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PREPARAÇÃO PARA
A CONSAGRAÇÃO À
SANTÍSSIMA VIRGEM
MARIA

“A quem Deus quer fazer muito santo,


faz muito devoto da Santíssima Virgem Maria”
(São Luís Maria Grignion de Montfort)
ÍNDICE
INTRODUÇÃO 06

PARTE 1 - O DESAPEGO DO MUNDO 10


1. O necessário desapego do mundo 12
2. Os perigos dos últimos séculos 21
3. O mundo e seus enganos 30
4. A luta com contra os desejos carnais 38
5. Desapego dos bens terrenos 45
6. A luta contra o orgulho 53
7. A fé triunfa sobre o mundo 59
8. Os deveres de religião que afastam do mundo 67
9. O remédio contra os vícios da impureza 74
10. O exercício da paciência e mansidão 82
11. A inveja mata a alma 89
12. A verdade vos libertará 95

PARTE 2 - O CONHECIMENTO DE SI 103


1. O reconhecimento humilde da própria miséria 105
2. O estado de santidade original do ser humano 112
3. Graça Santificante: a participação na vida divina 118
4. O pecado mortal e seus efeitos 125
5. As três idades da vida espiritual 132
6. Três bloqueios que impedem a cura da alma 142
7. O remédio para 4 feridas da alma 150

4
PARTE 3 - O CONHECIMENTO DE NOSSA
SENHORA 158
1. Uma Mãe de Misericórdia 160
2. A verdadeira devoção à Santíssima Virgem Maria
é terna 167
3. A verdadeira devoção à Santíssima Virgem Maria
é interior 174
4. A verdadeira devoção à Santíssima Virgem Maria
é constante 181
5. A verdadeira devoção à Santíssima Virgem Maria
é desinteressada 189
6. A verdadeira devoção à Santíssima Virgem Maria
é santa 196
7. A intimidade com a Santíssima Virgem Maria no
cotidiano 203

PARTE 4 - O CONHECIMENTO DE JESUS CRISTO 212


1. A Santíssima Trindade é comunhão de amor 214
2. Jesus Cristo, homem e Deus 224
3. A ressurreição de Cristo prova sua divindade 232
4. A doce e adorável face de Deus 240
5. A Santíssima Eucaristia é o maior tesouro da Igreja 247
6. OgrandesinaldeDeusparaaconversãodahumanidade 255
7. A caridade nos une ao Cristo 263
APÊNDICE 271

5
INTRODUÇÃO
Ser um verdadeiro devoto da Santíssima
Virgem Maria é caminhar sempre nos cami-
nhos de Jesus, procurando conformar toda a vi-
da com Ele e, assim, chegar à santidade, a qual
todos os fiéis são chamados. Este livro tem o in-
tuito de ajudar àqueles que desejam fazer uma
profunda preparação de suas almas para entre-
garem-se totalmente às mãos de Deus por meio
da Santíssima Virgem. São Luís Maria escreveu
o Tratado da Verdadeira Devoção com a inten-
ção de que todos os homens e mulheres che-
gassem ao conhecimento de Deus e o amassem
por meio daquela que melhor o conheceu e o
amou. A Virgem Santíssima é, portanto, o cami-
nho mais seguro e mais rápido para ser um ver-
dadeiro imitador de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Seguindo os passos de São Luís, o livro está


dividido organicamente em quatro partes e dis-
tribuído ao todo em trinta e três capítulos em
que o leitor poderá meditar a cada dia sobre o
caminho progressivo que a alma deve fazer pa-
ra entregar-se toda a Deus. Foram 33 anos que

6
Cristo passou entre os homens, serão 33 dias de
preparação do fiel para tornar-se um verdadei-
ro devoto da Santíssima Virgem e um amante
de Nosso Senhor.

A primeira parte trata do desapego do mun-


do, sem o qual ninguém pode abraçar a verda-
deira fé. Purificar-se do espírito do mundo é
necessário para que a graça não encontre obstá-
culos em nossa alma e possa operar a transfor-
mação que Deus deseja. Assim como na alma da
Santíssima Virgem não havia nenhum obstácu-
lo que lhe impedisse de servir a Deus e amá-lo
como Ele merece ser amado.

A segunda parte trata do conhecimento de


si que se torna imprescindível para que a alma
possa dar-se a Deus. O fiel precisa reconhecer
qual o seu estado de alma em cada etapa do ca-
minho de conversão e santificação, pois um sé-
rio e profundo exame de consciência a respeito
da própria vida é um exercício fundamental em
que a consciência vai sendo formada e tornan-
do-se mais sensível para ouvir a voz de Deus que
chama no fundo da alma.

7
A terceira parte aborda o conhecimento de
Nossa Senhora e dá a conhecer as grandezas de
Maria e uma profunda consideração a respei-
to de como o fiel deve viver a sua consagração.
Maria também merece ser amada e venerada
com um culto de hiperdulia que eleve suas vir-
tudes e a glorifique como a criatura mais perfei-
ta saída das mãos do Criador.

A quarta parte trata a respeito do conheci-


mento de Jesus Cristo, o Deus que se fez homem
e deu provas de seu amor, convivendo com os
homens e dando-os a conhecer os segredos vi-
vidos no seio da Santíssima Trindade. É a Cristo
que a Virgem Maria pretende levar cada um de
seus filhos, por isso o fim desta devoção é cristo-
lógico.

Ao final do livro ainda será possível en-


contrar os exercícios espirituais que devem
ser feitos nos trinta e três dias de preparação.
Esperamos que esse material seja uma ponte
que o conduza mais rapidamente à intimidade
com Cristo apoiado sob a poderosa intercessão

8
da Santíssima Virgem, para que por suas mãos o
próprio Cristo transplante o seu coração ao nos-
so, santificando a nossa alma e nos conduzindo
às eternais fontes de seu amor na eternidade.

Você vai agora, iniciar sua preparação pa-


ra a mais perfeita consagração a Jesus Cristo,
Sabedoria Encarnada por meio da Virgem Maria.
O ideal, é que você já tenha lido ou esteja len-
do o livro do Tratado da Verdadeira Devoção à
Santíssima Virgem Maria, ou ao menos, o livro
O Segredo de Maria. Pois assim você terá uma
compreensão necessária de quão grande graça
está para receber em sua vida. Algo que vai mar-
car e mudar profundamente a sua história e o
modo como você se relaciona com Deus.

9
PARTE 1

O DESAPEGO
DO MUNDO
Vamos começar com os 12 dias de meditação
sobre o necessário desapego do mundo, colo-
cando em prática o que o evangelho de Jesus nos
ensina: “Quem se apega à sua vida, perde-a; mas
quem faz pouca conta de sua vida neste mundo
conservá-la-á para a vida eterna” (Jo 12,25). Por
isso é tão importante rezar, meditar e colocar
em prática todos os ensinamentos que serão ex-
perimentados nestes 12 dias preliminares.

Para isso, você deve a cada dia rezar as seguin-


tes orações:

10
VENI, CREATOR SPIRITUS (P. 271)
AVE MARIS STELLA (P. 273)

Além disso, deve fazer a meditação do dia e


colocar em prática os conselhos que se encon-
tram ao final de cada meditação.

Que Nossa Senhora seja tua melhor compa-


nhia nestes 12 primeiros dias de batalha espiri-
tual contra o mundo.

11
1. O NECESSÁRIO
DESAPEGO DO MUNDO
O desapego do mundo constitui a primei-
ra etapa da purificação e do amadurecimento
na fé que São Luís Maria Grignion de Montfort
propõe para aqueles que querem viver total-
mente entregues a Jesus Cristo por meio de sua
Mãe Maria Santíssima. Tratar sobre o desapego
do mundo em primeiro plano é fundamental,
pois nisto consiste os primórdios da verdadeira
devoção, já que é impossível ser um devoto au-
têntico da Virgem Maria sem antes lançar fora
todos os afetos e apegos mundanos que subsis-
tem na alma.

Mas antes de aprendermos quais são os remé-


dios que o cristão deve empregar na luta contra
o mundo, é necessário entender que espécie de
mundo São Luís se refere. Sem sombra de dúvi-
das não se trata da criação divina, porque tudo
quanto Deus cria é bom, pois sua origem é o pró-
prio Deus. Portanto, o universo criado por Deus
não é o inimigo que se levanta contra a alma do
fiel devoto.

12
O mundo que tanto São Luís, quanto a Sagrada
Escritura e a Tradição se referem são as estru-
turas de pecado que o homem constrói contra
Deus e sua vontade. Por meio das ações pecami-
nosas o ser humano promove injustiças, perse-
guições, desenvolve mentalidades mundanas e
aumenta a desordem na sociedade. A Igreja em
sua doutrina apresenta o mundo como “a influ-
ência negativa que as situações comunitárias e
as estruturas sociais, que são o fruto dos peca-
dos dos homens, exercem sobre as pessoas.” ¹.
Portanto, o homem afastado de Deus não faz se-
não uma perversão de toda a realidade em fun-
ção de seu desejo egoísta e isso provoca a queda
de muitos outros no pecado.

O mundo pode se apresentar de diferentes


formas, mas em geral, é possível classificá-lo em
quatro aspectos: primeiro fazem parte do mun-
do os chamados incrédulos, aquelas pessoas
que não possuem fé, estes precisamente por
não crerem estão dispostos a destruir a religião
e tudo o que venha dela. Os incrédulos agem as-
sim porque de certa maneira a religião é uma
denúncia ao seu modo de viver, ela condena seu

13
orgulho, sensualidade e o desejo desmedido pe-
las riquezas.

O próprio Jesus, que veio para salvar os que


estavam perdidos, anunciou a existência desse
ódio que o mundo tem por aqueles que creem:
“Se o mundo vos odeia, sabei que, primeiro, me
odiou a mim. Se fôsseis do mundo, o mundo
amaria o que era seu; mas, porque não sois do
mundo e minha escolha vos separou do mun-
do, o mundo, por isso, vos odeia”² . No entanto,
ainda que exista essa revolta é necessário conti-
nuar anunciando a conversão a todos para que
o mundo não avance, mas mude de mentalida-
de.

Em segundo lugar o mundo é constituído


pelos indiferentes. Esses estão acomodados nu-
ma vida preguiçosa e não possuem desejos de
abraçar as cruzes necessárias para imitar a vida
de Cristo. De alguma maneira os indiferentes
consideram a religião como algo dispensável,
ou algo de escolha meramente pessoal. No en-
tanto, Jesus advertiu que a salvação está desti-
nada apenas aqueles que renunciam seu modo

14
de viver para abraçar firmemente o seu ensina-
mento. Ele diz claramente: “Se alguém quiser vir
após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz
e siga-me. Pois aquele que quiser salvar sua vida,
a perderá; mas, o que perder sua vida por causa
de mim e do Evangelho, a salvará. Com efeito,
que aproveitaria ao homem ganhar o mundo
inteiro e arruinar sua própria vida?” .

Esse questionamento precisa inquietar o es-


pírito de quem caminha na indiferença: “Que
aproveitaria ao homem ganhar o mundo intei-
ro e arruinar sua própria vida?” Não vale a pe-
na viver uma vida morna, apática em relação
a Deus, se no fim das contas o homem deverá
prestar contas diante de seu Criador. Somente
a vida na graça deve constituir a razão dos em-
preendimentos humanos. Mesmo quando não
há um forte desejo de abraçar a cruz é preciso
implorá-lo ao próprio Deus que fará surgir na
alma uma determinação de abandonar o mun-
do.

Os pecadores impenitentes fazem parte do


terceiro grupo de pessoas que formam o mun-

15
do. Eles sabem que estão no pecado, que perde-
rão a salvação se persistirem em suas práticas,
mas mesmo assim amam o pecado e os prazeres
e não querem renunciá-los. O coração humano
não pode estar dividido entre dois amores, ou se
ama o mundo e torna-se seu escravo, ou se ama
a Deus e serve a sua santa vontade. O apóstolo
São João deu esta recomendação: “Não ameis
o mundo nem o que há no mundo. Se alguém
ama o mundo, não está nele o amor do Pai” 4.

A vida cristã é um verdadeiro embate contra


o pecado, foi precisamente para isso que Cristo
veio ao mundo, sofreu a sua paixão, morreu e
ressuscitou. Cristo quis em sua própria humani-
dade destruir a separação que existia entre Deus
e o homem depois do surgimento do pecado. É
por isso que é inadmissível alguém querer ser-
vir a Deus e ao mesmo tempo enamorar-se por
uma vida pecaminosa. “Adúlteros, não sabeis
que a amizade com o mundo é inimizade com
Deus? Assim, todo aquele que quer ser amigo
do mundo torna-se inimigo de Deus” 5. Quem
vive no pecado, embora não perceba, alimenta
um profundo ódio por Deus em sua alma.

16
Por fim, os mundanos fazem parte do quar-
to grupo dos que constituem o mundo. Os
mundanos são pessoas que creem e praticam a
religião, vão à Missa, recebem Sacramentos, fa-
zem orações, até algum gesto de caridade, mas
ao mesmo tempo querem viver a vida do mun-
do. As pessoas mundanas “amam” as coisas de
Deus, mas ao mesmo tempo seu olhar admira o
mundo e elas não se determinam a cortar total-
mente seu relacionamento com as coisas mun-
danas. Seu coração está dividido e sua prática
religiosa se perde e torna-se hipócrita. Os mun-
danos dão maus exemplos aos outros e até tor-
nam-se motivo de escândalo.

A vida cristã para ser vivida com autentici-


dade requer uma radicalidade. É preciso saber
dizer sim ao que é justo e não ao que conduz
ao pecado. Todo cristão precisa se fortalecer na
graça para que possa alcançar um domínio de si
próprio a ponto de não retroceder no caminho
da fé. São Paulo nos exorta a reavivarmos essa
consciência: “A graça de Deus se manifestou pa-
ra a salvação de todos os homens. Ela nos ensina
a abandonar a impiedade e as paixões munda-

17
nas, e a viver neste mundo com autodomínio,
justiça e piedade” 6. Embora o mundo possa pa-
recer atraente, é preciso considerar sempre que
seus bens são efêmeros e seus prazeres são tão
passageiros que se tornam incapazes de satisfa-
zer a alma humana. Era essa a consideração de
Santa Gema Galgani quando dizia: “Nosso cora-
ção foi feito para amar uma só coisa: nosso gran-
de Deus”.

O mundo está sob o império de Satanás,


portanto, um verdadeiro devoto da Santíssima
Virgem Maria precisa declaradamente se posi-
cionar contra o mundo, declarar guerra a sua
maneira de pensar e agir. São Paulo dá um con-
selho indispensável àqueles que querem se de-
cidir por Deus: “Não vos conformeis com este
mundo, mas transformai-vos, renovando a vossa
mente, a fim de poderdes discernir qual é a von-
tade de Deus, o que é bom, agradável e perfei-
to” 7. Todavia, para que essa renovação de men-
talidade e atitudes possa acontecer é necessário
meditar constantemente na Palavra de Deus,
pois somente ela é capaz de formar no espírito
do homem a resolução de abandonar o mundo.

18
E “a suprema sabedoria é esta: pelo desprezo do
mundo tender ao reino dos céus” 8.

Cristo, por sua Palavra, ilumina a alma que se


torna capaz de enxergar a irrelevância do mun-
do e, à medida que aumenta a fé do devoto, tor-
na-o capaz de vencer as seduções mundanas.
“Todo o que nasceu de Deus vence o mundo. E
esta é a vitória que venceu o mundo: a nossa fé”
9
. Quem vive mergulhado na Palavra de Deus não
precisa temer o mundo, nem se admirar dele. É
uma grande libertação viver longe das coisas do
mundo, o coração torna-se leve e disposto para
o verdadeiro bem: “Conseguirão grande liberda-
de da alma os que por vosso nome entram na ve-
reda estreita e se apartam de todos os cuidados
mundanos” 10. Os verdadeiros devotos da Virgem
Maria possuem um coração livre, porque aban-
donaram o mundo para viver só para Deus.

PARA REFLETIR:
• Estou com o coração disposto a ser modelado
pela Palavra viva de Deus, permitindo assim
que ela purifique meus pensamentos, sen-
timentos e hábitos mundanos?

19
• Estou decidido a abandonar, dia após dia,
tudo aquilo que em mim desagrada a Jesus
e me conformar ao espírito do Evangelho?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, quero tornar-me
um devoto seu. Quero viver na verdade e retidão
do Evangelho de vosso Filho dileto. Vós amastes
tanto a Jesus e vivestes tão distante do mundo
que seu coração foi sempre livre e capaz de amá-
lo de maneira perfeita. Vos suplico essa mesma
graça, de desprezar todas as seduções mundanas,
de crescer no conhecimento da Palavra de Deus
e meditar na vontade do Senhor dia e noite
sem cessar. Maria, minha Mãe de Misericórdia,
interceda por mim junto ao seu filho Jesus.
Amém!
PROPÓSITO
Hoje Nossa Senhora vai interceder por sua
vida e o Divino Espírito Santo vai iluminar a sua
alma para que você reconheça qual é a pior ati-
tude mundana que está presente na sua vida e
se proponha a mudar radicalmente isso.

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2. OS PERIGOS DOS
ÚLTIMOS SÉCULOS
O mundo é um terrível inimigo da alma e su-
as estruturas de pecado cresceram enormemen-
te nos últimos dois séculos. Sobre este tempo já
haviam profecias de Nossa Senhora e exortações
de toda a Igreja, mas o homem moderno decidiu
trilhar outro caminho, afastando-se de Deus. A
confusão que se instalou no mundo, sobretudo
no século XX e XXI manifesta o quanto as almas
estão se perdendo, visto que o homem destes
tempos acredita que a religião é uma trivialida-
de e Deus uma invenção. A arrogância humana
levou às piores catástrofes que já se viram: duas
grandes guerras, o surgimento de inúmeras ide-
ologias, o crescimento do ateísmo, a destruição
da família e uma crise de sentido nunca antes
vista.

O mundo moderno se declarou contra a fé,


mas essa decisão não foi motivada de qualquer
maneira, por trás dela está a busca alucinada do
ser humano por prazer. Quando o homem vive
num estado de lassidão, sua capacidade de con-

21
templar a realidade tal como ela é e de se abrir
às realidades divinas torna-se mais difícil. Isso
ocorre porque a fé é uma virtude que Deus in-
funde na inteligência humana para que se pos-
sa enxergar as verdades que a simples razão di-
ficilmente compreenderia. Essa verdade não
está assentada sob a verificação científica, mas
somente na autoridade do próprio Deus que se
revela, porque Deus não pode se enganar e não
engana a ninguém.

Assim, é possível compreender que a fé é


uma iluminação divina que faz o homem enxer-
gar o modo correto de viver, de se dar a Deus, de
desfrutar da criação, de acolher interiormente
a vontade de Deus. No entanto, o que se vê no
mundo moderno é a cegueira espiritual causa-
da pelos pecados da carne e, portanto, a fé está
consequentemente se apagando no coração da
maior parte das pessoas.

A crise de fé que se instalaria no mundo foi


profetizada por Nossa Senhora séculos antes.
A partir do ano 1594 Nossa Senhora do Bom
Sucesso apareceu à Madre Mariana de Jesus

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Torres em Quito, no Equador. Em uma de suas
aparições A Virgem Maria disse o seguinte: “No
final do século XIX e grande parte do século XX
surgirão muitas heresias, e a luz preciosa da fé se
apagará em muitas almas devido a uma corrup-
ção moral que será generalizada. Neste tempo
os ares se encherão com os espíritos malignos
da impureza, que a semelhança de um dilúvio
de sujeiras e imundícies inundará ruas e praças
e os lugares públicos. Tamanha será a libertina-
gem, que não haverá mais almas virginais no
mundo”.

A grave profecia de Nossa Senhora associa a


impureza à falta de fé e ainda afirma que se tor-
naria uma raridade a existência de almas virgi-
nais, ou seja, aquelas pessoas que conservaram
a Graça Santificante recebida no Batismo. Santa
Teresinha do Menino Jesus foi uma santa que
teve o privilégio de conservar a graça batismal.
Ela nunca cometeu qualquer pecado mortal, pe-
lo contrário, sempre viveu afastada dos pecados
da carne, pois foi cercada de pureza em um lar
verdadeiramente católico.

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Infelizmente, pouco tempo depois da morte
de Santa Teresinha o mundo já não era o mes-
mo. Com o surgimento de Sigmund Freud no
campo da psicologia muitos fenômenos psico-
lógicos passaram a ser explicados partindo da
sexualidade humana. Não demorou muito pa-
ra que anos depois surgissem inúmeras teorias
que colocavam o prazer sexual como o centro
da vida humana. Foi o que ocorreu com a cha-
mada Revolução Sexual que teve seu ápice entre
1960 e 1970. A intenção dos revolucionários era
a destruição dos valores morais tradicionais, da
família constituída segundo os princípios cris-
tãos, do sexo vivido dentro do matrimônio, do
fim do casamento, enfim, a revolução sexual ti-
nha como finalidade a completa subversão dos
princípios morais que sustentavam a sociedade
até aquele momento.

As profecias de Nossa Senhora tinham sido


acertadas, porque a partir da Revolução Sexual
o ser humano se entregou a todo tipo de bestia-
lidades. A libertação sexual era motivada, sobre-
tudo pelo movimento feminista e por ideólogos
esquerdistas que desejavam transformar a se-

24
xualidade humana em uma arma política. Suas
reivindicações eram pela reforma dos costu-
mes tradicionais defendidos pela moral cristã,
por isso, defendiam explicitamente o aborto, a
facilitação do divórcio, a aceitação do adultério
como uma prática comum, a pedofilia, o inces-
to, que são as relações sexuais entre parentes, a
zoofilia, sexo praticado com animais e a poliga-
mia.

Desde esse evento muitas coisas passaram


a ser comuns na sociedade. Com a introdução
dos métodos contraceptivos para impedir o
nascimento dos filhos, as pessoas perderam o
verdadeiro sentido do sexo que é a procriação e
a união do casal, e passaram a vê-lo simplesmen-
te pela ótica do prazer. Nasceu assim o sexo sem
compromisso que também facilitou a prática
mais comum do adultério. Além disso, cresceu
enormemente e perdura até hoje as lutas para a
legalização do aborto, tornando algo “normal”
o assassinato de bebês.

Mas o ser humano afastado de Deus e cego


espiritualmente não reconhece os limites de su-

25
as loucuras, por isso, logo em seguida surgiram
também os movimentos gayzistas que busca-
ram promover a prática da homossexualidade
e a ideologia de gênero. As pautas destes grupos
invadiram diversos setores da sociedade. A mí-
dia deu grande visibilidade a tudo isso e levou
para dentro das casas das famílias uma ideo-
logia que perverteria o plano natural de Deus
para o homem. A situação da sociedade atual é
pior que a de Sodoma e Gomorra e tem ferido
gravemente o Coração de Deus. Essas ações pe-
dem uma intervenção divina devido à injustiça
e idolatria do sexo que leva o ser humano a sua
autodestruição. “Sodoma, Gomorra e as cidades
vizinhas, por se terem prostituído, procurando
unir-se a seres de natureza diferente, foram pos-
tas como exemplo, ficando sujeitas ao castigo
do fogo eterno” 11.

Como se não bastasse a promiscuidade que a


humanidade já havia atingido, o mundo se viu
contaminado por mais um espírito de impure-
za: a pornografia. Com este mal, a perversão se-
xual tomou proporções ainda maiores, pois o
sexo tornou-se onipresente. Homens e mulhe-

26
res se afundam dia após dia neste vício que já
supera largamente o vício nas drogas. Como se
não bastasse, também as crianças estão cada vez
mais cedo tendo acesso a esse tipo de conteúdo,
pois com o celular em suas mãos o pecado tor-
nou-se ainda mais acessível.

Deus não fica indiferente a tantas perversões,


sobretudo porque a inocência já quase não exis-
te mais em meio aos seres humanos. “Mortificai,
pois, vossos membros terrenos: fornicação, im-
pureza, paixão, desejos maus, e a cupidez, que
é idolatria. Essas coisas provocam a ira de Deus
sobre os desobedientes” 12. Somente voltando-
-se para Deus e buscando conhecer sua vontade,
seguir seus mandamentos e abandonar tudo is-
so que o mundo considera bom, é que o ser hu-
mano encontrará a liberdade que tanto deseja.
“Se o meu povo, sobre quem foi invocado o meu
Nome, se humilhar, orar, buscar a minha pre-
sença e se arrepender de sua má conduta, eu, do
céu, escutarei, perdoarei seus pecados e restau-
rarei sua terra” 13.

27
A devoção à Santíssima Virgem constitui um
passo fundamental para se opor às modas do
mundo. Maria é a criatura mais pura que já exis-
tiu, seu exemplo e suas preces ajudarão os cris-
tãos deste tempo a não sucumbirem às seduções
deste mundo pervertido. Santa Jacinta Marto,
ouviu de Nossa Senhora em Fátima que o pecado
que mais levavam almas para o inferno são os que
se cometem contra a pureza. Sua consciência foi
avivada de compaixão pelas almas que estão nes-
te caminho pecaminoso e, por isso alertou: “Hão
de vir umas modas que hão de ofender muito a
Nosso Senhor. As pessoas que servem a Deus não
devem seguir as modas. A Igreja não tem modas.
Nosso Senhor é sempre o mesmo”. Viver aparta-
do do mundo é, sobretudo, não seguir a última
tendência do momento, mas firmar-se nos valo-
res que preservam a alma de afundar-se no lama-
çal de pecado contra a pureza.

PARA REFLETIR:
• Estou me deixando influenciar por todas
essas modas e costumes presentes no mundo
de hoje, sobretudo as coisas que são clara-
mente fontes de pecado?

28
• Tenho protegido a minha família, especial-
mente as crianças de terem contato com
tudo aquilo que pode ferir a sua pureza?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, o mundo está en-
louquecido e subvertendo todo o projeto de
Deus. As almas estão se entregando à impure-
za e à devassidão como nunca antes na histó-
ria. Eu vos peço, tende misericórdia de mim e
não permitais que eu tome também este cami-
nho. Preserve meu olhar, pensamentos e afetos
de toda impureza. Reveste-me com teu manto
virginal e guarde-me na pureza para contem-
plar a face de Deus no céu. Minha Boa Mãe não
abandoneis vossos filhos neste vale de lágrimas
e dai-me, sobretudo um desejo ardente de fazer
penitência pela conversão dos pobres pecado-
res. Amém!

PROPÓSITOS
Hoje os santos anjos vem ao seu encontro
juntamente com Nossa Senhora para te fortale-
cer no combate espiritual. Nós precisamos lu-

29
tar pela conversão do mundo, por isso escolha
um sacrifício para o dia de hoje e ofereça pela
conversão dos pobres pecadores.

3. O MUNDO E
SEUS ENGANOS
O mundo é astuto para cercar o homem e le-
vá-lo à perdição. Pode-se dizer que existe uma
certa sabedoria mundana, todavia ela se contra-
põe à sabedoria divina, é uma verdadeira opo-
sição ao que Deus deseja para o homem já que
a sabedoria mundana consiste numa desordem
da criação que não vê outro fim senão a sua pró-
pria vontade egoísta. Ela é o desenvolvimento
explícito do mundo, visto que ele é o conjunto
das estruturas de pecado que o homem constrói
contra Deus. A sabedoria do mundo é uma lou-
cura, ela perverte o sentido original das coisas,
transforma o homem numa besta, reduzindo-o
a um estado pior do que o dos animais, em su-
ma, a sabedoria mundana é enganadora porque
não pode cumprir nada do que promete.

30
O apóstolo São João definiu com clareza em
que se resume as obras mundanas: “Tudo o que
há no mundo – a concupiscência da carne, a
concupiscência dos olhos e a soberba da vida –
não vem do Pai, mas do mundo. Ora, o mundo
passa com a sua concupiscência; mas o que faz a
vontade de Deus permanece eternamente” 14. A
tríplice concupiscência de que fala São João é a
desordem instalada na alma de todo ser huma-
no depois do trágico episódio da queda de Adão
e Eva. O pecado dos nossos primeiros pais dei-
xou no homem uma tendência para desprezar o
que é verdadeiro, belo e bom e inclinar-se para
o mal. Depois do pecado original o ser humano
está numa constante batalha contra si mesmo
se quiser fazer o bem. A natureza humana está
ferida pela ignorância que enfraquece a luz na-
tural da razão, e também ficou maliciosa, pois
sua vontade se inclina para as obras más, por
fim, se vê uma profunda desordem nos desejos
sensíveis que já não mais obedecem docilmen-
te a razão e este terceiro mal é a concupiscência.

Nosso Senhor Jesus Cristo ao ser conduzido


pelo Espírito Santo para o deserto, foi tentado

31
por Satanás exatamente onde se estabelecem
as três feridas presentes na natureza humana.
Jesus não tinha pecado e, portanto, não existia
nele as desordens da concupiscência, no entan-
to ele desejou padecer e vencer Satanás em todas
elas para mostrar ao homem que somente com
a força da graça é possível vencer essa batalha.
No Jardim do Éden o pecado acontece porque
Adão e Eva se afastam da graça, não dão ouvidos
à Palavra de Deus e escolhem sua própria satis-
fação.

A primeira tentação que Satanás faz a Jesus


se dirige ao que nos pecadores chama-se con-
cupiscência da carne, a desordem causada nos
desejos relativos à subsistência: alimentação e
sexo. Ele diz a Jesus: “Se és Filho de Deus, manda
que esta pedra se transforme em pão” 15. Essa fala
já demonstra uma sabedoria enganadora, pois
Satanás sabia perfeitamente que Jesus é o pró-
prio Deus. No entanto, aproveitando-se de sua
fome, dada a circunstância do jejum que fazia
a quarenta dias, quis levá-lo ao pecado. A mes-
ma coisa fez o diabo ao tentar Eva, ele a instiga
a desejar o fruto da árvore proibida por Deus e

32
quando ela lhe responde que não podia comer,
pois se o fizesse morreria, ele diz: “Vós não mor-
rereis! Mas Deus sabe que, no dia em que dele
comerdes, vossos olhos se abrirão e vós sereis
como deuses, conhecedores do bem e do mal”
16
. Ninguém pode ser como Deus e, Satanás sabia
perfeitamente disso, mas ele conseguiu acender
em Eva o desejo concupiscível. Jesus, ao contrá-
rio, não dialogou com a tentação, mas apenas
a reprimiu de imediato com a Palavra de Deus:
“Está escrito: Não só de pão vive o homem” 17.
De fato, Nosso Senhor estava alimentado pelo
Espírito Santo e desejoso de fazer unicamente a
vontade do Pai Celeste.

A concupiscência dos olhos é o desejo des-


medido de possuir as coisas que existem no
mundo, é o desejo de riqueza. Satanás também
tentou Jesus nesse sentido, mostrando a ele a
imensidão dos reinos que estavam sob seu po-
der, ele lhe disse: “Eu te darei todo este poder
com a glória destes reinos, porque ela me foi en-
tregue e eu a dou a quem eu quiser. Por isso, se
te prostrares diante de mim, toda ela será tua”
18
. No Éden, instigada pela proposta do diabo,

33
“Eva viu que a árvore era boa ao apetite e formo-
sa à vista” 19. Seu desejo era possuir aquele fruto
e devorá-lo, dentro de sua alma surgiu um de-
sejo desmedido por aquilo que não era seu. Ao
contrário de Eva, mais uma vez Jesus reprimiu
a tentação com a Palavra de Deus: “Está escrito:
Adorarás ao Senhor teu Deus, e só a ele prestarás
culto” 20. Isso revela que nenhuma criatura pode
tomar o lugar de Deus, o homem deve usar das
coisas deste mundo com a consciência de que
elas não lhe pertencem definitivamente, mas
que ele é apenas um administrador das coisas
de Deus. O apego aos bens deste mundo tira a
paz do coração e transforma o ser humano em
um escravo.

A última tentativa de Satanás ao tentar Jesus


faz referência a desordem que nos seres huma-
nos chama-se soberba da vida. Essa desordem é
o desejo desmedido de poder, quando o homem
se coloca no lugar de Deus e deseja ser adorado.
O diabo levou Jesus ao pináculo do Templo e lhe
disse: “Se és filho de Deus, atira-te para baixo,
porque está escrito: Ele dará ordem a seus anjos
a teu respeito, para que te guardem. E ainda: E

34
eles te tomarão pelas mãos, para que não trope-
ces em nenhuma pedra” 21. No Jardim do Éden
Eva notou que a “árvore era desejável para ad-
quirir discernimento” 22, comendo o fruto ela
acreditava que seria possuidora de todo poder,
de conhecer tudo e assim poder dominar to-
das as coisas sem a necessidade de se submeter
a Deus. Nosso Senhor era profundamente sub-
misso à vontade do Pai e, por isso, reprime sua
última tentação com as palavras: “Foi dito: Não
tentarás ao Senhor, teu Deus” 23. Deus não que-
ria que Jesus aparecesse glorioso diante de to-
dos, mas que as pessoas pudessem reconhecê-lo
por meio de uma fé humilde. Assim também,
Deus esperava a submissão de Eva à sua vonta-
de, que ela confiasse em sua Palavra com espíri-
to humilde e filial.

Em todas as tentações o diabo usou a Palavra


de Deus, mas não no sentido mesmo que ela
possui, mas instrumentalizando-a para afastar
o homem de Deus. Assim é a sabedoria munda-
na, para satisfazer todos os desejos do homem,
está disposta até mesmo a deturpar os ensina-
mentos de Deus. No mundo atual, ouve-se cada

35
vez mais frequentemente coisas do tipo: “Deus é
misericordioso, não há problema em pecar” ou
“o inferno não existe, aliás, Deus é tão bom”. São
meias verdades ditas para fazer com que o ho-
mem se acostume com a mentalidade do mun-
do e perca Deus, seu único bem.

Mas existe remédios dados pelo próprio Jesus


para curar a tríplice concupiscência. Contra a
concupiscência da carne deve-se fazer jejum,
pois ele ajuda o homem a conquistar o domínio
de si. Para curar a concupiscência dos olhos de-
ve-se aplicar a dar esmolas, pois ela faz com que
a necessidade do próximo fale mais alto ao co-
ração do que o desejo de posse, além de ajudar
o homem a desapegar-se dos bens. Por fim, pa-
ra curar a ferida da soberba da vida é necessário
empregar a oração. Ela faz com que a alma seja
iluminada pela graça que ajuda a reconhecer a
grandeza de Deus e a miséria do homem, além
disso, move os afetos para que se implore humil-
demente a misericórdia divina e o crescimento
na fé. Desse modo, fazendo uso do jejum, da es-
mola e da oração, as desordens presentes no ser
humano vão se enfraquecendo e o homem po-

36
de, por fim, ver-se livre de si mesmo e servo fiel
de Deus.

PARA REFLETIR:
• Tenho conseguido controlar os meus desejos
de prazer, de possuir e de poder pela força da
Palavra de Deus e do Divino Espírito Santo?

• Já tenho o costume de fazer jejum, oração e


dar esmolas com frequência?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, em vossa alma nun-
ca existiu desordem alguma, pois sempre fostes
imaculada, isenta de qualquer culpa de pecado.
Como devia ser harmônica vossa vida e quão in-
tenso o desejo que possuías de Deus. Eu, pobre
pecador, estou tão inclinado para as coisas do
mundo que custa-me amar a Jesus com todo meu
coração. Por isso vos peço que me ajude a vencer
os vícios, crescer nas virtudes, ordenar minha al-
ma e chegar à santidade, na perfeita imitação de
vossa vida. Assim seja, amém!

37
PROPÓSITO
Hoje o Divino Espírito Santo ilumina a sua
alma para reconhecer as desordens que estão aí
presentes. Também te motiva a imitar a vida da
Virgem Maria, por isso se proponha a fazer je-
jum, ou dar uma esmola, ou fazer alguns minu-
tos a mais de oração no dia de hoje por amor a
Jesus e como forma de ordenar a sua alma.

4. A LUTA COM CONTRA


OS DESEJOS CARNAIS
Depois do pecado original o ser humano está
hereditariamente sob o peso do pecado e com
ele também a tríplice concupiscência. Uma lu-
ta se passa no seu interior, de tal modo que São
Paulo assim se expressou: “A carne tem desejos
opostos ao Espírito e o Espírito tem desejos con-
trários à carne” 24. Mas como é possível enten-
der que a carne esteja em um combate contra o
espírito, se a condição corporal do ser humano
foi criada por Deus? Para isso é necessário fazer
uma distinção desde o princípio. A carne a qual
São Paulo se refere são as desordens causadas

38
pelo pecado em todo o nosso ser, desde o corpo
com seus afetos, emoções e sentimentos, até a
alma em sua inteligência, vontade e memória.
O homem como um todo está ferido pela má in-
clinação deixada pelo pecado, para se referir a
essa desordem a Sagrada Escritura em seu ori-
ginal grego utiliza o termo Sarx. Por outro lado,
o corpo é uma realidade originalmente boa, ele
corresponde a dimensão somática, da existên-
cia humana e é parte integrante e necessária na
constituição do homem.

A santidade que consiste na plena conformi-


dade com a vontade de Deus requer, portanto,
que sejam ordenados corpo e alma para estarem
com todas as suas capacidades direcionadas pa-
ra Deus. Sendo assim, “O corpo, na sua masculi-
nidade e feminilidade, é desde o princípio, cha-
mado a tornar-se a manifestação do espírito. O
corpo, de fato, e só ele, é capaz de tornar visível
o que é invisível: o espiritual e o divino.” 25. Deus
mesmo quis formar um corpo para si quando se
encarnou no ventre puríssimo da Virgem Maria
e se fez homem. Todavia, embora o corpo seja
naturalmente bom, tanto ele quanto a alma so-

39
frem com os ataques da carne que é a influência
do mundo sobre o ser humano como um todo.

A dificuldade do homem está em equilibrar


o desejo que possui dentro de si, um desejo que
não pode ser plenamente saciado de qualquer
maneira, pois sua intensidade requer algo eter-
no que possa satisfazê-lo. Se o homem busca sa-
tisfazer seus desejos de qualquer maneira ele se
torna um mundano. “O homem, que vive segun-
do a carne, é o homem dos ‘sentidos’, o homem
da tríplice concupiscência” 26. Isso significa que
quem segue os desejos carnais é a pessoa que
se contenta com prazeres imediatos, vividos de
forma irracional e que ao fim conduzem o ho-
mem a uma vida bestial. Mas condenar a vida
da carne não significa condenar o prazer, pois
ele é próprio do homem enquanto criatura de
Deus. O que é necessário é a moderação dos de-
sejos sensíveis.

A Igreja em sua doutrina ensina que as pai-


xões existentes no homem não são boas nem
más, por isso “As emoções e sentimentos podem
ser assumidos em virtudes ou pervertidos em

40
vícios” 27. Igualmente o prazer pode ser vivido
dentro do projeto original de Deus, como pode
ser degenerado em formas viciosas. Mas é preci-
so ter claro que o prazer criado por Deus não é
mau, pelo contrário, é naturalmente bom, mas
se vivido com moderação, ordenado ao seu fim
próprio que deve ser o bem moral e sobrenatu-
ral. No projeto originário “Deus une o prazer a
certos atos bons para que se tornem mais fáceis
e, assim, atrair-nos ao cumprimento do dever”
28
. Portanto, o prazer tem a função de estimular
o ser humano na prática do bem. No entanto,
quando vivido segundo os desejos imoderados
da carne, o prazer é experimentado como fim
em si mesmo, o que representa um grande mal.

São Paulo expõe quais são as obras pratica-


das por aqueles que vivem no mundanismo: “As
obras da carne são manifestas: fornicação, impu-
reza, libertinagem, idolatria, feitiçaria, ódio, ri-
xas, ciúmes, ira, discussões, discórdia, divisões,
invejas, bebedeiras, orgias e coisas semelhantes
a essas” 29. Todas essas obras pecaminosas acon-
tecem quando o homem não tem um comple-
to domínio de si e não vive segundo o Espírito.

41
Ao contrário, São Paulo diz que aquele que vive
sob o efeito da graça do Espírito Santo, é cheio
de: “Amor, alegria, paz, longanimidade, benig-
nidade, bondade, fidelidade, mansidão, autodo-
mínio” 30.

A temperança é a virtude principal que ajuda


o homem a vencer a si mesmo no combate con-
tra a carne. Ela corresponde ao equilíbrio que de-
ve haver nos desejos sensíveis, onde a pessoa se
torna capaz de manter um autodomínio sobre
seus desejos e ações. Para chegar a possuir essa
virtude é necessário um caminho de mortifica-
ções, como, por exemplo, a prática do jejum que
ajuda a moderar o desejo pelo alimento. Ou a vi-
gilância sobre o olhar para que não se caia em
nenhum pecado contra a pureza. Essas formas de
mortificação vão aos poucos curando a grave fe-
rida da concupiscência carnal e à medida que se
purifica, o homem vai se aproximando de Deus.
O verdadeiro devoto da Santíssima Virgem sabe
que não deve saciar seus desejos nas obras mor-
tas do pecado, mas segue perfeitamente o con-
selho de São Paulo: “Conduzi-vos pelo Espírito e
não satisfareis os desejos da carne” 31.

