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FORTALEZA - CEARÁ
2022
JOSÉ JEOVÁ MOURÃO NETTO
FORTALEZA - CEARÁ
2022
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação
REPERCUSSÕES DO PODER NA DIMENSÃO POLÍTICA DO CUIDADO
DA(O) ENFERMEIRA(O), NO PROCESSO DE TRABALHO E NA EXPRESSÃO
DO HABITUS PROFISSIONAL
BANCA EXAMINADORA
____________________________________________ __________________________________
Prof.ª Drª. Lucilane Maria Sales da Silva Prof.ª Drª. Maira Buss Thofehrn
Presidente e orientadora
Universidade Federal de Pelotas - UFPEL
Universidade Estadual do Ceará – UECE
__________________________________________ __________________________________
Prof.ª Drª. Saiwori de Jesus Silva Bezerra dos Anjos Prof. Dr. Aluísio Ferreira de Lima
Universidade Estadual do Ceará - UECE Universidade Federal do Ceará -UFC
__________________________________
Prof.ª Dr ª. Karla Corrêa Lima Miranda
Universidade Estadual do Ceará - UECE
A todos os profissionais de enfermagem, em
especial, às enfermeiras e enfermeiros.
AGRADECIMENTOS
A Deus, por ter me dado a permissão de chegar aqui e por toda força e sabedoria concedida. A
Ele, toda honra e glória!
A Nossa Senhora, pela proteção e intercessão por todas as minhas necessidades.
A minha esposa Natália Frota Goyanna, companheira nos sonhos e nas lutas para concretizá-los,
sem a qual nada disso seria possível. O meu muito obrigado! Amo você!
Aos meus filhos, Mateus Frota Goyanna Mourão e Levi Frota Goyanna Mourão, por me
inspirarem a ser mais forte e a querer sempre ser um ser humano melhor.
Aos meus pais Maria Mourão Martins e José Valdir Mourão, pelo exemplo de vida e pelo amor
dedicado a mim. A vocês, que muitas vezes renunciaram os seus sonhos para que eu pudesse
realizar os meus, partilho a alegria deste momento.
Aos meus irmãos, Paulo Wérlon Mourão e Roberto Itallo Mourão, pela união, incentivo e apoio.
A minha sogra, Maria do Socorro Frota, pela atenção, carinho e disponibilidade em me ajudar
sempre que eu, minha esposa e meus filhos precisamos. Tenha certeza que, grande parte dessa
conquista, devo a você. O meu muito obrigado!
A todos os colegas de turma do doutorado, em especial aos amigos Edson Batista dos Santos,
Eduardo Carvalho de Sousa, Francisco Gilberto Fernandes Pereira e Francisco Rafael Ribeiro
Soares, que muitas vezes foram o apoio, o alento e a alegria, sentimentos e companheirismo que
ganham um outro significado quando se está longe de seu lar. O meu muito obrigado!
Agradecer, em especial, também, as colegas de turma e amigas: Antônia Regynara Moreira
Rodrigues, que me acolheu por anos em seu lar, configurando um apoio essencial para a
consecução do processo de doutoramento, além da convivência sempre divertida, e Maria da
Conceição Coelho Brito, essa amiga, companheira de turma, de orientadora e das viagens entre
Sobral e Fortaleza, nas quais pudemos chorar, sorrir, refletir e discutir sobre as questões
emergidas do doutorado. Às duas, o meu muitíssimo obrigado!
Aos irmãos da Equipe Nossa Senhora Desatadora dos Nós, pelos momentos partilhados,
incentivo, confiança e orações para a conclusão desse processo.
Aos profissionais que participaram da pesquisa, que me atenderam prontamente e colaboraram
durante a coleta dos dados. Obrigado!
À Professora Drª. Lucilane Maria Sales da Silva, pela orientação, atenção e paciência durante
toda essa caminhada. Obrigado pela sensibilidade para com o objeto, pois tenho certeza que
poucos pesquisadores se atreveriam a explorá-lo.
Ao Professor Dr. Leonardo Damasceno de Sá, pela coorientação e pelo apoio em toda a
construção deste estudo. As suas considerações foram determinantes para a execução da
pesquisa. Muito obrigado!
Aos professores Drª. Maira Buss Thofehrn, Dr. Aluísio Ferreira de Lima, Drª. Saiwori de Jesus
Silva Bezerra dos Anjos e Drª. Karla Corrêa Lima Miranda, Drª. Antônia Regynara Moreira
Rodrigues e Drª. Janiery Lima de Araújo por aceitarem participar da banca de defesa desta tese e
pelas valorosas contribuições.
Ao Programa de Pós-graduação em Cuidados Clínicos em Enfermagem e Saúde, da
Universidade Estadual do Ceará, pela oportunidade e a todos os professores pelos ensinamentos
e por contribuírem para a minha formação e realização deste projeto. Tenho orgulho de ter sido
produto dessa Universidade que tem consciência de sua responsabilidade para com a sociedade.
Aos meus professores da Universidade Estadual Vale do Acaraú, por todos os ensinamentos que,
até hoje, subsidiam todas as minhas ações como enfermeiro. O meu eterno agradecimento!
Aos amigos do Hospital Regional Norte e do Hospital Municipal de Cariré, o meu muito
obrigado pela disponibilidade em realizar as trocas e pela compreensão com as diversas situações
em que precisei de apoio no percurso do doutorado.
