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Anais do X Encontro de Geógrafos da América Latina – 20 a 26 de março de 2005 – Universidade de São Paulo

A REDE URBANA EM TESE: CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS


RUMO AO NOVO MILÊNIO

Bianca Simoneli de Oliveira 1

A década de 1970 foi considerada um período de transição no Meio


geográfico brasileiro. Desde então, mudanças nas funções, nas formas e nas
estruturas têm ocorrido no campo e na cidade. Estas últimas têm
evidenciado uma transformação dinâmica, uma mudança visível de papéis,
que ocorre em conformidade com a região onde estão inseridas e pela
função que desempenham regionalmente.

Em outras palavras, se estamos tratando de uma pequena cidade,


inserida numa região agrária, perceberemos que ela irá se equipar em
função desse campo, por outro lado, analisando uma cidade média, voltada
para o setor industrial, a função desenvolvida por ela, em nível regional,
estará vinculada ao setor econômico/industrial.

A inserção ao Período técnico científico informacional criou meios para


que as cidades do interior pudessem equipar-se com serviços bancários,
informações, telecomunicações, meios de armazenagem, sistema de
circulação e transportes, comércio especializado e profissionais voltados
para o campo tecnificado. O elo entre campo/cidade tornou-se cada vez mais
intenso, ou seja, interdependentes, e mesmo as cidades econômicas e
industriais têm no setor rural, sua fonte de matéria-prima.

As cidades médias ainda apresentam mais equipamentos e condições


de atendimento que as pequenas e, por isso, ainda são referências
regionais.

Algumas contribuições teóricas sobre a rede urbana

A questão da rede urbana foi assunto polêmico nos debates


geográficos dos anos de 1960/70 e início de 1990. Dois autores que muito
tem contribuído nessa discussão no Brasil, são Roberto Lobato Corrêa e
Milton Santos, que analisaram a rede urbana brasileira e suas metamorfoses

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Universidade de Rio Verde/GO/BR – FESURV
bsimoneli@fesurv.br

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diante das transformações estruturais que ocorreram no país a partir de


meados do século XX.

O significado de rede urbana é amplo e sua compreensão na academia


tem sido feita, as vezes, por meio de polêmicas discussões frente a
correntes que ignoram a existência dessas redes nos países
subdesenvolvidos ou consideram que elas estariam em fase embrionária, ou
mesmo seriam desorganizadas.

Roberto Lobato Corrêa caracteriza-se como um autor que contraria os


argumentos dessa corrente de pensamento e defende a existência dessas
redes. Em seus estudos sobre a rede urbana, o autor discute clássicos como
Walter Christaller e David Harvey, levantando pontos que merecem ser
discutidos no momento que o país vive.

Segundo esse autor, na sua obra de 1989, a rede urbana é um reflexo


dos efeitos acumulativos da prática de diversos agentes sociais,
principalmente das grandes corporações “multinacionais e multiorganizadas”,
que introduzem, na cidade/campo, atividades que geram diferenciações entre
os centros urbanos e que condicionam a novas ações.

Carlos (1992) e Corrêa (1989) discutem posições parecidas sobre a


rede urbana, considerando a sua forma espacial, entretanto, divergem entre
fatores sociais e funcionais respectivamente.

Carlos (1992) admite que a rede urbana pode ser considerada como
forma sócio-espacial de realização do ciclo de exploração 2 da grande cidade
sobre o campo e centros menores, onde há relação de inter-relação entre a
grande cidade, os pequenos centros e o campo.

A rede pode ser considerada como uma forma espacial através da qual
suas funções urbanas se realizam. Trata-se das funções de comercialização
de produtos rurais, produção industrial, vendas varejistas, prestação de
serviços diretos, entre outras, as quais se reportam aos processos sociais
dos quais “a criação, apropriação e circulação do valor excedente constitui-
se no mais importante, ganhando características na estrutura capitalista”.
(CORRÊA, 1989, p. 71).

2
Por ciclo de exploração, entende-se que existem dois, em que, no primeiro, a
grande cidade, “cabeça da rede urbana”, extrai do campo e das cidades menores,
via migrações, força de trabalho, produtos alimentares, matérias-primas, lucros
c o m e r c i a i s e r e n d a f u n d i á r i a . N o s e g u n d o c ic l o , q u e r e a l i m e n t a o p r i m e i r o , t r a t a - s e ,
portanto, do mesmo processo, ou seja, a cidade grande exporta para os centros
m e n o r e s e o c a m p o , c a p i t a i s , b e n s , s e rv i ç o s , i d é i a s e v a l o r e s . ( C A R L O S , 1 9 9 2 )

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Outro autor que contribui para o estudo da rede urbana trata-se de


Rocheford (1998), que desenvolveu sua tese com base no setor terciário da
economia dos países desenvolvidos, mas que também muito enriquece a
discussão. Segundo esse autor, as redes urbanas configuraram-se a partir
do momento em que os transportes modernos facilitaram os deslocamentos
de relações, elaborados no século XIX.

Diante disso, para entender uma rede, é necessário levar em conta


uma dada região e as cidades que aí se distribuem em alguns tipos
caracterizados por certo papel econômico mais ou menos influenciados pela
história; a inserção geográfica dessas cidades em sua região vai repercutir
na maneira pela qual elas cumprem seus papeis com relação a esta última.