42
O homem foi criado por Deus para viver um
equilíbrio perfeito em sua composição de cor-
po e alma, mas os bens espirituais estão sempre
acima dos materiais e, portanto, os bens da al-
ma estão acima dos bens do corpo. Desse mo-
do, o desejo que arde na alma humana por uma
busca de satisfação só será plenamente realiza-
do no céu. A felicidade humana não consiste em
adquirir todo o conforto para o corpo, mas em
encontrar em Deus a plena realização de todos
os seus desejos. Nenhuma satisfação sexual ou
alimentar será permanente e capaz de dar a feli-
cidade verdadeira que o homem busca, essa só
pode ser encontrada em Deus, na plena união
com Ele.

PARA REFLETIR:
• Você percebe o combate espiritual que está
sendo travado dentro de você, com desejos
de viver as coisas de Deus, mas ao mesmo
tempo o desânimo e os prazeres do mun-
do?

43
• Você já percebeu que uma vida de pecados
é sempre cheia de angústias, vazio e sem
esperança?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, durante o curso de
vossa vida na terra, tivestes todos os seus desejos
direcionados para Deus. Buscastes viver na gra-
ça e preservada de toda impureza e imoderação
nos prazeres, lançando seu Coração Imaculado
em direção à eternidade. Obtende-me a graça
de encontrar equilíbrio, para saber usufruir dos
prazeres de forma lícita, buscando o bem sobre-
natural. Que a minha vida possa ser cheia de vir-
tudes, como a vossa, sobretudo a pureza. Assim
seja, amém!

PROPÓSITO
A Virgem Maria consola o seu coração e traz
esperança para sua vida. Com o auxílio do seu
Anjo da Guarda, ela te convida a abandonar os
prazeres e pensamentos do mundo e a abraçar a
cruz de Jesus. Hoje, faça a renúncia de algum ti-
po de prazer, como um alimento, o celular, uma
conversa, e pense mais no céu e nas coisas san-
tas.

44
5. DESAPEGO DOS
BENS TERRENOS
Deus é o Criador de todas as coisas e, portan-
to, o Senhor de suas criaturas. Mas em seu proje-
to benevolente ele quis que o homem exercesse
consigo este senhorio sobre a criação. Assim se
expressa a Sagrada Escritura: “Deus os abençoou
e lhes disse: ‘Sede fecundos, multiplicai-vos, en-
chei a terra e submetei-a; dominai sobre os pei-
xes do mar, as aves do céu e todos os animais
que rastejam sobre a terra’.” 32. Esse domínio que
Deus permite que o homem exerça é uma parti-
cipação em seu governo, mas esse senhorio de-
veria ser vivido como uma forma de sacrificar,
ou seja, oferecer todos os frutos a Deus.

Com a queda do homem no pecado essa or-


dem estabelecida por Deus foi quebrada e no
íntimo da alma surgiu um descontrole, a cha-
mada concupiscência dos olhos. Essa desordem
representa o egoísmo e a sede de possuir todas
as coisas de maneira desmedida para si mes-
mo, não oferecendo-as a Deus. Afirma a Sagrada
Escritura: “O olho não se sacia de ver” 33 e, por

45
contemplar toda a obra da criação e ver a sua
imensidão, o homem desordenado tende a que-
rer roubar de Deus aquilo que lhe pertence. É
assim que expõe sua alma a um grande perigo,
porque a posse desmesurada dos bens terrenos
não é capaz de saciar seu espírito, mas levado
por uma cegueira, não se deixa iluminar pela
luz da graça que lhe exorta a exercer a generosi-
dade, possuindo os bens, mas não deixando-se
ser possuído por eles.

Com a Encarnação de Jesus Cristo, ele pas-


sou a ser o modelo do homem perfeito e, Nosso
Senhor sempre foi desapegado de todos os bens,
mas sabia usufruir deles de maneira moderada.
Desse modo, ele institui a pobreza evangélica
como sinal desse benéfico desapego dos bens.
Segundo os ensinamentos de Jesus, o problema
não está em possuir bens, pois desde o princípio
Deus assim o quis, mas em colocar essa posse
material acima dos bens espirituais. Portanto, a
Igreja em sua doutrina ensina que “O preceito
do desapego das riquezas é obrigatório para en-
trar no Reino dos céus” 34.

46
Aqueles que desejam alcançar a sua salvação
precisam moderar seus desejos pelos bens ter-
renos, pois o próprio Jesus Cristo afirmou expli-
citamente: “É mais fácil o camelo entrar pelo bu-
raco da agulha do que o rico entrar no Reino de
Deus” 35. Nessa exortação feita pelo Senhor não
há uma condenação àqueles que possuem mui-
tos bens, mas sim, àqueles que se apegam dema-
siadamente aos bens terrenos e não os dispõe
para Deus e ao serviço dos mais pobres. A pro-
pósito disso, existiram muitos santos ricos, mas
eles faziam pouco caso de sua riqueza e sempre
distribuía seus bens aos pobres, demonstrando
assim que a única riqueza que realmente lhes
importava era possuir a Deus.

Diante dos bens deste mundo o coração hu-


mano tantas vezes sente-se dividido, mas é ne-
cessário lutar contra isso, pois “ninguém pode
servir a dois senhores. Com efeito, ou odiará
um e amará o outro, ou se apegará ao primei-
ro e desprezará o segundo. Não podeis servir a
Deus e ao dinheiro” 36. Quem se apega aos bens
não é capaz de confiar na Providência de Deus,
tornar-se soberbo e indiferente às necessidades

47
do próximo. É por isso que o apego representa
uma escravidão, ao passo que é uma verdadeira
idolatria. “O abandono à providência do Pai do
céu liberta da preocupação pelo amanhã. A con-
fiança em Deus dispõe para a bem-aventurança
dos pobres. Eles verão a Deus” 37. Somente os
pobres em espírito podem ver a Deus, pois seus
olhos se preservaram para esse dia, não viveram
cobiçando os bens terrenos.

O remédio para o apego aos bens terrestres


é o apego aos bens celestes. É a esperança na
posse de Deus na Bem-aventurança eterna que
torna o coração humano capaz de abandonar
todas as riquezas materiais que são passageiras
para abraçar as riquezas espirituais que são per-
manentes. São Francisco de Assis, por exemplo,
soube encontrar nas palavras do Salvador, essa
sabedoria que se esconde aos olhos do mundo:
“Não ajunteis para vós tesouros na terra, onde a
traça e o caruncho os corroem e onde os ladrões
arrombam e roubam, mas ajuntai para vós te-
souros no céu, onde nem a traça, nem o carun-
cho corroem e onde os ladrões não arrombam
nem roubam.” (Mt 6, 19-20). É o grande desejo

48
do céu que vai desprendendo o coração huma-
no das coisas da terra, que vai lhe abrindo a vi-
são para enxergar que os bens eternos são mais
valiosos e importantes que os bens terrenos. “O
desejo da verdadeira felicidade liberta o homem
do apego imoderado aos bens deste mundo, e
terá a sua plenitude na visão beatífica de Deus.
[...] Por isso aquele que vê a Deus obteve todos
os bens que se possam imaginar” 38.

No coração de cada homem e mulher exis-


te uma inclinação desregrada pelos bens des-
te mundo, mesmo quando está aí disfarçada.
É contra essa inclinação que é preciso lutar ar-
duamente, pois desse desejo imoderado é que
nasce a inveja. Esse vício capital é a tristeza que
surge na alma diante do bem alheio e do dese-
jo desmesurado de possuir esses bens que não
lhe pertencem. Por isso, na vida cristã, “o bati-
zado combate a inveja pela benevolência, pela
humildade e pelo abandono à providência divi-
na” 39. A caridade é a maneira pela qual é possí-
vel compreender que o dinheiro e os bens são
meios que devem ser colocados à disposição do
próprio bem e do bem do próximo.

49
Jesus é muito incisivo quando coloca a sal-
vação como consequência do despojamento do
homem de todo afeto desmedido pelos bens, de
sua liberalidade em relação ao próximo: “Tive
fome e me destes de comer. Tive sede e me destes
de beber. Era forasteiro e me acolhestes. Estive
nu e me vestistes, doente e me visitastes, preso
e viestes ver-me. Cada vez que o fizestes a um
desses meus irmãos mais pequeninos, a mim
o fizestes” 40. Isso prova que somente os desa-
pegados é que são capazes de olhar a necessida-
de do próximo, de estender-lhe a mão e suprir
sua necessidade. A esses o próprio Jesus dirá:
“Vinde, benditos de meu Pai, recebei por heran-
ça o Reino preparado para vós desde a fundação
do mundo” 41.

O verdadeiro devoto da Santíssima Virgem


deve esforçar-se diariamente por viver uma vi-
da despojada de tudo. Seu coração repousará
somente em Nosso Senhor e o único bem que
desejará é a eterna união com Deus no céu. A
exemplo da própria Virgem Maria que foi sem-
pre pobre de espírito e de seu Filho Jesus Cristo

50
que sendo rico se fez pobre por amor aos ho-
mens. Aqui cabe o conselho de São Paulo: “Se,
pois, temos alimento e vestuário, contentemo-
-nos com isso. Ora, os que querem se enriquecer
caem na tentação e cilada, e em muitos desejos
insensatos e perniciosos, que mergulham os
homens na ruína e na perdição. Porque a raiz de
todos os males é o amor ao dinheiro” 42. O cora-
ção humano só encontrará paz na posse eterna
de Deus, o dinheiro jamais será capaz de preen-
cher um espaço que anseia por eternidade.

PARA REFLETIR:
• Os bens deste mundo não serão capazes de
preencher a nossa alma. Você é uma pessoa
excessivamente preocupada com as coisas
deste mundo até ao ponto de deixar de lado
as coisas de Deus?

• Você é capaz de se alegrar com os bens do


próximo sem deixar com que a inveja tome
conta do seu coração?

51
AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, Minha amada
Mãe, soubestes em cada momento de vossa vi-
da abandonar-se à Providência Divina, amar os
pobres e desejar somente a Deus, como único
bem. Ajuda-me a superar meus apegos pelos
bens terrenos e a lançar meu olhar para o céu,
a fim de que as coisas deste mundo não me de-
tenham na busca pelos tesouros celestes. Tudo
deposito em tuas mãos, obtende-me a graça de
amar unicamente a teu Filho Jesus. Amém!

PROPÓSITO
A Virgem Maria era profundamente carido-
sa e sempre se compadecia dos mais pobres. Ela
não tinha apegos a nada neste mundo, pois seu
coração sempre desejou os bens celestes. Hoje
ela vem ao seu encontro para te ajudar a abando-
nar as preocupações e apegos com os bens deste
mundo. Todo aquele que vive desapegado, pen-
sa no próximo e o ajuda em suas necessidades,
por isso, ajude alguém que esteja precisando.
Faça uma doação, dê uma esmola, encontre um
meio de aliviar a dor do próximo.

52
6. A LUTA CONTRA
O ORGULHO
O homem ferido pelo pecado deseja arden-
temente viver prazeres sem limites, possuir tu-
do o que há no mundo, mas quer ainda mais,
quer ser o seu próprio deus. A soberba da vida
faz com que o ser humano não veja Deus como
um amigo, mas como seu principal inimigo,
pois ele seria uma espécie de estraga prazeres.
Mas a verdade é que o orgulho é uma espécie de
cegueira espiritual que impede a contemplação
da realidade, ou seja, da verdade das coisas. Por
isso a Sagrada escritura afirma: “A arrogância de
teu coração te enganou” 43. Essa palavra poderia
ser aplicada a Satanás que desejou ser igual a
Deus e acabou sucumbindo nas profundezas do
inferno. Ele é orgulhoso desde o princípio e, por
isso, também é homicida. Satanás tentou Adão
e Eva e também eles ficaram cegos pelo orgulho
e pecaram contra Deus desobedecendo sua or-
dem.

O orgulho está presente na vida de todo ser


humano, ele se manifesta como uma revolta

53
contra Deus e precisa ser curado para que se
possa chegar à verdade. “A soberba da vida é o
amor desordenado de nossa própria superiori-
dade, do que pode colocá-la em destaque, por
mais árduo ou difícil que seja. Aquele que se en-
trega sempre mais à soberba acaba por se tor-
nar seu próprio ‘deus’, como Lúcifer. E disso po-
dem provir todos os pecados e a perdição.” 44. O
pecado do orgulho é o que mais assemelha uma
alma ao diabo, pois sendo uma espécie de peca-
do propriamente espiritual, faz com que o cora-
ção humano se inche a tal ponto de desprezar a
Deus e, assim fazer muitos outros pecados, co-
mo a vaidade, a preguiça espiritual, a inveja e a
cólera.

Quando o homem não se submete humilde-


mente a Deus, proclama com um forte brado pe-
la força do orgulho a mesma decisão de Lúcifer:
“Não servirei!” 45. Essa determinação de se opor
a Deus é a causa de sua própria ruína e de sua ce-
gueira. “Teu coração se exalta orgulhosamente e
dizes: ‘Eu sou deus, ocupo trono divino no cora-
ção do mar’. Apesar de seres homem e não Deus,
alimentas, em teu coração, pretensões divinas.”

54
46
. O orgulho é como um câncer que vai se rami-
ficando por todo o corpo e mata o organismo.
Mas existe uma cura para esse mal: a virtude da
humildade.

A humildade consiste na aceitação da pró-


pria condição e na inteira submissão à sabedoria
e vontade de Deus. Ensina Santa Teresa D’Ávila
que “A humildade é a verdade”, essa definição é
perfeita, pois a verdade é aquilo que condiz com
a realidade. Sendo assim, o orgulho não passa de
uma coisa irreal, fruto de uma vontade perverti-
da que não aceita sua condição e não se submete
a soberana sabedoria do Altíssimo. O homem e
os anjos são apenas criaturas e, portanto, nunca
poderão ser iguais a Deus. A humildade consis-
te em aceitar essa condição de criatura e com-
prazer-se nela, glorificando a Deus que é a fonte
de seu ser. A propósito disso, escreve São Tiago:
“Deus resiste aos soberbos, mas dá sua graça aos
humildes” 47. Deus não pode dar graças a uma
pessoa soberba, pois ela usaria esses dons para
agravar ainda mais a sua condição, por isso, aos
orgulhosos somente a humilhação pode ser um
remédio eficaz.

55
O próprio Deus escolheu o caminho da hu-
mildade para conquistar o coração dos homens,
a fim de que reconheçam que Ele é infinitamen-
te maior que suas próprias concepções e proje-
tos. Ele diz: “Quanto os céus estão acima da ter-
ra, tanto meus caminhos estão acima dos vossos
caminhos, e meus pensamentos acima dos vos-
sos pensamentos” 48. Sua entrada no mundo faz
cair por terra todo o orgulho humano de querer
ser mais sábio que o próprio Deus. Ele escolheu
um caminho de pobreza, de total esvaziamento
de si mesmo para encher os humildes das gra-
ças do céu. Somente os humildes puderam reco-
nhecer Jesus, pois sua encarnação, vida e paixão
era uma contradição para os mundanos. Por isso
diz São Paulo: “Mas o que é loucura no mundo,
Deus o escolheu para confundir os sábios; e o
que é fraqueza no mundo, Deus o escolheu para
confundir o que é forte; e, o que no mundo é vil
e desprezado, o que não é, Deus escolheu para
reduzir a nada o que é, a fim de que nenhuma
criatura possa vangloriar-se diante de Deus” 49.

Toda a vida de Cristo se passou numa com-


pleta confiança no Pai. Ele triunfou sobre todas

56
as coisas porque estava completamente sub-
metido a vontade de Deus e, por isso, deu aos
homens o exemplo perfeito de como deveriam
agir, desconfiando de si mesmos e colocando
toda a sua força em Deus que os sustenta. “Jesus
venceu por uma humilde e amorosa paciência.
É esta mesma disposição que assegurará à alma
o triunfo sobre os obstáculos interiores e exte-
riores, que atrapalham na sua união com Deus”
50
. Não há situação que a alma humilde não con-
siga superar, pois ela não combate por si mes-
ma, mas é a força do Alto que a sustenta.

O humilde nunca se vangloria a si mesmo,


mas deposita toda a glória sobre o único que é
digno dela: o próprio Deus. “Quem ama a Deus
é verdadeiramente humilde. Não se orgulha
vendo em si algumas boas qualidades. Sabe que
tudo quanto possui é dom de Deus; de seu, só
tem o nada e o pecado. Por isso, conhecendo os
dons concedidos por Deus, mais se humilha,
sentindo-se indigno e tão favorecido por Deus.”
51
. É por isso que a oração é o principal recurso
de uma pessoa humilde, pois só reza verdadei-
ramente quem se humilha diante de Deus e, “O

57
Senhor atende à oração dos humildes” (Sl 101,
18). É preciso seguir, portanto, o ensinamento
de Jesus: “Aquele que se exaltar será humilhado,
e aquele que se humilhar será exaltado” 52. Se o
homem se humilha diante de Deus tudo poderá
ser vencido, até mesmo seu espírito orgulhoso.

PARA REFLETIR:
• Na sua relação com Deus, você consegue
reconhecer a sua posição de criatura e se
submete a vontade do Pai, ou muitas vezes
deseja que Deus faça a sua vontade?

• Somente um coração humilde se sente re-


alizado, porque com os pés assentados no
chão, sabe bem qual é a sua realidade. Você
tem dificuldade de se aceitar, de aceitar
sua condição e também a vontade de Deus
para sua vida?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria escolhestes livre-
mente se submeter a Deus em todas as coisas.
Tu mesmo te chamaste “a escrava do Senhor”
porque nunca quisestes o lugar que não te per-

58
tence, mas te alegrastes com os dons concedi-
dos por Deus. Ajuda-me a possuir um espírito
humilde, despojado de mim mesmo e de minha
vontade. Que meu único desejo seja imitar-vos
e conquistar o olhar misericordioso de Jesus so-
bre minha pobre alma. Amém!

PROPÓSITO
Aceitar a própria condição sem se revoltar,
sem murmurações é um bom sinal de humilda-
de. Como Nossa Senhora foi feliz sabendo que
era uma criatura que devia servir a Deus com to-
do seu coração, sem grandes pretensões, mas so-
mente com o coração posto na vontade de Deus.
Hoje, é um dia muito especial para pedir a Deus
um espírito mais humilde, um despojamento
de sua própria imagem e um coração que aceite
melhor a vontade do Senhor.

7. A FÉ TRIUNFA
SOBRE O MUNDO
O crescimento na fé é essencial no processo
de desapego do mundo. O homem não pode vir

59
a conhecer-se devidamente, encontrando as re-
alidades mais profundas do seu ser, se o próprio
Deus não o iluminar com a graça. Foi essa a ex-
periência de Santo Agostinho quando decidiu
escrever suas Confissões, logo no início de sua
obra ele mostra que é pela fé que ele chegou ao
conhecimento de si que vai apresentar aos seus
leitores: “Invoca-te, Senhor, a minha fé, que me
deste, que me inspiraste pela humanidade de
teu Filho, pelo ministério de teu pregador” 53.

A fé é uma virtude teologal infundida por


Deus na inteligência humana. Esse dom dado
por Deus tem a função de iluminar a alma com
verdades que não podem ser conhecidas pela
simples razão natural. Existem muitas coisas que
o homem não teria conhecimento se o próprio
Deus não lhe tivesse revelado, como, por exem-
plo, a presença real de Jesus na Divina Eucaristia,
a Santíssima Trindade, a existência do inferno,
entre tantas verdades de fé que ajudam a escla-
recer a nossa inteligência e nos proporcionam
um aprofundamento na nossa visão da realida-
de. Além disso, a fé predispõe a uma abertura às
outras virtudes, como a caridade, que nos une

60
mais perfeitamente a Deus. “A fé infusa, nos faz
crer em tudo o que Deus revelou, por ser Ele a
própria Verdade. É como um sentido espiritual
superior que nos permite perceber uma harmo-
nia divina, inacessível a qualquer outro meio de
conhecimento.” 54. Ter fé é crer que tudo o que
Deus comunica ao coração humano está isento
de erro, pois ele jamais pode se enganar e nem
mesmo enganar a ninguém.

Sem a virtude da fé é impossível agradar a


Deus, pois não se terá conhecimento a respeito
de sua vontade. Mas não basta ter fé, é preciso,
para que seja verdadeira, que ela frutifique em
boas obras, porque “A fé, se não tiver obras, está
completamente morta” 55. Crer nas realidades
que Deus revela é algo que até mesmo os demô-
nios fazem, São Tiago deixa isso bastante claro
quando diz: “Tu crês que há um só Deus? Ótimo!
Lembra-te, porém, que também os demônios
creem, mas estremecem” 56, ou seja, eles sabem
quais são verdades de fé, mas não as colocam
em prática, pois não amam a Deus. Portanto, a fé
precisa também ser alimentada pelo amor, pois
quem ama realmente procura sempre o bem do

61
seu amado. São Paulo ensinou em sua doutrina
acerca da caridade: “Ainda que tivesse toda a fé, a
ponto de transportar montanhas, se não tivesse
a caridade, nada seria” 57. Desse modo, somente
o amor demonstrado nas boas obras é que dão
verdadeiro testemunho da fé de uma pessoa.

O amor a Deus e ao próximo se revela sobre-


tudo na prática dos mandamentos, onde se vê
a perfeita obediência aos ensinamentos dados
por Deus. “E sabemos que o conhecemos por
isto: se guardamos os seus mandamentos” 58.
A finalidade dos mandamentos é tornar o ho-
mem livre dos pecados e levá-lo a se unir mais
perfeitamente a Deus. Para o cristão nada deve
importar mais do que uma vida vivida na graça,
onde se obtém a Vida Eterna pela fé em Cristo e
as obras de caridade que acendem em sua alma
uma fornalha ardente de amor. Portanto, “Em
Cristo Jesus, nem a circuncisão tem valor, nem
a incircuncisão, mas apenas a fé agindo pela ca-
ridade” 59. É o amor que brota de um coração ilu-
minado pela fé que é capaz de se dar aos outros.

62
A característica principal do verdadeiro
amor é a oferta que a pessoa faz se si mesmo ao
outro, buscando o bem não para si próprio, mas
para aquele a quem ama. “A essência própria do
amor é a dedicação, a vontade firme de dar-se
e, se necessário for, de imolar-se totalmente por
Deus e pela sua glória, preferindo o seu agrado
antes do nosso e o das criaturas” 60. A fé impul-
siona o fiel a depositar em Deus sua inteira con-
fiança e o amor a dar-lhe tudo, até mesmo a sua
própria vida para agradar-lhe. Esse é o maior
triunfo que se pode obter sobre o mundo, pois
tudo o que os inimigos da alma mais desejam é
ver-nos perdidos para sempre. Quando a fé e o
amor operam juntos na alma, não há o que te-
mer, a vitória sobre o mal é certa. “Este é o amor
de Deus: observar os seus mandamentos. E os
seus mandamentos não são pesados, pois todo
o que nasceu de Deus vence o mundo. E esta é a
vitória que venceu o mundo: a nossa fé.”61.

Quem tem fé está sempre disposto a abraçar


a vontade de Deus, ainda que ela custe muito.
Esse é um critério importante para conhecer o
tamanho da própria fé, perguntar-se se diante

63
do que Deus revela e pede a cada um, se há uma
correspondência. Quem diz crer, mas não prati-
ca o que crê, não tem fé. Abraão, o pai da fé, deu
um belo testemunho, ao oferecer seu único fi-
lho, concebido já na velhice, em holocausto por
obediência a Deus. Assim, como a Virgem Maria,
que sempre se submeteu em tudo à vontade de
Deus, mesmo quando ela não podia compreen-
der totalmente. Sua oferta foi até a entrega ge-
nerosa de seu filho em sacrifício na cruz. Desse
modo, se considerarmos o exemplo de todos os
santos, será possível perceber que a fé está sem-
pre relacionada profundamente com obras de
amor por Deus e pelo próximo. Como ensina o
Venerável Fulton Sheen: “O único modo de se
demonstrar amor neste mundo é através do sa-
crifício”.

O ato de fé é o meio pelo qual o coração hu-


mano deixa de exigir provas a Deus e acaba por
se conformar ao seu divino querer. Quando
alguém, por exemplo, que ainda esteja na in-
credulidade, mas deseja crer na Eucaristia, se
coloca diante deste augusto mistério e diz ao
Senhor: “Jesus, eu ainda não consigo crer que

64
estás presente neste sacramento, minha razão
jamais compreenderá, pois, tua glória excede a
minha compreensão. Mas diante de tua presen-
ça que me foi anunciada, eu quero crer, quero
crer firmemente que estás presente neste sacra-
mento e que viestes do céu para me alimentar”.
Somente este ato dito do profundo da alma é ca-
paz de dar abertura para que a luz da graça ilu-
mine a alma e predisponha o fiel a abraçar a ver-
dade que Deus revela. Pelo ato de fé, esta mesma
pessoa estará pronta para exercer o amor, prati-
cando o que acabara de professar em sua alma.

PARA REFLETIR:
• A fé é necessária para alcançar de Deus tudo
aquilo que necessitamos. Nossa Senhora foi
cheia de fé, por isso agradou tanto a Deus.
Você tem uma fé profunda e uma grande
confiança em Deus?

• Sem fé é impossível agradar a Deus. A fé


abre os nossos olhos para as realidades es-
pirituais. Você tem pedido a Deus que au-
mente a sua fé?

65
AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, sua fé superou a de
todos os viventes deste mundo. Sempre acredi-
tastes no que Deus vos revelou, abristes a sua in-
teligência para a iluminação divina e colocastes
em prática todos os preceitos dados por Deus.
Quero associar-me a vós e obter de Deus o dom
da fé. Desejo que minha inteligência seja ilumi-
nada e minha vontade atraída ao cumprimen-
to de todos os mandamentos. Roga por mim ao
teu filho Jesus e obtende-me as graças que vos
peço. Amém!

PROPÓSITO
A fé é capaz de mover montanhas, de operar
verdadeiros milagres, porque nos faz entrar em
conformidade com a vontade de Deus. Como é
feliz aquele que vive de fé neste mundo, porque
enxerga realidades que muitos não conseguem
enxergar. Quem tem fé tem olhos de águia. Peça
a Deus que aumente sempre mais a sua fé, que
Ele te conceda uma fé como a da Virgem Maria,
inabalável, forte, decidida.

66
8. OS DEVERES DE
RELIGIÃO QUE AFASTAM
DO MUNDO
O exercício constante das virtudes é o que faz
com que o homem vá pouco a pouco se configu-
rando mais a cristo e consequentemente aban-
donando o mundo, a fim de viver só para Deus.
Enquanto criatura, o ser humano tem o dever
moral de reverenciar a Deus, pois Ele é o prin-
cípio da sua existência, aquele que o sustenta e
o fim para o qual deve tender. Santo Inácio de
Loyola ensina em seus exercícios espirituais:
“O homem é criado para louvar, reverenciar e
servir a Deus Nosso Senhor, e assim salvar a sua
alma. Desse modo, Deus mesmo se incumbiu
de preceituar aos homens o modo como seria
justo que O louvassem. Assim, os três primeiros
mandamentos da lei de Deus são um convite ao
culto de adoração e profunda revência das cria-
turas ao seu Deus.

O amor a Deus a partir da prática dos manda-


mentos segundo a iluminação da fé já fora des-

67
crito no capítulo anterior. Agora é necessário
compreender como se aplicam na vida do fiel
devoto o 2º e 3º Mandamentos da Lei de Deus. O
2º mandamento diz: “Não tomarás o nome do
Senhor teu Deus em vão”. Esse preceito indica
que o homem precisa nutrir por Deus um res-
peito admirável, visto que Ele é o seu Criador. É
por isso que desde o Antigo Testamento, quando
Desde revelou o seu nome a Moisés, o povo não
o pronunciava de qualquer maneira e, quando
murmuravam contra Deus desonrando seu no-
me, eles eram punidos, para que aprendessem a
ter reverência por Aquele a quem deviam a pró-
pria existência. Desse modo, “O segundo man-
damento proíbe o abuso do nome de Deus, isto é,
todo o uso inconveniente do nome de Deus, de
Jesus Cristo, da Virgem Maria e de todos os san-
tos” 62.

Deus merece uma adoração interior e exte-


rior por parte de suas criaturas. Reverenciar seu
nome é reconhecer sua soberania, pois a invo-
cação do nome de Deus tem poder sobre tudo. É
pelo poder do nome de Jesus que muitas curas,
milagres, exorcismos serão realizados pelas

68
mãos dos apóstolos e pela Igreja ao longo dos sé-
culos. Por isso, São Paulo ensina: “Deus sobera-
namente o elevou e lhe conferiu o nome que es-
tá acima de todo nome, a fim de que ao nome de
Jesus todo joelho se dobre nos céus, sobre a ter-
ra e abaixo da terra.” 63. Portanto, o homem “Por
ser mais perfeito que os seres irracionais, ter si-
do criado à imagem e semelhança de Deus, e por
participar da própria vida divina, deve viver em
perpétua admiração, louvor, adoração, gratidão
e amor para com seu Criador e Santificador” 64.
É obrigação moral de todo homem, como um
dever de religião manter em seu coração a cons-
ciência de que deve viver para Deus. Por isso,
o segundo mandamento expressa com clareza
que “O nome do Senhor é Santo; por isso, o ho-
mem não pode abusar dele. Deve guardá-lo na
memória, num silêncio de adoração amorosa. E
não o empregará nas suas próprias palavras se-
não para o bendizer, louvar e glorificar” 65.

Se Deus exige do homem tal reverencia, é pre-


ciso então se perguntar: “de que modo Ele mes-
mo deseja que o homem o adore, e mantenha
para com Ele esses sentimentos? A resposta pa-

69
ra tal questão está contida no 3º Mandamento:
“Lembra que deves santificar o dia do Senhor”.
É guardando um dia especialmente para Deus,
com o intuito de render-lhe o culto devido que
o homem acaba por honrar o seu nome e pres-
tar-lhe a verdadeira adoração. Assim, no Antigo
Testamento, Deus instituiu o sábado como dia
de preceito em que todos deveriam deixar seus
ofícios e consagrar um tempo primordial para o
culto a Deus e o descanso do corpo, à semelhan-
ça do próprio Deus que “abençoou o sétimo dia
e o santificou, pois nele descansou depois de
toda a sua obra de criação” 66. No entanto, com
o advento de Cristo, o sábado deixou de ser o
dia de culto cedendo seu lugar ao domingo. A
Igreja ensina que “O sábado que representava o
término da primeira criação, é substituído pe-
lo domingo, que lembra a criação nova, inaugu-
rada com a Ressurreição de Cristo” 67. Agora, o
homem deve guardar o domingo como Dia do
Senhor, em que faz memória de seu sacrifício
pascal e se rejubila em Deus, porque “Este é o
dia que o Senhor fez, exultemos e alegremo-nos
nele” 68.

70
Desde as primeiras comunidades cristãs, to-
dos se reuniam em torno do altar aos domin-
gos para celebrarem a Eucaristia. Assim, a Santa
Missa passa a ser o centro da vida cristã em to-
das as épocas, de tal modo que aí está o sacrifí-
cio perfeito em que Deus é devidamente adora-
do. “O sacrifício da Missa glorifica a Deus e o faz
de modo perfeito, porque Jesus, por intermédio
do sacerdote, novamente oferece ao Pai todos os
atos de adoração, de ação de graças e amor que
ofereceu outrora ao imolar-se no calvário, atos
estes de valor moral infinito. Ao oferecer-se co-
mo vítima, afirma de modo eloquente o supre-
mo domínio de Deus sobre todas as coisas: esta é
a adoração.” 69. Por isso, Deus merece que os ho-
mens acorram ao menos aos domingos à Santa
Missa e lhe prestem a homenagem justa que é o
sacrifício de seu próprio Filho. Quem não honra
a Deus guardando o domingo peca gravemente.
Mas essa não é uma mera lei formal, é um modo
do homem demonstrar gratidão a Deus. Quem
falta a Santa Missa dominical por qualquer mo-
tivo, desonra a Deus e o despreza com o pior ti-
po de ingratidão.

71
Não há nada tão importante para o cristão do
que assistir a uma Missa com toda piedade que
se requer e ainda comungar com vivo desejo de
se unir a Jesus. Por isso, Santo Afonso recorda
que: “devemos estar certos de que uma pessoa
não pode fazer nem pensar fazer coisa agradá-
vel a Jesus Cristo, do que comungar com as dis-
posições convenientes a tão grande hóspede.”
70
, honram muito a Deus quem comunga todos
os domingos, sempre em estado de graça e com
um ardente desejo de se unir a Jesus Cristo.

Não há remédio tão eficaz para dissipar os


atrativos do mundo do que assistir bem a Santa
Missa, honrando o Santo Nome de Deus e co-
mungando com fé o seu Corpo, Sangue, Alma e
Divindade. Tão bem ensinou São Vicente Ferrer
quando dizia: “Maior proveito se tira da co-
munhão, do que uma semana de jejum a pão e
água”. Portanto, não há nada tão valioso quanto
a Santa Missa para honrar a Deus, pois além de
ser o mais perfeito ato de adoração, a comunhão
é remédio para se livrar das falhas cotidianas e
preservar a alma dos pecados mortais.

72
PARA REFLETIR:
• Deus está à procura de almas adoradoras,
que o adore em espírito e verdade. Ele me-
rece ser amado, adorado e respeitado de
uma maneira sem igual. Você tem honrado
o nome de Deus e buscado a sua glória?

• O maior ato de louvor a Deus é a Santa


Missa. Nada tem maior valor do que o Santo
Sacrifício de Cristo renovado sobre o altar
pelo sacerdote. Você participa da Santa
Missa todos os domingos ou até mais vezes
ao longo da semana?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, a vossa vida sem-
pre foi um culto agradável a Deus. A Ele prestas-
tes reverência e adoração e depois da subida de
vosso Filho ao céu, a Divina Eucaristia era vos-
so único consolo. Dai-me também a graça de
cumprir com fidelidade meus deveres de reli-
gião, honrando o nome santíssimo e poderoso
de Deus e acorrendo a Ele com boas disposições
para tornar a Santa Missa um verdadeiro sacri-
fício de adoração, reparação e amor em minha

73
vida. Minha Boa Mãe, recorra ao seu Filho Jesus
em minha causa. Amém!

PROPÓSITO
Todo o bem da nossa vida está em viver para
amar a Deus e louvá-lo, assim como fez a Virgem
Maria. Quando vivemos assim, todas as coisas to-
mam sentido, desde as nossas relações familia-
res, nosso trabalho e até as coisas mais simples
da vida. Por isso, na Santa Missa levamos nosso
coração a Deus através de seu santo sacrifício e
pedimos graças para poder fazer a vontade de
Deus e amá-lo neste mundo. Nas próximas ve-
zes que você for comungar, peça a Deus um de-
sejo muito profundo da Eucaristia, um fervor de
buscar a sua glória e o perfeito cumprimento de
sua santa vontade.

9. O REMÉDIO CONTRA
OS VÍCIOS DA IMPUREZA
Para levar o homem à perdição, o mundo está
repleto de seduções que desfiguram a imagem
de Deus na alma humana e ferem gravemente a

74
sua dignidade. Entre as obras, tanto do mundo
quanto da carne, estão as atitudes de impureza
que mancham a alma pela deturpação da fina-
lidade que Deus colocou na sexualidade huma-
na. O homem e a mulher foram constituídos por
Deus em um estado original de santidade, no
qual viviam em pureza e harmonia. O homem
segundo o plano de Deus é alguém integrado
em seu corpo e alma, de tal modo que a razão
governa os desejos sensíveis do corpo. Assim, o
ser humano é capaz de enxergar a união entre o
casal e a procriação como as duas finalidades do
sexo vivido dentro do matrimônio. Fora disso,
todo pensamento, desejo ou ato são contrários
à sexualidade humana. Ao explicar sobre a dig-
nidade da pessoa humana, São Paulo exortou os
fiéis: “Não sabeis, porventura, que o vosso corpo
é templo do Espírito Santo, que habita em vós,
que recebestes de Deus, e que não vos perten-
ceis a vós mesmos?” 71.

Desde o Antigo Testamento, Deus preceituou


que o homem buscasse viver na pureza, tanto
de seus atos, quanto de seus pensamentos e de-
sejos. Por isso, nas Tábuas da Lei ordenou o 6º

75
Mandamento: “Não pecar contra a castidade”
e o 9º Mandamento: “Não cobiçar a mulher do
próximo”. Estes dois mandamentos ajudam o
ser humano a compreender que a satisfação de
seus impulsos sexuais não está no sexo desorde-
nado, mas sim na complementariedade e na fi-
delidade que somente o amor entre os esposos
pode proporcionar, porque esse amor está di-
recionado para Deus. Além da sexualidade con-
jugal, a castidade é também a virtude daqueles
que vivem o celibato, seja temporário, seja per-
manente. O corpo do homem e da mulher pos-
suem em si uma expressão clara de uma realida-
de espiritual: a união que se expressa pelo amor,
união esta que será experimentada por todos na
eternidade quando Deus satisfazer todos os de-
sejos humanos por sua posse. Por isso, São Paulo
exorta: “O corpo não é para a imoralidade, mas
para o Senhor, e o Senhor para o corpo” 72.

A virtude da castidade é como uma delicada


rosa branca que precisa ser cultivada com todo
cuidado. Ela possui espinhos que a protegem, é
de uma profunda candura e delicadeza e, por is-
so, precisa ser cuidada para que nada a destrua

76
ou manche sua beleza. Desse modo, é possível
compreender três aspectos da castidade: “Ela
é uma virtude angélica, pois nos assemelha aos
anjos, que são puros por natureza. É uma virtu-
de austera, porque não se consegue praticá-la
sem disciplinar e dominar o próprio corpo e
seus sentidos por meio da mortificação. É uma
virtude delicada, porque não se consegue guar-
dá-la senão lutando com generosidade e cons-
tância contra aquela que é a mais tirânica das
paixões.” 73. Portanto, para que se consiga viver
bem a castidade é necessário recorrer a todos
os meios que proporcione a sua vivência, como
por exemplo, não consentir em qualquer pen-
samento, imaginação, sensação ou ação contrá-
rias a ela, mas afastá-los imediatamente; morti-
ficar os sentidos, mantendo um controle sobre
si pelo autodomínio; fugir das ocasiões de peca-
do; e, sobretudo, nunca confiar em si mesmo.

Além de todos esses meios, nesse combate


o cristão poderá munir-se de uma alta virtude
que o fará abandonar todo gosto pelos prazeres
desordenados e alcançar uma profunda liberda-
de interior, trata-se da virtude da esperança, um

77
grande remédio contra a impureza. Desse mo-
do, é possível compreender que os prazeres da
carne não são capazes de dar ao homem a com-
pleta realização, pois apesar de conceder certo
prazer, eles são passageiros e deixam um arre-
pendimento amargo. Por outro lado, a esperan-
ça infunde santos desejos no coração humano,
sobretudo o de possuir a Deus e o desejo do céu,
substituindo, dessa forma, os desejos carnais e
os apegos a esse mundo. São Paulo fala a comu-
nidade de Éfeso: “Que ele ilumine os olhos dos
vossos corações, para saberdes qual é a esperan-
ça que o seu chamado encerra, qual é a riqueza
da glória da sua herança entre os santos” 74. A sa-
tisfação de todo desejo no céu superará infinita-
mente qualquer prazer que se tenha na terra.

A característica principal que a virtude da


esperança tem em relação ao combate contra a
impureza é que “A esperança sobrenatural sus-
tenta o cristão em meio às dificuldades que se
opõem à sua salvação e perfeição. Tem por ob-
jeto todas as verdades reveladas que dizem res-
peito à vida eterna e aos meios de conquistá-la e,
como se baseia no poder e na bondade de Deus,

78
tem uma firmeza inabalável” 75. Portanto, essa
firmeza que se assenta sobre o abandono à graça
de Deus, é que sustenta o combate cristão. Com
os olhos voltados para as coisas celestes, pouco
a pouco o homem aprende a desapegar-se das
terrestres e os prazeres desordenados vão per-
dendo o gosto. Por isso, os santos fugiam sem-
pre do pecado para se manter na graça de Deus,
pois sabiam que nesta vida tudo é desprezível se
comparado às glórias do céu. Desse modo, eles
esperavam confiantes o cumprimento das pro-
messas divinas de se realizarem plenamente no
céu, a esperança os animava dia e noite, pois “a
esperança não decepciona” 76.

Aquele que emprega os meios corretos no


combate contra a impureza e, sobretudo ali-
menta-se pela oração e possui uma desconfian-
ça de si, alcança de Deus todas as graças sufi-
cientes para sempre triunfar nesse combate.
Firme deve ser a esperança do cristão, pois diz a
Sagrada Escritura: “Sabei que nenhum daqueles
que confiavam no Senhor foi confundido. Pois
quem foi abandonado após ter perseverado em
seus mandamentos? Quem é aquele cuja oração

79
foi desprezada? Pois Deus é cheio de bondade e
de misericórdia” 77. Portanto, a força nesta luta
não se encontra no próprio combatente, mas
em Deus que é a força e vitória dos que Nele es-
peram.

PARA REFLETIR:
• Para manter-se na pureza é necessário pa-
gar um alto preço, o de conhecer e amar a
Deus e buscar forças na sua graça. Você tem
lutado com as forças de Deus para se man-
ter longe da impureza?