É preciso falar daquilo que nos obriga ao silêncio
(Clarice Lispector)
RESUMO
No processo de produção da saúde, muitos são os agentes envolvidos no cuidar, tecendo-se entre
eles uma imbricada rede de relações de poder, o que cria uma atmosfera invisível, que se
configura como a dimensão política do cuidado, podendo influenciar o processo de trabalho. No
contexto do trabalho da (o) enfermeira (o), observamos, em algumas situações e cenários, a
fragilidade política dessa profissão, evidenciada pela limitação: da autonomia, do pensamento
crítico ou da capacidade de mobilização coletiva. O estudo teve como objetivo geral: analisar
como a dimensão política do cuidado, no processo de trabalho da(o) enfermeira(o), influencia ou
é influenciada pelas diferentes formas de poder emergidas da interação deste com a equipe de
saúde, a ponto de definir seu habitus; e como objetivos específicos: apreender a dimensão
política do cuidado na prática profissional da(o) enfermeira(o) e sua influência na conformação
do habitus desse profissional; identificar as estratégias utilizadas pelas(os) enfermeiras(os) junto
aos demais membros da equipe de saúde que concorrem, ou não, para o aumento de seu capital
simbólico e social; verificar as posições assumidas pelas(os) enfermeiras(os) em articulação com
os demais membros da equipe multiprofissional e sua relação com os poderes estabelecidos;
evidenciar as relações de poder e dominação estabelecidas entre os agentes no campo da saúde e
como estas influenciam a dimensão política do cuidado de enfermagem. Trata-se de um estudo
de campo, de natureza qualitativa, ocorrido em um Hospital Terciário e em Unidades Básicas de
Saúde, em Sobral, Ceará, Brasil. A coleta ocorreu mediante entrevista semiestruturada e
observação não participante. Foram ouvidos 33 profissionais, entre enfermeiras(os), médicas(os),
odontólogas(os) e fisioterapeutas e realizadas 43 horas de observação em duas Unidades Básicas
de Saúde e no Serviço de Emergência. Os achados foram categorizados e analisados a partir da
Teoria do Habitus de Pierre Bourdieu. O resultados estão constituídos em quatro categorias:
caracterização dos participantes; o campo da saúde e as distintas interações de seus agentes;
mobilização dos capitais: o que tem valor no campo da saúde?; dimensão política do cuidado:
dinâmica do poder e sua influência sobre o habitus e a prática do enfermeiro e da enfermeira.
Observou-se que enfermeiros, médicos, fisioterapeutas e odontólogos desenvolvem práticas
muito similares, sendo difícil a definição de um núcleo de atividades privativas. Os (as)
enfermeiros (as) apresentam limitada capacidade de relatar suas atividades. Identificamos como
elementos que interferem na constituição do habitus profissional do (a) enfermeiro (a) a
legislação, o conhecimento e a dinâmica institucional. As relações de poder interferiram na
prática desse profissional, seja limitando a fala ou pela imposição de receios. O trabalho desse
profissional envolve gerenciamento e prestação de cuidados diretos, que podem ser clínicos ou
educativos. Muitos foram os capitais encontrados no campo e que interferem na dimensão
política, no trabalho da(o) enfermeira(o): o conhecimento, as formas de se comunicar, a postura,
a posse de bens materiais, o gênero, o cargo, a experiência, a categoria profissional, o tempo de
serviço, a idade, o reconhecimento, o prestígio, as relações de amizade, o acesso a determinados
pessoas e grupos. Ao final, podemos considerar que o trabalho em saúde, de fato, envolve e é
influenciando por relações de poder que conformam a dimensão política do cuidado. Esta
dimensão influencia no processo de trabalho da(o) enfermeira(o) e dos demais profissionais,
sendo os elementos mais fortemente relacionados com a aquisição de capital simbólico o
conhecimento teórico e prático e as formas de se comunicar. É necessário que a enfermagem
conheça mais sobre esse aspecto do cuidado, para que possam se sobressair nessa dinâmica,
podendo ofertar um melhor cuidado e aumentar sua visibilidade e valor diante da sociedade.
In the health production process, there are many agents involved in care, building a complex
network of power relationships between them, which creates an invisible atmosphere, which is
configured as the political dimension of care, which can influence work in health. In the context
of the nurse's work, we observed, in some situations and scenarios, the political fragility of this
profession, evidenced by the limitation: of autonomy, critical thinking or the capacity for
collective mobilization. The study aimed to analyze how the political dimension of care is
influenced by different forms of power, to the point of defining the professional habitus. We
defend the following thesis: there is a political dimension of care that significantly interferes in
the work process. This is a field study, of a qualitative nature, carried out in a large hospital and
in Basic Health Units, in Sobral, Ceará, Brazil. Data collection took place through semi-
structured interviews and non-participant observation. Thirty-three professionals were
interviewed, including nurses, doctors, dentists and physiotherapists, and 43 hours of observation
were carried out in two Basic Health Units and in the Emergency Service. The findings were
categorized and analyzed based on Pierre Bourdieu's Habitus Theory. The results are constituted
in four categories: characterization of the participants; the field of health and the different
interactions of its agents; capital mobilization: what is valuable in the health field?; political
dimension of care: dynamics of power and its influence on the habitus and practice of nurses. It
was observed that nurses, doctors, physiotherapists and dentists develop very similar practices,
making it difficult to define a core of private activities. Nurses have limited ability to report their
activities. We identified legislation, knowledge and institutional dynamics as elements that
interfere in the constitution of the nurse's professional habitus. Power relations interfered in this
professional's practice, either by limiting speech or imposing fears. The work of this professional
involves management and provision of direct care, which can be clinical or educational. There
were many capitals found in the field that interfere in the political dimension, in the work of
nurses: knowledge, ways of communicating, posture, possession of material goods, gender,
position, experience, professional category, length of service, age, recognition, prestige,
friendships, access to certain people and groups. In the end, we can consider that health work, in
fact, involves and is influenced by power relations that shape the political dimension of care.
This dimension influences the work process of nurses and other professionals, and the elements
most strongly related to the acquisition of symbolic capital are theoretical and practical
knowledge and ways of communicating. It is necessary for nursing to know more about this
aspect of care, so that they can excel in this dynamic, being able to offer better care and increase
its visibility and value in society.
