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Crimes

TÍTULO VII
DOS CRIMES E DAS INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS

CAPÍTULO I
DOS CRIMES

SEÇÃO I
DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 225. Este Capítulo dispõe sobre crimes praticados contra a criança e o
adolescente, por ação ou omissão, sem prejuízo do disposto na legislação penal.

Apesar de o art. 225 anunciar que os crimes contra criança e adolescente podem ser
praticados por ação ou omissão, obviamente não se pode desconsiderar a necessidade de
uma lei penal anterior, escrita e estrita, determinando, com clareza, a conduta (comissiva
ou omissiva) que se busca incriminar.
Antes de se iniciar a análise de cada um dos crimes tipificados no Estatuto, duas
observações merecem ser feitas, e que servirão de substrato para na análise dos vários tipos:
uma relacionada à competência para a apuração dos crimes, outra sobre medidas protetivas
para o menor vítima ou testemunha de violência.
O art.148 do Estatuto nada prevê em relação à competência da Vara da Infância e da
Juventude para o julgamento de crimes praticados contra a criança e o adolescente.
Por esse motivo, em princípio, a Vara da Infância não detém tal competência, restrita
às Varas Criminais.
Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça, em diversas oportunidades, declarou a
incompetência da Vara da Infância e da Juventude para o julgamento de ações penais em
que se apurava a prática de crimes sexuais contra a criança e o adolescente, ainda que a lei
estadual.
Contudo, esse não foi o posicionamento que prevaleceu no Supremo Tribunal
Federal, o qual reconheceu ser legítimo que o Tribunal de Justiça, ao estabelecer a
organização e divisão judiciária, poderá atribuir a competência para o julgamento de crimes
sexuais contra crianças e adolescentes ao Juízo da Vara da Infância. A propósito:
Habeas corpus. Penal. Processual penal. Lei estadual. Transferência de competência.
Delitos sexuais do código penal praticados contra crianças e adolescentes. Juizados da infância
e juventude. Violação do art. 22 da CF/1988 e ofensa aos princípios constitucionais. Não
ocorrência. Ordem denegada. I – A lei estadual apontada como inconstitucional conferiu ao
Conselho da Magistratura poderes para atribuir aos 1.º e 2.º Juizados da Infância e Juventude,
entre outras competências, a de processar e julgar crimes de natureza sexuais praticados contra
crianças e adolescentes, nos exatos limites da atribuição que a Carta Magna confere aos
Tribunais. II – Não há violação aos princípios constitucionais da legalidade, do juiz natural e
do devido processo legal, visto que a leitura interpretativa do art. 96, I, a, da CF/1988 admite
que haja alteração da competência dos órgãos do Poder Judiciário por deliberação dos
Tribunais. Precedentes. III – A especialização de varas consiste em alteração de competência
territorial em razão da matéria, e não alteração de competência material, regida pelo art. 22 da
CF/1988. IV – Ordem denegada (HC 113.018, 2.ª T., j. 29.10.2013, rel. Min. Ricardo
Lewandowski, DJe 14.11.2013).

Em conformidade com o precedente, portanto, tem-se que a lei estadual poderá


autorizar o Tribunal de Justiça do Estado a expandir a competência da Vara da Infância e
da Juventude para a apuração de crimes praticados contra a criança e o adolescente. Agora,
com o advento da Lei n. 13.431/2017, mais uma “porta se abre”. Seu art. 20 diz que o
Poder Público poderá criar delegacias especializadas no atendimento de crianças e
adolescentes vítimas de violência. Até a criação do órgão especializado, a vítima será
encaminhada prioritariamente à delegacia especializada em temas de direitos humanos. O
art. 23, por sua vez, trata da organização judiciária, facultando aos órgãos responsáveis criar
juizados ou varas especializadas em crimes contra a criança e o adolescente, sendo que, até
a sua implementação, o julgamento e a execução das causas decorrentes das práticas de
violência ficarão, preferencialmente, a cargo dos juizados ou varas especializadas em
violência doméstica e temas afins.
Reza o referido art. 23: “Os órgãos responsáveis pela organização judiciária poderão
criar juizados ou varas especializadas em crimes contra a criança e o adolescente”.
Por fim, a nova Lei, ao estabelecer importante sistema de garantia de direitos da
criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência, manda qualquer pessoa que
tenha conhecimento ou presencie ação ou omissão, praticada em local público ou privado,
que constitua violência contra criança ou adolescente, comunicar o fato imediatamente ao
serviço de recebimento e monitoramento de denúncias, ao conselho tutelar ou à autoridade
policial, os quais, por sua vez, cientificarão imediatamente o Ministério Público (art. 13).
Constatado que a criança ou o adolescente está em risco, o art. 21 estabelece que a
autoridade policial requisitará (rectius: representará) à autoridade judicial responsável, em
qualquer momento dos procedimentos de investigação e responsabilização dos suspeitos,
as medidas de proteção pertinentes, entre as quais:
I - evitar o contato direto da criança ou do adolescente vítima ou testemunha de
violência com o suposto autor da violência;
II - solicitar o afastamento cautelar do investigado da residência ou local de
convivência, em se tratando de pessoa que tenha contato com a criança ou o adolescente;
III - requerer a prisão preventiva do investigado, quando houver suficientes indícios
de ameaça à criança ou adolescente vítima ou testemunha de violência;
IV - solicitar aos órgãos socioassistenciais a inclusão da vítima e de sua família nos
atendimentos a que têm direito;
V - requerer a inclusão da criança ou do adolescente em programa de proteção a
vítimas ou testemunhas ameaçadas; e
VI - representar ao Ministério Público para que proponha ação cautelar de
antecipação de prova, resguardados os pressupostos legais e as garantias previstas no art. 5.º
desta Lei, sempre que a demora possa causar prejuízo ao desenvolvimento da criança ou
do adolescente.
Art. 226. Aplicam-se aos crimes definidos nesta Lei as normas da Parte Geral do
Código Penal e, quanto ao processo, as pertinentes ao Código de Processo Penal.

Não dispondo o ECA em sentido contrário, a Parte Geral do Código Penal e, quanto
ao processo, as regras pertinentes ao Código de Processo Penal devem reger as infrações
penais praticadas contra a criança e o adolescente.
Art. 227. Os crimes definidos nesta Lei são de ação pública incondicionada.

Não sem razão, Nucci rotula este dispositivo como desnecessário: “Qualquer tipo
penal incriminador que não traga, especificamente, o alerta de se tratar de delito de ação
pública condicionada (‘somente se procede mediante representação’) ou de ação privada
(‘somente se procede mediante queixa’) é de ação pública incondicionada. Em suma, na
falta de disposição expressa, a ação é pública, promovida pelo Ministério Público, sem
qualquer condição de procedibilidade. Por isso, o art. 227 não tem efeito prático”. 569
Art. 227-A. Os efeitos da condenação prevista no inciso I do caput do art. 92 do
Decreto-lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), para os crimes
previstos nesta Lei, praticados por servidores públicos com abuso de autoridade, são
condicionados à ocorrência de reincidência. (Incluído pela Lei n. 13.869, de 2019)
Parágrafo único. A perda do cargo, do mandato ou da função, nesse caso,
independerá da pena aplicada na reincidência. (Incluído pela Lei n. 13.869, de 2019)

A sentença penal condenatória transitada em julgado possui outras consequências que


não apenas a submissão do condenado à execução forçada da pena imposta. Vislumbram-
se consequências de ordem penal e de ordem extrapenal, ou efeitos penais e extrapenais. 570
Considerando-se a redação do art. 227-A do Estatuto da Criança e do Adolescente
(incluído pela Lei n. 13.869/2019), interessa, neste momento, a análise dos efeitos
extrapenais, que comporta as seguintes subdivisões: efeitos extrapenais genéricos e
específicos.
Os efeitos extrapenais genéricos encontram-se tratados no art. 91 do Código Penal.
São automáticos e, por isso, independem de serem declarados na sentença. De outro lado,
os efeitos específicos são tratados no art. 92 do CP. Não são automáticos, “devendo ser
motivadamente declarados na sentença condenatória (art. 92, parágrafo único, do CP).
Têm apenas caráter preventivo, assegurando a eficácia da reprimenda principal, prevenindo
a reincidência”.571
Esclarecedora a lição doutrinária sobre a exigência de declaração expressa na sentença
do efeito extrapenal específico:
Esta fundamentação a que se refere o Código penal não se satisfaz com a mera reprodução
dos critérios objetivos previstos na lei para a aplicação de tais efeitos (...). Exige-se, ademais,
que o magistrado aponte a necessidade e adequação de tal medida às circunstâncias fáticas que
deram ensejo à condenação do acusado.572

E, também:
Outro detalhe importante acerca desses efeitos é que sua aplicação não está condicionada
à existência de requerimento expresso nesse sentido constante da peça acusatória. Ora, sendo
a perda do cargo, função pública ou mandato eletivo, conforme disposto no artigo 92 do
Código Penal, consequência da condenação, mostra-se dispensável a veiculação, na denúncia,
de pedido visando a sua implementação.573
Entre os efeitos extrapenais genéricos pode ser indicada a perda de cargo, função
pública ou mandato eletivo, que se bifurcam em efeitos administrativos e efeitos políticos
da condenação.574
Os efeitos administrativos estarão presentes quando da condenação de agentes
públicos administrativos, exercentes de cargo ou de função pública. 575 Considerando-se o
crime praticado, será possível identificar os seus pressupostos. Em comum às duas situações
previstas no Código Penal, tem-se a exigência da aplicação de pena privativa de liberdade.
Porém, para a perda do cargo ou da função pública, exige-se, no caso de crime
praticado com abuso ou violação de dever funcional, pena aplicada por tempo igual ou
superior a um ano; de outro lado, tratando-se de crimes comuns, exige-se pena privativa
de liberdade superior a quatro anos.
Uma vez sendo cientificado da sentença penal condenatória transitada em julgado e
da declaração do efeito da perda do cargo ou da função pública, compete ao superior
hierárquico competente proceder à demissão do servidor ou à cassação de sua
aposentadoria, não se exigindo, para tanto, a prévia instauração de procedimento
administrativo disciplinar.576
A perda do cargo, função pública ou mandato eletivo é efeito de caráter permanente,
de modo que o “agente não só perde o cargo, a função ocupada ou o mandato eletivo,
mas se torna incapacitado para o exercício de outro cargo, função pública ou
mandato”.577 Para que possa ocupar novo cargo, função pública ou mandato eletivo, exige-
se que o agente promova a reabilitação criminal (arts. 93 a 95 do CP). 578
O Estatuto da Criança e do Adolescente, assim como já ocorreu em outras leis,
encampou regramento especial no que tange à condenação nos crimes nele tipificados. Em
conformidade com o novo dispositivo, o efeito extrapenal administrativo, para os crimes
ali tipificados, praticados por servidores públicos com abuso de autoridade, são
condicionados à ocorrência de reincidência, independentemente da pena aplicada nesta última
condenação.
Portanto, podem ser destacadas duas diferenças básicas do efeito extrapenal de perda
do cargo, função pública ou mandato eletivo, no que tange aos delitos tipificados no
Estatuto da Criança e do Adolescente. São elas:
a) exigência de reincidência;
b) desnecessidade de se levar em conta a pena aplicada na reincidência.
Dessa maneira, ao contrário do que está previsto no art. 92 do CP, que leva em conta
o tempo da pena privativa de liberdade, o Estatuto da Criança e do Adolescente não o
considera, impondo-se, em contrapartida, a reincidência.
Em resumo, são requisitos para a incidência do efeito extrapenal genérico
administrativo previsto no Estatuto:
Efeito extrapenal genérico administrativo da sentença penal condenatória no Estatuto da Criança e do Adolescente

Exigência de que o crime esteja tipificado no Estatuto.

Praticado por servidor público com abuso de autoridade (elemento subjetivo).

Reincidência.

