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Be Huo Mart Ipa LUCIA MacHabo RENATO DE MELLO Orgs: PMNS) O ANALISE DO DISCURSO Fundamentos ¢ Praticas FACULDADE DE LETRAS DA UFMG Niicleo de Anilise do Discurso BELO HORIZONTE. 2001 MARL Het ali Anise de soo: fndamenter epics. Belo Herizone: Nileo de Andlise do Discuso-FALEZUFMG, 2001 UMA TEORIA DOS SUIBITOS DA LI NGUAGEM> PATRICK CHARAUDEAU Paris XUL Levando-s jo que a antropologia, a sociologia ¢ a psicologia social — disciplinas as quais 0 termo lingiifstico é, freqiientemente, acrescentado como sufixo — exercem sobre a ciéncia da linguagem, podemos pergumtar se esta pos especificidade, um campo préprio, E t6gico que tal qu homem de eiGncin ta 10 pode ser respondida com a segitranga do. rnaclat parece abalar, cm sua torre «le martin: “Da punto de visus tedrieo, haje, came a vinte anos atrds, lingitistica & constituida de wn niicleo dura e de wad ~ periferia mole, O micleo duro esté na gramditica gerativa Lu] ¢ 0 “uicleo duro"do niicleo duro continua sendo o trabalho de Chomsky e seus discipulos préximos.” * Eniretanto, algumas quesies fundamentais foram colocadas lingtifstica’pelas disciplinas acima citadas: como compreender um objeto de linguagem que se apresenta desprovido de sua dimensiio psicossocial? O que so essas descrigdes de sistema que néio nos permitem dar conta da comunicagao humana? Como captar 0 fendmeno da significago em uma anilise da linguagem que no se interessa pelas condigdes de produgio? O que pode significar uma sintaxe, tio claborada e rigorosa, mas incapaz de explicar as 1 Este artigo teve sua primeira publicacio na revista Langages et Soci Paris, n, 28, Maison des Sciences de l'Homme, jun. 1984. 2 Ruwet, N. Linguistique. im: Magazine Littéraire, Paris. n. 200/201, p. 44 nov. 1983. expectativas psicossociais produzidas em um ato de linguagen? Sio essus questies que, jit hi alguns anos, esto concluzindo os estudos lingiifsticos rumo a novas hipyiteses que poelems marcar a histéria ciéncia da linguagem. EE por isso que nos parece dificil concordar com Ruwet (1983) quando ele diz: nox trabulhos ‘fronteivigos’ & que se encontra maior confusdo, menos rigor: esto me referindo, aqui, aos iniimeros trabathos realicadas sobre a couunicergic, un dees initas de nosso tenpo, & ans tvabalhos = por vezes demaxdgicns ~ realizadlas sobre as niveis da ling Kinguagem oral, ete ts, eet Enfim, devemos olhar para o futuro sem complexos © sem receio de afirmar que os citados trabathos tiveram o mérito de garantir uma abertura cieniffica, contribuindo, conseqiientemente, para o progress do espitito humane. Partindo da hipstese de que é possivel estudar a linguagem levando-se em conta sua dimensio psicossocial, gostariamos de mostrar que uma (coria do discurso mio pode prescindir de uma definigtio dos sujeitos do ato de linguagem. O piscurso Para comegar, consideremos algumas informagdes sobre 0 termo discurso. Nio € nosso objetivo, aqui, definir 0 conccito de discurso, dado que & participando do conjunto de uma teoria que 0 discurso é por ela definida, Gostariamas, apenas, de delimitar o Cerritérie no qual ele pode se mover, 0 que nos permitira evitar algumas confusbes, visto que 0 termo em questo é empregado em diversas acepgées. O discurso deve ser assimilado a expresso verbal da linguagem, A linguagem, mesmo sendo dominante no conjunto das manifestagdes linguageiras, corresponde a um certo eddigo semiolégico’, isto é, a um Conjunto estruturado de signos formais, do mesmo modo, por exemplo, que o cédigo gestual (linguagem do gesto} ou 0 cédigo Nesse sentido, convém distinguir 0 c6digo semiolégico verbal oral do grafico. 