Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
lga
ivu
od
nã
4-
20
P0
FL
m
oe
us
ra
pa
Copyright © 2021 by Virgílio Afonso da Silva
1ª edição 2021
1ª reimpressão 2021
2ª reimpressão 2021
pa
ra
us
oe
Bibliografia.
ISBN 978-65-5785-005-3
P0
Direitos reservados à
A meu pai,
José Afonso da Silva,
20
Agradecimentos ........................................................................................................... 17
Apresentação ................................................................................................................ 21
4-
Introdução .................................................................................................................... 25
Parte i – Constituição
nã
od
Parte ii – Direitos
r
* Um sumário detalhado, com todas as subdivisões dos capítulos, encontra-se no fim deste livro.
10 Direito Constitucional Brasileiro
Parte iv – Desafios
od
ac – Ato Complementar
aco – Ação Civil Originária
20
ap – Ação Penal
are – Agravo em Recurso Extraordinário
r
cp – Código Penal
cpc – Código de Processo Civil
cpi – Comissão Parlamentar de Inquérito
cpt – Comissão de Finanças e Tributação
ec – Emenda Constitucional
ecr – Emenda Constitucional de Revisão
Enem – Exame Nacional do Ensino Médio
Ext – Extradição
pa
if – Intervenção Federal
igpm – Inspetoria-Geral das Polícias Militares e dos Corpos de Bombeiros Militares
oe
mc – Medida Cautelar
mi – Mandado de Injunção
nã
ms – Mandado de Segurança
msc – Mensagem do Poder Executivo ao Poder Legislativo
od
Pet – Petição
pib – Produto Interno Bruto
r
Rcl – Reclamação
rcn – Resolução do Congresso Nacional
re – Recurso Extraordinário
resp – Recurso Especial (stj)
respe – Recurso Especial Eleitoral (tse)
rg – Repercussão Geral
rhc – Recurso ordinário em Habeas Corpus
ricd – Regimento Interno da Câmara dos Deputados
pa
ss – Suspensão de Segurança
sta – Suspensão de Tutela Antecipada
FL
Federalismo
ra
us
oe
m
FL
P0
evitar a fragmentação territorial que havia ocorrido nos territórios antes colonizados
pela Espanha. Embora ideias federalistas estivessem constantemente presentes na-
4-
quele momento, a oportunidade concreta para sua adoção surge apenas no último
quarto do século xix, com o fortalecimento do movimento republicano. Com a
nã
A despeito das inúmeras alterações em sua configuração desde então, ambos con-
tinuam a ser as principais instituições do Brasil contemporâneo. A Constituição de
1891 vedava emendas que tendessem a abolir a forma federativa de Estado (art. 90,
ivu
§ 4º). A Constituição de 1988 manteve essa tradição (art. 60, § 4º, i)1.
Apesar de ter sido cláusula pétrea em quase todas as constituições brasileiras, a
lga
forma federativa de Estado talvez tenha sido a variável institucional que mais sofreu
os impactos das diversas turbulências políticas, institucionais e constitucionais do
r
Quando se fala em forma de Estado, quer se fazer menção à maneira como o po-
der é organizado, compartilhado e exercido no território de um determinado país.
P0
formas de Estado, sobretudo porque a diferença entre elas não se resume a uma
gradação entre a extrema centralização e a extrema descentralização. Em outras
4-
federal centralizado.
É possível afirmar que todo Estado tem algum nível de descentralização. Ou
seja, não é possível supor que, em algum Estado, todas as decisões sejam tomadas
ivu
por uma autoridade central, desde decisões sobre política econômica até decisões
sobre instalação de semáforo em determinado cruzamento viário. É intuitivo supor
lga
que, em qualquer Estado, há decisões que são tomadas de forma centralizada (sobre
política econômica, por exemplo), enquanto algumas decisões locais são tomadas
r
3. Embora houvesse alguma previsão de compartilhamento de competências já na Constituição de 1934 (art. 10),
um sistema amplo de competências concorrentes foi introduzido apenas pela Constituição de 1988.
Federalismo 355
Mais do que isso, não seria impossível imaginar um exemplo de Estado unitário
no qual autoridades locais ou regionais tenham mais competências (isto é, podem
decidir sobre mais coisas) do que as autoridades locais ou regionais de um hipotético
Estado federal. Ou seja, embora essa não seja a regra, um Estado unitário pode ser
tão descentralizado quanto um Estado federal.
Suponha o Estado unitário U e o Estado federal F. O Estado U é dividido em
departamentos, F é composto por estados membros. Os chefes dos departamentos
em U são eleitos por seus moradores e os governadores dos estados em F também
pa
são eleitos por seus habitantes. O mesmo vale para as assembleias departamentais de
U e as assembleias legislativas de F. Mais do que isso: essas assembleias têm poderes
ra
dessa autonomia? Ser autônomo, nesse contexto, significa poder tomar as decisões
que entender corretas e convenientes na sua área de competência e ter a garantia
FL
de que essa área de competência não será alterada. Nesse sentido, se os estados
em F podem legislar sobre os temas t1, t2 e t3, não há nada que o governo central
P0
de F possa fazer para impedir que os estados membros legislem sobre esses temas.
De forma similar, se os estados em F têm direito às receitas dos impostos i1, i2 e
20
i3, o governo central de F não pode alterar isso. E, por fim, se os governadores
e as assembleias legislativas dos estados membros de F são eleitos diretamente, o
4-
governo central não pode interferir nessa organização. Nada disso, contudo, vale
para os departamentos de U. O fato de que, no exemplo, esses departamentos têm
nã
competências legislativas, essas receitas e essa organização política não possam ser
alteradas posteriormente pelo poder central de U.
Neste momento já ficou claro que a fonte da autonomia dos estados em F é a
ivu
receitas das divisões administrativas em um Estado unitário (as quais foram chamadas
de departamentos, mas podem ter outros nomes, como províncias, regiões, dentre
r
locais de poder. Essas delegações, em geral, podem ser alteradas ou mesmo revo-
gadas a qualquer tempo.
Uma comparação entre as constituições brasileiras de 1824 e 1891 pode
ser ilustrativa. Como já mencionado, durante o Império o Brasil foi um Estado
unitário, tendo sido a federação criada com a proclamação da República. Mesmo
sendo um Estado unitário, o Brasil era dividido em províncias durante o Império.
A Constituição de 1824 tinha algumas disposições sobre essas províncias. As princi-
pais delas eram o art. 2º (“O seu território [do Império] é dividido em Províncias
pa
(“Estes Conselhos terão por principal objeto propôr, discutir, e deliberar sobre
os negócios mais interessantes das suas Províncias; formando projetos peculiares,
us
e qualquer poder ou direito, que lhes não for negado por cláusula expressa ou
implicitamente contida nas cláusulas expressas da Constituição”. O Senado, já
20
1891 continha uma explícita cláusula de não intervenção da União nos estados
(art. 6º) e definia tanto a forma federal de Estado quanto a igualdade da repre-
nã
sentação dos estados no Senado como cláusulas pétreas, isto é, protegidas contra
emendas (art. 90, § 4º)4.
od
federal, mas também dos legislativos estaduais, como ocorre, por exemplo, nos
Estados Unidos e no México5. Por fim, em Estados federais costuma-se atribuir a
um órgão neutro – com frequência a uma suprema corte – a tarefa de resolver
conflitos federativos6.
Mas há experiências distintas, nas quais o Estado soberano já existe com forma
unitária e, em algum momento de sua história, transforma-se em um Estado federal,
FL
por meio de uma espécie de refundação, a qual, embora não modifique território
e soberania anteriormente existentes, constitui um novo pacto constitucional, em
P0
que estados membros entram como parte constitutiva tanto quanto a União. O caso
do Brasil, em 1889, é um exemplo nesse sentido. Mas há outros exemplos, como a
20
Bélgica e a Argentina.