AH Atenção Hospitalar
APS Atenção Primária à Saúde
CAPS Centro de Atenção Psicossocial
CEP Comitê de Ética em Pesquisa
CLT Consolidação das Leis Trabalhistas
COFEN Conselho Federal de Enfermagem
COREN Conselho Regional de Enfermagem
ESEL Escore de Enfermagem Linear
ESF Estratégia Saúde da Família
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICN International Council of Nurses
NAI Núcleo de Atividades Identitárias
NANDA North American Nursing Diagnosis Association
NIC Nursing International Classification
NOC Nursing Outcomes Classification
ODS Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
OPAS Organização Panamericana de Saúde
OS Organização Social
SERNECE Sindicato dos Enfermeiros da Região Norte do Estado do Ceará
SUS Sistema Único de Saúde
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UECE Universidade Estadual do Ceará
UVA Universidade Estadual Vale do Acaraú
SUMÁRIO
1
Optamos pelo uso da expressão usuários por considerá-la um contraponto a ideia de paciente, fortemente
relacionada ao modelo biomédico de prestação do cuidado, e alternativa mais adequada frente à expressão cliente,
que embora avance no que concerne ao protagonismo da pessoa, família ou comunidade, foco do cuidado, ainda
pode guardar uma conotação mercantilista e assistencialista da prestação do cuidado. Nesse contexto, usuário parece
mais adequado por possibilitar uma relação mais aproximada a noção de integralidade e cidadania.
17
2
A partir do olhar de Pierre Bourdieu, o habitus é considerado a força invisível que orienta as práticas nos diferentes
contextos, inclusive as práticas profissionais, tornando tácita uma dinâmica de trabalho que é obedecida e
reconhecida por todos que convivem e compartilham desse campo.
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que trabalham tanto, mas não são percebidos; pessoas que conhecem tanto sobre o Sistema
Único de Saúde (SUS), mas não são convidados a serem ouvidos na construção das soluções de
suas problemáticas.
No entanto, em alguns estágios, nos deparávamos com algumas enfermeiras que
conseguiam romper a dinâmica hegemônica dos serviços, de pouca proatividade dos
profissionais de enfermagem, e apresentavam-se como agentes de transformação, como
lideranças que tinham conhecimento, eram ouvidas, respeitadas e tinham suas opiniões
acolhidas. As observando, percebia que os usuários que estavam sob os cuidados dessas
enfermeiras mais politizadas, pois eram críticas e provocadoras de mudanças, tinham suas
necessidades de cuidados mais rapidamente e eficazmente atendidas.
Durante a graduação, observar essas enfermeiras me ajudou a vislumbrar qual o tipo
de enfermeira(o) eu desejaria ser e a me perguntar: quais comportamentos deve ter um
enfermeiro para provocar transformações nos serviços? Por que alguns enfermeiras(os) são mais
ouvidos do que outros?
Nessa trajetória de 13 anos como enfermeiro, sempre atuando na prestação de
cuidados diretos, seja na Atenção Primária à Saúde (APS), Centro de Atenção Psicossocial
(CAPS) ou Hospital, tive a oportunidade de tentar ser esse enfermeiro crítico e transformador.
Entendi que a politização dos profissionais poderia nos ajudar a conquistar mais espaço diante da
sociedade e obter melhores condições de trabalho. Assim, com um grupo de colegas da
Estratégia Saúde da Família (ESF) de Sobral, em 2013, fundamos o Sindicato dos Enfermeiros
da Região Norte do Estado do Ceará (SERNECE), o primeiro da Região dedicado aos
enfermeiros.
O SERNECE tinha o intuito de organizar a categoria em busca de melhorias das
condições de trabalho, principalmente, por meio da tomada de consciência das(os)
enfermeiras(os) da ESF, na tentativa de romper com a alienação imposta pelo processo de
trabalho. No entanto, a partir dessa vivência, pude perceber como a categoria tinha uma
resistência à organização política.
Alguns anos depois, em 2017, também compus uma chapa para concorrer à mesa do
Conselho Regional de Enfermagem (Coren) do Ceará. Após vencermos a eleição, tentamos pôr
em prática um dos propósitos da equipe: organizar politicamente a categoria. Assim, durante os
anos em que estive no conselho, realizamos diversos encontros com os coordenadores e
23
2 PRESSUPOSTOS
3 OBJETIVOS
3.1 Geral
Analisar a influência entre as formas de poder, oriundas da interação entre a equipe de saúde, e a
dimensão política do cuidado no processo de trabalho da(o) enfermeira(o) e na conformação do
seu habitus profissional.
3.2 Específicos
4 REVISÃO DA LITERATURA
seres humanos (MELO; SANTOS; LEAL, 2015). Embora o cuidado em saúde não se caracterize
em uma especificidade exclusiva do trabalho da enfermagem, este se distingue por suas
singularidades em relação ao trabalho dos demais profissionais da saúde, a saber o fato de estes
desenvolverem, simultaneamente, atividades de gestão e de prestação de cuidados (LEAL;
MELO, 2018).
O trabalho em saúde mantém a especificidade de constantemente se estar em contato
com o outro: seja o usuário, seus familiares ou outros profissionais. Neste sentido, ao se fazer
saúde, constantemente, mantém-se contato com pessoas, estabelecendo relações, construindo
acordos e divergindo, ou seja, constantemente exercendo poder e sendo influenciado por ele,
pois, como lembra Bourdieu (1989), as relações de comunicação são sempre relações de poder,
reforçando o que já tínhamos sinalizado anteriormente: essa teia imbricada, complexa e
permanente de relações de poder constitui a dimensão política do processo de cuidar.
É nessa dimensão do cuidado que também deve atuar a(o) enfermeira(o) e os demais
membros da equipe de enfermagem, devendo, para isso, estes conhecerem e reconhecerem este
locus como espaço desafiador para atuação profissional, mas também rico de potencialidades que
podem alçar a enfermagem para uma nova representação diante da sociedade e dos demais
profissionais que integram o processo de trabalho em saúde.