24 icdnico (linguayem cht imagem). O discurso ultrapassa os eddligos de manifestagdo linguageira na medida em que & o lugar da encenagao da signilicagio, senda que pode utilizar, conforme seus fins, um ou viirios cédigos semiolégicos. Nao pretendemos dizer, com isso, que existiria um estado do discurso anterior & produgio da manifestagio € dela independente, E preciso que Figue’ claro que toda encenagio discursiva depende cus caracteristicas desses eddigos © de todos os cAdigos nela envalvidos. O que propomos, enti, é que nfo se limite 2 aeepgia desse terma somente ao caso tht verbal, considerando-n como a tnici munifestagia possivel Nao se deve confundir discurso com fexto, E preciso considerar texto como o objeto que representa a materializagao da encenagtio do ato de linguagem, O texto é 0 resultado singular de um processo que depende Ge um sujeito falante particular © de circunstincias de produgio particulares.’ Cada texto é, assim, atravessado por wirios discursos ligadas a géneros ou a situagées diferentes. Por exemplo, 0 género politico’ pode ser entrecruzado por um discurse diddtico ou por um discurso de humor. 0 Discurso nao deve ser compreendiclo segundo a tradigio lingtifstica, ow seja, come a unidade que ultrapassa a frase, A relagio entre diversas frases nao constitui, necessariamente, a unidade-discurso. E pteciso, como veremos mais adiante, que wma seqtiéneia de frases corresponda & expectativa da troca linguageira entre parceiros em circunstincias bem determinadas. Mas, note-se, também, que uma frase, uma palavra, um gesto podem ser portadares de discurso, desde. que Satisfagam & condigao acim. Enfim, © discurso aqui, considerado no sentido de Benveniste (1966: 238), com stia oposigio entre discurso e histéria, ou seja “dois planos diferentes de enunciagzo.” Uma vez mais, 0 discurso diz respeito a0 conjunto da encenagaa da significagiio do qual "Nao cenfundic, ambém, texto © corpus, 0 corpus é um outro objeto, construtdo pola reuniso de diversos texios (textos estes que sezvem certos parimetros, cuja finalidade’ € a de dar a0 corpus um principio de hhomogencidade). 5Tal posiga & questionsivel. Preferimas, na verdade, falar de ritwat potitice (wide "Le discours propagandiste”, in: Le Francais dans te monde, Batis, Hachette, n, 182, jan. 1984), 2s um dos componentes & enunciative (discurso) € © outro enuncivo (histéria). Essas distingdes no nos dao, ainda, uma definigao precisa do conceito de disewrrso, mas elas t&m 0 mérito de colocar em evidéncia, por contrasie, algumas de suas caracteristicas. O termo discurse pode ser, assim, utilizado em dois sentidos: Em um primeiro sentido, discurso esti relacionado a0 fendmeno da encenagao do ato de Tinguagem. Esta encenagio depende de um dispositive que compreende dois circuitos: um circuito externo, que representa 0 lugar do fazer psicossocial (0 situacional) € um circuito interno que representa o lugar da organizagéo do dizer. Reservaremos 0 termo discurso a0 dominio do dizer. Sera feita, conseqiientemente, uma oposi¢io entre encenagdo discursiva e encenagdo lingnageira, na medida em que a segunda, incluindo o aspecto sittacional do ato de linguagem, engloba a primeira, Note-se que, mesmo possuindo um dispositive proprio que Ihe confere autonomia, a encenagéia discursiva niio se consiréi independentemente di encenagia lingnageira. \ encenagéo discursive promowera a realizagio de xénaros © de esiratégins que nie esti, abr niente, ligados as cizcunstneias de produgio. Assim, discurso diditico, em suas caracteristicas do dizer, no esti, exclusivamente, ligado & situagio escolar ~ que chamaremos de ritual ~ € pode ser encontrado em outros tipos de situagio (politica, cientifica, das midias®, etc.); Em um segundo sentido, discurso pode ser relacionado a um conjunto de saberes partilhados, construfdo, na maior parte das vezes, de modo inconsciente, pelos individuas pertencentes a um dado grupo social. Os discursos saciais (ou imaginrios sociais) mostram a maneira pela qual as préticas sociais. sto tepresentadas em um dado contexto socio-cultural e como si0 racionalizadas em termos de valor: sério/descontraido, popular! aristocritico, polido/impolido, ete. © 0 termo Midia, aqui, est sendo utilizado no sentido de veiculo de informagio (imprensa escrita, rid, televisa0).. 