Independentemente do processo de criação, as razões para se adotar a forma
4-
federativa são numerosas. Elas podem envolver extensão territorial (todas as maiores
democracias do mundo adotam a forma federal); mas não necessariamente, porque
nã
há países pequenos que também adotam a forma federativa, como a Bélgica, a Suí-
ça e a Bósnia Herzegóvina, por exemplo. Em geral, a adoção do federalismo está
od
5. Ver Constituição dos Estados Unidos, art. v (que exige a aprovação das emendas por 3/4 das assembleias
estaduais) e Constituição do México, art. 135 (que exige a aprovação pela maioria das assembleias estaduais).
6. Não é coincidência, portanto, que no Brasil (e também em outros países) o Senado Federal tenha um papel
no processo de nomeação dos membros do Supremo Tribunal Federal. Se este é o árbitro da federação, é
natural que os estados tenham, ainda que indiretamente, alguma participação no processo de escolha de
seus membros.
358 Direito Constitucional Brasileiro
O território brasileiro ocupa uma área de 8 515 767,049 km2, segundo o ibge7. Sobre
seu território, e também sobre o mar territorial8, o Brasil exerce plena soberania9.
O território brasileiro é integralmente ocupado por 26 estados membros e um Dis-
trito Federal. A Constituição de 1988 estabeleceu que os municípios também são
unidades componentes da federação. O Distrito Federal não pode ser dividido em
municípios (art. 32).
pa
níveis. Na verdade, são apenas três os níveis: União, estados e municípios10. Como
será visto adiante, o Distrito Federal tem um status especial11 e, em boa parte dos
FL
casos, tem tanto as competências típicas dos estados quanto aquelas dos municípios.
Além da União, estados, municípios e Distrito Federal, a Constituição men-
P0
ciona diversas vezes o termo territórios (às vezes também “territórios federais”) no
âmbito da federação. Os territórios, contudo, não são uma unidade componente da
20
federação, porque pertencem à União, nos termos do art. 18, § 2º (“Os Territórios
Federais integram a União”). Os territórios federais serão analisados brevemente
4-
mais adiante12.
nã
21.4 COMPETÊNCIAS
od
Nos debates sobre federalismo, competência é sem dúvida um dos termos mais rele-
vantes. Competência é, na verdade, um conceito central para o direito em geral,
ivu
de largura, medidas a partir da linha de baixa-mar do litoral continental e insular”. Ver também o decreto
legislativo 5/1987 e o decreto 1.530/1995, que aprovaram e promulgaram a Convenção das Nações Unidas
sobre o Direito do Mar.
9. O Brasil também exerce alguns direitos de soberania na zona econômica exclusiva, que “compreende uma
faixa que se estende das doze às duzentas milhas marítimas, contadas a partir das linhas de base que servem
para medir a largura do mar territorial” (lei 8.617/1993, art. 6º).
10. Embora tenha havido no passado alguma polêmica sobre a possibilidade de uma federação ter três níveis, já
que elas usualmente têm apenas dois, o fato é que a Constituição de 1988 decidiu incluir os municípios como
parte integrante da federação. Para mais detalhes, ver o tópico 21.10.
11. Ver o tópico 21.12.
12. Ver o tópico 21.13.
Federalismo 359
será necessário adentrar esse debate aqui. O termo “competência”, nos debates
jurídicos sobre federalismo, quer dizer pura e simplesmente ter o poder de tomar
certas decisões. É certo que “ter o poder de tomar certas decisões” pode significar,
no âmbito do federalismo, ao menos duas coisas razoavelmente distintas. Essa ex-
pressão pode significar: (a) ter a faculdade de agir em determinado âmbito (o que
inclui a faculdade de não agir, se entender conveniente); ou (b) ter o dever de agir
em determinado âmbito (o que, portanto, não inclui a possibilidade de não agir).
Em ambos os casos, contudo, o que mais importa para o debate conceitual é
pa
que uma decisão tomada por quem tenha a competência para agir em determinado
âmbito não pode ser considerada inconstitucional por razões de competência (em-
ra
bora possa ser considerada inconstitucional por outras razões). Na medida em que as
numerosas controvérsias – judiciais ou políticas – sobre federalismo têm como cerne,
us
em grande parte dos casos, analisar se quem tomou uma decisão poderia tomá-la, a
distinção entre ter a faculdade de agir e ter o dever de agir torna-se menos relevante.
oe
político-administrativas e tributárias.
FL
ANTES DE 1889
20
Como mencionado no início deste capítulo, ideais federalistas não surgiram no Brasil
somente no final do século xix. Mesmo antes da independência já havia fortes mo-
4-
vimentos federalistas, ainda que nem sempre essa denominação fosse utilizada. Além
disso, a alocação de poderes no Brasil desde a chegada dos portugueses passou por
nã
distintas identidades regionais, bem como de elites locais com interesses particulares
e distintos. Essas identidades regionais ficaram especialmente salientes na época da
independência, algo que a historiografia oficial procurou negar por muito tempo,
com o intuito de sedimentar a ideia de que tanto o processo de independência
na forma como ocorreu quanto a criação de um Estado unitário expressavam a
vontade geral da nação14.
Mas a ideia de que a soberania pertencia às províncias, que poderiam (mas não
necessariamente deveriam) unir-se para formar um Estado maior, era mais difundida
pa
do que por muito tempo se procurou fazer crer. Talvez os exemplos mais emble-
máticos dessa forma de ver a relação entre poder central e poder das províncias
ra
adotar a forma federal, nenhuma delas teve qualquer chance de sucesso. A dissolu-
ção da assembleia constituinte por Dom Pedro i15, e a outorga de uma constituição
20
fortemente centralizadora, redigida sob sua supervisão pessoal, embora tenha dado
causa a reações, como foi o caso da já mencionada Confederação do Equador, aca-
4-
cial – conhecida como Ato Adicional – acabou por incorporar ao sistema político
brasileiro algumas demandas associadas a ideias federalistas. O Ato Adicional extin-
od
profundamente alterado por uma lei que, em tese, deveria apenas estabelecer cri-
térios para sua interpretação, mas que, na prática, tornou sem efeito várias de suas
medidas descentralizadoras, especialmente ao diminuir o poder das assembleias
legislativas provinciais. Em 1841, o Conselho de Estado foi recriado e o Código
de Processo Criminal, de 1832 – o qual havia introduzido importantes alterações
descentralizadoras no sistema de justiça ainda antes da descentralização política
e administrativa promovida pelo Ato Adicional –, foi reformado para conter a
descentralização nesse âmbito. Era o início do que ficou conhecido como Regresso,
pa
ria de Estado e menos contra o regime de governo. Em grande medida, era, mais
do que um manifesto republicano, um manifesto federalista. Já o livro de Tavares
m
anos após a publicação desses textos, não há dúvida de que ambos foram centrais
para preparar o terreno para o federalismo no Brasil.
P0
17. Ruy Barbosa talvez seja o exemplo paradigmático. Quando percebeu que o Império não abandonaria a cen-
tralização unitária, ele passou para o lado republicano. Como se sabe, após o fim do Império, Ruy Barbosa
tornou-se o mais importante jurista da Primeira República (1889-1930) e desempenhou papel central na
elaboração da Constituição de 1891.
362 Direito Constitucional Brasileiro
o qual são reservadas aos Estados “as competências que não lhes sejam vedadas
por esta Constituição”.
ra
e cobrados por cada ente da federação. Na Constituição de 1988, isso não ocorre
no título dedicado à organização do Estado (título iii), mas no título dedicado à
m
cooperativo, têm sido adotados desde 1934 e tiveram seu papel fortalecido na Cons-
tituição de 1988. Como será visto adiante, a Constituição adota termos diferentes
P0
para se referir a esses dois critérios. Nos casos em que as competências são com-
partilhadas com alguma forma de divisão de tarefas, a Constituição adota o termo
20
competências concorrentes (art. 24); quando não há divisão de tarefas, ela adota o
termo competências comuns (art. 23).
