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Coordenação Editorial: Henrique Veber

Preparação de Originais: Gladis Cantini e Henrique Veber


Projeto Gráfico e Diagramação: Felipe Magnus
Capa e Ilustrações: Felipe Magnus
Revisão: Henrique Veber e Jonatan Ortiz Borges

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Nelson Oliveira da Silva – CRB 10/854

E23v Editora Entreverbo.


Coletânea Entreverbo 2022. / Editora Entreverbo; ilustração Felipe
Magnus. – Canoas: Entreverbo, 2023.

92 p.

ISBN: 978-65-992987-5-2

Literatura Brasileira: Poesia. 2. Coletânea I. Magnus, Felipe


II. Título

CDU 821.134.3(81)-1

Produção 100% em Software Livre.


Tipografia: Alata, Roboto Condensed e Pirata One (mod.)
3

Este livro é um compilado de 77 poemas publicados


nas cinco edições digitais da revista de poesia lusófona
Entreverbo no ano de 2022, com a participação de 53
poetas de vários estados do Brasil, de Portugal e de
brasileiros residentes no exterior, que aceitaram
gentilmente participar e financiar este projeto de livro
impresso. A Coletânea Entreverbo 2022 apresenta um
belo panorama da poesia contemporânea lusófona, que
mesmo na diversidade de formas e temas narra,
sobretudo, o seu tempo.
Com isso, algumas temáticas surgem de forma
recorrente, como os reflexos do período pandêmico
vivenciado recentemente, o abismo político que o país
passou nos últimos anos ao ser governado pela extrema
direita e que ainda está presente em nossa sociedade, a
poesia feminista das mulheres que reivindicam seu direito
de existir livremente numa sociedade marcada pelo
machismo, mas também a poesia lírica, metalinguística e
especulativa. Nos aspectos formais, a tônica da
diversidade se manifesta mais ainda, com a presença de
formas fixas, versos livres, prosa poética e poesia visual.
Mas por que editar um livro impresso de poemas já
publicados em meio digital? Marshall McLuhan, teórico
da comunicação e pensador canadense, cunhou o axioma
"o meio é a mensagem”, no livro com mesmo título
publicado em 1967. Com esta afirmação o autor deixava
claro que a mídia na qual é transmitida uma mensagem é
tão importante quanto o conteúdo, influenciando na
forma de fruir e compreender a mensagem.
4

Fazendo um paralelo entre a teoria de McLuhan e a


pergunta lançada acima, acreditamos que a experiência
de publicação na mídia revista digital, apesar de ter
atingido um amplo público nos últimos três anos, ainda
não é o meio mais universalizado para fruição da poesia.
A distribuição em formato digital sofre com a
fragmentação e a concorrência dos múltiplos focos de
atenção ofertados pelos dispositivos digitais e pela
internet. Por sua vez, o livro impresso, estabelecido como
meio tradicional de publicação literária, se mantém como
principal mídia de publicação de poesia e ainda atrai
maior público leitor, inclusive entre poetas.
Por essas razões, a Entreverbo Editora, junto aos
poetas que aqui publicam, decidiu lançar esta deliciosa
coletânea de poemas, para que a poesia, com suas
formas, palavras, sentimentos e ideias se propague cada
vez mais entre novos leitores através do seu mais
tradicional suporte, o bom e velho livro impresso, e que a
partir de sua leitura surjam novas experiências de fruição.

Henrique Veber
→ Editor Executivo Entreverbo
Adeneri Nogueira de Borba 76

Adson Leonardo 40 48

Alexandre Morais Paulino 49

André Galvão 52

Armando Martinelli 34

Benette Bacellar 09 24 50 61 77

Carla Marinho 10

Carlos Vilarinho 11 38 78

Charlene França 42 62

Cláudia Sotello 43

Cris Tavares 63

Daniel Morine 12 57

Delma Gonçalves 32 64

Edileine Carvalho Bisinella 79

Elisa Ribeiro 80

Elroucian Motta 36

Emerson Garcia de Souza 29 56

Everton Luiz Cidade 35


Fátima Farias 13

Fernanda Caleffi Barbetta 14

Flavio Machado 28 54 65 81

Gelbart S. Silva 83

Giovanni Alecrim 66

Helena da Rosa 33

James Berwaldt 84

Jorge Abreu 55

Lecy Sousa 41 85

Léo Cruz 86

Luccas Samtos 87

Lúcia Regina Lucas da Rosa 67

Luís Amorim 45

Luiz Otávio Oliani 16

Malú Bortoletto 31 46

Marcius Andrei Ullmann 26

Marcos Nunes Loiola 68

Marlene de Fáveri 69
Marlon Nunes Silva 27

Matheus Bueno 88

Maurício Simionato 70

Neli Germano 25

Noélia Ribeiro 60

Paulo Sérgio Kajal 71

Plínio Mósca 17

Robson Alves Soares 39 53 72 90

Roger Gregory 47

Ronaldo Junior 58

Rozana Gastaldi Cominal 73

Rubermária Sperandio 18 89

Sabrina Dalbelo 19

Sigridi Borges 91

Tida - Ástrid Schein Bender 20 37 74

Vilma Rainha Cintra 21

William Weber 22
9
tive problemas
quando acreditei
em final feliz
num mergulho louco
em águas profundas
sem dublê

súbito, lembro
de um peixe
fora d'água

vida mesmo
é ilusão desmanchada
em longos segundos
após confusão
e tontura

vida mesmo
é dificuldade de escolher
o melhor caminho

vida mesmo
é tirar os sapatos
e ir em frente

descalça

Benette Bacellar Porto Alegre / RS


Em 2018, lançou o segundo livro de poemas “a outra me faz roer os
dedos”, uma obra vencedora do I Concurso Literário Benfazeja e uma
das finalistas do Prêmio AGES, Livro do Ano, em 2019. Menção honrosa
no Prêmio Lila Ripoll de Poesia em 2016 e 2017. Em 2015, lançou seu
primeiro livro de poemas "Nua Escrevo". Natural de Porto Alegre e
integrante dos grupos de poesia Gente de Palavra, Entreverbo e Mulherio
das Letras.Contato: benettebacellar@hotmail.com
10

O meu abraço
Tão completamente seu
Tão completamente espaço
O meu braço
Tão completamente rede
Tão completamente quarto
Meu braço no teu braço
Sem entrave
Quebra-cabeça montado:
abraço-chave 

Carla Marinho João Pessoa / PB

Natural de João Pessoa/PB. Geógrafa. Fascinada por mapas.


Professora da rede pública de ensino. Apaixonada por livros e pelas
palavras. É autora do livro de poemas intitulado "Alto-Falante",
lançado em 2019.
11

Acharam uma bagana na cabana 


Do velho Tomás – deu cana 
Lá embaixo, no asfalto 
Na baia do bacana, também 
Acharam uma tonelada – deu nada 
 
O velhote estava na boa 
Tragava  
A última loa 
 
O ricaço rangia por nada 
Mordendo 
A própria arcada 
 
Quanto peso. Quanta medida 
Equação sem saída 
 
Que o justo se retraia 
Que a saia seja justa 
Veja o quanto custa 
A esperança que não raia 
 
Era só uma bagana 
Esquecida  
Na guarda da cama 

Carlos Vilarinho Palmeira das Missões / RS

Pai do Ícaro, do Martim, da Ana Clara e do Théo. Leitor, escritor e


advogado. Livros: “sentimentos indecifráveis’ (2008), “meia-lua”
(2018). Publicação em coletâneas e revistas literárias.
Contato: carloseugeniovilarinho@hotmail.com
12

vida de haijin
um haicai bom
pra cada cem ruim

Daniel Morine  Santos / SP

35 anos, natural de Santos/SP. Escreve seus poemas, haicais


e outras coisas mais no instagram @morineescreve.
13

Aceita esse meu vacilo


quase falei teu nome no fim de um verso
esse nosso segredo 
começa a cansar

Poesia me chegou de surpresa 


ao despertar
assim como vieram teus abraços 
outro dia
de um jeito respeitoso e quente
paixão faz isso com a gente

Ainda bem 
me dei por conta a tempo
as palavras ficaram presas na garganta

Amor que revoluciona o mundo


amor que vem em pitadas ardentes
deixando umidade 
nos antes tão quentes edredons

Segredei teu nome


Só não sei até quando.

Fátima Farias Porto Alegre / RS

Nasceu em Bagé. É poeta compositora e produtora articuladora


cultural. Participa de saraus, rodas de conversa e palestras com
muitos livros publicados em coletâneas e revistas, sua primeira obra
em livro solo foi lançado pela editora Libretos em 2020 com o título
“Mel e Dendê”.
14

Quando ele está em casa


ela toma banho demorado
para ele não
achar
que ela é porca.
 
Bota calcinha de renda
bonita
mas não enfia na bunda
para ele não
achar
que ela é puta.
 
Na cama ela
se contém, se comporta
mas geme
para ele não
achar
que ela é frígida.
 
(hoje ele não está)
 
Ela tomou um banho
rápido
vestiu calcinha bege
bem larga e
na cama 
gemeu
sozinha.

