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Guilherme Schelb

OS CRISTÃOS
E O GOVERNO
A BÍbLIa E O
SOCIaLIsMO

1ª Edição

Brasília
Edição do Autor
2022

Joice Cecilia Oliveira Gonzaga - joicececilia.oliveira@gmail.com - CPF: 373.194.328-03


Brasília - DF
© 2022 Guilherme Zanina Schelb
Proibida a reprodução total ou parcial dos textos autorais. Todos os
direitos reservados de acordo com a lei.

Ficha Técnica

Capa/Diagramação
Robson Pires

Impressão
Flex Gráfica e Editora

S322v
Schelb, Guilherme Zanina.
Os Cristãos e o Governo – A Bíblia e o Socialismo /
Guilherme Zanina Schelb. – Brasília: 2022. 96 p.

ISBN: 978-65-00-43331-9

1.Cristianismo. 2. Bíblia. 3.Política. 4. Socialismo.

CDD 000.00000

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Sumário

Introdução 5

Capitulo 1 – O Governo é do povo 9

Capitulo 2 – Governar é tão espiritual quanto orar pelos


governantes 21

Capitulo 3 – Não se deve eleger espinheiros para governar 33

Capitulo 4 – A direção certa: direita ou esquerda? 49

Capitulo 5 – Socialismo cultural: o feitiço das palavras 67

Capitulo 6 – A Bíblia e o Socialismo 83

Conclusão 95

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Introdução

As atitudes de Jesus Cristo, especialmente ao demonstrar


compaixão pelos pobres, alimentar os necessitados e defender
a igualdade entre os homens, levam muitos a crer que o Mestre
nutria ideais socialistas. Mas será que, de fato, essas pessoas
conhecem a ideologia socialista a ponto de justificarem esse
entendimento?
Meu desejo sincero ao escrever este livro é lançar luz sobre
esse tema que tem trazido dúvida na mente de muitos cristãos,
especialmente no atual cenário da política brasileira.
Antes, porém, traçarei alguns princípios para ajudar você,
que é cristão, a compreender seu papel como parte integran-
te de uma política justa e baseada nos princípios eternos da
Palavra de Deus.
O que torna um governo cristão não é a religião do gover-
nante, mas o conteúdo de suas decisões. Por isso, mais relevante

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do que “quem governa” são os atos do governo, ou seja, suas


decisões governamentais. Dessa forma, eleger líderes políticos
é necessário, mas é apenas metade do caminho. Precisamos
governar com quem elegemos, a fim de cumprirmos a missão
para a qual fomos chamados.
Há muito sedimentou-se na mentalidade de diversos cris-
tãos, não apenas no Brasil, mas em todo o mundo, o entendi-
mento de que, em relação ao governo, os cristãos possuem duas
atitudes básicas: orar pelos governantes e respeitar as leis. Essa
ideia não está errada, mas é incompleta. É certo que a Bíblia
ensina essas atitudes em relação ao governo, mas a Palavra de
Deus vai muito além.
Veremos, ao longo desta leitura, que José, no Egito, e
Daniel, na Babilônia, por exemplo, demonstraram a extraor-
dinária relevância de ocupar postos governamentais. Afinal,
ambos, heróis da fé, foram notabilizados por atuarem em car-
gos públicos e serem instrumentos de Deus nessa função. Até
mesmo Ester, embora não tendo desempenhado uma função
pública de liderança, exerceu profunda influência no gover-
no do Rei persa Xerxes, dada a sua proximidade e influência
pessoal, a ponto de obter o decreto do Rei que salvou todo o
seu povo do martírio.
Na atualidade, eleger governantes é um aspecto espiritual
muito relevante aos cristãos, especialmente em regimes políti-
cos que permitem aos cidadãos escolherem seus governantes.
Veremos que a Bíblia contém a primeira formulação de um
regime político-democrático. Há cerca de quatro mil anos, o
Senhor inspirou Moisés a governar o povo hebreu de uma for-
ma democrática, conforme narrado no livro de Deuteronômio.
O papel do cristão como participante direto na escolha
de seus governantes e até como candidato para funções no

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Introdução 7

governo se torna fundamental. Mas não só. Você perceberá,


ao longo destas páginas, que o cristão pode e deve exercer
outras funções públicas de extrema relevância, como juízes,
promotores de justiça e delegados de polícia. Isso sem falar
na participação efetiva em Conselhos municipais, ONGs, e
outras esferas de influência política, que fazem diferença para
o aprimoramento da sociedade.
Assim, é primordial compreender que, tão importante
quanto orar, respeitar as leis e eleger candidatos a cargos de
prefeito ou presidente da República, é discernir também que
há uma série ampla de funções públicas negligenciadas, que
configuram posições estratégicas de governo.
Governar com quem elegemos é compreender que o nosso
papel como cidadãos é tão importante quanto os cargos pú-
blicos para os quais damos o nosso valioso voto. Se desejamos
ver uma nação governada segundo os princípios da Palavra
de Deus, nossa missão como cristãos, “pequenos cristos”,
precisa, de fato, ser bem mais efetiva. Afinal, o conteúdo
justo das decisões do governo tem a ver diretamente com os
princípios fundamentais do evangelho, e isso quem carrega
somos nós, cristãos.
Nas páginas a seguir, refletiremos mais detidamente sobre
como podemos, além das nossas orações, governar com o
governo, exercendo influência cristã sobre nossos líderes, se-
guindo os princípios do nosso Mestre.
Venha comigo e boa leitura!

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Capítulo 1

O GOVERNO É DO
POVO

Há uma declaração poderosa que diz: “Todo o poder ema-


na do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos
ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Ela está no
artigo 1º da Constituição brasileira, e significa que o Estado
brasileiro, em outras palavras, o poder público e os governantes,
serve às pessoas, e não é o titular do poder. É por essa razão que
os agentes do Estado são chamados de “servidores públicos”,
porque devem “servir ao público”.
Essa declaração traduz a afirmação de que os cidadãos bra-
sileiros são os soberanos, e é dever dos governantes servi-los
e protegê-los.
Para compreendermos o papel do Estado e do cidadão,
é muito importante conhecermos as duas instâncias de

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poder existentes no sistema de governo brasileiro, segundo a


Constituição:
• O povo, o titular do Poder.
• O governo, que exerce o Poder em nome do povo.
Você deve estar achando graça de tudo isso, afinal, na
prática cotidiana, muitos governantes não se importam com
as necessidades reais do povo e da nação, e as pessoas não se
sentem representadas por eles. Infelizmente, esse tem sido o
lamento de muitos cidadãos, mas é fundamental entender os
princípios que regem o país, para que possamos restaurar a
Justiça em nosso meio.

Povo e governo
O povo é representado em nossa Constituição pelo conceito
de sociedade civil, isto é, pelo que não é público ou governa-
mental, ou seja: indivíduos, famílias e instituições privadas,
como empresas, igrejas e associações.
Como um ente abstrato, o povo se materializa para o gover-
no por meio de ONGs, instituições civis e grupos de influência.
Isso significa que o governo será muito mais influenciável com
o auxílio de organizações concretas de pessoas que se fizerem
representadas diante das instituições públicas – órgãos do
Poder Legislativo, agências de fiscalização, Poder Executivo
e Judiciário. Dessa forma, quem não se fizer representar de
maneira organizada e permanente terá menos chances de ser
ouvido e respeitado.
Já o governo é um conceito mais amplo, que envolve várias
esferas de autoridade. No Brasil, há três esferas geográficas de
poder público: municipal, estadual e federal.

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Certamente, você vive em um município, e os municípios


correspondem às cidades. Embora seja possível que haja mais
de uma cidade em um mesmo município, na maioria dos ca-
sos, cada cidade corresponde a um município.
Os Estados são os governos regionais, que abrangem cen-
tenas de municípios, como é o caso de São Paulo, Goiás ou
Bahia. Cada Estado estabelece leis próprias sobre temas de
seu interesse. O governo estadual exerce funções de interesse
comum aos municípios governados por ele, como segurança
pública, justiça, saúde ou educação. A Polícia Militar, por
exemplo, é um órgão estadual que exerce suas funções de
proteção em cada município.
A esfera federal de poder, embora mais abstrata, corresponde
ao governo, que atua em temas de relevância ou importância
nacional. Imagine, por exemplo, a proteção das fronteiras bra-
sileiras ou a emissão de cédulas de real, válidas em todo o país.
Todos esses temas são de abrangência nacional e, por isso, são
de competência federal, ou seja, da União.

As funções do governo
O governo também pode ser analisado pela função exercida.
Isso nos leva ao entendimento de que, dentro de cada esfera
geográfica de poder, há diferentes órgãos: Executivo, Legisla-
tivo, Justiça e Ministério Público. Cada um tem sua tarefa ou
função específica, mas todos exercem a responsabilidade de
controle recíproco, ou seja, um fiscaliza o outro.
O Poder Executivo tem a incumbência de exercer os ser-
viços públicos mais diretamente relacionados ao dia a dia das
pessoas, como educação, segurança pública e saúde.

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Cabe ao Poder Legislativo efetuar a tarefa constitucional de


elaborar leis e fiscalizar os atos do Poder Executivo, especial-
mente a arrecadação de receitas e os gastos públicos.
Já ao Poder Judiciário cumpre a responsabilidade de resolver
os conflitos na sociedade e aplicar as leis. Aos juízes compete
o dever de mediar os litígios entre pessoas ou instituições na
sociedade, aplicando as leis e a Constituição.
O Ministério Público fiscaliza todos os órgãos do poder pú-
blico, podendo instaurar investigações e propor ações judiciais
contra qualquer autoridade, instituição pública ou privada em
defesa da coletividade.
É muito importante compreender que, em um Estado
Democrático de Direito, como é o caso do Brasil, o governo
e seus agentes devem agir conforme as leis que estabelecem
suas funções e finalidades. O agente público só pode atuar se a
lei autorizar. Em outros termos, a lei é para o servidor público
como a luz de um poste à noite: o agente público só pode atuar
onde “está iluminado”.
Em resumo, o governo é o conjunto de instituições cons-
tituídos pela Constituição e leis para exercer a soberania em
nome do povo. Significa um aparato formado por órgãos, por
meio do qual exerce suas funções públicas.

O governo materializado
O governo é quem exerce o poder público, ou seja, as fun-
ções previstas em lei para o bem da coletividade. Geralmen-
te, quando se pensa em governo, está-se referindo aos cargos
eletivos do Executivo : prefeito, governador ou presidente da
República. Mas o conceito de governo que utilizarei aqui é
muito mais amplo, e engloba todos as funções públicas de

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Poder: executivo, legislativo, judiciário e ministério público.


Como veremos, somente algumas funções de governo são
ocupadas por pessoas eleitas, outras, não.

Funções públicas eletivas


Saber que a forma mais conhecida de exercer função no
governo é por meio da eleição de pessoas a cargos de prefeitos,
governadores, presidente da República, vereadores, deputados
ou senadores traz-nos um grande senso de responsabilidade.
Todavia, é importante esclarecer que a participação política
das pessoas ocorre tanto ao eleger governantes como ao se
candidatar para eleições a funções no governo.
Os cargos eletivos têm sempre um mandato temporário, ou
seja, o exercício das funções públicas se dá por um período de
tempo previamente fixado. Atualmente, o prazo é de quatro
anos para todos os cargos eletivos, à exceção de senador, que
é de oito anos. Durante esse período, os titulares de funções
eletivas possuem garantias constitucionais para o exercício de
suas atribuições públicas e não podem ser afastados de seu
mandato por qualquer motivo.
Há ainda funções públicas eletivas de grande relevância so-
cial, como os conselhos tutelares, cuja incumbência é garantir
os direitos da infância e adolescência; os diversos conselhos
municipais do meio ambiente, educação e segurança pública.
Essas funções não possuem a dimensão política dos cargos
superiores do Executivo e do Legislativo, mas podem fazer
muita diferença na formulação e implementação de políticas
públicas da infância em cada cidade. É muito importante que
os cristãos ocupem essas funções, pois poderão influenciar
diretamente as políticas públicas de sua cidade.

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Funções públicas não eletivas


Há um predomínio no entendimento das lideranças cristãs
de que a única forma de exercer o governo de cidades ou da
nação é elegendo candidatos a cargos de prefeito, deputado
federal ou presidente da República.
Esse é um equívoco a se superar, pois há muitas funções de
governo que não são ocupadas por eleição. Eleger governan-
tes não é a única forma de influência que os cristãos podem
exercer sobre o governo. Existem outras maneiras de liderar
e exercer funções públicas muito relevantes, mas que não são
por meio de eleições.
É o caso de ministros de Estado e secretários municipais e
estaduais da Saúde ou Educação. Eles são nomeados livremente
pelo chefe do Executivo – prefeito, governador ou presidente
– e exercem funções públicas muito relevantes. A desvantagem
é que podem ser demitidos a qualquer momento, mas, por
outro lado, são os que exercem efetivamente as funções gover-
namentais administrativas, pois, muitas vezes, os governantes
superiores se ocupam de tarefas mais políticas.
É fundamental salientar que há muitas outras funções públi-
cas não eletivas de destaque presentes no dia a dia das cidades,
como auditores da Receita, defensores públicos ou professo-
res, todas muito relevantes. Mas quero focar em três delas em
especial: juízes, promotores de justiça e delegados de polícia.
O delegado de polícia exerce função de extrema importância
na sociedade, com amplos poderes legais para impor a ordem,
restringir a liberdade dos criminosos e garantir a segurança
dos inocentes.

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Já o promotor de justiça é o encarregado legal da defesa da


sociedade em temas diversos, como segurança pública, meio
ambiente, infância, educação e serviços públicos. Por meio
de ações judiciais, o promotor de justiça pode afastar de seus
cargos prefeitos e qualquer agente público local que praticar
corrupção ou abuso de autoridade.
Ao juiz compete o exercício da função de solução dos con-
flitos na sociedade, decidindo o que cabe a cada um segundo
a lei. Ele pode decretar a prisão de criminosos, a suspensão de
atividades que poluem o meio ambiente ou o afastamento de
servidores públicos faltosos.
Observe como todas essas são funções governamentais es-
tratégicas. Materialmente, fazem parte do conceito amplo de
governo, todavia, não são exercidas por pessoas eleitas pelo
voto, mas por aquelas aprovadas em concurso público.
O concurso público é o procedimento legal para a escolha
do melhor candidato a exercer um cargo público, por meio
de avaliação em provas de conhecimento e análise de títulos
de capacidade profissional ou estudos acadêmicos.
Assim, é muito importante considerar essas funções pú-
blicas de governo, que são acessíveis por meio de concurso
público e extremamente importantes, com uma caracte-
rística muito peculiar: a vitaliciedade ou estabilidade. Isso
significa que, após um período de avaliação, o ocupante
do cargo público poderá exercê-lo até a sua aposentadoria.
Ou seja, são funções públicas que poderão ser exercidas por
toda a vida da pessoa.
Imagine isso! Funções públicas tão relevantes para a
sociedade, podendo ser exercida por décadas pela mesma
pessoa. Compare. Enquanto a eleição de um presidente

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ou prefeito exige uma mobilização extraordinária e muitos


recursos financeiros a cada quatro anos, é possível ocupar
cargos públicos de governo vitalícios por meio de concurso
público, nos quais o que conta é o conhecimento e a com-
petência do candidato.
Portanto, trata-se de um erro pensar que só há funções de
governo acessíveis por eleição. É tão necessário eleger can-
didatos cristãos a cargos eletivos quanto aprovar cristãos em
concursos públicos para delegado de polícia, juiz de direito e
promotor de justiça.
Os cristãos devem ter isso em mente ao considerar sua
influência nos governos, pois é preciso ocupar não apenas as
funções governamentais eletivas, mas também as acessíveis por
concurso público.

orientação prática

Os líderes cristãos devem estimular os jovens a ocupar


funções na Justiça. Proponho aos pastores convocarem
e apoiarem os membros de sua igreja a ocuparem essas
relevantes funções de governo. Não apenas elegendo-
-se a cargos públicos, mas também sendo aprovados em
concurso para delegado, juiz de Direito ou promotor de
justiça, assumindo funções governamentais estratégicas
e vitalícias. É importante saber, no entanto, que há um
requisito comum a todas essas funções públicas: somente
os que se formaram em Direito estão aptos a participar do
concurso público de acesso aos cargos públicos. Portanto,
é urgente e necessário estimular jovens com vocação para
funções de Justiça a estudarem para carreiras jurídicas. Em
20 anos, veremos os frutos dessa semeadura.