4-
seis breves capítulos, que podem ser considerados o cerne do federalismo brasilei-
ro. Esses capítulos são: (i) Da organização político-administrativa (arts. 18 e 19);
od
(ii) Da União (arts. 20 a 24)19; (iii) Dos estados federados (arts. 25 a 28); (iv) Dos
municípios (arts. 29 a 31); (v) Do Distrito Federal e dos territórios (arts. 32 e 33);
(vi) Da intervenção (arts. 34 a 36).
ivu
Como será visto ao longo deste capítulo, esses artigos não são dedicados apenas
à repartição de competências. Eles também contêm normas sobre organização dos
lga
18. Como foi mencionado, contudo, a repartição de competências tributárias é definida no título vi (Da tributação
e do orçamento).
19. Embora o capítulo ii do título iii seja intitulado “Da União”, dois de seus artigos (arts. 23 e 24) contêm regras
que valem também para os outros entes da federação.
Federalismo 363
atividade. Com base nesse critério, três são os tipos principais de competências
distribuídas entre os entes da federação: competências legislativas, político-admi-
us
nistrativas e tributárias.
Com base nesse critério, os mesmos artigos já mencionados seriam classifi-
oe
mencionados acima parece revelar um cenário no qual é possível saber, com alto
grau de certeza, qual ente pode fazer o que em qual área. Mas essa primeira im-
20
20. A possibilidade de delegação de competências não interfere em seu caráter privativo. Assim, o fato de o art.
22, parágrafo único, prever que a União pode, por meio de lei complementar, autorizar os estados a legislar
sobre questões específicas das matérias relacionadas nos incisos do mesmo art. 22 não afeta o caráter privativo
das competências da União ali definidas.
364 Direito Constitucional Brasileiro
“legislar sobre assuntos de interesse local” (art. 30, i), a Constituição atribui à
União a competência para legislar sobre mais de cinquenta temas definidos nos 29
incisos do art. 22, como, por exemplo, a competência para legislar sobre direito
civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial
e do trabalho (art. 22, i); sobre águas, energia, informática, telecomunicações e
radiodifusão (art. 22, iv); sobre política de crédito, câmbio, seguros e transferência
de valores (art. 22, vii); sobre nacionalidade, cidadania e naturalização (art. 22,
xiii); sobre populações indígenas (art. 22, xiv); e sobre propaganda comercial
pa
de organizações internacionais (art. 21, i), declarar a guerra e celebrar a paz (art.
21, ii), emitir moeda (art. 21, vii), e outras que serão analisadas mais adiante.
oe
Por fim, no âmbito tributário a Constituição também aloca uma série de com-
petências privativas para cada ente da federação, definindo quais impostos podem
m
ser instituídos pela União (art. 153), pelos estados e pelo Distrito Federal (art. 155)
e pelos municípios (art. 156). Essa exclusividade na competência para instituir os
FL
tributos elencados nesses artigos não significa que a renda desses tributos pertença
exclusivamente aos entes que os tiverem instituído. A Constituição define um com-
P0
plexo sistema de repartição de receitas tributárias, por meio do qual parte do que
é arrecado por um ente (sobretudo a União) é transferido aos outros.
20
4-
que diante do que foi apresentado sobre a enorme lista de competências privativas
atribuídas à União, bem como em razão do que será visto abaixo, sobre a também
r
longa lista de competências comuns e concorrentes, quase nada sobra aos estados
como competência residual21.
21. No âmbito tributário, a competência residual pertence à União, nos termos do art. 154, i: “A União poderá
instituir […] mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cu-
mulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição”.
Federalismo 365
ilustrar essa afirmação. É competência comum a todos os entes “zelar pela guarda
ra
ficientes. Para evitar esses problemas, é frequente que, embora em tese não haja
hierarquia no exercício das competências comuns, a União acabe assumindo um
4-
ou por meio de legislação. Nesse sentido, o parágrafo único do art. 23 prevê a pos-
sibilidade de que leis complementares fixem “normas para a cooperação entre a
União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio
ivu
140/2011, cujo escopo é limitado a questões ambientais. Essa lei segue a tendência
de fortalecer os poderes da União para fomentar sua capacidade de articular a
r
Constituição prevê que compete à União, aos estados e ao Distrito Federal legislar
concorrentemente sobre as matérias constantes nos seus dezesseis incisos22. Dentre
essas matérias estão a legislação sobre direito tributário, financeiro, penitenciário,
econômico e urbanístico (art. 24, i), produção e consumo (art. 24, v), responsa-
bilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor
artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (art. 24, viii), educação, cultura,
ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação (art.
24, ix), previdência social, proteção e defesa da saúde (art. 24, xii), dentre outras.
pa
tarefas no âmbito das competências concorrentes. Essas regras são definidas pelos
§§ 1º a 4º desse artigo, segundo os quais: (1) a competência da União limita-se a
us
estabelecer normas gerais; (2) aos estados compete suplementar as regras definidas
pela União; (3) caso a União não exerça sua competência e não exista lei federal
oe
cendo normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.
Como será visto adiante, é justamente essa divisão de tarefas – sobretudo a dis-
FL
tinção entre o que são normas gerais e o que são normas suplementares – a maior
causa de controvérsias nesse âmbito.
P0
20
legislativas e políticas. Esta seção tem como objetivo analisar os principais desafios à
interpretação desse modelo. Há pelo menos três ordens de dificuldades que merecem
ser analisadas, ligadas (a) à definição dos limites das competências privativas; (b) à
ivu
22. Os municípios não são mencionados no art. 24. Contudo, com base no previsto no art. 30, ii, segundo o qual
compete aos municípios “suplementar a legislação federal e a estadual no que couber”, tem se entendido que
os municípios também podem legislar sobre as matérias previstas no art. 24. Na jurisprudência do stf, ver,
por exemplo, re 194704 (2017) e re 586224 (2015). Apesar de amplamente aceita, essa interpretação pode
gerar inúmeros problemas interpretativos. Como será visto ainda neste tópico, uma das maiores dificuldades
interpretativas no âmbito das competências concorrentes é a definição do que compete à União e aos estados.
Diante disso, a inclusão dos municípios como titulares dessas competências torna a controvérsia interpretativa
ainda mais intrincada.
Federalismo 367
privativas, como os arts. 22, 25, § 2º e 30, i. Por mais que alguns termos suscitem
oe
poucos problemas, como é o caso, por exemplo, de “desapropriação” (art. 22, ii),
“nacionalidade, cidadania e naturalização” (art. 22, xiii) ou “atividades nucleares
de qualquer natureza” (art. 22, xxvi), a maioria dos incisos utiliza termos cujos li-
m
mites semânticos nem sempre são claros. O que exatamente significa legislar sobre
“direito civil” (art. 22, i) ou sobre “propaganda comercial” (art. 22, xxix)? Exponho
FL
abaixo alguns exemplos simples para que a dimensão desse problema interpretativo
P0
lizado compras acima de um determinado valor23. Algumas dessas leis foram objeto
de ação direta de inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal. O
argumento mais recorrente foi aquele que alegava que esse tipo de lei regula ma-
nã
de que nem os estados, nem o Distrito Federal, nem os municípios podem legislar
sobre cobrança em estacionamentos, os argumentos que embasam os votos dos
ivu
ministros não são uniformes e podem dar uma ideia da dificuldade em interpretar
alguns termos. Ainda que boa parte dos ministros do stf costume aceitar que essas
lga
leis disciplinam matéria de direito civil, e que essa seria a razão de sua inconstitu-
cionalidade, há quem entenda que se trata de matéria de liberdade econômica24,
r
ou mesmo uma questão urbanística25. Percebe-se, portanto, que mesmo que o texto
constitucional, no exemplo usado, pareça ser claro ao atribuir à União a competência
para legislar sobre direito civil, não é sempre claro quais são os limites da própria
expressão direito civil. Como a definição acerca do que compete a qual ente é uma