Fernanda Caleffi Barbetta Oakland, EUA

Nascida na cidade de São Paulo, é formada em Jornalismo e pós-


graduada em Comunicação Social. Publicou a coletânea de contos “30
Textos para Descontrair” (2019), o livro de poesias “Já não me cabem as
rimas” (2020) e livro de microcontos “Iceberg”, na Coleção III do Mulherio
das Letras, pela editora Venas Abiertas (2021). Mantém o site Entre
Versos e Prosas (www.entreversoseprosas.com.br) e faz parte dos
coletivos As Contistas.
16

a areia
cega os olhos
escapa

no ir-e-vir das horas


a ampulheta para?

infinita
a sede de saber

Luiz Otávio Oliani Rio de Janeiro / RJ

Natural do Rio de Janeiro (1977). É professor e escritor. Tem


intensa participação no meio literário. Publicou 18 livros, incluindo
poesia, conto, teatro e literatura infantil.
17

café com pão, café com pão, café com pão, de 1936 e de Manuel
Bandeira.
Do Pernambuco para o mundo.
Nos balcões das padarias, vamos começar a revolução moderna
para mais e mais Manuel Bandeirar-nos, porém os balcões
desaparecem, o café cada vez mais falso, 
amancebou-se com salgados cada vez mais artificiais,
enquimiquizados e assassinos . 
Verdadeira legalização de armas de fogo e de munição, que
enchem de cruzes as casas dos pobres e dos famintos. Crimes
análogos ao crime da falta das vacinas.
O café inventado na cafeteira é falso. De plástico. Feito para durar
o mesmo tempo absurdo dos salgados e doces artificiais. Morreu a
possibilidade de tomar
um café com pão, café com pão, café com pão,  assim, na hora
inventada pela necessidade e pelo prazer. Morreu o imprevisto.
Morreu o improviso. Morreu o que fica fora das caixinhas plásticas
congeladas e previsíveis.
Que triste esta completa ausência de espontaneidade, de gana e
gula de último minuto.
Morte ao reino da boia aromatizada, pintada, cheia de
conservantes e de conservadores, saborizados apenas para
disfarçarem-se de bons moços, de bons cafés e de bons pães.
Isquemia mesentérica, degeneração intestinal, inflamação do
pâncreas, ruína do fígado, horror no estômago. Pressa?
Insensatez? Crime deliberado disfarçado?
Falta café com pão, café com pão, café com pão, falta Manuel
Bandeira, falta boa vontade e falta o tesão de correr o risco de
encontrar o Manuel, o amor de sua vida sentado na padaria.

Plínio Mósca Porto Alegre / RS

61 anos, um bebedor contumaz de café, letras e emoções. É diretor


e professor de teatro, Tecnólogo de Produção Cênica pela
Faculdade Monteiro Lobato, Mestre em Memória Social e Bens
Culturais pela Unilasalle e pesquisador de Teatro-Memória.
18

Ninguém é tão diferente,


por natureza,
antes de se olhar no espelho,
magistralmente trincado.
Olho para os fragmentos 
e pergunto quem sou. 
Um saco de almas me responde:
Miserável! Imbecil! Verme! 
Poeirinha cósmica!
Não há consenso.

Rubermária Sperandio Rio de Janeiro / RJ

Formada em Comunicação Social e mestre em Mídia, Política e


Cultura pela UFMT. Escritora e poeta, com várias publicações em
revistas e coletâneas. Publicou em 2019 o livro de poemas
“Matrioskas”.
Instagram: @rubermariasperandio_
19

o segredo do mundo
não é segredo
: nasci do colo da minha mãe
 
para ensinar esperanto
aos filhos dos filhos dos meus filhos e
divertir os vizinhos
que me cuidam pela fresta da janela
o fio de cabelo branco da minha cabeça
o fio de pelo no meu sovaco
mulherificados
 
saúdam o fio do teu bigode
penteado

Sabrina Dalbelo Bento Gonçalves/RS

Poeta e servidora pública gaúcha, autora dos livros de poesia “Baseado


em Pessoas Reais" (Poesias Escolhidas, 2017), “Lente de aumento para
coisas grandes” (Penalux, 2018) e “Rasga-ossos” (Penalux, 2020), este,
finalista do Prêmio AGES Livro do ano 2021 e do Prêmio Açorianos de
Literatura 2021, na categoria poesia. Integrante do Coletivo As
Contistas.
20

Suas asas quase macias


marcavam bordas douradas
Sutil, invadiu meu dia
Gentil, deixou-me tocá-la
 
Meus olhos, de encanto, brilharam
Algo novo acontecia!
Iluminou a casa, a borboleta
E o Sol cintilou magia
 
Estabanada pelos ares,
Era leve em seu afã,
Farfalhante de alegrias!
 
Inspirou-me sua presença
Seu recado, um vasto riso!
Mensagem, segredo e guia.

Tida - Ástrid Schein Bender Chapada dos Guimarães / MT

Nasceu em Taquara/RS e vive atualmente no MT. Desde criança voltou-


se para a poética vivencial, presente ao longo da vida em cada escolha,
como o canto, as Letras, os Astros, a terapêutica dos caminhos de
Alma, a Gestão Ambiental. Paixões que se integram através da escrita
criativa. Seus poemas têm sido publicados de forma impressa e virtual
em diversas antologias poéticas.
21

Um dia me disseram,
Que as nuvens
Não eram de algodão
Em tantos instantes,
De realidade cruel,
Quase acreditei,
Que realmente não.

Adultos que já não sonham


Puseram meus pés no chão
Cobriram de névoa densa
Turvaram minha visão.

Mas continuei admirar o céu


Mesmo no tempo curto
Que hoje resta
Seja da janela do avião
Ou apenas por uma fresta.

Dos discursos ausentes


Eu sempre duvidei
Criatura teimosa, preferi acreditar
Na realidade que eu inventei.

Um dia me disseram,
Que as nuvens
Não eram de algodão,
Mas nos corações das crianças,
E dos poetas, elas ainda são.

Vilma Rainha Cintra Itapecerica da Serra / SP

Nasceu em Itapecerica da Serra/SP no dia 18/05/1982. É formada em


Letras Português/Espanhol e atua como professora na Rede Estadual
de Ensino. Começou a escrever seus poemas aos dez anos de idade e
seus temas preferidos são: Infância, tempo, amor, brevidade da vida e
natureza. Já publicou como coautora em várias antologias.
Contato: vilmarainhacintra@gmail.com
22

Quem dera ser pedra rara 


Turmalina, Diamante, Rubi
Ser desejado e garimpado 
Ser de brilho lapidado 
Ser joia, ser adornado

Mas sigo mero cascalho 


De forma bruta e sem valor
Pisoteado pelo caminho
Tapado de ervas daninhas
Envolto de saibro e espinhos 
Sem brilho, sem luz, sem cor.

William Weber de Weber São Leopoldo / RS

Licenciado em Ciências Biológicas. Escreve poesias livres, poesia


minimalista, minicontos, contos e poesia engajada.
24
deixa-me exausta
o vazio do mundo injusto

o riso dos indiferentes


ecoam a cada esquina

enquanto homens
habituados a miséria
adormecem no asfalto

os espertos continuam
com bolsos cheios de cédulas

sentam à mesa com a maldade


sendo bem servidos pelo
egoísmo

vejo-os como um grupo


de animais adestrados
cada um no seu quadrado

deixa-me exausta
a realidade nua e crua

ue em silêncio me dou conta


a esperança me abandona

sem rodeios, sem deixar rastros

deixa-me exausta
viver sem devaneios

Benette Bacellar Porto Alegre / RS


Em 2018, lançou o segundo livro de poemas “a outra me faz roer os
dedos”, uma obra vencedora do I Concurso Literário Benfazeja e uma
das finalistas do Prêmio AGES, Livro do Ano, em 2019. Menção honrosa
no Prêmio Lila Ripoll de Poesia em 2016 e 2017. Em 2015, lançou seu
primeiro livro de poemas "Nua Escrevo". Natural de Porto Alegre e
integrante dos grupos de poesia Gente de Palavra, Entreverbo e Mulherio
das Letras.Contato: benettebacellar@hotmail.com
Viver em  25
estado
de graça...

Essa confidência
íntima, 
olhos mudos

A sede desperta
nas nascentes,
do Oiapoque ao Chuí

As sílabas que
ardem em cada
palavra 

Movimento de 
quereres em diversão 
contínua 

A doçura do
tempo guiada
pelo deus do amor

Ah! O segredo
de cada chegada,
o aroma que vibra

O eu-te-amo
na graça
de beijos tontos

O mundo é
leve quando
se vive em estado
de graça.

Neli Germano Porto Alegre / RS


Naturall de Torres-RS, reside em Porto Alegre desde 1960. Graduada
em Letras e Serviço Social pela ULBRA Canoas-RS. Dois livros solo
publicados, “_ como quem rema _” em 2022 (Ed. Casa Verde e Cidade
Poema) e “CASA DE INFÂNCIA” em 2014 (Gente de Palavra). Participou
de algumas antologias, entre elas “Dez Poetas e Eu” (Ed. Do Carmo),
“Arca dos desejos por Porto Alegre” (Território das Artes) e “I Tomo das
Bruxas – Do Ventre à Vida” (Projeto Enluaradas).
26

Que vida ingrata


essa do girassol.
Idolatra tanto seu astro
que lhe quer ser igual:
É um ser humano
querendo ser seu Deus,
"a sua imagem e semelhança".