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Influência governamental sem função pública


Além de toda a relevância que as funções públicas referidas
desempenham, é possível, ainda, influenciar o governo sem
exercer qualquer cargo público. Um exemplo real deixará
bem clara essa afirmação.
A Lei n. 11.340/2006, que protege as mulheres contra a
violência doméstica, foi elaborada no Congresso Nacional.
Mas essa Lei foi fruto direto da iniciativa e mobilização de um
grupo de pessoas liderado pela sra. Maria da Penha Maia Fer-
nandes, vítima de tentativa de homicídio por seu ex-marido.
Sua influência pessoal foi tão grande, que a lei ficou conhecida
nacionalmente como “Lei Maria da Penha”.
Uma única mulher, influenciando um grupo de pessoas,
formulou e ajudou a implantar em todo o Brasil uma política
pública em defesa de todas as mulheres.
A sra. Maria da Penha não foi eleita nem ocupava nenhum
cargo público, mas conseguiu, com esforço, determinação e
habilidade, transformar a vida de todas as mulheres do Brasil.
Isso só foi possível porque houve uma mobilização da socie-
dade pela causa, graças à liderança dessa destemida mulher.
Cada um de nós também pode fazer o mesmo, e até mais.
Mas é preciso ter uma causa, um propósito. Talvez essa seja
uma das maiores lacunas na teologia de nosso tempo. Mui-
tos cristãos se afastaram das causas bíblicas e, hoje, não têm
mais um propósito claro.
Nos primórdios da igreja cristã, o cuidado com os órfãos,
enfermos e necessitados, como determina o livro de Tiago,
capítulo 1, versículo 27, era a sua causa maior:
A religião que Deus, o nosso Pai aceita como pura e
imaculada é esta: cuidar dos órfãos e das viúvas em suas
dificuldades e não se deixar corromper pelo mundo.

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O compromisso com as pessoas necessitadas sempre foi


uma marca da igreja cristã por quase dois milênios.
Até recentemente, não havia órgãos públicos encarregados
de assistência social ou saúde. Até o século XIX, quem exercia
essas funções de relevância social era a Igreja Cristã. É bom
relembrar isso aos professores de História. As Santas Casas, que
ainda hoje atendem a milhões de enfermos no Brasil, são um
monumento à história da caridade cristã no mundo.
Além de tudo isso, ainda há outra dimensão muito rele-
vante da influência que os cristãos podem exercer sobre o
governo, que é a mobilização e atuação organizada perante
o poder público – especialmente os poderes Legislativo,
Executivo e ministério público.
Podemos dizer que o poder político pertence a quem faz
prevalecer sua vontade diante dos órgãos democráticos de
elaboração de normas e de execução de políticas públicas.
A maioria desorganizada pode ser facilmente dominada por
uma minoria organizada. É o que vemos atualmente em re-
lação aos cristãos, que, mesmo sendo maioria, são frequen-
temente subjugados por minorias organizadas, que agem
de forma intensa e estratégica em diversas esferas do poder,
especialmente Judiciário e Ministério Público.

orientação prática

Os cristãos devem criar associações civis, ou seja, or-


ganizar-se em associações de ddefesa de valores coletivos
– infância, meio ambiente, saúde, etc.

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Cada líder de igreja pode formar com seus membros


uma instituição local com objetivos definidos de defesa de
uma área de interesse da cidade. Por exemplo, uma asso-
ciação em defesa dos direitos da criança e do adolescente.
Essa associação pode se tornar influente nas esferas de
poder de sua cidade, apresentando propostas de políticas
públicas ou colaborando com ações do governo. A ênfase
nessa proposta é a aproximação estratégica com prefeitos,
secretários municipais, promotores de justiça e juízes, na
exata medida em que essas autoridades decidem os desti-
nos da cidade. Devemos ter em mente que o governo será
muito mais influenciado por instituições organizadas do
que por coletividades desorganizadas.

Neste primeiro capítulo, vimos que os cidadãos têm o di-


reito de exercer liderança na nação, eleger seus representantes
no governo ou influenciar políticas públicas, até mesmo sem
atuar em nenhuma função pública. Indivíduos, famílias, igrejas
ou associações podem ter forte influência no governo.
Em suma, os cristãos podem ter influência governamental
exercendo:
• o direito de eleger e ser eleito a cargos públicos de pre-
sidente da República, governador de Estado, prefeito,
deputado, senador ou vereador;
• funções públicas superiores não eletivas em serviços
públicos como secretários municipais ou estaduais de
saúde ou educação;
• cargos públicos por meio de concurso: juiz, promotor
de justiça, delegado de polícia;

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• mobilização social ou propostas de políticas públicas,


sem exercer qualquer função ou cargo público.
Orar pelos governantes é uma atitude espiritual muito re-
levante. Governar nações e cidades, também!

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Capítulo 2

GOVERNAR É TÃO ESPIRITUAL


QUANTO ORAR PELOS
GOVERNANTES
É comum vermos lideranças cristãs orando em cultos por
autoridades públicas, às vezes, em palácios de governo. Nos
Estados Unidos da América, há um evento que ocorre há dé-
cadas, em que lideranças cristãs se reúnem com o presidente
da República em um café da manhã para orar, profetizar e
pregar a Palavra de Deus.
De fato, há mandamentos bíblicos expressos para que o
cristão obedeça às leis e ore pelos governantes. Os versículos
abaixo são exemplos dessa afirmação:
Todos devem sujeitar-se às autoridades governamentais,
pois não há autoridade que não venha de Deus [...].
(Romanos 13.1 – grifo meu)

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Antes de tudo, recomendo que se façam súplicas, orações,


intercessões e ações de graças, em favor de todas as pessoas,
pelos reis e por todos os que exercem autoridade [...]. (1
Timóteo 2.1 – grifo meu)

Por causa do Senhor, sujeitem-se a toda autoridade


constituída entre os homens; seja ao rei, como autoridade
suprema, seja aos governantes, como por ele enviados
para punir os que praticam o mal e honrar os que pra-
ticam o bem. (1 Pedro 2.13,14 – grifo meu)

Comumente, os cristãos compreendem esses versículos de


uma forma muito limitada. Segundo esse entendimento equi-
vocado, para cumprir seu chamado em relação às autoridades,
seria responsabilidade dos cristãos tão somente orar pelos go-
vernantes e ser obedientes às leis. A Bíblia, porém, vai muito
além disso e estabelece outras possibilidades de influência dos
cristãos em relação aos governos.

O chamado bíblico para governar


Além de orar pelos governantes, os cristãos podem elegê-
-los e até, eles mesmos, governar. Para entendermos melhor o
chamado bíblico do governo, vamos nos debruçar na Palavra
de Deus e nos seus ensinos quanto a esse assunto.
A Bíblia está repleta de orientações e instruções de diver-
sas formas e estilos. Há mandamentos diretos: “não matarás”,
“não furtarás” (cf. Êxodo 20); mas, muitas vezes, os manda-
mentos e as ordenanças de Deus são expressos por meio de
uma história ou parábola. Trata-se de uma forma poética de
ensinar por meio de uma narrativa que contempla diversas
circunstâncias e fatos, unidos por um princípio ou finalidade
essencial, que representa a grande diretiva ou ensino de Deus.
É uma verdadeira instrução, precisa e prática, de como agir
em situações específicas.

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GOVERNAR É TÃO ESPIRITUAL QUANTO ORAR PELOS GOVERNANTES 23

Por meio de parábolas ou histórias, a Bíblia revela muitos


princípios e orientações. Por exemplo, em Mateus 25.14-30,
Jesus narra a parábola dos talentos:
E também será como um homem que, ao sair de via-
gem, chamou seus servos e confiou-lhes os seus bens. A
um deu cinco talentos, a outro dois, e a outro um; a
cada um de acordo com a sua capacidade. Em seguida
partiu de viagem. O que havia recebido cinco talentos
saiu imediatamente, aplicou-os, e ganhou mais cinco.
Também o que tinha dois talentos ganhou mais dois.
Mas o que tinha recebido um talento saiu, cavou um
buraco no chão e escondeu o dinheiro do seu senhor.
Depois de muito tempo o senhor daqueles servos voltou
e acertou contas com eles. O que tinha recebido cinco
talentos trouxe os outros cinco e disse: “O senhor me
confiou cinco talentos; veja, eu ganhei mais cinco”. O
senhor respondeu: “Muito bem, servo bom e fiel! Você foi
fiel no pouco; eu o porei sobre o muito. Venha e participe
da alegria do seu senhor!”. Veio também o que tinha
recebido dois talentos e disse: “O senhor me confiou dois
talentos; veja, eu ganhei mais dois”. O senhor respondeu:
“Muito bem, servo bom e fiel! Você foi fiel no pouco;
eu o porei sobre o muito. Venha e participe da alegria
do seu senhor!”. Por fim veio o que tinha recebido um
talento e disse: “Eu sabia que o senhor é um homem
severo, que colhe onde não plantou e junta onde não
semeou. Por isso, tive medo, saí e escondi o seu talento
no chão. Veja, aqui está o que lhe pertence”. O senhor
respondeu: “Servo mau e negligente! Você sabia que eu
colho onde não plantei e junto onde não semeei? Então
você devia ter confiado o meu dinheiro aos banqueiros,
para que, quando eu voltasse, o recebesse de volta com
juros. Tirem o talento dele e entreguem-no ao que tem
dez. Pois a quem tem, mais será dado, e terá em grande
quantidade. Mas a quem não tem, até o que tem lhe
será tirado. E lancem fora o servo inútil, nas trevas, onde
haverá choro e ranger de dentes”. (grifo meu)

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24 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

A análise literal dessa passagem bíblica revela a aprovação de


Deus a aqueles que se esforçam, são diligentes e desenvolvem
o que Deus lhes deu. É bom esclarecer que a expressão “talen-
to”, nessa passagem bíblica, era uma representação econômica
equivalente a 35 quilos de prata pura.1
Numa interpretação mais ampla, esse texto pode ser com-
preendido como um mandamento de Deus a todo cristão para
que desenvolva, esforce-se e multiplique dons, habilidades e
capacidades em serviço ao Reino de Deus.
Portanto, as parábolas contém, implícita ou explicitamente,
mandamentos e instruções. Logo, elas são, a um só tempo,
uma história espiritual e pedagógica.

orientação prática

A Bíblia é um livro de histórias reais, portanto, é


preciso refletir um pouco sobre a mentalidade de como
lemos e compreendemos a Palavra. Desde a Antiguidade,
os textos religiosos e míticos eram compreendidos de vá-
rias formas. Muitas vezes, a abordagem que prevalecia era
a simbólica, ou seja, os textos religiosos revelariam uma
alegoria ou representação do real. Segundo essa compre-
ensão, conhecida como Hermenêutica Alegórica Grega,
as narrativas de um livro ou a natureza são símbolos para
levar ao entendimento superior de realidades metafísicas.
De acordo com essa compreensão equivocada da
Bíblia, nenhum dos feitos extraordinários narrados

1
Bíblia King James Atualizada. São Paulo: Abba Press, 2012, p. 1816

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GOVERNAR É TÃO ESPIRITUAL QUANTO ORAR PELOS GOVERNANTES 25

na Palavra seria real e literal, tudo seria uma forma meta-


fórica de se referir a realidades espirituais superiores. Dessa
forma, por exemplo, a arca de Noé não teria existido real-
mente, mas constituiria apenas uma alegoria de um refúgio
espiritual superior para os eleitos.
Essa forma de pensar alcançou até mesmo a maneira de
ver o mundo físico. A natureza era compreendida como
sombra de uma realidade superior intangível. Muitos
pais da Igreja viam o Universo físico como uma imagem
inferior e transitória de um reino eterno e espiritual. Não
faria sentido, assim, estudar as “sombras” (mundo físico).
A ciência nasce quando os cristãos começaram a ler a
Bíblia de forma literal, não alegórica. Os pais da ciência
moderna eram cristãos e foram inspirados diretamente pela
Bíblia para formular e desenvolver o método científico:
Copérnico, Francis Bacon, Isaac Newton, Robert Boyle.2
É claro que há parábolas, metáforas e histórias pedagó-
gicas na Bíblia, mas os relatos bíblicos não são alegóricos.
Pedras caem do céu literalmente, assim como a arca de
Noé foi um barco mesmo.
A questão é que, somente com a Reforma Protestante
e sua ênfase na Palavra de Deus, os cristãos passaram ma-
ciçamente a ler e compreender a Bíblia e a natureza criada
por Ele de modo literal também. O livro de Romanos,
capítulo 1, versículo 20 foi uma das maiores inspirações
para os criadores do método científico:
Pois desde a criação do mundo os atributos invisíveis
de Deus, seu eterno poder e sua natureza divina, têm

2
VISHAL, Mangalwadi. O livro que fez o seu mundo: como a Bíblia criou a
alma da civilização ocidental. São Paulo: Vida, 2013, p. 275.

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26 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

sido vistos claramente, sendo compreendidos por meio


das coisas criadas [...].

O racionalismo, que ainda impera em nossos dias, pre-


tende reduzir as narrativas bíblicas a alegorias espirituais,
sem qualquer concretude ou materialidade. E o faz em
razão de as verdades espirituais e milagres não cumprirem
os requisitos científicos da verificabilidade e demonstrabi-
lidade. Assim, os feitos sobrenaturais da Bíblia deveriam
ser compreendidos, não como fenômenos reais, mas como
representações ficcionais e alegóricas de âmbitos espirituais.
É interessante observar que Georg Friedrich Hegel, um
dos filósofos racionalistas mais expressivos do século XIX,
era cristão evangélico. Aliás, filho e neto de pastores, uma
de suas primeiras obras foi sobre Jesus Cristo: A Vida de
Jesus, de 1795.3
Hegel negava veementemente a concretude dos mila-
gres e feitos sobrenaturais narrados na Bíblia. Rejeitava,
em suma, o que é a essência do cristianismo, a dimensão
histórica e real da encarnação de Jesus Cristo, negando-
-lhe a condição de Messias e Salvador, verdadeiro homem
e verdadeiro Deus.
Os fundamentos da fé não são aferíveis nem com-
prováveis empiricamente. Todavia, as narrativas bíblicas
acerca de acontecimentos e pessoas o são. Aqui reside uma
constatação exuberante da veracidade bíblica: poucos li-
vros tiveram tamanha comprovação arqueológica como
a Bíblia obteve nos últimos 150 anos. A arqueologia e a
história comprovam, a cada dia, que as narrativas bíblicas

3
REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da Filosofia. V. 3. São
Paulo: Paulus, 1991, p. 97

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GOVERNAR É TÃO ESPIRITUAL QUANTO ORAR PELOS GOVERNANTES 27

refletem fatos históricos e comprováveis. A existência dos


principais personagens bíblicos é comprovada pela arque-
ologia e historiografia: Davi, o rei Herodes, o Grande ou
Pôncio Pilatos.
A arca de Noé não foi localizada, mas a ciência é categó-
rica em afirmar que os mares se elevaram 186 metros cerca
de 10 mil anos atrás, comprovando, ao menos em parte,
a narrativa bíblica de uma grande inundação na terra.4

O mandamento de governar e influenciar


o governo

No que diz respeito à atuação de homens e mulheres de


Deus nos governos, a Bíblia contém três histórias muito
especiais que se referem diretamente a como os homens e
mulheres de Deus devem se relacionar, exercer ou influen-
ciar os governos.
Refiro-me a José no Egito (cf. Gênesis 41. 37-57), Daniel
na Babilônia (cf. Daniel 1-8 e Ester (cf. Ester 5.1-14; 8.8-
17). Não vou me deter profundamente em nenhuma dessas
histórias bíblicas, mas percebemos que todos esses casos se
referem a pessoas que ocuparam funções públicas ou influen-
ciaram as autoridades de uma nação.
Em nenhuma dessas histórias, há relatos de que o homem
ou a mulher de Deus realizou uma oração ou culto em Palá-
cios. Pelo contrário, em todos esses casos, os profetas foram
alvo de perseguição pelos inimigos, a despeito da simpatia

4
BLAINEY, Geoffrey. Uma breve história do mundo. São Paulo: Funda-
mento, 2007.

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28 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

pessoal do governante. É razoável supor que nenhum deles


orou ou profetizou pessoalmente para os governantes aos
quais serviam.
O fator comum às três histórias bíblicas é que a ação pessoal
e influenciadora dos profetas perante o governo foi decisiva
para as nações e o povo hebreu. É importante salientar que
José, no Egito, e Daniel, na Babilônia, exerceram funções pú-
blicas de governantes. José concebeu e formulou uma política
pública de armazenamento de grãos que salvou a nação egíp-
cia da calamidade e morte. Isso lhe rendeu o posto de maior
governante do Egito, abaixo apenas de Faraó:
Disse, pois, o faraó a José: “Uma vez que Deus lhe re-
velou todas essas coisas, não há ninguém tão criterioso
e sábio como você. Você terá o comando de meu palácio,
e todo o meu povo se sujeitará às suas ordens. Somente
em relação ao trono serei maior que você”. E o faraó
prosseguiu: “Entrego a você agora o comando de toda a
terra do Egito”. (Gênesis 41.39-41 – grifo meu).

