na Europa, cujas folhas
rios dos arredores de Caiena, e possivelmente ou raízes mergulhadas n’água têm a propriedade
de embriagar o peixe. Ele flutua na água, e é
alhures. É o mesmo que chamam ‘lamantin’ em
apanhado a mão. Os Índios, por meio dessas
Caiena e nas ilhas francesas da América; mas
plantas e de tapumes com que barram a entrada
suponho a espécie um pouco diferente. Não se
dos pequenos rios, pescam tantos peixes quantos
encontra no alto mar, e mesmo é raro nas
querem; fazem-nos defumar em caniços, para os
proximidades das embocaduras dos rios; mas ao conservar: raramente utilizam o sal para isso;
contrário, acha-se a mais de mil léguas do mar, na entretanto, os Mainas retiram sal fóssil de uma
maior parte dos grandes rios que desaguam no montanha vizinha do Huallaga; os Índios sujeitos
Amazonas, como o Huallaga, o Pastaza, etc. Ele aos Portugueses o buscam do Pará, onde é
não é detido senão pelo Pongo de Borja de que antes importado da Europa.
falamos. Mas tal barreira não é um obstáculo para
Os crocodilos são comuníssimos em todo o
outro peixe chamado Mixano, tão pequeno este
curso do Amazonas, e até na maior parte dos rios
quanto é o outro grande, não chegando alguns a
que vêm ter a ele. Alguns chegam a ter algumas
ter o tamanho de um dedo. Eles vêm todos os anos
vezes 20 pés [6,5 m] de comprimento; e talvez os há
em bancos quando as águas começam a baixar, maiores. Já tinha eu visto um grande número deles
pelos fins de junho. Não têm nada de singular senão no rio Guayaquil. Eles ficam horas e dias inteiros
a força com que remontam a contra-corrente. Como sonre o lodo, estendidos ao sol e imóveis. Seriam
o leito estreito os reúne necessariamente perto da tomados por troncos de árvores, or por longos
garganta, vêm-se atravessar em cardumes duma pedaços de pau cobertos de uma casca escabrosa e
margem para a outra, e vencer alternativamente dessecada. Como os das margens do Amazonas são
ora dum lado ora do outro, a violência com que as menos perseguidos e caçados, eles pouco temem os
águas se precipitam. Eles são apanhados a mão homens. Nos tempos de inundação chegam a
quando as águas estão baixas, nos poços dos penetrar nas cabanas dos Índios; e há exemplos de
rochedos do Pongo, onde eles repousam para que esse animal feroz tenha raptado um homem de
restaurar as forças, e de que se servem como se de sua canoa, à vista dos camaradas, e o tenha
patamares para subir. devorado, sem socorro possível.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 263

O mais perigoso inimigo do crocodilo, e talvez o quadrada, as orelhas pontudas e salientes como
único que ousa entrar em luta com ele, é o tigre. cães ou gatos, e não como os outros símios, com os
Deve ser um espetáculo raro o seu combate, o que quais pouco se parecem, poir têm antes o ar e o
só pode ser presenciado por feliz acaso. Eis o que os porte dum leãozinho. Eles se chamam pinchês em
Índios contam a tal propósito. O crocodilo põe a Mainas, e tamarins em Caiena. Tive vários, que não
cabeça fora d’água para abocar o tigre quando ele pude conservar; são da espécie chamada saguins
vem dessedentar-se: é como ele faz em semelhante na língua do Brasil, e ‘sagoins’ por corrupção em
caso com os bois, cavalos, mulos, e tudo que se lhe francês; Laet fala deles, e cita l’Ecluse e Lery. Aquele
aprresente. O tigre crava as unhas nos olhos do de que me fez presente o Governador do Pará era o
crocodilo, o único lugar por onde ele pode ser único dessa espécie que se havia visto no país: o
ofendido, visto a dureza das suas escamas; mas este, pêlo era argênteo, e da cor dos mais belos cabelos
mergulhando n’água, arrasta o tigre, que se afoga de loiros, e tinha a cauda lustrosa, próximo de negro.
preferência a abandonar a presa. Os tigres que vi na Tinha uma outra singularidade mais de notar: as
América, e que são vulgares em todas as regiões orelhas, as faces e o focinho eram de um vermelho
quentes e boscosas, não me pareceram diferir dos tão vivo que dificilmente se creria natural. Guardei-
afrticanos, nem em beleza nem em tamanho. Existe o por todo um ano, e ele ainda estava vivo quando
uma espécie cuja pele é castanha, sem ser isto escrevi, à vista da costa francesa, onde queria
mosqueada. Os Índios são extremamente adestrados ter o prazer de o introduzir com vida. Apesar das
a combater o tigre com um espontão, ou meio-pique, precauções contínuas que tive para preservá-lo do
que é a sua arma ordinária em viagem. frio, o rigor da estação possivelmente o matou. Como
O animal que os indígenas do Peru chamam eu não tinha nenhum recurso a bordo para o
‘puma’, e os Espanhóis ‘leão’, eu só encontrei na dissecar no forno, da maneira que M. de Réaumur
província de Quito, e nunca nas margens do imaginou para conservar os pássaros, o que pude
Amazonas. Não sei se merece tal nome; mas o macho fazer foi metê-lo no álcool; isto bastará pode ser para
não tem juba, e é muito menor que o leão africano. demonstrar que nada exagerei na descrição.
Nunca o vi vivo, mas empalhado. Há ainda outros vários animais raros; mas a
Não é de estranhar que os ursos, que não maior parte deles foram já descritos, e se vêem em
povoam senão os lugares frios, e que se encontram diversas partes da América, como javalis, coelhos,
em várias montanhas do Peru, não se vejam pacas, tamanduás, porcos espinhos, preguiças,
absolutamente nas florestas do Maranhão, cujo tatus ou armadilhos, e tantos outros, alguns dos
clima é tão diferente; todavia aí ouvi mencionar um quais desenhei ou cujos esboços executados por N.
animal chamado ‘ucumari’, que é precisamente o de Morain Ville estão em mãos de M. Godin.
nome índio do ‘urso’ na língua do Peru; não pude Não é de espantar que em países tão quentes
assegurar-me sobre se o animal é o mesmo. e úmidos quanto estes, se encontrem serpentes de
O alce [sic], que se acha nalguns cantões todos os gêneros. Li não sei onde que todas as do
emboscados da Cordilheira, em Quito, não é raro Amazonas são sem veneno; mas as picadas de várias
nas selvas do Amazonas, ou da Guiana. Chamo assim são quase sempre mortais. Uma das mais perigosas
ao animal que os Espanhóis e Portugueses conhecem é a cobra coral, notável pela variedade e viveza de
pelo nome de ‘anta’; na língua do Pará chama-se suas cores; porém a mais rara e particular é uma
uagra; tapira na do Brasil; maypuri na língua Galibi, grande serpente anfíbia de 25 a 30 pés [de 8 a 10
na costa da Guiana. Como a terra firme vizinha à m], e de mais de um pé de grossura, ao que dizem,
ilha de Caiena faz parte do continente que o e que os índios Mainas chamam yacu-mama, ou
Amazonas atravessa, e está contígua às terras mãe-d’água, e que vivem ordinariamente nos
regadas por esse rio, acham-se em ambos os países grandes lagos formados pelo extravasamento das
os mesmos animais pela maior parte. águas para o interior das terras. Contam-se fatos
de que eu duvidaria ainda se os houvesse visto, e
Passando entre os Jameos, desenhei uma
que eu não me abalanço a repetir aqui senão
espécie de doninha que se domestica com facilidade;
conformando-me com o novel autor já citado do
não pude pronunciar nem escrever o nome que aí
Orinoco Ilustrado, que os assegura muito a sério.
lhe dão; achei-a depois nas cercanias do Pará onde
Não somente, dizem os Índios, essa monstruosa
lhe chamam coati, na língua do Brasil. Laet a
serpente engole um corço inteiro, mas atrai, dizem
menciona.
eles, invencivelmente pela respiração os animais que
Os símios constituem a caça mais comum, e dela se aproximam e os destr ói. Diversos
mais do gosto dos índios do Amazonas. Em todo o Portugueses do Pará tentaram persuadir -me de
curso de minha excursão por esse rio, vi tantos e casos quase tão pouco de acreditar, como a maneira
de tantos ouvi falar, que a só enumeração das por que outra grande cobra mata os homens com a
espécies diversas seria muito longa. Uns são como cauda. Suspeito que esta mesma espécie habita os
um lebréu, e outros como um rato, e não falo da bosques de Caiena. Aí todo esse maravilhoso se
espécie minúscula conhecida pelo nome de reduz a um fato confirmado pela experiência: é que
‘sapajus’, mas de outros menores ainda, difíceis de a gente pode ser por ela mordida e ser por ela
capturar, que têm o pelo longo, lustr oso, marcada sem perigo, malgrado seus dentes serem
ordinariamente castanho, e algumas vezes bem próprios para infundir o terror. Dela tenho
pintalgado de amarelo. Têm a cauda dois tantos duas peles, uma das quais não tem nada menos
mais longa que o corpo, a cabeça pequenina e de quinze pés de comprimento, está seca e tem um
264 A Viagem de La Condamine (1743)

pé de largura. Sem dúvida há maiores. Devo estas só vi dois no Pará. Não conhecem aí absolutamente
peles, e diversas outras curiosidades de história a espécie cinzenta, que tem a ponta das asas cor de
natural aos PP. Jesuítas de Caiena, a M. de Lille fogo, e tão comum na Guiana.
Adam, comissário da marinha, a M. Arture, médico
Os Mainas, os Omáguas e diversos outros
do Rei, e a vários oficiais da guarnição.
Índios fazem alguns artefatos de penas, que
O verme que se chama entre os Mainas entretanto não se aproximam da perfeição nem da
‘suglacuru’, e em Caiena ‘verme-macaco’ [ura ou limpeza dos dos Mexicanos.
berne], cresce na carne dos animais e dos homens;
cresce até o tamanho de uma fava, e causa uma Os Indios das margens do Oiapoque têm o hábito
dor insuportável. É bem raro: desenhei em Caiena de dar artificialmente aos papagaios cores naturais
o único que vi, e conservei-o em álcool. Dizem que diferentes daquelas que eles receberam da natureza,
nasce na chaga feita pela picada de mosquito ou tirando-lhes as penas e esfregando-os com sangue de
moscardo; mas até aqui o animal que depõe o ovo certas rãs: é o se chama em Caiena ‘tapirer un
não está conhecido. perroquet’ [avermelhar um papagaio]; talvez o segredo
Os morcegos que chupam o sangue dos não consiste senão em molhar com algum líquido ácido
cavalos, e até dos homens, se quando dormindo não o lugar que foi depenado; talvez não seja mesmo
se garantem com o abrigo de uma barraca, são um neessário nenhuma preparação; é uma experiência a
flagelo espalhado pelos países quentes da Américas. fazer. Com efeito não parece estraordinário ver nacer
Uns há monstruosos pelo tamanho, e destruíram num pássaro penas vermelhas ou amarelas, em lugar
em Borja o gado que os missionários aí introduziram, das verdes que lhe foram arrancadas: é como ver
e que começava a multiplicar-se. repontar pêlo branco em lugar de negro, no dorso de
A quantidade das diversas espécies de um cavalo que foi ferido.
pássaros nas florestas do Maranhão parece maior
Entre outros pássaros vulgares, vi no Pará um
ainda que a dos quadrúpedes. É notável que quase
do tamanho dum ganso, e nada notável quanto à
nenhum tem canto agradável; é principalmente pelo
plumagem, mas com esporões no alto das asas,
berrante e pela diversidade de cores da plumagem
que eles interessam. como cornos muito aguçados, semelhante a um
grosso espinho de meia polegada. Ele tem demais
Nada iguala a beleza das penas do colibri, de por cima do bico outro pequeno chifre isolado e
que vários autores falaram, e que se acham na
flexível, do comprimento de um dedo; chama-se
América em toda a Zona Tórrida. Notarei apenas
cauitau na língua brasileira, palavra onomatopéica.
que apesar de que ele passa comumente por habitar
somente os países quentes, não os vi em nenhuma O pássaro chamado ‘trompetero’ pelos
parte mais numerosos do que nos jardins de Quito, Espanhóis da província de Mainas, é o mesmo que
cujo clima temperado mais se aproxima do frio do se chama ‘agami’ no Pará e em Caiena. É muito
que do grande calor. O tucano, cujo bico vermelho familiar, e nada tem de estranho swenão o barulho
e amarelo é monstruoso em proporção com o corpo, que às vezes faz, e que lhe valeu o apodo de ‘pássaro
e cuja lingua a modo de pluma solta passa por ter trombeta’. É disparate que alguns tenham tomado
grandes virtudes, não é tampouco particular ao país esse barulho por um canto ou gorjeio. Parece que
de que trato. As variedades de papagaios e araras,
se forma num órgão todo outro, e precisamente
em tamanho, cor e aspecto, são sem conta; entre os
oposto ao da garganta...
primeiros rareiam os inteiramente amarelos, com
manchas verdes nas extremidades das asas. Destes (...).”

Referências
La Condamine, C. M. de, 1745a. Extracto del diario de observaciones hechas en el viagem de la Provincia de
Quito al Para, por el Rio de las Amazonas: Y del Para a Cayana, Surinam y Amsterdam. Destinado para ser
leydo en la Assemblea publica de la Academia Real de las Ciencias de Paris. Por Mons. de la Condamine,
uno de los tres Embiados de la misma Academia a la Linea Equinoccial, para la medida de los Grados
terrestres, Traducida del Francés en Castellano. En la Emprenta de Joan Catuffe, Amsterdam.
La Condamine, C. M. de, 1745b. Rélation abrégée d’un voyage fait dans l’intérieur de l’Amérique méridionale
depuis la côte de la Mer du Sud, jusqu’aux côtes du Brésil & de la Guiane, en descendant la rivière des
Amazones, lûe à l’Assemblée publique de l’Académie des Sciences, le 28 avril 1745. Avec une carte du
Maragnon, ou de la rivière des Amazones, levée par le même. Veuve Pissot, Paris.
La Condamine, C. M. de, 1746. Bekort verhaal van een Reyze gedaan in ‘t binnelands gedeelte van Zuyd
America, van de Zuyd Zee totaan de Kusten van Brazil en Guiane. De Rivier der Amazoone afzakkende in
de Opengare Vergaadering der Eetenschappen tot Parys geleezen op den 28 April 1745. Door den Heer de
la Condamine Luytnant van Cavalery, in Ridder van de Ordre van St. Lazare, Lid derzelver Academie. Met
een Plaat van’t oproer van Cuenca, en een Kart van Maragnon, of the Rivier der Amazoone, door den zelve
geteekend.Dirk Sligtenhorst, Amsterdam.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 265

La Condamine, C. M. de, 1747. A succint abridgment of a voyage made within the inland parts of South
America; from the Coasts of the South Sea to the Coasts of Brazil and Guiana, down the River of Amazons:
As it was read in the Public Assembly of the Academy of Sciences at Paris, April 28, 1745. By Mons. De La
Condamine of that Academy. To which is annexed, a map of the Maranon or River of Amazons, drawn by
the same. E. Withers, London.
La Condamine, C. M. de, 1751a. Journal du voyage fait par ordre du roi, a l’Equateur, servant d’introduction
historique a la mesure des trois premiers degrès du méridien, par M. de la Condamine. Imprimerie Royale,
Paris.
La Condamine, C. M. de, 1751b. Mesure des trois premiers degrès du méridien dans l’hemisphere austral,
tirée des observations de Mrs. de l’Academie Royale des sciences, envoyés par le Roy sous l’Equateur, par
M. de La Condamine. Imprimerie Royale, Paris.
La Condamine, C. M. de, 1752. Supplément au journal historique du voyage à l’Equateur, et au livre de la
mesure des trois premiers degrés méridiens: servant de reponse à quelques objections. Par M. de la
Condamine. Durand & Pissot, Paris.
La Condamine, C. M. de, 1763. Geschichte der zehnjahrigen Reisen der Mitglieder der Akademie der
Wissenschaften zu Paris vornemlich des Herrn de la Condamine nach Peru in America in den Jahren 1735
bis 1745 vvorinne ausser verschiedenen Nachrichten von der gegenwärtigen Beschaffenheit der spanischen
Colonien in America und einer vollständigen Beschreibung des berühmenten Amazonasflusses auch noch
verschiedene und besondere Anmerkungen zur Aufnahme der Sternkunde, Erdbeschreibung und Naturlehre
befindlich sind, heraugegeben und mit einigen Beylagen und Kupfern begleitet von I. G. S. Johann Friedrich
Hartung, Erfurt.
La Condamine, C. M. de, 1778. Relation abrégée d’un voyage fait dans l’intérieur de l’Amérique méridionale,
depuis de la Côte de la Mer du Sud, jusqu’aux côtes du Brésil & de la Guyane, en descendant la rivière des
Amazones, par M. de la Condamine, de l’Academie des Sciences, avec une carte du Maragnan, ou de la
rivière des Amazones, levée par le même. Nouvele édition augmentée de la Relation de l’emeute populaire de
Cuenca au Pérou, et d’une lettre de M. Godin des Odonais, contenant la Relaton du Voyage de Madame
Godin, son Epouse, &c. Jean Edme Dufour & Philippe Roux, Imprimeurs-Libraires, Maestricht.
La Condamine, C. M. de, s. d. Lettre de M. D. L. C. à M.*** sur le sort des astronomes qui ont eu part aux derniers
mesures de la terre, depuis 1735. Lettre de M. Godin des Odonais, & l’aventure tragique de Madame Godin
dans son voyage de la province de Quito, à Cayenne, par le fleuve des Amazones. S. l., s. ed.
La Condamine, C. M. de, 189?. Relación abreviada de un viaje hecho por el interior de la América meridional
desde la Costa del Mar del Sur hasta las Costas del Brasil y de la Guayana, siguiendo el curso del Río de
las Amazonas por M. de la Condamine de la Academia de Ciencias com un mapa del Marañón, o Río de las
Amazonas, y una lámina. Nueva edición, aumentada com la relación del motín popular de Cuenca, en el
Perú, y com una carta de M. Godin des Odonais, conteniendo la relación del viaje de Madame Godin, su
Esposa, etc. Versión castellana de Federico Ruiz Morcuende. S. ed., Cuenca.
La Condamine, C. M. de, 1944. Viagem na América Meridional descendo o Rio das Amazonas. Biblioteca
Brasileira de Cultura (Direção de Basílio de Magalhães & Cândico Jucá Filçho, no. 1). Editora Pan-
Americana S. A., Rio de Janeiro.
La Condamine, C. M. de, 1992. Viagem pelo Amazonas. 1735-1745. [Seleção de textos, introdução e notas
Hélène Minguet. Tradução Maria Helena Franco Martins]. Editora Nova Fronteira & Editora da Universidade
de São Paulo, Rio de Janeiro.
La Condamine, C. M. de, 1993. Viaje a la América meridional por el río Amazonas. Estudio sobre la
quina.(Introducción a la Segunda edición: Eduardo Estrella. Presentación a la primera edición Antonio Lafuente
y Eduardo Estrella). Ediciones Abya-Yala, Quito, Ecuador. [Antes reeditado em Barcelona, 1968, Editorial
Alta Fulla).
Moraes, R. B. de, 1983. Bibliographia Brasiliana. Rare books about Brazil published from 1504 to 1900 and
works by Brazilian authors of the Colonial Period. Revised and enlarged Edition. A – L. UCLA Latin American
Center Publications, University of California, Los Angeles & Livraria Kosmos Editôra, Rio de Janeiro.
Capítulo 22

A “NAVEGAÇÃO FEITA DA CIDADE DO


GRÃ-PARÁ ATÉ A BOCA DO RIO DA MADEIRA”
DE JOSÉ GONÇALVES DA FONSECA (1749)

J osé Gonçalves da Fonseca saiu de Belém a 14 de julho de 1749 e chegou ao porto de


Pescaria, no Mato Grosso, a 14 de abril de 1750. Seu relato da nagegação do Amazonas e do
Madeira foi publicado somente em 1826; posteriormente, com um título ligeiramente modificado,
apareceu no livro de Candido Mendes de Almeida, Memorias para a historia do extincto Estado do
Maranhão (1874). Foi traduzido para o inglês e incluído na obra Explorations in the Valley of the
River Madeira, from 1749 to 1868. Published for the National Bolivian Navigation Co. (1875).
O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, no Rio de Janeiro, possui uma cópia manuscrita
desse relato, datada de 1752, com 375 páginas.
Pouco interesse zoológico apresenta seu relato sobre essa viagem Amazonas acima até chegar
à boca do Madeira, e por este acima até chegar ao Mato Grosso. Suas menções a animais são
escassas, muito gerais, e corriqueiras.
Peixes, só os menciona coletivamente, como p. ex.,
“He o mesmo rio abundante de peixe, e as suas margens e Ilhas de toda a sorte de
caça” (1874: 270).
“[O rio Jaraukú] he fertilissimo de peixe...” (1874: 276).
“[Lago Surubiú] muita abundancia de peixe...” (1874: 283).
“Nesta espera se fez experiencia de pescaria, e em breve tempo mostrou a sua fertilidade o
rio em peixe de linha, que bastou para aquella ocasião” (1874: 294).
“...defronte desta Ilha se via a boca de um lago que há da parte oriental mui abundante de
peixe...” (1874: 297).

Em raras ocasiões menciona certos animais nominalmente:


“São inhabitaveis as referidas Ilhas, que vulgarmente se chamão do Gurupá, e porque todas
estão sujeitas ás inundações do inverno, e sem embargo de tão grande invasão tem muita abundancia
de caça sylvestre, que consiste em Pacas, Cotias, Veados, Javalis, etc.” (1874: 174).
“Os referidos lagos em tempo de cheia se reduzem a hum só tão extenso e profundo, que
tem capacidade para embarcações maiores que canoas; nelle há infinidade de jacarés e cobras de
desmedida grandeza, a que chamão Sucurujús, Giboias e Boia-assú. Tem muita abundancia de
peixe, e de toda a variedade, que produz o Amazonas.”

Não poderia deixar de mencionar os carapanãs:


“As ilhas referidas que estão huma junto da outra se chamão de Carapanátuba, idioma dos
Indios, e no Portuguez significa terra de muito mosquito; com o mesmo nome se apellida o lago, de
que já se fez menção” (1874: 297).

De resto, menciona as tartarugas do Amazonas:


“[Rio Madeira]...se acha á parte occidental huma praia, em que se vai formando huma ilha;
e nesta praia há muita abundancia de tartarugas no tempo da sua producção, que he na vasante
do rio na lua nova de Outubro” (1874: 293).
“[Lago do Padre S. Sampaio] ...nelle há immensa quantidade de Tartarugas, e outros peixes
de salga em abundancia” (1874: 294).
268 A “Navegação...até a boca do rio da Madeira” de José Gonçalves da Fonseca (1749)

Figura 22.1. Sucuri (apud Brehm)


O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 269

Figura 22.2. Jibóia (apud Brehm)

Mas o trecho mais pitoresco que tem, falando das tartarugas, é o seguinte:
“Nestas praias ou corôas de areia se faz a fertilissima colheita das Tartarugas, quando estas
deixando sua habitação das agoas sahem a estas praias em tão immensa quantidade, que chegão
a cobrir muita parte daquellas arenosas estancias, nas quaes se estabelecem feitorias não só dos
moradores do Pará, mas de todos os habitantes do Amazonas a fazer duas conveniencias, a
primeira he a colheita das Tartarugas para sustento, e a segunda he a dos ovos dellas que
enterrão na areia, de cuja incrivel immensidade extrahem por beneficio da arte huma manteiga,
de que todo aquelle vasto paiz usa para tempero das viandas, da mesma sorte que na Europa se
pratica com a manteiga de vacca, ou azeite.
Este genero de colheita he todos os annos no mez de outubro a maior força: e á não haver
tão grande extracção no Amazonas e seus collateraes, se faz crivel que o infinito numero desta
qualidade de animaes não so faria mais fertil aquelle dilatado Continente, mas em partes seria
a navegação difficil pelo embaraço, que lhe resultaria da mais estranha abundancia que se
poderia imaginar” (1874: 287).

É interessante assinalar que a mesma idéia é repetida por D. João de São José Queiroz, bispo
do Pará e pelo Pe. João Daniel.

Referências
Fonseca, J. G. da, 1826. Navegação feita da cidade do Grão-Pará até a boca do rio da Madeira pela escolta
que por este rio subiu ás minas do Matto-Grosso, por ordem mui recommendada de Sua Majestade
Fidelissima no anno de 1749. Escripta no mesmo ano, in Academia Real das Sciencias de Lisboa, Collecção
de noticias para a histora e geographia das nações ultramarinas que vivem nos dominios portuguezes, ou
que lhes são vizinhas: publicada pela... 4(1): 1-143. Lisboa.
Fonseca, J. G. da, 1874a. Navegação feita da Cidade do Gram-Pará até a boca do Rio da Madeira pela escolta
que por este Rio subio às Minas do Mato-Grosso, por ordem mui recommendada de Sua Majestade
Fidelissima no anno de 1749, escripta por José Gonçalves da Fonseca no mesmo anno. Breve noticia das
serranias de que procedem as cachoeiras do Rio da Madeira. Descrevem-se as cachoeiras do Rio da
Madeira principiadas a passar no dia 18 de dezembro de 1749, pp. 167-317, 318-320, 321-418, in
Almeida, C. M. de, 1874. Memorias para a historia do extincto Estado do Maranhão cujo territorio
comprehende hoje as provincias do Maranhão, Piauhy, Grão-Pará e Amazonas. Colligidas e annotadas
por.... Tomo Segundo. Nova Typographia de J. Paulo Hildebrandt, Rio de Janeiro.
Capítulo 23

DOIS OPÚSCULOS DE 1754

Da “Relaçam curioza do sitio do Grão Para” [Figura 23.1], diz Moraes (1983: 707-708) que
este folheto de 8 páginas, publicado anonimamente, sem lugar e data, apareceu provavelmente
em 1754, e que “The author of this interesting anonymous account must certainly have travelled
across the Brazilian ‘sertões’. He describes the excellence of the climate, the forests, and the
animals in the jungle. ‘O animal mais horrendo he o Jacareo’, he states, writing also about the
‘onça’, the snakes, the ‘surucucú’, etc. [negrito nosso] The author declares that this account was
written with the intention of publicising these regions which he considers to be a paradise. At the
end he states that he intends to write a second part, if this first one meets with success, in which
he will include additional geographical information. It seems, however, that the work was not
successful because a second part was never published. This curious acount is very rare”.

Figura 23.1. Frontispício de Relaçam curiosa do sitio do


Grão Para (1754)
272 Dois Opúsculos de 1754

A “Relaçam” de Caetano Paes da Silva era muito popular na época. Ainda segundo Moraes
(1983: 710, 712), “This very rare popular pamphlet (folheto de cordel) is written as a letter from a
Portuguese who has recently arrived in Pará to a gentlemen in Lisbon. He writes that the voyage
took fifty-one days and almost everyone arrived suffering from illness. He praises the good climate,
the low price of meat, and the simple and practical method used to build a cabin to live in.
The country is at that time sparsely inhabited but he expects that more people will soon come
from Portugal. He ends by describing an enormous snake which can swallow a calf [negrito
nosso], and tells of the arrival of a Negro slave ship, from which all the Negroes were sold”.

Referências
Anônimo, [1754]. Relaçam curioza do Sitio do Graô Para Terras de Mato-Grosso bondade do clima, e fertilidade
daquellas terras. Escrita por hum curiozo experiente daquelle Paiz. Primeira Parte. S. e., s. l.
Moraes, R. B. de, 1983. Bibliographia Brasiliana. Rare books about Brazil published from 1504 to 1900 and
works by Brazilian authors of the Colonial Period. 2 vols. UCLA Latin American Center Publications,
University of California, Los Angeles & Livraria Kosmos Editôra, Rio de Janeiro.
Silva, C. P. da, 1754. Relaçam e noticia da gente, que nesta Segunda monção chegou ao sitio do Grão Pará, e
as terras de Mato Grosso, caminhos que fizerão por aquellas terras, com outras muito curiosas, e agradaveis
de Rios, Fontes, fructos, que naquelle Paiz acharão. Copia tudo de huma Carta, que a esta Cidade mandou,
Isidoro de Couto, escripta por Caetano Paes da Silva. Off. de Bernardo Ant. de Oliveira, Lisboa.
Capítulo 24

A “VIAGEM E VISITA DO SERTÃO EM


O BISPADO DO GRAM PARÁ” DO BISPO
DOM FREI JOÃO DE SÃO JOSEPH QUEIROZ (1761-1763)

S egundo Aranha (1883: 284), aquele que no século chamou-se João da Silveira Queiroz
nasceu em Matozinhos, Portugal, em 11 de agosto de 1711, sendo batizado na igreja paroquial de
Bouças. Filho de Francisco Gonçalves Dias e de D. Joanna Dias de Queiroz, ambos de nobre
família, tornou-se monge de São Bento. Apresentado em 1759, e confirmado bispo do Grão-Pará,
no Brasil, pelo papa Clemente XIII, chegou à sua diocese em 31 de agosto de 1760, tomando logo
posse de seu bispado. Fez duas extensas viagens pelo interior de sua imensa diocese. Vitimado
por intrigas que chegaram até Lisboa, e que influíram no governo metropolitano, D. João foi
chamado de volta à corte. Embarcou de Belém do Pará a 24 de novembro de 1763, chegando a
Lisboa em janeiro de 1764. O governo mandou-o recolher no Convento de S. João da Pendurada,
entre Douro e Minho, e aí faleceu oito meses depois, em 5 de agosto de 1764.
Diz ainda Aranha (l. c.) que este prelado era homem muito instruído, de caráter independente
e veia satírica; e quando falava ou escrevia, particular ou oficialmente, não poupava amigos nem
adversários, afirmando-se que o governo o perseguira por causa das verdades que ele não poupara
em cousas da administração pública.
Dom Frei João de São Joseph escreveu umas Memórias, primeiramente publicadas em folhetins
no Jornal do Commercio de Lisboa, começando em 9 de janeiro de 1867. Foram posteriormente
editadas por Camillo Castello-Branco, a partir do autógrafo de Fr. João de São José, encontrado
no arquivo ou biblioteca do Mosteiro de Tibães. No livro de Castello-Branco (1868: pp. 167 até o
fim) apareceu o relato da primeira viagem de D. João ao interior da Amazônia, realizada em 1761.
A segunda (“Viagem e visita do sertão em o bispado do Gram-Pará em 1762 e 1763, escripta pelo
bispo D. Fr. João de S. José, monge benedictino”), que constava de um manuscrito achado na
Biblioteca Pública Eborense, teve seu relato publicado em 1847, na Revista do Instituto histórico e
geográfico do Brasil. É deste escrito que transcrevemos abaixo os excertos relativos a animais, dos
quais citou o bispo os seguintes (mantida a grafia original):

1. Acará 20. Corimatá 40. Motum 60. Quiquió


2. Acotyboia 21. Cotia 41. Onça 61. Rapoza
3. Adem 22. Delfim [boto] 42. Paca 62. Saracura
4. Anta 23. Enambú 43. Paca-sororóca [onça] 63. Serobim
5. Aracú 24. Formiga 44. Paraoiva 64. Suassuarana
6. Araoaná 25. Gallo-do-mato 45. Pato 65. Sucurijú
7. Arára 26. Garapaná 46. Peixe-boi 66. Surucucú
8. Bicho [do pé] 27. Giboia 47. Periquito 67. Tamandoássú
9. Caba 28. Guariba 48. Picapáo 68. Tartaruga
10. Camaleão 29. Jabotim 49. Piranha 69. Tatú
11. Camarão 30. Jacaré 50. Pirorocú 70. Tetem
12. Cam-hitaou 31. Jandiá 51. Pium 71. Tigre preto
13. Capivára 32. Japy 52. Pombinha do mato 72. Tucanaré (ou
14. Cardial 33. Jararáca 53. Poraqué tukenaré)
15. Cascavel (ou Cobra 34. Macaco 54. Porco montez 73. Unicornio
de cascavel) 35. Marreca 55. Porco-espim (ver Cam-hitaou)
16. Cigana 36. Meruim 56. Praga 74. Urú
17. Cobra 37. Morcego 57. Praira 75. Urubú
18. Colhereiro 38. Mosquito 58. Preguiça 76. Uruiaoara [onça]
19. Coral [cobra] 39. Motuca 59. Pulga 77. Veado
274 A “Viagem” do Bispo Dom Frei João de São Joseph Queiroz (1761-1763)

Excertos
“Saltaram ao mato os da voga, que se não costumam guardar, lançaram-no ao rio. Tivemos o
embaraçam com flôres, a buscar fructas silvestres, divertimento de atirar a jacarés pequenos dos
e succedeu matarem uma cobra, não das grandes muitos que estavam nas margens, e como não
do Estado, mas dentro da sua especie de jararácas fugiam para a agua, como fazem os pais, succedeu
não era pequena. Estas fortunas costumam celebrar ficarem alguns bem convidados da comitiva, sendo
muito os índios, e guizar a caça, repartindo-a entre de tres a quatro palmos, e pouco mais de grossura
si como se fossem deliciosos bocados da marmelada do pulso de um homem, que por isso sentem a
cambray de Odivellas, ou da mais fina geléa de S. bala””(p. 70).
Bento do Porto. A isto póde ser aludisse Jeronimo “Chegámos pelas 10 horas a boca do rio que
de Albuquerque quando escreveu ao Sr. De La sahe ao das Amazonas, onde dor mimos
Ravardière, general francez, que mostrava doer-se ator mentados da praga que tem copiosa de
da penuria a que se achavam reduzidos os nossos mosquitos, de garapanazes, meruins, pium, e
soldados, dizendo-lhe Albuquerque que elles motucas, que são umas moscas verde-negras, que
estavam costumados a sustentar-se de um punhado atormentam os remeiros por estarem nús, razão
de farinha, e de um pedaço de cobra, quando a por que já antes de chegar a este sitio têm cuidado
havia; rodamontada de soldado, que mostrou depois de fazer cada um certa vassoura, com que ou as
estimar o francez. Porém os indios, que de outra matam ou sacodem” (pp. 70-71).
pesca estavam bem satisfeitos, não se serviram da
cobra mais do que para lhe tirar os dentes, que como “Tirou-se muito peixe pequeno, alguns de
esta gente tem em alto gráo a crença e medo de palmo chamados piranhas, que n’este lugar eram
feitiços, attribuindo a isto quanto mal lhe sucede, o tão vermelhos e prateados, que escusaram de nos
que é rarissimo, apprehenderam que os dentes da trazer da China outros semelhantes, que se
jararáca, o bico do passaro a quem o canto dá o deixavam ver entre as raridades dos senhores
nome de quiquiós, e tambem a tinta do carujurú, infantes em o palacio de Palhavan, e em Santa
são amuletos preservativos” (p.59). Cruz de Coimbra, e na casa de campo de Belém,
do conde de Oeiras. Estes peixes são crueis, e
“Na tarde penetrámos pelo tal rio [Tajapuru]
mordem muito; a um clerigo que nos acompanhou
dentro, onde havia muita caça nas arvores e muitos
e por refrigerar -se do calor que sentia nas plantas
jacarés, que logo se occultavam; suppomos que
dos pés se banhava sentado na canôa, tirou uma
estes são os animaes amphibios que os latinos e
piranha um bocado de carne do calcanhar, de que
muitos autores chamam crocodilos, convindo-lhes
se andou curando muito tempo, dizendo
bem todos os signaes, menos o de fingir que choram,
festivamente que debaixo dos pés se lhe
que é maior fingimento dos que primeiro o
levantavam os trabalhos” (p. 71).
sonharam, do que artificio para lhe acudirem
compassivos. Vimos muita quantidade de guaribas, “Nada offereceu este dia reparavel, e assim
especie de macacos, e tão destros como elles nunca continuando-a em 2 de Dezembro cuidámos em jantar,
se punham a tiro, occupando n’este sitio os ramos para o que a mão liberal do Senhor, em cujo serviço
mais altos das sumaúmeiras, celebres arvores de se anda, concorreu hontem á noite, recolhendo a rede
que se tira aquella especie de seda ou lãa, que com perto de trinta arrobas de peixe em poucos lanços,
o sabido nome de sumaúma amarella uma e outra sendo o ultimo tão crescido em grandes e muitos
branca, servem de occupar os colxões de mais peixes, que se estragou a rede, nem bastaria uma
regalo” (p. 61). canôa para o receber. Os pescadores se viam rodeados
de jacarés, porém fugiam e viam de longe a festa estes
“Gastámos os dias de 29 e 30 em passar o
animaes, que suppomos fartos, e que a terem fome
Ayquiqui, e entrando por outro rio chamado o
seriam perigosos. Toda a noite andou um de enorme
Guajará, descobrimos grandes campinas de pastos
bem proprios para gado, que não tem por não haver grandeza rodeando a canôa principal, no sitio em que
quem habite estes lugares que nas cheias ficam se lançou fatexa, e sem embargo de alguns tiros com
cobertos. Houve muita caça de aves, e se fizeram bala não sentiu molestia nem mostrou abalo” (p. 75).
reparaveis algumas amarellas e só nas costas pretas, “Em a mesma manhã foi feliz a navegação, e a
mais vistosas que os japys; vimos outras pequenas primeira vez que vimos cobra notavel; teria duas
de côr de fogo unicamente n’este sitio, e bem varas de cumprimento uma que subia da margem
galantes á proporção de raras; os periquitos verdes para uma ilha, a grossura não excedia do pulso de
innumeraveis, bastando fazer fogo ao pé da arvore um homem, e é da especie das que chamam
para cahirem com o fumo como atordoados; vimos sucurijú, e costumam apertar um veado ou boi de
grandes saracuras, bons patos, e na sorte que os ossos se fazem como farinha, então se
agua bandos de lontras; quasi sempre nos alarga, e come aquella massa de carne misturada,
acompanháram mergulhando delfins. Vimos que succede corromper-se; mas provida a natureza
algumas capiváras em terra, e mergulhando aparta uma membrana ou pelle por onde bem
atravessar este profundo canal. São animaes facilmente expulsa toda a podridão, e torna unir
quadrupedes, porém duros e difficultosos de matar; soldando prfeitamente. D’esta casta ou especie anda
ainda assim á bala se segurou um que sendo pardo uma cobra no lago da cidade chamada Pery,
tem alguma semelhança com as antas, e sendo do monstruosa. Há outras muitas de que fallaremos
tamanho de um porco ordinario, e muita boa carne; se vier a proposito, como são a giboia, surucucú,
os índios que tinham pescado e comido, e não coral, cascavel, &c” (p. 75).
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 275

“A noite tivemos em uma enseada, e foi bem Há peixe boi de tanta grandeza, que se conhece logo
cruel com a praga de meruins, especie de mosquitos a canôa que o traz por vir muito mettida; fallamos
que mettem em desesperação a quem os sentem; das ordinarias de pescaria. Se o leitor não fôr de
há outra especie, cuja mordedura venenosa tem pouca lição, ou tiver menos noticia, lerá sem horror
causado febres, e aos impacientes do prurido a que há peixe boi que quasi todo se reduz a manteiga,
morte em o rio de Solimões alguma vez, sendo e dá quarenta potes d’ella, o que poderá servir para
necessario para rezar o officio divino ter luvas ou os hollandezes nos admirarem menos quando
cobertas as mãos, e a cabeça e o pescoço bem contam haver vaccas em Hollanda que largam cada
resguardados. A noite se concluiu com uma grande dia vinte e seis canadas de leite, sendo muito
trovoada e chuva grossa; por meio de tudo se fizeram commum almude e meio. Não devendo admirar a
os indios á vela, segurando não haver perigo, grandeza do peixe-boi, pois sabemos por informação
desesperados da praga, com que saltavam de do inglez Smith, na viagem de Guiné, acharem-se
mergulho ao rio” (p. 76). cavallos marinhos, que os gregos chamam
“...encontrámos em uma praia os ovos, que a hippopotamos, que pesam quinhentas libras. A
tartaruga encobre na arêa, depondo por uma vez manteiga do peixe boi tem virtude para conservar
cento e cincoenta as grandes até duzentos, de que annos incorruptos os presuntos, e assim d’ella nos
se fazem manteigas, e a não ser assim andariam servimos, e da experiencia do capitão José Miguel
coalhados estes rios de tartarugas. O capitão José Ayres e de seu irmão André Miguel Ayres, cavalleiros
de Sousa, natural de Santarém, nos mostrou uma naturaes de Lisboa, de extracção franceza, e irmãos
pequena que criava pela raridade de ser branco o do capitão de mar e guerra das náos da corôa,
casco; cousa nunca vista n’este Estado, dizem os Francisco Miguel Ayres, casados em Belém, onde
indios. Aqui houve antes de anoitecer muita pesca se acham com numerosa familia” (pp. 87-88).
de serobins, tucanarés, corimatás, acarazes, “[Villa Franca, rio Tapajós] Tem pesca de peixe
piranhas, pirorocús (de que a lingua é o melhor boi e viração de tartaruga” (p. 106).
ralador de noz-moscada), araoanás e aracús, e seria “[Navegando para Villaboim, rio Tapaós]
extraordinaria a pesca se as redes estivessem em Passámos essa noite em umas praias que
melhores termos, que sempre arrastaram ao mesmo acompanhando o rio faziam costas a um braço que
tempo quatro jacarés pequenos, que presos pelo entra pela terra dentro, onde achámos agua clara,
focinho serviram na praia de divertimento aos indios: e a pesca fez divertida a tarde com a frescura em
não assim os grandes, há-os de grandeza que declinava o dia, aliás ardentissimo, e com a
extraordinaria, e confessamos ingenuamente que o variedade de arvores na mesma arêa, que formavam
maior que pudemos mandar medir não excedeu de a espaços agradaveis sombras, e se cobriam algumas
dezeseis palmos; porem vimos n’agua a cabeça de de flores miudas da côr do pecegueiro ou da olaya
um em outro sitio, que causava admiração, e os em Portugal. Na observação só coube reparar nos
indios diziam que era como uma canôa; não vestigios de um jacaré, que pelos signaes de pés e
sabemos de que tamanho seria a que se propuzeram mãos e cauda deixava perceber uma grandeza
por exemplar ou simil; quem quizer d’estes milagres enorme; tambem se conheciam as pegadas da onça:
da natureza ou estupendas pr oducções porém não lográmos o combate d’estas duas feras,
geometricamente averiguadas, consulte as medidas cousa bem celebre. Está o jacaré talvez dormindo
do crocodilo de Africa, que a tomou Mr. de la Rue em terra ou observando algum peixe com vista turva,
na sua celebre viagem, e a descripção do Nilo por e acaso o mais horrivel entre os animaes conhecidos,
Mallet” (p. 77). então a onça com penetrantes e fortes unhas,
principalmente da mão esquerda, que (costuma em
“Ouviam-se cantar harmoniosamente as aves,
muitas) ser mais grossa, se deixa cahir sobre o
cousa rara n’este paiz, pois exceptuando a fineza
jacaré, segurando-o pelo cachaço e cabeça. Elle
das côres, são muito inferiores no canto ás da
procura agua e mergulha; mas a onça, que retem
Europa, se exceptuarmos o chamado tetem, que é
por muito tempo o folego sem perigo, se deixa ir
o rouxinol do Pará, e de harmonia agradavel; e bem com elle ao fundo, nem descança até o degollar com
que muito inferior aos que em Portugal se escutam as cortadoras e formidaveis unhas” (p. 106).
nos salgueiros do Mondego, tem lugar em o côro
das aves” (p. 77). “[Villaboim, rio T apajós] Tem pesca de
tukenarés, que é bom peixe; tem abundancia de
“[Em Santarém] Há... rolas, a que chamam tartarugas grandes e saborosas, mas sem cascos
pombinhas do mato. Tem viração de tartaruga, finos para obra delicada, que d’essa especie só se
grande pesca de peixe-boi, que não é de escama; é acha n’esse Estado em a villa de Cintra, antigamente
grande e muito grosso, tem duas grossas cartilagens conhecida, e ainda hoje, nos roteiros e cartas
ou barbatanas, que lhe servem de remos, a pelle é hydrographicas portuguezas com o único nome de
boa para palmatorias; depois de tirada se separa Maracanan [...]. Tem mais a villa muitos jabotins,
uma grossa banha como os pães ou rolos de unto certa especie de kagado, de que é excellente o figado
de porco, em que está envolvido todo o peixe, e é depois de assado, com azeite e vinagre: estimam-se
singular manteiga, como tambem a ventrecha, que os ovos por saborosos, como os de tartaruga pela
assada nenhuma differença tem do lombo singular. excellente manteiga e pela multidão.
276 A “Viagem” do Bispo Dom Frei João de São Joseph Queiroz (1761-1763)

Figura 24.1. Preguiças (apud Brehm)


O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 277

Há aqui um peixe em abundancia chamado caça. Bem se necessita na America de seme-lhante


poraqué” (O auctor do Marañón y Amazonas chama caçador, e n’estes Estados principalmente, pelo
a este peixe paraquê pag. 108, col. 2ª) e talvez especie grande damno que fazem, [...].Desejávamos ver fazer
de que os latinos chamam torpedo, e nos consta ser anatomia ao tamandoássú para observar o
commum no Estado, principalmente no rio Guamá, reservatorio da lingua, porém não o conseguimos;
que já navegamos. Logo que os indios pegam n’elle, os olhos são formosos e pequenos, e a cauda
ficam entorpecidas as mãos e braços, até passar formosissima, e d’ella se fazem vassouras ou
este effeito, circumstancia que alguns negam, e espanadores. Há outro animal chamado tatú; tem o
lembra-nos seguir esta ultima opinião o inglez focinho de rato, mas agudo, e a cabeça do mesmo
Ovington, celebre viajeiro. O erudito Kempser, nas cobre-se de um casco côr de chumbo, como a pelle
suas Amenidades exoticas, diz que para se restituir do peito do jacaré, com juntas sobrepostas como o
o enfermo promptamente basta tomar a respiração pescoço da lagosta, e parte das armas brancas que
com cuidado, resistindo por algum tempo ao vestiam os antigos militares, e se chamavam
movimento; suppomos ser o que os medicos cataphractos, conforme Vegeiro” (pp. 184-185).
chamam systole e diastole: e nos persuadimos que “[Pinhal, ou aldeia de S. José, rio Tapajós] Não
é este peixe a tremelga de Portugal ou especie d’ella, é menos barbaro o modo com que tratam os moços
e o mesmo que nas costas d’Africa na Gambia para sahirem valentes aos quinze annos de idade.
descobriu Jobson em 1621” (p. 182). Deve-se saber-se [sic] que há uma casta de formigas
“[Villaboim, rio Tapajós] Tem este sitio um que atazanam a carne, grandes e crueis: levam pois
celebre animal, que primeiro vimos em Portugal, e os Magués ao seu candidato de valentia junto á
é a preguiça, sendo o mais notavel o vagar e pausa bocca do formigueiro, e prendendo-lhe o braço
com que se move, pois apenas se percebe, e as direito com laçadas de fitas de varias côres, que
grandes unhas de que serve são tambem muito adquirem nos resgastes do guaraná, e então lhe
notaveis. Há innumeraveis camaleões, [...] porém mettem o restante do braço no formigueiro até o
difficultosamente se encontra pedra na bexiga, de cotovello, e por mais gritos que o padecente dê,
que se contam cousas maravilhosas na dor de ninguem o socorre; assim soffre ou atura tres dias
calculo tomada e moida primeiro a pedra de o martyrio, que tanto tempo se deixam as formigas
camaleão. Não ficamos por fiador do successo; estar pegadas. Acabados elles com vidros retalham
sabemos sim que se mataram muitos sem achar tal o branço, correndo com o fio agudo a disforme
pedra; póde ser que só em os velhos se ache ou nos inchação, e acudindo com hervas, fica o indio
de differente especie, e tambem póde ser fabula na graduado valente” (p. 189).
historia. Encontram-se muitas onças, e o nosso (Nota dos Editores: A citação anterior refere-se
escrivão da camara se viu com uma, de que se à “tocandira”, sendo a segunda mais antiga que
retirou prudentemente. As pintadas se chamam – conhecemos).
paca sororóca – isto é, banana ou pacova brava,
pela semelhança da côr com esta planta; outras “[Pinhel, rio Tapajós] A pesca e caça é a mesma
tambem pintadas se chamam uruiaoaras, isto é, cão aqui que em outras partes do rio; o peixe boi é grande
pintado como o pássaro urú. As onças avermelhadas remedio porque chega á muita gente: já dissemos se
se chamam suassuarana, quer dizer – côr de veado. sustenta de herva, ainda que não é animal amphibio,
Há tigres pretos, macho e femea, cujo pello parece e por isso sempre procura partes onde encontre nas
velludo, e fazem grande estrago. Há porcos margens dos rios pastos excellentes, taes são as hervas
montezes com differenças; veados, rapozas, pacas que os rios banham” (p. 192).
semelhantes as lebres de Portugal, excedendo a “[Numa enseada entre Villaboim e Alter do
estas em o sabor as pacas; cotias, especie Chão, rio Tapajós] Aqui foi tanta a immundicia de
semelhante algum tanto aos coelhos, com differença pulgas miudissimas, sem embargo de estarmos na
na côr; que é como a dos indios avermelhada, e de rede, que mortificaram a todos; porque estas,
vista tão activa como elles. proprias dos cães, gatos e ratos se introduzem na
Há cobras de salto chamadas jararácas, e pelle e logo na carne, crescendo até criar corrupção,
correspondem na malignidade as nossas viboras de largando sementes no mesmo lugar, de que há
Portugal. Não assim as chamadas acotyboias, isto successos tragicos; a isto chamam bicho na terra,
é, cobra de cotia, a qual não mata o homem, porém e de os tirarem fazem um divertimento, ou affectam
seguiindo-o o põe fóra do mato á força de açoutes, os naturaes, sendo cousa bem ingrata a ponta de
ou o faz fugir; põe a cabeça em terra, e dá pelas um alfinete mexer entre a unha e a carne; porém
costas do homem com a cauda. Tambem se faz taes os há por cá. N’esse dia tivemos a paciencia de
celebre um animal chamado tamandoássú; elle tem nos tirarem dezeseis bichos” (p. 198).
o pescoço de cavallo, o corpo de pôtro novo, é de
“[Alter do Chão, rio Tapajós] Há na villa muita
quatro pés, e muito feroz, de sorte que com as
afiadas, fortes e penetrantes unhas maiores que as pesca de peixe, e grande de tartaruga. [...]. Muitos
da preguiça, apertando entre os braços a onça, a passaros, como colhereiros, saracuras e cardiais”
estala, corta e retalha. Tem a lingua excessi-vamente (p. 198).
comprida e larga, quasi como uma espada; por uma [Alter do Chão, rio Tapajós] Há grande
pequena bocca sahe a lingua, e a estende em sitio multidão de antas, veados, onças, e formigas quasi
onde estão formigas, que a cobrem e picam, e elle com uma pollegada de comprimento, e tudo serve
então vai recolhendo a presa e aproveitando-se da de destruir as roças, porque a gente é pouca,
278 A “Viagem” do Bispo Dom Frei João de São Joseph Queiroz (1761-1763)

e os homens andam por fóra a maior parte do anno. “Logo ao sahir de Obidos pouco mais de um
O grande lago, que é braço de Tapajós, dá muito quarto de legua está um lago, chamado dos
peixe, e é bem agradavel com ilhas pelo meio. Há Sucurujús, onde os pescadores se não atrevem a
muita caça e aves, como gallinhas, patos, adens, pescar excellente peixe que alli se acha, nem a virar
marrecas e outras” (pp. 199-200). grandes tartarugas, com medo e receio de irritar
as cobras chamadas sucurujús, que se acham
“[Alter do Chão, rio Tapajós] Esquecia-nos
tambem e dão o nome ao lago, deixando-se bem
dizer que há aqui cobras de cascavel, que tem na
divisar em suas aguas, que são muito claras,
cauda, não em a cabeça, [...]; e dizem ser medicinaes
estarem no fundo enroscadas como amarras de
para a gotta coral, quanto a cobra é venenosa. Não
navios, maiores e menores, em diversos montes.
costuma esta a exceder o comprimento de vara e
Fomos convidados para este espectaculo da
meia: nem investe com facilidade, antes parece
natureza: porém venceu a nossa curiosidade o
advertir ao caminhante, movendo com a cauda os
horror, ainda mais que o receio do perigo. Talvez
cascaveis, estando parada, para que passe de largo, se chegam ás bordas dos rios estes animaes, e
advertido o estrondo. O principal nos trouxe dois prendendo um cavallo ou boi, o arrastam com a
bocados de cobra ou pedaços, cada um com dez ou cauda, com que os seguram em pé ou mão. Alguns
doze cascaveis, que se costumam trazer engastados negros se valeram da faca, e lhes valeu cortar a
por aquelles que se persuadem que são remedio cauda, que não é volumosa como o mais corpo: a
contra o estupor, torpor e espasmo. Tambem dizem uma preta que lavava n’este porto sobre uma mesa,
que postos sobre dôr tem notaveis effeitos: mas como como costumam junto ao rio, defendeu mais que o
ignoramos qual seja a dôr, ficamos na duvida da ferro o páo: chegou-se a cobra sem ruido, armando-
tenção e caso em que se deve applicar, e na certeza lhe tiro errou, por que em lugar de enlaçar a preta,
de que não há especifico para todas” (p.200). atracou apertadamente um pé da banca, com que
“Na madrugada de 14 de Janeiro nos deu tempo a fugir e escapar -lhe. A esta especie se
embarcámos, e na camara da canôa sentimos uma attribue em Belém o faltarem em todos os annos
dor, a maior e mais intensa que experimentámos na pessoas que foram nadar, vendo-se e ouvindo-se
nossa vida. Não foi mais que uma mordedura de do convento de Santo Antonio alguma vez gritar
formiga no pollegar da mão esquerda, e inchou esta um rapaz que lhe acudissem, e ir arrastado ou
logo e mais tres dedos, a que acudimos por ordem do aboiado até se submergir de todo. Não há perigo
cirurgião com triaga magna desfeita em aguardente de cobra, jacaré, arraia, e outros muitos que
de canna; dentro em doze horas nos restituimos, sendo intimide a moradores do Pará e a indios, para se
intoleravel a dor nas primeiras duas horas, que causou absterem de metter n’agua. N’este mesmo sitio de
a formiga do tamanho do mesmo pollegar e com azas: Pauxis [Óbidos] desappareciam rapazes que
depois soubemos ser remedio admiravel a cera dos nadavam, padeceu o sucurujú os juizos, que não
ouvidos” [provavelmente o bispo foi picado por um eram temerarios: porém em certo dia que se pescou
exemplar de vespa do gênero Polistes e não por uma um grande peixe chamado praira, que é muito voraz
formiga, já que tinha asas, e as formigas adultas não e grosso, aberto se lhe achou car ne que se
picam] (p. 201). conheceu ser humana, e ossos de gente de pouca
idade” (pp. 211-212).
“Acalmaram os ventos, pararam as ondas, não
se ouviram trovões; então respirando os animos, e “Da bahia em que estivemos cercados de
juntas outra vez em conserva as canôas, fomos innumeraveis jacarés, ou do lugar em que passámos
buscar porto para dormir. Os indios, ainda que se uma noite cruel de chuva, trovões, relampagos e
lhe acudiu com dois frascos de aguardente, que era vento, partimos pelas cinco horas da manhã, com
isto entre tantos? Achavam-se frios; para dormir inverno entrado e acabados os ventos geraes, que
pois apenas ceiaram, fizeram covas na arêa, e são os nortes, e duraram até 15 de Janeiro” (p. 213).
cobertos ou enterrados n’ella, e só com a cabeça de “Na boca de Jamundaz tivemos que offerecer
fóra, se deixaram aquentar por este estylo, que á a Deus, passando cruel noite pela perseguição da
imitação das tartarugas praticam quando pousam praga, de que, ainda coberto o rosto e as mãos, e
á noite em praias, e tambem por se livrarem da praga debaixo do mosquiteiro em camara fechada, não nos
dos garapanazes, mosquitos e meruins, para o que, pudemos ver livres” (p. 215).
descançando a cabeça no remo, a cobrem com a
“Nelle se tiraram duas muito grandes
camisa; ainda que o ordinario é fazer grandes
paraoivas, peixe bem saboroso, e que desterrou em
fogueiras para intimidar as feras, e para dar gasto
o sabbado o fastio de peixe secco e de peice boi e as
á lenha prompta que sempre acham nas praias”
semsaborias da noite” (pp. 215-216).
(pp. 202-203).
“[Entre Santarém e Óbidos] Innumeraveis “Jantámos em uma ilha de grande arvoredo,
bandos de marrecas saborosissimas, que vão muitas aráras e urubús” (p. 217).
deixando as praias por causa das chuvas, patos de “Ao varar em terra as canôas, sahiu do tronco
grandeza notavel; innumeraveis macacos, sendo de uma grande arvore chamada siringaúa uma cobra
muito celebre entre elles a especie dos pequenos de muita grossura e comprimento, e mettendo-se
vupapussas: e ciganas, aves vistosas pela pluma aio rio passou para o lado fronteiro, que coberto de
ou ramo da cabeça, porém ingratas ao gosto; arvoredo servia de cortina a diverso quadro d’este
motuns, certa especie de perús saborosos” (p. 208). lago famoso de Jamundazes” (p. 217).
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 279

“Há caça de grandes patos, saborosos e de pouco serviria isso se elles não tivessem todos
tenros, tambem os enambús são bem estimados, e os anos uma doença, como peste, de que morrem
não são inferiores ás perdizes do termo de Lisboa innumeraveis; e seriam coalhados os rios como estão
e Castello Branco, temperados porém ao gosto muitos lagos, em os quaes, quando a cheia grande
portuguez” (p. 218). principia a abater, se acham estendidos, mortos e
“[Em Faro] O sitio da villa é agradavel, tem corruptos; de sorte que é a mortandade em muitos
boas praias, excellentes ares, e bons mantimentos, annos, que se não atrevem os pescadores pelo fetido
principalmente d’aves e tambem de pacas e cotias” a ir pescar em canôa aos taes sitios” (pp.. 330-331).
(p. 219). “[Em Alenquer] Vimos uma especie de
“E é digno de advertir, nem vem fóra de passarinhos em grandes bandos pela campina,
preposito, que esta noite tivemos á roda da cama e amarellos claros, e a tempo que haviamos recebido
debaixo d’ella morcegos em quantidade, por serem dois do Rio Negro, côr de fogo ou amarello mais vivo,
muitos n’esta terra e grandes, com a prenda de chamados gallos do mato, dignos de estimação ate
morderem suavissimamente fazendo notaveis pelo feitio, que sendo como de pomba, tem alentos
sangrias, e há taes que matam o gado” (p. 225). de freira, isto é, um circulo de pennas mais airoso
que o das corujas em Portugal. Tambem se
“Já podemos dizer que no lago de Jamundazes encontravam no mesmo sitio passaros como
vimos jacarés monstruosos, e sem susto de enganar, pintassilgos, menos no canto. A cousa mais celebre
que os há de trinta palmos de comprido, de que n’estes bosques é o passaro ou ave de rapina
fallaremos por uma vez por occasião do seguinte. chamado cam-hitaou: é grande como um perú alto,
Chegámos a Obidos pelas oito horas da noite, e e tem nos encontros das azas dois ossos sahidos fóra,
achámos ao vigario com o sentimento de lhe ter redondos, tem no salto da cabeça uma vara ou
occasionado a morte a um rapaz de sete para oito ponteiro elevado do comprimento de quatro dedos
annos, que criava, a voracidade de um jacaré; no com pouca grossura. Dizem ser grande contraveneno,
que intervêm taes circumstancias, que podem ser e ainda os ossos; estes moidos e bebidos; a vara
objecto de attenta critica, e não menos de as estimar porém posta de infusão em agua: chamam-lhe os
a piedade catholica. No porto da villa estavam nossos portuguezes unicornio” (p. 337).
meninos brincando junto d’agua, e mais perto d’ella
o menino João, indio baptizado; chegou com “[Em Monte Alegre] Há abundancia
subtileza um jacaré, e segurando com os dentes a de farinhas, veados, porcos, carneiros e ovelhas”
criança, depois de lhe dar com a cauda uma pancada (p. 343).
no rosto, de que lhe ficou roxa a face, se retirou “[Monte Alegre] Em os dias que estivemos
com a presa ao fundo como costuma, em ordem a houve muita abundancia de peixe, principalmente
afogal-a e subir com ella a praia ou ribeiras a comel- de excellentes paraoivas e outros entre os quaes
a em terra, pois debaixo d’agua não come o que veio um grande e muito bom chamado jandiás.
prende ou agarra; sendo isto cousa tão sabida por Pudemos averiguar que estando seis indios
estas partes, que o não ignoram os rapazes: e n’esta pescadores nossos quazi tres mezes a fazer peixe
certeza se pozeram alguma cousa arredados da boi para sortimento das canôas, tempo em que se
pequena praia, para esperar e ver como o jacaré costuma fazer cento e cincoenta arrobas, e
subia e trinchava o Joãozinho; porém, admirados constando-nos que foram felizes recolheram-se com
de que não apparecesse com elle na bocca, por ter algum peixe indigno, e nas mesmas vasilhas de salga
estado debaixo d’agua dizem elles uma hora, se um porco montez, misturado tudo, com que se
queriam retirar. Eis que apparece o jacaré com o completava o numero de vinte arrobas” (p. 346).
menino vivo atravessado na bocca, e o foi levando
“[Monte Alegre] Há grandes cobras de cascavel,
para perto de uma arvore. Então o menino, dizendo
e uma casta de abelhas ou vespas, a quem chamam
aos outros: Meus parentes, acudi-me! (a nada se
Cabas; ellas lançam um cheiro como de mel, que
animaram, nem podiam) lançou a mão esquerda a
não produzem, e são tão penetrantes, que uma d’ellas
um ramo da arvore, e com a direita os dedos aos
por cima da ceroulas e camisa nos mordeu em uma
olhos do jacaré, que com a dôr o largou. Então os
coxa muito arrasoadamente; faltava-nos depois da
rapazes ganharam animo, e dentro de uma igarité
cinza e jejum este cilicio, que não esteve frouxo, mas
ou canôa pequena o conduziram para terra, com
sem ter semelhantes effeitos aos das formigas de Alter
estrago de uma coxa e nadega.
do Chão. O remedio para a mordedura de caba é pôr
Durou vivo doze horas, sacramentou-se e em cima cobre ou ferro, o qual aplaca
morreu. Disse que estando no fundo clamára instantaneamente” (p. 347).
(cremos que em o seu coração): - Siara Tupan
cepereon – isto é – Senhor Deus, tende misericordia “[Outeiro] ...aqui se lava a roupa, e em horas
de mim! – e chamára muito por Santa Anna. Assim de sesta e noite se banham os indios, sem descer
se conservou vivo debaixo d’agua por tanto tempo, ao porto, nem perigo dos jacarés, que passeavam á
e com a debil força de menino e dispendio de sangue vista e sem abalo dos tiros, que se lhe deram por
se pôde valer de um ramo, e animar-se a metter os muitas vezes” (p. 348).
dedos nos olhos de uma fera, cuja vista é a mais “[Partida de Outeiro] Em o dia 30 com feliz
horrivel das que se conhecem no Estado. Sentiu-se successo continuámos a viagem; pelas cinco horas
a morte, e se tem feito algumas depois de jacarés: e meia nos fez recolher o nosso guia das ondas do
280 A “Viagem” do Bispo Dom Frei João de São Joseph Queiroz (1761-1763)

rio grande a uma pequena mas profunda ribeira que cima em movimento, não se atreveu a dar-lhe a
penetrava pela terra dentro, coberta de arvoredo, absolvição debaixo de condição...” (p. 371).
com sua praia; ahi deixámos passar uma trovoada
“... tambem os corpos padecem grandes
de relampagos e trovões com chuva, e se fez collação
ás seis horas, quasi ás escuras, para evitar a grande necessidades, porque como a villa [de Melgaço] nem
impressão de mosquitos e garapanazes” (p. 356). carne nem peixe tem, é o sustento dos indios farinha
com limão, pimenta e sal, e quando tem alguns
[Em Pombal] ... no que pertence á historia
camarões, é dia que se póde assignalar com pedra
natural sómente se offerece observar que há muitas
branca” (. 483).
aves, entre ellas as que se chamam picapáos, pela
industria com que formam ninhos em troncos. A “Nesta freguezia de Melgaço houve o anno
esta ave se diz deverem alguns poucos indios o passado um notavel successo, digno da historia.
raro segredo ou conhecimento de certa planta, com Sahiu uma ilha do Tajapurú nadando pelo lago de
a qual dizem se faz flexivel e brando o ferro como a Melgaço, que primeiro fôra solapada pelas aguas; e
cêra. Figuram pelo modo seguinte a especie do como as raizes do arvoredo que trazia estavam entre
phenomeno. Por brinco ou travessura, pretendem- si tecidas, e a terra bem unida na superficie,
se atravessára um prego á entrada do ninho, e que sustentou-se o equilibrio do arvoredo, que devemos
a ave vendo o impedimento procurára uma herva, suppôr Ter por casualidade partes iguaes a respeito
com a qual tocando e esfregando com o bico o ferro,
do todo; trazia macacos nas arvores a ilha, e cobras
pudéra facilmente cortal-o. Este é o modo com que
tambem. Assim veio esta machina nadante, maior
contam o invento, e dizem ter-se praticado muitas
que as náos da corôa, encostar-se a Melgaço, onde
vezes com diligente observação, porém que com
rarissimo effeito (O mesmo refere com pouca este (não lembra ao certo) 12 ou 15 dias, até que o
differença o coronel Pitta na sua America, e aponta vento e o embate das aguas a separou, e caminhando
caso de que af fir ma ser testemunha pessoa a vegetante não a outro sitio, n’elle teve a ruina, ainda
fidedigna em o sitio de Natuba, quarenta leguas que se mostram signaes bem visiveis do destroço para
distante da Bahia. O mesmo ouvimos a um viageiro monumentos da raridade: os indios iam dentro de
de grande probidade e juizo, chamado Caetano tal ilha e se aproveitaram de cousas d’ella. Esta
Ferr eira do Valle, natural de Matozinhos, noticia é constante sem duvida no facto, como podem
affirmando que na cidade de Loanda do reino de attestar o arcediago da sé, actualmente vigario, o
Angola um seu irmão prendêra certo escravo por director e capitão João Baptista Mardel, varios
travesso, e dizendo outro que elle se quizesse militares, e toda a villa. Não é caso raro n’estas partes
estaria livre, porque conhecia herva, e confirmando este, que na Europa o parecerá” (p. 489).
o escravo preso, conseguida licença primeiro,
mandou buscar a herva, que recebeu por mão de “[Paraná de Anapu, no rio T ocantins]
uma negra que lhe communicára o conhecimento Unicamente achámos noticia certa de haver por
da planta, e esfregado o ferro o puzéra como cêra, estas alturas porcos espins, como os pintam os
e desfizéra o grilhão. Sentença é de grandes historiadores e descrevem os poetas, pois quando
theologos que cada especie tem seu anjo da guarda, irritados estão despedem umas settas ou espinhos,
em ordem a conservar -se, mediante o instincto da cujas feridas são rebeldes á cura. Não achei que
natureza excitada)” (p. 370). houvesse noticia de pedra do tal animal, mas que
“[Em Pombal] Não há muito tempo que um os espinhos se estimam é sem duvida. Um dos
vigario, acudindo a ver uma india que gritou por nossos capellães teve dois porcos espins: nada tem
elle nas praias do Parú, indo na bocca de um jacaré, de raros, com tanto que se procurem e pelo nome
e vendo-a debaixo d’agua, mas com uma mão em dos gentios” (p. 511).

Referências
Aranha, B., 1883. Diccionario bibliographico portuguez. Estudos de Innocencio Francisco da Silva applicaveis
a Portugal e ao Brazil continuados e ampliados por Brito Aranha, em virtude de contrato celebrado com o
governo portuguez. Tomo Decimo (Terceiro do Supplemento), H-J. Imprensa Nacional, Lisboa.
Castello-Branco, C., 1868. Memorias de Fr. João de S. Joseph Queiroz, bispo do Grão-Pará. Com uma introdução
e notas illustrativas por Camillo Castello-Branco, 214 + 1 pp. Typographia da Livraria Nacional, Porto.
Moraes, Mello, 1864. Brazil histórico Vol. 1.
São José, D. Fr. J. de, 1847. Viagem e visita do sertão em o Bispado do Gram Pará em 1762-1763. Escripta
pelo Bispo D. Fr. João de S. José, monge benedictino. Revta Inst. hist. geogr. Brasil 9: 43-107, 179-227,
328-375, 476-527. [2a. ed., 1869].
São José, D. Fr. J. de, 1867. Memorias. Jornal do Commercio, Lisboa, nos. 3.965, 3.967, 3.968, 3.976,
3.978, 3.979, 3.987, 3.988, 3.990, 3.991, 4.000, 4.001, 4.013, 4.017, 4.018, 4.022, 4.024, 4.030, 4.034,
4.036, 4.040.
Silva, I. F. da, 1859. Diccionario bibliographico portuguez. Estudos de Innocencio Francisco da Silva applicaveis
a Portugal e ao Brazil. Tomo Terceiro. Imprensa Nacional, Lisboa. [P. 390].
Capítulo 25

O “ROTEIRO DA VIAGEM DA CIDADE DO PARÁ


ÀS ÚLTIMAS COLONIAS DO SERTÃO DA PROVÍNCIA”
DO PE. JOSÉ MONTEIRO DE NORONHA (1768)

J osé Monteiro de Noronha nasceu em Belém, no Pará, em 1723. Estudou no colégio dos
jesuítas (S. Alexandre) e depois freqüentou escolas públicas. Casou-se, e depois de enviuvar (1754)
decidiu abraçar o estado eclesiástico. Foi vigário geral no Rio Negro e pregador de fama. Morreu a
15 de abril de 1791.
Legou-nos um precioso “Relato da viagem da cidade do Pará às últimas colonias do Sertão da
Província”, obra concisa, precisa e riquíssima de informações geográficas e hidrográficas, com um
impressionante elenco das tribos indígenas da Amazônia. Essa obra é ainda merecedora de encômios
por se tratar do primeiro livro sobre a Amazônia escrito por um paraense. Surgiu pela primeira vez
o “Relato” no vol. 87 do Jornal de Coimbra (ano ?); foi depois publicado pela Academia Real das
Ciências de Lisboa (Noronha, 1856), na Collecção de noticias para a Historia e Geographia das
nações ultramarinas que vivem nos Domínios Portuguezes ou lhes são visinhas; finalmente foi editado
sob forma de livro, em Belém, em 1862. Existem ainda dois manuscritos coevos desse documento,
um na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, intitulado Roteiro das viagens da cidade do Pará até
as ultimas colonias dos dominios portuguezes em os rios Amazonas e Negro. Illustrado com algumas
noticias, que podem interessar a curiosidade dos navegantes, e dar mais claro conhecimento das
duas Capitanias do Pará e S. João do Rio Negro; o outro no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro,
no Rio de Janeiro, com o título Roteiro da viagem do Estado do Pará até a ultima povoação do Rio
Negro; na biblioteca desta última instituição existe também um manuscrito inédito de Antonio
Ladislao Monteiro Baena, emitindo um “Parecer ácerca do manuscripto anonymo intitulado
‘Roteiro...’ ”.
São infelizmente poucas as referências a animais existentes nesta obra (mas entre elas
encontra-se o primeiro registro de moluscos fósseis!). Transcrevemo-las em seguida (as páginas
citadas referem-se à edição da Academia de Ciências de Portugal (Noronha, 1856)):
“17. Entre a Villa Viçosa, e o Canal do Limoeiro “72. Defronte do primeiro furo de Saracá
se achão dilatadas minas de berbigões, e conchas principião as praias, aonde com mais abundancia
marinhas, a que dão o nome de cernambi, de que se costumão as tartarugas depôr os seus ovos. Não
faz consideravel quantidade de cal; que he outro ramo pretendo escrever a historia particular das
de commercio daquella villa. As ditas minas provão tartarugas e suas especies, nem contradizer as
demonstrativamente que esta Peninsula foi em tempo noticias que dellas dão alguns; porque em outras
partes poderão ter notavel differença: e só passo a
antigo inundada das agoas do mar, que ao depois se
dizer: que as tartarugas de concha preciosa se
retirou, por se elevar aquelle sitio sobre o nivel, que
achão e pescão na costa seguida da cidade do Pará
antes tinha; ou porque outros sitios donde se para baixo, e que as do Rio Amazonas, e outras de
recolherão as agoas, baixarão do nivel da Península, agoa doce, são das que se comem. Estas apenas
por causa de alguma alteração, e por qualquer dos pezão vivas tres arrobas; e depõem os ovos
modos, que discorrem Mr. Buffon (Hist. Natur. Tom. ordinariamente por huma vez em os mezes de
I da 4ª Ediç. Da pag. 97 em diante) e Feijó (Theatro Outubro e Novembro, em que estão enxutas as
Critico Tom. 5. Discurs. 15. N. 16, 45 e 65). Das praias. Cada huma depõe cento e quarenta ovos,
mesmas conchas há tambem grandes minas no Rio mais, ou menos; e os escondem na arêa, não
Canaticú da Ilha do Marajó, do qual se tratará mais ligeiramente mas com profundidade de dois
adiante, em os Rios Maracaná e Marapani, que fica palmos; de modo que não he o calor do Sol, sim o
da arêa, o que os fomenta, e faz sahir os filhos, os
abaixo do Rio Curuçá declarado no § 5” (p. 11).
quaes logo que chegão á agoa, mergulhão sem
“66. Nos lagos do Rio Nhamundá se achão e embaraço das ondas” (pp. 30-31).
pescão os peixes Bois chamados de azeite, os quaes “81. Da sahida superior de Matary se segue em
só differem dos ordinarios em terem maior altura, e distancia de seis legoas, e na mesma margem
tanto toucinho e gordura que quasi se lhe não percebe septentrional a ponta de Pedras, a que chamão –
carne alguma. Ha peixe Boi destes, que rende vinte Puraquécóara – e vale o mesmo que, lugar ou buraco
e mais almudes de azeite” (pp. 28-29). das Tremelgas, por haverem muitas neste sitio.
282 O “Roteiro da Viagem” do Pe. José Monteiro de Noronha (1768)

82. Mr. Laurencini citado em o Diccionario Critico Tom. 2º Discurs. No. [incompleto]): porêm o
de Dombez verbo Torpille diz, que as tremelgas de estupor he na verdade maior, do que suppõe este
maior grandeza pezão de 18 a 24 libras; e que he author; e bastante para fazer morrer afogados a
precioso [sic] toca-las immediatamente com a mão muitos homens, e outros animaes, quando
em dois musculos, que as cingem, e onde reside o encontrando-os as tremelgas em algum Rio, ou Lago;
seu veneno para se sentir o estupor, que produzem. se esfregão por elles de modo, que por
Neste Estado há tremelgas de 40 e mais libras; e entorpecimento, não pódem nadar. O mesmo Mr.
em qualquer parte do corpo, que se lhe toque com Laurencini colloca as tremelgas na classe dos
a mão, ou com instrumento de pau, ferro, ou aço, viviparos. O certo he, que ellas tem ovos similhantes
causão o referido estupor, e mais intenso, sendo aos do peixe Arauaná, e depois de vingados os ovos,
feita a percussão com instrumento de ferro, ou aço. e sahirem delles os filhos, he que os crião, e agazalhão
A sensação que se sente no braço, he livremente entre as guelras, como fazem os peixes chamadas
dolorosa como affirma o doutissimo Feijó (Theatro Piráurucú, e outros” (pp. 34-35).