26 Os SUIEITOS DA LINGUAC Colocar os sujeitos da linguagem no centro das teorias lings uma precupago recente © ainda nao generaizada. De fato, durante muito tempo ~ até o surgimento da Teoria da Enunciagao — a lingua cera considerada como um objeto abstralo, e era necessirio descrever seus sistemas internos. Além disso, 0 termo sujeito sé tinha uma realidade gramatical, , ainda que na ret6rica antiga a atividnde da linguagem fosse considerada como arte da persuasio, esse sujeito nia estava presente como ser da enunciagdo. Com as teorias estruturalistas ¢ sua orientagio para a atividade da comunicagio — reduzida e simplificada ao extremo pela teoria matemiticn da informagao — assim como a teoria gerativa de Chomsky, 0 ato de finguagem € 0 feito de um “locutor-ouvinte ideal” ce de um processo simétrico entre aquele que o produz e aquele que o recebe ¢ 0 decodifica. Nao hd, portanto, lugar para a teorin dos sujeitos, uma vez que estes desaparecem na abstragio ideal de um modelo dle competéncia supostamente perfeito. Com a Teoria da Enunciagio, 1 presenga dos responsiveis pelo ato de linguagem, suas iddemticides, seus estatuitos e seus papéis, sta levaclos em consideragao, Iii em Jakobson (1963), os conceitos de emissor e receptor encontram- se distinguidos e personalizados pelas fungdes emotiva e conativa que Ihes sfio associadas, Entretanto, é com Benveniste (1966) que se produz a primeira mudanca teérica de importancia: “... a subjetividade 6a capacidade do locutor de se colocar como sujeito”. Ao dizer que subjetivo € 0 ordenador da organizagio da linguagem, Benveniste dé primazia & enunciagio sobre 0 enunciado © abre caminho para os novos estudos fundados sobre a oposigio “Ew/Tu" A Pragmética vai ainda mais longe, uma vez que, sem se basear em uma verdadeira teoria dos sujeitos, leva em conta o estatuto linguageiro do sujeito falante para explicar os performativas: entre as condigées que definem a performatividade de um enunciado como “a sesso esti aberta”, estio a de se ter 0 estatuto de presidente da sessiio ea de sero sujeito que promuncia este enunciado, Embora essa posigio seja discutida mais adiante, gostariamos, desde ié, de reconhecer 0 papel inovador desempenhado pela pragmética em relagdo as outras teorias da fingua, n Lembremo-nos também que, paralelamente ao desenvolvimento das, teorias Tingtifsticas dos anos 60, a semistica tentard distinguir, nos objetos literdrios, varios tipos de enunciadores, destinadores, destinatdrios, etc., sobrettido através dos trabalhos de Barthes, Enfim, tanto na Europa quanto nos Estados Unidos, sob a influéncia do desenvolvimento dos estuclos antropoldgicos € sociolégicos cada ‘vez, mais interessados pela linguagem, nasce um ponto de vista macro- sociolingtifstico que integra, a uma dada situagao linguageira, todos os membros do grupo social nela inseridos. Dai os termos de participantes, atores, parceiros que podem ser encontrados aos trabalhos de Bernstein (1971),Halliday (1973), Hymes (1974), Fishman (1971), Labov (1971) ¢ Goffman (1974). Nio se pode dizer que 0 emprego desses termos seja de uma grande precisio, pois sio Uutilizados, ais vezes, uns no lugar dos outros. De qualquer forma, eles tém 0 mérito de obrigar toda teoria do discurso a se interrogar sobre a natureza dos seres sociais que participam das trocas linguageiras. Antes de passurmos is definigées, vejamos as hipsteses que constituem 0 quudro de nossa teoria exposta no livro Langage ef Discours (Charaudeau, 1983). 1. © ata de linguagem’ & um fendmeno que combina 0 dizer ¢ 0 fat O Jacer & 0 lugar da instiincia siteacional que se auto-detine pelo espiago que ocupam ox responsiveis deste ato (vor, mais. adiante, purceiros). O dizer & 0 lugar da insténvia discnrsiva que se iuto~ define comio uma enceniagdo de ual participam seres de pakivea (ver, mais adiante, protegonistas). Esta dupla realidade do dlizer e do fazer nos leva a considerar que © ato de finguagem é uma totalidade que se compie de um circuifo externo (fazer) e de um circuito interno (dizer), indissociaveis um do outro. 