Sentença penal condenatória que aplica pena privativa de liberdade, independentemente do tempo da condenação.
Merece destaque a necessidade de que se leve em conta o conceito de servidor público
previsto no art. 327, caput e § 1º, do Código Penal, de modo a englobar vários agentes
públicos.
Por fim, os efeitos políticos dizem respeito à perda de mandato eletivo, sendo
primorosa a seguinte lição:
Com o advento da Constituição Federal de 1988, mais precisamente em face do disposto
no seu artigo 15, inciso III, a perda do mandato eletivo já não mais se submete às regras do
Código Penal, sendo consequência de toda e qualquer condenação criminal transitada em
julgado, mesmo que não declarada expressamente na sentença. Independe, ainda, da natureza
do crime, da qualidade e quantum da pena efetivamente imposta. Nem mesmo o fato de ter
sido o agente, eventualmente, beneficiado com a suspensão condicional da pena impede a
perda do mandato eletivo.579

Consoante a citada lição doutrinária, o efeito extrapenal específico político não está
mais disciplinado no Código Penal, mas ao art. 15, III, da Constituição Federal (suspensão
de direitos políticos em razão de condenação criminal transitada em julgado, enquanto
durarem os seus efeitos).580
Assim, embora o art. 227-A do Estatuto da Criança e do Adolescente tenha
mencionado a perda do cargo, do mandato ou da função (parágrafo único), torna-se claro
que a incidência do efeito político, prevista no Estatuto, é inconstitucional.
Efeito extrapenal genérico político da sentença penal condenatória previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente é
inconstitucional.

Em relação aos parlamentares do Congresso Nacional, não se aplica o art. 15, III, da
Constituição Federal, mas o § 2.º do art. 55, de modo que a “ perda do mandato será
decidida pela Casa a que pertence o parlamentar, por voto da maioria absoluta, mediante
provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso
Nacional, assegurada ampla defesa”.581
Há crítica doutrinária sobre esse posicionamento, que poderia levar a uma situação
esdrúxula, pois se permitirá que um Deputado Federal, por exemplo, ainda que em
cumprimento de sentença penal condenatória transitada em julgado, pudesses exercer o
seu mandato por consequência à falta de deliberação da Casa a que pertencer. Nesse
sentido, já foi alertado que:
Ocorre que, conforme já mencionamos anteriormente, o art. 15, inciso III, da
Constituição Federal elege a condenação transitada em julgado como causa de suspensão dos
direitos políticos (trata-se de suspensão porque a privação dos direitos políticos vigora apenas
enquanto incidentes os efeitos da condenação). Diante disso, instala-se a celeuma: a perda do
mandato eletivo é consequência natural da condenação criminal definitiva, bastando à Mesa da
Casa Legislativa respectiva declará-la, ou deve haver deliberação do Plenário para decretar a
perda do mandato?582

O Supremo Tribunal Federal teve a oportunidade de debater o tema em duas


oportunidades. A primeira foi na AP 470, quando foi afastada a incidência de juízo político,
pois foi reconhecido que a perda de mandato eletivo é efeito irreversível da sentença
condenatória. Posteriormente, na AP 565, com a sua composição alterada, o STF decidiu
que compete à Casa Legislativa deliberar sobre a perda do mandato.
Importante a posição de Rogério Sanches Cunha a respeito do tema:
Data maxima venia, não se afigura razoável admitir que um parlamentar tenha seus
direitos políticos suspensos em decorrência de condenação criminal e, ao mesmo tempo,
mantenha seu mandato legislativo até que haja pronunciamento da Câmara dos Deputados ou
do Senado Federal a respeito da perda. E não é razoável porque se instaura o sério risco de que
tenhamos a escatológica figura do parlamentar-presidiário diante da possibilidade de que a
Câmara ou o Senado votem contrariamente à cassação, como, aliás, ocorreu em passando
recente, em que o Supremo Tribunal Federal condenou um deputado federal (AP 396), mas
não se pronunciou sobre a perda do mandato. Coube, pois, à Câmara dos Deputados votar a
respeito, e, diante da falta de votos suficientes, a cassação do mandato não prosperou e o
condenado iniciou o cumprimento da pena em regime fechado mantendo seu status de
parlamentar.583

De fato, a possibilidade de, ainda que ocorra a sentença penal condenatória, o


parlamentar livrar-se da cassação do mandato não é a melhor saída para a solução da
questão, colocando-se em xeque a própria autoridade do Supremo Tribunal Federal.

SEÇÃO II
DOS CRIMES EM ESPÉCIE

Art. 228. Deixar o encarregado de serviço ou o dirigente de estabelecimento de


atenção à saúde de gestante de manter registro das atividades desenvolvidas, na
forma e prazo referidos no art. 10 desta Lei, bem como de fornecer à parturiente ou a
seu responsável, por ocasião da alta médica, declaração de nascimento, onde
constem as intercorrências do parto e do desenvolvimento do neonato:
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.
Parágrafo único. Se o crime é culposo:
Pena – detenção de 2 (dois) a 6 (seis) meses, ou multa.

• Sujeitos do delito
Trata-se de crime próprio, podendo figurar como sujeito ativo somente o
encarregado do serviço ou o dirigente do estabelecimento de atenção à saúde da gestante. 584
Sujeito passivo será a criança recém-nascida, a quem poderá interessar, no futuro,
saber das intercorrências do parto. Também podem ser considerados sujeitos passivos
(secundários) a parturiente e o genitor do neonato, pois que interessados direta e
imediatamente em saber todos os passos do atendimento e as circunstâncias do nascimento.
• Tipo objetivo
Pune-se a conduta de deixar (omitir-se, abster-se) o encarregado de serviço ou o
dirigente de estabelecimento de atenção à saúde da gestante de manter 585 registro das
atividades desenvolvidas, na forma e prazo referidos em lei (art. 10 da Lei n. 8.069/1990),
bem como de fornecer à parturiente ou a seu responsável, por ocasião da alta médica,
declaração de nascimento, em que constem as intercorrências do parto e do
desenvolvimento do neonato.
Apesar de o tipo penal mencionar o art. 10 do ECA como complemento somente da
primeira omissão criminosa (deixar de manter registro das atividades desenvolvidas...), na
realidade também complementa, implicitamente, a segunda (deixar de fornecer declaração
de nascimento...). Dispõe o citado artigo:
“Os hospitais e demais estabelecimentos de atenção à saúde de gestantes, públicos e
particulares, são obrigados a: I – manter registro das atividades desenvolvidas, através de
prontuários individuais, pelo prazo de 18 (dezoito) anos; II – identificar o recém-nascido
mediante o registro de sua impressão plantar e digital e da impressão digital da mãe, sem
prejuízo de outras formas normatizadas pela autoridade administrativa competente; III –
proceder a exames visando ao diagnóstico e terapêutica de anormalidades no metabolismo
do recém-nascido, bem como prestar orientação aos pais; IV – fornecer declaração de
nascimento onde constem necessariamente as intercorrências do parto e do
desenvolvimento do neonato; V – manter alojamento conjunto, possibilitando ao neonato
a permanência junto à mãe”; VI – acompanhar a prática do processo de amamentação,
prestando orientações quanto à técnica adequada, enquanto a mãe permanecer na unidade
hospitalar, utilizando o corpo técnico já existente”.
Dos seis incisos elencados, somente os de n. I e IV integram o tipo penal em comento,
restando, para o artigo seguinte (229), punir a conduta omissiva em relação aos demais (II
e III). Já a omissão em relação aos incisos V e VI não foi erigida à categoria de infração
penal.
Conforme se extrai do inciso I, o registro a que alude o caput deve ocorrer por meio
de prontuários individuais e pelo prazo de dezoito anos. A redundância acima referida pode
ser notada porque a parte final do caput simplesmente repete o inciso IV do art. 10,
providência totalmente desnecessária, já que bastaria breve menção ao registro e à
declaração de nascimento, com a remissão àquele dispositivo ao final.
• Tipo subjetivo
No caput do dispositivo é o dolo, consubstanciado na vontade consciente de praticar
a conduta prevista no tipo penal.
O parágrafo único prevê a forma culposa, punida quando o agente deixa de manter
o registro ou de fornecer a declaração de nascimento por negligência.
Não há previsão de elemento subjetivo especial.
• Consumação e tentativa
Conforme já adiantamos ao tratarmos do tipo objetivo, cuida-se de crime instantâneo,
consumando com a simples abstenção do ato da mantença do registro a que alude
o caput do dispositivo ou com a simples omissão no fornecimento da declaração de
nascimento.
Configura crime omissivo próprio, não se admitindo a tentativa.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.
Art. 229. Deixar o médico, enfermeiro ou dirigente de estabelecimento de atenção
à saúde de gestante de identificar corretamente o neonato e a parturiente, por ocasião
do parto, bem como deixar de proceder aos exames referidos no art. 10 desta Lei:
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.
Parágrafo único. Se o crime é culposo:
Pena – detenção de 2 (dois) a 6 (seis) meses, ou multa.

• Sujeitos do delito
Assim como o crime anterior, o art. 229 também é próprio, somente podendo ser
praticado por médico, enfermeiro ou dirigente586 de estabelecimento de atenção à saúde de
gestante.
Sujeitos passivos serão o recém-nascido e sua genitora, primariamente. De forma
secundária, figura no polo passivo o pai do neonato, que também pode sofrer as
consequências da omissão criminosa.
• Tipo objetivo
Pune-se a conduta de deixar (omitir-se, abster-se) o médico, enfermeiro ou dirigente
de estabelecimento de atenção à saúde de gestante de identificar corretamente o neonato.
Houvesse o legislador atuado com melhor técnica, não haveria no tipo a
palavra corretamente, de interpretação vaga, mas sim a remissão expressa ao inciso II do
art. 10 da Lei n. 8.069/1990, que permite a segura compreensão da forma como se deve
proceder a identificação do neonato (“mediante o registro da impressão plantar e digital e
da impressão digital da mãe, sem prejuízo de outras formas normatizadas pela autoridade
administrativa competente”).
Pune-se, ainda, a conduta omissiva de deixar de proceder aos exames referidos no
inciso III do art. 10 do Estatuto (exames visando ao diagnóstico e terapêutica de
anormalidades no metabolismo do recém-nascido, bem como prestar orientação aos pais).
Dos seis incisos elencados no art. 10 da Lei n. 8.069/1990, somente os de n. II e III
integram o tipo penal em comento, restando para o artigo anterior (art. 228) punir a
omissão quanto aos demais mandamentos. A inação em relação aos incisos V e VI, por sua
vez, não foi erigida à categoria de infração penal.
• Tipo subjetivo
No caput do dispositivo, é o dolo, consubstanciado na vontade consciente de praticar
a conduta omissiva prevista no tipo penal.
O parágrafo único, por sua vez, tipifica a forma culposa, punida quando o agente
deixa de identificar corretamente o neonato e a parturiente ou de proceder aos exames por
negligência, isto é, falta de precaução.
Não há previsão de elemento subjetivo especial.
• Consumação e tentativa
Trata-se de crime instantâneo, consumando-se no exato momento em que ocorre a
omissão dolosa ou culposa por um dos sujeitos ativos.
A exemplo do delito anterior, também omissivo próprio, a tentativa é impossível.
Art. 230. Privar a criança ou o adolescente de sua liberdade, procedendo à sua
apreensão sem estar em flagrante de ato infracional ou inexistindo ordem escrita da
autoridade judiciária competente:
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.
Parágrafo único. Incide na mesma pena aquele que procede à apreensão sem
observância das formalidades legais.

• Sujeitos do delito
De acordo com o posicionamento dominante, o crime é comum, podendo ser
praticado por qualquer pessoa.
Sujeito passivo será a criança ou o adolescente ilegalmente apreendido.
• Tipo objetivo
A conduta punida é a de privar (impedir, frustrar) a criança ou o adolescente de sua
liberdade mediante sua apreensão sem que haja estado de flagrância de ato infracional ou
inexistindo ordem escrita da autoridade judiciária competente.
Ensina Guilherme de Souza Nucci que se trata de “uma modalidade de crime de
sequestro ou cárcere privado, especialmente previsto na Lei n. 8.069/1990. Porém, não se
confunde com o crime do art. 148 do CP, em particular com a figura qualificada prevista
no art. 148, § 1.º, IV. Cuida-se de figura mais branda que a prevista no Código Penal,
envolvendo somente a apreensão de menor de 18 anos, sem flagrante ou ordem
judicial. Apreender significa, neste caso, prender, mas não colocar em cárcere. Em outros
termos, quem fizer a apreensão do menor, sem as formalidades legais (cf. art. 106 desta
Lei), incide na figura do art. 230. Aquele que privar o menor de 18 anos de sua liberdade,
inserindo-o em cárcere, deve responder pelo art. 148, § 1.º, IV, do Código Penal, com
pena mais grave” (Leis penais e processuais penais comentadas, p. 240).
• Tipo subjetivo
É o dolo, consubstanciado na vontade consciente de praticar a conduta típica.
Ao contrário dos delitos anteriores, não é prevista a modalidade culposa.
Não há previsão de elemento subjetivo especial.
• Consumação e tentativa
A consumação ocorre a partir do momento da apreensão indevida e, tratando-se de
crime permanente, protrai-se enquanto a liberdade de locomoção da vítima perdurar. Por
isso, aplica-se neste caso a Súmula 711 do STF, segundo a qual a lei penal mais grave é
aplicada ao crime continuado ou ao permanente se a sua vigência é precedente à cessação
da continuidade ou da permanência.
Tratando-se de crime plurissubsistente, admite-se o conatus.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.
Art. 231. Deixar a autoridade policial responsável pela apreensão de criança ou
adolescente de fazer imediata comunicação à autoridade judiciária competente e à
família do apreendido ou à pessoa por ele indicada:
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.