Segundo esse autor, para caracterizar uma rede, duas categorias


devem, de fato, ser colocadas em evidência: determinar os tipos de cidades
que a região encerra e discriminar as zonas de influência das cidades
grandes e médias, que se constituem como os dois primeiros escalões dessa
hierarquia.

Entretanto é Walter Christaller, clássico nessa discussão, que


contribuiu intensamente sobre os estudos de redes urbanas, pela sua teoria
dos lugares centrais. Apesar de caracterizar-se como uma teoria assentada
numa visão bastante econômica, ainda foi base de diversos estudos sobre a
rede urbana, desde a década de 1940, influenciando notadamente vários
autores brasileiros.

O modelo clássico de Walter Christaller

Como destaque da tradição neoclássica de estudos sobre a rede


urbana, destaca-se a “teoria dos lugares centrais”, elaborada em 1933, que
trata a relação entre capital-interior numa perspectiva espacial. Essa relação
traduziu a presença de uma hierarquia entre cidades determinadas pela
lógica da “extração tributária” e pelas necessidades da “circulação mercantil”
estabelecidas de forma permanente no território.

Fatores que, segundo o IPEA (2000), definem localizações


privilegiadas no território da cidade, e, sendo assim, as condições de
reprodução social vão espelhar-se numa segregação espacial no que diz
respeito ao acesso às redes de infra-estrutura e serviços urbanos, cuja
lógica responde à dinâmica do sistema urbano na sua totalidade e não às
necessidades locais.

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A racionalidade dos agentes sociais envolvidos, tais como os


varejistas e prestadores de serviços, de um lado, e os consumidores finais,
de outro, geram localizações otimizadas por parte dos primeiros e
deslocamento racionais por parte dos segundos, nos quais, para um dado
bem ou serviço, o custo e o tempo são minimizados.

Segundo Tavares (2001), o conjunto de centros de uma região ou país,


tais como cidades, vilas, povoados e estabelecimentos comerciais isolados
na zona rural, tendo um papel de distribuição varejista e de prestação de
serviços para uma população neles residente, são denominados, na teoria
Christalleriana, de “localidades centrais” e a centralidade de que dispõe é
derivada de seu papel como centros distribuidores de bem e serviços, ou
seja, das funções centrais que desempenham.

Outra questão de que essa teoria trata diz respeito à hierarquia da


rede urbana, questionando o tamanho, as funções econômicas e a
localização das cidades num dado espaço.

Estudiosos como Christaller (1966) e Losch (1954), citados no estudo


do IPEA, notaram que existem aglomerações urbanas de todos os tamanhos,
“dotadas de funções centrais que consistem na produção e na distribuição de
bens e serviços a um “hinterland” em relação ao qual o centro urbano ocupa
posição central” (IPEA, 2000, p. 26). Na visão desses autores, a localização
das atividades básicas induz à organização de um sistema hierárquico de
cidades.

Na teoria christalleriana, qualquer estabelecimento comercial,


industrial ou de prestação de serviços, fornece bens e serviços a uma região
próxima do centro fornecedor, representando, nesse sentido, uma
polarização espacial da aglomeração urbana.

Desse modo, haveria a constituição de uma hierarquia de cidades, em


que, no nível mais elementar, estariam as cidades produtoras basicamente
de bens e serviços, aqueles mais procurados pela população para sua
reprodução social cotidiana, e, do outro lado, estariam os centros urbanos
maiores, geradores de produtos e serviços mais especializados para uma
área territorial mais extensa.

Seria uma região homogênea e desenvolvida economicamente,


havendo, portanto, uma hierarquia caracterizada de níveis estratificados de
localidades centrais, nos quais os centros de mesmo nível hierárquico

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“oferecem um conjunto semelhante de bens e serviços e atuam sobre áreas


semelhantes no que diz respeito à dimensão territorial e ao volume da
população”. (CORRÊA, 1997, p. 41).

Ainda no estudo da rede urbana, outra corrente de característica mais


humana e radical, em oposição ao modelo neoclássico de Christaller,
destacou-se; trata-se de uma corrente fundamentada em argumentos
estruturalistas, que questiona a separação entre a produção e distribuição
assumida pelas teorias locacionais, e “[...] enfatizam aspectos históricos
relacionados à constituição das cidades e dos conflitos entre agentes sociais
e econômicos que disputam o acesso à terra urbana” (IPEA, 2000, p. 24),
privilegiando o processo de urbanização.

Harvey e Castells apud IPEA (2000), foram autores que muito


contribuíram nessa corrente, justamente por reconhecerem o limite analítico
imposto por modelos que tinham como base o “equilíbrio geral” do modelo
neoclássico e também por perceberem que o desequilíbrio ligado à expansão
capitalista traz consigo permanente movimento gerador de regiões
dinâmicas, em contraposição às regiões estagnadas.

Das novas contribuições: a rede urbana numa visão “brasileira”

Temos sido agentes e observadores do processo de produção do


espaço brasileiro há várias décadas, e as transformações são consideráveis,
inclusive nos setores da economia, como o terciário, que, a modelo dos
outros, sofre mudanças relacionadas ao uso da informática, da tecnologia e
da comunicação.