• Somos mais fortes quando temos um gran-


de objetivo pelo qual lutar. O céu deve ser
a grande motivação daqueles que querem
viver uma vida de pureza. Você deseja ar-
dentemente o céu, mais do que a satisfação
dos desejos carnais?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, quão formosa sois,
um verdadeiro lírio de pureza virginal. Te con-
servastes pura, integra, imaculada, por amor
a Deus e em respeito ao vosso corpo e alma.

80
Obtende de Jesus graças suficientes para que
eu me mantenha firme neste árduo combate
contra as impurezas. Que meu coração se torne
puro como o vosso e que a candura de minha
alma possa agradar a Deus que é misericórdia.
Amém!

PROPÓSITO
Muitos santos tiveram a coragem de lutar
bravamente para se manterem na pureza, al-
guns chegaram até a ser mártires, como foi
Santa Maria Goretti. A pureza de corpo e alma
é uma joia preciosa que devemos guardar com
todo zelo. É muito importante pedir a Deus o
dom da fortaleza e da esperança nesse combate.
Recorrer a Nossa Senhora também sempre foi
um grande remédio usado pelos santos. Todas
as vezes que você se sentir tentado contra a pu-
reza, invoque Nossa Senhora, peça a ela o dom
da fortaleza e um profundo nojo do pecado.

81
10. O EXERCÍCIO DA
PACIÊNCIA E MANSIDÃO
O mundo é sempre implacável, pronto para
julgar, condenar e aniquilar o próximo com a
maior severidade. Ao mesmo tempo é sempre
indulgente com aqueles que se afeiçoam de to-
do aos seus desejos e sempre andam por suas
perdições. A ira é um grande mal, porque causa
divisões e fere os corações afastando-os da ver-
dade e da bondade. Ela é uma ação demoníaca,
pois não há nenhuma criatura que nutra tan-
to ódio em seu interior quanto os demônios.
Tantas vezes é quase impossível não sentir o
movimento da ira no interior do coração, é co-
mo um fogo que se acende rapidamente e que
se não for devidamente controlado pode tomar
conta por completo do homem. Por isso, São
Paulo recomendava: “Irai-vos, mas não pequeis:
não se ponha o sol sobre a vossa ira, nem deis lu-
gar ao diabo” 78. Aqui, São Paulo alerta que em-
bora possa haver um sentimento de ira no in-
terior de uma pessoa, ela nunca deve consentir
nesse movimento.

82
Para cumprir a justiça e ao mesmo tempo
a bondade, Deus instituiu o 5º Mandamento:
“Não matarás”, este mandamento ajuda o ho-
mem a compreender que não deve ceder aos
movimentos de sua cólera e nem mesmo ferir o
outro, pois a vida é sagrada e somente o Criador
tem poder sobre ela. Assim também, de certa
maneira o 4º Mandamento: “Honrar pai e mãe”
recebe as influências desta doutrina que pede
paciência e mansidão ao fiel, pois assim devem
agir com seus pais e superiores, com extrema
caridade para não os ofender.

Os movimentos sensíveis da ira devem ser


moderados pela virtude da mansidão e da pa-
ciência. O homem que tem domínio de si e sa-
be controlar suas paixões pela ordem da ra-
zão é capaz de praticar essas duas virtudes. São
Francisco de Sales, que pelo temperamento cus-
tou muito a conquistar essas virtudes, ensina a
esse respeito: “Esta miserável vida não passa de
uma jornada para a bem-aventurada; não nos
aborreçamos, pois, nem briguemos uns com os
outros ao longo do caminho; marchemos com
o grupo dos nossos irmãos e companheiros, do-

83
ce, pacífica e amigavelmente, e digo-te com to-
da a clareza e sem exceção alguma: não te irri-
tes nem muito nem pouco, se possível for, e não
admitas nenhum pretexto, qualquer que seja,
para abrir a porta do teu coração à cólera.” 79.
O santo insiste nisso, porque como ensina São
Tiago Apóstolo: “Que cada um esteja pronto pa-
ra ouvir, mas lento para falar e lento para encole-
rizar-se, pois a cólera do homem não é capaz de
cumprir a justiça de Deus” 80. Portanto, mesmo
que o homem queira por sua ira realizar aquilo
que é justo, sempre se excederá e acabará por fa-
zer mais mal do que bem.

Nosso Senhor que tinha todos os motivos pa-


ra irar-se, foi durante toda a vida extremamente
manso e paciente diante das inúmeras ofensas
que recebia. Ele segurou a mão justa do Pai para
que não pesasse sobre a humanidade, por isso
Ele pede aos homens: “Aprendei de mim, por-
que sou manso e humilde de coração” 81. Assim,
é necessário compreender em que consiste es-
sa virtude que torna o homem humilde diante
de Deus e afável com o próximo. “A mansidão é
uma virtude complexa que envolve três elemen-

84
tos principais: 1) certo domínio sobre si mesmo,
que previne e modera os movimentos da ira.
Neste aspecto está relacionada com a temperan-
ça. 2) suportar os defeitos do próximo, que exige
paciência e, portanto, a virtude da fortaleza; 3) o
perdão das injúrias e a benevolência com tosos,
mesmo com os inimigos. Neste aspecto supõe
a caridade.” 82. Essa doutrina traduz-se perfeita-
mente nas palavras de Cristo: “Bem-aventurados
os mansos porque herdarão a terra” 83, possuir a
terra significa em primeiro lugar ter esse com-
pleto domínio de si e depois conquistar os cora-
ções dos demais, pois o homem manso e humil-
de atrai os outros para perto de si.

A Sagrada Escritura permite compreender


que “É no coração dos insensatos que reside a
irritação” 84, ou seja, no coração daqueles que
não deixam guiar pela razão, mas por seus sen-
timentos desordenados é que surge a ira. Desse
modo, fica claro que há uma grande batalha a
ser travada no interior de cada pessoa, uma ba-
talha para dominar-se a si mesmo. No entanto,
é importante assinalar que “Mais vale o homem
lento para a ira do que o herói, e um homem se-

85
nhor de si do que o conquistador de uma cida-
de” 85. Isso manifesta a fortaleza que uma pessoa
precisa ter para conseguir ser manso, ao contrá-
rio do que se pensa, que as pessoas mansas são
as de caráter fraco e covardes. A verdade é que
os mansos e pacientes são pessoas que possuem
tanto domínio de si mesmas e tanta caridade
para com o próximo que não perdem nem por
um momento a paz que possuem na alma.

A mansidão e a paciência são, sem dúvidas,


virtudes muito importantes para aqueles que
querem desapegar-se do mundo e formarem na
alma a imagem de Cristo. “É de paciência que
tendes necessidade, para cumprirdes a vontade
de Deus e alcançardes o que ele prometeu” 86.
Por isso, o cristão precisa sempre se recordar a
necessidade de aprender a padecer as injúrias,
sofrimentos e angústias. Ensina São Francisco
de Sales: “Põe frequentemente os olhos do es-
pírito em Jesus Cristo crucificado, nu, alvejado
com blasfêmias, caluniado, abandonado e fi-
nalmente oprimido e atormentado com toda a
sorte de incômodos, tristeza e trabalhos, e con-
sidera que todos os teus sofrimentos não são

86
de modo algum comparáveis aos seus, nem em
qualidade, nem em quantidade, e que nunca so-
frerás por Ele nada tão custoso e áspero como
Ele sofreu por ti.” 87. Recordar-se do que Cristo
e os santos sofreram é um verdadeiro remédio
para afastar a ira do coração.

PARA REFLETIR:
• Dominar-se a si mesmo não é uma tarefa
fácil, sobretudo quando algo naturalmen-
te nos irrita e tenta tirar a nossa paciência,
mas quando isso acontece você cede facil-
mente ou luta contra esses sentimentos?

• Ninguém gosta de ser tratado com rispidez,


de ser humilhado e incompreendido. Você
age dessa forma com as pessoas ou procura
ser o mais manso possível?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria a mansidão e a pa-
ciência são virtudes explícitas em vossa vida e
na imitação de teu Filho Jesus crescestes nelas
ainda mais. Perante vós eu exponho a minha
incapacidade de dominar meus sentimentos

87
e imitar a Cristo em seus padecimentos. Peço,
por isso, que me socorras como Mãe e me ajude
a conquistar a mansidão, paciência e humilda-
de, para que diante de Deus e dos homens haja
afabilidade em minha alma e doçura em meus
lábios e minhas ações. Assim seja, amém.

PROPÓSITO
Nossa Senhora era adorável, podemos ima-
ginar que todos amavam estar na sua presen-
ça. Assim são as pessoas mansas, pacientes, ca-
ridosas, estão sempre exalando nesse mundo a
bondade de Deus. Ao contrário, as pessoas ran-
corosas e impacientes, cheias de ira afastam as
pessoas de si, porque suas ações refletem mal-
dade. Se proponha a sempre agir com o próxi-
mo com a maior caridade possível, com mansi-
dão no trato e nas palavras, para que as pessoas
possam enxergar em você a bondade e o amor
de Deus.

88
11. A INVEJA
MATA A ALMA
Com tantas seduções que o mundo ofere-
ce, desde a satisfação dos prazeres até a posse
dos bens materiais é fácil com que o homem se
perca e se degenere no vício capital da inveja.
É preciso que o coração esteja atento e direcio-
nado para Cristo, de tal modo que Ele fomente
desejos sinceros de gratidão, alegria e confian-
ça em Deus que é sempre justo para com todos.
Contra o pecado da inveja, Deus estabeleceu
dois mandamentos: o 10º Mandamento: “Não
cobiçarás as coisas alheias” e o 7º Mandamento:
“Não Roubarás”. Esses mandamentos ajudam o
homem a compreender o lugar adequado em
que os bens de todas as espécies devem estar e
se alegrar com o bem do próximo.

A inveja pode ser definida como “uma ten-


dência a entristecer-se com o bem alheio, como
se fosse algo que atingisse a nossa superiorida-
de. Muitas vezes vem acompanhada do desejo
de ver o próximo privado do bem que a provo-
cou.” 88, desse modo, a inveja tende a provocar

89
no coração que o que há de bem na vida de ou-
tra pessoa, na verdade representa um mal para
o invejoso. Se esse movimento da inveja não é
reprimido, muitos pecados podem surgir desse
sentimento. Santo Tomás de Aquino explica que
na inveja “O bem do outro é considerado um
mal pessoal na medida em que diminui nossa
glória e nossa excelência. É assim que a inveja
se entristece com o bem do outro. Eis porque se
inveja sobretudo os bens que comportam a gló-
ria, e nos quais os homens amam ser honrados e
ter fama.” 89. Portanto, a inveja causa no mais ín-
timo da pessoa uma certa angústia, porque ela
não aprendeu a se alegrar com o bem do próxi-
mo, mas sim a ver como uma certa injustiça o
que há de bom na vida alheia.

Este vício capital precisa ser cortado em sua


raiz, pois dele nascem muitos outros males que
colocam em risco a boa convivência entre as
pessoas. Se não for reprimida, ela suscita senti-
mentos de ódio que levam a maledicência, a ca-
lúnia, difamação e surge um desejo de que algo
mal aconteça com o próximo; a inveja também
semeia divisões, causando inimizades e escân-

90
dalos entre as pessoas; ela também impulsiona
a busca desmedida de riquezas e honras, de tal
modo que o trabalho pode se tornar excessivo
ou busca-se meios desonestos de enriquecer;
por fim, a inveja perturba a alma do invejoso,
porque enquanto ele não consegue ultrapassar
o próximo vive em angústia e nunca tem sosse-
go. É para não desenvolver esses males que São
Paulo recomenda: “Não sejamos cobiçosos de
vanglória, provocando-nos uns aos outros e in-
vejando-nos uns aos outros” 90.

A inveja é um pecado profundamente demo-


níaco, a própria escritura o atesta: “Foi pela in-
veja do demônio que a morte entrou no mun-
do” 91. Por possuir essa natureza, a inveja está
muito ligada com o orgulho, visto que o invejo-
so não é humilde o suficiente para reconhecer
o bem que o outro possui sem desejar possuir o
que não lhe pertence. Satanás não soube rego-
zijar-se em Deus, na sua glória e felicidade e por
se dar ao orgulho, também invejou o poder que
pertence unicamente a Deus. Por isso, São Tiago
exorta seus fiéis mostrando qual é a fonte da in-
veja: “Se tendes inveja amarga e preocupações

91
egoísticas no vosso coração, não vos orgulheis
nem mintais contra a verdade, porque esta sa-
bedoria não vem do alto; antes, é terrena, ani-
mal e demoníaca” 92. Portanto, a inveja não leva
o homem à verdade e a bondade, mas deixa-o
cego e insensível diante do outro e, por isso, sua
astúcia é uma sabedoria totalmente contrária
aos desígnios sempre justos de Deus.

Um verdadeiro devoto da Santíssima Virgem


não carrega esses sentimentos em sua alma,
porque vive consciente de que “Onde há inveja
e preocupação egoística, aí estão as desordens
e toda sorte de más ações” 93. Somente um co-
ração que se deixa mover pela caridade é capaz
de abrir-se ao outro e vê-lo não como um adver-
sário, mas como um irmão. Por isso mesmo, a
Palavra de Deus averte que “Um coração pacífi-
co é vida para o corpo, mas a inveja é cárie nos
ossos” 94, ou seja, a inveja corrói o próprio inve-
joso, mas por outro lado a caridade eleva a alma
e a dispõe a desejar somente o que é bom para o
próximo: “A caridade é paciente, prestativa, não
é invejosa, não se ostenta, não se incha de orgu-
lho” 95.

92
São João Crisóstomo ensina como é possível
pela caridade e humildade chegar a ter um co-
ração livre da inveja: “Quereríeis ver Deus glo-
rificado por vós? Pois bem, alegrai-vos com os
progressos do vosso irmão e, assim, será por vós
que Deus é glorificado. Deus será louvado, dir-
-se-á, pelo fato de o seu servo ter sabido vencer a
inveja, pondo a sua alegria nos méritos dos ou-
tros”. A Igreja, em sua doutrina ensina que “O
batizado combate a inveja pela benevolência,
pela humildade e pelo abandono à providência
divina” 96. A benevolência consiste em querer
sempre o bem do outro, em amá-lo por causa
de Jesus Cristo e seguindo sua imitação, querer
que o próximo saiba aproveitar as graças que
Deus lhe concedeu. A humildade consiste em
aceitar de bom grado a própria situação e a do
outro e nunca querer viver em espírito de com-
petição, mas de cooperação com os irmãos. O
abandono à providência divina é a confiança no
Pai que sempre age com justiça, dando a cada fi-
lho aquilo que é necessário, porque Deus é per-
feito, tudo o que Ele faz é bom, Deus nunca erra,
portanto, suas obras são justíssimas. Somente
o coração movido por essas três atitudes é que

93
pode se ver totalmente livre da inveja e em paz
com Deus e com o próximo.

PARA REFLETIR:
• A inveja é um veneno para a alma. A pessoa
que é mais prejudicada por ela é o próprio
invejoso, porque nunca se alegra com nada
e sempre quer o mal do outro. Você é esse
tipo de pessoa?

• Quando alguém consegue algo, você se ale-


gra com essa pessoa, com o seu bem ou se
entristece com o bem do próximo?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, a sua alegria sem-
pre esteve em Deus e em tudo procurastes agra-
dá-lo. Assim, também procuraste sempre o bem
do próximo, desejando que procurassem cum-
prir a justa vontade de Deus. Por vossos méri-
tos, vos peço, ajuda-me a libertar-me do espírito
demoníaco da inveja e abraçar a benevolência,
a humildade e a confiança inabalável na divina
providência. Intercede por mim junto a Jesus e
guarda-me das seduções do mal. Amém!

94
PROPÓSITO
Quanta alegria está presente numa alma li-
vre da inveja. Não existe egoísmo, tristeza, mal-
dade, nem escuridão em um coração assim. Por
isso, devemos sempre lutar contra esse mal que
é uma ação diabólica. Devemos pedir muito a
Nossa Senhora que nos ajude a vencer qualquer
movimento de inveja que surgir em nossa al-
ma. E como um bom propósito de vida, procure
sempre se alegrar pelas conquistas e pelo bem
do próximo.

12. A VERDADE
VOS LIBERTARÁ
O mundo está sob o poder de Satanás e ele é
por excelência o pai da mentira. Todas as obras
dos demônios são envolvidas de mentira, pois
eles não sabem seduzir senão para levar ao erro
e aos piores pecados. A mentira é sempre acom-
panhada de trevas e maldades em vários níveis,
pois somente a verdade é que inclina para o
bem. O homem mentiroso é dissimulado, não
sabe refrear a sua língua e sempre está disposto

95
a acusar, difamar e caluniar, para que assim pos-
sa esconder as suas obras más. O fim da mentira
é a morte, primeiro espiritual e depois de todas
as relações pacíficas entre os homens. Por isso a
Escritura afirma que “O diabo foi homicida des-
de o princípio e não permaneceu na verdade,
porque nele não há verdade: quando ele mente,
fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso e
pai da mentira” 97.

O homem criado a semelhança de Deus sem-


pre aspirou pela verdade, pois ela é o próprio
Deus. Por isso, é doutrina de fé reconhecer que
“O homem tende naturalmente para a verdade.
É obrigado a honrá-la e a testemunhá-la: ‘Em
virtude da sua dignidade, todos os homens,
porque pessoas, [...] são impelidos pela sua pró-
pria natureza e obrigados por exigência moral
a procurar a verdade, em primeiro lugar aquela
que diz respeito à religião. São obrigados tam-
bém a aderir à verdade desde que a conheçam e
a regular toda a sua vida segundo as exigências
da verdade” 98. Portanto, há no coração humano
uma sede pelo conhecimento da verdade, pois
ela dá sentido à sua existência e lhe convida ao

96
agir moral. No entanto, o homem ferido pelo
pecado é inclinado ao mal e, portanto, muitas
vezes cede a mentira. Para conter essa tendên-
cia, o próprio Deus instituiu o 8º Mandamento:
“Não levantarás falso testemunho”, para que o
homem estabeleça sempre relações pautadas
unicamente na verdade.

Quem ama a Jesus Cristo e imita a Santíssima


Virgem Maria precisa conformar sua vida à ver-
dade, de tal modo que todas as suas ações refli-
tam a escolha moral que fizeram, que é o segui-
mento de Jesus Cristo. Jesus, a Verdade Eterna,
não é uma ideia ou filosofia, mas uma pessoa
real que chama a cada homem e mulher a imi-
tar a sua vida. Ele mesmo afirma qual é a sua
missão entre os homens: “Para isso nasci e pa-
ra isto vim ao mundo: para dar testemunho da
verdade. Quem é da verdade escuta minha voz”
99
. A voz de Cristo ecoa nos corações humanos,
mesmo quando não o conhecem pessoalmente.
Santa Edith Stein que foi judia, ateia e, por fim,
cristã, ensina que “Quem busca a verdade busca
Deus sem saber”. Portanto, não é possível bus-
car a verdade e não chegar a encontrar-se com

97
a suprema verdade que é o próprio Deus e a Ele
conformar a vida.

Na vida cristã só deve haver espaço para a


verdade e esta dita e ensinada com caridade.
Santo Tomás de Aquino diz que “Não se opor ao
erro é aprová-lo, não defender a verdade é ne-
gá-la”, isso significa que é preciso estar sempre
ao lado da verdade e defendê-la, mas ao fazer is-
so o cristão nunca pode faltar com a caridade.
Assim, quando uma pessoa cristã ajuda o outro
a enxergar e mudar seus erros, não deve fazê-lo
com humilhações, impaciência ou julgamen-
tos, mas com a caridade de Cristo que impele a
abandonar o erro e abraçar a verdade que liber-
ta. O próprio Jesus assinalou essa realidade ao
dizer: “Conhecereis a verdade, e a verdade vos li-
bertará” 100. Cristo liberta o homem de suas pró-
prias artimanhas e o faz enxergar que somente
a verdade pode lhe trazer a paz de consciência
de que necessita.

A mentira é sempre uma negação da reali-


dade, por isso ela está intimamente associada
com o orgulho. Por outro lado, Santo Tomás en-

98
sina que “Constitui um tipo de ordem especial
o fato de nossas palavras e atos externos esta-
rem em conformidade com a realidade como o
sinal em relação à coisa significada. E a virtude
da verdade tem esta função de aperfeiçoar o ho-
mem no que diz respeito a isso.” 101. A verdade,
portanto, é a conformidade daquilo que está
em nossa mente ou em nosso coração, com a re-
alidade mesma. Quando isso não ocorre, o ho-
mem está sempre propenso a ofender a verda-
de de três modos: pelo juízo temerário que é o
pecado de julgar os outros de maneira precipi-
tada. Quando, mesmo que em segredo se admi-
te como verdadeiro, sem prova suficiente, um
defeito moral do próximo; pela maledicência
que se trata do pecado de falar mal do próximo.
Quando sem motivo objetivamente válido se
revela os defeitos e as faltas de outrem a pesso-
as que os ignoram; e pela calúnia que é o peca-
do de afirmar uma mentira como se fosse uma
verdade a respeito do próximo. Essa afirmação
prejudica a reputação dos outros e dá ocasião a
falsos juízos a seu respeito.

99
O cristão não pode de maneira alguma ter
esses comportamentos em sua vida, por isso,
São Paulo exorta os fiéis ao dizer: “Abandonai a
mentira e falai a verdade cada um ao seu próxi-
mo, porque somos membros uns dos outros” 102.
A mentira fere e tira a harmonia entre os mem-
bros do Corpo Místico de Cristo que é a Igreja.
Pelo contrário, a vida vivida na retidão manifes-
ta o desejo de Deus que não cessa de iluminar as
almas com a graça para que conformem a vida
à verdade. Porque “Deus quer que todos os ho-
mens sejam salvos e cheguem ao conhecimento
da verdade”, ou seja, que venham a conhecê-lo
como Ele mesmo se conhece e também as cria-
turas, a fim de amá-los com o mesmo amor de
Deus. Portanto, somente os que vivem na ver-
dade é que são capazes de amor verdadeiro, e
somente os que amam são capazes de viver na
verdade.

PARA REFLETIR:
• O último passo para viver o desapego do
mundo é viver completamente na verdade,
ou seja, não ter uma vida dupla, mas viver

100
com retidão. Você vive na verdade dando
testemunho de uma vida correta?

• Defender a verdade é muito importante,


mas é sempre necessário fazer isso com
amor. Quando você corrige alguém, faz is-
so com ternura e paciência?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, vossa vida sempre
foi límpida aos olhos de Deus e ninguém podia
acusar-te de nenhum erro, pois sempre confor-
mastes vossa vida ao querer de Deus. Eu, ao con-
trário de vós, muitas vezes dissimulei a verdade
e provoquei divisões, disseminando a mentira
entre os irmãos. Infelizmente, tantas vezes quis
enganar o próprio Deus, afastando-me da ver-
dade e do bem. Mas agora desejo conformar-me
à sua Santa Vontade e abraçar o bem de minha
alma e do próximo. Roga ao Senhor por mim,
para que eu me veja livre de todos os males que
afligem a minha alma. Amém!

PROPÓSITO
A mentira é uma ação própria do diabo, por-

101
que ele é mentiroso e pai da mentira. Nós somos
filhos de Deus e, portanto, precisamos cami-
nhar na verdade. Quem vive na mentira se mos-
tra filho do diabo e não de Deus. A vida de Nossa
Senhora foi sempre reta e verdadeira e, por isso
ela sempre tinha paz e tranquilidade de cons-
ciência. Se não experimentamos esses mesmos
sentimentos, então pode ser que nossa vida não
esteja na mais completa verdade. Se proponha
a não viver mais uma vida dupla e a não mentir
em nenhuma situação, mesmo quando é difícil,
escolha sempre a verdade.

102
PARTE 2

O CONHECIMENTO
DE SI
Vamos agora iniciar os 07 dias de meditação
sobre o conhecimento de si. Estas sete medita-
ções são muito importantes, pois ninguém po-
de crescer espiritualmente se não reconhecer
o terreno do próprio coração. Por isso Santa
Teresa D’Ávila ensina que: “O conhecimento de
si é o pão que se deve comer em todos os manja-
res”, ou seja, não importa o grau de vida espiri-
tual em que a pessoa se encontre, ela sempre vai
precisar aprofundar o conhecimento a respeito
de si mesma. Por isso, vamos rezar, meditar e co-
locar em prática todos os ensinamentos dessa
semana de aprofundamento interior.

103
Para isso, você deve a cada dia rezar as seguin-
tes orações:

LADAINHA DO ESPÍRITO SANTO (P. 275)


LADAINHA DE NOSSA SENHORA (P. 279)
AVE MARIS STELLA (P. 273)

Além disso, deve fazer a meditação do dia e


colocar em prática os conselhos que se encon-
tram ao final de cada meditação.

Que a Santíssima Virgem Maria te ajude a


adentrar o seu interior com a sabedoria e ilumi-
nação do Espírito Santo.

104
1. O RECONHECIMENTO
HUMILDE DA PRÓPRIA
MISÉRIA
O conhecimento de si é um passo decisivo
no progresso espiritual de uma pessoa, sem es-
se exercício ninguém conseguirá chegar ao es-
tado de santidade. No entanto, desde o início é
necessário salientar que este é um processo de
toda a vida, pois o homem só terá uma visão per-
feita de quem ele é, quando estiver no céu uni-
do a Deus e puder contemplar seu ser tal como
o próprio Deus o contempla. Isso ocorre porque
a alma humana é de uma tamanha profundeza
que somente uma iluminação da graça permi-
tiria conhecer a fundo a sua própria existência.
Cristo ilumina as almas, porque ele é “a luz do
mundo” 103. O influxo de sua graça por meio da
fé ilumina a inteligência humana e a torna ca-
paz de conhecer-se, portanto, sem o auxílio da
graça divina ninguém pode ter um real conhe-
cimento de si.

105
O homem precisa, desse modo, de uma pro-
funda humildade para trilhar esse caminho de
conhecimento, porque “Nós não somos capa-
zes de tirar por nós mesmos, como vindo de nós
mesmos, o menor pensamento proveitoso para
a salvação. É preciso uma graça, como para todo
ato sobrenatural” 104. Sobretudo depois do peca-
do original essa graça é de suma importância,
pois a inteligência humana ficou enfraquecida,
reforça esse pensamento o ensinamento de São
Paulo: “Todos pecaram e todos estão privados da
glória de Deus” 105. É necessário que o homem
esteja consciente dessa sua condição e quanto
mais próximo de Deus, mais claro essa realida-
de se tornará para ele. A humildade é, portanto,
o fundamento do conhecimento de si, pois ela
dá a conhecer a realidade mesma em que o ho-
mem se encontra.

Cristo, ao entrar no mundo, faz com que os


soberbos sucumbam em sua soberba, mas aos
humildes ele dá a graça de adquirirem um pro-
fundo conhecimento de si mesmo, a fim de que
conhecendo a miséria em que se encontram,
venham a abandonar-se à misericórdia divina.

106
Ele afirma: “Para um discernimento é que vim a
este mundo: para que os que não veem, vejam,
e os que veem, tornem-se cegos” 106. O orgulho-
so, em sua cegueira, quando se apresenta diante
de Deus, não reconhece sua miséria, mas sim a
do próximo. É o exemplo do fariseu que ora no
templo dizendo: “Ó Deus, eu te dou graças por-
que não sou como o resto dos homens, ladrões,
injustos, adúlteros, nem como este publicano;
jejuo duas vezes por semana, pago o dízimo de
todos os meus rendimentos”107. Essa oração não
é agradável a Deus, porque ela é um louvor a si
mesmo, ou seja, é um ato de vanglória.

O humilde é aquele que se apresenta dian-


te de Deus com o coração despojado de si mes-
mo, porque sabe que diante de Deus não é mais
do que um átomo. A pessoa humilde ora como
o publicano: “Meu Deus, tem piedade de mim,
pecador!108. Este sabe que tudo o que ele é ou
possa vir a ser é fruto da misericórdia que o sus-
tenta. Assim se comportavam os santos, nunca
presumindo que era melhores do que os outros,
pois como ensina a Imitação de Cristo: “Todos
somos fracos, mas a ninguém deves considerar

107
mais fraco que a ti mesmo”. Enquanto se vive
nesta vida, o homem está sempre em perigo de
cair em pecado e perder a sua salvação, por is-
so nunca deve ser presunçoso. Santo Agostinho
ensinava que “Não há falta cometida por outro
homem que não sejamos capazes de cometer
nós mesmos”. Portanto, somente a considera-
ção humilde se si mesmo pode preservar o co-
ração da soberba e favorecer um conhecimento
real das próprias misérias.

Não obstante essa necessidade, deveras o


homem inclina-se sempre a ter de si uma visão
deturpada, colocando-se em uma posição irre-
al, crendo ser bom naquilo que não é. “Somos
naturalmente inclinados a uma falsa estima de
nós mesmos; embora não sejamos mais do que
nada, nos convencemos de que valemos algo
e, sem qualquer fundamento, presumimos em
vão das nossas forças” 109. Em uma determinada
circunstância, São Francisco de Assis viu um cri-
minoso sendo levado à condenação e disse: “Se
este homem tivesse recebido as mesmas graças
que eu, talvez tivesse sido menos infiel que eu,
e se o Senhor tivesse permitido na minha vida

108
as faltas que permitiu na sua, seria eu que esta-
ria no seu lugar hoje”. A consideração do santo
é fruto da experiência da graça que lhe conce-
de enxergar o que ele seria se a misericórdia de
Deus não o sustentasse.

A Igreja não cessa de ensinar que “Quem é


humilde não se admira da sua miséria; ela leva-
-o a ter mais confiança e a manter-se firme na
constância” 110. Para se chegar a essa capacida-
de, que como já ficou claro, não é mérito do ho-
mem, mas graça de Deus, é necessário empregar
o constante exame da própria miséria. O exame
de consciência que o cristão deve realizar dia-
riamente é o principal instrumento para o cres-
cimento no conhecimento de si. É necessário,
ensina o pe. Scupoli: “Aproveitar as próprias
quedas no pecado, para aprofundar a consciên-
cia da tua fraqueza. De fato, é para este fim que
Deus permite essas quedas: para que, guiada pe-
la inspiração de uma luz mais clara, aprendas a
desprezar a ti mesma como um ser limitado, e
como tal desejes ser vista pelos outros. Sem es-
te desprezo, não haverá a desconfiança virtuo-
sa, que tem seu fundamento no conhecimento

109
experimental e na verdadeira humildade.” 111.
Santa Elisabete da Trindade dizia: “Não despre-
zes a tua miséria, porque é sobre ela que Deus
exerce a sua misericórdia”. Portanto, o reconhe-
cimento humilde da própria miséria é o passo
inicial para aqueles que desejam chegar a co-
nhecer quem realmente são, não segundo as su-
as próprias perspectivas, mas segundo o olhar
do próprio Deus.

PARA REFLETIR:
• Você consegue enxergar com facilidade
quando você comete um erro e é humilde
para pedir perdão?

• Diante de um pecado cometido você se de-


sespera porque cria muitas expectativas
sobre o seu comportamento, ou logo se re-
colhe interiormente e num ato de humil-
dade se volta para Deus e lhe pede perdão
com o firme propósito de não mais come-
ter aquela atitude?

110
AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, não houve e nem
haverá no mundo criatura mais humilde do
que vós. Mesmo sem pecado, não vos colocastes
acima de ninguém, mas sempre te contentastes
em ser a humilde serva do Senhor. Ajuda-me a
reconhecer as minhas misérias, a enxergar-me
com os olhos misericordiosos de Deus e a abra-
çar com resignação sua santa vontade, para que
com a alma iluminada pela graça, possa alcan-
çar a verdadeira vida devota. Assim seja, amém!

PROPÓSITO
A Virgem Maria ouve a sua oração nesse mo-
mento e acolhe os seus pedidos. Ela te convida a
imitar a sua maneira humilde de viver, pois ela
sempre se reconhecia como a escrava do Senhor.
Por isso, se proponha a não criar desculpas para
si mesmo quando você cometer um erro, mas
de pedir perdão a Deus e também a quem você
feriu.

111
2. O ESTADO DE
SANTIDADE ORIGINAL
DO SER HUMANO
Deus é a suprema bondade e tudo o que
criou manifesta as suas perfeições, sobretudo o
homem que foi criado à imagem e semelhança
de Deus. O ser humano é a obra prima saída das
mãos de Deus, nele, o Criador reuniu os elemen-
tos de todas as outras criaturas, concedendo-lhe
uma dignidade especial. “O homem é um con-
junto misterioso de corpo e alma, de matéria e
espírito que se unem intimamente para formar
uma única natureza e pessoa. É, por assim dizer,
o ponto de junção, o elo de ligação entre os es-
píritos e os corpos, um compêndio das maravi-
lhas da criação, um pequeno mundo que resu-
me todos os mundos, e manifesta a sabedoria
divina que soube unir duas coisas tão desseme-
lhantes.” 112. Desse modo, o homem é um tipo
de composto de duas realidades naturalmente
antagônicas: a matéria e o espírito.

112
Mas o Criador em sua sabedoria eterna fez
superar os próprios princípios naturais dando
ao homem um estado que naturalmente ele não
teria, de tal modo que desde o primeiro instan-
te de sua existência, Adão e Eva foram constitu-
ídos num estado de santidade e justiça. “Deus,
em sua infinita bondade, ordenou o homem pa-
ra um fim sobrenatural, isto é, para participar
dos bens divinos, que superam de todo a com-
preensão humana”113. Essa condição em que o
homem se encontrava era um estado de perfei-
to equilíbrio em todo seu ser, fruto do dom da
integralidade de que Deus o dotou.

Não obstante, em sua condição natural o ho-


mem estava sujeito à lei da corruptibilidade
material, por ser um organismo vivo, portanto
deveria morrer, mas Deus lhe concedeu o dom
da imortalidade corporal, porque “Deus não fez
a morte nem tem prazer em destruir os viven-
tes”114. A morte, portanto, só surge na história
humana como consequência do pecado: “o salá-
rio do pecado é a morte”115. Ademais, o homem
é um composto de corpo e alma, por isso, as po-

113
tências inferiores do corpo naturalmente exigi-
riam suas necessidades, mas Deus lhe concedeu
o completo domínio de suas paixões. E, por fim,
seu conhecimento deveria ser puramente expe-
rimental e progressivo, mas Deus lhe concedeu
o dom da ciência infusa. Esses são os chamados
dons preternaturais, que são como presentes
que Deus deu ao homem.

Tudo isso, faz entrever o projeto benevolente


de Deus para o homem. Assim “Originalmente,
no primeiro dia da Criação, existia perfeita har-
monia entre Deus e a alma, entre a alma e o cor-
po, entre o corpo do homem e os bens interiores.
Existia harmonia entre Deus e a alma, pois esta
é criada para conhecer a Deus, amá-lo, servi-lo
e, por esse meio obter a vida eterna. O primeiro
homem, que fora criado em “estado de santida-
de e justiça original”, era um contemplativo que
conversava familiarmente com Deus, [...] era à
luz de Deus que ele considerava todas as coisas,
e ele obedecia ao Senhor.”116. Assim, compreen-
de-se que a alma, recebendo o influxo de graça e
conhecimento vindo de Deus, era o instrumen-
to perfeito e mais elevado no ser humano para

114
direcioná-lo na via do bem. É na alma que reside
as perfeições que mais aproximam o ser huma-
no de Deus.

A alma disposta para Deus tinha todos os


meios para governar o corpo para o bem, pois
ela possui inteligência e vontade, ao contrá-
rio do corpo que por si só é uma potência ce-
ga. O homem “é a única criatura sobre a terra
que Deus quis por si mesma; só ele é chamado
a partilhar, pelo conhecimento e pelo amor, a
vida de Deus. Com este fim foi criado, e tal é a
razão fundamental da sua dignidade”117. Ele era
verdadeiramente amigo do Criador, tudo o que
Deus queria era prontamente observado nas
ações e pensamentos humanos. “Desta harmo-
nia superior, derivava aquela que existia entre a
alma e o corpo, feito para servir à alma. Como a
alma estava perfeitamente subordinada a Deus,
ela tinha o domínio sobre seu corpo; as paixões
ou movimentos da sensibilidade seguiam do-
cilmente a direção da reta razão iluminada pela
fé e o impulso da vontade vivificada pela cari-
dade.”118. Essa hierarquia de Deus para a alma
e da alma para o corpo garantia que o homem

115
tivesse um coração verdadeiramente livre, sem
apegos a nenhuma coisa criada.

A desobediência de Adão e Eva pôs tudo a


perder. Quando desobedeceram a Deus a morte
passou a reinar sobre o homem, mas Cristo Jesus
por sua extrema obediência ao Pai foi capaz de
vencer a morte, como nos atesta São Paulo: “Pela
falta de um só a morte imperou através deste
único homem, muito mais os que recebem a
abundância da graça e do dom da justiça reina-
rão na vida por meio de um só, Jesus Cristo”119.
Pelo Mistério da paixão, morte e ressurreição,
Cristo não simplesmente venceu a morte bioló-
gica, mas a eterna, e não simplesmente deu ao
homem a possibilidade de ter novamente suas
paixões reordenadas, mas elevadas a um grau
sobrenatural e, assim pudessem também expe-
rimentar a própria vida divina no Céu. “Deus,
que é rico em misericórdia, impulsionado pelo
grande amor com que nos amou, deu-nos a vi-
da juntamente com Cristo”120. Quão bela pode
tornar-se uma alma com os efeitos da redenção
operada por Cristo. Os santos superam larga-
mente o estado de santidade original concedi-

116
do a Adão e Eva, porque eles podem aumentar
sempre mais o grau de caridade por Cristo e as-
sim, também viverem uma imensa alegria no
céu. Por isso, tão belamente se canta na Vigília
Pascal: “O felix culpa, quae talem ac tantum ha-
bere meruit Redemptorem” (Oh, feliz culpa que
mereceu tal e tão grande redentor).

PARA REFLETIR:
• Imagine o quanto era maravilhosa a vida
de Adão e Eva, sem angústias, tristezas, pre-
ocupações, exatamente porque eles não ti-
nham pecado. Você já pensou nisso?

• Nós fomos criados para viver nessa amiza-


de maravilhosa com Deus, mas só podem
experimentá-la em vive na graça. Em que
estado está a sua alma?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, vossa alma é o jar-
dim de Deus. Adão e Eva rejeitaram a presença
do Criador, vós pelo contrário acolhestes o pró-
prio Deus em vosso ventre. Amastes o Senhor e
de tal modo que em vossa vida resplandecia a
harmonia perfeita desejada por Deus. Intercede

117
por mim, minha Mãe, pois quero abrir-me à
graça para restaurar a ordem em minha vida e
entregar-me todo a Deus. Que as vossas graças
sejam abundantes em minha alma para todo
sempre. Amém!

PROPÓSITO
A alma de Nossa Senhora é o jardim das delí-
cias de Deus. Quanta paz, amor, alegria, sereni-
dade presente em seu coração. Ela também quer
trazer tudo isso para sua vida. Neste dia repita
muitas vezes a seguinte jaculatória de Santo
Afonso: “Ó Maria Minha Mãe, obtende-me a gra-
ça de amar o meu Deus!”.

3. GRAÇA SANTIFICANTE:
A PARTICIPAÇÃO NA
VIDA DIVINA
Desde que o pecado passou a fazer parte da
história humana, nenhum sacrifício foi capaz
de regenerar o estado de santidade original do
homem. Todos os holocaustos oferecidos no

118
Antigo Testamento não tiveram nenhum outro
fim, senão apontar para o sumo e eterno sacri-
fício que Cristo operou na Cruz. A eterna se-
paração que existia entre Deus e o homem foi
vencida por Cristo, primeiro ao se fazer homem
e plenamente ao realizar seu Mistério Pascal.
Jesus foi o único capaz de “Criar em si mesmo
um só Homem Novo, estabelecendo a paz, e de
reconciliar a ambos com Deus em um só Corpo,
por meio da cruz, na qual ele matou a inimiza-
de”121. Agora, graças ao mérito de Cristo, toda
pessoa que recebe o batismo tem a infusão da
graça santificante em sua alma e se encontra
num estado de união real com Deus e, as pala-
vras de São Paulo reverberam com o mais pleno
sentido: “Onde abundou o pecado, superabun-
dou a graça”122.

A graça santificante é a mais importante de


todas as graças, porque ela é permanente na al-
ma de um fiel que não cometeu nenhum peca-
do mortal. Ela não é uma graça transitória como
as graças atuais. Portanto, “A graça santificante
é um dom habitual, uma disposição estável e
sobrenatural, que aperfeiçoa a alma, para a tor-

119
nar capaz de viver com Deus e de agir por seu
amor.”122. Essa graça dá ao homem uma partici-
pação na própria vida de Deus e o predispõe pa-
ra agir de maneira sobrenatural, mas além dis-
so, “se tivéssemos um profundo conhecimento
do estado de graça, veríamos que ele não é ape-
nas o princípio de uma vida interior muito san-
ta, mas é também o germe da vida eterna”124. O
cristão é chamado a aumentar sempre mais a
graça santificante nessa vida por meio do exer-
cício das virtudes para que ela desabroche ple-
namente na eternidade.