É tanta inveja
que se fez amarelo;
meio rubro nas pontas
de vergonha;
verde de raiva...
Mas não perde a majestade:
empina o nariz
e cresce
acima das demais plantas do jardim.

No entanto,
a soberba desaparece
à noite,
quando não mais sente o calor;
dobra-se,
sente o abandono do astro inatingível.
Nessa hora
não é mais sol
nem gira...

Nessa hora
vem-lhe a triste percepção:
não pode ser seu próprio Deus.
Quiçá fosse mais perfeito
se deixasse de ser imitação...

Marcius Andrei Ullmann Nova Petrópolis / RS

Entre 2005 e 2007 contribuiu para o jornal local A Ponte, publicando


poemas esparsos e contos. É coautor na coletânea de poemas Matizes
das Hortênsias (Letras em Cores, Gramado, 2010) e publicou Periodicidade
Incontínua (Biblioteca 24horas, São Paulo, 2012). Em 2020, o audiovisual
da obra Periodicidade Incontínua é contemplado com o Edital Nº 38/2020
de Fomento à Cultura - Lei Federal nº 14.017 (Lei Aldir Blanc).
27

Marlon Nunes Silva Belo Horizonte / MG

Bacharel licenciado em Geografia, Mestre em Estudos de Linguagens e


Psicanalista. Autor dos livros: “O Corpo Hiper-Real Em Crash E A Festa
Tecnológica: Sedução, Simulação & Fragmentação”, “A Tecnologia
Nossa De Cada Dia: Entre deuses e demônios” e da obra poética “A
Solidariedade vai até onde vai o Interesse”. Membro do Conselho
Editorial da Revista Cosmos (UFU).
Contato: nunesmarlon0@gmail.com
28

as dimensões dos objetos


reduzidos a vagos contornos
o deslumbramento da paisagem
o ar nos sustenta
no equilíbrio de forças
sobre a baía curvada
                    girando
como um peão nas mãos de Deus.
  
       as lembranças
       ao largo dos pecados não confessados
       caminhamos pelo fio da navalha
       solitários como um barco abandonado
       ou como uma pequena  ilha com a cabeça de rocha
       fora da água
  
(vamos submergir na imensidão
antes que o lixo seja recolhido 
e acomodado com as bagagens)
 
abriremos as pequenas janelas
recolheremos as imagens dos
                         terminais de carga
                         da Ilhabela
                         de praias sem nome
                         do vestígio de óleo vazado dos navios
 
consultaremos o nosso atlas de sentimentos
recheados de mapas em preto e branco

Flavio Machado Cabo Frio / RJ

Nascido no Rio de Janeiro em 1959. Publicou os livros: “Sala de


Espera” (Ed. Blocos, 2003), “livro azul de haicai” (Ed. CBJE, 2013),
“Provisórios” (2014), “este lado para cima e à margem – volume 1”
(2015) e “à margem – volume 2” (2016), todos pela Editora
LiteraCidade, e “Livro Branco – 2017” (Ed. Pará.Grafo), “Livro Amarelo –
2018” (Ed. Ixtlan) e “Poemas para a luz do lampião” (Ed. Costelas
Felinas, 2019). Membro da Academia de Letras e Artes de Cabo Frio.
29

Entre laços e desenlaces


Me faço um eunuco

Nada sei
Nada vejo
Nada escuto.

Apenas o suficiente,
para ficar no mais ensurdecedor silêncio...

… e assim,
Permanecer prostrado
Diante daquele que me atormenta:
O [temido] segredo
Que alma afugenta

Servo de informações vis


Quanta desonra a plenos ouvidos

Saber das amarguras da vida


Das antologias vividas
Me faz
           [simplesmente]
Ser o que sou

O portador de histórias
Das rupturas sofridas.

Emerson Garcia de Souza Paverama / RS

Formado em Letras/Português-Literatura pela PUCRS (2018). Pós-


graduado em Educação Especial Inclusiva e Orientação Educacional,
ambas pela Uniasselvi (2020). Atualmente, mestrando em Educação-
Formação de professores (FUNIBER). Julgo ser a Poesia, a porta que
abre caminhos e que auxilia na expressão do indivíduo, sendo
considerada uma terapia, ao ponto de ser libertadora e transformadora.
31

apraz-me rasuras
roupas surradas
rasgos no peito
pequenos defeitos
tudo o que nos faz
inteiros em partes

apraz-me ser criatura


servir de vaso
não possuo, passo
não escrevo, vazo
se posso, repasso
mão abaixo e acima
o que me transpassa

como um fio d'água


transbordo e transporto
mano a mano reforço
feliz pedra juntada à outra
e à outra e à outra e à outra

ao me espalhar em 
caminhos, não sou nem és:
subtraem-nos estigmas
multiplicam-se pés d'aço
de pedaço em pedaço
porém, despedaçamo-nos 
ou somamos os passos?

Malú Bortoletto São Paulo/SP

Amante de todas as artes, escreve desde cedo, completamente


apaixonada por livros com ilustrações e bem editorado - forma e
conteúdo se complementam. Em ininterrupto processo de
desformatação.
Instagram: @mhaluh.h
32

A minha fragilidade…
Sinto-a esvair-se…

 Pulverizada…
Chama azul...

 Esverdeada...
Elemento Telúrio...

 Estável...

Raro...
Vidro colorido...
Prateado perecendo 

Mas... 
Existe a resistência…
Estado sólido…

Energia solar!
Fogo!

 Calor!
Presença no ar...

 Explosiva!
Anulando vestígios...

Marcas...

Folhas de relva...
Aço inoxidável
Resistindo no tempo

Cerâmica queimada
Do meu envelhecimento!

Delma Gonçalves Porto Alegre / RS


Poetisa, compositora, produtora cultural. Graduada em Letras e Pós-
Graduação. Suas poesias estão em coletâneas desde 1994. Autora do livro
(Cinco Décadas de Samba no Bairro Santana) Faz parte da Academia de
Artes, Ciências e Letras Castro Alves POA/RS e Academia Internacional de
Literatura Brasileira/NY. Em 2019 lançou seu livro de poesias O Som das
letras na 65° Feira do Livro de Porto Alegre.
Instagram: @delmagoncalvesmattos
33

Abrir-se-á o baú do sonho 


e transitará no 
olhar o espanto 
de tocar a rosa 
coberta de rendas 
de versos 
 
Fluirão assim as 
palavras: vertentes 
d'água a matar a sede 

Liquefeito poema 
cantará o riso e 
verterá a lágrima: 

Na transparência 
de ondas que se propagam 
surgirá a alma do poeta. 

Helena da Rosa Canoas / RS

Escritora, poeta, cantora e ativista cultural. Natural de Canoas / RS,


participou de inúmeras coletâneas e antologias, Lançou o livro “Giz de
Cera”, projeto contemplado pelo microcrédito cultural de Canoas, 2021
e lançado na 27a Feira do Livro de Canoas / RS, pela Editora Entreverbo.
34

Um índio nu 
peguem 
pelado não! 
coloquem a tanga 
a tarja preta 
a folha de bananeira 
escondam o pênis  
pelas nossas crianças 

devastem a floresta e botem para correr 


pelado não! 
cubram o arco e a flecha 
deixem vender bugiganga no calçadão 

Oh, tempos de cólera! 


escudeiros a vigiar o jardim alheio 
mensageiros trajados em bolor 

Oh, grande oráculo! 


indecência nossa de cada dia 
salve Zé Celso Martinez e as bacantes 
dispam Caetano até o amanhecer  
revelem o mastro rijo da resistência 
o falo de Zumbi na consciência dos latifundiários  
a arte dos Dzi Croquettes em resposta às pistolas militares 

Armando Martinelli Campinas / SP

É jornalista, mestre em divulgação científica e cultural, doutorando em


educação pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp. É autor
de “Recital das reticências” (2018) e “A luz do abismo”, ambos pela
editora Urutau. Tem poesias e contos publicados em algumas revistas
e coletâneas digitais. Instagram: @armando_martinelli_nt
35

Afrodite me leve à luxúria 


Mas não me tome por Hefesto 
Estou mais para Hermes 
Fazendo amor com o gigante dos mil olhos 
Das Mil pálpebras laminadas de sol 
Estou mais para Hermes 
O indecifrável pai de Hermafrodita 
Hermes  
Para quem menos vale ser honesto 
Que afável 
E tu que estava sobre mim 
Leva esse lembrete para sua irmã aparvalhada: 
Pobres não optam por pobres 
Nem por suborno pornô. 