Ao executar o seu trabalho nos serviços de saúde, que compreende coordenar o
processo de trabalho dos técnicos e auxiliares de enfermagem, direcionar o processo de trabalho
dos outros profissionais e trabalhadores da saúde, organizar o ambiente e também executar
atividades técnico-assistenciais, a(o) enfermeira(o) continuamente leva em consideração as
necessidades da organização e as necessidades dos usuários desses serviços (LEAL; MELO,
2018).
Diante do cenário descrito, é correto afirmar que a(o) enfermeira(o) encontra-se no
centro dessa teia de relações, visto o lugar que ocupa no campo da saúde, sofrendo influências
emanadas de diversas fontes (gestão, equipe multiprofissional, usuário e cuidadores) e em
diferentes intensidades, de forma que sem estar politizado (reflexivo, crítico e capaz de
transformar a realidade), dificilmente conseguirá ocupar a posição e a representação dentro do
processo de trabalho em saúde e na sociedade, almejada e merecida.
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enfermagem para terceiros. A enfermagem possui funções orientadas a resultados que devem
ser articuladas pelas características interpessoais e sociais da enfermagem, e os resultados da
enfermagem podem ser expressos como formas de cuidado com a intenção de progressão para a
saúde e o bem-estar positivos.
O International Council of Nurses (ICN) refere que a enfermagem expressa sua
prática por meio da oferta do cuidado autônomo e colaborativo de indivíduos de todas as idades,
famílias, grupos e comunidades, adoecidos ou não, e em todos os ambientes, promovendo saúde,
prevenindo doenças, tratando pessoas adoecidas, deficientes ou no percurso final da vida
(INTERNATIONAL COUNCIL OF NURSES, 2002).
Essas definições não apresentam atributos objetivos e claros que permitam
distinguir o trabalho ou o cuidado de enfermagem das demais profissões. Talvez por isso,
muitas(os) enfermeiras(os) não conseguem expressar uma definição de enfermagem (ALVES et
al., 2012), não conseguem sistematizar e expressar quais são suas atribuições (FERNANDES et
al., 2018), bem como também não (re)conhecem seu próprio processo de trabalho
(MASCARENHAS et al., 2019).
Estudos têm apontado que já é fato que se formam enfermeiras que não
compreendem seu trabalho, fato que, somado ao contexto de crescente precarização do trabalho,
pode aprofundar a frustração e a pouca identidade com a profissão, bem como a alienação dessas
trabalhadoras (MASCARENHAS et al., 2019).
Diante desse contexto, Scott (2013) alerta que é preciso superar as definições vagas
na enfermagem, por não trazerem os elementos que permitem diferenciar o que as(os)
enfermeiras(os) fazem, dos outros profissionais, pois o papel da enfermagem precisa
urgentemente de definição, o que também pode contribuir para melhor caracterizar sua
identidade profissional (OGUISSO; FREITAS, 2016).
Um fazer pouco delimitado incentiva o distanciamento da essência da profissão, já
que, muitas vezes, por falta dessa delimitação, a(o) enfermeira(o) assume atribuições de outros
profissionais, o que lhe gera a sensação de pertencer, inclusive, a essas categorias, repercutindo
em demandas excessivas de atividades, se distanciando do cuidado direto e, por consequência,
fragilizando sua identidade profissional (FERNANDES et al., 2018).
Uma definição clara e que consiga trazer atributos que permitam distinguir a
enfermagem e seu cuidado dos de outros profissionais é fundamental, pois como vamos ensinar
34
o cuidado de enfermagem se não o conhecemos? Como a sociedade vai poder nos distinguir?
Como nós poderemos desenvolver uma identidade profissional clara e consistente sem saber o
que fazemos? (CARVALHO, 2009).
Diante do até aqui discutido, reconhecendo que este tema é profícuo e carece de
discussões mais densas para que avancemos em definições mais contundentes de conceitos
estruturantes para a enfermagem, embora não tenhamos encontrado uma definição que, por nós,
possa representar a enfermagem em sua totalidade e complexidade, existem considerações
sobre o cuidado de enfermagem que julgamos pertinentes.
Sobre o cuidado de enfermagem, Waldow (1998) pondera que, para sua realização
efetiva, afetiva e contextual, comportamentos e atitudes de cuidado são manifestados, todos
conjuntamente com as ações, calcadas em conhecimento, pois o processo de cuidar não pode se
dar isoladamente, pois trata-se de uma ação e de um processo interativo, caso contrário, o
cuidado de enfermagem não ocorre.
Reiterando o já trazido anteriormente por Boff (2014) e Noddings (2003), quando
apontam ser necessário ao cuidado, respectivamente, preocupação e ação, podemos concluir
que três elementos são essenciais para a consecução do cuidado de enfermagem: preocupação,
ação e interação, uma vez que, indiscutivelmente, espera-se que o cuidado de enfermagem
envolva ação e seja permeado pelo zelo e preocupação. No entanto, é imprescindível, para sua
efetivação, que haja interação entre quem cuida e quem é cuidado.
O cuidado de enfermagem envolve os comportamentos e atitudes expressas nas
ações, asseguradas por lei, pertinentes aos diferentes membros da equipe de enfermagem, de
forma que estas ações têm o objetivo de favorecer as potencialidades das pessoas no sentido de
manter ou melhorar a condição humana no processo de viver e morrer (WALDOW, 2012).
Entretanto, nem tudo o que faz o profissional de enfermagem é cuidado, em seu real sentido, pois
ações terapêuticas, intervenções, procedimentos, técnicas, essa vasta lista de tarefas denominadas
tradicionalmente cuidados de enfermagem, se não forem acompanhadas de comportamentos e
atitudes de cuidado, envolvimento e comprometimento não poderão ser considerados cuidados
de enfermagem, pois o que distingue o cuidar não é o que se faz, mas como se faz (WALDOW,
2015).
Em favor da necessidade da interação para a efetivação desse cuidado citamos a co-
participação, o respeito à autonomia e a necessidade de emancipação da pessoa a qual se cuida,
35
elementos essenciais para a produção do cuidado de enfermagem que, sem a interação, não
passarão de intencionalidade. Disto isto, nos parece incoerente a ideia de cuidado de
enfermagem indireto, como tem sido abordada por alguns autores e até mesmo na legislação de
enfermagem (COFEN, 2017).