Essas reestruturações causaram alterações significativas não só no


padrão de acumulação como também na organização espacial, influenciando
o arranjo da hierarquia urbana.

Nesse contexto, as críticas que surgem em relação às abordagens


tradicionais dos estudos da rede urbana, decorrem da defasagem histórica
das teorias, frente às mutações significativas ocorridas após os anos de
1970, nos países em subdesenvolvimento.

Fatores tais como a redução nos custos de transporte, facilidades na


área de telecomunicações, boa mobilidade para as pessoas, generalização
de serviços, equipamentos e comércio, que antes foram reservados às
grandes cidades, bem como os serviços de alta especialização, constituem

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alguns dos fatores que concorreram para as mudanças processadas na


organização das redes.

Diante disso, considerando o atual quadro brasileiro, faz-se necessário


abordar autores que tenham contribuído sobre os estudos das redes urbanas
no país, dentre eles, destacamos Milton Santos e Roberto Lobato Corrêa,
que muito somaram nessa temática.

a) Milton Santos: breves palavras relevantes

A obra de Milton Santos também constituiu uma contribuição


importante para a temática da rede urbana. Já na década de 1970 analisava
as modificações nos sistemas de produção brasileira e das redes, por meio
de dois sistemas que denominou circuitos superior e inferior.

Uma das questões que Santos (1996) muito tem discutido trata-se da
urbanização brasileira e da reestruração espacial pela qual temos passado
nesse recente período caracterizado pelo desenvolvimento da ciência,
tecnologia e informação, bem como a “função” que cada centro passa a
assumir na rede.

Para esse autor, uma rede urbana é o resultado de um equilíbrio


instável de massas e de fluxos, “cujas tendências à concentração e à
dispersão, variando no tempo, proporcionam as diferentes formas de
organização e de domínio do espaço pelas aglomerações”. (SANTOS, 1989,
p. 165).

Tradicionalmente, a Geografia descritiva isolava diferentes funções e


estabelecia uma classificação de cidades de acordo com uma ou várias
funções determinantes. Todavia, para Santos (1989), é preferível uma
distribuição segundo o grau de evolução das cidades, mas isso não nos deve
dispensar de reconhecer centros com função preponderante ou de liderança.

Na análise do autor, os dois circuitos da economia interferem na rede


de localidades centrais, estruturando-a de modo que cada centro atue
simultaneamente nos circuitos, dispondo de duas áreas de influência. Essa
interferência se faz, em realidade, mediante mecanismos básicos de
estruturação da hierarquia urbana, com alcance espacial mínimo e máximo,
em três níveis de centros: a metrópole, a cidade intermediária e a cidade
local.

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A cidade local atua efetivamente por meio do circuito inferior,


enquanto a metrópole o faz pelo superior; as cidades intermediárias ficam
numa posição de centralidade, que lhes é fornecida pelos dois circuitos, em
que, ora um tem maior importância, ora o outro.

Convém ainda esclarecer sobre os circuitos que o inferior, é


constituído por atividades que não dependem de capitais de modo intensivo
e possui uma organização primitiva, tal como a fabricação de bens, certas
formas de comércio e serviços que não exigem especializações e atende,
sobretudo, a população de baixa renda.

Por outro lado, o circuito superior é resultado da modernização


tecnológica, sendo constituído pelos bancos, comércio e indústria moderna
voltados para exportação e vinculados ao mercado interno, pelos serviços
modernos, empresas atacadistas e de transporte.

Ainda sobre as redes urbanas, Santos (1989) teoriza o assunto em três


elementos de base, que constituem, conforme esse autor, a própria
substância da organização das redes: as massas, os fluxos e o tempo.

As massas caracterizam-se pela população, sua densidade e sua


distribuição, também a produção, a distribuição e o valor. Os fluxos, que
contêm as massas, são a expressão dos fluxos populacionais, produções
agrícolas, fluxos monetários, informações, ordens.

O fator tempo, também trabalhado por Corrêa (1997), pondera os dois


elementos anteriores, explicando os fenômenos de disparidade,
principalmente os temporais, como o grau de arcaísmo de infra-estrutura
agrícola, industrial, dos transportes e serviços, dependendo da região.

Com a crescente especialização regional, com os inúmeros fluxos de


todos os tipos, intensidades e direções, Santos (1996) vê o mundo numa
outra ótica, cuja organização dos sub-espaços passa a ser articulados a
partir de uma lógica global. Portanto, temos de falar em circuitos espaciais
de produção e, não mais, em circuitos regionais.

Diante dessas transformações, principalmente a técnica, é importante


analisar esses elementos, compreender como agem na funcionalidade dos
centros e como contribuem para sua configuração na rede, considerando as
supostas modificações pelas quais a rede pode passar diante do dinamismo
das massas e fluxos.

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As mudanças espaciais, mediante as facilidades de fluxos e fixos,


também levaram Santos (1996) a questionar a hierarquia urbana, a qual,
num primeiro momento, se submeteu a uma organização hierárquica em que
os fluxos processavam-se das cidades menores para as progressivamente
maiores.

No entanto, com as facilidades do Período técnico científico


informacional passaram a existir múltiplas possibilidades de cidades de
diferentes padrões relacionarem-se. Desse modo, os núcleos urbanos
necessariamente não mais estabelecem fluxos que possam caracterizar um
padrão rígido de hierarquia.