Everton Luiz Cidade São Leopoldo / RS

Músico e poeta. Escreve semanalmente para jornais eletrônicos e sites das


rádios Armazém, Rockpédia, BerlindaNews, O Seguinte. Publicou Santo
Pó/P, QuiÓ, O Bonde Transmutóide, Aparecida e livros digitais e zines. Faz
poesia inspirada em HQs, livros místicos e filmes de ficção científica. Canta
na banda Santo Suzuki. Instagram: @evertoncidade
36

Elroucian Motta Porto Alegre / RS

Natural de Porto Alegre/RS e graduado em Letras pela UFRGS, já


participei de diversos concursos literários pelo Brasil afora e fui
premiado em várias oportunidades. Tenho livro de poesia publicado e
participação em muitas coletâneas e antologias. Membro da Sociedade
Partenon Literário, da Academia de Letras do Brasil - Seccional Rio
Grande do Sul (ALB-RS) e da Academia Mundial de Cultura e Literatura
(AMCL). Instagram: @mottarevisaoetraducao
37

De todos os sentimentos cheios de cores


De todos os pensamentos giratórios
Volatilizados em rezas, preces
Qual, qual deles me levou ao silêncio?
Meu silêncio
de longos vazios entre espaços
Cresce em meu corpo a nutrir amor
Expande em ondas de infinito!

Meu silêncio faz minguar pensamentos


Por um tempo, vejo contornos
pequenas bolhas evanescentes,
quase invisíveis.
Enquanto somem,
ainda esvoaçam.
De repente,
em pura transparência,
se desfazem.

Ouço
um suave
“flop”
Depois:
Vazio.

Tida - Ástrid Schein Bender Chapada dos Guimarães / MT

Nasceu em Taquara/RS e vive atualmente no MT. Desde criança voltou-


se para a poética vivencial, presente ao longo da vida em cada escolha,
como o canto, as Letras, os Astros, a terapêutica dos caminhos de
Alma, a Gestão Ambiental. Paixões que se integram através da escrita
criativa. Seus poemas têm sido publicados de forma impressa e virtual
em diversas antologias poéticas.
38

estenda a manta
oh! bela infanta
tenho um mantra
na garganta

sob a saia da santa


ensaio

estenda a manta
a pélvis se encanta
tenho um mantra
na garganta

no colo cálido calo


colo

estenda a manta
o prazer imanta
tenho um mantra
na garganta

a seiva nos salva


na selva

estenda a manta
o verbo se agiganta
tenho um mantra
na garganta

Carlos Vilarinho Palmeira das Missões / RS

Pai do Ícaro, do Martim, da Ana Clara e do Théo. Leitor, escritor e


advogado. Livros: “sentimentos indecifráveis’ (2008), “meia-lua” (2018).
Publicação em coletâneas e revistas literárias.
Contato: carloseugeniovilarinho@hotmail.com
39

Não planto amor-perfeito,


cuidando as fases da Lua,
esperançoso e paciente
no "quem planta colhe".
Quero mesmo é teus seios
pedindo minha boca,
tua cavalgada de dona, 
colher tua cintura, 
reiniciar o mundo contigo.

Robson Alves Soares Porto Alegre / RS

Nasceu em Cachoeira do Sul / RS no dia 08 de julho de 1967. Está


pronto para se aposentar desde os 11 anos de idade. Sua gare
eterna é a esquina da infância, onde o tempo é circular e as
lâmpadas são vaga-lumes.
40

Uma vez disse o poeta


Ou o cientista, qual a diferença?
Que somos todos poeira das estrelas

Então

Se em mim há uma fração do que compõe o Sol


Ao ver-te tão radiante sob o brilho intenso vespertino
Por mais que não sinta sua pele em meus dedos e lábios
Me contento em saber que
mesmo separado por bilhões de fótons luz de saudade
Meu amor ainda aquece seu corpo

Adson Leonardo Montes Claros / MG

Escritor, poeta, redator e um apaixonado por histórias em todas as


formas. Aficionado por jogos, tanto eletrônicos quanto de
interpretação (RPG), acredita no poder que as narrativas têm para
construir conexões humanas verdadeiras e expor o que de mais
intenso, e bonito, há dentro de nós.
41

Lecy Sousa Contagem / MG

Aprendiz de poeta e autor de livros como "Primeirapessoaplural" (2008),


"Rascunhos" (2015), "Poesia fora da Curva" (2017), "Bora lá,
Baudelaire"(2022) e "Trilogia do Poema Bruto( 2023). Participou da
fundação da Academia Contagense de Letras - ACL (2001) e diversos
saraus. É servidor público da Educação Municipal de Contagem.
Licenciado em Letras e Graduado em Processos Gerenciais.
42

Sabe aquele verde esmeralda no fundo da retina tímida?


Sabe o negro que se estende dos cabelos à noite completa e
cheia aos pés da lua?
Sabe a mudez diante da mão que afaga? 
Sabe a verdade nua e crua?
Tomei então minha metáfora mais clara e efetiva 
Na dose única, única alternativa, única rua
E diante do sinal fechado,
Do trânsito entre dentes, congestionado,  despertei.
Sabe o sonho sereno, entorpecer tão delicado?
Ai de mim, acordei.

Charlene França Nova Iguaçu / RJ

Mestre em Literatura brasileira pela UERJ, professora dos ensinos


fundamental e médio da Rede Estadual de ensino do RJ, amante de
gatos e autora dos livros: “Diversus devaneios do cotidiano” (2012),
“Ao pé do ouvido” (2015), “Sinestesia e Brevíssimos” (2020). Membro
da ALTO (Academia de Letras de Teófilo Otoni) desde 2013 e finalista
do Prêmio Baixada 2016. Instagram: @charlene.franca
43

Ela é do dia, é dia, doída; ele, brisa.

O solo dele pede o sol dela.


Os desertos dela clamam pela irrigação dele.

A seiva dele faz florescer o girassol que é ela. 

Ela reverbera, é das letras, da eloquência, da


intensidade, não sabe amar em silêncio; ele dissimula,
é dos números, coeso, exato, preciso.
Fluem e “fluidam-se”, enquanto os olhos dela
denunciam: “te preciso”.

Ele é ousado, sem medo de arriscar; ela? seu fôlego.

E esses corpos seguem tocando-se, alcançando as


memórias de nossas existências. 

Cláudia Furlan Sotello Poá / SP

Cacau Sotello, advogada, apaixonada pela escrita e pelo Fábio,


mãe do Vini, da EuVira (latinha) e da Mia miau.
Instagram: @claudia.sotello.1
45

Por de vida, desígnio


Seguir o caminho de frente
Na sua missão consequente
É ir da nascente pelo rio.

Chegar à foz, perfeição


Se é que ela existe
Mas se tal nada registe
Tentar-se-á outra extensão.

Cada vez maior o percurso


De percorrida viagem
Com tanta natural visita.

Em plural sítio, vasto recurso


Sempre com inúmera bagagem
Trazida, contada e escrita.

Luís Amorim Oeiras, Portugal

Natural de Oeiras (Portugal), escreve poesia e prosa desde 2005. Tem


já escritas cerca de 2200 histórias, 88 livros de ficção publicados e
com numerosas participações em antologias literárias, revistas e
jornais em Portugal, Brasil, Suíça, Colômbia, EUA e Inglaterra.
46

esta língua que ouço


que soa esse som
saliva que engole
dissolve e silva
degusta, lambe, toca
e degusta a úvula
ressoa e ecoa no
céu dessa boca
que fala e canta
encanta e cala
cansa e se enrola
em beijos sem eixo
no beco do berro
esse erro esse entrave
essa ponte essa chave
esse encontro esse ponto
onde nada se diz 
e tudo se esconde
essa língua que urra
clama e declama
desde sempre
sussurra apenas 
por uma única - voz:
todos os laços, sem nós

Malú Bortoletto São Paulo / SP

Amante de todas as artes, escreve desde cedo, completamente


apaixonada por livros com ilustrações e bem editorado - forma e
conteúdo se complementam. Em ininterrupto processo de
desformatação.
Instagram: @mhaluh.h
47

Em toda manhã, fez-se viva a obra 


Desenhada em prístinos entalhes, 
Cada traço retilíneo, cada dobra, 
Cobertos pelo sol, envoltos pela flora 
Era ela, plena nos ínfimos detalhes 
A exímia artífice em exposição 
Que ao digerir a beleza com os olhos, 
Tomando encargo da criação,
Dos objetos que molda, indistinta,  
Retrata outro mundo com as mãos 
Com o cuidado da obra que prima, 
Que destila sua alma na tinta 
Mesclada entre cores e tons 

Roger Gregory Silveira Viamão / RS

Graduando na UFRGS no curso de Letras - Bacharelado Tradução


Alemão/Português. Aspirante a autor, entusiasta de literatura sci-fi,
horror cósmico e poesia. Atualmente compondo uma coletânea de
contos intimistas ambientados em cenário futurista.
48

Hoje confessei aos ventos todo o amor que sinto


Pedindo que o levassem pelo ar até você 
E mesmo que os ventos não falem
Encontram uma forma de o fazer

Um toque leve no rosto, o secar de uma lágrima


O cheiro de pão novo, o bailar que agita sua saia
Pois os ventos, tal qual amante tímido
Traduzem em carinho o que não conseguem dizer

Adson Leonardo Montes Claros / MG

Escritor, poeta, redator e um apaixonado por histórias em todas as


formas. Aficionado por jogos, tanto eletrônicos quanto de
interpretação (RPG), acredita no poder que as narrativas têm para
construir conexões humanas verdadeiras e expor o que de mais
intenso, e bonito, há dentro de nós.
49

Sob o som de “Do You Wanna Dance” 


Embalado por de Johnny Rivers 
Em meio ao caos das barracas  
De quentão, de cachorro-quente, de doces... 
Encontrei seu olhar 
E neste esbarrão de almas 
Supliquei ao locutor de quermesses 
Para tocar em seu nome 
David Castle e sua “You're Too Far Away”. 
E por um anjo envio este  
Correio elegante no qual  
Te entrego meu coração. 