O que ocorre é que a graça santificante pro-


voca uma verdadeira transformação na alma do
batizado, ela forma em seu interior uma espé-
cie de organismo espiritual que o torna capaz
de corresponder a Deus de modo sobrenatu-
ral. “A graça santificante é um dom divino, uma
qualidade sobrenatural infundida por Deus em
nossa alma que nos dá uma participação física e
formal da mesma natureza divina fazendo-nos
semelhantes a Ele em sua própria razão de dei-
dade”125. É como se Deus permitisse aos homens
que se tornassem “deuses”, obviamente não por

120
natureza, mas por participarem da natureza de
Deus. Por isso, Santo Tomás de Aquino ensina
que: “O mínimo grau de graça santificante va-
le mais que o bem natural do universo inteiro”.
Deus mesmo passa a habitar na alma em esta-
do de graça e dá ao homem essa participação
em sua própria vida divina. “Nos foram dadas
as preciosas e grandíssimas promessas, a fim de
que assim vos tornásseis participantes da natu-
reza divina, depois de vos libertardes da corrup-
ção que prevalece no mundo como resultado da
concupiscência”126.

O cristão deve fazer todo esforço possível pa-


ra manter-se nesse estado sublime de pureza da
alma, pois o pecado mortal mata o organismo
espiritual e, por assim dizer torna estéreis todas
as obras do homem. Cristo deixou isso explícito
em seu ensinamento: “Como o ramo não pode
dar fruto por si mesmo, se não permanece na vi-
deira, assim também vós, se não permanecerdes
em mim”127. Se o homem desgraçadamente per-
de o estado de graça que lhe foi concedido na
fonte batismal, somente o sacramento da con-
fissão poderá lhe recobrar o estado de pureza

121
da alma. O sacramento da confissão sempre foi
chamado pela Igreja de sacramento de mortos,
pois sua função é vivificar as almas que abraça-
ram a morte com o pecado. Portanto, depois do
batismo ele é a segunda tábua de salvação. O es-
tado de graça é como que o céu por antecipação
e sem ele é impossível obter a vida eterna, pois
“Quem não nascer da água e do Espírito não po-
de entrar no Reino de Deus”128.

Essa graça é extremamente importante, ela


já é o princípio da vida eterna, assim como ensi-
nava Santa Elisabete da Trindade: “esta vida é a
eternidade começada e sempre em crescimen-
to”129. A graça santificante, santifica essencial-
mente a quem a recebe; de modo que, entre a
criança recém batizada e o maior santo do Céu
há apenas uma diferença acidental - diferença
de grau-, mas não essencial em relação à santi-
dade propriamente dita.” 130. O fiel precisa de-
senvolver progressivamente essa graça, a fim
de que chegue a ser um Alter Christus, um outro
Cristo, de tal modo que possa se expressar com
São Paulo: “Já não sou eu que vivo, mas é Cristo
que vive em mim”131. A alma em estado de graça

122
é o bem mais precioso, é o jardim de Deus, onde
ele passeia e onde é possível que a criatura se en-
tretenha em diálogo íntimo com seu Amado.

De todas as criaturas, nenhuma jamais será


capaz de ser tão íntima de Deus, quanto a Virgem
Maria. Ela foi preservada de todo pecado em vista
dos méritos de Cristo, portanto, sua alma trans-
bordava de graças. “Maria, já assim preparada
para o seu destino como Mãe de Deus e Mãe de
todos os homens, não devia ser menos perfeita
que Eva desde a sua criação. Ainda que ela não
tenha recebido em seu corpo os privilégios da
impassibilidade e da imortalidade, tinha em sua
alma tudo o que pertencia espiritualmente ao
estado de justiça original e ainda mais, porque
nela a plenitude inicial de graça excedia mesmo
a graça final de todos os santos reunidos; suas
virtudes iniciais ultrapassavam, portanto, as
virtudes heroicas dos maiores santos.” 132. À se-
melhança da Santíssima Virgem, Deus deseja
operar nas almas uma profunda transformação,
levando-as a santidade e fazendo com que cres-
çam sempre mais no grau de caridade para au-
mentar também seu grau de glória.

123
PARA REFLETIR:
• Que maravilha é possuir a graça santifi-
cante, porque é o céu já aqui, presente em
nossa alma. Você já parou para pensar no
quanto é grandioso esse privilégio de viver
na graça?

• Para conservar a graça santificante em nos-


sa alma é necessário tomar muito cuidado
para não se cometer pecados mortais. Você
sempre foge das situações que te colocam
em perigo de pecar?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, eu nasci pecador
e inclinado ao mal, mas vós fostes sempre de
Deus. Em vossa alma nunca se encontrou o me-
nor defeito, pois sua consciência estava avivada
do valor da graça que Deus depositou em sua
alma. Ajuda-me a não desprezar a graça, de pre-
servar o estado de pureza da alma e crescer na
virtude da caridade, para que aumente sempre
mais o meu grau de glória no Céu. Amém!

124
PROPÓSITO
Os Santos intercedem por você diante de
Deus e pedem forças para que você viva perfeita-
mente na graça. Eles sabem, assim como Nossa
Senhora, o quanto o menor pecado é uma ofen-
sa contra Deus, por isso fugiam de todas as oca-
siões que lhes pudesse levar a pecar. Hoje você
também precisa tomar essa decisão. Sempre fu-
ja de todas as ocasiões de pecado, mesmo aque-
las situações que pareçam inofensivas. Assim
você conseguirá manter a sua alma sempre em
estado de graça.

4. O PECADO MORTAL
E SEUS EFEITOS
O discernimento a respeito do pecado se
coloca como um ponto crucial no caminho do
cristão que deseja se conhecer verdadeiramen-
te. Saber em que estado a alma se encontra é
fundamental para tomar as decisões mais fun-
damentais no que diz respeito a vida espiritual.
Não obstante, nos tempos modernos o pecado
tornou-se tão comum que o homem já não en-

125
xerga mais a sua malícia e, portanto, sua vida
moral e espiritual vai de mal a pior. No entan-
to, quando não há uma consciência bem forma-
da a respeito do pecado ou quando se ignora a
sua gravidade, se expõe a alma a sérios riscos.
Muitas vezes “Tal caminho parece reto para al-
guém, mas afinal é o caminho da morte” 133. O
pecado mortal mata o organismo espiritual da
alma cristã que foi gerado no batismo. Santo
Tomás define o pecado grave como “um ato pe-
lo qual nos afastamos de Deus, nosso fim últi-
mo, apegando-nos livre e desordenadamente a
algum bem criado”.

O pecado é sempre um ato de rejeição, de


injúria contra Deus. Pelo pecado o homem des-
preza a sabedoria do Altíssimo para fazer a sua
vontade egoísta. Apesar de atualmente muitos
desconsiderarem a gravidade do pecado mor-
tal, São João Paulo II manifesta claramente qual
a natureza dessa espécie de pecado: “Com toda
a tradição da Igreja, chamamos pecado mortal
a este ato, pelo qual o homem, com liberdade e
advertência rejeita Deus, a sua lei, a aliança de
amor que Deus lhe propõe, preferindo voltar-se

126
para si mesmo, para qualquer realidade criada
e finita, para algo contrário ao querer divino.”
134
. O pecado mortal é a resposta negativa do ho-
mem, à semelhança de Lúcifer, quando declara
imperiosamente: “Não servirei!” 135.

Santo Afonso ensina que o pecado mortal é


um ato de desprezo total de Deus, de tal manei-
ra que “Sempre que o pecador se põe a deliberar
se deve ou não consentir ao pecado, toma, por
assim dizer, a balança em suas mãos, e se põe a
considerar o que pesa mais: se a graça de Deus,
ou aquele ímpeto de ira, aquela vaidade, aquele
prazer. E quando, pois, dá o consentimento, de-
clara, então, que para si vale mais aquele ímpe-
to de ira, aquele prazer, que a amizade divina.”
136
. O pecado mortal é muito grave porque fere
diretamente a Deus, mas apenas um coração
contrito e humilde é capaz de reconhecer: “Nós
pecamos, cometemos iniquidades, agimos im-
piamente e rebelamo-nos, afastando-nos dos
teus mandamentos e normas.” 137. No mundo
tudo é uma trivialidade se comparado com a
gravidade de um único pecado mortal.

127
Uma alma em estado de pecado mortal é co-
mo um cadáver que se encontra em seu pior es-
tado de putrefação, cheio de larvas que o conso-
mem, com um odor insuportavelmente fétido.
Nenhuma pessoa suportaria ficar ao lado de
alguém em pecado mortal se fosse possível en-
xergar com clareza o estado de sua alma. Santa
Tereza a quem foi dada a graça de conhecer a si-
tuação de uma alma em pecado mortal, diz que
“Não há treva tão tenebrosa, nem coisa tão es-
cura e negra que se lhe compare. [...] Conheço
uma pessoa (a própria santa) a quem Nosso
Senhor quis mostrar como fica uma alma quan-
do comete um pecado mortal. Diz ela que, se se
entendesse o que significa isso, ninguém seria
capaz de pecar, ainda que tivesse de submeter-
-se aos maiores sofrimentos para fugir das ocasi-
ões.” 138. O homem é uma pobre e frágil criatura,
portanto, deveria temer ofender a Deus dessa
forma. No entanto, mesmo sendo “um verme
miserável que nada pode, um cego que nada sa-
be ver, pobre e nu que nada possui. E este verme
miserável deseja injuriar a Deus!” 139.

128
O discernimento a respeito do pecado mor-
tal, a fim de distingui-lo do pecado venial con-
siste em três condições: “É pecado mortal aque-
le que tem por objeto uma matéria grave e que,
conjuntamente, é cometido com plena adver-
tência e consentimento deliberado”140. Matéria
grave é todo ato que contraria objetivamente
um dos 10 mandamentos. Portanto, o que dis-
tingue o que é ou não um pecado grave não é a
mera opinião pessoal, mas as condições objeti-
vas que Deus coloca. Infringir um dos manda-
mentos significa agir contrariamente a lei que
Deus mesmo estabeleceu. A plena advertência
ou consciência plena, é a própria voz da cons-
ciência que alerta o homem a evitar o pecado
e fazer o bem. Quando se sabe que algo é peca-
do, mas mesmo assim, o homem quer cometer
aquela infração, então peca-se mortalmente. Por
fim, o consentimento deliberado e a vontade li-
vre que realiza o pecado, seja em pensamento,
palavras, atos ou omissões sem a coação de nin-
guém.

129
Diante de um sério exame de consciência
é preciso se perguntar se as atitudes tomadas
envolvem essas três categorias: matéria grave,
consciência plena e vontade deliberada. Se for
constatado um pecado mortal, é necessário re-
correr o quanto antes ao sacramento da con-
fissão. Porque “Bem sabe o pecador que Deus
não pode achar-Se com o pecado. Bem vê que,
pecando, deve Deus partir. Por isso, Lhe diz: ‘Já
que não podeis manter-vos com meu pecado e
deveis partir, boa viagem’. E, expulsando Deus
da alma, faz com que entre, imediatamente,
o demônio a tomar posse. Por aquela mesma
porta por onde sai Deus, entra o inimigo.”141. A
pessoa que vive em pecado mortal é escrava de
Satanás e não se deixa mover pela graça. Ao con-
trário, “Quem guarda o mandamento guarda a
vida, quem despreza os seus caminhos morre-
rá”142. Não uma morte meramente biológica,
mas uma morte eterna. É necessário, portanto,
confiar que “O sangue de Jesus nos purifica de
todo pecado” 143, pois sem o auxílio da graça na-
da o homem pode.

130
PARA REFLETIR:
• Viver em pecado mortal é a mesma coisa
que adiantar a condenação eterna. Você
quer ir para inferno, ou quer fazer todo o
esforço necessário para ir para o céu?

• São Domingos Sávio dizia: “Antes morrer


do que pecar!”, você também tem essa ra-
dicalidade na sua vida, lutando ferozmen-
te contra todo tipo de pecado ou é indul-
gente consigo mesmo?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, quanta formosura
há em vossa alma, toda adornada de virtudes,
tão cheia de luzes espirituais. Vossa vida agradá-
vel, Senhora, é a maravilha de Deus. Mas eu sou
realmente um verme, um nada que é incapaz de
fazer um único ato de bondade pelas próprias
forças. Sem o auxílio da misericórdia divina es-
tarei sempre perdido, por isso recorro a vós, não
permitais que eu cometa nenhum pecado mor-
tal, porque não desejo separar-me eternamente
de Deus. Roga por mim e fortaleça a minha hu-
mildade e fé. Amém!

131
PROPÓSITO
É necessário sempre examinar a própria
consciência para manter-se na graça de Deus e
assim possuir um real conhecimento do estado
em que se encontra a alma. Hoje, faça um exa-
me de consciência baseado nos 10 mandamen-
tos da Lei de Deus e veja se você não cometeu
nenhum pecado contra um dos mandamentos.
Se você perceber que há algum pecado mortal
em sua alma, procure um sacerdote o quanto
antes e faça uma boa confissão.

5. AS TRÊS IDADES DA
VIDA ESPIRITUAL
A santidade é o principal fim de toda a vida
Cristã, foi precisamente para isso que Cristo se
encarnou e ofereceu seu sacrifício ao Eterno Pai,
para que os homens chegassem a máxima união
com Deus. Por isso a Igreja declarou solenemen-
te no Concílio Vaticano II a santidade universal:
“Munidos de tantos e tão grandes meios de sal-
vação, todos os fiéis, seja qual for a sua condição
ou estado, são chamados pelo Senhor à perfeição

132
do Pai, cada um por seu caminho.”144. Esta dou-
trina já era ensinada por São Francisco de Sales:
“É um erro, ou por melhor dizer, heresia, querer
banir a vida devota dos quartéis dos soldados,
das oficinas dos artistas, da corte dos príncipes,
do lar dos casados”145, ou seja, em qualquer esta-
do é possível viver a santidade. Esse é o desejo e
ensinamento do próprio Jesus: “Deveis ser per-
feitos como o vosso Pai celeste é perfeito”146.

Não obstante, a santificação é um processo


gradual e progressivo que foi distinguido pe-
los mestres espirituais em três fases: a fase dos
iniciantes, chamada de via purgativa; a fase dos
avançados, chamada de via iluminativa; e a fase
dos perfeitos, chamada de via unitiva. Mas des-
de o princípio é necessário salientar que não são
“três vias divergentes ou paralelas, mas sim de
três fases distintas ao longo do mesmo caminho,
ou seja, três degraus principais da vida espiritu-
al percorridos pelas almas que generosamente
correspondem à graça de Deus.”147. Essas três
fases devem conduzir a alma primeiramente à
purificação do pecado e de seus afetos, depois
a pratica mais constante da virtude e, por fim, a

133
paz e contentamento unicamente em Deus pela
união transformante.

A VIA PURGATIVA: Esta fase da vida espi-


ritual, própria dos principiantes, consiste na
purificação do pecado mortal, dos pecados ve-
niais e dos afetos que se tem pelo pecado. Desse
modo, os grandes mestres da vida espiritual
ensinam que esta fase diz respeito a purifica-
ção dos sentidos. Para melhor compreensão,
Santa Teresa D’Ávila distinguiu as três fases em
sete moradas, assim as três primeiras moradas
correspondem a via purgativa. Nas primeiras
moradas encontram-se as pessoas que abando-
naram o pecado mortal através do sacramento
da confissão e começaram a ter uma vida espiri-
tual, mesmo que simplória. A santa explica que
“Os primeiros aposentos ainda abrigam pessoas
muito absorvidas pelo mundo, engolfadas nos
contentamentos e desvanecidas com as honras
e pretensões. Assim sendo, não têm força os vas-
salos da alma que são os sentidos e faculdades
naturais que Deus lhe deu -, sendo essas almas
facilmente vencidas, embora nutram desejos de
não ofender a Deus e façam boas obras.” 148. Aqui

134
se encontram as pessoas que estão em estado de
graça e que fazem algumas orações vocais, mas
ainda com muitas dificuldades. Embora este-
jam em um estado sublime porque recobraram
a graça santificante, devido as paixões desorde-
nadas, são incapazes de contemplar a beleza da
alma.

Nas segundas moradas, a pessoa já possui uma


determinação maior de viver a vida espiritual.
Neste ponto, a alma procura vencer os pecados
veniais deliberados e começa a se exercitar na
oração de meditação. “As segundas moradas são
os aposentos dos que já começaram a ter oração
e entenderam a grande importância de não per-
manecer nas primeiras moradas, mas que, em
geral, não têm ainda determinação para deixar
de estar nelas, porque não abandonam as ocasi-
ões”149. O problema dos que estão nas segundas
moradas é que embora comecem a ter uma vida
espiritual mais sólida, ainda vivem desejosos de
voltar para a vida mundana. Suas ações estão em
Deus, mas seu coração ainda está distante dos
sentimentos de Cristo.

135
Nas terceiras moradas encontram-se almas
bastante generosas, Santa Teresa explica que
“Elas têm grande desejo de não ofender Sua
Majestade e apreciam fazer penitência, evitan-
do até mesmo os pecados veniais. Têm seus mo-
mentos de recolhimento e empregam bem o
tempo, exercitando-se em obras de caridade pa-
ra com o próximo. Essas almas são corretíssimas
no falar e no vestir, bem como na administra-
ção da casa, quando a têm.”150. Nestas moradas,
há uma grande luta para reordenar as paixões
sensíveis do corpo e da alma para Deus. Os pe-
cados reforçam a concupiscência e essas marcas
presentes nos sentidos são difíceis de retirar, so-
mente com muita oração e mortificações será
possível superar essa fase.

São João da Cruz, descrevendo a noite dos


sentidos, mostra que Deus procura conduzir
a alma para que cresça no amor. Por causa dos
exercícios espirituais empregados nesta primei-
ra fase a alma abandona o mundo, mas se agarra
as consolações da vida espiritual. Ensina o santo
que essas almas “Já percorreram, durante algum
tempo, o caminho da virtude, perseverando em

136
meditação e oração; pelo sabor e gosto que aí
achavam, aos poucos se foram desapegando das
coisas do mundo e adquiriram algumas forças
espirituais em Deus. Deste modo, conseguiram
refrear algum tanto os apetites naturais, e estão
dispostos a sofrer por Deus um pouco de tra-
balho e secura sem volver atrás, para o tempo
mais feliz. Estando, pois, estes principiantes no
meio das melhores consolações em seus exercí-
cios espirituais, e quando lhes parece que o sol
dos diversos favores os ilumina mais brilhante-
mente, Deus lhes obscurece toda esta luz inte-
rior.”151. Nesse momento, a alma precisa dar um
novo passo para progredir, experimentando a
obscuridade interior provocada por Deus ela
deve entrar agora na via iluminativa.

A VIA ILUMINATIVA: Nesta fase da vida espi-


ritual as almas avançam na forma como rezam,
Deus as ilumina com o dom da fé lhes dando
mais clareza a respeito do caminho espiritual e,
assim, a alma também vê com mais nitidez a ne-
cessidade de uma segunda purificação, a do es-
pírito. Santa Teresa apresenta a via iluminativa
como sendo as quartas e quintas moradas, nes-

137
ta etapa, “O bom Deus conquista a nossa inteli-
gência, e a esclarece como só Ele o pode fazer;
Ele torna essa faculdade superior cada vez mais
dócil a Suas inspirações para que ela apreendes-
se a verdade divina. Ele submete, assim, nossa
inteligência, vivificando-a.”152. Aqui à semelhan-
ça de um fogo que purifica o ferro de sua ferru-
gem, o amor de Deus penetra a alma e a purifica
de um modo todo espiritual. Deus a faz progre-
dir nas formas de oração para que se contente
unicamente com ele, de tal modo, que seu amor
seja unicamente por Deus em si mesmo.

Os avançados na vida espiritual devem dedi-


car-se mais a oração afetiva para adquirir conhe-
cimento, amor e imitar mais perfeitamente a vi-
da de Jesus Cristo. São João da Cruz mostra que
“Esta inflamação de amor está agora no espírito,
onde, em meio de obscuras angústias, a alma se
sente ferida, viva e agudamente, com certo sen-
timento e conjetura de que Deus ali está, embo-
ra não compreenda coisa determinada; porque,
conforme dissemos, o entendimento está às
escuras.”153. Progredindo também nas virtudes
morais e teologais, experimentando-as de um

138
modo sobrenatural, as almas desta etapa colo-
carão em prática o ensino de São Paulo: “Tende
em vós o mesmo sentimento de Cristo Jesus”154.
Quando sua inteligência está avivada de muitas
luzes espirituais, pelos dons da inteligência e da
sabedoria, a alma passa pela purificação passiva
do espírito e esse momento marca a passagem
da via iluminativa para a via unitiva.

A VIA UNITIVA: Nesta fase se encontram os


perfeitos que entraram nela pela purificação da
noite do espírito, pois nesta fornalha do amor
divino “se purifica a alma como o ouro no cri-
sol”155. Esta etapa corresponde às sextas e séti-
mas moradas do castelo interior de Santa Teresa.
Os perfeitos podem estar em diversos graus de
contemplação infusa, de tal modo que cheguem
até a união transformante. Quando atingem es-
te máximo grau podem afirmar com São Paulo:
“Eu vivo, mas já não sou eu; é Cristo que vive em
mim”156. O fim da via unitiva é levar a alma ao
matrimônio espiritual. Por meio da noite do
espírito, diz São João da Cruz que Deus mesmo
junta “Amado com amada. Amada já no Amado
transformada.”157

139
As principais características das almas perfei-
tas da via unitiva é que elas têm “O pensamento
sempre em Deus, ama-O constantemente, não
mais apenas fugindo do pecado ou imitando as
virtudes de Nosso Senhor. É o puro amor a Deus
e às almas em Deus; é o zelo apostólico, mais ar-
dente do que nunca, mas humilde, paciente e
suave. Verdadeiramente, este é o amar a Deus,
não apenas “de todo o coração, de toda a alma,
de todas as forças”, mas “de todo espirito”, pois o
perfeito não se eleva apenas de vez em quando
àquela região superior de si mesmo; ao contrá-
rio, ele está estabelecido nela; está espirituali-
zado, sobrenaturalizado, tornou-se realmente
‘um adorador em espírito e em verdade’.”158. O
matrimônio espiritual é verdadeiramente um
céu na terra, onde Deus é a única coisa em que a
alma realmente se detém.

PARA REFLETIR:
• A oração é fundamental para o progresso
nas virtudes e o crescimento espiritual.
Você tem sido generoso e feito orações de
qualidade e com bastante frequência?

140
• Também as mortificações nos ajudam no
desenvolvimento espiritual, por isso as pe-
nitências sempre estiveram presente na vi-
da dos santos. Você também pratica peni-
tências?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, vossa alma sempre
foi repleta de graças e vossa união com Deus tão
profunda, que mesmo os maiores santos não
chegam ao mínimo de caridade que existia em
vosso coração. Imitando vossas virtudes, desejo
me dar a Deus com generosidade, para que mi-
nhas faculdades sensíveis, minha inteligência
e vontade estejam totalmente ordenadas para
Ele. Socorre-me com vossas preces em cada eta-
pa de minha configuração com Cristo. Assim eu
me confio a vós, minha doce Mãe. Amém!

PROPÓSITO
A Virgem Maria sempre foi muito genero-
sa para com Deus em sua vida espiritual. Ela
nunca colocou obstáculos para a ação da graça
e, por isso, correspondia a todos os apelos de

141
Deus. Seríamos muito mais maduros espiritual-
mente se fôssemos como Nossa Senhora. Pense
em quantos anos você já perdeu por não levar a
sério a vida espiritual, no quanto você poderia
ser uma pessoa mais forte, com mais fé, mais pa-
ciente, mais realizada se tivesse abraçado com
fidelidade a vida espiritual. Agora faça um pro-
pósito de não mais perder tempo e viver com
generosidade a vontade de Deus.

6. TRÊS BLOQUEIOS
QUE IMPEDEM A CURA
DA ALMA
O surgimento do pecado feriu gravemente a
natureza humana, de tal modo que seu coração
está sempre acorrentado a alguma coisa que não
seja Deus e, por isso, sua liberdade interior está
quase sempre comprometida. Para se chegar a
dar passos largos no caminho de santidade des-
crito no capítulo anterior, é necessário abrir-se
à graça, pois o processo de santificação não é um
esforço meramente humano, mas uma ação so-

142
brenatural de Deus na alma. O cristão deve con-
siderar que para Cristo seja formado em sua vi-
da, é preciso morrer dia após dia para a própria
vontade e dar lugar à vontade divina. “Prostro-
me diante de minha miséria e, reconhecendo
minha absoluta pobreza, apresento-a diante da
misericórdia de meu Divino Mestre. [...] Ponho
a felicidade de minha alma em tudo quanto po-
de imolar-me, destruir-me, rebaixar-me porque
quero dar lugar ao meu mestre.” 159. Este desejo
de Santa Elisabete da Trindade encerra perfeita-
mente qual deve ser a atitude do homem peran-
te a infinita misericórdia de Deus.

O primeiro bloqueio que se opõe à graça é a


falta de arrependimento. O homem é necessita-
do dos auxílios divinos para poder se elevar de
sua condição, mas isso supõe que ele reconhe-
ça suas faltas e implore a misericórdia de Deus.
Portanto, o arrependimento nasce da humilda-
de do coração de quem se reconhece necessi-
tado de Deus, pois como reza o salmista: “Um
coração contrito e esmagado, ó Deus, tu não
desprezas” 160. Deus está sempre inclinado a re-
dimir a sua criatura, mas Ele só o faz se ela mes-

143
ma permite que ele intervenha diretamente em
sua alma. Não se arrepender dos próprios peca-
dos é um ato de extrema soberba e é conhecido
de todos que “Deus resiste aos soberbos, mas dá
sua graça aos humildes” 161.

O arrependimento é verdadeiramente um
ato da vontade, em que a pessoa enxerga com
clareza que sua atitude é contrária à vontade de
Deus e, por isso, livremente decide mudar, mas
não podendo fazer isso por conta própria, im-
plora os auxílios da graça. Deus tem uma gran-
de paciência e enquanto o homem tem vida, Ele
sempre espera a sua conversão. O cristão deve
viver com a consciência avivada desse chamado
de Deus para retornar à sua dignidade de filho.
Ignorar esse chamado e esse amor é desprezar
o próprio Deus, como ensina São Paulo: “Ou
desprezas a riqueza da sua bondade, paciência
e longanimidade, desconhecendo que a benig-
nidade de Deus te convida a conversão?” 162. Um
arrependimento sincero sempre implica uma
dor do coração por ter ofendido a Deus e junto a
essa dor, um propósito firme de não mais voltar
aos mesmos erros.

144
O segundo bloqueio é a dificuldade de per-
doar e de acolher o perdão. O ato de perdoar re-
vela a capacidade de amar de cada coração, pois
quanto mais se perdoa, tanto mais essa pessoa
demonstra seu amor. Todos querem obter per-
dão, porque sabem que em algum momento
erram e desejam a reconciliação. É essa motiva-
ção que deve levar sempre a perdoar o próximo:
“Perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós
perdoamos a quem nos tem ofendido”. Aqui, é
possível perceber que o perdão tem uma condi-
cional importantíssima, de que Deus só poderá
perdoar alguém que soube dar o perdão ao seu
próximo. É isso que ensina a Escritura: “Perdoa
ao teu próximo seus erros, e então, ao rezares,
ser-te-ão perdoados os teus pecados. Um ho-
mem guarda rancor contra outro: do Senhor pe-
dirá cura? Para com o seu semelhante não tem
misericórdia, e pede perdão de seus pecados?”
163
.

O perdão liberta o coração de todos os fal-


sos juízos e rigorismos que se pode cair, e assim
aproxima o homem de Deus que é sempre rico

145
em misericórdia e inclinado a perdoar. É preci-
so perdoar sempre, porque é necessário amar
sempre. Foi isso que Jesus quis ensinar aos
apóstolos: “Pedro chegando-se a ele, pergun-
tou-lhe: ‘Senhor, quantas vezes devo perdoar ao
irmão que pecar contra mim? Até sete vezes?’
Jesus respondeu-lhe: ‘Não te digo até sete, mas
até setenta e sete vezes.’” 164. Muitas pessoas não
conseguem entender e oferecer o perdão, mas
porque igualmente não se deixam mover pelo
amor. Deus sempre perdoa a seus filhos, por-
que muito maior que os erros que cometem é
o amor que tem por eles. “Tu és bom e perdoas,
Senhor, és cheio de amor com todos os que te
invocam” 165. É necessário, portanto, reconhecer
que se não há na alma esse amor misericordio-
so é preciso implorá-lo constantemente a Deus,
assim, também aumentará a capacidade de per-
doar, tal como Jesus que mesmo em meio aos
suplícios implora: “Pai, perdoa-lhes: não sabem
o que fazem” 166.

O terceiro bloqueio são as contaminações


espirituais, as influências negativas que crenças
pagãs provocam sobre a relação do fiel com Deus.

146
A Igreja ensina que “Todas as formas de adivi-
nhação devem ser rejeitadas: recurso a Satanás
ou aos demônios, evocação dos mortos ou ou-
tras práticas supostamente ‘reveladoras’ do fu-
turo. A consulta dos horóscopos, a astrologia,
a quiromancia, a interpretação de presságios e
de sortes, os fenómenos de vidência, o recurso
aos “médiuns”, tudo isso encerra uma vontade
de dominar o tempo, a história e, finalmente,
os homens, ao mesmo tempo que é um desejo
de conluio com os poderes ocultos. Todas essas
práticas estão em contradição com a honra e o
respeito, penetrados de temor amoroso, que de-
vemos a Deus e só a Ele.” 167. O cristão, portanto,
precisa rechaçar da sua vida todos esses males
para estar em paz com Deus.

No mundo moderno as pessoas estão acostu-


madas a misturarem diversas crenças como se
todas pudessem levar a um único fim, mas São
Paulo já alertava os cristãos a não se envolverem
com doutrinas estranhas: “Procurai discernir o
que é agradável ao Senhor e não sejais partici-
pantes das obras infrutuosas das trevas, antes
denunciai-as” 168. Para que haja verdadeira liber-

147
dade de coração é necessário fixar-se unicamen-
te em Deus e dar-se todo a ele, entrar em sua co-
munhão e receber suas luzes espirituais.

PARA REFLETIR:
• Deixar-se curar por Deus é tornar-se livre e
feliz. O que ainda impede a sua cura total:
a falta de arrependimento, a dificuldade de
perdoar, ou a falta de fé e a decisão firme
por Deus?

• Deus é a verdade que liberta, que traz paz


para o coração. Ele quer tirar todos os blo-
queios que ainda existem na sua vida e te
fazer uma pessoa feliz. Você aceita que Ele,
hoje, te ajude a superar todos esses blo-
queios?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, em vossa alma ja-
mais existiu feridas, trevas e resistências à ação
de Deus. Mas na minha alma há muitas feridas
que se encontram abertas. Peço-te que alivies
meus sofrimentos com o sangue precioso de
seu filho Jesus. Dai-me forças para buscar um

148
arrependimento sincero, o perdão que liberta e
a afastar-me de tudo o que não venha de Deus.
Em vós confio e espero. Amém!

PROPÓSITO
Guardar mágoas e ressentimentos nunca
faz bem. Só é feliz uma pessoa que sabe fechar
bem os ciclos de sua vida e deixar com que Deus
a liberte de tudo aquilo que a impeça de amar
e de ser livre na graça do Espírito Santo. Nossa
Senhora tinha um coração totalmente livre por-
que não carregava em si nenhum bloqueio para
a ação de Deus. Hoje se decida a não mais carre-
gar mágoas e ressentimentos do passado, nem
mesmo a se fechar para o perdão e para a verda-
de.

7. O REMÉDIO PARA
4 FERIDAS DA ALMA
Deus criou o ser humano à sua imagem e se-
melhança e se alegrou por ver que sua obra era
muito boa. Uma criatura graciosa, um comple-
xo perfeito entre o mundo material e o mundo

149
espiritual, “O homem é a obra-prima da obra da
criação” 169. O ser humano foi feito, portanto, pa-
ra consumir-se de amor vivendo de Deus e para
Deus e isto deveria ser a causa de sua felicidade.
Todavia, o pecado manchou a história humana
e deste trágico episódio surgirão muitas con-
sequências das quais o homem padecerá e só
poderá superá-las com o auxílio divino. Diante
disso, o conselho do autor da Carta aos Hebreus
já revela o que Deus pretende para seus filhos
e qual deve ser o sentimento que eles devem
nutrir por Deus: “Aproximemo-nos, então, com
confiança do trono da graça para conseguirmos
misericórdia e alcançarmos graça, como ajuda
oportuna.” 170. É essa confiança cega na miseri-
córdia divina e o abandono que se faz por causa
dela que faz curar toda ferida que se possa ter na
alma.

A primeira ferida a ser curada é o sentimento


de culpa que se origina pelas más obras do pas-
sado. É verdade que o homem é um miserável e
que abandonado a sua própria sorte não tem a
capacidade de fazer nada de bom. São Luís ensi-
na: “Para despojar-nos de nós mesmos, é preciso

150
reconhecer primeiramente e bem, pela luz do
Espírito Santo, nosso fundo de maldade, nossa
incapacidade para todo bem, nossa fraqueza
em todas as coisas, nossa inconstância em todo
tempo, nossa indignidade de toda graça e nos-
sa iniquidade em todo lugar.” 171. Não obstante
todas essas misérias o homem não deve nutrir
em seu coração um sentimento de culpa que o
paralise e não permita que se entregue à ação
misericordiosa do Pai. Se grande é o abismo das
fraquezas humanas, muito maior é o abismo
da misericórdia divina e, por isso, “Um abismo
atrai outro abismo ao fragor das cascatas” 172.

Deus quer sempre curar as feridas que os pe-


cados deixam na alma, e o perdão que Ele con-
cede é o mais profundo que se pode receber,
tal é a promessa de Deus: “Perdoarei sua culpa
e não me lembrarei mais de seu pecado” 173. Se
Deus mesmo não se lembra da culpa perdoada,
também aqueles que pecaram devem se unir ao
sentimento de São Paulo que diz: “Esquecendo-
me do que fica para trás e avançando para o que
está diante, prossigo para o alvo, para o prêmio
da vocação do alto, que vem de Deus em Cristo

151
Jesus.” 174. Quando Deus mergulha uma alma em
seu amor misericordioso ela deve dar-se intei-
ramente a Ele, de tal modo que seus erros não
subsistam nem mesmo em sua memória. Quem
ama verdadeiramente não teme, mas confia
num poder que supera suas próprias misérias.
“Não há temor no amor: ao contrário: o perfei-
to amor lança fora o temor, porque o temor im-
plica castigo, e o que teme não chegou à perfei-
ção do amor. Quanto a nós, amamos, porque ele
nos amou primeiro” 175. A grande prova de que
Deus ama seus filhos é o sacrifício de seu Filho
Unigênito que apaga toda culpa.

A segunda ferida a ser curada é o medo. Esse


sentimento negativo gerado pela angustia da in-
segurança deve ser curado com a certeza de que
Deus é um Pai providente, Ele conhece a cada
um de seus filhos, e como ensinou Jesus: “Vosso
Pai sabe do que tendes necessidade antes de lhe
pedirdes” 176. Não importa se sejam necessida-
des materiais, espirituais, psicológicas, Deus co-
nhece o coração e a dificuldade de cada um de
seus filhos muito mais do que eles mesmos. O
mundo jamais será capaz de oferecer a seguran-

152
ça que somente Deus pode dar. Aqui nesta vida
tudo é pueril, efêmero, insaciável, tudo se perde
com muita rapidez, portanto ninguém deve co-
locar suas esperanças em outra coisa, senão em
Deus. No coração de um devoto da Santíssima
Virgem deve estar esta certeza: “O Senhor é meu
pastor, nada me falta. Ainda que eu caminhe
por vale tenebroso nenhum mal temerei, pois
estás junto a mim; teu bastão e teu cajado me
deixam tranquilo” 177. Deus jamais abandona
seus filhos, Ele mesmo convida a essa confiança:
“Não temas, porque eu te resgatei, chamei-te pe-
lo teu nome: tu és meu. [...] Pois que és precioso
aos meus olhos, és honrado e eu te amo” 178. Seu
amor leva a dar tudo por eles, portanto, não há
razões para o medo no coração de um cristão.

A terceira ferida é o sentimento de inferio-


ridade que nasce do desprezo que se nutre por
si mesmo. Esse sentimento nasce das compara-
ções sempre frequentes com o outro e, às vezes,
de considerações que foram feitas colocando a
pessoa numa posição inferior à de outro. No en-
tanto, é necessário lembrar-se de que Deus criou
cada pessoa de uma maneira singular, cada uma

153
possui diante Dele um valor inestimável e razão
de todas as pessoas serem diferentes umas das
outras é que Deus é capaz de criar sempre algo
novo, sem com isso deixar de dar a mesma dig-
nidade a todos. Cada pessoa foi sonhada, amada
e desejada por Deus: “Antes mesmo de te mode-
lar no ventre materno, eu te conheci; antes que
saísses do seio, eu te consagrei” 179. Desse mo-
do, só há uma única pessoa que deve ser imita-
da e com quem se deve comparar a vida: Nosso
Senhor Jesus Cristo, porque Ele “revela também
plenamente o homem ao mesmo homem e des-
cobre-lhe a sua vocação sublime” 180. Em Cristo e
somente nele está o valor do homem, portanto,
nada deve fazer esmorecer o coração do cristão
quanto a sua dignidade.

A quarta ferida é o sentimento de rejeição


que nasce das experiencias negativas que se po-
dem ter experimentado no seio da família ou da
sociedade. Essa ferida aparece na vida de muitos
ainda na infância, quando se sabe que ocorreu
uma tentativa de aborto, um abandono, a falta
de amor dos pais, entre tantos acontecimentos
que fragilizam as relações humanas que exi-

154
gem afeto, confiança e amor. Mas apesar dessa
ferida, a misericórdia de Deus é um verdadeiro
bálsamo e sobre ela deve se assentar a certeza
de que se “Meu pai e minha mãe me abandona-
ram, mas o Senhor me acolhe” 181. Deus nunca
deixará de cuidar de seus filhos, portanto, todos
os que se sentem rejeitados procurem seguir o
conselho de São Pedro: “Lançai nele toda a vossa
preocupação, porque é ele que cuida de vós” 182.
Cristo também foi rejeitado desde que entrou
no mundo, mas seu amor foi maior do que tu-
do, esse amor ainda continua a ser maior do que
qualquer mal.

PARA REFLETIR:
• Por que você ainda não se decidiu por ser
livre e feliz? Deus está preparado para te
curar com a sua misericórdia. O que ainda
te machuca: o sentimento de culpa, o me-
do, o sentimento de inferioridade ou a re-
jeição?

• Deus quer curar as suas feridas, mais do


que você mesmo deseja. Ele só precisa da
sua permissão para colocar remédio nessas

155
feridas. Você permite que hoje Ele entre no
seu coração e cure todo mal?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, em vosso amor de
Mãe padecestes junto ao seu Filho e não rejei-
tastes nenhum sofrimento, mas a todos trans-
formastes pela força do amor de Deus que sem-
pre irradiou sobre a vossa alma. Por esse mesmo
amor misericordioso quero permitir que Jesus
cure as minhas feridas, que seu sangue precio-
síssimo seja derramado sobre cada ferida aberta
e as transformem em fontes de amor. Que o mal
não prevaleça sobre mim, mas que Deus triunfe
sobre todo sofrimento e santifique a minha al-
ma. Amém!

PROPÓSITO
A misericórdia é uma forma de amor de al-
guém que é superior para alguém que é infe-
rior. Deus sempre nos olha com misericórdia,
porque sabe da nossa fraqueza e pequenez. Até
mesmo a Virgem Maria acolheu a misericórdia
divina se reconhecendo uma pequena criatura
nas mãos do Altíssimo. Assim como ela, hoje vo-

156
cê precisa se abandonar nos braços do Pai, não
ter medo de correr ao seu encontro, assim como
o filho pródigo e deixar com que Ele restitua a
sua dignidade de filho (a) de Deus.

157
PARTE 3

O CONHECIMENTO
DE NOSSA SENHORA
Agora chegou o momento de meditar sobre
aquela que foi a mais perfeita das criaturas: a
Santíssima Virgem Maria. Por isso, vamos ini-
ciar os 07 dias de meditação sobre o conheci-
mento de Nossa Senhora. Durante essas sete
meditações compreenderemos melhor como
ela foi tão fiel à vontade de Deus e por meio de
suas virtudes, também aprenderemos a desen-
volver as nossas, assim nos tornaremos verda-
deiros devotos seus. É muito importante cada

158
tema que será abordado nessa parte, então va-
mos rezar, meditar e colocar em prática todos
os ensinamentos dessa semana de profunda in-
timidade com Nossa Mãe, a Virgem Maria.

Para isso, você deve a cada dia rezar as seguin-


tes orações:

LADAINHA DO ESPÍRITO SANTO (P. 275)


AVE, MARIS STELLA (P. 273)
RECITAR O ROSÁRIO OU AO MENOS UM
TERÇO

Além disso, deve fazer a meditação do dia e


colocar em prática os conselhos que se encon-
tram ao final de cada meditação.

Que Nossa Senhora seja seu espelho e sua


mestra de vida interior e te ajude a crescer nas
virtudes a partir desta semana toda voltada pa-
ra ela.