23. Ver, apenas como exemplo, as leis estaduais 1.094/1996 (df); 15.233/2005 (go); 4.711/1992 (es).
24. Ver adi 3710 (2007), voto do ministro Carlos Ayres Britto.
25. Ver adi 3710 (2007), voto do ministro Sepúlveda Pertence.
368 Direito Constitucional Brasileiro
que sempre que se legislar sobre propriedade essa legislação será de competên-
cia da União. Em 2006, foi promulgada na cidade de São Paulo a lei municipal
ra
14.223/2006, que ficou conhecida como Lei Cidade Limpa. Ao definir a forma e os
limites dos anúncios indicativos das atividades exercidas em determinados estabe-
us
pode fazer de sua propriedade. Assim, da mesma forma que ocorre no exemplo
da cobrança de estacionamento, uma lei como a Lei Cidade Limpa restringe sen-
m
sivelmente o uso que alguém pode fazer de sua propriedade27. No primeiro caso,
entende-se – muitas vezes sem grandes discussões – que a questão é de direito civil
FL
esses critérios não são mutuamente excludentes. Mesmo que uma matéria seja clara
e inequivocamente parte do direito civil (competência da União), legislar sobre
ela pode, ao mesmo tempo, ser de interesse local (competência dos municípios).
ivu
26. Na verdade, nem mesmo essa premissa pode ser aceita sem ressalvas, já que a propriedade há muito tempo
não pode mais ser tratada como uma questão estritamente privada e, nesse sentido, exclusiva do direito civil.
O tratamento que a Constituição de 1988 dá à propriedade – seja urbana, seja rural – é aqui suficiente para
indicar que a dimensão pública da questão é no mínimo tão importante quanto a privada. Sobre essa questão,
ver capítulo 11. Para os fins da discussão aqui, a distinção entre função privada e função social da propriedade
pode ser momentaneamente deixada de lado.
27. Além de legislar, pelo menos de forma indireta, sobre propaganda comercial, o que também é competência
privativa da União (Constituição, art. 22, xxix).
Federalismo 369
que auxiliem nessa distinção, esse esforço não costuma ser suficiente para tornar a
questão mais concreta. O que em geral se faz é simplesmente substituir os termos
oe
“normas gerais” e “normas suplementares” por termos sinônimos, o que, por razões
óbvias, não resolve o problema.
m
Com essa constatação não pretendo sugerir algum tipo de fracasso da doutrina
em definir esses termos. Ao contrário, parto do pressuposto de que não há critério
FL
adicional que consiga ser mais claro do que o texto constitucional e, assim, resolver
a tensão entre a competência da União e a competência dos estados e Distrito Fede-
P0
entre o geral e o específico. O que há é uma linha contínua entre dois extremos
hipotéticos: a generalidade absoluta e a especificidade absoluta. Tudo o que estiver
4-
entre os dois extremos dessa linha contínua será geral em relação a uma parte da
linha e específico em relação à outra parte.
Um exemplo simples do que aqui se quer dizer com linha contínua e da relati-
nã
mas poderia ser considerada geral se comparada com a quinta. O único critério que
parece plausível para responder à pergunta feita acima seria o critério geográfico:
a última lei, por dizer respeito ao patrimônio localizado apenas em dois estados,
deveria ser feita por esses estados. Todas as outras poderão ser feitas pela União.
Embora pareça plausível, esse critério não tem relação direta com a dicotomia
constitucional entre normas gerais e normas específicas ou suplementares. Se uma
lei federal disciplinar a proteção do patrimônio arquitetônico barroco no Brasil
inteiro (segunda lei do exemplo citado), e o fizer com tal nível de detalhamento
pa
que impeça que qualquer outro ente possa adaptar ou suplementar as regras tendo
em vista as suas peculiaridades regionais, essa lei deixará de ser geral (ao menos
ra
dência caso a caso. Esta, se pode gerar alguma insegurança no início, pode ainda
assim gerar alguma segurança jurídica com o passar do tempo: quanto maior a
P0
rede de casos já decididos, maior é a chance de que casos futuros sejam similares a
casos pretéritos e também maior é a chance de desenvolver critérios com base na
20
experiência concreta.
Mas a jurisprudência do stf não tem servido para a criação dessa rede de
4-
ele mesmo não segue. Em vários casos, por fim, o que o stf acaba por fazer é
simplesmente analisar se uma lei estadual sobre determinada matéria no âmbito
das competências concorrentes é compatível com a lei federal que disciplina a
ivu
mesma matéria. Nesse sentido, o tribunal faz aquilo que reiteradamente diz que
não pode fazer – verificar a compatibilidade entre duas leis ordinárias (federal
lga
e estadual)28 – e não faz aquilo que sustenta ser seu dever, que é analisar se as
normas contidas na lei federal são de fato gerais e se as normas contidas na lei
r
28. Ver, por exemplo, adi 252 (1997), adi 1540 (1997), adi 2344-qo (2000), adi 2876 (2009).
Federalismo 371
declara uma lei federal inconstitucional com base na alegação de que suas normas
não são gerais29.
Ao menos duas críticas podem ser feitas a essa forma de lidar com a questão:
(a) é possível afirmar que a União passa a ter um poder que nenhum outro ente
possui, o poder de definir sozinha os limites de sua própria competência; e (b) se a
União puder decidir sozinha o que é norma geral e o que não é, isso significa que
ela teria uma competência privativa para regular exaustivamente uma determinada
matéria se entender conveniente e oportuno. O problema é que isso mitiga o próprio
pa
mum à União, aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios (art. 23). Não há
uniformidade na denominação desse tipo de competências não legislativas. E há
FL
uma razão simples para isso: esses dois artigos contêm competências de naturezas
as mais variadas, como, por exemplo, “manter relações com Estados estrangei-
P0
moeda” (art. 21, vii), mas também “cuidar da saúde e assistência pública, da pro-
teção e garantia das pessoas portadoras de deficiência” (art. 23, ii), “proteger o
4-
meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas” (art. 23, vi)
e “combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização, promovendo a
nã
integração social dos setores desfavorecidos” (art. 23, x). Não parece ser simples
subsumir essas e outras competências a uma única categoria específica. Mas parece
od
ser exemplificado pela competência para manter relações com Estados estrangei-
ros e participar de organizações internacionais (art. 21, i), bem como ao uso do
lga
termo político na expressão “políticas públicas”, que são instrumentos por meio
r
29. Em uma série de decisões sobre fabricação e uso de amianto e a proteção da saúde, o stf declarou a incons-
titucionalidade de alguns dispositivos da lei 9.055/1995 e confirmou a constitucionalidade de leis estaduais
e municipais que eram incompatíveis com aquela lei federal. Essas decisões, contudo, não se basearam em
considerações ligadas à repartição de competências, mas em razões substanciais. Assim, primeiro se declarou
a inconstitucionalidade da lei federal, por não proteger adequadamente a saúde, e, com isso, o conflito entre
os vários níveis de legislação foi eliminado. Ver adi 3356 (2017), adi 3357 (2017), adi 3937 (2017) e adpf
109 (2017). Ver também adi 3406 (2017), adi 3470 (2017) e adi 4066 (2017). Em 2020, contudo, o stf de-
monstrou que, em determinadas circunstâncias, pode se inclinar para um reconhecimento de competências
mais robustas para os estados, especialmente em situações de falta de coordenação no âmbito federal, como
ocorreu no contexto da pandemia da covid-19. Ver adpf 672 (2020).