Referências
Noronha, Pe. J. M. de, 1856. N. I. Roteiro da viagem da Cidade do Pará até ás ultimas colonias dos Dominios
Portuguezes em os Rios Amazonas e Negro. Illustrado com algumas Noticias, que pódem interessar a
curiosidade dos navegantes, e dar mais claro conhecimento das suas Capitanias do Pará, e de S. José do
Rio Negro, pp. 1-85, in Academia Real das Sciencias de Lisboa, Collecção de noticias para a historia e
geographia das nações ultramarinas que vivem nos Dominios Portuguezes, ou lhes são visinhas: Publicada
pela.... Tomo VI. Typographia da Real Academia das Sciencias, Lisboa.
Noronha, Pe. J. M. de, 1862. Roteiro da viagem da Cidade do Pará, as ultimas colonias do Sertao da Provincia.
Escripto na Villa de Barcellos pelo Vigario Geral do Rio Negro o Padre Dr. José Monteiro de Noronha no anno
de 1768. Typographia de Santos & Irmaos, Pará [= Belém]. [Tal é o título da capa; o que consta da
primeira página do texto reza: “Roteiro da viagem da cidade do Pará ate as ultimas colonias dos dominios
portuguezes em os rios Amazonas e Negro. Illustrado com algumas noticias, que podem interessar a
curiosidade dos navegantes, e dar mais claro conhecimento das duas capitanias do Pará, e do S. José do
Rio Negro”].
Capítulo 26

FRANCISCO XAVIER RIBEIRO DE SAMPAIO E A PRIMEIRA


RELAÇÃO DA FAUNA DO RIO BRANCO (1774-1775)

O Tratado de Madri (1750) pueden de uno y outro sexo para que instruyan en
el modo de trabajar a los recién-pacificados y
Segundo Lucena Giraldo (1991: 7-15;
dejando a éstos com tal cual regularidad y
em tradução):
gobiernados por un capitán (que comúnmente es
“As relações entre Portugal e Espanha tiveram de los que concurrieron a la expedición) y por
um momento de atrito permanente desde o século algunos outr os portugueses que sirvan los
XVI por causa da grande expansão fronteiriça principales oficios del nuevo pueblo, siguen
experimentada pelas possessões lusas no Novo sucesivamente y sin dejar enemigos a las espaldas”
Mundo. Esta pode-se explicar, entre outras razões, (Bayle, 1951: 433).
pela diferença nas atitudes oficiais respectivas ante Até 1750, a grande profundidade alcançada
a empresa de avanço para o interior do continente. no interior do continente pela fronteira lusa, havia
Enquanto do lado português esta recebia todo o terminado por levar as potências ibéricas a uma
apoio, do lado espanhol governou-se por longo situação política extremamente delicada, já que sua
tempo como se a fronteira tropical carecesse de disputa territorial se havia convertido em eminente
qualquer valor. Um Vice-rei do Peru, o Conde de conflito fronteiriço. A definição das áreas de
Superunda (1754-1761) chegou a dizer em sua soberania respectivas no Novo Mundo parecia
‘Relación de Mando’ o seguinte comentário: absolutamente impredizível, por estas razões
‘Los países no conquistados son unas selvas y estritamente políticas, mas havia um fator ainda
montañas de difícil tránsito y los llanos muy mais importante que aconselhava a busca de algum
húmedos, cenagosos y ardientes, por lo que no tipo de negociação bilateral: o controle do espaço e
pueden mantenerse los españoles. Las naciones que os mercados coloniais se haviam convertido em um
allí habitan son bárbaras. No cuidan de cubrir su fator de verdadeira preponderância mundial, e tanto
desnudez y sus casas son tan pobres que nada Espanha como Portugal encontravam-se imersos em
pierden aunque se las quiten, porque com cuatro planos de renovação econômica e tecnológica
palos y unas hojas de árboles en pocas horas interiores que lhes exigiam a implantação de um
fabrican outras en el lugar que les parece. Reducirlos controle estrito de seus territórios ultramarinos.
por armas se há tenido siempre por imposible, Com isto iria nascer uma nova categoria política: o
respecto de que con mudarse de un lugar a outro e reformismo de fronteira.
internarse en lo más espeso de la montaña, como
Tudo parece indicar que o rei português José
lo han hecho en las ocasiones que se les há buscado,
I teve que esperar a morte de Felipe V para lograr
quedan frustradas las diligencias, perdidos los
que a Espanha acolhesse um projeto de dirimir os
gastos y expuestas muchas vidas por las
problemas fronteiriços mútuos em Ásia e América.
enfermedades que se contraen’.
A resolução de uma dúvida sobre os limites dos dois
Frente a posições como esta, a precária domínios que, dizia-se, havia durado duzentos e
situação fronteiriça espanhola no Amazonas foi cinqüenta anos, esteve marcada pela nova atitude
sustentada durante o Século XVII e boa parte do frente ao passado, a busca de uma regeneração das
Século XVIII, pelos missionários da Companhia de monarquias ibéricas e a utilização de argumentos
Jesus. Estes desenvolveram diversas ofensivas científicos na negociação. Tarefas diplomáticas nas
informativas, cujo objetivo foi sensibilizar as quais as ciências geometrizantes deviam ajudar a
autoridades políticas peninsulares e lograr um buscar rios e montes como limites ‘visíveis e
apoio estatal efetivo, mas obtiveram pouco êxito. inalteráveis’ nos quais dever -se-iam implantar
Um testemunho de um deles permite-nos conhecer marcos de pedra que tornassem patente o limite no
com exatidão o sistema de assentamento usado Novo Mundo, unindo ao mandato da natureza o da
pelos lusos: razão.
‘El método que los portugueses han tenido y Até 1746, encontrava-se a Espanha em uma
tienen en esta grande empresa de la extensión de situação de fraqueza tal que existia a convicção de
sus dominios es el más oportuno que se puede idear, que nem se podiam povoar as regiões interiores do
y se reduce a ir cada año o de dos en dos años Brasil nem era factível evitar que os portugueses as
haciendo sus excursiones o reconocimientos, y junta ocupassem. A contenção por força das armas, tantas
la gente que hallan establecen un pueblo, llevando vezes pedidas pelos missionários, também resultava
de los anteriores ya civilizados las personas que impossível. Na prática, dizia-se:
284 Francisco Xavier Ribeiro de Sampaio e a Fauna do Rio Branco (1774-1775)

‘No hay más remedio que ajustarse de modo em diante não se trate mais dela, reduzindo-se os
que cada uno sepa lo que es suyo, quedando por limites das duas monarquias aos que assinalarão
linderos los parajes más conocidos de aquellos no presente Tratado’.
países, para que no se alteren en adelante, en cuya Ressalta a vontade de que os limites existam
forma prevenimos la introducción futura y evitamos em paragens conhecidas ‘para que em tempo algum
más daños’. se confundam nem dêm ocasião a disputas, como
O acerto de um limite poderia deter são a origem e curso dos rios e os montes mais
definitivamente os portugueses, que se haviam notáveis’, e mencionam-se os plenipotenciários
adiantado umas 500 léguas sobre a linha principal respectivos. Em seguida proclama-se o Tratado
do Tratado de Tordesilhas no Amazonas, 200 em como único fundamento em questões de limites e
Cuiabá e Mato Grosso, 100 ao poente e 200 na passa-se às questões concretas. Pelo artigo 2 º.,
costa até o Rio da Prata, a reorientação da política Portugal cede à Espanha as ilhas Filipinas e
exterior espanhola – com a busca de novos aliados, adjacentes. O artigo 3º trata da cessão do Amazonas
o desejo de paz – uma condição para a reconstrução pela Espanha:
interna -, a intenção portuguesa de libertar-se de ‘Da mesma forma, pertencerá à Coroa de
seu caráter de colônia econômica inglesa e sua Portugal tudo o que tiver ocupado pelo rio Maranhão
necessidade de organizar e explorar efetivamente ou das Amazonas acima, e o terreno de ambas as
o território ocupado, assegurando-lhe a explotação margens deste rio até as paragens que abaixo se
da planície central aurífera e diamantífera dirão...’
brasileira, levaram definitivamente à discussão
A descrição da linha divisória ‘pela parte do
política os ministros de estado respectivos, José
norte’ abarca os artigos 7o, 8º e 9º:
de Carvajal pela Espanha, e Alexandre de Gusmão
por Portugal. Apesar da complexidade das ‘Desde a boca do rio Jauru pela parte ocidental
negociações, que duraram cerca de três anos, a 13 seguirá a fronteira uma linha reta até a margem
de janeiro de 1759 os plenipotenciários concluíram austral do rio Guaporé em frente à boca do rio Sararé,
o T ratado, que constituiu uma novidade que entra no dito Guaporé por sua margem
diplomática sem precedentes. setentrional... desde o lugar que na margen austral
Aquele que seria conhecido como ‘Tratado de do Guaporé for assinalado por termo da linha, como
Madrid’ começa mencionando a necessidade de fica explicado, baixará a fronteira por toda a corrente
aplanar os obstáculos que alteram a amizade entre do rio Guaporé até mais abaixo de sua união com o
as duas coroas, particularmente por motivo das rio Mamoré... formam juntos o rio chamado da
diferenças sobre os limites na América. Decidiu-se Madeira, que entra no Maranhão ou Amazonas por
‘por termo às disputas passadas e futuras’, para sua margem austral... baixará pelas águas destes
que chegou-se a ajuste conveniente para ambas. dois rios já unidos até a paragem situada a igual
Faz-se em seguida uma análise histórica do conflito, distancia do citado rio Maranhão ou Amazonas e da
enumerando as razões de ambos contendentes e boca do dito Mamoré, e desde aquela paragem
as rupturas mútuas. Para que não voltem a repetir- continuará por uma linha este-oeste até encontrar
se, começa-se por derrogar a maior causa das com a margem oriental do rio Javari, que entra no
diferenças, o Tratado de Tordesilhas, assim como Maranhão pela margem austral, e baixando pelas
outros que também estavam em vigor: águas do Javari até onde desemboca no Maranhão
ou Amazonas, seguirá águas abaixo por este rio até
‘Reconhecendo as dificuldades e dúvidas que a boca mais ocidental do Japurá, que desagua nele
em todos os tempos tornarão embaraçosa esta pela margem setentrional’.
contenda, se se houvesse de julgar por meio da
demarcação concordada em Tordesilhas, já porque O limite entre as possessões hispano-
não se declarou desde qual das ilhas de Cabo Verde portuguesas continuava então pelo rio Japurá e seus
se havia de começar a conta das 370 léguas, já afluentes en direção ao norte, para dirigir-se até a
pela dificuldade de assinalar em as costas da cordilheira que se acreditava dividir as bacias fluviais
América Meridional os dois pontos ao sul e ao norte do Orinoco e do Amazonas. O trecho final devia seguir
de onde havia de principiar a linha, já pela ‘pelo cume dessas montanhas ao oriente até onde se
impossibilidade moral de estabelecer com certeza extenda o domínio de uma e outra monarquias’.
no meio dessa mesma América uma linha Continuando, reservava-se a navegação e posse
meridiana... Considerando ao mesmo tempo que dos rios Japurá e Negro para os portugueses e do
os referidos embaraços talvez fossem no passado a Orinoco para os espanhóis: ‘Assinalarão os limites
ocasião principal dos excessos que de uma e outra pelas lagoas e rios... sem reparar o pouco mais ou
partes tiveram.... [ambas as Coroas] resolveram pôr menos de terreno que fique para uma ou outra
termo às disputas passadas e futuras, e esquecer- coroas, desde que se logren os fins desejados’. Os
se e não usar de todas as ações e direitos que artigos restantes do Tratado abrigavam as instruções
possam pertencer-lhes em virtude dos referidos complementares para a definição da linha divisória.
Tratados de Tordesilhas, Lisboa e Utrecht, e da Tratava-se da adjudicação das ilhas fluviais à
escritura de Zaragoza, ou de outros quaisquer potência cuja margem ficava mais próxma na estação
fundamentos que possam influir na divisão de seus seca, a elaboração de um mapa firmado pelos
domínios por linha meridiana, e querem que daqui representantes de ambas coroas e a colocação
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 285

de nomes de comum acordo aos rios e montanhas Finalmente, declarava-se a irreversibilidade


que se fossem descobrindo. Os artigos que das cessões mútuas e proclamavam-se a garantia
regularam a navegação mútua dos cursos fluviais recíproca e a perpetuidade do convênio diplomático.
resultaram muito originais, a proibição absoluta do O Tratado de Madrid foi um feito tanto para a
comércio na zona limítrofe, o ilícito levantamento diplomacia hispano-portuguesa como para o marco
de fortificações ou povoações nos rios fronteiriços e tradicional das relações entre as potências
a neutralização da América do Sul com relação aos européias. A ruptura do que poderíamos chamar
conflitos europeus que pudessem envolver ambas de ‘ordem diplomática tradicional’ manifestou-se
potências. A realização na prática da linha divisória desde a negociação, com a busca de observações
aceitada no gabinete ficava confiada a comissões científicas modernas e indiscutíveis, que apoiassem
especiais, de acordo com o artigo 22º: as posições respectivas. No campo jurídico, as
‘Para que se determinem com maior precisão inovações foram enor mes; por influência de
e sem que haja lugar à mais leve dúvida no futuro, Alexandre de Gusmão, aplicou-se um princípio do
nos lugares por onde deve passar a linha em direito civil romano – o uti possidetis – ao campo
algumas partes que estão nomeadas e das relações enttre Estados, uma esfera de direito
especificadas distintamente nos artigos público. O ‘utis possidetis iuris’ do Tratado de
antecedentes, como também para declarar a qual Tordesillas transformou-se em ‘uti possidetis facti’,
dos domínios hão de pertencer as ilhas que se uma pirueta jurídica que permitiu a legalização de
achem nos rios que hão de servir de fronteira, todo o processo de usurpação português. A
nomearão ambas majestades, quanto antes, neutralização das possessões americanas das
comissários inteligentes, os quais, visitando toda potências firmantes do Tratado foi, por sua vez, uma
a linha, ajustem, com a maior distinção e iniciativa de José de Carvajal. Segundo este
claridade, as paragens por onde há de correr a princípio, os possíveis conflitos suscitados na
demarcação, em virtude do que se há de expor Europa não afetariam as relações hispano-
neste Tratado, pondo marcas nos lugares que lhes portuguesas nas possessões americanas. A
pareça conveniente, e aquilo que decidirem será desmilitarização da fronteira foi uma consequência
válido perpetuamente, em virtude da aprovação e lógica do ambiente de entendimento comum. A
ratificação de ambas majestades; mas em caso de proibição de levantamentos nos rios limítrofes de
que não se possa concordar com alguma paragem, estabelecimentos militares buscava dar garantias
darão conta aos sereníssimos reis para decidir a de uma solução pacífica aos possíveis problemas
dúvida em termos justos e convenientes’. que surgissem.”

Diz Rodolfo Garcia em seu esplêndido ensaio (1922) “Historia das explorações scientificas”
(pp. 869, 871-872):

“Em meados do seculo XVIII, as questões de quaes o capitão-general commissario, seus ajudantes
limites, entre as possessões portuguezas e de ordens, o secretario da expedição e conferencias,
hispanholas na America, motivaram diversas os capellães, o physico-mór, o sargento-mór,
explorações geographicas que cumpre aqui engenheiros, capitães e tenentes engenheiros,
rememorar. Em cumprimento do tratado de 13 de doutores mathematicos, desenhadores, provedor,
Janeiro de 1750, as Côrtes de Madrid e Lisboa thesoireiro, escrivão da receita, capitães-tenentes e
nomearam commissarios, que deviam proceder á alferes, 205 soldados, 24 pilotos, 411 remeiros, 62
demarcação das fronteiras. Por parte de Portugal foi creados e escravos. Todo esse pessoal foi
escolhido para primeiro commissario, da primeira transportado em 37 canôas, das quaes se distinguia
divisão da fronteira ao Sul, que alcançava desde a do general ‘em ser toda purpurea’, informa Baena
Castilhos a foz do Jaurú, o governador e capitão- no Compendio das Eras. (...).
general do Rio, Minas e S. Paulo, Gomes Freire de O facto é que o encontro das commissões no
Andrade; a primeira divisão, ao Norte, ficou a Rio Negro, com o dinheiro que derramaram, os
principio a cargo do governador e capitão-general do fornecimentos vindos da Europa e do Pará, as
Estado do Maranhão, Francisco Xavier de Mendonça edificações que, para acomodá-las e ao seu pessoal,
Furtado, que se passou para o Pará, cuja capital foi, o Governo Portuguez teve que construir (...), deram
para isso, em 1753, declarada séde da Capitania grande animação áquella região na segunda metade
Geral; ficando depois a cargo de d. Antonio Rolim de do seculo XVIII. Se foi um bem ou um mal para o
Moura, governador de Matto-Grosso, que mudou, em desenvolvimento della (...) é questão differente. Os
1761, a capital dessa Capitania para Villa Bella, mais indios desviados para o serviço, muitas vezes a elles
proxima da fronteira. mesmos fatal, de remeiros no immenso percurso
Por parte de Hispanha foi confiada a primeira do Pará a Matto-Grosso, desfalcavam a cultura e a
divisão do Sul ao marquez de Valdelirios e a do Norte povoação de uma e outra Capitania. Navegava-se
a d. José Iturriaga. Para um e outro lado mandaram- do Pará para o Rio Negro e do Rio Negro para Matto-
se astronomos e geographos, quasi todos Grosso em canôas ou botes de meia coberta, para
extrangeiros; numerosissimo foi o pessoal que evitar as alagações a que estavam sujeitas as canôas
empregaram. Mendonça Furtado chegou ao arraial de poço; nos portos das povoações havia sempre,
do Rio Negro em 1755 com 796 pessoas, entre as promptos de munições de bocca e de guerra, os botes
286 Francisco Xavier Ribeiro de Sampaio e a Fauna do Rio Branco (1774-1775)

de reserva para a segurança da navegação de alto entre aquelles dois rios, devia caminhar em
Barcellos ao Pará. Uma canôa grande de carga rumo léste, para dividir os dois dominios até seus
vencia a distancia em 30 a 40 dias, os botes confins.
ordinarios desciam em 15. Rio acima, ajudada pelos Sabe-se que a opposição dos Jesuitas aos
ventos geraes, a mesma canôa, confor me a commissarios muito prejudicou os trabalhos da
correnteza do Amazonas e do Rio Negro, levava de demarcação. Ainda em 1759, o commissario
45 a 60 dias e mais. A navegação do Rio Negro Iturriaga, por falta de canôa, e canoeiros, que lhe
praticava-se em cerca de 150 leguas (...). deviam fornecer os missionarios do Orinoco, não
Com relação às demarcações da parte do havia podido passar de Cabruta, donde devia subir
Norte, sabe-se que o trecho dessa fronteira, como ao Cassiquiari, a encontrar-se com os commissarios
aconteceu ao sul, ficou dividido em tres partidas. portuguezes no Rio Negro. (...).
A primeira partida devia descer o Rio Negro, O tratado de 1750 foi annullado, e todos os
atravessar as aguas do Amazonas e subir o Madeira seus effeitos cancellados, pelo tratado de 12 de
e o Guaporé até a boca do Jaurú; à segunda Fevereiro de 1761, assignado no Prado pelos
competia buscar a bocca mais occidental do Japurá plenipotenciarios das duas Côrtes. Depois desse
e prosseguir até aos montes existentes entre o pacto, as questões de limites entre as duas
Amazonas e o Orinoco; a terceira, partindo do monarchias ibericas só voltaram a ser objecto de
extremo ou ponto de divisão assignalado pela deliberação pelo tratado preliminar de Santo
precedente, no cume dos montes ou terreno mais Ildefonso (La Granja), de 1 de Outubro de 1777”.

A expedição de Sampaio ao rio Negro


Prossegue Garcia (1922: 872):
“Antes de passarmos ás explorações decorrentes desse pacto devemos, em respeito á ordem
chronologica, abrir espaço aqui para tratar a viagem que, em visita e correição das povoações da
Capitania de S. José do Rio Negro, fez, em 1774 e 1775, o ouvidor e intendente geral Francisco
Xavier Ribeiro de Sampaio, na qual colligiu noticias relativas á mesma Capitania, de summa
relevancia para o seu conhecimento.”

Segundo Silva (1859: 95-96) e Varnhagen (1866: 404-406), Francisco Xavier Ribeiro de
Sampaio (ou S. Paio, como grafado pelo primeiro autor) nasceu na vila de Mirandela, comarca de
Moncorvo, Portugal, a 13 de agosto de 1741, filho do capitão de ordenanças Luiz Ribeiro de
Sampaio e de Dna. Leonor da Costa. Seguiu os estudos na Universidade de Coimbra, de 1757 a
1762, bacharelando-se em leis. Foi nomeado Juiz de Fora e Provedor da Fazenda Real da Capitania
do Pará, no Brasil, por decreto de 8 de março de 1767, tomando posse desses cargos a 11 de
maio do mesmo ano, e neles serviu até 21 de novembro de 1772. Depois disso passou a Ouvidor
e Provedor da Fazenda Real, e Intendente de Agricultura da Capitania do Rio Negro, em setembro
de 1772, tomando posse aos 27 dias de outubro de 1773; nesses cargos serviu até 25 de janeiro
de 1780. De volta a Portugal, foi despachado para Provedor da Comarca de Miranda do Douro,
de que tomou posse em 7 de março de 1782, com o predicamento de primeiro banco. Foi
reconduzido no mesmo lugar, fazendo-o da relação do Porto por decreto de 26 de fevereiro de
1789 e sendo relevado do dito lugar de provedor, veio a ter exercício efetivo na relação, que
principiou em 10 de junho de 1794. Por decreto de 7 de janeiro de 1800 foi despachado para
Desembargador da Casa de Suplicação. Sendo Ouvidor do Rio Negro, Sua Majestade fez mercê
do hábito de Cavaleiro da Ordem de Cristo. Foi membro da Academia de Ciências de Lisboa.
Morreu entre os anos de 1812 e 1814.
Dele disse ainda Rodolfo Garcia (1922: 872):

“Ribeiro de Sampaio entrou a servir o logar de dos Indios, transcreve as providencias que decretou
ouvidor e intendente geral em fins de Outubro de para seu governo, dá noticia de dezenas de rios,
1773, trazendo do governador João Pereira Caldas discute as questões de limites com o Perú, Nova
recommendações especiaes para visitar as Granada e Guiana, bem como insere uma descrição
povoações da Capitania. A ultima correição havia do Rio Negro por José Monteiro de Noronha, datada
sido em 1768; instava, portanto, a necessidade de Barcellos, 1769. Monteiro de Noronha é o auctor
daquellas povoações que se fizesse nova visita. Em do Roteiro da viagem da Cidade de Belém até ás
31 de Agosto de 1774 emprehendeu o ouvidor sua ultimas colonias dos dominios portuguezes em os rios
viagem em uma canôa grande de oito remeiros por Amazonas e Negro, e parece ter acompanhado o
banda e mais outra pequena, para o serviço da ouvidor precedente em sua referida correição de
viagem, caça e pesca. A comitiva compunha-se de 1768. Seu roteiro foi publicado pela primeira vez
26 pessoas. No Diario, que escreveu o ouvidor, trata por Philippe Alberto Patroni Martins Maciel Parente,
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 287

sem nome do auctor, no Jornal de Coimbra, no. 87, progressos dos estabe-lecimentos que lhe foram
1a. parte, e depois na Collecção de Noticias para a posteriores até o anno de 1788, etc., impressa na
Historia e Geographia das Nações Ultramarinas, Revista do Instituto Historico, tomo xiii (1850) [Um
tomo vi (Lisboa, 1826). Há uma edição tirada no resumo dessa relação já fora publicado na mesma
Pará em 1862. revista, no vol. 1, pp. 100-122, 1839]. O
O Diario de Viagem de Ribeiro de Sampaio foi manuscripto original autographo se conserva na
publicado em 1825 pela Academia Real das mesma Bibliotheca (...). Esse manuscripto traz um
Sciencias de Lisboa e depois pela Revista do Instituto mappa de Indios do Rio Branco e outro que mostra
Historico, tomo i (1839). (...). Mas em nenhuma o Rio Negro, desde a bocca do Rio Caboris até a
dessas publicações se encontra o mappa do Rio Povoação de S. Carlos. Vem tambem publicado por
Negro e parte do Orinoco que traz o manuscripto, Nabuco nos Annexos já referidos. Não só a
hoje pertencente á Bibliotheca Nacional (...). Da Geographia e a Historia, como a Ethnographia e a
auctoria de Ribeiro Sampaio é tambem a Relação Historia Natural, são tratadas nesse trabalho de
Geographico-Historica da America Portugueza, na modo succinto, mas consciencioso em sua exposição
qual se dá noticias do seu descobrimento e dos e methodo”.

Além de algumas outras obras que apresentamos nas “Referências”, Sampaio foi autor de
outros trabalhos, arrolados por Varnhagen (1866).

Lista dos animais do rio Branco


A Relação geographica-historica de Francisco Xavier Ribeiro de Sampaio (cf. Sampaio, 1850)
está dividida nos seguintes capítulos:
I. Descreve-se o Rio Branco; o territorio que comprehende; seus limites e confrontações; natureza
e temperamento do seu clima;
II. Descobrimento do Rio Branco pelos portuguezes; uso consecutivo d’este descobrimento até o
presente;
III. Intentos dos hespanhóes de se estabelecerem no Rio Branco; invasão effectiva dos mesmos;
IV. Chega ao Rio Negro a noticia da intrusão dos hespanhóes no Rio Branco, e porque modo: o que
se obra para a sua expulsão, e como se consegue.
V. Negociação em que entra o governador da Guyana hespanhola com o nosso do Rio Negro sobre
os limites dos dominios das duas corôas no Rio Branco: carta d’aquelle, e resposta do nosso;
VI. Apologia do direito de Portugal sobre o Rio Branco e seu territorio, em impugnação das pretenções
dos hespanhóes;
VII. Digressão sobre os verdadeiros motivos da invasão dos hespanhóes no Rio Branco: noticia
occasional da Lagua Parime ou Dourado;
VIII. Novos estabelecimentos portuguezes no Rio Branco;
IX. Dá-se noticia das nações de indios habitantes do Rio Branco, e dos seus usos e costumes;
X. Breve nomenclatura dos animaes, plantas e minerais, que se acham no território do
Rio Branco.
XI. Reflexões sobre as utilidades que podem resultar a Portugal dos estabelecimentos do
Rio Branco.

Dedicou pois o capítulo X a uma sucinta enumeração dos animais, plantas e minerais do
Rio Branco. Faz no início esta introdução:
“Em dois pontos tenho de prevenir os leitores sobre a materia do presente capitulo.
O primeiro, que se deve tomar ao pé da letra o titulo d’elle. Não desejo prometter e faltar depois á
promessa. Não se deve esperar de mim um tratado de historia natural, com as descripções
expressadas com termos technicos, com a ordem scientifica das classes, e com as divisões e
especies. Nem eu me acho com a instrucção necessaria para o desempenho de igual obra, nem em
circumstancias de a executar. Prometto unicamente um catalogo simples, e esse nem ainda
completo. O fim d’esta relação é dar uma idéia do todo, e quanto possa ser das partes do vasto
territorio que é o seu objecto. N’este plano entrava necessariamente descrever tambem o que toca
á historia natural d’aquelle paiz; porém não sendo comtudo o fim primario, merece desculpa não
se tratar com toda a perfeição: é por isso bastante uma nomenclatura. O segundo ponto. Em que
devo prevenir os leitores, consiste em advertir que os animaes ou plantas aqui nomenclaturadas
não são proprios e particulares ao territorio do Rio Branco. Faço de tudo menção por se achar
n’aquelle rio ou paiz; mas não por lhe serem exclusivamente proprio. Com estas advertencias
principiarei o meu capítulo”.
288 Francisco Xavier Ribeiro de Sampaio e a Fauna do Rio Branco (1774-1775)

Figura 26.1. Quatis (apud Brehm)


O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 289

Dividiu o “Reino Animal” em:


1. “Quadrupedes” (dos quais examinou os “Macacos” em separado),
2. “Reptís terrestres”,
3. “Animaes aquaticos” (separados em “Quadrupedes”, “Peixes de grande corpulencia”;
4. “Peixes de menor corpulencia”, “Testaceos” e “Mariscos”),
5. “Aves” (compreendendo: “Aves de rapina”, “Papagaios”, “Aves aquaticas” [subdivididas em
“Brancas”, “Encarnadas”, “Vermelhas”, “Pretas” e “De diversas côres”] e “Aves silvestres”)
Listou nesse capítulo 224 nomes de animais, reproduzidos na seqüência. Sua identificação
será dada num “Dicionário histórico dos animais do Brasil”, ora em elaboração.

1. Acará (2 espécies) - 259 38. Cobra de arára - 258


2. Acotipurú (3 espécies) - 258 39. Cobra de cascavel - 258
3. Anacan - 260 40. Cobra de coral - 258
4. Anta - 257 41. Cobra de coral - 260
5. Anú (duas variedades) - 261 42. Cobra de cotía - 258
6. Anujá - 259 43. Cobra de duas cabeças (2 variedades) - 259
7. Araçari (2 variedades) - 261 44. Cobra de jabutí - 259
8. Aracuan - 262 45. Cobra de papagaio - 258
9. Arapápa - 261 46. Cobra de sacaí - assim chamada por ser
10. Arára (4 espécies) - 260 cumprida e muito delgada - 258
11. Arara-boya - 260 47. Cobra de sapo - 259
12. Arauná - 259 48. Cobra de uacanuá - 258
13. Arraia - 259 49. Coelho americano - ver Cotía
14. Avará ou raposa - 258 50. Colhereira - 261
15. Bacú - 259 51. Corica - 260
16. Besouros - 259 52. Coricáca - 261
17. Borboletas - 259 53. Corimatá - 259
18. Bôtos (2 espécies) - 259 54. Corvo - ver Urubú
19. Boyapeba - 258
55. Cotía ou coelho americano - 258
20. Boyapéba - 260
56. Cujubí (2 variedades) - 261
21. Boya-piranga ou vermelha - 260
57. Curaxirí - É proprio aos campos do Rio Branco:
22. Boyatauá ou amarella - 260 é de côr amarella, e sómente os encontros das
23. Caburé - 260 azas e o rabo de côr preta salpicada de branco:
24. Cágado (2 espécies) - 260 o seu canto é admiravel - 262
25. Caiarára - 258 58. Cuxiú, de grande topete e rabo felpudo - 258
26. Camaleão (2 espécies) - 259 59. Enagé - 260
27. Camarão - 260 60. Enambu (7 variedades) - 261
28. Caninana - 259 61. Epené, cotia de rabo e propria do territorio do
29. Cão montez - ver Lontra Rio Branco - 258
30. Capivára ou porco d’agua - 258 62. Gafanhotos - 159
31. Caracaraí - 260 63. Gaivota branca, de espécie grande - 261
32. Caráo - 261 64. Gaivota branca, de espécie pequena - 261
33. Carará - 261 65. Gaivota cinzenta - 261
34. Caripirá - 261 66. Garça pequena - 261
35. Cuiú-cuiú - 259 67. Garça real - 261
36. Coatá (2 variedades) - 258 68. Gavião de campina - 260
37. Coatí (2 espécies) - 258 69. Gavião de peixe - 261
290 Francisco Xavier Ribeiro de Sampaio e a Fauna do Rio Branco (1774-1775)

70. Gavião preto de bico amarello - 260 113. Maracajá preto -257
71. Gavião real - 260 114. Maracajá vermelho - 257
72. Gejú - 259 115. Maracanã grande - 260
73. Geréba - 261 116. Maracanã pequena - 260
74. Giboya - 258 117. Marreca grande - 261
75. Guará - 261 118. Marreca pequena - 261
76. Guará preto - 261 119. Marrecão grande - 261
77. Guararimá (3 espécies) - 261 120. Marrecão pequeno - 261
78. Guariba parda - 258 121. Matamatá - 259
79. Guariba preta - 258 122. Mergulhão - 261
80. Hiá, macaco noctambulo - 258 123. Mexilhão - 260
81. Irára ou papamel - 258 124. Moçú - 259
82. Jabotí ou tartaruga terrestre - 260 125. Monatí - ver Vacca marinha
83. Jaburú - 261 126. Mucura (2 espécies) - 258
84. Jacamí (2 variedades) - 261 127. Murucututú (2 espécies) -
85. Jacaré (2 espécies) - 259 128. Mutum (5 variedades) - 261
86. Jacú (2 variedades) - 261 129. Onça - “Conforme o systema de M. de Buffon,
87. Jaguar - 257 não há na America a onça verdadeira: e por
isso o citado naturalista applica aos referidos
88. Jandiá - 259
animaes, que nós chamamos onça, os proprios
89. Jandiá pequeno - 259
nomes americanos na lingua Tupinambá, a
90. Japií - 261 dominante do Brasil. Assim lhe chama Jaguar,
91. Japú - 261 que deriva da palavra Jauaraitê. Faz duas
92. Jaraqui - 259 especies differentes da onça malhada e da onça
93. Jararáca (3 espécies) - 258 vermelha. Porém note-se que não é mais que
uma variedade, porque a onça vermelha e a
94. Jauatí - 260
malhada copulam mutuamente, ou seja femea
95. Juauraitê - 257
ou macho. Muitas vezes se vê uma onça com
96. Jupará, ou macaco noctambulo de maior filhos malhados e outros vermelhos. Ora,
corpulencia - 258 conforme os principios do dito Buffon, quando
97. Lagartos, grandes e pequenos - 259 dois animais copulam, e os filhos depois não
98. Lebre americana - ver Paca são estereis (como o mulo ou mula), é signal
99. Lesmas (3 espécies) - 259 da identidade de especie. Isto é o que sucede
100. Lontra, cão montez - 258 nas onças americanas”. - 157-258

101. Macaco de boca preta (2 variedades) - 258 130. Onça de malhas grandes - 257

102. Macaco de prego grande - 258 131. Onça malhada - 257

103. Macaco de prego pequeno - 258 132. Onça preta - 257

104. Maçarico (4 espécies) - 261 133. Onça vermelha -257

105. Maguarí grande - 261 134. Ostra - 260

106. Maguarí pequeno - 261 135. Paca, a que se póde chamar a lebre ame-
ricana - 258
107. Mandiy - 259
136. Pacú - 259
108. Mandubé - 259
137. Papagaio-amarello - 260
109. Mapará - 259
138. Papagaio-azul - 260
110. Maracajá, ou onça pequena
(4 variedades) - 257 139. Papagaio-moleiro - 260

111. Maracajá de malhas miudas - 257 140. Papagaio-ordinario - 260

112. Maracajá malhado, com as pontas das orelhas 141. Papagaio-pequeno - 260
brancas - 257 142. Papagaio pequeno de cabeça amarella - 260
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 291

143. Papagaio pequeno de cabeça ver melha, 183. Surucuá (3 espécies) - 262
pescoço e peito amarellos, costas amarellas
184. Surucucú (2 espécies) - 258
salpicadas de vermelho, azas verdes e azues,
rabo comprido e azul - É proprio aos campos 185. Taiassú - 258
do Rio Branco (...); não falla, mas é muito 186. Taititú - 258
esperto e vivo: vai debuxado no fim d’esta 187. Tamanduá-i - 258
relação - 260
188. Tamanduá-i amarello - 258
144. Papagaio pequeno verde-ferrete - 260
189. Tamanduá-i preto - 258
145. Papagaio-real - 260
190. Tamanduá-uassú - 258
146. Papagaio-roxo - 260
191. Tamuatá - 259
147. Papamel - ver Irára
192. Tangará (muitas variedades) - 261
148. Pato - 261
193. Taquerú - 259
149. Pavão de especie grande - 261
194. Taraíra (2 espécies) - 259
150. Pavão de respecie pequena - 261
195. Tartaruga - 259
151. Peixe boi - ver Vacca marinha
196. Tartaruga de menor especie - 259
152. Pescada - 259
197. Tartaruga terrestre - ver Jabotí
153. Pica-flôr (muitas variedades) - 262
198. Tatú (3 especies) - 258
154. Picapáo (muitas variedades) - 261
199. Temtém amarello - 262
155. Piráandirá - 259
200. Temtém preto - 261
156. Pirá-apapá - 259
201. Tocano (2 variedades) - 261
157. Pirá-catinga - 259
202. Tracajá - 260
158. Pirá-enambú - 259
203. Tremelga americana - ver Poraqué - 259
159. Pirágepeauá - 259
204. Tucunaré - 259
160. Piraíba - 259
205. Tuiuiú - 261
161. Piranha - 259
206. Tumurupára - 262
162. Pirapecú (2 espécies) - 159
207. Uacarí - 259
163. Pirára - 259
164. Piráurucú - 259 208. Uacarí-uá - 260

165. Piriquito (4 espécies) - 260 209. Uaiapeçá (2 variedades) - 258


166. Pitauan (2 espécies) - 262 210. Uanambé (3 variedades) - 261
167. Pixi - 260 211. Uaracapurí - 259
168. Pomba (7 variedades) - 261
212. Uaracú - 259
169. Poraqué, ou tremelga americana - 259
213. Uirapanéma
170. Porco d’agua - ver Capivára
214. Uirauassú - 260
171. Raposa - ver Avará
172. Rato (2 espécies) - 258 215. Uiraúna - 261

173. Saguim - 258 216. Urú - 261


174. Saracura (2 variedades) - 261 217. Urubú ou corvo (3 espécies) - 261
175. Sarapó - 259 218. Urumutum - 261
176. Socó (4 espécies) - 261 219. Vacca marinha, peixe boi, ou Monatí - 259
177. Socó grande pintado - 261
220. Veado grande de campina, com arvores - 257
178. Socó grande vermelho - 261
221. Veado pequeno com pontas sem ramos - 257
179. Socó pequeno azul - 261
222. Veado vermelho do mato, sem pontas - 257
180. Socó pequeno pintado - 261
181. Sucurujú - 260 223. Virajuba - 260

182. Surubí - 159 224. Yapacaní - 260


292 Francisco Xavier Ribeiro de Sampaio e a Fauna do Rio Branco (1774-1775)

Referências
Baena, A. L. M., 1838. Compendio das eras da Provincia do Pará. Typographia de Santos & Santos Menor,
Pará [= Belém].
Baena, A. L. M., 1969. Compêndio das eras da Província do Pará. Universidade Fedral do Pará (Coleção
Amazônica, Série José Veríssimo), Belém.
Bayle, C., 1951. Las misiones, defensa de las fronteras. Misionalia hispánica, Madrid 24: 433.
Garcia, R., 1922. Historia das explorações scientificas, pp. 856-910, in Instituto Histórico, Geographico e
Ethnographico Brasileiro, Diccionario historico, geographico e ethnographico do Brasil 1: 1688 pp., ilus.
Rio de Janeiro.
Lucena Giraldo, M., ed., 1991. Francisco de Requena y otros: Ilustrados y bárbaros. Diario de la exploración
de límites al Amazonas (1782). Alianza Editorial (Libro de Bolsillo 1515), Madrid.
Sampaio, F. X. R. de, 1790. Memoria sobre as ruinas do Mosteiro de Castro de Avellans, e do monumento e
inscripção lapidar, que se acha na capella-mór da antiga igreja do mesmo mosteiro. Jornal Encyclopedico,
Lisboa, Maio de 1790. [Republicado em 1793, nas Mem. Literat. Acad. r. Sci. Lisboa 1793].
Sampaio, F. X. R. de, 1816a. Observações sobre a primeira formação das linguas, do differente genio das
originaes e compostas. Traduzidas do inglez de Adão Smith, e annotadas por ...., x + 70 pp. Imprensa
Regia, Lisboa.
Sampaio, F. X. R. de, 1816b. Oração á memoria de Pedro o grande, imperador da Russia: Traduzida da lingua
russa para a ingleza, e d’esta para a portugueza, 74 pp. Imprensa Regia, Lisboa.
Sampaio, F. X. R. de, 1825. Diario da viagem, que em visita e correição das povoações da Capitania de S. José
do Rio Negro fez o ouvidor, e intendente geral da mesma Francisco Xavier Ribeiro de Sampaio no anno de
1774 e 1775. Exornado com algumas noticias geograficas e hydrograficas da dita Capitania. Typographia
da Academia Real de Sciencias, Lisboa.
Sampaio, F. X. R. de, 1839. Extracto da segunda viagem, que em visita e correição das povoações da capitania
de S. José do Rio Negro fez..., como ouvidor e intendente geral, nos anos de 1774 e 1775. Revta Inst. hist.
geogr. Brasil 1: 100-122. [3a. ed., 1908, pp. 85-95].
Sampaio, F. X. R. de, 1850. Relação geographica historica do Rio Branco da America Portugueza. Composta
pelo Bacharel Francisco Xavier Ribeiro de Sampaio, sendo Ouvidor da Capitania de S. José do Rio Negro.
Revta Inst. hist. geogr. Brasil 13: 200-273. [3a. ed., 1872; mesma paginação].
Sampaio, F. X. R. de, 1856. N. II. Appendix ao Diario da Viagem, que em visita, e correição das Povoações da
Capitania de S. José do Rio Negro, fez o ouvidor, e intendente geral da mesma, Francisco Xavier Ribeiro
de Sampaio, no anno de 1774-1775, pp. 86-142, tabelas, in Academia Real das Sciencias de Lisboa,
Collecção de noticias para a historia e geographia das nações ultramarinas que vivem nos dominios
portuguezes, ou que lhe são visinhas: Publicada pela ...Tomo VI. Typographia da Academia Real das Sciencias,
Lisboa.
Silva, I. F. da, 1859. Diccionario bibliographico portuguez. Estudos de ......., applicaveis a Portugal e ao Brasil.
Tomo Terceiro. Imprensa Nacional, Lisboa.
Varnhagen, F. A. de, 1866. Biographia dos brasileiros distinctos por armas, letras, virtudes, etc. Francisco
Xavier Ribeiro de Sampaio. Revta Inst. hist. geogr. Brasil 7(27): 404-406.
Capítulo 27

O “TESOURO DESCOBERTO NO
RIO AMAZONAS” DO PE. JOÃO DANIEL (1758-1776)

S egundo S. Leite (1943: 325-327), nasceu João Daniel no dia 24 de julho de 1722 em
Travaçós, diocese de Viseu, em Portugal. E diz o seu registro nos cárceres do Forte de Almeida
que era ‘filho de Manuel Francisco Canário e de Maria, de que se não sabe o sobrenome’. Maria
Daniel talvez. Os Jesuítas usavam com freqüência o apelido materno quando o do pai já era o de
outro Jesuíta contemporâneo, para facilidade de distinção, ou, quando o apelido paterno,
estranho, parecesse menos grave. Devia ser este o caso. João Daniel entrou na Companhia de
Jesus, em Lisboa, dia 17 de dezembro de 1739; e dois anos depois, com menos de vinte, embarcou
para o Estado do Maranhão e Grão-Pará. Estudou Humanidades (3 anos) e Filosofia no Colégio
Máximo de São Luís. Em 1747 era aluno distinto de Física, estudante ao mesmo tempo de
Teologia, porque em 1750 andava já no 4º ano desta última faculdade, ainda irmão. Ordenou-se
sacerdote este ano, ou princípio do seguinte, dado que no de 1751, se apresenta já como Padre,
entregue a ministérios sobretudo no Pará, percorrendo Aldeias e Fazendas. Na mais importante
de todas, a Fazenda de Ibirajuba, igreja de Nossa Senhora de Nazaré fez a profissão solene de
quatro votos a 20 de novembro de 1757.
João Daniel saiu do Pará, desterrado para o Reino, por fúteis pretextos, a 28 de novembro de
1757. Encerrado primeiro nos cárceres do Forte de Almeida, a vida que lhe permitiram infere-se
do ofício que Manuel Freire de Andrade, comandante da Praça, dirigiu ao Conde de Oeiras, a
dar-lhe conta do zelo com que tratava os padres, antigos beneméritos missionários da Amazônia.
Relata as perquirições que fez, e o suplício, do maior agrado do inquisidor de Sebastião José
[o Marquês de Pombal], a que submetia homens de inteligência, e escritores, privando-os de escrever,
o único refrigério humano que lhes restava:
‘No rosto de cada um dos cinco maços de papéis, que também remeto, se declara o Padre a
quem se extraíram, e o número de papéis que vai em cada um dos ditos maços; e nos livros, vão
registrados alguns protestos que tinham escrito neles. Como lhes falta o papel, porque nem para
as fontes lho consisto há muito tempo, vão-se aproveitando dos do embrulho das quartas de
tabaco (que já lhes entra senão em latas), das folhas brancas dos Breviários que iam arrancando,
dos registros de Santos, e das Bulas feitas em tiras, e escritas com a ponta de um alfinete, que me
não foi possível ler, como Vossa Excelência verá nos que remeto do Padre Joaquim de Barros, e
também um novo modo de fazer tinta, com que Paulo Ferreira escreveu as duas cartas a sua
irmã, Freira em Sandelgas, que vão dentro do maço dos papéis que se acharam. Mandei-lhes
entregar os Breviários para continuarem as rezas, arrancando-lhes primeiro todas as folhas
brancas, e tirando-lhes alguns registros, porque nas costas de dois tinha o Padre João Daniel
feito duas petições para Sua Majestade, que Vossa Excelência verá, por irem inclusos nos papéis
pertencentes ao dito Padre.”

Era isto a 3 de dezembro de 1761, quatro anos depois do exílio. Que teria já então escrito
João Daniel nestes ‘papéis’ que lhe tomaram?
João Daniel foi transferido, no ano seguinte, a 11 de fevereiro de 1762, para a Torre de
S. Julião da Barra, em Lisboa. E nela entrou para não mais sair, falecendo, daí a 14 anos, no dia
19 de janeiro de 1776.
No meio desta desgraça imerecida, o Pe. João Daniel deu provas de admirável fortaleza de
ânimo, como beirão que era. A sua profissão solene de quatro votos, nas margens do Moju, fê-la já
depois de notificado do seu próximo desterro; encerrado nos cárceres e privado de liberdade,
continuou a missão do Grão-Pará. Realmente ainda é ação missionária, no terreno da cultura e
dos serviços prestados ao Brasil, o seu Tesouro descoberto no máximo Rio Amazonas.
294 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

Se aqueles papéis, dos cárceres de Almeida, não eram já o seu livro, e cremos que sim que
eram, temos de admitir que com o tempo se remitiu o primitivo rigor ou que, apesar dele, houve
meio de introduzir, papel e tinta, nos cárceres de S. Julião. Se assim foi, também ali se acabou um
dia. E é com esta reflexão final, sereno grito de alma, que João Daniel fecha o seu Tesouro e o
último capítulo dele, Notícia de algumas bombas e aqueductos para o Rio Amazonas:
“Porém, como se acaba já o papel, e, por outra, estes inventos necessitam de se conferir,
fiquem reservados para melhor tempo, ou para quem liberdade e nela comodidade e
instrumentos...”

O “Tesouro descoberto no máximo Rio Amazonas”


O livro do Pe. João Daniel, Tesouro descoberto no máximo Rio Amazonas, consta de seis
partes. O manuscrito das cinco primeiras é uma das preciosidades da Biblioteca Nacional do
Rio de Janeiro (códice l-2, 1, 21); a Sexta está em Évora. Imprimiram-se inicialmente três: a
Segunda parte, precedida do Índice geral das matérias contidas na obra, publicou-a Varnhagen
na Revista do Instituto Histórico, vols. 2 e 3 (1840, 1841). A Quinta parte saiu em avulso, Rio,
Imprensa Régia, 1820. A Sexta parte foi ainda publicada na Revista do Instituto, vol. 41 (1878).
Em 1976, a obra foi publicada completa, nos Anais da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro,
Vol. 95 (no Tomo I, as partes 1ª, 2ª e 3ª; no Tomo II as partes 4ª, 5ª e 6ª).
Uma cópia (à mão!) feita por Rudolf Schuller dos manuscritos do Pe. Daniel encontra-se no
Fundo Schuller do Museu Paraense Emílio Goeldi (cf. Projeto Arquivo Permanente do Museu
Paraense Emílio Goeldi, 1987).
Trata-se de uma verdadeira monografia sobre a Amazônia, a primeira contribuição de vulto
sobre a região, contemplada sob praticamente todos os pontos de vista, acrescentada de vários
conselhos para desenvolver sua ocupação e economia. Ao contrário dos outros relatos, o livro do
Pe. João Daniel é um verdadeiro tratado científico, fruto de suas observações e preocupações de
muitos anos. Há várias interpolações de trechos relativos a animais exóticos, onde o Pe. Daniel
mostra conhecer pelo menos os relatos feitos por outros jesuítas, sobre a fauna da Índia e de
outras regiões. Não desdenha também animais mitológicos ou fantasiosos, e “contos” de caçadores.
É interessante o estilo arcaizante de retirar lições morais das histórias sobre animais, seguindo a
centenária tradição dos “Physiologus” medievais (cf. Papavero et al., 1995: 17-19). Cita como
autoridade em matéria médica o livro do “Dr. Curvo”; trata-se da obra Memorial de varios simplices
que da India Oriental, da America e de outras partes vem ao nosso Reyno, de Curvo Semedo (1727),
que teve grande voga no século XVIII. Para ilustrar o quão abrangente é essa obra, listamos aqui
seu índice de matérias:

PARTE PRIMEIRA 23, 24. Da praga volátil do Rio Amazonas


1. Descripção geográfico-histórica do Rio 25. Das sevandijas terrestres do Amazonas
Amazonas 26, 27. De outras pragas do Amazonas
2. Seu descubrimento e navegação 28. Das cobras do Amazonas
3. Causa, e origem do seu nome 29. De alguns antídotos contra a praga das cobras
4. Dos principaes rios que recebe
5, 6. Dos rios que recebe da parte do sul PARTE SEGUNDA
7. Da pororoca, e algumas cousas notáveis 1. Notícia geral dos índios seus naturaes e de
8. Da qualidade das suas ágoas algumas noções em particular da sua vida
costumes, e das cousas mais notáveis da sua
9. Do clima e saudáveis ares do mesmo rio
rusticidade.
10. De algumas cousas notáveis do mesmo rio
2. Da sua creação, desponível riquezas
11. Idem
3. Idem
12. Das ilhas, lagos, e penínsulas do mesmo rio
4. Notícia de alguns venenos mais notáveis da
13. Idem América
14. Da mais excelente pescaria do mesmo rio 5. Da ingratidão dos índios
15. Idem 6. Continuação da descripção de seus costumes
16. Para ordinária pescaria no mesmo rio 7. Dos costumes de comer carne humana
17, 18. Da sua caça altília 8. Da tropa dos resgates do seu primeiro intento,
19, 20, 21. Divertimento da caça no mesmo rio abuso e como se desfaz
22. Das pragas mais especiaes do Amazonas 9. Das guerras dos índios do mesmo rio
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 295

10. Das leis dos índios PARTE QUARTA


11. Idem Do tesouro descoberto no Rio Amazonas
12. Idem 1. Praxe da sua agricultura ao uso dos naturaes
13. Da grande habilidade e aptidão dos índios indios
14. De alguns outros costumes dos índios 2. Da praxe, e da diversa agricultura, que usam
15. Da grande fecundidade dos índios os naturaes do rio Solimões, e toda a província
16. De algumas nações de índios em particular de Mainas, e dos mais benefícios, que fazem
17. Idem nas roças, e searas já ditas até o tempo das
suas colheitas
18. Idem
3. Dos engenhos de açúcar, e feitorias de agoardente
19. Idem
4. Notícia da especial factura das embarcações do
20. Da condição dos índios da América Rio Amazonas
21. Continuação da notícia dos povoadores do
5. Das missões do Amazonas, modo de sua
mesmo rio
fundação, praxe de seu governo
6. Do regimento dos missionáios nas missões
PARTE TERCEIRA
7. Viagem dos sertanejos para as colheitas do sertão
Da notícia da muita riqueza nas suas minas, 8. Da torna viagem das canoas do sertão
nos seus muitos e preciosos haveres, e na muita 9. Praxe das missões espanholas no Amazonas
fertilidade das suas margens.
10. Do método que tem no Amazonas de pastorear
Tratado 1º. Das minas de oiro, prata, e diamantes os gados
da região Amazônica 11. Da indústria, que usam os naturaes do Amazonas
1. Dos seus muitos minerais na pescaria
2. Das minas descubertas, na margem do sul 12. Praxe ordinária nos mercados do Amazonas
3. De outros minerais do dito rio 13. Da indústria, com que os índios tiram fogo e
fabricam a louça
Tratado 2º. Dos tesouros descobertos no Rio
Amazonas
PARTE QUINTA
1. Do seu fertilíssimo terreno, e a ruindade das
suas margens Em que mostra um novo, e fácil método da
2. Da farinha de pao da América sua agricultura. O meio mais útil para extrair as
3. Do trigo e mais searas do Amazonas suas riquezas, e o modo mais breve para desfrutar
4. Idem os seus haveres para mais breve, e mais facilmente
se efeituar a sua povoação e comércio
5. Dos mais excelentes fructos do mesmo rio
6. Idem Tratado 1º. Da praxe, que se deve observar na
agricultura das terras incultas do
7, 8. Idem
Amazonas
1. Em que se expõem as providências precisas,
Tratado 3º. Da riqueza do Amazonas na precio-
que deve haver para a boa, e precisa vivenda no
sidade de suas madeiras
Amazonas
1. Dos seus mais preciosos paos 2. Diferença das terras já cultivadas no mundo
2, 3. De outras espécies de paos preciosos 3. As matas do Amazonas pedem diversa
4. De algumas plantas notáveis agricultura nas terras
5. Idem 4. Modo facilimo de cultivar a terra no Amazonas
5. O segundo empenho dos habitantes do
Tratado 4º. Das palmeiras da América Amazonas deve ser fazer estáveis as suas terras
6. A agricultura praticada dá mais dano que
l. Da palmeira dos cocos
proveito a seus moradores
2. Das palmeiras do mesmo rio
7. Deve desterrar-se do Amazonas o cultivo da
3. Idem maniba, ou farinha de pao
4. Palmeiras da [ilegível] as mais nomeadas 8. Para o bem dos moradores, e augmento do
estado se deve introduzir o uso do grão
Tratado 5º. Do principal tesouro do Rio Amazonas 9. Das mais searas, que se dão nas terras do
1. Da multidão, variedade, e preciosidade de seus Amazonas
haveres 10. De outras searas de milhos, que se podem
2, 3, 4, 5, 6. Prosseguem-se os mais gêneros do cultivar (no Amazonas)
Amazonas 11. Das semeaduras de arroz
7. Apêndice de alguns haveres, que não lembraram 12. Que as conveniências destas searas são muito
vantajosas as de farinhha de pau
Tratado último. Das tintas mais especiaes do Rio 13. A causa da pobreza no Amazonas e o cultivo da
Amazonas
maniba
1. Da tinta azul, anil, e outras 14. Só com as searas da Europa pode haver fartura
2. Das tintas rosa, preta, e outras espécies no (Amazonas)
296 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

15. Da precisa providência com que se devem prover Tratado 6º. Das missões do Amazonas, e seus
os novos povoadores do Amazonas estados
16. Tirada a agricultura da maniba de nenhûa 1. Das condições onerosas das missões do
utilidade são os escravos a seus senhores Amazonas
17. Os escravos nos ultramares, e Amazonas são 2. Da repartição dos índios aos seus missionários
tantos ladrões quanto escravos 3. Método fácil e útil para escusar aos missionários,
os índios da repartição
Tratado 2º. Da navegação e serventia do Rio 4. De outras úteis economias, que devem observar
Amazonas nas missões
5. Da língua que se deve falar nas missões do
1. Da praxe ordinária de navegar no Rio Amazonas
Amazonas
2. Dos graves inconvenientes desta navegação, e 6. Que as escolas são o meio mais proporcionado
praxe dos habitantes do Amazonas para civilizar os índios
3. Que para o augmento dos estados do Amazonas 7. Quaes devem ser os missionários dos índios
lhes são necessários barcos comuns 8. Que não convém aos regulares ser missionários
4. Meio fácil para haver feiras, e mercados no dos índios
Amazonas 9. Que não convém às missões clérigos com o
5. Qual haja de ser a esquipação, ou equipagem governo temporal
destes barcos 10. De como se devam haver os regulares obrigados
6. Novo utilíssimo método de navegar com às missões
facilidade 11. De como se devam haver os regulares na direção
temporal dos índios
Tratado 3º. Das especiarias, e riquezas que produ- 12. Idem
zem nas suas matas o Amazonas 13. Sobre a conversão e descimento dos índios
14. Que se devem proibir os contractos com os
1. Do meio de se extrair as riquezas do sertão, ou
selvagens
matas
2. Dos grandes inconvenientes que trazem consigo
Tratado 7º. Especial método de augmentar o estado
as canoas do sertão
do Amazonas
3. Que as canoas do sertão do Amazonas são o
1. Modo fácl de erigir várias povoações no Rio
maior estorvo dos seus augmentos
Amazonas
4. Apontam-se os melhores meios para se haverem
2. De outros modos fáceis de povoar as terras no
as riquezas do Amazonas
Amazonas
5. Método fácil para por em praxe esta economia
3. Das paragens, em que primeiro se devem povoar
6. Propõem-se o 2º meio de fazer hortenses as o dito Rio Amazonas
riquezas do sertão com os índios da repartição 4. Das condções que devem ter asditas povoações
7. Das vantagens desta economia às canoas do do Amazonas
sertão
8. Modo practico de principiar um sítio, Tratado 8º. De alguns mecanismos, e indústrias
ou fazenda no Amazonas necessárias aos habitantes do Amazonas
1. Do modo de livrar do gorgulho, e conservar os
Tratado 4º. Da factura das canoas, ou embar - milhos, cacaos, e mais grãos
cações do Amazonas 2. Indústria de preservar as plantas da praga das
1. Da praxe ordinária que usavam na factura das formigas, e gafanhotos
canoas 3. Da preservação do chá, café, algodão, e
2. De muitos invconvenientes que tem esta praxe chitas, [roo e ilegível] como consta do mesmo
3. De outro novo, e melhor método de construir manuscrito.
as canoas
PARTE SEXTA (MANUSCRITO DE ÉVORA)
º
Tratado 3 . Da pesca no Amazonas Contém inventos úteis e curiosos para a
1. Da pesca ordinária do Rio Amazonas melhor fazendo navegação prósperos todos os ventos
2. Da providência que usam muitas nações na ainda os mais ponteiros, e contrários, e para fazer
nas calmarias boa viagem, com nova invenção de
pescaria
represar as marés, para moerem fábricas e ingenhos
3. Da providência que deve haver na pescaria do de moto contínuo, accrescem algumas outras idéias
Amazonas de ingenhos manuaes para serrar madeira, fazer
4. De outras providências necessárias à pescaria açúcar, e muitos outros não menos curiosos que
do Amazonas úteis à vida humana.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 297

Nomes de animais citados no “Tesouro”


Nos capítulos 14 a 28 da Parte Primeira do “Tesouro” do Pe. João Daniel são citados nomes
de animais amazônicos, que são os seguintes (a página citada entre parênteses refere-se ao primeiro
tomo da edição do “Tesouro” da Biblioteca Nacional – Daniel, 1976a):

1. Abelha – cap. 24 (170) 55. Carão – cap. 18 (129)


2. Ac(...) [garça] – cap. 18 (129) 56. Carapaná – cap. 23 (164)
3. Acanguera – cap. 17 (111) 57. Carrapato – cap. 15 (171)
4. Acará – cap. 16 (106) 58. Cascavel – cap. 28 (186)
5. Acará-pixuna – cap. 16 (106) 59. Cascudo – cap. 16 (107)
6. Acará-tinga – cap. 16 (106) 60. Cenemi – cap. 15 (93)
7. Acauã – cap. 18 (118) 61. Centopéia – cap. 27 (184)
8. Acotibóia – cap. 28 (185) 62. Chocalheiro – ver bem-te-vi
9. Águia – cap. 17 (110) 63. Coatá – cap. 20 (147)
10. Aí – cap. 19 (144) 64. Cobra-coral – cap. 28 (185)
11. Ainum – cap. 18 (129) 65. Cobra-da-ágoa – cap. 28 (189)
12. Anacã – ap. 18 (124) 66. Cobra-de-atrair – cap. 28 (188)
13. Andorinha – cap. 18 (130) 67. Cobra-de-capelo – cap. 28 (186)
14. Anhuma – cap. 17 (112) 68. Cobra-de-cipó – cap. 28 (186)
15. Anta – cap. 19 (135) 69. Cobra-de-duas-cabeças – cap. 28 (187)
16. Aranha – cap. 25 (172) 70. Cobra-de-papagaio – cap. 28 (185)
17. Aranha-do-mato – cap. 25 (173) 71. Cobra-viscosa – cap. 28 (188)
18. Aranha-onça – cap. 25 (172) 72. Cochini – cap. 19 (141)
19. Araquá – cap. 18 (128) 73. Cochinil – ap. 19 (145)
20. Arara – cap. 18 (121) 74. Coelho – cap. 19 (146)
21. Ararabóia – cap. 28 (185) 75. Colhereira – cap. 17 (113)
22. Arari – cap. 18 (122) 76. Corcovado – ver inambu-uru
77. Cotia – cap. 19 (145)
23. Araruna – cap. 18 (121)
78. Cranguejeira – cap. 25 (173)
24. Arganás – cap. 19 (146)
79. Cupi – cap. 27 (181)
25. Arminho – cap. 19 (146)
80. Cutelo – ver aruaná
26. Aruaná – cap. 16 (103)
81. Dourada – cap. 16 (101)
27. Atiati – cap. 18 (129)
82. Ema – cap. 17 (109)
28. Atin – ver atiati
83. Escorpião – cap. 25 (174)
29. Bagre – cap. 16 (104)
84. Espadarte – cap. 16 (101)
30. Bagre-dos-livros – cap. 22 (160)
85. Formiga – cap. 26 (176)
31. Baiacu – cap. 16 (106)
86. Formiga-de-fogo – cap. 26 (179)
32. Barata – cap. 22 (159)
87. Galinha-do-amazonas – cap. 15 (93)
33. Barbado – cap. 20 (151)
88. Garça – cap. 18 (129)
34. Barrigudo – cap. 20 (149)
89. Gavião – cap. 17 (110)
35. Bem-te-vi – cap. 18 (129) 90. Guananá – cap. 17 (115)
36. Berne – cap. 22 (158) 91. Guananaí – cap. 17 (116)
37. Bicheira – cap. 22 (158) 92. Guará [ave] – cap. 18 (120)
38. Bicho-do-pé – cap. 22 (157) 93. Guariba – cap. 10 (148)
39. Bicho-vergonhoso – cap. 15 (98) 94. Guirajuba – cap. 18 (122)
40. Bisouro – cap. 24 (169) 95. Inage – cap. 17 (111)
41. Boiasique – cap. 28 (185) 96. Inambu – cap. 18 (127)
42. Boi-marinho – cap. 16 (99) 97. Inambu-acumeriva [erro] – cap. 18 (127)
43. Borboleta – cap. 24 (169) 98. Inambu-cururina – cap. 18 (128)
44. Caba – cap. 24 (167) 99. Inambuguaçu – cap. 18 (127)
45. Caba-negra – cap. 24 (168) 100. Inambu-peba – cap. 18 (127)
46. Caburé [gavião] – cap. 17 (111) 101. Inambu-pecuapé – cap. 18 (127)
47. Camaleão – cap. 15 (92) 102. Inambu-quia – cap. 18 (127)
48. Cangaitoriá – cap. 17 (118) 103. Inambu-tona – cap. 18 (127)
49. Canindé – cap. 18 (121) 104. Inambu-toro – cap. 18 (127)
50. Caninena – cap. 28 (186) 105. Inambu-uru – cap. 18 (127)
51. Canuaru – cap. 25 (175) 106. Ira(...) – cap. 24 (170)
52. Cão-bravo-do-mato – ver cochini 107. Iruçu – cap. 24 (170)
53. Capivara – cap. 15 (98), cap. 19 (141) 108. Jaboti- Pe. João Daniel, 1772-1776,
54. Caracaraí – cap. 17 (111) cap. 15 (96)
298 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

109. Jabotibóia – cap. 28 (185) 169. Peixe-boi – cap. 16 (99)


110. Jacaré – cap. 14 (87) 170. Peixe-cavalo – cap. 16 (103)
111. Jacaré-curuba – cap. 14 (90) 171. Peixe-do-mato – cap. 16 (108)
112. Jacaré-guaçu – cap. 14 (90) 172. Peixe-mulher – cap. 16 (100)
113. Jacaré-tinga – cap. 14 (90) 173. Peraqué – cap. 16 (106)
114. Jacaré-tiribiri – cap. 14 (90) 174. Picaflor – cap. 18 (133)
115. Jacu – cap. 17 (117) 175. Piraíba – cap. 16 (100)
116. Jacumin – cap. 17 (117) 176. Piraíba-remuia [“avó das piraíbas”] – cap. 16
117. Jacunda – cap. 16 (107) (104)
118. Jaguareté – cap. 19 (138) 177. Pirainambu – cap. 16 (105)
119. Jandiá – cap. 16 (101) 178. Pirajaquara – cap. 16 (100)
120. Japim – cap. 18 (132) 179. Piranha – cap. 16 (108)
121. Javali – cap. 19 (138) 180. Pirapema – cap. 16 (106)
122. Jequeri – cap. 18 (127) 181. Pirapitinga – cap. 16 (104)
123. Jeraraca – cap. 28 (186) 182. Pirarará – cap. 16 (103)
124. Jibóia – ap. 28 (187) 183. Pirarocu – cap. 16 (100)
125. Jurará – cap. 15 (93) 184. Pium – cap. 23 (163)
126. Lacrao – ver escorpião 185. Porco – cap. 19 (138)
127. Lagarta [sic; lagarto] – cap. 25 (173) 186. Porco-espim – ver porco-espinho
128. Lobo – ver cochini 187. Porco-espinho – cap. 19 (140)
129. Lombriga – cap. 27 (183) 188. Preguiça – ver aí
130. Lontra – cap. 15 (97) 189. Ralo – cap. 22 (160)
131. Macaco – cp. 20 (147) 190. Raposa – cap. 19 (142)
132. Macaco-prego – cap. 20 (150)
191. Saguim – cap. 20 (154)
133. Maçarico – cap. 18(129)
192. Sapo – cap. 25 (175)
134. Maçarico-real – cap. 18 (129)
193. Saúba – cap. 26 (177)
135. Mãe-da-ágoa – cap. 28 (189)
194. Seracura – cap. 18 (127)
136. Mãe-do-peixe – cap. 28(189)
195. Seracura-caapora – cap. 18 (127)
137. Maguari – cap. 17 (112)
196. Seracura-guaçu – cap. 18 (127)
138. Mapará – cap. 16 (105)
197. Serobi – cap. 16 (108)
139. Maparati – cap. 16 (105)
198. Sucuruju – cap. 28 (188)
140. Maracajá – cap. 19 (138)
199. Tamanduá – cap. 19 (142)
141. Maritaca – cap. 19 (146)
200. Tarairabóia – cap. 28 (185)
142. Marreca – cap. 17 (116)
143. Marreca-puriribaba – cap. 17 (116) 201. Tariira-guaçu – cap. 16 (105)
144. Marreca-mariana – cap. 17 (116) 202. Tartaruga – cap. 14 (87)
145. Marrecão – cap. 17 (115) 203. Tartaruga-de-casco – cap. 15 (94)
146. Mecuim – cap. 22 (156) 204. Tartaruga-do-salgado – cap. 15 (94)
147. Mergulhão – cap. 18 (128) 205. Tatu – cap. 19 (139)
148. Meruim – cap. 23 (162) 206. Tatu-caba – cap. 24 (168)
149. Mocotó – cap. 25 (175) 207. Tem-tem – cap. 18 (133)
150. Morosoca – cap. 23 (163) 208. Tijijiê – cap. 17 (112)
151. Mosquito – cap. 23 (161) 209. Tocano – cap. 18 (121)
152. Motum – cap. 17 (117) 210. Toconaré – cap. 16 (107)
153. Motum-de-fava – cap. 17 (117) 211. Tombura – ver bicho-do-pé
154. Motumpinima – cap. 17 (117) 212. Toncanguira – cap. 26 (177)
155. Motunguaçu – cap. 17 (117) 213. Topiaí – cap. 26 (177)
156. Mutuca – cap. 23 (165) 214. Topi-caba – cap. 24 (168)
157. Mutuca-verde – cap. 23 (166) 215. Tosto – cap. 17 (111)
158. Onça – cap. 19 (135) 216. Traçado [terçado] – ver aruaná
159. Osga – cap. 25 (174) 217. Tracajá – cap. 15 (94)
160. Pacamo – cap. 16 (107) 218. Tubarão – cap. 16 (101)
161. Papagaio – cap. 18 (122) 219. Turu – cap. 27 (182)
162. Papagaio-corica – cap. 18 (123) 220. Urubu – cap. 17 (112)
163. Papagaio-moleiro – cap. 18 (123) 221. Urubu-tinga – cap. 17 (113)
164. Papagaio-real – cap. 18 (122) 222. Vareja – cap. 23 (165)
165. Papagaio-sertanejo – cap. 18 (123) 223. Viado – cap. 19 (142)
166. Paraoubóia – ver cobra-de-papagaio 224. Viado-da-campina – cap. 19 (142)
167. Pato – cap. 17 (113) 225. Viado-do-mato – cap. 19 (142)
168. Pegador – cap. 16 (101) 226. Xeribóia – cap. 28 (185)
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 299

Os capítulos 14 a 29 da Primeira Parte do “Tesouro”

CAPÍTULO 14o morta, se põe a chorar, e lamentar com grande pena


DA MAIS EXCELENTE no que indicam, que o apertado abraço, não é efeito
PESCARIA DO RIO AMAZONAS de odio, mas força de afecto, é expressão de amor, e
não paixão de ira; é concludente argumento de bem
Dissemos da imensidade de ágoas do rio querer, e de não querer a matar: fora com tal amor,
máximo Amazonas e dos seus colateraes; segue-se e com tal afecto! Porém como brutos não sabem,
agora dizer algúa cousa da sua muita pescaria. Não nem discorrem o como devem temperar as forças;
pretendo aqui descrever toda a variedade de peixe, porque os efeitos do pranto por bom espaço e o
com que, assim como é o mais caudaloso de ágoas, tornar de quando em quando a sair do mar, e buscar
talvez que também ele seja o mais abundante; mas o cadáver continuando sempre as exéquias, claros
só descrever os mais principaes, e menos conhecidos indícios são de simpatia, e não de aversão. E se há
na Europa, ou que excedem no mimoso etc., dos peixes tão amigos dos homens [que] se tem visto
que neste há da mesma espécie. Daremos o primeiro acompanhá-los no mar, como se diz do golfinho,
lugar aos peixes anfibios, visto que pelos dous que não só acompanha mas também festeja aos
predicados de terrestres, e marinhos, parece se homens, mais provável é que o homem marinho
fazem merecedores de mais atendiveis nas Histórias. tenha com os mais homens esta correspondência, e
Merece pois o primeiro lugar o homem marinho, benevolência; porque omne animal diligit sibi simile
por ser o homem de todos os viventes sensitivos o [todo animal ama o seu semelhante]. Mais
mais nobre. Que há homens marinhos, o tem repugnante é á fé humana o acreditar, que vivam
mostrado por vezes a experiência; ou eles sejam, os no mar, como peixes os homens criados na terra,
que com nome de sereas baptizam os historiadores, pela sua diversa natureza: porque, assim como os
ou outra diversa espécie, como parece mais provável, peixes fora da ágoa, logo morrem; assim os homens
que participe da figura, e feitio de peixe, e de homem fora do ar, aonde não podem respirar, como sucede
(como as sereas, que se pintam com feitio de peixe aos que se afogam, logo expiram; e contudo já hoje
da cintura para baixo, e com figura de homem no é tão sem controvérsia, que alguns homens tem
mais corpo) mas sim sejam inteiramente como vivido no mar, como peixes, depoes de viverem com
homens na figura. e em tudo semelhantes aos mais, o ar da terra, que seria temeridade o negá-lo; e
menos no racional. Assim o referem as Histórias da confirma-se com o exemplo daquele que refere Feijó,
Ásia Portuguesa, e o mostra a experiência de alguns, o qual foi apanhado por uns pescadores, depoes de
que os tem visto, como afirma Bernardo de Brito, e ter vivido nove anos debaixo da ágoa, como peixe.
muitos outros. Com mais razão pois se pode acreditar a existência
Antônio Carlos homem douto, prudente, e de homens marinhos, ou nascidos na mesma ágoa,
digno de toda a fé, não só pelas suas respeitosas ou nela criados como os mais anfibios, que tanto
cãs, mas também pelo seu cargo de Brigadeiro nas vivem no mar, como na terra.
tropas portuguesas no mesmo Estado do Amazonas, Dos homens marinhos fala Feijó no 6 Tom.
afirmou, que encontrando-se no mar com um Discurso 7º com provas cuidadas: não só dos que
corsário inglês, vira nele um, que pela raridade o são do mesmo corpo humano, e o mais peixe; como
estimavam tanto, que não lhe foi possivel o podê-lo são os tritones machos, e sereas têmeas; mas tão
alcançar, por mais diligências que para isso fez: e bem dos que são homens perfeitos, etc. Como tão
[que os] há no mesmo Amazonas, se prova do bem prova a existência dos sátiros ou homens
seguinte caso. Um principal, ou cacique, indio de silvestres, dos quaes há muitos se tem visto, e ainda
propósito, e madureza da Vila de Santarém, apanhados alguns na Ilha de Bornéo na India, e no
chamada antes a Missão de Topajós, contou ao seu estreito de Málaca, e só não falam: posto que adiante
missionário, e amigos portugueses, que estando ele lhes chama [ilegível].
com outro indio nas margens, e praias do Rio Destes animaes anfibios tenham o segundo
Copariri (que, como já dissemos, desagoa no Topajós lugar os crocodilos, lagartões grandes, chamados
pouco acima da sua boca) por causa de negócio, assim na África; e no Amazonas, lhe chamam os
viram sair do rio muitos homens, mulheres, e espanhoes caimán, e os portugueses jacaré. É o
meninos rindo, e falando entre si ûa tal lingoagem, maior lagarto que há no mundo, capaz de investir,
que nenhum dos dous entendia, e assustados com e intimidar ao mais robusto gigante. Dizem, que o
a novidade, começaram a mostrar-lhe as cruzes das jacaré é a peior cousa, que cria o Amazonas; mas
cantas, e a invocar a Venerável Senhora, por eu diria, que é o monstro mais proporcionado de
cuidarem ser demônios; e que os taes se tornaram grandeza. Há jacarés de 40, e 50 palmos de
depoes a meter naa ágoa, e que não os viram mais. comprimento, com proporcionada grossura, como
Talvez sejam estes homens marinhos aqueles, ûa ordinária pipa, principalmente o sen bojo. Tem
dos quaes referem o autor do Divertimento Erudito, escamas como conchas que lhe servem de forte saia
e outros, que vendo alguma pessoa nas praias, ou de malha, tão impenetrável, como um aço: pois não
margens dos rios, em que eles andam, logo acodem lhe entram, nem as mais agudas lanças, nem lhe
a abraçar -se com ela tão apertadamente que fazem brecha as mesmas balas, quaes duros
ameaçando-lhe as costelas a matam (devem ter rochedos, assim resistem, e cospem as balas. Tem
muita força) e depoes vendo-a caída, em terra, e ûa tão grande boca, que por ela engolem um homem
300 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

inteiro; e quando [a] trazem aberta, fazem a figura segurando-se com o outro na cela, o foi chegando a
de tamborete levantado, formando o queixo de baixo, terra, onde saltou, e foi festejado como renascido,
que é imóvel, e firme, a semelhança do aperto, e o continuando depoes a viver até a idade varonil, sem
queixo de cima a de encosto. E assim como gozam ter mais que úa pequena arranhadura em úa perna,
do título, e honras de grandes, assim também o são por roçar ao engolir por um dente, de que facilmente
as suas oxarias, porque comem com grandeza e á sarou este novo Jonas. Assim nos afirmaram alguns
fidalga. Não se contentam com ervas, frutas do mato, missionários que o conheceram, dos quaes ainda
ou legumes, como os demais animaes, mas só de aqui vivem alguns. Como o seu sustento são
bom peixe, que pescam, e boa carne, que caçam, ordinariamente carnes, cujas sobras se lhes metem
ou pilham, por serem assueti vivere rapto por entre os dentes, tem também seu palito para os
[acostumados a viver de rapina]. Pescam muitas esgaravatar, e limpar. É este palito um passarinho,
tartarugas nos rios, e principal-mente nos lagos, que metendo-se-lhe na boca, quando a tem aberta
que são ordinariamente os seus viveiros: também com o bico lhos esgaravata, e alimpa, servindo-lhe
as accometem nas praias, quando saem a desovar, estas lavaduras de sustento, e como seu paje o
e muito mais quando pequeninas saem dos ovos acompanha sempre, já dentro na boca, e já na
para a ágoa, onde os jacarés estão esperando com cabeça. Quando o jacaré quer fechar a boca, para o
os alçapões das suas grandes bocas, nas quaes elas comcr, depois de ter os dentes aliviados, dizem que
inocentes se vão meter, quaes doninhas nas bocas o passarinho o fere com uma espinha, que tem nas
dos sapos. Tem especial antipatia com as onças, costas, e o constrange a abrí-la; por cuja razão a
tigres, e cães; não porque perdoem a qualquer outro avezinha sem susto, nem medo entra, e sae quando
animal, que possam nas praias, ou rios pilhar, pois quer pela bocarra do bruto, como quem entra por
assim que podem fazer tiro seguram ainda ao mais sua casa; e o mais tempo gasta em pequenos vôos
bravo touro; mas porque tendo a escolher a caça,
da boca para a testa, e desta para a boca, digo corpo,
os primeiros acometidos são os cães, e onças:
em cuja grandeza tem bom espaço para os seus
adiante diremos as guerras, que tem os jacarés com
pequenos vôos; e só se retira do jacaré, quando este
as onças. Porém o seu melhor bocado é a carne de
mergulha. Posto que algumas vezes passeiam pelos
gente, quando a podem colher, que não é poucas
rios, especialmente se tem lodo, a sua principal
vezes, ou já dos que caem na ágoa, nas alagações,
estancia é nas enseadas, e ramansos [sic], aonde
ou dos que vão a nadar, e lavar-se, ou já dos mesmos
estejam abrigados das ventanias, e livres das ondas;
pescadores, e gostam tanto da carne humana, que
e por esta mesma razão habitam nos lagos em
nem a assam, nem a cozem, senão no ventre. Usam
grande multidão, fogindo das costas lavadas dos
de varias astúcias para apanharem a gente, porque
ventos, para que as ondas os não levem, ou
umas vezes, dizem, fingem, que choram, e dizem,
impurrem para os areaes, de que muito fogem, ou
que o fazem tão propiamente, que parecem crianças
por não poderem caminhar bem pela areia, ou
a chorar; e acodindo a gente à praia a ver, ou ouvir
porque sao mais expostos a seus inimigos, sem lhes
o que é, acodem os jacarés de súbito a fazer tiro em
poderem fugir com ligeireza, pelo empedimento do
algum. Outras vezes vendo ûa pessoa à borda da
vento, e das ondas. Sabem já os indios estes
ágoa, ou lavando-se, mergulham abaixo, e vão surgir
na mesma parte, e dando logo com a cauda ûa forte costumes dos jacarés, e por isso se vão banhar, e
rabanada, quanto apanham é seu, que levando-o o refrescar ao rio sem medo algum, e aparecendo
vão comer muito contentes. São tão atrevidos, que algum jacaré, que vem descendo, ou atravessando,
algumas vezes tem acometido a gente nas mesmas facilmente o vem, e também facilmente o matam,
embarcações, especialmente apanhando as quando o apanham junto das praias.
descuidadas; e alguns tem havido, que subindo pelo Quase sempre andam na ágoa, e poucas vezes
jacumã (é uma comprida pá, que em algumas saem à terra a dar o seu passeio, mas em terra não
embarcações serve em lugar de leme) foram dentro são tão ligeiros, como na ágoa, por terem os pés, e
à embarcação a fazer a sua presa. Outras vezes mãos curtos, razão, porque em terra são mais
estando algum pescador com o braço de fora tímidos, e fogem de qualquer criança, sendo que na
segurando a linha, lhe agarram o braço, e o levam ágoa envestem o mais bravo touro, ou ao mais
sem remédio; e alguns, que livraram foi largando o forçoso gigante: contudo, se os incitam, também dão
braço, ou perna. sua carreirinha por terra atrás da gente. Põe, e
Foi notável o ânimo, e valor de um menino escondem os seus ovos na terra debaixo de ervas, e
para tornar a sair do ventre de um jacaré. Apanhou-o arbustos, e os vigiam com muito cuidado, e dizem,
este descuidado à borda da ágoa, e fazendo tiro o que tem tal instinto, que já sabem quanto os rios
segurou, e engulio de um só bocado, não obstante hão de encher; e por isso os põe mais, ou menos
ser o rapaz já crescido de 10 anos pouco mais, ou longe de sorte, que as enchentes lhes não façam
menos. Vendo-se o rapaz no ventre do jacaré, teve mal. São os ovos proporcionados á sua grandeza,
ânimo para menear os braços, e tirar da cintura úa ainda que são uns maiores, que outros, conforme
faca (é o lugar, em que ordinariamente a trazem, as espécies diversas dos jacareses; os ovos dos
servindo os cós dos calções de bainha, e presilha) jacarés grandes são tamanhos como dous punhos,
com que golpeando a barriga daquele monstro pouco de sorte que basta um só para fazer uma grande
a pouco a abrio de todo, e saindo pela brecha para fritada. São da mesma cor, e feitio dos ovos de
fora, montou no mesmo jacaré, já mais manso com gallinha, excepto em terem a casca muito dura. Os
as ansias da morte, e remando com um braço, indios gostam muito deles, e lhes dão busca pelas
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 301