159
1. UMA MÃE DE
MISERICÓRDIA
Depois de considerar o caminho para conhe-
cer-se, é necessário dispor dos modelos a serem
seguidos para se praticar as virtudes cristãs. Entre
todas as criaturas, a mais perfeita e sublime foi a
Santíssima Virgem Maria, na qual imperou sem
obstáculo algum, a vontade de Deus. Maria foi
escolhida desde toda a eternidade para executar
os desígnios divinos a respeito de Cristo. Deus a
amou mais do que a qualquer outra criatura e
lhe concedeu graças superabundantes para que
cumprisse a sua missão. Assim se entende que
“O que é o cume da perfeição de outros santos
não é ainda o início da santidade de Maria” 183.
A Virgem Santíssima é infinitamente maior que
todos os anjos e santos, mas também é verdade
que diante de Deus ela não passa de um átomo.

Quando o anjo Gabriel se encontra com


Maria, ele a saúda dizendo: “Alegra-te cheia de
graça, o Senhor está contigo” 184. As graças pre-
sentes na alma de Maria são superabundantes
para que ela fosse digna Mãe de Deus, por is-

160
so a doutrina da Igreja apresenta a imaculada
conceição como um grandioso privilégio ope-
rado por Deus através da chamada Redenção
Preservadora, a fim de que a Virgem Santíssima
não contraísse a nódoa do pecado e pudesse re-
ceber em seu ventre o Filho de Deus. Assim se ex-
pressa o Papa Pio IX na Bula Ineffabilis Deus: “A
Santíssima Virgem Maria, no primeiro instan-
te da sua concepção, por uma graça singular e
um privilégio especial a ela concedido por Deus
Onipotente, em previsão dos méritos de Jesus
Cristo Salvador do gênero humano, foi preserva-
da imune de toda a mancha do pecado original”
185
. Todas as obras que Deus realizou em Maria,
seja sua Imaculada Conceição, sua Virgindade
Perpétua, sua Assunção ao Céu, tinham como
finalidade a própria pessoa de Cristo de quem
devia ser Mãe.

A Santíssima Virgem foi a Mãe perfeitíssima


para Nosso Senhor. Nunca houve na terra, nem
jamais haverá um coração que ame a Deus com
tal profundeza como o de Maria. A relação que
Nossa Senhora tinha com seu Filho não é mera-
mente espiritual, ela tinha com ele uma relação

161
de ordem hipostática, pois a humanidade do
Verbo foi recebida inteiramente de Maria. Foi da
Santíssima Virgem que Jesus recebeu sua carne,
seu sangue e foi em seu ventre que Deus lhe for-
mou uma alma imortal. Desse modo, Deus quis
ter uma relação diferente com Maria, tornan-
do-a sua digna Mãe e esse é o maior dom que
nenhuma criatura poderá merecer. Somente à
Virgem Maria foi dada a graça de ser chamada
Mãe de Deus. “Esta Divina Mãe é infinitamente
inferior a Deus, mas é imensamente superior a
todas as criaturas. E se é impossível achar um fi-
lho mais nobre que Jesus, é impossível também
achar uma mãe mais nobre que Maria. Sirva tu-
do isto aos devotos de Maria, não só para se re-
gozijarem das suas grandezas, como também
para aumentar-lhes a confiança no seu podero-
síssimo patrocínio.” 186.

Deus quis que Maria fosse uma criatura es-


plendorosa, embora estivesse escondida sob o
véu da humildade. Deus ainda deseja que Maria
continue a ser um esplendor de glória no mun-
do, porque todas as graças que o Criador infun-
diu em sua alma são transbordantes para que se

162
derramem sobre todos os seus filhos. O próprio
Filho de Deus não se recusou a se sujeitar a Maria
em todas as coisas, Ele que é Deus onipotente,
quis e, de fato, dependeu da Santíssima Virgem
em todas as coisas. “Deus, feito homem, encon-
trou sua liberdade em se ver aprisionado no seio
da Virgem Mãe; patenteou a sua força em se dei-
xar levar por esta Virgem santa; achou sua gló-
ria e a de seu Pai, escondendo seus esplendores
a todas as criaturas deste mundo, para revelá-las
somente a Maria; glorificou sua independência
e majestade, dependendo desta Virgem amável,
em sua conceição, em seu nascimento, em sua
apresentação no templo, em seus trinta anos
de vida oculta, até à morte, a que ela devia assis-
tir, para fazerem ambos um mesmo sacrifício e
para que ele fosse imolado ao Pai eterno com o
consentimento de sua Mãe. [...] Foi ela quem o
amamentou, nutriu, sustentou, criou e sacrifi-
cou por nós.” 187. Desta relação de Jesus e Maria
pode-se tirar uma dupla consequência para
a vida espiritual cristã: 1) Que se deve sujeitar
em tudo a Maria, como fez Jesus; 2) Que se deve
amar Jesus, como a Virgem Maria.

163
Quando no ápice de sua paixão, Nosso Senhor
Jesus Cristo entrega sua Mãe a São João, ele esta-
beleceu a filiação adotiva de todos os homens
à sua Mãe Santíssima: “‘Mulher, eis teu filho’
Depois disse ao discípulo: ‘Eis tua mãe!’” 188. É
a partir da maternidade espiritual que Maria
exerce sobre os homens que todos os seus de-
votos devem aprender a se sujeitar a ela, a fim
de que em sua intimidade sejam formadas as
virtudes cristãs em sua alma. Por outro lado, a
Santíssima Virgem ensina aos seus filhos o mo-
do como devem amar a Jesus, associando-se a
Ele pelos méritos de sua paixão. Portanto, vê-se
que a verdadeira devoção à Santíssima Virgem
Maria é fundamental para quem deseja se sal-
var. O devoto deve abandonar-se às mãos desta
Mãe tão misericordiosa, pois “A confiança em
Maria, Mãe de Misericórdia, e no poder de sua
intercessão, longe de diminuir a confiança em
Deus, aumenta-a.” 189. Isso acontece porque o
fim da devoção à Santíssima Virgem é totalmen-
te cristológico, quem vai a Maria, por fim, chega
a Jesus.

164
Por ser digna Mãe de Deus e estar intimamen-
te associada ao mistério de Cristo, até mesmo
em sua paixão, como corredentora, a Santíssima
Virgem tem méritos suficientes para conquistar
todas as graças aos seus filhos. “Maria nos dis-
tribui todos os dons que seu Filho nos tem da-
do. [...] Nos transmite todas as graças que rece-
bemos, todas as graças atuais que nos são dadas
para a respiração da alma, como o ar que chega
incessantemente nos pulmões para a respiração
do corpo, nós estamos, do mesmo modo, cons-
tantemente sob sua influência, subordinada
à de Cristo, cabeça da Igreja; ela nos transmite
continuamente o influxo vital que dele proce-
de.” 190. Portanto, deve-se pedir muito a Maria,
sobretudo que ela derrame as graças necessá-
rias para a santificação da alma.

PARA REFLETIR:
• Deus quis trazer a salvação ao mundo por
meio de Maria e quer que nós acheguemos
a Ele por meio dela. Você se submete à Nossa
Senhora e segue os seus ensinamentos?

165
• Como Jesus foi feliz amando a Virgem
Maria e lhe obedecendo. Ele espera que fa-
çamos o mesmo. Depois de Deus, você ama
a Virgem Maria acima de tudo, como sua
Mãe de Misericórdia?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, sois Mãe de mise-
ricórdia e por isso suas preces são valiosas aos
seus filhos. Rogo-vos que por vossos méritos me
obtenha a graça de amar a Jesus e me entregar
por completo a Ele. Mas quero fazê-lo por vos-
sas mãos, me submetendo inteiramente ao vos-
so patrocínio. Sois minha mãe e minha rainha,
em vós me abandono inteiramente. Amém!

PROPÓSITO
Ninguém neste mundo amou tanto a Deus
como a Virgem Maria. Em todos os seus pen-
samentos, intenções, afetos e ações Deus era o
seu fim. Por isso, Deus quer que Maria continue
sendo um caminho seguro para irmos até Ele.
Mas para isso é preciso recorrer sempre à Nossa
Senhora com confiança e amor, assim como
uma criancinha que se abandona nos braços da

166
Mãe. Peça sempre à Virgem Maria que te ajude a
crescer no amor de Deus, fale com ela todos os
dias e peça que pela intercessão dela você seja
capaz de acolher a misericórdia e os apelos de
Deus na sua vida.

2. A VERDADEIRA
DEVOÇÃO À SANTÍSSIMA
VIRGEM MARIA É TERNA
A Santíssima Virgem Maria desde sempre
consagrou toda a sua humanidade a Deus, não
reservando nada para si. Ela quis assim, que tu-
do em sua vida estivesse ordenado para a glória
de Deus e, isso demonstra o quanto Maria amava
a Deus, pois a virtude do amor é a decisão firme
de buscar o bem daquele que se ama. Na vida de
Nossa Senhora tudo aspirava por esse amor, tudo
radicava desse amor, seus pensamentos, inten-
ções, afetos e ações eram todos absorvidos pelo
grande amor que tinha por Deus. A Santíssima
Virgem sempre foi tão afeiçoada a Deus, sobre-
tudo à pessoa divina de Nosso Senhor, que ne-

167
la existiam “os mesmos sentimentos de Cristo
Jesus” 191. Em virtude dessa apurada afeição en-
tre ela e Deus é que também seus devotos de-
vem exercitar para com ela uma devoção terna,
para que possam consagrar a Deus todos os seus
afetos.

A ternura é uma expressão afetiva do amor. O


coração humano necessita de expressões de ca-
rinho, confiança, afago, que só podem ser bem
percebidas quando a virtude do amor se expres-
sa com ternura. Por isso, São Luís Maria Grignion
de Montfort ensina que a devoção à Santíssima
Virgem deve ser terna, ou seja, “cheia de con-
fiança na Santíssima Virgem, da confiança de
um filho em sua mãe. Impele uma alma a recor-
rer a ela em todas as necessidades do corpo e do
espírito, com extremos de simplicidade, de con-
fiança e de ternura” 192. Esse abandono às mãos
de Maria é um grande sinal de amor, um amor
concreto, pois ainda que o amor não seja mera-
mente um sentimento, quando é verdadeiro,
ele é preenchido de demonstrações afetivas, vis-
to que o ser humano não sabe expressar as rea-
lidades espirituais, senão em termos humanos.

168
São Luís dá a conhecer como essa terna con-
fiança se manifesta: a alma “implora o auxílio de
sua boa Mãe em todo tempo, em todo lugar, em
todas as coisas: em suas dúvidas, para ser escla-
recida; em seus erros, para se corrigir; nas ten-
tações, para ser sustentada; em suas fraquezas,
para ser fortificada; em suas quedas, para ser le-
vantada; em seus abatimentos, para ser encora-
jada; em seus escrúpulos, para ficar livre deles;
em suas cruzes, trabalhos e reveses da vida, para
ser consolada. Em todos os males do corpo e do
espírito, enfim, Maria é seu refúgio, e não há re-
ceio de importunar esta boa Mãe e desagradar a
Jesus Cristo.” 193. Nosso Senhor, em seu coração
humano também demonstrava seu amor com
profundos traços afetivos, por isso, tinha por
sua Mãe uma ternura inigualável. Jesus quis ter
uma real dependência de Maria, dela recebia
seu alimento, com ela aprendeu a andar, obede-
ceu em tudo as suas ordens, fez tudo em íntima
união com ela, como não haveria de nutrir por
essa tão boa mãe um amor cheio de ternura e
confiança?

169
Os verdadeiros devotos da Santíssima Virgem
hão de recorrer a ela do mesmo modo, por um
abandono à sua maternidade. Não deve haver
nenhuma desconfiança em seu coração, mas
pelo contrário, uma confiança inabalável, pois
Maria deseja o bem de seus filhos muito mais
que eles mesmos. Portanto, é necessário fazer
enternecer o coração por essa boa Mãe, confian-
do que todas as graças que são derramadas do
céu passam por suas mãos puríssimas. Santo
Afonso que tinha uma terna devoção à santíssi-
ma Virgem faz uma recomendação importan-
te: “Avivemos, pois, cada vez mais a nossa con-
fiança, ó devotos de Maria, sempre que a ela
recorremos pedindo-lhe graças. Para avivá-las
tenhamos sempre presentes duas grandes prer-
rogativas que possui esta boa Mãe: o desejo de
nos fazer bem e o poder de conseguir do Filho
tudo quanto lhe pede. Quão vivo é o seu dese-
jo de ajudar a todos!” 194. Outro santo que ti-
nha uma terna confiança em Maria era São João
Maria Vianney, e de tanto amor que tinha, ele
exortava os seus fiéis a não colocarem obstácu-
los à ação de Maria, por isso lhes dizia: “O cora-

170
ção de Maria tem tanta Ternura por nós que os
corações de todas as mães, juntas, são como um
pedaço de gelo em comparação ao Seu”.

Maria é o receptáculo da misericórdia e bon-


dade de Deus, se se aproxima dela com confian-
ça, não se chegará a outro fim senão a uma ca-
ridade ardentíssima por Jesus Cristo. “Vamos,
pois, cheio de confiança para o trono de graça,
a fim de obtermos misericórdia e alcançarmos
a graça no socorro oportuno” 195. Com toda sua
ternura e afago, a Santíssima Virgem conquis-
ta para Deus até os corações mais endurecidos,
são muitos aqueles que se voltaram para Deus
por meio dessa boa Mãe, por enxergarem nela
de imediato, aquilo que só veriam em Deus pos-
teriormente. Maria manifesta de maneira sim-
ples aquilo que Deus é em essência: amor e mi-
sericórdia. Por isso, seu olhar para os pecadores
é tão terno que ninguém ao contemplá-la pode
hesitar em converter logo o coração para Deus.

No coração do verdadeiro devoto deve estar


a certeza de que Maria conhece muito melhor as
suas necessidades do que ele mesmo. Portanto,

171
seja em meio as dúvidas, erros, tentações, fra-
quezas, quedas, abatimentos, escrúpulos, cru-
zes, trabalhos, dificuldades, não se desesperará
o seu coração, visto que Maria é o seu porto se-
guro. Por isso, a imitação das virtudes de Maria
torna-se um caminho seguro para chegar à
união com Deus e nenhum outro santo oferece-
rá tanto benefício à alma do fiel, do que a devo-
ção terna à Santíssima Virgem. “Sua mediação
ultrapassa, assim, em muito, aquela dos santos,
porque somente ela nos deu o Salvador; somen-
te ela esteve também intimamente unida, com
um coração de mãe, ao sacrifício da cruz; so-
mente ela é medianeira universal para todos os
homens e, de todas as graças, não somente em
geral, mas em particular, até a mais particular
de todas, que é, para cada um de nós, a do mo-
mento presente, que assegura nossa fidelidade
de minuto em minuto.” 196. Não se tenha, por-
tanto, no coração nenhum receio de se entregar
a tão terna Mãe, Jesus assim o quer, queiramos
nós também.

172
PARA REFLETIR:
• Nossa Senhora como Boa Mãe quer te aju-
dar em todas as suas necessidades. Você
implora o auxílio dela em todo tempo, em
todo lugar e em todas as coisas?

• Quando amamos alguém sempre procu-


ramos demonstrar esse amor por meio de
gestos de carinho. Que tipos de atitudes de-
monstram que você ama verdadeiramente
Nossa Senhora?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, o vosso coração
humano pulsava de amor por Deus em cada
instante. Todos os seus pensamentos, palavras
e ações estavam inclinados para Jesus e, por is-
so, palpitavam esses dois corações em um só de-
sejo, o de agradar ao Eterno Pai. Rogo-vos com
confiança e ternura, pois quero abandonar-me
em vossos braços e aprender de vós o modo de
amar a Jesus Cristo. Seja meu auxílio em mi-
nhas necessidades e minha esperança na hora
da morte. Amém!

173
PROPÓSITO
Como é bom amar e sentir amado. O amor
quando é verdadeiro preenche a alma e traz
uma satisfação sem igual. Jesus sempre amou a
sua Mãe e lhe dirigia sempre atitudes e palavras
de carinho. Igualmente ela o amava com toda a
ternura e cuidado, não tendo no seu coração ou-
tro espaço senão para Jesus. É assim que deve-
mos amar Nossa Senhora, para que consigamos
amar a Jesus. Por isso, a partir de hoje sempre
lance um olhar de ternura para Nossa Senhora,
diga a ela palavras doces: “Mãe, como és bela,
eu te amo!”, “Maria, minha rainha, quero ser
teu servo”. Desse modo, seu amor e dedicação à
Santíssima Virgem vai aumentar dia após dia.

3. A VERDADEIRA DEVOÇÃO
À SANTÍSSIMA VIRGEM
MARIA É INTERIOR
Todas as obras verdadeiras tem a sua raiz no
coração mergulhado no amor. Não poderia ser
diferente com a devoção à Santíssima Virgem

174
Maria, pois seus devotos verdadeiros tem so-
bre ela uma atenção e afeto profundos e sempre
crescentes. Mas a profundidade dessa devoção
não é coisa que se conquista pelas próprias for-
ças, pelo contrário, ela é um resultado da vida
de oração que não visa a quantidade que se re-
za, mas a qualidade com que as preces são fei-
tas. Desse modo, o verdadeiro devoto não pode
ouvir a censura de Jesus: “Este povo somente me
honra com os lábios; seu coração, porém, está
longe de mim” 197, porque para que essa devo-
ção atinja seu devido fim, é preciso rezar com os
lábios e o coração.

São Luís Maria Grignion de Montfort en-


sina que “A verdadeira devoção à Santíssima
Virgem Maria é interior, isto é, parte do espíri-
to e do coração. Vem da estima em que se tem a
Santíssima Virgem, da alta ideia que se formou
de suas grandezas, e do amor que se lhe consa-
gra” 198. Somente a oração pode fazer com que
a devoção atinja esse grau de solidez, porque
Deus ilumina a alma com a luz da fé, fazendo
surgir no coração humano considerações ele-
vadas sobre os mistérios da graça operados na

175
Virgem Maria. Essa iluminação faz com que a
inteligência enxergue a verdade, proponha à
vontade que abrace esses mistérios consagran-
do-lhes um amor verdadeiro. Portanto, rezar é
muito mais do que apenas proferir palavras sol-
tas, mas é fazer uma rica consideração a respei-
to dos mistérios de Cristo e sua Mãe Santíssima.

A mestra de oração, Santa Teresa D’Ávila ensi-


nava que a oração se feita com distrações perde
substancialmente o seu valor. “Não chamo ora-
ção aquilo em que não se percebe com quem se
fala e o que se pede, nem quem pede e a quem;
por mais que se meneiem os lábios, não se trata
de oração. E, se algumas vezes o for, mesmo sem
esse cuidado, será por motivos que se justifi-
quem. Mas o costume de falar com a Majestade
de Deus como se falaria a um escravo, sequer re-
parando no que se diz, mas apenas repetindo o
que se decorou ou se disse muitas vezes, não o te-
nho por oração. Preza Deus que nenhum cristão
ore dessa maneira!” 199. A consideração de Santa
Teresa faz perceber que rezar distraidamente é
ignorar a presença de alguém que não pode ser
ignorado, o próprio Deus, e ninguém gosta de

176
conversar com alguém que não lhe dá a devida
atenção.

O próprio Jesus Cristo ensinou a seus discípu-


los a não rezarem da boca pra fora, sem colocar
atenção e afeto no que se diz: “Quando orardes,
não useis de muitas palavras, como fazem os pa-
gãos. Eles pensam que serão ouvidos por força
das muitas palavras. Não sejais como eles, pois
o vosso Pai sabe do que precisais, antes de vós o
pedirdes” 200. A oração, portanto, deve ser sem-
pre bem feita, pois seu intuito não é comunicar
a Deus aquilo que se quer, mas abrir o coração
de tal maneira que sua graça realize uma trans-
formação naquele que reza. O exemplo perfei-
to de oração é a própria Virgem Maria que não
simplesmente rezava, mas colocava seu coração
em todos os acontecimentos e, por isso, “medi-
tava todas as coisas em seu coração” 201.

Em seu tratado, São Luís insiste para que os


devotos não se tornem exteriores na vivencia
desta devoção, visto que há muitos que assim se
comportam crendo que estão assim agradando
a Deus. Esses devotos exteriores “Amam apenas

177
o que há de sensível na devoção, sem interesse
pela parte sólida. Se suas práticas não lhes afe-
tam a sensibilidade, acham que não há nada
mais a fazer, ficam desorientados, ou fazem tu-
do desordenadamente”202. Para esses devotos,
a devoção consiste nos arrepios, nas lágrimas,
nas consolações de todo tipo e na quantidade
de orações que recitam. Sua devoção nunca es-
tá assentada em princípios sólidos que dão ver-
dadeira qualidade ao que fazem. Eles sempre
“Recitarão às pressas uma enfiada de terços, ou-
virão, sem atenção, uma infinidade de missas,
acompanharão as procissões sem devoção, fa-
rão parte de todas as confrarias sem emendar de
vida, sem violentar suas paixões, sem imitar as
virtudes desta Virgem Santíssima”203. No entan-
to, não é assim que se poderá agradar ao Senhor
e sua Mãe.

Aqueles que desejam progredir na verdadei-


ra devoção à Santíssima Virgem devem se apli-
car à oração fervorosa, colocando a devida aten-
ção naquilo que faz. O pensamento, os afetos e
as intenções precisam estar direcionados para
a Virgem Santíssima e seu Filho Jesus Cristo. Ao

178
longo do dia devem procurar elevar muitas ve-
zes o pensamento a Deus para conservar a sua
presença. Nas orações devem entregar-se com
confiança esquecendo todas as outras preocu-
pações e quando elas tomam conta do coração, é
preciso oferecê-las a Deus e aquietar-se. Recorrer
à Santíssima Virgem também é de grande valia,
porque “assim como quem se aproxima de uma
grande fogueira não pode deixar de receber o
seu calor, assim também nenhum necessitado
de auxílio ou graças deixa de receber misericór-
dia e piedade ao aproximar-se, com humildade
e fé, da fogueira de amor que arde no coração da
Virgem.”204. A oração é um combate e mais sa-
biamente combate quem está com os soldados
mais experientes, portanto é preciso confiar em
Maria e fazer de suas preces uma alavanca da vi-
da espiritual, pois “As orações de Maria são mais
poderosas diante de Deus do que as de todo pa-
raíso”205.

PARA REFLETIR:
• Para que nossa oração seja frutuosa ela pre-
cisa ser feita com amor e atenção. Quando
você reza, por exemplo, o terço, você pensa

179
nos mistérios da vida de Jesus e de Nossa
Senhora com bastante atenção?

• Uma devoção interior está voltada muito


mais para a qualidade da oração e da en-
trega a Deus, do que para a quantidade e a
aparência. Você se confia inteiramente aos
cuidados de Nossa Senhora e se empenha
em fazer suas orações com a maior quali-
dade possível?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria como são agradá-
veis as preces que diriges a Deus. Ele sempre vos
escutou e nunca deixou de atender nenhum pe-
dido vosso. Coloco-me diante de vós como quem
sabe que não tem mérito algum, portanto, nada
possuo e nada posso, mas vós podeis, porque
vossa oração é infalível. Pedi Senhora minha a
Jesus que me conceda progredir na oração, que
dissipe minhas distrações e acenda um fogo ar-
dentíssimo de caridade em minha alma. Assim
seja, amém!

180
PROPÓSITO
Um verdadeiro devoto da Santíssima Virgem
Maria não pode viver a sua devoção de qualquer
maneira. Não deve rezar com falta de atenção
nas palavras que diz e nos mistérios que está
meditando. Deus espera que assim como Nossa
Senhora, o nosso coração se volte inteiramente
para Ele, que pensemos nele e nas coisas do céu
quando fazemos orações e assim, que nossos
sentimentos também se voltem para Ele. Para
isso, a partir de hoje comece a fazer as suas ora-
ções com mais atenção, pensando nas palavras
que estão sendo ditas e peça à Nossa Senhora
que te ajude a manter o seu pensamento nas
coisas celestes.

4. A VERDADEIRA DEVOÇÃO
À SANTÍSSIMA VIRGEM
MARIA É CONSTANTE
Depois de ter falado sobre a necessidade da
oração para que a devoção à Santíssima Virgem
Maria seja verdadeira, é necessário agora com-

181
preender a importância da constância no pla-
no de vida espiritual, porque é pela oração que
se obtém a constância e é sendo constante que
melhor se serve a Deus. Essa é uma característi-
ca fundamental na vida dos verdadeiros devo-
tos. São Luís Maria Grignion de Montfort diz:
“A verdadeira devoção à Santíssima Virgem é
constante, firma uma alma no bem, e ajuda-a a
perseverar em suas práticas de devoção. Torna-a
corajosa para se opor ao mundo em suas modas
e máximas, à carne, em seus aborrecimentos e
paixões, e ao demônio, em suas tentações”206. A
constância segundo o santo tem, portanto, du-
as funções: ajudar a perseverar nas práticas de
devoção e a combater os inimigos da alma.

É necessário, por primeiro, que o devoto se


acostume a dar-se a Deus constantemente, não
somente nos momentos em que se sente mais
inclinado. Aqui, São Luís revela a importância
de não tornar a devoção um mero sentimenta-
lismo, o que representa um grande perigo para
a alma, mas que seja um meio útil para confor-
mar a vida à vontade de Deus. A constância diz
respeito a perseverança que se tem em algo es-

182
pecialmente difícil, como é o caso da devoção
e do combate contra o mundo, a carne e o dia-
bo. Por isso, Santo Tomás de Aquino ensina que
“O simples fato de alguém se obstinar durante
muito tempo numa tarefa difícil tem em si mes-
mo, uma dificuldade especial. Por isso, persistir
em um bem até que ele atinja sua consumação
diz respeito a uma virtude especial.”207, isso sig-
nifica que a constância não torna as coisas mais
fáceis de praticar, mas que ajuda o homem a per-
sistir mesmo na dificuldade e a sua persistência
vai lhe dando mais forças para resistir na práti-
ca do bem.

São Luís considera que, apesar das dificulda-


des que se encontram pelo caminho, um devoto
constante “Não é volúvel, não se deixa dominar
pela melancolia, pelos escrúpulos ou pelos re-
ceios. Não quer isto dizer que não caia ou mu-
de, às vezes, na sensibilidade de sua devoção;
mas se cai, levanta-se logo, estende a mão à sua
boa Mãe, e, se perde o gosto ou a devoção sen-
sível, não se aflige irremediavelmente, pois o
justo e devoto fiel de Maria vive da fé de Jesus e
de Maria, e não nos sentimentos naturais” 208. O

183
verdadeiro devoto não é como um caniço mo-
vido ao sabor dos ventos, pelo contrário, sabe o
que deve fazer e o cumpre com determinação,
não se esquece que esse combate se dá contra
inimigos perigosos que querem a sua ruína.

Mas o grande segredo para a constância é a


fidelidade nas pequenas coisas, não ter a pre-
tensão de querer ser grande e com humildade,
como Santa Teresinha acomodar-se às coisas
pequenas. O próprio Jesus Cristo ensinou isso:
“Quem é fiel no pouco, é fiel também no mui-
to, e quem é infiel no pouco, é infiel também
no muito” 209. O que ocorre tantas vezes é que
se quer abraças as grandes coisas e se despreza
facilmente as pequenas, no entanto, essas mes-
mas coisas pequenas são o fundamento da boa
execução das grandes. A Virgem Maria viveu
de modo simples, mas perseverante a sua vida
de fé, ela “perseverava na oração, na leitura dos
Livros Santos, nos jejuns, em toda sorte, enfim,
de obras virtuosas” 210. Maria agradou muito a
Deus vivendo no escondimento, no silêncio, na
constância do amor, ela não desprezava nada,
por menor que fosse, mas referia tudo a Deus.

184
Ocorre muitas vezes que as pessoas não en-
xergam o quanto é precioso um só terço bem
rezado todos os dias, ou menos aquelas jacula-
tórias que se pronuncia mesmo em meio aos
afazeres, mas sempre em constante memória de
Deus. Muitos creem que o ideal é apenas aquele
rosário rezado uma única vez quando é possí-
vel, aquela penitência extraordinária que quase
nunca ocorre. Não é a isso que um verdadeiro
devoto deve se fiar. “No serviço a Deus, as coi-
sas que parecem pequenas em si mesmas são
grandes por sua relação ao fim último, a Deus,
a quem é preciso amar acima de tudo; elas são
grandes também pelo espírito sobrenatural de
fé, de confiança e de amor que deveria levar-nos
a realizá-las. Assim, do amanhecer até à noite,
nós guardaríamos a presença de Deus, coisa in-
finitamente preciosa, e viveríamos dele, de seu
espírito, em lugar de viver do espírito da natu-
reza segundo a inclinação do egoísmo. Pouco
a pouco, cresceria em nós o zelo pela glória de
Deus e pela salvação das almas.” 211.

185
Os frutos da constância se colhem com o tem-
po, mas sempre se colhem. É preciso alimentar
a esperança e a confiança em Deus que sempre
recompensa os esforços empreendidos, por
menores que sejam. Por isso a oração é o princi-
pal meio de conseguir perseverar, porque Deus
mesmo infunde na alma a força necessária para
trilhar o caminho. O devoto deve empregar a sú-
plica de Santo Agostinho: “Dá-me Senhor o que
ordenaste e ordena-me o que queres”. Se Deus
pede algo, Ele também pode dar todos os meios
para se chegar a sua consecução.

Enfim, depois de muitos anos bem vividos


praticando a devoção à Santíssima Virgem se
poderá ouvir de Jesus: “Muito bem, servo bom
e fiel! Sobre o pouco foste fiel, sobre o muito te
colocarei. Vem alegrar-te com o teu Senhor!” 212.
Portanto, sobre o coração do verdadeiro devoto
da Santíssima Virgem deve estar estampado a
promessa de Jesus: “Quem perseverar até o fim
será salvo” 213, visto que essa vida é brevíssima,
não se pode deixar o ânimo abater, nem o cora-
ção desalentar-se e sair a procura dos prazeres
mundanos, é preciso conservar a alma firme na

186
prática do bem, na constância das virtudes e na
fidelidade do amor.

PARA REFLETIR:
• Ninguém pode chegar a lugar algum sem
ser constante. Isso se aplica ainda mais ao
crescimento espiritual. Você tem sido fiel
no seu compromisso diário com Deus?

• Quem persevera, mesmo que sofra muito


ao fim vê os frutos do seu esforço. O mais
importante é manter-se fiel nas pequenas
coisas todos os dias. Você tem sido pacien-
te para esperar o tempo certo de colher as
graças que Deus reservou para você?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, o vosso amor por
Deus não se abreviou em momento algum, pe-
lo contrário, aumentava sempre mais e vos unia
perfeitamente à sua santa vontade. Como é belo
contemplar o vosso amor em meio a alegrias e
tristezas sempre do mesmo modo, com o mes-
mo fervor. Não sou como vós, custa-me amar a
Deus, portanto, recorro a vós, pois quero apren-

187
der a amá-lo em toda circunstância, sempre
com a mesma intensidade e, assim, nutrir san-
tos afetos por Aquele a quem merece ser amado
com todo fervor da alma. Socorra-me com vos-
sas preces, ó bendita Mãe de Deus. Amém!

PROPÓSITO
Nossa Senhora não tinha pretensões de gran-
deza, ela se contentava em ser fiel às pequenas
coisas que Deus lhe pedia todos os dias. Ela foi
muito constante no amor a Deus e nos seus de-
veres diários. Hoje ela vem ao seu encontro pa-
ra ensinar o caminho da perseverança e te pede
para ser fiel também nas pequenas coisas: no
terço diário, nas orações bem feitas, nos afaze-
res de cada dia, e ainda mais, é necessário ter pa-
ciência e esperar com confiança em Deus. Então
viva esse propósito de nunca abandonar seu de-
ver cotidiano e de não deixar o desespero e o de-
sânimo tomar conta do seu coração.

188
5. A VERDADEIRA DEVOÇÃO
À SANTÍSSIMA VIRGEM
MARIA É DESINTERESSADA
Deus merece ser amado, não simplesmente
pelos favores que faz aos homens, pelos mila-
gres que realiza, as graças que dispensa, as curas
que promove, tudo isso é justo, agradável e le-
va a amar a Deus, mas a causa principal de seu
amor deve ser outra, o simples fato de que Ele é
Deus. Deus merece o amor dos homens porque
sem Ele nada existiria, Ele é o único necessário
e, portanto, os homens simplesmente por exis-
tirem já devem prestar a Deus as suas homena-
gens. Esse amor desinteressado é sublime e tam-
bém deve ser aplicado em relação à Santíssima
Virgem Maria.

São Luís Maria Grignion de Montfort ensina


que o amor desinteressado pela Virgem Maria
demonstra com mais profundidade que ele de-
seja muito mais a união com ela e ser um imita-
dor seu, do que receber dela os benefícios que

189
ela pode dispensar. Por isso, “O verdadeiro de-
voto de Maria não serve a esta augusta Rainha
por espírito de lucro e interesse, nem para seu
bem temporal ou eterno, corporal ou espiritual,
mas unicamente porque ela merece ser servida,
e Deus exclusivamente nela; o verdadeiro devo-
to não ama Maria precisamente porque ela lhe
faz ou ele espera dela algum bem, mas porque
ela é amável. Só por isso ele a ama e serve nos
desgostos e na aridez, como nas doçuras e no
fervor sensível, sempre com a mesma fidelida-
de.”214. Desse modo, fica claro a qualidade desse
amor que não é apenas de munificência em que
se deseja receber bens, mas sobretudo de sacri-
fício, pois vai até a entrega da própria vida.

Os devotos interesseiros são falsos, porque o


fim de sua devoção não está em agradar a Virgem
Santíssima, imitar suas virtudes e alcançar a sal-
vação, está somente nos prêmios que dela pode
receber. Há um amor muito maior pelas coisas
do que pela pessoa da Santíssima Virgem. Eles
se esquecem do preceito de Jesus: “Buscai, em
primeiro lugar, o Reino de Deus e sua justiça,
e todas as coisas vos serão acrescentadas”215.

190
Desse modo, São Luís explica que “Os devotos
interesseiros, só recorrem a Santíssima Virgem
para ganhar algum processo, para evitar algum
perigo, para se curar de alguma doença, ou em
qualquer necessidade desse gênero, sem o que
a esqueceriam; uns e outros são falsos devotos
que não tem aceitação diante de Deus e de sua
Mãe Maria Santíssima” 216. Tão infeliz é esse tipo
de devoção por instrumentalizar a Santa Mãe de
Deus, a ponto de esquecê-la se nenhum benefí-
cio esteja em vista. Que Deus livre seus filhos de
caírem neste tipo de falsa devoção.

No entanto, o único interesse que a Santíssima


Virgem Maria realmente deseja que seus filhos
anseiem é a glória eterna, porque buscar a sal-
vação da alma é o maior desejo de Deus para os
homens. “Deus, nosso Salvador, quer que todos
os homens sejam salvos e cheguem ao conheci-
mento da verdade” 217. O céu deve ser a meta diá-
ria de cada Cristão, por causa dele deve tudo des-
prezar, como fez São Paulo: “O que era para mim
lucro tive-o como perda, por amor de Cristo. Mais
ainda: tudo considero perda, pela excelência do
conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor. Por

191
ele, perdi tudo e tudo tenho como esterco, para
ganhar a Cristo e ser achado nele.”218 Quando se
considera o valor da Vida Eterna todas as outras
coisas tornam-se insignificantes e alma aspira
somente por esse único bem. Os santos viveram
para o céu, enquanto ainda estavam no mundo
seus corações eram constantemente atraídos
para o Alto. Isso fazia exclamar Santa Elisabete
da Trindade: “Eis o que cantam os céus: a glória
de Deus. Já que a minha alma é um céu onde vi-
vo esperando a Jerusalém celeste, é necessário
que este céu também cante a glória do Eterno, e
somente a glória do Eterno.”219.

São Paulo fazia os cristãos se recordarem


da graça recebida no batismo que era para to-
dos um gérmen de glória: “Se, pois, ressuscitas-
tes com Cristo, procurai as coisas do alto, onde
Cristo está sentado à direita de Deus. Pensai nas
coisas do alto, e não nas da terra, pois morres-
tes e a vossa vida está escondida com Cristo em
Deus.”220. O batismo sepultou o homem velho e
deu vida a um novo homem que não tem outra
esperança senão a de possuir a Vida Eterna. Por
isso, já nesta vida o cristão pela fé contempla as

192
realidades que um dia contemplará em pleni-
tude no céu. Portanto, “A graça santificante é o
princípio radical da visão intuitiva da divina es-
sência, visão que tem o mesmo objeto que o co-
nhecimento incriado, sem, contudo, penetrá-lo
tão profundamente.”221.

Na eternidade pela visão beatífica os santos


contemplam a Deus e o veem como Ele mesmo
se vê, o amam como Ele mesmo se ama e conhe-
cem a profundidade da alma como o próprio
Deus as conhece. Era exatamente isso que en-
sinava São Paulo: “A caridade jamais acabará...
Agora vemos em espelho e de maneira confusa,
mas, depois, veremos face a face. Agora meu co-
nhecimento é limitado, mas, depois, conhece-
rei como sou conhecido.”222. Que alegria não se-
rá essa visão, de quanto contentamento a alma
gozará. Por causa do céu é justo abandonar tu-
do, pois no fim se saberá que ele era a única coi-
sa necessária nesta vida. Por isso a Santíssima
Virgem espera que seus filhos vivam uma devo-
ção desinteressada, para que não se esqueçam
que o céu é a única coisa que devem procurar.

193
O amor desinteressado por Deus e pela
Santíssima Virgem levará a alma a grande ale-
gria do céu e “Será a união transformante con-
sumada, como a fusão de nossa vida com a vida
íntima do Altíssimo, que se inclinará para nos
atrair definitivamente a si. Por esse amor, nos
alegraremos sobretudo de que Deus seja Deus,
infinitamente santo, justo e misericordioso;
por esse amor adoraremos todo os decretos de
sua Providência em vista de sua glória, da ma-
nifestação de sua bondade, e nos subordinare-
mos plenamente a Ele, dizendo-lhe: ‘Não a nós,
Senhor, não a nós, mas a teu nome seja dada a
glória’.”223. Portanto, que as insignificâncias des-
ta vida não detenham os filhos de Maria, pois o
céu é maior.

PARA REFLETIR:
• Há pessoas que só procuram a Deus quan-
do estão passando por algum problema
ou necessidade. Essas pessoas não amam a
Deus, porque não estão atrás de sua salva-
ção, mas somente de benefícios. Você é as-
sim, ou tem um amor desinteressado?

194
• Deus pode nos dar todas as graças de que
precisamos e Ele quer realmente as dar.
Mas não há nenhuma graça que seja maior
que a salvação. Na sua devoção à Nossa
Senhora, você tem buscado, sobretudo a
sua salvação eterna?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, vossa alma é o pa-
raíso de Deus, enquanto estavas na terra procu-
ravas somente realizar a sua santa vontade e ago-
ra no céu gozas de uma alegria infinita. Peço-vos
com fé e humildade que me ajudes a abandonar
todo apego às criaturas e a procurar-vos e amar-
-vos com total desinteresse, para que também
ame a Deus com o coração livre de toda preocu-
pação. Em vossas mãos me entrego. Amém!

PROPÓSITO
Jesus nos ensinou a buscar em primeiro lugar
o Reino de Deus e a sua justiça e todas as outras
coisas nos seriam dadas por acréscimo (Cf. Mt
6,33). Nossa Senhora nunca se preocupou com
outra coisa senão as coisas do céu, seu olhar e
seus esforços estavam voltados para lá. Hoje ela

195
te toma pela mão para te guiar por este mesmo
caminho. E como propósito de vida ela te pede
para não mais viver preocupado com as coisas
deste mundo, mas buscar a salvação em primei-
ro lugar. Por isso, sempre que você for pedir algo
a Deus, sempre peça dizendo que te seja conce-
dido se aquilo ajudar na sua salvação. Com cer-
teza dessa forma Deus atenderá suas preces.

6. A VERDADEIRA DEVOÇÃO
À SANTÍSSIMA VIRGEM
MARIA É SANTA
A máxima união com Deus na eternidade de-
ve ser a meta de todo cristão. Todavia essa união
já pode ser experimentada parcialmente nesta
vida, pois Deus quer permanecer nas almas e na
intimidade com elas fazer com que participem
de maneira cada vez maior de sua vida divina. A
santificação das almas é a principal obra de Deus
que se produz pelos méritos de Jesus Cristo con-
quistados em seu Mistério Pascal. Portanto, to-
das as práticas cristãs devem ter esse único fim

196
de levar as almas à santidade, por isso São Luís
faz questão de ensinar: “A verdadeira devoção à
Santíssima Virgem é santa: leva uma alma a evi-
tar o pecado e a imitar as virtudes da Santíssima
Virgem, principalmente sua humildade pro-
funda, sua contínua oração, sua obediência ce-
ga, sua fé viva, sua mortificação universal, sua
pureza divina, sua caridade ardente, sua paciên-
cia heroica, sua doçura angélica e sua sabedoria
divina”224.

O ensinamento de São Luís está em perfeita


conformidade com a doutrina que a Santa Igreja
apregoa: “Todos os fiéis, seja qual for a sua con-
dição ou estado, são chamados pelo Senhor à
perfeição do Pai, cada um por seu caminho”225. A
santidade é universal, está ordenada para todos
os fiéis que desejam se unir mais perfeitamente
a Cristo, e sem ela é impossível entrar na Vida
Eterna, por isso o autor da Carta aos Hebreus in-
siste: “Procurai a paz com todos, e a santificação,
sem a qual ninguém verá o Senhor”226. Ser santo
deveria ser a maior preocupação de uma pessoa
e o fim de todos os seus esforços.