Daniel exerceu a justiça, governou e aconselhou reis de dois


impérios diferentes, Babilônia e Pérsia:
Então o rei colocou Daniel num alto cargo e o cobriu
de presentes. Ele o designou governante de toda a pro-
víncia da Babilônia e o encarregou de todos os sábios
da província. (Daniel 2.48 – grifo meu)

Assim Daniel prosperou durante os reinados de Dario e


de Ciro, o persa. (Daniel 6.28 – grifo meu)

No livro de Ester, há o relato de um projeto de aniquilação


de todo o povo hebreu, urdido por inimigos que ocupavam
cargos no governo. A Bíblia narra a atuação decisiva de Ester

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GOVERNAR É TÃO ESPIRITUAL QUANTO ORAR PELOS GOVERNANTES 29

diante do rei, obtendo dele um decreto, uma decisão governa-


mental, que garantiu a sobrevivência do povo judeu:
[...] Mandei enforcar Hamã e dei os seus bens a Ester
porque ele atentou contra os judeus. Escrevam agora
outro decreto em nome do rei, em favor dos judeus,
como melhor lhes parecer, e selem-no com o anel-selo
do rei, pois nenhum documento escrito em nome do
rei e selado com o seu anel pode ser revogado. (Ester
8.7-8 – grifo meu)

O princípio subjacente a essas três belíssimas histórias


bíblicas é o de que os homens e as mulheres de Deus po-
dem e devem exercer funções no governo ou influenciar
suas decisões.
Observamos, assim, que, além dos mandamentos expressos
de orar pelas autoridades e respeitar as leis, a Bíblia revela ou-
tras formas de relacionamento dos cristãos com os governos:
exercer funções públicas e influenciar as decisões dos gover-
nantes. Em outras palavras, a Bíblia nos mostra que governar
é tão espiritual quanto orar pelos governantes.

A política pública de “amor ao próximo”


É preciso compreender que, ao governar uma cidade ou
nação, o cristão está cumprindo um chamado tão espiritual
quanto o de orar por seu país. Esse entendimento é funda-
mental para os cristãos compreenderem o chamado de Deus
em suas vidas. Somos membros de um mesmo corpo cuja a
cabeça é Cristo. Assim, além da boca que proclama, um corpo
tem braços e mãos que cuidam.
Ao desconectar o evangelismo e a pregação da Palavra das
ações de amor ao próximo, muitos cristãos perderam sua re-
levância social, tão exaltada na Bíblia:

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30 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

A religião que Deus, o nosso Pai aceita como pura e


imaculada é esta: cuidar dos órfãos e das viúvas em
suas dificuldades e não se deixar corromper pelo mundo.
(Tiago 1.27 – ACF, grifo meu)

Há diversas passagens bíblicas exortando os cristãos a


exercer o cuidado com os necessitados individualmente,
em ações de compaixão e cuidado pessoal em ruas, creches,
abrigos ou asilos. Está certo, mas não é tudo.
Esses mandamentos de amor ao próximo, dirigidos a
cada um dos cristãos, não anulam o chamado espiritual dos
discípulos de Jesus para governar cidades e nações, seja in-
fluenciando governos ou exercendo pessoalmente funções
governamentais. José do Egito representa bem essa atuação
espiritual de homens e mulheres de Deus.
A Bíblia não relata que José mantivesse creches ou projetos
sociais para os necessitados. A Bíblia relata que, por meio de
suas habilidades, todos os habitantes do Egito, crianças, ado-
lescentes, jovens, mulheres, deficientes e necessitados – e de
toda a região, até os hebreus – foram alcançados. Lembre-se
de que Jacó enviou seus filhos ao Egito para buscar comida
(cf. Gênesis 42.1-5), e foram salvos da morte por fome de-
vido à política pública concebida e executada por José como
governador do Egito.
O que desejo salientar é que cuidar de todos os neces-
sitados, em políticas públicas, é uma forma de exercer o
mandamento de amor ao próximo. O cristão que elabora ou
executa a política pública de merenda escolar, por exemplo,
está praticando Mateus 25.35: “Pois eu tive fome e vocês me
deram de comer [...]”.

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GOVERNAR É TÃO ESPIRITUAL QUANTO ORAR PELOS GOVERNANTES 31

orientação prática

É aqui que muitos cristãos se perdem ao contemplar


espiritualidade apenas nas ações individuais de caridade.
Não estão errados, mas falta algo. Os cristãos que ocupam
função pública e, intencionalmente exercem atividades
governamentais de provisão e sustento aos que têm fome
ou necessidades, estão cumprindo o mandamento bíblico
do amor ao próximo, ainda que não estejam pessoalmente
realizando o ato de caridade. José, no Egito, e Daniel,
na Babilônia, são relatos bíblicos que nos recordam da
profunda espiritualidade das ações de governo.
Ao compreender a poderosa dimensão espiritual de
governar, os cristãos poderão cumprir plenamente seu
chamado bíblico e também mudar sua atitude para com
os governantes, não apenas elegendo-os a cargos públicos,
mas também propondo e executando políticas públicas.
É tão urgente e espiritual dar de comer aos que têm
fome quanto exercer e aprimorar a política de merenda
nas escolas públicas das cidades.

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Capítulo 3

NÃO SE DEVE ELEGER


ESPINHEIROS PARA
GOVERNAR

Sabemos que, nas democracias atuais, os governantes são


eleitos pelos cidadãos. É o que a Constituição brasileira cha-
ma de Estado Democrático de Direito. “Estado” significa o
poder público em suas diversas esferas geográficas, municipal,
estadual e federal; “Democrático”, porque os governantes são
eleitos pela maioria, conforme o princípio de que o povo elege
seus representantes para governar em seu nome; “de Direito”
significa que o governo é regido por leis, não pelo arbítrio ou
vontade particular de pessoas ou autoridades.
No entanto, nem sempre foi assim. Para que você compre-
enda melhor essa questão, voltemos à Antiguidade.

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34 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

Grécia antiga
Na cidade de Atenas, há 2.400 anos, houve uma experi-
ência muito conhecida que alguns chamam de “democracia
ateniense”. Foi uma das primeiras experiências de governo da
humanidade regida pela vontade dos cidadãos. Os atenien-
ses se reuniam em uma ekklesia, nome dado às reuniões ou
assembleias em que os cidadãos gregos decidiam os destinos
políticos de Atenas.
Essa era uma opção conferida apenas aos homens adultos,
e significava muito prestígio e relevância social, pois se referia
aos assuntos mais importantes da cidade, como a eleição dos
governantes e generais, e até decisões de declaração de guerra.
Em seu auge, as ekklesias reuniam até 6 mil cidadãos atenien-
ses, várias vezes ao ano.
Se você andasse pelas ruas de Atenas nessa época, veria
principalmente três classes de pessoas: mulheres, estrangeiros
e escravos. Estima-se que, da população total de Atenas, cerca
de 80 por cento não eram cidadãos, e nenhum deles possuía
status legal para participar da ekklesia. Por esse motivo, alguns
questionam se realmente a experiência ateniense era uma de-
mocracia real, como muitos imaginam em nossos dias.1
Os gregos cunharam um nome especial para descrever as
pessoas que, podendo participar das assembleias e decidir os
destinos da nação, recusavam-se a fazê-lo. Essas pessoas eram
chamadas de “Idiotas”!

1
PARKER, Philip. História mundial. (Trad. Maria Alice Máximo). Rio de
Janeiro: Zahar, 2011

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NÃO SE DEVE ELEGER ESPINHEIROS PARA GOVERNAR 35

Avançando nesse entendimento, há um alerta para todos


os homens e mulheres cristãos: “Para que o mal triunfe, basta
que os bons não façam nada”.2 Não participar das eleições é
a pior forma de eleger os maus governantes. Os gregos sabiam
disso muito bem e, por isso, qualificavam os omissos pelo me-
recido nome de idiotas.

A parábola do espinheiro (Juízes 9.8-14)


Imagine um país em que as eleições livres se aproximam e
há diferentes candidatos, com variadas propostas de governo.
Entre os candidatos, dois se destacam com particular in-
teresse nos cristãos. O primeiro se chama Faraó, e propõe
abertamente a morte de todos os meninos cristãos ao nascer.
Ele acha que já há cristãos demais no país e que é preciso uma
ação drástica para resolver a questão.
Outro candidato, chamado Herodes, também tem como
uma de suas principais propostas de governo ordenar a morte
de crianças cristãs de até dois anos de idade, sob a justificativa
de controle populacional.
Nesse país imaginário, os cristãos podem participar livre-
mente das eleições, elegendo ou sendo eleitos. Se participarem
da eleição, votando em candidatos que defendam as crianças
e sua fé, as chances de vitória desses candidatos perversos será
bem reduzida, afinal, os cristãos são um grupo muito nu-
meroso de cidadãos e podem decidir as eleições. Mas se não
participarem ou elegerem os candidatos Faraó e Herodes, as
crianças estarão em grave perigo.

2
Tradução livre e popular da afirmação: “The only thing necessary for the
triumph of evil is for good men to do nothing”. (Edmund Burke)

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36 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

Embora os nomes exemplificados acima se refiram di-


retamente às passagens bíblicas de Êxodo 1.15 e Mateus
2.16, sua semelhança é assustadoramente atual na realidade
brasileira, considerando a crescente participação de partidos
políticos e candidatos socialistas anticristãos que abertamente
defendem o aborto, a erotização de crianças e até o ensino
do Alcorão nas escolas.
Sim, acredite se quiser, o Partido dos Trabalhadores (PT)
e o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) apresentaram o
Projeto de Lei 1.780/2011 na Câmara dos Deputados, que
propõe tornar obrigatório o ensino da “cultura islâmica” nas
escolas brasileiras. Para esses partidos, a Bíblia deve ser banida
das escolas e o Alcorão ensinado obrigatoriamente. Os autores
desse projeto são deputados de partidos socialistas, certamente
eleitos com votos de muitos cristãos desatentos.
A Bíblia narra uma parábola que descreve a omissão e ne-
gligência dos bons em relação à escolha dos governantes. É a
parábola do espinheiro, no livro de Juízes, capítulo 9. Acom-
panhe comigo.
Em um reino imaginário, as plantas buscavam um gover-
nante para reinar sobre elas, e, assim, convidaram algumas
árvores especiais para a nobre missão. Uma a uma, as boas plan-
tas, como a videira, a figueira e a oliveira recusaram a missão
por causa de seus diversos afazeres. Finalmente, o espinheiro
aceita a comissão que lhe foi oferecida e, abertamente, dá um
aviso às árvores. Acompanhe o texto:
Sendo assim, todas as árvores rogaram ao espinhei-
ro: “Vem tu, e reina sobre nós!”. Então, o espinheiro
aquiesceu, mas advertiu às árvores: “Se de fato desejais
ungir-me rei sobre vós, vinde e abrigai-vos sob a minha

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NÃO SE DEVE ELEGER ESPINHEIROS PARA GOVERNAR 37

sombra. Caso contrário, sairá fogo dos meus espinheiros


e devorará até os cedros do Líbano!”. (Juízes 9.14,15)

Essa parábola revela as consequências das más decisões


políticas de um povo, e o quanto o desinteresse das pessoas
pelo governo e questões políticas pode afetá-las, inclusive
colaborando diretamente para instituir sobre si mesmas au-
toridades perversas.
É um aviso para todos os cristãos! Os que se omitem em
eleger governantes colaboram decisivamente para que os maus
governem. A omissão dos bons produz resultados terríveis,
afinal, parafraseando o escritor francês Vitor Hugo, poupar o
lobo é uma forma de sacrificar as ovelhas.
Na política, os cristãos estão diante de um mandamento
de Deus, não apenas para respeitar o governo, mas também
para eleger governantes e governar. Tanto é assim, que a
Bíblia é o primeiro livro escrito por homens que estabelece
e reconhece a importância da democracia no governo e no
exercício dos poderes públicos.

Democracia na Bíblia, o governo de Moisés


(Deuteronômio 1.9-18)
Na história da humanidade, a maioria absoluta de gover-
nantes foram reis, faraós ou imperadores. Sua autoridade era
divina e, frequentemente, eles próprios eram identificados
como deuses. As decisões e desejos deles não estavam sujeitos
a nenhum limite ou controle.3

3
PARKER, Philip. História mundial (Trad. Maria Alice Máximo). Rio de
Janeiro: Zahar, 2011

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38 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

Curiosamente, a primeira experiência de um governo


de soberania popular na história da humanidade, segundo
o conceito moderno de representação democrática, está na
Bíblia, conforme descrito em Deuteronômio 13. Incrivel-
mente, esse objetivo ainda não foi alcançado em muitas
nações da atualidade.
Isso mesmo! Deus estabeleceu um sistema democrático de
governo há quase quatro mil anos:

Mas como poderei levar sozinho os seus problemas, as


suas cargas e as suas disputas? Escolham homens sábios,
criteriosos e experientes de cada uma de suas tribos, e eu
os colocarei como chefes de vocês. Vocês me disseram que
essa era uma boa proposta. Então convoquei os chefes das
tribos, homens sábios e experientes, e os designei como
chefes de mil, de cem, de cinquenta e de dez, além de ofi-
ciais para cada tribo. Naquela ocasião ordenei aos juízes
de vocês: “Atendam as questões de seus irmãos e julguem
com justiça, não só as questões entre os seus compatrio-
tas como também entre um israelita e um estrangeiro.
Não sejam parciais no julgamento! Atendam tanto o
pequeno como o grande. Não se deixem intimidar por
ninguém, pois o veredicto pertence a Deus. Tragam-me
os casos mais difíceis e eu os ouvirei”. (Deuteronômio
1.12-17, grifo meu)

De forma sintetizada, Moisés estava à frente de uma mul-


tidão de hebreus, que ele liderava e conduzia para a liberdade
após o cativeiro no Egito. Reconhecendo sua incapacidade
de dirigir sozinho o povo, Moisés se vê diante de uma tarefa
urgente e desafiadora: como resolver as questões e problemas
de toda aquela gente?

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NÃO SE DEVE ELEGER ESPINHEIROS PARA GOVERNAR 39

Essa experiência bíblica vivenciada por Moisés e o povo


hebreu nos revela princípios e critérios notáveis para o governo
nos dias atuais. Vejamos um a um:

1º- A finalidade do governo é servir ao povo

“[...] como poderei levar sozinho os seus problemas, as


suas cargas e as suas disputas? ” (v.1– grifo meu)

A finalidade do governo é servir a todo o povo, pequeno


ou grande, e ser uma fonte segura para resolver contendas e
litígios. Em suma, exercer a justiça e a autoridade com equi-
dade e imparcialidade.
Aqui também está proclamada a natureza impessoal do
governo, pois o governante não é a fonte do poder. São
necessárias a repartição de poderes e as incumbências de
liderança, pois “como poderia eu levar sozinho” as funções
de governo?
Implícita a tudo isso está a ideia contemporânea de que
o governo serve ao povo; afinal, é preciso levar a bom termo
as “cargas, problemas, questões e litígios do povo”, como
disse Moisés.