Partindo do pressuposto de que o cuidado deve ser realizado de forma dialogada
com o usuário e sua família, é importante considerar que a interação também possa favorecer ao
desenvolvimento da enfermagem, uma vez que permitiria a sociedade conhecer melhor seu
trabalho, valorizando seu papel, aumentando sua visibilidade e ajudando a construir uma nova
identidade social da profissão (NOGUEIRA, 2010).
4.3 O entendimento sobre poder e política adotados no estudo
enxerga o mundo como esse espaço de permanente correlação de forças, mas nunca de
confrontos violentos.
Por política, a autora entende ser a ação do homem no espaço público, a qual se
apresenta como relação do homem para com os outros, intrinsecamente marcada por relações de
poder que se constituem a partir do discurso e da ação, do falar e do agir, tratando-se a política,
sobretudo, da convivência entre diferentes (ARENDT, 2002, 2007).
Hannah Arendt (2007) defende que a atuação política está estruturada na ação e no
discurso, de forma indissociável, revelando em sua teoria política a potência da relação entre o
agir e o falar. Para a autora, “o homem político é o homem que age e fala, inseparavelmente”
(ARENDT, 2007).
A ação e o discurso são os modos pelos quais os seres humanos se manifestam uns
aos outros, configurando o meio pelo qual se existe no mundo (ARENDT, 2007) e por esses
modos, também desenham a imbricada rede de influências, ou relações de poder, que,
conformadas, constituem a política.
Consonante ao pensamento de Arendt, Bourdieu (1989) infere que as relações de
comunicação são sempre relações de poder, de modo inseparável, de forma que o poder das
palavras, poder de manter a ordem ou de a subverter, repousa na crença da legitimidade dessas
palavras e naquele que as pronuncia.
Essa interface no pensamento de Bourdieu e Arendt, acreditamos, resulta da
influência de Max Weber sobre ambos. No entanto, apesar desse ponto em comum, Bourdieu se
distancia de Arendt por buscar uma compreensão de estilo mais sociológica sobre poder e
dominação, enquanto Arendt se conecta mais às preocupações da filosofia política em pensar
novos horizontes de sentido para o humano.
A partir do pensamento de Pierre Bourdieu, o discurso permitiria o acúmulo de poder
simbólico a partir da expressão do capital cultural, formado pelo conjunto de conhecimentos,
habilidades, informações e a forma de se expressar e apresentar-se em público (THIRY-
CHERQUES, 2006).
Sem o discurso, a ação deixaria de ser ação, pois não haveria ator; e o ator, o agente
do ato, só é possível se for, ao mesmo tempo, o autor das palavras. A ação que ele inicia é
humanamente revelada por meio das palavras e, embora o ato possa ser percebido em sua
manifestação física bruta, sem acompanhamento verbal, só se torna relevante por meio da
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palavra falada na qual o autor se identifica, anuncia o que fez, faz e pretende fazer, pois a esfera
política resulta diretamente da ação em conjunto de palavras e atos (ARENDT, 2007).
Para Arendt, o discurso presente na política tem como fim a persuasão do outro, seja
para que sua opinião ganhe a maioria das opiniões, seja para que o autor do discurso venha a ser
admirado pelo público. O discurso persuasivo intenta levar alguém a crer em alguma coisa ou
aceitar fazer algo e comporta dois aspectos principais: o argumentativo, por meio da razão; e o
oratório, por meio dos afetos e sentimentos (ARENDT, 2007; TELES, 2013).
Sobre as relações de poder, Bourdieu está em consonância com Giddens (2018),
quando este último refere serem essas relações regradas de autonomia e dependência,
apresentando sempre uma mão dupla, ou seja, por mais subordinado que seja um dos agentes
nessa relação, a própria relação sempre lhe concede algum grau de poder sobre o outro.
Sobre o poder, assim como a política, também se relacionam uma gama de definições
e concepções. Giddens (2018), ao apontar a dificuldade de consenso entre os autores sobre o que
seria poder, ora o tratando como capacidade transformadora, ora como dominação, se posiciona
ao considerar poder como “capacidade transformadora decorrente das interações sociais, de
forma que essa capacidade está atrelada às tentativas dos agentes de fazer com que os outros se
conformem aos seus desejos”.
Tal pensamento dialoga com a concepção de Bourdieu sobre poder, que em sua
teoria o trata como simbólico. Bourdieu (1989) concebe o poder simbólico como o poder de
construção da realidade que tende a estabelecer uma ordem, correspondendo a um poder
invisível e que alcança os mesmos efeitos que se alcançaria impingindo força física ou
econômica.
Em suma, Hannah Arendt desenha um cenário onde os atores que nele convivem
estão em permanente correlação de forças (relações de poder) e Pierre Bourdieu dá vida a esses
atores, ao explorar e clarificar suas dinâmicas, elucidando como se movem, por que se movem e
pelo que disputam.
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5 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO
Pierre Bourdieu nasceu em agosto de 1930 em Béarn, uma pequena vila em uma
região rural do sudoeste da França, onde ao cursar seus estudos no ensino fundamental, tinha
como colegas os filhos de operários, camponeses e de pequenos comerciantes (WACQUANT,
2002).
Após concluir o ensino médio, Bourdieu logo ingressou na prestigiada École
Normale Supérieure, onde cursou filosofia, concluindo seus estudos em 1954. Um ano depois,
foi convocado pelo exército francês e enviado para servir na Argélia, em decorrência de sua
indisciplina para com o serviço militar (KOZICK; COELHO; ALMEIDA, 2013).