• Sujeitos do delito
Tratando-se de crime próprio, somente a autoridade policial poderá praticá-lo.
Entende-se como tal o delegado de polícia incumbido de lavrar o auto de apreensão,
excluídos outros agentes policiais, como investigadores ou policiais militares, já que não
são eles os responsáveis pela formalização da apreensão e, portanto, pelo comunicado à
autoridade judiciária.
Sujeito passivo será a criança ou o adolescente apreendido.
• Tipo objetivo
Pune-se a conduta de deixar de fazer imediata comunicação da apreensão de criança
ou adolescente à autoridade judiciária competente e à família do apreendido ou à pessoa
por ele indicada.
Esta figura criminosa não se confunde com a anterior. Naquela, se pune quem efetua
a indevida apreensão do menor, ao passo que esta apreensão é regular, derivada de uma
situação de flagrância, mas a autoridade se omite no dever de informar a ocorrência ao
magistrado e à família do apreendido ou à pessoa indicada por ele.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consistente na vontade consciente de praticar a conduta típica.
Não há modalidade culposa, de maneira que, havendo a omissão negligente da
autoridade policial, o fato será atípico, não obstante possa haver responsabilidade
administrativa.
Não há previsão de elemento subjetivo especial.
• Consumação e tentativa
A consumação ocorre no momento em que a autoridade policial encerra o
procedimento da apreensão e não efetua a comunicação devida.
Tratando-se de crime omissivo próprio, não se admite a forma tentada.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.
Art. 232. Submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou
vigilância a vexame ou a constrangimento:
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.

• Sujeitos do delito
Trata-se, novamente, de crime próprio, podendo ser praticado por quem é
incumbido de autoridade, guarda ou vigilância sobre o menor. Entretanto, o crime não
exige que o ato seja praticado especificamente por agentes do Estado, já que o particular
também exerce tais poderes sobre o menor.
Sujeito passivo será a criança ou o adolescente submetido à situação vexatória ou
constrangedora.
• Tipo objetivo
A conduta punível é a de submeter (sujeitar, expor) criança ou adolescente sob
autoridade, guarda ou vigilância do agente a vexame (situação de vergonha ocasionada por
desonra) ou a constrangimento (violência física ou moral).
Note-se que, tratando-se de dispositivo de lei especial, o art. 232, quando praticado
por agente do Estado, prevalece sobre a conduta de abuso de autoridade descrita no art.
4.º, alínea b, da Lei n. 4.898/1965.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consistente na vontade consciente de praticar a conduta nuclear típica.
Não há previsão de modalidade culposa ou de elemento subjetivo específico.
• Consumação e tentativa
A consumação ocorre no momento em que o agente pratica o ato apto a gerar a
situação vexatória ou constrangedora para a criança ou o adolescente.
O crime é plurissubsistente, admitindo a tentativa, a depender do meio eleito pelo
agente.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.
Art. 233. (Revogado pela Lei n. 9.455/1997.)
Art. 234. Deixar a autoridade competente, sem justa causa, de ordenar a imediata
liberação de criança ou adolescente, tão logo tenha conhecimento da ilegalidade da
apreensão:
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.
• Sujeitos do delito
Sujeito ativo será o magistrado que tiver conhecimento da apreensão da criança ou
do adolescente realizada pela autoridade policial. Também poderá figurar no polo ativo a
própria autoridade policial na hipótese em que a apreensão é realizada por algum
subordinado sem que se verifique situação de flagrância.
Sujeito passivo será a criança ou o adolescente.
• Tipo objetivo
A conduta punida é a de deixar a autoridade competente, sem justa causa, de ordenar
a imediata liberação de criança ou adolescente, tão logo tenha conhecimento da ilegalidade
da apreensão.
Conforme já adiantamos no item anterior, o tipo penal é dirigido, primariamente, à
punição do magistrado que, cientificado pela autoridade policial acerca da apreensão do
menor, identifica ilegalidade no ato, mas não adota as providências necessárias para ordenar
a imediata liberação.
Entendemos, no entanto, que o delegado de polícia também pode praticar o crime
quando identifica a ilegalidade da apreensão antes mesmo de cientificar o juiz e não ordena
a libertação da criança ou do adolescente.
O tipo contém um elemento normativo consistente na imediatidade da liberação. O
termo imediata contido no dispositivo comporta valoração, sendo certo que, em se
tratando de privação da liberdade, a interpretação deve se render à literalidade, ou seja, a
liberação deve ocorrer no exato momento em que a autoridade tem conhecimento da
ilegalidade (sem hiato temporal).
O tipo penal do art. 234 é especial em relação ao art. 4.º, d, da Lei n. 4.898/1965,
que caracteriza como abuso de autoridade a conduta do juiz que deixa de ordenar o
relaxamento de prisão ou detenção ilegal que lhe seja comunicada.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consubstanciado na vontade consciente de praticar a conduta omissiva.
Não é prevista modalidade culposa e não se exige elemento subjetivo especial.
• Consumação e tentativa
A consumação ocorre no exato momento em que a autoridade é cientificada da
apreensão ilegal e não ordena a liberação do menor.
A tentativa, por se tratar de crime omissivo próprio, é inadmissível.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.
Art. 235. Descumprir, injustificadamente, prazo fixado nesta Lei em benefício de
adolescente privado de liberdade:
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.

• Sujeitos do delito
Trata-se de crime próprio, que só pode ser praticado pela autoridade competente para
fazer cumprir o prazo, em regra o magistrado, a autoridade policial e o órgão do Ministério
Público.
Sujeito passivo será o adolescente.
• Tipo objetivo
Pune-se a conduta de descumprir, injustificadamente, prazo fixado no Estatuto da
Criança e do Adolescente, em benefício de adolescente privado de liberdade.
A Lei n. 8.069/1990 disciplina os procedimentos a que são submetidos os adolescentes
autores de atos infracionais e estabelece prazos para a realização dos atos processuais.
Quanto ao prazo sob a responsabilidade do juiz, temos, dentre outros, o art. 183: “O
prazo máximo e improrrogável para a conclusão do procedimento, estando o adolescente
internado provisoriamente, será de quarenta e cinco dias”.
Já o delegado de polícia pode ser responsabilizado se descumprir a determinação do
art. 175: “Em caso de não liberação, a autoridade policial encaminhará, desde logo, o
adolescente ao representante do Ministério Público, juntamente com cópia do auto de
apreensão ou boletim de ocorrência”.
O promotor de justiça, por sua vez, pratica o crime se não observar o art. 179:
“Apresentado o adolescente, o representante do Ministério Público, no mesmo dia e à vista
do auto de apreensão, boletim de ocorrência ou relatório policial, devidamente autuados
pelo cartório judicial e com informação sobre os antecedentes do adolescente, procederá
imediata e informalmente à sua oitiva e, em sendo possível, de seus pais ou responsável,
vítima e testemunhas”.
Este delito é especial em relação àquele descrito no art. 4.º, i, da Lei n. 4.898/1965,
que pune como abuso de autoridade a conduta de prolongar a execução de prisão
temporária, de pena ou de medida de segurança, deixando de expedir em tempo oportuno
ou de cumprir imediatamente ordem de liberdade.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consistente na vontade consciente de praticar a conduta típica.
Não é prevista modalidade culposa nem elemento subjetivo específico.
• Consumação e tentativa
A consumação ocorre no momento em que se descumpre a determinação do tempo
em que o ato deve ser realizado.
Tratando-se de crime unissubsistente, não se admite a tentativa.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.
Art. 236. Impedir ou embaraçar a ação de autoridade judiciária, membro do
Conselho Tutelar ou representante do Ministério Público no exercício de função
prevista nesta Lei:
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.

• Sujeitos do delito
O crime é comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa.
Sujeito passivo neste caso é o Estado, incumbido de garantir a eficiência do sistema
de proteção à criança e ao adolescente.
• Tipo objetivo
Pune-se a conduta de impedir (obstar completamente) ou embaraçar (perturbar) a
ação de autoridade judiciária, membro do Conselho Tutelar ou representante do
Ministério Público no exercício de função prevista na Lei n. 8.069/1990.
Além dos procedimentos apuratórios sobre atos infracionais, o Estatuto disciplina
inúmeras funções que competem aos órgãos incumbidos da proteção à criança e ao
adolescente.
Como regra geral, o art. 95 estabelece: “As entidades governamentais e não
governamentais referidas no art. 90 serão fiscalizadas pelo Judiciário, pelo Ministério
Público e pelos Conselhos Tutelares”.
Especificamente, inúmeras são as funções destes órgãos estabelecidas na Lei n.
8.069/1990, das quais podemos destacar as seguintes:
a) “Art. 136. São atribuições do Conselho Tutelar: I – atender as crianças e
adolescentes nas hipóteses previstas nos arts. 98 e 105, aplicando as medidas previstas no
art. 101, I a VII; II – atender e aconselhar os pais ou responsável, aplicando as medidas
previstas no art. 129, I a VII; III – promover a execução de suas decisões, podendo para
tanto: a) requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, educação, serviço social,
previdência, trabalho e segurança; b) representar junto à autoridade judiciária nos casos de
descumprimento injustificado de suas deliberações; IV – encaminhar ao Ministério Público
notícia de fato que constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança
ou adolescente; V – encaminhar à autoridade judiciária os casos de sua competência; VI –
providenciar a medida estabelecida pela autoridade judiciária, dentre as previstas no art.
101, de I a VI, para o adolescente autor de ato infracional; VII – expedir notificações; VIII
– requisitar certidões de nascimento e de óbito de criança ou adolescente quando
necessário; IX – assessorar o Poder Executivo local na elaboração da proposta orçamentária
para planos e programas de atendimento dos direitos da criança e do adolescente; X –
representar, em nome da pessoa e da família, contra a violação dos direitos previstos no art.
220, § 3.º, II, da Constituição Federal; XI – representar ao Ministério Público para efeito
das ações de perda ou suspensão do poder familiar, após esgotadas as possibilidades de
manutenção da criança ou do adolescente junto à família natural”.
b) “Art. 139. O processo para a escolha dos membros do Conselho Tutelar será
estabelecido em lei municipal e realizado sob a responsabilidade do Conselho Municipal
dos Direitos da Criança e do Adolescente, e a fiscalização do Ministério Público”.
c) “Art. 149. Compete à autoridade judiciária disciplinar, através de portaria, ou
autorizar, mediante alvará: I – a entrada e permanência de criança ou adolescente,
desacompanhado dos pais ou responsável, em: a) estádio, ginásio e campo desportivo; b)
bailes ou promoções dançantes; c) boate ou congêneres; d) casa que explore
comercialmente diversões eletrônicas; e) estúdios cinematográficos, de teatro, rádio e
televisão; II – a participação de criança e adolescente em: a) espetáculos públicos e seus
ensaios; b) certames de beleza. § 1.º Para os fins do disposto neste artigo, a autoridade
judiciária levará em conta, dentre outros fatores: a) os princípios desta Lei; b) as
peculiaridades locais; c) a existência de instalações adequadas; d) o tipo de frequência
habitual ao local; e) a adequação do ambiente a eventual participação ou frequência de
crianças e adolescentes; f) a natureza do espetáculo. § 2.º As medidas adotadas na
conformidade deste artigo deverão ser fundamentadas, caso a caso, vedadas as
determinações de caráter geral”.
Trata-se de tipo misto alternativo, isto é, se o agente praticar as duas condutas, no
mesmo contexto fático, responderá por apenas um crime, devendo o seu proceder ser
aquilatado no momento da aplicação da pena.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consistente na vontade consciente de praticar uma das condutas típicas.
Não é prevista modalidade culposa e elemento subjetivo específico.
• Consumação e tentativa
A consumação ocorre no momento em que o agente atua no intuito de embaraçar
ou impedir a ação da autoridade judiciária, do membro do Conselho Tutelar ou do
representante do Ministério Público.
Por se tratar de crime plurissubsistente, é admissível o conatus.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.
Art. 237. Subtrair criança ou adolescente ao poder de quem o tem sob sua guarda
em virtude de lei ou ordem judicial, com o fim de colocação em lar substituto:
Pena – reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.