2. Todo ato de linguagem corresponde a uma dada expectativa de significagio®. O ato de linguagem pode ser considerado como uma Esse termo nio €, aqui, tomado no sentido que the dé a Pragnidtiea, mas sim em um sentido mais extenso, uma vez que cle designa © conjunto da realidade Tinguageiea * Devemos lembrar que utilizamas esse termo como senclo oposto a sentide (Langage et Discours, p. 18 & “Sens et signification”, in: Cahiers de 28 interagao” de intencionalidades cujo motor seria o principio de jogo: “Jogar um lance na expeetativa de ganhar.”"" O que nos leva a afirmar gue a encenagio do dizer depende de uma atividade estratézica (Conjunto de estratégias discursivas) que considera as determinagies do quacro situacional. 3) Todo ato de linguagem & 0 produto da-agiio de seres psicossociais que sio testemunhas, mais ou menos conscientes, das prifticas sociais € das representagées imaginirias da comunidade qual pertencem. sso nos leva a colocar que o ato de lingwagem niio é totalmente consciente e & subsumido por um certo ntimero de rituais. socio- linguageiros. Esse conjunto de hipdteses define nosso quadro teérico, que pode ser representadlo, pela seguinte figura: Fazer-Situacional circuito interno — Dizer BUc Bue< >TUd | Tui reuito extemo Fazer Relagio Contratual Vejamos, pois, as denominagdes por nés acima wtilizadas © suas respectivas definigdes: Lexicologie n. 21, Paris, Didier, 1972), em urna acepgio diversa da de Ducrot (Les mots du discours, Paris Editions de Minuit, 1980). ° Todo ato de linguagem em seu duplo processo de producdo e de imerprotagdo & uma interagao. Esse termo no 6, pois, reservado somente twagio dialdgica, Essa analogia com a teoria do jogo é também wilizada por analistas da conversnedo e por certs psicassocidlogos. 1. Sujeitos: das diferentes acepgées do dicion‘rio'! reteremos apenas a lilima: “Philo, Psycho. (empr. all, Kant). Ser pensante, considerado como a sede do canhecimento (em oposi¢de a objeto)", em um sentido rms restrito, O sujeito pode ser considerado como um lugar de produgio da significacio linguageira, para 0 qual esta significagio retorna, a fim de constitui-lo. O sujeita no & pois nem um individuo preciso, nem um ser coletivo particular: trata-se de uma abstragio, sede da produgiolinterpretagio da sign especificuda de acorda ‘com os lugares que ele ocupa no ato linguageiro, Falaremos, entio, no que nos concerne, Ue sujeit comumicanie, de aujeito enunciador, de sujeita destinatdrio ¢ de sujeito imerpreiante. 2. Parceiras: de uma maneira geral, reteremos do diciondrio! — ainda que nfo expressa nestes termos ~ &nogiio de “pessoas associadas”, em uma relugio de fucer-valer reeiprocar tals “pessoas” se consideram, por isso mesmo, clignas umas das outras (reconhecimento miitua). Na interagio Tinguageira, vemos dois parceiros: o sujeito comunicante (BUc) ¢ o sujeito interpretante (TUi), implicados no jogo que Ihes & proposto por uma relagéa contratual. Hiss relagio contratual nao se baseia nos estatutos sociais dos parceiros, do lado de fora da situagio linguageira, Ela depende do “desafio” construido no © pelo ato de linguagem, dlesafio este que contém uma expectativa (0 ato de linguagem vai ser bem sucedido ou niio?), Isso faz com que os parceiros s6 existam na medida em que eles se reconhegam (¢ se “construam”) uns aos outros com os estatutos, gue eles imaginam. E o caso de encontros entre parceiros em lugares como, por exemplo, bares ou restaurantes; nessas situagdes, os estatutos dos parceiros no vio depender tanto de categorias profissionais, hierarquizadas (patriiofempregado; intelectualfartistafcomerciante, cte,), iio depender mais de um. cstatuto de competéncia atribuido no momento dos ditos encontros sobre os temas em torno dos quais vai girar a conversagio (futebol, politica, moda, ete.). A relagdo contratual depende, portanto, de componentes mais ou menos objetivos, tornados pertinentes pelo jogo de expectativas que envolve o ato linguageiro. } Petit Robert. "ib 30 Estes componentes sao de trés tipas — comunicacional, concebide como o quadro fisico da situa interacional: os parceitos esto presentes? Bles se veer? Ainicos ou miltiplos? Que canat — oral au grifico ~ & por eles utilizado? ete, (Charaudeau, 1973)."