Essa vivência na Argélia foi um elemento definidor para a sua formação intelectual,
pois a exposição direta às horríveis realidades do domínio imperial e do estado de guerra fizeram
com que Bourdieu migrasse da filosofia para a ciência social, assim, a imersão de Bourdieu em
uma sociedade aflita, apanhada nas convulsões do colonialismo decadente e caótica lhe
permitiram apreensões do campo que foram geradoras de inquietações que alimentaram a
construção de sua teoria social (WACQUANT, 2006).
Em 1961, retorna a França, onde em 1964 ingressa como docente na École de Hautes
Études en Sciences Sociales. Durante as décadas de 60, 70 e 80 continuou publicando sobre os
mais diversos assuntos, desenvolvendo suas categorias de análise e seu método de abordagem
40
Em seu método investigativo, ele verifica que o trabalho científico não é uma
operação linear, pois ao longo da pesquisa, a problemática pode ser alterada, a hipótese
modificada, as variáveis reconsideradas e que o objetivo da investigação é conhecer as
estruturas, tanto no que elas determinam as relações internas a um segmento do social, quanto no
que estas estruturas são determinadas por estas relações, assim, o método consiste em estudar o
campo mediante a aplicação dos conceitos pré-formados, de modo a desvelar os objetos sociais,
o conjunto de relações que explicam a lógica interna do campo (THIRY-CHERQUES, 2006).
Os agentes sociais, em disputa, aceitam que vale a pena se manter na disputa e, sobre isso,
concordam. O capital é o que alimenta essas disputas. Dentre os capitais pelos quais se luta,
social, cultural, econômico, o capital simbólico tem uma representação central, pois este é o que
faz os outros nos reconhecerem como importantes (prestígio, reconhecimento, status),
constituindo-se esse capital em um bem pessoal, subjetivo, que somente existe pelo
reconhecimento que os outros agentes do campo dão a ele, pelo valor social que ele tem. É esse
capital que “nos livra da insignificância, como ausência de importância e de sentido”
(BOURDIEU, 2001a, p. 296; SOUZA, 2014).
poder nos campos. À luz do pensamento de Bourdieu, é possível superar as dicotomias entre
micro e macro, subjetivo e objetivo, ação e estrutura, para pensar estratégias microssociológicas
de pesquisa que levam em consideração as propriedades estruturais dos mundos sociais.
6 O CAMINHO METODOLÓGICO
6. 3. 1 Entrevistas
do instrumento ocorreu com uma participante, no qual foi observada a necessidade de adequação
para que a entrevista fosse menos prolixa, assim, foram unificadas perguntas, evitando
paralelismos e repetições.
Em decorrência das mudanças ocasionadas pela pandemia de COVID-19, ocorreram
atrasos na etapa de coleta e algumas entrevistas foram realizadas de forma remota, por meio da
ferramenta Google Meet. Todas as entrevistas tiveram seu áudio gravado, para posterior
transcrição.
nenhuma forma do contexto social, para isso sendo necessária a utilização de recurso de
gravação de som e imagem (GOLDEN, 1958).
No contexto hospitalar, a observação foi realizada no Serviço de Urgência e
Emergência, nos períodos matutino e vespertino. Cada observação durou em média 2h em um
total de 19h. Na APS, a observação foi realizada em 2 UBS da sede do município, escolhidas por
apresentarem mais de uma equipe existente na mesma UBS e por se configurarem em contextos
extremos na vulnerabilidade da população: uma está localizada em área muito vulnerável e a
outra em área de menor vulnerabilidade. As observações duraram em média 2:30 min. e
corresponderam um total de 23h e realizadas mediante um roteiro de observação (APÊNDICE
D).
O processo de pesquisa foi guiado pelas etapas propostas por Pierre Bourdieu para o
processo investigativo em sociologia, sistematizadas por Thiry-Cherques (2006). Todas as quatro
categorias, a partir das quais foram organizadas o material empírico e a análise, foram
determinadas a priori (ARANALDE, 2009), a partir dos objetivos e pressupostos da pesquisa, a
saber: caracterização dos participantes; o campo da saúde e as distintas interações de seus
agentes: o processo de trabalho de enfermeiras(os), fisioterapeutas, médicos e odontólogos;
mobilização dos capitais: o que tem valor no campo da saúde?; dimensão política do cuidado:
dinâmica do poder e sua influência sobre o habitus e a prática do enfermeiro e da enfermeira.
Observação e descrição das práticas, como ocorrem, em que ponto são ou não
influenciadas pelas relações de poder e dominação.
Identificação, por meio das entrevistas, das estruturas mentais, dos pensamentos
estruturados, do que acham que podem ou não podem, pensamentos que limitam ou restringem
comportamentos.
Descrição das relações, dos fenômenos, dos capitais. Identificação das relações de
poder e dominação e a tessitura de uma explicação para esses fenômenos, a partir do
entendimento da dinâmica do campo.
contratação regida pela CLT. Assim, a instituição adere ao movimento de terceirização na saúde,
fruto da repercussão do modelo capitalista de desenvolvimento, embora exista o vínculo não
precarizado, é importante ratificar que, como equipamento do SUS, estes profissionais deveriam
dispor de vínculo estatutário, selecionados por meio de concursos públicos.
Guimarães Júnior e Ferreira (2020), ao analisarem as recentes mudanças das
legislações trabalhistas e seu impacto no campo da saúde, inferem que o cenário de
subcontratação irrestrita, incentivado pelas mudanças na legislação, tende a catalisar os efeitos
deletérios da terceirização para a classe trabalhadora, cujos desdobramentos ameaçam a garantia
de direitos no trabalho e os mecanismos de proteção social e resistência. Assim, o tipo de
vínculo, ao passo que repercute na proteção social, também pode configurar um elemento que
desempenha papel nas tensões, conflitos e alianças no campo da saúde, dado que vínculos mais
fortes permitem aos profissionais determinados posicionamentos, em comparação aos de vínculo
precarizado, por terem mais receio da perda desse vínculo.
maioria, de usuários com COVID-19, uma vez ser esse hospital a referência para esse
atendimento na região.