2º - Eleição dos representantes

“Escolham [...]” (v.13)

Efetuar a eleição de seus representantes é outro fator extra-


ordinário. Digno de nota é o fato de essa experiência hebraica
anteceder ao modelo ateniense em mais de mil anos.
É sempre bom relembrar que os modelos de governo
da Antiguidade eram todos autoritários. Os faraós ou reis

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40 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

escolhiam como bem queriam as autoridades que conduzi-


riam os negócios governamentais. Já no modelo hebraico,
era responsabilidade de cada tribo escolher seus represen-
tantes no governo.

3º - Todos deveriam ter o direito de ser representados


no governo

“[...] de cada uma de suas tribos [...]” (v. 13)

A Bíblia revela o primeiro modelo democrático de governo,


em que o povo tem a incumbência de escolher as autoridades
(chefes em cada tribo) que os representariam. Isso não é pouco,
tendo em vista que a representação política é conquista muito
recente na humanidade.

4º - Havia requisitos para ser uma autoridade

“[...] homens sábios, criteriosos e experientes [...]” (v. 13)

Era necessário cumprir as especificações para ser eleito re-


presentante do povo. Só poderiam concorrer os que fossem
considerados sábios, criteriosos e experientes. Não podia ser
qualquer um. A ideia de que qualquer pessoa pode governar
é um dos maiores enganos da humanidade. Esse fator não
passou despercebido aos grandes filósofos de todas as eras,
especialmente Platão. Segundo o filósofo grego, os cidadãos
eram qualificados segundo suas habilidades e competências
pessoais. Desse modo, aqueles com alma de ouro receberiam
a atribuição das funções de governo; aos de alma de prata,
as funções de guarda da cidade; e aos de alma de bronze e
ferro, as profissões manuais:

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NÃO SE DEVE ELEGER ESPINHEIROS PARA GOVERNAR 41

Enquanto os filósofos não forem reis nas cidades, ou


aqueles que hoje denominamos reis e soberanos não
forem verdadeira e seriamente filósofos, enquanto
o poder político e a filosofia não convergirem num
mesmo indivíduo, enquanto os muitos caracteres
que atualmente perseguem um ou outro destes
objetivos de modo exclusivo não forem impedidos
de agir assim, não terão fim, meu caro Glauco, os
males das cidades, nem, conforme julgo, os do gêne-
ro humano, e jamais a cidade que nós descrevemos
será edificada.4

Portanto, as funções de governo devem ser exercidas por


pessoas competentes, experientes e sábias. A nação que negli-
genciar esses critérios bíblicos poderá sofrer sérios danos.

5º - Direito de petição aos hebreus e também aos estrangeiros


que habitavam entre eles

“Naquela ocasião ordenei aos juízes de vocês: Atendam


as questões de seus irmãos e julguem com com justiça,
não só as questões entre os seus compatriotas mas também
entre um israelita e um estrangeiro. [...] (v.16)

A obrigação das autoridades de ouvir os cidadãos é, ainda


hoje, um desafio para as nações modernas, mas era imposta
às autoridades hebreias há mais de 2 mil anos.
O princípio da igualdade entre os hebreus está expresso
aqui, uma vez que ordena aos juízes atender aos irmãos. Vale
dizer que as autoridades exercem uma função superior, mas
continuam filhos do mesmo Deus dos demais cidadãos.

4
PLATÃO. A república. Vol. 1. São Paulo: Difusão Europeia do Livro. 1965,
p. 237

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42 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

6º - Justiça ao decidir

“Não sejam parciais no julgamento! Atendam tanto o


pequeno como o grande.” (v.17)

Aqui se proclama a igualdade entre as pessoas perante o


governo. Não importa se é rico ou pobre, grande ou pequeno,
todos serão ouvidos e julgados com o mesmo critério de justiça.
Que extraordinário, não?
Em suma, há 4 mil anos, a Bíblia estabeleceu um sistema
de governo democrático, fundamentado na eleição livre de
representantes, na liberdade de petição de cada cidadão, na
garantia da igualdade e justiça nas decisões dos governantes.
Até hoje, muitas nações buscam realizar esses objetivos
superiores, mas nem sempre há sucesso.5 É fundamental que
os cristãos conheçam, proclamem e exerçam esses princípios
bíblicos no governo e na política, assumindo a titularidade
histórica e jurídica do primeiro regime democrático de governo
da humanidade.
Embora escrita há milênios, a Bíblia continua sendo um
texto inovador e atualíssimo em suas prescrições e princípios.
Vale notar, aqui, como é surpreendente observar os estudio-
sos contemporâneos da Política, da Filosofia e do Direito
negligenciarem a análise da mais antiga fonte histórica de
um sistema democrático de governo: a Bíblia. Na realidade,
até mesmo a maioria dos cristãos desconhece as origens bí-
blicas da democracia.

5
COPE, Landa. Template social do Antigo Testamento: redescobrindo
princípios de Deus para discipular nações. Belo Horizonte: Jocum, 2007, p. 55-60

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NÃO SE DEVE ELEGER ESPINHEIROS PARA GOVERNAR 43

A questão aqui, porém, é que, por razões diversas, os cristãos


se afastaram ou até mesmo renunciaram ao exercício legal de
seus direitos de influenciar, exercer ou eleger o governo de sua
nação, e aqui me refiro não apenas ao Brasil, mas a diversos
outros países de maioria cristã, como os Estados Unidos da
América ou a Alemanha.
Por razões teológicas, e não bíblicas, lideranças e cristãos
passaram a considerar o governo (e a política) algo incom-
patível com a fé cristã. Embora a Bíblia mencione a decisiva
ação de homens e mulheres de Deus no exercício de funções
de governo, como foram os casos de José do Egito e Daniel,
muitas teologias reputam o governo e a política como esferas
de corrupção da fé cristã.

A teologia da omissão política


É comum ouvir muitos cristãos dizerem: “Não me envolvo
em política” ou “Cristãos não devem se envolver em política”.
Essas afirmações, no entanto, revelam a concepção grega du-
alista que divide o mundo em dois âmbitos de importância:
o mundo secular, que jaz no Maligno e está corrompido; e o
mundo sagrado, onde se manifesta o Eterno.
Seculares seriam as atividades fora dos templos ou à parte
dos momentos espirituais solenes, tais como escolas, tri-
bunais ou hospitais. Segundo essa visão teológica, essas
funções até podem ser úteis e relevantes, mas não possuem
importância espiritual.6

6
VIOLA, Frank; BARNA, George. Cristianismo pagão? São Paulo: Abba
Press [sd].

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44 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

As coisas sagradas, por sua vez, são aquelas praticadas no


templo ou em reuniões solenes, como orar, pregar, louvar
ou estudar a Bíblia. Segundo essa teologia, os que pregam e
cantam louvores na igreja são considerados os que cuidam e
falam de coisas espirituais, enquanto os que trabalham em
fábricas, dão aulas em escolas ou exercem profissões, atuam
em funções seculares.
Esse pensamento está bem arraigado nas teologias mo-
dernas. Proeminentes cristãos afirmam publicamente que
não veem como um cristão pode se envolver no governo sem
comprometer sua fé. Algumas igrejas ensinam seus membros
até mesmo a não se envolver em política, alegando que seria
algo mundano ou impuro.
O dualismo entre o sagrado e o secular foi responsável por
grandes tragédias na humanidade. Quero trazer à memória
um exemplo bem recente na História, em que uma nação
cristã pereceu em grande calamidade em razão desse dualismo
teológico e consequente alienação política dos cristãos. Os
resultados abalaram todo o mundo.

O nazismo floresceu na Alemanha cristã

Todos conhecemos a ascensão nazista liderada por Adolf


Hitler no início da década de 30 na Alemanha, que implantou
uma ditadura sanguinária e mergulhou o mundo na Segunda
Guerra Mundial (1939-1945). Apenas em campos de con-
centração, Hitler ordenou e executou a morte de mais de seis
milhões de judeus, entre outros prisioneiros.
É interessante observar que, na época da eleição de Adolf
Hitler e do governo nazista, a população da Alemanha era
majoritariamente cristã, dividida entre católicos e evangélicos.

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NÃO SE DEVE ELEGER ESPINHEIROS PARA GOVERNAR 45

Surpreendentemente, poucos cristãos alemães se opuseram ao


nazismo. Pastores, como Dietrich Bonhoeffer e Martin Nie-
möller, que sacrificaram suas vidas ao denunciar e combater
as atrocidades do regime insano, contam-se, no máximo, às
dezenas.
É verdade que a maioria dos que conspiraram para o
atentado contra Hitler em 1944, entre militares e civis, eram
cristãos. Mas isso só ocorreu quando o regime de Hitler já
cambaleava. O fato histórico é que a maioria absoluta dos
cristãos alemães apoiaram o regime nazista e a liderança de
Adolf Hitler. Até mesmo esclarecidos estudantes universitários
cristãos que rejeitavam a encampação da igreja pelo governo
nazista declaravam-se, em sua maioria, submissos à liderança
de Adolf Hitler.7
Como explicar o apoio público dos cristãos ao cruel regime
nazista desde sua ascensão em 1933?
O dualismo grego e a teologia da omissão política explicam
muito bem esse fenômeno, pois, ao confinar a espiritualidade
cristã a templos ou momentos religiosos, esvazia-se o conteú-
do ético bíblico da vida dos cristãos. Isso significa que a vida
espiritual seria exercida apenas em templos ou por meio de
orações e proclamações solenes.
O cotidiano dos cristãos foi esvaziado de sua grandeza espi-
ritual. Eleger representantes no governo, governar ou exercer
profissões seriam apenas atividades seculares, sem nenhuma
relevância espiritual. Dessa forma, para essa teologia, nomear

7
METAXAS, Eric. Bonhoefffer: pastor, mártir, profeta, espião. São Paulo:
Mundo Cristão, 2011, p. 189

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46 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

políticos para governar não possuía relevância espiritual para


os cristãos alemães. Era uma mera atividade secular.
Acredito que muitos teólogos e cristãos alemães só perce-
beram a relevância espiritual de suas decisões políticas quando
as bombas dos exércitos aliados caíram em cima das igrejas na
2a Guerra Mundial, destruindo-as totalmente e matando os
próprios fiéis.
Esse entendimento teológico, infelizmente, é dominante
há muito tempo no meio cristão e explica porque alguns dos
mais perversos sistemas de opressão do ser humano se desen-
volveram e permaneceram em nações majoritariamente cristãs.
O primeiro país a implantar a ditadura socialista na huma-
nidade, a Rússia, era predominantemente cristão ortodoxo no
tempo da hedionda revolução bolchevique, em 1917. Segundo
estimativas, 80% da população russa integrava a igreja cristã
ortodoxa russa.
Por sua vez, o ápice do racismo nos Estados Unidos, nos
anos de 1920-1950, coincidiu com o período de avivamento
evangélico, em que quase 80% da população norte-americana
se declarava cristã evangélica.
Esses fatos históricos devem nos fazer refletir sobre a rele-
vância social da fé cristã, que precisa ser restaurada conforme
a Palavra de Deus apregoa:
Que mais direi? Não tenho tempo para falar de Gideão,
Baraque, Sansão, Jefté, Davi, Samuel e os profetas, os
quais pela fé conquistaram reinos, praticaram a justiça,
alcançaram o cumprimento de promessas, fecharam a
boca de leões, apagaram o poder do fogo e escaparam
do fio da espada; da fraqueza tiraram força, tornaram-
-se poderosos na batalha e puseram em fuga exércitos
estrangeiros. (Hebreus 11.32-34, grifo meu)

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NÃO SE DEVE ELEGER ESPINHEIROS PARA GOVERNAR 47

Como se pode observar, segundo a Bíblia, a fé deve pro-


duzir resultados concretos nas cidades e nações, e ao povo de
Deus incumbe, como declara Hebreus 11.32-34, “conquistar
cidades, praticar a justiça e colocar o inimigo para fugir do
campo de batalha”, o que não se vê com muita frequência em
nossos dias, não é verdade?
Vamos mudar esta realidade!
Outro resultado dessa mentalidade religiosa é que, em di-
versos países majoritariamente cristãos, partidos e candidatos
que defendem valores anticristãos são eleitos e apoiados por
eleitores cristãos.
No Brasil, muitos cristãos ainda apoiam políticos e partidos
socialistas, com propostas abertamente contrárias à Bíblia e aos
ensinamentos de Jesus Cristo.
É preciso restaurar o conhecimento de Deus e da Bíblia para
compreender o papel dos cristãos diante dos governos e das
ideologias. Os cristãos são chamados a governar, conquistar
cidades e nações; não apenas em proclamações solenes, mas
em atos de governo e justiça em todo o lugar, como escola,
tribunais, mídias e lares.
Devemos ser cabeça, e não cauda (Deuteronômio 28.13).
Afinal, o espinheiro não deve governar sobre as árvores nobres.

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48 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

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Capítulo 4

A DIREÇÃO CERTA: DIREITA OU ESQUERDA?

Desde o século XIX, duas concepções políticas dividem o


mundo, e são designadas “direita” e “esquerda”. O dualismo
pode assumir também a forma de expressões antagônicas,
como “conservador” e “progressista”, ou até mesmo, “capi-
talista” e “socialista”.
Tudo isso está disseminado em mídias, escolas, univer-
sidades e, claro, nas igrejas também. Infelizmente, muitos
desconhecem seu significado ou são enganados por quem
deseja manipulá-los e, por consequência, sujeitam-se a mui-
tos equívocos.
A ignorância leva inúmeros cristãos a apoiar propostas que
aparentemente, só na aparência mesmo, parecem corresponder
ao anseio bíblico de ajuda aos necessitados. Sem saber, estão se
aliando a projetos socialistas e anticristãos, que se disfarçam em
propostas de “justiça social” ou “combate à desigualdade”. Por

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50 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

essa razão, é muito importante definir e esclarecer os conceitos


políticos de direita e de esquerda.

Direita e esquerda
A distinção entre direita e esquerda remonta à Antiguidade,
e já revela os fundamentos mais profundos da noção recente
dessas concepções.
É essencial compreender que, na Bíblia, há uma milenar
distinção entre os da “direita” e os da “esquerda”.
No Antigo Testamento, destacam-se várias passagens que se
referem à direita, simbolizando os justos que creem em Deus, e
à esquerda, representando os ímpios que não creem em Deus.
Vejamos algumas passagens bíblicas no Antigo Testamento:
O coração do sábio está à sua direita, mas o coração do tolo
está à sua esquerda. (Eclesiastes 10.2 ARC – grifo meu)

Então admitirei que a sua mão direita pode salvar você.


(Jó 40.14 – grifo meu)

No Novo Testamento, ao se referir ao juízo final, o Evan-


gelho de Mateus, capítulo 25, proclama:
E colocará as ovelhas à sua direita e os bodes à sua
esquerda. (v. 33 – grifo meu)

As ovelhas se referem aos que serão salvos, os tementes a


Deus; e os bodes, aos ímpios, que serão lançados no Inferno.
Assim, sempre que a Bíblia se refere à direita ou “aos da direita”,
está se referindo aos justos, tementes a Deus, aqueles que creem
em Seus valores absolutos, e serão colocados à direita pelo Senhor,
significando a salvação eterna. Já quando se refere à “esquerda”, está

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A DIREÇÃO CERTA: DIREITA OU ESQUERDA? 51

se referindo aos não crentes, ou ímpios, os que rejeitam a Deus,


para os quais está reservada a perdição. A tradição judaico-cristã
preserva esse entendimento desde a Antiguidade.
Trilhando por esse entendimento, veremos que o sécu-
lo XVIII foi palco da Revolução Francesa, um movimento
humanista que repudiava a religião e a fé cristã. A sociedade
monárquica francesa, no tempo da Revolução, era cristã; o que
foi, aliás, uma das principais motivações da rejeição dos revo-
lucionários ao cristianismo. Várias ruas de Paris com nomes
de santos católicos foram renomeadas por causa da aversão dos
revolucionários humanistas à religião cristã.
Durante o período revolucionário francês, estabeleceu-se
os Estados Gerais, uma espécie de reunião entre representan-
tes dos nobres, burgueses, clérigos e povo, em que se debatia
o futuro da França. À direita do monarca, reuniam-se os de-
fensores da monarquia e os cristãos; à esquerda, estavam os
que desejavam destruir toda a ordem, oponentes da realeza
e do cristianismo.
Com o passar do tempo, especialmente com o advento do
socialismo, a esquerda passou a ser relacionada aos partidários
do socialismo, que continuam ateus e anticristãos; e a direita,
aos cristãos e aos que defendem a liberdade econômica e a
livre iniciativa.
Embora o contexto seja outro, é inegável que se trata de
situações similares às que a Bíblia contempla.
O socialismo é expresso ao propor que seu objetivo principal
é “abolir a religião e a moral”.1 As proclamações humanistas

1
MARX, Karl; Engels Manifesto Comunista. São Paulo: Boitempo, 2010, p57

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52 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

são abertamente contrárias à religião, qualquer religião, e às


verdades eternas. O pensamento de esquerda é profundamente
humanista, pois deposita no ser humano e sua razão a grande
esperança de transformação da humanidade. Em sua raiz, há
o pressuposto de que o homem é bom, conforme o mito do
bom selvagem, de Jean Jaques Rousseau, concebido em sua
obra O contrato social.2
Segundo essa mentalidade, se o sistema capitalista for subs-
tituído pelo sistema socialista, que se imagina perfeito e bom,
e considerando que o ser humano é bom, os problemas da
humanidade estarão resolvidos.3
Ledo engano!