praias, [aonde] já sabem que os põe, e por mais que expelindo-as logo, que aplicam o dente de jacaré a
os jacarés os escondam, sempre os indios lhes mamilha do padecente pela parte de baixo. E quem
apanham muitos. Dizem alguns, que eles os chocam me comunicou este segredo, me afirmou, que não
com a vista, e que por isso lhes estão sempre com só era certa sua vertude eficaz por muitos
os olhos fitos: bem pode ser, que assim seja, porque experimentos, mas que também conservava um por
também há pássaros, que chocam os seus com a grande herança em sua casa, a que acodiam os
vista; mas outros dizem, que o estar olhando para achados com feliz successo. Mas parece, que tão
os ovos, não é para os chocarem, mas para os bem nem todos tem este préstimo; pois alguém
vigiarem, e que só se chocam com o calor do sol, experimentou um, e não lhe succedeo, como
como os ovos das tartarugas. Dizem alguns tão bem, desejava: o que posto, será bom fazer de todos prova,
que eles não comem na ágoa, mas que feita a presa, podendo ser, para conhecer quaes tem a dita
vão comê-la a terra, ainda que muitos, que tem feito antipatia, se os dianteiros, ou queixaes; se os de
experiência, afirmam, que comem na ágoa, como fora, ou se os de dentro? Nem é bem, que se despreze
os peixes. Com serem os jacarés os maiores por inútil esta experiência, porque achando-se um
inimigos, que tem em si o Rio Amazonas, contudo com tão excelente préstimo, será um grande
há também alguns bons préstimos, como são os morgado para uma casa, por ser tão usual á dor de
seus celebrados dentes, especialmente os dentes de dentes; nem haverá tantos desdentados, embora,
uma espécie, de que logo diremos. Tem estes brutos que apesar dos barbeiros, que muitas vezes tiram
os dentes grandes, e metidos uns para dentro dos não só os doentes mas também os dentes sãos.
outros, por se compor cada dente de 3, ou 4 de Também a gordura, ou banha do jacaré, é aprovado
sorte, que tirado um, ficam os outros como cascos remédio para os papaterras; porque lha faz vomitar,
de cebola muito inteiros, sendo uns bainha dos expelir, e alimpar. É bem verdade, que [roto o
outros. São os seus dentes óptimo contraveneno original] levar, e que os doentes lhe fazem caras, ou
para todos os venenos. Descubrio o seu grande carrancas; porém como os efeitos são bons, tenham
préstimo na América um preto ministrando a outro, paciência os enfermos, e para a tomarem com menos
que no disfarce de seu amigo, e grande camarada, repugnância, lembrem-se do adágio, que diz, e cae
mas inimigo refinado no ânimo, o queria matar, para aqui bem – Caro é, o que bem sabe - outra letra a
cujo fim o brindou por várias vezes com muitos e diz: Caro custa o que bem sabe. Diz o Padre Gumilha
refinados venenos disfarçados em bebidas, e que no Orinoco é muito usual nos indios o abuso
admirado, de que nenhum sortisse efeito, desejoso de comer terra, mas que não temem os seus ruins
de saber a causa, lhe meteo prática accomodada ao efeitos, por comerem tão bem como cousa muito
caso, no qual lhe perguntou, se sabia algum regalada, e gostosa a gordura do jacaré, que sabem
remédio, com que andassem seguros das venenosas separar, e alimpar da catinga, donde procede toda
potagens dos inimigos? Ao que o outro, que não a sua insipidez, e amargura. Pelo contrário dizem
suspeitava malicia respondeo sincero, que o remédio ser muito venenoso o seu fel, por cuja razão é muito
universal era um dente de caimán trazido consigo, buscado pelos malfazejos, que dele usam nas suas
como ele o trazia no sovaco do braço. Deste caso, confeições em prejuízo do seu próximo, e das
que logo se foi publicando, se principiou a estimar próprias almas; porque tirando aos outros a vida
como cousa preciosa o dente do jacaré, como do corpo, a si mesmos tiram a vida do espírito:
excelente contraveneno; e cada vez se foi mais Peccatores mala capient in interitu [“Os pecadores
confirmando a sua vertude, por experimentada em recebem o castigo no próprio crime (S. Agost.)]. Há
muitos casos, dos quaes foi mui notável o seguinte. várias espécies destes lagartões, ao menos quatro.
Indo de jornada um ministro português, lhe mordeo Aos da primeira espécie cbamam os naturaes jacaré
uma cobra surucucu o cavalo em um pé, que guaçu, e são os da primeira grandeza, que isso quer
começou logo a sentir os efeitos do mortal veneno, dizer a palavra guaçu. Dos desta espécie abundam
lançando sangue por todas as vias, boca, olhos, e os lagos dos Rios Amazonas, Madeira, e outros
ouvidos, e já estirado agonizava com as ansias da caudalosos, em cujas enseadas, e remansos
morte; e agoniado também o Ministro com a perda ordinariamente andam, e vivem. Aos da segunda
da cavalgadura, se lembrou do dente de jacaré, que especie chamam jacaré curuba, isto é, bexiguento,
o seu paje levava consigo, e atando-lho ao pescoço, em tudo semilhantes aos da primeira espécie,
pouco a pouco foi parando o sangue, e o animal excepto, que os curubas são muito pretos, e pelas
restituido às suas forças brevemente pôde continuar costas tem muitos inchaços, ou quitãs duríssimas,
a jornada. como as mais duras pedras, e algumas tão grandes
Dizem porém os naturaes, que nem todos os como nozes, e daqui lhe vem o nome de curuba.
dentes do jacaré tem esta vertude: uns afirmam, São também distinctos dos primeiros em serem mais
que só a tem os queixaes, outros, que são os pequenos, porque da tromba até a ponta da cauda
dianteiros; estes ateimam, que são os de fora, e terão 8, ou 10 palmos. Os dentes dos desta segunda
aqueles, que os de dentro. Eu digo, que o mais espécie é que tem vertude contra todo o veneno,
acertado é, que quem quiser certificar-se, podendo, como afirmam os experimentaes. Aos da terceira
os experimente todos em algum animal, v. g., cão, espécie chamam jacaré tiribiri: são mais pequenos,
gato, ou qualquer outro. Outra vertude excelente, que os da segunda espécie, e deles se diferençam
que dizem se tem descoberto nos mesmos dentes é em terem a cauda triangular, e o papo vermelbo,
uma grande antipatia contra as dores de dentes, andam ordinariamente nos iguarapés, e mais rios
302 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

pequenos. Não obstante serem pequenos de só 4, Assim atado, e maniatado aquele grande
ou 5 palmos de comprimento, tem tal serventia, que, lagarto, saltam os pescadores a sua canoinba, donde
se succede taparem os iguarapés, em que andam o puxam para dentro, se é pequeno, ou se não podem
os taes jacarés, com os seus parises, os pescadores, por ser grande, o vão levando a reboque para o porto,
por mais tontos que sejam os parises os rompem, e com advertência que sendo tão bravos os jacarés;
lançam por terra, o que não fazem os da primeira e contudo assaltados assim por qualquer indio, se
segunda espécie, porque com qualquer pari se dão deixam maniatar sem bulir; pois bastava qualquer
por presa. Parises são úa casta de tapagem com movimento, que fizessem para deitarem o indio de
estacas, com que os pescadores tapam as bocas dos pernas acima, e logo levá-lo de um bocado; mas
iguarapés [sic], para colherem o peixe na vazante nisto mesmo mostram a sua brutalidade, se não é,
das marés. Quando dormem roncam tão fortemente que por terem o somno muito pesado não sentem,
que parece tremer a terra, e nos roncos exprimem o nem o peso do indio, nem nem [sic] os cordéis, e
seu nome tiribiri. dores. Porém saltando o indio à canoa, e
principiando a puxá-lo de longe, começa o bruto a
Os da quarta espécie são os chamados jacaré
estremecer-se, e a dar taes açoutes, já no lodo, e já
tinga, isto é, brancos, a respeito dos outros, que
na ágoa, já com a tromba e já com a cauda, que faz
são mais apretados. Os das tres primeiras espécies,
tremer, e arripiar os cabelos, menos aos indios por
nem todos os indios os comem, especialmente os
acostumados, ainda que sempre fazem toda a
da primeira, e segunda espécie; porém os tingas da
diligência para irem distantes do jacaré, em ordem
quarta espécie comem todos. Tem a carne muito
a que este com alguma trombada, ou açoute, lhe
alva, e branca como galinha, e bem cozinhados
não vire a canoa, e a faça em pedaços. O seu grande
parccem pescada, e por tal os tem avaliado alguns
furor admirou um missionário do Amazonas,
europeos, que prometendo de nunca os comer, por
trazendo o seu pescador assim bem seguro um
serem feios lagartos, disfarçados em boas
jacaré, que com ser dos mais pequenos por ser dos
menestras, gostaram muito deles. Desta espécie há
da terceira espécie de 4 até 5 palmos, dava taes
maiores, e menores até doze palmos, e mais de
açoutes na terra, taes voltas em redondo, taes saltos,
comprimento.Vivem nos lagos, e iguarapés, e são
e tão formidáveis urros, e roncos, que o missionário
tão bravos como os mais; mas não obstante a sua
não se fiando em estar bem amarrado, se foi
braveza os indios não só os matam, mas também
retirando mais que depressa. Além dos homens, que
os apanham vivos. Há indios tão afoitos, que os vão
já deste modo, e já com anzóes de fortes cadeias os
buscar para brigar com eles, o que fazem metendo-
pescam, tem mais muitos outros inimigos, e o maior,
se nos lagos, onde os jacarés são inumeráveis,
são eles mesmos, não por se matarem em pelejas
armados unícamente com dous bons toretes, e
uns aos outros; mas porque ao sair dos ovos os
dando sobre uns, e outros com notável ligeireza, os
pequenos, os grandes os comem, e talvez por esta
tem iludido; posto que os jacarés em cerco como
razão, e também porque os indios dão busca dos
um exército arremetem o que lhe há de chegar, e no
seus ovos, como já dissemos, são menos: pois a
mesmo passo os indios dando para úa, e outra parte
lograrem-se todos os ovos, e crias, seriam tantos,
se tem livrado deles com gracioso espectáculo dos
que o Amazonas, e mais rios se fariam inabitáveis;
que das margens estão aplaudindo a victória, ou
mas assim como eles são inimigos de muitos assim
temendo a peleja, que sempre é tao perigosa, como
tem muitos contrarios. Também é curiosa a peleja,
se estiveram rodeados, e pelejando no meio de uma
que tem com os tigres, e onças, que exporemos
grande manada de bravos touros, ou ao menos entre adiante.
uma matilha de raivosos cães de fila mais ferozes
que os chamados mastizes dos ingleses com raça
de tigres. Não é menos admirável a ousadia, com CAPÍTULO 15º
que os indios pescadores os apanham vivos. Vão CONTINUA-SE A MESMA MATÉRIA
nas suas canoinhas nas vazantes das marés DOS ANFÍBIOS DO RIO AMAZONAS
observando as margens dos iguarapés, ondc os Visto falarmos em lagartos, merecem sua
crocodilos costumam dormir enterrados no lodo; e especial menção os chamados camaleões, célebres
como os indios já tem signaes, por onde os pela sua tão medicinal pedra. São do feitio de
conhecem, advertindo ou achando algum a dormir, lagartos de comprimento até cinco palmos, feios,
chegam a canoinha à borda da ágoa, põe no lodo o mas muito inocentes; e quanto mais bravos são os
seu remo, e neste os pés, para se não encravarem lagartos, ou jacarés, de que até agora falamos, tanto
no mesmo lodo. Depoes de observarem e estes são mais mansos. Não tem escamas, nem
examinarem bem o lugar da cabeça, e cauda do conchas, mas úa pele como lixa: andam
bruto, com muita subtileza, e ligeireza lhe põe um ordinariamente pelas árvores, e arbustos, à borda
pé sobre a cabeça, e outro sobre o lombo, e com as da ágoa, e nos rios, e quando se vem assaltados
mãos se segura em cima do mesmo jacaré: logo com um salto se escondem na ágoa, onde também
metendo os braços pelo lodo a buscar-lhe as mãos, vivem, e nadam, como peixes. A sua carne é branca,
estando que as acha, lhas puxa, e vira para as e alva como galinha; nem falta, quem a antepõe no
costas, onde lhas ata com fortes cordéis, e o mesmo gosto a mesma galinha, e os indios não fazendo
faz aos pés, e já então mais seguro lhe ata também muito apreço da galinha, quanto podem, não
a tromba, como se faz aos porcos; quando se querem perdoam aos camaleões. O modo de os caçarem é
matar, se não é que a tromba é a primeira que à frecha, indo mansamente pelos rios à borda da
seguram, por ser a mais perigosa. ágoa, e assim que os avistam, fazem neles tiro com
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 303

suas frechas, em que são destríssimos, e poucos não advertem para buscá-las; tanto que chegou a
lhes escapam; porque, ainda que vendo-se feridos confessar um missionário daquele rio, que indo
logo saltam a ágoa, como levam a frecha embarcado, e matando uns rapazes, que com ele
atravessada, não podem mergulhar abaixo, e por iam muitos no descurso da viagem nunca lhe
isso os apanham, e metem nas carnes onde posto occorrera a tal pedra. Tem-na no bucho, e por isso
que estejam totalmente vivos, e com todos os seus tem, os que a tem, maior [ilegível] pelo qual logo se
espíritos vitaes não fazem mal nenhum, de sorte, conhecem.
que correm as canoas de popa a proa pelos pés Agora diremos alguma cousa das tartarugas
descalços dos indios, e contudo são tão inocentes, do Amazonas, chamadas pelos naturaes jurará; e
que nem os mordem, nem molestam, salvo só com alguns europeos, além do usual nome de tartaruga,
as unhas, que as [tem famosas]. Dizem comumente a chamam galinha do Amazonas. É animal anfíbio,
que eles só se sustentam de vento, e de ar; e por mas a sua principal vivenda é na ágoa, peixe por
isso aos homens soberbos, e vaidosos, que parece certo digno de toda a estimação, não só por grande,
só vivem dos cortejos, e aura popular, chamam se não também por gostoso. O feitio é bem conhecido
camaleões de vento; mas os naturaes afirmam, que em tudo semilhante aos cagados, menos na
eles na verdade tem o seu sustento, ou já nas ervas,
grandeza. Há duas castas mais conhecidas. Maior
ou arbustos, ou já na lambuje do musgo. O que
e menor: as da primeira espécie crescem a tal
porém é certo é, que eles variam as cores, não só na
grandeza, que cada uma pode carregar a um
aparência como no pescoço das pombas, que só é
jumento, e ainda se exporá a dar com a carga por
aparente, ou conforme lhe dá a luz; mas na realidade
terra, sendo o caminho comprido[.] Valente
se vestem de todas as cores. Certificou-me um
animalejo! Tem tempos de mais, e menos gordas;
religioso curioso, que ele mesmo em pessoa fez
as suas carnes nas maiores, especialmente estando
experiência. Apanhou um vivo pequenino, pô-lo em
magras, são alguma cousa duras, e secas; mas se
um papel verde, e com multa presteza, e facilidade
se mudou em verde o camaleão; mudou-o para dão em mãos de um bom cozinheiro, sabem como
campo azul, e também se vestio de azul, passou-o gaitas, ou se convertem como carneiro estofado, ou
para vermelho, e pôs-se de vermelho, e o mesmo ensopado, ou como porco de fricassé, ou como
fez em campo roxo, variando em todas o camaleão. galinha. O seu sarapatel, e sangue em nada se
Só nas cores pretas, e brancas gastou mais algum distingue do sarapatel, e sarrabulho de porco, se é
tempo, sinal de que sentia maior dificuldade de bem cozinhado. De cada tartaruga fazem sete ou
sorte, que tomam as cores conforme o plano, em mais menestras diversas; e todas de receber.
que estão; e por isso é, que ordinariamente são Primeira o sarapatel, segunda o sarrabulho, terceira
verdes, por estarem entre as verdes folhas das o peito assado, quarta fricassé, quinta o cozido, sexta
árvores. Há duas castas mais conhecidas, a primeira a sopa, sétima o arroz. Isto é o mais usual, que em
maior, e cresce té cinco, ou seis palmos. A segunda casas particulares ainda fazem mais guisados,
é mais pequena, e tem pouco mais de palmo: em especialmente se ela está com os seus ovos; e se é
um desta espécie, que são mui mansinhos, se fez a das maiores úa só pode dar de comer a úa
referida experiência. É muito célebre, e preciosa a comunidade. As pequeninas quando, e pouco
pedra do camaleão, não por ser resplandecente, depoes, que saem dos ovos, sabem como torresmos;
como outras, que só servem para ornato, e enfeite e quando já de alguns meses, enquanto são como
da vaidade; mas por ser muito medicinal com um palmo, ou pouco mais, lhe fazem úa brecha no
excelentes préstimos na medicina, especialmente peito, por onde as alimpam, e enchem o vão de
por ser um óptimo febrífugo, por isso é tão estimada, temperos: vinagre, cebola, etc. e assadas assim no
que chegam a dar por ela para cima de 200 mil réis. forno são um pasmo, come-se sem fastio, e por
Há maiores, e menores; e chegam alguns a ser regalo. Diferençam-se das tartarugas do salgado
maiores, que um bom ovo de pato, praecipue no ordinárias, em terem os cascos, ou conchas muito
comprimento. finas, e por isso ineptas para delas se fazer obra
alguma. Disse das tartarugas ordinarias do salgado,
Só os da primeira espécie tem pedra, e ainda
porque também neste há em algumas partes destas
destes, não a tem todos, antes são os menos, os
tartarugas, que só servem para comer,
que a tem: e alguns curiosos tem havido, que
especialmente na altura das Ilhas: não sei, se são
andando à caça deles por causa da pedra, em cousa
tão gordas, e gostosas. As da segunda especie, que
de todo, nem úa só acharam; e tem havido outros,
chamam tracajás, além de serem mais pequenas,
que em quase todos a achavam. Verdade é que
são ordinariamente mais tenras; e por isso mais
muitas se perdem por causa dos indios, que são
estimadas para o prato. As tartarugas de cascos,
ordinariamente os que os caçam; porque, ou não
ou do salgado, a que podemos chamar terceira
sabem a sua estimação, e é o mais comum, e por
espécie, também merecem sua menção na História
isso a deitam fora; ou porque os pescadores, que
pelos seus preciosos cascos, e conchas; e também
[em branco no manuscrito] tem recomendação as
tem parte no Amazonas, especialmente na sua foz,
encobrem, como costumam fazer em tudo o mais,
onde já entra o salgado; mas deixemo-las reservadas
em que sentem empenho. E apenas se aproveitam
mais para diante.
algúas, quando nas embarcações vem algum branco,
que delas já tem notícia, e apanhado o camaleão, Os ovos da primeira espécie, e cuido, que
ou cene[mi], como lhe chamam os naturaes, o também da terceira, são do feitio, e tamanho dos de
manda abrir à sua vista. Disse que delas tem noticia; galinha, e da mesma cor, menos em terem a
porque ainda os mesmos brancos ordinariamente casca muito branda de sorte que podem acamar
304 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

uns com outros sem perigo de quebrar em. os comilões, que não podem jejuar uma quaresma,
Diferençam-se mais em serem quase tudo gema, e talvez nem um dia! Para as pescarem usam de
com um pequeno círculo de clara, e são óptimos vários modos. Umas vezes redes, como os peixes;
para fazer ovos moles. É para admirar, a quantidade outras vezes à frecha, já com arpões, e já na viração.
de ovos, que põe: 150 té 200 é o mais ordinário. Se A viração é na occasião, em que elas saem à area a
fossem tão fecundas as galinhas não seriam tão desovar, cujas paragens, e tempo já sabem os
caros os seus ovos. O tempo de os lançarem é, moradores; e por isso escondidos as esperam em
quando os rios pela vazante vão descubrindo os seus grande silêncio, para que não sejam presentidos das
areaes; então elas saindo dos seus lagos, em que tartarugas, atalaias, e tanto que presentem aquele
pela maior parte andam, vão em tão grandes
exército cavando, e fazendo as suas covas na area,
cardumes, e tão numerosos exércitos buscando as
lhe saem de repente da cilada, cortando-lhe os
praias, que alteram as ágoas, e fazem ondas, quaes
passos, e retirada pela parte do mesmo rio. Daqui
as ventanias, quando assopram, e isto por grande
espaço de tempo; e já sabem por instinto, não só vem, que posto que elas logo se ponham em
onde estão os areaes, mas também, a quaes areaes descomposta marcha, e precipitada fuga, para na
pertencem; porque um exército vai para uma parte, ágoa segurarem com a liberdade a vida, não podem
e outro para a outra. Nestes rios andam até lhes fazê-lo com tanta pressa, que se livrem das mãos
chegar a sua vez de desovarem, o que sempre fazem dos caçadores, que não fazem outra cousa mais, do
de noute, e no silêncio. Não é menos admirável o que dar-lhe um pontapé e virá-las de pernas acima,
seu instinto para sair a desovar; porque não só é de e assim vão fazendo a quantas podem, já com
noute, e em silencio; porém tão bem com muita pontapés, já com as mãos, e já com encontrões. E
cautela, e segurança. Pois antes de começarem a posto que muitas escapam para o rio, também ficam
marchar os exércitos, ou cardumcs delas, saem outras muitas viradas, e tão seguras, que estando
primeiro algumas poucas, como atalaias, e de costas, nem-se podem meixer [sic], nem menear.
descobridores do campo a especular, e observar bem Assim seguras de pernas acima, as vão embarcando
a paragem, se está, ou não solitária, e segura. muito a seu salvo, e se carregam todos os anos
Depoes de verem, que não há inimigos, voltam a muitas embarcações, de que fazem grandes
dar parte às mais; e logo sae um exército a desovar, provimentos, e bom negócio.
e o mesmo vão continuando pelas mais noutes, por
muito tempo, que ordinariamente é por todo o Outros moradores tendo as deste modo
setembro, outubro, e parte de novembro. Para os seguras vão matando nelas [sic], para só lhe
porem, fazem úa cova na areia, e depoes de nela aproveitarem as bandas, de que fazem tão perfeita,
desovarem, a tornam a cubrir com a mesma areia, e gostosa manteiga, como a de vacca, deixando as
alisando-a muito bem; e retirando-se outra vez para carnes para pasto das feras, e aves. Também fazem
o rio, com a cauda vão apagando as pegadas, para manteiga dos seus ovos, que para isso são óptimos,
que senão conheçam, e o fazem com tal subtileza, por serem quase tudo gema, e em tanta abun-
que não fica sinal algum: de sorte, que ainda que dância, que há moradores, que fazem 600, 800, e
os indios sejam 1inces de vista, não divisam vestigio 1000 potes dela. E quase todos os mais, que sobem
algum, por onde andasse a tartaruga, e em que lugar o Amazonas para a colheita dos cascos, e mais
pusesse os seus ovos. Tem tal simpatia com a ágoa, riquezas, ordinariamente fazem tão bem seu negocio
que pondo úa tartaruga no interior do mato, ainda destas manteigas por princípio, e provimento de
que lá a virem com focinbo para o sertão, em se tartarugas, assim para comerem no decurso da
vendo liberta logo vira, caminha para o rio, e ágoa: viagem, e demora no sertão, como tão bem para
Só os homens tendo no Céo o seu centro, são para
carregarem na torna viagem, deixando-as para isso
ele bem pouco inclinados!
fechadas em curraes, e as manteiras no mato, até
O seu sustento são fructas silvestres, que voltarem do sertão. O modo, de que usam para
andam nadando pelos rios, trazidas dos matos pelas descubrirem os ovos enterrados é irem passeando
ágoas das ribeiras, ou caídas das árvores, que os pelas praias, e com frechas picando a area, e
rios tem nas margens. Mas a principal é úa fructa havendo ninhadas, logo as frechas dão signal de si,
do feitio de pinha, que é fructo de úas canas nascidas ou das ninhadas. É incrivel a muita manteiga, que
na mesma ágoa, e lagos, chamadas aningas. É sae todos os anos do Rio Amazonas! Talvez, que pela
notável o muito que vivem sem comer, nem beber!
sua abundância, e barateza, não cuidem na manteiga
Não foram tão sofredores da fome, nem tão
de vacca. São as tartarugas animaes inocentes, e
abstinentes os antigos anacoretas do deserto. Fazem
não fazendo mal a ninguém, contudo tem muitos
delas grandes provimentos os cidadãos para irem
comendo pelo discurso do ano, e fecham-nas em inimigos. Os primeiros são os jacarés, que nelas tem
curraes, ou as arremessam em algum canto da casa, o seu principal sustento; náo só nas grandes, que
aonde aturam aqueles brutos semanas, e meses, matam especialmente nos lagos, onde elas, e eles
sem outro alimento mais, que o ar 4, 5, e 6 meses. mais vivem, e quando saem a desovar nas praias;
E se os moradores tem a providência de terem estes mas muito mais nas pequeninas assim na ágoa, como
viveiros, onde entrem, e saiam as marés, ou outra também, e principalmente ao sair dos ovos, por
ágoa doce, aturam e vivem um ano, ou mais com a endireitarem, e caminharem logo para a ágoa, em que
circunstância, que se estavam gordas, quando as eles as estão esperando com os alçapões abertos, nos
encerraram, gordas ordinaria-mente se conservam quaes elas como inocentes vão cair. E como aqueles
todo este tempo. E que grande confusão esta para vorazes brutos tem tão grande bojo já se vê, que
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 305

por cada vez, não se darão por satisfeitos, senão dos ovos, de que fazem seus guisados, e um deles
com tartarugas a milhares. Os segundos inimigos não é despeciente; é uma massa composta deles, e
são as onças, e tigres, que andam pelos areaes, e de farinha de pao, que torram ao fogo, ou no forno.
praias á caça delas, e fazem grande matança, assim Também apanham as pequeninas, quando saem dos
nas grandes, como nas pequeninas; e tanto as ovos, e lhes dão uma grande diminuição: Mas na
onças, como os jacarés já sabem o tempo, em que verdade os seus maiores contrários são os brancos,
saem a desovar, e em que saem dos ovos. Muitas tanto das grandes, e pequenas, como dos ovos para
as manteigas: e se vê claramente, ainda pelos cegos;
outras feras não lhes perdoam, quando as acham,
porque não obstante todos os mais inimigos, que
ou encontram. Os terceiros inimigos são as aves,
tinham antes dos europeos, ainda havia tal
que vivem do marisco, e andam em grandes bandos
multidão, e abundância, que muitas vezes não
pelas praias, e areaes, e algumas são insignes podiam navegar as embarcações, como referem os
caçadoras. Os quartos inimigos são os indios historiadores, e ainda confessam os mesmos
naturaes, que nelas tem o seu principal sustento; e brancos; mas depoes que às tartarugas sobre-vieram
por isso há nações, que vivem, e tem as suas mais estes inimigos, as desbarataram tanto, e
povoações sobre os lagos em estacas; porque neles fizeram nelas tal destroço, que já em multas
tem abundância. E pouco seria, se comessem só as paragens, onde antes a multidão delas impedia o
grandes, mas também passeam as praias à caça navegar, hoje não se pode colher uma.

Figura 27.1. Jaboti (apud Brehm)


306 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

Também os jabotis fazem seu corpo na mais brutos, que estes mesmos brutos, praecipue
república dos anfíbios, e por taes, como os de que em muitos indios do mesmo Amazonas. Este mesmo
tegora falamos, gozam do privilégio de serem discurso, ou instincto mostram nas mais suas ações,
admitidos no sagrado do jejum. São do feitio de especialmente na providência que tem em desviarem
grandes cágados, ou de tartarugas mais pequenas; das suas casas as enchentes, e enseadas dos rios,
porque tem bons cascos, e bem duros: em que se
quando as tem não totalmente sobre o rio, mas em
recolhem, quando tocam, encolhendo as mãos,
terra perto, ou a borda da ágoa, em que cuido põe,
p e r n a s , e c a b eça, como também fazem as
os que já por muito velhos, ou acha[ca]dos não
tartarugas, e quase pela muita semilhança se
podem chamar tartarugas da terra, visto que as podem passar a ágoa para acompanhar os mais, e
outras o são da ágoa. Contudo, além de serem mais ir viver nos giraos sobre os rios, e ali tratam deles,
pequenas, lá tem suas diferenças; úa é em serem buscando-lhes o sustento. Mas no que se vê mais a
mais altas respective as de mais corpo. 2ª em terem sua habilidade é em divertirem as correntes, para
os cascos mais bem distintos, e em mais bem que não os alaguem ou desacomodem, já fazendo
claros, espelhos, com seus relevos nas divisões. 3ª [ilegível], e já cortando com unhas, e dentes, ramos
na cor [roto o original] tanto na boca, e pescoço, de árvores, e já abrindo vaIas, tudo com muito
como nos pés, e mãos, em que tem umas como acerto; outras mais propriedades admiráveis, que
escamas vermelhas. Posto que também vivem na tem, as poderão ver os leitores em Meri, e Capani,
ágoa, a maior vivenda é em terra, principalmente os quaes elegantemente as explicam, e em todos os
em campinas descubertas, e lugares alagadiços, mais [ilegível] no Canadá, onde há muita
escondidas entre, e por baixo do feno, ainda que
abundância; eu por não ter vivas as espécies, nem
também muitos andam nos matos. São inocentes,
[ilegível] por onde as coteje as passo em claro: e só
e não fazem mal a ninguém, temendo só que lho
declaro ser tão bom, e macio o seu pelo, que em
façam. Quando se vem assaltados dos mais bichos,
e feras do mato, escondem logo, e metem cabeça, e nada cede ao veludo, e por isso dele se fazem os
pés na concha, e ficam muito contentes, e seguros, melhores chapéos, cuja bondade se explica dizendo,
menos das onças, e tigres, que metendo-lhes as que são chapéos de castor.
unhas os matam. Também como tartarugas, sofrem As lontras também são animaes anfíbios, e
muito a fome, e se domesticam em casa tanto, que muito especiaes no Rio Amazonas. São pardas do
vem comer à mão. São multo vagarosos, já por tamanho de pequenos cães, e vivem igualmente na
terem os pés, e mãos muito curtas, e já por ágoa, e na terra. São tão ladinas, que se podem
trazerem ás costas o peso das suas conchas, e
chamar as raposas da ágoa, e tão ligeiras, que
casas. São muito gostosos, e tenríssima a sua
iludem os mesmos caçadores, especialmente nos
carne, e alva. Tem grandes fígados, e respective ao
rios, onde brincam trazendo só as cabeças fora da
corpo parecem disproporcionados; cozidos são um
ágoa, e se lhes desparam as clavinas, ou os indios
bom pratinho, e muito melhor assados. São símbolo
da mansidão; e por isso já anda em prolóquio nos as frechas, quando cuidam ter segurado alguma,
moradores, para significarem a mansidão de ela surge logo mais distante; e por mais tiros que se
alguém, o ouvirem, que tem fígados de jaboti; e atirem, não só os iludcm, mas também aos mesmos
dos velhos, em que já com os anos vai faltando o caçadores, nas voltas, e revoltas que fazem, em que
calor natural, dizem, que tem sangue de jaboti, no arremedam uma dança, já passando umas pelas
que querem significar, que já tem o sangue frio. outras, agora afastando-se, e logo chegando-se. Em
Dignos são por certo das Histórias os anfíbios terra também são tão ligeiras, que sobem, e andam
castores [sic! Não ocorrem no Brasil], que tão bem por cima das árvores, como macaco: sustentam-se
tem seu lugar no Rio Amazonas, posto que mais de bom peixe, que apanham em tanta quantidade,
retirados, ou mais raros; talvez por mais dignos: que são a destruição dos ríos, e muitas vezas vão
porque sempre foram raros os bons! São do tamanho comer a sua pescaria acima das árvores, onde
de cães ingleses, per minus, corpo cheio, cor também comem das suas fructas. Zombam das
apretada. Vivem juntos, como em bem ordenadas, redes dos pescadorcs, as quaes destroem, roendo-
e reguladas repúblicas. Fazem as suas casas sobre as com os dentes; e não só não ficam pescadas,
as enseadas dos rios, ou em cima dos lagos, as quaes mas são amigas de fugir toda a outra pescaria, e
fornam de paos, levantadas sobre giraos com sua ficarem os pescadores sentindo a perda das suas
semilhança às casas dos tapuias; e nelas fazem seus redes. São muito felpudas (não o são as de Macao,
repartimentos, e divisões. Os melhores quartos, ou
e China) e talvez que por isso sejam buscadas as
salas são para os mais velhos; e todos segundo a
suas peles para regalos das mãos. Antes de cortidas
gravidade, e a antiguidade que tem, assim tem
também as suas salas de sorte, que os mais tem seu fétido, que depoes de cortidas perdem: a
pequenos, e modernos, estão nas mais inferiores, e sua carne é gostosa, especialmente estando gordas.
menos cômodas: tudo também ordenado, que parece Fazem seus gorgeos por modo de cantiga
obram com claro juízo e discurso. Tanto assim, que bastantemente alta. Os indios, quando as vem, ou
os que defendem haver nos brutos verdadeiro encontram com elas nos rios, logo lhe gargarejam
discurso, o provam com a bem ordenada república batendo com os dedos na garganta, a que elas logo
dos castores; e na verdade há homens, que parecem respondem da mesma sorte.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 307

Outro anfibio é, o que chamam bicho palmatórias, depois de bem secco à sombra, e bem
vergonhoso [sic! Trata-se do pangolim, alheio à fauna espichado para não encolher; e fazem bem o seu
brasileira]. É do feitio de um lagarto grande de dous ofício, porque não molestando as mãos, como as
palmos, e meio; tem a cauda bastantemente aguda, de pao; não são menos doloridas. São pretos, como
e a cabeça, e focinho de carneiro. É bicho de conchas, os pretos, e são muito valentes. Há duas especies,
de que está todo cheio; mas conchas sobrepostas ambas semilhantes, na cor, e na grandeza. A
umas às outras, e só pegadas à pele por uma pequena segunda especie só se diferença em ser quase tudo
cartilagem; e por isso as levantam, e abaixam como gordura, e por essa razão servem para manteigas,
querem. Domesticam-se bem, com facilidade, e se de que fazem grande quantidade. É para admirar
lhes fazem festa, eles também correspondem a manteiga, que deita, cada um desta segunda
levantando, e abaixando as suas conchas; e batendo espécie! 30, 40, e mais potes de manteiga dá cada
umas nas outras fazem som de castanholas. peixe boi, o que se pode bem inferir a sua grandeza.
Chamam-lhe bicho vergonhoso, porque tocando-o, O serem tão gordos faz, que não sejam tão
ou querendo pegar-lhe, logo encolhe as mãos, e pés; estimados para comer, como os da primeira espécie,
e ajuntando a cauda com a cabeça, fica como urna ainda que destes também se faz alguma manteiga,
bola; ou ele se encolhe por humilde, ou se esconde especialmente das banhas, e muito azeite da sua
por vergonhoso, ou, e será o mais certo, por muito cauda, que é úa famosa pá. A mais carne, e febra é
tímido, como o fazem os jabotis, e tartarugas. A sua em tudo semilhante à de porco, e parece ter com o
carne é de bom gosto, as suas conchas atadas sobre porco muito estreito parentesco; e por isso das suas
os rins tem vertude de curarem, ou livrarem das carnes, como das de porco, se fazem linguiças,
amorróidas. Estes são os mais notáveis anfíbios do chouriços, e paios: e salpresas tem o gosto dos
grande Rio Amazonas, deixados muitos outros menos melhores presuntos de Lamego. Os negociantes a
dignos da História, como são várias espécies de beneficiam em postas escaladas, e seccas ao sol;
pequenos bichinhos, dos quaes há abundância, ou metidas em vasilhas de manteiga, e de ambos
especialmente em alguns lagos, e enseadas, onde há os modos se conserva muito tempo, sem a mínima
menos correnteza, e vivem, e passeiam não só pela lesão. Nos rios de Sena, e na Ásia também há bois
ágoa. mas também em varios arbustos, e criam na marinhos; mas naquelas regiões o chamam peixe
mesma ágoa, já sobindo, e já descendo, na ágoa mulher, e com o mesmo nome o descrevem os
vivendo, como peixes, e nos arbustos, como silvestres. historiadores, o qual lhe provém do membro
Uns são felpudos, e outros muito lisos; uns como generativo, que nas fêmeas é mui semelhante aos
lagartos, e outros como aranhas, e de muitas cores, das mulheres; e por terem também peitos como
e feitios diversos. Também há várias espécies de mulheres, e no mesmo lugar, os quaes cobrem com
cobras aquáticas, e anfibias, como são, as que na as suas grandes barbatanas; e por isso este peixe
Europa chamamos cobras da ágoa, e de algumas tem três figuras, ou três semilhanças. Primeira
darei especial notícia, quando delas falar em distincto semilhança de boi no focinho, nos peitos, e vaso
capítulo. E segundo algumas notícias, me parece, feminino semelhante de mulher, e no demais
que o grande Amazonas tem todos os anfibios, que semilhança de peixe, ainda que em muitas coisas
as Histórias contam da Ásia, África, e de mais mundo diverso dos mais. 1º. em ser redondo, como úa pipa;
[sic], menos os cavalos marinhos [sic; hipopótamos], 2º. em não ter ovos, nem ovas, como os mais peixes,
de que abundam os rios de Sena, e outros da África, mas gera os seus filhos como os animaes terrestres,
cuja descripção aqui não pertence. As riscas das parindo um só por cada vez, e criando-os com o leite
margens onde se acharem, denotam a falta de dos seus peitos. Tem também o seu coito em terra,
notícias de alguns viventes, que os leitores poderão razão porque alguns o [roto o original] na república
ver descriptos com mais individuação nos livros dos dos anfíbios, e também por se sustentar das folhas,
respectivos autores. Falta aqui a capivara do feitio, e e ervas a borda dos rios, como se fora animal
terrestre. São muito valentes, mas contudo não se
grandeza de porco, e vive na água, e em terra.
livram dos pescadores, que com fisgas, e arpões
os matam. O modo de os pescar é desta sorte. Como
CAPÍTULO 16º eles pastam à borda dos rios, e lagos, observam os
DA ORDINÁRIA PÉSCARIA DO AMAZONAS pescadores a sua roída de fresco, signal de que ali
andam alguns: põe-se à espera nas suas canoinhas
Merece o primeito lugar da república aquática com muito silêncio, e assim que o sentem, lhe
o boi marinho, ou como lhe chamam os europeos, o atiram com o arpão preso em úa comprida linha, a
peixe boi. É o maior peixe, que cria o Rio Amazonas, qual vão largando ao peixe, que ferido vai correndo
e talvez também o melhor. Tem tamanho corpo como com muita velocidade e ferocidade; e não tendo a
um boi, ainda que não se chama assim pela linha o comprimento suficiente, e ainda que o
grandeza, mas por ter os beiços, e boca do feitio de tenha, lha largam toda com úa bóia, pela qual
um boi, e também os dentes. No mais corpo é feitio depoes conhecem, onde está, ou já morto, ou
de peixe, muito redondo, e do feitio de úa pipa; mas esvaindo em sangue. Para o emborcarem alagam a
não tem como os mais peixes espinha algúa, nem canoa (são canoas que bóiam) em que vão; e assim
ainda no espinhaço. É peixe de pele, ou de couro, e alagada, lha metem por baixo, e vão conduzindo
tão grosso como boa sola, e pode servir dela no para terra, onde desalagam a canoa, e o levam para
calçado, ainda por cortir, assim como serve de boas o porto.
308 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

Depoes do peixe boi, ou peixe molher, tem o azeite da candea. Dizem, que tem o focinho de cão,
sen lugar o peixe piraíba, nao só pela sua grandeza, e suponho, que daí lhe vem o nome pirajaquara,
mas muito mais pelo gosto; porque na verdade é cão marinho [sic]. Também tem, como os cães, a
um dos mais gostosos do Rio Amazonas, posto que singularidade de acompanharem, e seguirem as
[o seu nome] o desminta, que é da língoa da terra, e embarcações, e fazerem como festa em giros, e
quer dizer peixe mao. Há diversas espécies, que só saltos, como os cães a seus donos, e como se conta
diferem, e se distinguem em serem maiores, ou dos golfinhos. Rolam pela ágoa uns atrás dos outros,
menores. Os da primeira espécie são tão grandes, como fazem as toninhas, e parecem barris, ou pipas,
que para a carregarem são necessários dous que andam rolando sobre a ágoa; e por isso se podem
pescadores dos mais valentes, que a pao, e corda a matar nos tiros, ou à frecha. Pau maqui [sic;
levam tremendo, e gemendo; e ainda ela arrastando, tambaqui] tão bem é peixe de estimação, e de
e alimpando o caminho com a cauda. É úa fartura excelente gosto, posto que não é dos maiores; pois
para qualquer grande comonidade se regalar com terá até quatr o palmos de comprido, e de
úa boa ceia. É peixe de pele; só se pescam, desproporcionada largura. É peixe de escama, tem
especialmente as grandes, com anzol; e é peixe a cabeça pequena, e muito mais pequena a boca,
universal em todo o Amazonas, e rios colateraes; que não excede a de úa tainha. É chato, e com ser
mas para baixo, e vizinhanças do Pará muito largo tem as costelas em lugar de espinhas
ordinariamente são as maiores da primeira espécie. delgadas; nem tem mais algúas outras espinhas, e
O peixe pirarocu também é de boa grandeza, e posto ordinariamente anda gordo. Náo é fácil pescar-se à
que não chega à da piraíba, contudo é um dos linha, por não lhe caber na boca anzol competente,
maiores do Amazonas: é de escamas, que para se que anzol pequeno não tem suficiente força para o
lhe tirarem requer -se um machado. Há duas segurar; e por isso só se pesca à fisga, ou frecha.
espécies; uma tem a escama com alguma pinta de
vermelho, que lhe dá sua galantaria. É algúa cousa O peixe jandiá é dos mais delicados do
carregada, por cuja razão não é dos mais estimados; Amazonas, e de delicioso gosto. Há duas espécies;
e tão bem por ter alguns tal qual [asco] ou catinga, úa grande, quase como úa mediana piraíba; a
mas havendo a providência dela tirar, é muito bom segunda espécie é pequena, que apenas terá palmo,
peixe. Consiste a sua catinga em dous nervos e meio: um, e outro é muito estimado. Tem pele em
delgados, como cordas de viola, que tem nos lombos lugar de espinhos, tem úas barbas compridas, que
desde o cachaço até a cauda. Para se lhes tirarem, já estende para diante, já endireita para os 1ados, e
não é necessária mais mestria, que dar-lhe umas já vira para trás; predicado, em que excedem aos
pancadas nos lombos com o olho do machado, com homens, que as não podem menear, e quando muito
que se escama; e logo deitam para fora as cabecinhas só podem ter barbas tesas. O jandiá da primeira
pelo cachaço, dando primeiro neste um golpe; e espécie como grande, só passeia pelo Amazonas, e
pelas cabecinhas se puxam para fora os nervos, e rios colateraes: os da segunda espécie como mais
fica o peixe sadio, e gostoso. As suas ventrechas, e pequenos, também andam pelos iguarapés, e
lombos assados não causam fastio. Costumam regatos; e é uma das mais ordinárias pescarias. Tem
cozinhá-lo, digo beneficiá-lo como badejo; é muito também o peixe espadarte, que é diverso, e mui
alvo, e de melhor gosto que o bacalhao. Há distincto do peixe espada. É o espadarte peixe
abundância dele em todos os rios, e lagos; os filhos grande, e de pele; mas, no que é mais admirável, é
acompanham os pais: pescam-se a fisga, e também na sua espada, que lhe sae do focinho, ou da cabeça.
com linha. O corpo será até seis palmos de comprido, e a espada
Há no Amazonas um peixe, que também é terá de quatro até cinco palmos de comprimento: é
nomeado, e merece seu lugar, não só entre os chata, e tem dentes de uma, e outra parte como
grandes, mas também entre os maiores. Chamam- serra, mas compridos como um dedo, e algumas
lhe os naturaes na sua lingoa pirajaquara, que quer tem para cima de um palmo de largura, e nelas
dizer peixe cão, ou cão marinho. É do tamanho da dizem, que tem muita força, e quando algum fica
piraíba; mas grosso, e corpolento; e lá tem algúa na rede, com a espada a golpea, e corta. Dizem
semilhança com úa pipa por redondo. É peixe de mais, que dando-lhe qualquer pancada, ainda que
pele, e posto que de todos os peixes abunda o pequena, na ponta da espada, logo fica como
Amazonas, e mais rios, lagos, e baías, deste há maior esmorecido, e morre. É espécie de cação seco e de
quantidade e abundância, que anda em bandos, e pouco [gosto]; também é peixe do salgado, e tão
cardumes. A razão de ser tanto é, por lograr ategora atrevido, que briga com a [roto o original] da mata
o privilégio de imunidade para com os pescadores, ferindo-a nos lombos com a sua espada, e como
e moradores por não sei que catinga, que nele ela é tão grande bruto, quando levanta a cauda, e
achavam. Porém perderam o privilégio, depoes que chega a descarregar o golpe contra o espadarte,
uns estrangeiros matemáticos (que se ajuntaram que supõe ainda da banda, em que a primeira vez
no Pará, e Rio Negro para as novas demarcações, a ferio, já ele como mais ligeiro está da outra banda,
entre as Coroas Portuguesa, e Espanhola) vendo a e dando outro salto em cima dela, torna a feri-la, e
sua grande abundância, fizeram experiência, e torna a saltar para a parte oposta, e triunfa dela.
pondo-o em postas ao sol, acharam ser um dos Eu observei úa vez esta peleja e tão de perto, que
melhores peixes, cuja ruindade está toda em uma estava vendo quantos saltos dava o espadarte, tão
certa gordura, que se desvanece derretido ao sol; e altos, que me parece, não ceder nenhum à altura
a mesma gordura se derrete para muito suficiente de um homem de mediana estatura. Os dentes da
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 309

sua espada tem algúas vertudes medicinaes. Outra que tem os mais anzóes, lbe põe duas farpas cada
especie de peixe grande é a dourada, não cede no úa de seu lado do comprimento de um dedo, as
corpo a uma piraíba; e por isso alguns a põe [sic] quaes por si se fecham, e unem de sorte, que só
entre as espécies da mesma piraíba. É muito galante deixam de fora úa pequena amostra, e nela põe a
a sua cor, e na verdade vista de baixo da ágoa tem isca, a qual engolida pelo bruto, abrem as asas, e o
uma cor amarela tão viva, e luzidia, que parece ouro; encravam; e logo o puxam para
e daí lhe vem com muita propriedade o nome de terra com boa linha, ou cadeia. Pescam-no
dourada, e talvez pela cor seja respeitada dos ordinariamente para fazer azeites, como outros
maiores peixes, ainda dos grandes tubarões, que a fazem da balea; e alguns também lhe aproveitam a
acompanham no salgado e boca do Amazonas. É carne, e febras desecadas, como badejo.
peixe de pele, e nele úa boa lixa; pesca-se à fisga, e
tão bem a anzol. Tem o tubarão uns peixinhos do tamanho de
barbos por pajes, que não só o acompanham, mas
Também merece sua memória o grande
também se pegam a ele de tal sorte, que custam a
tubarão, nome respeitado ainda nos homens; e por
arrancar, por cuja causa com muita razão os
isso muitos o tem metido nos seus muitos, e nobres
chamam pegadores, cujo lugar é junto das
apelidos, ainda dos antigos romanos, como se lê
barbatanas; ou sobre os lombos: sustenam-se das
nas histórias. É dos maiores brutos, que criam os
mares, e o Río Amazonas, não em todo, mas só na migalhas dos tubarões, os quaes não lhe fazem mal,
boca, onde já o salgado tem entrada; e são tantos, porque não podem chegar-lhe com a boca. Para o
que posto que sejam peixe comum nos mares, como tubarão pegar, e comer a presa se vira de costas,
testemunham os mareantes, parece, que a sua porque tem a boca por baixo, como o cação, e muito
própria pátria são a boca do Amazonas, e toda a metida para dentro, bem verdade é, que o fazem
mais costa do Brasil. É de pele e boa lixa, mas a com tanta destreza, como se este fora o seu natural.
carne é secca; e por isso os naturaes lhe perdoam, Também se presume ser o tubarão aquele voraz
que ordinariamente não o comem. É dos mais peixe, que diz a Sagrada Escriptura acometera ao
atrevidos peixes do mar, ainda mais, que a mesma São Tobias, e a quem livrou de ser victima da sua
baleia; porque enveste com qualquer animal que brutal voracidade o Arcanjo São Rafael, mandando-
chega à ágoa, aonde eles andam, e com os mesmos lhe, que o abrisse, e tirasse o fel, coração, e fígados
homens, que logo fazem em pedaços, como tem por serem muito medicinaes, e ensinando-lhe, que
succedido a alguns marinheiros, em alagados, e nas o fel tinha vertude para recuperar a vista; e os
mesmas praias do Brasil, e Amazonas; razão por fígados, e coração vertudes de expelir, e afugentar o
que sendo os indios tão inclinados a lavagens e diabo - Lumina fel sanat, sed virtus cordis, et jecoris
banhos, como patos, contudo nestas costas, e diaboli expellit potestatem [O fel cura os olhos, porém
praias, não há cbegarem à ágoa, buscando para isso o coração e o fígado têm a virtude de expulsar o
só algum retiro em iguarapés, ou poços, onde eles poder do demônio]. Ambas as vertudes
não possam entrar, ou chegar. Há porém alguns experimentou o São Tobias, dando com a primeira
indios tão animosos, que brigam com eles, não vista ao pai, ungindo-lhe com o fel os olhos; e
medindo as forças, porque então nenhum partido afugentando o diabo de sua esposa pela vertude do
teriam com os tubarões, mas por arte, e com fígado, e coração do peixe queimados. Não sei porque
destreza, metem-se os indios na ágoa armados com não se exprimentam, e usam agora tão prodigiosos
um, ou dous zargunchos de bom, e bem duro pao remédios [roto o original] por um Arcanjo!
em uma, ou ambas as mãos estendidos para o
tubarão que logo com grande ímpeto, e voracidade Também pertence ao Amazonas o peixe
acomete a presa, como uma seta. Então o indio com pirarara, e é digno de sua menção pelo tamanho,
o braço, e pao estendido lho mete pela boca, e o posto que não seja dos mais capazes para o geral,
atravessa até as entranbas. Mas se o tubarão tanto que ainda os mesmos índios lhe fazem caras.
declinou o zarguncho, faz o contendor em pedaços, Pirarará quer dizer ladrão do peixe, ou peixe ladrão;
como também, se andam mais tubarões; porque suponho, que lhe vem o nome do muito peixe, que
atravessando um, envestem os outros. Os indios come; porque é de rapina. Cresce até cinco palmos,
mais célebres nesta habilidade são os tramambeses ou pouco mais: é peixe grosso de corpo, e tem úa
no Estado do Maranhão. Mais seguramente os cabeça tamanha, que parece desproporcionada ao
pescam os marinbeiros no mar com bons, e bem mais corpo, e com tanta cabeça não é dos mais
fortes ganchos de ferro em que põe algúa posta de ladinos. É peixe de pele, e não fazem dele tanta
came, ou qualquer trapo por isca, e assim que chega estimação, por ter algúa catinga, posto que é dos
ao mar, logo o bruto a segura, ficando também ele mais gordos, como bem o mostram as suas banhas
seguro; menos sendo a corda, que serve de linha, muito amarelas de gordas, das quaes os indios
delgada, porque a quebra; ou ainda que seja forte, fazem muita estimação, porque dizem, que são
se lhe chega com os dentes, porque a corta; e quando óptima isca para o mais peixe, que logo acode ao
temem, que lhes fuja o prendem com um forte cabo anzol, em que a presente; e também serão boas
e assim guindam para cima. Quase semilhante é o para azeite da candeia, se as aproveitarem. O
modo, com que os pescam na vezinbança do Pará e aruaná é um galante peixe daqueles rios pelo feitio,
Amazonas, com um anzol de boa grossura, que [tem] e pelo gosto. Chamam-lhe alguns traçado [sic;
um ferro direito da grossura de um dedo, e perto de terçado], ou cutelo pelo seu feitio. Terá quatro até
um palmo de comprimento, e em lugar de gancho, [cinco] palmos de comprido; é chato, e na sua
310 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

Figura 27.2. Tubarão (apud Brehm)

largura, e grossura, não excede muito a largura, e peixe cavalo do Amazonas, e outras partes da
grossura de úa palma da mão, com toda a mais América. É um peixe pequeno, que apenas passa
semilhança de um cutelo. Não só a carne por de um palmo; mas tem a cabeça, e focinho de
dentro, mas também a sua cor por fora, é muito cavalo, tão semilhante, como se revera fosse feito
branca, por serem prateadas as suas escamas. O para um cavalo; e dovido que os pintores a possam
seu gosto é apetitoso, e só tem o desar de ter muita delinear mais semilhante, do que a formou a
espinha, e requerer -se muito cuidado para lhas natureza: por isso lhe vem bem a nascer o nome
tirar: seria óptimo peixe ainda para os doentes, a de peixe cavalo. No mais corpo é peixe de escama,
não ter senão, pelo qual alguns só lhe comem as como os ordinários.
ventrechas, em que o não tem, ou assado para Bagre é peixe, que desde o Amazonas até o
largar melhor as espinhas, como o savel. Na Ásia Mar da China se faz temido, e respeitado pelo
há abundância deste peixe [sic], e só no nome difere veneno das suas espinhas; talvez, que o baptizá-lo
do do Amazonas; porque no feitio, cor, e gosto, e em regiões tão distantes com o mesmo nome, seja
senão das espinhas convém inteiramente com ele. para melhor se conhecer, e precaver o veneno das
Os asianos lhe chamam carlim, e para lhe tirarem suas espinhas. Há muitas espécies deste peixe com
com facilidade as espinhas, assim que os a mesma semilhança; diferençam-se só no
pescadores o apanham, logo o enchem de golpes tamanho, e no gosto, e duvido, se também no efeito.
desde a cauda até a cabeça. O peixe cavalo tem É peixe de pele, de cabeça grande, mas alguma
um galante feitio: mas primeiro é de advertir, que cousa chata: na boca, e beiços tem barbas, que
eu não falo aquí do cavalo marinho, e senão do meneia, como quer; no mais corpo crescerá até três
peixe cava1o, que é diverso. O cavalo marinho palmos, ou quatro, e a pele com bastante grossura.
[hipopótamo] é um anfibio dos rios de Sena, e talvez Tem no cachaço, e nas bandas úas três espinhas
o maior dos anfibios, porque tem corpo maior, que com que pica, cada úa como um sovelão, muito
o maior cavalo, com pescoço, e cabeça do mesmo, venenosas todas três, e sempre anda com elas no
e também o arremeda nos rinchos [sic]; mas o reto, e direitas de sorte, que por banda nenhuma
demais corpo, é semilhante a um roliço porco, com se lhe pode chegar, sem se atravessar. Causa
pés curtos, e abertas as unhas. Também as suas grandes dores a sua picada, e se não se acode
carnes tem o mesmo gosto, que as de porco, e posto depressa à cura, há perigo de herpes, ou espasmo:
que na terra é tão tímido que foge de qualquer e outras vezes, quando pouco, fica aleijado por toda
pessoa, na ágoa enveste ainda com as embarcações, a vida o picado. A espécie maior é peixe carregado,
além de outras muitas propriedades dignas das e o beneficiam como badejo, quem não o quer comer
histórias, em que já andam, e muito alheias do em fresco: os das mais especies mais miúdos, não
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 311

tem mao gosto, e só tem pouco que comer, porque seu grande gosto; porque inamhu é um pássaro do
desde as espinhas venenosas para diante tudo são Amazonas de gosto especial, como diremos, quando
ossos, e apenas fica metade do peixe. Andam pela entrarmos na república das aves. Tem o pirainambu
foz, e costas do Amazonas, onde já entra algúa ágoa a aparência da piraíba, e só difere em ter a pele
salgada ou salobra. Segue-se para a arraia, a quem mais negra, e a cabeça de figura oval, além de não
os naturaes chamam jababira, de que há no igualar as piraíbas na grandeza, por não passarem
Amazonas grande multidão, e em algúas outras os maiores pirainambus de 4 té 5 palmos de
partes do Brasil; e cuido, que há de diversas comprido com grossura proporcionada.
espécies. As da maior espécie são tão grandes, que
Mas a todos os referidos leva a primazia o peixe
para as carregar necessitam de bons ombros em
mapará, que pelo seu incomparável gosto, sem
um robusto indio; e já foram necessários muitos
encarecimento o podemos chamar a lamprea do Rio
homens para carregarem úa do porto para casa a
Amazonas, e as delícias, e mimo dos seus peixes;
pao, e corda. O seu feitio é bem sabido na Europa,
onde também as há; e por isso já todos sabem, que antes dizem os experimentados, e de bom gosto,
são espalmadas, e redondas, e que não tem espinhas que entendem não cria o oceano peixe, que o exceda
algúas; mas só uns nervos, ou como cartilagens no gosto. Não necessita de mais temperos, e adubos,
muito tenras, e gostosas. Há uma espécie de do que ser assado com úas pedras de sal, ou com o
pequeninas cuja grandeza será como um palmo em mesmo simplesmente cozido, para exceder as
diâmetro, as quaes são muito gostosas, pescadas, lingoados, e melhores lampreas guisadas
especialmente fritas, e capazes para doentes. Tem por mão de mestre com muitas especiarias. É peixe
na cauda úas três farpas, ou espinhos mulio sem espinha, mais que o espinhaço do menor tem a
venenosas, tanto, senão mais, que os sovelões do cabeça chata, e espalmada, e nela uns ossos, ou
bagre; e as dores, que causa muito mais intensas, cartilagens tenríssimas, e gostosas por extremo, por
tanto, que sendo os indios sofridos, que ainda nas serem trespassadas de gordura mais apetitosa, que
maiores doenças ordinariamente não costumam dar a mais saborosa manteiga. A sua pele é muito fina,
ais; contudo picados da arraia, não só dão ais, mas e branca, e a sua grandeza chega té 4 palmos; com
também gritos; e não lhe acudindo com diligência serem não só bons, mas óptimos, são tantos, que
causa espasmo, e tira a vida; porém a arraia não andam em cardumes, como as sardinhas: os indios
acomete, e só vendo-se tocada acode logo com a pescam-nos á frecha, e fisga. Há outra espécie, a
cauda, como faz o lairão. Há úa espécie, que que chamam maparati em tudo parecidos aos da
acomete, e corre atrás da gente até picar. primeira, excepto na grandeza, por serem mais
Porém entre os mais célebres, e estimados pequenos, e no gosto, que posto seja excelente, não
peixes do Amazonas, merece, senão o primeiro lugar, chega aos da primeira especie.
ao menos o segundo, o que chamam pirapitinga, e Tariiraguaçu também é dos especiaes peixes
por outro nome mais comum entre os indios piraíba do Amazonas, assim pelo gosto melhor, que o das
remuia, que quer dizer avó das piraíbas. A figura, e pescadas, como também pela grandeza, em que
parecença é toda de piraíba; e toda a diferença está ombream com as maiores piraíbas. É um dos peixes
na grandeza, e gosto; porque um pirapitinga é maior, mais universaes em todo o Amazonas, e rios
que duas grandes piraíbas; e de gosto muito mais colateraes, tanto que ainda nas altas serras da
excelente, que as piraíbas. Porém com serem do Chapada grande, donde procedem, e descem todos
peixe da primeira estimação, por não excederem os rios, o primeiro peixe, que criam são tariiras
menos no gostoso, que na grandeza, as piraíbas, os guaçus, peixe de escama, e muito gordo. Chama-se
pescadores não gostam que lhe pegue no anzol, tanto tariira guaçu, que significa tariira grande, para
pelo risco de o quebrarem, como também pelo diferença de outra, que há na boca do Amazonas, e
grande trabalho, que lhe causa a sua condução, e costas do mar, tão pequena, que não é para ser filha
pelo grande perigo de vida, em que os põe, quando da tariira grande, ainda que no gosto mostra ser
o querem segurar, e meter na canoa, por não
sua parenta muito chegada; mas desmerecem toda
andarem nunca nestas canoas mais, que dous
a estimação por muito espinhadas, e é necessário
homens (e as vezes só um, que pesca só para seu
comê-las com multa cautela. Tem úa galantaria, que
amo, ou senhor) e não haver naquele estado
pescadores públicos, e de ofício, que em taes serve de recreio aos navegantes, e é, que nas
occasiões ajudem uns aos outros, e ser claro, que vazantes das marés andam brincando pelas praias,
um só, ou dous homens, não bastam para segurar e charcos de lodo ao nivel da água, ou para melhor
um tão grande animal, sem evidente perigo de vida. dizer entre lodo, e água; e quando a embarcação vai
Há outro peixe mais pequeno, que terá té dous chegando ao pé, vão todas aos saltos para a ágoa,
palmos, com o mesmo nome de pirapitinga, também ou como escorregando por aquele lodo. E ainda pela
de pele, e da mesma figura, e bom gosto: entendo, mesma ágoa dos rios, vão correndo sobre a ágoa,
que outra especie ínfima, e de ambas há muita até que depois de um bom espaço se escondem para
abundância. Ainda é mais delicioso o peixe baixo; e são tão amigas destas margens, e praias de
pirainambu, por ser não só de bom, mas de óptimo lodo, que facilmente não se acharão em praias de
gosto; e por isso deve ter lugar na classe dos area, ágoa clara, e limpa, ao contrário das da
melhores peixes, visto que na grandeza, não seja primeira espécie, que além de não terem espinhas,
dos mais avultados. O seu nome quer dizer - peixe mais que as ordinárias, só passeam por rios de ágoa
inambu, e talvez que seja nascido o dito nome do clara, e cristalina.
312 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

O peixe acará também é delicioso, e quase se corvina. É peixe de escama, e de muita espinha,
pode comparar com o linguado, por ser pouco mais porém de bom gosto; nem a multidão de espinhas o
grosso, e não lhe ceder no gosto. Há duas espécies, fazem menos estimável, por não serem pequenas, e
que explicam os apelidos tinga, isto é branco; e finas, como em outros peixes, mas grandes, e
pixuna, que é preto. O branco é menor, apenas terá grossas como palitos, e por isso alguns usam delas
palmo, e meio; o preto é maior: ambos, além de em lugar de palitos, para o que não são despicientes;
gostosos, são tão sadios, que se dão em lugar de porque, além de grandes, são chatas. Também a
galinha aos doentes, ainda que na verdade o pixuna beneficiam, como badejo; e ainda assim não é
excede ao tinga. É peixe mais ordinário, e usual em despiciente. Baiacu, que também é peixe do salgado,
todo o Amazonas, e os indios o pescam já a frecha, tem úa singularidade, pela qual se faz digno da
que é o seu mais ordinário instrumento, e já com História, ao menos para cautela. É tão pestilente,
úas pequenas redes, que tecem entre duas varas que mata, aos que o comem, não sendo bem cozido,
com hastes compridas, e pegando nestas metem a ou assado; e ainda assim, será bom o resguardo,
rede na ágoa, e levantam para cima. Ambas as porque pode succeder não perca todo o seu veneno,
espécies são de escama. O peixe mais admirável que e quando não mate damnifique. É peixe de pele, e
cria o Amazonas, é o chamado pelos naturaes
pequeno, apenas chegará a palmo, e meio. Tão fácil
poraqué, e no latim torpedo, e stupefa[cio] cujo
de pescar, que basta atirar com a linha a àgoa, e
nome declara bem o seu mecanismo; porque
puxar, que já vem um baiacu para terra, sem ser
tocando-lhe faz entorpecer, e pasmar ainda ao mais
necessário embarcar para o ir pescar mais longe.
forçoso gigante, Não o excedem os mais bravos
Assim que sae da ágoa, toma vento, e se faz redondo
jacarés, nem podem competir com ele os tubarões
como úa bola. Não só inficiona o mar Oceano, que
atrevidos; porque estes pelejam empenhando o resto
da sua força, e valentia; o poraqué porém para fica próximo ao Amazonas, mas também o Índico, e
vencer ao maior Hércules, só peleja com a eficácia Sínico, em tanta quantidade, e com tão refinado
do seu mecanismo: de sorte, que tocar-lhe com úa veneno, quando não seja mais, como acima
espada, é o mesmo, que ficar desanimado o braço, dissemos: nem entre eles há outra diversidade, e
e tão estúpido, que por si mesmo deixa cair a espada; diferença mais, que a dos nomes [sic]: porque na
e o mesmo succede, a quem o toca com qualquer Ásia o chamam bontal. E se há outra é, que o bontal
outro instrumento ou arma de ferro. E é tão vence na malignidade do seu veneno ao baiacu, pois
instantâneo o seu efeito que basta bulir o peixe, não obstante serem os chinas de tão boa boca, que
para logo desmaiar o braço, e o que é mais, sentir- a nenhum peixe perdoam, por insípido que seja,
se em todo o corpo um pasmoso tremer e não tocam este; e por isso em os pescadores vendo,
macanismo. Dizem também, que só causa os que se ele é pescado, lhe põe o pé sobre a barriga,
referidos efeitos, em quem o toca com ferro, e não até o fazerem [estalar] e esmagado deixam para pasto
com pao. E porquc mais pelo ferro, do que pelo pao dos bichos. Segue-se agora a enchova, que tão bem
hão de subir os eflúvios e causar taos efeitos? é peixe do salgado, e boca do Amazonas, e um dos
É questão que ainda hoje se ventila nas aulas, e mais selectos, e estimados pelo seu excelente gosto;
disputa na Física. Que o poraqué, ou torpedo tenha por ele merecedor de ser contado entre os da
simpatia mais com o ferro, do que com o pao, se primeira classe, e não menos pela sua grandeza;
prova claramente; porque com ferro basta tocá-lo porque não só é peixe de posta, mas de mão cheia,
de sorte, que ele faça algum movimento: com pao por enchê-la aos pescadores quando o apanham, e
porém, ainda que o moam a pancadas, não se muito mais a seus senhores, e amos, quando o vem.
sentem alguns efeitos dos seus eflúvios. O mesmo
mecanismo sentem, os que o tocam, ou com a mão, Toconaré também é dos mais excelentcs do
ou com o pé, enquanto ele está vivo, não com Amazonas, e seus colateraes: é peixe de escama,:
pequeno perigo de ficar afogado, quem nadando, e tão delicado, que apanhado pela manhã, já de
ou vadeando a cavalo a água, o toca: de sorte, que tarde está moído, donde se segue, que se não pode
se um cavaleiro caminhando pela ágoa tiver a guardar de um dia para outro, senão em sal: parece
infelicidade, de que a cavalgadura o toque com miséria própria dos delicados o corromperem-se
algum pé, corre perigo de ficar um, e outro pelas mais depressa! Cresce até três palmos, e assado
custas. Os mesmos efeitos sentem os brutos bois, fresco não cede no gosto ao savel. Não só os
cavalos etc; ac proinde [e por esta razão] na ágoa pescadores, mas os mesmos rapazes caminhando
correm o mesmo perigo, que os homens, de morrer pelas praias o apanham a frecha. O peixe cascudo
afogados. Contudo não lhe guardam o privilégio os é digno de alguma lembrança. É pequeno, apenas
índios, e brancos, que o pescam a frecha, e nada terá um palmo de comprido, mas muito gordo, e
sentem, pelo não tocarem, senão depoes de morto. faz um caldo, que se pode apresentar nas mesas
Tem o feitio, e semelhança de lamprea, e no gosto graves por caldo de galinha: porém a cousa especial
tão bem é um pasmo, por ser muito gordo: é de nele é úa saia de malha, em que sempre anda
pele, e anda principalmente pelos lagos, e iguarapés. metido, e serve-lhe em lugar de escamas. Consiste
Tão bem é próprio do Amazonas o peixe esta saia de malha em uns anéis, que o cobrem todo
pirapema, posto que não sobe muito acima, mas desde a cabeça até a cauda, tão duros, que ainda
só, ou pelo salgado, ou até onde chegam as ágoas depoes de cozido o peixe se não amolgam, mas vão
salobras. É peixe grande, quase como piraíba, e julgo se tirando, já com mais facilidade, como quem tira
tem alguma semelhança, ou parentesco com a anéis dos dedos. O peixe pacamo é também
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 313

de excelente gosto. É de pele, e com não ser grande, depressa, que não chegam a perder ma[rés], nem é
pois terá palmo, e meio té dous palmos, tem grande despiciente o peixe por ser de poços; porque sempre
cabeça. Vive ordinariamente pelos buracos, e entre neles entram ágoas vivas, ou das marés, ou de
pedras, comumente em rios, e iguarapés de lodo, algumas fontes, e regatos do mesmo mato. Pescam-
em cujas ribanceiras está escondido em buracos, no os índios ordinariamente á frecha.
como em tocas, donde o tiram os pescadores com
Basta já de peixe, sendo verdade que ainda
alguma dificuldade, não só por estarem muito
não disse, nem o dízimo das espécies diversas, que
dentro, mas tão bem por ser a sua pele muito
cria o Amazonas: úas unicamente próprias daquelas
escorregadia, e só o poderem tirar á mão na vazante
das marés. É muito mole, e parece ser uma lama; ágoas, e climas, pelas não haver em outros rios; e
porém depoes de cozido, é dos mais excelentes no outras comúas, por se criarem também já no mar, e
gosto, e escolhido para doentes. Pertence ao salgado, já nas ágoas de diferentes rios: e todas em tanta
e ágoas salobras. Muito ao contrário do pacamo, é cópia, como se pode ver nas suas tainhas, que posto
o peixe jacunda; porque é duro, não só antes, mas que sejam do mar, também sobem pelo rio acima, e
ainda depoes de cozido; contudo não é dureza tantas, que nas grandes baías do Marajó, Afuá, e
indigesta, e insípida, antes muito gostosa, e Marapatá do Rio Tocantins, basta ir um pescador
agradável, e só mostra ser algúa cousa duro, por se de noute com um pequeno facho acceso, com que
comer sólido. É peixe de pele, e quase do feitio do vá tocando em uma, e outra borda da embarcação,
torpedo, ainda que, não tão comprido; terá dous para logo saltarem tantas dentro, que seja obrigado
palmos de comprimento, mas redondo, e muito o pescador a largar o facho, e lançá-lo na ágoa, para
nédeo, como lamprea. Há muita abundância dele não se afundar com o peso. E nas costas da grande
em todo o Amazonas, e rios colateraes, e os índios o Ilha Marajó, aonde chamam a Ilha de Joanes, são
pescam a frecha nos lagos, em que anda junto com tantas, que há úa pescaria contínua arrematada em
o torpedo. contrato; as quaes beneficiam como badejo, e delas
A piranha é peixe gostoso, assim ele não tivera se provê quase toda a cidade do Pará, para cuja
o desar de muitas espinhas; mas sem embargo delas condução anda sempre uma embarcação na
é estimado pela facilidade, com que se pesca em carreira. São tão gordas, que ainda escaladas, e
qualquer ribeira, iguarapé, e lagos. Porque basta secas são úa delícia; e ordinariamente de bom
tamanho. Igual abundância há de outras muitas
tocar o anzol na ágoa, para já picar a piranha, de
espécies: porém bastarão estas poucas, para se
sorte, que os pescadores, e outros por divertimento
inferirem as mais, e ficar acreditado o Amazonas
não fazem mais, que meter, e puxar: é peixe
por máximo de todos os rios, não só pelas suas
pequeno, e os maiores apenas serão de palmo, mas
muitas ágoas, e rios colateraes, que recolhe, mas
é largo, e de escama. Tem uns dentes tanto, ou mais
também pela sua copiosa, e deliciosa pescaria, de
agudos, que lancetas, e daí lhe vem o nome de
que vivem ordinariamente os seus naturaes,
piranha, que quer dizer tesoura. Há outros peixes
praecipue pelo interior do rio acima, aonde falta a
em tudo semilhantes às piranhas, e com o mesmo
cômoda provisão de vacca, e quase em todo o
gosto, chamados [em branco no manuscrito] sem o
mundo, são o sustento ordinário dos homens. Agora
desar das espinhas, que tem a piranha; pois só tem
passaremos à república das aves, em que também
as ordinárias. Há outra terceira espécie e da mesma
o Amazonas não fica inferior a nenhum outro rio,
figura, também sem espinha, ainda de mais singular
assim na abundância, como também na variedade,
gosto, sendo juntamente muito maior, tanto no
(que unidas ali estão convidando aos portugueses,
comprimento, como na grossura. Tem costelas tão
não só para os fazer abundantemente abastados,
grossas como o são as de carneiro: é muito estimado,
mas também variamente regalados) ficando
e chamam-lhe [em branco no manuscrito] de todas
reservada entretanto a sua pescaria aos pescadores,
estas três espécies há abundância. O peixe serobi é
que com ela se regalam.
grande, e de pele, e pele galante; porque tem nela
úas malhas de várias cores, de sorte, que parece
pintado, e tem a pele tão grossa, que podia servir CAPÍTULO 17º
para solas de sapatos. É alguma cousa carregado, DA CAÇA ALTÍLIA DO RIO AMAZONAS
e muito indigesto, especialmente os maiores, de que
Visto falarmos da especial pescaria do Rio
há muito abundãncia, principalmente nos lagos.
Amazonas, como primeiro producto das suas ágoas,
Beneficia-se como badejo, e tem muito gosto. Há
e não pequena porção do seu tesouro, pede a razão,
muitas outras espécies de peixe a que chamam peixe
do mato, não porque sejam animaes terrestres, nem que demos alguma notícia das suas principaes aves,
ainda anfíbios, mas por viverem nos lagos pequenos, não só por viverem pela maior parte nas suas praias
regularmente por baixo do mato, e arvoredo, que participando do seu peixe, e marisco; mas também
há nos mesmos lagos; e alguns destes peixes são por terem com o peixe alguma comu-nicação, e
deliciosos. E como há grande multidão de lagos parentesco. Pois sendo certo, o que afirmam muitos
pequenos e poços uns, que deixam as marés, onde històricos, que há aves, que se convertem em peixes,
chegam: e outros, que deixam as enchentes dos rios, e peixes, que se transmudam em aves, como entre
há também inumerável peixe do mato, de que os outros diz o autor do Divertimento Erudito, e para prova
viajantes do Amazonas nas esperas das marés, assigna determinadas espécies; bem se infere terem
saltando em terra, fazem bons provimentos, e tão entre si algúa afinidade peixes, e aves, de que não é
314 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

pequena congruência a multidão de diversas aves, Venha agora o gavião, ou águia, que merece o
que sempre vivem no mar, onde comem, passeiam, primeiro lugar, e as primeiras atenções, por ser a
voam, descansam, e dormem; de sorte, que talvez rainha das aves. É pássaro do alto, não só por ser
nunca chegarão a ver terra, podendo com razão em real, mas pelo seu vôo; e posto que haja outros de
todo o sentido chamá-las pássaros do alto; além maior corpo, haverá mui poucos de tanto ânimo,
daqueles peixes, a que os mareantes chamam que isso mesmo é condição dos reis o terem espíritos
voadores, por andarem em contínuos vôos, de sorte, nobres, e grande ânimo. São pouco maiores, que os
que ao longe, e ainda ao perto, não parecem, senão maiores perus. É pássaro tão majestoso, que mete
passarinhos a voar. O que suposto, terá o primeiro medo, e infunde respeito a qualquer homem: é
lugar, o que mais avulta entre as aves. cinzento, ou branco escuro; e também se metem no
É o pássaro, a que os naturaes chama[m] ema, escuro dos matos, onde ordinariamente vivem. As
o maior volátil que cria nas suas campinas o pernas, e pesunhos são mais grossas, que o pêlo de
Amazonas; e talvez, que também seja o mais gigante qualquer rapaz, armadas com úas tão grandes
do mundo. É do tamanho de úa vitela, assim na unhas, como dedos de homem, e em terem tão
grandeza, digo altura como na grossura, e grande unha se aparentam muito com os ladrões, e
comprimento e por razão do seu grande corpo nunca como eles são assueti vivere rapto [habituados a viver
voa ao alto, nem se levanta da terra, posto que é tão de rapina], para isso as ajuda muito o seu bico,
ligeira ave na carreira, que se pode dela dizer, não porque são pássaros de bico revolto, em que tem
só que corre, mas que voa, de sorte, que custa a tanta força, que podem segurar o mais bravo cão de
apanhar ao mais destro cavaleiro. Por quanto o ema fila. O seu comer é mui substancial, como são reaes
vendo-se assaltado por qualquer cavaleiro não só tem régias iguarias; porque sempre andam á caça,
corre com as pernas, que tem compridas de sorte, que também lhe serve de divertimento, e recreio, e
que se desunha, mas também se vale e ajuda das matam veados, pacas, cotias, javalis, macacos,
asas levantando já úa, e já outra, como velas ao garibas, cães, e outra muita caça: e também
alto, para apanhar vento, e voar rastejando. Contudo matariam a qualquer homem, se avançassem a ele.
seja o seu curso vôo, ou seja carreira sendo um Também se domesticam, em úa fazenda estava um
cavalo ligeiro, e o cavaleiro destro, que saiba furtar- ainda pequeno, e querendo o fazendeiro matar
lhe as voltas, obrigando-a a fugir contra o vento, algum cão, ou gato, não fazia mais que botar-lho, e
por fim a vem acolher, embora que ambos fiquem logo o gavião muito alegre com a oferta, lhe dava
esfalfados, como succede às galgas com as lebres. um tal assalto, que em breve espaço com as garras
Vivem nas campinas, e juncaes, onde se sustentam o despedaçava, e concluía; e destas boas carnes
de erva, e feno; que só com tal pasto se podiam comem todo o ano, porque, como os graves, não
sustentar taes animaes! A sua cor, e penas são entre sabem, que cousa seja quaresma, ou jejum. E com
brancas, e cinzentas, excepto nas (nas) asas e cauda, serem tão graves, e valentes pássaros, tem muito
em que é mais preta e são quase tão compridas, e fraca garganta; porque nunca usam do tom grave
finas, como as penas do pavão, e posto que não na sua solfa, mas só do agudo, ou triple, por não
sejam tão lindas, são estimadas para plumagem dos fazerem mais, que chiar. Há duas espécies desta
chapéos, e para espanadores dos templos; porque águia: A primeira é, a de que propriamente temos
tendo o cano muito fino fazem úa grande roda, e falado de cor cinzenta, ou branco escuro, pouco
podiam servir de finos, e engraçados leques das maior que o maior peru, ainda que alguns a
donas. Tem o pescoço comprido, e a cauda respective comparam na grandeza a um carneiro. A segunda
ao corpo muito curta, que o desfeia demasiado. Os espécie é algum tanto mais pequena, que a primeira
seus ovos são proporcionados à sua grandeza, cada e são de cor negra pelas costas, e branca pela
um como dous grandes punhos. Domestica-se a ema barriga: também tem famosas unhas com que
como qualquer outro pássaro, e seria úa grande matam macacos, guaribas, e muitos outros
conveniência se se introduzisse entre as aves animaes, de que vivem. A sua força admirou úa vez
domésticas, ao menos por regalo, e raridade. É tão certo caçador, que matando um à espingarda, e
voraz, que não só digere pedras o seu papo, mas querendo cortar -lhe uma unha, por cuidar estava
também a prata, como se vio nas aldeas altas, onde já morto, o gavião moribundo acometeo com a outra
apanhando uma por descuido um dedal de prata, e garra a úa perna do caçador, e nela abriu quatro
advertindo a mulher na falta dele, feita a diligência, famosas sangrias. Úa, e outra espécie tem na cabeça
e não o achando, se foram a ema, e vendo que ainda um penacho, que levantam, quando estão coléricos,
não tinha passado do pescoço para o papo, lho e lhe serve de capacete, ou coroa. No peito também
espremeram tanto, até que outra vez saio pela boca tem outros penachos, que estendem, quando
fora, mas muito gasto, e bem se deixava ver, que querem, como aventaes, com que cobrem as pernas,
por mais uma, ou outra hora o consumiria de todo. servindo-lhe de enfeite, ou branca [galha]. Conta-
O papo desta ave serve para desfazer as pedras, e se das águias, por cousa certa, que levam para os
curar quem é achacado deste mal; porém é seus ninhos úa pedra medicinal, chamada por esta
necessária muita cautela, pelo grave perigo, que causa pedra de águia, para facilitarem os seus
causa com a sua muita acrimônia, e fortaleza; e partos, cujas vertudes exporemos em outra parte.
conforme dizem os experimentados, para se usar Dizem também, que para provarem, se seus filhos
dele é necessária mistura de papo de motum com são legítimos, ou adulterinos, os levam nas garras
uma casca de certo pao. ao alto, onde os endireitam com os olhos para o sol.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 315

Se eles o vem com bons olhos, e sem pestanejarem maior, que úa andorinha, de cor negra pelas costas,
fixam bem a vista nos seus raios, que é a prova da e branca pela barriga, e peito; e com serem tão
sua nobreza, são reconhecidos por legítimos, e pequenos, acometem a os patos, e envestem com
verdadeiros filhos, de que os pais lhes lavram alvará, os maiores mutuns, e matam, e comem uns, e
e dão jus de successão ao morgado das suas rapinas. outros. Também caçam grandes morcegos, que ali
Porém se não saem bem do seu exame, por não são muito maiores, que na Europa, e os apanham
poderem fitar os olhos no sol sem pestanejarem, no ar com tanta destreza, e graça, que por elas,
lhes dão úa reprova redonda, julgando-os indignos assim como conciliam a atenção, e alegram a vista
da sua filiação, e como a taes os largam das unhas, dos curiosos, também conseguem os vivas, e
e os matam com a queda. aplausos dos mesmos.
Falta aqui a águia de duas cabeças, que há na Porém o mais formidável gavião do Amazonas,
América [sic], e de que trata Feijó no tomo 6, Disc. é o chamado pelos naturaes acanguera. Quer dizer,
5, folha 195, cujo cadáver se remeteo a Europa no que os não há em todas as partes, nem em tanta
ano de 1723 e se conserva para memória no abundância como os ordinários, que a não serem
Concelho do Escorial; achava-se com outros três tão raros, fariam inabitável aquele Estado. Habitam
na província de Guaxaca, dos quaes dous eram estes gaviões nas catadupas do Rio Xingu, e no Rio
maiores que pareciam ser os pais, e dous menores, Jerauçu, e em poucas outras partes. Tem cabeça, e
que denotavam ser os filhos, dos quaes mataram aparência de gente, como qualquer homem; mas
um, fogindo os outros. muito disformes, e comem gente, o ponto é apanhá-
Além destas duas espécies, que se julga serem la, do que se pode conjecturar a sua grandeza, e
as verdadeiras águias, há várias espécies de outros ferocidade. Vendo-se qualquer homem assaltado, e
gaviões mais pequenos, como são, os que chamam abarbado com este monstro, não tem mais remédio,
tosto, inage, caracaraí, e outros. Porém entre todos que lançar-se na ágoa, se poder. Segundo, o que
estes se faz merecedor de particular menção o deles afirmam os índios, e muitos europeos, que os
chamado caburé, não pela grandeza, mas pela tem visto, são as verdadeiras harpias, de que fala, e
notável valentia, animosidade, e destreza. É pouco que descreve Virgilio.