197
Apesar de todas as debilidades que se podem
encontrar na vida de uma pessoa, esses obstácu-
los não podem ser vistos como intransponíveis,
Deus pela graça, pode fazer com que se triunfe
sobre todos eles e se abrace a santidade. “Se es-
tamos obrigados a aspirar à santidade e a ten-
der a ela com todas as nossas forças, é porque a
santidade está perfeitamente ao nosso alcance.
Do contrário, estaríamos obrigados a aspirar ao
impossível, o que é impensável em uma vocação
e chamado urgidos pelo próprio Deus. Jamais o
próprio Deus nos mandaria aspirar ao impos-
sível; seria absurdo e contraditório.”227. Santa
Teresinha deixa isso ainda mais evidente e ani-
ma as almas no caminho da virtude, ela diz: “O
Bom Deus não seria capaz de inspirar-me dese-
jos irrealizáveis. Posso, por conseguinte, aspirar
à santidade, não obstante minha pequenez.”228.

A Santíssima Virgem é o modelo perfeito pa-


ra todos os que querem chegar à santidade, ela
pode ser chamada a Forma Dei, porque nela es-
tá expressa perfeitamente a imagem de Deus, a
qual todos os homens são chamados a transpa-
recer. Desse modo, Deus quer usar Maria como

198
um molde para a santificação dos homens. Ela
moldou a humanidade de seu filho em seu ven-
tre puríssimo e agora sua grande missão é fazer
surgir a imagem de Deus na alma de seus filhos.
Desde toda a eternidade Deus deseja que em
Cristo os homens sejam santos: “Nele nos esco-
lheu antes da fundação do mundo, para sermos
santos e irrepreensíveis diante dele no amor”229.
A Virgem Santíssima foi a primeira a se benefi-
ciar dos méritos de Cristo, pois foi em vista deles
que Deus a fez a mais santa de todas as criaturas.

Agora, o próprio Salvador chama a todos os


homens a abraçar esse estado tão admirável:
“Deveis ser perfeitos como vosso Pai celeste é
perfeito”230. E a medida desta santidade é amar
sem medidas, pois Deus é infinitamente maior
do que se pode imaginar. Portanto, “Eis a medi-
da de santidade dos filhos de Deus: ‘ser santo
como Deus é santo, ser santo da própria santi-
dade de Deus’, e isto vivendo intimamente com
Ele, no fundo do abismo sem fundo, ‘dentro de
nosso ser’”231. Mas essa santidade só pode vir a
existir na alma de um fiel se Deus mesmo operar
essa transformação, que por sua vez deve ser ar-

199
dentemente desejada. “Ninguém pode possuir
um sincero e autêntico desejo de santidade ou
perfeição cristã, senão sob a influência imediata
da divina graça.”232. O homem deve sim procu-
rar com todos os seus esforços a conformidade
com a vontade de Deus, mas nunca deve esque-
cer que a santidade não é uma obra sua, é antes
do próprio Deus que conta simplesmente com
o abandono da alma ao seu divino querer.

Será muito mais fácil a qualquer pessoa chegar


à santidade se imitar as virtudes da Santíssima
Virgem, sobretudo a sua caridade, humildade
e pureza. Seguindo o mesmo caminho que ela
seguiu chegarão à perfeição com muito mais ra-
pidez e facilidade. O próprio São Luís o atesta:
“Eu digo que os santos são moldados em Maria.
[...] Tendo encontrado o belo molde de Maria,
no qual Jesus Cristo foi natural e divinamente
formado, sem se fiar na própria habilidade, mas
unicamente na eficiência do molde, lançam-se
e perdem-se em Maria para se tornarem o retra-
to natural de Jesus Cristo.”233.

200
Seja na vida secular, em meio aos trabalhos
e ocupações do dia a dia, recluso em um mos-
teiro, ou no exercício do ministério sacerdo-
tal, não importa em que estado de vida uma
pessoa se encontre, não importa a sua idade
ou nível de conhecimento, Deus quer fazer a
todos santos por meio da Santíssima Virgem.
“Quem é, pois, o mais santo? É aquele que mais
ama, aquele que mais olha para Deus e que
atende mais plenamente às exigências do seu
olhar.”234. Todos podem cumprir essas coisas,
amando generosamente, dando-se a Deus em
cada acontecimento, abandonando-se em sua
vontade. O problema na maioria das vezes é
que ao invés de abandonar-se a alma impõe
resistência e isso dificulta o processo. Por isso,
quem aspira a santidade deve se lembrar que
“Nas mãos de Deus, toda a criatura é dócil. Do
coração mais frio, Ele faz um serafim. Sem Ele,
as aptidões naturais de nada servem; com Ele,
os defeitos transformam-se em virtudes. Sem
Ele, a ciência incha e perde; com Ele, a ignorân-
cia dissipa-se, dando lugar ao saber. Para fazer
um Santo, Deus só necessita de um coração de
boa vontade.”235. Portanto, que o desejo de san-

201
tidade e a generosidade nunca cesse de aumen-
tar nas almas.

PARA REFLETIR:
• Fazer a vontade de Deus é a única coisa que
importa. É a conformidade com a vontade
de Deus que se chama santidade. Você tem
lutado com todas as suas forças para se tor-
nar uma pessoa santa?

• Ninguém nesta vida chegou a um grau tão


alto de perfeição quanto Nossa Senhora.
Ela era cheia de graça e fidelíssima à vonta-
de de Deus. Suas virtudes apontam o cami-
nho do céu. Você tem procurado imitar as
suas virtudes todos os dias?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, vos sóis imagem
perfeita da santidade de Deus, sois o molde
com o qual ele quer formar almas perfeitas.
Abandono-me em vossas mãos com confiança fi-
lial, desejo unir-me a voz e praticar vossas virtu-
des para que também chegue à santidade. Que
a vontade de Deus se cumpra em mim e que no

202
céu minha alma cante a sua glória juntamente
convosco, Santa Mãe. Amém!

PROPÓSITO
Todos somos chamados à santidade, porque
a graça dada no batismo nos torna capazes de
amar a Deus de todo coração e fazer a sua vonta-
de. Nossa Senhora vem hoje te ajudar nesse ca-
minho de perfeita identificação com Deus. Para
isso é necessário aceitar a vontade divina em to-
das as coisas que nos acontecem, sabendo que
“tudo concorre para o bem daqueles que amam
a Deus” (Rm 8,28). Por isso, coloque mais amor
em tudo aquilo que você fizer, veja a presença
de Deus em tudo e aceite os acontecimentos co-
mo vindos de sua mão.

7. A INTIMIDADE COM
A SANTÍSSIMA VIRGEM
MARIA NO COTIDIANO
Quando existe amor verdadeiro pela
Santíssima Virgem Maria ela passa a fazer parte

203
do cotidiano da vida de seus devotos. Não é pos-
sível que alguém ame uma determinada pessoa
e não a queira junto de si. A respeito dessa verda-
de São Luís Maria Grignion de Montfort ensina
que é necessário dar-se a Maria muitas vezes, ter
com ela um trato de intimidade que é próprio
de uma relação filial: “Não basta nos havermos
dado a Maria uma vez na qualidade de escravos.
Não basta mesmo fazê-lo todos os meses, todas
as semanas, seria uma devoção muito passagei-
ra e não elevaria a alma a perfeição a que é capaz
de se elevar”236. Resulta dessa doutrina que o
grau de santidade ao qual Deus quer elevar uma
alma depende em grande medida de sua asso-
ciação à Santíssima Virgem para que dando-se a
Deus por suas mãos, nada se perca.

As obras humanas são todas manchadas com


imperfeições, oferecê-las a Deus por conta pró-
pria é sempre entregar-lhe algo deficiente. Pelo
contrário, as obras de Maria são perfeitíssimas
porque essa Santa Virgem nunca teve nenhum
obstáculo que lhe impedisse de fazer tudo por
amor a Deus. “Em Maria não há noite, pois ela
jamais pecou, nem teve sequer a sombra de um

204
pecado. Maria é um lugar santo, o Santo dos san-
tos, em que se formam e modelam os santos”237.
Dada a sua perfeição, Maria pode gerar a vida
da fé dos homens em suas próprias entranhas,
seu parto se dará na eternidade quando entre-
gar todos ao bom Deus. As palavras de São Paulo
podem ser postas acertadamente nos lábios de
Maria: “Meus filhos, por quem sofro de novo as
dores de parto, até que Cristo seja formado em
vós”238. Maria pode e quer modelar os corações
humanos, mas não o fará se não houver uma
grande intimidade entre ela e seus devotos.

A Santíssima Virgem precisa ser imitada em


todas as suas ações. Se São Paulo pediu aos fiéis
que o imitassem: “Sede meus imitadores, como
eu mesmo o sou de Cristo”239, quanto mais não
se deve imitar a Maria que não somente imitou
os passos de seu filho, mas foi para Ele fonte de
aprendizado na vida virtuosa, o modelo huma-
no que Ele seguiu durante seus trinta anos de
escondimento em Nazaré. Se o verdadeiro devo-
to quer ter profunda intimidade com a Virgem
Mãe de Deus será preciso, como ensina São Luís,
“fazer todas as suas ações por Maria, com Maria,

205
em Maria e para Maria, a fim de fazê-las mais per-
feitamente por Jesus, com Jesus, em Jesus e para
Jesus.”240. A Virgem Santíssima viveu para Jesus,
quem pratica todas as ações em união com ela
não chegará a outro fim senão a viver também
para Cristo com todo seu espírito.

Fazer todas as ações por Maria significa pos-


suir o espírito que a animava que é o próprio
Espírito de Deus. O verdadeiro devoto deve re-
nunciar ao espírito do mundo, mas também a si
mesmo, abandonando a velha maneira de agir e
de pensar. Deve então fazer surgir na sua alma as
mesmas disposições que existiam na Santíssima
Virgem. São Luís deixa claro que este ponto é de
suma importância, pois “Entre tantos devotos
da Santíssima Virgem, só os que se conduzem
por seu espírito é que são devotos verdadeiros
e fiéis.”241. Portanto, a verdadeira devoção con-
siste num abandono por completo a Maria e
do mais profundo da alma dizê-la: “Abandono
a mim mesmo, entrego-me todo a vós, minha
querida Mãe, não quero saber de minha própria
vontade, mas apenas encontrar gosto em tudo o
que é vosso”. E assim, é necessário também fa-

206
zer a renovação destes atos de oferecimento e
de união a Maria depois de cada ação, para que
tudo esteja regado de seu espírito.

Fazer todas as ações com Maria significa imi-


tar o seu modo de agir, porque todas as obras de
Maria foram sempre perfeitas, sem nenhuma
espécie de mácula aos olhos de Deus. Realizar
todas as ações com Maria é atingir a perfeição
em tudo que se faz, pois todos somos “criados
em Cristo Jesus para as boas obras que Deus já
antes preparara para que nela andássemos”242.
Portanto, como ensina São Luís, se deve: “em
todas as ações olhar Maria como um modelo
acabado de todas as virtudes e perfeições, que
o Espírito Santo formou numa pura criatura,
e imitá-lo na medida de nossa capacidade.”243.
“Como Maria procederia nesta situação?” Essa
deve ser a principal pergunta que o verdadeiro
devoto precisa fazer, a fim de conseguir fazer to-
das as suas ações com Maria.

Fazer todas as ações em Maria é viver com a


Santíssima Virgem crendo que ela é o jardim de
Deus, onde Ele passeava e tinha um profundo

207
trato de amizade com ela. É neste jardim de de-
lícias que o verdadeiro devoto deve viver. “Este
lugar santíssimo é formado de uma terra virgem
e imaculada, da qual se formou e nutriu o novo
Adão, sem a menor mancha ou nódoa, por ope-
ração do Espírito Santo que aí habita.”244. Ela foi
chamada pelo Arcanjo Gabriel de “cheia de gra-
ça”245, portanto, como receptáculo do Altíssimo
ela pode sustentar todos os seus filhos com abun-
dância de graças que transbordam de sua alma.
Seus devotos, por sua vez, aproveitando-se des-
sas graças devem afastar todas as preocupações,
temores e escrúpulos, colocar em debandada os
inimigos da alma, e permitir que a imagem de
Cristo seja formada em suas vidas.

Fazer todas as ações para Maria é considerar


Maria como o fim próximo e intermediário en-
tre o devoto e Jesus Cristo, sem com isso descon-
siderar que Jesus é sempre o fim último de tudo
o que se faz. “É preciso fazer finalmente todas
as ações para Maria. Porque, desde que nos en-
tregamos completamente a seu serviço, é justo
que façamos tudo para ela, como um criado, um

208
servo, um escravo.”246. Movidos por esse amor e
essa sujeição à Santíssima Virgem, seus fiéis de-
votos devem defender a sua honra e seus privi-
légios, sustentar sua glória e atrair todo o mun-
do para si. Para isso, tantas vezes será necessário
combater todos maldizem a sua devoção e de-
sonram a Jesus Cristo. Portanto, quem tudo faz
para Maria, tudo faz para Jesus, pois seus cora-
ções possuem um único desejo, o de agradar ao
Eterno Pai em todas as coisas.

PARA REFLETIR:
• Deus nos deu a Santíssima Virgem Maria
para que ela seja um atalho para a nossa
santificação. Ela intercede por nós e cuida
das nossas necessidades, mas é necessário
ter intimidade com ela. Como está a sua re-
lação e intimidade com Nossa Senhora?

• Se tudo entregamos nas mãos de Nossa


Senhora, ela faz com que todas as coisas
se tornem perfeitas, por isso o verdadeiro
devoto faz tudo por Maria, com Maria, em
Maria e para Maria. Você vive assim?

209
AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, vós vivestes por
Jesus, com Jesus, em Jesus e para Jesus, agora eu
desejo viver por vós, convosco, em vós e para vós,
pois sei sem sombra de dúvidas que me levarás
a amar vosso Amado Filho com toda perfeição
de que sou capaz. Portanto, abandono-me em
tuas mãos e esqueço-me de mim para lembrar-
-me unicamente de vós, de vossas virtudes e de
vossa santidade. Ajuda-me a imitar os seus pas-
sos e a confiar em vossa poderosa ação de Mãe
misericordiosa. Amém!

PROPÓSITO
Toma a Virgem Maria por sua melhor com-
panhia e ela te conduzirá a Jesus. Ali o seu cora-
ção encontrará paz, alegria e liberdade. Por isso,
se você quer ser um verdadeiro devoto de Nossa
Senhora é preciso aprender a fazer todas as coi-
sas com o mesmo espírito dela. Tome como um
propósito para a sua vida de fazer todas as coisas
pensando em Maria, por amor a ela, e entregue
o fruto de todas as suas ações nas mãos dela pa-
ra que ela ofereça a Deus.

210
211
PARTE 4

O CONHECIMENTO
DE JESUS CRISTO
Chegamos enfim à última semana neste ca-
minho de preparação para a consagração à
Santíssima Virgem Maria. Agora serão 07 dias
de meditação sobre o conhecimento de Nosso
Senhor Jesus Cristo. A finalidade da devoção à
Santíssima Virgem é nos conduzir a seu Filho,
por isso aprenderemos que tudo o que se refere
a esta consagração está profundamente direcio-
nada para Jesus, pois Ele é o centro de tudo. Por
isso vamos rezar, meditar e colocar em prática
os ensinamentos dessa semana que é como um
coroamento de todo o processo de crescimento
espiritual que estamos fazendo. A perfeita con-

212
formidade de nossa vida com a de Jesus é o que
queremos alcançar, essa é a verdadeira santida-
de.

Para isso, você deve a cada dia rezar as seguin-


tes orações:

LADAINHA DO ESPÍRITO SANTO (P. 275)


AVE, MARIS STELLA (P. 273)
ORAÇÃO DE SANTO AGOSTINHO (P. 284)
LADAINHA DO SANTÍSSIMO NOME DE JESUS
(P. 286)
LADAINHA DO SAGRADO CORAÇÃO DE
JESUS (P. 290) (Opcional)

Além disso, deve fazer a meditação do dia e


colocar em prática os conselhos que se encon-
tram ao final de cada meditação.

Que Nosso Senhor Jesus Cristo te inspire


bons propósitos, te conceda todas as graças ne-
cessárias para conformar sua vontade a dele e
que assim você esteja totalmente preparado
(a) para entregar-se em suas mãos por meio da
Santíssima Virgem Maria.

213
1. A SANTÍSSIMA TRINDADE
É COMUNHÃO DE AMOR
Deus criou o homem para que tivesse uma
plena comunhão com Ele, fruindo da própria
felicidade de Deus, de sua bondade, amor e co-
nhecimento. Essa comunhão deve ser um refle-
xo da própria comunhão estabelecida no seio
da Santíssima Trindade. Não obstante, o pecado
se interpôs entre Deus e os homens e, por isso,
Deus precisou fazer um longo caminho revelan-
do-se progressivamente ao homem e chaman-
do-o novamente a essa comunhão. Por primei-
ro, Deus retirou Abraão do meio do politeísmo
e o convidou para constituir um povo que o
adorasse como Deus único. “Deus disse a Abrão:
“Sai da tua terra, da tua parentela e da casa de
teu pai, para a terra que te mostrarei. Eu farei de
ti um grande povo, eu te abençoarei, engrande-
cerei teu nome; sê uma benção!”247. Aceitando
o convite de Deus, Abraão tornou-se o pai da
fé, porque aceitou a vontade de Deus sem nem
mesmo saber para onde iria, apenas a confiança
cega em seu poder o guiava.

214
Progressivamente Deus foi estabelecendo
para o seu povo o modo como deveriam viver,
abandonando os comportamentos próprios
dos povos pagãos, aprendendo a amar o próxi-
mo e crendo na existência de um único Deus.
Por meio de seus mandamentos, pelas exorta-
ções dos patriarcas e profetas, Deus foi fazendo
o povo abrir-se à sua graça, embora não tenha si-
do um processo fácil, pelo contrário, foi longo e
cheio de recaídas. Mas séculos depois, quando a
fé do povo de Israel já havia chegado a uma soli-
dez maior, Deus enviou seu Filho ao mundo pa-
ra levar toda a revelação à plenitude. “Quando,
porém, chegou a plenitude do tempo, enviou
Deus o seu Filho, nascido de mulher, nascido
sob a Lei, para resgatar os que estavam sob a Lei,
a fim de que recebêssemos a adoção filial. E por-
que sois filhos, enviou Deus aos nossos corações
o Espírito do seu Filho, que clama: Abba, Pai!”248.
A entrada de Cristo no mundo traz um novo ca-
pítulo na história do povo de Deus, agora eles
saberão que Deus não é apenas único, mas que
também é trino em pessoas.

215
A primeira pessoa a receber a revelação de
que Deus é uma Trindade foi a própria Virgem
Maria quando recebeu o anúncio do Arcanjo
Gabriel de que seria Mãe do Filho de Deus e de
que isso se realizaria por obra do Espírito Santo.
Posteriormente, no Batismo de Jesus Deus reve-
la a todo o povo que Ele é trino: “O Espírito Santo
desceu sobre Ele em forma corpórea, como uma
pomba; e veio do céu uma voz: ‘Tu és o meu Filho
amado, em ti ponho minha afeição”249. Ainda
na Transfiguração de Nosso Senhor, a Trindade
mais uma vez se revela: “Ainda falava, quando
uma nuvem luminosa os cobriu com sua som-
bra e uma voz, que saía da nuvem, disse: ‘Este é o
meu Filho amado, em quem me comprazo, ou-
vi-o!’”250, Jesus se apresenta glorioso, enquanto
a nuvem que representa o Espírito Santo os en-
volve e a voz manifesta a presença do Pai. Ainda
em muitos outros momentos, Jesus vai dar a co-
nhecer a fé na Santíssima Trindade.

Em todos os acontecimentos as três pesso-


as divinas sempre se manifestam em perfeita
comunhão, porque tudo é obra da Trindade.

216
Essa verdade se assenta no fato de que “Deus
é Amor”251, por ser essa a essência de Deus, na
Trindade contempla-se o Pai, aquele que ama, o
filho, aquele que é amado e o Espírito Santo, o
amor entre o Pai e o Filho. A Trindade é uma co-
munhão perfeita de amor. Essa relação amorosa
da Santíssima Trindade é compreendida segun-
do a doutrina da Santa Igreja do seguinte modo:
Em Deus há uma única substância ou essência
divina, portanto, há um único Deus, tanto o Pai,
quanto o Filho e o Espírito santo são igualmente
Deus. “As pessoas divinas não dividem entre Si a
divindade única: cada uma delas é Deus por in-
teiro: O Pai é aquilo mesmo que o Filho, o Filho
aquilo mesmo que o Pai, o Pai e o Filho aquilo
mesmo que o Espírito Santo, ou seja, um único
Deus por natureza. Cada uma das três pessoas
é esta realidade, quer dizer, a substância, a es-
sência ou a natureza divina.”252. Portanto, há um
único Deus, porque uma só é a natureza divina
das três pessoas da Trindade.

Mas apesar da Trindade ser Una e a fé cató-


lica não professar a existência de três deuses, é
preciso ainda confessar que este único Deus é

217
uma trindade consubstancial. Isso significa que
o Pai, o Filho e o Espírito Santo são três pessoas
distintas entre si. O Pai não é o Filho, o Filho não
é o Pai e o Espírito e, por fim, o Espírito não é
nem o Pai, nem mesmo o Filho. Quem são cada
uma das pessoas da Trindade então? O Pai é des-
de toda eternidade Deus Todo Poderoso, é a fon-
te de todo ser, Ele é por excelência o Criador de
todas as coisas, a fonte e o fim de tudo. O Filho é
também Deus desde toda a eternidade, mas Ele
é a Sabedoria Eterna do Pai, gerado em seu seio.
Cristo é “a imagem do Deus invisível”253, “o res-
plendor da sua glória e a imagem da sua subs-
tância”254. É por meio de Jesus, o Verbo Eterno
que o Pai cria todas as coisas, segundo a sua ima-
gem. O Espírito Santo também é Deus desde to-
da a eternidade e procede do Pai e do Filho. Ele
é, por assim dizer, o laço de amor que une o Pai
e o Filho, o Espírito é ainda a força santificadora
que age sobre todas as coisas vivificando-as.

O mistério da Santíssima Trindade é o centro


da fé cristã, sem o qual nada poderia fazer senti-
do, porque todas as obras, desde a fundação do
mundo até a sua consumação na glória vindoura

218
é obra da Santíssima Trindade. “Da mesma for-
ma que a Trindade não tem senão uma única e
mesma natureza, assim também não tem senão
uma única e mesma operação. [...] Contudo, ca-
da pessoa divina cumpre a obra comum segun-
do sua propriedade pessoal.”255. Desse modo, as
três pessoas divinas concorrem na obra da cria-
ção, da redenção e da santificação com um amor
levado ao excesso.

O autor principal da obra da criação é Deus


Pai, todavia ele cria todas as coisas tendo seu
Filho Unigênito como a imagem perfeita. É por
meio de seu Verbo, de sua Sabedoria Eterna que
Deus Pai cria. Ainda o faz, colocando sobre su-
as criaturas o seu Espírito que a tudo santifica.
Sua maior obra é a oferta que faz de seu Filho ao
mundo, em resgate da humanidade. “O Pai tem
somente um Filho, igual a si próprio, que ama
como a si mesmo e por quem é infinitamente
amado. Esse Filho único ele nos dá, sacrifican-
do-o por nós, para restituir-nos a vida que haví-
amos perdido pelo pecado.”256. São João atesta o
grande amor do Pai em querer levar os homens
novamente à comunhão com a Trindade: “Com

219
efeito, de tal modo Deus amou o mundo, que
lhe deu seu Filho único, para que todo o que ne-
le crer não pereça, mas tenha a vida eterna”257.
Por meio de Cristo, Deus Pai recria a humanida-
de na ordem da graça e essa será a maior obra da
Santíssima Trindade.

O autor principal da obra da redenção é Jesus


Cristo, no entanto, Ele a realiza como obediên-
cia a seu Pai Eterno, entregando-se inteiramen-
te a Ele em sacrifício e oblação, assim prestou a
Deus um culto de adoração, ação de graças, sú-
plica e reparação perfeitas. “O Filho aceita jubi-
losa e generosamente a missão que lhe é confia-
da. Desde o primeiro momento da Encarnação,
oferece-se ao Pai como vítima para substituir
todos os sacrifícios da antiga Lei. Sua vida intei-
ra será um contínuo sacrifício, culminado pela
imolação no Calvário. Sacrifício que nasce do
amor que nos tem.”258. Pela oferta de Cristo as
portas do céu se abriram ao homem e agindo o
Espírito Santo em seus corações, pelo amor po-
derão dar-se inteiramente a Deus. Por isso, São
Paulo exorta a todos os fiéis: “Progredi na carida-
de, segundo o exemplo de Cristo, que nos amou

220
e por nós se entregou a Deus como oferenda e
sacrifício de agradável odor”259.

O autor principal da obra de santificação


das almas é o Espírito Santo, mas sua operação
se dá para transformar as almas na imagem do
homem perfeito, Jesus Cristo, a fim de que se
tornem um esplendor de glória para Deus Pai.
“Para completar sua obra envia-nos o Espírito
Santo, o amor consubstancial do Pai e do Filho,
que além de derramar em nossas almas a graça
e as virtudes infusas, especialmente a caridade,
dá-se a si mesmo para que possamos desfrutar,
não somente da sua presença e de seus dons,
mas também da sua própria pessoa.”260. Eis a vi-
da da alma, é o próprio Deus que a vivifica por
seu Espírito, “Porque o amor de Deus foi derra-
mado em nossos corações pelo Espírito Santo
que nos foi dado”261. O Espírito que é o próprio
amor não quer outra coisa senão unir os ho-
mens a Deus, levando-os ao seio da Trindade.

O homem, no entanto, poderia se questionar


a respeito da necessidade de saber sobre este
dogma tão precioso da fé cristã. A verdade é que

221
toda revelação de Deus é salvífica, Ele anuncia
aos homens o mistério insondável de sua co-
munhão trinitária porque deseja inseri-los em
seu seio, dando a conhecer essa realidade que
por enquanto se enxerga às apalpadelas pela
fé, mas que na eternidade será contemplada
em plenitude e esplendor. Porque “A vida eter-
na é esta: que eles te conheçam a ti, o único
Deus verdadeiro, e aquele que enviaste, Jesus
Cristo”262. No seio da Trindade, os homens en-
contrarão todas as respostas que buscaram,
sentirão a satisfação de todos os seus desejos
e serão eternamente felizes, como o próprio
Deus é.

PARA REFLETIR:
• Fomos criados para o céu, para viver em
comunhão com Deus e amá-lo de todo co-
ração. Nossa Senhora já vive essa alegria
e nos espera na eternidade. Você deseja o
céu acima de tudo nesta vida?

• A Santíssima Trindade é uma comunhão


de amor perfeitíssima e à sua semelhança
deve ser a família, a sociedade e a Igreja.

222
Você procura viver em comunhão com o
próximo buscando o bem de todos?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, sois o santuário e
repouso da Santíssima Trindade, o lugar onde o
Pai, o Filho e o Espírito Santo puderam ser ado-
rados, amados e glorificados como merecem.
Agora no céu contemplas em plenitude essa re-
alidade tão sublime e tens a maior felicidade
entre todos os anjos e santos. Eu desejo que a
Santíssima Trindade também faça morada em
minha alma, que realize a obra de perfeição que
tanto deseja, que torne a minha vida mais divi-
na que humana. Portanto rogo a vós e vos pe-
ço que apresenteis ao Pai, ao Filho e ao Espírito
Santo as súplicas que vos faço. Amém!

PROPÓSITO
Quando estamos em estado de graça a
Santíssima Trindade habita a nossa alma e po-
demos viver em profunda comunhão com nos-
so Deus. Essa é uma grande graça que Nossa
Senhora nunca deixou se perder em sua vida.

223
Hoje ela te convida a olhar para seu interior
e buscar a Deus no mais profundo do seu ser. Se
você expulsou Deus da sua alma por causa de al-
gum pecado, então é momento de pedir perdão
e acolher novamente Deus em sua alma. Sempre
se volte para o seu interior e nas suas orações
pensa que Deus que sustenta o universo inteiro
está dentro de você. Que Ele escolheu fazer mo-
rada em um coração tão pobre, mas que deseja
transformar esse mesmo coração.

2. JESUS CRISTO,
HOMEM E DEUS
A encarnação de Jesus Cristo no ventre de
Maria Santíssima constitui um mistério supre-
mo que a simples razão não é capaz de compre-
ender, somente pela fé o homem pode vir a en-
tender o que o Eterno Pai operou pelo Espírito
Santo no ventre puríssimo da Santíssima
Virgem, quando formou para seu Filho eterno
uma humanidade. Por conseguinte, o mundo
envolto em trevas necessitava de um salvador,
pois era incapaz de salvar-se a si mesmo. Ao lon-

224
go dos séculos, Deus mesmo se incumbiu de
preparar o tempo propício em que enviaria ao
mundo seu Filho dileto, a fim de que oferecesse
pelos homens um sacrifício que fosse capaz de
apagar sua pena eterna. Desse modo, a humani-
dade estava completamente separada de Deus,
mas no ventre da Virgem Maria se deu o matri-
mônio perfeito entre Deus e a humanidade. Ao
perguntar como se operaria a encarnação do
Verbo em seu ventre, visto que era uma virgem,
o Anjo responde a Maria: “O Espírito Santo virá
sobre ti e o poder do Altíssimo vai te cobrir com
a sua sombra; por isso o Santo que nascer será
chamado Filho de Deus”263. Verdadeiramente
Deus operou um milagre no ventre de Maria,
um milagre inesperado.

Durante toda a vida oculta de Cristo em


Nazaré a sua divindade passou despercebida aos
olhos de todos, sendo adorada somente nos co-
rações de Maria e José. Mas ao iniciar sua prega-
ção quis dar a conhecer a todos os homens qual
era a sua origem. Teve a graça de confessá-la o
apóstolo Pedro: “Tu és o Cristo, o filho do Deus
vivo”264. A partir desse momento Jesus passou

225
a comunicar qual era a sua missão entre os ho-
mens, demonstrando que ofereceria um sacrifí-
cio que fosse capaz de reparar os pecados da hu-
manidade e lhes abrir novamente as portas do
céu. De fato, “Deus amou tanto o mundo, que
entregou o seu Filho único, para que todo o que
nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”265.
Somente Cristo poderia imolar-se na cruz pela
salvação dos homens, porque ele é muito mais
do que um profeta, mais do que um semideus,
muito mais do que qualquer sábio, Jesus é Deus
eterno feito homem.

Jesus Cristo é antes de tudo uma pessoa divi-


na que habitava em luz inacessível, diz São João:
“No princípio era o Verbo e o Verbo estava com
Deus e o Verbo era Deus. No princípio, ele estava
com Deus. Tudo foi feito por meio dele e sem ele
nada foi feito. E o Verbo se fez carne e habitou
entre nós; e nós vimos a sua glória, glória que
ele tem junto do Pai como Filho único.”266. Ao fa-
zer-se homem, Jesus recebe uma nova natureza:
a humana, pois no céu ela era puro espírito, mas
ao encarnar-se Deus forma no ventre de Maria
um corpo e uma alma para Ele. Assim é preciso

226
confessar com a Igreja que “Jesus é inseparavel-
mente verdadeiro Deus e verdadeiro homem.
Ele é verdadeiramente o Filho de Deus que se
fez homem, nosso irmão, e isto sem deixar de
ser Deus, nosso Senhor.”267. A melhor maneira
de entender esse mistério tão sublime é fazen-
do duas perguntas a respeito de Jesus: 1) “O que
é Jesus?” E 2) “Quem é Jesus?”.

Quando se faz a pergunta “O que é Jesus?”


busca-se saber qual é a natureza de Cristo, por-
tanto para essa pergunta deve-se responder
que Jesus é verdadeiramente Deus e verdadei-
ramente homem. Jesus possui duas naturezas,
a humana e a divina. Mas quando se faz a segun-
da pergunta: “Quem é Jesus?” Então busca-se
saber sobre a sua pessoa, e para essa pergunta
se responderá que Jesus é a Segunda Pessoa da
Santíssima Trindade, o Verbo Eterno, portan-
to Deus. Essas duas perguntas ajudam a escla-
recer o mistério que a Igreja chama de União
Hipostática, que se trata da união das duas na-
turezas de Cristo sob sua única pessoa divina,
de tal modo que se deve confessar que Jesus
Cristo é uma pessoa divina com duas nature-

227
zas: a divina e a humana. Ele é “Verdadeiro Deus
e Verdadeiro Homem”268.

As duas naturezas de Cristo estão unidas,


mas não fundidas de maneira a se tornarem
uma confusão e mescla sem sentido, como tam-
bém estão distintas, mas não separadas. Assim
professa a fé da Igreja a qual todos os fiéis de-
vem aderir, que há “Um só e mesmo Cristo,
Senhor, Filho Único, que devemos reconhecer
em duas naturezas, sem confusão, sem mudan-
ça, sem divisão, sem separação. A diferença das
naturezas não é abolida pela sua união; antes,
as propriedades de cada uma são salvaguarda-
das e reunidas numa só pessoa e numa só hipós-
tase”269. Portanto, com isso admite-se que Jesus
sendo Deus quis também tornar-se humano, e
milagrosamente conseguiu fazer com que a sua
divindade assumisse a natureza humana sem,
contudo, suprimi-la dada a grandeza de sua na-
tureza divina. Em Cristo estão harmonicamente
as duas naturezas em uma única pessoa divina.

Jesus Cristo quis experimentar em sua pró-


pria carne puríssima todas as realidades huma-

228
nas. Se fez homem para amar os homens com
um coração verdadeiramente humano que pal-
pitasse por eles em todas as suas ações e pensa-
mentos. “O Filho de Deus trabalhou com mãos
humanas, pensou com uma inteligência huma-
na, agiu com uma vontade humana, amou com
um coração humano. Nascido da Virgem Maria,
tornou-Se verdadeiramente um de nós, seme-
lhante a nós em tudo, exceto no pecado”270. Não
obstante Cristo seja verdadeiramente um ser
humano, é necessário reiterar que sua pessoa é
divina e não humana, portanto, “A humanidade
de Cristo não tem outro sujeito senão a pessoa
divina do Filho de Deus, que a assumiu e a fez
sua desde sua concepção.”271. Nosso Senhor não
são duas pessoas com duas naturezas, Ele é Um
da Trindade, a segunda pessoa que assumiu a
condição humana. Por isso, “em sua alma como
em seu corpo, Cristo exprime humanamente
os modos divinos de agir da Trindade.”272, todas
as suas características divinas são reveladas em
sua própria maneira de se expressar no mundo.

Crer em todas essas verdades é entrar em co-


munhão com mistério tão admirável de Cristo

229
que se fez homem para tornar os homens par-
ticipantes de sua própria natureza divina. Esse
é o ensinamento de São João: “O Pai enviou seu
Filho como Salvador do mundo. Aquele que
confessa que Jesus é o Filho de Deus, Deus per-
manece nele e ele em Deus”273. Se o homem não
confessa a divindade de Cristo, então o mesmo
Cristo não poderá fazer nada por ele, porque
um mero homem não seria capaz de apagar os
pecados com que a humanidade ultrajou o co-
ração de Deus. Somente pela fé é possível reco-
nhecer Jesus como Deus e homem. “Nós anun-
ciamos Cristo crucificado, que para os judeus, é
escândalo, para os gentios é loucura, mas para
aqueles que são chamados, tanto judeus como
gregos, é Cristo, poder de Deus e sabedoria de
Deus.”274. Quem não tem essa fé, que a peça in-
sistentemente ao Senhor que lhe concederá.

PARA REFLETIR:
• Nosso Senhor Jesus Cristo é Deus que se fez
homem. Ele escolheu nossa pequenez para
ficar próximo de nós e nos ensinar o cami-
nho do amor. Você tem vivido em intimi-
dade com Jesus?

230
• Nossa Senhora gerou Jesus em seu ventre e
nos deu o maior presente que poderíamos
ganhar. Ela o amou e se dedicou inteira-
mente a Ele. O que você tem feito para de-
monstrar o seu amor a Jesus que se fez ho-
mem pela sua salvação?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, em vosso ventre
oferecestes morada para o próprio Deus. Vossa
relação com Ele supera infinitamente a de to-
dos os homens, pois ela é de ordem hipostáti-
ca. A carne e o sangue de Jesus foram recebidos
de vossa humanidade. Dai-me participar espiri-
tualmente desse mistério. Forma-me em vosso
ventre puríssimo para que eu possa receber de
vós todas as riquezas da graça que estão escon-
didas em Cristo. Amém!

PROPÓSITO
Jesus é um ser humano, mas é ao mesmo tem-
po uma pessoa divina, é o nosso Deus. Nossa
Senhora sabia perfeitamente disso e todas as ve-
zes que ela cuidava de Nosso Senhor, ela sabia

231
que em seus braços estava o Deus que a criou.
Quando Nossa Senhora amamentava Jesus, o
colocava para dormir, lhe dava banho, o acari-
ciava, ela tinha plena consciência de que ali não
estava um simples ser humano, mas o próprio
Deus. Ela te convida agora a adorar Jesus e a amá-
-lo de todo coração, pensando no quanto a sua
humanidade nos torna próximos dele. Sempre
que você comungar lembre-se que você está re-
cebendo o corpo, sangue, alma e divindade de
Jesus, ou seja, a sua humanidade e a sua divin-
dade.

3. A RESSURREIÇÃO
DE CRISTO PROVA SUA
DIVINDADE
No Jardim do Éden Adão e Eva foram tenta-
dos por Satanás e pecaram desobedecendo a
Deus. Como consequência de seu ato de revolta
contra o bom Deus eles perderam os dons pre-
ternaturais que o Criador lhes tinha concedido,
dentre eles, o ser humano estava agora destina-

232
do a morrer, não possuía mais a imortalidade
corporal. Todavia, num outro jardim Deus quis
fazer com que o novo Adão, Jesus Cristo, triun-
fasse sobre a morte. Por isso São Paulo ensina:
“Pela falta de um só a morte imperou através des-
te único homem, muito mais os que recebem a
abundância da graça e do dom da justiça reina-
rão na vida por meio de um só, Jesus Cristo”275.
Com sua ressurreição Cristo venceu, portanto,
o último inimigo do homem, colocando a mor-
te sob seus pés.

Nosso Senhor em suas pregações ensinou


incansáveis vezes que Ele era Deus verdadeiro
e convidou todos os homens a aderirem a essa
verdade. Muitos, cegos pela sua incredulidade
não se deixaram mover pelas palavras de Jesus
e sempre insistiam querendo novos sinais pa-
ra que pudessem crer. Jesus, no entanto, a to-
dos respondia: “Essa geração má pede um si-
nal, nenhum sinal lhe será dado, senão o sinal
de Jonas”276. Assim como Jonas esteve três dias
no ventre de uma baleia, o Filho de Deus ficaria
morto no sepulcro, mas no terceiro dia ressus-
citaria glorioso e essa seria a prova cabal de sua

233
divindade, pois somente um Deus é capaz de
operar esse mistério tão estupendo. Portanto,
“A ressurreição constitui, antes de mais, a con-
firmação de tudo quanto Cristo em pessoa fez
e ensinou. Todas as verdades, mesmo as mais
inacessíveis ao espírito humano, encontram a
sua justificação se, ressuscitando, Cristo deu a
prova definitiva, que tinha prometido, da sua
autoridade divina.”277. Depois da ressurreição o
homem está obrigado a crer nesse mistério, sob
pena de não poder se salvar se a ele rejeitar. “Se
confessares com tua boca que Jesus é Senhor e
creres em teu coração que Deus o ressuscitou
dentre os mortos, serás salvo.”278. A ressurreição
torna-se, portanto, a razão de toda a esperança
cristã.

Por sua ressurreição, Cristo insere o homem


numa nova dimensão da vida, dando à humani-
dade uma condição que não lhe é própria. O seu
corpo glorioso faz com que o homem tome posse
da porção da graça a ele reservado, de tal manei-
ra que a ressurreição já é a entrada da humani-
dade na vida divina de Deus. Por isso, “A ressur-
reição de Jesus foi a evasão para um gênero de

234
vida totalmente novo, para uma vida já não su-
jeita à lei do morrer e do transformar-se, mas si-
tuada para além disso: uma vida que inaugurou
uma nova dimensão de ser homem.”279. Agora
a humanidade glorificada de Nosso Senhor já
não está sujeita às necessidades da matéria, as
suas limitações, ele as transcende porque colo-
ca a humanidade numa condição gloriosa que
somente o próprio Deus a poderia elevar. A res-
surreição de Cristo já é a vitória de todos os ho-
mens e a esperança de ressuscitar com Ele para
uma vida nova. São Paulo tira a dúvida do cora-
ção incrédulo dos fiéis quando diz: “Se não há
ressurreição dos mortos, também Cristo não
ressuscitou. E, se Cristo não ressuscitou, vazia é
a nossa pregação, vazia também é a vossa fé”280.
É porque Cristo ressuscitou que todas as coisas
adquirem sentido.