Alexandre Morais Paulino São Paulo / SP

Poeta paulistano. Trabalha como professor no ensino fundamental na


rede pública de Osasco, mas já fez um pouco de tudo neste mundão e
confessa abestalhado que em matéria de guarida ainda espera a sua
vez, parafraseando o Seu Zeca, nosso poeta do samba. Dirige, produz e
apresenta o programa CasArte Marginal na Web Rádio CasIlêOca.
50

o mundo entristece
com os esquecidos de uma vida inteira
aqueles que deixamos para trás
sem o mínimo de conforto
esperança ou dignidade
os invisíveis agarrados à miséria
as mãos frias que ninguém afaga
empurrando suas histórias
em carrinhos de supermercado vazios
 
então o sol avista
e aquece os solitários
os que comem sanduíches
sentados nos bancos das praças

o sanduíche acaba
a miséria não

Benette Bacellar Porto Alegre / RS


Em 2018, lançou o segundo livro de poemas “a outra me faz roer os
dedos”, uma obra vencedora do I Concurso Literário Benfazeja e uma
das finalistas do Prêmio AGES, Livro do Ano, em 2019. Menção honrosa
no Prêmio Lila Ripoll de Poesia em 2016 e 2017. Em 2015, lançou seu
primeiro livro de poemas "Nua Escrevo". Natural de Porto Alegre e
integrante dos grupos de poesia Gente de Palavra, Entreverbo e Mulherio
das Letras.Contato: benettebacellar@hotmail.com
52

Desisti das notícias:


Nada percorre esse vazio
Que preenche os dias
E derrama de si essa letargia

E nas encruzilhadas que vejo


Não sinto meus pés
Nem comemoro vitórias
Enquanto estiver são

Mas então, alguém pondera


Sem malícia ou pretensão
Que um bom solo de guitarra
Eleva qualquer espírito

E deixo, assim, o som deífico


Fazer deste tosco cérebro
Uma gaiola de Faraday
Em transe existencial

Agora já posso desligar


Pois eu sei finalmente
Que esse insano caminho
Não chega a lugar algum.

André Galvão Amargosa / BA

Autor dos livros de poemas “A Travessia das Eras” (Penalux, 2018),


“Depois do Sonho” (Penalux, 2020), “Ansiedades: Relatos poéticos de
incompletude” (Starling, 2021). Coautor do livro “Redescobrir-se:
poesias de fim de século” (Selo Editorial Letras da Bahia, 1998).
Organizador da antologia poética “Deíficos Átimos” (Editora EP, 2021).
Participou de antologias e revistas literárias no Brasil e em Portugal.
53

O poema quando retorna 


não quer cruzar a ponte.
Prefere molhar no rio
cada verso e anverso,
a ver se a água tem força 
para mover os moinhos 
das metáforas. 

Robson Alves Soares Porto Alegre / RS

Nasceu em Cachoeira do Sul / RS no dia 08 de julho de 1967. Está


pronto para se aposentar desde os 11 anos de idade. Sua gare
eterna é a esquina da infância, onde o tempo é circular e as
lâmpadas são vaga-lumes.
54

os corpos
eram encaixe perfeito
passariam à eternidade
encantados

retardariam o nascimento do dia


esconderiam o sol
em alguma caixa mágica
seriam eternos

estabeleceriam a nova ordem mundial


prevalecendo o amor sobre as guerras
sobre qualquer forma de violência

apagariam as luzes da cidade


restariam as estrelas na escuridão
fariam amor
dentro da noite eterna

partiram para rumos contrários


e as noites se sucederam
tão efêmeras
quanto uma flor do campo
como a própria vida

Flavio Machado Cabo Frio / RJ

Nascido no Rio de Janeiro em 1959. Publicou os livros: “Sala de


Espera” (Ed. Blocos, 2003), “livro azul de haicai” (Ed. CBJE, 2013),
“Provisórios” (2014), “este lado para cima e à margem – volume 1”
(2015) e “à margem – volume 2” (2016), todos pela Editora
LiteraCidade, e “Livro Branco – 2017” (Ed. Pará.Grafo), “Livro Amarelo –
2018” (Ed. Ixtlan) e “Poemas para a luz do lampião” (Ed. Costelas
Felinas, 2019). Membro da Academia de Letras e Artes de Cabo Frio.
55

O poder ostenta 
Inventa inverdades  
Comete crueldades 
Contra quem prefere 
Andar na contramão 

Devora tudo a frente 


Mata maltrata tritura 
O poder enche o bucho 
De lagosta filé camarão 

O poder atrai encanta 


Promete a eternidade 
Na alegria e na saúde 
Na tristeza e na dor

Poder, oposto do amor!

Jorge Abreu Barra da Corda / MA

Jorge Abreu é poeta, autor de “danações” (Trevo, 2018), “feitiço”


(Primata, 2021) e “Digitais” (Elefante Editores, 2022). Do signo de
Escorpião, mora em Barra do Corda, Maranhão.
56

Tic-Tac! Tic-tac! Tic-tac!

Entre uma badalada e outra


Tentativas de não pensar em você
          [Aliás, não pensar em nada].

Olho para os ponteiros


Eles insistem em me desafiar.

Badaladas em meio à madrugada


Palpitadas no peito
Pancadas na alma
Que infortúnio não ter notícia alguma!

Cada segundo, um martírio


            [Enlouquecedor].
Chronos não ajuda; não favorece
Simplesmente desmerece.

Momento obscuro e de lamento


Busca-se redenção na presença
Antes outrora fora ausência  
Liberdade então, desse sofrimento.

Para o caos que me fora causado


Diante de tão negligente tristeza
Só me resta este insólito momento
para então chamar
            [de tempo].

Emerson Garcia de Souza Paverama / RS

Formado em Letras/Português-Literatura pela PUCRS (2018). Pós-


graduado em Educação Especial Inclusiva e Orientação Educacional,
ambas pela Uniasselvi (2020). Atualmente, mestrando em Educação-
Formação de professores (FUNIBER). Julgo ser a Poesia, a porta que
abre caminhos e que auxilia na expressão do indivíduo, sendo
considerada uma terapia, ao ponto de ser libertadora e transformadora.
57

E daí que a Coca é Fanta?


até hamburguer
pode ser de planta

Daniel Morine  Santos / SP

35 anos, natural de Santos/SP. Escreve seus poemas, haicais e


outras coisas mais no instagram @morineescreve.
58

pensar sobre si
é carregar no bolso
um caco de espelho
para consultar a cada dia
       - feito bússola
         cujo norte é outro -

     a fim de não


     considerar as aleatoriedades
     que proferem sem
            que sejamos

       no caco de espelho,


       a imagem é origem
       de quem podemos ser
            - não do que queremos
              nem do que pensamos,
                                  fomos
  nem sequer do que acham -

       a imagem
       reside
       em olhar o
            agora

Ronaldo Junior Campos dos Goytacazes / RJ

Ronaldo Junior (1996) é carioca, Bacharel em Direito, estudante de


Letras e escritor acadêmico da Academia Campista de Letras
(Campos/RJ) e de outras instituições. É autor dos livros "O verso sou
eu: Antologia de sentimentos" (2016), "Muros impalpáveis: Recorte
poético da cidade de Campos" (2021), "Ideário poético da
Independência"(2022) e "Prosas descolonizadas" (2022).
Site: www.ronaldojuniorescritor.com
60

pensar sobre si
é carregar no bolso
um caco de espelho
para consultar a cada dia
       - feito bússola
         cujo norte é outro -

     a fim de não


     considerar as aleatoriedades
     que proferem sem
            que sejamos

       no caco de espelho,


       a imagem é origem
       de quem podemos ser
            - não do que queremos
              nem do que pensamos,
                                  fomos
  nem sequer do que acham -

       a imagem
       reside
       em olhar o
            agora

Noélia Ribeiro Brasília / DF

Pernambucana, poeta, revisora e taquígrafa, radicada em Brasília,


formada em Letras na UnB. Publicou Expectativa (1982), Atarantada
(Verbis, 2009), Escalafobética (Vidráguas, 2015), Espevitada (Penalux,
2017) e Assim não vale (Arribaçã, 2022).
61
talvez seja uma febre passageira
ou a mais longa da vida
então, começa o espetáculo

de quem vive numa cidade


com eterno alarme de perigo ligado
no circo dos horrores

de quem entra em pânico


no meio da travessia
no quase escuro

de quem se empenha
contando seus naufrágios
e punhais cravados

de quem adoece quando ouve


discursos políticos
mentiras à luz de velas

de quem pisa em falso


em campos minados
e sangra na trilha

no entanto, a coragem
salta do prédio mais alto
nem enfrenta o árido

espertos voam na selva de pedra


engaiolados, sobrevivem

Benette Bacellar Porto Alegre / RS


Em 2018, lançou o segundo livro de poemas “a outra me faz roer os
dedos”, uma obra vencedora do I Concurso Literário Benfazeja e uma
das finalistas do Prêmio AGES, Livro do Ano, em 2019. Menção honrosa
no Prêmio Lila Ripoll de Poesia em 2016 e 2017. Em 2015, lançou seu
primeiro livro de poemas "Nua Escrevo". Natural de Porto Alegre e
integrante dos grupos de poesia Gente de Palavra, Entreverbo e Mulherio
das Letras.Contato: benettebacellar@hotmail.com
62

Ela tirou a roupa 


E eu vi sua alma em eclipse.
Vi sua fala interrompida,
O soluço sem lágrima,
O verso de Bandeira,
A solidão cheia de curvas e vazios.
Vi chuva fresca no estio,
A pele dourada, arrepiada e vã.
Era toda rosada, madrugada,
Poesia despida,
Nascida às seis da manhã.