Figura 27.3. Gavião real (apud Brehm).


316 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

Depoes da águia é digno de ter o primeiro lugar pelo seu tamanho, ainda que também é dos
na História o tijijiê, por ser pássaro, não só grande, maiores. É quase como peru na grandeza; tem por
mas também que disputa grandezas a sua rainha, todo o corpo (não falho nas asas) uma pena branca,
na valentia, correndo com ela parelhas na e duas pretas, variedade, que faz a sua vista
dificuldade dos seus partos, e excedendo-a no galante. A sua carne é gostosa, e tenra. Mas no
avultado do seu corpo. É tão forte, que com o bico, que mais se faz acredor da estimação dos homens
(que tem mais de palmo) tirou um das mãos a é, em ter na testa uma ponta, como unicórnio,
espingarda, e um remo, com que um alentado cafuz, redonda, e do tamanho de pao de dentes, e dele se
queria matar um, tendo-lhe quebrado úa asa com servem naquelas terras alguns, em lugar de palitos,
úa bala, e nunca o pôde matar, donde assentam pelo préstimo de ser contraveneno. Também nos
homens, além de noticiosos, de bom entendimento, cotos, ou encontros das asas tem duas do mesmo
que o tijijié é a garça, chamada no latim herodius feitio, e com a mesma vertude, e eficácia, que a
[sic!]. Afirmam homens verdadeiros, que os ditos ponta do unicórnio de ser contraveneno; e de facto
para porem os seus ovos levam, e põe nos seus certificam homens fidedignos, que as ditas aves
ninhos a pedra verde, de que usam muito os índios, antes de beber metem primeiro a tal ponta na ágoa.
que nós chamamos nefrítica. Os ninhos destas aves Bastava este préstimo, e estimável vertude, para
são de paos grossos, e os fazem por modo de jirao: se fazer muito apreço da nhuma, e se criar entre
São da grandeza de um grande carneiro; e de fato as mais aves domésticas. Amansa-se com tanta
de longe muitos se enganam, cuidando vem lote de facilidade, que não só vem comer à mão, mas faz
carneiros, quando são bandos de tijijiés. São de cor festa a seu dono revirando o pescoço, e cabeça, já
brancos escuros, e tem as pernas altas. Vivem do sobre as costas, e já para os lados, cujos meneos,
marisco, e peixe, que apanham; e por isso andam e trejeitos acompanha com sua tal qual solfa, que
sempre por lugares úmidos, alagadiços, e praias; por ser grosso baixam, só tem a galantaria de ser
com serem tão grandes, e valentes, não fazem mal signal de amizade. Sustenta-se do feno, e erva dos
a ninguém; nem ainda aos bichos do mato. Contudo campos, posto que também gosta muito da ágoa,
vendo-se acometidos dols caçadorcs, basta só na qual se banha, e refresca.
endireitar-lhe o bico para lhe vazar os olhos, além Segue-se já o pássaro chamado urubu, do
de os obrigar a largar as armas, como acima qual há três espécies, e os da inferior são sem
relatamos, podendo com o bico fazer nelas presa. conto, nem número; e na cor semilhantes aos
Já alguns curiosos tem querido domesticá-los, e na corvos da Europa, cujos parentes são, senão é que
verdade é fácil, porém custam o sustentar tão uns, e outros são da mesma espécie. São da
grandes animaes; especialmente na bebida; porque, grandeza de um peru, ou pouco menores, e perus
além de serem pássaros aquáticos, necessitam de os chamam os novatos reinóes. Tem a cabeça
úa grande gamela, em que possam beber a vontade cuberta de pele preta, sem pelo, nem pena té a
por não poderem de outra sorte beber, nem grossura de dous, ou três dedos pelo pescoço: estes
sustentar-se. Abaixo dos tijijiés são os jaburus, por nem se sabe como produzem, nem nunca se lhes
semilhantes na grandeza, se é que estes não são vio ninho, e muito menos os seus ovos; dizem em
um pouco maiores, e também nas cores tem pouca pequenos são brancos, e com o tempo se fazem
diferemça, só em serem mais pardacentos, que os pretos. É ave de rapina, mas útil ao público,
tijijiés, e de bico ainda mais comprido: são de pernas especialmente daquele Estado; por que
altas, e fracas unhas. Também vivem, e passeam ordinariamente não fazem mal, senão provocados,
pelas praias a pesca dos peixes, e às vezes os pescam e fazem muito bem comendo, e alimpando as carnes
tamanhos, que podem dar de cear a úa pessoa. Não podres, e animaes mortos nos matos, e nas
envestem, mas vendo-se assaltados, dão fataes campinas, nas quaes algumas vezes é tanta a
lancetadas com o bico, por terem tanta força, que carniça, que a não a consumirem os urubus, dela
podem com úa picada atravessar um homem. se levantaria muitas vezes peste. Para cuja melhor
O pássaro maguari também merece sua inteligência se deve saber, que nas campinas do
memória: é pássaro semilhante a outro, de quem Amazonas pastam gados vaccum, e cavalar em
disse um castelhano – tanta parola, e tan poca muita quantidade, de que muito se rebela, e afasta
carnola!- porque faz um vulto, e figura de um peru, totalmente dos curraes, por cuja razão costumam
quando depoes de depenado é pouco maior, que úa os donos fazer-lhe montaria, em que matam touros
franga, ainda que mais comprido. É de cor cinzenta, a milhares, só para aproveitarem os couros, que
com suas máculas de preto que lhe dão algúa põe à sola por contracto, deixando as carnes nas
galantaria. Também é aquático, anda, e vive pelas campinas por conta dos urubus, que de graça as
praias, e iguarapés ao marisco, e peixe que pescam alimpam sem ser necessário, que os magistrados
com o seu bico, além de comprido, tão agudo, que lhes paguem o trabalho, como aos alimpadores, e
dando uma picada, fazem logo arrebentar o sangue, varredores das ruas. O mesmo benefício fazem nas
como se fora lanceta. Anhuma, ou como o chamam povoações; em que andam aos bandos,
os índios caintau, é um dos mais célebres pássaros sustentando-se destas imundícies, com que se
do Amazonas, digno de andar nas Histórias, como regalam, e passam uma vida alegre, embora que
anda pelas suas estimáveis propriedades, mais que os chamem brejeiros, e aves de rapina, como
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 317

Figura 27.4. Urubu rei (apud Brehm)

bem indicam as suas grandes unhas, e bico revolto; chegando um urubu tinga, todos se afastam, e estão
quando os assanham, são muito bravos, e envestem como creados, ou como vassalos a espera em roda
com a gente. Estes são os verdadeiros abutres de do comer, sem o tocar, ainda que seja da grandeza
que falam as Histórias, cujo olfato é tão grande, e de um boi nem da parte extrema, enquanto o tinga
vivo, que nele vencem ao homem. Voam muito alto, farte até mais não querer, não se retire, e lhe dê
e contra o vento para melhor persentirem o cheiro lugar, para que cheguem, e aproveitem os seus
da carne morta, e acudirem logo à presa para lhe sobejos, sendo cousa que abranja a todos. Bem
darem honrada sepultura nos seus ventres. As suas mostram que são pássaros de distinção, e
penas são óptimas para escrever, mas as suas aparentados com os cavalheiros, e fidalgos, que
estilham o mesmo nas suas mesas, e banquetes; e
carnes tem o privilégio de se não comerem, nem
tem mais esta circunstância, que os pretos
ainda pelos índios. A segunda espécie de urubus
regularmente em bandos, e entre eles aparece um,
não é tão negra, de cores, como a dos sobreditos; e
ou dous brancos; e contudo observam à risca o
em lugar da pele preta, na cabeça a tem vermelha:
seu ceremonial, cedendo a multidão aquele só,
não se unem uns com os outros, nem nunca se vem,
ainda que os haja de deixar em branco, por não
senão um a um. ser esplêndida a mesa; no que bem indicam o
A terceira espécie se chama urubu tinga, que respeito que lhe tem. É esta ave majestosa, e pela
vale o mesmo, que urubu branco. Destes há uns galantaria da sua cabeça muito estimada dos
inteiramente brancos, outros tem o papo, e todo o príncepes, que a buscam, e sustentam para seu
baixo preto; e branco todo o mais corpo: os olhos divertimento, e ostentação. São maiores, que os
com o sol reverberam com tanta graça, que parecem da primeira espécie, e do que o mais grande peru;
luar amarelo, que se move. Tem crista amarela, do são tão ciosos do asseio próprio, que ainda os já
feitio do peru, porém de penca. Tem-se observado, domesticados não permitem, que alguém os toque,
que a cabeça é própria de um frade, que usa de símbolo próprio das virgens, e pudicas donzelas,
cercílio; e à proporção tem cara de frade, e cercílio cujo recato deve ter por empresa a letra noli me
como eles, o qual é de pêlo, e não de penas: em tangere [não me toques]. E se inesperadamente lhe
uma palavra, forma-se na fantesia úa cabeça de tocaram em algúa pena, logo mostra o seu
carmelitano, e mercenário com croa e cachaço sentimento investindo com o bico contra quem o
rapado, e ai está um urubu tinga. Tem este o mesmo tocou, e na cólera, e ira, com que acomete indica o
oficio de gastadores, que os urubus pretos; mas, seu desagrado da recebida descomposição, da qual
como mais graves, tem eles a preferência de comer se lamenta como choroso, e com o bico torna logo
em primeiro lugar; porque não obstante a a compor as penas tocadas, o que faz úa, e muitas
sofreguidão dos urubus pretos no comer, em vezes. Tem vários préstimos as mesmas penas:
318 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

queimadas, e feitas em pó são bons febrifugos; e e posto que tem muita comedia, pelos arrozaes de
bebidas em chá, ou vinho são bom contraveneno. sua natureza, fructas bravas etc. parece, que o de
Parece ser este pássaro, o que as Histórias chamam que mais vivem é da area, e da ágoa; porque
pelicano [sic!], tão decantado, por sustentar com o regularmcnte não se lhe vê no papo outra mistura,
sangue do seu peito, que fere com o bico, a seus nem outro sustento. Dormem em bandos em
filhos. A razão é, porque o urubu tinga tem o seu árvores altas, e os caçadores, que lhe sabem o
peito muito diverso dos mais pássaros, cuja dormitório, não necessitam de mais açougue,
diversidade consiste em ter o papo por fora do peito, porque de cada tiro mata aos pares. Outros
em úa muito tênue cute, em que quase se está caçadores usam de outras indústrias, ou já com a
vendo, o que tem dentro; e daqui talvez tomaram que acima dissemos, com pedaços de carne nas
fundamento os poetas para dizerem que sustenta pontas das linhas, em paragens, que os patos
os filhos com o sangue do próprio peito. Mas sejam costumam frequentar, e esperá-los que eles hão
os urubus tingas, ou não, o tão celebrado pelicano, de cair, e deixar-se apanhar, antes que vomitar o
o certo é, que eles são mais raros, que os pretos; bocado; porque são símbolo dos peccadores, que
porque os melhores sempre foram raros em toda a ainda que vejam que o diabo infalivelmente os puxa
parte. Nunca entram no povoado, como fazem os para o inferno, não se resolvem a largar, ou vomitar
da primeira espécie, e só se vem alguns pelas a isca do seu peccado: ou também costumam fazer-
campinas: voam tão altos, que se perdem de vista, lhes negaça com alguma pata caseira nas mesmas
e ordinariamente só descem á presa. paragens, a que logo acodem; e então com boa
Apanham-se facilmente com destreza, quando munição fazem um grande provimento. As suas
se sabe, onde andam, e tem presa; o que fazem os criações são sempre ou em ilhotas, ou sempre sobre
caçadores deste modo. Põe-se a espera deles, e os rios; e assim que os filhos saem da casca, logo
quando os vem acabar de comer, que só largam tão principiam a patinhar tão espertos, que custa
fartos, que não podem voar, de repente lhe saem os colhê-los à mão. A segunda espécie de patos
caçadores em bem expeditos e ligeiros cavalos, e os chamam colhereiras, por terem o bico espalmado,
persegucm as carreiras, sem lhe dar lugar a e largo para a ponta do feitio de colheres, são do
tomarem vento, e voarem, de sorte, que pouco a tamanho dos mais patos, mas tem as pernas mais
pouco os vão cansando, até que eles, por já não altas, e vermelhas; a cor das suas penas, é como
poder mais, se deixam apanhar à mão; ainda que de uma rosa; e por isso as maiores óptimas para
sempre se requer cautela; porque posto que escrever, e as miúdas para ramilhetes. Também
cansados, ainda assim envestem com os caçadores, andam em bandos, mas separados dos outros, e
como tigres, e onde podem chegar, já com o bico, e também como dos muito amigos da ágoa, e tem os
já com as garras, que as tem famosas, fazem muito seus dormitórios, ou nas mesmas praias, ou sobre
damno: especialmente é necessário resguardar o as árvores mais baixas, ao contrário dos da
rosto, e olhos, que são o ordinário alvo dos seus primeira espécie; e são de tão grandes espíritos,
tiros, e primeiro escopo das suas unhas, e bico. que ainda atravessados com boa munição vão
Outra mestria mais curiosa usam para colherem voando, como se não tivessem cousa alguma. Os
tanto os desta, como os da primeira espécie. Atam índios naturaes os caçam muito bem à frecha, como
na ponta de um bom cordel úa fatal isca de carne, e fazem a todo o gênero de caça.
a põe junto da presa, e em algúa distância A terceira espécie são a que chamam patos
escondidos com a ponta da linha bem segura estão guananás, outros os chamam marrecões. São do
à mira, e acudindo os urubus, tanto que engolem a mesmo tamanho, mas com pernas mais altas, e
isca, sem mais demora puxam pela linha, e os vermelhas; e mais lindos, e briosos, que os das duas
urubus, como não lhe dão tempo, a que possam primeiras espécies: na cor são parte brancos, e parte
cortar a linha com o bico, ou vomitar o bocado, não vermelhos, porém muito diversos das colhereiras,
tem mais remédio, que darem-se por presos, e porque avultam mais as cores ver melhas.
apanhados. Caminham muito ao grave, isto é pausados, e com
Vamos agora a patinhar com os patos, e o pescoço levantado, e os olhos mui espertos para
divertir-nos um pouco com a sua variedade, visto úa e outra parte. Domesticam-se bem, e muitos
que não podemos gostá-los no prato. Há muita moradores os trazem nos seus sítios por
variedade, de patos no Amazonas. A primeira espécie divertimento, e alguns não só acompanham aos
são os patos ordinários todos de bom tamanho; de donos, como cachorrinhos, mas também lhe fazem
sorte, que cada um pode dar de comer bem a vontade festa com uma grossa, e alta cantilena, pouco
a dous amigos. Não me detenho em os descrever, agradável aos ouvidos. São como os de cima
porque são bem conhecidos, e só diferem os mansos aquáticos, mas o seu principal comer é a erva do
dos bravos na variedade das cores, por serem os do campo; dão suas envestidas a cães, e ainda a
mato todos da mesma cor azul, só com a ponta das rapaziada, e agarrando com o bico, fustigam com
asas branca, e as suas penas óptimas para escrever, as asas, mas com pouca, ou nenhuma moléstia;
porque são mais duras, e fortes, que as usadas na antes qualquer sua envestida serve de recreio.
Europa, de sorte que quase todos as escolhem, e Amam muito a sociedade, e raras vezes se verá um
preferem; e pela multidão dos patos são tantas, que só, posto quc nunca se misturam com os de outras
podiam prover a toda a Eur opa, as que se espécies. T em os guananás outra espécie
desprezam, e perdem, nos que se matam. Andam chamada guananaí, em tudo semilhantes aos
pelos lagos, e praias sempre chapinhando na ágoa, primeiros, excepto no corpo, que é muito mais
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 319

pequeno; mas por isso mais lindo, e mais estimados ágoa para nadar, vão metendo as patas pelos laços,
para regalo da vista. Marrecas. Há muitas espécies, e sendo estes muitos, muitas marrecas ficam
porém eu só de três tenho notícia. A primeira chama- seguras, as quaes se apanham à mão. O seu chiar é
se mariana, porque no seu cantar atiram a mariana. muito suave, especialmente de noute, quando vão
Tem os pés, pernas, e bicos brancos; e nada tem voando sobre as povoações; porque a toda hora
nas penas de cor preta; são na grandeza abaixo dos voam, ainda no mais cerrado escuro, e trevas, como
guananás, e maiores, que os das outras espécies. A se foram noutibós. Há uma espécie menos
segunda espécie tem parte do bico preto, pernas estimável, e suspeito ser, por darem uns como
quase negras, e parte das asas preta: estas todas grasnidos, quando vem gente, que serve de aviso às
se misturam, e andam em bandos. A terceira espécie mais para fogirem.
são puriripabas, e são as mais pequenas, porém as
O pássaro motum é digno de especial nota,
mais saborosas, tem as penas vermelhas; os machos
assim pela grandeza, como de peru, como também
tem também o bico vermelho, as fémeas preto, com
pela vista, e gosto. Tem pernas altas tanto, ou mais,
as asas azues, e algumas penas brancas; e sendo
que o galo. Há três espécies de motuns: a primeira
galantes para a vista, ainda são melhores para o
chamam os naturaes motunguaçu, isto é motum
gosto. Andam de 8, l0, e 12 por bando, sem mistura
grande. É todo preto, e tem na raiz do bico da parte
das outras, e ao pousar sempre se ajuntam o par
de cima, ou testa, duas bolas vermelhas do tamanho
macho, e fêmea.
de úa pedra ágata: e debaixo do bico, e parte inferior
Além das referidas espécies, há marrecas, em outra maior, que as duas superiores, e todas lhe
cuja espécie se incluem muitas outras, que só dão muita graça, não só pela cor ver melha
diferem na cor, posto que quase todas são azul bastantemente viva, que no preto das penas sae
escuro, com as pontas das asas brancas; e no mais, bem; mas também, porque lhe servem de natural
ou menos branco, e azul está ordinariamente a sua enfeite à cabeça, e bico, o qual é do feitio do bico de
diversidade. São um pouco maiores, que as galo, e também as pernas. Aos da segunda espécie
perdizes, e no gosto não só podem competir com as chamam motuns de fava; porque tem úa fava por
mais aves, mas ainda sobrepujam ao gosto das crista, também vermelha. São no mais muito pretos,
mesmas perdizes, ou sejam assadas, ou cozidas. O como os primeiros, e de cor tão viva, e fina como o
seu caldo, ou sopas, além do seu apetitoso sabor, é veludo; e só se deferençam dos primeiros em terem
mais gordo, que o de uma gorda galinha. Faz pasmar fava, em lugar de glândulas. São do mesmo
a multidão de marrecas que se criam, e sustentam tamanho. A terceira espécie chamam motumpinima.
por todo o destricto do Amazonas! andam em bandos É da mesma cor dos mais pela parte de cima, e tem
pelas praias, e lagos; posto que há paragens de maior úa trunfa de penas mais altas na cabeça, as quaes
multidão, quaes são as praias, e lagos, em que há só levanta, quando se espanta; mas no peito é
arrozaes naturaes, que são o seu principal alimento; branco com malhas pretas, como pintado, e delas
e nas campinas alagadiças, especialmente da Ilha lhe vem o nome pinima, que quer dizer malhado.
Marajó, cujos moradores tem nelas um indefectível São um pouco mais pequenos, que os das segundas
açougue com tanta facilidade, que basta chegar a e primeiras espécies; todos porém galantes, e dignos
qualquer lago, ou alagadiço (que são muitos na Ilha) de se criarem entre as aves domésticas, com que se
para em breve espaço fazerem provimento a sua dão bem. São todas as três espécies muito asseados,
vontade. Com um só tiro de espingarda matam e briosos, como o galo. O seu papo tem vertude para
muitas vezes tantas, quantos são os grãos de desfazer a pedra da bexiga, e rins, nos que padecem
munição, por serem tantas, que não poucas vezes as agudas dores deste mal; e não só a pedra, mas
occupam légoas, quanto abrange a vista, também para desfazerem qualquer metal, e o mesmo
especialmente no inverno. E posto que no verão, ferro, porque tem alguns curiosos observado nos
em que desagoam as campinas, não sejam tantas, motuns domésticos, que se acham algum dedal ou
por buscarem então o arroz dos lagos amazônicos, pregos, os engolem com tanta facilidade, como o
cujo tempo sabem, e conhecem; contudo ainda ficam milho; e tem tanta actividade o calor do seu papo,
muitas; e quem tem providência em todo o ano as que os desfaz, e digere; ac proinde [e por isso] com
tem com fartura, apanhando-as vivas à mão, como maior facilidade desfará a pedra. Secam-se, e
muitos fazem. E para que os leitores, que não tem desfeitos em pó, se dão a beber aos achacados de
plena notícia daquele país, entendam, quão pouco
pedra. Um religioso tinha uma eficaz receita para
custa aos habitadores da Ilha Marajó fazer estes
desfazer a dor de pedra, que nunca quis reveIar,
viveiros de marrecas, hão de saber, que elas
porque lha tinham comunicado debaixo de
engordam. tanto por aquelas campinas, e alagadiços
do Marajó, que lhes caem as penas, e assim juramcnto, ou em segredo natural; mas por alguns
facilmente se apanham, e fazem viveiros, em que se indícios se presume, que um dos seus ingredientes,
sustentam; o ponto é haver cuidado em lhe ter e talvez o principal, eram papos de motuns, patos,
sempre boas vasilhas de água, ou tanques, não tanto emas.
para beberem, como para se refrescarem; porque O pássaro jacu é também especial do
quase sempre andam na ágoa. Outros usam de Amazonas: é da grandeza dos motuns, mas difere
diversas indústrias para as colherem vivas; e uma primeiro em ser menos preto, atira a pardacento.
muito curiosa é estenderem uns cordéis na ágoa, Segundo em ter na cabeça um penacho de
seguros em estacas pelas pontas, cheios de laços, e plumagem tão fina, como veludo, e de cor tão preta,
logo esconder. Vindo um bando, que logo busca a e lustrosa, como o mesmo veludo, que lhe dá notável
320 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

galantaria: tem pernas altas, como galo, e da mesma e monstruosas, que sejam; o mesmo é avistá-la, que
forma pesccço levantado. O seu chiar ordinário é vestir-se de brios, revestir-se de coragem, cobrar
jacu, jacu, e dai tem o nome: também se amansa, e cólera, encrespar as plumas, e investi-la com tanto
cria entre as aves domésticas. Segue-se o jacumim, ânimo, e ousado desafogo, que a serpente, ou já
do tamanho, ou pouco maior, e mais alto nas pernas, por presentir tanta vertude antipática, ou por prever
que a galinha: é muito preto, e azebichado; antes o infeliz êxito do combate, ou por se aterrar vendo
iguala na cor ao mais preto veludo, e ainda mais tanto ânimo no seu contrário, desfalece, desanima-
preta, e fina é úa plumagem; que tem na cabeça por se, e desmaia. Assalta-lhe a cabeça, fura-lhe com
modo de penacho. Contudo não é dos mais vistosos, as unhas os olhos, e ouvidos, acode a cobra a
pelo desfear [roto o original] de leque, ou cauda, defender-se, já com a boca para o tragar, e já com a
que não tem, e é tanto desejada nos pássaros para cauda, e voltas para o açoutar; a ligeireza porém do
o seu maior adorno, como vituperada nos homens, acauã, não só declina os golpes, mas igualmente
por ser sinal, de que tem atrasados: bem podia lhe não dá lugar a usar das suas armas, nem tempo
repartir com ele o pavão, e ainda ficariam ambos para defender -se, lhe corta os passos para a
ornados. Também o desfeia úa como giba, que tem retirada, e fuga. E para isso agora a enveste pela
nas costas, e o pescoço, além de muito fino, frente, e logo se retira para os lados; agora dá um
ordinariamente inclinado para baixo; porque não vôo ao alto, para com mais furor descair sobre ela;
tem os brios do galo, jacu, motum, e outros. É já a assalta pelos lados, já a pica por retaguarda, já
contudo muito estimado o jacumim, assim pela nesta, e naqueles abre brecha com a troquês do
fineza das suas plumas, como também por se seu bico, logo lhe encrava as unhas no cachaço, e
domesticar melhor, que todas as mais aves. abrindo sem demora as asas, ao mesmo tempo, que
Acompanha a seu senhor, a quem faz muita festa, se enfurece, encrespa as plumas, e ao mesmo passo,
quando vem para casa, saindo-lhe ao encontro, e que com estas explica o seu bravo ânimo, com
chegando ao pé dele se humilha mais, que um aquelas ostenta a sua destreza, e forças, assim em
escravo, abatendo o pescoço, cabeça, e bico até o aparar nelas, como em escudo, os golpcs do seu
chão, e dando-lhe as boas vindas com a sua inimigo, como também em o fustigar com as
cantilena, e grasnido. O mesmo faz a qualquer outro mesmas, enquanto unhas, e boticão vão abrindo,
hóspede conhecido, e acabada de fazer a sua rajetando [?], despcdaçando, e desangrando a cobra
zombaria, vai para dentro, como quem acompanha. de sorte, que ela totalmente se dá por vencida, e
A cangaitoriá é pássaro galante pela sua cabeça, e morta. Acabada a peleja, e declarada a vitória, a
por ela o chamam os naturaes cabeça de gente; não canta o acauã, e como dando-se os parabéns do
porque imite as feiçòes humanas, de que não tem triunfo, desabafa em úa grande cantilena, que
semelhança alguma; mas por ter muito enfeitada juntamente serve de aplauso ao seu valor, e de
com diversas cores, semilhantes aos enfeitcs, que desafogo à sua fúria. Depoes, se a cobra é pequena
costumam os índios em algumas suas funções pôr a carrega com o bico; e se é grande com bico, e
nas cabeças, que adornam com grinaldas de penas garras a fazem postas, que leva para o ninho, por
das mais vivas, e raras cores: e isto, que os naturaes ser o seu sustento, e de seus filhos. Fazem os seus
fazem por arte, tem esta ave por natureza; e por ninhos em altas árvores, e são conhecidos; porque
isso lhe vem bem ao nascer o nome de acanga ordinariamente estão rodeados de cobras mortas
aitoriá, que lhe puseram os naturaes, e quer dizer dependuradas nos ramos, como troféos das suas
cabeça de gente. A mais cor é pardacenta; será da victórias. E é tal o medo das cobras, e antipatia,
grandeza de úa franga, e ordinariamente anda em que tem entre si, que basta ouvirem cantar o aca[u]ã,
árvores a borda dos rios. para já se esconderem, ou fogirem; e dizem os índios,
que regularmente não há cobras onde anda, e canta
CAPÍTULO 18° o acauã.
PROSEGUE A MESMA MATÉRIA Um religioso tinha um destes pássaros já
Faltam-nos ainda os mais divertidos pássaros doméstico, e quando se queria divertir, mandava
do Rio Amazonas, e parece merecer o primeiro lugar buscar alguma cobra viva, ou morta, e a mostrava
o pássaro acauã, cujo ânimo desmente, e o acauã, que logo a envestia. E posto que quando
desempenha o pigmeo do seu corpo, e cujos espíritos já vinha morta, era mais breve o espectáculo,
equivalem aos brios das mesmas águias. Pois com contudo sempre a ave se armava, e fazia as mesmas
ser só do tamanho, ou pouco maior, que úa galinha, exibições com bom divertimento dos circunstantes;
sae a campo a pelejar com as cobras, e dragões semilhante ao combate dos galos ingleses, e dos
[sic], e não só as faz comer terra; mas também as dos chinas, que além dos combates dos galos,
mata, e faz em pedaços com maior valentia, e mais estimam muito o das codurnizes com a
bravos brios, que as conhecidas cegonhas da circunstância, que neles param milhares, e
Europa. Tem cor cinzenta, e na barriga tem uma milhares de cruzados, que ganha o dono da
felpa, mais comprida, que nas costas, e quando se codurniz, que ganha a victória, ou fica senhora do
encoleriza a enriça, como também a penugem do campo, que a mais fraca, ou menos destra, [ilegível]
pescoço, e cabeça. O bico, pernas, e unhas são de larga viva, ou morta. Porém isto não obstante bem
gavião. É notável o ódio, e antipatia, que tem com se pode duvidar; quaes sejam mais divertidos, se
as cobras, e não pouco recreativa a sua batalha os galos, e codurnizes investindo-se até morrer
com elas. Não o atemorizam por mais feias, grandes, algum deles; se o acauã assaltando dragões, e
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 321

envestindo cobras, não só até as fazer acuar, e pequenos. Os da segunda espécie são menores, e
recuar, mas até de todo as matar? O seu cantar rara vez sobe algum pelo Amazonas acima; mas
tem também sua galantaria; porque principiam vivem, e passeiam pelas praias, e barra do
pouco, a pouco a gritar, e exclamar, indo ao mesmo Amazonas, onde já chega algúa ágoa salobra; e na
compasso da sua solfa increspando-se, e grande Ilha do Marajó são inumeráveis. Serão do
enfurecendo-se. E quando já estão bem animados, tamanho de úa boa franga, e quase como úa galinha.
ou coléricos cantam também com mais força, e na É notável a natureza destes pássaros, porque
sua cantilena dizem tão distincta, e claramente o nascem brancos, depoes se vestem de preto, e em
seu nome acauã, como o pode exprimir qualquer chegando a sua consistência fazem-se vermelhos, e
pessoa; e daí lhe vem o nome, que ele a si mesmo se ficam como escarlate penas, pernas, e bico, cuja
põe. É muito notável o agouro, que os índios tem variedade de mudanças não será fácil achar
com o acauã persuadindo-se ser profeta, e semelhança em algum outro pássaro, e com a
ad[i]vinhador; pois afirmam, que sempre que canta
circunstância, que todas as três cores, que varia
em casa, ou ao pé dela, há sempre alguma novidade;
são muito vivas, especialmente a vermelha, em úa,
e os mesmos europeos que os criavam domésticos,
e outra espécie; e por esta causa são (são) muito
ou tinham alguns destes pássaros vizinhos de suas
apetecidas, e buscadas as suas penas para
casas, sentem o mesmo. Bem lhe sabia da sua
habilidade um morador antigo daquele Estado, o curiosidadcs, e ramilhetes, que delas se fazem
qual em o ouvindo cantar, advertia a uns religiosos, óptimos. E há curiosos, que fazem grande
que em úa residência muitos dias longe de povoados quantidade destas mesmas penas, que mandam nas
[ilegível] cavam seus vezinhos, que preparassem o (su) suas mesmas peles para Europa, onde são
jantar, ou cea; porque brevemente teriam hóspedes; estimadas para o mesmo efeito de ramilhetes, e
e pela experiência também já sabia, em que hora vários outros adornos, que para sobressaírem
chegaria o hóspede, segundo a hora do canto do melhor, esmaltam com outras cores. E com serem
acauã. E ainda que os religiosos ao princípio não tantos os coriosos, que os matam a milhares, ainda
acreditavam, o tempo os foi desenganando, com são tantos, que cobrem inteiras praias, por onde
repetidas experiências; porque regularmente ordinariamente andam em bandos buscando o seu
tinham, ou algum hóspede, ou correio, ou novidade. sustento no marisco, de que vivem. Tem o bico
E dizem os mesmos práticos do país, que o tal nome alguma coisa comprido, as pernas mais altas, que
acauã, quer dizer adivinhador. Se é, ou não possível as galinhas; e as suas carnes são de bom gosto.
esta propriedade no acauã o deixo a disputa dos Domesticam-se, porém os que se apanham para
leitores. Eu bem sei, que de outras aves se contam esse efeito, vão pouco a pouco perdendo a cor até
semilhantes habilidades; e que na Índia, dizem os chegar a desmaiar; e nem bem são vermelhos nem
práticos, há um pássaro preto, o qual por vezes se bem brancos.
tem visto seguir algumas pessoas, anúncio infalível
de haverem de morrer brevemente; do que é Não é menos notável o pássaro tocano,
irrefragável argumento a experiência. Mas sempre chamado assim pelos naturaes por ter bom peito,
advirto, que não sejam fáceis os leitores em acreditar e voz alta; e dele puseram o nome às suas caixas
taes cantos, por ser certo que o diabo engana a de guerra a que também chamam tocano [sic]. Os
muitos com semilhantes cantos de aves, permitindo castelhanos o chamam el páxaro predicador, por
Deus, que algúas vezes saiam certos os agouros em ser o seu canto semilhante aos brados dos
pena de os acreditar. Tem outro grande préstimo o pregadores nos ser mões da Paixão. Será do
acauã, e é que as suas penas, e ossos são óptimo tamanho, ou pouco maior, que úa perdiz; mas a
contraveneno das cobras: não só vivo, mas também sua maior galantaria está nas suas penas, e bico.
morto, é seu inimigo. Secos os seus ossos, e penas, As penas do seu papo, pescoço, e cabeça levam
e feitas em pó, dando-se a beber aos mordidos das vantagem às lindas cores das mais ricas galas;
cobras, desfeitas em vinho, chá, ou outro licor, porque são um amarelo salpicado de vermelho tão
desfazem o veneno. Há outro pássaro no Amazonas vivo, que não há jalde, nem vermelhão, que lhe
muito parecido ao acauã na cor, grandeza, e canto chegue: e a mais própria semilhança para o explicar
tão semilhante que parece o mesmo; mas distingue- é a cor do ouro esmaltado. Por isso são muito
se, em que a sua cantilena, nunca passa de grasnar, buscados os seus papos pelos mercadores, que com
e nunca chega a pronunciar o nome acauã. Além de eles ornam os seus coletes, e peitilhos mais, que
não se saber dele, que tenha habilidade mais, do com preciosas gemas, e diamantes. E tem a
que para comer; anda sempre pelas àrvores circunstância de terem o papo largo, que dá úa
sobranceiras aos rios, e pelas praias. Também é boa película: também alguns fazem remessa destas
espécie de gavião, como o acauã, e talvez será a peles para Europa, onde as estimam tanto, ou mais,
sua fêmea, visto terem tanta semilhança. que as do guarases, como também a pele do
Não são menos estimados os pássaros pescoço, e cabeça. Não é menos admirável o seu
guarases pela sua bela, e vermelha cor, do que o bico, que é do tamanho do mesmo pássaro. Tem
acauã pela sua habilidade; e na verdade, são dos um palmo de comprido, e com gr ossura
mais vistosos, e dos mais bem vistos pássaros do proporcionada, que para isso tem a cabeça grande,
Amazonas. Há duas espécies de guará: a primeira é e se não tem juízo, ao menos não se pode negar,
quase do tamanho de perus, andam pelas praias, e que é pássaro de grande cabeça. Todo o bico é
baías, e rara vez entram nos igarapés, e rios mais amarelo avermelhado, e com ser duro, é quase
322 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

transparente, e tão poroso, que por ele toma a com um vermelhão muito vivo, claro, e fino,
respiração o tocano, nem tem signal algum de matizadas com algúas malhas verdcs, e amarelas,
ventas. É estimado por cousa rara na sua grandeza, umas, e outras igualmente vivas, e claras. Não tem
e cores. Tem o desar de não ter cauda; ou porque como as primeiras os feios veos de viúvas, ou freiras;
lhe caem as penas, ou porque são tão pequenas, nem também enfastiam com algum grasnar; mas
que não excedem as das costas, cujo desar, e senão em tudo são mais nobrcs, mais lindas, e majestosas;
o afeia, e deslustra muito, que afeia a propoção do passeiam com muita gravidade, e conservam sempre
seu corpo, e com a galantaria do seu peito, podia o mesmo lustre das suas penas, e por todas estas
litigar com o pavão pontos de bizarria; mas se este suas boas partes é a mais estimada de todas as
o vence na fermosura da sua estrelada cauda, o espécies, e a mais digna de estar nas janelas, e
tocano se pode jactar de lhe levar as primazias nos galarias dos palácios. Tem esta terceira outras
esmaltes do seu peito, em cuja fineza também espécies infimas, e talvez que alguma ainda mais
desbanca o veludo. engraçada, que esta; porém com pouca mais
Segue-se já a arara também de muita diferença nas cores, entre elas é mui galante a toda
estimação pelas suas cores, pela sua majestosa vermelha, e digna de constituir a quarta espécie na
vista, e pela sua lingoagem; digna na verdade de república das araras. As plumas de todas são
ser admitida nos jardins dos princepes, e nas estimadas para ramilhetes, adornos, e enfeites, a
varandas, salas, e janelas dos palácios, onde tem já carne deliciosa; e a habilidade para falarem tudo, o
muita (entrada) para galantaria, e recreo. Há muitas que lhe ensinam em pequenas, também a mesma.
espécies desta ave: cinco são as principaes. A Alguns curiosos também as ensinam solfa, tendo-
primeira chamam os naturaes araruna, é a maior as em salas, aonde com o uso de a ouvirem cantar
de todas, maior que úa galinha grande na grandeza aos meninos, a aprendem. Todas se sustentam de
do corpo; e no comprimento desde o bico até a ponta fructas do mato, mas domesticadas, comem de tudo,
da cauda terá por três galinhas; porque tem úa e com especialidade arroz cozido, milho, e fructas.
cauda comprida. É de cor toda azul, mas um azul A quinta espécie também na galantaria compete com
muito vivo, muito claro, e lindo, especialmente as mais lindas das outras espécies. Chamam-na
quando nova, ou enquanto não lhe caem as penas. guirajuba, que quer dizer pássaro amarelo, e
Enquanto novas, ou não muito velhas, são mais convém-lhe bem o nome: porque é todo, e totalmente
gostosas, que as galinhas; depois de velhas, tem a amarelo e amarelo tão vivo, quão vivo é o azul das
carne mais dura. Tem o bico revolto, e nele tanta da primeira espécie, e o vermelho das outras. Este
força, que onde agarram é o mesmo, que se pegasse pássaro teria muita aceitação na China, e os
úa troquês; com ele partem caroços tão duros que primeiros valimentos se para lá o levaram, por ser a
só um martelo amolgaria, ou quebraria[.] E quando cor amarela a mais estimada naquele Império, e
os caroços são redondos, e pequenos, que não fazem estar destinada para o uso só da Casa Real, cujos
bom jeito para lhe pegarem, o unem a uma palhinha, trajes, adornos, e galas sempre são de amarelo com
e junto com ela logo o quebram; não sei, se por um dragão de cinco unhas lavrado, ou bordado nos
vertude da palha, se por lhe ficar com ela mais vestidos. É a mais pequena de todas as espécies a
ajeitado, mas a verdade é, que sempre há mistério arara guirajuba, a figura também é a mesma e só
na indústria. Tem na testa, e a roda do bico uma não tem tão comprida cauda como as outras;
película parecida ao veo das viúvas: ás vezes
domestica-se, e amansa-se tanto, que parece não
grasnam, e gritam tão alto, que se fazem menos
sabe morder. Costumam as mulheres conservá-las
estmáveis por enfadonhas, mas aprendem bem a
nas suas salas por adorno, trazê-las no ombro por
falar enquanto pequenas, como as das mais
bizarria, e no seio por afecto.
espécies. A segunda espécie chamam arara canindé,
é um pouco mais pequena, mas ainda como a mais Abaixo das araras, só os papagaios merecem
famosa galinha; tem também na cabeça o seu veu a primazia do lugar, visto que depoes delas tem a
de viúva, e muito semilhante a primeira espécie, primeira estimação, pela sua gravidade, pela sua
menos em ter o peito amarelo, que lhe dá mais loquela, mansidão, e lindas cores. São os papagaios
galantaria. Destas duas espécies há tanta do tamanho de perdizes, posto que há maiores, e
abundância em alguns rios, que cobrem o sol, também menores, conforme as suas espécies, das
especialmente no tempo do açaí, fruto de uma quaes conheço seis. A primeira que em tudo leva
palmeira, que é o seu maior regalo; e se algum as primas aos das outras espécies, é o papagaio
viajante ferio, ou deitou abaixo alguma, ainda viva real. Na cor são verdes claros com úa, como coroa,
de sorte, que vá ainda na embarcação grasnando na cabeça amarela, também muito viva, que no
todas as mais, que a ouvem, se ajuntam em grandes verde das mais penas sae bizarramente; e tem as
bandos, e vão também gritando em giro sobre a pontas, e cotos das asas também vermelhos, e
mesma embarcação, como dando os pêsames, ou muito vivos. A cauda também tem as penas amarelas
desejando acodir-lhe, e livrá-la das mãos do caçador, na extremidade e a sua cor verde esmaltada com
o qual ao mesmo tempo lhe vai dando furnaça, como estas máculas amarelas, e também vermelhas, o
também os remeiros com as frechas. fazem tão galante, e majestoso, que por isso já tem
A terceira espécie chamam arari, mais galante, o grande titulo de real, como distintctivo entre as
que as duas primeiras. São pouco menos, que as mais espécies. Nesta mesma primeira espécie de
duas superiores no tamanho; mas totalmente pagagaios reaes há outras espécies, que se
diversas na cor, e fermosura, por serem vermelhas distinguem, por terem mais, ou menos amarelo, e
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 323

vermelho; e por serem maiores, ou menores as suas que os da primeira, e segunda espécie; e também
máculas, que os fazem mais, ou menos preciosos, e não são dos mais estimados, com serem dos que
por isso mais, ou menos dignos da estimação dos melhor aprendem a falar, e dos que mais facilmente
homens. Aos da segunda espécie chamam moleiros, se domesticam. Constituem a quarta espécie os
e também tem algumas espécies subalternas. chamados coricas, que posto que sejam os mais
Algumas destas espécies são maiores, que os reaes, pequenos de todas as três espécies superiores, abaixo
e tem o bico tão grande, e revolto, que não podem dos reaes, merecem o primeiro lugar; não só por
inclinar para baixo a cabeça sem perigo de se terem diversidade de cores, mas também por serem,
picarem no papo, de sorte, que ainda com ela os que de toda a república dos papagaios aprendem
levantada com a gravidade própria dos papagaios, melhor, mais expedita, e facilmente a falar. Também
fica a ponta do bico unida á moela, e pescoço: por tem diversidade de outras espécies, mas as cores
isso não pode comer direito, como os outros, mas ordinárias são o verde claro, e o amarelo na cabeça,
come pelas bandas. O seu principal distinctivo é o e cauda, além de uma malha vermelha nas costas,
serem todos verdes claros, sem mistura de outras em lugar dos encontros, e pontas das asas, que tem
cores, ou máculas; e por isso são os menos os reaes. Uma só cousa os faz menos estimáveis,
estimados: porque as máculas, que nos homens são que os reaes, e vem a ser uns cacarijares, que as
descrédito, e denotam vileza, nos pássaros, e mais
vezes fazem, especialmente com quem não estão
animaes são bizarria, que os faz acredores de muita
acostumados; no mais em tudo são excelentes.
estimação. Os da terceira espécie se chamam
sertanejos, porque há mais abundância deles pelo Estas quatro espécies aprendem bem a falar,
sertão acima do Rio Amazonas: diferençam-se dos como já disse, ainda que úas com maior facilidade,
da segunda espécie em terem na testa em roda do que outras: tem a língua bem expedita, e enquanto
bico um como friso, ou cordão vermelho em uns, e são pequenos aprendem quanto ouvem, e por isso
já roxo em outros, conforme as suas diversas castas, costumam tirá-los do ninho, e criá-los em casa para
porque também tem outras espécies subalternas, e os ensinar na menor idade; porque papagaio velho
úa pequena malha vermelha nas costas que só já não toma língoa, digo aprende língoa. Pelo que
aparece, e se vê bem, quando voam. Sâo menores, com muita propriedade são reputados por símbolo

Figura 27.5. Papagaio (apud Brehm)


324 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

dos peccadores, que vivendo sempre nos seus vícios, às aos das outras espécies, e com que alegra a todos,
guardam para a velhice as lições de bom católico, e e principalmente a seus donos, e aos que tem com
os bons preparos para a morte, sem temerem lhe ele confiança. É do tamanho dos da quinta espécie,
succeda o mesmo, que aos papagaios velhos, que mas distingue-se deles, e de todos os mais em ser
só são bons para o espeto, e é bem gostosa a sua verde claro, quase em tudo, sem mistura de outras
carne. Porém enquanto pequenos, não só aprendem cores, ou máculas; excepto na cabeça, e pescoço,
bem a falar, e cantar, mas também a rir, e chorar; e que são tão salpicados de cores diversas, como são
a arremedar aos animaes, e tanto as vezes falam, os cravos chamados [em branco no manuscrito]
que se fazem suspeitos, de que neles fala o diabo; porque naquele pequeno campo se admiram o
porque são tão aporité ou a ponto, e congruentes vermelho, o amarelo, o roxo, e outras cores de modo,
as suas repostas, que parecem exceder o seu que só na cabeça, e pescoço tem unidas toda a
instinto, por mais que alguns queiram meter nos variedade de cores, que nas suas penas tem
cascos dos outros, que eles, e outros animaes tem desunidas as outras espécies todas; mas a que mais
juízo, e verdadeiro discurso mais, ou menos avulta é a roxa: e estas penas, que em tudo são
expedito. Em uma missão se criou, e estava um, finas, e as quaes podemos chamar trunfa, encrespa,
que respondia ad rem [conforme a coisa] em tudo, o enriça, e levanta quando quer. Porém a sua maior
que se lhe perguntava, como se tivesse juízo. Vinha galantaria está nas suas macaquices, e inocentes
algum hóspede a casa, respondia o papagaio, o dono brincos; porque brinca com o dono já deitando-se
está ocupado, ou, não está em casa, ou, está de costa, já saltando-lhe para os ombros, já fazendo-
dormindo etc. Ausentava-se algúas vezes de casa, e lhe cócegas, e outras bugiarias engraçadas. Mas a
depoes de alguns dias tornava acom-panhado de principal é, quando se encrespa; porque então abre
outros bravos, e perguntando-lhe, aonde fostes as asas, levanta o penacho, ou trunfa da cabeça, e
papagaio? Fui buscar a estes meus parentes, pescoço, e qual cão de fila, bufando colérico, assim
repunha. Além desta, dava outras repostas tão bufa fazendo seus arremessos, e arremedos de
galantes, e a propósito, que o mesmo dono investidas com mais pilhéria, do que tem as
desconfiava dele, e o queria matar; mas o bom do investidas dos estudantes de Coimbra, que
papagaio, como se advertisse, se retirava, e andava ordinariamente fazem chorar, e as do anacã a todos
tão precatado, que já não queria vir à mão, nem dar os circunstantes fazem rir. Algúas vezes faz estas
o pé, como costumam. Não se ausentava totalmente habilidades avançando ao dono, e subindo pelo
de casa, mas só punha-se de largo, como pelas vestido, se agarra nele com as unhas, e deixando-
varandas, pelas janelas, telhado, e cumieira da casa; se cair para trás, nesta postura virado para o dono
porque não costumam no Estado do Amazonas os exibe com valentia todas as suas habilidades; depoes
donos terem presos estes pássaros, e assim correm indireitando-se, sobe mais para cima, e deixando-
todas as casas, páteos, e por onde querem. Em outra se cair repete as mesmas exibições, úa, e muitas
Missão havia outro, que também ad[i]vinhava e vezes sempre com graça. O mesmo faz passeando
predisse algumas cousas bem contingentes, como pela maquira, que são as camas, e estimados leitos,
vendo vir algum em alguma embarcação, dizia da daquele país: o mesmo também passeando por
cumieira o papagaio - Lá vem um branco - outras algum pao levantado, ou corda estendida, na qual
vezes dizia - traz papel - , isto é carta da cidade, e também faz as mesmas politrias dependurado pelos
cousas semelhantes. Verdade seja, que este segundo pés, qual bolantim passeando, dançando, e
podia dizer isto materialmente, maxime por ouvir pendurando-se em cordas, cujos meneos faz ao
aos rapazes, e índios, que assim costumam falar, compasso da sua voz, com taes requebros, que
quando chega, ou vem vir algúa canoa, ou burrico; parece está rindo, falando, e aplaudindo; e tudo tão
mas o primeiro e outros semilhantes dão grande bem, e com tanta pilhéria, que tem havido
suspeita, de que não falam eles sós. moradores, e circunstantes, que não podendo já com
A quinta espécie, de que não me lembra o tanta galhofa, se vem obrigados a apertar as
nome, são uns papagaios roxos, e bem roxos, sem ilhargas, que por muito rir, chegam a doer, e nisto
mistura de alguma outra cor; mas muito galantes, passam, e gastam dias inteiros.
e divertidos. São um pouco mais pequenos, que Não tem menos graça, quando investindo a
todos os das quatro espécies supra; e são mais raros, outras aves galinhas, patos, peruns, e ainda a cães
e pela raridade talvez sejam dos mais estimados. não só se increspam, mas como animando-se a si
São papagaios do sertão do Amazonas, donde os mesmos, viram, e reviram os olhos para úa, e outra
sertanejos trazem alguns, quando navegam rio parte, fingindo ímpetos de saltos, e assaltos, e como
abaixo, que nas vizinhanças do Pará não costumam quem já despreza o inimigo, se vira para trás, e dá
andar. A sexta espécie, que quase merecia ter um alguns passos com muita pausa, e gravidade: e com
dos primeiros lugares na república das aves, e a a mesma torna a avirar -se para ele, fazendo-se
primeira estimação entre todas as espécies de igualmente temido, e respeitado. Não aprende
papagaios, é o anacã, porque na verdade é o mais também a falar como os mais papagaios, mas com
devertido pássaro de quantos tratam as Histórias, a sua voz, e requebros parece que fala, e responde;
não tanto pela gravidade dos reaes, nem pela e aprendem seus saltos, e brincos. Arremedam a
variedade das cores, e menos pelo papear, porque outros animaes especialmente galinhas, e criam
nestas habilidades outros o desbancam; mas pelas tanto amor a seus donos, que não só passeam com
macaquices, trejeitos, e meneos, em que dá sota, e eles, mas quando se apartam os acompanham com
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 325

a vista, e dão seus gritos a modo, que choram; e pôr -se na forma. Fazem os seus ninhos em buracos
quando voltam, se alegram muito. Dão seus assobios de árvores, e ribanceiras muito solitárias.
agradáveis; mas tem de quando em quando suas Restam ainda muitos outros pássaros, que
tristezas, e melancolias, que logo dão a conhecer, também pertencem à república dos papagaios; e por
assim no chiar, como no dar com as asas. Porém isso muitos os descrevem como espécies subalternas
passa-lhe em breves minutos, especialmente se na mesma transcendência dos papagaios: Outros
então os animam, fazem festa, e lhe dão de comer. porém querem, que sejam totaImente diversos, e
Não devem estar presos, mas é necessário esconder- que por si sós constituam nova república, como são
lhe contas, e outras cousas ainda os mesmos os pássaros maracanases, e os periquitos. E na
vestidos, porque nunca estão quietos com o bico. verdade eles só se diferençam na sua pequenhez,
Para [ilegível] os taes inconvenientes, quem quer ter porque nas cores são o mesmo; porém, ou sejam da
semilhantes aves de regalo, além do sustento, que mesma, ou de diversa espécie, fazem-se acredores
são frutas, milho grosso, e principalmente arroz de algúa memória. São pois os maracanases como
cozido, e temperado, deve dar-lhe sempre alguma médios entre os papagaios já referidos, e os
causa, com que ele se divirta, ainda que sejam periquitos, do tamanho de um pequeno frango. O
pedaços de pao, cana etc. : o mesmo deve praticar bico revolto, pés, cores, habilidades, e feitio tudo é
com os papagaios das outras espécies, e araras, de papagaio; e tem tanta variedade de castas, como
quem os tiver para o próprio divertimento. Há ainda os mesmos papagaios: porque há uns reaes com
outra espécie de papagaios artificial, e posto que cabeça, e cauda amarelas, cotos, e pontas das asas
sejam poucos, são abaixo do anacã os mais vermelhas. Outros como os moleiros todos verdes
estimados. Costumam os índios, e índias dar cores claros; estes sertanejos, e aqueles com algúa cor
aos seus papagaios, enfeitando-os como querem : roxa; e assim nas mais castas todas galantes, e com
porque depenando-os nas partes, que querem a mesma habilidade de falar, rir etc. e por isso
pintar, sabem a mestria de introduzir-lhe as tintas também muito estimados. Os periquitos são os
tanto a o pintar, que, saindo aqui úa malha amarela, últimos por mais pequenos, e são como os
ali úa vermelha, e em diversas partes, quantas esturninhos no corpo, posto que alguns tem a
diferentes cores lhe querem dar, não só saem as grandeza de melros. Tem tão bem entre si a mesma
penas daquela cor, mas ficam com as taes cores tão variedade de castas, que todos os das outras
fixas, e permanentes, como se fossem naturaes, e espécies, com o mesmo feitio, e cores: não tem porém
não artificiaes, podendo bem dizer -se deles – é tanta expedição na língua para aprenderem a falar,
pintar, como querer – mas como são artificiaes são ainda que algúa cousa tomam, e aprendem, sendo
poucos. Costumam os papagaios andar em bandos que não necessitam de boa ponta de língoa para
respectivos às suas espécics, e nestes bandos serem estimados, pois só com a sua piquenhez, belas
sempre emparelhados o par masculus, et femina. O cores, e vista granjeam tanto a estimação, e afecto
seu sustento são frutas do mato, e não desgostam das matronas, que o trazem já nas palmas, já no
do milho grosso, quando o apanham; e por isso dão seio, já no ombro; e quando pouco nos estrados, e
algumas vezes nos milhos das roças, e fazem por todas as salas, com resguardo porém sempre
grandes avarias. Faz admirar o instincto destes por rezão dos cães, e gatos. Tanto os periquitos,
pássaros, e as cautelas, que tem em dar estes como os maracanases fazem os seus ninhos em
assaltos nos milhos, pois nunca os dão sem porem árvores, por modo de um grande cortiço, a roda do
sentinelas à lerta, e à vista; e toda a vez, que as tr onco da árvore com bastante grossura, e
atalaias dão aviso com gritos, de que há inimigo, comprimento, conforme o bando maior, ou menor.
isto é que vem gente, todos de repente respondem, Nestes cortiços tem em roda os seus buracos, e
e ao mesmo tempo levantam de vôo, e vão voando ninhos; e ordinariamente buscam alguma árvore
para onde as suas sentinelas os guiam voando, que seca, em que dormem, e também os vigiam sem o
sempre é para a parte contrária, donde vem gente. impedimento da rama; por isso com facilidade se
A mesma economia tem sempre nos seus tira muita abundância deles no tempo das crias.
dormitórios, que são sempre em altas árvores, e da
Basta já de papagaios, e vamos a dar noticia
mesma usam nas mais árvores, em que pousam. de algúas das muchissimas espécies de aves, que
Porém não fogem logo, que vem gente, mas só se nos faltam por descrever, já que seria um nunca
põem todos em tanto silêncio, que não se sentem, e acabar, o querer descrever todas no breve da nossa
nele perseveram até verem, que o inimigo vai história. Comecemos pois pelas galinhas do
chegando a lugar, de que eles possam ser Amazonas, que bem merecem fazer seu papel na
presentidos; e então rompem os sentinelas o silêncio História, visto fazerem agradável figura no prato;
com um grito, a que todos una vocce logo mas advirto, que não falamos aqui das caseiras,
correspondem com outros, e ao mesmo tempo vão por ser já de todos bem conhecidas, e aprovadas,
fogindo. Tem um voar mui sereno, e sempre voam a posto que não sejam provadas por todos, mas só
par dous, a dous, e tão serenos, e tanto a par, que das silvestres galinhas, e do mato, chamadas
quase vão tocando nas asas um do outro, sem um seracuras, que não são menos gostosas, que as
se adiantar, ou atrasar mais um só dedo. E se por domésticas. Há três espécies de seracuras: a
algum incidente se apartaram, v. g.. com alguma primeira é do tamanho dos tijijiés, de que falamos
fumaça de espingarda, logo se tornam a reunir, e supra, maiores que peruns; e por isso a chamam
326 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

Figura 27.6. Inambu (apud Brehm)

os naturaes seracura guaçu, isto é grande, em cuja excepto quando caminha, sendo que ainda vai
comparação ficam sendo as caseiras medíocres fazendo as mesmas mudanças, porque caminha
pintos, ainda que sejam as afamadas de Angola por muito pausado, e acompanha as suas mudanças
grandes. São desde o pescoço até o meio das costas com o seu chiar. Domésticos tem, além da galantaria
brancas, e o mais de cor cinzenta, pastam nas das penas, úa boa conveniência, que é andarem
campinas. A segunda espécie chamam os índios sempre à caça das moscas, e mosquitos, as quaes
seracura caapora, que quer dizer do mato, por apanham com destreza. Assim que vem a mosca se
viverem pelos matos ao contrário das primeiras. São vão chegando para ela, e quando já estão a tira com
maiores, que as galinhas ordinárias. As da terceira muita pausa, e subtileza lhe vão chegando o bico,
espécie, que são mais ordinárias, chamam até que o volátil se levanta, e então o jequeri lhe
simplesmente seracuras; e são mais pequenas, que embarga o vôo, abocando-o; e são tão destros
as caseiras. Vivem pelas margens, e bordas dos rios: caçadores, e insignes frecheiros desta caça, que rara
cantam, e cacarejam como as mais domésticas, e é, a que lhe escapa. O imperador Domiciano, que
tem sua roupa, ou cucruto na cabeça. Não é se divertia em caçar, e frechar moscas, teria no
necessária muita diligência para as caçar, porque pássaro jequeri um grande passatempo.
andam perto das povoações, e ainda das casas,
principalmente para as partes do mar, nas quaes Segue-se já a perdiz do Amazonas, a quem os
se ouvem úas ou outras, seracuras, e galinhas dos índios chamam inambu, e os europeos de bom gosto
quintaes. Posto que em tanta variedade de pássaros, a comparam no gostoso à perdiz da Europa, que na
como há no Amazonas; com tanta diversidade de variedade, multidão, e grandeza do corpo não tem
cores, e multiplicidade de figuras, não se tenha visto comparação esta com algúas espécies do inambu
o pavão, que na verdade leva a palma a todas as amazônico. Oito são as espécies mais conhecidas
aves pela bizarria da sua majestosa, e versicolorada desta ave. A primeira é inambu tona; a segunda
cauda; contudo há um, que ainda que de longe, tem chama-se inambuguaçu, a terceira inambu toro, a
seus arremedos, e dá seus ares de pavão. Chama- quarta inambu quia, a quinta inambu peba, a sexta
se jequeri, e tem o tamanho par minus de úa perdiz. inambu acumerina [sic, cururina], a sétima, inambu
É todo salpicado de olhos em todas as suas penas e uru e a oitava inambu pecuapé. É um bom escólio
cauda, e não só na cauda, como o pavo. Além disto, de excelentes inambus, ou perdizes óptimas.
tem úa rara habilidade natural, de estar sempre O inambu tona é o maior de todos, tem a grandeza
como a dançar, virando-se para úa, e outra parte de um peru; é famosa perdiz! Com ser tão grande,
só com o corpo, estando com os pés fixos, e firmes; não cuidem os leitores, que será rara avis in terris;
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 327

pois há paragens, onde há muitas, como é o Rio Há também muita abundância desta ave, e vive
Xingu. O inambu guaçu na grandeza é como um quase caseira, porque nos subúrbios das povoações;
grande pato, mas de pernas mais altas; como tem e alguns a tem entre as mais aves domésticas com
melhor gosto, que o pato, justo é que calce mais grande utilidade própria, e dos vezinhos; porque
alto, ou que seja altioris cothurni [de mais alto canta de madrugada, e serve de despertador, e de
coturno]. O inambu toro é como úa boa galinha. divertimento pelo dia.
O peba como úa arrezoada franga. O quia é do Os pássaros chamados vulgar mente
mesmo tamanho, e só difere em ser mais alto, que o mergulhões tem úa rara e grande habilidade, que é
peba. O uru, a quem os brancos chamam corcovado, nadarem pelos rios, e mergulharem melhor, que (que)
por ter no bico úa corcova, é pouco maior, que uma os mais destros algarvios; nem há nadador, ou
perdiz. O pecuapé tem o feitio, e cor de perdiz, cujo marujo, que os iguale. Ora se vê aqui, ora ali, logo
bico também é vermelho, e só difere das de Portugal acolá, já em úa, e já em outra parte: e quando o
em ser algúa cousa maior. Os índios a chamam caçador em alguma ligeira embarcação cuida, que o
pecuapé, porque ordinariamente anda pelos tem pilhado, o pássaro valendo-se das suas
caminhos. A cururina, que é a oitava e ínfima habilidades, sem que lhe seja necessário bater as
espécie é do tamanho das nossas perdizes, a asas, a sobir ao alto, e voar fugindo, ou fogir voando,
proporção dela é o seu ovo, cuja casca por fora é da o ilude, e lhe escapa, metendo-se como peixe debaixo
cor da tinta sinopla, que é roxo bem vivo, e as penas da ágoa, e surgindo depoes de largo espaço em mui
são cinzento escuras. Tem as cururinas úa longe distância. É pássaro preto do tamanho, ou
particular singularidade que do ponto indivisível das maior, que galinha, de pescoço algúa cousa comprido:
seis horas da tarde cantam, cousa de um quarto andam em bandos, e dormem em árvores a borda
pouco mais, ou menos; pelas nove da noute o mesmo dos rios; grunhem, como leitões, tão propriamente
indispensavelmente, pela meia noute, o mesmo que os europeos se enganam com eles, quando de
pelas três horas depoes da meia noute, e pelas seis noute os ouvem nos dormitórios. Os pássaros atins,
da manhã. Nisto não há falência, os galos falham, ou atiatis, como outros lhe chamam, andam também
as cururinas não. Também o jacami não falha ao em bandos pelas dilatadas praias do Rio Amazonas.
indivizível ponto da meia noute, nem a motum aos São azues escuros tirantes a preto, e alguns tem algúa
primeiros crepúsculos da aurora; porém nenhum é mistura de branco nas pontas das asas; há diversas
relógio mais singular, certo, e fixo, que a cururina. castas de atis, que se distinguem, já pelas misturas
da cor branca, e já pelos bicos, que são chatos com
Todas estas diferentes espécies tem o excelente
algúa semilhança aos dos patos, mas com mediana
gosto das perdizes, ou sejam cozidas, ou assadas,
proporção, e em algumas espécies tem estes bicos
ainda que são mais apetitosas com um molho de
úa serra pelos lados, ou dentes como de serra. Vivem
vilão. A cor não é tão vermelha, como a das perdizes,
do marisco, e peixinhos, que por isso andam sempre
excepto a pecuapé: as outras são mais escuras, ou
pelos areaes; o bico é também do comprimento do
pardas: os ovos das da primeira espécie são
de pato, e o seu cantar são uns como assobios, não
totalmente esféricos, e do mesmo feitio são os das desagradáveis aos ouvidos. Também há muita
outras espécies, a cor é azul muito claro, e vivo, variedade de maçaricos; e entre eles uma espécie, a
menos os da cururina, que são da cor da tinta que chamam maçaricos reaes, suponho, que o nome
sinopla, como acima dissemos. Os inambus da de reaes se deriva da sua grandeza, em que excedem
primeira espécie tem os ovos da grandeza, ou ainda aos das mais castas; são de cor cinzenta, ou parda.
maiores, que os de pata; e quase do mesmo tamanho Vivem também do marisco, mas com a diversidade
são os da segunda, que são o inambu guaçu. Os da dos atis, que estes vivem pelas margens, e praias do
terceira toro tem a grandeza dos de pata, os das Amazonas, e mais rios da ágoa doce: os maçaricos
mais espécies, menos os das cururinas, são como porém vivem nas praias do salgado, em que andam
os de galinha. Apanham-se vivos, ou com laços, que em bandos, e com cada tiro se matam a dúzias.
lhes armam, ou com úa espécie de gaiolas feitas dc
canas, ou de paozinhos, a que os naturaes chamam Merecem as garças seu lugar na república das
guira puca, que lhe põe nos caminhos estreitos, e aves, e tenho para mim serem as mesmas, a que
caem nelas com facilidade, quando querem os índios chamam Ac.. [incompleto no manuscrito].
atravessar para a outra parte do caminho, porque São brancas, e alvas mais do que muitos brancos.
vivem ordinariamente debaixo das árvores. O Tem muitas espécies, e também há a das garças
pássaro araquã é de gosto singular, e talvez mui reaes. Úas espécies são maiores, que outras: e
semilhante ao gosto das perdizes. Chama-se araquã, posto que algúas espécies de garça vistas com a
porque ele mesmo o exprime no seu canto, que é pena pareçam grandes, depenadas, apenas terão
com tal talento, e tão alto, que pode fazer acordar a grandeza de úa bem pequena franga. Tem suas
aos dorminhocos, e desacordar aos acordados. É bulhas entre si, e quando estão furiosas, enriçam
pouco mcnor, que uma galinha no seu corpo os cabelos, ou plumas da cabeça, e pescoço, e dão
depenado, e algum tanto mais comprido, mas uns roncos, que quem os ouve imagina ser uma
vestido da sua pena é mais galante, porque tem a grande batalha. Também costumam fazer úa
cor com algúa parecença de perdiz, cor de tabaco estrondosa estalada, outra quinada com os bicos,
castelhano. Tem cabeça pequena, ornada com sua que arremedam o estrépido de úa matraca, quando
mitra, ou penacho, cauda comprida, e é bem posto. se toca com pausa, e sem pressa. Vivem nos rios, e
328 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

praias do salgado, e ágoas salobras; ainda que o T ambém as andorinhas do Amazonas


mais ordinário é andarem pelos paos secos que estão merecem sua memória (embora que sejam bem
deitados sobre os rios donde avançam melhor ao conhecidas na Eur opa) não tanto pelas
peixe, que é o seu comer, como pássaros marinhos. singularidades comúas a todas as andorinhas,
É úa ave, a que chamam carão, digna de ser contada quanto pelas especialidadcs das do Amazonas, de
entre as boas, pelo seu excelente gosto, em que leva que só apontarei duas. Deixando pois o venenoso
ventagens as melhores galinhas, ainda que não as do seu esterco tão quente, e activo, que caindo nos
igualam na grandeza. São pretas, sem mistura de olhos de qualquer pessoa, a deixa logo cega, como
algúa outra cor. As suas pernas com serem pretas, refere a Sagrada Escriptura ter succedido ao São
também são estimadas para ramilhetes, em que não Tobias; omitindo também o ponderar o seu natural
só saem bem como sombras na pintura, mas instincto, com que conhecem, e aplicam a seus filhos
também [faz sobre-]sair melhor as outras cores: cegos a erva andorinha, por cuja vertude recuperam
porém há abundância não só neste, mas em outros a vista perdida; e reservado para os professores da
pássaros. Há um pássaro chamado por alguns o medicina o inculcar a estimada pedra, que criam
chocalheiro, porque o mesmo é ver algúa pessoa, na cabeça, ou todas, ou algúas, muito medicinal;
que gritar logo dizendo, que a vê, e por isso com
porque estas são propriedade das andorinhas, que
muita energia Jhe chamam os europeos bem te vi,
já andam tratadas em muitos autores; posto que a
porque o bom do pássairo assim mesmo o diz, e
incúria dos homens não façam delas o devido
exprime com tanta clareza o bem te vi, como se o
apreço, nem procurem utilizar-se dos seus muitos,
pronunciasse alguma pessoa; e já alguns se tem
e singulares préstimos, quando [roto o original] sem
enganado com ele, cuidando ser gente, que fala,
praecipue os novatos reinóes, que dele ainda não dúvida, que ainda o seu mesmo lixo tão contrário á
tem notícia. São do tamanho, ou pouco maiores, vista, e pernicioso aos olhos pelo seu tão exorbitante
que tordos. Há também úa pequena ave por nome calor, será utilíssimo para várias enfermidades, a
ainum, que se faz digna de algúa menção, ao menos que se acode com remédios quentes, sem ser
pela sua nociva singularidade, ou verdadeira, ou necessário empenhar o crédito, e consumir as bolsas
falsa, a fim de a evitarem os comilões. É um pássaro em remédios tópicos das boticas: passemos a
preto, cauda comprida pouco maior, que um melro: descrever as especiaes especialidades das
é muito amigo do gado vaccum, em cujos lombos andorinhas do Amazonas. A primeira é a guerra,
pousa, e donde faz seus tiros aos bichinhos, que vê que tem com os gaviões: não com os reaes, porque
no chão, tornando logo a voar para cima dos bois; esses vivem retirados, e não lhes são tão contrários,
ainda que o mais ordinário é andarem diante dos por não se contentarem com caça de tão pouco vulto;
bois, quando estes pastam, como fazendo-lhe festa. mas com todos os mais gaviões, embora, que sejam
É bem verdade, que o ainum não acompanha, e faz daqueles que envestem, matam, e comem galinhas,
festa aos bois, por ser amigo dos bois, senão porque patos, motuns, e outros grandes pássaros; porque
estes vão levantando alguns pequenos voláteis, como todos, não obstante a sua muito valentia, ficam
moscas, mosquitos, gafanhotos, e semilhantes muitas vezes vencidos delas, e a bom escapar
sevandijas, que são a sua comida, e estão corridos, envergonhados, e fugitivos. Assim que as
encubertos com a erva, e feno; por isso lhe vão andorinhas vem algum gavião voando por cima, ou
saltando diante, para que não lhe escape a caça, perto dos seus ninhos, logo o vão investir, embora,
que os bois fazem descubrir e levantar. São como a que sejam poucas, úas por um lado, e outras por
maior parte dos amigos, que não são amigos dos outro o assaltam; e como são velocíssimas no voar
amigos por eles, mas pelo seu, amigos do tempo, e o depenam com incrível ligeireza. Chega úa de
da moda; o que se conhece claramente, porque deles repente por um lado e com úa picada lhe arranca
não fazem caso, quando os vem descaidos de algúas penas, e sem demora se retira; vira-se o
fortuna, Tempora, si fuerint nubila so1us eris [se as gavião para tomar o despique, e no mesmo tempo o
circunstâncias forem desgraçadas, estarás só]. accomete outra pelo outro lado, e logo se aparta; já
A singularidade porém do ainum está, em que outra voando por cima lhe arranca algúas penas
comendo-o alguém, para logo é assaltado em todo o das costas, e com estes assaltos, e investidas o vão
corpo de uns tremores, e dores tão veementes, que pouco, a pouco despindo, e com assaz pena do
brevemente (se é verdade, o que dizem os naturaes) gavião depenando, por ele se não poder defender,
o privam da vida. Não se pode negar, que não sendo
nem ofender alguma das suas inimigas, ou com a
agouro dos índios, a que eles são muito dados, esta
troquês do seu bico, ou com as garras das suas
decantada singularidade do ainum, procedem tão
famosas unhas, por mais que se vira para úa, e
fataes efeitos de ser a sua carne um refinado veneno;
pelo que, deposto todo o afecto ao pemicioso vício outra parte, qual touro no corro agarrochado por
dos índios, nunca será nociva a cautela com a carne todos os lados; ou como um bravo canzarrão
do ainum, abstendo-se de a comer, antes de abarbado com ligeiros gozos; e vendo-se assim
experimentá-la em um cão, ou gato. Matando certa acometido o gavião, não tem mais remédio, que
pessoa um, e mandando prepará-lo para o comer, ceder fugindo, porque já muito ao longe o deixam
veio úa boa velha mais que depressa avisar ao as andorinhas. Porém se ele como valente se quer
caçador da[s] ruins qualidades da ave, e de tal sorte defender, e despicar, tanto o picam, e depenam
o intimidou, com não ser agoureiro, que se não quis aquelas, que se tem visto caírem muitos em terra,
expor ao experimento. O certo é, que os índios o por não poderem já voar, dando-nos um saudável
temem, ou respeitam tanto, que ordinariamente não documento, que se devem temer os inimigos por
o matam. pequenos, e fracos, que sejam.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 329