O homem precisa crer neste mistério, por-


que a ressurreição de Cristo é o prelúdio do
que Deus operará no próprio homem. “Assim,
todavia, como Cristo destruiu nossa morte por
sua morte, assim por sua ressurreição reparou
nossa vida.”281. A ressurreição de Cristo é um ato

235
histórico, no qual o próprio Deus intervém na
história e na criação e pela ressurreição de Jesus
insere a humanidade em sua própria vida da
Trindade. Desse modo, “Cristo ressuscitou dos
mortos como primícias dos que morreram [...].
Do mesmo modo que em Adão todos morre-
ram, assim também em Cristo serão todos resti-
tuídos à vida”282. A ressurreição de Jesus é a fon-
te de esperança de toda a Igreja, é esse mistério
que dá sentido a toda a dinâmica da vida Cristã
que leva o homem a desejar ser uma nova cria-
tura: “Para que, assim como Cristo ressuscitou
dos mortos [...], também nós vivamos uma vida
nova”283.

Depois da morte de Cristo os discípulos fi-


caram muito desanimados, pois pensavam que
tudo tinha acabado, que a promessa de Jesus fa-
lhou e já não havia mais esperança de continuar.
No entanto, o ressurgimento de Cristo reacende
a chama em seus corações e lhes encoraja a acei-
tarem tudo o que fosse necessário, apenas para
poderem continuar a propagar o nome de Jesus
Cristo. Disso dá testemunho a própria Escritura:
“Chamaram de novo os apóstolos e açoitaram-

236
-nos com varas. E, depois de intimá-los a que não
falassem mais no nome de Jesus, soltaram-nos
Quanto a eles, saíram do recinto do Sinédrio
regozijando-se, por terem sido achados dignos
de sofrer afrontas pelo Nome.”284. A fé na ressur-
reição os impelia a irem sempre mais longe, a
alcançar mais almas, pois queriam salvar a mui-
tos pela fé na ressurreição.

A ressurreição é esperança de vida eterna, de


uma vida inextinguível. Por isso mesmo, Cristo
ressuscitou, “para que os vivos deixem de viver
para si próprios, mas vivam para Aquele que
morreu e ressuscitou por eles”285. Santo Tomás
ensina sobre esse ponto que “É manifesto, por-
tanto, que Cristo pode dizer-se primogênito dos
que ressurgem dos mortos não só pela ordem
do tempo, porque foi o primeiro que ressusci-
tou segundo o dito, mas também pela ordem
de causa, porque sua ressurreição é causa da
ressurreição dos outros, e pela ordem de digni-
dade, porque ressuscitou com mais glória que
os outros. Logo, a fé na ressurreição de Cristo
contém-na o Símbolo da Fé ao dizer: “ao tercei-
ro dia ressuscitou dos mortos”286. Portanto, fora

237
de Cristo, não há esperança de alcançar outro
gênero de vida. Crer na ressurreição de Nosso
Senhor, é crer que por causa dele um dia tam-
bém todo homem ressuscitará, terá um corpo
glorioso, não mais sofrerá, será inteiramente fe-
liz.

PARA REFLETIR:
Um dia no céu todo o nosso sofrimento
não mais existirá e Deus vai secar toda lágri-
ma de nossos olhos. O que nos dá essa certeza
é a Ressurreição de Jesus, porque Ele já venceu.
Você crê que um dia também ressuscitará com
Cristo para a vida eterna?

A Ressurreição de Jesus é uma fonte de espe-


rança para nossa vida. Portanto, a morte não é o
fim. Você confia no poder e na misericórdia de
Jesus para te salvar?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria já estás na eterni-
dade feliz contemplando aquele a quem tanto
amastes. Mais feliz do que todos os santos sois
vós, porque enquanto eles esperam a ressurrei-

238
ção da carne, vosso corpo já é glorioso. Diante
de vós me coloco para suplicar-vos o aumento
de minha fé na ressurreição de vosso Filho. Roga
ao Pai que derrame profusamente copiosas gra-
ças em Minh ‘alma para que minha fé aumente
sempre mais. Que eu não queira outra coisa, se-
não Cristo ressuscitado dentre os mortos. Assim
seja, amém!

PROPÓSITO
Todas as pessoas querem ser felizes. Nessa vi-
da é possível alcançar alguma felicidade, mas
não a plenitude da felicidade. Existem muitos
sofrimentos, angústias, tribulações, mas se cre-
mos na Ressurreição de Jesus também há espe-
rança de alcançarmos uma vida onde não haja
mais sofrimento. Nossa Senhora quer que você
creia nisso, por isso, todas as vezes que você es-
tiver triste, abatido ou desanimado lembre-se
que Jesus já venceu todos os inimigos, inclusive
a morte e que se você ter fé, Ele te ajudará a ven-
cer todos os obstáculos também.

239
4. A DOCE E ADORÁVEL
FACE DE DEUS
A entrada de Cristo no mundo por meio de
sua encarnação representa um novo capítulo
na história de fé do povo de Deus. Até a vinda
de Jesus o homem não sabia como Deus era, não
tinha dele uma imagem concreta, e dirigia-se a
Ele de forma indireta. Durante séculos afora o
povo suspirava suplicando a Deus: “Mostrai-nos
a Vossa face, ó Senhor”287, mas quando chegou a
plenitude do tempo, o tempo previsto por Deus
para a salvação da humanidade, então Jesus deu
a conhecer a face adorável de Deus. “Jesus Cristo
é o rosto da misericórdia do Pai. O mistério da
fé cristã parece encontrar nestas palavras a sua
síntese. Tal misericórdia tornou-se viva, visível
e atingiu o seu clímax em Jesus de Nazaré.”288.
Contemplando a Sagrada Face de Nosso Senhor
é possível ter um prelúdio daquela realidade
que será contemplada em plenitude na glória
celeste, onde o coração humano se encherá da
mais pura alegria de ver a Deus face a face.

240
Muitas vezes em Nazaré a Virgem Maria to-
cou o rosto adorável de Jesus, o beijou e reparou
tantas ofensas que ele viria a sofrer. No caminho
do Calvário, Verônica adora e por um gesto repa-
rador enxuga o rosto ferido de Cristo. Mas a to-
dos os homens, Nosso Senhor quis deixar uma
imagem de sua face adorável, deixou-a no Santo
Sudário de Turim. Neste tecido que envolveu o
corpo de Cristo em seu sepultamento ficou es-
tampada a imagem de Nosso Senhor. No entan-
to, ela não é uma pintura feita com tinta, pelo
contrário, nela se conserva o sangue de Cristo de
tipo AB mais comum entre os judeus. Por con-
seguinte, estudiosos constataram que os pólens
do tecido só existem em Jerusalém. Somente
em 1898 foi fotografado por Secondo Pia, onde
se obteve a primeira versão em negativo do teci-
do, tornando ainda mais clara a impossibilida-
de de ter sido falsificado séculos atrás, quando
ainda não havia tecnologia de reprodução tão
perfeita.

Da mesma maneira que Cristo deixou grava-


da a sua imagem no santo sudário, como uma
prova de sua morte e ressurreição, Ele deseja

241
muito mais gravar seu rosto de misericórdia nos
corações humanos. Todos aqueles que foram se-
pultados nas águas batismais, devem se tornar
Alter Christus, um outro Cristo, com a imagem
de sua glória. “Vós todos sois filhos de Deus pela
fé em Cristo Jesus, pois todos vós, que fostes ba-
tizados em Cristo, vos revestistes de Cristo”289. O
Cristão é uma imagem viva de Cristo ressuscita-
do presente no mundo, dando testemunho de
sua esperança. Portanto, toda a sua vida deve re-
velar a face amorosa de Deus, pois o cristão car-
rega em si as marcas de Cristo. Tal é a doutrina de
São Paulo quando afirma: “E nós todos que, com
a face descoberta, contemplamos como num es-
pelho a glória do Senhor, somos transfigurados
nessa mesma imagem, cada vez mais resplan-
decente, pela ação do Senhor, que é Espírito”290.
Todos os santos são, portanto, um reflexo fide-
líssimo da própria imagem de Cristo.

A face deve revelar em íntima conexão aqui-


lo mesmo que se passa no coração, tal como a
face de Cristo que expressava não outra coisa,
senão a sua imensa misericórdia e afabilidade
pelos homens. Por isso, “O rosto adorável de

242
nosso Salvador foi, sem dúvida, o índice e como
que o espelho fidelíssimo dos afetos que, como-
vendo-lhe de vários modos a alma, à semelhan-
ça das ondas que se entrechocam, chegavam ao
seu coração santíssimo e lhe excitavam as pulsa-
ções.”291. Como é serena, alegre e misericordio-
sa a face daquele que porta Jesus bem no fundo
do coração, trazendo-lhe bem gravado na alma
as marcas de seu amor. Cada homem e mulher
é verdadeiramente “Uma carta de Cristo [...] es-
crita não com tinta, mas com o Espírito de Deus
vivo, não em tábuas de pedra, mas em tábuas de
carne, nos corações!”292. Portanto, quando al-
guém vê um cristão, não deveria ter dúvidas a
respeito de quem ele serve, mas vendo sua ale-
gria, suas atitudes, seu rosto afável, lembrar-se
logo de Cristo que foi tudo isso.

Avidadagraçaqueocristãoviveécomoumselo
que é colocado sobre seu coração. Tal foi o ensina-
mento de Jesus quando lhe perguntaram sobre
o imposto devido a Cézar. Jesus disse: ‘“Mostrai-
me a moeda do imposto’. Apresentaram-lhe um
denário. Disse Ele: ‘De quem é esta imagem e a
inscrição?’ Responderam-lhe: ‘De Cezar’. Então

243
lhes disse: ‘Dai, pois, o que é de Cezar a Cézar, e
o que é de Deus, a Deus’.”293. Cristo queria com
isso ensinar que os homens pertencem a Deus
e, portanto, na alma cristã deve estar a imagem
viva de Deus, pois o cristão está revestido de
Cristo e por isso deve transparecer a sua face
adorável. Isso levava São Leão Magno a exortar
os fiéis: “Toma consciência, ó cristão, da tua dig-
nidade. E já que participas da natureza divina,
não voltes aos erros de antes por um comporta-
mento indigno de tua condição.”294.

A face adorável de Nosso Senhor é para todos


os homens um penhor da glória futura. Ela nos
chama a olhar para o céu, a desejar ardentemen-
te a suprema contemplação. No céu, as almas
contemplam sem cessar a face de Deus e isto
é a máxima felicidade, pois viveram à procura
desse rosto afável que preenche os corações e dá
sentido à vida. Em sua Poesia 20, intitulada Meu
céu na terra! Santa Teresinha descreve como a
face de Jesus nos remete à Pátria Celeste:

Tua face é a minha única Pátria,


Ela é o meu Reino de amor,

244
É a minha alegre Campina,
Meu doce Sol de cada dia.
Ela é o Lírio do vale
Cujo perfume misterioso,
Consola minha alma exilada
E a faz gozar da paz dos Céus 295

A alegria do Cristão é contemplar a Deus “Foi


Ele mesmo quem reluziu em nossos corações,
para fazer brilhar o conhecimento da glória
de Deus, que resplandece na face de Cristo.”296.
Portanto, A face de Nosso Senhor revela ao ho-
mem todos os mistérios insondáveis da graça
e, por isso, o salmista exclama: “Feliz o povo,
Senhor, que caminha na luz da Vossa Face!”297.
Feliz de quem já vive nesta vida contemplando
aquela face que contemplará eternamente no
céu.

PARA REFLETIR:
Jesus te olha e te ama com misericórdia. Ele
revelou a face de Deus para nós e espera que cor-
respondamos ao seu amor. Você está crescen-
do na intimidade com Jesus e revelando a sua
Sagrada Face?

245
Quem ama Jesus e procura imitá-lo, também
demonstra esse amor nas suas relações com o
próximo. Você se esforça por ser misericordioso
com as outras pessoas?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, a face adorável de
vosso amado Filho era vosso consolo em Nazaré.
O teu olhar se confundia com o Dele, podias to-
cá-lo, dizer-lhe palavras doces, amá-lo como Ele
sempre mereceu. Que alegria tivestes ao con-
templar a face do Deus Eterno. Peço-vos minha
Mãe que me ajudes a chegar a essa contempla-
ção. Que a Face de Cristo seja também minha
pátria de amor. Amém!

PROPÓSITO
Jesus disse à Madre Pierina Di Micheli que
quem contempla a sua Sagrada Face o consola.
Jesus sofre muitos ultrajes pelos pecados que se
cometem contra ele todos os dias. Por isso, Ele
nos chama a reparação dessas ofensas, pois são
como bofetadas em sua Face. A Virgem Maria
te convida hoje a ter um olhar compassivo por

246
Jesus, do mesmo modo como ela olhava para Ele.
Por isso, contemple alguma imagem de Jesus e
peça pela conversão dos pecadores.

5. A SANTÍSSIMA
EUCARISTIA É O MAIOR
TESOURO DA IGREJA
Nosso Senhor Jesus Cristo deu-se inteiramen-
te aos homens num sacrifício perfeito. Cumpriu
sua missão salvífica satisfazendo assim a justiça
devida ao Eterno Pai. Não obstante, levado pe-
lo grande amor que teve para com os homens
quis deixar-lhe uma prova desse amor e, por is-
so mesmo instituiu a Santíssima Eucaristia e o
sacerdócio. “Desejei ardentemente comer esta
páscoa convosco antes de sofrer”298, no Coração
Sacratíssimo de Cristo ardia uma chama de ca-
ridade tão grandiosa que ele quis deixar a si
mesmo para servir de alimento aos homens. “O
primeiro sinal do amor é que Jesus nos deu sua
carne para comer, seu sangue para beber. É pró-
prio do amor dar sempre e sempre receber. Ora,

247
o amor de Cristo é generoso. Dá tudo quanto
tem e tudo o que é.”299. A Eucaristia é instituía
por Nosso Senhor como um verdadeiro memo-
rial de sua paixão, morte e ressurreição e essa é
uma das provas mais sublimes de seu amor pe-
los homens.

Para o cristão, a Eucaristia é o maior tesouro


de sua vida, incomparável a qualquer outra coi-
sa. Ele toma parte no culto de sua própria sal-
vação e faz memória do Sacrifício eterno de seu
Salvador. A Santa Missa é, portanto, o culto per-
feito em que o homem se une ao sacrifício reden-
tor, recebendo a Jesus e dando-se inteiramente
a Ele. “Por ser memorial da Páscoa de Cristo, a
Eucaristia é também um sacrifício. O caráter sa-
crifical da Eucaristia é manifesto nas próprias
palavras da instituição.”300 Cristo se dá inteira-
mente nas espécies eucarísticas de pão e vinho.
Na noite em que ia ser entregue ele “Tomou um
pão, deu graças, partiu e deu-o a eles, dizendo:
‘Isto é o meu corpo que é dado por vós. Fazei is-
to em minha memória’. E, depois de comer, fez
o mesmo com o cálice, dizendo: ‘esse cálice é a
Nova Aliança em meu sangue, que é derramado

248
por vós.”301 Cristo não encena um teatro com seus
apóstolos, como pensam os protestantes que
blasfemam contra a Santíssima Eucaristia. Pelo
contrário, Cristo se dá verdadeiramente, ele diz
“Isto é o meu corpo”, não disse “Isto representa”,
portanto, o cristão precisa crer verdadeiramen-
te na presença real de Cristo na Eucaristia.

Comungar é o maior ato de gratidão, de re-


conhecimento e de amor que um cristão pode
realizar. Comer da carne e beber do sangue de
Cristo é fundamental para obter forças e chegar
à vida eterna. “Em verdade, em verdade, vos di-
go: se não comerdes a Carne do Filho do homem
e não beberdes o seu Sangue, não tereis a vida
em vós”302. Quando alguém comunga, mais do
que trazer Cristo em sua alma, é a própria alma
que se perde na imensidão do amor de Cristo.
Por isso, “Receber a Eucaristia na comunhão
traz como fruto principal a união íntima com
Cristo Jesus.”303 O amor sempre tende à união,
a Eucaristia é o Sacramento do amor, por isso
Jesus quer se unir à alma perfeitamente nesta
vida como uma antecipação da união que te-
rão na eternidade. Por isso, diz São Francisco de

249
Sales: “É justo que recebas por amor o que só por
amor te foi dado. Nem o Salvador pode ser con-
siderado numa ação mais amorosa e mais terna
que esta, em que por assim dizer se aniquila, e
se reduz a comida, a fim de penetrar em nossas
almas e de se unir intimamente ao coração e ao
corpo dos seus fiéis.”304.

Visto que o amor de Deus manifesto na


Eucaristia é tão extraordinário, é necessário que
todo fiel se aproxime desse augusto sacramen-
to com o maior respeito e devoção possíveis.
Ninguém tem dignidade suficiente para rece-
ber a comunhão, todavia é necessário ao menos
estar em estado de graça e nutrir um vivo desejo
de crescer no amor a Jesus. Receber a Eucaristia
de forma indigna é comungar a própria con-
denação e cometer um grave sacrilégio contra
Nosso Senhor. Ele se deu aos homens para que
pudessem ter a vida e não a morte. “A comunhão
é, pois, a primeira maneira de recebermos a Vida
Divina, à qual não temos mais direito do que a
pedra-mármore tem de vir algum dia a dar flor.
É apenas uma pura dádiva do Todo-Poderoso
que nos amou ao ponto de querer unir-Se a nós,

250
não por meio dos laços da carne, mas sim pelos
sagrados laços do Espírito, cujo amor não está
sujeito à saciedade, pois é feito de êxtase e ale-
gria.”305 Os verdadeiros devotos da Santíssima
Virgem Maria devem estar sempre atentos pa-
ra que não causem mais sofrimentos ao Senhor,
mas o amem, adorem e reparem.

Aos muitos que não creem na presença real


de Cristo na Eucaristia, Ele mesmo dá provas
de sua presença. As maiores provas já atestadas
na história da Igreja são os milagres eucarísti-
cos. O primeiro e mais eminente foi o Milagre
Eucarístico de Lanciano. Ele ocorreu por volta
do ano 700, no mosteiro de São Legoziano on-
de viviam os Monges de São Basílio na cidade
de Lanciano na Itália. Vivia ali um monge in-
crédulo a respeito da presença real de Cristo
na Eucaristia. Numa manhã enquanto celebra-
va a Santa Missa, após proferir as palavras da
Consagração, ele viu a hóstia converter-se em
Carne viva e o vinho em Sangue vivo diante de
seus olhos. Contemplando aquele fato milagro-
so dúvida foi imediatamente dissipada e ele ex-
clamou aos fiéis presentes: “Ó bem-aventuradas

251
testemunhas diante de quem, para confundir a
minha incredulidade, o Santo Deus quis desven-
dar-se neste Santíssimo Sacramento e tornar-se
visível aos vossos olhos. Vinde, irmãos, e admi-
rai o nosso Deus que se aproximou de nós. Eis
aqui a Carne e o Sangue do nosso Cristo muito
amado!”.

No século passado a Igreja permitiu que dois


cientistas, o Dr. Odoardo Linoli e o Prof. Ruggero
Bertelli, ambos de grande prestígio acadêmico,
pudessem realizar pesquisas e analisassem a
Carne e do Sangue do milagre de Lanciano. No
dia 4 de março de 1971 eles relataram o seguin-
te: “A Carne é verdadeira carne, o Sangue é ver-
dadeiro sangue. A Carne é do tecido muscular
do coração (miocárdio, endocárdio e nervo va-
go). A Carne e o Sangue são do mesmo tipo san-
guíneo (AB) e pertencem à espécie humana. No
sangue foram encontrados, além das proteínas
normais, os seguintes materiais: cloretos, fósfo-
ros, magnésio, potássio, sódio e cálcio. A conser-
vação da Carne e do Sangue, deixados em esta-
do natural por 12 séculos e expostos à ação de
agentes atmosféricos e biológicos, permanece

252
um fenômeno extraordinário.”

Cristo está verdadeiramente presente nos sa-


crários espalhados pela terra. Ele se faz presen-
te todas as vezes que um sacerdote pronuncia
as palavras da consagração. Ele continua a se fa-
zer carne para habitar nos corações humanos.
“A Eucaristia é verdadeiramente um pedaço de
céu que se abre sobre a terra; é um raio de gló-
ria da Jerusalém celeste, que atravessa as nu-
vens da nossa história e vem iluminar o nosso
caminho.”306. Que cada fiel ame cada vez mais a
Eucaristia, que viva por ela, deseje ardentemen-
te a comunhão e se aproxime dela com o cora-
ção puro e incendiado pela caridade do próprio
Cristo. A Eucaristia é o céu na terra.

PARA REFLETIR:
• Jesus está verdadeiramente presente nas
espécies de pão e vinho. Mesmo que nos-
sos olhos não possam enxergar a sua pre-
sença física ali, a fé nos dá essa certeza.
Você realmente crê na presença de Jesus no
Santíssimo Sacramento?

253
• Muitas pessoas perderam a fé e não amam
a Deus e o adoram como Ele merece. Por is-
so existem tantos sacrilégios. Você sempre
comunga em estado de graça e com fé?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, a eucaristia sempre
foi o penhor de vossa esperança. Vosso coração
ardia de amor ao receber o Corpo, Sangue, Alma
e Divindade de vosso Divino Filho das mãos de
São João. Não há dúvidas que as missas mais re-
paradoras foram as que assististes. De todo meu
coração vos peço essa fé, esse amor e essa espe-
rança. Dai-me receber vosso Cristo presente na
Eucaristia com todo amor e devoção. Assim se-
ja, amém!

PROPÓSITO
Deus espera que correspondamos ao seu
amor, Ele se entrega a nós sem reservas. Devemos
nos deixar guiar pela Virgem Maria para apren-
dermos a receber Jesus em nós, a adorá-lo e vi-
ver para Ele. Pense no quão grande era o amor
que Nossa Senhora tinha ao receber Jesus na
Eucaristia em cada Missa. Hoje ela te convida a

254
fazer uma boa preparação antes de comungar.
Tenha o firme propósito de ir para a fila da co-
munhão com o coração profundamente desejo-
so de comungar, além de fazer orações para se
preparar bem e estar em estado de graça.

6. O GRANDE SINAL DE
DEUS PARA A CONVERSÃO
DA HUMANIDADE
Para guiar o seu povo no caminho do bem
Deus sempre lhes concedeu sinais sensíveis
para que conhecessem qual era a sua vontade.
Como um Pai misericordioso, Deus nunca aban-
dona seus filhos, mesmo quando lhe são infiéis.
Ele está constantemente os chamando nova-
mente à comunhão com Ele. No entanto, desde
o Antigo Testamento Deus tem anunciado por
seus profetas que enviaria um grande sinal que
seria para todos fonte de salvação, este sinal é
uma virgem que conceberia um filho. “Pois sa-
bei que o Senhor mesmo vos dará um sinal: Eis
que a jovem está grávida e dará à luz um filho e

255
dar-lhe-á o nome de Emanuel.”307 Esse sinal é a
Santíssima Virgem Maria que traz em seu ven-
tre a salvação da humanidade.

Os sinais de Deus só podem ser compreendi-


dos pelos pequeninos, aqueles que são humil-
des para enxergar o agir de Deus nas coisas mais
desprezíveis. Ele escolheu a pequena cidade de
Davi para que fosse o lugar onde nasceria seu
Filho e somente aqueles que se despojaram de
si mesmos é que puderam contemplá-lo. Diz o
profeta Miquéias: “E tu, Belém-Éfrata, pequena
entre os clãs de Judá, de ti sairá para mim aque-
le que governará Israel. Por isso ele os abando-
nará até o tempo em que uma virgem dará à luz.
Então o resto de seus irmãos voltará para os is-
raelitas.”308 Quem poderia imaginar que Deus
viesse como homem, nascido de uma pobre fi-
lha de Nazaré, numa cidade tão pequena, des-
pojado de toda glória e força? Somente aqueles
que possuíam fé e eram humildes o reconhece-
ram.

Depois do pecado original, Deus disse que


haveria inimizade entre os obedientes da fé e os

256
desobedientes soberbos: “Porei inimizade entre
ti e a mulher, entre a tua descendência e a des-
cendência dela. Ela te esmagará a cabeça”309. Os
filhos de Maria liderados por ela triunfarão em
todas as suas batalhas contra Satanás, pois Maria
esmagará a cabeça da serpente e seu coração,
por fim, triunfará! Nestes tempos Maria conti-
nua a ser um sinal esplendoroso para apontar
aos homens o caminho da conversão e salvação,
visto que a cada dia a humanidade tem se afas-
tado mais da vontade de Deus, desprezando-o e
vivendo na iniquidade.

Nunca foi tão necessária a intercessão de


Maria pela conversão da humanidade como
nestes tempos, suas aparições de multiplica-
ram abundantemente nos últimos tempos e
isso é um sinal imperioso de que seu amor de
Mãe compreende com profundidade a perdição
em que o mundo se encontra. Por isso, “A for-
ça de que temos necessidade, na convulsão em
que se encontra o mundo nos tempos atuais, é a
oração de Maria, Mãe de todos os homens, que
nos obterá o favor do Salvador. Sua intercessão
é poderosíssima contra o espírito do mal que

257
levanta uns contra os outros, indivíduos, clas-
ses e povos. Se um pacto formal e plenamente
consentido com o demônio pode ter consequ-
ências tremendas na vida de uma alma e perdê-
-la para sempre, qual efeito espiritual não pro-
duzirá uma consagração a Maria feita com um
grande espírito de fé e frequentemente renova-
da com uma fidelidade maior?”310 A consagra-
ção à Santíssima Virgem será uma grande arma
contra todas as artimanhas de Satanás e seus
demônios, fará surgir uma grande fé e amor no
coração dos homens, a fim de que vivam apenas
para Deus.

A Virgem Santíssima apareceu diversas vezes


e em muitos lugares diferentes como um gran-
de sinal de Deus para comunicar aos homens os
seus divinos decretos e levá-los a uma conver-
são sincera. Em Quito Nossa Senhora do Bom
Sucesso alertava sobre os pecados de impureza
que se multiplicariam no século XX e XXI. Em
La Salette ela convidou os homens a honrarem
devidamente a Deus, guardando o seu dia san-
to, voltando aos costumes da Santa Religião
Católica. Em Fátima, Nossa Senhora pediu mais

258
uma vez a conversão da humanidade e alertou
sobre os males do comunismo, sobre as impure-
zas e a falta de fé. No México, Nossa Senhora de
Guadalupe salvou milhões de índios pagãos por
meio de seus milagres que até hoje são inexpli-
cáveis e assim uniu os povos do novo continen-
te. Em Lourdes, Garabandal, Akita, Medjugorje,
Ruanda, Paris, enfim, Nossa Senhora em todas
as aparições convidava os homens a voltarem o
coração para Deus e se converterem, fazerem pe-
nitência e rezarem muito, sobretudo o rosário,
a fim de que Deus não impusesse sobre o mun-
do a sua justiça, mas que ela fosse abreviada por
sua misericórdia.

Maria é o grande sinal pelo qual Deus quer


alertar o mundo dos perigos da perdição. Na
batalha final ela lutará ao lado dos seus filhos e
triunfará com eles. Portanto, “Maria permanece,
assim, diante de Deus e também diante de toda
a humanidade, como o sinal imutável e inviolá-
vel da eleição por parte do mesmo Deus, de que
fala a Carta paulina: ‘em Cristo nos elegeu antes
da criação do mundo ... e nos predestinou para
sermos seus filhos adotivos’ (Ef 1, 4. 5). Esta elei-

259
ção é mais forte do que toda a experiência do
mal e do pecado, do que toda aquela ‘inimiza-
de’ pela qual está marcada toda a história do ho-
mem. Nesta história, Maria permanece um sinal
de segura esperança.”311 Não existe, portanto, a
mínima possibilidade de derrota para Maria e
seus súditos fiéis, pois ela tem diante de Deus
uma força imperiosa da graça. É por isso que to-
dos devem recorrer a Maria e suplicar-lhe pela
conversão dos povos, porque “Maria, por sua
intercessão, obtém infalivelmente de seu Filho
tudo o que ela lhe pede, de modo não condicio-
nal, mas absoluto, em conformidade com as in-
tenções divinas, que ela não ignora.”312 Quantas
graças Maria quer derramar sobre o mundo,
mas só o fará se o mundo se voltar para Deus de
todo coração.

Maria é, sobretudo o grande sinal de Deus


porque ninguém pode como ela levar tantas
almas à conversão. Ela faz com seu amor mise-
ricordioso com que os homens vejam a perver-
sidade de suas ações e o quanto ferem a Deus.
Mas ainda mais, “A Santíssima Virgem nos faz
compreender que Deus, por pura misericórdia,

260
nos dá frequentemente mais do que o necessá-
rio, do que aquilo que ele deve em justiça nos
conceder; mostra-nos que ele frequentemente
também nos dá aquilo que está acima de nossos
méritos, como por exemplo a graça da comu-
nhão, que não nos é merecida. Ela nos faz com-
preender que a misericórdia se une à justiça nas
penas desta vida, que são como que um remé-
dio para nos curar, corrigir e fazer retornar ao
bem.”313 Que ninguém seja soberbo e despreze
as mensagens que a Santíssima Virgem traz do
céu, mas que a honrem numa veneração digna
dela e abracem a fé, escolham fazer penitência
e rezar constantemente para que Deus redobre
em misericórdia pela humanidade.

PARA REFLETIR:
• Se seguirmos os conselhos de Nossa
Senhora nós venceremos as batalhas que
enfrentamos. Em Fátima ela prometeu que
o seu Imaculado Coração triunfará. Você
tem obedecido o que Nossa Senhora ensi-
na, sobretudo a prática dos mandamentos?

261
• O grande sinal de Deus para a salvação da
humanidade nos foi dado por meio de
Maria. Você tem se aproximado mais de
Jesus e vivido uma vida mais santa por meio
da devoção à Nossa Senhora?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, quão grande é o
vosso amor de Mãe. És o sinal perfeito para to-
dos nós, um sinal que nos alerta sobre os perigos
que nos cercam e assim nos convidas a conver-
são. Não tenho forças minha querida Mãe para
abraçar a vontade de Deus, mas quero agarrar-
-me a vós e obter todas as graças necessárias pa-
ra ser fiel a Jesus. Roga por mim, derrama sobre
mim uma torrente de graças, a fim de que eu
corresponda mais perfeitamente ao chamado
de Deus. Amém!

PROPÓSITO
A Virgem Maria nos guiará no caminho do
amor e da paz. Ela nos chama à fidelidade ao
Evangelho, à prática dos mandamentos e a gene-
rosidade na vida de oração e de mortificação. Se
seguirmos os seus passos, por fim chegaremos

262
a Jesus, pois a finalidade da devoção mariana é
nos levar a plena comunhão de vida com Cristo.
Hoje, o seu propósito deve ser a obediência e o
abandono às mãos de Maria, para que somente
ela seja sua guia e consolo ao longo do caminho
do céu.

7. A CARIDADE NOS
UNE AO CRISTO
O homem foi feito para se unir a Deus em
uma vida pura e perfeita. Todo o seu ser aspi-
ra por Deus, deseja a verdade, tem sede de rea-
lização, busca o eterno, embora tantas vezes o
homem se distraia com os bens deste mundo e
acabe não reconhecendo que seu coração tem
necessidade unicamente de Deus. Mas muito
antes que o ser humano procure a Deus e o ame,
foi o próprio Deus que veio ao seu encontro e o
amou mesmo sem merecimento. Diz o apósto-
lo São João: “Ele nos amou primeiro”314. Amou
os homens quando eles nem mesmo poderiam
corresponder ao seu amor. Por eles criou o uni-
verso e todas as coisas que contem, ainda por

263
eles se revelou e deu a conhecer o mistério de
sua vida trinitária, mas a grande prova de seu
amor foi a entrega generosa que o Pai fez de seu
filho na cruz. “Deus amou tanto o mundo que
lhe deu seu Filho Unigênito”315. Diante de tanto
amor o coração humano precisa se render, caso
se feche para Deus estará dando as costas para o
seu bem supremo.

A Paixão de Cristo implica sérias consequên-


cias sobre a vida do homem. A primeira é que
por ser pecador havia contraído uma dívida
eterna com Deus, mas quando Jesus pagou essa
dívida o homem tem agora com ele uma dívida
ainda maior. Cristo deu sua vida em resgate da
humanidade, tirando-a da morte eterna a que
estariam condenados eternamente e o fez mo-
vido por um amor infinito. “Deus que é rico em
misericórdia, pelo excessivo amor com que nos
amou, quando estávamos mortos por nossos pe-
cados, vivificou-nos juntamente com Cristo”316.
Para retribuir com gratidão a Nosso Senhor por
tão grande bem, os homens devem amá-lo de
um modo sobrenatural e a Ele se unirem total-
mente com todas as potências da alma.

264
Para vir a conhecer e a amar Cristo de um
modo sobrenatural é necessário que o fiel em-
pregue a meditação a respeito dos mistérios
de Cristo, sobretudo de sua paixão, porque “A
meditação põe em ação o pensamento, a ima-
ginação, a emoção e o desejo. Esta mobilização
é necessária para aprofundar as convicções da
fé, suscitar a conversão do coração e fortalecer a
vontade de seguir a Cristo. [...] a oração cristã de-
ve ir mais longe: até ao conhecimento amoroso
do Senhor Jesus, até à união com Ele.”317 Isso tu-
do é sem dúvidas importantíssimo porque é o
amor que santifica a alma e, portanto, esse amor
só se adquire num contato íntimo com Nosso
Senhor. “Na meditação a alma deve elevar-se pa-
ra Deus sobre as duas asas da inteligência e da
vontade, ajudadas pelo sopro da graça. A medi-
tação é, pois, um movimento de conhecimento
e de amor inteiramente sobrenatural.”318 É co-
nhecendo que se pode amar e amando busca-se
conhecer ainda mais a Deus.

A meditação a respeito da paixão de Cristo


faz com que o fiel considere com profundidade

265
o excessivo amor com que foi amado e à medida
que a inteligência vai compreendendo esse mis-
tério, a vontade se une mais intimamente a essa
rica consideração e então vai surgindo na alma
o amor por Deus. Não há nada que possa fazer
uma pessoa progredir tanto no amor quanto
considerar os sofrimentos de Cristo em sua pai-
xão. Diz São Boaventura: “‘Se quereis progredir
no amor de Deus, meditai todos os dias a paixão
do Senhor. Nada contribui tanto para a santida-
de das pessoas como a paixão de Cristo’. E dizia
já Santo Agostinho: ‘Vale mais uma lágrima der-
ramada ao lembrar da Paixão, do que o jejum a
pão e água em cada semana’”319. Todos os sacrifí-
cios que se podem oferecer por Jesus, embora se-
jam muito válidos não são capazes de provocar
na alma a união pelo amor que a meditação de
sua paixão provoca. Portanto, a paixão de Cristo
é o principal meio pelo qual a alma progride ra-
pidamente na perfeição e forma em si mesma as
características de Nosso Senhor.

Quando alguém se põe a meditar está reali-


zando um exercício que coloca em movimento
as virtudes teologais: a fé é iluminada, a carida-

266
de vontade atraída para a união e a esperança
cresce no desejo de contemplar eternamente
Nosso Senhor no céu. Mas de tudo isso o mais
importante é o crescimento no amor, porque é
essa virtude que, de certa maneira, funde a al-
ma com cristo na máxima união das vontades.
Por isso Santo Afonso ensina que “Na Paixão do
Senhor não devemos considerar tanto as dores e
os desprezos que ele padeceu, como o amor com
que os suportou, pois se Jesus quis sofrer tanto,
não foi unicamente para salvar-nos, já que para
isso bastava uma simples oração sua, mas para
nos patentear o amor que nos consagra e assim
ganhar os nossos corações.”320 Fazendo essa ri-
ca consideração não como não corresponder
a Cristo que apela ao coração, porque “A cari-
dade de Cristo nos constrange”321. É impossí-
vel que alguém veja o excessivo amor com que
Deus amou os homens e não se deixe mover por
ele, por isso, a meditação é o melhor meio pa-
ra transformar os corações humanos, mesmo os
mais gélidos.

É dito popularmente que é mais fácil atrair


uma abelha com uma só gota de mel, do que com

267
um barril de vinagre. A propósito do amor de
Cristo deve se dizer que ele oferece aos homens
um mar de mel, para atraí-los e fazer com que
desejem ardentemente se unir a ele. Diz Santo
Afonso que “Nosso tempo não é mais o tempo
do temor, como era o dos Hebreus, mas é o tem-
po do amor, havendo um Deus morrido por nos-
sa salvação e para ser amado por nós. É artigo de
fé que Jesus nos amou e por nosso amor se en-
tregou à morte: ‘Cristo nos amou e se entregou
a si mesmo por nós’ (Ef 5,2).”322 Os verdadeiros
devotos devem acorrer a Cristo pela meditação
com o desejo de se entregarem de todo a Ele, de
tornarem-se um outro Cristo, de amá-lo como
Ele merece e quer ser amado. O fim desta devo-
ção é tornar os devotos uma imagem mesma de
Cristo, tal como a Virgem Maria o foi. O coração
de Maria palpitava com o de Cristo, amava-o em
todas as circunstâncias, sobretudo depois de sua
ascensão ao céu, a Santíssima Virgem constan-
temente se recordava da paixão de seu Filho e
meditava sobre ela, e com isso seu amor crescia
ainda mais, a ponto de que ela morreu de amor
e saudades de seu Filho, como ensina a tradição,
porque “o amor e forte, como a morte”323. Que

268
cada devoto da Santíssima Virgem possa mor-
rer de amor por Cristo Jesus, como ele morreu
pelos homens.

PARA REFLETIR:
• Nosso Senhor Jesus Cristo quer se unir a
nós e transformar nosso coração para que
possamos amá-lo de um modo extraordi-
nário. Você tem permitido que a graça ope-
re essa transformação na sua vida?

• Meditar na paixão de Cristo faz com que


nosso coração se transforme profunda-
mente. Esse era o exercício espiritual pre-
ferido dos santos. Você também medita na
paixão de Jesus?

AFETOS E RESOLUÇÕES
Santíssima Virgem Maria, creio firmemente
que vosso Filho deu a vida pela minha salvação.
Vós sois corredentora com Ele, oferecestes tam-
bém o vosso coração para me libertar do pecado.
Quero corresponder a esse amor, quero viver de
Cristo, dando-me inteiramente a Ele, mas quero
fazê-lo por vossas mãos. Ninguém se uniu mais
a Cristo do que vós, portanto, com vosso auxí-

269
lio desejo também conformar a minha vontade
com a do Divino Salvador. Me dou inteiramente
a Ele consagrando-me totalmente a vós. Que as-
sim seja, amém!

PROPÓSITO
Nossa Senhora se identificou em tudo com
seu filho Jesus. Enquanto Ele sofria a paixão em
seu corpo, ela suportava as mesmas dores na sua
alma. Isso fez com que o amor presente na alma
da Virgem Maria aumentasse sempre mais. Por
isso, hoje ela te convida a meditar sempre sobre
a paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo. Que a ca-
da dia você tire alguns minutos para refletir so-
bre as suas dores, todo seu sacrifício e o amor
infinito que demonstrou por nós.

270
APÊNDICE
EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS EM PREPAÇÃO
A CONSAGRAÇÃO A SANTÍSSIMA VIRGEM
MARIA SEGUNDO O MÉTODO DE S. LUIS
MARIA GRIGNION DE MONTFORT

I
DOZE DIAS PRELIMINARES
PARA DESAPEGAR-SE DO
ESPÍRITO DO MUNDO

VENI, CREATOR SPIRITUS

Oh vinde, Espírito Criador,


as nossas almas visitai

271
e enchei os nossos corações
com vossos dons celestiais.

Vós sois chamado o Intercessor,


do Deus excelso o dom sem par,
a fonte viva, o fogo, o amor,
a unção divina e salutar.

Sois doador dos sete dons,


e sois poder na mão do Pai,
por ele prometido a nós,
por nós seus feitos proclamais.

A nossa mente iluminai,


os corações enchei de amor,
nossa fraqueza encorajai,
qual força eterna e protetor.

Nosso inimigo repeli,


e concedei-nos vossa paz;
se pela graça nos guiais,
o mal deixamos para trás.

Ao Pai e ao Filho Salvador


por vós possamos conhecer.

272
Que procedeis do seu amor
fazei-nos sempre firmes crer.

V: Envia o vosso Espírito, e a tudo será criado.


R: E renovareis a face da terra.

Oremos. Ó Deus, que instruíste os corações


de vossos fieis com a luz do Espírito Santo, fazei
que conheçamos o que é reto, e gozemos sempre
as suas consolações. Por Cristo Nosso Senhor.
Amém.

AVE, MARIS STELLA

Ave, do mar Estrela,


bendita Mãe de Deus,
fecunda e sempre Virgem,
portal feliz dos céus.

Ouvindo aquele Ave


do anjo Gabriel,
mudando de Eva o nome,
trazei-nos paz do céu.

273
Ao cego iluminai,
ao réu livrai também;
de todo mal guardai-nos
e dai-nos todo o bem.

Mostrai ser nossa Mãe,


levando a nossa voz
a Quem, por nós nascido,
dignou-se vir de vós.

Suave mais que todas,


ó Virgem sem igual,
fazei-nos mansos, puros,
guardai-nos contra o mal.