Charlene França Nova Iguaçu / RJ

Mestre em Literatura brasileira pela UERJ, professora dos ensinos


fundamental e médio da Rede Estadual de ensino do RJ, amante de
gatos e autora dos livros: “Diversus devaneios do cotidiano” (2012),
“Ao pé do ouvido” (2015), “Sinestesia e Brevíssimos” (2020). Membro
da ALTO (Academia de Letras de Teófilo Otoni) desde 2013 e finalista
do Prêmio Baixada 2016. Instagram: @charlene.franca
63

Meu amor é secular


Vem de tempos imemoráveis
Atravessou desertos, mares
Longas planícies
Está escrito desde o início
No firmamento
A cada nascimento
Vem traçado pelos astros
No mapa da minha vida
É feito de encontros
Desencontrados
Tal qual o dia e a noite
No crepúsculo
É um sulco profundo
Impresso na minha mão
E tem o brilho intenso
Da primeira estrela
Refletido no meu olhar
E quando nos encontramos
A memória brinca
E traz momentos inconscientes
Dos quais não havia registro

Cris Tavares Brasília / DF

Carioca, radicada em Brasília. Apaixonada pelos versos desde


criança, especialmente os de Mario Quintana. Gosta de ler poemas,
sejam de poetas consagrados ou não. Além da poesia, sua outra
paixão é a fotografia.
64

Há impermanências no ar
Da desvalorização do teu eu 
Do porquê de estar aqui
Sejas tu na essência do ser pra ti 
Nos teus resumos
Viver é trabalhar futuros
Os posicionamentos invasivos 
São recursos nulos
Dos muros intransponíveis
Reaja digno - dê o pulo 
Mudar os conceitos de quem te anula
Sempre é necessário
O espaço no mundo é pra todos 
Siga acredite nos teus recursos 
Pise sem medo nos buracos
Eles já não são mais obstáculos 
Teu salto foi suado foi fundo
O asfalto é teu espelho permanente
Siga o rumo
Do que foi... Do que és... 
Em suma...
Do que podes ser no fluxo
De tudo!

Delma Gonçalves Porto Alegre / RS


Poetisa, compositora, produtora cultural. Graduada em Letras e Pós-
Graduação. Suas poesias estão em coletâneas desde 1994. Autora do livro
(Cinco Décadas de Samba no Bairro Santana) Faz parte da Academia de
Artes, Ciências e Letras Castro Alves POA/RS e Academia Internacional de
Literatura Brasileira/NY. Em 2019 lançou seu livro de poesias O Som das
letras na 65° Feira do Livro de Porto Alegre.
Instagram: @delmagoncalvesmattos
65

o menino encontra no livro de ciências


espanto diante da expectativa da morte
destino certo de toda vida

companheira invisível
tenta tocar-lhe o ombro
como se fosse possível a amizade entre eles

será no café da manhã?


ou antes do anoitecer ?
em um inesperado atentado
homem bomba ao avesso
que não está pronto para morrer

contradição eterna
como se houvesse possibilidade de consciência
estado diferenciado
impossibilidade de comunicação entre desiguais:
qual a língua dos mortos?

invisíveis fios tecem intricadas redes


transcendem civilizações
o menino
abandonado à estrada
não sabe aonde chegará.

Flavio Machado Cabo Frio / RJ

Nascido no Rio de Janeiro em 1959. Publicou os livros: “Sala de


Espera” (Ed. Blocos, 2003), “livro azul de haicai” (Ed. CBJE, 2013),
“Provisórios” (2014), “este lado para cima e à margem – volume 1”
(2015) e “à margem – volume 2” (2016), todos pela Editora
LiteraCidade, e “Livro Branco – 2017” (Ed. Pará.Grafo), “Livro Amarelo –
2018” (Ed. Ixtlan) e “Poemas para a luz do lampião” (Ed. Costelas
Felinas, 2019). Membro da Academia de Letras e Artes de Cabo Frio.
66

Repousa sobre o papel


a caneta.
Repousa sobre a pele
a lembrança.
Repousa sobre a alma
a esperança
.
Cercado de repouso
Protesto!
Grito!
Desejo!

Silencioso...

Giovanni Alecrim São Paulo / SP

É mineiro, tem 43 anos, é casado com Tatiana, pai de Antônio e José.


É poeta, cronista e contista. Autor de livros de poesia e teologia. É
pastor da Igreja Presbiteriana Independente de Tucuruvi, São Paulo,
SP e editor-chefe do Grupo Meekah, Campinas, SP. É Bacharel em
Teologia pela Faculdade Unida de Vitória e Licenciatura em Filosofia
pela Faculdade de Educação Paulistana.
67

“Sorria, você está sendo filmado!”


Mas sorria por dentro
porque o filme está enrolado, 
a tela está obscura, 
a verba foi cancelada.
Mas sorria...
Os expectadores são os outros,
O diretor precisa atuar,
O público não perdoa.
Então, sorria pelo avesso,
Dê o troco,
Devolva a nota falsificada
E exija aplausos!
 
Sorria... você está sendo executado!

Lúcia Regina Lucas da Rosa Porto Alegre / RS

Professora de literatura brasileira, poeta, contista, cronista e


dramaturga; mestra e doutra em literatura (UFRGS). Autora de Viagens
poéticas (Editora Cirkula, 2021); Contos O segredo da Capulana, No
tempo das trivialidades (Editora Unilasalle, 2017 e 2021); texto
dramático: Mulheres de Machado (Editora Unilasalle, 2018).
Facebook: Lúcia Rosa
68

Não demores, ó Pai celestial,


a desvelar a tua fúria
aos que forjam a glória do mundo
em teu santo nome.

Não demores, ó Pai glorioso,


a calar teus filhos deturpadores
que borram o céu e a terra
com a tinta da tua palavra.

Não demores, ó Pai imaculado,


a deter os malfeitores
que explodem a terra pelo céu
em virtude da tua promessa.

Não demores, Pai amado,


a expulsar dos novos templos os mercadores
que multiplicam seus próprios peixe$
com a ajuda invisível de tua mão.

– Onde tu estás, ó Juiz dos juízes, que não vês?

Não demores, pois, ó infinito Pai,


a atender a nossa prece
antes que (loucos) forjemos
a tua morte!

Marcos Nunes Loiola Botuporã / BA

Sou advogado e também um apaixonado pelo mundo da literatura.


Me aventuro na escrita de contos e poemas desde 2019.
69

Não olhe para cima!


Gado mirando para o alto
Quebra o pescoço.
Negue, negue a ciência por 
Preguiça de raciocinar.
Enfarte-se das porcarias
Dos algoritmos e códigos
Coma, coma tudo, farte-se
Da mórbida gula.
Entupa-se de destilados,
Cocaína, luxúrias e
Mentiras que consome
Exclui quem não te serve
Mesquinho avarento que
Mata vidas e sonhos.
 
Agora olhe para cima!
Nenhuma estrela cadente
O que vês cintilando
É a ira dos teus deuses
Estilhaços de fogo
Fedendo a enxofre.
É a porta do inferno a punir
Tua soberba infame
De que serve ficares nu
Se de teus pecados, o maior foi
A gana da cobiça?
Teu corpo pútrido alimentará
Demônios famintos, e,
Do que era terra, agora é
Estrume vagando no espaço.  
Fim.

Marlene de Fáveri Florianópolis / SC

Historiadora, poeta, escritora, feminista, autora de livros e artigos


historiográficos e, com a pandemia, voltou-se para a literatura. Em
2021, publicou dois volumes de “Crônicas da Incontingência da
clausura – cotidianos na pandemia” (ed. Letras Contemporâneas) e, em
2022, o livro “O Ultra-realismo na cena literária de Itajaí” (ed. Traços &
Capturas). Atualmente prepara seu primeiro livro autoral de poesias.
Instagram: @marlenedefaveri
70

Enfim, desaba o céu


e cai veloz a tempo de 
a tudo limpar,
como uma navalha 
feroz, deixa que mais nada reste, 
permita que de resto, nada sobre.
Enfim, desaba o céu,
a tudo evapora e nada disso é demais, 
a tempo de nos fazer perder a hora.
Enfim, desaba o céu,
e quando o verbo finda
que acendam as luzes: sem cortes,
estouradas de breu, até o fim, 
o que nem começou
é o que se desfaz em foz
nestes dias estranhos,
o que nos resta 
é pensar, senão,
que, desaba 
o céu em nós. 