As mudanças de função na rede urbana, frente às mudanças no


espaço geográfico, foram também analisadas por Corrêa. Suas contribuições
buscam contextualizar as teorias Christallerianas nos países
subdesenvolvidos mediante as transformações ocorridas durante o Período
técnico científico informacional.

b) Roberto Lobato Corrêa: uma contribuição necessária

Esse autor tem sido reconhecido com mérito por muito ter contribuído
para o estudo das redes urbanas no que tange ao caso brasileiro. Sua
preocupação sobre essa temática já ocorre desde a década de 1980.

No seu estudo, Corrêa (1989) procura identificar a natureza e o


significado da rede urbana, levando em consideração fatores como a divisão
territorial do trabalho, as relações entre a rede urbana e os ciclos de
exploração, bem como a forma espacial desta.

Quanto à materialização da rede urbana, o autor argumenta que “os


processos sociais que definem e redefinem uma rede urbana não atuam por
igual em toda a sua extensão”, ou seja, há seguimentos da rede que
incorporam vários momentos da história e/ou do presente, portanto, verifica-
se que a periodização ocorre de modo espacialmente desigual. (CORRÊA,
1989, p. 79)

Em razão da desigual espaço-temporalidade dos processos sociais, da


qual Corrêa (1997) considera a rede urbana um reflexo e uma condição,
pode-se verificar a existência de diversos tipos de redes, de acordo com o
padrão espacial, a complexidade funcional dos centros e o grau de
articulação interna e externa da cada rede.

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Para esse autor, pode existir rede urbana nos países


subdesenvolvidos 3 , desde que três condições sejam satisfeitas: primeiro, que
exista uma economia de mercado com uma produção que é negociada por
outra e que não tenha sido produzida local ou regionalmente; segundo, a
existência de pontos fixos no território, em que a troca é realizada, ainda
que periodicamente; esses pontos tendem a concentrar outras atividades,
tais como aquelas de controle político-administrativo e ideológico,
transformando-se em núcleos de povoamento composto de diferentes
atividades; e a terceira condição refere-se à existência de um mínimo de
articulação entre os núcleos anteriormente referidos, o que dá origem e
reforça a diferenciação entre os núcleos urbanos no que se refere ao volume
e tipo de produtos comercializados, às atividades político-administrativa,
entre outras; e que se traduz em uma hierarquia entre núcleos urbanos e em
especializações funcionais. (CORRÊA, 1989).

Diante dessas explanações e tecendo uma análise sobre os países


subdesenvolvidos, esse autor discute que há uma semelhança muito grande
entre as redes de localidades centrais desses países com o descrito no
esquema christalleriano, mas que se distinguem por três modos de
organização distintos, que podem coexistir numa mesma rede: - uma rede
dendrítica de localidades centrais; - mercados periódicos; e –
desdobramento da rede em dois circuitos da economia.

As redes dendríticas caracterizam-se como de origem colonial; uma


cidade estratégica que concentra as principais funções econômicas e
políticas da hinterlândia 4 e um expressivo número de pequenos centros no
seu entorno.

Quanto aos mercados periódicos, estes são definidos como aqueles


núcleos de povoamento pequenos, que, periodicamente, se transformam em
localidades centrais e que, passado o período de intenso movimento
comercial, voltam a ser pacatos núcleos rurais, com grande parte da
população engajada em atividades primárias.

3
E s t a d e n o m i n a ç ã o f o i u t i l i za d a n a o b r a d e C o r r ê a , 1 9 9 7 .
4
Hinterlândia caracteriza-se como a área unida social e economicamente a um
núcleo urbano. Em sua grande maioria, esses núcleos são modernos e seus
h i n t e r l a n d s s ã o e c o n o m i c a m e n t e i n d e p e n d e nt e s , e m v e z d e s e r t r i b u t á r i o s u n s d o s
outros. Geralmente, as cidades maiores exercem uma influência particularmente
intensa sobre as áreas que a rodeiam, até o ponto de afirmar-se que elas
organizam suas hinterlands formando regiões funcionais. (TAVARES, 2001)

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Os dois circuitos da economia, superior e inferior, elaborados por


Milton Santos (1979), constituem uma bipolarização interligada, visto que
possuem origem em comum e o mesmo conjunto de causas.

Segundo Corrêa (1997), a existência de uma classe média que utiliza


um e outro circuito, impede o isolamento de ambos, além do que ainda
existem articulações de complementariedade e de dependência, envolvendo
intercâmbios de insumos entre esse sistema.

Outra contribuição relevante, que Corrêa (1997) aborda sobre o


entendimento das redes, trata-se de algumas dimensões que precisam ser
consideradas para realizar estudos sobre o urbano. São as dimensões
organizacional, temporal e espacial, que não se dissociam.

O autor esclarece que a dimensão organizacional refere-se à


configuração interna de um entidade estruturada na rede, pode ser uma
cidade, uma empresa e abrange agentes sociais envolvidos, a origem da
rede, a natureza dos fluxos, a função e a finalidade da rede, sua existência,
construção, formalização e organização.