Capitalismo e socialismo
Você certamente já ouviu muitos discursos, especialmen-
te de políticos e professores, fazendo um antagonismo entre
capitalismo e socialismo. De acordo com esse senso comum,
o capitalismo é concebido como o sistema da exploração dos
mais pobres pelos ricos, e o socialismo como o sistema da
igualdade e justiça social.
É uma exposição resumida, mas representa a essência do
que se ouve, sobretudo na Educação e mídias brasileiras. Nada
mais equivocado!

2
ROUSSEAU, Jean-Jacques. O contrato social: princípios do direito político.
São Paulo: Edipro. 2020.
3
BOBBIO, Norberto. Teoria geral da política. São Paulo: Editora Campos,
2000, p342/3.

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A DIREÇÃO CERTA: DIREITA OU ESQUERDA? 53

Para compreender bem o que é capitalismo e socialismo,


elegi fatores bem práticos e úteis que, na essência, revelam os
grandes elementos que os diferenciam:
1. a liberdade individual
2. a propriedade privada e
3. os poderes do Estado.

A liberdade individual é a chave e essência da distinção.


Diz respeito a ser garantido ao indivíduo a capacidade e
condição de expressar-se livremente, de conduzir-se e agir
conforme seu próprio entendimento e vontade.
A propriedade privada é uma das manifestações da liberda-
de individual exatamente na medida em que cada pessoa tem
habilidades, determinação, ideias ou esforços que a distin-
guem dos demais, criando riquezas, invenções ou desenvol-
vendo atividades. Uns estudam, outros não; uns trabalham,
outros não. Uns bebem e se dedicam à boemia sem pensar
no futuro; outros, sacrificam-se em trabalhos e estudos no
anseio de melhorar de vida. Como se pode notar, a liberdade
é a maior causa de desigualdade no mundo.
Os poderes do Estado se referem aos limites e controles
das suas funções em relação à sociedade e ao indivíduo. Para
o pensamento de esquerda, o Estado deve ter poderes plenos
para intervir em qualquer âmbito da sociedade, instituições
ou pessoas. Os partidários da direita, ao contrário, desejam
limitar ao máximo a ingerência do Estado na sociedade,
limitando-a a funções básicas de segurança interna e externa,
justiça e regulação de atividades de relevância coletiva.

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54 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

Capitalismo
Em sua essência, o capitalismo é um sistema econômico,
e sua origem histórica remonta ao século XVII. A liberdade
individual é tão fundamental ao sistema capitalista, que se re-
puta a ele a eliminação de uma das práticas mais abomináveis
da humanidade: a escravidão.4
Sim, a escravidão, que existiu há milênios, foi extinta na
humanidade por ação direta do sistema capitalista.
A escravidão é observada em todas as sociedades humanas
desde os tempos mais remotos. Os sumérios, o povo mais
antigo que habitou a Mesopotâmia, experimentou-a, assim
como babilônios, assírios, persas e romanos. É curioso, mas
uma das nações que mais escravizaram seres humanos em to-
dos os tempos foi o Egito, uma nação africana que subjugou
povos vizinhos durante mais de três milênios, de 3.200 a.C
até o primeiro século da nossa era.
Em sua origem, os burgueses eram os revolucionários, pois
se opunham ao então sistema de castas do feudalismo, a velha
ordem. É Karl Marx, pai do socialismo, que o reconhece:
A burguesia desempenhou na História um papel
iminentemente revolucionário. Onde quer que tenha
conquistado o poder, a burguesia destruiu as relações
feudais, patriarcais e idílicas. Rasgou todos os com-
plexos e variados laços que prendiam o homem feudal
a seus “superiores naturais”, para só deixar subsistir,
de homem para homem [...]5

4
NARLOCK, LEANDRO. Guia Politicamente Incorreto da Economia
Brasileira. São Paulo, Globo Livros, 2019.
5
MARX, op. cit., p. 42

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A DIREÇÃO CERTA: DIREITA OU ESQUERDA? 55

O capitalismo exige um ambiente social e jurídico em que


se garanta a liberdade individual, a propriedade privada e a
liberdade econômica de empreender – isso era tudo o que o
sistema feudal impedia.
O sistema feudal, existente desde o século IX na Europa,
era baseado em castas sociais fixas, às quais os indivíduos
tinham de se subordinar – vassalos, plebeus e nobres. A au-
toridade do senhor feudal era um obstáculo intransponível
para a liberdade individual e o empreendedorismo. Ser ca-
pitalista no século XVII era bem revolucionário.

A liberdade é a alma do capitalismo


O capitalismo não se intromete em outras esferas da
vida social ou humana, senão naquelas que interfiram em
seus três valores fundantes: propriedade privada, liberdade
individual e livre mercado.
O capitalismo se interessa apenas pelo econômico, finan-
ceiro, riquezas. A liberdade é seu oxigênio e combustível. É
como um motor que busca sempre a melhor eficiência para
funcionar e produzir. Se a imagem de um socialista sanguiná-
rio, como Ernesto Che Guevara, vende produtos, o capitalis-
mo vai vender o máximo de produtos com sua imagem. Isso
explica porque o terrorista argentino se tornou ícone atual
do capitalismo, cuja imagem está disseminada nas mídias,
educação e até nos desfiles de moda.
À vista disso, é um grave erro supor que o capitalismo pos-
sua alguma afinidade ou predileção pelo cristianismo. Qual-
quer forma de pensamento ou religião é muito bem-vinda
ao capitalismo, não há restrições. Cristãos, ateus, budistas,

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56 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

muçulmanos são igualmente aceitos. Como já se disse: “É a


economia, estúpido!”.6
Você já percebeu que as mulheres socialistas só governam
em países capitalistas?
Não há notícia de uma única líder mulher em regimes
socialistas! Nos 70 anos de regime soviético, cubano e chinês,
nunca uma mulher exerceu o cargo máximo de governo, como
usualmente ocorre em países capitalistas. E você já percebeu
também que todos os regimes democráticos que já existiram
eram ou são capitalistas? Não houve, até hoje, sequer um único
regime socialista democrático.

Socialismo
É frequente ouvirmos de algumas pessoas que, “na teoria, o
socialismo é maravilhoso, mas, na prática, nunca funciona”. A
ideia subjacente a quem pensa assim é que o socialismo seria
uma doutrina que propõe a justiça social, a igualdade entre as
pessoas e o fim da exploração e da desigualdade.
Nada mais enganoso!
É preciso conhecer melhor o que os autores socialistas e
suas teorias realmente propõem para as sociedades.
Em sua essência, o socialismo é uma ideologia que propõe
submeter coercitivamente ao Estado e a um partido político
único todas as pessoas e âmbitos humanos, não apenas a eco-
nomia, mas também a cultura, o direito, a religião, as artes,
a educação, a família, em suma, todos os âmbitos sociais,

6
Frase cunhada pelo publicitário James Carville, em 1992, assessor da cam-
panha presidencial do então desconhecido candidato democrata Bill Clinton

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A DIREÇÃO CERTA: DIREITA OU ESQUERDA? 57

familiares e individuais. Os socialistas não apenas concordam


como também colocam em prática a frase atribuída ao ditador
fascista Benito Mussolini: “Tudo para o Estado, nada contra o
Estado, nada fora do Estado”.
O grande formulador da doutrina socialista, Karl Marx,
propõe, em seu livro Manifesto Comunista, destruir todas as
estruturas sociais existentes – família, igreja, cultura – para que
o socialismo seja implantado:

O socialismo só pode ser implantado com a suplan-


tação forçada de todas as condições sociais existentes.
Os comunistas se recusam a dissimular suas opiniões
e seus fins. Proclamam abertamente que seus objeti-
vos só podem ser alcançados pela derrubada violenta
de toda a ordem social existente.7

“Suplantação forçada de todas as condições sociais existen-


tes” e “derrubada violenta de toda a ordem social existente”
significa a destruição forçada de todos os âmbitos sociais an-
teriores ao socialismo, como família, religião, valores éticos,
educação e liberdade.
Melhor dizendo, para implantar o socialismo, é necessário
destruir de forma violenta não apenas o poder político e eco-
nômico, mas também todo e qualquer aspecto social, cultural
e familiar.
Observe que o socialismo propõe, expressamente, a abolição
da religião e da moral, algo que nunca foi proposto antes. Leia
o que Karl Marx afirma:

7
MARX, op cit, p. 69

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58 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

Além disto, há verdades eternas, como a liberdade,


a justiça, etc., que são comuns a todos os regimes
sociais. Mas o comunismo [socialismo] quer abolir
estas verdades eternas, quer abolir a religião e a moral,
em lugar de lhes dar uma nova forma, e isso contradiz
a todos os desenvolvimentos anteriores.8

Percebe-se, dessa forma, que, ao contrário do capitalismo,


que é um sistema econômico, o socialismo é uma ideologia
totalitária, utópica e coletivista, que deseja controlar todos os
âmbitos humanos, não apenas a economia.
É totalitário, porque propõe submeter ao controle do Es-
tado não apenas o sistema econômico, mas todos os aspectos
sociais da vida humana, como religião, família, educação,
cultura e política.
É utópico, porque tem a pretensão de criar uma sociedade
completamente nova, sem considerar as lições e aprendiza-
dos do passado. É uma promessa eterna de que “dessa vez
vai dar certo!”.
Mesmo após mais de 100 anos de tenebrosas experiências
socialistas, em que milhões de pessoas foram executadas ou
torturadas, os socialistas atuais conseguem afirmar sem ne-
nhum pudor: “Nenhum desses regimes conseguiu implantar
o verdadeiro socialismo”.
Isso significa que os socialistas pretendem sempre fazer algo
completamente novo, desconsiderando todas as experiências
e aprendizados do passado. Aliás, o desprezo e a negação dos
erros praticados pelos diversos regimes socialistas já existentes
é uma marca dos políticos socialistas em todos os tempos.

8
MARX, op cit, p.57.

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A DIREÇÃO CERTA: DIREITA OU ESQUERDA? 59

reflexão

Os socialistas brasileiros são árduos críticos do regime


militar que governou o Brasil de 1964 a 1985, dizendo-se
defensores da Democracia. Contraditoriamente, porém,
esses mesmos socialistas admiram ditaduras militares. Em
2017, o Congresso Nacional brasileiro realizou solenidade
de comemoração pelos 100 anos da Revolução Socialista
Russa de 1917, que implantou a Ditadura Militar do
Proletariado na Rússia, a pedido e com o apoio dos par-
tidos socialistas brasileiros PT, PDT, PSB, PSOL, PSB,
PSDB e PC do B.
A admiração dos socialistas brasileiros pela sanguinária
ditadura em Cuba, implantada em 1959 sob a liderança
de Fidel Castro, também é reveladora. O regime socialista
cubano executou sumariamente cerca de 17.000 pessoas,
opositores do regime. Também suprimiu a liberdade de
imprensa e estabeleceu o regime ditatorial em que Fidel
Castro reinava autoritariamente.
De modo surpreendente, a maioria dos políticos bra-
sileiros e quase todos os jornalistas lamentaram a morte
do sanguinário ditador cubano em 2016. Mais estranho
ainda são os sindicatos de jornalistas no Brasil, que ho-
menageiam o ditador cubano que suprimiu a liberdade
de imprensa em seu país! Isso revela bem a esquizofrenia
que aflige os defensores do socialismo em regimes capi-
talistas democráticos.

É coletivista, porque, no socialismo, a liberdade indivi-


dual está sempre submetida aos interesses da coletividade.
Um exemplo bem prático e simples revela essa natureza

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60 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

do socialismo. Nenhum país socialista possui ou jamais


possuiu previsão legal para habeas corpus-HC. O HC é o
instrumento jurídico em países democráticos e capitalistas
para o indivíduo garantir sua liberdade em relação aos atos
abusivos do poder público.
E por que não há habeas corpus em países socialistas?
Simples! Porque em regimes marxistas, o poder judiciário
está submetido ao partido socialista que governa e, portanto,
não há equilíbrio ou divisão entre poderes. O partido socialis-
ta reina sem nenhum controle externo. Ditaduras são assim!
Outra característica coletivista do socialismo é o fato de
afirmar que as virtudes e os vícios não estão nas pessoas,
mas em classes de pessoas. Assim, as virtudes são todas dos
trabalhadores, os explorados; os vícios, da burguesia, os ri-
cos maus e exploradores. Nesse sentido, um dos principais
instrumentos de ação política do socialismo é propor o ódio
entre classes de pessoas.
O socialismo sempre propôs a perseguição e eliminação
física de uma classe inteira de pessoas, os burgueses, ou seja,
os ricos detentores de capital. Veja o que Karl Marx propõe:
“É natural que o proletariado de cada país deve, antes de tudo,
liquidar a sua própria burguesia [...]. O proletariado estabe-
lece sua dominação pela derrubada violenta da burguesia”.9
Todos os regimes socialistas que existiram eliminaram vio-
lentamente seus opositores por meio de execuções sumárias
ou prisões perpétuas.10

9
MARX, op cit, p.50.
10
COURTOIS, Stéphane et al. O livro negro do comunismo: crimes, terror e
repressão (trad. Caio Meira). Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1999.

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A DIREÇÃO CERTA: DIREITA OU ESQUERDA? 61

Aliás, uma das características marcantes dos regimes socia-


listas é que as pessoas não podem deixar livremente seu país,
senão após prévia autorização do governo. Há um controle
estrito das fronteiras.
Os países capitalistas se caracterizam pela liberdade de ir e
vir de seus cidadãos.

As experiências reais de socialismo


Todos os governos socialistas nos últimos 100 anos alega-
ram pretender implantar a igualdade entre os homens, mas,
na realidade, resultaram em algo bem diferente:
- Concentração de todo o poder nas mãos de uma elite go-
vernamental. Detalhe: sem eleições democráticas. Nenhum
regime socialista real de governo teve eleições livres.
- Imposição de economia planejada e planificada pelo gover-
no. O indivíduo ou as empresas não têm liberdade de empre-
ender como desejam. Todos devem se submeter às prioridades
e objetivos do governo central e do partido. Todos os países
socialistas faliram economicamente.
- Aniquilação da liberdade individual. Toda vontade in-
dividual deve se submeter ao interesse coletivo e ao que o
governo central estabelecer. Nenhum país socialista admite
o recurso do habeas corpus para proteger a liberdade do
indivíduo. Somente residentes em países capitalistas têm
esse privilégio.
- Abolição da propriedade privada. A decorrência lógi-
ca e natural da abolição da liberdade individual é o fim
da propriedade privada. O governo central pode rea-
lizar qualquer intervenção na propriedade pessoal dos

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62 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

indivíduos. A expropriação dos adversários é a regra.