372 Direito Constitucional Brasileiro
dos quais boa parte dessas competências são exercidas, sendo um exemplo claro a
competência para combater as causas da pobreza (art. 23, x). E são administrativas
sobretudo no sentido associado à prestação de serviços públicos (art. 21, x, xi e
xii, por exemplo) e à organização de órgãos dos poderes públicos (art. 21, xiii,
xiv e xv, por exemplo).
Embora normalmente haja uma ligação estreita entre o exercício do poder
político (em ambos os sentidos mencionados aqui) e a competência para legislar,
nem sempre as competências político-administrativas e legislativas são atribuídas
pa
ao mesmo ente. Assim, embora muitas vezes quem tem a competência para legislar
sobre determinada matéria também tem a competência para colocar em prática
ra
federal e as políticas públicas que nela se baseiam sejam realizadas pelos estados
ou municípios. Muitas vezes essa é justamente a forma de regionalizar políticas
oe
não é definida apenas pelo art. 23. Boa parte dessa articulação é, na verdade, defi-
nida em outras partes da Constituição (e, claro, também pela legislação ordinária).
FL
Várias normas sobre políticas públicas podem ser encontradas no título viii da
Constituição, sobre a ordem social, no qual, dentre outras coisas, são estabeleci-
P0
das diretrizes para políticas públicas sobre saúde (arts. 196 a 200), previdência
social (arts. 201 e 202), assistência social (arts. 203 e 204), educação (arts. 205 a
20
214), cultura (arts. 215 e 216), esportes (art. 217), ciência, tecnologia e inovação
(arts. 218 e 219), comunicação social (arts. 220 a 224), meio ambiente (art. 225),
4-
família, criança, adolescente, jovem e idoso (arts. 226 a 230), e povos indígenas
(arts. 231 e 232).
nã
od
estados que compõem a federação, com a exceção daqueles estados que tenham
sido criados pela própria Constituição de 1988, que são mencionados nos arts. 13 e
r
os estados não compitam com a União e, diante disso, uma diminuição de suas
competências não implique um direto aumento das competências de outros entes
ivu
cia para outro), ainda assim a liberdade de auto-organização dos estados tem sido
tolhida pela prática constitucional das últimas décadas.
r
31. Ver, nesse sentido, o decreto-lei 9.578/1946, que aprovou a linha divisória entre os estados de Pernambuco
e Alagoas.
32. Ver, por exemplo, o art. 12, § 5º do adct: “Ficam reconhecidos e homologados os atuais limites do Estado do
Acre com os Estados do Amazonas e de Rondônia, conforme levantamentos cartográficos e geodésicos reali-
zados pela Comissão Tripartite integrada por representantes dos Estados e dos serviços técnico-especializados
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística”.
33. Ver aco 347 (2014) e aco 652 (2014), sobre demarcação dos limites entre os estados da Bahia, de Goiás, do
Piauí e de Tocantins. Ver também aco 714 (2020), sobre a demarcação dos limites entre Mato Grosso e Pará.
34. Ver aco 444 (pendente) sobre demarcação das divisas marítimas entre Paraná e Santa Catarina.
374 Direito Constitucional Brasileiro
deputados estaduais nas assembleias legislativas (art. 27), à duração de seu mandato
e ao sistema eleitoral usado para elegê-los (art. 27, § 1º), bem como à duração dos
ra
mandatos dos governadores (art. 28). Além disso, nos termos do art. 34, vii, a-e,
os estados devem respeitar os seguintes princípios: (a) forma republicana, sistema
us
eleitoral (art. 22, i), o que poderia indicar que os estados não poderiam definir um
sistema eleitoral para suas assembleias legislativas que seja distinto daquele utilizado
20
para a Câmara dos Deputados. Mas não é claro que este seja um impedimento abso-
luto. O que o art. 27, § 1º, exige é apenas que o sistema eleitoral para as assembleias
4-
exigido pelo art. 2538. O stf não oferece nenhuma definição clara do que seria o
dever de simetria, de forma que tem sempre a liberdade de escolher se as constitui-
ções devem ou não seguir determinados padrões adotados pela Constituição federal.
Desde 1988, o stf já declarou inconstitucionais diversos artigos de constituições
estaduais, os quais, segundo sua interpretação, não respeitavam o dever de simetria39.
Em decorrência disso, sobretudo as disposições que dizem respeito à organização dos
poderes legislativo e executivo nas constituições estaduais são praticamente idênticas
no país inteiro. Em muitos aspectos, constituições estaduais são meras cópias da
pa
Constituição federal. Embora desde 1988 os estados não tenham tentado se afastar
do modelo institucional definido pela Constituição federal40, ainda assim algumas
ra
Alguns poucos exemplos podem dar uma ideia de como o stf muitas vezes
decide nesse âmbito. O tribunal já decidiu pela inconstitucionalidade de artigos
oe
25 e art. 11 do adct) que, em si, não sustentam um dever de simetria amplo como
defendido pelo stf, o tribunal também não fornece nenhum parâmetro preciso para
nã
diante da qual as constituições estaduais são livres para decidir, ou ainda quando há
uma proibição de reprodução de regras da Constituição federal nas constituições esta-
duais. Assim, não é possível identificar por que (1) haveria um dever inafastável de
ivu
lga
40. Algo que já ocorreu com mais frequência no passado, especialmente durante a Primeira República, durante a
qual alguns estados possuíam legislativos unicamerais, enquanto outros adotaram o bicameralismo; as consti-
tuições de alguns estados previam a possibilidade de veto parcial pelos governadores, enquanto a Constituição
de 1891, até a reforma de 1926, previa apenas o veto total, dentre outros exemplos.
41. Ver adi 486 (1997).
42. Ver adi 102 (2002). Ver também adi 1304 (2004) e adi 1391 (2002).
43. Ver adi 3647 (2007). Ver também adi 678 (2002). No caso das regras sobre viagens internacionais do chefe
do Poder Executivo, não há nem mesmo regra expressa na Constituição federal no sentido de que o vice-pre-
sidente deverá substituir o presidente. A despeito disso, o stf tem entendido que constituições estaduais não
podem permitir a ausência do governador do país, mesmo que por menos de quinze dias, sem autorização da
assembleia legislativa e sem a substituição pelo vice-governador.
376 Direito Constitucional Brasileiro
mesmo uma proibição de reprodução. Critérios mais concretos nunca são fornecidos.
Para além da fundamentação deficiente do stf, um suposto dever de simetria
us
esbarra em problemas práticos para os quais não se tem dado a devida atenção. O
mais relevante pode ser resumido por meio da seguinte pergunta: seria necessário
oe
pios)? Um único exemplo pode ilustrar essa situação. Ainda que em outro contexto,
o stf decidiu que “[o]s Estados-membros, na elaboração de seu processo legislativo,
P0
lei aprovados pelo Congresso Nacional deveria ser apreciado em sessão conjunta
do Congresso, que decidiria em escrutínio secreto (art. 66, § 4º, redação original).
4-
66, § 4º, definida pela ec 76/2013? Se se levar a sério o suposto dever de simetria
defendido pelo stf, muitas emendas à Constituição federal gerariam um dever geral
de alterar todas as constituições estaduais (e, eventualmente, todas as leis orgânicas
ivu
44. Ver, por exemplo, adi 1057-mc (1994), adi 687 (1995) e adi 3549 (2007).
45. Ver adi 4777 (2018).
46. adi 102 (2002).