Quanto a dimensão temporal, esta associa-se à duração da rede, à


velocidade dos fluxos, à freqüência com que ela se estabelece e à história;
essa dimensão está ligada à espacial, bem como à organizacional; ademais
essa última não adquire concreticidade se estiver desvinculada do tempo e
do espaço.

Essas dimensões podem ser visualizadas no território brasileiro,


principalmente pelas transformações ocorridas no país, tais como a
industrialização, a melhoria da circulação e dos transportes, o
desenvolvimento de uma estratificação social mais complexa, bem como a
modernização do campo e a incorporação de novas áreas. Fatores que
levaram a uma “complexicação funcional” dos centros urbanos, como afirma
Corrêa (1997).

Dessa forma, verifica-se que a posição de cada centro na hierarquia


urbana não é mais suficiente para descrever e explicar a sua importância na
rede de cidades. Tornou-se relevante considerar suas especializações
funcionais, sejam elas relativas à indústria ou aos serviços.

Nesse contexto, em que há uma complexidade funcional, entende que


cada centro passa a situar-se em pelo menos duas redes, onde “[...] uma é

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constituída por lugares centrais e na qual cada centro tem uma posição
(metrópole, capital regional, centro sub-regional, centro de zona, centro
local) e outra menos sistemática e mais irregular” (CORRÊA, 1997, p. 100),
em que cada centro desempenha um papel singular e/ou complementar aos
outros.

Diante disso, a rede urbana brasileira não pode ser mais tratada
exclusivamente por interações do tipo rígida, descrita na teoria
Christalleriana, mas deve incluir também interações de complementariedade
no âmbito da rede urbana, visto que a complexidade da divisão territorial do
trabalho leva a numerosas especializações funcionais, que definem diversos
centros urbanos.

Essas inter-relações podem ser vistas em uma capital regional por


exemplo, que, no passado, se relacionava quase que exclusivamente com
uma única metrópole e que, atualmente, passa a relacionar-se com outras,
além de diversas capitais regionais, e mesmo com centros menores mais
afastados.

A crítica ao modelo tradicional

Analisar essas teorias isoladas, para entendê-las no contexto dos


países subdesenvolvidos, como fez Corrêa (1997), constitui-se numa tarefa
árdua.

Verifica-se que há validade e grandes contribuições, mas que também


há fatores discutíveis ou a ausência de outros, e, sendo assim, é necessário
repensá-las, considerando as transformações conjunturais e estruturais nas
diversas escalas da economia, que tem levado a intensas modificações, no
que diz respeito ao território brasileiro após 1970.

As críticas mais intensas são feitas à teoria dos lugares centrais de


Christaller, que tem sido base para muitos estudos, mas que, diante das
transformações do espaço geográfico brasileiro, não tem conferido uma
visão de flexibilidades entre os diversos centros urbanos, que o atual
período exige.

A teoria dos lugares centrais não leva em consideração uma série de


serviços especializados, que foram sendo desenvolvidos após sua
elaboração e, por isso mesmo, eles não estão presos num modelo de
hierarquia urbana estratificado, em que estejam necessariamente disponíveis

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nos grandes centros, mas, ao contrário, tornaram-se mais acessíveis por


meio da melhoria da rede de comunicação e dos transportes.

Outros fatores a serem repensados nessa teoria diz respeito à


disposição espacial das cidades num determinado território, que tende a não
obedecer a uma distribuição rigorosamente geométrica e nem mesmo
populacional, que está distante de ser homogênea. São essas dimensões
populacionais e econômicas das cidades que se destacam na teoria de
Christaller e não uma dimensão funcional, que é indispensável na
organização espacial de um território, ainda que essa se modifique com o
decorrer do tempo.

Nesse sentido, manter a posição na hierarquia urbana requer,


portanto, capacidade de inovação, pois, dessa forma, as funções
econômicas, que decorrem cada vez mais da capacidade de inovar, permitem
apontar outras classificações mais elaboradas com base no nível de
desenvolvimento econômico e nas estruturas mais ou menos complexas dos
centros urbanos.

O modelo de Christaller apresenta-se como uma situação ideal,


utilizando-se somente da função de distribuição dentre os diversos papéis
que são desempenhados pelos núcleos urbanos.

O papel da funcionalidade, destacado por Santos e Corrêa


anteriormente, somado a uma estrutura instável e dinâmica dos países
subdesenvolvidos, revela novas configurações significativas para as redes
urbanas.

As melhorias nos transportes e telecomunicações têm encurtado o


tempo e as distâncias entre os centros. O espaço geográfico torna-se virtual
para diversas relações, mas, em nenhum momento, perde sua importância,
pois não deixa de existir.

As características da teoria de Christaller estão presentes entre os


centros, tanto nas relações de distribuição regionais como nos moldes da
rede dendrítica, onde a cidade pólo reúne as principais funções do hinterland
formando uma hierarquia piramidal rígida.

Ao analisar tal situação mediante as facilidades do PTCI, da


implantação de fixos de transportes e comunicações, observamos que os
fluxos têm ganhado dimensões diversas e, portanto, não ficam presos a uma
rede.

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Mas ainda existem necessidades básicas quanto aos serviços de


saúde, de educação e de prestação de serviços especializados (para o
campo), denotando a existência de uma hierarquia ativa, cujos pequenos
núcleos do hinterland são polarizados por uma cidade mais equipada.