• Sujeitos do delito
Tratando-se de crime comum, qualquer pessoa pode praticá-lo.
Sujeito passivo será a criança ou o adolescente e, secundariamente, aquele que detém
legalmente ou por ordem judicial a guarda do menor.
• Tipo objetivo
Pune-se a conduta de subtrair (retirar) criança ou adolescente ao poder de quem o
tem sob sua guarda em virtude de lei ou ordem judicial, com o fim de colocação em lar
substituto.
A subtração, como se nota, pode ocorrer tanto na hipótese em que a guarda é
estabelecida em virtude de lei (no caso dos pais, por exemplo) ou de ordem judicial (no
caso de suspensão do poder familiar). Dessa forma, a depender da situação jurídica que
sustenta a guarda, até mesmo os pais destituídos do poder familiar podem praticar o crime.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consistente na vontade consciente de praticar a conduta nuclear típica,
acrescido da especial finalidade de colocar a criança ou o adolescente na companhia de
outra família. A finalidade especial que anima o agente diferencia este crime daquele
previsto no art. 249 do CP.
• Consumação e tentativa
A consumação do delito ocorre no momento da subtração.
Há discussão quanto ao crime de subtração de incapazes previsto no Código Penal
que pode ser aplicada também a este delito. De acordo com Mirabete, Fragoso e Luiz
Regis Prado, aquele crime é permanente. Este entendimento, todavia, não é compartilhado
por Guilherme de Souza Nucci. Comentando o delito em estudo, Nucci ensina que pode
eventualmente “haver rastro do crime, mantendo-se, por exemplo, a criança subtraída no
lar substituto, motivo pelo qual o delito não se torna permanente, mas deve ser
considerado instantâneo de efeitos permanentes”.587
Por se tratar de crime plurissubsistente, a tentativa é possível.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.
Art. 238. Prometer ou efetivar a entrega de filho ou pupilo a terceiro, mediante
paga ou recompensa:
Pena – reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. Incide nas mesmas penas quem oferece ou efetiva a paga ou
recompensa.

• Sujeitos do delito
O caput descreve crime próprio, pois somente os pais, o tutor e o guardião podem
praticá-lo. Já o parágrafo único enuncia delito comum, podendo ser cometido por qualquer
pessoa.
Sujeito passivo será a criança ou o adolescente privado do convívio familiar ou da
situação de guarda ou tutela regularmente determinada pelo juiz.
• Tipo objetivo
A conduta punida no caput é a de prometer (obrigar-se) ou efetivar (concretizar) a
entrega de filho ou pupilo a terceiro, mediante retorno financeiro ou outra espécie de
benefício.
O tipo penal foi instituído com a finalidade de evitar e punir, não tão severamente
quanto deveria, o comércio de crianças ou adolescentes. A despeito da tipificação da
conduta, é comum o fato de famílias desprovidas de recursos, iludidas pelo dinheiro ou
pela obtenção de outros bens materiais, entregarem jovens (quase sempre de tenra idade) a
terceiros. Pelo mesmo motivo, ocorre a situação popularmente conhecida como “barriga
de aluguel”, em que a gestante promete a entrega da criança mediante pagamento.
Destaca Guilherme de Souza Nucci, com razão, que, em virtude da natureza do
crime, é comum no caso concreto tornar-se “muito complexa e difícil a prova de que
houve a promessa ou a efetivação da entrega de filho, mediante paga ou recompensa. Se as
partes envolvidas negarem o ocorrido, torna-se quase impossível ao Estado provar o
contrário” (op. cit., p. 249).
O parágrafo único do art. 238, por seu turno, prevê punição para quem oferece ou
efetiva a paga ou a recompensa pelo recebimento do menor.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consistente na vontade consciente de praticar uma das condutas típicas,
aliado à intenção de obter a vantagem.
• Consumação e tentativa
A consumação ocorre no momento em que o agente pratica uma das condutas
nucleares típicas.
A tentativa, tratando-se de crime plurissubsistente, será possível.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.
Art. 239. Promover ou auxiliar a efetivação de ato destinado ao envio de criança
ou adolescente para o exterior com inobservância das formalidades legais ou com o
fito de obter lucro:
Pena – reclusão de 4 (quatro) a 6 (seis) anos, e multa.
Parágrafo único. Se há emprego de violência, grave ameaça ou fraude:
Pena – reclusão, de 6 (seis) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à
violência.

• Sujeitos do delito
Tratando-se de crime comum, qualquer pessoa pode praticá-lo.
Sujeito passivo será a criança ou o adolescente.
• Tipo objetivo
A conduta punida é a de promover (executar, impulsionar) ou auxiliar (ajudar,
facilitar) a efetivação de ato destinado ao envio de criança ou adolescente para o exterior
com inobservância das formalidades legais ou com o fito de obter lucro.
As formalidades legais a que alude o dispositivo são impostas no próprio Estatuto da
Criança e do Adolescente. Como exemplo, podemos citar as regras para a adoção
internacional, que, além do procedimento previsto nos arts. 165 a 170, deve atender às
adaptações do art. 52. Há também a necessidade de autorização judicial para a viagem
internacional na hipótese em que o menor não estiver acompanhado de ambos os pais ou
responsável, em que viajará na companhia de um dos pais, sem que o outro tenha
autorizado por meio de documento com firma reconhecida ou em companhia de
estrangeiro residente ou domiciliado no exterior (arts. 84 e 85).
Note-se que o crime poderá se configurar mesmo na hipótese em que cumpridos os
requisitos para que o menor deixe o território nacional, mas haja intuito de lucro. Assim,
se o estrangeiro, por exemplo, se submeter a todo o procedimento para adotar uma criança,
pagando determinada quantia para tê-la em sua família, quem promoveu ou auxiliou o
envio dessa criança ao exterior, recebendo o dinheiro, responderá pelo delito.
O dispositivo em estudo revogou tacitamente o art. 245, § 2.º, do CP, já que trata da
mesma matéria nele disposta. Pune-se ali a conduta daquele que, embora excluído o perigo
moral ou material referido no caput, auxilia a efetivação de ato destinado ao envio de
menor para o exterior, com o fito de obter lucro. Como podemos notar, o art. 239 da Lei
n. 8.069/1990 tem maior amplitude, pois inclui a punição daquele que, mesmo sem intuito
de lucro, atua para enviar criança ou adolescente ao exterior sem observar as regras
existentes.
Por fim, o parágrafo único qualifica o crime se uma das ações do caput é praticada
com violência, grave ameaça ou fraude, sendo que na primeira hipótese a pena é aplicada
cumulativamente.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consistente na vontade consciente de praticar uma das condutas típicas.
Pode haver elemento subjetivo específico na hipótese em que o agente atua com o
objetivo de lucro.
Se a finalidade que move o agente é a remoção de órgãos, tecidos ou partes do corpo
do menor, submetê-lo a trabalho em condições análogas à de escravo, submetê-lo a
qualquer tipo de servidão, adoção ilegal ou exploração sexual, configura o crime do art.
149-A do CP (tráfico de seres humanos), punido com reclusão, de 4 a 8 anos, pena esta
majorada de 1/3 até a 1/2 em face da transnacionalidade do delito.
• Consumação e tentativa
Consuma-se o delito no momento em que o agente promove ou auxilia a efetivação
do ato que possibilitará o envio da criança ou do adolescente para o exterior.
Não é exigida a efetiva saída do menor, na verdade, é mero exaurimento que poderá
influir no quantum da pena.
A tentativa é possível, vez que se trata de crime plurissubsistente.
• Competência para o processo e julgamento
É da Justiça Federal, nos exatos termos do art. 109, V, da CF/88.
Art. 240. Produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer
meio, cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente:
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.
§ 1.º Incorre nas mesmas penas quem agencia, facilita, recruta, coage, ou de
qualquer modo intermedeia a participação de criança ou adolescente nas cenas
referidas no caput deste artigo, ou ainda quem com esses contracena.
§ 2.º Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o agente comete o crime:
I – no exercício de cargo ou função pública ou a pretexto de exercê-la;
II – prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade;
ou
III – prevalecendo-se de relações de parentesco consanguíneo ou afim até o
terceiro grau, ou por adoção, de tutor, curador, preceptor, empregador da vítima ou de
quem, a qualquer outro título, tenha autoridade sobre ela, ou com seu consentimento.