A segunda pr opriedade especial das os seus ninhos; e um dos taes materiaes são uns
andorinhas consiste na preciosidade dos seus peixnhos muito pequeninos, que várias vezes
ninhos; mas antes de a descrevermos, convém aparecem quase inteiros entre as mais cousas, de
saber, que há várias espécies de andorinhas. A que as andorinhas fabricam os ninhos; cujos
primeira é bem conhecida, porque são, as que nos peixinhos, digamo-lo assim, fazem naquela
anunciam a primavera, e verão com a sua vinda, preciosa fábrica as vezes de pedra, e com eles, e
azuladas pelas costas, e brancas pela barriga, e sobre eles edificam a casa para seus filhos, como
destas há abundância, e já bem conhecidas em os homens as erigem com pedra, e sobre pedra para
todo o mundo, e quase caseiras, e domésticas, por os seus descendentes; e à proporção dos outros
fazerem sempre os seus ninhos dentro das materiaes, que estas levam, se requerem naqueles
povoações, [ilegível] das mesmas casas. Há outra ninhos a espuma das ágoas, ou mais provavelmente
espécie, que não andam, nem se criam em toda a a baba das andorinhas, em lugar da ágoa; os
parte, mas só em algúas terras, e climas quentes, aromas, e resinas, para fazerem as vezes [roto o
ou saltem [pelo menos] temperados, como são original] barro: e talvez que a espuma seja em lugar
Amazonas, América, e Java, Manilha, e Molucas de cal, com que o dealbam: que se nos edifícios é
na Ásia. Serão do tamanho de um pintassilgo, com necessária a caiação, para serem mais vistosos,
cor azul escuro, ou apretadas, e brancas: não se no ninho de pás s a r o , p a r a s e c e g a r e m o s
chegam as povoações como as ordinárias mas mercadores, e o comprarem a todo o preço, requer-
vivem nas margens, e altas ribanceiras dos rios, e se muito a alvura, porque quanto mais alvo, e
nas do Amazonas, e rios colateraes são branco é, mais caro custe. Com estes ninhos, a
inumeráveis, e em todas as partes tem os seus que a preguiça dos americanos, talvez chame
buracos, e ninhos tão altos, que só com boas ninherias, por não fazerem deles o devido apreço,
escadas se lhe pode chegar. A singularidade, que ou por [roto o original] sobe porém os gêneros
tem estas andorinhas está na matéria tão estimada, preciosos, se tem levantado [roto o original] edifícios
de que fazem os seus ninhos, os quaes são um dos em várias terras da Ásia, e com estas ninherias de
mais estimados, e raros géneros da Ásia, aonde se pobretões chegaram a ser ricaços, não só muitos
vendem, e compram a peso de dinheiro; e são um asiáticos, senão também muitos e muitos europeos.
dos mais apetecidos mimos, ou para falarmos ao E havendo no Estado do Amazonas inumeráveis
modo da Ásia, dos mais grandiosos saquates, com ribanceiras, em que andam a grandes bandos estas
que se presenteam os princepes. É conhecido o dito andorinhas, que segundo as pintam os naturaes
gênero, e estimado naquelas regiões desde a Índia são as mesmas, que na Ásia ninguém se aproveita
até o extremo da China, e reinos adjacentes, e para de tanta riqueza, ou por desprezo, ou por
o dito império o conduzem asiáticos, e europeos, ignorância dos excelentes préstimos, quando não
por saberem, que nele sempre tem seguros os fosse para mais, ao menos para fazerem deles
ganhos, e avanços a centos; e em todas as partes esquisitos guisados, delicadissimos doces, e
da Ásia lhe dão o nome de ninho de pássaro. Do deliciosas menestras, com que se regalam os
ninho de pássaro fazem os asiáticos as mais asiáticos, e com que os doentes refocilam as forças,
gostosas, e excelentes menestras; do mesmo fazem como já disse, e já tratam alguns autores.
os mais deliciosos doces, não para mesas Depois das andorinhas tão caseiras, e amigas
ordinárias, mas só para os mais esplêndidos dos homens, se podem contar também por
banquetes, e custosos saguates de empenho: não domésticos os pássaros, a que chamam japins, que
há jaléa mais apetitosa, que o desbanque, nem são a recreação, e alegria das povoações. São maiores,
comer mais substancial, e inocente, ainda para que tordos, malhados, ou matizados de várias cores,
tísicos, e éticos. A causa de tanta estimação é, como entre as quaes avulta muito a cor amarela muito viva,
dizem os práticos, por serem feitos, e compostos e um como azul, ou preto, além de algúas pintas de
de preciosos aromas, e resinas, que aqueles vermelho; por cuja variedade de cores, em que levam
passarinhos sabem colher, e escolher das árvores ventagem aos mais lindos passarinhos, e também
para fabricarem os seus ninhos, como já dissemos, pela sua singularíssima habilidade, que agora direi,
ou. nas rachas de altas rochas, ou nos buracos de se pode duvidar, se há na república das aves alguma
eminentes ribanceiras, e também sobre elevados outra, tão galante, e divertida, como esta. Arremedam
penhascos, que estão sobranceiros aos rios, e a todos os pássaros, e as mesmas galinhas,
ondas do mar, donde lhos tiram, e extraem para principalmente chocas, e ainda a muitos animaes;
muitas partes, em que os vendem por subido preço, mas o som mais ordinário, e comum falar, é dizer
sem mais custo, nem beneficio, que lavá-los da mui claramente - dá cá o cu, dá cá o cu -. Vivem no
imundícia, e penugem, que neles fica das criações. meio das povoações, sítios, e fazendas; e fazem em
Alguns dizem que além de aromas, e resinas, lhe algúa das mais altas árvores, que acham na
ajuntam as andorinhas a escuma da ágoa, que nos povoação, os seus ninhos, os quaes são da figura de
rios, e no mar fazem, ou as ondas, ou as compridas algibeiras, com um buraco daquela
correntezas. Outros sentem, que elas conglutinam banda, que sabem é mais abrigada das chuvas, e
com a sua baba os materiaes, de que se compõem ventos, por onde só ele cabe, tão liso, e bem feito,
330 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

que os artífices o não fariam com mais primor; e A segunda espécie também tem muita
os taes ninhos, ou algibeiras dependuram nas estimação, posto que não chega aos do primeira,
extremidades dos raminhos, para que as cobras com ser maior, e quase do tamanho de melros, e
lhe não possam chegar, e comer os filhos, e com os todo preto. Porém os melros não tem que fazer com
ventos andam de úa para outra banda, sempre eles em pontos de solfa, porque nos seus assobios,
pêndulos, e fixos sempre. O mesmo fazem na Índia requebros, e gorjeos, põe os melros a um canto,
muitas espécies de passarinhos. O escolherem confunde os solitários, faz emudecer os cochichos,
sempre o meio das povoações, ou é por amigos da zomba dos canários, e assombra aos rouxinóes.
gente ou por se livrarem dos assaltos, e investidas Porque na sua solfa há, e se admiram os mais altos
dos gaviões. contraltos, ou subidos assobios, os tiples mais
finos, o dobrar mais doce, e os falsetes mais
O pássaro picaflor é um galante passarinho
galantes, e floreados, que não há italiano, nem mais
daquele Estado, e talvez o menor na república das
doce, nem mais fino. Por isso divertem muito nas
aves. É do tamanho de úa grande borboleta, e por
árvores, e nos bosques, alegra, e recrea nas salas,
tal se podia julgar, se o bico e as unhas o não
e nas igrejas suspende os sentidos, eleva os
distinguissem: é matizado de várias cores, tem o
pensamentos, [e faz] subir o espírito do terreno ao
biquinho comprido, e delgado, como um alfinete
celeste a suspirar por aquelas vozes angélicas, e
com o qual anda sempre chupando as flores, como
celestiaes solfas. E tanto estes, como os já referidos,
abelha, nem tem outro sustento. E segundo dizem
e ainda superiores são tão amigos de cantar, que
os naturaes nunca pousa, mas sempre anda a dar
nunca se calam; há muitos domésticos, que não
com as asas no ar, o que me parece hipérbole, só de dia, mas a qualquer hora da noute, que1he
porque ao menos de noute parece, que se lhe deve tocam nas gaiolas, ou mostram algúa luz, logo se
conceder algum repouso. Dizem mais, que quando dão por desafiados, e se desfazem em canto, cujo
quer morrer pica no tronco de úa árvore, onde
predicado os faz mais dignos da estimação dos
dependurado pelo alfinete do seu biquinho morre;
homens, do que são aqueles canários, de quem
e que do seu cadáver se origina úa borboleta:
disse Horácio – Nollunt cantare [não querem cantar]
não sei se esta mesma borboleta vem depois
e não obstante serem estes tão difíceis, e o tem
a ser outro picaflor, ou se se multiplicam como os
tem tão fàcil em cantar, nem sempre aqueles
bichos da seda.
agradam com os seus concertos, agradando a todos
Quero já acabar com a descripção das aves em todo o tempo este com a sua melodia, que para
do Amazonas, e para o coroar descrevo por último nunca enfastiar, sabe como bom mestre de solfa
o pássaro tem tem, que é um enlevo dos sentidos, variar; porque quando não dobra como rouxinol,
e um dos mais dignos daquele rio; e se pode assubia como melro. Tem-se feito diligência para
aclamar por mestre da solfa em toda esta república. os trazer para a Europa, mas sempre morrem na
Há várias espécies desta ave: três são as mais viagem.
conhecidas, e ainda que as descreverei todas, A terceira espécie são como, e em tudo
principiemos pela mais pequena, porque na semilhantes aos da Europa, menos nos assobios,
verdade, entre todas três merece o primeiro lugar. e canto, em que são mais excelentes, e na cor parda
É este tem tem do tamanho de um pintassilgo as escura. Mas não obstante ter mais espertos, e
penas das costas são de um preto tão fino, que engraçados assobios, não são tão estimados, por
parecem vidradas por luzidias: as do peito são de terem a mão muita abundância dos já referidos, e
úa cor amarela tão subida, que não há jalde, que a de muitos outros, que deixo de especificar; como
exceda. Na testa, e raiz do bico pela parte superior, também vários outros galantíssimos nas cores, e
tem um círculo de penas amarelas, que chega de toda a variedade grandes, e pequenos: uns, que
quase até o meio da cabeça, sendo esta preta da andam a beirada dos rios alegrando com suave
mesma cor das costas. Esta pequenina ave toda é música, e alegre vista, os que navegam; outros,
voz, porque em matéria de canto, não há pássaro que vivem no centro dos matos, e rasas campinas,
que o exceda, na solfa, nem o iguale nos seus onde quanto mais retirados mais seguros. Estes já
falsetes, requebros, e sustinidos. Parece vive de nas praias refrescando-se com a viração dos
cantar; de sorte, que estando em alguma igreja, favônios, e já nos rios banhando-se em cristalinas
em que algúas vezes os põe sempre estão em ágoas; aqueles nas praias do salgado à pesca do
continuo canto, principalmente ouvindo cantar, ou marisco, e peixes grandes, medianos, e pequenos,
tocar algum instrumento músico, como órgão, cuja multidâo, e variedade mais se conhece nas
cravo, ou qualquer outro: nos dias de sermão é grinaldas, ou turbantes, com que os naturaes
necessário várias vezes tirá-los, para não índios se enfeitam nas suas mais lustrosas funções,
perturbarem o pregador, e divertirem os ouvintes. com tão lindas cores, como eles em si feios. De
Arremedam todas as aves, e com serem tão sorte, que pode entrar em problema, quaes se
pequenos imitam tão propriamente os assobios dos devem mais admirar; se as penas por tão lindas,
gaviões, que quem os ouve perto dos seus quintaes, ou se os enfeitados índios por tão feios? enquanto
e não os vê, se põe alerta, para o gavião lhe não passamos também a ver algúa caça terrestre do
rape algúa criação. Amazonas.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 331

Figura 27.7. Beija-flores (apud Brehm)


332 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

CAPÍTULO 19° A onça é das mais ferozes, e bravas feras do


DIVERTIMENTO DA CAÇA NO RIO AMAZONAS Amazonas. Há diversas espécies deste animal: úas
são pardas, outras pintadas; umas vivem nas
Depoes de descrevermos a caça altília do campinas descubertas, outras não saem dos matos,
Amazonas segue-sc o divertirmo-nos também um úas são maiores, e outras menores. Nas mesmas
pouco na sua caça terrestre: porque não só é rico pintadas há diversas castas, porque úas são pretas
no seu pescado, delicioso nas suas penates; mas malhadas todas de amarelo, e outras são
farto, e divertido na sua montaria, não só pela esbranquiçadas, e tem as malhas de preto; às
multidão, mas também pela variedade de feras, que primeiras chamam panteras, e às segundas onças;
cria nos seus matos. E assim, ou seja pelo rio às dos matos, e campinas também dão diversos
pescando, ou pelos areaes passarinhando, ou nos nomes. Também há onças todas pretas, e a estas
bosques caçando, em tudo pretende o grande chamam tigres. Na grandeza também tem muita
Amazonas ostentar-se o mais rico, e famoso dos rios. diversidade; porque umas são como os maiores
É verdade, que não tem os elefantes, e abadas da rafeiros, e cães de fila: outras são como novilhos, e
África, os leões, e ursos da Ásia, nem as búfaras, um missionário do mesmo Amazonas refirio, que
viu com os seus neófitos úa, que era de corpo mais
camelos, e dormedários que criam várias regiões
alto, que um homem, e na grandeza excedia a
do mundo; mas produz, e tem abundância de muitas
qualquer boi; na verdade algúas dão rica pele, que
outras, em que se não excede, também não cede às
na grandeza se equivoca com as dos maiores touros:
ditas regiões o Amazonas, como escrevem já os seus
estas, são as que na Ásia chamam tigres reaes: às
historiadores, e em abono daquele máximo rio, e
menores dão o nome de tigres bibós. Todas porém
abreviado mar, descreverei agora alguns animaes são casta brava, e tão sagazes, e ladinas, que a
mais conhecidos, por terem aqui o seu próprio lugar raposa à sua vista é animal estólido. Sobem, e
[roto o original] dos peixes, e aves. atrepam pelas árvores acima melhor, que qualquer
Anta. Demos o primeiro lugar a anta, que posto gato, e ainda que qualquer homem, e delas fazem
não seja das mais avultadas feras na grandeza; tiro à presa com muita ligeireza. Já a mais atrevida
talvez mereça os primeiros méritos pelo seu delicioso fera, que criam os matos, e ainda mais que os
gosto nos banquetes, onde desbanca a muitas das mesmos leões, abadas, e elefantes; porque os
carnes, que nele são provadas, e aprovadas por mesmos leões temem ao homem, nem ordina-
gostosas; e também por ter nas histórias as riamente acomete se não provocados; mas a onça,
primeiras atenções com o nome de gran bestia, que nem a animaes, nem a racionaes teme, acomete
intrépida ainda ao maior gigante. Só o cão a faz
já hoje assentam ser anta. Na verdade é grande
fugir, não pelo temer, mas porque não lhe toa bem
besta, pois tem a grandeza de um grande jumento,
o seu latir: que o não teme se vê bem em ser o
e também mostra ter com ele mui estreito parentesco
primeiro, que acomete, e mata, se pode. E que não
no seu rico feitio não estou certo, se tem também
lhe soa bem o latir do cão se prova, de que em campo
grandes orelhas. É ruço este animal inclinando para
descuberto, onde o cão a veja, e lhe ladre, basta
cor preta, mas parece não é tão asno, como o burro, qualquer cachorro para fazê-la fugir, e subir a algúa
porque a ninguém dá ancas. A sua carne é muito árvore; por isso a melhor arma, e companheira, que
gostosa, mais que a mesma vacca; e tem um cheiro pode levar um viandante, ou caçador, é um câo,
tão activo, e tão regalado que recende, e não pode porque em este a vendo logo lhe ladra, e a faz subir
esconder-se a sua olha aos que passam, e passeiam a alguma árvore, aonde o caçador lhe pode milhor
pela rua. Tem a pele mais grossa, que a mais grossa atirar; e se a não vê, enquanto a onça não o mata,
sola, ainda antes de cortida, e tão durável, que dizia não acomete o dono. Mas ela tem tal instinto, que
um morador, que os seus sapatos já tinham rompido se sabe esconder de sorte, que o cão a não veja; ou
três couros, e que a sola estava ainda como nova, e sobindo a alguma árvore, em cuja ramada se
capaz de romper outros três: curtida ainda tem mais occulta, e quando o cão vai passando o assalta de
estimação. A dita pele cortida como camurça fica cima, de repente; ou fingindo, que lhe foge, depoes
tão macia como veludo. Os militares fazem dela furtando-lhe as voltas, e virando por entre o mato o
coletes, por serem impenetráveis as balas, como as acomete por detrás, e ordinariamente todos os cães
mais fortes saias de malha. As suas unhas tem de caça lhe vem a parar, e acabar nas garras.
grande serventia na medicina: nada bem, e passa
Há contudo cães de onças, não só que brigam
não só rios, mas ainda as maiores baías a nado, e com elas, especialmente se estão armados com as
também mergulha abaixo, e vai surgir em boa suas coleiras, mas também porque as sentem pelo
distância. Os índios, posto que a matam, e comem, faro, e as perseguem com latidos ao longe, e as fazem
tem com ela alguns agouros: se lhe aparece em tal, subir às árvores, onde o caçador lhe faz tiro; ou
ou tal occasião, deste, ou daquele modo, agouram, com a frecha como os índios, ou com espingarda. E
que lhes anuncia a morte, e de tal sorte se ainda então é necessária cautela de logo se retirar
entristecem, e melancolizam, que na verdade daquele lugar; porque a onça vendo-se ferida,
morrem, não bastando toda a eloquência de ordinariamente dá um salto no mesmo lugar, donde
Demóstenes, nem o incansável zelo dos seus lhe atiraram; e os cães, que deste modo a persegucm
missionários, ou pregadores, para os disuadir do são melhores, que os que a avançam, e acometem;
seu agouro, e persuadi-los à verdade o mesmo porque na briga sempre a onça fica de melhor
agouro tem alguns já criados com os brancos. partido. Aos homens também assaltam, não
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 333

só usando da mesma traça, mas ainda a peito despedaça; ou também chegando neste tempo algum
descuberto; e muitas vezes succede, que outro jacaré, bem como succede a alguns valentes
caminhando por algum caminho se encontra com lutadores, quando colhem caído, ou debaixo ao seu
[roto o original] em cujo caso não há mais remédio, contrário, porque então se vinga muito a seu salvo, e
que tomar ânimo, e gritar-lhe, ou ladrar-lhe como toma toda a satisfação, e medida da sua desmarcada
cão. Os índios afoutos neste caso, se não tem tempo raiva, e furor.
de a frechar, atravessam o arco, pegando-lhe com Mas não é tanto para admirar esta destreza
as mãos nos lados, e assaltando-os ela, arrebatem da onça contra o jacaré, e mais animaes, quanto a
nela como em escudo de sorte, que a fera pelo alto ousadia mais que atrevida de chcgar a investir com
da cabeça lhe vai cair atrás das costas, e virando- o leão [sic!], que é o rei das feras, e ainda ao matar;
se para ela, tornam a fazer o mesmo até ela não a peito descuberto, mas com manha, e
desesperar, e fugir. São tão forçosas, que com úa só indústria[.] Faz a onça úa comprida cova até sair
bofetada, matam o maior porco, que regularmente da outra banda, larga até o meio, e daí até o fim tão
não tem tempo de grunhir, mais, que úa só vez, e estreita que só ela possa caber pelo buraco. Feita a
depoes carregam com ele para o mato arrastando- cova, espera, que por ali passe o leão, a quem para
o, onde o comem muito a seu salvo. E se é touro, logo, desafia, e depoes de o irritar foge, e se mete na
ou cavalo, que ela não pode arrastar, ali mesmo cova, por onde é mais larga a boca da mesma, e o
onde o mata, lhe faz anatomia. A sua ferocidade é leão atrás da onça até chegar ao meio do buraco, e
tal, que matando uns caçadores úa em um seu sítio, ficar entalado de modo, que nem pode ir para diante,
a onça antes de espirar, vingou bem a sua morte, nem voltar para trás. Então a onça com mais juízo,
matando dous negros, e um cão: o primeiro, porque e discurso, do que instinto passando avante torna
julgando-a já morta, se chegou a ela, e então lhe a entrar pela boca grande da cova, e assalta pela
deu úa bofetada com a manopla esquerda, onde, retaguarda ao leão, que por estar entalado, não se
dizem, tem a maior força, que o segurou. O que pode defender, e assim muito a seu salvo o cavalga,
vendo os caçadores lhe tornaram a dar alguns tiros, e lhe salta nas ancas com unhas, e dentes a fazer
com os quaes não duvidando estar já morta, se anatomia, de que não cessa, enquanto não vê ao
chegaram com confiança, mas ainda a fera ferio seu rei a seus pés postrado, e morto. Vejam agora
outro de sorte, que também veio a morrer. lá os militares, se os seus ardilosos discursos, e
Tem as onças, além dos cães, especial estratagemas bélicos são mais ingenhosos para
inimizade com os jacarés, ou crocodilos, com quem enganar, e vencer a seus inimigos, do que este da
tem suas contendas, e grandes batalhas, nas quaes onça para vencer o mais valente dos animaes. Porém
ordinariamente ficam triunfantes, não obstante a assim como a onça é ardilosa para acometer, do
grande brutalidade, e fereza dos crocodilos desta mesmo modo os índios são destros, e muito mais
sorte. Sobem as onças as árvores sobranceiras aos sagazes para a matarem por vários modos.
rios, baías, e lagos, em que andam os jacarés, e ali O primeiro é a frecha, quando a fazem subir as
muito quietas, e em muito silêncio esperam, que árvores com o latir dos cães, como já dissemos.
algum vá passando por baixo, ou perto, onde de Segundo. Armando-lhe ratoeira, a que chamam
repente o assalta. Algumas nem isso esperam, mas mundé, que quer dizer tronco, e consiste em úa
lhe fazem foscas, ou cortando algum raminho, que estacada de paos a pique, tapada por cima, e com
deitam na ágoa, ou tocando na mesma com a ponta portas falsas, dentro da qual lhe põe algum cão por
do rabo em ordem a atrair, e enganar o jacaré, que negaça. E como a onça tem capital inimizade, e inata
logo acode a ver, o que é, e então o assalta de cima, antipatia com os cães, o mesmo é ouvi-lo ganir
fazendo tiro ao cachaço, e logo com unhas, e dentes dentro da ratoeira, que entrar a buscá-lo por alguma
se segura. Vendo-se assaltado o jacaré, mergulha das portas falsas, donde não podendo sair, pelos
abaixo, e a onça com ele, surge acima o jacaré, e buracos a matam às frechadas. O terceiro modo é
juntamente a cavalo nele a onça; e tomando fazando-lhe espera, quando algúa mata algum boi,
respiração, tornam a mergulhar, e a surgir. No ou qualquer outra grande presa, a que a onça vem
entretanto a onça não se descuida de lhe ir todas as noutes tomar barrigada, e o fazem deste
esgravatando com as suas grandes unhas os modo. Metem alguns paos em terra em distância de
ouvidos, e com os dentes o vai descarnando por tiro de frecha, e sobre estes paos armam outros por
onde pode, sangrando, e matando pouco a pouco, modo de varanda, na qual posto algum caçador a
já abaixo, e já acima; sem valerem ao jacaré, nem espera, e mata muito a seu salvo, quando ela volta
as rabanadas, que atira para as bandas com a à presa, que ordinariamente não chega a comer toda
cauda, nem as voltas para os lados, nem os da primeira vez.
movimentos da tromba para a sacudir fora do
cachaço, e despedaçar com os dentes, nem ainda a É também a onça, além de muito ardilosa,
impenetrável saia de malha das suas conchas, atrevida, e brava, tão confiada, que não só entra
finalmente acaba ferido, já pelos ouvidos, e já pela nas povoações, mas ainda nas mesmas casas dos
garganta, se alguns, ou algum jacaré, não lhe acode. índios, (e de noute sobe as mesmas varandas) onde
Depoes de morto, nadando o vai conduzindo para apanha, já o [porco] já o cão, e já algúa outra presa,
terra, onde o come, e enquanto dura tem nele boas que acha, se os moradores estão dormindo. Estando
fartadelas. Disgraçada porém a onça, se no meio porém acordados, e dando-se dela, e avisando-se, a
da batalha, e nos giros, e motos das escaramuças, onça com muita segurança sae para fora, e se
perde o tino, e os estribos, e chega a ficar desmontada, esconde no mato. Em úa povoação entrava uma nas
porque então o jacaré a investe, e irremediavelmente casas, e era tão ladina, que, como discorrendo,
334 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

Figura 27.8. Onça (apud Brehm)


O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 335

lhe fariam espera, como na verdade faziam, nas correriam muito perigo os caçadores, porque os
seguintes noutes não voltava àquela, mas ia a outras javalis não descansariam, enquanto não o deitassem
povoações, e assim andou muitos tempos iludindo abaixo. São muito semilhantes aos ursos, que
as vigias, e esperas; e quando já se não esperava, também assim perseguem a gente, quando a sentem
tornava a onça com a mesma sagacidade. As peles refugiada em cima de algúa árvore, não se
de todas as onças são muito buscadas, accomodando, enquanto a não deitam abaixo. Porém
especialmente as pinimas, ou pintadas, cortidas com se há outras árvores ao pé, em cujos ramos se
cabelo para chairéis de cavalos, e outros adornos. peguem, como na América, também os ursos ficam
Os religiosos da Companhia, quando os havia baldados, como no Brasil os javalis: antes se o
naquele Estado, logravam o privilégio de não lhes caçador tem ânimo, e está bem provido de munição,
fazerem mal, nem cobras, nem onças: O mesmo ou frechas, de cima vai fazendo neles boa chacina,
privilégio tinham os jesuítas em todo o Brasil, se porque são tão bravos, que não obstante verem, que
não é, que se estendia a toda a América, por os companheiros vão morrendo, não só não fogem,
reverência, e benção do grande missionário, e mas antes mais se enfurecem. Porém as melhores
insigne varão apostólico, o venerável Padre José de caçadas são, as que se fazem de cima de algum
Anchieta, a quem pela sua grande vertude tinham tronco de árvore caída, que há muitas pelas matas,
tanto respeito cobras, e feras, que o festejavam, e onde os melhores, e mais destros caçadores os
iam tomar a benção, a qual lhe dava mandando- esperam, e quando eles vão [roto o original] uns
lhes, que não fizessem mal, aos que traziam aquela atrás dos outros (porque ordinariamente andam em
santa roupeta; e tem succedido tantos, e tão fileira) com úa boa lança, ou zagaia os vão
prodigiosos casos neste particular, de que muitos sangrando, sem que eles tornem para trás por medo,
já andam na sagrada rota, que tiram toda a dúvida antes vem com braveza acodindo uns aos gritos dos
desta verdade, e bem confirmam a duração de tão outros, ajuntando-se em taes bandos para os vingar,
santa benção. Porém aqueles mesmos religiosos, aos que em pouco tempo pode o caçador fazer grandes
quaes reverenciavam os mais venenosos bichos, e provimentos o ponto está em ter ânimo, e não se
as mais bravas feras, como são cobras, e onças; intimidar corri o estrondo, e estalada, que fazem no
esses mesmos odiados dos racionaes seus nacionaes bater dos dentes, tal, que parece vir abaixo toda a
não só foram por estes expulsados com infâmia, mas mata, ou que querem despedaçar toda a montanha:
tão inumanamente tratados, e maltratados, que e na verdade fazem tal ruído, e bulha, que basta
seriam mais humanos, se logo lhes tirassem a vida. ouvir de longe, ou vê-los de palanque, para se
É parenta por bastardia da onça a fera levantarem e enriçarem os cabelos.
maracajá, antes parece ser úa espécie de onças mais Outro modo também seguro de fazer neles boas
pequenas; porque no feitio, e na cor não tem mais caçadas é, quando se apanham nadando, e
diferença, das onças pinimas, ou pintadas, do que atravessando os rios, e baías de úa para a outra
em serem mais pequenas, e do tamanho de um banda, o que fazem com frequência buscando as
cachorro inglês; mas a figura é de gato, como todas suas comedias, que ordinariamente são frutas
as mais onças, posto que os naturaes lhe chamem bravas, raízes de paos, e ervas. Nadam, e atravessam
pela sua língoa jaguareté, que é o mesmo, que cão em fileira, e por isso chegando qualquer caçador
bravo: porque além do mais feitio, tem a cabeça em úa canoinha atravessada, e quase unida, basta
chata, e barbas, como os gatos. Não fazem tanto úa faca para fazer grande matança; e depoes de
mal como as grandes, nem investem aos gados, nem matarem, os que querem recolhem-nos para dentro:
a gente, senão irritadas: o maior mal, que fazem, é porque ainda que mortos, não vão ao fundo, mas
saltar nos galinheiros, e assaltar as galinhas, como andam boiando a reveria das ágoas. Um dos seus
a raposa. A sua pele tem tão bem muita estimação. maiores inimigos é a onça, que também se vale das
Depoes da onça também é formidável o javali, de suas habilidades para os apanhar; e é sobindo-se a
que há tanta multidão, e variedade, que ainda que algum pao, onde sente, que eles vão passando, e
o Rio Amazonas não tivesse outra caça, bastavam enquanto passam está muito quieta, para não ser
os seus javalis, para a fazerem abundantíssimo dela. sentida, até que chegando o último, de repente o
Umas espécies são maiores, outras menores; uns assalta, e segura com úa fatal bofetada, e logo torna
deste, outros daquele feitio; mas todos bem gostosos para o mesmo lugar; e posto que o javali ferido dá
na sua carne, posto que os chamem porcos, todos um grito, a que acodem todos os mais a onça de
bravos, e todos de ruim pêlo, e mao cabelo. Há úa cima está vendo os touros de palanque, até que eles
espécie de javalis tão bravos, que presentindo gente, se apartam, e então ela desce a comer a presa. A
ou o caçador o acometem com grande furor, e raiva, causa de sempre acometer, o que vai no couce da
que indicam no bater dos dentes, e escuma na boca: procissão é, porque os mais a não apanhem, porque
de sorte, que não tem mais remédio o caçador, que apanhando-a no meio, ainda que sejam muitas,
refugiar-se em algum pao alto, ou árvore. Porém infalivelmente fica pelas costas, e é feita em pedaços,
são tão ferozes, que se o presentem na árvore, se como muitas vezes succede ou succederia muitas mais,
atiram a ela com unhas, e dentes para a cortarem, se ela não usasse da sua indústria. Entre as mais
e o deitar abaixo, e fazê-lo, ou desfazê-lo em pedaços, espécies de javalis, que cria o Amazonas, há úa, que
sendo que lá não seja tão perigoso por rezão de se tem seu asco, ou catinga, e a tem no espinhaço, em úa
poder saltar de umas para outras árvores, por como fonte, ou fístula; por isso já os práticos, assim
estarem muito juntas: que se não o estivessem que o matam, lha cortam com úa faca; e sem mais
336 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

beneficio, fica já a mais carne gostosa, e sadia. cão, que perseguio a um porco espim, não só não o
Deixando porém as mais espécies, que, como já venceo, mas ainda em pouco tempo ficou incapaz
disse, são muitas, e algúas de bom tamanho, só de proseguir a briga, e foi obrigado a retirar-se ferido
farei menção da ínfima espécie, a que chamam tatu. com três setas, e úa trespassada de banda a banda
É bicho de concha, como são os cágados, jabotis, por úa perna. Estes espinhos, ou setas do porco
tartarugas, mas concha, e todo o seu feitio é espim tem em circunferência, ou no menos em
inteiramente diverso do dos referidos animaes: algúas partes, úa aspereza, ou pequenas barbas,
porque as conchas são sobrepostas úas às outras, como as praganas do trigo, que dificultam o tirar os
e vão à [roto o original] como fitas; e não como nas taes espinhos encravados na carne, sendo que os
tartarugas, que são concha, ou casco inteiriço. A não retardam a entrar nela, por serem lisos para
tromba, focinho, pés, e rabo são totalmente de porco: diante, e ásperos só para trás. Em úa quinta de
tem a grandeza de jabotis, ou pequenas tartarugas; religiosos na Ásia saio um potente canzarrão, da
a sua carne, e toucinho, não só tem a semilhança, batalha, que [roto o original] teve com o porco espim,
e gosto da de porco, mas é de todas as espécies a com duas setas encravadas no focinho de sorte, que
mais gostosa. não foi possível tirar-lhas, senão cortando-lhe a pele,
Havendo tanta multidão, e variedades de e carne, até abrir caminho tamanho, como se
porcos no Amazonas, e América, que crie nas suas requeria para as duas garrochas saírem sem novo
tão vastas, e dilatadas matas o porco espinho, tão tormento do animal.
conhecido, e célebre na Ásia pela sua medicinal Nas suas setas tem armas, não só defensivas,
pedra, chamada pedra de porco espinho; porém mas também ofensivas, contra quem os accomete:
como cada vez se vão descubrindo mais novidades, é bem verdade, que delas, e deles zombam os
e cousas raras, e admiráveis no destricto do caçadores práticos no modo de os caçar, que é
Amazonas, me parece conveniente dar alguma investi-los por diante, e não pelos lados, e menos
notícia desta espécie de porcos, para que possam por detrás; porque só para as ditas partes despede
os seus moradores vir no conhecimento deles, se os seus espinhos, e não para diante; dado porém,
alguma vez os acharem. É o porco espinho, ou que atire alguns para a frente, nada ofendem por
espim, do tamanho de um bácoro de 8 até l0 meses, irem sem força. A sua tão medicinal pedra é tão
e de 2 pa1mos, e alguma cousa mais de comprido. preciosa, que algúa se tem avaliado em 600 mil réis;
Não tem sedas, mas em lugar delas tem o corpo e porque também já, ou a curiosidade, ou a cobiça
cheio de espinhos, que no feitio pouco, ou nada se de dinheiro tem falsificado algúas, digo muitas, o
diferençam dos de ouriço cacheiro; porém no remédio para discernir as verdadeiras das falsas é,
comprimento, cor, grossura e fortaleza diferem tocá-las na ágoa, e postas na palma da mão chupar
muito. Os espinhos do cachaço, e espinhaço tem com a língua nas costas da mesma mão: porque
cousa de dous palmos de comprido com grossura sendo verdadeira, é a sua vertude tão activa, eficaz,
de úa muito grossa pena de escrever; e tão duros, e e instantânea, que logo passa, e traspassa, ou
fortes, como bem duras espinhas; a cor de todos é repassa à outra banda a sua amargura; e não se
matizada de branco, e preto. Os espinhos da barriga, sentindo amargor, pode suspeitar-se ser falsa, como
ou lados, de todos são os mais compridos, e também diz o Dr. Curvo. Nem todos os porcos espinhos a
os mais delgados: os da cauda são da grossura tem, antes em raros se acha, como succede nos
(senão mais) dos do lombo, ainda que não tão camaliões: se havemos de dar crédito a alguns, a
compridos, e são occos por dentro, e abertos na rezão de não se achar em todos é, como eles dizem,
ponta: pelo contrário os espinhos da barriga, lombo, porque só depoes de tantos anos de idade, se
e cachaço são compatos, e sólidos por dentro, e tem principia a formar a tal pedra. Alguns curiosos
a ponta muito aguda. A rezão de serem occos os do dizem, que esta mesma pedra se acha em muitos
rabo é, porque neles, como em penas, ou canudos; outros javalis, e porcos monteses; o que facilmente
costuma levar ágoa dos rios, e mar, com que burne, se pode experimentar no Amazonas, e América, onde
alisa, e conserva sempre muito munda a boca da andam em grandes manadas. Na verdade se tem
sua cova, desmintindo com limpeza de arminho o achado já algúas destas pedras nos javalis do
imundo do seu nome. Daqui vem, que para se saber, Amazonas.
se o porco espinho está na cova, ou fora dela,
costumam muitos, que querem apanhá-lo à mão, Quase semilhantes aos porcos são outros
deitar alguma cinza na boca da cova; v. g. a noute, animaes, a que os naturaes chamam capivaras
e pela manhã vai [achar] na mesma as pegadas, porque são do mesmo tamanho, da mesma cor, e
que por estar limpíssimo o chão da entrada da cova, roncos: só tem alguma diferença na tromba, e
estão bem impressas na cinza, e vendo, que são cabeça; esta em ser mais chata, e aquela em não
para dentro, é signal evidente, que o porco está na ser tão comprida. Também não tem a braveza, e
cova, onde entram, e o seguram: querendo logo ali ferocidade dos javalis; as suas carnes não são tão
matá-lo, basta para isso um arrocho; e deste modo gostosas; e por isso não se comem em toda a parte,
matou muitos certo ecclesiástico na Ásia. Nunca ou talvez, que só seco, mas algúas das suas
accometem a gente, mas vendo-se accometidos com espécies, e não todas. Como os porcos também
a cólera enriçam, ou arrepiam os espinhos, e os gostam dos lodos, em que andam foçando a borda
despedem, com tanta velocidade, e força contra dos rios em bandos, e quem não as conhece, cuida
quem os persegue, como se foram setas atiradas serem javalis. Na grande Ilha do Marajó são
com arco, e frecha. Bem o sentio em certa parte um inumeráveis, e andam ainda ao pé das árvores, e
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 337

casas: talvez, porque lá não as matam, nem comem, quando elas são grandes, e de muitos galhos,
por terem grande fartura de melhores carnes. Pacas também servem para adorno das salas, em lugar
são outros animaes, que tem muito parentesco com de cabides, e de que muito usam os seus caçadores,
os porcos monteses, e são úa das melhores caças como testemunhas das suas caçadas. Também em
do Rio Amazonas. Tem o corpo de porcos de 8 para alguns se acham umas como pedras, ou maçãs com
10 meses, ou pouco maiores, e roliços, não só por várias vertudes medicinaes: talvez, que entre as
grossos, mas também por gordos. O feitio é de porco, muitas espécies, que há de viados na América, haja
de que difere na cor, que é avermelhada, e talhada também aquela, que tem a famigerada pedra bazar,
com uns como listões pardos em roda, que os que vem da Ásia: porque o animal, em que ela se
enfeitam. A barriga é branca, e a tromba mais curta, acha, dizem ser úa como cabrinha, que ninguém
que a dos porcos: o gosto da sua carne é como o da duvida ser espécie de viado. Há varios modos de os
de leitão, e as mesmas carnes tem com as dos caçar, mas o mais usual é com cães de caça próprios
leitões sua parecença. Há porém tempos, em que a de viado, os quaes deitam os caçadores ao mato, e
paca não é tão gostosa, por ter um como amargor eles andam em canoinhas ligeiras pelo rio. Dando
desconsolado, e contraído de úas frutas do mato, os cães com algum viado o perseguem com latidos,
como castanhas, de que se faz excelente azeite para e a fera vendo-se acossada, foge para o rio, por achar
a candea, e outros usos, a qual fruta é tanto, ou na água especial refúgio; e então o mata, e recolhe.
mais amargosa, que a azeitona, antes de cortida. O mesmo faz aos mais; que saltando vem buscar a
Desta fruta comem as pacas no seu tempo, e dela ágoa acossados dos cães; e quando já não quer mais
se refunde na sua carne o dito amargor; passado grita, e assobia aos cães. Os das campinas se
porém este tempo são tão gostosas como leitão, ou perseguem ordinariamente em ligeiros cavalos, e se
sejam cozidas, ou assadas. Os brutos, ou feras, a matam a tiros já de espingarda, e já de frecha.
que os índios chamam cochiné, propriamente são Um dos animaes mais galantes da América são
lobos, ou cães bravos do mato, excepto em não os tamanduás, a quem os castelhanos chamam
serem louros, como os lobos, mas com uma cor
hormiga león [sic!], símbolo verdadeiro de muitos
castanha. Também não são tão atrevidos, porque
soldados desta era, que no tempo de paz blasonam
ordinariamente não investem a gente, posto que não
de valentes, como leões, e taes se mostram, com os
lhes falta valentia de sorte, que se possam defender
que por mansos se assemelham a mansos
das feras, e dos cães, ainda que sejam de fila. A
cordeirinhos. Porém no tempo da guerra, ou achando
figura, e tamanho todo é de lobo: tem grandes
algum filho da velha, que lhe tenha a barba tesa,
bulhas com os cães domésticos, não pelos
vem-se abarbados, e desmaiados de medo: mais
acometerem sós por sós no mato; mas porque algúas
claro: são uns humildes cordeirinhos, e mansos
vezes sentem passar perto da povoação algum
borregos para os leões; e parecem soberbos leões, e
cochini, e então muitos juntos o assaltam, e só pela
bravos leopardos para os mansos, e pacíficos: taes
multidão o vencem, e matam; porque a muitos
são os tamanduás, ou hormiga leones, que é o
inimigos, nem um Hércules pode resistir!
mesmo que leão das formigas [sic!]; mas com outros
Pode questionar -se, quaes sejam mais no animaes, e com os caçadores são muito tímidos, e
Estado do Amazonas: se os javalis, se os viados? cobardes, e mansos como cordeiros. São da grandeza
por serem tantos os viados, que dizem os europeos, e feitio de um grande galgo, algum tanto mais altos;
que eles são as pulgas da América. Há muitas e talvez que também mais compridos: o focinho porém
espécies de viados: uns chamados viados da é sem comparação, mais comprido e agudo, que o
campina, por pastarem sempre em campos dos galgos. São ruços na cor: da cabeça, ou pescoço
descubertos: outros viados do mato, por viverem lhe saem duas fitas, ou listões, que já alargando-se
sempre nos matos. Uns com galhos pequenos, e úa da outra, e depoes tornando a unir-se, e passando
lisos; outros com galhos grandes como os da Europa, úa por baixo, da outra se vão outra vez separando
e outros com galhos do feitio de um bezerrinho; e em tanta igualdade, [ilegível], [como] se as dilineara,
talvez são as que na África, e Ásia chamam e pintara algum insigne pintor; por fim vão a cair, e
vaquinhas do mato, que tem excelente gosto. Os finalizar sobre as polpas das pernas, para cada banda
viados do mato são mais buscados, e se tem por sua. São de cor castanha, e lhe dão tanta graça, que
carne mais gostosa: os das campinas são menos só pela vista se podiam domesticar. A sua cauda é
perseguidos, e ordinariamente só aproveitam as comprida, e por remate tem úa tal trunfa de cabelo,
suas peles para belas camurças, que delas se fazem, que bem pode servir de amplo espanador nas salas.
e as carnes deixam para as feras, e aves, não por A sua vida, e sustento é caçar, e comer formigas; e
não serem boas, mas por terem abundância de como estas na América são inumeráveis, nunca
outras melhores. O ser a vida dos viados mais padece fome. Para as caçarem se chegam aos
prolongada que a dos homens se tem já como cousa formigueiros, sem medo de que os mordam, embora,
assentada; mas é quando os caçadores lha não que sejam das formigas, que chamam de fogo, pelo
abreviam. Conhecem os práticos os seus anos pelos fogo e comichão, que causam as suas mordedelas
seus galhos, como os alveitares as bestas pelos ou as chamados tacibas, cujos dentes cortam, como
dentes; porque em cada ano lhe nasce demais úa lancetas, ou quaesquer outras, que nenhúas teme o
ponta. São as suas pontas estimadas nas boticas tamanduá, antes as accomete todas, como cão
por ingredientes de vários remédios médicos; e intrépido, nos seus mesmos formigueiros, onde
338 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

estendendo a sua comprida língua, talvez mais para fugir, nem para accometer. O mais que faz é
comprida, que lingoados, a mete pelo buraco conservar as mãos, e braços levantados, olhando já
dentro. Acodem logo as formigas a contenda para para uma parte, e já para a outra, indicando a
que será a primeira a picá-lo, e mordê-lo; mas ele vontade, que tem de vir às mãos, com quem o
constante não se move, enquanto a não vê bem persegue, e como desafiando-o para medirem braço
coberta de formigas, que estando-o logo a recolhe, a braço as forças, ou que ao menos se chegue, que
e as engole; e logo outra vez lhes oferece a língoa ele, além de ânimo, tem desejo de jogar com ele as
até se fartar. Seriam estes brutos de grande lutas. É certo, que (que) se pode duvidar: se o
utilidade a todo aquele Estado, se não só senão se tamanduá não foge por cobarde, ou por brio, como
matassem, mas, antes se multiplicassem em muita o generoso leão? que antes se deixará matar, do
abundância, para com eles diminuírem os seus que fogir: pois, segundo dizem os noticiosos,
grandes formigueiros, que são úa das maiores encontrando-se algúa pessoa com ele, se vê, que o
pragas de toda a América. homem pára, também pára o leão, e chegando-se o
Não fazem mal a ninguém, antes são tão homem para o leão, este também continua a
cobardes, que facilimamente se matam: porque caminhar para aquele; porém se o homem foge
accometidos ordinariamente fogem; e se alguém os voltando para trás, da mesma maneira vira o leão,
segue, e persegue, param, e assentam-se como cães, e vai fogindo: de sorte, que imita as acções do
levantando as mãos, em que tem, e também nos homem, mas à sua vista não sabe o leão fogir, ainda
pés úas famosas unhas. E dizem tem [em branco que ali haja de morrer: assim o tamanduá, ainda
no manuscrito] tanta força, que colhendo nos braços que seja investida por rapazes, antes ali se deixa
alguém, que se chega perto dele, lhe dá um tal matar, do que fogindo mostrar fraqueza.
abraço, que lhe faz sair as entranhas, e quebrar Semilhantes ao tamanduá são muitos homens, que
todos os ossos; e assim fazem ás onças, quando os reputando por desdouro o retirar -se, e declinar a
accometem, se elas se chegam de sorte, que as seus inimigos, se oferecem briosos às brigas, e
possam agarrar, e abraçar. Mas quem já sabe, não duelos, ainda que vejam o perigo de morte, que
se chega a ele, porém de largo, já com paos, já com correm aceitando o combate; e por um brutal
pedras, já com pedradas, e muito melhor com tiros, capricho se expõe a duas mortes de corpo, e alma
ou frechas, o matam, sem que ele tenha ânimo, nem com eterna infâmia.

Figura 27.9. Tamanduá (apud Brehm)


O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 339

As raposas da América e Amazonas são tremer. Os olhos, ou sempre fechados, ou sempre


maiores, que as da Europa no mais em tudo dorminhocos; de sorte, que parece não os pode abrir,
semilhantes; e por serem tão conhecidas não as ou está com eles cheios de somno, bem
descrevo, posto que sejam dignas de especial propriamente como os dorminhocos, quando muito
menção nas Histórias pelo seu raro instincto, pelo carregados de somno não podem abrir os seus; do
qual são símbolo de astúcia: e além das mais provas mesmo modo este monstro, ou para melhor dizer,
bem o mostram em comerem sempre, que podem, ainda os tem sempre muito mais carregados com a
galinhas, frangos, e na falta deles, seu bocado de circunstância, que é o mesmo, ainda sendo fustigado
coelho. E na verdade, que quem o pode fazer, será com alguma verde vara, ou corda. E se os mais
bem pouco atilado em comer feijões, excepto sendo movimentos não fossem homogênios, se podia
por mortificação, como faziam os santos anacoretas discorrer, que não poderia olhar para a claridade
do deserto, e ainda hoje fazem muitos nas religiões; por natural impedimento na vista, e olhos; mas as
porque estes que deixam as galinhas, e delicados mais acções todas são do mesmo teor, e todas
manjares de suas casas, e palácios, trocando-os indicam a sua quase incrível preguiça. Gasta tanto
pelas insulsas ervas, e legumes das religiões, são tempo para levantar úa mão, e pegar em algúa
tão prudentes, e astutos, que merecem com eternos cousa, ou mover algum pé para dar algum passo,
louvores glórias eternas. As peiores raposas, e que quem é diligente no comer, tem tempo de jantar,
pestes dos galinheiros na América, são uns bichos, ou cear. É enfim um monstro de preguiça, e monstro
a que chamam mocuras (não sei se são as que na tão vagaroso, e preguiçoso, que parece, que não só
Europa chamam foinhas) porque estas em úa só não se achará semilhanie, mas nem ainda termos
noute dão conta de um grande, e numeroso cabaes para se explicarem os seus vagarosos termos,
galinheiro. Pois, além de matar algúa para comer, e intermináveis vagares. De sorte, que eu mesmo o
depoes de farta, mata as outras só para lhe beber o
teria por quimérico, se não o tivesse visto, e
sangue, e o mesmo faz a todos (a todos) os penates,
admirado por vezes, e ainda fustigando-o para ver
que apanha; e para os segurar, não só os acomete
se com os açoutes, ou acordava, ou se estava
de noute, e as escuras, mas quando estão dormindo,
acordado, como na verdade estava, se espertava,
trincando-lhe logo o pescoço, e são do tamanho de
nunca foi possível tirá-lo daquele natural letargo, e
gatos, e ruças: tem na barriga pela parte exterior
vê-lo dar um passo inteiro no espaço de meia hora,
um fole, onde metem, recolhem, e trazem os filhos,
ou mais, que me detive. Quantas semanas serão
enquanto pequenos. São caseiras, porque vivem
necessárias para subir a algúa pequena árvore a
ordinariamente escondidas nas mesmas casas, e
buscar o seu sustento nas folhas da mesma? se
telhados, aos quaes sobem como gatos, ou em
buracos de árvores, e das paredes dos quintaes. Tem pode inferir dos seus vagares: e naquela árvore, pao,
algúa catinga, ou fétido no seu ruim pêlo, mas tirado ou qualquer outra cousa, em que chegaram a pegar,
este, e esfolada a mocura, dizem ser mais gorda, e ou agarrar é de sorte, que se requer boa hora para
gostosa, que galinha. lha tirar da[s] mãos, e garras, onde dizem tem muita
força. Sobe às árvores, e arbustos, e se sustenta
Aí é o bicho do Brasil, que há mais aparentado das suas folhas. Tem carranca, e focinho de cão, e
em todo o mundo, não por haver muitas espécies está sempre com ela caída: os seus olhos sempre
debaixo do mesmo nome, pois não se sabe mais carregados, e somnolentos, além da sua má cara, o
que de úa; mas porque em todo o mundo tem muitos fazem muito feio, e carrancudo. Os índios gabam
imitadores da sua vida. Chama-se em bom muito as suas carnes por saborosas, e boa caça, e
português preguiça, e na verdade não é nome vácuo, por isso achando-o não lhe perdoam.
fantástico, ou sombra de nome, como o é o de
muitos, que tem nome grande, e não são homens T ambém as cotias m e r e c e m e s p e c i a l
de grande nome nas suas acções. Nâo. assim o aí, memória, por serem das mais excelentes caças da
ou preguiça do Brasil, porque o seu nome diz, e América. São maiores, que coelhos, e talvez sejam
condiz em tudo com as suas acções. É da grandeza algúa espécie deles, ou de lebres, com que mais se
de um cão ordinário, posto que a sua máscara, ou parecem na grandeza; mas são [ilegível] gostosos
má cara, é fea, e assemelha mais aos macacos. É do que as lebres, e coelhos. Tem famosos dentes,
de cor cinzenta, pernas, e mãos parecidas às dos não só por grandes, mas por tão agudos, como
cães, excepto as unhas, que são famosas, e boas navalhas, e muito duros. Daqui vem, que os índios
para assobios. Dificultoso me será dar úa cabal do mato, que não tem uso do ferro, nem de algum
descripção da sua preguiça: mas do modo possível metal, se valem dos dentes de cotia para muitos
darei a notícia suficiente para se formar dela algum lavores, embrechados, e pinturas, que fazem muito
tal, e qual conceito. Ordinariamente está deitado, e curiosas, como as poderão fazer os artífices com a
ainda quando lhe é preciso caminhar, o faz como, ajuda dos instrumentos de ferro, e por curiosas
assentado, e por modo, de quem não se pode são estimadas dos europeus. As peles das cotias
levantar, e que tem difundido pelos nervos, juntas, são buscadas para sapatos; e há ilhas, como é a
e medulas algum estupor. Enquanto levanta, ou das Onças de fronte da cidade do Pará, que se
move a cabeça bem se podem rezar muitos, e mui alagam nas ágoas vivas de março, e setembro, e
devotos Padre Nossos, e outras tantas Ave Marias: então alguns curiosos moradores, e caçadores vão
e como se não tivera ossos, ou nervos parece não à caça delas, que por entrarem as ágoas nas suas
pode sustentá-la; e por isso não só lhe cae para covas, são obrigadas a nadar, e então com facilidade
baixo, mas ainda no levantar, ou abaixar, é a bom se matam, e fazem grandes provimentos; mas
340 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

devem ter cautela em se livrar das mordeduras, e Não é menos notável o instincto, e arte, com
picadelas dos seus dentes. Os cães de caça não que os bichos chamados maritaca iludem os
ousam investi-las, e só as obrigam a encovar-se, e caçadores, e seus contrários. Tanto que se vem
então os caçadores as matam, mas se podem chegar- seguidos, e perseguidos dos cães, lhes largam úa
lhe com os dentes, vingam-se bem. Acoti é outra flatulência (outros dizem é a sua ourina mijando-se
boa caça: são do tamanho de coelhos, mas tem as de medo) tão fétida, e activa, que peior, que se fosse
mãos, e pés mais curtos, e o corpo mais comprido, úa boa (boa) fumaça de grossa munição, os faz logo
que eles: a cauda é comprida, e bem felpuda, e o cair para a banda desmaiados. Agora se este efeito
focinho agudo; não só se domesticam, mas também nasce de especial antepatia, ou de especial
actividade de seo fétido? é questão controvertida.
fazem algúas bogiarias graciosas, em que imitam
Não só se admira o efeito, mas o ser tão instantâneo;
os macacos; e talvez sejam algúa espécie deles,
porque ainda que há flores, cuja fragrãncia é tanta,
porque brincam, folgam, e divertem os donos. As
e tão activa, que fazem desmaiar, como são as
suas carnes, não só são gostosas, mas sadias, e açucenas pelo que é perigoso dormir em algúa
por isso dão-se aos doentes. câmara, em que elas estejam, contudo este efeito
É célebre o cochinil pela sua excelente tinta só é, em quem está abafado, e em alguns mais
chamada do mesmo nome. Tem maior corpo, que delicados, e é mais vagaroso; mas o fétido da
grandes lebres [sic! O Padre Daniel estabelece aqui maritaca é tão grande, que tomba, e tão eficaz, que
enorme confusão entre a cochonilha, inseto, e a é instantâneo. Bem sei que na Índia há um animal,
chinchila, mamífero!]; porém como não tenho vivas a que os canarins, e portugueses chamam adibe
as espécies deste bicho, e do modo de extrair a sua em tudo parecido as raposas da Europa, o qual
tinta, só faço este apontamento; para que os leitores seguido, e perseguido dos cães lhes larga sua
saibam que também há este bicho nas matas do ventosidade tão pestilente, que os cães sâo forçados
a virar o focinho; mas não é sempre, nem com (com)
Amazonas [sic!], e possam buscar a sua descripção
a promptidão, e menos com a eficácia de maritaca.
nos muitos autores que dele tratam [No códice, até
este ponto, riscado o parágrafo com traços verticais].
Como também a notícia de outro animalejo tão CAPÍTULO 20°
vermelho, que, quando morto, basta chegar-lhe o PROSEGUE-SE A MESMA MATÉRIA
pincel tocado em ágoa, para poder fazer quaesquer
debuxos do mais vivo escarlate; de que só tenho Rezão é, que tenham já o seu lugar os
úas muito longes espécies, e por isso não o descrevo macacos, que na verdade se fazem dignos de
com as suas individuaes propriedades etc. Coelhos especial menção pelas suas divertidas macaquices,
e galantes bogiarias tão semilhantes às acções
propriamente taes, não tenho notícia, que os haja
humanas, que parecem ser úa espécie intermédia
no Estado do Amazonas: há porém uns bichos do
entre a natureza humana, e a dos brutos. E de fato
tamanho, ou pouco maiores, que os ratões grandes,
em algúas partes arremedam tanto as acçõees do
a que chamam arganases [sic; cobaias], e a estes
homem, que servem aos moradores como fâmulos;
mui parecidos no feitio, menos em não terem rabo, e na mesma América no Reino da Flórida até vão
ou muito pequeno, cujas carnes são tenras, e buscar ágoa na fonte, e encher as vasilhas para o
gostosas; e tem muita estimação, especialmente no serviço de seus donos. E na África se contam vários
Amazonas castelhano, e Rio de Quito, aonde os casos trágicos de grandes monos, que apanhando
chamam coelhos, e como taes os criam em páteos, algúas negras, as levavam para o centro dos matos,
ou em quintaes, como em próprias coelheiras, em onde tratavam, e coabitavam com elas, como
que em breves tempos multiplicam muito. Os índios próprios maridos. E os naturaes do Brasil, e também
naturaes os tem também por úa das suas mais alguns da Africa, dizem, que os macacos são gente,
regaladas caças, posto que os portugueses não e que se disfarçam, não querendo falar para que os
fazem deles muita estimação. brancos não os obriguem, como aos índios, a remar
Segue-se agora o arminho [que não pertence nas suas canoas: nisto bem se vê que erram; mas
à fauna amazônica, nem neotropical], símbolo da diriam bem se os chamaram um arremedo da gente.
Há no Estado do Amazonas as muitas espécies de
limpeza, e protótipo da pureza, e castidade. É do
macacos, por conduzirem muito os seus climas, e
tamanho de um láparo, com pêlo, ou felpas mui
terras para a sua multiplicação, e vivenda; posto
fino e limpo. É tão amantc da sua limpeza, que pela
que não cria aqueles grandes macacões, e feios
não manchar, elege o perder a liberdadc, e também
monos, de que abundam as regiões da África, e
a vida. Por isso os caçadores para o caçarem basta
talvez muitas outras partes da mesma América.
lhes fazer um círculo de lodo em giro do lugar, onde Eu não me canso em os descrever por miúdo, por
anda o arminho; porque chegando ao lodo de serem já bem conhecidos em todo o mundo, pelos
nenhúa sorte o passará, não podendo fazê-lo de mandarem para todas as suas partes os curiosos:
salto, mas voltará para trás, embora, que se vá meter além de que, só se descrevem bem nas suas
nas mãos dos caçadores. No que dá um raro mesmos espécies, por se diversificarem muito,
documento, e exemplo aos meninos, e meninas bem entre umas, e outras; bem que todas são tão
educados, que ainda que os matem, escolham antes galantes nas suas macaquices, trejeitos, e bogiarias
o morrer virgens, do que macular a sua pureza no feitas com tal destreza, e ligeireza,que deixam a
feio, e impuro lodo de algúa acção menos decente. perder de vista os arlequins, e bolantins mais
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 341

destros, e ligeiros. Umas vezes parece, que não tem de sua natureza são menos umbrosas. A causa de
ossos pela flexibilidade, com que se movem: outras escolherem estas árvores, suponho eu, é para se
vezes parece terem asas pela ligeireza com que verem bem uns aos outros, ou para melhor
sobem; e assim outras habilidades todas dignas da observarem ao longe se vem alguns caçadores, feras,
nossa admiração. Direi por partes o particular ou gaviões, dos quaes se devam acautelar, ou por
distinctivo de cada úa das suas espécies, saltem úa, e outra rezão. Sobidos todos a árvore, ou coro,
[ao menos] das mais conhecidas e comúas em toda pelas suas pernadas, e ramos se accomodam cada
a América, e principalmente Amazonas. um conforme a sua gravidade e ancianidade,
Sejam a primeira espécie os macacos, que deixando desocupada úa das principaes pemadas no
chamam coatás, que são os maiores, em todo aquele meio da árvore, e eles todos a roda nos seus lugares
Estado: e se não são parentes dos grandes monos tão quietos, e com tal silêncio, que se não vê, nem
de África por não serem tão mal encarados, não sente bulir, nem úa folha. Postos neste alto silêncio,
diferem muito deles na grandeza. São do tamanho dá o mestre da capela, ou vigário do coro o compasso,
de grandes galgos, e talvez alguns os excedam, e que é um passeio apressado pela verga, ou pernada
também de corpo esgalgado, ou mais fino na cintura. do meio expedita, e acompanha o passeio, ou
São pretos, e altos como os galgos, cauda, e cara de compasso com úa voz, ou urro semilhante a um
macacos; mas não feios como os monos, antes mais baixão. Levantada a antífona, logo todos os mais dos
bonitos, que alguns pretos de Guiné, ou Cacheu. É seus lugares acompanham o vigário do coro com o
tão meigo, e afável o coatá, que parece só lhe falta o seu canto, já levantando, e já abaixando, agora
falar como a gente, com quem se abraça como fazendo algúa pausa, ou mórula, depoes apressando
qualquer criança. Com serem tão grandes são muito mais, ou menos: úas vozes garganteando, outras só
mansos, e se amansam muito facilmente: nem tem entoando; e entretanto não cessa o vigário do coro,
aquelas investidas coléricas, com que algúas vezes ou mestre da capela de dar o tom, e fazer o compasso
se fazem aborrecidos os monos de África. Rezões passeando, e apressando o passo de úa para outra
todas, porque alguns curiosos preferem a todas as ponta da pernada, enquanto dura o coro, que é por
mais espécies de macacos para [roto o original], algúas horas tão bem entoado, que alguns dizem ser
mimo, regalo, e divertimento dos homens. só úa voz do vigário[;] ouve-se de muito longe.

A segunda espécie são os macacos guaribas, Acabada a reza, ou matinada, pára o vigário
cuja república mais parece racional, que brutal; e do coro, e reprime o compasso com o passeio; e em
cuja vida, e instincto, mais parece discurso racional, continente fazem todos final, ficando em profundo
e vida humana, que beduína. São do tamalho de silêncio por algum espaço, e ainda tão quietos, como
um pequeno cão, pretos como azebiche, cara de o tem estado em todo o tempo das matinas, ou
moleque, muito felpudos, de pelo tão fino como vésperas. Faz pasmar, que tendo os macacos gênio
veludo; e por isso as suas peles seriam óptimas para tão desenquieto, que não podem estar quietos, e
mitras de granadeiros, e talvez mais estimáveis, e sem bulir um instante, estejam neste seu coro, que
apetecíveis, que as dos ursos. A propriedade porém dura por umas poucas de horas, com tanta
quietação, e gravidade, que nunca já mais se tem
mais notável, e admirável destes macacos está no
visto bolir com pé, ou mão, nem ainda movimento
seu cantar, ou salmear com tão bela ordem, e com
algum de cabeça, ou corpo! O que é grande confusão
tal regulamento, que parecem frades a cantar, e
para os racionaes, e católicos, que ainda nas igrejas,
salmear em coro; e só lhes faltam as vozes humanas
e templos diante, e na presença de Deus, não só
para ser omnímoda a semilhança: tanto, que o nome
não costumam estar quietos, e calados; mas muitas
mais conveniente aos macacos guaribas seria o
vezes levantam a voz, e saem em tão descompostas
chamarem-nos coristas. Os moradores daqueles
risadas, movimentos do corpo, e desassossego da
rios, quando os ouvem, logo dizem, estão os macacos
vista, e dos olhos, como se estivessem em algúa
no coro: e não só é tarefa de todos os dias, mas farsa, ou comédia no meio de úa praça, sem
parece ser regra inviolável de manhâ, e de tarde. E atenderem, que aquele mesmo Deus e Senhor
para não haver falência já tem horas certas, e diante de quem estão com tanta irreverência, e
determinadas, para em tudo se mostrarem bem desacato, é o mesmo, em cuja presença tremem as
regulados; e certo, ou determinado lugar mais hierar quias do ceo, o qual com tr emenda
retirado da gente; e nisto observam o Evangelho que majestade, respeito, e horror os há de vir a julgar
diz: Cum oraveris intra in cubiculum tuum, et clauso algum dia. No respeito devido a Deus nos templos
ostio, ora Patrem tuum [quando rezares, entra em são mais imitáveis os pérfidos maometanos, que
tua cela e fechada a porta, ora a teu Pai]: porque a nas suas mesquitas são tão reverentes, e modestos,
oração para ser devota, e fervorosa deve ser com que não só guardam inviolável silêncio, mas nem
todo o sossego, e retirada do rebulício da gente, e ainda ousam a virar os olhos, e menos a cabeça,
embaraço da publicidade. Chegado o tempo, e hora para as bandas. E o que é mais, que os mesmos
de coro, sobem a úa das mais altas árvores, e mais gentios em algúas terras da Ásia, em que há templos
espaçosa nas suas pemadas, e ramos, para poderem do verdadeiro Deus, quando querem entrar neles se
caber todos, porque andam em grandes descalçam, e tiram a touca; e especialmente os gentios,
comunidades, e as árvores, que sempre são as ainda das castas mais ilustres, quando entram em
mesmas, são pouco copadas de folha, ou porque algúas casas do nosso Deus é com sumo respeito,
lhas desbastam, e alimpam por dentro, ou porque mas com inaudito exemplo de humildade costumam
342 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

varrer os pavimentos das mesmas igrejas com os anel, e por isso com ele dão volta, e se dependuram
cabelos da cabeça, que para isso desgrinham. Deixo nos paos, ficando de pernas acima, fazendo com
de ponderar a reverência dos católicos e armênios, ele tantos outros brincos, e meneos, com tanta, ou
que não se atrevem a entrar na igreja, sem fazerem com mais facilidade, do que fazem com as mesmas
na porta a Deus úa reverência com genuflexão, e mãos. Brincam uns com outr os com tanta
inclinação de corpo, rosto, e boca tão profunda, que galantaria, como se fossem meninos, e com a mesma
chegam ao chão; o que fazem por consideração, que aparência se assentam com tal sesudeza, que
as igrejas são os palácios do Rei da Glória, que neles causam admiração. São entre os macacos, os que
os está vendo. Pela mesma razão, aquele grande mais se domesticam, e tão mansos, que parece, nem
imperador, e exemplar monarca Carlos VI não
sabem morder, nem fazer algum outro mal.
tolerava, que alguém levantasse a voz, ou metesse
algúa prática nos templos, tendo destinado alguns Aos macacos da quarta espécie chamam [em
dos seus arqueiros para servirem de espias, e branco no manuscrito] são da grandeza dos
vigiarem os menos cautos, e reverentes: porque os barrigudos, e de cor cinzenta, ou esbranquiçados;
templos só são lugar de oração: Domus mea domus mas algum tanto mais altos, e compridos, que eles;
orationis [minha casa é casa de oração], como disse e menos grossos, e barrigudos. Também fazem
o mesmo Deus. E se tanto respeito deve haver nos muitas bugiarias, mas entre os macacos são na
templos, quanto mais no coro, em que se fala com sesudeza catões, e tão meigos, e afáveis, como os
Deus? Grande documento, de atenção nos dão os coatás, abraçando-se com a gente, e lançando os
macacos guaribas no seu coro, posto que sejam braços ao pescoço como menino, e outras
irracionaes! São tão concordes nas suas vozes, que habilidades de macacos. Tem porém um vício, ou
alguns duvidam, se [é um só] o que canta? Mas na ruindade, que os faz menos estimáveis, e é comerem-
verdade todos cantam, como claramente se vê no se a si mesmos os rabos principiando pela ponta.
grande som, e toada, que fazem: e também pela
Não se sabe se por fome, se por especial gosto, que
diversidade acorde, e concorde de vozes; porque uns
acham na sua mesma carne, ou se por tristeza, e
sobem mais de ponto, e outros floream
melancolia? E em começando, não há mezinha
garganteando, e todos, com serem tantos, com tanto
azeda, nem azíbar amargoso, que os retraa do vício,
acerto, e concerto de vozes, que parecem um só.
o que causa admiração, porque naturalmente hão
Alguns índios costumados a comer carne de sentir grandes dores. Símbolo mui próprio dos
humana nos seus matos, posto que façam muita amancebados, a quem não retraem, nem as dores,
estimação de todos os macacos (porque na verdade que sentem nos remorsos da consciência; nem as
são úa da mais excele [sic], e gostosa montaria, não
picadas dos temores da morte, e prenúncios do
só do destricto do Amazonas, mas também de toda
inferno, nem os males, que muitas vezes contraem,
a América) fazem mais apreço destes guaribas;
nem os dispêndios, que necessariamente hão de
porque dizem, que tem mais semilhança, e gosto
sentir na bolsa, e na fazenda. Não sei, quaes sejam
mais parecido a carne de gente. É certo, que visto
qualquer no espeto, não se diferença mais na sua mais brutos, se estes disgraçados, se os macacos?
figura da de um rapaz, do que em ser menor, e ter O que sei é, que estes como brutos não sabem o
cauda nem ter os pés tão formaes. As suas peles que fazem: aqueles porém sendo homens, não
são óptimas para o cortume: e sendo com o pêlo podem alegar ignorância em viver como brutos.
tem muitos outros préstimos, e alguns acha[ca]dos Os macacos da quinta espécie são os que
de flatos, e cól[ic]as fazem delas cintas, e usam delas chamam de prego, e são entre todos os mais
por bom remédio, além do bom préstimo, que podem divertidos, pelos seus muitos brincos, macaquices,
ter (como já dissemos), para as mitras dos soldados e bogiarias em que são tão agéis, que parece não
granadeiros. tem ossos, mas constarem só de arames, e serem
A terceira espécie são os macacos barrigudos, de engonços: de sorte, que em destrezas, e ligeirezas
chamados assim por terem grande barriga respective dão sota, e às aos mais destros, e ligeiros volantins.
as mais espécies, que a tem mais esgalgada. São Em Bragança houve úa menina de muitas
pretos pardos do tamanho de um menino de poucos habilidades, entre as quaes era úa o ser tão flexível,
meses, especialmente sendo algum negrinho de que se virava para trás, não só até o chão, como
Guiné, com quem tem tanta parecença; que vestidos, fazem muitos: mas até meter a cabeça por entre as
como alguns curiosos os trazem, só diferem em pernas, e falar com os circunstantes de espaço; e
terem rabo: porque a cara, e cabeça é muito ainda virar o pescoço, e cabeça para diante, e falar
semilhante, como se vê bem, quando andam em pé
com muito sossego: habilidade que é rara entre
vestidos com seus calções, gibão, e carapuça, que
homens! Mas a respeito dos macacos de prego, não
totalmente parecem uns moleques: são os
barrigudos, os que mais facilmente andam tem que admirar: porque já se viram, e já se dobram;
levantados em pé como qualquer menino encostado já se fazem em um novelo, e já se estendem em
a sua mãe. Tem a cauda tão comprida par minus, muitas outras macaquices com rara ligeireza, e
como todo o mais [ilegível] e bastantemente grosso: destreza. E na verdade que alguns fazem algumas
muito felpudo pelas bandas, e parte superior, e pela habilidades tão notáveis, que se pode duvidar, se
inferior, não só são lisos, e sem cabelo, mas muito neles obra mais o diabo, se a natureza? como eram,
calijados, pelo grande exercício que com ele fazem; as que eu mesmo admirei em um destes macacos,
e é tão flexível, que o podem enrodilhar, como um de quem tinha ouvido cousas galantíssimas.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 343

Deram-lhe um tição de fogo comprido mais de como os maiores; porém são mais hábeis para
palmo, e quase todo em brasa, em que pegou o saltarem, e dançarem diante dos donos, ainda
macaco pelo pé, ou bocado, que tinha sem fogo com quando estes vão de passeio, o que fazem com muita
tanta alegria, e gozo, como se lhe deram o mais destreza. Todos os desta espécie, assim maiores,
gostoso mimo. Principiou logo a brincar com ele como menores, são os mais feios de todos os
muito contente, já chegando-o à boca, e narizes, macacos na cor, e ruim pêlo, que é de cor ruça.
como quem cheira úa flor: já pondo-o no chão, Aos da sexta espécie podemos chamar
deitar-se sobre ele, virando-se, e revirando-se sobre barbados, porque tem úas, senão venerandas, ao
o mesmo, como em úa cama mui macia: já correndo- menos compridas barbas, semilhantes às dos
o pela cabeça, lombo, e barriga; e de quando em barbadinhos. Parece, que neles trocou a natureza
quando tornando a chegá-lo aos narizes, e cheirá- com os índios as sortes: porque tendo estes a cara,
lo; e à boca assoprando-o, para que não se apagasse: e barba lisa, e desbarbada, ou deslavada como as
e nestas galantarias continuou por grande espaço mulheres; tem os macacos barbas, e boas barbas.
até que finalmente se apagou de todo o tição, e então E posto que estas os façam feios, como fazem aos
como enfadado o lançou fora, sem que em tanto homens, não se pode duvidar, que na república
espaço queimasse um só cabelo. Deram-lhe segundo macaquice são eles os mais respeitados; porque
tição maior que o primeiro, e com ele renovou as em matéria de barbas desbancam aos mesmos
mesmas galantarias até se apagar esfregando-o, barbadinhos. No mais são semilhantes aos de
volvendo-se, e revolvendo-se em cima dele, como se prego, tanto nas habilidades, como na grandeza, e
estivera em úa cama de flores, ou bem acamadas, e cor parda puxando a ruça. Antes que passemos a
muito deliciosas rosas. tratar dos saguins, julgo necessário dar algúa
O seu grande, e vivo instincto mostram [bem] notícia desta república dos macacos em geral, além
em arremedarem a gente, e acções humanas tanto, da referida distinção nas suas mencionadas
que já houve morador, que nâo era ousado fazer espécies; porque ainda restam algúas suas
cousa alguma, que um o não imitasse de úa janela propriedades dignas da História. Seja a primeira a
fronteira, em que estava; do que enfadado o homem sua grande econorria de sempre viverem em
fingindo, que se fazia a barba, e se cortava o pescoço, comunidade, e com esta mesma união juntos
atirou com a navalha ao macaco, que fazendo o buscam as suas comedias, caminhando de úa para
mesmo se degolou. Mais galante foi a macaquice, outra banda dos rios em grandes bandos, sem
que exibio outro na vista, e presença de um Pontífice, jamais se dividirem, e apartarem uns dos outros,
que por estar já com as agonias da morte, ainda antes esperando uns pelos outros, e ajudando-se
que com todos os seus sentidos, entraram os mutuamente. E se por algum incidente se vem
familiares com ânsia a lançar mão, do que mais lhe obrigados a dividirem-se, e separarem-se, por
agradava. Vendo o macaco tirar tanta alfaia, correo serem assaltados de algum caçador, fera, ou gavião,
também ele a participar do espólio, e pegando na ao depoes dão seus signaes, e gritos para se
tiara pontifícia a pôs na cabeça, e ficou muito ufano, tornarem a ajuntar, e unir, e se esperam para irem
e grave com cuja vista deu no moribundo um tal sempre de sociedade, e companheirismo, embora,
fluxo de riso, que com a veemência de tão alegre que nunca ouvissem aquele ve soli [ve soli ou vae
paixão vomitou uma postema, e ficou bom. São soli: ai do que está só] do grande sábio Salomão. A
galantes os meneos, que fazem, quando lhe chegam segunda especialidade, também imitável, dos
macacos é o grande amor, que tem aos filhos, e o
úa fumaça de cachimbo; como também enganando-
modo de os crearem, enquanto pequenos; e a
os com algum papelinho bem embrulhado com algúa
grande caridade natural, e providência para com
boa pitada de tabaco: porque o desembrulham com
os velhos. A primeira se admira em buscarem o
tanto cuidado como qualquer pessoa, e logo vão a
bocadinho mais mimoso, e tenro para darem aos
cheirá-lo, e chegá-lo ao nariz, e chegando-lhe o
filhos, e em nos trazerem às costas, não só quando
tabaco fazem tantas caras, e taes visagens, que é
caminham, mas ainda estando de assistência em
um entremez. Certo boticário enfadado contra um, algum lugar, ou andando pelas árvores buscando
por lhe fazer na botica úa grande avaria, pegou em de comer. E os filhos de tal sorte se abraçam com
um pao para o castigar; o que vendo o macaco fogio os pais que ainda quando estes saltam de suas
para o quintal, e sobio com ligeireza a úa árvore: árvores para outras, não caem, nem largam: e se
mas vendo, que o dono saía com úa espingarda para os pais morrerem, nem por isso os filhos ficam
o matar, desceo com muita presteza, e pegando em desamparados, por tomarem logo outros conta
uma tampa de boceta de marmelada, que ali achou, deles, embora que nunca fossem seus padrinhos,
a embraçou como escudo, ou broquel contra o dono, e como se os perfilhassem, os tratam como a filhos
que não podendo reprimir o riso, perdoou-lhe o próprios. Vê-se esta sua providência ainda mais
crime: e são inumeráveis os casos, em que mostram claramente nos domésticos; porque apanhando os
o seu grande instincto, ou juízo. Há várias espécies índios, ou brancos algum filhinho, e trazendo-o
destes macacos de prego, uns são grandes como para casa, onde já tem manso algum grande, logo
cães, outros menores como gatos, e outros ínfimos, este o toma a seu cuidado, e põe às costas, se ainda
que são os mais ordinários. Mas todos tem a mesma precisa deste auxílio, e ajuda. A mesma caridade
galantaria, excepto, que os pequenos por pequenos usam com os velhos já ministrando-lhe a comida,
não são tão aptos para andarem a cavalo em cães, e já carregando com eles às costas.
344 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

A terceira singularidade é nas suas comedias, de úa para a outra banda, e ganhando espaço a
que ordinariamente são fructas, ou grão; e muitas modo de vai vem, até a última ponta da corda, que
vezes dão em algum milharal, e fazem grande é o último macaco, chegar a agarrar-se com as mãos
destroço; por gostarem muito do milho grosso. E na árvore da outra banda do rio; e assim que este
tanto nesta, como nas mais comedias põe suas pode bem segurar-se, larga [roto o original] outro, e
atalaias, ou sentinelas, que sobem a árvores altas de repente fica toda a corda de macacos da outra
para descobrirem o campo, e vigiarem se vem algum banda. Deste modo fazem outra, e outras cadeias
inimigo, o que fazem com grande instincto; e vendo conforme o bando até passarem todos para a outra
algum contrário, logo com um grito avisam aos banda: e os que por velhos, ou pequenos não podem
sócios, e todos se põe em seguro, podendo, corno dependurar-se, e segurar-se nos outros, passam por
acima dissemos da república dos papagaios, que cima da corda, como por úa ponte, antes do primeiro
também usam da mesma cautela. A quarta largar; e assim se ajudam uns a outros com tanta
propriedade é a lembrança e natural piedade, união, e uniformidade, como se fossem racionaes:
instincta pela natureza dos seus defunctos, os quaes e talvez que tenham entre si maior uniâo de vontade,
choram, e pranteam, como se fossem racionaes, e conformidade de afectos junto com Oconomei, do
melhor do que fazem as choradeiras em casa de que muitas vezes tem os homens!
algum defunto. Por saber deste seu costume, aquele Por estas raras habilidades, e vivo instincto,
insigne varão apostólico, e venerável Padre José de não só se domesticam bem, e com facilidade, mas
Anchieta, ilustre ornamento da Companhia de também aprendem bem quanto lhe ensinam; e por
Jesus, a quem o Brasil deve as tão desejadas pazes isso em algumas partes se servem deles para
com os índios, que andavam em cruéis guerras com trazerem ágoa da fonte para casa, além de outros
os portugueses, indo-se meter entre os índios, muitos ministérios, em que fazem as vezes de
expondo-se à morte pelo bem da Pátria; e na verdade moleques segundo a sua capacidade. Do seu vivo
que muitas vezes o quiseram matar, de que instincto, e habilidade tiram os índios, e dizem, que
milagrosamente o livrou a Santíssima Mãe de Deus, eles são gente, mas que fingem, e fazem tolos por
como se lê na vida de tão admirável missionário não remarem: isto se entende dos grandes, como
(todas as vezes que fazia viagem com os índios, e os coatás, e grandes monos da África; porque os
estes lhe pediam de comer, chamava pelos macacos, das espécies pequenas não tem forças para o
porque todos os brutos, e feras, e bichos lhe trabalho. Todos se põe em pé como gente, e tendo
obedeciam) os quaes vinham logo em bandos, e algum encosto, também caminham em pé, e ainda
encomendava aos índios, que matassem quantos sem ele o fazem os já costumados. Todos são
lhe eram necessários, o que faziam sem os macacos excelente caça e mui gostosa montaria, ainda que
fogirem, e depoes de providos os índios, mandava
os europeos ordinariamente as não comem, pela
aos macacos, que chorassem a seus irmãos, e lhe
semelhança, e aparência que tem com a gente. Para
fizessem as exéquias, e últimas honras, o que faziam
os caçarem usam de muitos modos: o mais usual
levantando o choro, e os gritos por muito tempo. A
é à frecha; outra occasião boa para os pilhar é
quinta singularidade é a indústria, de que usam
quando se apanham na passagem de algum rio,
para passarem, e atravessarem os rios de úa para
[como] acima falamos: porque basta dar-lhe alguns
outra parte. É o macaco um dos raros animaes, que
gritos, e vaias acompanhadas de acções, de quem
não nadam ordinariamente como os homens, o que
lhes quer atirar, para eles logo se intimidarem de
é por causa do seu instincto, e fantesia, que lhe
representa o perigo; e esta viva apreensão os enche sorte, que caem no rio, aonde com facilidade se
de tal pavor, e medo, que os faz desanimar, e apanham. Outro modo, e mui fácil é nas roças, e
naufragar; o que não tem os mais animaes, por não sítios, em que há milhos, armando-lhe laços mui
conhecerem o perigo. Para suprirem esta falta usam fáceis desta sorte. Põe cabaços, ou vasilhas bem
de úa admirável indústria, para passarem os rios, e seguras, e com algúa porção de milho dentro, e
as ilhas de úas para outras partes, que é escolherem pôr -se em cilada esperando por eles. Tanto que os
algúa grande árvore nas margens do rio, que querem macacos vem ao milharal, como esmerilhadores
atravessar, a que deite algum ramo sobre o mesmo acodem às vasilhas, e sentindo o milho dentro
rio, e se acham algúa outra correspondente na outra metem a mão, ou as mãos, a proverem-se; e então
margem, melhor o que tudo fazem com rara de repente os assalta o caçador, e os macacos não
providência, e eleição, tomando bem as medidas pelo podendo tirar as mãos cheias de milho, por ser
compasso de seu desmedido instincto. Sobem pois para isso o buraco, ou boca da vasilha estreito,
por esta árvore, buscam o ramo, e dele com muita nem tendo ânimo, e liberdade para abrirem as
ligeireza, em que são insignes, saltam para a outra mãos, e largar o milho, ou pelo inesperado assalto
fronteira. E se o rio é largo, e as árvores distantes do caçador assustados, ou por brutal ambição, que
usam de outra indústria; e é sobirem ao mais alto bem mostram nesta tenacidade da rapina, não
da árvore, e ramo, que cae para o rio, e nele se podendo fugir, se deixam prender do caçador: neles
dependura pelo rabo algum mais valente e neste se se simbolizam mui propriamente os usurpadores
pega outro, e outros até fazerem úa grande cadea, do alheio, e ladrões, que por não quererem largar
ou corda de macacos pegados uns nos outros; assim o [mal] ganhado, ou havido, se deixam perder, e
dependurados se vão embalançando pouco a pouco prender do caçador infernal.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 345