Tudo isso está bem descrito e documentado na obra de
Stéphane Courtois, “O livro negro do comunismo: cri-
mes, terror e repressão”.
Considerando as nações que adotaram o socialismo/
comunismo como sistema de governo, todas resultaram
em fracasso econômico, como é o caso da União das Re-
públicas Socialistas Soviéticas, Cuba, Cambodja, Vietnã e
Coreia do Norte.
É como se um engenheiro se propusesse a construir uma
grande obra. Ao ser indagado sobre experiências anteriores,
ele confessa que todos os prédios que construiu desabaram
ou se encontram em ruínas. Mas promete que, desta vez, vai
dar tudo certo.
Você contrataria alguém com essa experiência?
Claro que não!
Mas o socialismo não é só uma história de fracasso eco-
nômico. Os regimes socialistas são a maior causa de mortes
na história da humanidade. Mataram mais que todas as
guerras reunidas nos últimos 500 anos. “Morte matada”,
como diziam os cangaceiros. Eles implantaram, ao longo de
sua história, execuções sumárias e campos de concentração
para os adversários políticos. Estima-se que mais de 100
milhões de pessoas foram mortas intencionalmente nos
regimes ditatoriais da União Soviética, China, Vietnam,
Cambodja e Cuba.11

11
COURTOIS, Stéphane, op. cit.

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A DIREÇÃO CERTA: DIREITA OU ESQUERDA? 63

reflexão

Vale a pena observar que os filósofos e artistas que


cantavam no Ocidente “É proibido proibir” ou ainda
“Paz e amor!”, nos anos 60, como Jean Paul Sartre,
Focault, Paulo Freire e Chico Buarque de Holanda,
admiravam publicamente os perversos regimes comu-
nistas da China e de Cuba e suas execuções sumárias
dos adversários da “revolução”.
Entorpecidos pela ideologia socialista, defendiam
publicamente regimes que praticavam atrocidades hu-
manitárias em nome de uma pretensa justiça social. Mas,
em países capitalistas, pregavam “é proibido proibir”.
Para os socialistas, matar os adversários é uma opção
legítima quando convém.
Nada supera a hipocrisia de Paulo Freire ao se referir
ao “Amor de Che Guevara” em seu livro “A pedagogia
do oprimido”. Para quem não se lembra, Che Guevara
afirmou publicamente em evento da Organização das
Nações Unidas que: “metralharemos e continuaremos a
metralhar [os opositores da revolução]”.

Você deve estar se perguntando: se o socialismo (de Fidel


Castro, Mao Tse Tung, Joseph Stalin) praticou tantos ou até
mais horrores que o nazismo ou o fascismo, por que somente
o nazismo é condenado pelas nações, enquanto o socialismo
é defendido até hoje por pessoas e partidos políticos?
Enumero, a seguir, os motivos principais que justificam
esse tratamento diferenciado entre ideologias coletivistas e
autoritárias irmãs:

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64 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

1ª. razão: A farta documentação e registros em vídeos dos cri-


mes praticados pelo nazismo. Os crimes do nazismo estão bem
documentados, especialmente em vídeos e fotos. Ao ocupar
a Alemanha, os exércitos aliados registraram em milhares de
fotos e vídeos os mortos e sobreviventes que encontraram nos
campos de concentração. Já quanto aos crimes dos regimes
socialistas, os registros são raros.
2ª. razão: O julgamento público dos crimes cometidos pelo
nazismo. Após a Segunda Guerra Mundial, os governantes
nazistas foram submetidos a um julgamento público, o fa-
moso julgamento de Nuremberg. Seus crimes foram docu-
mentados e apresentados publicamente, inclusive em jornais,
rádio e televisão. Nenhum regime comunista foi exposto a
um julgamento externo e independente por seus campos de
concentração e execuções sumárias.
3ª. razão: Os horrores e a maldade nas execuções em massa
de pessoas pelos nazistas foram maiores. A máquina nazista de
morte sistemática, especialmente de judeus, foi inigualável
em suas atrocidades.
4ª. razão: O componente racial e multinacional da perse-
guição nazista. Hitler dirigiu sua ação criminosa contra
grupos de pessoas de várias nacionalidades, especialmente
os judeus. Milhares de judeus conseguiram fugir para o
Ocidente antes da guerra, especialmente escritores, filó-
sofos e professores, e relataram os horrores praticados. Os
regimes socialistas massacraram seu próprio povo. Poucos
russos ou chineses conseguiram fugir dos regimes autori-
tários socialistas para contar sua história.
5ª. razão: Theodor Adorno e Herbert Marcuse, os famosos
socialistas alemães judeus. Esses dois professores alemães

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A DIREÇÃO CERTA: DIREITA OU ESQUERDA? 65

da Escola de Frankfurt já eram conhecidos mundialmente


quando buscaram refúgio nos Estados Unidos da América
em 1939, fugindo do regime nazista alemão. Eles se torna-
ram celebridades na mídia norte-americana e uma espécie de
representantes dos alemães e judeus no exílio. Quem melhor
do que judeus alemães para falar sobre o nazismo?
6ª. razão: Adolf Hitler deu início à Segunda Guerra Mundial,
enquanto Stalin foi aliado do Ocidente. Não era viável expor
politicamente as atrocidades do regime comunista russo, que
fora aliado na derrota do inimigo alemão.

Mas por que o socialismo tem tantos adeptos


até hoje?

O socialismo continua a seduzir jovens pelo mundo por


meio de promessas e objetivos redentores: “Vamos destruir
tudo e criar uma sociedade justa e igualitária, onde não haverá
mais ricos e pobres; exploradores e explorados”.
Parece bom, não é?!
Do ponto de vista individual, o argumento mais poderoso
do socialismo para os jovens é: “Há um culpado por todos os
seus problemas, e não é você, é o sistema capitalista!”.
Outro fator de atração é que o socialismo, frequentemen-
te, recorre ao conceito aberto de “justiça social” e “igualdade”
para obter a simpatia dos jovens. Novamente, a ideia subja-
cente é que o ser humano é bom, mas o sistema (capitalista)
o corrompeu.
O socialismo é um médico charmoso que matou todos seus
pacientes. Não reconhece nenhum de seus erros, e continua
a receber pacientes desatentos.

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66 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

reflexão

Os países escandinavos são socialistas?


Após mais de 100 anos de dezenas de revoluções so-
cialistas, e diante da inexistência de uma única experiência
de sucesso, muitos devotos do socialismo argumentam,
falsamente, que os países escandinavos – Dinamarca, Su-
écia e Noruega – “realizaram a utopia socialista”.
Bernie Sanders, o pré-candidato democrata norte-
-americano à presidência em 2016 e 2020, afirmou, em
discurso, que a Dinamarca é um país socialista.
A verdade, porém, é que os países da Escandinávia
são capitalistas. Jamais houve socialismo lá. Propriedade
privada, liberdade individual e livre mercado são respei-
tados e garantidos em todos eles. O que os escandinavos
fizeram de espetacular foi criar um eficiente sistema pre-
videnciário e de assistência social. Formularam diversos
instrumentos legais de apoio financeiro e social a pessoas
em situação de vulnerabilidade.
Por sua vez, a utopia socialista é a abolição da proprie-
dade privada, do livre mercado e das classes sociais, espe-
cialmente a eliminação da burguesia. Nada disso ocorreu
nos países nórdicos. A burguesia escandinava é vigorosa, e
a liberdade individual e a propriedade privada, respeitadas.

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Capítulo 5

SOCIALISMO CULTURAL:
O FEITIÇO DAS PALAVRAS

No capítulo anterior, abordamos os fundamentos do so-


cialismo e seu objetivo de destruir a propriedade privada, a
liberdade individual, a religião e a moral.
A ideia original do socialismo era de que os trabalhadores
deveriam se unir e, por meio de uma violenta revolução arma-
da, tomar o poder político e econômico da nação, eliminando
todos os seus adversários, especialmente os burgueses. Foi o
que aconteceu em todos os regimes socialistas reais que exis-
tem ou já existiram: em 1917, na Rússia, em 1949, na China
e em 1959, em Cuba.
Como hoje sabemos, nenhum desses regimes socialistas au-
toritários sobreviveu. O regime comunista na Rússia colapsou

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68 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

totalmente. Cuba vive em frangalhos. E a China comunista


adotou o regime capitalista em sua economia.
Nos anos 30 e 40 do século XX, vários pensadores socia-
listas já haviam percebido que o fôlego da revolução socialista
pelas armas sofria sérias limitações. Constataram que era ne-
cessária também uma revolução cultural, psicológica e jurídi-
ca. Assim, a outrora concebida revolução proletária armada
foi suplantada por novas estratégias nos âmbitos culturais,
educacionais e jurídicos. Nessa nova estratégia socialista, o
alvo de ação será cada centímetro quadrado da cultura, da
linguagem, da moral, das leis e das instituições sociais. Isso
é o que se chama de socialismo cultural.
Vários teóricos socialistas se destacaram nessa nova estra-
tégia de ação política, especialmente os estudiosos da assim
chamada “Escola de Frankfurt”: Max Horkenheimer, Herbert
Marcuse e Erich Fromm. Eles elegeram uma nova classe re-
volucionária, não mais os proletários de Karl Marx. Agora, a
nova classe revolucionária seria formada por aqueles que, de
alguma forma, eram ou se sentiam excluídos nas sociedades
ocidentais, as minorias: homossexuais, negros, mulheres, pre-
sidiários, prostitutas e viciados em droga.
Essa nova tática possui uma grande vantagem, pois frag-
menta a estratégia socialista de disseminar o ódio entre classes
de pessoas em diversos âmbitos sociais.
É preciso reconhecer que, de fato, existem as causas sociais
que o socialismo cultural tenta aparelhar. Como em qualquer
sociedade do passado ou do presente, também nas sociedades
ocidentais, há diversos grupos de pessoas que são alvo de dis-
criminação ou são prejudicados em oportunidades na socieda-
de. Portanto, há, sim, situações de rejeição e injustiça contra
negros, homossexuais, prostitutas e presidiários.

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SOCIALISMO CULTURAL: O FEITIÇO DAS PALAVRAS 69

Aproveitando-se disso, a ação dos partidos e movimentos


socialistas procura ocupar função de liderança nessas causas,
simulando a defesa das minorias, mas, na verdade, com o ob-
jetivo de usá-las como pretexto para implantar suas propostas
de revolução socialista cultural.
Um exemplo claro dessa ação de aparelhamento oculto da
defesa de causas sociais justas é o ativismo dos movimentos
sociais que alegam defender a causa de minorias sexuais.
Em primeiro lugar, é preciso distinguir entre o respeito e
garantia aos direitos dos indivíduos escolherem livremente seu
estilo de vida e, por outro lado, o atendimento à agenda do
ativismo político e ideológico que alega defender o direitos das
pessoas. As pessoas merecem respeito e o pleno exercício de
direitos e deveres, não importa suas opções ou estilo de vida.
O movimento ativista sexual, porém, pretende assumir a
exclusividade da defesa da causa, apresentando propostas que
nada têm a ver com o interesse das pessoas.
É o ativismo sexual, não as pessoas, que propõem a abusiva
exposição de temas adultos a crianças, como ocorreu na Mostra
Queer em Porto Alegre, em 2018. Nessa ocasião, crianças de
escolas públicas foram expostas a fotos de pênis ereto e a vídeo
em que homem se masturbava e ejaculava na face de um outro
homem. O ativismo celebrou o abuso.
É o ativismo sexual, não as pessoas que alegam defender,
que propõe abolir o Dias dos Pais e o Dia das Mães nas es-
colas. As pessoas amam seus pais e certamente os valorizam e
reconhecem sua importância.
É o ativismo sexual, não as pessoas, que deseja proibir os
nomes “pai” e “mãe” em certidão de nascimento de crianças,

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70 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

como é proposto pelo Estatuto da Diversidade da Ordem dos


Advogados do Brasil – OAB.
A ilegal e abusiva erotização de crianças e adolescentes sob
o rótulo de “educação sexual” ou “combate à discriminação”
é a estratégia central do ativismo sexual.
Utilizam as pessoas, que merecem todo o respeito e con-
sideração, para implantar uma agenda moral e sexual ilegal e
antidemocrática.

O feitiço das palavras


Ora, as palavras são o primeiro campo de batalha. Imagi-
ne que alguém se aproxime de você e pergunte: “Posso te dar
um abraço?”. Embora surpreso com o pedido, você concorda
por simpatia. A pessoa, então, desfere um soco em seu rosto
e explica: “Isso é um abraço para mim”.
Esse é um exemplo hilário da deturpação do significado das
palavras utilizada pelo socialismo cultural. As palavras consa-
gradas são corrompidas em seu significado original. Abraço
não é mais abraço; tolerância não é mais tolerância; direitos
humanos não são mais direitos humanos. Justiça social não é
justiça social.
O discurso socialista se apoderou de palavras-chave e estra-
tégicas, para as quais a maioria das pessoas têm simpatia. Esses
termos são utilizados com um novo significado, a fim de exe-
cutar outras ações, completamente dissociadas do significado
original e consagrado do nome que as designa.
Um exemplo real e prático pode esclarecer muito bem essa
nova estratégia de ação política do socialismo cultural. Os
perversos sexuais propõem implantar, no Plano Nacional de
Educação, “a prevenção e proibição do bullying homofóbico,

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SOCIALISMO CULTURAL: O FEITIÇO DAS PALAVRAS 71

que discrimina crianças e adolescentes por gênero, identidade


de gênero e orientação sexual”.
A alguém desatento, a proposta parece legítima e justa,
afinal, proteger crianças do bullying é um imperativo legal e
moral. Há até uma lei que o determina, Lei do Bullyng, Lei
13.185/2015. Valendo-se dessa aparência do bem, os ativistas
sexuais, porém, tentam colocar em prática ações ilegais e abu-
sivas, violando os direitos das famílias, crianças e adolescentes.
Vou explicar isso detalhadamente para você.
Como se sabe, o conteúdo da expressão “prevenção e
proibição do bullying homofóbico que discrimina crianças e
adolescentes por gênero, identidade de gênero e orientação
sexual” possui ampla abrangência de significado.
Trata-se de cláusulas abertas que necessitam de esclareci-
mento e determinação para o contexto de aplicação pedagógica
para crianças e adolescentes. Seria necessária uma lei específica
que definisse o que é homofobia, identidade de gênero e orien-
tação sexual no contexto da educação e, mais especificamente,
no âmbito de aulas ou pedagogias dirigidas a crianças e adoles-
centes, em razão da condição de pessoas em desenvolvimento.
Como não há nenhum referencial legal orientando cla-
ramente o conteúdo e forma de abordar esses temas com-
plexos com crianças, na prática, a proposta tem legitimado
indevidamente:
• apresentar para as crianças temas da sexualidade adulta,
como bissexualidade, sexo anal, entre outros;
• ensinar às crianças que elas podem ser sexualmente o
que desejarem, influenciando-as e induzindo-as a com-
portamentos sexuais especiais, não naturais;

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72 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

• implantar no entendimento das crianças a relativização


da consciência de sua sexualidade natural, por meio
de ações abusivas: banheiros unissex, mudança da lin-
guagem no tratamento dos alunos conforme o sexo e
apresentações eróticas nas escolas.
Tudo isso viola o princípio da legalidade, moralidade e
transparência, contidos no artigo 37 da Constituição Federal
e leis específicas que protegem crianças e adolescentes de temas
impróprios à sua vulnerabilidade psicológica e sexual.
Além disso, temas tão sensíveis e complexos em sua abor-
dagem devem ser adequados à idade de cada aluno. Nada
disso é especificado ou delimitado na cláusula aberta “pre-
venção e proibição do bullying homofóbico que discrimina
crianças e adolescentes por gênero, identidade de gênero e
orientação sexual”.
Em suma, conceitos genéricos, como “combater o bullying” ou
“defender o direito de minorias” tem servido ao propósito de co-
locar em prática ações ilegais e violadoras dos direitos das crianças.
Não devemos nos iludir com nomes e placas, mas procurar
saber o que, de fato, está sendo feito, quais as propostas con-
cretas por trás dos rótulos. Essa é a estratégia mais utilizada
pelo socialismo cultural: utilizar cláusulas gerais abertas, de
significado amplo, para impor e implantar a todos os seus
valores sexuais e morais.

A estratégia da revolução cultural socialista


Se você quisesse demolir um prédio, por onde começaria?
Certamente, você deve estar pensando, “Pelas fundações do
edifício”, não é mesmo? Está correto. Ao abalar as estruturas
que sustentam o prédio, a edificação inteira ruirá.