• Sujeitos do delito
Sujeito ativo do crime pode ser qualquer pessoa (delito comum), ao passo que o
sujeito passivo deve ser criança ou adolescente.
• Tipo objetivo
No caput do dispositivo são seis as condutas típicas previstas, todas ligadas, direta ou
indiretamente, à criação do material pornográfico: produzir (pôr em prática, levar a efeito,
realizar), reproduzir (apresentar novamente, imitar fielmente), dirigir (dar orientação,
comandar), fotografar (imprimir a imagem de alguém por meio da
fotografia), filmar (registrar a imagem de alguém por meio de vídeo) e registrar (alocar em
bases de dados) cena de sexo explícito ou pornográfica, assim entendida qualquer situação
que envolva criança ou adolescente em atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas, ou
exibição dos órgãos genitais de uma criança ou adolescente para fins primordialmente
sexuais (art. 241-E).588
Trata-se de tipo misto alternativo, ou seja, se o agente, no mesmo contexto fático,
incorrer em mais de uma ação nuclear típica (dirigir e filmar, por exemplo), responderá
por apenas um crime, embora isso possa se refletir na aplicação da pena.
O § 1.º equipara ao caput, impondo a mesma pena, a conduta de quem:
a) agencia (trata com terceiros, diligencia), facilita (propicia sem a exigência de
esforço), recruta (alicia, angaria), coage (constrange, força), ou, de qualquer
modo, intermedeia (põe-se entre duas ou mais pessoas com a finalidade de tratar sobre
determinado assunto) a participação de criança ou adolescente nas cenas referidas no caput;
b) com eles contracena (participa efetivamente da cena de sexo explícito ou
pornográfica criada). Como já atentado nas considerações iniciais, esta última conduta,
principalmente, pode também configurar crime mais grave, como no caso de o agente
praticar cena de sexo explícito com uma criança de dez anos de idade, por exemplo,
caracterizando estupro de vulnerável.
A exemplo do que exposto no caput, se o agente, no mesmo contexto fático, praticar
mais de uma conduta, não desnatura a unidade do crime, devendo a multiplicidade de
ações ser considerada na aplicação da reprimenda.
O § 2.º do dispositivo em estudo estabelece três majorantes, determinando a elevação
da pena em um terço se o agente comete o crime:
I – no exercício de cargo ou função pública ou a pretexto de exercê-la: cargo
público é a reunião de atribuições conferidas ao servidor, criadas por lei, em número
determinado e com denominação própria; função pública é aquela que pode ser exercida
sem o revestimento de cargo público, pois nem sempre é criada por lei, em número certo.
Nas hipóteses em que a função é exercida com fundamento em um contrato regido pela
CLT, denomina-se emprego público. Incide a causa de aumento tanto nas hipóteses em
que o agente exerce o cargo ou a função quando pratica o crime como também se se vale
disso para a prática;
II – prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade:
relações domésticas são aquelas estabelecidas entre pessoas que compartilham do mesmo
núcleo familiar, ainda que não haja relação direta de parentesco, embora seja mais comum
sua existência. Com efeito, é possível que pessoas reunidas em um mesmo núcleo, sejam
parentes ou não, estabeleçam relações domésticas caracterizadas pela rotina própria de uma
família. As relações de coabitação são aquelas estabelecidas entre indivíduos que
compartilham o mesmo teto, ainda que não nutram qualquer espécie de amizade ou
intimidade, como os habitantes de uma pensão, por exemplo. Por fim, as relações de
hospitalidade são aquelas caracterizadas pela temporariedade, como as visitas. Justifica-se a
majoração da pena porque, nessas hipóteses, o agente se aproveita da proximidade que
mantém com a vítima;
III – prevalecendo-se de relações de parentesco consanguíneo ou afim até o terceiro
grau, ou por adoção, de tutor, curador, preceptor, empregador da vítima ou de quem, a
qualquer outro título, tenha autoridade sobre ela, ou com seu consentimento: a última
causa de aumento prevista para o delito complementa o inciso anterior. Neste caso, a
conduta é punida de forma mais severa quando praticada com aproveitamento dos laços de
parentesco, consanguíneo ou não, bem como de qualquer relação de subordinação entre a
vítima e o agente. Bem assim, contempla o dispositivo, expressamente, o tutor, o curador,
o preceptor e o empregador da vítima. O fundamento desta causa de aumento é idêntico
ao da anterior, ou seja, a maior proximidade estabelecida entre o sujeito ativo e a criança
ou adolescente submetido às cenas de sexo explícito ou de pornografia.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consubstanciado na vontade consciente de praticar uma das ações nucleares
típicas preconizadas no caput e no § 1.º, sem a exigência de qualquer finalidade específica.
• Consumação e tentativa
O momento consumativo do delito é atingido pela prática de qualquer das ações
nucleares típicas.
Tratando-se de crime plurissubsistente, admite-se a tentativa.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.
Art. 241. Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou outro registro que
contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.
• Sujeitos do delito
Por se tratar de crime comum, qualquer pessoa pode praticá-lo, ainda que não
comerciante. Se o vendedor participou da confecção do material, produzindo,
reproduzindo, dirigindo, fotografando, filmando ou registrando, por qualquer meio, cena
de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente, ou, então, agenciou,
facilitou, recrutou, coagiu ou, de qualquer modo, intermediou a participação de criança
ou adolescente nas referidas cenas, ou ainda com esses contracenou, responderá somente
pelo delito do art. 240, caput ou § 1.º, ficando o art. 241 absorvido (post
factum impunível).
Sujeito passivo será a criança ou o adolescente.
• Tipo objetivo
São duas as ações nucleares típicas, ambas relacionadas com o comércio do aparato
pornográfico: vender (ceder em troca de determinado valor) e expor à venda (oferecer
para a alienação).
O objeto material é a fotografia, o vídeo ou qualquer outro registro de cena de sexo
explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente.
Embora seja o mais comum, o tipo não exige do agente finalidade de lucro.
O dispositivo também não especifica o meio a ser utilizado pelo sujeito ativo, ainda
que o ordinário, atualmente, seja a informática. Assim, independentemente da forma como
ocorre, a venda ou a exposição à venda é severamente reprimida.
A simples oferta ou distribuição gratuita do material, ou sua troca, configura o crime
seguinte (art. 241-A).
Por fim, deve ser alertado que a Lei n. 13.718/2018 acrescentou ao Código Penal o
art. 218-C, inaugurando a punição de quem promove a divulgação de cena de sexo, nudez
ou pornografia sem o consentimento dos envolvidos, bem como de quem possibilita a
publicação de cenas reais de estupro ou de estupro de vulnerável. A pena cominada ao
novo delito denota mediana potencialidade ofensiva e admite a suspensão condicional do
processo. O dispositivo contém dois parágrafos. No primeiro, a pena é aumentada de um
a dois terços se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação
íntima de afeto com a vítima, ou com o fim de vingança ou humilhação. O segundo traz
causa excludente da ilicitude em determinadas circunstâncias em que as condutas são
praticadas.
O crime do art. 218-C do CP é expressamente subsidiário, ou seja, tem lugar apenas
se a conduta não constitui crimes mais graves, que, no caso, são os arts. 241 e 241-A do
ECA. O art. 218-C, aliás, é uma combinação dos núcleos típicos que compõem os dois
dispositivos que visam à proteção de crianças e adolescentes. Dessa forma, se a conduta
consiste em vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual com
cena envolvendo criança ou adolescente, o crime é o do art. 241 do ECA, punido com
reclusão de quatro a oito anos. Tratando-se das demais condutas envolvendo menores de
idade, o crime é o do art. 241-A, punido com reclusão de três a seis anos.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consistente na vontade consciente de vender ou de expor à venda o material
de pornografia ou de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente.
• Consumação e tentativa
O crime se consuma no momento em que o agente aliena o material ou promove sua
exposição à venda, não se exigindo habitualidade. Aliás, a exposição à venda de uma
fotografia ou de um vídeo já é o suficiente para caracterizar o delito (a pequena quantidade
do material, diferentemente do art. 241-B, não repercute na fixação da pena).
Por se tratar de crime plurissubsistente, admite-se o conatus.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal. O Plenário do Supremo
Tribunal Federal, em decisão proferida no Recurso Extraordinário 628.624, com
repercussão geral reconhecida, pôs fim ao debate e decidiu que, sendo o crime praticado
no Brasil e por meio da internet, a competência é da Justiça Federal, com fundamento no
art. 109, V, da CF/88.
Art. 241-A.589 Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou
divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou
telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou
pornográfica envolvendo criança ou adolescente:
Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
§ 1.º Nas mesmas penas incorre quem:
I – assegura os meios ou serviços para o armazenamento das fotografias, cenas
ou imagens de que trata o caput deste artigo;
II – assegura, por qualquer meio, o acesso por rede de computadores às
fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo.
§ 2.º As condutas tipificadas nos incisos I e II do § 1.º deste artigo são puníveis
quando o responsável legal pela prestação do serviço, oficialmente notificado, deixa
de desabilitar o acesso ao conteúdo ilícito de que trata o caput deste artigo.

• Sujeitos do delito
Tratando-se de crime comum, qualquer pessoa pode praticá-lo.
Sujeito passivo será a criança ou o adolescente.
• Tipo objetivo
O caput do dispositivo traz sete ações nucleares típicas, todas associadas à difusão
(especialmente pela rede mundial de computadores) do material pornográfico já
produzido: oferecer (propor para aceitação), trocar (permutar,
substituir), disponibilizar (permitir o acesso), transmitir (remeter de um lugar a
outro), distribuir (proporcionar a entrega indeterminada), publicar (tornar manifesto)
e divulgar (difundir, propagar).
As ações típicas recaem sobre fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena
de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente.
O tipo é misto alternativo, razão pela qual a prática de mais de uma ação nuclear, no
mesmo contexto fático, configura apenas um crime.
O § 1.º traz duas hipóteses de forma equiparada ao caput, punindo com a mesma pena
quem:
I – assegura (proporciona, torna seguro) os meios ou serviços para o armazenamento
das fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput do art. 241-A. Trata-se aqui daquele
indivíduo que não atua diretamente na transmissão das produções ilegais, mas que
disponibiliza instrumento de armazenamento;
II – assegura (proporciona, torna seguro), por qualquer meio, o acesso por rede de
computadores às fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo. Busca-se
a punição daquele que atua em uma forma de assessoramento do agente que pretende a
divulgação das produções ilegais envolvendo criança ou adolescente por meio da rede
mundial de computadores. Neste caso, o sujeito ativo promove a hospedagem de imagens
ou vídeos, proporcionando o acesso por meio de endereços eletrônicos.
O § 2.º do art. 241-A traz uma condição objetiva de punibilidade ao estabelecer que
as condutas tipificadas nos incisos I e II do § 1.º são puníveis quando o responsável legal
pela prestação do serviço, oficialmente notificado, deixa de desabilitar o acesso ao conteúdo
ilícito de que trata o caput. O pressuposto para a punição revela a adoção de prudência por
parte do legislador, impondo àqueles que são competentes para a persecução penal que se
certifiquem de que o agente tenha consciência de que armazena ou proporciona o acesso
a produções pornográficas ou de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente,
evitando-se, desse modo, a responsabilidade penal objetiva. 590
Por outro lado, busca-se afastar a comum alegação de ignorância por parte de
provedores da rede mundial de computadores, quase sempre justificando seus
comportamentos com a alegação de que se mostra impossível controlar todo o material
disponibilizado para acesso. Agora, havendo prova da notificação da existência do material,
impede-se a escoteira explicação defensiva.
A lei exige a notificação oficial do responsável legal pela prestação do serviço de
armazenagem, ou seja, daquele efetivamente capaz de desabilitar ou de determinar a
desabilitação do acesso ao material. A notificação oficial deve partir da autoridade
competente para a apuração dos fatos criminosos (Polícia, Ministério Público, CPI etc.),
sempre de maneira a possibilitar a identificação pessoal do responsável legal. Assim, se for
por mandado judicial, deverá ocorrer a intimação pessoal daquele indivíduo; se por correio,
o documento de recebimento deve ser assinado pelo responsável; se ocorrer por meio
eletrônico, deve haver a validação por meio da certificação digital de que se trata do
responsável legal, tendo em vista a certeza de que deve se revestir o ato.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consubstanciado na vontade consciente de praticar uma das condutas
previstas no tipo penal.
• Consumação e tentativa
A consumação do delito é atingida com a prática de uma das ações nucleares típicas,
independentemente do efetivo acesso do usuário ao conteúdo criminoso oferecido,
disponibilizado ou divulgado pelo agente.
No que tange aos atos de disponibilizar e divulgar, a consumação pode se protrair no
tempo, a depender do meio utilizado pelo sujeito ativo, como, por exemplo, se hospedar
o conteúdo em um endereço eletrônico acessível permanentemente pelo público.
Também nas hipóteses do § 1.º, ocorrida a notificação pessoal, a consumação se
prolonga durante todo o tempo em que o responsável não promove a desabilitação do
acesso ao conteúdo. Sendo modalidade omissiva de praticar o delito, é a única forma
criminosa do art. 241-A que não admite a tentativa.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal. O Plenário do Supremo
Tribunal Federal, em decisão proferida no Recurso Extraordinário 628.624, com
repercussão geral reconhecida, pôs fim ao debate e decidiu que, sendo o crime praticado
no Brasil e por meio da internet, a competência é da Justiça Federal, com fundamento no
art. 109, V, da CF/88.591
Art. 241-B. Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo
ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica
envolvendo criança ou adolescente:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
§ 1.º A pena é diminuída de 1 (um) a 2/3 (dois terços) se de pequena quantidade
o material a que se refere o caput deste artigo.
§ 2.º Não há crime se a posse ou o armazenamento tem a finalidade de comunicar
às autoridades competentes a ocorrência das condutas descritas nos arts. 240, 241,
241-A e 241-C desta Lei, quando a comunicação for feita por:
I – agente público no exercício de suas funções;
II – membro de entidade, legalmente constituída, que inclua, entre suas
finalidades institucionais, o recebimento, o processamento e o encaminhamento de
notícia dos crimes referidos neste parágrafo;
III – representante legal e funcionários responsáveis de provedor de acesso ou
serviço prestado por meio de rede de computadores, até o recebimento do material
relativo à notícia feita à autoridade policial, ao Ministério Público ou ao Poder
Judiciário.
§ 3.º As pessoas referidas no § 2.º deste artigo deverão manter sob sigilo o
material ilícito referido.