Maurício Simionato Campinas / SP

É poeta e jornalista. Lançou os livros de poesias “Impermanência”


(2012, selecionado pela Secretaria de Cultura de Campinas), “Sobre
Auroras e Crepúsculos” (2017, Ed. Multifoco), lançado na Bienal do
Livro do Rio/2017, e “O AradO de OdarA” (2021, Patuá).
71

Como um amor entre as ondas


de uma frequência hipnótica de 741hz
transpassando a cadeia montanhosa de prédios
concretos, vigas, pilares e paredes
atravessando o amor a barreira do barulho urbano
malha ferroviária, sol  a pino, grafite e pichação
o amor deste século se emaranhando entre grades
e árvores com densas sombras que nascem no concreto
entre tampas de bueiro que me dizem:
Força e luz!
e o amor escorre subterraneamente com sua fragrância
mais que divina, rompendo a barreira do odor citadino
Neste circo que imita o mundo: profuso de gozo e horror
o que se diz além do amor é que te digo: Amor!
O pandemiceno não passa de um circo? Será?
Será!  Ou não... o ser e suas eternas incógnitas ancestrais
Quase modernas de tão velhas perguntas abissais
O amor nos liberta até dos significados prosaicos
da palavra liberdade
E o século das improbabilidades e das profecias emerge
entre a poça de sangue, o rebento das ideias e a cadência
do amor

Paulo Sérgio Kajal Rio de Janeiro / RJ

Poetator, iniciado nos Mistérios de Lapêusis, cultor da filosofia


pilintriana, autor do livro de poesia "Alma profana", dos fanzines "
Ballah", “Pan na América” (poesia) e Toca dos Insetos (conto).
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Eu tirava a primavera dela,


devagarinho, pétala por pétala,
outonando-a gomo a gomo. 

Robson Alves Soares Porto Alegre / RS

Nasceu em Cachoeira do Sul / RS no dia 08 de julho de 1967. Está


pronto para se aposentar desde os 11 anos de idade. Sua gare
eterna é a esquina da infância, onde o tempo é circular e as
lâmpadas são vaga-lumes.
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entre loopings e parafusos


paralisam os confusos
                    entre aclives e declives
                     bailam vultos aos trancos
                                      entre sucessivos solavancos
                                       projetam veias de anil
 
entre o primeiro e  o último vagão
pulsam corações a mil
                            entre  olhares cá e acolá
                             acenam mãos aos pares
                                     entre a multidão e o palhaço
                                     gravitam serpentes de aço

Rozana Gastaldi Cominal Hortolândia / SP

Mulher que voa, é feita d-eus múltiplos que sustentam o corpo


amoroso, político e periférico. Acredita na força dos coletivos e com
eles faz voz. Com publicação de poemas em redes sociais, revistas
literárias digitais, e-books e livros impressos. Autora do livro de
poesias “Mulheres que voam”, Scenarium, 2022.
Instagram: @rozanagastaldi
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Para. E observa.
Para... e observa...
Para e observa... aquilo
que vai se revelar.
Saiba, isso requer paciência
A paciência dos dias,
dos meses,
dos anos.
Cuida! Não apresses o tempo natural!
Ele é justo!
Por favor, não o apresses ao criares,
apenas por impaciência, conceitos,
julgamentos Infinitos,
condenando o que não tocaste.
Ainda não se revelou a oportunidade
para que descubras, conheças,
para que possas ver desabrochar,
Se revelar!
Na vida, milagres acontecem!
Não nos fechemos em dogmas pessoais!
Não seria sábio se eu o fizesse
Tampouco seria se o fizesses tu!

Tida - Ástrid Schein Bender Chapada dos Guimarães / MT

Nasceu em Taquara/RS e vive atualmente no MT. Desde criança voltou-


se para a poética vivencial, presente ao longo da vida em cada escolha,
como o canto, as Letras, os Astros, a terapêutica dos caminhos de
Alma, a Gestão Ambiental. Paixões que se integram através da escrita
criativa. Seus poemas têm sido publicados de forma impressa e virtual
em diversas antologias poéticas.
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O tempo escapa entre os dedos 


Como areia, farinha, pó
Encontrei meu primeiro fio de cabelo branco 
Ele descansa sob os finos vincos da testa 
E desmaia em ondas na minha face. 
As crianças crescem abruptamente
Minha rosa desabrocha em moça  
Meu primogênito se lança na vida 
O caçula ainda se joga na infância
Ah! Tempo, porque você é tão inexorável?
Um minuto de despedida é pouco 
Um minuto de espera é uma eternidade 
Nas paixões, você voa como louco
Na tristeza, nos faz remoer lentamente:
a saudade, a culpa, as tempestades
Os ponteiros não param
Como a roda de samsara 
Amontoem-se as roupas sujas, a louça, a poeira 
Certas coisas podem esperar
As palavras pipocam na mente 
As mãos coçam, querem transplantá-las
E elas brincam como criança arteira 
E ficam a rebombar, a pipocar
Até que eu as plasme derradeiramente
De corpo e alma 
Como quem colhe frutos maduros num pomar
Assim eternizo minhas memórias 
Meus versos simples, degustados a bel-prazer 

Adeneri Nogueira de Borba Barra Velha / SC

É paranaense, reside em Barra Velha desde 1999. Pedagoga, Mestra em


Educação, lecionou até assumir a maternidade dos três filhos. Esposa,
dona de casa, deixa a pedagogia transcorrer em seus dias, assim como
a escrita que transborda em versos, crônicas, contos e algo mais. Faz
da literatura sua companheira diária na solidão em seu remanso de
poetas mudos, sua biblioteca.
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Ela não cabe no laço da polícia moral
nem sua liberdade pode ser medida
pela opressão sentida

para incutir nela, as regras


e ensiná-la se vestir
é castigada pelo descuido de um véu solto

bateram com um bastão em suas pernas e mãos


uma pancada violenta na cabeça foi fatal
três dias em coma no hospital

(apaga-se a luz da jovem de 22 anos


mas nada impede que na paz de um céu se revele
então, acaba a incerteza e o medo)

muitas mulheres estão na vanguarda


e corajosas protestam
cortam cabelos, queimam véus

ela, Mahsa Amini perdeu a vida, sim


contudo, deixou como herança sementes da liberdade
espalhadas nas mãos de todas as mulheres

no estranho mundo dos absurdos


e das atrocidades
mulheres não estão em paz
e choram

Benette Bacellar Porto Alegre / RS


Em 2018, lançou o segundo livro de poemas “a outra me faz roer os
dedos”, uma obra vencedora do I Concurso Literário Benfazeja e uma
das finalistas do Prêmio AGES, Livro do Ano, em 2019. Menção honrosa
no Prêmio Lila Ripoll de Poesia em 2016 e 2017. Em 2015, lançou seu
primeiro livro de poemas "Nua Escrevo". Natural de Porto Alegre e
integrante dos grupos de poesia Gente de Palavra, Entreverbo e Mulherio
das Letras.Contato: benettebacellar@hotmail.com
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mioleira de veredas  
castas profanas vastas  
 
no que mais  
me basta  
escolho a que me arrasta 
e caminho descalço  
 
no afã do fato  
no elã do laço  
 
a fugir do frio 
com iansã pelo braço  
no traço largo  
do céu tardio rosáceo 

Carlos Vilarinho Palmeira das Missões / RS

Pai do Ícaro, do Martim, da Ana Clara e do Théo. Leitor, escritor e


advogado. Livros: “sentimentos indecifráveis’ (2008), “meia-lua”
(2018). Publicação em coletâneas e revistas literárias.
Contato: carloseugeniovilarinho@hotmail.com
79

Eu sou a terra que sustenta a vida.  


Em oferta e acolhida
permitindo brotos... 
Eu sou a água que extravasa e vibra
Que refresca ou inunda
o mundo todo em gotas…
Eu sou o vento cujo sopro leva
o que nem se vê ou sabe
sentidos em cada ponto…
Eu sou sol e sou a lua 
no brilho, luz que flutua.
sonhos em paz ou prantos…
Eu sou... força e fragilidade,
da natureza infinita
Segredo assim revelado:
Eu sou... o tempo: além do passado!

Edileine Carvalho Bisinella Canoas / RS

Escrevo poemas desde menina embora, naquela época, a vergonha


os deixasse perdidos por aí. Vejo a poesia passeando e converso
com ela, por vezes. Professora aposentada das salas de aula, eterna
aprendiz. As palavras são companhia perfeita.
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Alheia e estática
o olhar fixo em um ponto impreciso
concentra-se
a menina-lenta
apreende tudo em que se demora.

Peixe fora d´água


ágil por fora
seu tempo interno a desmente
densa-calma
demora-demora.

Esmera-se em tudo
que não importa —
o detalhe que ninguém vê
a perfeição dos avessos
o que está e não se nota.

Elástica
dobra-se a qualquer vento
dançarina
a menina-lenta inspira
e evapora.