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SOCIALISMO CULTURAL: O FEITIÇO DAS PALAVRAS 73

Do mesmo modo, os ambiciosos socialistas culturais de-


sejam fazer ruir o prédio da “Civilização Ocidental”. Os so-
cialistas Max Horkenheiner, Herber Marcuse e Erich Fromm
identificaram corretamente os três pilares fundamentais da
civilização judaico-cristã: a família, a escola e a igreja.
Veja como eles apresentam a questão:

Entretanto, se por um lado a coerção passada e


presente penetram nas mais sublimes manifestações
da alma humana, por outro lado têm a sua legalida-
de própria também essa mesma alma, assim como
todos aqueles fatores mediadores pelos quais ela
é formada, como a família, a escola e a igreja. Na
história transcorrida até os dias de hoje é impossível
superestimar, quando da explicação da vida social, o
papel exercido pela coerção, que caracteriza não
apenas o começo, mas também o desenvolvimento
que se segue à formação de todos os Estados”.1

Observe a profundidade da análise desses socialistas.


Segundo constataram, a base da sociedade não é o dinheiro
nem a política. Não é o poder militar nem os grandes pensa-
dores. O que sustenta toda a civilização são a família, a escola
e a Igreja, à medida que são as instâncias que estabelecem o
conceito de autoridade para as novas gerações.
Isso é notável!

1
HORKHEIMER, Max; FROMM, Erich; MARCUSE, Herbert et alii. Stu-
dien über Autorität und Familie – Forschungsberichte aus dem Institut für
Sozialforschung. Lüneburg: Dietrich zu Kampen Verlag, 1987 (1936). Apud
SILVA, Fábio. “Crítica da autoridade: dominação e emancipação na obra de
Max Horkheimer. (Tese). São Paulo: USP, 2018, p. 166/7.

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74 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

Veja. A questão é: a criança nasce e é criada em uma famí-


lia. Os pais estabelecem os primeiros valores morais, limites e
noção de autoridade. Os professores são a segunda instância
de valores e autoridade. A Igreja é o lugar de reconhecer a au-
toridade acima de todos os homens e poderes. É impossível
matar alguém que vive para sempre.
Identificado o alvo concreto de ação política, o socialismo
cultural desenvolve diversas táticas para enfraquecer ou cor-
romper a autoridade na sociedade burguesa, especialmente nas
famílias, escolas e igrejas.
É possível compreender, assim, porque se vê, ultimamente,
tantas propostas legislativas, jurídicas e culturais desfigurando
ou corrompendo o significado da família, subvertendo a edu-
cação, ou atacando e desmoralizando as igrejas cristãs.
A revolução socialista cultural tem o objetivo bem claro de
mudar o modo de pensar do ser humano. Os autores socialistas
se referem expressamente a uma mudança de mente – meta-
noia – das novas gerações, onde as artes, a mídia e a educação
são a ponta de lança das “transformações sociais”.

Linguagem neutra
A linguagem tornou-se um campo revolucionário, onde pa-
lavras e conceitos são deturpados em nome de um objetivo su-
premo: a destruição dos marcos civilizatórios judaico-cristãos.
Nada mais evidente do que a implantação da assim chamada
linguagem de gênero neutro, em que se propõe a mudança
da sintaxe e morfologia da língua portuguesa a fim de impor
a moral e os valores dos ativistas sexuais. Independentemente
do acolhimento ou não de suas propostas, o fato é que se trata
de ação autoritária e insidiosa dos ativistas sexuais, pois pre-
tendem impô-la a toda a sociedade sem nenhuma apreciação

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SOCIALISMO CULTURAL: O FEITIÇO DAS PALAVRAS 75

ou debate democrático, especialmente no parlamento. Em sua


atitude autoritária, simplesmente todos devem se curvar à nova
língua que criaram, na qual, por exemplo, o pronome “todos”
é extinto da língua portuguesa, e substituído pelo vocábulo
“todes”, e por aí vai.
Para implantar sua revolução na linguagem, utilizam as es-
colas e salas de aula como macabro campo de batalha, impondo
a “novilíngua” às crianças e adolescentes, a partir do ensino
infantil. Desrespeitando a lei e a ordem democrática, profes-
sores ativistas impõem aos alunos – crianças e adolescentes –
mesmo em seus primeiros anos de vida, uma lavagem cerebral.
Devemos enfrentar essas ilegalidades com as leis nas mãos
e na mente. Recorrer a argumentos sedimentados em Códigos
e Tribunais que conferem à família a primazia na formação
moral dos filhos menores, como determina a Convenção Ame-
ricana dos Direitos Humanos, artigo 12, item 4; que obrigam
os servidores públicos, inclusive professores de escolas públi-
cas, a obedecer aos princípios constitucionais da legalidade,
moralidade e transparência, conforme determina o artigo 37
da Constituição e que proíbe expor crianças e adolescentes a
situações abusivas, como ocorre quando se impõe aos alunos
uma nova língua diversa da língua portuguesa oficial.

Saul Alinski, o mentor de Barack Obama


Um dos maiores formuladores de táticas de ação cultural
socialista foi o norte-americano Saul Alinsky, em seu livro Re-
gras para radicais, publicado pela primeira vez nos anos 50, que,
curiosamente, dedica-o ao primeiro radical da história, Lúcifer:
Não nos esqueçamos de reconhecer o primeiro ra-
dical: de todas nossas lendas, mitologia e história [e
quem pode dizer onde termina a mitologia e começa

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76 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

a história, ou o que as distingue uma da outra], o


primeiro radical que o homem conheceu e que se
rebelou contra o sistema e o fez tão eficazmente que,
pelo menos, ganhou seu próprio reino: Lúcifer.2

Essa passagem do livro de Saul Alinski é um bom alerta


aos cristãos modernos, tão relutantes em reconhecer a ação de
demônios, pois revela que os inimigos de Jesus publicamente
declaram sua submissão a seu líder, Satanás.
Alinski era filho de pai e mãe russos e se formou na Uni-
versidade de Harvard, nos Estados Unidos. Ele foi mentor de
Hillary Clinton, que escreveu um livro em sua homenagem.
O primeiro emprego de Barack Obama foi em uma ONG
criada por Alinski.
Em síntese, as regras elaboradas por Alinski contemplam
os seguintes aspectos:
• Não combata frontalmente instituições que você quer
destruir, como igrejas; faça parte delas, infiltre-se, e
faça-os apodrecer por dentro.
• Quando quiser combater algo, crie uma ONG, cujo
nome afirme defender exatamente o que se quer des-
truir. Por exemplo, se o objetivo é legalizar o sexo com
crianças, crie uma ONG em defesa da criança.
• Utilize sempre argumentos jurídicos genéricos para
praticar atos ilegais a favor de sua causa. Por exemplo,
alegue o direito constitucional à alimentação para jus-
tificar o furto ou roubo de alimentos em restaurantes

2
ALINSKY, Saul. Prefácio de Rules for radicals: a pragmatic primer for
realistic radicals. [s.l.]: Vintage. 1989.

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SOCIALISMO CULTURAL: O FEITIÇO DAS PALAVRAS 77

ou supermercados. O próprio Alinski confessou, já


no final da vida, que praticava reiteradamente o furto
de alimentos, quando estudante em Harvard, e usava
pretextos dessa natureza para justificar os crimes que
praticava.
No filme, A América de Hillary, de Dinnesh de Souza, é
possível assistir o próprio Alinski descrevendo e defendendo
essas propostas revolucionárias.3
A estratégia é corromper o significado das palavras, dos
valores, dos direitos humanos, por meio de ações jurídicas,
políticas e pedagógicas que encubram o objetivo final que se
deseja alcançar.
O socialista Saul Alinsky orientava os revolucionários para
jamais revelar seu objetivo final às pessoas que conseguia ilu-
dir com seu chamado de “justiça social”, pois elas não iriam
aceitar isso. Segundo ele, é preciso enganá-las com pretextos
palatáveis no início.

Mulheres, negros e homossexuais


Já vimos no capítulo anterior que um dos fundamentos da
mentalidade socialista é depositar as virtudes e os vícios em
classes de pessoas, não em indivíduos. Assim, conforme apre-
goa a bíblia socialista – Manifesto Comunista –, a classe dos
trabalhadores é explorada pela classe dos burgueses (ricos); por
consequência, os trabalhadores são sempre bons e explorados,
portanto, vítimas do sistema, enquanto os burgueses são sem-
pre maus e exploradores.

3
Hillary’s America: the Secret history of the democratic party. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=sXycbfmaqg0. Acesso em: junho de 2022.

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78 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

A partir da década de 1950, essa mentalidade de luta de


classes foi disseminada em outras esferas sociais, o que se
denomina socialismo cultural identitário. Desse modo, as
mulheres, os negros e os homossexuais – as principais novas
trincheiras de guerra cultural – tornaram-se massa de mano-
bra para os políticos e movimentos esquerdistas. Eles alegam
a defesa dessas minorias, mas, na verdade, os socialistas exa-
cerbam e incitam o conflito entre as classes de pessoas que
escolheram como alvo. Não almejam o convívio pacífico e
igualitário, e sim realçar o conflito entre negros e brancos;
mulheres e homens.
Desejam transformar as causas justas da defesa da mulher,
negros e homossexuais em pretexto para criar apartheids sociais.
Os brancos são acusados de serem opressores dos negros; os
homens, das mulheres; e assim por diante.
No plano político, o socialismo cultural identitário se ma-
nifesta em uma das máximas mais apregoadas publicamente
pela esquerda:
“Mulher vota em mulher; negro vota em negro; trabalhador
vota em trabalhador.”
A ideia subjacente é a de que os membros de uma clas-
se – mulheres, negros, homossexuais ou trabalhadores – só
serão representados corretamente por outro membro de
sua classe. Esta mentalidade socialista está disseminada em
Universidades e Tribunais. E aqui se revela a manipulação
ideológica para produzir conflitos sociais artificiais. Basta
refletir um pouco.
O caráter e a competência das pessoas não está em seu
sexo, raça ou opção sexual. Homens, mulheres, negros ou
gays podem representar muito bem homens, mulheres, negros

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SOCIALISMO CULTURAL: O FEITIÇO DAS PALAVRAS 79

ou gays. Por exemplo, as Leis 11.340/2006 e 13.104/2015,


respectivamente conhecidas como lei Maria da Penha e lei do
feminicídio, que estabeleceram excelentes normas protetivas
em defesa das mulheres foram aprovadas por um Congresso
Nacional majoritariamente masculino.
O Supremo Tribunal Federal, ao aprovar de forma he-
terodoxa a extensão do conceito de união estável às uniões
homossexuais em 2011, não tinha em sua composição ne-
nhum ministro homossexual conhecido. (ADI nº 4277 e a
ADPF nº 132)
Ao se vincular o voto das pessoas a candidatos conforme
seu sexo, raça ou opção sexual, os ativistas pretendem criar
um apartheid entre as pessoas, como se fossem categorias di-
ferentes. A ideia é calar a voz das pessoas, no sentido de que,
os homens não teriam autoridade para falar ou propor nada a
respeito das mulheres, pois somente as mulheres teriam legiti-
midade a fazê-lo; do mesmo modo, pessoas brancas, a respeito
dos negros, e assim por diante.
Esse modo de pensar viola o princípio democrático e o
direito fundamental da liberdade de expressão, cláusulas
constitucionais essenciais à democracia. Segundo o princípio
democrático, as pessoas devem ser livres para decidir sobre sua
representação política, não podendo sofrer restrições. O direito
à liberdade de expressão significa que as pessoas não podem ser
impedidas de expressar suas opiniões ou pensamentos sobre
qualquer tema que desejarem falar.
Muitas vezes, a estratégia de apartheid entre classes sociais
(negros, mulheres, homossexuais) é aplicada de forma indi-
reta. Por exemplo, sempre que se fala da violência doméstica
ou feminicídio na mídia ou escolas, a ênfase absoluta é dada
aos casos de homens que agridem mulheres. Porém, para essa

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80 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

lógica de manipulação das causas sociais, não se deve apresentar


as estatísticas que revelam que em cerca de 1/3 das ocorrências
de violência doméstica o autor é .... uma mulher!
As estatísticas revelam que mulheres são autoras de até
30% dos casos de violência doméstica contra as próprias
mulheres, e isso se torna um fato indesejável para as ativistas
feministas, que desejam usar essa temática para imputar aos
homens o monopólio da violência contra as mulheres.4
Do mesmo modo, na questão racial, não é conveniente aos
ativistas do movimento ideológico negro revelar o fato de que
homens negros ou pardos são a maioria absoluta dos autores
de estupros contra mulheres negras, pois essa evidência des-
montaria o “castelo de cartas” da opressão e violência contra
os negros que se quer imputar somente aos brancos.
Negros, mulheres e homossexuais são colocados sempre
como vítimas de violências ou preconceitos de outra classe
de pessoas, respectivamente, os brancos, os homens ou os
heterossexuais.
Tudo se torna um jogo de palavras, em que o feitiço se
encontra oculto em diversos subterfúgios, tais como: mu-
dança oculta do significado das palavras, o uso das estatís-
ticas sobre fatos relevantes sob um viés ideológico e até a
ênfase distorcida em aspectos que reforcem o ponto de vista
que se deseja impor, especialmente por meio da distorção
das informações.

4
Estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada-IPEA
constatou que 38% das agressões e ameaças sofridas por mulheres entre 1995
e 2015 foram praticadas por OUTRAS MULHERES. https://www.ipea.gov.br/
retrato/pdf/190215_tema_d_a_violenca_contra_mulher.pdf

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SOCIALISMO CULTURAL: O FEITIÇO DAS PALAVRAS 81

Na verdade, homens ou mulheres, negros ou brancos, ho-


mossexuais ou não podem ser bons ou maus. O valor e dig-
nidade das pessoas não residem em sua raça, sexo ou opção
sexual. Isso está bem demonstrado nas estatísticas sobre autores
e vítimas de crimes na sociedade brasileira.
Não podemos aceitar a abusiva manipulação dos fatos
e estatísticas públicas para beneficiar uma narrativa ideo-
lógica e enganosa que pretende incentivar conflitos na so-
ciedade, antagonizando mulheres contra homens, negros
contra brancos.

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Capítulo 6

A BÍBLIA E O
SOCIALISMO

É frequente ouvir em diversos meios, principalmente uni-


versitários, políticos e até igrejas, a afirmação de que “Jesus
Cristo era socialista” ou, pelo menos, seus ensinamentos e
pregações estariam em alguma sintonia com o pensamento
de Karl Marx.
Para se chegar a essa conclusão, de duas uma: ou não se co-
nhece Jesus Cristo e seus ensinamentos, ou não se faz a menor
ideia do que é socialismo.
No capítulo quatro, analisamos o socialismo e seus prin-
cipais fundamentos. Procurei mostrar, por meio das diversas
transcrições de livros clássicos do socialismo, que entre os ob-
jetivos principais desse sistema está a abolição da propriedade
privada, da religião e dos valores morais e da família.

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84 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

Embora essas propostas sejam antagônicas aos ensinamen-


tos de Jesus Cristo, ainda assim, políticos socialistas insistem
em citar passagens bíblicas isoladas sugerindo que haveria al-
guma identidade entre o socialismo e os ensinos de Cristo. A
parábola do jovem rico, que se encontra em Mateus 19.16-30,
é a preferida deles, porque nessa passagem Jesus diz ao jovem
para vender tudo o que possuía e dar aos pobres, o que indi-
caria, segundo os socialistas, uma aversão de Jesus ao acúmulo
de riquezas e à propriedade privada.
Vamos analisar, agora, a doutrina socialista e os ensina-
mentos de Jesus Cristo para descobrir se há alguma seme-
lhança entre eles.
É preciso considerar que muitos que se dizem socialistas não
conhecem, de fato, a doutrinas do socialismo; sequer leram os
livros. Por isso, é necessário conhecer melhor essa ideologia e
seus fundamentos teóricos.
O maior teórico do socialismo é Karl Marx, autor do livro
Manifesto Comunista, considerado a “bíblia” do socialismo,
pois contém a descrição e os objetivos do socialismo. A obra
propõe, como vimos, a destruição da propriedade privada, da
família monogâmica e das religiões.
O livro condensa os princípios ideológicos e táticas de
ação política e revolucionária dos socialistas desde o século
XIX. Até hoje ocupa lugar de destaque na formação dos jo-
vens socialistas em universidades e escolas brasileiras, muitas
vezes por imposição ou induzimento abusivo de professores.
Para compreender bem os dogmas e valores da fé cristã e
do socialismo, vou analisar a seguir quatro temas centrais:
a propriedade privada, a família, a liberdade religiosa e
o indivíduo.