Federalismo 377
em muitos casos, ser usado como laboratório para testar efeitos de reformas. Em
outras palavras, antes de alterar regras eleitorais com efeitos (desconhecidos) no país
inteiro, seria prudente fazer um teste com efeitos localizados. De forma ainda mais
concreta: antes de adotar um sistema eleitoral misto ou lista fechada para eleição
de deputados ou, de modo ainda mais radical, substituir o presidencialismo pelo
parlamentarismo ou semipresidencialismo em nível nacional, seria prudente testar
mudanças como essas (ou outras) nos estados ou mesmo nos municípios. Contudo,
esse experimentalismo só pode vicejar quando se leva a sério o federalismo, e levar
pa
de plebiscito, e do Congresso Nacional, por lei complementar” (art. 18, § 3º). Esse
dispositivo, embora simples, já gerou grandes disputas.
FL
tentes mencionadas pelo art. 18, § 3º, podem ser classificadas em dois grandes tipos:
união e fracionamento de estados. Embora aparentemente opostos e incompatíveis
entre si, esses dois processos podem ser combinados na criação de novos estados.
20
Assim, quando a Constituição fala em incorporar-se entre si, ela faz referência a um
4-
processo puro de união entre dois ou mais estados limítrofes para formar um novo,
cujo território coincide com a soma dos territórios dos estados que se uniram. Já o
processo puro de fracionamento ocorre tanto quando a Constituição prevê que esta-
nã
dos podem subdividir-se, que é o fracionamento de um estado para que dois ou mais
novos estados (ou territórios) sejam formados, com o consequente desaparecimento
od
do estado original, quanto quando ela prevê que podem desmembrar-se para formar
novo estado, o que implica o fracionamento de um estado com a manutenção do
ivu
estado original (nome, personalidade jurídica, capital, dentre outros) com território
reduzido, além da criação de um ou mais novos estados (ou territórios), com novos
lga
podem desmembrar-se para se anexarem a outros, quando então um estado perde parte
de seu território, que é anexada a outro estado. Esse caso, contudo, não implica a
criação de um novo estado, mas de alteração dos limites territoriais de dois estados
existentes. Do ponto de vista jurídico, nada de novo é criado nessa hipótese.
Embora não haja dúvidas sobre os processos mencionados, é possível argumen-
tar que eles não esgotam todas as possibilidades de formação de novos estados ou de
alteração territorial. Ao menos dois outros processos seriam possíveis. Em primeiro
378 Direito Constitucional Brasileiro
lugar, por meio da união entre duas (ou mais) partes de dois (ou mais) estados
limítrofes que tenham se desmembrado. O que diferencia essa hipótese daquela
mencionada no fim do parágrafo anterior é o surgimento de um novo estado, a
partir de duas ou mais partes desmembradas de outros estados.
Em segundo lugar, seria possível que um estado incorporasse o território (e
também o patrimônio, os bens, as rendas, os serviços e o pessoal) de outro estado e,
por meio dessa incorporação, o primeiro estado manteria sua personalidade jurídica
e o segundo estado deixaria de existir. Parece ser possível subsumir essa possibilidade
pa
à previsão de que estados podem incorporar-se entre si. Embora a literatura consti-
tucional tenda a ver no processo de “incorporar-se entre si” apenas aquilo que foi
ra
descrito anteriormente (isto é, o processo por meio do qual dois ou mais estados se
unem para formar um novo estado), não parece fazer sentido excluir a possibilidade
us
de incorporação analisada aqui (isto é, o processo por meio do qual um estado in-
corpora o território de outro, mantendo-se o primeiro e extinguindo-se o segundo).
oe
Criação de Extinção de
Processo Descrição
novo estado? algum estado?
FL
não sim
o território de outro
território de um estado é
4-
pode decidir ainda assim alterar os limites territoriais dos estados ou criar estados
novos. No entanto, caso uma proposta de criação de novo estado receba maioria
us
complementar e sem lei complementar a criação de novo estado não pode ocorrer.
Seria possível indagar se há alguma consequência para a decisão do Congresso
P0
nas urnas. Mas não parece haver forma de compelir o Congresso a aprovar uma lei
contra sua vontade. Não se trata, é importante ressaltar, de omissão legislativa. Na
4-
hipótese suscitada aqui, o Congresso Nacional tomou uma decisão, não se omitiu.
Quanto ao conceito de população diretamente interessada, devido a uma diferença
nã
na redação dos §§ 3º e 4º do art. 18, houve, em especial nos primeiros anos após a
promulgação da Constituição de 1988, alguma controvérsia sobre o seu significado.
od
Isso porque a redação original do art. 18, § 4º, que regula a criação de novos muni-
cípios, empregava a expressão no plural (“populações diretamente interessadas”47),
enquanto o art. 18, § 3º, emprega a expressão no singular. Diante disso, havia quem
ivu
47. A ec 15/1996 alterou a redação desse dispositivo, que agora fala em “populações dos Municípios envolvidos”.
48. Ver adi 2650 (2011).
380 Direito Constitucional Brasileiro
que ocorre nas constituições da maioria dos países que adotam a forma federal – a
Constituição de 1988 inclui os municípios dentre os entes componentes da federação.
ra
Isso ocorre tanto no art. 1º, que declara que a federação brasileira é “formada pela
união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal”, quanto no art.
us
forma que os estados. Estes, por exemplo, têm uma casa representativa no legis-
lativo federal, que é o Senado49. Além disso, a relação da União com os estados
P0
e municípios é diversa: ela pode intervir nos primeiros (art. 34), mas não nos
municípios. Mais do que isso, são os estados que podem intervir nos municípios
20
(art. 35), o que não faz sentido quando se defende que ambos ocupam a mesma
hierarquia federativa.
4-
chamada de lei orgânica, aprovada pela sua Câmara Municipal (art. 29); (2) pre-
feitas, vice-prefeitos e membros das câmaras municipais (vereadoras e vereadores)
são eleitos diretamente (art. 29, i); (3) os municípios têm competência para legislar
ivu
(art. 23); (4) os municípios podem instituir e cobrar os impostos municipais men-
cionados no art. 156, e recebem transferências de receitas de impostos da União e
r
49. Ainda que seja possível argumentar que, na prática, essa representação estadual não ocorra da forma prevista
pela Constituição. Sobre isso, ver o tópico 21.16.
50. Mais de 80% dos municípios brasileiros dependem fortemente das transferências da União e dos estados. Nesses
municípios, as transferências são responsáveis por mais de 75% do orçamento municipal. Tesouro Nacional,
disponível em: https://www.tesourotransparente.gov.br/temas/estados-e-municipios/transferencias-a-estados-
-e-municipios, acesso em: 20 jun. 2020.
Federalismo 381
Em 2004 o stf decidiu que o município de Mira Estrela não poderia decidir
livremente o tamanho de sua câmara municipal. O tribunal definiu então uma es-
oe
municípios existentes são semelhantes àquelas válidas para os estados. Mas a Cons-
tituição emprega termos distintos nos §§ 3º e 4º do art. 18, que, respectivamente,
disciplinam ambos os casos, o que tende a gerar confusões terminológicas. Como foi
nã
visto acima, para o caso dos estados, o art. 18, § 3º, prevê que estes podem incorporar-
-se entre si, subdividir-se ou desmembrar-se para se anexarem a outros, ou formarem novos
od
estados; já o art. 18, § 4º, relativo aos municípios, prevê a possibilidade de criação,
incorporação, fusão e desmembramento de municípios. O primeiro termo do art. 18, §
ivu
4º, destoa dos demais, porque não descreve uma forma de criação ou alteração de
limites territoriais de municípios, apenas prevê que municípios podem, nos termos
lga
do mesmo art. 18, § 4º, ser criados. Os demais termos serão analisados a seguir.
A incorporação de municípios equivale a dois dos processos de criação ou altera-
r
o processo por meio do qual um município perde parte de seu território, que passa
a constituir novo município52. Da mesma forma que ocorreu na criação de estados, o
ra
outro município
dois ou mais municípios limítrofes
20
sim, sim,
Fusão unem-se para formar um novo
apenas um mais de um
município
4-
52. Como foi visto acima, o outro processo (desmembrar-se para se anexar a outro estado) deve, no caso dos
municípios, ser subsumido à rubrica incorporação.