Contudo mesmo essas atividades não ficam presas num único pólo
urbano, visto que no atual período, centros de diversos tamanhos
complementam-se e nada impede que esse fluxo populacional consuma
serviços em centros de porte, funções e localizações variadas.

Algumas considerações acerca das transformações na rede urbana

O processo de urbanização é um fenômeno muito recente na história


do homem e, no entanto, já tem adquirido grandes proporções na escala
mundial. No final do século XIX, conforme nos apresenta Sposito (1997), a
população considerada urbana correspondia a apenas 1,7% da população
total. Nos anos de 1950, esse percentual cresceu para 21%, e
posteriormente aumentou para 25% em 1960, 37,4% em 1970 e cerca de
41,5% em 1980, atingindo a margem de 51% em 1990.

No Brasil, o processo de urbanização começou após a 2 a Guerra


Mundial, mas, até 1960, ainda era um país predominantemente agrícola, com
uma taxa de urbanização de 44,7%.

Essa urbanização não foge a regra dos países em desenvolvimento.


Após o golpe militar de 1964, o país criou condições de uma rápida
integração com um movimento de internacionalização para investir
intensamente no campo e modernizá-lo, tendo como finalidade atender a um
mercado consumidor interno em expansão e a uma demanda externa.

Diante dessa reestruturação no campo, ocorreu a expulsão de um


intenso contingente de trabalhadores rurais, e foram as grandes cidades as
acolhedoras desse fluxo, vistas como lugares que ofereciam melhores
condições de vida, com maior acesso à saúde, educação e empregos,
implicando o esvaziamento do campo e de pequenos centros.

Toda essa reestrutração que ocorreu no campo e na cidade foi a base


para a instalação de um novo Meio geográfico, - os meios e os fins -,
caracterizado pela informação, tecnologia e cientificidade.

Santos (1996) denomina esse novo Meio geográfico de “Meio técnico


científico informacional”, que se desenvolve num período de mesmo nome, e

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distingue-se por duas características no país: - grande desenvolvimento na


configuração territorial, em que o homem cria sistemas de engenharia que
superpõem à natureza, a fim de criar condições de trabalho, próprias de
cada época; - intenso desenvolvimento da produção material, agrícola e
industrial, em que as mudanças que são estabelecidas nesses setores
acarretam também alterações nas formas de circulação e distribuição e,
conseqüentemente, sobre o consumo.

Nesse período, a urbanização ganhou novo impulso e o espaço do


homem, tanto nas cidades como no campo, foi tornando-se um espaço
instrumentalizado, aculturado, tecnificado, cada vez mais trabalhado
segundo os ditames da ciência.

Diante disso, a rede urbana tornava-se cada vez mais diferenciada e


complexada, haja visto que cada cidade e seu campo passavam a responder
por relações específicas, próprias a sua realidade sócio-econômica e, dessa
forma, percebemos que toda a reestruturação sócio-espacial e econômica
pela qual o território tem passado, além do processo de urbanização,
contribuíram para que houvesse uma extrema diferenciação entre os tipos
urbanos e sua hierarquia de tamanho e funções.

No Brasil, o desenvolvimento da produção, circulação, informação e de


novas formas de consumo, tem gerado novas funcionalidades entre os
centros urbanos e uma nova configuração no interior das redes urbanas.
Diante disso, é possível uma relação de complementariedade e prestação de
serviços entre a pequena cidade local com a cidade média, com a metrópole
regional ou, em certos níveis, mesmo diretamente com a metrópole nacional.
Esse novo meio tecnificado e informatizado cria uma "contração" do tempo e
o "encurtamento" das distâncias, beneficiando essa relação.

Importa considerar o processo de globalização, porquanto este tem


modificado os consumos consuntivo e produtivo da população e dos meios
de produção, refletindo-se diretamente no meio rural/urbano e induzindo as
mais diferentes aglomerações a participar do jogo entre local e o global. É
dessa forma que “as cidades pequenas e médias acabam beneficiadas ou, ao
contrário, são feridas ou mortas em virtude da resistência desigual dos seus
produtos e de suas empresas face ao movimento de globalização”.
(SANTOS, 2001, p. 281).

Diante disso, percebemos uma hierarquia flexível de cidades, em que a


dinâmica dos fluxos (sejam eles econômicos, demográficos, informacionais)

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é capaz de gerar funcionalidades às cidades, despontando-as numa rede,


bem como a possibilidade de estagná-las, num curto período de tempo.

Assim, notamos que o processo de mundialização não implica o


desaparecimento de uma estrutura hierarquizada de relações e articulações
entre as cidades, mas que possibilita maiores interações entre eles,
independente de seu tamanho, funcionalidade ou localização, como
verificamos no contexto das cidades médias e pequenas.

A refuncionalização das cidades Médias

Nesse processo de transformação do espaço geográfico mediante a


inserção do PTCI, muitos centros têm se (re)funcionalizado na rede urbana
em que estão inseridos. Os pequenos centros, criados sob determinadas
condições de demanda e circulação, por longo tempo, permaneceram com a
função exclusiva de reservatório de força de trabalho rural.

As novas técnicas absorvidas pelo campo, além de aumentarem a


produção e alterarem o sistema fundiário, passaram a gerar novas
necessidades, cujo “lócus” representante são as pequenas e médias cidades.