Também são, e pertencem a república dos abundância. Outra espécie dos mais galantes na
macacos os saguins de que também há muita república dos macacos é tão pequena, como um
variedade, e muitas espécies: há maiores do rato, ou pouco maior. O rabo, ou cauda não é
tamanho de macacos de prego da segunda espécie, comprido, mas curto, como o de cotia: é de cor parda
há medianos um pouco mais pequenos; e há ínfimos matizada de preto, que lhe dá muita graça: mas o
como láparos. Uns são louros, e com a figura de que o faz mais admirávd é a sua viveza, tal, que
leão tão própria, que parecem leõezinhos, tanto na parece tem azougue nos ouvidos, e nunca sabem
perspectiva do corpo, como na cor, e bem lançado estar quietos; e por deles se pode dizer - Stare loco
da cauda: e só na cabeça, e rosto tem algúa nescit [não pode estar quieto, ou no mesmo lugar].
diferença, pela falta das jubas leoninas, que estes
Entre outras habilidades, que tem uma é, que sabem
macaquinhos não tem: antes em lugar de[las] tem
catar cabeça, como qualquer rapaz, que o faz bem;
cara bem feita, e bonita; e na testa, ou fontes suas
porque gostam muito dos piolhos. A espécie, a que
entradas, que lhe dão muita graça e a mesma
cabeça, e orelhas são bem feitas, e lindas. Outros as naturaes chamam acoti puru é de pés, e mãos
são pretinhos, e muito azebichados, e felpudos; mas tão curtas, que parece andam de rastos: são mais
com o cabelo, ou felpa tão fina, como veludo; e posto compridos, do que grossos segundo a proporção.
que nem na cor, nem na calda, e felpa sejam Comem cacau, e mais fructas; e quando apanham
parecidos com os leões, como os louros; nas melenas aranhas, tem nelas o mais regalado pratinho. Saltam
da cabeça tem um muito vivo arremedo dos mesmos de úas árvores a outras com tanta destreza, e
leões, por lhe fazerem uma como coroa majestosa, ligeireza, que mais parecem pássaros a voar, do que
e agradável; e com rezão são dos mais lindos, e macacos a saltar. Talvez, que o pêlo destes seja o
estimados na república macaca, e os trazem no seio contraveneno das aranhas.
os curiosos. São do tamanho de láparos, e alguns
há tão pequeninos, que se podem fechar em úa mão.
CAPÍTULO 22°
Há muitas outras variedades destes macaquinhos,
e de outras cores, e todos fazem suas bogiarias, DAS PRAGAS MAIS ESPECIAIS DO AMAZONAS
como os grandes, quanto cabe na sua possibilidade Se no Paraíso Terreal, com ser um jardim de
com as mãos, e pés mui semilhantes aos da gente. deleites, creado, e formado para regalo dos homens,
Muitos fazem grandes diligências para os trazerem
houve úa venenosa serpente, que com o seu mais
para Europa, onde se estimam tanto, que há
que pestífero veneno inficionou a todo o gênero
curiosos, que logo a primeira vista oferecem, e dão
humano não é muito que também o paraíso do
por cada um l0, e 12 moedas. Mas ordinariamente
Amazonas sendo um tesouro de riquezas seja
morrem nas viagcns, ou por estranharem as ágoas
corruptas dos navios, ou os frios; porque são os inficionado de serpentes, e outras pragas em tanta
animaes, que mais o sentem, tanto, que ainda na maior cópia, quanto é mais copiosa, que o mais
mesma América, com ser tão cálida dormem de mundo a sua fertilidade: que não estão isento os
noute uns muito unidos com os outros, para melhor jardins de serem habitados de dragões, nem as
se aquentarem. São raros, os que chegam a Europa, mesmas flores livres de serem abocanhadas por
ainda trazendo-os no seio, ou como muitos os sevandivas! [sic]. São estas a maior praga do
trazem, em uns pequeninos cubos, ou cestos com Amazonas, para que também nos insectos se mostre
algodão nos quaes os metem, e neles dormem. A a grande fertilidade do seu terreno; a maneira do
espécie dos saguins brancos ainda tem mais Egipto, que sendo úa das mais férteis regiões, é a
galantaria pela sua cor: no mais são em tudo mais abundante de veneno: multa venena in Egipto.
semilhantes aos pretos, e do mesmo tamanho: mas Descreverei algúas pragas do Amazonas, para que
são mais raros. também não fiquem sem algum lugar nas Histórias,
as que o tem nos mais viçosos jardins.
CAPÍTULO 21º Mecuins sejam estes os primeiros, visto que
CONTINUA A MESMA MATÉRIA por serem os mais pequenos bichinhos, que na
Há outra espécie de macacos muito especial, república das sevandijas se admiram, merecem a
e por isso digna da História; não me lembra o nome primeira atenção para a cautela. Digo, que são os
próprio. Tem úa muito grande felpa desde a cabeça mais pequenos não porque ignore outras muitas
até os pés mui semilhante a dos chamados cães de espécies tão minutas, que não bastando a vista
ágoa. A sua cor é parte parda da cor dos macacos mais de lince para os divisar se vale do instrumento
de prego, e parte branca, as quaes duas cores melhor do microscópio para os sentir, de que também
se explicam com a semilhança do hábito dos adiante faremos algúa menção: mas porque no
Terceiros de São Francisco. A cara é diversa do Amazonas são estes entre os visíveis os mais
macaco de prego em não ser tão redonda, e pequenos. Há várias espécies destas sevandijas,
semilhante à do homem, mas mais comprida e o brancos, pardos, e outros: os mais ordinários são
queixo debaixo mais beiçudo, e comprido semilhante vermelhos. Vivem pela relva, e talvez pela mesma
ao dos cães ingleses. O falar, ou mais propriamente terra, tão humildes, como rasteiros, andam pelos
zurrar, é mui parecido ao urnear do burro: é mais pés de todos, porque a todos se humilham. Nos
sesudo, e sério, que os macacos de prego; mas é pas- [roto o original] o seu couto, onde nem o sol
um rico feitio, e por isso mais estimado; grande, com os seus raios os abrasa, nem as chuvas os
como um cão mediano. Na boca do Rio Madeira há afogam, nem os ventos, e frios lhes dão abalo:
346 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

quanto são mais pequenos, tanto vivem mais livres Tombura, a que os portugueses chamam
de contrários porque quanto cada um é mais bichos dos pés, é outra praga do Amazonas, tanto
humilde, tanto menos inimigos tem! Nas mesmas mais enfadonha, quanto mais caseira. São como úas
vilas, cidades, e mais povoações há muita cópia na pequenas pulgas, diversas porém no feitio, e na cor:
erva, e relva, que nasce nas ruas, e praças de sorte, nesta, porque são pardos; naquela, porque são
que se pegam ao calçado, e vestidos talares dos redondos, nem saltam, como as pulgas. Metem-se
viandantes, e por eles entram no corpo, e sobem ás pela carne dos animaes, e da gente com mais
mãos, braços, e rosto, onde com as suas pequenas destreza, do que piolho por costura; e dentro, cousa
mordeduras causam úa grande comichão, nem vale de meia cabeça de um dedo, fazem úa cova, onde
para a apagar toda a diligência das mais bem em um fole cria os seus filhos. Este fole é do tamanho
crescidas, e menos aparadas unhas. de um grão de milho grosso, e não é outra cousa
Ordinariamente se não divisam pelas [sic] sua mais, que a barriga do mesmo tombura, cuja
pequenhez, se não pela comichão; os que porém cabecinha só deixa fora do fole, com que vai comendo
tem boa vista chegam a divisá-los, como a ponta da a carne. Deste fole, ou barriga quando já na sua
mais subtilíssima agulha, vendo, que se bolem, e consistência, saem em grande multidão os filhos e
movem; porque estando parados ordinarianiente cada um se vai inclinando para sua parte furando a
não se percebem. Onde porém se deixam mais ver, carne, e fazendo sua cova, e fole: e assim se vão
não pela grandeza; mas pela multidão, é nas multiplicando de modo, que chegariam a comer, todo
galinhas, e pintos; porque se lhe ajuntam nas o corpo, não acodindo a tirá-los com tempo, e curar
pernas, e muito mais na cabeça em tanta cópia, as feridas, o que é fácil. São bichos caseiros, como
que lhes fazem um círculo em roda do bico, e as pulgas. A sua admirável habilidade está na sua
pestanas, para que também os piolhos tenham nas grande subtileza; porque não só furam a roupa, mas
picadas destes animalejos penas mais sensíveis, do também a carne quase meia cabeça de um dedo,
que naquelas, com que a natureza os veste! Porém sem se sentir. E muitas vezes só se sentem depoes
com o costume já se não fazem tão sensíveis; e por da creação do seu fole inteiramente repleto, e
isso os naturaes, e connaturalizados pouco caso completo; e quando então já se sente, é como um
fazem dos mecuins: não assim os reinóes, e novatos, espinho, cuja dor é tão tênue, e doce, que se por
que usam de vestido talar, pelo que em se recolhendo uma parte molesta; por outra parece alivia: donde
a casa, logo mudam os vestidos; e quando se vem nasce, que só se adverte neles, quando já grandes,
nimiamente molestados, se lavam com ágoa ardente, e ainda então sentindo, se a moléstia, não se
que logo os mata, o mesmo efeito faz a ágoa quente. conhece o lugar. Busca-se em sua parte e ele está
na outra; busca-se em um dedo, e ele tem a sua
Há uma espécie maior, e mais avultada, de cova em outro: e alguns buscam-se muitas vezes
que fala o Padre Gumilha no seu Orinoco ilustrado, primeiro que se divisem, e quando se divisam,
cujo veneno é tão activo, e tão penetrante, e subtil, parecem como a ponta de um alfinete preto no
que penetrando com muita brevidade os poros do interior da carne. Tiram-se com a ponta de úa
corpo, inficiona a massa do sangue, e mata sem agulha, ou alfinete, abrindo antes caminho para
remédio. Digo sem remédio, porque ategora não se poder caber, e sair todo aquele fole. O que mais custa
descobrio o seu antídoto. Matam não com a é abrir a brecha para desalojar aquele inimigo
mordedura, mas com o contacto do seu mortífero caseiro: também tem algúa dificuldade o despegar
humor: de sorte, que basta esmagar algum no a película do folezinho da carne, por estar muito
corpo, ou com os dedos para logo aquele humor unido com ela. Porém é úa dor não só tênue, mas
penetrar dentro, e matar. Por isso quando algum suave; a destreza, e mestria toda está em não
se pega, ou salta no corpo, ou vestido, não se há quebrar a película do fole, mas tirá-lo inteiro, para
de esmagar, mas assoprar -lhe, e afugentá-lo, o que que não fique algum filho, ou semente dentro:
é fácil; porque não são tão pegadiços como os mais porque torna a crescer, e multiplicar como o
mecuins, posto que são mais ligeiros, e por isso primeiro. Depoes de bem limpa a brecha, e cova, se
vão saltando, quando caminham. O mais admirável cura com sarro de cachimbo, ou com tabaco, o qual
também mata algúa semente se ficou dentro. Alguns
é o instincto do gado vaccum, que pasta nos
também escaldam a ferida com úa pinga de azeite
mesmos pastos, em que anda esta praga; porque
bem quente. Nas lógeas, e casas térreas há mais
vão assoprando os bocados, que vão comendo de
abundância, especialmente havendo descuido em
sorte, que antes de pegarem no feno, ou erva, lhe alimpá-las, e varrê-las. Os que andam descalços
dão um assopro, com que afugentam estas estão mais sujeitos a esta praga, porém são, os que
sevandijas. Suponho, que o mesmo fazem os mais menos experimentam os seus efeitos, por se
gados, se é, que por aqueles pastos andam outros banharem, e lavarem repetidas vezes no dia; e assim
gados; porque ordinariamente não apascentam não lhes dão lugar a entrar, antes se algum bichinho
mais gado, que o vaccum. Esta praga é rara no Rio quer entrar, logo o sentem e tiram; além de que
Amazonas, e seus estados, que a ser tão frequente, como tem os pés mais duros, e calejados, sentem
e numerosa, como as mais, faria pouco cobiçosas os bichinhos mais dificuldade a entrar.
as suas matas; posto que estas se comuniquem Os que sentem mais os seus efeitos são, os que
com as do Rio Orinoco, onde há quantidade como andam calçados; porque o mesmo calçado serve de
refere o citado Padre Gumilha, o qual lhe chama refúgio aos bichinhos para com mais segurança
[incompleto]. abrirem as suas brechas. A parte, que mais buscam
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 347

são os pés, e daí tomam o nome de bichos dos pés; algum novilho, a quem as cordas, que o seguravam
e nestes, o que mais buscam são os dedos; ainda pelas pontas, junto destas fizeram úa roçadura, em
que algúas vezes também entram pelas mãos, e que por inadvertência saltou úa bicheira, que em
corpo, porém são mais raras. poucos dias o comeo todo, e parecia o animal, que
Bernes são outra espécie de bichos mais todo ele se convertera em bichos. Tem porém fácil
raros, mas maiores, e mais pestilentes. São brancos, remédio, quando lhe acodem com tempo. Primeiro:
ou esbranquiçados: entram também pela carne, e assim, que se divisa a bicheira por algum sangue
tão subtilmente que não se sentem. Dentro se vâo podre, que vai manando da ferida; e pela grande
sustentando com dor pouco sensível, e quanto mais comichão que causa, se purifica a ferida de toda a
se vão enchendo, tanto mais vão inchando a parte sua bicharada, carne, e sangue podre, e depoes de
de sorte, que chegam a fazer um grande inchaço bem limpa, se lhe mete bastante sarro de cachimbo,
sem signal algum de bicho. Por isso, quem não sabe ou tabaco mascado. Por isso os vaqueiros, e os que
desta praga, e não tem experiência, sentindo estes tratam de gados, tem sempre à mão provimento deste
inchaços, quer curá-los como taes modificando-os remédio; porque o gado vaccum é o mais sujeito a
com lenitivos; e quanto mais (mais) os curam, mais estas bicheiras; as quaes o mesmo gado cura, quando
crescem; porque sempre vão em augmento. Os cães, pode chegar-lhe com a língoa: da mesma sorte os
e mais animaes são mais sujeitos a esta praga, e se cães não tem perigo nestas bicheiras, a que chegam
os donos não tem cuidado de os vigiar, e curar, não com a língoa. Segundo remédio: em lugar do tabaco,
só emagrecem, mas também morrem, não lhes ou na sua falta, usam alguns de cal, ou malanguetas
valendo a sua medicinal língoa. E não obstante pisadas. Terceiro[:] do esterco do mesmo gado posto
crecerem até a grossura de meio dedo (e mais, se os em cima da ferida por modo de emplasto; e assim
deixam) o buraquinho por onde entraram, e sempre outros as curam com outras mezinhas, e para mais
conservam, é tão subtil, que nem se vê, nem se segurança lhe atam algum pano.
percebe. Porém, conhecido pelos práticos, espremem Sendo porém o Amazonas sujeito a esta, e
com força o inchaço, até o bicho lançar fora a cabeça, outras muitas pragas, pela sua grande humidade,
na qual com ligeireza pegam com as unhas, e o e calores, causará admiração aos leitores o saber,
puxam para fora; porque ainda que grossos se que não consente o seu clima as pragas mais
estendem, e adelgaçam. Tirado o bicho, se cura usuaes, e comúas na Europa, como são pulgas, e
facilmente a chaga, como qualquer outra ferida, percebejos. De sorte, que se admira por cousa rara,
ainda que ad cautelam lhe metem, e põe alguns o quando se vê algum, ou alguns percebejos, como
sarro de cachimbo, depoes de bem limpa a ferida, na verdade algúas vezes se vem, ainda que tão raras,
ou tabaco mascado. O signal para o conhecerem é, que bem se pode dizer, não há esta praga no Estado
quando os inchaços nâo obedecem a cura algúa, do Amazonas, sendo tanta, e tão molesta, na Euopa;
antes vão crescendo, nem se divisa algum dos que só ela basta para inquietar o sossego de úa casa,
signaes, que ordinariamente tem as mais nascidas. especialmente no verão, que é o seu próprio tempo:
Bicheiras. Visto irmos falando na bicharia e sendo todo o tempo verão no Amazonas, não reina
inimiga dos corpos; tem aqui o seu lugar as lá esta peste. Há porém nos matos uns bichinhos,
bicheiras, que são úa das maiores pragas do que lançam de si um fétido mui semilhante ao dos
Amazonas, muito sujeito a elas pelos seus grandes percebejos, e se faz muito sensível aos passageiros:
calores. Originam-se de qualqucr ferida, e às vezes mas não consta, que façam outro mal. Quase a
basta úa pequena arranhadela, ou picada de vareja. mesma falta há de pulgas; e com mais admiração,
Criam-se pois na dita ferida bichos, que pouco a que não se habitando as casas por alguns dias, se
pouco vão crescendo, multiplicando, e augmen- criam nelas tanta cópia de pulgas, que andam aos
tando, se de sorte, que se não lhe acodem, em breves montes; sendo porém habitadas, e frequentadas as
dias se vão estendendo por toda a carne, e tiram a casas desaparecem logo, sendo o mesmo entrarem
vida, comendo da mesma sorte os corpos vivos, que os moradores em úa casa, que saírem delas as
fazem aos cadáveres, e carnes podres, por serem a pulgas, ou morrerem todas em poucos dias. Daqui
mesma espécie de bichos. E desta sorte matam os vem, que os brancos naturaes da terra não sabendo,
animaes, e gados, não os curando ao principio, que cousa são pulgas, e hospedando em suas casas
quando ainda tem remédio; que sendo já a bicheira, alguns reinóes na chegada das frotas, de que saem
grande, e chegando a comer as entranhas, ou a fazer com grande provimento para terra, vendo-se
grandes covas, já então não tem outro remédio, que mordidos delas, e cuidando serem corrimentos e
a cova. Eu prescindo agora, se esta bicharada, que comichões causados dos maos humores, se tem
se cria dentro da cute, se origina de algúa semente posto nas mãos dos médicos procurando com
de algum outro animalejo, como algúas vezes purgantes, e sangrias expelir a fervescência das
succede nas carnes tocadas das moscas, que nelas
pulgas, que finalmente com o clima da terra em
põe varejas; ou [legível] cedem da sangueira podre,
pouco tempo se desvanecem, e morrem.
e carne corrupta, como parece nestas bicheiras, e
nos cadáveres enterrados? porque ainda os filósofos Outra praga caseira do Amazonas são as
não se ajustaram neste, e outros pontos. O que baratas; e posto que estas sevandijas pertençam aos
admiro é a brevidade, com que se criam, e voláteis, de que logo trataremos, contudo por serem
multiplicam! porque em poucos dias crescem em domésticas, tem aqui melhor lugar. São bem
tanto número, que parecem formigueiros. Vi eu conhecidas na Europa, aonde também se criam,
348 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

posto que muito raras: não assim no Amazonas, conhecem, por terem a terra levantada à maneira
aonde é tal a sua multidão, que parece serem dos das toupeiras; e por estas estradas encubertas
aquelas terras a sua própria terra, e amada pátria. chegam ás raízes da hortaliça, e roendo aquelas,
Chamo-lhes caseiras, porque se criam em casa, nem fazem secar estas. O que vale aos hortelões, e donos
querem nada dos matos; porque os calores, e chuvas das hortas é, querer esta praga não só ralo, no nome,
não lhe fazem bom cabelo: nas casas sim, onde de mas também rara por pouca, donde se segue, que
dia estão muito quietas, e sossegadas pelos buracos sentindo-se algum, logo se mata.
das paredes, e gretas das táboas, mas chegando a
Bagre dos livros [Thysanura] são uns
noute, quaes morcegos saindo delas, procuram a
sua vida. E se as casas são velhas, ou não estão bichinhos pequenos, bem do feitio do peixe bagre, e
bem rebocadas, são nelas tantas, que parecem da mesma cor; só lhes faltam as espinhas, e como
enxames, a sair das colméas, e cobrem as paredes; bagre tem duas barbas tão compridas, como todo o
fazem porém pouco, ou nenhum damno aos mais corpo, senão mais, e tão flexíveis, que as
moradores; porque não mordem, ou se mordem, não meneam, como querem. Não são próprios só do
são muito sensíveis. Com o que mais molestam, e Amazonas, porque também em outras regiões, e na
se fazem aborrecidas, é com o seu fétido, ou catinga mesma Europa, especialmente em paredes frescas,
pouco agradavel ao olfato[;] também são molestas e de barro, onde vivem da umidade a qual acabada,
de noute, especialmente nas ruas, voando úas, e morrem: não assim no Amazonas, aonde são
outras, e desacomodando a gente, não só com os caseiros, e innumeráveis; e vivem ainda nas casas
vôos, mas principalmente com as suas carreiras, mais secas, e lavadas dos ventos com tão grande
que, pousando nos vestidos, dão por eles, pela damno, e prejuízo dos livros, e toda a casta de papel,
cabeça, cara, e cachaço. O maior damno, que fazem, que merecem bem o nome de praga, e das mais
é roerem os papéis, pastas de alguns livros, e pestilentes do Amazonas, quando aliunde são
vestidos: são perdidas por tinta de Nan Kin, e tanta bichinhos innocentes, por não fazerem algum outro
achem nos tinteiros, como chupam; e logo a largam mal aos moradores. Todo o mal, que fazem é nos
em cima de papéis, ou livros, estando perto; por livros, e papéi: e mal tão grande, que principiando
isso havendo aquela se deve cobrir, e encobrir a elas; ordinariamente na primeira lauda, e na primeira
e para maior cautela ter bem livres delas livros, e folha, os vão furando, e comendo até a última letra,
papéis de importância. São porém um grande regalo, e folha, até os acabarem de todo, comendo só o papel
e gostoso manjar dos pássaros, se lhe chegam, branco, e não tocando nas letras. Daqui vem, que
praecipue a pintos, e galinhas: e por isso com elas deixam os livros inteiramente perdidos; porque põe
alguns moradores criam as suas criações, apanhando as suas folhas a modo de renda; e feitas um crivo
em grande número, [ou] innumeráveis em de sorte, que ficam inúteis para o uso, e só úteis
frasqueiras, e caixas velhas, em que se recolhem de para o fogo. E desta sorte destroem, e deitam a
dia, e voam pouco, talvez por não verem, senão de perder não só os jogos inteiros, e caixões de livros,
noute. O modo melhor de ter sempre as casas limpas porém também inteiras livrarias, se não há quem
desta praga, e imundicia, é tê-las sempre rebocadas,
trate delas: e o mesmo risco tem todas as mais obras
e caiadas; porque tanto mais livres estão desta peste,
de papel: nem as mesmas bíblias, breviários, e
quanto mais lisas, e caiadas. Da mesma sorte tendo
estampas por mais sagradas, que sejam escapam
as salas, e câmaras expeditas de trastes, e madeiras
da sua destruição. E não só comem todo o papel,
velhas; ou tão justas, e unidas, que não possam
entrar pelas junturas: porque taes trastes velhos etc. mas também todo o grude, que leva massa; immo
são covil, e ninho delas; e quando alguma aparece, esta é a primeira víctima da sua voracidade. Por
dar-lhe logo caça, o que alguns fazem bem com uma estes efeitos merecem bem estes bichinhos o
tesoura; porque não são muito espantadiças; renombre de letrados, e doutores; porque toda a
esperam bem o golpe, por serem já afeitas à sua vida gastam em versar, e folhear os livros; e
confiança. Deste modo conservam sempre limpas as por isso de muita literatura, dando um grande
suas moradas os cidadãos, o que é dificultoso, quinao nos homens, que apenas no dia abrem algúa
quando elas se tem apossado, e multiplicado: mas vez um livro; e como estes são os mais, com razão
ainda então, se há cuidado, e diligência se extinguem, se pode dizer, que mais gasto dão aos livros no
especialmente dando-lhe caça como alguns, que Amazonas os bagres, do que os homens. E se os
bastantemente as perseguem. livros são tesouro, que enriquecem aos seus leitores,
Há outra espécie de baratas, a que chamam porque tudo ensinam, especialmente os espirituaes,
ralo [grilo-toupeira ou paquinha], que ainda que não que ensinam o caminho dos Divinos Mandamentos,
sejam caseiras, são mais damnosas. O feitio é o pelos quaes se chega à posse do tesouro do Céo;
mesmo, ou quase o mesmo das baratas ordinárias; naquele estado são os livros tesouro desprezado dos
excepto em serem mais pequenas: e assim como as homens, e tesouro muito estimado e prezado dos
domésticas nunca saem das casas, assim estas bagres, que deles tiram bom proveito, embora que
nunca entram nelas; mas vivem sempre pelas não tirem fruto. O remédio pois de livrar os livros, e
hortas, e quintaes, sustentando-se da hortaliça, não manuscriptos desta praga é o usá-los, e manusiá-
da rama, e folhas como fazem muitos outros los, folheando-os a meúdo, batendo-os, sacudindo-
animalejos, mas das suas tenras raízes. Para isso lhes o pó, e matando de quando em quando os
vivem, e andam sempre como toupeiras, por baixo bichos; porque só desta sorte se conservam
da terra, que lavram em canaes, os quaes logo se manuscriptos, livros e livrarias.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 349

CAPÍTULO 23º chegarem à gente, ou se queimam no fogo, ou se


DA PRAGA VOLÁTIL DO RIO AMAZONAS afogam no fumo; e assim usam outros de outros
remédios, que posto que não livram de todo, sempre
Ainda é mais abundante de pragas voláteis o evitam grande parte. Verdade seja, que nem sempre,
Amazonas, e bastavam estas para muitas as suas nem em toda a parte há a mesma multidão; porque
pragas, ainda que não tivesse outras: porque é tal a nas praias de area são menos e muitos nas praias
cópia, variedade e malignidade destas pragas de lodo, e por entre os mangaes são inumeráveis;
voláteis, que se pode questionar quaes sejam mais: mas esta abundância só é na occasião das luas,
se as folhas das árvores do seu tão vasto bosque donde vem, que nas mesmas paragens, em que úas
acima de 1000 léguas, ou se os seus mosquitos? vezes são inumeràveis outras não aparece um só.
Se as areas das suas extensíssimas praias, ou se Também parece, que são viventes de um só dia,
os voláteis pestíferos que produz pelos seus lodos e porque saindo de noute dos charcos, e mangaes para
lagos? São nuvens e nuvens estes voláteis; nem para o mar, nele finalmente caem, e morrem afogados; e
se explicarem basta qualquer comparação, que não contudo no seguinte dia em anoutecendo saem
seja a da chuva miúda, porque parecem chuveiros[.] outros tão numerosos exércitos: o que parece não
Nascem, e criam-se estas sevandijas dos muitos pode ser de outra sorte senão por nascerem cada
lagos, ágoas empoçadas, e podres, que ficam pelos dia, e impelidos dos ventos vem a acabar a sua breve
matos enlodados, [e] as imundícies, e podridão da vida na ágoa de que se formaram, tendo por
muita folhagem, que continuamente caem das sepultura o mesmo lugar, que pouco antes fora berço
árvores, e levam as enxurradas. Seja pois a primeira do seu nascimento.
praga, a que entre os voláteis é a mais pestilenle,
Há outras espécies destes mosquitos meruins
posto que é mais miúda, que os mosquitos meruins,
maiores, ou menores, mas os maiores são, os que
de que há várias espécies. Os mais ordinários são
ategora descrevemos tão miudos como pontas de
do tamanho de ponta de alfinete com asas
alfinete. Há outra tão miúda, que nem se vê, nem
proporcionadas a sua pequenhez. São pardos, ou
se acham, mas só se sente a sua comichão, e o fogo,
esbranquiçados. Onde mais habitam é nas matas,
que causam as suas picadas: esta espécie há
lodos, e praias do salgado; de dia, nem signal dão
também em algúas paragens de ágoa doce, e nas
de si, mas em anoutecendo saem em tanta multidão,
matas do Amazonas, mas não são em tanta cópia,
que parecem chuveiros sobre os navegantes, e
como os naturaes do mar. ‘I’odos assentam, que esta
passageiros: e tem tal astúcia que não só accometem
grande comichão, que causa a sua mordedura é
a cara, mãos, cabeça, e toda a parte, que acham
puro veneno, porque de outra sorte se não faria tão
descuberta, mas metendo-se pelas aberturas dos
sensível: da mesma sorte, que a mordedura dos
vestidos envestem ao peito, braço, pernas, e todo o
quase invisíveis mecuins, de que falamos no capítulo
corpo; de sorte, que só algum bom, e bem tapado
antecedente. Tem também a propriedade dos mais
toldo poderia impedir, não todos, mas algúa parte
mosquitos em acudirem à luz, onde morrem tantos,
deles. Mas como os exorbitantes calores não
que na occasião das luas nas suas paragens se
permitem taes toldos, porque abafam, ficam eles enchem as candeas desta imundícia de modo, que
sem obstáculo para accometerem a sua vontade, pela manhã se não divisa o ferro. Piuns é outra
posto que morram, como mosquitos. A sua espécie de mosquitos maiores, que os referidos, e
mortedura causa um tal fogo, e comichão, que não também mais pestíÍeros: tanta é a sua peçonha, que
bastam quaesquer unhas por mais crescida, que deita a muitos na cova! São do tamanho, e feitio
sejam para as modificar, ainda que cocem até dos mosquitos do vinho, cuja semilhança é mais
sangue. São trabalhosas as viagens do salgado pelas própria de pequenas moscas, do que de mosquitos;
más noutes que fazem passar estes mosquitos e também como moscas andam de dia, e não de
meruins: quem mais o paga são os pobres índios noute. São ao contrário dos meruins, porque estes
remeiros; porque como andam, ou nus por mais vivem nas partes do mar, e os piuns no centro dos
expeditos nestas viagcns, ou quase nus, porque só matos, e senão do Amazonas, e mais rios de ágoa
com camisa, e calções, que parecem úa rede, não doce: contudo, nem por isso a sua picada tem algúa
tem mais remédio, que sofrê-los, se vão remando; e cousa de doce. Há duas espécies mais conhecidas.
se a canoa está parada por causa de alguma espera Úa tem a cabeça parda, e são menos nocivos: outros
de ágoas, ou baía, que temem passar de noite os a tem avermelhada, e tanto são mais lindos, tanto
procuram evitar de algum dos modos seguintes. mais pestilentes. A sua picada também causa
O primeiro é deitar a canoa bem para o largo, algúa, e assaz sensível ardor, mas levantam
se não há medo dos mares, ou quando não pode empolha; e os mordidos tenham paciência, que
ser, armar as redes, e ranchos nas praias, quanto para não escandalizarem a parte não devem coçá-
mais perto da ágoa melhor, onde corram bem os la sub poena de maior damno, qual é a inchação,
ventos, porque estes os levam, e mergulham no mar. que logo se segue: de sorte, que a alguns põe as
O segundo é, quando não há essas praias, ou não pernas, braços, ou cara, aonde morderam, como
correm os ventos, fazer, o que fazem os indios, que odres de inchados; e se não acodem a sangrar -se,
se enterram na area, deixando só de fora, para corre perigo a sua vida. É pois a sangria o remédio
respirarem a cara, ou narizes, e ainda estes com eficaz para as picadas dos piuns, e já depois de
algum pano por resguardo. Terceiro é fazer fogueiras bem sangrados não há perigo, ainda que tornem a
à roda, e dormir entre elas porque antes de ser picados. Por isso alguns brancos, que andam
350 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

por entre eles, e ordinariamente são só, os que vão carapaná porém é praga de todo o Amazonas: pois
aos sertões a fazer as colheitas, assim que sentem em todo ele o há em mais, ou menos quantidade
o veneno pela inchação, logo se mandam sangrar, e conforme as margens, e o tempo, por não serem em
daí por diante já não fazem caso do seu veneno, todo o tempo com a mesma abundância. O seu
ainda que a picada sempre é molesta, e levanta próprio tempo é nas vazantes do rio, de que se infere;
empolha, mas já sem perigo de vida. que se originam, e geram das ágoas empoçadas, e
Os índios salvagens tem muita desta peste nos do lodo das praias. E nestas vazantes são tantos,
seus matos, e aldeas; e como eles andam nus são como chuveiros, os quaes a maneira de ladrões,
mais expostos as suas picadas. Para as evitar usam saem a boca da noute, quase repentinamente, a
de remédios preservativos, quaes são untar-se de correr o rio. E assim como aqueles de súbito saem
pés a cabeça com algum óleo dos muitos, que tem das emboscadas a assaltar os caminhantes, do
nos seus matos, e alguns deles com grande, e mesmo modo os carapanás assaltam as canoas, e
desabrida catinga; mas é tão eficaz, que os saltando nos passageiros fazem o seu emprego com
mosquitos fogem dele, e os que chegam o pagam tal coragem, que além de lhe darem muito que fazer,
com a vida, caindo logo mortos; ou seja pelo fétido não só os obrigam a levar toda a noite em vigia,
da catinga, ou por vertude do óleo; sendo que como mas em um contínuo desassossego, dando-se
o corpo é tão calijado, porque endurado com o sol, bofetadas por picados ainda os mais pacientes, se
e chuva, e por isso mui semilhante ao dos animaes, não usam de algum resguardo: com a advertência,
não pode abrir neles muita brecha esta mosquetaria. que se no Amazonas, e rios, que chamam de ágoa
Pelo contrário succede aos brancos, e por isso os branca, há esta praga; e não nos rios colateraes,
menos sofridos estilam cobrir o rosto com caraças, que chamam de ágoa preta. Chamam os naturaes
ou máscaras, como também as mãos, e mais corpo, ágoas brancas às do Amazonas, Madeira, e outros,
quando vão às colheitas do sertão. que correm enlodados: e ágoas pretas às dos rios,
que correm, e tem praias de areia, como são quase
Morosoca é a terceira espécie pestilente do Rio todos os mais, que de um, e de outro lado correm a
Amazonas, mas a sua peste está só na picada, e dor encorporar-se no Amazonas.
muito sensível, que causam; não são porém
venenosos, como os sobreditos. A semelhança é dos Daqui vem, que só no Amazonas, e mais rios
mosquitos ordinários, algum tanto maiores, pernas de ágoa branca, pela vizinhança do mesmo.
grandes, e tromba comprida, em que tem tal força, Amazonas, há grande abundância desta praga,
que passam, e trespassam qualquer pano por mais tanta, que os pobres índios amanhecem nas canoas
grosso, e tapado, que seja. A sua picada é tão activa, tão picados de pés a cabeça a maneira, dos que se
e penetrante, que parece úa lancetada; não só levantam de úa boa camada de bexigas. E o peior é,
porque logo tira sangue, mas por fazer fogir, e que fazem a sua pela calada, por não avisarem antes
comprimir o corpo. Faz admirar, como um bichinho, de acometer, como fazem os da Europa; mas
que parece úa lama, e tão mole, que com qualquer assaltam de repente, e assim como não tocam os
toque se esmaga, tenha tal força na sua tromba, seus clarins para marchar ao assalto, tão bem nunca
que parece úa lanceta; e se acertasse a picar em úa tocam a retirada, porque se deixam matar sem
veia poderia fazer úa sangria! É bem verdade que fugirem, nem bolirem consigo. Nos lugares, em que
esta praga morosoca não é em tanta abundância há povoações, são menos, e já por acostumados os
como outras, que a ser tanta como a peste dos moradores não fazem caso deles poucos; não assim
meruins nas suas paragens, seria intolerável, quando navegam, porque como então acometem
especialmente para os índios, e aos mal enroupados. como chuveiros, armam os brancos seu toldo na
Também só presegue à boca da noute, e pela popa com algumas chitas, e pelas não poderem
madrugada, ou quando há luar: mas no dia claro, e passar, ou penetrar os mosquitos, por isso os
pelas trevas da noute estão retirados; e nas mesmas passageiros dormem sossegados; não assim os
paragens, em que andam havendo cuidado de lhes pobres remeir os, que aturam as picadas
fechar as portas, e janelas, não entram em casa. descobertos. Nas cidades, vilas, e mais povoações
Não são espantadiços, como outros mosquitos, onde antigas ordinariamente não há estas pragas, e só
pousam, aí param até se encher de sangue; e por há alguns mosquitos dos ordinários, como na
isso é fácil o despique aos picados por eles, o qual Europa, de que se não faz caso, e mais molestam
esperam a pé quedo, sendo que morrem com com a sua fina cantilena, do que com a picada de
qualquer leve toque. As suas paragens são sorte, que não há melhor meio para evitar estas
regularmente as campinas ao pé de lagos, de cujos pragas, do que povoar-se a paragem, em que as há:
lodos nascem e geram no tempo das vazantes. porque pouco a pouco se vão diminuindo, ou seja
A terceira espécie de mosquitos do Amazonas por se cortarem os matos à roda, e os ventos, que
são os que chamam carapaná muito parecidos á correm os afugentam; ou porque o fogo, e o fumo os
morosoca, menos em não ser tão forte, e activa, a consomem de todo: porque levados e enlevados com
sua picada: também são algúa cousa menores, e a formosura do fogo e luz, a buscam intrépidos, ou
por isso totalmente parecidos aos mosquitos atraídos, e nele acabam queimados vivos. Não há,
ordinários da Europa. São estes a maior praga, que que fiar em formosuras, que matam, quando atraem,
mais propriamente se pode chamar praga do e só aos que fogem não queimam! Estas são espécies
Amazonas: porque os meruins são mais de mosquitos mais frequentes e conhecidas no
propriamente do salgado na foz do rio: a morosoca Amazonas; mas não são só estas as suas pragas,
é em maior cópia nos lagos das campinas: o porque ainda restam muitas.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 351

Seguem-se agora outras pragas, tanto mais Por esta causa se preparam os índios, que vão ao
avultadas, quanto são maiores as moscas, que os sertão com úas vassourinhas de cipó, ou abanos de
mosquitos. Não falo das moscas mais ordinárias, e palma, com que lhe dão em cima, quando pousam,
conhecidas; porque essa praga não é só do para as afugentar. Digo quando pousam, porque
Amazonas, mas de todo o mundo, tanto mais nunca são em tanta quantidade como a praga dos
molestas, quanto mais atrevidas, pois delas não se mosquitos. Outros não se cansam com levar leque,
isentam ainda os mais nobres palácios, e recôndidos mas com as mãos lhe dão úa boa palmada, e as
[sic] gabinetes: só tem a diferença, que na Europa deixam esmagadas: porque assim elas como todas
só reina esta praga no tempo da primavera, e verão, as mais pragas voláteis do Amazonas em pousando
morrendo com os frios do outono, e rigores do a nada mais atendem, que a encher-se; e por isso
inverno; no Amazonas porém, como sempre é esperam bem a pancada. E para fazerem tiro não
[verão], sempre há moscas. E posto que a sua picada
avisam primeiro voando como as moscas, mas estão
seja das mais toleráveis na república dos voláteis;
nas folhas, e árvores das margens, donde
contudo é entre todas a peior praga, por ser praga
inesperadamente acometem os remeiros que
caseira, e doméstica, porque as mais são pragas
navegam chegados a terra, e ou [ilegível] fazer a sua
externas, e de fora, nem são de todo o tempo.
sangria, ou hão de ficar mortas, como
Varejas são úa espécie de moscas do mesmo ordinariamente succede, na empresa. Mutuca
feitio, que as ordinárias, mas muito maiores de sorte, amarela quase é tão inimiga da gente, como a
que cada úa tem duas, ou três das ordinárias; e sobredita; porque como esta não se satisfaz com
também a sua picada é muito mais sensível, ainda menos, com beber o sangue, dos navegantes; mas
que o seu peior efeito não é tanto a picada, quanto são mais raras como também a mutuca pequena. A
a sua imundícia, e grande multiplicação de
mutuca grande é do tamanho de grandes varejas,
bicharada, que dela se origina. São o maior
da mesma cor, e também mais chatas, e do feitio
contrário, que tem as carnes, e peixes secos; porque
das mais mutucas: e assim como são maiores,
quando se põe ao sol acodem logo as varejas, e delas
também a sua picada é maior, e tanto maior, que
se originam os bichos, e destes logo a corrupção, e
fazem úa sangria. A quem mais acometem é ao gado
podridão: e como no Amazonas são tão necessárias
as carnes salgadas, e secas, que são um dos seus vaccum, e cavalar, os quaes sentem tanto a sua
maiores contratos; por isso o remédio para as lancetada, não obstante a grossura dos seus couros,
livrarem das varejas é o porem-nas a secar, que as vezes exasperados com a dor, desabafam em
enquanto bem frescas, e com bastante salmoura; furiosas carreiras pela campina: e cegam-se de tal
porque as varejas só acodem, quando já vai tendo sorte estas mutucas, quando picam, que não bastam
algum cheiro a carne morta, mas não enquanto os açoutes das caudas dos cavalos para as fazer
fresca. Das mesmas var ejas se originam fugir, em quanto não se fartam de sangue. O mesmo
ordinariamente as bicheiras, de que acima falamos, fazem à gente, mas descarregando-lhes úa boa
ainda nos corpos vivos nas feridas, em que há algúa bofetada, pagam com a vida o seu atrevimento.
matéria, ou sangue podre, a que acodem 1ogo as A mutuca porém principal, e que merece mais
varejas, delas se gera a bicharada. Também não são distincto nome entre as da sua repiiblica, é a
só do Amazonas estas pestíferas moscas, porque mutuca verde, de tanto respeito, e autoridade entre
tão bem as há na Europa, e Ásia, mas na Europa
as mais mutucas, que se não é a sua rainha, sem
são menos, e no Amazonas são praga, e praga de
dúvida é o seu corregedor. Tem a grandeza das
todo o tempo, como dissemos das moscas
abelhas da Europa: o feitio mais é de mosca, que
ordinárias; e ainda haveria mais, se também
de mutuca; porque não é chata, mas bem feita. A
moscas, e varejas não tiveram seus contrários, que
cor é verde, como as cantálidas [sic], e talvez seja
delas vivem, como são os pássaros, e morcegos, e
multidão de aranhas, que se criam pelos matos. alguma espécie de cantálidas do Amazonas. Todas
as outras mutucas desaparecem, fogem, e se
Mutucas são outra espécie de moscas de peior escondem à sua vista: a razão não se sabe, mas
qualidade, que as já numeradas, e com a diferença pode-se conjecturar, que é antipatia; porque basta
de serem mais chatas, e espalmadas, e terem as aparecer úa onde andam enxames das mais
asas algum tanto mais longas. A sua picada é de
mutucas maiores, que elas, para logo moscarem, e
lanceta, que logo tira sangue, e tão penetrante, que
desaparecerem todas, quando bastaria qualquer
passa, e repassa qualquer vestido. Há várias
delas para lhe resistir; e daqui vem, que muitas vezes
espécies de mutucas. Quatro são as mais
desaparecem grandes bandos quase de repente, sem
conhecidas, e ordinárias, todas pouco de cobiçar. A
primeira é pequena do tamanho das moscas se saber a causa, que só descubriram alguns
ordinárias, mas chata. A segunda é preta, e quase curiosos. Manifestou esta experiência um viandante
do mesmo tamanho. A terceira é amarela, e maior. a outros companheiros, quando fazendo úa parada
A quarta é verde. A mutuca preta é em maior para descansarem, e tomarem algum alento as
abundância, e a que mais frequenta o Amazonas, cavalgaduras se viram acometidos de tantas
preseguindo [sic] os navegantes, não tanto os mutucas que nem os cavalos podiam pastar, nem
brancos, que andam vestidos, quanto os índios descansar os cavaleiros; e por essa causa antes
remeiros pelo discurso do dia; para que assim como queriam proseguir a jornada. T irou-os deste
de noute tem os despertadores dos carapanases, intento um experiente, que estava na comitiva,
também de dia tenham os aguilhões das mutucas. dizendo-lhe, que aquela inumerável multidão de
352 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

mutucas só duraria, enquanto por ali não mesma mísera] fortuna com as abelhas, que
aparecesse algúa mutuca verde, a cuja presença largando o ferrão morrem, não seriam tão atrevidas,
todas desapareceriam: pouco tardou a prova; porque mas tanto não morrem, que antes ficam mais
chegando úa mutuca verde, que primeiro se deu a contentes por despicadas. Não são só caseiras, mas
conhecer pelo sussurro, logo ao seu som moscaram também dos matos, em cujas árvores fornam, e
as mais, sem esperarem a sua correição. E com dependuram os seus casulos; e se alguém passando
serem tão temidas estas verdes das mais, não por baixo toca neles, despedem logo como raios
consta, que elas piquem ou molestem os passageiros contra o incauto, e as vezes o vão seguindo, quando
e navegantes: o que claramente se vio nesta fugindo procura evitar o despique, até lhe pregarem
occasião, porque logo se puseram a pastar as o aguilhão; mas em o pregando, e encravando úa
cavalgaduras com muita quietação. Basta esta sua vez, se dão por satisfeitas, e não repetem a ferroada.
propriedade para não (não) se contarem no número Há vários remédios contra estas picadas, como são
das pragas, mas antes serem estimadas dos untar a ferida, e inchação com azeite: pôr-lhe em
homens, como antídoto [roto o original] e cima cera dos ouvidos, e outros; mas todos são
ennumeradas á república dos viventes mais fracos remédios: dizem, que o melhor é ir logo
profícuos à natureza humana; e como taes se deviam ourinar, e faz passar a dor.
procurar fazer domésticas, especialmente Tatu caba são úa espécie de cabas negras, cuja
estendendo-se a sua antipatia a desterrar a praga picada, além de grande inchação, custa frio, e febre.
dos enfadonhos mosquitos. Porém a disgraça é, que Chamam-se tatu caba, porque fazem os seus casulos
sendo tantas as pragas de mutucas nocivas, sejam com semelhança de tatu: tatu é úa espécie de porcos
tão poucas as verdes; porque os bons ainda entre do mato [sic] pequenos com o focinho muito agudo,
os animaes são raros, do que se segue serem as e o lombo muito levantado: assim mesmo são os
taes pragas intoleráveis em muitas paragens, por ninhos destas cabas, e por isso lhe chamam caba
falta de corregedor, que fazendo-lhe correiçâo as de tatu. Esta espécie é mais rara, que a serem tantas
intimide com a sua presença, e castigue o seu como as que já dissemos se fariam intoleráveis aos
atrevimento com perpétuo desterro das margens, e moradores: porém, além de serem mais raras
matas do Amazonas; ordinariamente não vivem nos povoados, mas nos
matos. Mais bravas ainda que estas são as de úa
CAPÍTULO 24º espécie camada topi caba: porque são tão bravas,
PROSEGUE-SE A MESMA MATÉRIA que bolindo alguém nos seus ninhos, ou entendendo
com elas, o vão seguindo, e perseguindo até lhe
Já é tempo de entrar a praga das cabas, úa tirarem o sangue. Também causam, além de
das peiores do Amazonas, e entre as voláteis, as agudas dores, inchação, e causam úa grande febre.
que mais avultam. São úa espécie de bespas, mas Há outra espécie de cabas negras, que é a maior
mais terríveis, que as da Europa, e tão terríveis, de todas; porque são tão grandes como um bom
que causam febres, e frios. E não só são praga dos
dedo índice: e se as outras espécies sendo
matos, e brava; mas também doméstica, das
incomparavelmente mais pequenas causam frios,
povoações, e caseiras; porque as há dentro daquelas,
e febres, sobre agudas dores, que dores, febres, e
e destas. E se os moradores não entendem com elas,
frios, não causarão as desta grande espécie? isso
não fazem mal; mas se as ofendem, elas sabem se
poderão discorrer os leitores sabendo, que o seu
defender, despicar, e vingar. Há várias espécies de
aguilhão melhor se explica compar ando-se a um
cabas; as mais ordinárias, são pardas com asas
sovelão de ferro, do que ao mais duro espinho. Tem
pretas: estas são as que habitam nas casas; e fazem
o seu ninho por modo de casulos pendentes de um porém o singular predicado de serem juradas
pezinho mui delgado, mas bem forte. Neste casulo inimigas das aranhas cranguejeiras, outra terrível
fazem outros à maneira de nichos bastantemente praga no Amazonas, de que adiante falaremos, às
fundos, regularmente até doze. Dependuram-nos quaes assaltam, e matam dando-lhe uma, ou duas
pelas biqueiras das telhas de sorte, que as chuvas ferroadas. Há muitas outras espécies de cabas
os não damnifiquem; ainda que dela não fazem caso pequenas: úas do tamanho de moscas com um olho
outras, e por isso os fabricam por cima das mesmas em cada asa: outras maiores, que mosquitos; e
telhas: e se acham buracos suficientes nas paredes, todas causam grandes dores, e inchação com a sua
como dos andaimes, neles fazem tantos ninhos, picada. São quase todas estas espécies do mato.
quantas são as cabas, que ordinariamente andam Há muitos modos de as matar. O primeiro é com
em bandos, ou enxames. E não havendo vigilância algodão na ponta de um pao, e bolindo com ele no
nas casas, pouco a pouco vão entrando para dentro, casulo, logo o assaltam, e embaraçando-se no
e fazendo os seus ninhos pelo tecto, e forro com alg[od]ão, dão tempo a pôr -lhe o pé em cima: é
grande incômodo dos moradores: porque as vezes bom modo, mas nas casas, e lugares, onde há
caem abaixo, e a qualquer tope dos pés, ou mãos, abun[dância] é muito vagaroso; porque, além de
logo dão a sua picada tão penetrante, e de tão agudas escaparem muitas, só acabam úa a uma. Melhor é
dores, que fazem ver as estrelas, ainda que seja ao a indústria do fogo, atando um facho de pindoba
meio dia, seguindo-se logo à picada a inchação na ponta de um pao, e chegar -lhe de repente a
grande: e posto que a dor não dure muitas horas, a lavareda, da qual poucas escapam. Só tem o contra,
inchação dura dias, e basta uma picada para fazer de que não se pode usar este eficaz meio
inchar toda a mão, ou face. Se elas corressem [a de as extinguir em todos os lugares, e casas,
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 353

pelo perigo de incêndio. E [a] melhor mestria é a de luz, ennamoradas da sua beleza, ou envejosas da
visco na forquilha de alguma vara, que investem e sua formosura; e por isso quando algúa lucerna está
ficam presas; de cujo modo se matam, sem nenhum patente, acodem a ela tantas sevandijas, que pela
obstáculo, aos centos, cortando-as pelo meio, ou manhã se acham mortas em grande quantidade,
decapitando-as com úa tesoura. Depoes da[s] cabas, apagando muitas vezes as luzes, e deixando aos
moscas, e mosquitos deviam também contar-se no circunstantes, senão às boas noites, às escuras: mas
número das pragas, outras inumeráveis espécies como a enveja é o maior verdugo dos envejosos, às
de voláteis, que posto não sejam tão nocivos, como suas mesmas mãos morrem infelizmente, porque
os referidos, também pouco, ou nada tem de só úa disgraçada morte é pena proporcionada, [aos]
profícuos a natureza humana; e só servem de ornato que envejam luzes alheias.
ao mundo pela variedade, pois não menos se compõe
Merecem especial menção muitos outros
de úas, que de outras creaturas. Entre estas
espécies tão bem fazem sua figura úa espécie de volàteis com algúa semilhança de grandes moscas,
mosquitos inocentes quase tão pequenos, como os mas com sua diversidade no feitio: porque são mais
meruís; que acima descrevemos. Chamo-lhe grossas, e mais curtas. Podem chamar-se caseiras;
inocentes, porque não fazem outro mal, que porque vivem também nos povoados, e nas mesmas
meterem-se pelos olhos, ou atraídos da beleza, que casas; mas não são tão confiadas como as moscas,
nestes se lhes representa, ou por natural simpatia; e mosquitos, por se contentarem com as paredes
mas a sua inocência não os incita a morder, picar, de fora, onde fazem as suas casinhas, úas em
ou fazer algum outro mal. O seu maior exercício é buraquinhos, que fazem; e outras em forninhos de
andarem dançando em grandes nuvens diante dos barro feitos com toda a perfeição, sem serem oleiros.
olhos dos caminhantes, e às vezes tão perto, que A maior admiração está na mestria, com que criam
causam a estes algum tal qual impedimento; e por a seus filhos nestes forninhos; porque, assim que
issto se vem obrigados aos ir enxotando de quando põe as ovas, vão buscar bichinhos, que metem
em quando; sendo que eles talvez por lhes dentro, até encherem o ninho, ou casulo; e logo vão
lisonjearem a vista, vão fazendo adiante estas suas buscar barro, com que o tapam, e depoes se
danças: porém nem sempre as lisonjas são bem ausentam talvez a ordenar novas casas para os
vistas, e de receber! futuros filhos, que para aqueles já está dada a
providência necessária. Os bichos, que metem
As borboletas são tantas, e de tantas espécies
dentro não são tanto para sustento dos filhos,
no Amazonas, que não menos o fazem divertido, que
quando nascerem, como para chocarem, animarem,
abundante; úas brancas, e tão alvas como neve:
e vivificarem as suas ovas: e quando delas nascem
outras vermelhas, já de carmesim, já de púrpura:
os filhos, abrem estes os casulos, ou vem os pais
como veludo estas; aquelas salpicadas a maneira
abrir-lhos, quando pelo natural instincto sabem é
de cravos: roxas umas, outras azuis; e finalmente
tempo deles saírem dos ninhos. Os mais que fazem
de tantas cores, quantas produzio a natureza, e
buraquinhos pela parede, também os enchem do
inventou a pintura. Há úa espécie de borboletas
mesmo modo, e depoes entaipam. São todos estes
amarelas, que frequentam muito as praias dos rios
voláteis inocentes, pois nem mordem, nem
em tão numerosos. e inumeráveis bandos, que fazem
desacomodam os moradores; e só causam algum
amarelizar as mesmas praias, onde quase sempre
leve prejuízo nas paredes, que facilmente se evita,
pousam; ou porque nelas buscam algúa lambujem,
caiando-se.
com que se sustentam, ou porque a elas vão beber.
São todas as borboletas não só sustento, mas Quero já acabar a descripção das pragas
também regalo para muitos pássaros, que as caçam. voláteis do Amazonas, não por não restaram ainda
Por toda parte se fazem muito estimáveis pelas suas tantas por descrever, que seria um nunca acabar, o
belas cores, e mansidão, que dos voláteis são os querer dar notícia de todas elas, ainda que mui
mais inocentes. Os índios por mui propensos a sumária, no breve mapa da nossa História; mas
agouros também os tem com as borboletas, ou com porque sobejam as apontadas, para que os leitores
algúa das suas espécies: pelo que, quando algúa acabem de conhecer, que o Amazonas em tudo se
lhe entra em casa, ou voa perto, ou por entre eles, faz acredor dos títulos de abundante, rico, e grande:
quando estão divertidos, logo ajuízam tem hóspede e para que a narração de tantas sevandijas, e o
brevemente. E já a seu exemplo muitos brancos desabrido das suas pestíferas qualidades não nausee
acreditam o mesmo agouro, sendo que pela o gosto dos leitores, rematarei esta descripção com a
multidão, que há de todas as espécies maior das abelhas; que só elas sobrepujam para adoçar, e
admiração pode causar o não entrarem todos os dulcificar os dissabores, que os mencionados voláteis
dias, do que o entrarem alguma vez pelas casas. costumam causar, e para fazer apetecer aos leitores
Mas o certo é, que os agouros sempre, ou muitas aquelas terras, como os israelitas apeteciam aquela,
vezes saem certos, ou por indústria do diabo para da qual disse Deos, para exprimir a sua bondade e
enganar aquela rude gente, ou porque succedem abundância, que manava leite, e mel – terram
acaso. O mesmo agouro tem com os bisouros, de fluentem lacte, et melle - por ser tanta a abunrdância,
que há abundância no Amazonas, e de muitas e tão grande (senão mais) a bondade das terras do
castas. Entram eles também algúas vezes nas casas, Amazonas, como da Terra de Promissão; porque não
ou voam por entre os circunstantes, e destes vôos só são abundantíssimas de tudo, o que é útil para a
fazem os índios seus agouros. Porém o peior vida humana, mas desentranham-se um dulcíssimo
incômodo destas sevandijas é acudirem de noite à mel, em que deleitam, e fazem sempre gostosa a seus
354 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

moradorcs a sua perene abundância. Disse senão com agudas dores por todas as junturas, e
mais: porque é tão excessiva a sua bondade, que amaldiçoando de quando em quando o saborá; mas
não só dentro dos seus matos tem mel, mas também depoes de passada a trevoada das dores ficou são
dentro da mesma terra o há em abundância, no que como um pero. Saborá é um licor azedíssimo, de
excede à mesma Terrra de Promissão. São quase que estão cheios os muitos favos mais imperfeitos,
inumeráveis as diversas espécies de abelhas que que os favos de mel, e deste licor azedíssimo é, que
há no Amazonas, e nos mais rios, que o enriquecem as abelhas fazem dulcíssimo mel. A cor da saborá é
com as suas ágoas. Direi só três espécies. A primeira a mesma, que a do mais fino jalde. Pedia a rezão
chamam os naturaes iruçu, que quer dizer grande dizer agora alguma cousa de outros inumeráveis
[mel], e verdadeiramente merece o nome de grande, voláteis, que enchem os [ares], assim pelas praias,
não só pela grandeza dos favos, e grande abundância e margens, como pelos matos do Amazonas, tão
deles, mas pela qualidade do mel que em si é impercetíveis, que só se distinguem pelo
excelentíssima, de que muito gostam os paulistas, microscópio; mas fiquem reservados para outro
não só para tempero do palmito, pratinho, que muito tempo. Tão bem não dei mais individual notícia das
estimam, mas para as coalhadas e leites; e também abelhas, porque, além do sobredicto, nada mais tem
para o comerem às colheradas por sobremesa. O de especial, que não tenham as da Europa, aonde
cortiço dcstas abelhas é úa grande casola, que fazem são bem conhecidas, e ainda pelo vulgo bem sabidas
dependurada, ou pendente de alguma grande árvore, as suas singulares qualidades, instincto, e mais
e dentro desta casola fabricam a sua lavoura de propriedades, que tratam vários autores.
cera que é muito boa de sabora, e de mel. Para tirar
o mel é necessário cortar a árvore, o que custa caro,
CAPÍTULO 25º
porque as abelhas em ouvindo o primeiro golpe
DAS SEVANDIJAS TERRESTRES DO AMAZONAS
acodem em enxames a proibir o corte; e posto que o
não conseguem, contudo preseguem os Passando já das voláteis as pragas terrestres,
trabalhadores tão vivamente com aguillhoadas que tem o primeiro lugar os carrapatos: são estes de
provam ser verdadeiro o dito, ou ditado, que caro muitas castas, e de muita diversidade na grandeza,
custa, o que bem sabe: é bem verdade, que também mas todos pestilentes. Há uns tão miúdos, como as
elas experimentam em si bem a seu pesar o infalível mais miúdas pulgas, e há deles tanta abundância
deste ditado; porque lhe custa a vida o despique, pelos matos, onde estão em pinhas uns sobre outros,
que tomam, dos que desfrutam o doce trabalho da que basta qualquer destas pinhas para cobrir um
sua indústria; mas com morrer vingadas adoçam caminhante de pés a cabeça. Estão estas pinhas
as amarguras da própria morte. pegadas, e por baixo nas folhas, nas quaes tocando
os caminhantes logo principiam a mexer-se, qual
A segunda espécie chamam os naturaes
formigueiro, quando lhe tocam; e posto que os
tocana ira [;] dão-lhe este nome, porque os favos
caminhantes não parem, sempre apanham úa tal
que fabricam estas abelhas, ainda que grandes tem
porção, que quando reparam se acham com os
muita parecença com o bico do tocano. É mel mui
vestidos cheios, pelos quaes vão subindo até a
claro, cheiroso, e dulcíssimo; como testificam os que
cabeça, e insinuando-se pelo corpo, se apegam a
o tem gostado. A cera é muito amarela, e óptima
carne causando com a sua mordedura úa boa
para velas, curando-a primeiro; fazem estas abelhas
comichão, e além dela, chaga com inflamação; que
o seu mel em paos duríssimos como joataimirim,
tão pestilentes são os bichinhos! Os que estão mais
pao mui precioso por ser muito fino, de exelente
sujeitos a estas pragas são os que caminham pelos
lustre, e cor; em havendo algum [ilegível] é certo
ter, não só um, mas mais enxames; nunca porém matos com vestidos compridos, e talares: porque
se tira este mel, e cera, sem custo do machado, pela tem mais aonde se peguem: e alguns se vem tão
dureza do pao joataí. A terceira espécie é de úas cheios, que são obrigados a despir-se, fazer fogueira,
abelhas, das quaes não me lembra o nome, que lhe e passar os vestidos pelas chamas. Não estão tão
dão os naturaes. O cortiço destas abelhas é a terra, expostos a esta praga os índios, pela sua nudez, e
a que penetram cousa de três palmos de fundo, e lá os brancos, que trajam a ligeira, como quase todos
laboram a sua ceia; sabora e mel, que é muito bom. costumam, quando passam pelos matos. Nào há
Da sua bondade me certificou uma pessoa fidedigna, porém sempre, nem em todas as paragens mesma
que úa ocasião o comeo indo servindo de guia a abundância mas só em certos tempos do ano, e nas
outro homem ignorante daquele país; e chegando a matas capoeiras, isto é pequenas. O seu efeito peior
paragem chamada salgado, ou perto dela, acharam é, que quando os querem tirar do corpo, já estarem
dous negros cavando a terra com empenho, e fortemente agarrados, largam algum, ou alguns
perguntados, que faziam responderam: queremos dentes, que ficam pregados na carne, e a vão cada
tirar mel. Mel da terra! disse um dos dous, que era vez mais inflamando até que chega a fazer ferida, e
novato reinol, e se pôs como pasmado a ver, e a chaga, e a muitos assaltam herpes, que os deitam
poucos passos começaram os negros a tirar favos na cova. Para evitar estes perigos já os práticos não
de mel, dos quaes deram ao guia,e ao novato reino1, costumam tirá-los com força, mas com jeito, e com
que comeo bastante, mas do que mais gostou foi da fogo, tocando-lhe com algum subtil instrumento bem
sabora com ser azedíssima, por ter ouvido, que era quente; e só assim largam da carne. Outros os
bom remédio para o mal francês. Custou-lhe porém sofrem, e deixam até eles se encherem de sorte, que
caro, porque toda a noute esteve ansiado gritando arrebentam de fartos, e morrem. Não há estes
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 355

perigos, quando eles ainda vão caminhando, mas como cotias, quando se vem perseguidas dos cães,
só depoes de se apegarem à carne. Também e caçadores chegando a algúa destas teas saltam
presumo, que a ágoa os afoga, e mata; e essa será a acima, e passam por al[to] aos cães, sem caírem,
razão pela qual os índios, que andam, vivem, e nem romperem as redes. Outras quase semilhantes,
passeam tanto pelos matos, nenhum caso fazem e também [do] mato, não fazem teas, ou redes: mas
deles; porque logo se vão banhar aos rios, onde vivem em covas na terra, como os cranguejos, em
largam, os que apanham pelos matos. Se não é, que cuja boca se põe a espera, e dali fazem tiro, e
por terem a pele já bem curtida, não podem assaltam aos passageiros com tal ligeireza, que
damnificá-los, nem fazer na sua carne presa os quando o assaltado repara, já elas estão encovadas:
carrapatos. Peiores que estes, posto que mais raros ambas espécies são muito venenosas. De sorte, que
são outra espécie de carrapatos maiores, tamanhos os mordidos padecem tão grandes, e agudas dores,
como percebejos; porque à medida aa sua grandeza que não podendo soportá-las desabafam em gritos,
é maior o seu damno, quando pegam. Porém como e sentidos gemidos, ainda os mesmos índios, que
são grandes logo se percebem, ouvem, e facilmente na verdade são muito pacientes e sofredores. E só
se tiram, se ainda não estão apegados, mas depoes sentem algum alívio pondo na parte lesa moscas
de se pegarem, o melhor é, ou deixá-los fartar até esmagadas misturadas com azeite; porque atraem
caírem, ou despegá-los com fogo, como acima o veneno. Úa destas espécies, além de dores, faz
dissemos: porque de outra sorte há perigo de ficarem inchar todo o corpo, e inflama os olhos de sorte,
alguns tantos apegados, e causarem inflamação na que parece querem saltar fora da cara; e juntamente
ferida. Há outra espécie de outros maiores do fazem arrebentar o sangue pelos narizes, e ouvidos,
tamanho da cabeça de um dedo, as quaes fazem e em breves horas matam. Uma semelhante enferma
presa nos animaes, e gados, em que se fartam bem trouxeram ao seu missionário para lhe administrar
à sua vontade, até que arrebentam de fartos. os sacramentos, a qual vendo um índio ainda pagão,
Depoes dos carrapatos se seguem as aranhas, acudio com úa pele de macaco, e tirando dela uns
mas como em toda a parte há abundância desta cabelos, depoes de os queimar, e fazer em pós, lhes
praga, só apontarei algúas espécies mais especiaes deu a beber com tão bom successo, que logo a
do Amazonas, entre as quaes demos o primeiro lugar moribunda principiou a respirar, e a achar -se
às chamadas onças, que em outras regiões chamam melhor. Quem souber a espécie do macaco a aponte
tigre leão. São brancas, e mui galantes; de pequeno aquí. É digna de especial menção outra espécie de
corpo, pernas curtas, e com duas troqueses na boca, aranha, cujo nome não achei, quem mo dissesse,
que ordinariamente andam sempre abrindo, e sendo vere digna de grande nome pelo seu grande
fechando, e são as suas presas. São quase caseiras, préstimo. É mediana da grossura de um dedo, e de
mas inocentes: vivem de caçar moscas, de cujo meio dedo de comprimento, com todo o mais feitio
tamanho são; e da astúcia, com que as caçam lhe de aranha, de cor parda, e tão mansa, e inocente,
veio o nome de onças. Não fazem teas, como as que os rapazes pegam nela, e a trazem na mão. A
outras, mas investem-nas de salto, como faz a onça. sua especialidade consiste em se desfazer em
O seu caminhar é aos saltinhos, e quando vem a finíssimo fio, como os bichos da seda, ficando tão
mosca, se por estarem longe a não podem assaltar, inteira como antes: de sorte, que os rapazes pegando
só então caminham, mas com tanta, senão mais nela, lhe chegam um paozinho ao rabo, e nele se
cautela, do que o pode fazer o mais destro caçador, pega um fio que vão dobando em forma de maçaroca,
porque lhe vão [ilegível] as voltas por detrás muito andando com o pao á maneira de fuso, até fazerem
sorrateiras, e quando já estão perto, atiram-lhes o úa boa maçaroca. O fio é bastantemente forte, e
salto com tanto acerto, que poucas vezes erram o talvez tanto como a seda, sendo torcido; porque no
tiro, e nunca o lugar. A segunda espécie de aranhas mais é bem parecido: porém pela grande incúria
é, a que chamam cranguejeiras, das quaes há duas dos moradores, não se tem feito experiência.
castas: uma totalmente preta da grandeza, e figura A muita variedade de lagartas pedia úa grande
de cranguejos com pernas, presas, e mais feitio; e relação; só apontarei algumas para excitar as
daí tem o nome. São tão peçonhentas, que em espécies, a quem mais largamente as quiser
agarrando causam agudíssimas dores; immo basta descrever. Seja pois a primeira a lagarta chamada
tocarem com o seu cabelo no corpo de alguém, sem osga mui conhecida por muito doméstica, e caseira;
que agarrem, para logo deixarem, além de úa é do tamanho de meio palmo, sendo palmo de
comichão, agudas dores; porque são muito gigante; tem suas malhas amarelas; o mais corpo
cabeludas, e o seu cabelo refinado veneno. Há outras preto, e não muito azebichado. Quando caminha,
espécie destas mesmas cranguejeiras avermilhadas, é, como aos saltinhos, excepto estando enraivada,
e segundo dizem os índios, ainda mais venenosas, que então dá grandes saltos. Canta por modo de
e o peior é, que também as há caseiras: só tem o osga, e ordinariamente anda pelos telhados, e às
bem, de que por grandes se vem, e perseguem vezes desce aos sobrados, e se mete pelas gretas. A
melhor. Peiores são as de outra espécie, que chamam sua picada é tão venenosa [sic], que, além de causar
aranhas do mato, de cor parda, e posto que de bom grandes dores, mata irremedavelmente, se não se
tamanho, não tão grandes como as cranguejeiras. acode com os contravenenos, sendo que nem todos
As suas teas são grandes como velas, e tão fortes, aproveitam. O melhor é a ágoa da palmeira
como se fossem de pano de sorte, que algúa caça joçara, ou na falta dela, a sua cinza bebida em
356 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

vinho. Observou um missionário curioso, que com tanto desfastio? Soube, que o tal neófito era
quando picava, despedia de si a osga parte da cauda, tolhido de um braço, e de uma perna. Quem tiver a
como se esta não fora inteira, mas composta de curiosidade de fazer experiência deste préstimo dos
partes unidas, das quaes arroja a última contra lacraos em algum animal, poderá dar pés, e mãos,
quem quer ficar. Suponho porém, que só será, sem ser santo, a muitos europeos, e haverá mais
quando por si mesma não pode picar, digo chegar. trabalhadores, e menos pedintes.
Nem mesmo occorre dificuldade em despedir assim
Sapos são no Amazonas inumeráveis, e se a
a osga a cauda: porque também o porco espinho
sua pestilência fora proporcionada á sua multidão,
arremessa os seus espinhos contra seus inimgos,
seriam pouco de cobiçar aqueles estados do
como acima dissemos. A segunda espécie de
Amazonas: porque a cada passo, e a cada canto se
1agartas digna de espcial menção é úa dos matos,
encontram sapos. E nas praias de areias úmidas
cujo nome não me lembra, do tamanho de meio dedo
no comprimento, e também da grossura de um dedo. são tantos os sapinhos, que vão saltando adiante
É muito felpuda, cujo pelo é tão comprido como ela, dos caminhantes, como moscas, e parece, que
de cor branca, e semeado de amarelo, e todo tão actualmente se vão formando, e estão continua-
fino, como algodão. É tão linda a tal lagarta com mente nascendo da areia úmida. São porém tão
esta sua lã, ou pêlo, que está convidando, aos que a inocentes, que deles ninguém faz caso, como
vem a pegar-lhe, e admirá-la; mas tão refinado, o também dos já crescidos, e ordinàrios, que não
seu veneno, que basta tocar na carne o seu pêlo fazem mais damno, a quem os persegue, do que
para logo saltar com tão agudas dores, que não só a mijar para ele, ou contra ele; e chegando a ourina à
larga muito depressa, mas deitando-a fora fica carne levanta bolhas com aguadilha, e causa, não
sacudindo a mão, e gritando com dores. A terceira estou certo, se dores, ou ardor, mas uma, ou outra
espécie é úa com pele tão luzidia, e linda, que parece cousa é cousa de nonada, e de tão pouca moléstia,
prata vista de dia; e de noute ainda tem mais que os moradores não fazem caso dela. Entre os
galantaria; porque parece úa viva brasa. Há outra sapos merecem especial lembrança, os que chamam
também muito linda por pintada, ou malhada de canuaru e os chamados mocotó. O canuaru sendo
vermelho, mas muito nociva: porque a sua picada pequeno, ou pouco maior, que os ordinários, tem
causa agudíssimas dores; anda pelas árvores, e se uma vozeira, como a de um valente bezerro; bem
junto dela passa alguém, logo desce a picá-lo na se pode dizer dele, o que a outro intento diz o refrão
cabeça, ou onde pode, e logo torna a subir, enquanto castelhano: Tanta parola, y tan poca carnola! de
o picado vai gritando com dores. sorte, que os novatos, e europeos quando ouvem
Depoes das lagartas tem o seu lugar os lacraos, tamanhos mugidos nos matos, cuidam, que está
ou escorpiões, porque também entre as pragas, não perto algúa gran béstia, e é um pequeno sapo. Lança
tem o ínfimo lugar; e o peior é, que também são esta espécie de sapos pela boca úa rezina semilhante
praga caseira, porque vivem nas casas por hóspedes, a breu muito estimada, e preciosa, pelas excelentes
ainda que bem a pesar dos moradores. Não os vertudes, que tem na medicina, especialmente para
descrevo, por serem bem conhecidos, ainda na dores de cabeça, e cuido, que também para dores
Europa; posto que no Amazonas são tantos como de dentes. É também contraveneno; e suponho
praga. Há duas espécies: uma mais pequenos, e são serem estes sapos, os que são tão ligeiros em saltar,
os caseiros; outra maior, e são os dos matos; ambas que um rapaz não pode apanhá-los.
as espécies pestilentes, mas a dos matos peior, e O mocotó é também de muita estimação pelos
casta brava; porque causam com a sua picada
ossos dos pés, por serem grande contraveneno, como
grandes dores, e aguda febre. Os caseiros
dizem os práticos, ainda que não o explicam, no
ordinariamente também causam, além de agudas
que se vê se a sua vertude. São dificultosos de colher
dores, febre; posto que esta, e aquelas menos
por andarem sempre em matos carras-quinhos, e
intensas, e agudas. Dizem, que um dos melhores
contravenenos dos lacraos são os mesmos quase sempre metidos na toca. A sua voz só se ouve
machucados, e postos na parte picada (é remédio nos meses de março, e abril, e é tão tristíssima, que
eficaz, porque em mim mesmo o experimentei) parecem gemidos das almas ss. do purgatório. E
porque tornam a receber em si o veneno, que quando os inespertos ouvem estes gemidos
largaram. Deles se extrae o óleo, a que chamam óleo concebem grande pavor, por na verdade se
de lacraos muito medicinal, e seria bom, se os persuadirem, que são gritos das almas ss. do
boticários fizessem mais abundância dele, porque purgatório, não só pelo triste, senão também pelo
o haveria em maior quantidade, e seriam menos os alto gritar tanto, que se ouvem de mui longe. O seu
lacraos. Tem esta peste uma propriedade digna de cantar, ou gritar tristíssimo só é de noute, e
menção, e vem a ser, que apanhando-se algum vivo, ordinariamente nas ribanceiras dos rios, e praias
e cercando-o com vivas brasas em forma, que não o do mar, em que há inato carrasquinho. Há outra
toquem, mas só o impeçam sair do cerco, como ele espécie de sapos do mato tão grandes, que só a
vê todos os passos tomados, ou par braveza, ou por boca é tão grande, quando a abrem, que parece um
antipatia com o fogo, se não é por se ver com ele no tamborete armado: qual seja a grandeza do corpo?
rabo, desafoga a sua raiva contra si mesmo, picando- se pode ver pela pela grandeza da boca.
se com a unha da sua cauda, com que brevemente E se as doninhas atraídas do seu hálito, ou vertude
morre. Um missionário sinense viu um neófito, que e simpatia se vão meter na boca dos sapos, nestes
comia quantos achava, sem mais beneficio, que podem ir aos bandos, porque para entrarem tem
cortar-lhe a cauda, e perguntado, porque os comia grande portal. São mais raros estes sapos, que a
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 357