Federalismo 383
As regras para a criação de novos municípios são definidas pelo art. 18, § 4º,
e são similares às regras para a criação de novos estados. É necessária a aprovação
por parte das populações dos municípios interessados (por meio de plebiscito)
e a posterior promulgação de lei estadual. Contudo, o art. 18, § 4º, impõe duas
condições cuja satisfação não é exigida nos casos de criação de estados. A criação
de municípios somente pode ocorrer: (1) dentro do período determinado por lei
complementar federal; e (2) após divulgação de estudos de viabilidade municipal.
Essas duas condições não estavam presentes na redação original do art. 18,
pa
§ 4º, e foram introduzidas pela ec 15/1996, que tinha como um dos objetivos conter
a criação de novos municípios. Entre 1988 e 1996, mais de mil novos municípios
ra
nuaram a ser criados, já que muitos estados procuraram sanar essa omissão por
meio de leis estaduais.
oe
doxa. No que diz respeito aos municípios criados após 1996 – portanto, sem preen-
cher os requisitos definidos no art. 18, § 4º, já que a lei complementar federal nele
FL
prevista nunca foi editada –, o tribunal convalidou a sua criação, a despeito do não
preenchimento das condições estabelecidas pela Constituição53. O stf alegou que a
P0
respectivo Estado à época de sua criação”. Desde então, nenhum outro município
foi criado no Brasil.
od
E MICRORREGIÕES
lga
De acordo com o art. 25, § 3º, os estados podem, mediante lei complementar, “insti-
tuir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por
r
53. Ver, por exemplo, adi 2240 (2007), adi 3316 (2007), adi 3489 (2007) e adi 3689 (2007).
54. É importante ressaltar, contudo, que o Congresso Nacional aprovou projetos de leis complementares sobre
a questão em duas ocasiões (em 2013 e 2014), mas a presidente da República os vetou. Isso não exime a
responsabilidade do Congresso pela omissão, apenas deixa claro que essa responsabilidade deve ser atribuída
também à presidente da República. A responsabilidade do Congresso Nacional pela omissão não desaparece,
porque ele poderia ter derrubado o veto da presidente; para isso, como se tratava de lei complementar, seria
necessária exatamente a mesma maioria necessária para a aprovação da lei (maioria absoluta, arts. 66, § 4º, e
69). Apesar disso, o veto não foi derrubado.
384 Direito Constitucional Brasileiro
Estatuto da Metrópole (lei 13.089/2015). De acordo com essa lei, região metropo-
litana é a unidade regional instituída pelos estados, por meio de lei complementar,
us
normas são a elas aplicáveis e que elas podem ser instituídas pelos estados com
fundamento em funções públicas de interesse comum com características predomi-
P0
nantemente urbanas (lei 13.089/2015, art. 2º, i, e art. 1º, § 1º, i).
A criação de regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões
20
pode gerar alguma tensão entre entes federativos. O art. 25, § 3º, prevê que somente
os estados têm competência para criá-las e, de acordo com o stf, isso pode ocorrer
4-
até mesmo sem a concordância dos municípios envolvidos55. Como a criação dessas
regiões, aglomerações e microrregiões implica o compartilhamento de políticas
nã
aglomerações e microrregiões.
ivu
De 1763 a 1960, a capital do Brasil foi o Rio de Janeiro. Brasília foi concebida e
construída para ser a nova capital do país na segunda metade da década de 1950 e
r
podem ser encontradas também nas constituições de 1934 e 194656. Mas a ideia se
concretizou apenas no governo do presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961).
A Constituição de 1988, além de incluir os municípios como entes componen-
tes da federação, também alterou o status do Distrito Federal no arranjo federativo.
Embora o Distrito Federal, mesmo antes de 1988, já fosse mencionado como parte
da federação e tivesse representantes no Senado, bem como deputadas e deputados
eleitos em seu território, sua capacidade de autogoverno e auto-organização era
limitada. Isso significa que a organização do Distrito Federal era definida sobretu-
pa
do pela legislação federal e que seu governador era nomeado pelo presidente da
República57. Desde 1988, o Distrito Federal tem o mesmo poder de autogoverno
ra
Além disso, como o Distrito Federal não pode ser dividido em municípios (art.
32), a Constituição explicitamente prevê que a ele são atribuídas as competências
oe
legislativas reservadas tanto aos estados quanto aos municípios (art. 32, § 1º). Isso
significa, de um lado, que o Distrito Federal pode – como os estados – legislar sobre
m
os assuntos elencados nos incisos do art. 24; e, de outro lado, também pode – como
os municípios – legislar sobre assuntos de interesse local. As competências comuns
FL
ção ao estado de origem serão reguladas em lei complementar (art. 18, § 2º). A
característica mais relevante dos territórios – a qual deriva do fato de pertencerem
à União – é o seu caráter não autônomo, já que são organizados por lei federal.
ivu
Os governadores dos territórios não são eleitos diretamente, mas nomeados pelo
presidente da República, após confirmação pelo Senado Federal (art. 33, § 3º,
lga
nome ainda era Guaporé), Amapá, Roraima (cujo nome ainda era Rio Branco),
e o arquipélago de Fernando de Noronha. Os dois primeiros foram extintos pela
ra
Constituição de 1946 (art. 8º do adct) e suas áreas foram reintegradas aos estados
a que anteriormente pertenciam. Rondônia foi transformada em estado em 1981
us
Distrito Federal era menor do que a área total do país. Como atualmente não há
territórios federais, os estados e o Distrito Federal ocupam toda a área do país e, por
FL
essa razão, a criação de um eventual novo território federal somente pode ocorrer
por meio do desmembramento de parte de um estado existente. O procedimento
P0
21.14 REGIÕES
nã
disso que o art. 43 trata – tem relação íntima com o federalismo, razão pela qual
o tema é tratado aqui.
lga
legislação federal, mas por atos normativos diversos que conferem força às decisões
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (ibge)62. Ainda assim, vários artigos
região (Centro-Oeste)65.
Essas três superintendências já existiram no passado, ao lado de uma quarta,
nã
cuja área de atuação abrangia a região Sul (Sudesul)66. A Sudeco e a Sudesul foram
extintas em 1990, e a Sudene e a Sudam, em 2001. A ideia por trás da criação (e
od
baseia-se no decreto 67.647/1970, que dividiu o país também em cinco regiões, mas com outra configuração:
Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul. A única alteração na divisão estabelecida em 1970 foi a decorrente
da criação do estado de Tocantins, pela Constituição de 1988, que o alocou à região Norte. Anteriormente, a
área hoje ocupada por Tocantins pertencia ao estado de Goiás e, portanto, à região Centro-Oeste.
63. As regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste são mencionadas com mais frequência, pelos arts. 157, i, c, e, no
adct, pelos arts. 34, § 10, i a iii, e 42. As regiões Sudeste e Sul, apenas no art. 97, § 2º, i e ii, do adct.
64. Ver art. 3º das leis complementares 124/2007, 125/2007 e 129/2009.
65. Ver art. 2º das leis complementares 124/2007, 125/2007 e 129/2009.
66. Ver leis 3.692/1959 (Sudene), 5.173/1966 (Sudam), 5.365/1967 (Sudeco), e decreto-lei 301/1967 (Sudesul).
388 Direito Constitucional Brasileiro
inspirada nas ideias de Celso Furtado, um dos principais economistas do Brasil, que
também foi seu primeiro diretor. Em uma federação com profundas desigualdades
regionais, a ideia de promover o desenvolvimento de determinadas regiões por meio
de uma ação regional articulada é sem dúvida pertinente. No entanto, os resultados
dessa ação articulada a partir da criação de superintendências é ainda hoje objeto
de controvérsias e resistências.
pa
As últimas disposições que fazem parte do cerne do arranjo federal brasileiro são
aquelas destinadas a disciplinar a intervenção federal nos estados (art. 34) e as inter-
us
venções estaduais nos municípios (art. 35). Como seria de se esperar em um Estado
federal, a regra geral definida por esses artigos é a da não intervenção67. Contudo,
oe
esses mesmos artigos definem uma série de situações que, excepcionalmente, podem
justificar essas intervenções.
m
No caso de intervenção federal nos estados, a União pode decidir intervir para:
FL
c. autonomia municipal;
d. prestação de contas da administração pública, direta e indireta;
lga
67. Art. 34: “A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal […]”; art. 35: “O Estado não intervirá em
seus Municípios […]”.