Elisa Ribeiro Lisboa, Portugal

Nasceu no Rio de Janeiro e vive em Lisboa. É poeta, contista e


dramaturga. Publicou os livros: A segunda natureza, contos, 2020; O
condomínio no Divã, dramaturgia, 2021; Aragem, poesia, Ed.Urutau,
2021 e A perfeição dos avessos, poesia, Ed. Folheando, 2022.
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adoto discurso ultrapassado


anacrônico
fora de contexto
 
prego a igualdade da distribuição de renda
igualdade de oportunidades
justiça social
 
acusado
acuado
 
o que procuro
não está de acordo
com nenhum programa partidário
deriva da necessidade de colocar mais lirismo
onde só há miséria
quer transformar a realidade
e se perde nas aparências
do discurso literário.

Flavio Machado Cabo Frio / RJ

Nascido no Rio de Janeiro em 1959. Publicou os livros: “Sala de


Espera” (Ed. Blocos, 2003), “livro azul de haicai” (Ed. CBJE, 2013),
“Provisórios” (2014), “este lado para cima e à margem – volume 1”
(2015) e “à margem – volume 2” (2016), todos pela Editora
LiteraCidade, e “Livro Branco – 2017” (Ed. Pará.Grafo), “Livro Amarelo –
2018” (Ed. Ixtlan) e “Poemas para a luz do lampião” (Ed. Costelas
Felinas, 2019). Membro da Academia de Letras e Artes de Cabo Frio.
83

Nem odeio, nem amo 


Muito pelo contrário 
Sei lá eu, nem me pergunte, 
Porque assim sou 
Assim sou eu, por quê? 
Não sei, só sei que sou eu que sofro 
E só, Lésbia, ela, tão profunda 
como profundo Averno é 
Sublime, ela, deia súpera 
Superar, ela, supero; só espero 
um dia, um beijo só, não cem, 
nem mil, nem depois tantos cens  
Apenas uma, dela, de saliva a gota, 
para do peito meu fazer qual plácido mar 
E, toda formosa de mil Vênus,  
uma única noite e longa dormir. 

Gelbart S. Silva Onda Verde / SP

Caiçara de São Sebastião que veio para o interior de São Paulo onde
o mar é o céu, Gelbart sempre foi apaixonado por ouvir histórias e
descobriu que amava (re)contá-las. Doutorando em Letras e
pesquisador na área das Clássicas, arrisca-se em escrever um tanto
de prosa e alguns versos.
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clara, obscura
singela, dura
menina, madura
pensada, imatura
ofensa, candura
rudeza, ternura
repete, inaugura
esconde, apura
colagem, ranhura
informa, censura
acordo, ruptura
concorda, atura
declama, murmura
delícia, tortura
afaga, dedura
doa, fatura
escassez, fartura
violência, brandura
lisa, fissura
esconde, figura
carinho, secura
deleite, amargura
acidez, doçura
covardia, bravura

Melado, rapadura

James Berwaldt São Leopoldo / RS

das reminiscências juvenis enredou-se nas letras, tropeçou nas


palavras, berrou aos ventos, subverteu a esperança, enganou a
solidão, tirou a poeira, deu uma colorida na bosta e foi. Só que não,
está aí, porque tem uns livros de contos, novelas e poesia e, de vez
em quando faz propaganda deles, mas não vende nada.
Instagram: @james_berwaldt
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Uma poesia
Ainda sangra
bem mais que
um iate em Angra.

Nem sempre bilacquiana


trajando smoking
também sapato de bico fino.

Uma poesia sangra


(via de regra)
bem debaixo do viaduto
numa batalha de versos
num grito humano
corroendo o concreto armado.

Lecy Sousa Contagem / MG

Aprendiz de poeta e autor de livros como "Primeirapessoaplural" (2008),


"Rascunhos" (2015), "Poesia fora da Curva" (2017), "Bora lá,
Baudelaire"(2022) e "Trilogia do Poema Bruto( 2023). Participou da
fundação da Academia Contagense de Letras - ACL (2001) e diversos
saraus. É servidor público da Educação Municipal de Contagem.
Licenciado em Letras e Graduado em Processos Gerenciais.
86

colei um poema num poste, 


mas ele não estava mais lá quando voltei.

o que será que aconteceu?


ganhou vida e agora anda de bar em bar
procurando resposta para dores que não entende?
ou se descolou e saiu voando,
dividindo espaço com os pássaros 
e se questiona agora que mesmo com essa liberdade toda
eles também sentem o vazio?

acho que só foi arrancado e agora está perdido


e se sente, finalmente, igual a quem o escreveu.

Léo Cruz Porto Alegre / RS

Léo Cruz é de Porto Alegre e formado em Publicidade e Propaganda.


“Ainda não há um furacão com seu nome” foi lançado de forma
independente, no final de 2018, sendo o mais vendido na categoria Poesia
para Jovens e Adolescentes e um dos mais vendidos na categoria geral de
Poesia na Amazon. Em 2021 lançou seu segundo livro de poemas, “A
última vez que penso em você neste segundo”, publicado pela editora
Bestiário. É coorganizador do Sarau Poetaria.
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Nos apropriamos dos rios,


Das plantas e animais.
Colonizamos terras,
Tornamos praias, cais.
Mesas fartas,
Estados superavitários
À custa de escravizados
E povos originários.
A consumação que,
Instintiva, nos move,
E toda a dor do outro
Que não nos comove,
Fazem do homem,
Escravo de sua paixão,
Artífice da própria
Destruição.
Manejamos a 
Arma que atira,
Ficando, nós mesmos
Sob a mira,
Do poderio tirano
E destruidor,
Da torpe foice
Do colonizador.

Luccas Samtos São Paulo / SP

Luccas Samtos é um autor meio paulistano, meio diademense, que


começou a escrever aos 12 anos em oficinas de literatura de Diadema, e
permanece escrevendo até hoje. Autor de 'Anamnesis' pela GBL Editora, e
de 'Epithymia', pela Editora Algaroba, faz de seus poemas, um grito contra
toda a exclusão e sonda a própria subjetividade neles.
Instagram: @luccassamtosbr
88

Se pudesses dar-me o mel à alma sem o estardalhaço que


causas, serias o mais doce dentre todos

pois gargalham estridentes os sátiros


soam sonoramente os címbalos às bacantes
berram desvairados esses bêbados
como se anunciassem:

estás aqui.

E como não estarias se és a própria orgia?


Como não serias balbúrdia, se és o próprio bacanal?

Se não são os teus que choram evoé,


se não são os teus que dançam e cantam,
és tu que bradas incessantemente de onde estiver.

Então venhas sozinho.

Professa-te em sussurros.

Deixe-me ser séquito em silêncio.

Matheus Bueno Itapetininga / SP

Nascido em Itapetininga, gradou-se em Letras Português/Italiano e fez


Mestrado em Literatura Italiana pela UNESP de São José do Rio Preto. De
vez em quando, escreve poemas inspirados pela Mitologia Greco-romana.
E-mail: matheus.s.bueno93@gmail.com
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Rubermária Sperandio Rio de Janeiro / RJ

Formada em Comunicação Social e mestre em Mídia, Política e Cultura


pela UFMT. Escritora e poeta, com várias publicações em revistas e
coletâneas. Publicou em 2019 o livro de poemas “Matrioskas”.
Instagram: @rubermariasperandio_
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Fico desabotoado de saudade 


quando vais ali, na loja de armarinho,
buscar linhas e botões para ocupar 
as nossas casas, acaso vazias.

Robson Alves Soares Porto Alegre / RS

Nasceu em Cachoeira do Sul / RS no dia 08 de julho de 1967. Está


pronto para se aposentar desde os 11 anos de idade. Sua gare
eterna é a esquina da infância, onde o tempo é circular e as
lâmpadas são vaga-lumes.
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vozes ecoam
num ritmo audaz
entoam clementes
num doce encanto
de sons inefáveis
solfejo em notas
num canto solene

vozes brilham
na tela em cores
de flores e amores
firmados num céu
como num troféu
de estrelas cadentes

como viver
num mundo em silêncio
sem canto, nem ritmo
num canto qualquer
sem som, nem ruído
sem laço, sem dó

é ter num só tempo


num simples compasso
no canto do pássaro
no breve sonido
das ondas do mar
no eco
no quadro
na vida
num canto do céu.

Sigridi Borges São Paulo / SP

Professora de Matemática e Escritora. Autora de “Algarismos em


Sonetos” (Scortecci, 2016), e “O sonho da girafa Zeni” (EHS Edições,
2021), vencedora do Troféu Literário Clarice Lispector 2022 categoria
Melhor Projeto Gráfico, integra AIL, AILB e AISLA. Diagramadora e uma
das produtoras da Revista SerEsta. Integra a equipe de produção da
Revista Ecos da Palavra. E-mail: sigridi.escritora@gmail.com
apoia.se/entreverbo

facebook.com/entreverbo

@entreverbo

youtube.com/c/Entreverbo

issuu.com/entreverbo

Impresso em Porto Alegre por Printstore.


Miolo composto em papel Pólen Soft 80g.
Projeto gráfico confeccionado no histórico
bairro de Santa Teresa, Rio de Janeiro.

Editora Entreverbo, inverno de 2022.

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