No intuito de melhor compreender a dinâmica do trabalho no campo e as relações
estabelecidas entre os participantes, o capítulo seguinte desvela as peculiaridades, aproximações
e distanciamentos das atividades laborais de enfermeiras(os), médicos, dentistas e
fisioterapeutas.
mobilizações. A gente ajuda a evitar que o paciente evolua para intubação e mobilização
(FIS-H-2).
Realizamos abordagem tanto de avaliação como de assistência, existindo funções
privativas e compartilhadas. Na avaliação, vamos avaliar a parte neurológica, pulmonar,
cardiológica e motora do paciente, visando uma função de manutenção da vida e já
pensando em qualidade de vida caso ele venha a sair do hospital. No sistema
respiratório, restaurar uma via área que não esteja pérvia, então tenho que ter ausculta,
tosse eficaz, ver se precisa de manobras, de aspiração, preciso ver eletrólitos, valores
gasométricos, se tem contraindicações para uma VNI (ventilação mecânica não
invasiva), se tem trauma de face, se tem sensório comprometido (FIS-H-3).
Durante o plantão, fazemos o exame físico completo, a evolução clínica completa,
conduta farmacológica, tomar decisões quanto questões invasivas e procedimentos
invasivos como reanimação, como hemodiálise, acesso central (MED-H-1).
O médico faz exame físico, história clínica, mas tem um papel mais de diagnóstico e
tratamento. O médico tem uma função mais objetiva de interpretar dados, dar
diagnóstico e tratamento (MED-H-2).
Além de outras coisas, o médico tem o foco no diagnostico nosológico e prescrição
medicamentosa (...). Médico e enfermeiro têm um trabalho muito complementar (MED-
H-3).
Fazemos evolução de enfermagem, ofertamos assistência aos que estão mais graves,
realizamos procedimentos de enfermagem, passagens de sonda, coletas de gasometria,
supervisiona o trabalho dos técnicos, tenta agilizar o máximo para o paciente receber
alta logo, tem as questões burocráticas que prendem muito a gente, prepara para
exames, marca exames, preenche os termos de exames, atualiza a passagem de plantão,
faz curativos, checagem do carrinho de parada (ENF-H-2).
A gente checa carrinho de parada, curativos, examina, faz evolução, atualiza
instrumentos de invasivos, (...) faz transferências de paciente, escalas de Braden e Esel.
A gente também é gestor dos materiais (ENF-H-10).
influência no processo de trabalho desses profissionais. Daneliu et al. (2019) reforça essa ideia,
ao estudar a dinâmica de trabalho no ambiente hospitalar, concluindo que o trabalho em saúde é
pautado pela inter-relação entre os profissionais, sendo o trabalho em equipe promotor de
melhores desempenhos ao nível hospitalar (ERVIN et al., 2018).
Durante as observações, ficam evidentes que o trabalho em saúde ocorre de uma
forma colaborativa, mas em grande parte, o que foi observado, é que a maioria dos profissionais
ainda atua de uma forma individualizada, sem muitas trocas e com limitada
interprofissionalidade. Percebeu-se uma interação mais frequente entre enfermeiras(os) e
técnicos de enfermagem. Em algumas intervenções, sobretudo as que demandam esforços
físicos, os fisioterapeutas solicitam apoio da equipe de enfermagem, configurando uma interação
mais por justaposição do que interprofissional. De forma geral, os profissionais parecem
conviver de uma forma funcional.
No contexto da Atenção Primária à Saúde, as falas também revelam que há, quando
se compara ao contexto hospitalar, ainda menos distinção entre as práticas de alguns
profissionais, o que pode ser percebido a seguir.
(...) a gente faz muita coisa que não é da gente. (...) então renovo receita de todos os
programas, saúde mental, hanseníase, tuberculose, planejamento familiar e a escuta, a
primeira escuta, a escuta qualificada para fazer o encaminhamento, acolhimento, (...) faz
pré-natal, visita, atendimento ao hipertenso, puericultura, (...) faz procedimentos,
passagem de sonda vesical, (...) organizamos a equipe, fazemos as solicitações de
exames, vê prontuários de gestantes, cartões de vacina, a gente gerencia a equipe,
coordena a equipe (ENF-APS-1).
Ainda temos muito trabalho com a demanda espontânea, tem a questão dos programas,
saúde da criança, do idoso, saúde mental, entre outros, Programa Saúde na Escola,
visitas domiciliares, temos trabalhos intersetoriais na comunidade, nas empresas,
serviços de outras secretarias da gestão, participamos de momentos de educação
permanente, matriciamento, procedimentos, (...) consulta de enfermagem, o
acolhimento e a triagem é algo bem próprio da enfermagem, (...) também realizo
atividades de gestão, pois sou gestor de 5 agentes de saúde, técnico de enfermagem e
um médico, faço a gerencia da minha microárea (ENF-APS-3).
Tratamento de infecções, suturas, prescrição de antibióticos. Acho que só medicamentos
mesmo (faço de diferente), pois os profissionais do posto são muito bons, bem
orientados, e eles são bem resolutivos quanto ao que cabe a categoria de enfermagem
(MED-APS-1).
Eu consulto os casos mais graves que os enfermeiros não conseguem resolver, faço pré-
natal, prescrevo alguns medicamentos, alguns exames só quem pede sou eu,
encaminhamentos para especialistas, só quem pede sou eu, basicamente algumas
restrições que eles não podem fazer, alguns diagnósticos diferenciais, mas na maioria
das coisas, praticamente o que o enfermeiro faz o médico faz, com pouca coisa diferente
(MED-APS-2).
62
queixas das(os) enfermeiras(os), observadas nas falas, pode-se perceber que nesse nível de
atuação muitas atividades que seriam do campo da APS são delegadas à Enfermagem, fazendo
com que, muitas vezes, esse trabalhador perca noção de seu trabalho identitário. Aliado a isso,
as(os) enfermeiras(os) mostram-se pouco preparados para movimentarem-se na dimensão
política do cuidado, dado que expressam frágil empoderamento político, apresentando-se pouco
críticos e transformadores de suas realidades (PORTO; THOFEHRN, 2015).