Oh! dai-nos vida pura,


guiai-nos para a luz,
e um dia, ao vosso lado,
possamos ver Jesus.

Louvor a Deus, o Pai,


e ao Filho, Sumo Bem,
com seu Divino Espírito
agora e sempre. Amém.

274
II
PRIMEIRA SEMANA
PARA ADQUIRIR O
CONHECIMENTO
DE SI MESMO

LADAINHA DO ESPÍRITO SANTO

Senhor, tende piedade de nós.


Jesus Cristo, tende piedade de nós.
Divino Espírito Santo, ouvi-nos.
Espírito Paráclito, atendei-nos.

Deus Pai dos céus, tende piedade de nós.


Deus Filho, redentor do mundo,
Deus Espírito Santo,
Santíssima Trindade, que sois um só Deus.
Espírito da verdade,
Espírito da sabedoria,
Espírito da inteligência,
Espírito da fortaleza,
Espírito da piedade,
Espírito do bom conselho,

275
Espírito da ciência,
Espírito do santo temor,
Espírito da caridade,
Espírito da alegria,
Espírito da paz,
Espírito das virtudes,
Espírito de toda graça,
Espírito da adoção dos filhos de Deus,
Purificador das nossas almas,
Santificador e guia da Igreja Católica,
Distribuidor dos dons celestes,
Conhecedor dos pensamentos e das intenções
do coração,
Doçura dos que começam a vos servir,
Coroa dos perfeitos,
Alegria dos anjos,
Luz dos patriarcas,
Inspiração dos profetas,
Palavra e sabedoria dos apóstolos,
Vitória doa mártires,
Ciência dos confessores,
Pureza das virgens,
Unção de todos os santos,

276
Sede-nos propício, perdoai-nos, Senhor.
Sede-nos propício, atendei-nos, Senhor.

De todo o pecado, livrai-nos, Senhor.


De todas as tentações e ciladas do demônio,
De toda a presunção e desesperação.
Do ataque à verdade conhecida,
Da inveja da graça fraterna,
De toda a obstinação e impenitência,
De toda a negligência e tepor do espírito,
De toda a impureza da mente e do corpo,
De todas as heresias e erros,
De todo o mau espírito,
Da morte má e eterna,

Pela vossa eterna procedência do Pai e do Filho,

Pela milagrosa conceição do Filho de Deus,


Pela vossa descida sobre Jesus Cristo batizado,

Pela vossa santa aparição na transfiguração


do Senhor,
Pela vossa vinda sobre os discípulos do Senhor,
No dia do juízo,

277
Ainda que pecadores, nós vos
rogamos, ouvi-nos.

Para que nos perdoeis,


Para que vos digneis vivificar e santificar todos
os membros da Igreja,
Para que vos digneis conceder-nos o dom da
verdadeira piedade, devoção e oração,
Para que vos digneis inspirarmos sinceros afe-
tos de misericórdia e de caridade,
Para que vos digneis criar em nós um espírito
novo e um coração puro,
Para que vos digneis conceder-nos verdadeira
paz e tranquilidade no coração,
Para que vos digneis fazer-nos dignos e fortes,
para suportar as perseguições pela justiça,
Para que vos digneis confirmar-nos em
vossa graça,
Para que vos digneis receber-nos o número
dos vossos eleitos,
Para que vos digneis ouvir-nos,
Espírito de Deus,

Cordeiro de Deus que tirais os pecados do


mundo, envia-nos o Espírito Santo.

278
Cordeiro de Deus que tirais os pecados
do mundo, mandai-nos o Espírito
prometido do Pai.
Cordeiro de Deus que tirais os pecados do
mundo, dai-nos o Espírito bom.
Espírito Santo, ouvi-nos.
Espírito Consolador, atendei-nos.

V. Enviai o vosso Espírito e tudo será criado.


R. E renovareis a face da terra.

Oremos: Deus, que instruístes o coração de


vossos fiéis, com a luz do Espírito Santo, conce-
dei-nos que, no mesmo Espírito, conheçamos o
que é reto, e gozemos sempre as suas consola-
ções.

Por Cristo, Nosso Senhor. Amém.

LADAINHA DE NOSSA SENHORA

Senhor, tende piedade de nós.


Jesus Cristo, tende piedade de nós.
Senhor, tende piedade de nós.

279
Jesus Cristo, ouvi-nos.
Jesus Cristo, atendei-nos.

Pai celeste que sois Deus,


tende piedade de nós.
Filho, Redentor do mundo, que sois Deus,
tende piedade de nós.
Espírito Santo, que sois Deus,
tende piedade de nós.
Santíssima Trindade, que sois um só Deus,
tende piedade de nós.

Santa Maria, rogai por nós.


Santa Mãe de Deus,
Santa Virgem das Virgens,
Mãe de Jesus Cristo,
Mãe da divina graça,
Mãe puríssima,
Mãe castíssima,
Mãe imaculada,
Mãe intacta,
Mãe amável,
Mãe admirável,
Mãe do bom conselho,

280
Mãe do Criador,
Mãe do Salvador,
Virgem prudentíssima,
Virgem venerável,
Virgem louvável,
Virgem poderosa,
Virgem clemente,
Virgem fiel,
Espelho de justiça,
Sede de sabedoria,
Causa da nossa alegria,
Vaso espiritual,
Vaso honorífico,
Vaso insígne de devoção,
Rosa mística,
Torre de David,
Torre de marfim,
Casa de ouro,
Arca da aliança,
Porta do céu,
Estrela da manhã,
Saúde dos enfermos,
Refúgio dos pecadores,
Consoladora dos aflitos,
Auxílio dos cristãos,

281
Rainha dos anjos,
Rainha dos patriarcas,
Rainha dos profetas,
Rainha dos apóstolos,
Rainha dos mártires,
Rainha dos confessores,
Rainha das virgens,
Rainha de todos os santos,
Rainha concebida sem pecado original,
Rainha elevada ao céu,
Rainha do sacratíssimo Rosário,
Rainha da paz,

Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do


mundo, perdoai-nos Senhor.
Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do
mundo, ouvi-nos Senhor.
Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do
mundo, tende piedade de nós.

V. Rogai por nós, Santa Mãe de Deus,


R. Para que sejamos dignos
das promessas de Cristo.

282
Oremos. Senhor Deus, nós Vos suplicamos
que concedais aos vossos servos perpétua saúde
de alma e de corpo; e que, pela gloriosa interces-
são da bem-aventurada sempre Virgem Maria,
sejamos livres da presente tristeza e gozemos
da eterna alegria.

Por Cristo Nosso Senhor. Amém.

V. Rogai por nós, Rainha do


Sacratíssimo Rosário,
R. Para que sejamos dignos das
promessas de Cristo.

III
SEGUNDA SEMANA

PARA ADQUIRIR O CONHECIMENTO


DA SANTÍSSIMA VIRGEM

LADAINHA DE NOSSA SENHORA (P. 279)


LADAINHA DO ESPÍRITO SANTO (P. 275)
AVE, MARIS STELLA (P. 273)
RECITA DO ROSÁRIO OU AO MENOS UM TERÇO

283
IV
TERCEIRA SEMANA
PARA ADQUIRIR O
CONHECIMENTO DE
JESUS CRISTO

LADAINHA DO ESPÍRITO SANTO (P. 275)


AVE, MARIS STELLA (P. 273)

ORAÇÃO DE SANTO AGOSTINHO

Vós Sois, ó Jesus Cristo, meu Deus miseri-


cordioso, meu Rei infinitamente grande; sois
o meu Bom Pastor, o meu único mestre, o meu
auxílio cheio de bondade, o meu bem-amado
de uma beleza maravilhosa, o meu pão vivo, o
meu sacerdote eterno, o meu guia para a pátria,
a minha verdadeira luz, a minha santa doçura,
o meu reto caminho, sapiência minha preclara,
a minha pura simplicidade, a minha paz e con-
córdia; sois, enfim, toda a minha salvaguarda,
a minha herança preciosa, a minha eterna sal-
vação... Ó Jesus Cristo, amável Senhor, por que,

284
em toda a minha vida, não amei, por que não
desejei outra coisa senão Vós? Onde estava eu
quando não pensava em Vós? Ah! Que, pelo me-
nos, a partir deste momento o meu coração só
deseje a Vós e por Vós se abrase, Senhor Jesus!
Desejos da minha alma, correi, que já bastante
tardastes; apressai-Vos para o fim a que aspirais;
procurai em verdade Aquele que procurais. Ó
Jesus, anátema seja quem não Vos ama. Aquele
que não Vos ama seja repleto de amarguras. Ó
doce Jesus, sede o amor, as delícias, a admiração
de todo o coração dignamente consagrado à
Vossa glória. Deus do meu coração e minha par-
tilha, Jesus Cristo, que em Vós o meu coração
desfaleça, e sede Vós a minha vida. Acenda-se na
minha alma a brasa ardente do Vosso amor e se
converta num incêndio todo divino, a arder pa-
ra sempre no altar do meu coração; que inflame
o íntimo do meu ser, e abrase o âmago da mi-
nha alma; para que no dia da minha morte eu
apareça diante de Vós inteiramente consumido
em Vosso amor. Amém!

285
LADAINHA DO SS. NOME DE JESUS

Senhor, tende piedade de nós.


Jesus Cristo, tende piedade de nós.
Senhor, tende piedade de nós.

Jesus Cristo, ouvi-nos.


Jesus Cristo, atendei-nos.

Pai celeste que sois Deus,


tende piedade de nós.

Filho, Redentor do mundo, que sois Deus,


tende piedade de nós.
Espírito Santo, que sois Deus,
tende piedade de nós.
Santíssima Trindade, que sois um só Deus,
tende piedade de nós.

Jesus, Filho de Deus vivo,


Jesus, esplendor do Pai,
Jesus, pureza da luz eterna,
Jesus, Rei da glória,
Jesus, sol da justiça,
Jesus, Filho da Virgem Maria,

286
Jesus amável,
Jesus admirável,
Jesus, Deus forte,
Jesus, Pai do futuro do século,
Jesus, Anjo do grande conselho,
Jesus poderosíssimo,
Jesus pacientíssimo,
Jesus obedientíssimo,
Jesus, brando e humilde de coração,
Jesus, amante da castidade,
Jesus, amador nosso,
Jesus, Deus da paz,
Jesus, autor da vida,
Jesus, exemplar das virtudes,
Jesus, zelador das almas,
Jesus, nosso Deus,
Jesus, nosso refúgio,
Jesus, Pai dos pobres,
Jesus, tesouro dos fiéis,
Jesus, bom Pastor,
Jesus, luz verdadeira,
Jesus, sabedoria eterna,
Jesus, bondade infinita,
Jesus, nosso caminho e nossa vida,
Jesus, alegria dos anjos,

287
Jesus, Rei dos patriarcas,
Jesus, Mestre dos apóstolos,
Jesus, Doutor dos evangelistas,
Jesus, fortaleza dos mártires,
Jesus, luz dos confessores,
Jesus, pureza das virgens,
Jesus, coroa de todos os santos,

Sede-nos propício; perdoai-nos, Jesus.


Sede-nos propício; ouvi-nos, Jesus.

De todo o mal, livrai-nos, Jesus.


De todo o pecado,
De vossa ira,
Das ciladas do demônio,
Do espírito da impureza,
De morte eterna,
Do desprezo das vossas inspirações,
Pelo mistério da vossa santa Encarnação,
Pela vossa natividade,
Pela vossa infância,
Pela vossa santíssima vida,
Pelos vossos trabalhos,
Pela vossa agonia e paixão,

288
Pela vossa cruz e desamparo,
Pelas vossas angústias,
Pela vossa morte e sepultura,
Pela vossa ressurreição,
Pela vossa ascensão,
Pela vossa instituição da Santíssima Eucaristia,
Pelas vossas alegrias,
Pela vossa glória,

Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do


mundo, perdoai-nos, Jesus.
Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do
mundo, ouvi-nos, Jesus.
Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do
mundo, tende piedade de nós, Jesus.

Jesus, ouvi-nos.
Jesus, atendei-nos.

Oremos. Senhor Jesus Cristo, que disses-


tes: Pedi e recebereis; buscai e achareis; batei
e abrir-se-vos-á, nós vos suplicamos que conce-
dais a nós que vo-lo pedimos, os sentimentos
afetivos de vosso divino amor, a fim de que nós

289
vos amemos de todo o coração e que esse amor
transcenda por nossas ações, sem que deixemos
de vos amar.

Permiti que tenhamos sempre, Senhor, um


igual temor e amor pelo vosso santo nome; pois
não deixais de governar aqueles que estabele-
ceis na firmeza do vosso amor. Vós que viveis e
reinais pelos séculos dos séculos. Amém.

LADAINHA DO S. CORAÇÃO DE JESUS

Senhor, tende piedade de nós.


Jesus Cristo, tende piedade de nós.
Senhor, tende piedade de nós.

Jesus Cristo, ouvi-nos.


Jesus Cristo, atendei-nos.
Pai celeste que sois Deus,
tende piedade de nós.
Filho, Redentor do mundo, que sois Deus,
tende piedade de nós.
Espírito Santo, que sois Deus,
tende piedade de nós.

290
Santíssima Trindade, que sois um só Deus,
tende piedade de nós.
Coração de Jesus, Filho do Pai Eterno,
tende piedade de nós.

Coração de Jesus, formado pelo Espírito Santo


no seio da Virgem Mãe,
Coração de Jesus, unido substancialmente ao
Verbo de Deus,
Coração de Jesus, de majestade infinita,
Coração de Jesus, templo santo de Deus,
Coração de Jesus, tabernáculo do Altíssimo,
Coração de Jesus, casa de Deus e porta do céu,
Coração de Jesus, fornalha ardente de caridade,
Coração de Jesus, receptáculo de justiça e de
amor,
Coração de Jesus, cheio de bondade e de amor,
Coração de Jesus, abismo de todas as virtudes,
Coração de Jesus, digníssimo de todo o louvor,
Coração de Jesus, Rei e centro de todos os cora-
ções,
Coração de Jesus, no qual estão todos
os tesouros da sabedoria e ciência,
Coração de Jesus, no qual habita toda a
plenitude da divindade,

291
Coração de Jesus, no qual o Pai põe as suas com-
placências,
Coração de Jesus, de cuja plenitude nós todos
participamos,
Coração de Jesus, desejo das colinas eternas,
Coração de Jesus, paciente e misericordioso,
Coração de Jesus, rico para todos os que vos in-
vocam,
Coração de Jesus, fonte de vida e santidade,
Coração de Jesus, propiciação pelos nossos pe-
cados,
Coração de Jesus, saturado de opróbrios,
Coração de Jesus, atribulado por causa de nos-
sos crimes,
Coração de Jesus, feito obediente até à morte,
Coração de Jesus, atravessado pela lança,
Coração de Jesus, fonte de toda a consolação,
Coração de Jesus, nossa vida e ressurreição,
Coração de Jesus, nossa paz e reconciliação,
Coração de Jesus, vítima dos pecadores,
Coração de Jesus, salvação dos que esperam em
vós,
Coração de Jesus, esperança dos que expiram
em vós,
Coração de Jesus, delícia de todos os santos,

292
Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do
mundo, perdoai-nos Senhor.
Cordeiro de Deus, que tirais os pecados
do mundo, ouvi-nos Senhor.
Cordeiro de Deus, que tirais os pecados
do mundo, tende piedade de nós.

V. Jesus, manso e humilde de coração,


R. Fazei nosso coração semelhante ao vosso.

Oremos. Deus onipotente e eterno, olhai pa-


ra o Coração de vosso Filho diletíssimo e para os
louvores e as satisfações que ele, em nome dos
pecadores vos tributa; e aos que imploram a vos-
sa misericórdia concedei benigno o perdão em
nome do vosso mesmo Filho Jesus Cristo, que
convosco vive e reina por todos os séculos dos
séculos. Amém.

293
FÓRMULA DA CONSAGRAÇÃO
DE SI MESMO A JESUS CRISTO
PELAS MÃOS DE MARIA

Ó Sabedoria Eterna e Encarnada! Ó amabilís-


simo e adorável Jesus, verdadeiro Deus e verda-
deiro homem, Filho Unigênito do Pai Eterno e
da sempre Virgem Maria. Adoro-Vos profunda-
mente, no seio e nos esplendores do Vosso Pai,
durante toda a eternidade, e no seio virginal de
Maria, Vossa Mãe digníssima, no tempo da Vossa
Encarnação.

Eu vos dou graças por Vos terdes aniquilado


a Vós mesmo, tomando a forma de escravo, pa-
ra livrar-me da cruel escravidão do demônio. Eu
Vos louvo e glorifico por Vos terdes querido sub-
meter em tudo a Maria, Vossa Mãe Santíssima,
a fim de, por Ela, tornar-me Vosso fiel escravo.
Entretanto, ai de mim, criatura ingrata e infiel!
Não guardei os votos e promessas que tão so-
lenemente Vos fiz no Baptismo. Não cumpri as
minhas obrigações; não mereço ser chamado
Vosso filho, nem Vosso escravo; e, como nada
há em mim que não mereça a Vossa repulsa e a

294
Vossa cólera, não ouso aproximar-me por mim
mesmo de Vossa Santíssima e Augustíssima
Majestade. Recorro, pois, à intercessão e à mise-
ricórdia da Vossa Mãe Santíssima, que me des-
tes por medianeira junto de Vós. É por intermé-
dio d’Ela que espero obter de Vós a contrição e o
perdão dos meus pecados, a aquisição e conser-
vação da Sabedoria.

Ave, pois, ó Maria Imaculada, Tabernáculo


Vivo da Divindade, onde a Eterna Sabedoria es-
condida quer ser adorada pelos anjos e pelos
homens.

Ave, ó Rainha do Céu e da Terra, a cujo Império


é submetido tudo o que há abaixo de Deus!

Ave, ó Seguro Refúgio dos pecadores, cuja mi-


sericórdia a ninguém despreza. Atendei ao de-
sejo que tenho da Divina Sabedoria, e recebei,
para isso, os votos e ofertas apresentados pela
minha baixeza.

Eu, N..., infiel pecador, renovo e ratifico hoje,


nas Vossas mãos, as promessas do meu Baptismo:

295
renuncio para sempre a satanás, às suas pom-
pas e suas obras, e dou-me inteiramente a Jesus
Cristo, a Sabedoria Encarnada, para o seguir,
levando a minha Cruz, todos os dias da minha
vida. E para Lhe ser mais fiel do que até agora
tenho sido, escolho-Vos hoje, ó Maria, na pre-
sença de toda a Corte Celeste, por minha Mãe e
Senhora.

Entrego-Vos e consagro-Vos, na qualidade de


escravo, o meu corpo e a minha alma, os meus
bens interiores e exteriores, e o próprio valor
das minhas boas obras passadas, presentes e fu-
turas, deixando-Vos pleno e inteiro direito de
dispor de mim e de tudo o que me pertence,
sem excepção alguma, segundo o Vosso agra-
do e para maior glória de Deus, no tempo e na
eternidade. Recebei, ó Benigníssima Virgem,
esta pequenina oferta da minha escravidão, em
união e em honra à submissão que a Sabedoria
Eterna quis ter à Vossa Maternidade; em home-
nagem ao poder que ambos tendes sobre este
vermezinho e miserável pecador; em ação de
graças pelos privilégios com que Vos favoreceu
a Trindade Santíssima. Protesto que quero, de

296
hoje em diante e firmemente, como Vosso ver-
dadeiro escravo, buscar Vossa honra e obedecer-
-Vos em todas as coisas. Ó Mãe Admirável, apre-
sentai-me ao Vosso amado Filho na condição de
escravo perpétuo, a fim de que, tendo-me resga-
tado por Vós, por Vós também me receba propi-
ciamente. Ó Mãe de Misericórdia, concedei-me a
graça de obter a Verdadeira Sabedoria de Deus, e
de colocar-me, para isso, entre o número daque-
les que amais, ensinais, guiais, sustentais e pro-
tegeis como filhos e escravos Vossos. Ó Virgem
Fiel, tornai-me em tudo um tão perfeito discípu-
lo, imitador e escravo da Sabedoria Encarnada,
Jesus Cristo, Vosso Filho, que eu chegue um dia,
por Vossa intercessão e a Vosso exemplo, à ple-
nitude da sua idade na terra e da sua glória no
Céu. Amém. Assim seja!

ORAÇÃO A JESUS

Meu Amável Jesus, permiti que eu me dirija


a Vós, para Vos testemunhar o reconhecimento
pela graça que me tendes feito, dando-me a vos-
sa Santa Mãe pela devoção da escravidão, para

297
ser minha advogada junto à vossa majestade e o
complemento universal da minha grande misé-
ria. Infeliz de mim, Senhor, que sou tão miserá-
vel que, sem esta boa Mãe, estaria infalivelmen-
te perdido. Sim, em tudo Maria me é necessária
junto de Vós: necessária para Vos aplacar em vos-
sa justa cólera, pois vos tenho ofendido tanto,
todos os dias; necessária, para sustar os castigos
eternos de vossa justiça, que mereço; necessá-
ria, para Vos olhar, para Vos falar, Vos pedir, Vos
tornar propício e Vos agradar; necessária, para
salvar a minha alma e as dos outros; necessária,
em uma palavra, para fazer sempre a vossa santa
vontade e buscar em tudo a vossa maior glória.
Ah! Se eu pudesse publicar pelo universo es-
ta misericórdia que tivestes comigo; se todo o
mundo soubesse que, sem Maria, eu já estaria
condenado; se eu pudesse dar dignas ações de
graças por tão grande benefício! Maria está em
mim, haec facta est mihi. Oh! Que tesouro! Que
consolação! E, depois disto, não me entregaria
eu todo a Ela? Oh! Que ingratidão, meu caro
Salvador! Antes morrer do que esta desgraça!
Prefiro morrer a viver sem ser todo de Maria.
Mil e mil vezes A tomei por todo o meu bem, co-

298
mo São João Evangelista ao pé da cruz, e outras
tantas vezes me entreguei a Ela. Mas, meu bom
Jesus, se ainda não o fiz conforme os vossos de-
sejos, faço-o agora como quereis que o faça. Se
vedes alguma coisa em minha alma e meu cor-
po que não pertença a esta augusta Princesa,
peço-Vos arrancá-la e jogá-la longe, porque tu-
do que não pertence a Maria é indigno de Vós.
Ó Espírito Santo, concedei-me todas estas gra-
ças; e plantai, orvalhai e cultivai em minha alma
a amável Maria, que é a árvore de vida verdadei-
ra, a fim de que cresça, floresça e dê fruto de vida
em abundância. Ó Espírito Santo, dai-me uma
grande devoção e uma grande predileção por
vossa Esposa divina, um grande apoio em seu
seio de mãe e um recurso contínuo em sua mi-
sericórdia, para que nela formeis em mim Jesus
Cristo ao vivo, grande e poderoso, até a plenitu-
de de sua idade perfeita. Assim seja.

299
ORAÇÃO A MARIA PARA
SEUS FIÉIS ESCRAVOS

Ave, Maria, Filha bem-amada do Pai eter-


no; ave, Maria, Mãe admirável do Filho; ave,
Maria, Esposa fidelíssima do Espírito Santo;
ave, Maria, minha querida Mãe, minha amável
Senhora e poderosa soberana; ave, minha ale-
gria, minha glória, meu coração e minha alma!
Vós me pertenceis toda por misericórdia, e eu
vos pertenço todo por justiça. Mas não vos per-
tenço bastante, ainda; de novo me dou a vós to-
do inteiro, na qualidade de escravo perpétuo,
sem nada reservar para mim ou para outrem.

Se vedes em mim qualquer coisa que não


vos pertença, eu vos suplico de tirá-la agora, e
de vos tornar senhora absoluta de tudo o que
possuo; de destruir, desarraigar e aniquilar tu-
do o que desagrada a Deus, e de plantar tudo
e promover e operar tudo o que vos agradar.

Que a luz de vossa fé dissipe as trevas de


meu espírito; que vossa humildade profun-
da tome o lugar de meu orgulho; que vos-

300
sa contemplação sublime suste as distra-
ções de minha imaginação vagabunda; que
a vossa vista contínua de Deus encha a minha
memória de sua presença; que o incêndio de
vosso coração dilate e abrase a tibieza e a frie-
za do meu; que vossas virtudes substituam
os meus pecados; que vossos méritos sejam o
meu ornamento e suplemento perante Deus.

Enfim, muito querida e bem-amada Mãe,


fazei, se possível for, que não tenha outro es-
pírito senão o vosso, para conhecer Jesus
Cristo e suas divinas vontades; que não te-
nha outra alma senão a vossa, para lou-
var e glorificar o Senhor; que não tenha
outro coração senão o vosso, para amar a
Deus com um amor puro e ardente como vós.

Não vos peço visões, ou revelações, ou gozos,


ou mesmo prazeres, nem mesmo espirituais. É
privilégio vosso ver claramente, sem trevas; go-
zar plenamente, sem amargor; triunfar glorio-
samente à direita de vosso Filho, no céu, sem
humilhação alguma; dominar absolutamente
sobre os anjos, os homens e os demônios, sem

301
resistência, e, enfim, de dispor de todos os bens
de Deus, sem restrição alguma.

Eis, divina Maria, a ótima parte que o Senhor


vos deu e que não vos será tirada; e isto me de-
leita sobremaneira. Por minha parte, não quero
nesta terra senão o que vós tivestes, a saber: crer
puramente, sem nada gozar ou ver; sofrer ale-
gremente, sem consolação de criaturas; morrer
continuamente para mim mesmo, sem relaxa-
mento; e trabalhar resolutamente, até a morte,
por vós, sem interesse algum, como o mais vil
dos escravos.

A única graça que vos peço, por pura mise-


ricórdia, é que, em todos os dias e momentos
de minha vida, eu diga três vezes amém: Assim
seja, a tudo que fizestes na terra, enquanto nela
vivestes. Assim seja, a tudo que fazeis agora no
céu. Assim seja, a tudo que operais em minha
alma, a fim de que nela só vós estejais para glo-
rificar plenamente a Jesus em mim, no tempo e
na eternidade. Assim seja.

302
REFERÊNCIAS
¹ CaIC 408
² Jo 15, 18-19
³ Mc 8, 34-36
4
Jo 2, 15
5
Tg 4, 4
6
Tito 2, 11-12
7
Rm 12, 2
8
Tomás de Kempis. Imitação de Cristo. p. 22.
9
1 Jo 5, 4
10
Tomás de Kempis. Imitação de Cristo. p. 138.
11
Judas 1, 7
12
Cl 3, 5-6
13
2 Cr 7, 14
14
1 Jo 2, 16-17
15
Lc 4, 3
16
Gn 3, 4-5
17
Lc 4, 4
18
Lc 4, 7
19
Gn 3, 6
20
Lc 4, 8

303
21
Lc 4, 9-10
22
Gn 3, 6
23
Lc 4, 12
24
Gl 5, 17
25
São João Paulo II. Teologia do Corpo. Cat. 45 n.2;
Cat.19 n.4.
26
Idem, 51, 1
27
CaIC 1768
28
Pe. Tanquerey. Compêndio de Teologia Ascética e
Mística. p. 125
29
Gl 5, 19-21
30
Gl 5, 22-23
31
Gl 5, 16
32
Gn 1, 28
33
Ecle 1, 8
34
CaIC 2544
35
Mt 19, 24
36
Mt 6, 24
37
CaIC 2547
38
CaIC 2548
39
CaIC 2554
40
Mt 25, 35-36. 40
41
Mt 25, 34

304
42
1 Tm 6, 8-10
43
Ab 1, 3
44
Pe. Garrigou-Lagrange. As três idades da vida in-
terior, I, p. 367
45
Jr 2, 20
46
Ez 28, 2
47
Tg 4, 6
48
Is 55, 9
49
1 Cor 1, 27-29
50
Frei Maria-Eugênio, Quero ver a Deus. p. 316- 317
51
Santo Afonso de Ligório, A prática do amor a
Jesus Cristo. p. 115
52
Mt 23, 12
53
Santo Agostinho. Confissões. p. 16.
54
Pe. Garrigou-Lagrange, As três idades da vida in-
terior, I, p. 61
55
Tg 2, 17
56
Tg 2, 19
57
1 Cor 13, 2
58
1 Jo 2, 3
59
Gl 5, 6
60
Pe. Tanquerey. Compêndio de Teologia Ascética

305
e Mística. p.166.
61
1 Jo 5, 3-4
62
CaIC 2146
63
Fl 2, 9-10
64
Pe. Tanquerey. Compêndio de Teologia Ascética e
Mística. p.425-426.
65
CaIC 2143
66
Gn 2, 3
67
CaIC 2190
68
Sl 117, 24
69
Pe. Tanquerey. Compêndio de Teologia Ascética e
Mística. p.152
70
Santo Afonso de Ligório, A prática do amor a
Jesus Cristo. p. 30
71
1 Cor 6, 19
72
1 Cor 6, 13
73
Pe. Tanquerey. Compêndio de Teologia Ascética e
Mística. p. 444.
74
Ef 1, 18
75
Pe. Tanquerey. Compêndio de Teologia Ascética
e Mística. p. 477.
76
Rm 5, 5
77
Eclo 2, 11-13

306
78
Ef 4, 26-27
79
São Francisco de Sales. Filoteia. p. 178.
80
Tg 1, 19
81
Mt 11, 29
82
Pe. Tanquerey. Compêndio de Teologia Ascética e
Mística. p. 466.
83
Mt 5, 4
84
Eclo 7, 9
85
Pr 16, 32
86
Hb 10, 36
87
São Francisco de Sales. Filoteia. p. 160.
88
Pe. Tanquerey. Compêndio de Teologia Ascética e
Mística. p. 355
89
Santo Tomás de Aquino. Suma Teológica, II-II, q.
36. art. 1.
90
Gl 5, 26
91
Sb 2, 24
92
Tg 3, 14-15
93
Tg 3, 16
94
Pr 14, 30
95
1 Cor 13, 4
96
CaIC 2554
97
Jo 8, 44

307
98
CaIC 2467
99
Jo 18, 37
100
Jo 8, 32
101
Santo Tomás de Aquino. Suma Teológica, II-II,
q. 109. art. 2.
102
Ef 4, 25
103
Jo 8, 12
104
Pe. Garrigou-Lagrange. O homem e a eternida-
de. p. 42
105
Rm 3, 23-24
106
Jo 9, 39
107
Lc 18, 11- 12
108
Lc 18, 13
109
Lorenzo Scupoli. O combate espiritual. p. 21
110
CaIC 2733
111
Lorenzo Scupoli. O combate espiritual. p. 22
112
Pe. Tanquerey. Compêndio de Teologia Ascética e
Mística. p. 75
113
Fr. Antônio Royo Marin, O.P. Ser santo ou não
ser... eis a questão. p. 67
114
Sb 1, 13
115
Rm 6, 23
116
Pe. Garrigou-Lagrange. As três idades da vida in-

308
terior – Tomo I. p. 254
117
CaIC 356
118
Pe. Garrigou-Lagrange. As três idades da vida in-
terior – Tomo I. p. 254
119
Rm 5, 17
120
Ef 2, 4-5
121
Ef 2, 15-16
122
Rm 5, 20
123
CaIC 2000
124
Pe. Garrigou-Lagrange. As três idades da vida in-
terior – Tomo I. p. 32
125
Fr. Antônio Royo Marin, O.P. Ser santo ou não
ser... eis a questão. p. 69
126
2 Pe 1, 4
127
Jo 15, 4
128
Jo 3, 3- 4
129
Santa Elisabete da Trindade. Como encontrar o
Céu na Terra. p. 47.
130
Fr. Antônio Royo Marin, O.P. Ser santo ou não
ser... eis a questão. p. 70
131
Gl 2, 20
132
Pe. Garrigou-Lagrange. A Mãe do Salvador e a
nossa vida interior. p. 67

309
133
Pr 14, 12
134
São João Paulo II. O esplendor da verdade. 70.
135
Jr 2, 20
136
Santo Afonso de Ligório. Preparação para a
morte. p. 138.
137
Dn 9, 5
138
Santa Teresa de Jesus. Castelo Interior, Primeiras
Moradas II. 1,2. p. 445-446.
139
Santo Afonso de Ligório. Preparação para a
morte. p. 135.
140
São João Paulo II. O esplendor da verdade. 70.
141
Santo Afonso de Ligório. Preparação para a
morte. p. 141.
142
Pr 19, 16
143
1 Jo 1, 7
144
Lumen Gentium 2, 10
145
São Francisco de Sales. Filoteia. p. 32.
146
Mt 5, 48
147
Pe. Tanquerey. Compêndio de Teologia Ascética e
Mística. p. 267.
148
Santa Teresa de Jesus. Castelo interior: primeiras
moradas. Cap. 2. 12.

310
149
Santa Teresa de Jesus. Castelo interior: segundas
moradas. Cap. 1. 2.
150
Idem. Cap. 1. 5.
151
São João da Cruz. Noite escura. I, cap. VIII, 3.
152
Pe. Garrigou-Lagrange. As três idades da vida in-
terior – Tomo II. p. 647
153
São João da Cruz. Noite escura, II, cap. XI. 1
154
Fl 2, 5
155
Sb 3, 6
156
Gl 2, 20
157
São João da Cruz. Noite escura, p. 439.
158
Pe. Garrigou-Lagrange. As três vias e as três con-
versões. p. 87.
159
Santa Elisabete da Trindade. Como encontrar o
Céu na Terra. p. 52.
160
Sl 50, 19
161
Tg 4, 6
162
Rm 2, 4
163
Eclo 28, 2-4
164
Mt 18, 21-22
165
Sl 86, 5
166
Lc 23, 34

311
167
CaIC 2116
168
Ef 5, 10
169
CaIC 343
170
Hb 4, 16
171
S. Luís Maria Grignion de Montfort. Tratado da
Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem. p. 85.
172
Sl 41, 8
173
Jr 31, 34
174
Fl 3, 13-14
175
1 Jo 4, 18-19
176
Mt 6, 8
177
Sl 22, 1. 4
178
Is 43, 1. 3-4
179
Jr 1, 5
180
RH II, 8
181
Sl 26, 10
182
1 Pe 5, 7
183
Pe. Garrigou-Lagrange. A mãe do Salvador e nos-
sa vida interior. p. 61
184
Lc 1, 28
185
Denzinger, 1641
186
Santo Afonso de Ligório. Glórias de Maria. p.
295-296.

312
187
São Luís Maria Grignion de Montfort. Tratado
da verdadeira devoção. Cap. 1, art. 1
188
Jo 19, 26-27
189
Pe. Garrigou-Lagrange, A mãe do Salvador e nos-
sa vida interior. p. 242
190
Idem. p. 197
191
Fl 2, 5
192
São Luís Maria Grignion de Montfort. Tratado
da Verdadeira devoção. p. 110.
193
Idem.
194
Santo Afonso de Ligório. Glórias de Maria. p.
306.
195
Hb 5,16
196
Pe. Garrigou-Lagrange. A mãe do Salvador e nos-
sa vida interior. p. 165
197
Mt 15, 8
198
São Luís Maria Grignion de Montfort. Tratado
da Verdadeira devoção. p. 109
199
Santa Teresa de Jesus. Castelo interior: primeiras
moradas. Cap.1, 7.
200
Mt 6, 7-8
201
Lc 2, 51

313
202
São Luís Maria Grignion de Montfort. Tratado
da Verdadeira devoção. p. 103
203
Idem. p. 102
204
Lorenzo Scupoli. O combate espiritual. p. 144-
145.
205
Santo Afonso de Ligório. A Oração. p. 42.
206
São Luís Maria Grignion de Montfort. Tratado
da Verdadeira devoção. p. 111.
207
Suma Teológica II-II, q. 137, art. 1.
208
São Luís Maria Grignion de Montfort. Tratado
da Verdadeira devoção. p. 111.
209
Lucas 16, 10
210
Santo Afonso de Ligório. Glórias de Maria. p.
278
211
Reginald Garrigou-Lagrange. As três idades
da vida interior. p. 558.
212
Mt 25, 23
213
Mc 13, 13
214
São Luís Maria Grignion de Montfort. Tratado
da Verdadeira devoção. p. 112.
215
Mt 6, 33
216
Tratado, p. 108
217
1 Tm 2, 3-4

314
218
Fl 3, 7-9
219
Santa Elisabete da Trindade. Último Retiro:
Laudem Gloriae. p. 88
220
Cl 3, 1-3
221
Pe. Garrigou-Lagrange. O homem e a eternida-
de. p. 258.
222
1 Cor 13, 8. 12
223
Pe. Garrigou-Lagrange. O homem e a eternida-
de. p. 264-265.
224
São Luís Maria Grignion de Montfort. Tratado
da Verdadeira devoção. p. 110-111.
225
Lumen Gentium II, 11
226
Hb 12, 14
227
Fr. Antônio Royo Marin, O.P. Ser santo ou não
ser... eis a questão. p. 30
228
Santa Teresinha do Menino Jesus. História de
uma alma. p. 214
229
Ef 1, 4
230
Mt 5, 48
231
Santa Elisabete da Trindade. Obras Completas:
Como encontrar o Céu na Terra, p. 67
232
Fr. Antônio Royo Marin, O.P. Ser santo ou não
ser... eis a questão. p. 36

315
233
São Luís Maria Grignion de Montfort. Tratado
da Verdadeira devoção. p. 214-216
234
Santa Elisabete da Trindade. Obras Completas:
Como encontrar o Céu na Terra, p. 62
235
José Schrijvers. O dom de si. p. 22
236
São Luís Maria Grignion de Montfort. O gran-
de segredo para se chegar à santidade. p. 17.
237
São Luís Maria Grignion de Montfort. Tratado
da Verdadeira devoção. p. 214
238
Gl 4, 19
239
1 Cor 11, 1
240
São Luís Maria Grignion de Montfort. Tratado
da Verdadeira devoção. p. 243.
241
Idem. p. 244
242
Ef 2, 10
243
São Luís Maria Grignion de Montfort. Tratado
da Verdadeira devoção p. 246
244
Idem. p. 247
245
Lc 1, 28
246
São Luís Maria Grignion de Montfort. Tratado
da Verdadeira devoção. p. 251
247
Gn 12, 1-2
248
Gl 4, 4-6

316
249
Lc 3, 22
250
Mt 17, 5
251
1 Jo 4, 8
252
CaIC 253
253
Cl 1, 15
254
Hb 1, 3
255
CaIC 258
256
Pe. Tanquerey. Compêndio de Teologia Ascética e
Mística. p. 82
257
Jo 3, 16
258
Pe. Tanquerey. Compêndio de Teologia Ascética e
Mística. p. 82
259
Ef 5, 2
260
Pe. Tanquerey. Compêndio de Teologia Ascética e
Mística. p. 82
261
Rm 5, 5
262
Jo 17, 3
263
Lc 1, 35
264
Mt 16, 16
265
Jo 3, 16
266
Jo 1, 1-3. 14.
267
CaIC 469
268
CaIC 464

317
269
CaIC 467
270
GS 22, 2
271
CaIC 466
272
CaIC 470
273
1 Jo 4, 14-15
274
1 Cor 1, 23-24
275
Rm 5, 17
276
Mt 16, 4
277
CaIC 651
278
Rm 10, 9
279
Papa Bento XVI. Jesus de Nazaré. p. 524
280
1 Cor 15, 13-14
281
Santo Tomás de Aquino. Compêndio de Teologia.
p.475
282
1 Cor 15, 20-22
283
Rm 6, 4
284
At 5, 40-41
285
2 Cor 5, 15
286
Santo Tomás de Aquino. Compêndio de Teologia.
p.477
287
Sl 30
288
Papa Francisco. Misericordiae Vultus. Bula de
proclamação do Jubileu Extraordinário da

318
Misericórdia.
289
Gl 3, 26-27

290
2 Cor 3, 18
291
Papa Pio XII. Encíclica Haurietis Aquas. 26
292
2 Cor 3, 3
293
Mt 22, 19-21
294
Dos sermões de São Leão Magno. Ofício das
Leituras do Natal do Senhor.
295
Santa Teresinha do Menino Jesus. Obras
Completas: Escritos e últimos colóquios. p. 561.
296
2 Cor 4, 6
297
Sl 88, 16
298
Lc 22, 15
299
Santa Elisabete da Trindade. Obras completas.
p. 56
300
CaIC 1365
301
Lc 22, 19-20
302
Jo 6, 53
303
CaIC 1391
304
São Francisco de Sales. Filoteia. p. 143.
305
Fulton J. Sheen. O Calvário e a Missa. p. 52
306
Ecclesia de Eucharistia, 19

319
307
Is 7, 14
308
Mq 5, 1- 2
309
Gn 3, 15
310
Pe. Garrigou-Lagrange. A mãe do Salvador e nos-
sa vida interior. p. 266
311
João Paulo II. Redemptoris Mater I, 11
312
Pe. Garrigou-Lagrange. A mãe do Salvador e
nossa vida interior. p. 191
313
Idem. p. 212-213
314
1 Jo 4, 19
315
Jo 3, 16
316
Ef 2, 4-5
317
CaIC 2708
318
As três idades. p. 541
319
S. Afonso de Ligorio. A prática do amor a Jesus
Cristo. p. 22
320
S. Afonso de Ligorio. A paixão de nosso Senhor
Jesus Cristo. p. 143
321
2 Cor 5, 14
322
S. Afonso de Ligorio. A paixão de nosso Senhor
Jesus Cristo. p. 101
323
Ct 8, 6

320

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