* = psicossoetal, concebido em termas ox estanitos 4) pareeiros so suscetiveis de reconhecer um no outro: idade, SeX0, categoria socio-profissional, posigio hicrirquica, re de parentesco, fazer parte de uma instituigao de cariter priblico ou privad, ete = intencional, concebido como um conhecimenio @ priori que cada um dos parceiros possui (ou constréi para si mesmo) sobre © outro, de forma imagindria, fazendo apelo a saberes supostamente partilhados (intertextualidade)."* O componente intencional se apoia sobre duas questées que constituem os principios de base de sua realizacda: O que esta sendo colocado ‘em questo, com qual intengio de informagio? De gue maneira isso esti sendo veiculaclo, ot, quill ser a intengio estratégica de maniputacio? sujeito comunicante (EUe) & 0 parceiro que detém a iniciativa ro processo de interpretagio. Ele encena o Dizer em fungio dos trés Componentes acima ~ & no componente intencional que se integram as hipsteses de saber que este sujeito & levado a construir sobre 0 sujeito interpretante (TUi) ~ e através da percepeio que tem do ritual Tinguageiro no qual esté envalvido, Temos af o lugar de fala do EUc, sendo que 0 resultado dessa sua atividade esta centrado nas estratégias discursivas, que sdio suscetiveis de produzir efeitos de diseurso."® © Reflexion pour vine typotogie des discours", in; Etudes de liguistique EUe promete ¢ TUd & solicitide a crer nisso, Se TUi acreditar, de Falo, no que ouve, haverd um efeito performative (B. P.) para EUc e para TU: Porém, se TUi nao aereditar no que ouve, 0 I. P, nfio se dara b) EUe niio quer se comprometer a fiver algo > BUe, no entanto, promete © TUd € solicitado a erer nisso, Se TUi acreditar, de fato, no que ouve, haverd um E. P. para ele, mas no para EUc (que sabe que no esti dizendo a verdade mas, sim, contemporivaindo). ©) EUe niio quer se comprometer a fazer algo —> EUc promete, mas TUd & chamada a nfo erer (presenga de um indice que Propiciuré essa niio-crenga). Se TUi, por stia vez, niio acreditar no que ouve, no haverd efeito perform: conivente com EUc. " Ducrot distinavia, em 1977, 0 locvtor enquanto locutor (EUc) do locutor Personagem (EUe) no artigo “‘llocutoire et performalif™, in: Revue Linguistique et Sémiologie 4, P.ULL., 1977, . u Os exemplos de encenagio acima citados nos Jevam a afirmar que, nit andtise do discurso, s6 & possivel falar de efeita performaivo (E. P.), salvo se 0 conjunto do dispositive do ato de linguagem ¢ o lugar que ele ocupam os quatro sujeitos assegurarem ou niio tal efeito. 0 fato de que uma formula verbal qualquer, que nfo seja performativa ‘em si (no sentido inicial) possa contribuir para produzir a realizacio de uma agio enunciativa, mostra que esta niio esti necessariamente ligada ao emprego de uma férmula especifica, Vejamos 0 caso do enunciado “eu gostaria que voce viesse esta noite” dito por um pai a sua filha: se 0 pai (EUc) nao tem costume de dar ordens a sua filha © exerce essa relagiio de autoridade por meio de uma “negociagao”, e, se a filha em questo (TUi) sabe bem disso, € quase certo que tal enunciado produzira 0 efeito ¢ a realizagio da ordem, 0 que nio poderia ser determinado pelo uso de “eu gostaria que” em outras cireunstancias. Pensamos, assim, que a realizagio de uma agio enunciativa pode ser produzida por diferentes estratégias discursivas, sendo que algumas chegam até a mascarar 0 fazer peto dizer. Enfim, a andlise de algumas seqtiéneias