serem tantos como os ordinários, não haveria homens dotados de discurso, e as formigas de um
sustento para tão monstruosos animaes, nem bocado tão vivo instinctto [sic], que o não se lhe chamar
suficiente para tal boqueirão. Da pedra, que muitos verdadeiro discurso é só por não incorrer na censura
dizem criam os sapos na barriga, ou na cabeça é de alguns apaixonados, que não é muito tirem as
sem dúvida, que tem rara vertude medicinal para formigas o discurso (s), quando aos racionaes tiram
descubrir o veneno, estando presente, e não muito o juízo! Apontarei pois algúas das suas mais notáveis
distante da gente. Por esta vertude é muito estimada, espécies, e seja a primeira espécie de formigas, a
e se traz engastastada em anel, em forma, que toque que os naturaes chamam topiaí, por serem na sua
imediataente, na carne: porque,semel [uma vez] que república as mais corpulentas, e as que mais
chega veneno à sua presença, ainda que quem tem o avultam na personagem: bem merecem o nome de
anel não toque, nem pegue no tal veneno conhece, gigantes na sua república! São pretas
que está ali pelo calor, em que se abrasa, e comunica bastantemente azebichadas do comprimento de
a carne, ou dedo de quem o tem. É caso célebre o meio dedo de um menino já crecido, caminham pelas
que succedeo no Colégio de Coimbra dos Padres da estradas muito pausa-damente, e à grave, não em
Companhia de Jesus com Carlos Vl por uma aranha, bandos, como os mais formigueiros, posto que
que ia metida em um cacho de uvas, na qual só se também os tem, mas desacompanhadas, como quem
advertio depoes que aquele monarca sentio o calor não teme a ninguém. São tão duras, que se algum
na carne do dedo, em que tinha a tal pedra e declarou passageiro as pisa e ainda que faça finca pé em terra
havia veneno que tirada a aranha disse ser a mesma, dura, depoes de o tirar, vai a formiga continuando
por não continuar o calor, mas cessar logo. Basta viagem, com toda a pacacidade, como se não
esta vertude para a fazer úa das pedras mais sentisse tal pesadelo: não assim quando de raspão
preciosas, como na verdade por tal é estimada, sem com os pés, porque então, e só assim se esmagam.
bastar da o fraco conceito, que, por ignorante neste Não mordem com a boca mas picam com um ferrão,
ponto, forma dela o Doutor Curvo, dizendo, que dela como as bespas; e posto(s) que a dor dura pouco
não se sabe algum préstimo, para diminuir a sua tempo ad summum [no máximo] quarto e meio, ou
estimação, e grande apreço, que dela fazem, ainda meia hora, é agudíssima. A segunda espécie também
personagens taes, qual era Carlos VI. Para a vertude bem apessoada é a das formigas chamadas
ser mais eficaz advertem alguns, que antes de lhe toncanguiras, de que há duas castas, úa preta como
tirar a pedra, se prendam pelos pés os taes sapos, e a topiaí, outra cor de canela, do tamanho de bespas,
pendurem de pernas acima, e assim pendentes, ou e picam como elas com ferrão, que também tem na
dependurados se enraivem bem; porque com esta cauda; e são tão pestilentes, que causam terríveis
indústria fica mais activa a sua vertude. E afirmam dores por espaço de 24 horas, se não lhes acodem
os práticos, que o signa1 de avançarem às brasas, e com o contraveneno, que é a casca de uma planta
as comerem, não é infalível, de que tenham pedra: do mato, cujo nome me não lembra. Na sua falta,
porque todos comem as brasas, que se lhes deitam, usa-se do timbó: também andam pelos caminhos, e
e contudo, nem todos tem pedra. Costumam alguns se apegam aos vestidos dos caminhantes,
malfeitores abusar dos sapos, para os seus especialmente talares; o que vale aos habitantes é,
malefícios, dependurando um sapo, quando querem que também não são em tanta cópia, como outras.
fazer mal a alguém; e depoes de muito enraivado, Saúbas são outra espécie de formigas, que
lhe metem na boca algum bocado, v. g. de pano, e com não serem das maiores, são a maior praga do
depoes de babado com a saliva do sapo. o dão a comer Amazonas. São aver melhadas, e tem duas
disfarçado, a quem querem matar, e pouco a pouco. troqueses, ou presas, com que agarram estando
se vai definhando até morrer, quando morre o sapo bravas, com tanta tenacidade, que ainda depoes
definhado pelo deixarem sempre preso, e de mortas, não largam, de tal sorte que é mais fácil
dependurado, (Falta aqui a espécie de sapos que cortá-las à tesoura, do que largarem a presa. Por
tem corno na testa [,] muito medicinal para os isso muitos usam delas nas feridas em lugar de
doentes neufríticos, e do membro). pontos, unindo úa, e outra parte da cute, e
chegando as ]roto o original] esta, 1ogo faz presa
nelas com as suas troqueses; e cortando-lhe a
CAPÍTULO 26º
cabeça, fica o ponto seguro com as presas. São
DE OUTRAS PRAGAS DO AMAZONAS
estas formigas a maior praga do Amazonas; porque
Uma das maiores pragas do Amazonas, e de comem as roças; destroem as árvores, e minam as
todos os seus estados são as formigas. Sendo casas: destroem as roças roendo as plantas da
símbolo da diligência, e exemplar de prudência - mandioca, ou para melhor dizer, alimpando-as de
Vade ad formicam, o piger, et considera vias ejus toda a folha, e de todos os olhos, como em outras
[Vai tem com as formigas, preguiçoso, e observa o partes fazem as pragas dos gafanhotos: e com uma
seu mpetodo] - são tantas no Amazonas, que não circunstância admirável, e é, que ordinariamente
podem os naturaes alegar ignorância na pouca não damnificam à roça, em que tem o seu
economia, e diligência: antes se pode dizer, que tanto formigueiro, mas às de longe, e distantes da sua
mais são preguiçosos e inertes os seus habitantes, cova. O mesmo fazem às árvores; porque lhe tiram
como diligentes, e bem governadas as formigas, cuja os olhos, e alimpam a folha: daqui vem, que em
república não tem enveja as mais bem governadas, algúas partes, e sítios é difícil o cultivo delas: porque
e políticas dos homens, mais do que a menor tanto crescem cada mês, e cada ano, como e quanto
nobreza destas, e a maior excelência daqueles. Os as saúbas lhe vão cortando, e roendo; e trabalham
358 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

com tanta diligência, que em úa noite faz um estarem muito gordas, e cheias são muito vagarosas:
formigueiro a poda a qualquer árvore. Principiam a ajuntam-nas em cabaças, e depoes de bem torradas,
talar a árvore por uma parte, e acabam na outra: as comem como torresmos, que não cessam de gabar
umas em cima cortando, outras embaixo ajuntando, os castelhanos, e quantos se resolvem a gostà-las.
e outras carregando a colheita para os seus celeiros: Os segundos contrários são os pássaros, que quando
para isso escolhem noutes sossegadas, e sem vento, as vem voar as assaltam, e comem. Os terceiros são
nem chuva: esta, para que se não molhem, nem as feras tamanduá, que delas se sustentam, metendo-
elas, nem os seus provimentos, e para que a ágoa
lhe o linguado pelos buracos dentro, e depoes de bem
não impeça o caminho: sem vento para que este
cheio delas o tira, e as engole. Também os quinteiros,
não espalhe as folhas, que vão caindo, nem
que delas se vem desacomodados, lhe dão caça nas
embarace o transporte para as tulhas, árvores mais
sujeitas a esta inevitável poda, são as de espinho, suas mesmas covas, as quaes fazem muito fundas,
videiras, jasmineiros, e outras, a qual procuram os repartidas em muitas e mui distantes salas, e nestas
quinteiros evitar, pondo-lhe ao pé em roda algum tem muitas, e grandes panelas, as quaes tiram, e
alguidar com água, ou algum ramo espinhoso. lhas deitam no mar; ou com pólvora lhe dão fogo;
Arruinam as casas: porque as vão minando pelos ainda é difícil extinguir assim algum formigueiro,
alicerces, tirando para fora montões de terra. É por rezão de terem minado por baixo a terra em muita
célebre a demanda, que nesta matéria tiveram com distância. Na cidade do Pará quis um morador
elas os Padres Capuchinhos do Maranhão, os quaes extinguir um, que estava nas costas da cidade, para
vendo-se muito perseguidos delas, nem achando o que lhe queimou enxofre com tal engenho, que
meio para as desterrar da cerca, e convento, lhe laborando com uns foles fez ir para dentro todo o
puseram demanda, elegendo juízes por parte delas, fumo, que foi sair em outro lado da cidade, depoes
e depoes de alegadas por úa e outra parte as rezes, de a minar por baixo de parte a parte, sinal, que a
se deo sentença contra elas, não obstante o estarem mina das formigas occupava toda esta distância.
de posse, e serem creaturas do mesmo Senhor etc. Como estas formigas cavam tanto o centro da terra,
E foi notável o êxito, porque intimando-se-lhes a a vão tirando pouco a pouco para fora, e assim fazem
Senhora de tal sorte estiveram por ela, que sem mais
perto dos seus buracos grandes montões dela, e
apelação, nem agravo, logo fizeram total deixação
muitas vezes, se tem observado, que em lugar de
do convento, e cerca dos taes religiosos. Traz a
terra tiram grãos de ouro. Também nos mesmos
sentença [em branco no manuscrito] na sua
História. montões de terra se tem achado ouro, sinal das
minas, que há por baixo; e se os curiosos quiserem
Nas casas alimpam um alqueire de farinha de certificar-se se há, ou não ouro em muitas paragens,
pao, milho, arroz, ou de qualquer legume em úa em que há sinaes dele, será úa grande mestria meter-
noute: e suponho, que é esta mesma espécie, a que
lhe algum, ou alguns formigueiros de saúbas, que
em algúas partes chamam formigas da correição
como são diligentes mi [ilegível] logo na terra, que
[erro do Pe. Daniel; são formigas muito distintas],
foram tirando o mostrarão. O meter, e introduzir os
as quaes dando em algúa povoação, [as] alimpam
formigueiros é tão fácil, como pôr-lhe lá algúas
de tudo, ou seja comestível, ou vestuário; em cada
noute alimpam úa casa até as correrem todas. O formigas, quando estão cheias de ovas, e quantas lá
remédio. que então usam os moradores, quando meterem, tantos formigueiros terão em breve tempo.
sentem a correição em úa casa, é despejarem as Outra espécie de formigas pestilentes do
moradias, e porem em cobro todo o móvel de casa Amazonas, e ainda de toda a América, são as
até passar a correição. O milhor modo é dar-lhe formigas chamadas de fogo, nome próprio, e
fogo com ramos [roto o original] de pindoba, e expressivo do efeito que causa a sua mordedura.
continuando este remédio por algúas noites, Podemos chamar -lhe úa espécie de saúbas, por
especialmente na entrada por onde elas vem, não terem o mesmo feitio, presas, e cor mui semilhante
só juntas por modo de úa larga cinta, mas também a elas; mas são mais pequenas, como a metade das
formadas, dão a correição por acabada. Logo saúbas, ou ainda menos. Com a sua mordedura
diremos outros modo[s] de as fazer retirar de que causam com úa grande comichão um fogo, ou
usam os moradores do Amazonas. Nas primeiras fogagem grande; e daqui nasce o seu nome de
ágoas do inverno criam asas, com que voam, e se
formigas de fogo. E me parece, que bem se pode
espalham por onde querem, cheias de ovas, e muito
dizer serem peiores, que as saúbas: porque estas
gordas, aonde pousa cada uma, logo com as
causam sim uma tão grande dor, que quem a sente,
perninhas vão fazendo um buraco na terra até de
enquanto não vê a saúba, cuida ser algúa
todo se esconder; e lá debaixo desova em tanta cópia,
que dali se faz um grande formigueiro. E na verdade mordedura de cobra; mas as de fogo, posto que a
se não tiveram tantos inimigos, seriam aquelas dor não seja tão activa, causam um grande fogo; e
terras inabitáveis por causa de tantas formigas, mas comichão, que não cessa por mais que se cocem os
assim como são inumeráveis, da mesma sorte tem picados por bom espaço, e só tem prompto remédio
inimigos, e contràrios em grande número. Os na ágoa fria. Não andam em estradas formadas em
primeiros são os homens, não só todos os naturaes, fileiras como as saúbas, mas espalham-se de sorte,
mas também muitos europeos, os quaes as que há sítios inaturáveis por causa desta formiga,
apanham em saindo com asas, logo em pousando, onde os índios, e negros para poderem trabalhar
e com muita facilidade as colhem: porque por fazem umas como polainas de palhas, que atam
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 359

na barriga das pernas, e lhes cae sobre os pés em alto sobrado. O meio, de que usam os moradores
círculo. Também tem suas casas na terra, roem as para conservar as porcelanas, bandejas, e mais
plantas, e damnificam as searas; vivem, e habitam vasilhas de doce é porem-nas em alguidares de ágoa,
muito nas margens dos rios, e se sustentam nas mas é tal a indústria destas formigas, que nem ainda
viçosas ervas, que nadam por cima da ágoa nos no meio da ágoa lha escapa, o que fazem desta,
lagos, e enseadas, de sorte que entram nas canoas, (destas). Chegam as primeiras a borda da vasilha, e
que navegam junto a estes prados. As mesmas ilhas se vem, que a distância da ágoa é pequena se
volantes do Amazonas andam cheias destas avançam a ágoa, e abraçadas úas com as outras
formigas: nas suas covas, e casas como também formam úa ponte até o vaso do doce, e por cima
nos formigueiros das saúbas, vivem ordinariamente delas vão passando as mais muito enxutas, e depoes
algúas cobras, ou porque se sustentam das de passar todo o formigueiro, vão passando as
formigas, ou porque tem pazes com elas. últimas da ponte até todas entrarem. A mesma
Há muitas espécies de formigas pretas entre ordem observam ao sair, depoes de fartas, se o doce
elas é mui notável uma que faz o mesmo damno, não é de calda; mas se é lá ficam muitas, ou quase
que as de fogo com a mesma comichão, e fogagem: todas atoladas, e enterradas, por não poderem tirar
É também notável outra espécie destas pretas do os pés pegados na calda pegajosa. Se porém a
tamanho das saúbas, cuja economia é admirável, distância é maior, a que elas não se atrevem vão
quando caminham pelos matos em grandes buscar palinhas, e as deitam na ágoa até formarem
exércitos: por que como os caminhos estão a sua ponte de palhas. Vão também as vasilhas de
ordinariamente cobertos de folhagem, e lhe causam ágoa, e se elas não estão cheias ao depoes não podem
embaraço para carregarem o seu sustento, vão subir; e neste caso se ajuntam em montezinhos
primeiro alimpar a estrada, e aplainar o caminho umas sobre outras em grande quantidade coitadas
se é em pouca distância, porém sendo mais distante, das que ficam por baixo, ainda que de tal sorte se
e as folhas pesadas, ou porque são grandes, ou unem, que parece que nenhúa corre perigo, e
porque estão enlodadas, vão primeiro alastrando- quando alguém vai a beber chegam a borda, as que
se-por toda a estrada abraçando-se úas com as podem, (e as vezes entram estes montes na boca,
outras, com cujo modo de fazem um listão de dos que bebem) e assim escapam já em úa, e já em
largura, ou mais de palmo de sorte, que por cima outras vezes; e se deste modo não saem todas, saem,
destas passam as mais até se servirem todas; quando fica seca a vasilha, ou cheia; porque então
revezando-se úas às outras de modo, que as que sobem com a ágoa à borda. A outra espécie de
vão passando lá adiante se vão alastrando, e as formigas caseiras é muito miúda, mas no seu tanto
últimas passando. Outra espécie preta também de usam da mesma indústria, e economia, que as
bom tamanho habita nas árvores, onde fazem as antecedentes. Úa particularidade usam úas, e
suas casas por modo de cortiços, e passeiam nas outras, da qual se infere a sua grande economia,
ditas árvores, mas sem as damnificar; porque o seu que é, que não só o grão, e mais víveres, que ajuntam
sustento é por baixo, antes com muita utilidade;
nos seus celeiros, os deitam de quando em quando
porque nas árvores, em que elas tem as suas casas
ao sol para nunca se corromperem, mas também
não aparecem saúbas; e por isso alguns curiosos,
às suas ovazinhas costumam fazer a mesma
que nos seus sítios tem a peste das saúbas, e lhe
benfeitoria levando-as a soalhar todos os dias, ou
damnificam as plantas, põe nas taes plantas algúas
de quando em quando por algum bom espaço, e
destas formigas, e estão livres de as tocarem as
depoes as tornam a recolher. Muitas outras espécies
saúbas; e sendo tão fácil este remédio bem podiam
de formigas há, mas bastam estas, para os leitores
os moradores do Amazonas cultivar todas as plantas
for marem algum conceito destas pragas do
sem receio da peste das saúbas. E sendo estas
Amazonas, ainda que nem todas merecem ser
formigas de tanta utilidade não fazem mal: tem as
pernas mais compridas que as outras, e por isso chamadas pragas, por não serem daninhas como
correm muito. as saúbas, as de fogo, e as primeiras de que falamos.

Há mais duas espécies de formigas pretas, e


caseiras, mas inocentes por não morderem; e todo CAPÍTULO 27º
o mal, que fazem é buscarem doce, de que gostam PROSSEGUE A MESMA MATÉRIA
muito: não são elas sós, e como o doce causa sede, DAS PRAGAS DO AMAZONAS
depoes de o comer vão as vasilhas de ágoa, donde
não podem muitas vezes sair, e lá pagam a sua É mui notável na república das formigas a
golosina com damno dos moradores, que as vezes espécie das chamadas cupi na língua dos índios,
as acham em montes. A umas chamam formigas de que há duas castas: úa muito miúda, a outra
doudas, e podiam accrescentar doudas por doce. maior; ambas as duas castas são pretas. Fazem as
São do tamanho das de fogo, mas pretas, e mais suas casas nas árvores por modo de cortiço,
delgadas; e tão amigas de doce, que se pode duvidar, levando para isso barro com úa singularidade, que
qual é maior, se o gosto, e conveniência do doce, se sempre as suas estradas são encubertas, ou para
o trabalho em o guardar, e resguardar das formigas? mostrarem o seu recolhimento, ou para segurança
Não tanto pela falta; porque com pouco se das suas vilas; e fazem as taes estradas a maneira
contentam, mas porque o enxovalham; e quando é de carreiros, ou seja pela terra, ou pelas árvores,
açúcar, ou sequilhos não tem tanto perigo, mas ou seja pelas paredes: porque também dão nas
quando é de calda, ou molhado ficam afogadas, e o casas. Estes carreiros, ou careiros também são de
doce enxovalhado. É admirável a indústria que usam barro, e cubertos, por dentro dos quaes caminham,
para irem ao doce, embora que ele esteja no mais sobem, e descem sem que alguém as veja: e se
360 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

alguém lhos deita a baixo, tantas vezes os renovam, firmes; que basta tocar-lhe nas asas, e as vezes
quantas lhos arruínam, e com tal brevidade, que basta um assopro, para ficarem desasadas: as que
da noute para manhã aparecem refeitos; e o que caem na ágoa, na mesma largam as asas, que [por
mais é, que por dentro deles se servem, acarretam issol em algúas partes da [Asia (onde há praga de
víveres, barro, e quanto querem. Estes seus cortiços, cupi, a que lá chamam formiga branca) costumam
e casas de barro são grandes a roda de qualquer apanhá-las nela deste modo. Nas casas, almazéns,
árvore, ou só para uma banda; alguns do e conventos, ou colégios, em que aparece formiga
comprimento de 7, 10 ou mais palmos, e de grossura branca põe à boca da noute aqui úa, ali outra, e
de um boi. São de tal sorte solapados como se foram acolá diversas bacias grandes meias de ágoa, e
de estopa, e por entre eles estão em tanta quantidade dentro da bacia pouco fora da ágoa úa luz, v. g. , úa
que são inumeráveis, sem que de fora se descubra griseta com luz bem viva, onde acode logo toda a
mais que o montão de barro. E não sem razão lhes formiga, e fica toda nas bacias, donde não pode sair
deu a natureza este instinto de viverem, e por seu pé, e menos voando, por ter perdido na ágoa,
caminharem sempre encubertas; porque em algúa ou queimadas na luz as asas, ac proinde [e assim]
aparecendo descuberta, logo é assaltada dos nas mesmas as afogam lançando-lhe em cima ágoa
pássaros, que delas gostam muito por serem muito quente. Porém ainda que caiam na ágoa, se esta
moles, tenras, e suponho, que também de bom não está em bacias não morrem, nem se afogam,
gosto; e pela mesma razão os índios não lhe mas só deixam nela as asas, e saem para fora,
perdoam, e fazem delas torradas seus pratinhos. embora que desasadas para serem mais fácil, e
Alguns moradores usam deste cupi para sustento seguramente presas dos passarinhos, que nas
dos seus polhos, mandando todos os dias buscar occasiões, em que sae o cupi andam mui contentes,
algum torrão daqueles cortiços, e desfazendo-o dão e o caçam com destreza, e galantaria. Outra
boas barrigadas aos pintos, que não só gostam notabilidade é, que neste barro de que fazem as suas
muito delas, mas também engordam muito comê- casas algúas vezes involvem ouro, não porque sejam
las, e ainda para toda a creação usam alguns mais preciosas, mas por estar misturado com o
moradores, só deste sustento, furando debaixo com barro, que levam. Por isso alguns curiosos, não tanto
úa vara o cortiço, e logo caem tantas formigas, que no Amazonas, onde não fazem caso, mas em outras
bandos de galinhas se fartam; e no dia seguinte partes ali buscam, e acham ouro: e nos rios de Sena
aparece o cortiço tapado, e consertado. Multiplicam costumam as negras para inteirarem a porção de
em muita abundância, e por isso poucos cortiços ouro, que seus senhores lhe tem posto, guardar as
bastam para comer dos pintos, em todo o ano. Não cinzas da lenha, e arbustos que queimam; e no fim
damnificam as árvores, em que vivem, nem lhes do mês, ou do ano, se falta algum peso para
empedem o medrarem, não assim os paos secos, inteirarem a sua conta, em casa o tem naquelas
que roem de modo, que os consomem de todo: e cinzas: não porque as plantas em si sejam, ou
sendo uns animalejos tão moles roem tão tenham ouro, mas porque tem pegado o barro do
fortemente, que se sentem quando comem pelo cupi, no qual vem misturado o ouro.
estrondo. Dão nas casas a que sobem pelas paredes; Turu é a peste das embarcações do Amazonas,
e quando entram em algúa sempre vão de casa ainda que não é só do Amazonas. É semilhante à
mudada; porque logo principiam a fazer as suas minhoca, e propriamente é minhoca da ágoa, é
estradas encubertas, e nos tectos; ou por onde branca, mui delgada, e tão mole, e flexível, como
podem armam logo os seus cortiços: se dão em um úa tripa delgada; e faz admirar como um tão
caixão de roupa em úa noite a comem, ou desfazem, desprezível bichinho tenha tanta força, e actividade
e destroem toda. O mesmo fazem às pipas nas que roa, passe, e fure as embarcações, e qualquer
adegas, as madeiras nas casas, e aos tectos nos madeiro, pondo-o como um crivo! E se esta praga
telhados: por isso os moradores assim que sentem desse somente nos navios, que são ordinariamente
em casa este inimigo doméstico não descansam
de pinho, ou pao mole, não seria tanto de reparar;
enquanto o não acabam, desfazendo todos os dias
mas nas embarcações do Amazonas, que pela maior
assim os cortiços, como as estradas; e não só
parte são fabricadas de angelim, e itaúba, e
levantam da terra em travessas as pipas, e mais
semelhantes madeiras, cuja dureza pode competir
vasilhas de pao, mas também lhe põe ágoa nos pés,
com o ferro, é mais de admirar! mas é tão certo,
ou [breu] muito brando, e já fica impedida a subida.
como todos os moradores, e habitadores do
Em alguns tempos do ano cria asas o cupi, e Amazonas o experimentam, pois ordinariamente é
parece, que se lhe fazem quase de repente com as o turu a destruição dos seus barcos. O remédio,
chuvas, e então saem voando, não para onde que lhe aplicam é o breu misturado com azeite de
querem, mas para onde os levam os ventos. Entram andiroba, que com o seu grande amargor não deixa
pelas janelas, e casas, e pousam aonde succede; chegar a si estas lombrigas; e quanto podem
mas ainda que seja nos vestidos, cara, ou cabeça descansam as embarcações em terra não imediatas
da gente não mordem, [e só] desacomodam com o ao lodo, por onde anda escondido o turu; porém
seu caminhar; outras naufragam na ágoa. As asas levantadas, e suspensas em paos: e outros para
são maiores, que as mesmas formigas, e por isso mais segurança lhes dão [roto o original] amiudada.
lhe dão o nome de capas de asperges; mas são pouco É bicho não só da ágoa doce, mas também da
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 361

salgada. Há outra espécie de turu da terra mais quando dão na cara são mais aborrecidas. Deixo
miúdo, o qual só dá nas madeiras, e esteios de pao aos físicos a questão, se as impingens são só algum
duro, e quase incorruptível, fazendo nele uns humor [que]nte, e acre, que sae a cute; ou se são
buraquinhos, ainda que sem notável damno da sua multidão de bichinhos só visíveis pelo microscópio,
fortaleza. Por esta causa se não aproveitam muitos que causaõ aquela grande comichão, como já hoje
paos caídos pelas matas, e alguns mui preciosos; segue a mais comúa opinião! O que só advirto é,
porque sendo muito antigos estão repassados de que se devem curar logo no princípio, para que o
buraquinhos, ainda que servem para esteios, e obras humor que para ali corre se não aposse, e seja ao
grossas. Com serem bichos tão desprezíveis, e os depoes mais difícil a cura. São muitos os remédios,
índios do Amazonas tão nojentos, fazem destas dos quaes apontarei alguns em outro lugar.
minhocas, ou lombrigas, pratinhos de muita
Cobrelo é uma espécie de doença que também
estimação, e apreço, e ainda muitos brancos; para
se duvida se é bicho, se lombriga, ou se é algum
o que vão nas vazantes pelas praias de lodo, abrem
mao humor? Ordinariamente dá na cara, e é um
os paos podres, de que estão cheios os rios, e em
humor preto, que principia, e vai crescendo. cada
breve espaço de tempo enchem pratos, ou cuias,
vez mais, não só na grossura, mas também no
que levam para casa, guisam, e se regalam. E além
comprimento, tem o feitio de uma cobrinha por entre
de serem gostoso sustento, segundo dizem, também
a cute, e daqui vem o chamar-lhe cobrelo. E dizem,
tem seus préstimos, especialmente para os
que se chegar a circular ajuntando úa, e outra
convalescentes, e fracos: e sendo a sua pescaria tão
extremidade tira a vida ao enfermo; porém nunca o
fácil, bem seria que todos os gostassem para maior
deixam chegar a esses termos. Curam-no com vários
utilidade das embarcações. São óptima isca de peixe
remédios: o mais ordinário é pólvora desfeita em
para os pescadores de cana, porém no Amazonas
sumo de limão azedo, e molhando nesta calda algum
há pouco uso deste modo de pescar, por ser talvez
raminho de arbusto repetidas vezes, não só por cada
pescaria de pouca monta.
vez, senão por cada dia, açoutar a parte, e o cobrelo;
Lombrigas. Visto falarmos nas lombrigas da e depoes pôr-lhe panos molhados na mesma calda;
ágoa, ou turu também diremos algúa cosa das e deste modo continuando todos os dias acaba em
lombrigas dos corpos, as quaes posto que sejam pouco tempo: nem as dores são muito agudas. Há
comúas em todo o mundo, no Arnazonas são em outra espécie de cobrelo mais perigoso, cujo nome
tanta cópia, que bem se podem chamar úa das suas me não lembra, mas o poderão ver os curiosos no
pragas, para cuja criação convidam e concorrem Padre Gumilha, aonde o descreve com as suas
muito o clima, e calores: porque como a mãe das propriedades, de que eu não estou bem lembrado,
lombrigas é a ágoa, e pelos grandes calores do talvez porque dele nunca tive experiência no Rio
AInazonas seja o uso, e refrigério da ágoa mui Amazonas, sendo comunicável com o Orinoco, onde
frequente, e repetido, segue-se o haver tanta cópia é mais conhecida esta doença, por mais frequente. É
de sevandijas nos seus habitantes, que passam a como um cabelo, ou veia fina vermelha, a qual
ser praga, e peste. De sorte, que tem havido grandes principiando em úa parte do pé, vai crescendo com a
epedimias [sic] originadas só das lombrigas: tal foi
mesma fineza até o circular todo; e se chega a unir a
a grande que houve em 1740 e tantos, que
cabeça com o rabo parece ser a morte infalível.
indebitamente chamaram do sarampo; porque
Procuram pois atalhá-lo, e não o deixar chegar a taes
poucos morreram dele, mas 8, ou poucos mais dias
pontos: mas com mui diversa cura, que é tirar-lhe
depoes de se recolher o sarampo, dava urna grande
para fora a cabecinha, e ir puxando de modo que
corrupção intestina, que toda se resolvia em montes
não quebre (porque se quebra parece ser perigoso)
de lombrigas, que deitavam os moribundos, e pouco
mas sae todo o cabelo [Filária].
depoes expiravam. E afirmam muitos práticos, que
a multidão delas no Amazonas é causa de muitas Centopéias também não faltam no Amazonas,
enfermidades; e não são sós, nem as peiores, as assim chamadas pelo centenário número das suas
que se criam nos intestinos, mas as muitas que pernas, mas também são sevandijas de todo o
vivem, e andam por entre a cute exterior, posto que mundo. São da cor, e feitio de baratas, e só diferem
tão miúdas, que muitas vezes só se vem pelo delas no comprimento, e multidão de pés: de sorte
microscópio, untando com sangue o corpo, a que que alguns supõe serem algúa espécie de baratas;
elas logo acodem lançando fora as cabecinhas, que porém a guerra que entre si tem, não o mostra:
alguns lhes tem safado com uma navalha de porque as centopéas não lhes perdoam quanto
barbear: E aqui se vê bem, que não é certo o adágio, podem, e parece tem nelas o seu maior sustento.
que na cara se vê quem tem lombrigas. Há porém Tem na boca dous bracinhos como troqueses com
no mesmo Amazonas muitos remédios contra estas que acomete a presa; e com elas também mordem a
sevandijas, que não aponto por serem já sabidos: e gente e a seus inimigos causando-lhes mui agudas
só apontarei o leite da coxinguba tomado pela dores. Não só vivem pelos matos, mas também nos
manhã em jejum em pouca quantidade como meia povoados, e nas casas. Quando alguma morde, se
casca de ovo. Também o ananàs do mato. corta úa cebola em duas metades, e se esfrega bem
Impingens são praga no Amazonas, e por isso com ela a parte mordida; porque desfaz o veneno,
muito ordinárias principalmente nos europeos, e como eficaz remédio, que é contra as mordeduras
novatos: e posto que em todo o corpo são molestas, da centopéa.
362 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

muitas, e quase infinitas espécies desta boiasique,


º posto que com outros nomes. As chamadas
CAPÍTULO 28
caninena [sic] são de malhas pretas, e amarelas:
DAS COBRAS DO AMAZONAS outras tem vermelhas, e amarelas, e assim as
A maior praga, que criam as matas do Rio demais espécies se vão distinguindo pelas cores.
Amazonas, são as cobras, não só pela multidão, mas Jeraraca cobra brava, que alguns afirmam ser
também pela variedade. E mortífera actividade dos espécie de víbora, e semilhante a ela na actividade
seus venenos de sorte, que estão as brenhas cheias do seu veneno. É tão brava, que às vezes faz tiro
desta peste, e ainda as mesmas casas não estão aos mesmos cavaleiros, e basta ver ao longe um
isentas desta praga. E posto que succedem muitas cavaleiro, que vem andando pelo caminho, em que
desgraças de mortes, contudo parece especial ela está para logo se pôr em franquia levantando-se
providência divina, que não succedam mais, sendo ao ar sobre a cauda, abrindo a boca, e com a língoa
tanta a cópia, e variedade de cobras: de algumas fora com assobios parece estar já desafiando ao dito
daremos alguma notícia, porque de todas é difícil; e cavaleiro e ameaçando-o para o tragar de sorte, que
posto que já disse algúa cousa de algúas, quando é necessário, ou rodear o caminho, ou melhor atirar-
descrevi os animaes anfíbios, aqui a darei com mais lhe com algum bordão, que a quebre pelo meio. Pela
individualização, por ser o seu próprio lugar; e não sua braveza é já vulgar no Amazonas chamar
descrever com toda a miudeza algúas espécies, não jeraraca, a quem é bravo. Afirmam, que não criam
é por outra razão mais, do que por me faltarem as bem senão úa vez, e que os filhos já de si bravos, e
cabaes noticias delas. impacientes sem esperarem o parto, roem as
Merece o primeiro lugar a cobra coral, por ser entranhas da mãe, e a matam, e pela brecha, que
talvez a mais linda; e chamada assim, porque toda abrem saem para fora. Há muitas castas de
ela da cabeça até a cauda está vestida de anéis já jeraracas, e algúas pequeninas cousa de um palmo,
e muito lindas com diversas malhas: não só andam
vermelhos de cor de coral, e já pretos por sua
pela terra, e sobem às árvores, mas também se fazem
distribuição: um vermelho, logo um preto, outro
caseiras, e sobem aos telhados, donde algúas vezes
vermelho; e assim vai toda. Não é das maiores, mas
caem das bordas das telhas mas, ou seja por não
(cresce] até 5, e 7 palmos com proporcionada
serem tão bravas como a primeira casta, ou por
grossura. É tão venenosa, que logo mata a sua
especial providência de Deus, raras vezes succede
picada: nem me consta, que ategora se tenha
algúa picada destas caseiras. Outras andam pelos
descoberto o seu contraveneno, se não for o mais
quintaes, e por entre a hortaliça, e finalmente não
presentâneo a triaga humana, que é um dos mais
há lugar isento desta praga: mas tem muitos
eficazes que ategora se tem descuberto; ou a lavagem
contravenenos, que aplicados a tempo aproveitam.
de alguma mulher. Não é das mais bravas, porque
ordinariamente não acomete, se não a tocam. Cascavel é nome de outra cobra das mais
Paraoubóia, que é o mesmo, que cobra de papagaio, venenosas do Amazonas, não muito grande, mas
assim chamada por ter a cor de papagaio; isto é pode duvidar-se, qual veneno é mais activo, se o da
muito verde pelas costas de alto a baixo, e só pela jeraraca, se o da de cascavel? porque a sua picada
barriga é branca. É ainda mais venenosa, que a de é mortal: talvez, que por isso lhe deu o Autor da
cima: porque mata logo, e quase repentinamente a natureza o cascavel, que tem na cauda, chamado
sua picada: é mais perigosa, que as mais cobras, assim, porque quando caminha faz o som, e
não só pela eficácia do veneno, mas porque como é estrondo de um cascavel, como avisando, que se
verde não se distingue da cor do mato, e da relva; e livrem dela. Contudo a muitos pica sem valer o aviso
por isso menos evitável. Há a ararabóia cor da arara, do cascavel, porque muitas vezes está quieta, e
e julgo, que duas espécies conforme as duas espécies deitada no meio da erva, ou debaixo de algum pao,
que há de araras. A primeira toda azul sem mistura e nos que incautamenle lhe bolem, logo pica. Se
de outra cor; a segunda toda vermelha: não tenho não se acode logo incha a parte com herpes, que
notícia, se são tão venenosas como a paraoubóia; em breve tempo acometem o coração. O seu cascavel
são porém mais evitáveis, porque se distinguem é muito estimado para vários efeitos na medicina.
melhor. Há jabotibóia com as mesmas pintas do Surucucu é outra espécie de cobra muito venenosa:
jaboti. Hà xeribóia, que se parece com um camarão cresce mais, que as duas antecedentes, porque
grande. Há acotibóia da cor do bicho acoti, do qual cresce até oito ou mais palmos de comprimento. É
herdou com a semilhança o nome. Há tarairabóia mui brava, e acomete a gente com grandes saltos. A
da cor, e semilhança do peixe taraíra, de quem tem sua picada é tão venenosa, que faz arrebentar o
o nome. Há boiasique, que terá pouco mais de sangue pelos olhos, narizes, e ouvidos, além de fazer
palmo. É tão activo o seu veneno que é o mesmo inchar todo o corpo, e ordinariamente não obedece
morder ela, que morrer logo o mordido. Andam, e a medecina. Também a natureza lhe deu seu sinal,
sobem às árvores, e delas fazem tiro, aos que para dela fugirem os homens, que é o estar sempre
acometem, e basta úa para matar em breve tempo bulindo, e açoutando a terra com a cauda, cujo
um exército; e de facto as vezes matam um bando estrondo serve aos práticos que já o conhecem de
de porcos de 200, e mais cabeças sem mais, do que se o acautelar dela: pelo contrário quem ainda não
saltar de uns aos outros, que logo com a sua picada tem dele experiência, quando ouve os taes açoutes
vão caindo. E como por aquelas matas andam os acode ao estrondo, cuidando ser alguma outra
javalis em fileira formados uns atrás dos outros cousa. Quando dormem resonam alto, e com grande
desde o primeiro vai a cobrinha saltando, e picando estrondo. Tem muita amizade com a caça chamada
até o último; e eles caindo mortos sem quase os de paca de sorte, que ordinariamente vivem juntas na
trás advertirem nos dianteiros para fugirem. Há mesma cova.
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 363

Figura 27.10. Cobra coral (apud Brehm)

Cobra de capelo é também de veneno muito vio úa cobra de duas cabeças, que de longe vinha
activo; chama-se de capelo porque tem na cabeça em seu seguimento, e sem se assustar proseguio o
uma semilhança de capelo. Nas matas do Amazonas seu caminho, olhando de quando em quando, e
não há tanta cópia desta espécie de cobras [não há sempre a via em seu seguimento. Furtou-lhe a volta
nenhuma, é a naja da Índia], como de outras; e se rodeando por dentro do mato, e em pouca distância
não houvesse nenhúa seria melhor. Cobra de cipó voltou ao caminho, donde observou, que chegando
mui venenosa é das mais perigosas, que criam a cobra aquela paragem parou, e começando a
aquelas matas, Chama-se de cipó, porque a sua farejar como perro já para o ar, e já para a terra
cor é a mesma, que a de um cipó, e como ele delgada. endireitou para o mato, e fazendo o mesmo rodeio
É por isso das mais perigosas, porque se engana a veio sair a mesma parte, em que também saíra o
vista com elas cuidando ser cipó, sendo cobra; daqui missionário, e continuou a segui-lo; o que vendo
vem que muitos imaginando ser cipó vão pegar-lhe ele lhe descarregou úa chumbada, com que a matou,
e se acham com úa cobra. T ambém andam ficando persuadido, que fareja.
escondidas pela folhagem dos matos, e nos mesmos
caminhos. Cobra de duas cabeças é úa espécie de Jibóia é úa das cobras mais célebres do
cobra, que tem a ponta da cauda não aguda como Amazonas, e do Brasil pela grandeza, e pela
as mais cobras, mas rotunda, e da mesma sorte, voracidade com que de úa vez come um veado, um
que a cabeça de modo, que pouco se distingue a homem, ou um boi. Tem tanta força que segura
verdadeira cabeça. A sua cor é amarela, dizem qualquer fera, e é de tal elasticidade, que se estende,
comumente ser cega, mas na verdade algúa cousa e encolhe como quer, como se faz a um nervo.
vê; e tem os olhos muito pequeninos. Vivem com as Quando tem fome se põe no mato à borda de algúa
formigas nas suas covas, ou seja, porque delas estrada, ou caminho e ali occulta espera a caça
vivem, ou por alguma simpatia, que tem com elas, segurando-se em algúa àrvore com a cauda; e ao
ou talvez por não terem o trabalho de fazer as suas passar descuidada qualquer caça boi, veado, onça,
covas, que acham feitas nos formigueiros. A sua anta, ou qualquer outra lhe dá um salto dando-lhe
picada é tão venenosa, que mata para logo: assim o úa volta pela barriga tão ligeira, e repentina, que a
vio claramente um missionário em um cão, em quem fera se acha de repente presa, e rodeada, e querendo
vio morder úa destas cobras, e o perro não fez mais, fugir do perigo corre para diante, e quanto mais
que dar um grito em úa volta, e caio logo morto. O corre mais a cobra se vai extendendo segura na
mesmo missionário afirmou, que por experiência árvore com a cauda. Depoes de deixar correr a fera
vira, que esta cobra tem faro como os perros; o que algum espaço a vai outra vez fazendo recuar, e
observou deste modo. Em um caminlio dos matos entretanto a vai apertando cada vez mais até lhe
sentio atrás de si um tal qual estrondo, e olhando amolgar, e quebrar todas as costelas, e ossos, que
364 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

tanta força tem a bichinha! fazendo-lhe no mesmo outro remédio o atraído, senão caminhar a sua
tenipo arrebentar as veas, e sair o sangue por boca, perdição, e só se vai acompanhado de algum
olhos, narizes, e ouvidos, até que finalmente cae companheiro experimentado, que vendo-o ser
morta a presa. Logo a vai babando toda, enchendo- levado, corta algum ramo de árvore, e dando com
a de escuma e saliva, e depoes a engole inteira ainda ele para úa, e outra parte, corta o fio, ou hálito
que seja o maior boi; e só lhe ficam fora da boca as venenoso. Cobra viscosa. Não é menos nociva outra
pontas, se são grandes até se desconjuntarem, e espécie de cobra, cujos efeitos mostram ser anfíbia,
caírem. Depoes vendo-se com tão grande bucha na vivendo já na ágoa, e já na terra. O modo de caçar a
barriga se deita a dormir, e depoes de digerir aquele presa é desta sorte, sae da ágoa, enrosca-se na praia,
bocadinho, sentindo-se gravada com a ossada, se e finge ser algum penedo, que ali está assente,
finge morta, e estira com a barriga para cima. porque tem a mesma cor das pedras da ágoa pardas,
Acodem logo os urubus, e outras aves a picá-la, e
só com alguma diferença de mais lu[z mas] esta
fazer-lhe anatomia na pele, até lhe abrirem a barriga,
mesma diferença convida aos passageiros a
e quando se sente já com boa brecha se vira, e
chegarem a ver, o que julgam pedra; e como a
deixando cair a ossada vai buscar a sua vida. Daqui
curiosidade não se satisfaz só com ver, mas também
se pode fazer conceito de sua grandeza, e muita
força; pois não se pode escapar com toda a sua com o tocar, logo acompanham a vista dos olhos
valentia, nem um touro, nem uma anta: e da sua com o apalpar das mãos, e tocando-a com úa lhe
formidável boca também se pode conjecturar a sua fica pegada, como se a posesse em algum monte de
monstruosa grandeza, pois está claro que o bojo, breu, ou visco: acode logo com a outra mão, e
em que se há de alojar um bocado tão grande, deve também fica pegada, e o mesmo vai succedendo a
ser á medida de tão desmedido boqueirão, que engole todo o mais corpo; e quando já a cobra o tem de
um touro inteiro. Da gente algúa se tem livrado, se todo pegado, e mais que manietado, se desenrosca,
quando a cobra a assalta ao enroscar-se não lhe e o leva para o mar, onde o come muito a seu salvo.
prende os braços, mas ficam as mãos de fora, com Cobras de ágoa. São de muitas espécies, como
as quaes puxando de alguma faca, a afaquea, e são as referidas surucuju, e a visguenta: mas as de
corta: mas sempre ficam com mui pouca saúde, que agora quero falar são principalmcnte, as que
deitando sangue pela boca pelo damno, e força do chamam mãe da ágoa, e mãe do peixe. A mãe do
assalto, por mais diligentes, que sejam em golpear, peixe é uma cobra, que vive na água em baías, e
e cortar a cobra; e por isso pouco vivem. Mas das
lagos: é cobra muito grande, e capaz de investir a
feras, que nem tem, nem podem jogar semilhanles
qualquer canoa. Chamam-lhe mãe do peixe, porque
armas, nenhúa escapa, excepto, se quando se vem
só anda, onde há muito peixe, de que ela se sustenta;
assaltadas, são tão ligeiras na carreira, que não dão
tempo à cobra para as enroscar, e dar de todo a e na verdade para sustentar tal monstro é necessário
volta, ou laço. um mar de pescado; e talvez que por isso não
acometa as canoas. e navegantes. A mãe da ágoa é
Surucuju é outra cobra de bom tamanho, pois outra grande cobra, que vive nos lagos profundos,
também investe com qualquer homem, ou fera. e talvez que por isso a chamam os índios mãe da
Crescem a uma desmarcada grandeza de vinte, e ágoa; mas seja por esta, ou por outra qualquer razão,
mais palmos. É animal anfíbio: vive ordinariamente, o certo é, que é uma mui grande cobra, e talvez a
como peixe, na ágoa; e dela investe a tudo o que que afirmam alguns ter visto em diversos lagos, em
chega à praia, ou vai nadar no lugar, aonde elas que por medo dela não se atrevem os índios a entrar:
andam. Também saem a terra, e sobem às árvores, tal é um grande lago nas vezinhanças da Missão
donde fazem tiro nas canoas, que vão passando. E
Gurupatuba, chamada hoje a Vila de Monte Alegre,
sendo bruto forçosíssimo quando está em terra, que
porque entrando nele algúa embarcação se ouve
ordinariamente é nas ribanceiras dos rios, se mata
um estrondo, como de um grande trovão, e logo
as vezes com muita facilidade. Eu vi matar úa
surge uma cobra de tão desmarcada grandeza, que
atirando-lhe úas chumbadas, ou balas de úa canoa,
pode investir, e meter no fundo a um navio, e o
e com o primeiro tiro ficou tão quieta, como dantes
faria a alguma embarcação, que incautamente lá
de sorte que duvidaram se lhe entraram, o mesmo
tem entrado, se não fugira para terra com muita
succedeu com o segundo tiro, e só ao terceiro, ou
diligência; porque a fera surgindo acima investe
quarto fez uma pequena sensação, bolindo consigo,
com tal fúria, que para lhe escapar é preciso remar
mas logo ficou morta. Cobra de atrair. Chamo assim
a uma casta de cobra do Rio Amazonas, que atrae a para terra com unhas, e dentes; porque como a
si a presa, por me não lembrar do seu nome próprio. fera é de monstruosa grandeza demanda ágoa
Dizem ser cobras das maiores. que criam aquelas muito funda para poder nadar, a qual não tem perto
matas, mas são raras, e talvez só se acham em de terra, e por falta de fundo proporcionado a sua
algúas cavernas das altas cordilheras, pois são grandeza não podendo nadar se retira, e assim
poucos, os que dela dem notícia como testemunhas escapam as canoas de ser afundadas. Além destas
oculares. Não acomete por si, mas quando quer se tem visto muitas outras espécies de cobras tão
comer olha para a presa, ou seja fera do mato, ou grandes, que mais merecem o nome de monstros,
seja algum passageiro, que vai passando pela do que de cobras: Tal era a de que relataram uns
estrada, ainda que ao longe, e em muita distância, viajantes ter visto em úas matas parada, e cuidando
ele deita um tal hálito, que vem a presa atraída a ser algum madeiro caído se assentaram nele,
meter -se-lhe na boca; da mesma sorte, que a acendendo ao pé do mesmo úa fogueira; e só deram
doninha se vai meter na boca do sapo. Nem tem no engano, quando ela se principiou a mover
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 365

fustigada do calor do fogo. Em outras partes se tem preceito, e com a sua santa benção se apartavam
visto os covis de outras taes, como se ali tivera estado aqueles bravos, e cruéis monstros, tornados
algúa grande embarcação. Mais é, o que succedeo a cordeiros, cujo preceito tem guardado tanto à risca,
uns brancos nas praias do Amazonas, aonde vendo e ategora não consta, que alguma cobra no Brasil
caminhar um monstruoso cobrão o assaltaram, e tenha mordido algum jesuíta como testemunham
já com tiros, já com frechas o mataram. Vista a sua os muitos milagres, que andam autenticados no
grandeza nunca vista quiseram tirar-lhe a pele para processo da sua canonização, que se espera brevi.
a mostrarem por admiração, não a pueram virar 5 Por esta notícia, e para este efeito de livrar das
brancos com 40 índios, que ali se achavam, o que onças, e cobras veneram muito as suas relíquias, e
denota úa desmarcada grandeza: mas sempre fo as procuram, e estimam por um dos melhores
[roto o original] vão lhe tomar as medidas! Sendo antídotos contra os mortíferos venenos daquelas
porém tão vastas as matas do Amazonas, [e tão] feras, especialmente depoes de as terem
abundantes de semilhantes monstros, não [cons]ta experimentado eficazes, estimando já alguma
que haja nelas aquelas serpentes, e dragões de asas, amostra da sua loba, já alguma partícula das suas
que se admiram nos desertos da Líbia, e em outras alfaias, ou alguma pequena lasca das tàboas do seu
regiões do mundo, o que denota, que ainda o
cobícolo; como causa muito preciosa: mas quando
Amazonas não é tão infestado, e pestilente nas suas
os desejosos habitantes do Amazonas não possam
pragas, como são outras regiões. E se prova bem:
conseguir estas preciosidades, suprirão a falta delas
porque também não cria aquelas grandes feras, que
com a sua devoção e invocação do seu santo nome,
infestam não poucas partes da Ásia, e África como
e espero, que experimentarão a eficácia da sua
elefantes, rinocerontes, unicórnios, búfaras [sic],
poderosa proteção, que tem experimentado tantos
e muitas outras (outras) feras, que metem terror, e
espanto aos seus naturaes. out[r]os.
O segundo antídoto, que a experiência tem
º mostrado mui eficaz contra o veneno das cobras, é
CAPÍTULO 29
o dente de jacaré: não qualquer dente, mas os da
DE ALGUNS ANTÍDO’I’OS
espécie chamada jacarecuruba cuja vertude se tem
CONTRA A PRAGA DAS COBRAS
experimentado em muitos casos, dos quaes já
Ainda que parece não pertencer a este lugar apontei um nesta “Primeira Parte”, capítulo Io. No.
esta matéria, especialmente determinando eu fazer II, que foi, o que abrio caminho para a sua
dela especial lembrança em opúsculo próprio, estimação, e uso. No citado lugar podem ver os
contudo me pareceu ajustado à razão apontar aqui leitores como se descubrio este antídoto, que aqui
alguns antídotos contra o veneno das cobras, não não relato, por não repetir o mesmo e nausear aos
só pela razão, de que contraria juxta se posita magis benévolos leitores, O uso deste dente é trazer-se
elucescunt [conhecem-se melhor os contrários dependurado de sorte, que toque a carne imediate,
justapostos], mas principalmente para que os é já sem susto, nem medo podem frequentar as suas
leitores, e os pretendentes do grande tesouro matas os habitantes do Amazonas; e deste modo
descuberto no Amazonas, não deixem de procurar lhe será preservativo, ainda daquelas cobras, que
consegui-lo, por medo de tão pestíferas pragas, e matam logo, como as de duas cabeças, e as mais
mortaes sevandijas sabendo, que assim como aquele acima referidas. Mas para os já mordidos se raspe
grande rio é rico de venenos, também é sumamente algúa porção do tal dente, e se dê a beber ao
provido de antídotos, e abundantíssimo de muitos, enfermo, e o dente se lhe aplique, e ate unido a
e eficazes contravenenos, de que se aproveitam os carne do corpo. E sendo o dente verdadeiro tão
seus naturaes, e habitantes, e por cujo uso quase precioso como a vida de um homem, e por outra
desprezam as cobras, e formidam pouco os seus parte sendo os dentes de jacaré de tantas espécies,
mais refinados venenos. e tantos, deveria cada um ter a providência de os
O primeiro antídoto, e universal remédio experimentar primeiro para saber discemir os
contra todos os venenos, que não só merece o verdadeiros dos falsos, e não se expor a ficar
primeiro lugar, e a primeira estimação pela sua frustrado com os falsos. Simelhante vertude tem,
admirável eficácia, mas também a primeira, e maior corno já adverti na “Terceira Parte”, Capítulo [em
veneração pela pessoa, é úa cordial devoção ao branco no manuscrito] N° [em branco no
venerável Padre José de Anchieta da Companhia de manuscrito] a fava de Santo Ignácio trazida da
Jesus, missionário, que foi de índios nas partes do mesma maneira unida ao corpo, e segundo
Brasil, cuja santidade chegaram a venerar as feras advertem, os que dela tem notícia não deve ser
daqueles matos, cujo domínio chegaram a sentir os furada com instrumento de ferro. Da mesma se
tigres, e cobras, e cuja santa benção, e poderosa aplica raspada, e dada a beber aos mordidos, mas
proteção experimentam ainda hoje todos os jesuítas, não raspada com ferro; e ainda que não tivesse outro
e seus devotos desde que o venerável Padre préstimo, só por este merecia a dita fava ser contada
penetrando aquelas brenhas, e missionando aqueles no número das cousas preciosas: mas tem tantos
índios, lhes vinham as cobras, e tigres a fazer festa, outros, que a fazem mais preciosa, do que são as
como se fossem mansos, e bem domesticados perros mais finas gemas. Das suas vertudes se podem fazer
aos quaes mandava, que a todos os que trouxessem muitos capítulos; e de algumas já dei notícia na
aquela roupeta não fizessem mal: e com este “Terceira Parte”.
366 O “Tesouro Descoberto no Rio Amazonas” do Pe. João Daniel (1758-1776)

Merece o quarto lugar a raiz de cobra, cuja dada disfarçada aos enfermos em ágoa ardente, e
erva é tão activo contraveneno das cobras, segundo na falta desta em ágoa da fonte; e este é já hoje o
afirmam os práticos, que da sua efÍcácia recebe o mais prompto remédio, e provado antídoto, que
nome. Antes afirmam mais, que não só atalha o usam os que dele tem noticia não só pela eficácia
veneno das cobras, [mas de] tal sorte as mortifica, que nele se tem experimentado, mas porque no meio
que não podem morder, nem ainda bulir consigo de dos matos, onde muitas vezes succedem estas
modo, que alguns tendo consigo a dita raiz tem disgraças, não pode haver remédio mais
pegado [as] cobras, deitado-as a tiracolo, pre[sentâ]neo, com que uns a outros possam acudir.
enrodilhando-as ao pescoço, e feito delas quanto A mesma eficácia tem a lavagem por banho de
querem. É bem verdade, que um missionário
qualquer mulher bebida pelo doente; porque
testemunha o contrário dizendo, que por si mesmo
qualquer destes remédios fazem vomitar os
fizera a experiência botando no meio da casa úa
mordidos, e expelir o veneno.
raiz, e fazendo fugir para aquela parte a cobra, esta
lhe passou por cima com muita saúde, devendo ficar O uso do azeite de oliveira também obra
como pasmada, e imóvel, segundo a opinião dos que admiravelmente untando com ele a parte, ainda que
pugnam pela sua grande vertude. É certo, que há dizem alguns, que para ser mais eficaz deve só ser
três castas desta erva de cobra, e bem pode ser que extraido da azeitona, e não fervido, como costuma
a raiz de úa seja mais eficaz, que as outras, e por ser o azeite ordinário. Da mesma sorte dizem, que
conseguinte que todos tenham rezão, assim os que obra com eficácia o mesmo azeite bebido em
negam, como os que afirmam a sua vertude. Não é quantidade de modo, que faça vomitar ao picado,
menos excelente a pedra de cobra, pois tem provado Outros usam, se tem a mão, beber úa boa tarraçada
admiravelmente contra as suas picadas, atraindo a de ágoa ardente, que os provoque a vômito, e só
si o veneno posta na ferida. Não falo aqui na com ela tem livrado muitos da cova. Usam alguns;
verdadeira pedra de cobra, que na sua cabeça se cauterizar a parte com fogo queimando a ferida;
acha; porque estas são mais raras, se as há, e seria outros lhe queimam em cima enxofre, o qual remédio
difícil o alcançá-las: falo da que já hoje é mais usual, sempre é bom usar ad cautelam, ainda quando se
que é úa ponta de veado, alguns dizem que hasta de
aplicam outros remédios, para que se não obrar um,
boi, ou das suas canelas, queimada, e feita como
obre o outro, ou ambos juntos, porque virtus unita
carvão, e basta esta para atrair a si o veneno
fortius agit [a força unida age mais vigorosamente].
sobreposta na parte envenenada, como a experiência
o tem mostrado, e depoes de o chupar por si mesmo Para o mesmo efeito há inumeráveis outros
se despega, e então para largar o veneno chupado, remédios de que usam nas occasiões conforme o
se põe de molho em leite, no qual o larga, ficando pede a necessidade, e alguns fazem grande apireço
como dantes apta para nova cura quando for dos ossos do pássaro acauã de que já descrevemos
necessária. a antipatia, que tem com as cobras: e dizem, que a
Disse, que não falava na verdadeira pedra de mesma tem os seus ossos queimados, e dados a
cobra se [a há], porque na verdade parece havê-la, beber desfeitos em pó, como também as suas penas.
ou seja verdadeira pedra formada na cabeça da cobra, Mais admirável é a ponta do pássaro nhuma, ou
ou algum osso da sua cabeça. E quando não tenham como o chamam os índios cauintau, que dizem tem
todas as espécies de cobra, ou todas as cobras esta as mesmas vertudes, que a ponta do unicórnio. Mas
pedra, tê-la-ão algúas, como a pedra do camaleão, quando succeda, que por estarem embre-nhados
que nem em todos se acha, e como a do porco nos matos, ou na solidão muito distante do povoado
espinho, que são raros os que a tem. O mesmo faltem todos estes antídotos, podem recorrer ao
succederá nas cobras, que nem todas as terão; mas antídoto mais presentâneo, que ensinou a mesma
que algúas as tenham é sem dúvida, porque matando natureza, e é chupar com a mesma boca a parte
eu um sucuruju de formidável grandeza vi, e ouvi os mordida, ou com ela o veneno sem medo de que
índios meus neófitos falar entre si - cepiac itá acanga lhes possa ficar mal pela boca, pela razão de o
çui – “vede se tem pedra na cabeça”: mas vendo, que expelirem na saliva; e que este remédio seja
eu, e um branco atendemos ao dito, lançaram a proporcionado se infere da razão; porque a causa,
cabeça, e cobra ao mar. de ser proficua a pedra de cobra é por chupar o
São também mui eficazes remédios a triaga veneno: logo o mesmo efeito succederá chupando-se
humana, e lavagem de vaso femenino. A primeira com a boca.”
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 367

Referências
Daniel, J., S. J., 1820. Quinta parte do Thesouro descoberto no rio maximo Amazonas. Contém hum novo
methodo para a sua agricultura, utilissima praxe para a sua povoação, navegação, augmento, e commercio,
assim dos Indios como dos Europêos. Imprensa Régia, Rio de Janeiro.
Daniel, J., S. J., 1840-1841. Parte Segunda do Thesouro descoberto no rio Amazonas (noticia geral dos
indios seus naturaes, e de algumas nações em particular; da sua fé, vida, costumes, cousas mais notáveis
da sua rusticidade). Revta Inst. hist. geogr. Brasil 2 (7): 319-363, 1840, 2 (8): 445-498, 1841,
3 (9): 39-52, 1841, 3 (10): 158-183, 1841, 3 (11): 282-297, 1841, 3 (12): 372-393, 1841.
Daniel, J., S. J., 1878. Thesouro descoberto no máximo rio Amazonas [Sexta parte]. Revta Inst. hist. geogr.
Brasil 41(56): 33-142.
Daniel, J., S. J., 1976a. Tesouro descoberto no Rio Amazonas, 1ª, 2ª e 3ª partes. An. Bibl. nac., Rio de Janeiro
95(I): 1-437.
Daniel, J., S. J., 1976b. Tesouro descoberto no Rio Amazonas, 4ª, 5ª e 6ª partes. An. Bibl. nac., Rio de Janeiro
95(II): 1-440.
Leite, S., S.J., 1943. História da Companhia de Jesus no Brasil. Tomo IV. Norte – 2: Obra e assuntos gerais.
Séculos XVII e XVIII. Instituto Nacional do Livro, Rio de Janeiro & Livraria Portugália, Lisboa.
Papavero, N., G. Scrocchi & J. Llorente-Bousquets, 1995. Historia de la biología comparada desde el Génesis
hasta el Siglo de las Luces. II. La Edad Media: desde la caída del Imperio Romano de Occidenre hasta la
caída del Imperio Romano de Oriente. Universidad Nacional Autónoma de México, México, D. F.
Projeto Arquivo Permanente do Museu Paraense Emílio Goeldi, 1987. Inventário analítico do Fundo Rudolf
Schuller. Museu Paraense Emílio Goeldi, Belém.
Semedo, C., 1727. Memorial de varios simplices que da India Oriental, da América e de outras partes vem ao
nosso Reyno. Oficina de António Pedroso Galvan, Lisboa Occidental.
Índice Onomástico

d’Abbeville, Claude (Frei) – 84, 85, 86, 89 Ayres, José Miguel – 275
Abreu, Capistrano de - 3 Azambuja, (-) - 109
Abreu, Pedro Baião de - 138 Azaque, Pedro de - 199, 200
Acosta (soldado) – 67 Azevedo, Diego de - 36
Acosta, Benito de – 149. Ver Costa, Bento da
Acosta, Joseph (Pe.)- 125 Baena, Antonio Ladislao Monteiro – 281, 285
Acosta, Pedro de – 180, 200, 201, 203. Ver Favela Balcázar, Diego de - 46
Acuna – 253. Ver Acuña, Cristóbal de Ballejo, Pedro - 208
Acuña, Cristóbal de (Pe.)– 9, 142, 143, 145, 155, Ballesteros Gaibrois, Manuel - 9
156, 157, 158, 163, 180, 187, 202 Ballesteros y Beretta, Antonio - 9
Acuña, José de - 202 Bandera, Juan Alonso de la – 36, 45, 46, 48
Acuña, Juan Vásquez de – 142, 163, 201, 202 Baptista, João –87, 88
Afonso Henriquez, El Rey D. - 103 Barbosa Machado (-) - 109
Aguilar, Cristóbal de - 20 Barkeshire, Earle of – 124. V. Howard
Aguilar, Juan de - 197 Barksheire, Earle of – 131. V. Howard
Aguilar y Córdoba, Diego de - 34 Barros, Ioão de - 115
Aguirre, Juan de – 52, 61, 67 Barros. Joaquim - 293
Aguirre, Lope de – 3, 9, 33, 34, 35, 44, 45, 46, 47, Bauptista, Ioam – 87. Ver Baptista, João
48, 49, 50, 51, 52, 54, 56, 57, 59, 60, 63, 64, Bayón, Pedro - 180
66, 67, 69, 71, 73, 139, 160, 172, 176 Becerra, Francisco (Frei)- 205
Alarcón, Diego de – 67, 68 Becerra, Pedro (Frei) – 192, 194, 200
Albuquerque, Antonio de - 87 Bechamel (Pe.) - 253
Albuquerque, Ieronymo (Fragozo) de – 114, 117. Ver Becher, Johann Joachim - 239
Albuquerque, Jerônimo de Belalcázar - 7
Albuquerque, Jerônimo de – 85, 86, 148, 221, 274 Bell, Andrew - 254
Alcántara, Juan - 15 Bembo, Cardeal - 9
Alexandre (Papa) - 103 Bermudez, Pedro - 195
Alejandro Magno - 73 Berredo, Bernardo Pereira - 143
Almagro – 7, 33 Betancor, Jorge de Lemos – 101, 102
Almeida, Candido Mendes de - 267 Betancour, Jorge de Lemos – 101. Ver Betancor
d’Almeida, Manoel Soares (Capitão) - 117 Bettendorff, João Felipe (Pe.) - 241
Almesto, Pedrarias de – 34, 35 Bobeda, Miguel - 46
Altamirano (Capitão) - 34 Bouger, Pierre – 257, 258, 261
Alvarado, Pedro de - 7 Branco (Capitão) - 116
Álvarez de Holguín, Pedro - 7 Braer, Pe. Wenceslao - 251
Ambrosio (San) – 147, 164 Bravo de Molina, Pedro (Capitão) – 69, 71, 72, 73
d’Amiens, Ambroise (Frei) - 84 Breno, Martín - 60
Ampudia, Pedro de - 21 Brieba, Diego de – 137. Ver Brieva, Domingo de
Añasco, Pedro de - 45 Brieva, Domingo de – 137, 147, 149, 161, 192, 193,
Andrade, Fernão d’Aluares de - 115 194, 195, 197, 198, 199, 200, 201, 202, 203,
Andrade, Gomes Freire de - 285 204, 206, 210
Andrade, Manuel Freire de - 293 Brito, Bernardo de - 299
Anguita, Francisco (Frei) - 192 Buffon – 281, 290
Angulo, Antonio de - 59
Antonio Carlos - 299 Cabañas, Juan de – 47, 54
Aparia – 16, 18, 19 Cabral, Pedro Álvares - 1
Arana (soldado) - 67 Caceres, Juan Pereira de - 198
Aranha, B. - 273 Cáceres, N. - 59
Araújo, Antônio de - 241 Caldas, João Pereira - 286
Arce, García de – 38, 39, 40, 42 Caldeira, Francisco – 100. V. Castelo-Branco
Arias, Alonso - 60 Caldeira, V. - 113
Arias, Pedro de – 67, 68 Calderón, Juan (Frei) – 184, 195, 197, 199
Arnau, Antonio - 293 Caldeyra, Francisco – 99. V. Castelo-branco
Artiaga, (-) - 60, 63 Camacho, Francisco Cordovil - 143
Artieda, Andrés de – 142, 159, 163, 180, 202 Canário, Manuel Francisco - 293
Atienza, Inés de - 33 Cañete, Marquês de – 33, 35, 36, 45, 64, 65, 145
Aucedo, Juan de - 66 Canin, Ian - 79
Augur, John - 255 Canto, Eugênio do - 109
Ávila-Pires, F. D. - 89 Caraballo, Francisco Coelho de – 161 - ver Carvalho,
Ayres, André Miguel – 275 Francisco Coelho de
Ayres, Francisco Miguel - 275 Cararubia, Frei Lorenzo - 192
370 Índice Onomástico

Caravallo, Francisco Coello – 188. V. Carvalho, Couplet - 257


Francisco Coelho de Courtney, Stephen - 254
Carlos I – 7, 8, 16 Couynco – 11, 28
Carlos V – 113, 115, 160, 187 Crusoe, Robinson – 253, 254
Carlos VI - 357 Cruz, Laureano Montes de Oca de la (Frei) – 137,
Carranza, Antonio de - 29 145, 191, 194, 195, 197, 199, 201, 205, 206
Carreño, Antonio – 205, 206 Cruz, Pedro de la (Frei) – 194, 204
Carrión, Francisco de – 51, 52, 59, 68 Cunha, Ayres da - 115
Carualho, Francisco Coelho de - 122 Curvo, Dr. – 294, 336, 357. Ver Semedo
Carvajal, Gaspar de – 3, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 32, 139
Carvajal, José de - 284 Dalemquer, Marquês - 100
Carvalho, Antônio de Albuquerque Coelho de - 247 Damasceno, D. – 101, 109
Carvalho, Francisco Coelho de – 86, 137, 226 Dampier, William - 254
Carvalho, J. P. - 89 Daniel, João (Pe.) – 269, 294, 295, 297
Casco, Pedro Alonso - 36 Daniel, Maria - 293
Castel-Branco, Francisco Caldeira de – 99. Ver Davi - 220
Castelo-Branco Davies, William - 79
Castellobrãco, Francisco Caldeira de – 114, 116. Ver Day, John – 123, 240
Castelo-Branco Defoe, Daniel – 253, 254, 255
Castello-Branco, Camillo - 273 Deluas (Alcaide mor) - 111
Castelo Branco, Francisco Caldeira de – 85, 100, Denis, Ferdinand - 85
137, 225 Descartes - 239
Castilla, Sebastián de - 33 Dias, Francisco Gonçalves – 273
Castillo, (-) - 58 Dias, Gonçalves - 241
Castrillo, Conde de - 145 Díaz, Alonso - 64
Castro, Diego de - 205 Díaz, Antón - 60
Castro, Pedro Alonso de - 49 Díaz, Benito - 69
Cayado, N. - 62 Diaz, Sebastian - 200
Caycedo, Frei Juan - 192 Díaz de Arles, Francisco - 37
Díaz de Almendarez, Martín - 61
Celis, (-) - 21
Díaz de Armendariz, Miguel - 33
César, Julio - 73
Diaz de Paz, Diego – 208, 209, 210, 211
Chatelain - 253
Díaz-Maderuelo, R. – 7, 9, 145
Chaves (Alcaide) – 64, 67, 68
Díaz Pineda, Gonzalo – 7
Chaves, N. de - 62
Díaz y Mendoza, Pedro - 47
Chinchon, Conde de – 142, 162, 201
Dombez - 282
Churchill - 79
Domínguez (Alferes) - 61
Cieza de León, P. – 3, 9
Donadito, (-) – 209, 210
Cigarra, (-) - 64 Donado, (-) – 199, 204, 210, 211
Cisneros, Joseph de (Frei) - 204 Dorado, Pedro (Frei) – 192, 201, 204
Civezza, Marcellino da (Frei) – 137, 191 Dover, Thomas - 254
Clemente XIII (Papa) - 273 Drumond, C. - 4
Cochado, Antonio Vizente - 99 Duarte (Dom) - 87
Coelho, Antônio (Pe.) - 251 Duarte, Gonzalo – 38, 48, 50, 51
Coelho, João da Silva - 88 Duguay-Trouin - 257
Cokram, Capitão - 255 Durana, Frei Juan de - 207
Collado, Pablo – 68, 69, 71
Colon, Christouao - 103 d’Eça, Manoel de Sousa - 114
Compte, Francisco M. (Frei) - 191 Elvas, Conde de - 252
Condamine, Charles Marie de la – 143, 253, 258, Enríquez, Cristóbal - 21
259, 260. 262 Enríquez de Orellana, Alonso – 46, 57
Coñori – 11, 28 Espindola, Juan Gerónimo – 66, 73
Contreras (Clérigo) – 62, 64 Esperança, Manoel da (Frei) - 247
Cooke, Edward – 253, 254 Esquibel, (-) - 52
Cornejo, Juan – 159, 207 Evangelista, Joam (Frei) - 251
Cortés, Fernão – 119, 257 d’Évreux, Yves (Frei) – 84, 85
Cortezão, Jaime - 140
Corzo, Juan - 36 Fajardo, Francisco - 62
Cosa, Juan de la - 1 Faria, Manuel Severim de - 87
Costa, Bento da - 145 Favela, Pedro da Costa - 139
Costa, Domingos da - 244 Feijó – 281, 282, 299
Costa, Ioseph da - 121 Felipe, D. – 48, 49, 60, 64
Costa, Leonor da - 286 Felipe II de Espanha - 145
Costa, Pedro da – 142. Ver Favela Felipe III de Espanha (Felipe II de Portugal) – 86,
Cozar, Fernando de (Frei) - 210 205, 221
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 371

Felipe IV de Espanha (Felipe II de Portugal) – 86, Guedes, Max Justo - 1


142, 158, 160, 169 Guerrero, (-) - 71
Felipe V - 283 Guevara, Juan de – 46, 54, 63
Ferloj – 116. Ver Harlay de Sancy Guillén Tato, Julio - 9
Fernandez, Andres (Frei) - 205 Guillet (Pe.) - 253
Fernández, Cristóbal - 47 Guilherme, João (Frei) – 248, 249
Fernández, Lorenzo (Frei) – 192, 193, 194 Gusmão, Alexandre de – 284, 285
Fernández, Nuño - 66 Gutiérrez, Alonso - 63
Fernández, Pedro - 46 Gutiérrez, Blas - 66
Fernández de Oviedo, Gonzalo – 8, 9 Gutiérrez, Pedro - 55
Ferreira, José (Pe.) - 245 Gutiérrez, Rodrigo – 60. 67, 68
Ferreira, Paulo - 293 Guzmán, Fernando de – 35, 36, 40, 42, 44, 46, 47,
Ferrer, Rafael (Pe.) - 161, 187 48, 50, 52, 56, 60, 66, 73, 74
Figueira, Luís (Pe.) – 137, 241 Guzmán, Francisco de - 8
Figueroa, Diego de - 66 Guzmán, N. de - 52
Filipe, príncipe - 3
Filipe IV – ver Felipe IV Harcourt, Robert – 123, 125
Fonseca, Antonio da - 100 Harlay de Sancy, Nicolas de, Baron de la Motte et
Fonseca, João Antunes da - 247 du Gros-Bois - 84
Fonseca, José Gonçalves da - 268 Heaton, H. C. - 9
Fonseca, Luísa da - 88 Henao, Alonso – 43, 47, 51, 63
Fontes, Baltesar de - 87 Henrique, El Rey D. - 103
Frade, F. - 89 Henry IV - 83
Francisco – 214. V. Lopez, Francisco Heriarte, Mauricio de - 221
Frias, Diego de - 87 Hernández, Cristóbal - 46
Friedrich Casimir, Conde de Hanau - 239 Hernández, Custodio – 34, 66, 73
Fritz, Samuel (Pe.) – 143, 247, 248, 249, 250, 251, Hernández, Diego - 57
254, 258 Hernandez1, Francisco – 56, 64
Hernández2, Francisco - 198
Friz, Samuel – 244. Ver Fritz
Hernández, Pedro - 46
Fuensanta del Valle, Marquês - 134
Hernández Girón, Francisco – 64, 74
Fuentes, Francisco de (Pe.) - 163
Hernández Millares, Jorge - 9
Furtado, Francisco Xavier de Mendonça
Herrera, Antonio de - 9
Hidalgo de Pinto, Bernabé - 208
Gago, Fernão Mendes - 250 Holquín (Capitão) - 74
Galeán, Pedro Alonso – 38, 46, 52 Honoré - 253
Galeas, Pedro Alonso - 69 Hornigold, Benjamin - 255
Galeno - 119 Howard, Thomas, Earl of Berkshire - 123
Galindo, Cristóbal - 73 Huby - 85
Galvão, Antonio - 115 Hugot 257
Garcés, Jorge H. - 9 Humboldt, Alexander von - 1
García, Antón - 67
García, Cristóbal – 66, 71
Iapoco - 83
García, Pedro - 68
Ica – 14, 22
Garcia, Rodolfo – 84, 101, 285, 286
García Calafate, Cristóbal - 54 Inés, Dna. – 37, 38, 43, 45, 46, 50, 51, 63. V. Atienza
García de Paredes, Diego – 69, 70, 74 Inojosa (General) – 74
Gasca (Licenciado) - 35 Ioão II, El-Rei D. – 115
Geelkerchen, Nicolas van - 79 Ioão III, El-Rei D. - 115
Giral de Fuentes, Gonzalo – 51, 52, 56 Itapucu - 84
Girón, Hernández - 33 Ituarriaga, José – 285, 286
Godin, Louis – 257, 261
Godin des Odonais – 257, 261 Jaguaramiri - 214
Golibar, Juan de - 201 Jardim, Manoel Cordeiro - 250
Gomberville – 143, 155 Jiménez (soldado) - 67
Gómez, Diego - 61 Jiménez de la Espada, M. – 3, 145
Gomes, Juan - 66 Jiral de Fuentes, Gonzalo – 47. V. Giral de Fuentes
Gómez, Sebastián – 46, 47 João - 279
Gómez Arias (Governador) - 39 João 2º, El Rei D. - 103
Gómez Calafate, Juan – 52, 56 João III, El Rei D. – 4, 114
Goncalues, Joao - 103 João IV, El Rei D. - 220
Gonçalves, Afonso – 101 João Felippe (Pe.) - 243
Gonsalvi, Luiz (Pe.) João Maria (Pe.) - 247
Gonzalez, Francisco (Pe.) – 210, 215, 243 Joãozinho- 279
González, Juan – 52, 54 Jobson - 277
372 Índice Onomástico

Jos, E. - 34 Maroni, P. - 247


José I, El Rei D. - 283 Marquina (soldado) - 67
Juan (-) – 211 Marret, Veuve - 253
Juan Alonso - 47 Martín, Francisco – 63, 67
Juan Primero - 45 Martir de Angleria, Pedro – 1, 257
Juriaga, Juan de - 58 Martyr, Pedro - 1
Jussieu, Joseph de – 257, 261 Mateo - 35
Matos, Felipe de - 180
Kempser - 277 Maupertuis - 257
Mazarino, Cardeal - 143
Lacerda, André Pinheiro de - 247 Mecklenburg, Duque de - 239
Laeth, Juan - 188 Mello, Diniz de - 113
Lago, Rafael da Silva - 253 Mello, Pedro de - 221
Lanzobeja (Capitão) – 199, 200 Melo-Leitão, Cândido de – 9, 145, 155
Laurencini - 282 Mendes, Luis - 250
Lee, Bertram T. - 9 Mendoça, Manoel Fulgueira de (Pe.) - 117
Le Gentil (-) - 83 Mendoza, Julián de – 67, 68
Leigh, Charles - 128 Menezes, Diogo de - 114
Leite, Serafim (Pe.) – 293 Mercadilho – 4. Ver Mercadillo
León - 258 Mercadillo, Alonso - 3
León, Cosme de - 59 Mersenne, Pe. - 239
León, Diego de - 261 Mesa y Ayala, Alfonso - 159
Leonardo (Frei) - 84 Mexia, Diego - 18
Lepe, Diego de - 1 Migan, David - 84
Lima, José de (Frei) – 248 Miranda, Alfonso de - 160
Lintot, Bernard - 254 Miranda, Pedro Alonso de - 36
Lisboa, Cristóvão de (Frei) – 85, 86, 87, 88, 89, 102 Miranda, Pedro de - 46
L’Isle, Guillaume de - 253 Miranda e Noronha, Antônio - 247
Llagas, Frei Augustin de las – 200, 201, 202, 203, Mocquet, Jean - 83
216 Mogollon de Ovando, Francisco - 203
Llamoso, Antón – 51, 54, 58, 59 Monguía, Pedro de - 34
Loaysa (-) - 61 Montaño (Ouvidor) - 33
López, Domingo - 59 Montesinos, Frei Francisco – 57, 62
Lopez, Francisco - 214 Montoya, Alonso de – 4, 44, 46, 49, 50, 51
López de Ayala, Juan - 66 Mora, Alexandre de 114. Ver Moura
López de Gómara, Francisco - 9 Moraes, Rubens Borba de – 79, 80, 109, 254, 258,
López Serrato, Juan – 52, 54 261, 271, 272
Lora, N. de - 69 Morainville – 257, 258
Loraya, Nicolao de - 52 Morais, José de (Pe.) - 83
Lorimer, Joyce – 102, 123 Moreno, Martim Soares - 114
Louis XIII – 84, 85, 89 Moura, Alexandre de – 99, 116
Lucano - 164 Moura, Antonio Rolim de - 285
Lucena Giraldo, M. - 289 Moya, Pedro de (Frei) - 192
Lucero, Diego - 56 Munguía, Pedro de – 57, 58, 60, 63, 67. Ver Monguía
Luciano - 147 Muñoz, Juan Bautista – 8, 9, 34
Lutero, Martín – 64, 73
Nabuco, Joaquim - 287
Machacón, Gabriel – 194, 195, 196, 197 Nabucodonosor - 65
Machado, Diogo da Costa - 101 Nomura, H. - 89
Machado, Jorge da Costa - 101 Noroña, Giácomo Raymundo 161, 199, 200. Ver
Machiparo – 21, 22 Noronha, Jacome Raymundo
Maciel, Bento – 116, 118, 184. Ver Parente Noronha, Jacome Raymundo de – 137, 139
Madrigal, N. - 54 Noronha, José Monteiro de (Pe.) – 282, 286
Magalhaês [Gândavo], Pero de – 115 Nunes, Diogo – 3, 4
Magallanes, Luis de – 217 Núñez, Pedro - 66
Mahoma - 73 Núñez de Guevara, Juan - 44
Maldonado, Cristóbal – 20, 21, 22 Núñez Vela, Blasco - 33
Maldonado, Joseph (Frei) - 204
Maldonado, Pedro Vicente de – 257, 258 Ocaña y Alarcon Gabriel de - 207
Mancera, Marquês de - 206 Ochoa, Martín de (Frei) – 201, 202, 203
Manoel, El Rei D. – 114 Odonais, Madame des - 261
Manutá - 248 Oeiras, Conde de - 293
Marie de Médicis – 83, 84, 85 Ojeda (Capitão) - 74
Markham, C. R. – 9, 137 Oliuares, Duque de – 158. Ver Olivares
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 373