• Sujeitos do delito
Qualquer pessoa pode praticar o delito em estudo, enquanto o sujeito passivo será a
criança ou adolescente.
• Tipo objetivo
São três as condutas típicas previstas no tipo, punindo-se, especialmente, o
consumidor do material pornográfico: adquirir (obter, conquistar), possuir (ter em poder,
desfrutar) e armazenar (acumular, conter em depósito) fotografia, vídeo ou registro que
contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente.
O tipo é misto alternativo, ou seja, se o agente, no mesmo contexto fático, incorrer
em mais de uma figura, responderá por apenas um crime.
O tipo penal, inovador, tem o escopo de atingir o “receptador” da pornografia
infantil, isto é, aquele que de, qualquer forma (onerosa ou não), obtém o material e/ou o
guarda consigo, o que anteriormente só era possível se houvesse a imputação de
participação do agente no crime relativo à distribuição ou publicação de fotografias, vídeos
ou outros registros, o que impunha heroica colheita de provas e nem sempre era possível.
O § 1.º estabelece uma causa de diminuição de pena, que pode variar de um a dois
terços, se for pequena a quantidade de fotografias, vídeos ou outros registros de sexo
explícito ou pornografia envolvendo criança ou adolescente. Neste caso, o legislador
beneficia aquele que ocasionalmente foi surpreendido com pequena quantidade de material
ilegal, conduta que demonstra menor potencialidade lesiva. Como critério para a
diminuição poderá o juiz utilizar tanto a efetiva quantidade de imagens, vídeos ou registros
quanto o conteúdo por eles revelado. Se, por exemplo, forem duas ou três imagens que
apenas insinuam a prática de algum ato sexual, a diminuição pode se dar no máximo, o
que não se revela possível se a exibição for de sexo explícito. A benesse parece incompatível
com a aplicação do princípio da insignificância.
O § 2.º prevê três hipóteses de excludente de ilicitude, estabelecendo não haver crime
se a posse ou o armazenamento tem a finalidade de comunicar às autoridades competentes
a ocorrência das condutas descritas nos arts. 240, 241, 241-A e 241-C do ECA. As três
figuras retratam casos de estrito cumprimento do dever legal.
A comunicação de que trata o dispositivo deve ser feita por:
I – agente público no exercício de suas funções: trata-se tanto daquele diretamente
ligado aos órgãos públicos de proteção aos direitos da criança e do adolescente quanto
daquele de alguma forma titular de atividade investigativa;
II – membro de entidade, legalmente constituída, que inclua, entre suas finalidades
institucionais, o recebimento, o processamento e o encaminhamento de notícia dos crimes
referidos neste parágrafo: cuida-se aqui daquelas entidades não governamentais instituídas
com a finalidade de proteção aos direitos da criança e do adolescente, especificamente no
que tange à sua exploração sexual para a produção de material pornográfico. Neste caso,
tais entidades têm o dever de manter em seu banco de dados imagens, vídeos ou registros
de material envolvendo menores com a finalidade de encaminhá-los aos órgãos oficiais para
a adoção das medidas pertinentes;
III – representante legal e funcionários responsáveis de provedor de acesso ou serviço
prestado por meio de rede de computadores, até o recebimento do material relativo à
notícia feita à autoridade policial, ao Ministério Público ou ao Poder Judiciário: neste caso,
tratando-se de provedor de acesso ou de prestador de serviço de armazenamento de dados,
ou seja, entes que lidam diretamente com a circulação de conteúdo pela rede mundial de
computadores, evidentemente lhes cabe armazenar eventual conteúdo obsceno
envolvendo criança ou adolescente para posteriormente efetuar a comunicação às
autoridades.
Por fim, o § 3.º impõe a manutenção do sigilo sobre o material armazenado pelas
pessoas relacionadas no parágrafo anterior, sendo que a divulgação proposital faz com que
a conduta do agente se subsuma ao art. 241-A.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consubstanciado na vontade consciente de praticar uma das condutas
previstas no tipo.
• Consumação e tentativa
Consuma-se o delito com a prática de um dos verbos típicos, sendo certo que dois
deles (possuir e armazenar) transformam o crime em permanente, possibilitando, pois, a
prisão em flagrante a qualquer tempo.
Por se tratar de crime plurissubsistente, admite-se a tentativa.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal. O Plenário do Supremo
Tribunal Federal, em decisão proferida no Recurso Extraordinário 628.624, com
repercussão geral reconhecida, pôs fim ao debate e decidiu que, sendo o crime praticado
no Brasil e por meio da internet, a competência é da Justiça Federal, com fundamento no
art. 109, V, da CF/88.
Art. 241-C. Simular a participação de criança ou adolescente em cena de sexo
explícito ou pornográfica por meio de adulteração, montagem ou modificação de
fotografia, vídeo ou qualquer outra forma de representação visual:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem vende, expõe à venda,
disponibiliza, distribui, publica ou divulga por qualquer meio, adquire, possui ou
armazena o material produzido na forma do caput deste artigo.

• Sujeitos do delito
Tratando-se de crime comum, qualquer pessoa pode praticá-lo. O sujeito passivo será
a criança ou adolescente, cuja imagem foi utilizada na simulação.
• Tipo objetivo
A preocupação, mais uma vez, é com a criação do material pornográfico, punindo-se
o agente que simular (representar com semelhança, disfarçar) a participação de criança ou
adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica por meio
de adulteração (falsificação, contrafação), montagem (sobreposição de imagens)
ou modificação (transformação) de fotografia, vídeo ou qualquer outra forma de
representação visual.592
Embora o material seja criado sem utilizar diretamente crianças e adolescentes na
realização de cena de sexo explícito ou pornográfica, a simulação de sua participação, sem
dúvida, prejudica a formação moral do menor, além de fomentar outros indivíduos a
produzir cenas reais.
O parágrafo único traz conduta equiparada ao caput, punindo quem vende (cede em
troca de determinado valor), expõe à venda (oferece para a
alienação), disponibiliza (permite o acesso), distribui (proporcionar a entrega
indeterminada), publica (torna manifesto) ou divulga (difunde, propaga) por qualquer
meio, adquire (obtém, conquista), possui (tem em poder, desfruta) ou armazena (acumula,
contém em depósito) o material produzido na forma do caput.
Da mesma forma que a produção do material simulado deve ser coibida, sua difusão
demanda a devida punição em razão de contribuir diretamente para que indeterminadas
pessoas tenham acesso ao aparato ilegal.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consistente na vontade consciente de praticar uma das condutas previstas
no tipo penal.
• Consumação e tentativa
Ocorre a consumação no momento em que o agente pratica um dos comportamentos
nucleares típicos.
No que tange aos atos de disponibilizar e divulgar, a consumação pode se protrair no
tempo, a depender do meio utilizado pelo sujeito ativo, como, por exemplo, se hospedar
o conteúdo em um endereço eletrônico acessível permanentemente pelo público.
A tentativa é possível por ser o crime plurissubsistente.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.
Art. 241-D. Aliciar, assediar, instigar ou constranger, por qualquer meio de
comunicação, criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem:
I – facilita ou induz o acesso à criança de material contendo cena de sexo
explícito ou pornográfica com o fim de com ela praticar ato libidinoso;
II – pratica as condutas descritas no caput deste artigo com o fim de induzir
criança a se exibir de forma pornográfica ou sexualmente explícita.

• Sujeitos do delito
Tratando-se de crime comum, qualquer pessoa pode praticá-lo. Sujeito passivo será a
criança, ou seja, a pessoa com até doze anos de idade incompletos. 593
• Tipo objetivo
O tipo em análise, marcado pela prevenção, pune aquele
que aliciar (atrair), assediar (importunar), instigar (induzir) ou constranger (forçar, coagir),
por qualquer meio de comunicação, criança, com o fim de com ela praticar ato de
libidinagem (comportamento denominado grooming).594
Várias são as notícias nos jornais relatando indivíduos que se utilizam dos meios de
comunicação, especialmente a rede mundial de computadores, para a busca de crianças
com a finalidade de atraí-las à prática de ato de natureza sexual. Eis o comportamento alvo
do novel crime.
É evidente que o tipo penal em análise é marcado pela prevenção, pois que, punindo-
se aquele que simplesmente se coloca a aliciar, assediar, instigar ou constranger a criança,
por meios de comunicação, à prática sexual, evita-se a ocorrência de fato muito mais grave
e de efeitos devastadores, ou seja, o efetivo contato entre o agente e a vítima.
O parágrafo único traz duas formas equiparadas ao caput, punindo quem:
I – facilita (põe à disposição) ou induz (incute, sugere) o acesso à criança de material
contendo cena de sexo explícito ou pornográfica com o fim de com ela praticar ato
libidinoso: neste caso, o agente, agindo indiretamente, com a finalidade de praticar ato
libidinoso com a criança, proporciona seu acesso a material de conteúdo pornográfico, com
a finalidade de fazê-la crer na naturalidade daquelas cenas;
II – pratica as condutas descritas no caput com o fim de induzir criança a se exibir de
forma pornográfica ou sexualmente explícita: aqui, as condutas são as mesmas previstas
no caput (aliciar, assediar, instigar ou constranger), tendo como objeto também a criança,
modificando-se somente a finalidade, que passa a ser a exibição do infante em cenas de
sexo explícito ou pornográficas.
Tipificando-se meros atos preparatórios de crime mais grave (estupro de vulnerável),
ocorrendo este delito, o art. 241-D ficará por ele absorvido.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consubstanciado na vontade consciente de praticar uma das condutas típicas
previstas. No caput e no inciso I do parágrafo único exige-se, ainda, a intenção especial de
manter contato sexual com a criança, ao passo que no inciso II, o fim especial é o de induzir
a criança a se exibir de forma pornográfica ou sexualmente explícita.
• Consumação e tentativa
A consumação ocorre com a prática de qualquer das ações típicas previstas, e, por se
tratar de crime plurissubsistente, admite-se a tentativa.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.
Art. 241-E. Para efeito dos crimes previstos nesta Lei, a expressão “cena de sexo
explícito ou pornográfica” compreende qualquer situação que envolva criança ou
adolescente em atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas, ou exibição dos
órgãos genitais de uma criança ou adolescente para fins primordialmente sexuais.

• Conceito de cena de sexo explícito ou pornografia


Para evitar discussões a respeito da interpretação do que se pode entender como cena
de sexo explícito ou pornográfica, o próprio legislador firmou o conceito.
Ocorre que, conforme se pode notar, houve certa delimitação no conceito legal
apresentado, podendo ocorrer hipóteses em que mesmo não havendo atividade sexual
explícita, real ou simulada, ou mesmo exibição de órgão genital, o material produzido seja
inadequado, como, por exemplo, a tomada de imagens em poses sensuais. Guilherme de
Souza Nucci critica a atitude do legislador sob o fundamento de que a tentativa de clarificar
a redação dos tipos penais acabou por delimitar a sua incidência. 595 Sob outro prisma,
todavia, pode ser encarada a iniciativa: o de efetivamente delimitar a incidência dos tipos
penais, tornando sua aplicação mais segura e menos receptiva a interpretações por demais
extensivas.
Art. 242. Vender, fornecer ainda que gratuitamente ou entregar, de qualquer
forma, a criança ou adolescente arma, munição ou explosivo:
Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos.

• Sujeitos do delito
Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo desse delito.
Sujeito passivo será a criança ou o adolescente e, secundariamente, a coletividade,
ante o perigo causado por um menor armado.
• Tipo objetivo
A conduta punida é a de vender (transmitir a outrem mediante
pagamento), fornecer (equipar, abastecer) gratuitamente ou não ou entregar (fazer chegar),
de qualquer forma, a criança ou adolescente, arma, munição ou explosivo.
De se notar que o dispositivo foi parcialmente revogado pelo art. 16, parágrafo único,
III, da Lei n. 10.826/2003. Seu objeto material, agora, abrange instrumento apto para o
ataque e defesa, desde que não alcançado pelo Estatuto do Desarmamento. Em síntese,
somente arma branca, tais como: punhal, adaga, sabres, espadas, floretes, acha de guerra,
machado de guerra, lança, alabarda, porro, porrete, cassetete, bastão longo, bastão
curto, num tchaku, borduna, tacape, conjunto arco e flecha, estilingue, balista, catapulta,
funda, soco inglês etc. Compete ao Magistrado, no momento da dosagem da pena,
aquilatar o grau de perigo da arma branca fornecida ao menor, individualizando a
reprimenda.
Tratando-se de tipo misto alternativo, se o agente praticar mais de uma conduta em
relação a apenas um menor, no mesmo contexto fático (vendendo e entregando, por
exemplo), o crime será único, devendo a conduta múltipla ser analisada no momento da
aplicação da pena.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consistente na vontade consciente de praticar uma das condutas prevista no
tipo penal.
Não há elemento subjetivo especial nem se pune a forma culposa.
• Consumação e tentativa
Consuma-se o crime no momento em que o agente vende, fornece ou entrega a arma
à criança ou ao adolescente.
A tentativa, por se tratar de crime plurissubsistente, é possível.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.
Art. 243. Vender, fornecer, servir, ministrar ou entregar, ainda que gratuitamente,
de qualquer forma, a criança ou a adolescente, bebida alcoólica ou, sem justa causa,
outros produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica:
Pena – detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa, se o fato não constitui
crime mais grave.

