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Casal de coelhos
Ainda a propósito da entrevista do sr. Alberto Carlos Almeida, suspeito que uma
pergunta continua zumbindo nas cabeças dos leitores: se a culpa da má educação
brasileira não foi da Igreja Católica, foi de quem?
Funciona assim: como nossa elite empresarial e política não é das mais cultas, as
almas bem intencionadas que dela emergem com o propósito louvável de
remediar os males nacionais não têm por si próprias a capacidade de avaliar, pelo
exame direto das obras e ideias, quem, entre os intelectuais disponíveis, é
competente ou um emérito medalhão de cabeça oca. Resultado: têm de julgá-los
pelos sinais exteriores, os títulos e cargos, e acabam dando ouvidos a quem não
tem nada de sério a lhes informar nem de útil a lhes sugerir. A incultura gera
incultura com a fecundidade de um casal de coelhos.
E por que acontecem essas coisas? Porque a elite inculta se deixa levar pela mídia
e pelos prestígios fosfóricos do dia em lugar de examinar e testar, e assim acaba
somando erros e desastres com uma persistência obscena.
Quem nota esse fenômeno não pode deixar de concluir que o problema do Brasil é
o inverso daquele apontado pelo sr. Almeida: em vez de educar apenas a elite sem
dar atenção ao povo, temos tentado dar educação a todo o povo antes de ter uma
elite qualificada para educá-lo, ou até mesmo para examinar seriamente o
problema da educação popular.
Quem quer que tenha lecionado ao menos por um dia percebe que o processo
educacional tem uma estrutura irradiante: primeiro você educa dez, que educam
cem, que educam mil, que educam um milhão e assim por diante. Inverter essa
ordem é como querer que os filhos gerem os pais.
Os governos deste país prometem educação a milhões antes de poder reunir dez
educadores sérios para discutir como fazê-lo. Por que não formar os dez primeiro?
Os que objetem que isso é elitismo direitista deveriam ler Lênin e perguntar por
que ele organizou primeiro a elite do Partido e depois a massa. Lênin sabia que o
rabo não abana o cachorro.
Como quebrar o círculo vicioso de uma elite inculta, guiada por palpiteiros tão
ineptos quanto ela mesma? Só há um jeito, no meu entender: criar, fora do
sistema educacional, longe da grande mídia, longe dos prestígios consolidados,
uma nova intelectualidade preparadíssima, sincera e agressiva o bastante para, no
momento devido, cortar as cabeças ocas, expulsar as vacas sagradas e começar a
tratar dos problemas com seriedade.
***
Não por coincidência, é por isso mesmo que, em geral, acho inútil ficar “tomando
posição”, a cada momento, ante os descalabros do dia. Pois já não sabemos de
onde, em última análise, provêm todos eles? Não sabemos que, por trás de tudo de
mau que acontece no País, está a ignorância pomposa e irresponsável de uma elite
que só dá ouvidos a medalhões ainda mais ignorantes, pomposos e
irresponsáveis? Para que ficar criticando políticos de alta rotatividade se sabemos
que um só pseudo-intelectual basta para gerar milhares deles e substituí-los por
outros piores a cada dez ou quinze anos?
Para que ficar tentando matar baratas pelo método de jogar uma naftalina na
cabeça de cada uma que aparece? O que é preciso é armar umas quantas centenas
de jovens com um spray intelectual capaz de, amanhã ou depois, sanear o
ambiente.
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17/09/2021 15:30 Casal de coelhos
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