interacionais permite evidenciar que, cada vez que 0 BUc utiliza uma férmula explicita (eu ordeno, eu prometo, cu permito, ete), Tudo se passa, do ponto de vista da estratégia discursiva, como se a validade da relago contratual estivesse sendo colocada em dtiyida, mesmo quando todas as condigées sio aparentemente preenchidas para produzit 0 efeito performativo. Um patrio que quisesse expulsar de seu escrit6rio um funciondrio que ali veio para fazer uma reivindicagiio, the diria: “Saia daqui, agora!” Sco funciondrio no o fizesse, 0 patrio poderia acrescentar: “Eu estou mandando © senhor sair!” , talvez, pudesse mesmo explicitar as condigdes de enunciagda dizendo: “Sou ex, seu superior, quem esti Ihe fulando!” Mas, as trés dltimas formulas no passam de um simulacro de E. Pa. nas quais se institut um sujeito destinatirio (TUd) mistificada, 0 resultado ficando na dependéncia da reagiio do TU: ‘Ao contririo, no se concebe que, no decorrer de um assalto a banco, © EUe enuncie algo como: “Eu ordeno que vocés me déem dinheiro!” A impressiio de esciirnio que ésentida em casos desse tipo 35 (bastante explorada em filmes cémicos, como alguns de Woody Allen) se deve & forga da ameaga que a relagdo contratual representa (0 assaltante esta armado). Nesse caso, cla seria contemplada com um enunciado breve, do tipo: “O dinheiro! A relagio, inversamente proporcional, entre 0 emprega da forma performativa explicita e 0 E. P. do ato de linguagem leva a adotar uma terminologia que pode dar lugar a confusdes. Assim, distinguiremos: = 0 ato de tinguagem que, como Foi dito no inicio deste artigo, diz respeito a totalidade da encenagaio linguageira com seus dais circuitos, externo ~ 0 da relacio contratual enire parceiras ~ & interno ~ 0 da encen: seus dois protagonistas, ~ oto de fala que diz respeite exclusivamente 2 encenagio do dizer, por meio de qualquer férmula verbal que seja, desde que cla assinale um ato enunciativo dando um determinado papel ao EUe ¢ ao TUd. O ato de fala_ndo representa, entiio, 0 todo do ato de linguagem, = a estratégia discursiva que leva em conta 0 efeito possivel produzido pelo ajustamento (0 jogo) entre a encenagio da dizer (o ato de Fala) ¢ & relagio contratual de fazer io da dizer, com Nessas condigdes, 0 conceito dle ato performativo parece ser inttit no mbito da a descrigo sempre particultr do ef ‘ajustamento entre 0 dizer ¢ 0 fazer edo discurso, visto que tl conceita desaparece sob a to estratégica produzide pelo Coneluiremes mostrando, rapidamente, 0 sentido atribuido a outras denominagdes que jé mencionamos: = lcwtorfinterlacitor servirie para designar os parceiros EUc & TUi, quando estes estiverem em situagao de comunicagio Utilizando o canal ora = scriptorfteitor designariio os mesmos. parceiros acima mencionados, quando a situagio de comunicagio for ndo- dialégica, quando o canal for grifico ou escritural. Deixaremos a terminologia atores & sociologia — pois esse termo poderia trazer uma certa confusiio em uma teoria do discurso, a menos 36 gue © liguemos aos participantes da etnografia da comunicaga etnometodologia — pois trnta-se de um ponto de socialdgico que escapa no que nés consideramos como a expectativa do ato de linguagem. O conceito de Aror poderia, no entanto, ser utilizado para designar um terceito implicado em um ato de linguagem. Emissor/Receptor serio deixados de lado, pois podem transmitir uma falsa idéia do que seja um ato de linguagem. Enfim ei/tu no serio considerados, jd que nos enviam, de modo bem restrito, as pessoas gramaticais, ainda que Benveniste tenha tido cuidado para evitar essa possfvel confusio. (Tradugao de Ida Lucia Machado, Renato de Mello e Williane Viriato Rolim ) REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ANSCOMBRE, J.C. La problématique de Vllocutoire dérivé. In: Langage et Société 2, 1977. : BENVENISTE, B. Problémes de linguistique générale, 1. 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