• Introdução
Antes da Lei n. 13.106/2015, o art. 243 do ECA punia: “Vender, fornecer ainda que
gratuitamente, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente, sem
justa causa, produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica,
ainda que por utilização indevida: Pena – detenção de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa,
se o fato não constitui crime mais grave”.
Agora, com a nova Lei, o mesmo artigo pune vender, fornecer, servir, ministrar ou
entregar, ainda que gratuitamente, de qualquer forma, a criança ou a adolescente, bebida
alcoólica. Além disso, o dispositivo pune, como já fazia antes da alteração, as mesmas
condutas que, sem justa causa, envolvam outros produtos cujos componentes possam causar
dependência física ou psíquica.
A alteração é pertinente porque, diante da redação anterior, o STJ vinha considerando
que a conduta de fornecer de alguma forma bebida alcoólica a crianças ou adolescentes não
se subsumia ao crime do ECA. Em interpretação sistemática com o art. 81 do ECA, que
diferencia, em seus incisos, as bebidas alcoólicas dos produtos cujos componentes possam
causar dependência física ou psíquica, a conclusão possível era pela aplicação estrita do
princípio da legalidade para excluir esta conduta do âmbito do tipo do art. 243 e subsumi-
la à contravenção penal tipificada no art. 63, inciso I, do Decreto-lei n. 3.688/1941 (HC
167.659/MS, j. 07/02/2013).
Em vigor a Lei n. 13.106/2015, foi revogada expressamente a contravenção penal
(art. 63, I). A conduta de vender bebida alcoólica passa, agora, a se subordinar às disposições
do ECA, com tratamento muito mais severo (pena de detenção de dois a quatro anos ante
a prisão simples de dois meses a um ano da contravenção revogada).
E aqueles que venderam bebidas alcoólicas para menores antes da Lei n. 13.206/2015?
Continuam respondendo pela contravenção, pois a alteração é prejudicial para o réu, não
podendo retroagir em seu prejuízo (art. 1.º do CP).
Não houve abolitio criminis do art. 63, I, da Lei de Contravenções Penais? Não.
Ocorreu o fenômeno do princípio da continuidade normativo-típica. Qual a diferença
entre os dois institutos? A abolitio criminis não se confunde com o princípio da
continuidade normativo-típica. A abolitio representa supressão formal e material da figura
criminosa, expressando o desejo do legislador em não considerar determinada conduta
como criminosa. É o que aconteceu com o crime de adultério e sedução, revogados, formal
e materialmente, pela Lei n. 11.106/2005. O princípio da continuidade normativo-típica,
por sua vez, significa a manutenção do caráter proibido da conduta, porém com o
deslocamento do conteúdo criminoso para outro tipo penal. A intenção do legislador, nesse
caso, é que a conduta permaneça proibida pelo Direito Penal. Percebe-se esse fenômeno
quando a conduta de vender bebida alcoólica, permanecendo infração penal, migra da Lei
das Contravenções para o ECA, como crime.
É comum uma contravenção penal, de repente, se transformar em crime? No Brasil,
infração penal é gênero, podendo ser dividida em crime (ou delito) e contravenção penal
(ou crime anão, delito liliputiano ou crime vagabundo). Adotou-se o sistema dualista ou
binário. Essas espécies, no entanto, não guardam entre si distinções de natureza ontológica
(do ser), mas apenas axiológica (de valor).
Conclui-se, com isto, que o rótulo de crime ou contravenção penal para determinado
comportamento humano depende do valor que lhe é conferido pelo legislador: as condutas
mais graves devem ser etiquetadas como crimes; as menos lesivas, como contravenções
penais. Trata-se, portanto, de opção política que varia de acordo com o momento
histórico-social em que vive o país, sujeito a mutações.
No passado (década de 40), a venda de bebidas alcoólicas para menores não parecia
grave. Hoje o legislador atento ao problema, percebeu que a conduta é gravíssima,
merecendo maior atenção. Logo, o mesmo comportamento, que antes caracterizava
contravenção, agora é crime.
Quais são as principais repercussões geradas pela mudança (uma conduta passar de
contravenção para crime)? Vejamos:
a) Quanto à pena privativa de liberdade imposta. Nos termos do que disposto no art.
1.º da Lei de Introdução ao Código Penal, “Considera-se crime a infração penal que a lei
comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou
cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina,
isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou
cumulativamente” (art. 1.º). Percebam, portanto, que os crimes serão punidos com penas
mais severas (reclusão ou detenção), enquanto as contravenções penais com penas menos
severas (destacando-se a prisão simples, art. 6.º da LCP, que não segue os rigores
penitenciários daquelas).
b) Quanto à admissibilidade da tentativa. A tentativa de crime é punida nos termos
do art. 14, parágrafo único, do Código Penal. Por sua vez, muito embora possa ocorrer no
mundo dos fatos, a tentativa de contravenção penal não é punível, consoante disposição
do art. 4.º da Lei de Contravenções Penais.
c) Quanto à extraterritorialidade da lei penal brasileira. Presentes alguns requisitos, é
possível a aplicação da lei brasileira a crime praticado fora do nosso território, nos termos
do art. 7.º do Código Penal. Esta regra somente se aplica aos crimes, já que para as
contravenções penais vige o art. 2.º da LCP, que determina: “A lei brasileira só é aplicável
à contravenção praticada no território nacional”.
d) Quanto ao cabimento de prisão preventiva e temporária. A prisão preventiva não
pode ser imposta pela prática de contravenção penal por interpretação do art. 313 do
Código de Processo Penal. Esta medida cautelar restringe-se à prática de crime. A prisão
temporária, por sua vez, somente pode ser aplicada às infrações penais listadas em rol
taxativo previsto no art. 1.º, III, da Lei n. 7.960/89, rol no qual não se incluiu qualquer
contravenção penal.
e) Quanto à possibilidade de confisco. Somente é possível o confisco de bens que
configurem produto do crime, excluída a possibilidade deste efeito penal da sentença
condenatória em relação às contravenções penais. Diante desse quadro, o legislador,
quando pensa em criar uma infração penal, deve decidir se vai etiquetar o comportamento
ilícito como crime ou contravenção penal. Na sua decisão, deve (ou deveria) considerar as
diferenças acima. A sua opção pode gerar a punição (ou não) da tentativa; pode impedir
(ou não) pena de reclusão ou detenção; repercute na extraterritorialidade da nossa lei;
repercute, de forma direta, na possibilidade (ou não) de prisão provisória e confisco.
• Sujeitos do delito
Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, pois que se trata de crime comum.
Sujeito passivo será a criança ou o adolescente.
• Tipo objetivo
O tipo pune as seguintes condutas: vender (transmitir a outrem mediante
pagamento), fornecer (abastecer), servir (oferecer), ministrar (fazer tomar)
ou entregar (fazer chegar), ainda que gratuitamente, de qualquer forma, a criança ou a
adolescente, bebida alcoólica ou, sem justa causa, outros produtos cujos componentes
possam causar dependência física ou psíquica.
Quando a conduta do agente envolver outros produtos cujos componentes possam
causar dependência física ou psíquica, o tipo exige a observância do elemento
normativo ausência de justa causa para que o infante tenha acesso ao produto. Qualquer
das condutas praticadas com justa causa sempre tornará o fato atípico.
O tipo penal, ao estabelecer a pena, ressalva que esta só se aplica se o fato não
constituir crime mais grave. É que há determinadas substâncias de circulação vedada no
Brasil por meio de portaria emitida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, sendo
normalmente aquelas que, além da dependência, causam severa alteração de personalidade
e/ou efeitos alucinógenos, como cocaína, heroína, maconha, entre outras. Essas
substâncias, se vendidas, entregues, fornecidas ou ministradas a criança ou adolescente,
ensejarão a punição pelo tráfico de drogas tipificado no art. 33 da Lei n. 11.343/2006,
razão pela qual somente são abarcados no tipo penal em estudo os produtos de uso
permitido.
Tratando-se de tipo misto alternativo, se o agente praticar mais de uma conduta em
relação a apenas um infante, no mesmo contexto fático (vendendo e entregando, por
exemplo), o crime será único, devendo a conduta múltipla ser analisada no momento da
aplicação da pena.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consubstanciado na vontade consciente de praticar uma das condutas típicas.
Não se exige elemento subjetivo específico.
• Consumação e tentativa
A consumação ocorre no momento em que o agente vende, fornece, serve, ministra
ou entrega, ainda que gratuitamente, de qualquer forma, a criança ou a adolescente, bebida
alcoólica ou outros produtos cujos componentes possam causar dependência física ou
psíquica.
Há julgados no sentido de que o crime se configura com o simples fato de o infante
ter acesso à substância, sendo irrelevante, para tanto, a apuração de efetivo dano à saúde:
Estatuto da Criança e do Adolescente – Venda de bebida alcoólica a menor de dezoito
anos – Art. 243, ECA – Prova inequívoca – Prescindibilidade do laudo pericial – Recurso
provido. Incide nas penas do art. 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente, quem vende
a menor de dezoito (18) anos, um copo contendo bebida alcoólica, que, in casu, distribuiu o
conteúdo a outros adolescentes, ante a expressa determinação da lei, que a venda de álcool a
menor de dezoito (18) anos (art. 81, I, ECA), pois, ‘o álcool corrói o organismo, obnubila a
razão, causa dependência física ou psíquica e destrói o núcleo familiar, tornando o homem em
parasita humano’ (José Luiz Mônaco da Silva). A caracterização do crime previsto no art. 243
do ECA prescinde da realização do laudo pericial, haja vista que, além da ausência de previsão
legal neste sentido, não se pode aplicar, na hipótese, a mesma exigência que se faz, para a
configuração dos crimes definidos na Lei Antitóxicos (TJSC, ApCrim 32.874).

Tratando-se de crime plurissubsistente, é admissível a tentativa.


• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.
Art. 244. Vender, fornecer ainda que gratuitamente ou entregar, de qualquer
forma, a criança ou adolescente fogos de estampido ou de artifício, exceto aqueles
que, pelo seu reduzido potencial, sejam incapazes de provocar qualquer dano físico
em caso de utilização indevida:
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

• Sujeitos do delito
Qualquer pessoa pode figurar como sujeito ativo deste crime.
Sujeito passivo será a criança ou o adolescente e, secundariamente, a coletividade,
tendo em vista que fogos de artifício em poder de crianças (especialmente) e de
adolescentes causam perigo comum.
• Tipo objetivo
A conduta punida é a de vender (transmitir a outrem mediante
pagamento), fornecer (equipar, abastecer) ainda que gratuitamente ou entregar (fazer
chegar), de qualquer forma, a criança ou adolescente, fogos de estampido ou de artifício,
exceto aqueles que, pelo seu reduzido potencial, sejam incapazes de provocar qualquer
dano físico em caso de utilização indevida. 596
Justifica-se a punição em razão do evidente perigo representado por menores que
utilizam fogos de artifício sem a supervisão de um responsável, perigo este que não raras
vezes culmina na produção de resultados catastróficos tanto para quem manuseava o
artefato quanto para quem se encontrava nas imediações.
De acordo com o art. 3.º, LII, do Anexo do Dec. 3.665/2000, o termo fogos de
artifício é empregado como “designação comum de peças pirotécnicas preparadas para
transmitir a inflamação a fim de produzir luz, ruído, incêndios ou explosões, e
normalmente empregada em festividades”. A diferença entre fogos de artifício e fogos de
estampido reside unicamente no fato de que neste último não são produzidos efeitos
visuais, mas apenas ruídos ou explosões.
• Tipo subjetivo
É o dolo, consistente na vontade consciente de praticar uma das condutas típicas.
Não se exige nenhum elemento subjetivo específico.
• Consumação e tentativa
A consumação ocorre no momento em que o agente efetua a venda, o fornecimento
ou a entrega do artefato explosivo à criança ou ao adolescente.
O conatus é admitido porque se trata de crime plurissubsistente.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.
Art. 244-A. Submeter criança ou adolescente, como tais definidos no caput do
art. 2.º desta Lei, à prostituição ou à exploração sexual:
Pena – reclusão de quatro a dez anos e multa, além da perda de bens e valores
utilizados na prática criminosa em favor do Fundo dos Direitos da Criança e do
Adolescente da unidade da Federação (Estado ou Distrito Federal) em que foi
cometido o crime, ressalvado o direito de terceiro de boa-fé. (Redação dada pela Lei
n. 13.440, de 2017)
§ 1.º Incorrem nas mesmas penas o proprietário, o gerente ou o responsável pelo
local em que se verifique a submissão de criança ou adolescente às práticas referidas
no caput deste artigo.
§ 2.º Constitui efeito obrigatório da condenação a cassação da licença de
localização e de funcionamento do estabelecimento.