Federalismo 389
como objetivo “garantir o livre exercício de qualquer dos poderes nas unidades da
federação”, quem solicita a intervenção é o Poder Legislativo ou o Poder Executivo
m
estados, cujo resultado favorável estabelece um ônus político, mas não um dever
jurídico ao Congresso Nacional, já que, colocada a matéria em votação, ela sempre
r
68. Tanto o Conselho da República (art. 90, i) quanto o Conselho de Defesa Nacional (art. 91, § 1º, ii) devem
opinar sobre esse decreto. A Constituição não exige que o parecer de ambos seja anterior à decretação da
intervenção federal. Sobre isso, ver os tópicos 24.9.1 e 24.9.2.
69. Ver, por exemplo, o decreto legislativo 10/2018, que aprovou intervenção federal no Rio de Janeiro, e o decreto
legislativo 174/2018, que aprovou intervenção federal em Roraima.
70. O ristf também usa o verbo requisitar (art. 354).
71. Ver lei 1.079/1950, art. 12, 3, segundo o qual é crime contra o cumprimento das decisões judiciárias “deixar de
atender a requisição de intervenção federal do Supremo Tribunal Federal ou do Tribunal Superior Eleitoral”.
390 Direito Constitucional Brasileiro
termos do art. 36, § 1º, teve atuação restrita à área da segurança pública74. O go-
vernador do Rio de Janeiro continuou no exercício de suas funções, apenas sem
FL
72. A única alternativa a essa conclusão é sustentar, como faziam alguns, que, no caso de intervenção federal
requisitada pelo stf, cabe ao presidente da República decretá-la, sem necessidade de aprovação do Congresso
lga
Nacional. Contudo, não há qualquer base constitucional para essa tese. Tampouco o stf a chancela. Ver if 114
(1991). Atualmente, o art. 11 da lei 12.562/2011 explicitamente dispõe que, se o pedido em uma representação
interventiva for julgado procedente, o presidente da República tem até quinze dias para dar cumprimento aos
r
§§ 1º e 3º do art. 36 da Constituição Federal; e a dispensa de apreciação do Congresso Nacional (art. 36, § 3º)
só ocorre se o decreto do presidente da República limitar-se a suspender a execução do ato impugnado, sem
declarar intervenção no estado membro envolvido.
73. Mas várias intervenções de estados em municípios já haviam ocorrido, sobretudo nos casos de não prestação
de contas (art. 35, ii) e não cumprimento de decisões judiciais (art. 35, iv).
74. Ver decreto 9.288/2018, art. 1º, § 1º; art. 2º; e art. 3º.
75. Ver decreto 9.602/2018, art. 3º.
76. Ver capítulos 23 e 28.
77. Embora haja exceções, como é o caso da Alemanha, Áustria, Canadá, Índia e Suíça, países nos quais a repre-
sentação estadual no senado (ou órgão equivalente) não é paritária. Em alguns deles, senadoras e senadores
nem ao menos são eleitos diretamente.
Federalismo 391
e pelo Distrito Federal, eleitos por maioria simples para um mandato de oito anos.
Assim, o Senado Federal é composto por 81 membros, que, ao menos em tese,
representam os 26 estados e o Distrito Federal.
Como senadoras e senadores são eleitos diretamente, eles são muitas vezes de
partidos distintos entre si e, além disso, de partido distinto daquele no poder no
estado que representam78. Por essa razão, em geral os senadores de um determina-
do estado não votam em bloco, mas votam seguindo sua linha partidária. E, como
o Senado tem – salvo algumas exceções – os mesmos poderes e competências que
pa
Brasil – Articulações Jurídicas e Conflitos Institucionais”. In: Mendes, Gilmar Ferreira & Car-
neiro, Rafael Araripe (orgs.). Gestão Pública e Direito Municipal: Tendências e Desafios. São Paulo,
Saraiva, 2016, pp. 75-109.
nã
Araújo, Marcelo Labanca Corrêa de. Jurisdição Constitucional e Federação: O Princípio da Simetria na
Jurisprudência do stf. Rio de Janeiro, Elsevier, 2009.
od
A Carta: Para Entender a Constituição Brasileira. São Paulo, Todavia, 2019, pp. 13-52.
Carmagnani, Marcello (org.). Federalismos Latinoamericanos: México, Brasil, Argentina. México, Fondo
de Cultura Económica, 1993.
lga
Carvalho, José Murilo de. “República, Democracia e Federalismo: Brasil, 1870-1891”. Varia Historia,
vol. 27, n. 45, pp. 141-157, 2011.
r
Coser, Ivo. “O Conceito de Federalismo e a Idéia de Interesse no Brasil do Século xix”. Dados, vol.
51, n. 4, pp. 941-981, 2008.
Dolhnikoff, Miriam. O Pacto Imperial: Origens do Federalismo no Brasil. São Paulo, Globo, 2005.
Faoro, Raymundo. “O Excesso de Adaptação das Cartas Estatutais a Constituição de 1967”. Revista de
Direito Público, vol. 7, pp. 208-222, 1969.
Ferraz Jr., Tercio Sampaio. “Normas Gerais e Competência Concorrente: Uma Exegese do Artigo 24
da Constituição Federal”. Revista Trimestral de Direito Público, vol. 7, pp. 16-20, 1994.
78. Algo que não ocorre nos países nos quais senadores e senadoras são indicados pelos governos estaduais.
392 Direito Constitucional Brasileiro
Ferreira, Gabriela Nunes. Centralização e Descentralização no Império: O Debate entre Tavares Bastos e Vis-
conde de Uruguai. São Paulo, Editora 34, 1999.
Goulart, Jefferson O. “Processo Constituinte e Arranjo Federativo”. Lua Nova: Revista de Cultura e
Política, n. 88, pp. 185-215, 2013.
Grin, Eduardo José & Abrucio, Fernando Luiz. Governos Locais: Uma Leitura Introdutória. Brasília,
Enap, 2019.
Leal, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto. Rio de Janeiro, Forense, 1948.
Lewandowski, Ricardo. Pressupostos Materiais e Formais da Intervenção Federal no Brasil. 2. ed. Belo Ho-
rizonte, Fórum, 2018.
Mello, Evaldo Cabral de. A Outra Independência: O Federalismo Pernambucano de 1817 a 1824. 2. ed. São
pa
Riker, William H. Federalism: Origin, Operation, Significance. Boston, Little Brown, 1964.
Samuels, David. Ambition, Federalism, and Legislative Politics in Brazil. Cambridge, Cambridge University
us
Press, 2003.
Soares, Márcia Miranda & Machado, José Ângelo. Federalismo e Políticas Públicas. Brasília, Enap, 2018.
oe
Torres, Alberto. A Organização Nacional. Rio de Janeiro, Companhia Editora Nacional, 1933.
Torres, João Camillo de Oliveira. A Formação do Federalismo no Brasil. São Paulo, Nacional, 1961 (Bra-
P0
Wheare, Kenneth C. Federal Government. 4. ed. Oxford, Oxford University Press, 1963.
4-
nã
od
ivu
lga
r