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A BÍBLIA E O SOCIALISMO 85

Propriedade privada
Acerca da propriedade dos bens, o socialismo proclama:
“A abolição da propriedade privada é o objetivo supremo
do socialismo”.1
Abolir a propriedade privada significa proibir e impedir que
as pessoas acumulem bens com base em seu esforço ou habili-
dades individuais. Na doutrina socialista, o coletivo se sobrepõe
ao indivíduo, e os bens que as pessoas produzem devem ser
distribuídos para quem o Estado socialista ordenar entregar.
Entretanto, a propriedade privada está consagrada na Bíblia
expressamente no mandamento “não furtarás” (Êxodo 20.15).
Perceba que, ao proibir a subtração de bens alheios, Deus
reconhece que as pessoas têm direito de manter os bens que
lhes pertencem. Por toda a Bíblia, a propriedade e as riquezas
privadas são reconhecidas e respeitadas. As habilidades e o es-
forço de cada indivíduo são enaltecidos na Bíblia como fatores
de geração de riqueza:
Os planos de quem é esforçado conduzem à fartura, mas
a pressa excessiva leva à pobreza. (Provérbios 21.5 –
NAA – grifo meu)

Quem trabalha com a mão ociosa fica pobre, mas o


que trabalha com diligência enriquece. (Provérbios
10.4 – NAA, grifo)

O socialismo se opõe a esses princípios bíblicos e quer es-


tabelecer uma igualdade material artificial e forçada entre as
pessoas, desconsiderando habilidades e esforços individuais.

1
MARX, Karl; Engels Manifesto Comunista. São Paulo: Boitempo, 2010, p57

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86 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

Família
O socialismo propõe abertamente destruir a família:
“Supressão da família! Até os mais radicais se indignam com
esse propósito infame dos comunistas. Sobre que fundamento
repousa a família atual, a família burguesa? Sobre o capital,
sobre o ganho individual”.2
Suprimir a família significa destruí-la à força. Leia de novo.
Você pode não acreditar, mas é pensamento central do so-
cialismo a destruição da família, no sentido da união de um
homem com uma mulher e seus filhos.
Em outro livro, chamado A origem da família, da proprie-
dade privada e do Estado, Friedrich Engels explica melhor esse
propósito absurdo ao considerar que a família monogâmica
seria a primeira forma de exploração ou opressão de classes, na
qual o homem é o opressor, e a mulher, a explorada.3
Isso significa que, segundo a antropologia socialista, a famí-
lia (bíblica) é palco de exploração e injustiça, onde o homem
oprime a mulher.
Não obstante, a Bíblia enaltece a família, o oposto do
socialismo:
Por essa razão, o homem deixará pai e mãe e se unirá à
sua mulher, e eles se tornarão uma só carne. (Gênesis 2.24)

Por essa razão, o homem deixará pai e mãe e se unirá à sua


mulher, e os dois se tornarão uma só carne. (Efésios 5.31)

2
MARX, Karl; Engels Manifesto Comunista. São Paulo: Boitempo, 2010, p. 55
3
ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do
Estado. São Paulo: Boitempo, 2019.

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A BÍBLIA E O SOCIALISMO 87

Liberdade religiosa
Finalmente, o socialismo quer destruir e proibir as religiões:
“O comunismo [socialismo] quer abolir as verdades eternas,
quer abolir a religião e a moral, em lugar de lhes dar uma nova
forma, e isso contradiz a todos os desenvolvimentos anteriores”.4
Aqui se revela a intenção expressa do socialismo de destruir
toda a fé em Deus. Não apenas dos cristãos, mas de toda e
qualquer religião. E não apenas a fé, mas a moral, os valores e
a ética, frutos do desenvolvimento da humanidade por séculos.
O revolucionário Lenin, durante uma discussão com Leonid
Krassin, em 1918, a respeito da eletrificação na Rússia, afirmou:
“A eletricidade substituirá a Deus. Deixem o camponês re-
zar pela eletricidade e ele sentirá que o poder das autoridades
é bem maior que o dos céus”.5

Mas a Bíblia afirma que Jesus Cristo é a verdade e a vida:

Respondeu Jesus: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida.


Ninguém vem ao Pai, a não ser por mim”. (João 14.6)

Deus é a verdade eterna:

No princípio era aquele que é a Palavra. Ele estava com


Deus, e era Deus. Ela estava com Deus no princípio. Todas as
coisas foram feitas por intermédio dele; sem ele, nada do que
existe teria sido feito. (João 1.1-3)

4
MARX, op. cit., p. 57.
5
COURTOIS, Stéphane et al. O livro negro do comunismo: crimes, terror e
repressão (trad. Caio Meira). Rio de Janeiro:Bertrand Brasil, 1999, p. 64.

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88 O S CR ISTÃO S E A PO L ÍT I C A – A B íblia e o S o cialis m o

O indivíduo
O socialismo considera que as virtudes e os vícios não per-
tencem a indivíduos, mas a “classes” de pessoas. Assim, todos
os trabalhadores são bons e dignos, e todos os ricos (burgueses)
são maus e exploradores.
O conceito de luta de classes é a essência do modo socialista
de ver as pessoas e o mundo. É a concepção de que há sempre
um explorador e um explorado na humanidade, cabendo aos
explorados suplantar os dominadores para estabelecer “um
mundo justo”. O ódio entre as classes de pessoas é a força
motriz do socialismo, pois é vital para os propósitos revolu-
cionários criar e atiçar antagonismos viscerais na sociedade.
O conceito moderno de luta de classes foi expandido para
diversos âmbitos sociais da sociedade, não apenas trabalhadores
contra empresários. Agora, criam e alimentam o ódio entre
negros e brancos, mulheres e homens e assim por diante. Os
socialistas pretendem levar a discórdia e o ódio para todos os
âmbitos sociais que puderem.
Nesse contexto, os indivíduos não têm relevância, senão
conforme servem aos propósitos de sua “classe”, segundo
a agenda de valores estabelecida pelos líderes socialistas. O
pensamento socialista é tão contraditório que se um negro,
mulher ou homossexual se opuser a esse antagonismo, não
terá nenhuma consideração ou respeito.
O político negro Fernando Holliday sofreu na pele essa
reação esquizofrênica dos socialistas ao ser xingado de “capi-
tão do mato” por expressiva liderança socialista brasileira, ao
discordar de propostas do movimento negro, especialmente a
política de cotas. “Capitão do mato” é uma alusão aos negros

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A BÍBLIA E O SOCIALISMO 89

que, durante o regime escravocrata brasileiro no século XIX,


serviam aos donos de fazenda para dominar os escravos negros.
O ódio entre as classes de pessoas é tão exaltado pelo socia-
lismo, que, assim como o nazismo fazia com os judeus, o so-
cialismo propõe a perseguição e eliminação física de uma classe
inteira de pessoas, a burguesia: “É natural que o proletariado de
cada país deve, antes de tudo, liquidar a sua própria burguesia”.6
Aliás, a execução sumária de adversários ou oponentes é uma
característica de todos os regimes socialistas reais que já existiram,
demonstrando que os socialistas seguem à risca os princípios
estabelecidos por Karl Marx no Manifesto Comunista.
Na Bíblia, é totalmente diferente. O cristianismo conside-
ra que as qualidades ou os defeitos são atributos individuais,
jamais de coletividades. Ser rico ou pobre não interfere no
caráter da pessoa. O pressuposto é que cada indivíduo é capaz
de decidir sobre seus atos, ou seja, é dotado de livre-arbítrio:
Pois da mesma forma que julgarem, vocês serão julgados;
e a medida que usarem, também será usada para medir
vocês. (Mateus 7.1-2)

O indivíduo é chamado a decidir conforme seu entendi-


mento. Ricos ou pobres, homens ou mulheres, somos todos
iguais para Cristo:
Não há judeu nem grego, escravo nem livre, homem nem
mulher; pois todos são um em Cristo Jesus. (Gálatas 3.28)

Isso significa que, no cristianismo, as pessoas são considera-


das individualmente, independentemente de sexo, riqueza ou

6
MARX, op cit., p. 50.

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cidadania. Exatamente o oposto do socialismo, que considera


sempre classes de pessoas.
As únicas “classes” de pessoas que podem ser identificadas
na Bíblia são as classes dos santos e a dos pecadores. E, mesmo
nesse caso, a Bíblia não autoriza o extermínio dos pecadores pelos
santos. Muito pelo contrário, incumbe aos santos, pela com-
paixão e atitudes de amor, esforçar-se pela salvação dos ímpios.
Efetivamente, os valores e atitudes expressos por Jesus Cristo
em suas parábolas, ensinamentos e mandamentos respeitam
a liberdade do indivíduo e a propriedade privada, valorizam
o mérito e esforço individual e excluem a interferência do go-
verno em diversas áreas da vida das pessoas. Precisamente em
oposição ao que propõe o socialismo.
É necessário lembrar que Jesus Cristo respeitava a proprie-
dade privada e exortava as pessoas ao bom caminho conforme
sua liberdade pessoal de decidir. Nos evangelhos, Jesus Cristo
sempre se dirigia ao indivíduo:
Jesus dizia a todos: “Se alguém quiser acompanhar-me,
negue-se a si mesmo, tome diariamente a sua cruz e
siga-me”. (Lucas 9.23)

E todos os que tiverem deixado casas, irmãos, irmãs, pai,


mãe, filhos ou campos, por minha causa, receberão cem
vezes mais e herdarão a vida eterna. (Mateus 19.29)

Pois da mesma forma que julgarem, vocês serão julgados;


e a medida que usarem, também será usada para medir
vocês. (Mateus 7.2)

É certo que, na parábola do jovem rico, Jesus Cristo exor-


ta o penitente a vender toda sua riqueza e doá-la aos pobres:

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A BÍBLIA E O SOCIALISMO 91

Eis que alguém se aproximou de Jesus e lhe perguntou:


“Mestre, que farei de bom para ter a vida eterna?”
Respondeu-lhe Jesus: “Por que você me pergunta sobre
o que é bom? Há somente um que é bom. Se você quer
entrar na vida, obedeça aos mandamentos”. “Quais?”,
perguntou ele. Jesus respondeu: “Não matarás, não adul-
terarás, não furtarás, não darás falso testemunho, honra
teu pai e tua mãe” e ‘amarás o teu próximo como a ti
mesmo”. Disse-lhe o jovem: “A tudo isso tenho obedecido.
O que me falta ainda?”. Jesus respondeu: “Se você quer
ser perfeito, vá, venda os seus bens e dê o dinheiro aos
pobres, e você terá um tesouro no céu. Depois, venha e
siga-me”. Ouvindo isso, o jovem afastou-se triste, porque
tinha muitas riquezas. (Mateus 19.16-21)

Essa passagem deve ser entendida no contexto da obra


realizada por Jesus, especialmente conforme a parábola dos
talentos e a parábola dos trabalhadores na vinha, que exaltam
a iniciativa individual e a multiplicação engenhosa de riquezas.
É correto o entendimento de que Jesus alerta para não
colocarmos as riquezas materiais acima dos valores morais
e espirituais (cf. Mateus 6.19-21). Ele nos convida a sermos
generosos e liberais, gentis e prontos a ajudar os necessitados:
“Pois eu tive fome, e vocês me deram de comer; tive sede,
e vocês me deram de beber; fui estrangeiro, e vocês me
acolheram; necessitei de roupas, e vocês me vestiram;
estive enfermo, e vocês cuidaram de mim; estive preso,
vocês me visitaram”. Então os justos lhe responderão:
“Senhor, quando te vimos com fome e te demos de comer,
ou com sede e te demos de beber? Quando te vimos como
estrangeiro e te acolhemos, ou necessitado de roupas e
te vestimos? Quando te vimos enfermo ou preso e fomos
te visitar?” O Rei responderá: “Digo-lhes a verdade: o
que vocês fizeram a algum dos meus menores irmãos, a
mim o fizeram”. (Mateus 25.35-38)

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Ainda assim, é sempre uma exortação individual, sujeita à


liberdade e discernimento de cada pessoa, jamais uma obri-
gação imposta pelo Estado ou por terceiros.
E aqui reside outra grande diferença entre o ensino de Jesus
Cristo e o socialismo, pois este se dirige sempre ao coletivo e
propõe ao Estado impor à sociedade e aos indivíduos obriga-
ções de fazer e de suportar que se faça.
Na parábola do bom samaritano (cf. Lucas 10.25-37), o
indivíduo é exortado a se envolver na ajuda aos necessitados,
investindo seus próprios recursos materiais. O bom samari-
tano não é o governo, mas o indivíduo, o cristão verdadeiro.
Ao dizer “[...] Deem a César o que é de César e a Deus o
que é de Deus [...]” (Marcos 12.17), Jesus Cristo exaltou a
independência entre a vida espiritual e o governo, no sentido
de que a vida espiritual dos indivíduos não pode sofrer inter-
ferência das autoridades governamentais.
Nessa passagem está consagrada a semente do que mo-
dernamente denomina-se “princípio do Estado Laico”. Ao
Estado (César) incumbe atividades e poderes aos quais o
indivíduo deve obedecer; mas, por outro lado, as atividades
religiosas individuais são um direito do indivíduo, e devem
ser respeitadas pelo Estado.
Mesmo ao expulsar os mercadores no templo, como está
descrito no Evangelho de João 2.14-17, Jesus não está se
opondo ao comércio ou negócios, mas ao uso indevido do
templo para a mercancia. Em nenhuma passagem dos evan-
gelhos, Jesus Cristo reprimiu ou condenou o comércio nem
a propriedade privada.

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A BÍBLIA E O SOCIALISMO 93

orientação prática

Acredito que a mera apresentação desses funda-


mentos já resultará em uma reflexão profunda e numa
mudança de pensamento para muitos cristãos desavi-
sados. O ensino será muito mais proveitoso se feito até
mesmo a crianças, adolescentes e jovens, preparando-os
para enfrentar os doutrinadores socialistas em escolas e
ambientes midiáticos.
Cabe às famílias e aos líderes cristãos instruírem as
novas gerações com esse conhecimento simples e claro
sobre as doutrinas bíblica e socialista. É preciso que nós,
cristãos, sejamos os primeiros a dar filtros de entendimen-
to aos nossos jovens para que estejam protegidos contra
falácias e enganos
Assim como o discipulado, esse ensinamento deve ser
consistente e permanente.

O socialismo deposita no Estado as chaves de transforma-


ção da sociedade, devendo todos os indivíduos se submeter
aos interesses dos Governantes. Como vimos, abolir a família,
o cristianismo e a propriedade serão objetivos importantes a
alcançar pelo socialismo.
Jesus Cristo propõe a cada indivíduo o arrependimento,
a submissão a Deus e a consciência de seu protagonismo
familiar e social. A transformação da sociedade é fruto de
transformações individuais e o Estado deve respeitar a fé, a
família e a propriedade.

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Conclusão

Ao longo destas páginas, procurei conduzir você, leitor,


ao entendimento de que não podemos nos enganar com as
aparentes boas intenções de quem alega pretender defender
os pobres ou combater a injustiça social. Muitos socialistas se
escondem “nessa pele de cordeiro”.
Muitos cristãos que se dizem socialistas desconhecem
as propostas anticristãs e autoritárias que estão no sistema
operacional da ideologia socialista. Quantos têm sido ludi-
briados pelas propostas de “justiça social”, tão frequentes no
discurso socialista?
Palavras ou expressões aparentemente nobres, mas corrom-
pidas em seu significado, são a principal isca para capturar as
mentes desatentas. “Justiça social”, “igualdade” ou “combate
a desigualdades” são as armadilhas preferidas dos socialistas ao
abordar os jovens cristãos.

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Creio que, após a leitura deste livro, só restarão leito-


res cristãos e leitores socialistas, mas nenhum leitor cristão
socialista.

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