Diante da reestruturação dos centros urbanos, e consequentemente


das redes, a cidade média não é mais apenas um intermédio entre os
centros menores e maiores do que ela, mas um centro de atração de mão-
de-obra qualificada, reduto de uma classe média, altos índices de qualidade
de vida, espaço de lazer, “lócus” de novos investimentos industriais e de
serviços; revela-se como um reflexo da produção e das atividades
desenvolvidas regionalmente, visível na rede em que estiver inserida.

O fator demográfico isolado não afirma se uma cidade pode ser


considerada média, importante, hoje, frente às configurações do espaço
brasileiro, considerá-la em sua rede regional, as características de seus
centros, a qualidade de vida de sua população, a funcionalidade, a
localização, entre outros fatores.

Não há ainda um consenso entre os autores brasileiros a respeito do


tamanho populacional, todavia Santos (2001) afirma-nos que o novo limiar
para a cidade média está acima dos 100.000 habitantes, mas que há três ou
quatro décadas, esse número estava em torno de 20.000.

Muitas vezes, as atividades urbanas especializam-se em função da


produção regional que exige ciência, técnica e informação e inclui uma

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demanda expressiva de bens e serviços voltados para a cidade e para o


campo, visto que este cria necessidades a serem empregadas no plantio, na
lavoura, na colheita, na armazenagem, no empacotamento, no transporte e
na comercialização.

As cidades médias, atualmente, comandam os aspectos técnicos da


produção regional, deixando o essencial dos aspectos políticos para os
centros maiores no país, ou mesmo no estrangeiro, entretanto, conforme nos
esclarece Santos (2001), não deixa de ser um espelho de contradições entre
as preocupações ligadas à produção (lado técnico) e as ligadas à realização
(lado político).

Outra característica das cidades médias trata-se de que elas


apresentam-se como o “lócus” do trabalho intelectual, o lugar onde se obtêm
informações necessárias às atividades econômicas.

Nesse sentido, são cidades que reclamam continuamente mais


trabalhos qualificados, enquanto as maiores, por sua própria composição
orgânica do espaço, “[...] poderão continuar a acolher populações pobres e
desamparadas”. (SANTOS, 1996, p. 123).

Nessas mudanças de papéis, verificamos que a cidade média hoje,


também chamada de intermediária por Santos (2001), caracteriza-se por ser
o suprimento imediato e próximo da informação requerida pelas atividades
agrícolas e, desse modo, constitui-se em intérpretes da técnica e do mundo.

Nesse contexto, a cidade média não deixa de estar envolvida numa


suposta hierarquia urbana, uma vez que oferece bens, serviços, lazer, entre
outros, à população dos centros menores que nela forem buscar.

Todavia, temos visto que essas relações ocorrem de forma


complementar entre centros de diversos níveis, sem uma rigidez de relações,
como defende a teoria dos lugares centrais de Christaller.

As cidades médias da região do Triângulo Mineiro/Alto


Paranaíba/MG/BR apresentam uma relevante especialização regional em
função do campo, nelas, são implantados fixos que, por vezes, exigem mais
informação, força políticas e econômicas para materializá-los.

São os centros que contêm formação para profissionais e técnicos,


grandes armazéns e silos, grande número de bancos, sedes de poder
político de abrangência regional, bolsas de negócios (voltados para campo),

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sistema de saúde mais equipado, educação completa (básica, técnica e


superior), sistema de transporte rodoferroviário intermunicipal amplo, poder
judiciário, escritórios regionais (cartórios, IBGE, EMATER, etc.) que geram
uma especialização de âmbito mais regional a esses centros.

Nesse contexto de refuncionalização da rede urbana, a pequena


cidade, assim como a média também tem adquirido proporções e importância
vitais para a (e na) região onde se inserem.

O papel dos pequenos centros: a cidade Local

As interações que a pequena cidade, chamada de “cidade local” por


Santos (1979), com a média tem sido distintas de outros períodos, haja visto
que ambas se refuncionalizaram após a década de 1970.

A pequena cidade, que antes dependia do campo de um modo


tradicional (divisão do trabalho, alimento), passou a equipar-se em função do
campo, agora tecnificado, com equipamentos, mão-de-obra especializada,
informações técnicas, sementes, adubos, bancos armazéns e outros.

Constroem-se meios de transporte (rodoviários, ferroviários e aéreos);


elos que são criados e articulados, alterando o processo produtivo entre
ambos por meio das solicitações de produção, circulação, distribuição e
consumo.

De acordo com Santos (1993), deixa de ser a cidade dos “notáveis”,


onde quem tem vez é o juiz, o prefeito, o padre e a professora; ganham
relevância outras funções que o Meio técnico veio acrescentar: profissionais
e técnicos responsáveis pelo solo, pelo gado, pelo plantio; em que a
qualidade do produto, a preocupação com setores jurídicos ambientais e
trabalhistas e a estabilidade do mercado fazem-se presentes; por isso,
torna-se a cidade econômica; cuja função é adequar-se ao campo,
tecnificado, especializado, deixando de ser apenas uma “cidade no campo”.