Olivares, Duque de - 158 Pizarro, Gonzalo – 7, 87


Oliveira, Benito Rodríguez de – 190. Ver Oliveira, Pizarro, Hernando - 7
Bento Rodrigues de Pizarro, Sancho – 44, 46, 48, 52, 56
Oliveira, Bento Rodrigues de - 139 Plazuela, Gaspar de - 57
Oliveira Lima - 109 Poderozo, Pedro (Pe.) - 244
Omaga - 19 Pombal, Marquês de - 293
Ordás, Diego de – 7, 25 Porro, A. – 3, 140, 192
Ordoñez, Diego (Frei) – 206, 210 Portillo, Pedro - 37
Orelhada [sic] – 115. Ver Orellana Presepio, Francisco de el (Frei) - 216
Orelhana 103, 104, 115 - ver Orellana Purchas, Samuel – 123, 128
Orellana, Francisco de – 3, 7, 8, 9, 12, 13, 32, 35,
43, 140, 160, 164, 169, 176, 197, 208 Queiroz, João de São Joseph (Frei) – 264, 273
Oren, D. - 89 Queiroz, Joanna Dias de - 273
Orsúa 34, 160, 169, 176. Ver Ursúa Quesada, Madame - 261
Ortiguera, Toribio de – 9, 34 Quincoces, Juan de (Frei) – 191, 206, 210, 215
Ortiz de la Tabla, Javier - 34 Quiraeté, Lobo - 245
Ortiz Zapata, Gerónimo - 159 Quiraeté, Pero - 245
Ovington - 277
Ovirapire – 83 Raeders, G. - 85
Ovyrapive – 83. V. Ovirapire
Ramiro, Pedro – 36, 37
Oyón, Alvaro de - 60
Ravaillac, Jacques - 83
Rauardiéra, Danièl de la Tuxe, Monsiur de la 116.
Páez, Roberto - 9 Ver Ravardière
Pagador, Gonzalo - 68
Ravardière, Daniel de la Touche, Senhor de la – 83,
Pagan, Blaise François de, Conde de Merceilles -
84, 85, 274
243
Razalli 116. Ver Razilly
Paguana - 23
Razilly, François de, Seigneur des Aumers – 84, 85
Palacios, Juan de – 137, 139, 142, 147, 161, 173,
Reis - 88
194, 195, 196, 197, 198, 199, 208
Rengel, García - 71
Palomo, Pedro - 55
Papavero, N. – 89 Reyes Reyes, Raúl - 9
Paredes (soldado) – 67, 70 Reyes Villalobos, Vicente de los – 160, 187
Parente, Benito Macel – 160, 203. Ver Parente, Bento Ribeiro, Antonio - 244
Maciel Riberos, Fernando - 59
Parente, Bento Maciel – 101, 102, 117, 137 Rich, O. - 155
Parente, Philippe Alberto Patroni Martins Maciel - Riffault, Jacques - 83
286 Ringrose, Basil - 254
Pariente, Benito Maciel – 185, 187. Ver Parente, Rio Branco, Barão do - 143
Bento Maciel Ríos, Gonzalo de los - 74
Paris, Arsène de Frei – 84 Rizzini, C. - 88
Pascual – 211, 212, 213 Robledo, Miguel - 51
Pecador, Pedro (Frei) – 192, 194, 195, 196, 197, Robles, Martín de - 64
198, 199, 200, 201, 204, 210, 211, 212, 213, Rodas, Jorge de - 67
215 Rodríguez (Soldado)
Pedro Alonso – 40, 71 Rodríguez, Alonso - 62
Penalva, Diogo de (Frei) - 87 Rodríguez, Antonio – 47
Pereira, André – 99, 100 Rodríguez, Benito - 200
Peres, Iodoco (Pe.) – 244,245 Rodríguez, Cristóbal - 66
Pérez (Soldado) - 66 Rodríguez, Gaspar - 56
Pérez, Antón - 60 Rodríguez, Juan - 59
Pérez, Juan - 54 Rodríguez, Manuel – 56, 57, 59
Pérez, Martín – 44, 46, 48, 51, 52, 56, 58, 59 Rodríguez, Manuel (Pe.) – 155, 253
Pérez de Aguilera, Alonso - 58 Rodríguez, Sebastiãn - 15
Pérez de Salazar, Alonso – 59, 162, 202 Rodríguez de San Isidro y Manrique, Antonio - 159
Petrone Moisés, B. - 84 Rodríguez Viso, Pedro - 66
Piçarro, Gonçalo – 104, 115, 122. Ver Pizarro, Rogers, Woodes – 253, 254, 255
Gonzalo Rogozinski, J. - 254
Piedrahita (Capitão) - 64 Rojas, Alonso de – 9, 145
Pimenta, Vitoriano (Frei) – 247, 251, 252 Rojas, Ana de - 61
Piña, Francisco de (Frei) – 194, 197, 199, 201, 204 Rojas, Pedro de - 66
Pinto, O. M. de O. - 89 Roque, Diego - 71
Pinzón, Vicente Yáñez - 1 Rosales, (-) - 67
Pinzon, Vicente Yenez [sic] – 113. V.Pinzón Rua Cirne, Frei Pedro de Santa María y de la – 142,
Pizarro, Francisco – 3, 32 159
374 Índice Onomástico

Ruiz, Francisco - 7 Theodosio (Frei) - 245


Saá e Menezes, Artur de - 247 Thomas de S. Domingos (Frei) - 113
Saavedra y Guzmán, Martín de - 145 Thornton, Robert - 79
Saguer, Cristoval (Frei) - 203 Tiele, (-) - 79
Salamanca, Andrés de -56 Tirado, Diego – 66, 72
Salduendo, Lorenzo de – 38, 44, 45. 46, 48, 50, 51, Toledo, Andrés de (Frei) – 137, 140, 147, 161, 197,
74 198, 199
Salguero, (-) - 60 Toribio Medina, J. – 8, 9
Salinas, Juan de – 37, 38 Torquemada, Juan de - 257
Sampaio, Francisco Xavier Ribeiro de – 283, 286, 287 Torres, Diego de
Sampaio, Luiz Ribeiro de - 286 Torres, Pablo de (Frei) - 9
Samuel (Pe.). Ver Fritz Toscano, Baltasar - 92
Sánchez Barba, Mario Hernandez - 9 Trujillo, Diego – 52, 54
Sánchez Bilbao, Diego - 66 Trujillo, Marina de - 59
Sánchez del Castillo, Luis - 58 T’Serclaes de Tilly, José Pérez de Gusmán y Escrivá
Sánchez Loro, Domingo - 9 de Romani, Duque de – 8, 9
Sanchez Maldonado, Antonio - 207
Sánchez Paniagua, Bartolomé - 66 Ulloa, Jorge de - 257
Sanhudo, Miguel de Siqueira - 116 Urbano VIII (Papa) - 186
Santo Anastázio, Francisco de (Frei) – 248, 249 Ursúa, Pedro de – 3, 9, 33, 34, 35, 36, 37, 43, 44,
Santacilla, Jorge Juan de - 257 45, 46, 48, 49, 50, 52, 55, 61. 63, 65, 72, 74,
Santander - 205 139
Santos, Manuel de los – 214, 215
Sarmiento, Luis - 3 Vaca de la Cadena, Diego – 205, 206
Schuller, Rudolf – 99, 101, 109, 294 Vaca de la Cadena, Pedro - 206
Selkirk, Alexander – 253, 254 Valdelirios, Marquês de - 285
Semedo, Curvo - 294 Valdés y Llano, Juan de – 159
Seniergues – 257, 258, 261 Valente, Custodio - 117
Serrano de Cáceres, Miguel – 46, 51 Valle, Caetano Ferreira do - 280
Serrano Sanz, Manuel - 9 Valverde, Vicente de (Frei) - 8
Silva, Caetano Paes da - 272 Vane, Charles - 255
Silva, F. de - 60 Vargas, Juan de – 36, 38, 39, 40, 43, 44, 46, 48, 63
Silveira, Simão Estácio da – 101, 102. Ver Sylveira Vargas Zapata, Juan de – 34, 47
Siqueira, Rui Vaz de – 221 Varnhagen – 3, 221, 286, 287
Siqueira, Ruy Vaz de – 243, 244. Ver Siqueira, Rui Vas, Tristao - 103
Vaz de Vasconcellos, Luis Mendes de - 119
Smith, A. - 7 Vaux, Charles des – 83, 84, 85, 86, 89, 100
Soares,Gabriel - 114 Vázquez, Alvaro Tomás - 64
Sommervogel, C. - 155 Vázquez, Francisco – 34, 35, 47, 58, 74
Sosa, Roberto de – 56, 66, 71 Vega, Garcilaso de la - 9
Sosaya, Nicolás de – 59 Vega y Toral, Tomas de – 9
Sosaya, Roberto de - 59 Vegeiro - 277
Sotomayor, María de - 50 Verdugo, Melchor - 33
Sousa, Gaspar de – 99, 114 Verganza [sic; Bragança], Duque de – 215, 217
Sousa, Pero Coelho de - 114 Verguin - 257
Southey, Robert – 137, 139, 142 Verrazzano, Girolamo de - 1
Souza, Manoel de (Pe.) - 243 Viegas, Damião - 113
Souza, Tomé de - 3 Vieira, Antônio (Pe.) – 219, 241, 243
Suárez de Poago, (-) - 163 Villamayor Maldonado, Joseph de - 160
Superunda, Conde de - 283 Villandrando, Juan de - 56, 57, 58, 59, 60, 61, 62
Sylua, Luis de Mello da - 111 Villatoro, Juan de - 49, 58
Sylveira - 113 Villena, Alonso de - 46, 49, 51, 59, 61
Sylveira, Symão Estacio da – 101, 106, 109, 110, Vinha, Geraldo da - 113
240 Vizente, Antonio - 100. Ver Cochado
Vóhus, Carlos de - 116. Ver Vaux, Charles des
Teixeira, D. M. -89
Teixeira, Pedro – 9, 137, 138, 139, 140, 142, 143, Walckenaer, Barão de - 1
145, 155, 163, 221, 250 Walter, Jaime – 86, 87, 88, 89
Tejeira, Pedro 200, 201, 202. Ver Teixeira, Pedro
Texeira, Pedro 158, 159, 161, 180, 181, 202. Ver Zárate, Agustín de - 9
Teixeira, Pedro Zinzendorf, Conde de - 239
Texera, Pedro 148. Ver Teixeira, Pedro Zúñiga, Gonzalo de – 34, 58, 60
Índice dos Nomes de Animais e Produtos Animais
(1371 verbetes)

Abadas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332 Aletos - Sylveira, 1618 - 105, 1624
Abejas - Acuña, 1641 (cap. xxx) - 167 Ambar - Heriarte, 1662 - 223, 224
Abejas, cera de, que se cria en los huecos de los Amdura - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
árboles - Laureano de la Cruz, 1647-1651 - 196 XVII] - 95
Abejas, miel de, que se cria en los huecos de los Ameijoas - Sylveira, 1624 - 121
árboles - Laureano de la Cruz, 1647-1651 - 196 Amure - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Abelha - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 330 XVII] - 90
Abelhas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 352, 353, 354 Anacã - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 324, 325
Abelhas da Europa - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 351 Anacan - Sampaio, 1775 - 289
Abroteas - Sylveira, 1624 - 121 Anda pelos caminhos [“Pecuapé”] - Pe. João Daniel,
Abutres - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 317 1772-1776 - 327
Ac(...) [garça] - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327 Andorinha - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 315
Acanga aitoriá - Pe. João Daniel, 1772-177 - 320 Andorinhas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 328
Acanguera - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 315 Andorinhas [primeira espécie] - Pe. João Daniel,
Acara - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. 1772-1776 - 329
XVII] - 90 Andorinhas [segunda espécie] - Pe. João Daniel,
Acará - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312 1772-1776 (cap. 18) - 329
Acará (2 espécies) - Sampaio, 1775 - 289 Andorinhas do Amazonas - Pe. João Daniel, 1772-
Acará branco - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312 1776 - 328
Acara obu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa Anera [morcego] - Laureano de la Cruz, 1653 - 212
[Séc. XVII] - 91 Anhuma - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 316
Acará-pixuna - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312 Animais peçonhentos - Bettendorff. [1696] - 244
Acará preto - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312 Animal monstrosum - Pinzón, 1500 - 1
Acará-tinga - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312 Animales, huesos de - Laureano de la Cruz,
Acarazes - Queiroz, 1761-1763 - 275 1653 - 213
Acauã - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 320, 321 Anta - Diogo Nunes, 1553 - 5
Acauã [Segunda espécie ou a fêmea da primeira] - Anta - La Condamine, 1743 - 263
Pe. João Daniel, 1772-1776 - 320 Anta - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332, 363, 364
Acoti - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 340 Anta - Sampaio, 1775 - 289
Acotibóia - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 362 Antas - Acuña, 1641 (cap. xxviii) - 167
Acoti puru - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 352, Antas - Heriarte, 1662 - 226, 233, 236
353, 354 Antas - Queiroz, 1761-1763 - 277
Acotipurú (3 espécies) - Sampaio, 1775 - 289 Antas - Sylveira, 1618 - 105
Acotyboia - Queiroz, 1761-1763 - 277 Antas verdadeiras - Sylveira, 1624 - 120
Adens - Queiroz, 1761-1763 - 278 Anu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
XVII] - 95
Adibe - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 340 Anú (duas variedades) - Sampaio, 1775 - 289
Adivinhador [Acauã[ - Pe. João Daniel, 1772-1776 - Anujá - Sampaio, 1775 - 289
321 Apercas - Sylveira, 1618 - 105
Agaga - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Apercas - Sylveira, 1624 - 120
XVII] - 91 Apiha - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Agami - La Condamine, 1743 - 264 XVII] - 92
Águia - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314, 316
Araçari (2 variedades) - Sampaio, 1775 - 289
Aguia de duas cabeças - Pe. João Daniel, 1772-1776
Aracoas - Sylveira, 1624 - 120
- 314
Aracoan - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa
Aguia imperial - Bettendorff, [1698] - 244
[Séc. XVII] - 92
Aguia reral - Bettendorff, [1698] - 244
Aracuan - Sampaio, 1775 - 289
Aguias - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314, 315;
320 Aracús - Queiroz, 1761-1763 - 275
Agulhas - Sylveira, 1624 - 121 Aramaça - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Aí - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 339 XVII] - 90
Aiapa - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Aranha - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 357
XVII] - 91 Aranha [outra espécie de] - Pe. João Daniel, 1772-
Ainum - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 328 1776 - 355
Aiuruiu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Aranhas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 345, 351,
XVII] - 94 355
“Alce” [anta] - La Condamine, 1743 - 263 Aranhas cranguejeiras - Pe. João Daniel, 1772-1776
376 Índice dos Nomes de Animais

- 352, 355 Ayuru quuriqua - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa


Aranhas do mato - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 355 [Séc. XVII] - 94
Aranhas do mato (outras que são semilhantes) - Pe. Bácoro - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 336
João Daniel, 1772-1776 - 355 Bacú - Sampaio, 1775 - 289
Aranhas onças - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 355 Badejo - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 310, 312, 313
Araoanás -Queiroz, 1761-1763 - 275 Bagre - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 310, 348
Arapápa - Sampaio, 1775 - 289 Bagre-dos-livros - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 348
Araquã - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327 Bagres - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 348
Bagres - Sylveira, 1624 - 121
Arara - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Baiacu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312
XVII] - 94
Baracoas - Sylveira, 1618 - 106
Arara - La Condamine, 1743 - 264 Baratas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 347, 348, 361
Arara - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 322, 362 Barbados - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 343
Arára (4 espécies) - Sampaio, 1775 - 289 Barbos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 309
Ararabóia - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 362 Bem-te-vi - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 328
Arara-boya - Sampaio, 1775 - 289 Berbigões - Noronha, 1768 - 281
Arara canindé - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 322 Berbigoês - Sylveira, 1624 - 121
Arara guirajuba - Pe. João Daniel, 1772-1776 Bernes - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 347
(cap. 18) - 322 Besouros - Sampaio, 1775 - 289
Araras [tb. Aráras] - Heriarte, 1662 - 222, 236 Bespas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 352, 357
Araras - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 325, 362 Bezerro - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 356
Bicheiras - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 347, 351
Aráras - Queiroz, 1761-1763 - 278
Bichinhos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 328
Araras - Sylveira, 1624 - 120
Bicho [do pé] - Queiroz, 1761-1763 - 277
Arari - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 322 Bichos do pé - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 346, 347
Araruna - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Bichos-peçonhentos - Bettendorff, [1698] - 242
XVII] - 93 Bicho-vergonhoso - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 307
Araruna - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 322 Bisouros - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 353
Arasarij - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Boi - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332, 333, 363
XVII] - 92 Boiasique - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 362
Arasoare - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Boia-assú - Fonseca, 1749 - 267
XVII] - 94 Boi-marinho - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 307
Arauná - Sampaio, 1775 - 289 Bois - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 328
Arganases - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 340 Bonitos - Sylveira, 1624 - 121
Armadilhos - La Condamine, 1743 - 263 Bontal - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312
Borboleta [em que se transforma o picaflor] - Pe.
Arminho - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 311, 340
João Daniel, 1772-1776 - 330
Arraia - Sampaio, 1775 - 289
Borboletas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 330, 353
Arrayas - Sylveira, 1624 - 121
Borboletas amarelas - Pe. João Daniel, 1772-
Aruana - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. 1776 - 353
XVII] - 90 Borboletas - Sampaio, 1775 - 289
Aruaná - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 309 Borregos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337
Asno - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332 Botos - Heriarte, 1662 - 231
Atiati - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327 Bôtos (2 espécies) - Sampaio, 1775 - 289
Atiausu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Boyapeba - Sampaio, 1775 - 289
XVII] - 91 Boyapéba - Sampaio, 1775 - 289
Atiausu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Boya-piranga ou vermelha - Sampaio, 1775 - 289
XVII], 93 Boyatauá ou amarella - Sampaio, 1775 - 289
Atins - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327 Bravas feras - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 335
Auapessoca - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Búfaras - Pe. João Daniel, 1772-1775 - 332, 365
XVII] - 91 Bugios - Sylveira, 1618 - 105
Aves de agua, otras - Acuña, 1641 (cap. xxviii) - Bugios de dversas castas - Heriarte, 1662 - 236
Burro - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332, 345
167
Buzios - Sylveira, 1624 - 121
Aves en la montaña y árboles del río - Alonso de
Rojas, 1639 - 150
Caba de tatu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 352
Aues de rapina, outras muy reaes - Sylveira,
Cabas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 352
1624 - 120 Cabas - Queiroz, 1761-1763 - 279
Avará ou raposa - Sampaio, 1775 - 289 Cabas-negras - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 352,
Aves, que vivem do marisco - Pe. João Daniel, 1772- 353
1776 - 305 Cabeça de gente - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 320
Avestruzes - Heriarte, 1662 - 236 Cabure - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Avó das piraíbas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 309 XVII] - 93
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 377

Caburé [gavião] - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 315 Capiváras - Queiroz, 1761-1763 - 274
Caburé - Sampaio, 1775 - 289 Caracaraí - Sampaio, 1775 - 289
Caça - Teixeirea, 1639 - 141 Caracaraí - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 315
Caça do mato - Teixeira, 1839 - 140 Caracolejos - Frei Carvajal, [1545] - 31
Cação - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 308 Carãguejos - Sylveira, 1624 121
Caças - Sylveira, 1624 - 116, 117 Caramujos - Sylveira, 1624 - 121
Cachorrinhos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 318 Caranguejos - Bettendorff, [1698] - 241
Caçoês - Sylveira, 1624 - 121 Carneiro - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314
Cães - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314, 318, 324, Carão - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. XVII]
333, 337, 339, 340, 343, 347 - 91
Cães bravos do mato - Pe. João Daniel, 1772-1776 Carão - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 328
- 337 Caráo - Sampaio, 1775 - 289
Cães de caça - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332, Carapaná - Fonseca, 1749
337, 340 Carapaná - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 350
Cães de fila - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332, Carapanases - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 351
337 Caraqopitam - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa
Cães de onças - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332 [Séc. XVII] - 92
Cães domésticos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337 Carará - Sampaio, 1775 - 289
Cães ingleses - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 345 Cardiais - Queiroz, 1761-1763 - 277
Cágado (2 espécies) - Sampaio, 1775 - 289 Caripirá - Sampaio, 1775 - 289
Cágados - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 306, 336 Carlim - - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 310
Caiarára - Sampaio, 1775 - 289 Carrapatos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 354
Caimán - Pe. João Daniel, 1758-1776 - 299, 301 Carrapatos maiores, outra espécie - Pe. João Daniel,
Caimanes - Laureano de la Cruz, 1653 - 211 1772-1776 - 355
Caintau - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 316 Cascavel - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 362
Camaleão - Pe. João Daniel, 1772-1996 - 303 Cascavel (ou Cobra de cascavel) - Queiroz, 1761-
Camaleão (2 espécies) - Sampaio, 1775 - 289 1763 - 274
Camaleões - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 302 Castores - André Pereira, 1616 - 100
Camaleões - Queiroz, 1761-1763 - 277 Castores - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 306
Camaliões - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 336 Cauintau - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 366
Camarão - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 362 Cauitau - La Condamine, 1743 - 264
Camarão - Sampaio, 1775 - 289 Cavalo - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 333
Camarões - Queiroz, 1761-1763 - 280 Cavalo marinho - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 309
Camaroês - Sylveira, 1624 - 121 Cavalos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 318, 335,
Camaroupins - Sylveira, 1624 - 121 337. 351
Cameliões - Heriarte, 1662 - 229 Cavalos marinhos [hipopótamos] - Pe. João Daniel,
Camellos - Frei Carvajal, [1545] 1772-1776 - 307
Camelos - Pe. João Daniel, 1772-1775 - 332 Cayeiyu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Cam-hitaou - Queiroz, 1761-1763 - 279 XVII] - 90
Canários -Pe. João Daniel, 1772-1775 - 330 Caza de monte - Laureano de la Cruz, 1647-1651 -
Cangaitoriá - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 320 196
Cangrejos - Acuña, 1641, cap. xxviii Cegonhas da Europa - Pe. João Daniel, 1772-
Cangrejos bermejuelos del tamanõ de ranas - Frei 1776 - 320
Carvajal, [1545] - 31 Cene[mi] - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 303
Caninana - Sampaio, 1775 - 289 Centopéa - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 361
Caninde - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Centopéas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 361
XVII] - 93 Centopéias - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 361
Canindés - Heriarte, 1662 - 236 Cerdos - Vázquez [1561] - 54
Caninena - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 362 Cernambi - Noronha, 1768 - 281
Cantálidas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 351 Cheriuiuba - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Canuaru - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 356 XVII] - 94
Canzarrão - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 328, 336 Chernes - Sylveira, 1624 - 121
Cão - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314, 328, 332, Chocalheiro [bem-te-vi] - Pe. João Daniel, 1772-
333, 336 1776 - 328
Cão bravo - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 335 Choupas - Sylveira, 1624 - 121
Cão marinho - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 308 Ciganas - Queiroz, 1761-1763 - 278
Cão montez [ver Lontra] - Sampaio, 1775 - 289 Coatá (2 variedades) - Sampaio, 1775 - 289
Cão-bravo-do-mato [ver Cochini] - Pe. João Daniel, Coatás - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 341,
1772-1776 - 337 342, 344
Capivara - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 307 Coati - La Condamine, 1743 - 263
Capivára, ou porco d’agua - - Sampaio, 1775 - 289 Coatí (2 espécies) - Sampaio, 1775 - 289
Capiváras - Heriarte, 1662 - 226, 233, 236 Coatis - Sylveira, 1618 - 105
Capivaras - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 336 Cobra - Anon., 1754 (Relaçam curioza)
378 Índice dos Nomes de Animais

Cobra - Bettendorff, [1696] - 245 Corcovado [ver inambu-uru] - Pe. João Daniel, 1772-
Cobra - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 320, 358, 366 1776 - 327
Cobra [encontrada na árvore seringaúa] - Queiroz, Cordeirinhos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337
1761-1763 - 278 Corica - Sampaio, 1775 - 289
Cobra coral - La Condamine, 1743 - 263 Coricáca - Sampaio, 1775 - 289
Cobra coral -Pe. João Daniel, 1772-1776 - 362 Coricas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 322
Cobra-da-ágoa - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 307 Corimatá - Sampaio, 1775 - 289
Cobra de arára - Sampaio, 1775 - 289 Corimatás - Queiroz, 1761-1763 - 275
Cobra de atrair - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 364 Coroblan - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Cobra de capelo - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 363 XVII] - 90
Cobra de cascavel - Sampaio, 1775 - 289 Coruinas - Sylveira, 1624 - 121
Cobra de cipó - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 363 Corvo [ver Urubú] - Sampaio, 1775 - 289
Cobra de coral - Sampaio, 1775 - 289 Corycas - Sylveira, 1624 - 120
Cobra de cotía - Sampaio, 1775 - 289 Cotia, dente de - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 339
Cobra de duas cabeças - Pe. João Daniel, 1772- Cotía ou coelho americano - - Sampaio, 1775 - 289
1776 - 363 Cotías - Acunã, 1641 (cap. xxviii) - 167
Cobra de duas cabeças (2 variedades) - Sampaio, Cotias - Bettendorff, [1698] - 241, 244
1775 - 289 Cotias - Fonseca, 1749 - 267
Cobra de jabutí - Sampaio, 1775 - 289 Cotias - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314, 339
Cobra de papagaio - Pe. João Daniel, 1772-1776 - Cotias - Queiroz, 1761-1763 - 277
362 Cotias, pele de - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 339
Cobra de papagaio - Sampaio, 1775 - 289 Cotyas - Sylveira, 1624 - 120
Cobra de sacaí [assim chamada por ser cumprida e Cranes - Day, 1632 - 127
muito delgada] - Sampaio, 1775 - 289 Cranguejeira avermilhada - Pe. João Daniel, 1772-
Cobra de sapo - Sampaio, 1775 - 289 1776 - 355
Cobra de uacanuá - Sampaio, 1775 - 289 Cranguejos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 355
Cobra-viscosa - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 364 Crocodilos - Heriarte, 1662 - 233
Cobras - Bettendorff, [1698] - 242 Crocodilos - La Condamine, 1743 - 262
Cobras - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 320, 321, Crocodilos - Pe. João Daniel, 1772-1773 - 299, 333
335, 359, 362, 365, 366 Cucunare - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Cobras - Queiroz, 1761-1763 - 280 XVII] - 90
Cobras aquáticas e anfíbias, várias espécies de - Cuiú-cuiú - Sampaio, 1775 - 289
Pe. João Daniel, 1772-1776 - 307 Cujubí (2 variedades) - Sampaio, 1775 - 289
Cupi - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 359, 360
Cobras de agoa - Heriarte, 1662 - 233, 236
Curaxirí - Sampaio, 1775 - 289
Cobras de agoa, grandissimas - Heriarte, 1662 - 226
Cururina - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327
Cobras de cascavel - Queiroz, 1761-1763 - 278, 279
Cururinas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327
Cobras de desmedida grandeza - Fonseca, 1749 - Cutelo [ver aruaná] - Pe. João Daniel, 1772-1776 -
267 309
Cobras de duas cabeças - Pe. João Daniel, 1772- Cutias - Heriarte, 1662 - 222, 236
1776 - 365 Cuxiú, de grande topete e rabo felpudo - Sampaio,
Cõchas de madre perola - Sylveira, 1624 - 121 1775 - 289
Cochichos - Pe. João Daniel, 1772-1775 - 330
Cochiné - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337 Danta - Frei Carvajal [1545] - 21
Cochinil - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 340 Dantas - Alonso de Rojas, 1639 - 150
Codurniz - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 320 Dantas - Laureano de la Cruz, 1653 - 211
Codurnizes - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 320 Dantas, cueros de - Frei Carvajal, [1545] - 19
Coelho - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 339 Deere - Day, 1632 126
Coelho americano [ver Cotía] - Sampaio, 1775 - 289 Delfins [boto] - Queiroz, 1761-1763 - 274
Coelhos - Bettendorff, [1698] - 242 Dente de jacaré - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 365
Coelhos - Heriarte, 1662 - 236 Doninhas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 356
Coelhos - La Condamine, 1743 - 263 Dormedários - Pe. João Daniel, 1772-1775 - 332
Dourada - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 309
Coelhos -Pe. João Daniel, 1772-1776 - 335, 340
Douradas - Sylveira, 1624 - 121
Coelhos - Sylveira, 1624 - 120
Dragões - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 320
Colhereira - Sampaio, 1775 - 289 Dragões de asas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 365
Colhereiras - Heriarte, 1662 - 222
Colhereiras - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 318 Eirós - Sylveira, 1624 - 121
Colhereiros - Queiroz, 1761-1763 - 277 Elefantes - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332, 365
Colibri - La Condamine, 1743- 264 Ema - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314
Conchas marinhas - Noronha, 1768 - 281 Emas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 319
Conejos - Alonso de Rojas, 1639 - 150 Emas - Sylveira, 1624 - 120
Conies - Day, 1632 - 126 Enagé - Sampaio, 1775 - 289
Coral [cobra] Queiroz, - 1761-1763 - 274 Enambu (7 variedades) - Sampaio, 1775 - 289
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 379

Enambús - Queiroz, 1761-1763 - 279 Galos dos chinas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 320
Enchova - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312 Galos ingleses - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 320
Enxadas - Sylveira, 1624 - 121 Garapanazes [Carapanãs] - Queiroz, 1761-1763 -
Enxareos - Sylveira, 1624 - 121 274, 278, 280
Enxarrocos - Sylveira, 1624 - 121 Garça - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 316
Epené, cotia de rabo e propria do territorio do Rio Garça pequena - Sampaio, 1775 - 289
Branco - Sampaio, 1775 - 289 Garça real - Sampaio, 1775 - 259
Erubins [surubins] - Sylveira, 1624 - 121 Garças - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327
Escorpiões - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 356 Garças - Sylveira, 1618 - 105
Espadarte - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 308 Garças - Sylveira, 1624 - 120
Esturninhos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 322 Garças-reaes - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327
Garçotas - Sylveira, 1624 - 120
Fataças - Sylveira, 1624 - 121 Garibas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314
Feras - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 335, 341 Gato - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314, 328, 332
Foinhas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 339 Gatos - Frei Carvajal, [1545] - 16
Formiga - Queiroz, 1761-1763 - 278 Gatos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 343
Formiga branca - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 360 Gavião - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314, 320,
Formiga-ladra - Heriarte, 1662 330, 335
Formigas [tocandira] - Bettendorff, [1698] - 243 Gavião de campina - Sampaio, 1775 - 289
Formigas - Heriarte, 1662 - 229 Gavião de peixe - Sampaio, 1775 - 289
Formigas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337, 338, Gavião preto de bico amarello - Sampaio, 1775 - 290
357, 358, 359, 360, 363 Gavião real - Sampaio, 1775 - 290
Formigas - Queiroz, 1761-1763 - 277 Gaviões - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 315, 328,
Formigas caseiras - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 359 341
Formigas da correição - Pe. João Daniel, 1772- Gaviões-reais - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 315,
1776 - 358 328
Formigas de fogo - Pe. João Daniel, 1772-1776 - Gazellas - Sylveira, 1624 - 120
337, 358 Gejú - Sampaio, 1775 - 290
Formigas doudas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 359 Genero de ganado de cerda que tiene el ombligo en
Formigas pretas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 359 el lomo - Laureano de la Cruz, 1653 - 211
Formigas pretas (outra espécie) - Pe. João Daniel, Geréba - Sampaio, 1775 - 290
1772-1776 - 359 Gibatos [jabutis] - Sylveira, 1618 - 105
Formigas pretas (outras duas espécies) - Pe. João Giboia - Queiroz, 1761-1763 - 274
Daniel, 1772-1776 - 359 Giboias- Fonseca, 1749 - 267
Formigueiros - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337, Giboya - Sampaio, 1775 290
338, 347, 354, 357, 358, 359, 363 Gozos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 328
Franga - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 321, 327 Gran Bestia - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332
Frangos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 339 Grande mel [Iruçu] - Pe. João Daniel, 1772-1776 -
354
Gado cavalar - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 316, 351 Guacamayas - Vázquez [1561] - 40
Gado vaccum - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 316, Guacamayos, plumas de - Frei Carvajal, [1545] - 23
328, 346, 351 Guahi - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa
Gados - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 335 [Séc. XVII] - 92
Gafanhotos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 328, 357 Guananaí - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 318
Gafanhotos - Sampaio, 1775 - 259 Guananás - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 318, 319
Gaivota branca, de espécie grande - Sampaio, 1775 Guanibu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
- 259 XVII]- 94
Gaivota branca, de espécie pequena - Sampaio, Guará [primeira espécie] - Pe. João Daniel, 1772-
1775 - 259 1776 - 321
Gaivota cinzenta - Sampaio, 1775 - 259 Guará [segunda espécie] - Pe. João Daniel, 1772-
Galgo - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337 1776 - 321
Galgos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337, 341 Guará - Sampaio, 1775 - 290
Galinha - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 319, 320, Guará preto - - Sampaio, 1775 - 290
321, 322, 327, 339 Guarahû - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Galinha-do-Amazonas - Pe. João Daniel, 1772-1776 XVII] - 91
- 303 Guararimá (3 espécies) - Sampaio, 1775 - 290
Galinhas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 322, 324, Guarases [ave] - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 321
325, 326, 327, 328, 329, 335, 339, 348, 360 Guarazes - Heriarte, 1662 - 222
Galinhas crioulas pequenas - Sylveira, 1618 - 105 Guariama - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Galinholas brauas - Sylveira, 1618 - 106 XVII] - 92
Gallinholas - Sylveira, 1624 - 120 Guariba parda - Sampaio, 1775 - 290
Gallos-do-mato - Queiroz, 1761-1763 - 279 Guariba preta - Sampaio, 1775 - 290
Galo - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 319, 320 Guaribas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314,
Galos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327 341, 342
380 Índice dos Nomes de Animais

Guaribas - Queiroz, 1761-1763 - 274 Iundia - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Guirajuba - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 322 XVII] - 90
Guoara - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
XVII] - 92 Jababira - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 310
Guraausu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Jaboti - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 362
XVII] - 92 Jabotí ou tartaruga terrestre - Sampaio, 1775 - 290
Guratimguamerim - Anon., in Frei Cristóvão de Jabotibóia - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 362
Lisboa [Séc. XVII] - 91 Jabotins - Queiroz, 1761-1763 - 275
Guratimguaosu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa Jabotis - La Condamine, 1743 - 262
[Séc. XVII] - 91 Jabotis - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 306, 336
Gurauna - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Jaburú - Sampaio, 1775 - 290
XVII] - 93 Jaburús - Heriarte, 1662 - 236
Jaburus - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 316
Haiuru hite - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Jabutis - Bettendorff, [1698] - 242
XVII] - 94 Jacami - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327
Hares - Day, 1632 - 126 Jacamí (2 variedades) - Sampaio, 1775 - 290
Harpias - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 315 Jacaré - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 299, 302,
Hawkes - Day, 1632 - 127 333
Hennes - Day, 1632 - 127 Jacaré - Queiroz, 1761-1763 - 280
Herodius - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 316 Jacaré (2 espécies) - Sampaio, 1775 - 290
Hiá, macaco noctambulo - Sampaio, 1775 - 290 Jacaré - Queiroz, 1761-1783 - 275
Hicoteas - Vázquez, [1561] - 39 Jacarecuruba - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 365
Homem marinho - Pe. João Daniel, 1758-1776 - 299 Jacaré-curuba - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 301
Hormiga leon [sic] - Pe. João Daniel, 1772-1776 - Jacaré-guaçu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 301
337 Jacareo - Anon., 1754 (Relaçam curioza) - 271
Hormiga leones - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337 Jacarés - Bettendorff, [1698] - 243
Huruuasu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Jacarés - Fonseca, 1749 - 267
XVII] - 93 Jacarés - Heriarte, 1662 - 231, 233, 236
Jacarés - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 300, 301,
Iacami - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. 302, 312, 333
XVII] - 95 Jacarés - Queiroz, 1761-1763 - 274, 275, 279
Iacunda - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Jacaré-tinga - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 301
XVII] - 90 Jacaré-tiribiri - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 301
Iaqu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Jacu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 319, 320
XVII] - 92 Jacú (2 variedades) - Sampaio, 1775 - 290
Ieiu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Jacumin - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 320
XVII] - 90 Jacunda - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 313
Iguana - Acuña, 1641, cap. xxviii Jacus - Sylveira, 1618 - 106
Iguanas - Acuña, 1641 (cap. xxviii) - 167 Jacus - Sylveira, 1624 - 120
Iguanas - Heriarte, 1662 - 233, 236 Jaguar - Sampaio, 1775 - 290
Iguanas - Vázquez [1561] - 52 Jaguareté - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 335
Inage - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 315 Jandiá - Sampaio, 1775 - 290
Inambu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 311, 326 Jandiá - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 308
Jandiás - Queiroz, 1761-1763 - 279
Inambu merim - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa
Jandiá pequeno - Sampaio, 1775 - 290
[Séc. XVII] - 93
Japií - Sampaio, 1775 - 290
Inambu-acumerina [sic; cururina] - Pe. João Daniel,
Japins- Pe. João Daniel, 1772-1776 - 329
1772-1776 - 326
Japú - Sampaio, 1775 - 290
Inambuguaçu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 326
Japys - Queiroz, 1761-1763 - 274
Inambu guaçu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327
Jaraqui - Sampaio, 1775 - 290
Inambu-peba - Pe. João Daniel, 1772-1776 - Jararáca (3 espécies) - Sampaio, 1775 - 290
326, 327 Jararácas - Queiroz, 1761-1763 - 274, 277
Inambu-pecuapé - Pe. João Daniel, 1772-1776 - Jauatí - Sampaio, 1775 - 290
326, 327 Javali - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 335
Inambu-quia - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 326, 327 Javalis - Fonseca, 1749 - 267
Inambus - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327 Javalis - La Condamine, 1753 - 263
Inambu-tona - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 326 Javalis - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314, 335,
Inambu-toro - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 336, 337, 362
326, 327 Javotins- Heriarte, 1662 - 236
Inambu-uru - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 326 Jequeri - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 326
Inguias - Sylveira, 1624 - 121 Jeraraca - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 362
Insectos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 345 Jibóia - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 363
Irára ou papamel - Sampaio, 1775 - 290 Jimdaia - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Iruçu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 354 XVII] - 94
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 381

Juauraitê - Sampaio, 1775 - 290 Macaco - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 343,
Jubatis - Sylveira, 1624 - 1220 344, 355
Jumento - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332 Macaco de boca preta (2 variedades) - Sampaio,
Jupará, ou macaco noctambulo de maior 1775 - 290
corpulencia - Sampaio, 1775 - 290 Macaco de prego grande - Sampaio, 1775 - 290
Jurará - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 303 Macaco de prego pequeno - Sampaio, 1775 - 290
Jurará - Sylveira, 1624 - 120 Macacões - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 340
Jurara do Parra - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa Macaco-prego - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 342
[Séc. XVII] - 90 Macacos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314, 339,
340, 341, 342, 343, 344, 345
Kagados - Bettendorff, [1698] - 242, 243 Macacos - Queiroz, 1761-1763 - 278, 280
Macacos barrigudos - Pe. João Daniel, 1772-
Lacraos[ver escorpião] - Pe. João Daniel, 1772-1776 1776 - 342
- 356 Macacos da quarta espécie - Pe. João Daniel, 1772-
1776 - 342
Lacraos, óleo de - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 356
Macacos da quinta espécie - Pe. João Daniel, 1772-
Ladrão de peixe - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 309
1776 - 342
Lagartas [sic; lagarto] - Pe. João Daniel, 1772-1776
Macacos de prego - Pe. João Daniel, 1772-1776 -
- 355
342, 345
Lagartas, segunda espécie - Pe. João Daniel, 1772-
Macacos guaribas - Pe. João Daniel, 1772-1776 -
1776 - 356
341, 342
Lagartas, terceira espécie - Pe. João Daniel, 1772-
Macaquinhos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 345
1776 - 356
Maçarico (4 espécies) - Sampaio, 1775 - 290
Lagartas, [quarta espécie] - Pe. João Daniel, 1772-
Maçaricos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327
1776 - 356
Maçaricos-reaes - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327
Lagarto - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 307
Mãe-da-ágoa - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 364
Lagartos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 302 Mãe-d’água - La Condamine, 1743 - 263
Lagartos - Vázquez [1561] - 39 Mãe-do-peixe - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 364
Lagartos, conchas de [jacarés] - Frei Carvajal, Maguari - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 316
[1545] - 19 Maguarí grande - Sampaio, 1775 - 290
Lagartos del agua [jacarés] - Vázquez [1561] - 39 Maguarí pequeno - Sampaio, 1775 - 290
Lagartos, grandes e pequenos - Sampaio, 1775 - Maguarim - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
290 XVII] - 91
Lamantin - La Condamine, 1743 - 262 Maipury - Day, 1632 - 126
Lamprea do Rio Amazonas - Pe. João Daniel, 1772- Manatíes - Vázquez [1561] - 49
1776 (cap - 311 Manatis - Frei Carvajal, [1545] - 16
Lampreia, espécie de - La Condamine, 1743 - 262 Manatis, cueros de - Frei Carvajal [1545] - 19
Lampreia torpedo - La Condamine, 1743 - 262 Mandiy - Sampaio, 1775 - 290
Láparo - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 340, 345 Mandubé - Sampaio, 1775 - 290
Lebres - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 339, 340 Manii - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. XVII]
Leão - La Condamine, 1743 - 263 - 90
Leão - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 333, 339, 345 Mapará - Sampaio, 1775 - 290
Lebre americana [ver Paca] - Sampaio, 1775 - 290 Mapará - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 311
Leitão - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337 Maparati - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 311
Leitões - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337 Maracajá - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 335
Leões - Pe. João Daniel, 1772-1775 - 332, 337 Maracajá de malhas miudas - Sampaio, 1775 - 290
Leõespardos - Heriarte, 1662 - 233, 236 Maracajá malhado, com as pontas das orelhas
Leopardos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337 brancas - Sampaio, 1775 - 290
Leõezinhos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 345 Maracajá preto -- Sampaio, 1775 - 290
Lesmas (3 espécies) - Sampaio, 1775 - 290 Maracajá vermelho - Sampaio, 1775 - 290
Lingoados - João Daniel, 1772-1776 - 311, 338 Maracajá, ou onça pequena (4 variedades) -
Lingoados - Sylveira, 1624 - 121 Sampaio, 1775 -290
Linguado - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312 Maracanã grande - Sampaio, 1775 - 290
Lobsters - Day, 1632 - 127 Maracanã pequena - Sampaio, 1775 - 290
Lombrigas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 361 Maracanases - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 322
Lombrigas da ágoa - Pe. João Daniel, 1772- Maraquana - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
1776 - 361 XVII] - 94
Lombrigas dos corpos - Pe. João Daniel, 1772- Mariana - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 319
1776 - 361 Marisco - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 305,
Longueiroês - Sylveira, 1624 - 121 316, 327
Lontra, cão montez - Sampaio, 1775 - 290 Mariscos - Sylveira, 1624 - 117
Lontras - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 306 Maritaca - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 340
Lontras - Queiroz, 1761-1763 - 274 Marreca grande - Sampaio, 1775 290
382 Índice dos Nomes de Animais

Marreca pequena - Sampaio, 1775 - 290 Mosquitos - Acuña, 1641 (cap. xxix) - 167
Marreca-mariana - Pe. João Daniel, 1772-1776 - Mosquitos - Bettendorff, [1698] - 242, 244, 245
319 Mosquitos - Frei Carvajal, [1545] - 15, 18
Marrecão grande - Sampaio, 1775 - 290 Mosquitos - Heriarte, 1662 - 231, 233, 236
Marrecão pequeno - Sampaio, 1775 - 290 Mosquitos - Laureano de Cruz, 1653 - 211, 212, 214
Marreca-puriribaba - Pe. João Daniel, 1772- Mosquitos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 328, 349,
1776 - 319 350, 351, 352, 353, 355
Marrecas - Heriarte, 1662 - 236 Mosquitos - Pimentel, 1705 - 250
Marrecas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 319 Mosquitos - Queiroz, 1761-1763 - 274, 278, 280
Marrecas [espécie menos estimável] - Pe. João Mosquitos - Vázquez [1561] - 42, 49, 55
Daniel, 1772-1776 - 319 Mosquitos do vinho - Pe. João Daniel, 1772-
Marrecas [segunda espécie] - Pe. João Daniel, 1772- 1776 - 349
1776 - 319 Mosquitos meruins - Pe. João Daniel, 1772-1776 -
Marrecas - Queiroz, 1761-1763 - 278 3349
Marrecas - Sylveira, 1624 - 120 Mosquitos que molestan de día - Laureano de la
Marrecões- Pe. João Daniel, 1772-1776 - 318 Cruz, 1653 - 212
Matamatá - Sampaio, 1775 - 290 Mosquitos zancudos - Vázquez [1561] - 40, 49
Matamatas - Heriarte, 1662 - 236 Motucas - Queiroz, 1761-1763 - 274
Maypuri [anta] - La Condamine, 1743 - 263 Motum - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314, 319,
Mayria - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. 320, 327
XVII] - 95 Motuns - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 319
Mecuins - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 345, 346 Motuns-de-fava - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 319
Melro - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 328 Motum grande - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 319
Melros - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 325, 330 Motumpinima - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 319
Mergulhão- - Sampaio, 1775 - 290 Motunguaçu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 319
Mergulhões - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327 Motuns - Heriarte, 1662 - 222
Meros - Sylveira, 1624 - 121 Motuns - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 315, 328
Meruims - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 349, 350 Motuns - Queiroz, 1761-1763 - 278
Meruins - Queiroz, 1761-1763 - 274, 275, 278 Motuns-de-fava - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 319
Mexilhão - Sampaio, 1775 - 290 Motus - Sylveira, 1618 - 106
Mexilhoês - Sylveira, 1624 - 121 Motus - Sylveira, 1624 - 120
Migua - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Mucura (2 espécies) - Sampaio, 1775 - 290
XVII] - 91 Mugens - Sylveira, 1624 - 121
Minhoca - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 360 Mullet - Day, 1632 - 127
Minhoca da ágoa - Pe. João Daniel, 1772- Murciélagos - Laureano de la Cruz, 1653 - 212
1776 - 360 Murucututú (2 espécies) - Sampaio, 1775 - 290
Minhocas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 361 Mutuca-amarela - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 351
Mixano - La Condamine, 1743 - 262 Mutuca grande - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 351
Moani - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. XVII] Mutuca pequena - Pe. João Daniel, 1772-1776 -
- 90 351
Mõçoês [sic; mouchões] - Sylveira, 1624 - 120 Mutuca preta - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 351
Mocotó - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 356 Mutucas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 351, 352
Moçú - Sampaio, 1775 - 290 Mutuca-verde - Pe. João Daniel, 1772-1776 -
Mocuras - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 339 351, 352
Mutum (5 variedades) - Sampaio, 1775 - 290
Moleiros - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 322, 325
Mutum do Pará - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa
Monas - Alonso de Rojas, 1639 - 150
[Séc. XVII] - 95
Monatí - ver Vacca marinha - Sampaio, 1775 - 290
Mutús - Heriarte, 1662 - 236
Monos - Frei Carvajal, [1545] - 16
Monos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 3340, 341
Monstro que vive no Lago Parima - Anon. [Séc. Nãbus - Sylveira, 1624 - 120
XVII] - 80 Nhumas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 366
Morcegos - La Condamine, 1743 - 264 Ninhos de andorinhas - Pe. João Daniel, 1772-1776
Morcegos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 315, - 329
348, 351 Novilhos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332
Morcegos - Queiroz, 1761-1763 - 279
Moreyas - Sylveira, 1624 - 121 O outro motum - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa
Morosoca - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 350 [Séc. XVII] - 95
Moscardo - La Condamine, 1743 - 264 Onça - Anon., 1754 (Relaçam curioza) - 271
Moscas - Bettendorff, [1698] - 245 Onça - Bettendorff, [1698] - 243
Moscas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 326, 328, Onça - Heriarte, 1662 - 223
347, 349, 351, 352, 353, 355, 356 Onça - Sampaio, 1775 - 290
Mosquito - Heriarte, 1662 - 230 Onça - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332, 335,
Mosquito - La Condamine, 1743 - 264 355, 363
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 383

Onça - Queiroz, 1761-1763 - 275 1775 - 290


Onça de malhas grandes - Sampaio, 1775 - 290 Papagaio pequeno de cabeça vermelha, pescoço e
Onça malhada - Sampaio, 1775 - 290 peito amarellos, costas amarellas salpicadas de
Onça preta - - Sampaio, 1775 - 290 vermelho, azas verdes e azues, rabo comprido e
Onças - Heriarte, 1662 - 236 azul - É proprio aos campos do Rio Branco (...);
Onças - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 300, 302, não falla, mas é muito esperto e vivo: vai
305, 333, 335, 339 debuxado no fim d’esta relação - Sampaio,
Onças [aranhas] - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 355 1775 - 291
Onças - Queiroz, 1761-1763 - 277 Papagaio pequeno verde-ferrete - Sampaio, 1775 - 291
Onças pardas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332 Papagaio-real - Sampaio, 1775 - 291
Onças pintadas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332 Papagaio-real - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 322
Onça vermelha -- Sampaio, 1775 - 290 Papagaio-roxo - Sampaio, 1775 - 291
Opequ - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Papagaios - Heriarte, 1662 - 222, 236
XVII] - 93 Papagaios - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 322, 324,
Orucuréa - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. 344
XVII] - 93 Papagaios-moleiros - Pe. João Daniel, 1772-1776 -
Osga - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 355, 356 322
Ostra - Sampaio, 1775 - 290 Papagaios-reaes - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 322
Ostras [bivalvos de água doce] - André Pereira, 1616 Papagaios roxos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 324
- 100 Papagaios-sertanejos - Pe. João Daniel, 1772-1776
Ostras - Bettendorff, [1698] - 241 -323, 325
Ostras do lodo, & de pedras - Sylveira, 1624 - 121 Papagaios [tapiragem] - La Condamine, 1743 - 264
Ouriços [do mar] - Sylveira, 1624 - 121 Papagaio-xia - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa
Ovejas de las del Perú - Frei Carvajal, [1545] - 23 [Séc. XVII] - 94
Ovelhas como as do Peru - Diogo Nunes, 1553 - 5 Papagayos - Frei Carvajal, [1545] -15
Oysters - Day, 1632 - 127 Papagayos - Sylveira, 1624 - 120
Papagayos - Vázquez [1561] - 54, 68
Paca - Bettendorff, [1698] Papagayos blancos - Vázquez [1561] - 40
Paca, a que se póde chamar a lebre americana - Papagayos, plumas de - Frei Carvajal [1545] - 23
Sampaio, 1775 - 290 Papamel [ver Irára] - Sampaio, 1775 - 291
Paca - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337, 362 Pãpanos - Sylveira, 1624- 121
Pacamo - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312, 313 Para-jaguáras [pirá-jaguara] - Heriarte, 1662 - 231
Paçaros d’agoa - Sylveira, 1624 - 120 Paraoiva - Queiroz, 1761-1763 - 278
Pacas - Acuña, 1641 (cap. xxviii) - 167 Paraoivas - Queiroz, 1761-1763 - 279
Pacas - Alonso de Rojas, 1639 - 150 Paraoubóia [ver cobra-de-papagaio] - Pe. João
Pacas - Fonseca, 1749 - 267 Daniel, 1772-1776 - 362
Pacas [tb. Pácas] - Heriarte, 1662 - 222, 236 Pargos - Sylveira, 1624 - 121
Pacas - La Condamine, 1743 - 263 Parrats - Day, 1632 - 127
Pacas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314, 337 Partridges - Day, 1632 - 127
Pacas - Queiroz, 1761-1763 - 277 Pássaro amarelo [Guirajuba] - Pe. João Daniel,
Pacas - Sylveira, 1618 - 105 1772-1776 - 322
Pacas- Sylveira, 1624 - 120 Pássaro-trombeta - La Condamine, 1743 - 264
Paca-sororóca [onça] - Queiroz, 1761-1763 - 277 Passaros - Bettendorff, [1696] - 244
Pacca - Bettendorff, [1696] - 244 Pássaros marinhos - Pe. João Daniel, 1772-
Paccas - Bettendorff, [1696] - 244 1776 - 328
Pacú - Sampaio, 1775 - 290 Pata - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327
Pajaro que decía ‘hui’ - Frei Carvajal, [1545] Pato - Diogo Nunes, 1553 - 5
Pájaros (que se cogen en las playas) - Vázquez Pato - Pe. João Daniel, 1772-1776 (cap. 18) - 327
[1561] - 55 Pato - Sampaio, 1775 - 291
Pájaros del tamaño de palominos que son muy Patos - Acuña, 1641 (cap. xxviii) - 167
gordos y sabrosos - Vázquez, [1561] - 39 Patos - Bettendorff, [1698] - 242
Pangolim - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 307 Patos - Heriarte, 1662 - 236
Panteras - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332 Patos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 318, 319, 324,
Pantheras - Heriarte, 1662 - 233, 236 327, 328
Papagaio - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 324, 362 Patos - Queiroz, 1761-1763 - 274, 278, 279
Papagaio [quinta espécie] - Pe. João Daniel, 1772- Patos - Sylveira, 1618 - 105
1776 - 322 Patos - Sylveira, 1624 - 120
Papagaio amarello - Sampaio. 1774-1775 - 290 Patos bravos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 318
Papagaio azul - Sampaio. 1774-1775 - 290 Patos do mato - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 318
Papagaio moleiro - Sampaio. 1774-1775 - 290 Patos guananás - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 318
Papagaio-ordinario - Sampaio. 1774-1775 - 290 Patos mansos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 318
Papagaio-pequeno - Sampaio. 1774-1775 - 290 Patos ordinários - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 318
Papagaio pequeno de cabeça amarella - Sampaio, Paujíes - Alonso de Rojas, 1639 - 150
384 Índice dos Nomes de Animais

Pau maqui [sic; tambaqui] - Pe. João Daniel, 1772- Perdiz - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 326, 327
1776 - 308 Perdiz da Europa - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 326
Pavão - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 326 Perdizes - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 319, 327
Pavão de especie grande - Sampaio, 1775 - 291 Perseues - Sylveira, 1624 - 121
Pavão de respecie pequena - Sampaio, 1775 - 291 Periquitos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 325
Pavas - Frei Carvajal [1545] - 14 Periquitos - Queiroz, 1761-1763 - 274
Pavas del monte - Alonso de Rojas, 1639 - 150 Pernambins - Sylveira, 1624
Pavos - Heriarte, 1662 - 222 Perolas - André Pereira, 1616
Páxaro predicador - Pe. João Daniel, 1772-1776 - Peru - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314, 316, 317,
321 319, 326
Peba [Inambu] - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327 Peruns - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 324, 325
Perus - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314, 316, 321
Pecuapé [Inambu] - Pe. João Daniel, 1772-1776 -
Pescada - Sampaio, 1775 - 291
327
Pescadas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 311
Pedra bazar - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337
Pescadillos - Laureano de la Cruz, 1647-1651 - 199
Pedra de águia - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314
Pescado - Diogo Nunes , 1553 - 4
Pedra de camaleão - Pe. João Daniel, 1772-1776 -
Pescado - Frei Carvajal [1545] - 20
366
Pescado - Laureano de la Cruz, 1653 - 196, 211, 214
Pedra de cobra - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 366
Pescado - Vázquez [1561] - 39, 42, 49, 54
Pedra de porco espinho - Pe. João Daniel, 1772-
Pescado de cinco palmos - Frei Carvajal [1545] - 19
1776 - 336
Pescados - Frei Carvajal [1545] - 14, 16
Pedra de sapo - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 357
Pescados - Sylveira, 1624 - 116
Pedras de viado - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337
Pescados - Vázquez [1561] - 40, 56
Pegadores - Pe. João Daniel, 1772-1776, cap. 16
Pescados, otros - Frei Carvajal [1545] - 16
(101)
Pescarias - Sylveira, 1624 - 117
Peixe - Bettendorff (1698] - 241, 242, 244
Peúns - Pimentel, 1705 - 249
Peixe - Heriarte, 1662 - 232
Pheasants - Day, 1632 - 127
Peixe - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314, 328
Pian - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Peixe - Teixeira, 1639 - 141
XVII] - 90
Peixe-boi - Bettendorff, [1696] - 242, 243, 244
Picaflor - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 330
Peixe-boi - Heriarte, 1662 - 222. 226, 228, 232
Pica-flôr (muitas variedades) - Sampaio, 1775 - 291
Peixe-boi - La Condamine, 1743 - 262
Peixe-boi - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 307 Picapáo (muitas variedades) - Sampaio, 1775 - 291
Peixe-boi - Queiroz, 1761-1763 - 275, 277 Picapáos - Queiroz, 1761-1763 - 280
Peixe boi [ver Vacca marinha] - Sampaio, 1775 - 291 Pigeons - Day, 1632 - 127
Peixe boy - Sylveira, 1618 - 105 Pinchês - La Condamine, 1743 - 263
Peixe boy - Sylveira, 1624 - 120 Pintassilgo - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 329, 330
Peixe-cão - Pe. João Daniel, 1772- 1776 - 308 Pintos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 348, 360
Peixe cascudo - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312 Piolho - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 346
Peixe-cavalo - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 310 Piolhos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 346
Peixe-do-mato - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 313 Piráandirá - Sampaio, 1775 - 291
Peixe-espada - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 308 Pirá-apapá - Sampaio, 1775 - 291
Peixe-espadarte - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 308 Pirá-catinga - Sampaio, 1775 - 291
Peixe-gallo - Sylveira, 1624 - 121 Pirá-enambú - Sampaio, 1775 - 291
Peixe inambu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 311 Pirágepeauá - Sampaio, 1775 - 291
Peixe ladrão - - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 309 Pirahyba - Bettendorff, [1696] - 244
Peixes - Bettendorff, [1698] - 241, 242 Piraíba - Sampaio, 1775 - 291
Peixes - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 316 Piraíba - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 308, 309,
Peixes - Teixeira, 1639 - 140 311, 312
Peixes-boi s- Bettendorff, [1698] - 242 Piraíba-remuia [“avó das piraíbas”] - Pe. João Daniel,
Peixes-bois - Noronha, 1768 - 281 1772-1776 - 311
Peixes-pedras - Sylveira, 1624 - 121 Piraíbas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 311
Peixes reys - Sylveira, 1624 - 121 Pirainambu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 311
Peixinhos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327 Pirajaquara - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 308
Pejebuey - Acuña, 1641 (cap. xxv) - 165 Pira mota - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Peje buey - Laureano de la Cruz, 1653 - 211 XVII] - 90
Pelicano [sic] - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 318 Piranha - Sampaio, 1775 - 291
Pequenos bichinhos, várias espécies de - Pe. João Piranha - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 313
Daniel, 1772-1776 - 307 Piranhas - Queiroz, 1761-1763 - 274, 275
Peraque - Acuña, 1641 (cap. xxvii) - 166 Pirapecú (2 espécies) - Sampaio, 1775 - 291
Percebejos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 347, 355 Pirapema - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312
Perdices - Acuña, 1641 (cap. xxviii) - 167 Pirapitinga - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 311
Perdices - Alonso de Rojas, 1639 - 150 Pirapitinga [outra espécie] - Pe. João Daniel, 1772-
Perdices - Frei Carvajal, [1545] - 14, 16 1776 - 311
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 385

Pirára - Sampaio, 1775 - 291 Pulgas - Queiroz, 1761-1763 - 277


Pirarará - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 309 Pulgas da América [viados] - Pe. João Daniel, 1772-
Pirarocu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 308 1776 - 337
Piraui - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Puma - La Condamine, 1743 - 262
XVII] - 90 Puquasu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Pirauruca - Piráurucú - Sampaio, 1775 - 291 XVII] - 94
Piráurucú - Noronha, 1768 - 282 PuriripabasPe. João Daniel, 1772-1776 - 319
Piriquito (4 espécies) - Sampaio, 1775- 291 Pyràguivas - Sylveira, 1624 - 121
Pirorocús - Queiroz, 1761-1763 - 275 Pyraiaguara - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Pitauan (2 espécies) - Sampaio, 1775 - 291 XVII] - 90
Pium - Queiroz, 1761-1763 - 274
Piuns - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 349 Quatro-olhos - Pe. A. Vieira, 1654 - 219
Pixi - Sampaio, 1775 - 291 Quereiuhi - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Plagas - Laureano de la Cruz, 1653 - 212 XVII] - 94
Polhos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 360 Quia [Inambu] - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327
Polvos - Sylveira, 1624 - 121 Quiquiós - Queiroz, 1761-1763 - 274
Pomba (7 variedades) - Sampaio, 1775 - 291
Pombas - Sylveira, 1618 - 106 Rafeiros - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332
Pombinhas do mato - Queiroz, 1761-1763 - 275 Ralo - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 348
Pombos - Bettendorff, [1698] - 242 Raposa - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332
Poquohi - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Raposa - ver Avará - Sampaio, 1775 - 291
XVII] - 95 Raposas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 339
Poraqué - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312 Raposas da Europa - Pe. João Daniel, 1772-
Poraqué - Queiroz, 1761-1763 - 277 1776 - 340
Poraqué, ou tremelga americana - Sampaio, 1775 - Rapozas - Queiroz, 1761-1763 - 277
291 Rato (2 espécies) - Sampaio, 1775 - 291
Porco - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 333, 336, 337 Ravenous fowles - Day, 1632 - 127
Porco d’agua - ver Capivára - Sampaio, 1775 - 291 Requeimes - Sylveira, 1624 - 121
Porco do matto - Bettendorff, [1696] - 243 Rinocerontes - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 365
Porco espim - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 336 Roballo - Sylveira, 1624 - 121
Porco espinho - Pe. João Daniel, 1772-1776 - Rolas - Sylveira, 1624 - 120
336, 356 Rollas - Sylveira, 1618 - 106
Porco montês - Diogo Nunes, 1553 - 5 Rouxinóes - Pe. João Daniel, 1772-1775 - 330
Porco montez - Queiroz, 1761-1763 - 279
Porcos - Bettendorff, [1696] - 244 Sagoins - La Condamine, 1743 - 263
Porcos - Heriarte, 1662 - 222, 236 Saguim - Sampaio, 1775 - 291
Porcos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 336, 337, Saguins - La Condamine, 1743 - 263
362 Saguins - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 345
Porcos - Sylveira, 1618 - 105 Saguins brancos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 345
Porcos bravos - Sylveira, 1624 - 120 Saguis - Sylveira, 1618 - 105
Porcos do matto - Bettendorff, [1698] - 241, 244 Sammon, fish like a - Day, 1632 - 127
Porcos-espinhos - La Condamine, 1743 - 263 Sapajus - La Condamine, 1743 - 263
Porcos espinhos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 336 Sapinhos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 356
Porcos-espins - Queiroz, 1761-1763 - 280 Sapo que tem corno na cabeça - Pe. João Daniel,
Porcos monteses - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 1772-1776 - 357
336, 337 Sapo do mato - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 356
Porcos montezes - Queiroz, 1761-1763 - 277 Sapos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 356
Porcos selvagens - Bettendorff, [1698] - 242 Saracuras - Queiroz, 1761-1763 - 274, 277
Poteri - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Saracura (2 variedades) - Sampaio, 1775 - 291
XVII] - 91 Sarapó - Sampaio, 1775 - 291
Praga - Queiroz, 1761-1763 - 278 Sargos - Sylveira, 1624 - 121
Praira [Traíra]- Queiroz, 1761-1763 - 278 Saúbas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 357, 358,
Prego [macaco] - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 342 359
Preguiça - Queiroz, 1761-1763 - 277 Say - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. XVII]
Preguiça [ver aí] - Pe. João Daniel, 1772-1776 - - 93
339 Scate - Day, 1632 - 127
Preguiça do Brasil - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 339 Sea-breame - Day, 1632 - 127
Preguiças - La Condamine, 1743 - 263 Sea-cow - Day, 1632 - 126
Puercos - Vázquez [1561] - 49 Seale - Day, 1632 - 126
Puercos de monte - Vázquez [1531] - 49 Seracuras - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 325, 326
Puercos montaraces - Acuña, 1641 (cap. xxviii) - 167 Seracura-caapora - Pe. João Daniel, 1772-
Puercos monteses - Alonso de Rojas, 1639 - 150 1776 - 326
Pulgas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 346, 347, Seracura-do-mato - Pe. João Daniel, 1772-
354 1776 - 326
386 Índice dos Nomes de Animais

Seracura-guaçu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 326 Tarairabóia - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 362
Serobi - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 313 Tarerire - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Serobins - Queiroz, 1761-1763 - 275 XVII] - 90
Serpente - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 345, 365 Tariira grande - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 311
Serpentes - La Condamine, 1743 - 263 Tariira guaçu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 311
Serpentes - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 345 Tariiraguaçu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 311
Tartaruga - Bettendorff, [1696] - 242, 245
Sertanejos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 322, 325
Tartaruga - Pedro Teixeira, 1639 - 141
Sevandijas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 328, 345,
Tartaruga - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 303, 304
349, 353, 361
Tartaruga - Queiroz, 1761-1763 - 275, 277
Sevandivas [sic] - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 345 Tartaruga - Sampaio, 1775 - 291
Shrimpes - Day, 1632 - 127 Tartaruga de menor especie - Sampaio, 1775 - 291
Siaum - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. XVII] Tartaruga do Amazonas - La Condamine, 1743 -
- 90 262
Soale - Day, 1632 - 127 Tartaruga maior - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 303
Socó (4 espécies) - Sampaio, 1775 - 291 Tartaruga menor - Pe. João Daniel, 1772-1776 -
Socó grande pintado - Sampaio, 1775 - 291 303
Socó grande vermelho - Sampaio, 1775 - 291 Tartaruga terrestre - ver Jabotí - Sampaio, 1775 - 291
Socó pequeno azul - Sampaio, 1775 - 291 Tartarugas - Bettendorff, [1698] - 242, 243, 244, 245
Socó pequeno pintado - Sampaio, 1775 - 291 Tartarugas - Fonseca, 1749 - 267, 269
Solhos - Sylveira, 1618 - 105, 1624 Tartarugas - Heriarte, 1662 - 236
Solitários - Pe. João Daniel, 1772-1775 - 330 Tartarugas - Noronha, 1768 - 281
Stockdoves - Day, 1632 - 127 Tartarugas - Pedro Teixeira, 1639 - 141
Storkes - Day, 1632 - 127
Tartarugas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 300, 304,
Stupefa[cio] - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312
305, 306, 336
Suassuarana - Queiroz, 1761-1763 - 277
Tartarugas - Queiroz, 1761-1763 - 275
Sucurijú - Queiroz, 1761-1763 - 274
Tartarugas - Sylveira, 1618 - 105
Sucurujú - Sampaio, 1775 - 291
Tartarugas de casco - Pe. João Daniel, 1772-1776 -
Sucurujús - Fonseca, 1749 - 267
303
Sucurujús - Queiroz, 1761-1763 - 278
Tartarugas do Amazonas - Pe. João Daniel, 1772-
Suglacuru - La Condamine, 1743 - 264
1776 - 303
Sui - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Tartarugas de viração - Bettendorff, [1698] - 242
XVII] - 90
Tartarugas do salgado - Pe. João Daniel, 1772-1776
Surubí - Sampaio, 1775 - 291
Surucuá (3 espécies) - Sampaio, 1775 - 291 - 303
Surucucú - Anon., 1754 (Relaçam curioza) - 271 Tartarugas ordinárias do salgado - Pe. João Daniel,
Surucucu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 362 1772-1776 - 303
Surucucú - Queiroz, 1761-1763 - 274 Tatu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 336, 352
Surucucú (2 espécies) - Sampaio, 1775 - 291 Tatú - Queiroz, 1761-1763 - 277
Surucuju - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 364, 366 Tatú (3 especies) - Sampaio, 1775 - 291
Swordfish - Day, 1632 - 127 Tatu-caba - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 352
Tatús - Heriarte, 1662 - 222, 236
Tacibas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337 Tatus - La Condamine, 1743 - 263
Taiassú - Sampaio, 1775 - 291 Tatús - Sylveira, 1624 - 122
Tainhas - Bettendorff, [1698] - 242 Teieiu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Taititú - Sampaio, 1775 - 291 XVII] - 90
Tamandoás - Heriarte, 1662 - 236 Tem-tem - Pe. João Daniel, 1772-1776 (cap. 18) - 330
Tamandoássú - Queiroz, 1761-1763 - 277 Tem tem [primeira espécie] - Pe. João Daniel, 1772-
Tamanduá - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337, 338 1776 - 330
Tamanduá-i - Sampaio, 1775 - 291 Tem tem [segunda espécie] - Pe. João Daniel, 1772-
Tamanduá-i amarello - Sampaio, 1775 - 291 1776 - 330
Tamanduá-i preto - Sampaio, 1775 - 291 Tem tem [terceira espécie] - Pe. João Daniel, 1772-
Tamanduá-uassú - Sampaio, 1775 - 291 1776 - 330
Tamanduás - La Condamine, 1743 - 263 Temtém amarello - Sampaio, 1775 - 291
Tamarins - La Condamine, 1743 - 263 Temtém preto - Sampaio, 1775 - 291
Tamatian - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Tesoura [piranha] - Pe. João Daniel, 1772-1776
XVII] - 92 (cap. 16) - 313
Tambaquiz - Bettendorff, [1698] - 244 Tetem - Queiroz, 1761-1763 - 275
Tamuatá - Sampaio, 1775 - 291 Thornebacke - Day, 1632 - 127
Tangará (muitas variedades) - Sampaio, 1775 - 291 Tigre - Bettendorff, [1696] - 244
Tapira - La Condamine, 1743 - 263 Tigre - Heriarte, 1662 - 223
Taquerú - Sampaio, 1775 - 291 Tigre - La Condamine, 1743 - 263
Taraíra - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 362 Tigre leão [aranha] - Pe. João Daniel, 1772-1776 -
Taraíra (2 espécies) - Sampaio, 1775 - 291 355
O Novo Éden: a fauna da Amazônia brasileira nos relatos de viajantes e cronistas... 387

Tigres - Heriarte, 1662 - 233, 236 Tubarões - - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 309, 312
Tigres - Laureano de la Cruz, 1653 - 211 Tucanarés (ou tukenaré) - Queiroz, 1761-1763 - 275
Tigres - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 300, 302, 305, Tucano - La Condamine, 1743 - 264
332, 365 Tucunaré - Bettendorff, [1698] - 245
Tigres bibós - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332 Tucunaré - Sampaio, 1775 - 291
Tigres pretos - Queiroz, 1761-1763 - 277 Tuiuiú - Sampaio, 1775 - 291
Tigres reaes - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332 Tukenaré - Queiroz, 1761-1763 - 275
Tihemirim - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Tumurupára - Sampaio, 1775 - 291
XVII] - 95 Turu - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 360, 361
Tijijiê - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 316 Turu da terra - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 361
Tijijiés - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 325
Tinguara - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Uacarí - Sampaio, 1775 - 291
XVII] - 93 Uacarí-uá - Sampaio, 1775 - 291
Tiriuos - Heriarte, 1662 - 236 Uaiapeçá (2 variedades) - Sampaio, 1775 - 291
Tocana ira - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 354 Uagra [anta] - La Condamine, 1743 - 263
Tocano - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. Uanambé (3 variedades) - Sampaio, 1775 - 291
XVII] - 93 Uaracapurí - Sampaio, 1775 - 291
Tocano - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 321, 322, Uaracú - Sampaio, 1775 - 291
354 Ucumari - La Condamine, 1743 - 263
Tocano (2 variedades) - Sampaio, 1775 - 291 Uirapanéma - Sampaio, 1775 - 291
Tocános - Sylveira, 1624 - 120 Uirauassú - Sampaio, 1775 - 291
Toconaré - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312 Uiraúna - Sampaio, 1775 - 291
Tohi - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. XVII] Unicórnio - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 360, 366
- 94 Unicornio [ver Cam-hitaou] - Queiroz, 1761-1763 -
Tohim hite - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. 279
XVII] - 94 Unicórnios - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 365
Toitoy - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. XVII] Upiaua - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
- 92 XVII] - 90
Tombura [ver bicho-do-pé] - Pe. João Daniel, 1772- Ursos - La Condamine, 1743 - 263
1776 - 346 Ursos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332, 335, 341
Toncanguiras - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 357 Urú - Sampaio, 1775 - 291
Topiaí - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 357 Uru - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327
Topi-caba - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 352 Urú - Queiroz, 1761-1763 - 277
Tordos - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 328, 329 Urubu [primeira espécie]- Pe. João Daniel, 1772-
Tordos - Sylveira, 1624 - 120 1776 - 316
Toro[Inambu] - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 327 Urubu [segunda espécie]- Pe. João Daniel, 1772-
Torpedo - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 312, 313 1776 - 317
Tortuga, huevos de - Laureano de la Cruz, 1653 - Urubú - Queiroz, 1761-1763
199 Urubu branco - - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 317
Tortuga - Vázques, [1561] - 39, 55 Urubú ou corvo (3 espécies) - Sampaio, 1775 - 291
Tortugas - Acuña, 1641 (cap. xxvi) - 166 Urubus - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 364
Tortugas - Frei Carvajal, [1545] - 15, 16, 20, 25 Urubu-tinga - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 317, 318
Tortugas - Heriarte, 1662 - 226.227, 228 Urubus-tingas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 318
Tortugas - Laureano de la Cruz, 1653 - 211, 212, Uruiaoara [onça] - Queiroz, 1761-1763 - 277
213, 214 Urumutum - Sampaio, 1775 - 291
Tortugas - Vázquez [1561] - 40, 42, 49
Tortugas, conchas de - Laureano de la Cruz, 1653 - Vaca marinha - La Condamine, 1743 - 262
213 Vacari - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa
Tortugas grandes - Vázquez [1561] - 39, 42 [Séc. XVII] - 90
Tortugas, huevos de - Vázquez [1561] - 39 Vacca - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 332
Tosto - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 315 Vacca marinha, peixe boi, ou Monatí - Sampaio,
Toupeira - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 361 1775 - 291
Touro - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 328, 333 Vacu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. XVII]
Touros - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 316, 332 - 90
Traçado [terçado; ver Aruaná] - Pe. João Daniel, Vaquinhas do mato - Pe. João Daniel, 1772-1776 -
1772-1776 - 309 337
Tracajá - Sampaio, 1775 - 291 Vareja - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 347
Tracajás - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 303 Varejas - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 347, 351
Tremelga americana - ver Poraqué - Sampaio, 1775 Varem - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. XVII]
- 291 - 90
Tremelgas - Noronha, 1768 - 281 Veado - Bettendorff, [1696] - 245
Trompetero - La Condamine, 1743 - 264 Veado - Diogo Nunes, 1553 - 5
Tubarão - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 309 Veado - Pe. João Daniel, 1772-1775 - 363
388 Índice dos Nomes de Animais

Veado grande de campina, com arvores - Sampaio, Vrepe - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc. XVII]
1775 - 291 - 93
Veado pequeno com pontas sem ramos - Sampaio, Vupapussas [Uapuçás]- Queiroz, 1761-1763 - 278
1775 - 291
Veado vermelho do mato, sem pontas - Sampaio, Wild-duckes - Day, 1632 - 127
1775 - 291 Wilde-geese - Day, 1632 - 127
Veados - Bettendorff, [1698] - 241, 242 Wilde swine - Day, 1632 - 127
Veados - Fonseca, 1749 - 267
Veados - Heriarte, 1662 - 222, 236
Xeribóia - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 362
Veados - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 314
Veados - Queiroz, 1761-1763 - 277, 279 Xerobim - Heriarte, 1662 - 222
Veados - Sylveira, 1618 - 105
Veados - Sylveira, 1624 - 120 Yaboru - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa
Venado - Acuña, 1641 (cap. xxviii) - 167 [Séc. XVII] - 90
Venados - Alonso de Rojas, 1639 - 150 Yacu-mama - La Condamine, 1743 - 263
Veneno das cobras - Pe. João Daniel, 1772-1775 - Yagotis - Acuña, 1641 (cap. xxviii) - 167
365 Yamdu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Venenosos bichos - Pe. João Daniel, 1772-1775 - 335 XVII] - 92
Verme-macaco - La Condamine, 1743 - 264 Yapacaní - Sampaio, 1775 - 291
Yapehi - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Viados - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337
XVII] - 93
Viados-da-campina - Pe. João Daniel, 1772-
Ycoteas - Alonso de Rojas, 1639 - 150
1776 - 337
Ynambuasu - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa
Viados-do-mato - Pe. João Daniel, 1772-1776 - 337
[Séc. XVII] - 92
Vibora - Pe. João Daniel, 1772-1775 - 362
Yoroti - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Viboras - Laureano de la Cruz, 1653 - 211
XVII] - 94
Virajuba - Sampaio, 1775 - 291
Vpequa - Anon., in Frei Cristóvão de Lisboa [Séc.
Zancudos - Vázquez [156l] - 55
XVII] - 91

View publication stats

Você também pode gostar