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O que ficou pelo caminho?

Aqueles cobertores eram mesmo feitos para nos esquentar?


Ou era só uma maneira que encontramos de nos esconder?

Ainda lembro do gosto. Aquelas noites ganham cores novas agora. Mas nenhuma como
antes.

A vida anda bonita por aqui.


Nós ainda corremos atrás do que nunca importou.
Nós ainda deixamos de falar do mais importante.
Choramos por coisas pequenas e rimos por bobagens, mesmo o meu riso já não sendo
assim tão fácil quanto antes.
Aquela cidade sempre foi pequena.
Aquelas pessoas eram e ainda são mesquinhas demais.

Nada muda.

Mas seu sorriso ainda tá aqui.


Aquele primeiro abraço parece durar até hoje.
Vidas foram vividas naquele espaço de tempo.
Me lembro do cheiro. Me lembro da música.

Como você está?


Encontrou o que te faltava?

Me desculpa. Eu menti.
Tenho a impressão de que sua busca não pode terminar.
O que te falta fica longe demais para alguém como você, de carne e osso conseguir
alcançar.
Talvez você tenha nos deixado por não saber ser feliz. Mas sinceramente, alguém sabe?

Sei que separados caímos em limitações. Vivemos a finitude. Mas sinto que juntos, nós
tínhamos por instantes tudo. Tudo que precisávamos.

Eu trazia inocência pro jantar, e você, preparava com toda malícia e sutileza uma dança
para mim.
Sempre gostou de ver aquele menino sem palavras, né?
Bom... talvez seja por isso que ele desenvolveu um caso de amor tão conturbado
duradouro com elas.
Você deixou um menino pensando nelas por tempo demais.

Tempos depois, se podemos dizer, ele e as palavras fizeram as pazes. Vivem hoje um
caso de amor muito longe do "felizes para sempre". Mas na medida da realidade, apenas
felizes por vezes. Vezes por esforço, vezes por acaso.
Há manhãs que acordo de um sonho bom, e acho que estou vivendo em outro tempo,
outro lugar.
Não preciso dizer que não estou. Mas esse frescor inicial, essa magia de reaparecer, só a
embriaguez e a ignorância podem dar.
Confesso que o sentimento inicial é ótimo, mas a realidade é uma só, e a lembrança me
estraga.

Ainda brincamos de esconde-esconde, mesmo que em pensamento?


Eu que sempre me escondi bem, passava horas planejando os melhores lugares. Agora
vejo que nunca foi preciso. Não poderíamos encontrar esconderijo melhor que nós
mesmos.
Somos dois sobreviventes.
É bom te ter aqui.

Aquele ano foi sobre você. E você nunca foi sobre coisa alguma que eu pudesse
escrever.

Por que correu?


Eu nunca quis te fazer mal.
Eu estava só entendendo como me encontrar.

Seus olhos ainda me pescam. Sei que sim.

Me entrega seu sonho, que devolvo todo seu amor. Sempre sobrou demais no mundo.

Não poderia ter sido diferente.

A vida continua.

Se me visse, se encheria de orgulho.

Ainda toco meu violão, como disse que faria.


Faço minhas próprias músicas.
Faço meus próprios quadros de pinturas.
Gravo nossas histórias em tudo... em tudo... de formas diferentes.

As pessoas amam, sabia? Centenas de milhares delas querem ouvi-las.


Agora, fica entre nós, não conte a elas, se não eu perderia minhas regalias.
Elas gostam de ouvir minhas histórias.
Acham incríveis.
Mas não fazem ideia de que essas aqui são só migalhas. Migalhas do que sobrou.
Se tivessem a chance de viver o que eu vivi, sentir o que eu senti, achariam essas coisas
que escrevo até simplistas demais. Pena delas não terem vivido.
Juro, a sorte é toda minha.

Do outro lado do mundo, envio esse sinal de vida.


Pra sempre seu. Eu.

Te vejo sempre nos seus melhores traços, nas velhas lembranças, e no breve frescor
onírico das manhãs.

Todo o meu amor, hoje, como sempre.


Um dia, quem sabe, não me acho?

Fabrício Negreiros

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