O art. 244-A do Estatuto da Criança e do Adolescente, introduzido pela Lei n.


9.975/2000, pune a conduta de submeter criança ou adolescente a prostituição ou a
exploração sexual. Há ainda dois parágrafos, segundo os quais: a) incorrem nas mesmas
penas o proprietário, o gerente ou o responsável pelo local em que se verifique a submissão
de criança ou adolescente às práticas referidas no caput (§ 1.º); e b) constitui efeito
obrigatório da condenação a cassação da licença de localização e de funcionamento do
estabelecimento (§ 2.º).
O crime é comum, ou seja, pode ser praticado por qualquer pessoa, inclusive pelos
pais do menor.
A ação nuclear típica é a de submeter (sujeitar, expor) criança ou adolescente a
prostituição ou a exploração sexual.
A prostituição está incluída na exploração sexual, que, de acordo com o primoroso
estudo de Eva Faleiros597, pode ser definida como uma dominação e abuso do corpo de
crianças, adolescentes e adultos (oferta), por exploradores sexuais (mercadores),
organizados, muitas vezes, em rede de comercialização local e global (mercado), ou por
pais ou responsáveis, e por consumidores de serviços sexuais pagos (demanda), admitindo
quatro modalidades:
a) prostituição – atividade na qual atos sexuais são negociados em troca de pagamento,
não apenas monetário;
b) turismo sexual – é o comércio sexual, bem articulado, em cidades turísticas,
envolvendo turistas nacionais e estrangeiros e principalmente mulheres jovens, de setores
excluídos de Países de Terceiro Mundo;
c) pornografia – produção, exibição, distribuição, venda, compra, posse e utilização
de material pornográfico, presente também na literatura, cinema, propaganda etc.; e
d) tráfico para fins sexuais – movimento clandestino e ilícito de pessoas através de
fronteiras nacionais, com o objetivo de forçar mulheres e adolescentes a entrar em situações
sexualmente opressoras e exploradoras, para lucro dos aliciadores, traficantes.
De acordo com a orientação majoritária da doutrina, o art. 244-A do Estatuto da
Criança e do Adolescente foi tacitamente revogado pelo art. 218-B do Código Penal,
incluído pela Lei 12.015/2009 e que pune a conduta de submeter, induzir ou atrair à
prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de dezoito anos ou que,
por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática
do ato. Pune-se ainda quem facilitar a prostituição ou impedir ou dificultar que a vítima a
abandone. A pena é de reclusão de quatro a dez anos.
O § 1.º do art. 218-B determina a aplicação de multa cumulativamente se o crime é
praticado com o fim de obter vantagem econômica. O § 2.º, por sua vez, pune de forma
equiparada às condutas do caput: “I – quem pratica conjunção carnal ou outro ato
libidinoso com alguém menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos na situação
descrita no caput deste artigo; II – o proprietário, o gerente ou o responsável pelo local em
que se verifiquem as práticas referidas no caput deste artigo”.
E o § 3.º dispõe que, na hipótese do inc. II do § 2.º, constitui efeito obrigatório da
condenação a cassação da licença de localização e de funcionamento do estabelecimento.
Como podemos constatar, o art. 218-B do Código Penal abrange completamente a
conduta antes tipificada no art. 244-A do ECA e a complementa, pois, nos termos de seu
§ 1.º, inc. I, é também punida a conduta de quem mantém relação sexual com adolescente
(maior de quatorze anos) submetido a exploração sexual. Ressalvamos a idade maior de
quatorze anos porque, se a vítima for menor, a conduta se subsume ao estupro de
vulnerável, crime pelo qual responde, na qualidade de partícipe, inclusive quem submete
a vítima a exploração sexual.
Essa conduta de quem mantém relação sexual eventual com menor explorado
sexualmente era objeto de muita discussão, pois havia quem sustentasse a punição do agente
como partícipe do art. 244-A ao mesmo tempo em que outros consideravam atípica a
conduta. Esta última orientação acabou sendo adotada pelo STJ: “É entendimento
consolidado no Superior Tribunal de Justiça que a conduta praticada pelo cliente ocasional
não configura o tipo penal do art. 244-A do ECA (precedentes)” (RHC
80.481/PR, DJe 11.04.2017).
Com a introdução do art. 218-B no Código Penal, não há mais dúvida: o cliente
ocasional de adolescente entre quatorze e dezoito anos submetido a prostituição deve ser
punido.
Não obstante a evidente revogação (tácita) do art. 244-A, a Lei n. 13.441/2017 lhe
introduziu uma modificação no preceito secundário. A pena de reclusão permanece de
quatro a dez anos, mas, de acordo com a nova regra, aplica-se também a perda de bens e
valores utilizados na prática criminosa em favor do Fundo dos Direitos da Criança e do
Adolescente da unidade da Federação (Estado ou Distrito Federal) em que foi cometido o
crime, ressalvado o direito de terceiro de boa-fé.
Trata-se, a nosso ver, de alteração inócua não somente em virtude da revogação do
dispositivo, mas também porque a combinação dos arts. 91 e 218-B, § 3.º, do CP permite
a aplicação de efeitos semelhantes: este último dispositivo determina, como efeito
obrigatório da condenação, a cassação da licença de localização e de funcionamento do
estabelecimento. Em decorrência do primeiro, o condenado perde, em favor da União, o
produto do crime ou qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido com a prática
do fato criminoso. Não obstante o dispositivo se refira à União, nada impede que o juiz,
fundamentando-se no fato de que o crime vitimou uma criança ou um adolescente,
determine a perda de bens e valores utilizados na prática criminosa em favor do Fundo dos
Direitos da Criança e do Adolescente da unidade da Federação em que foi cometido o
crime.
Art. 244-B. Corromper ou facilitar a corrupção de menor de 18 (dezoito) anos,
com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la:598
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
§ 1.º Incorre nas penas previstas no caput deste artigo quem pratica as condutas
ali tipificadas utilizando-se de quaisquer meios eletrônicos, inclusive salas de bate-
papo da internet.
§ 2.º As penas previstas no caput deste artigo são aumentadas de 1/3 (um terço)
no caso de a infração cometida ou induzida estar incluída no rol do art. 1.º da Lei n.
8.072, de 25 de julho de 1990.

• Sujeitos do crime
Trata-se de crime comum, não se exigindo qualidade ou condição especial do agente.
O sujeito passivo pode ser qualquer pessoa, menor de dezoito anos, desde que ainda
não inteiramente corrompida, pois a configuração do delito tem como pressuposto a
indeclinável integridade moral da vítima. Nesse sentido, explica Nucci: “O objetivo do
tipo penal é evitar que ocorra a deturpação na formação da personalidade do menor de 18
anos. Se este já está corrompido, considera-se impossível qualquer atuação do maior, nos
termos do art. 17 do Código Penal”.599
• Tipo objetivo
As condutas típicas são corromper (perverter) ou facilitar a corrupção (induzir a
praticar), de pessoa menor de dezoito anos (criança ou adolescente), com ele praticando
infração penal ou induzindo-o a praticá-la. Da parte final do dispositivo percebe-se a
necessidade de o maior ser coautor da infração, executando-a juntamente com o menor,
ou ao menos partícipe do ilícito, induzindo, instigando ou prestando auxílio material para
o menor praticá-lo.
Usando, indistintamente, o termo infração penal, para o legislador estará caracterizado
o crime de corrupção de menores mesmo quando a vítima for orientada pelo agente a
praticar contravenção penal. Aliás, o § 2.º majora a pena de um terço no caso de a infração
cometida ou induzida estar incluída no rol do art. 1.º da Lei n. 8.072/1990. 600
Apesar de desnecessário, entendeu por bem o legislador ressaltar que incorre nas
mesmas penas quem pratica as condutas ali tipificadas utilizando-se de quaisquer meios
eletrônicos, inclusive salas de bate-papo da Internet (comportamento que, segundo
pensamos, já estava abrangido pelo caput).
• Tipo subjetivo
O crime de corrupção de menores é punido somente a título de dolo, consistente na
vontade consciente de corromper ou facilitar a corrupção de menor de dezoito anos, com
ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la.
Silvio Maciel, não sem razão, alerta que o “maior não cometerá o crime, portanto,
se, culposamente, induzir o menor a praticar uma infração penal. Assim, se o agente, por
imprudência, induz o adolescente a exceder a velocidade do automóvel e este atropela e
mata culposamente alguém, não se cogita do delito de corrupção de menores, embora o
maior será responsabilizado pelo delito de homicídio culposo” (Legislação criminal
especial, vol. 6).
• Consumação e tentativa
A doutrina e a jurisprudência divergiam no tocante ao momento consumativo do
delito.
Para uns, trata-se de crime formal, sendo suficiente para a consumação que o menor
pratique (ou seja induzido a praticar) infração penal, dispensando a prova da subsequente
corrupção da vítima. Deve ser observado, contudo, que menor já corrompido não permite
a tipificação do crime. Nesse sentido:
Penal – Recurso especial – Art. 1.º da Lei n. 2.252/54 (corrupção de menores)
[atualmente revogada pela Lei n. 12.015/2009] – Absolvição – Crime de perigo – Anterior
inocência moral do menor – Presunção iuris tantum. I – O crime previsto no art. 1.º da Lei
n. 2.252/54 [atualmente revogada pela Lei n. 12.015/2009] é de perigo, sendo despicienda a
demonstração de efetiva e posterior corrupção penal do menor. II – No entanto, a anterior
inocência moral do menor se presume iuris tantum como pressuposto fático do tipo. Quem já
foi corrompido não pode ser vítima do delito sob exame (Precedentes). III – In casu, restou
cabalmente demonstrado, através de documentos, conforme reconhecido tanto na sentença
condenatória quanto no v. acórdão guerreado, que os menores que participaram da conduta
delituosa já contavam com diversas passagens pelo Juízo da Infância e da Juventude pela prática
de atos infracionais graves, inclusive com aplicação de várias medidas socioeducativas. IV –
Comprovado que os menores já eram corrompidos, não se verifica a prática do delito previsto
no art. 1.º da Lei n. 2.252/54 [atualmente revogado pela Lei n. 12.015/2009] (STJ, REsp
822.977/RJ, rel. Min. Félix Fischer).

Para outros o delito é material, não bastando que o adolescente pratique (ou seja
induzido a praticar) a infração penal, sendo necessária, ainda, a sua efetiva corrupção. Havia
decisões nesse sentido no próprio STJ, demonstrando o quanto era polêmica a questão:
Penal – Corrupção de menores – Lei n. 2.252/54 [atualmente revogada pela Lei n.
12.015/2009] – Caracterização – Crime matéria – Provas da efetiva corrupção do adolescente
– Necessidade – O crime de corrupção de menores, descrito no art. 1.º da Lei n. 2.252/54
[atualmente revogado pela Lei n. 12.015/2009], em qualquer das suas duas formas de conduta
– corromper ou facilitar a corrupção –, tem a natureza de crime material, que se configura em
face do resultado, sendo, portanto, necessário para a sua configuração que se demonstre a
efetiva corrupção do adolescente. Recurso especial conhecido, mas desprovido (STJ, REsp
150392/DF, 6.ª T., j. 11.04.2000, v.u., rel. Min. Vicente Leal, DJU 02.05.2000, p. 187).

Pondo uma “pá de cal” na discussão, o próprio Superior Tribunal de Justiça editou a
Súmula 500, segundo a qual a configuração do crime previsto no art. 244-B do ECA
independe da prova da efetiva corrupção do menor (leia-se criança ou adolescente), por se
tratar de delito formal. No mesmo sentido, o STF, no HC n. 104.342, rel. Min. Marco
Aurélio, 1.ª T., j. 06.03.2018, decidiu que o fato de ser “o menor” arregimentado para a
prática criminosa ter vida pregressa condenável não afasta a incidência do art. 244-B do
Estatuto.
Apesar de haver corrente em sentido contrário, parece-nos perfeitamente possível a
tentativa, independentemente do posicionamento adotado quanto à consumação.
• Competência para o processo e julgamento
Em regra, é da Justiça Estadual, salvo se presente alguma das hipóteses do art. 109 do
CP, quando, então, a competência será da Justiça Federal.

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