Segundo Oliveira e Soares (2000), nesse processo, em que a técnica,


ciência e informação infiltram-se rapidamente, as pequenas cidades são as
mais prejudicadas, porque não apresentam condições concretas de suprirem-
se de todos os bens e serviços ou os vendem a preços muito elevados, por
não conseguirem competir no mercado, e, sendo assim, sempre perdem
população. Muda-se a função e aumentam-se as necessidades, diante de seu
nível urbano elementar.

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A cidade local, segundo Santos (1979), caracteriza-se por ser a “célula


mater”, que atende às necessidades de uma população, distingue-se de uma
cidade média pela sua influência estritamente local, atendendo a seu
entorno, ou seja, as vilas e a zona rural.

Essas pequenas cidades aumentaram rapidamente a partir de 1970;


cidades que foram se emancipando e/ou refuncionalizando para atender às
exigências locais e do entorno.

Nesse processo de modernização, vão se abastecer de um aparelho


comercial, administrativo e bancário, fundamentais para o novo Período
tecnológico.

Oliveira e Soares (2000) afirmam que o tema das cidades locais gera
polêmica na pesquisa, já que deixa lacunas diante de estudos empíricos.

São cidades que não apresentam tamanhos definidos, podendo-se


entender que as funções elementares voltadas ao local e ao entorno podem
também ser resultado de vários processos locais e regionais. Isso porque
“cada lugar é singular, e uma situação não é semelhante a qualquer outra;
cada lugar combina de maneira particular variáveis que podem, muitas
vezes, ser comuns a várias lugares”. (SANTOS, 1988, p. 57).

Portanto, consideramos que a materialização das pequenas cidades


locais da Mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba/MG e suas
relações com o campo e com as cidades maiores apresentam-se, ao mesmo
tempo, semelhantes e diferentes da realidade de pequenas cidades locais de
outras regiões e estados.

Fatores endógenos a região, tais como a inexistência de resistência


cultural, o papel das elites locais e o tempo de inserção do Meio técnico
foram fundamentais para o desenvolvimento dos pequenos centros
Triângulinos, em equiparem-se para o campo tecnificado da região. Uma
realidade regional distinta, mediante um processo histórico-econômico-
político singular no estado de Minas Gerais.

Além dessa configuração urbana, o Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba


tornou-se um entreposto comercial entre os estados de Goiás e São Paulo,
recebendo intensos investimentos nos setores de transporte (rodovias e
ferrovias), comunicação e na formação de um complexo agroindustrial (soja,
café, leite e carne).

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A especialização das pequenas cidades locais do Triângulo


Mineiro/Alto Paranaíba/MG supre apenas as necessidades básicas da
população local e do campo, como impõem o Período tecnológico e a
necessidade regional. A presença do aparelho comercial, administrativo e
bancário, segundo Santos (1979), é o suficiente para considerar esses
centros como cidades locais.

Os estudos de Oliveira e Soares (2000), sobre as pequenas cidades


locais revelaram que, por ser a Mesorregião em questão, especializada na
produção voltada para a agroindústria, os pequenos centros vão equipar-se
conforme a demanda da produção regional.

Além do aparelho voltado para o Meio técnico, como determina Santos


(1979), outros fatores também caracterizaram as pequenas cidades locais da
região: a presença de pelo menos um hospital, escolas de ensino
Fundamental e Médio, redes de abastecimento de água e coleta de esgoto
sanitário, redes de energia elétrica, serviços de telecomunicações (telefone,
emissoras de rádio, jornal local), agências bancárias, correios, e
particularmente, serviços de armazenagem (armazéns e silos),
representantes da especialidade em grãos da região.

Analisar a função que as cidades locais exercem no seu local/entorno,


frente ao Período técnico científico informacional, é fundamental para
entendermos sua dinâmica com a cidade média numa determinada região.
São essas interações que geram especializações regionais, formando as
redes, sejam elas de serviços, comércio, comunicação, transporte, entre
outras.

Algumas considerações

Ao contextualizar a teoria de Christaller (1966), frente as críticas de


Santos (1996) e Corrêa (1989), verificamos uma contribuição no sentido de
compreender a existência de um centro distribuidor e um hinterland na rede
urbana. Percebemos uma hierarquia urbana flexível, em que centros de
diversos tamanhos adquiriram a possibilidade de manter inter-relações uns
com os outros, mediante as facilidades de Meio técnico científico
informacional, no território brasileiro, após 1970.

Sabemos que as hierarquias não deixam de existir, visto que muitos


centros ainda têm a necessidade de adquirir determinados serviços de que

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não dispõem. Mas há toda possibilidade desse fluxo buscar o mesmo serviço
em centros maiores, mais equipados e, por vezes, mais distantes.

Exemplos ligados aos serviços de saúde, educação, transportes


interestaduais e comércio, servem para enriquecer o tema da flexibilidade de
uma rede urbana, afinal, a melhoria nas informações, telecomunicações,
transporte e circulação, “quebrou” as barreiras espaciais entre os centros
urbanos, “encurtando” a distância e “contraindo” o tempo.

Assim, na hierarquia urbana, que se tornou flexível diante das


mudanças no espaço geográfico, em centros de vários tamanhos, localização
e funções, passa existir uma complementariedade entre si, permitindo que os
pequenos centros de uma teia urbana utilizem os serviços de cidades
localizadas fora da área de polarização de seu centro principal.

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