Nesse cenário, até mesmo o fazer do médico se confunde com os dos demais,
inclusive, se considerarmos que a prescrição de medicamentos, que é colocada pelos
participantes como uma de suas principais atividades, também poder ser realizada por
enfermeiras(os) e odontólogos.
Tanto pelas falas quanto pelo observado no campo, é possível dizer que definir um
núcleo de atividades privativas para cada profissão, enfermeiras(os), odontólogos, fisioterapeutas
e médicos, parece ser infértil e pouco viável, haja vista que os limites impostos pela legislação
são tênues, possibilitando aos profissionais realizarem atividades comuns, que são mobilizadas a
depender das necessidades dos espaços de produção da saúde, seja na APS ou no hospital.
Esse caráter do trabalho em saúde, no qual os profissionais misturam-se a partir de
suas práticas e de seus saberes, tem sido estimulado por configurar uma forma de prestar
cuidados mais assertivos, que impactam mais na qualidade de vida das pessoas. Ceccim (2018)
chama esses saberes de interdisciplinares, pois são conhecimentos provenientes de várias
ciências, de conhecimentos populares e de conhecimentos tácitos, reconhecendo que, quanto
mais se trabalha em equipe, de forma colaborativa, mais se pode compartilhar dos saberes uns
dos outros, ampliando-se o arsenal de competências e a capacidade de resposta dos serviços de
saúde.
Piaget (1981, p.52) concebe a interdisciplinaridade como “intercâmbio mútuo e
integração recíproca entre várias ciências”, correspondendo a uma interação entre as ciências que
deveria conduzir à transdisciplinaridade, sendo esta última, concepção que se traduz em não
haver mais fronteiras entre disciplinas. Fenômeno que já parece estar em curso nos cenários
pesquisados.
64
As figuras são uma construção a partir das falas e das observações. Na APS, o
odontólogo apresenta atividades mais bem delimitadas e distintas do trabalho dos demais
profissionais, médicos e enfermeiras(os). Mesmo assim, muitas atividades podem ser
compartilhadas. Nesse contexto, médicos e enfermeiras(os) desenvolvem atividades muito
parecidas, com maior sobreposição que no ambiente hospitalar. No entanto, há que se ressaltar
que a diferenciação das práticas é mais quantitativa do que qualitativa, haja vista que a repetição
de determinas práticas acabam por determinar as diferenciações entre as profissões.
Um ensaio clínico randomizado, comparando os efeitos das consultas de médicos e
enfermeiras(os) na Espanha, concluiu que enfermeiras(os) prestam assistência de qualidade
comparável àquela prestada por clínicos gerais, para problemas agudos de baixa complexidade,
como os encontrados na APS (IGLESIAS et al., 2013). Laurant et. al (2018), em uma revisão
sistemática que objetivou saber o impacto de enfermeiras(os) em substituição a médicos na APS,
envolvendo 18 ensaios clínicos, concluiu que, para a grande maioria dos desfechos, a atuação do
enfermeira(o) mostra-se provavelmente igual ou ligeiramente melhor em comparação aos
médicos.
Essas evidencias corroboram com a observação de que as atividades possíveis desses
profissionais são bastante aproximadas, dado que possuem um processo de formação amplo e,
realmente, generalista, em diferenciação aos demais profissionais da saúde, que mantém forte
inclinação para determinadas disciplinas e temas, ao exemplo do dentista, concentrado no
66
pretensão, na formação da(o) enfermeira(o), de que este substitua o médico, pois são formações
diferentes. No âmbito da APS, apesar de se identificar um campo constituído por várias
atividades que podem ser comuns, isso não deve deixar de levar em conta as ações inerentes aos
núcleos profissionais, mas é preciso reconhecer que “o que se faz”, no campo da saúde, é mais
determinante para o cuidado do que “quem faz”, pois todos os profissionais podem fazer a
grande maioria das atividades.
No entanto, ao observar o campo, é percebido que, embora muitos possam fazer
quase tudo, grande parte das atividades comuns são realizadas com maior participação da(o)
enfermeira(o), como a gerência do território e as atividades grupais, na APS, resultando em
sobrecarga dessa(e) profissional (CAÇADOR et al., 2015; GALAVOTE et al., 2016).
Tal cenário conflui para uma dinâmica de atuação cada vez mais inter e
transdisciplinar, na qual todos fazem, ou poderiam fazer, em algum momento, quase tudo, sendo,
de fato, poucas as atividades exclusivas de uma ou de outra profissão. Mas, em nossos achados,
percebemos que, mesmo sendo poucas as atividades distintivas, ou seja, privativas, a
representação dessas atividades para a categoria e como ela se repete na prática de cada
profissional reverbera de forma diferente no fazer de cada categoria.
Por exemplo, médicos e enfermeiras(os) podem prescrever medicamentos, porém o
médico pode prescrever incontavelmente mais que as(os) enfermeiras(os) e tem mais
propriedade para isso, de forma que, embora os dois possam prescrever, esse ato ganha sentidos
diferentes no contexto de cada profissão, pois médicos consideram essa prática como uma das
mais representativas e ela ocupa grande espaço na prática cotidiana desse profissional. Já para
a(o) enfermeira(o), embora possa prescrever alguns medicamentos, essa atividade nem mesmo
chega a ser citada por elas(es).
Outro exemplo, é a realização da atividade cateterismo vesical. O médico também
sabe e pode realizar essa atividade, mas ganha um sentido diferente na prática da(o)
enfermeira(o), pois a representação dessa atividade para essa categoria é mais significativa,
existe uma relação diferente, pois a expertise dos profissionais é maior, pois esses a realizam
com mais frequência. Então, essas características, a expertise adquirida pela práxis permite
incorporar essa atividade, embora não exclusiva da(o) enfermeira(o), em seu núcleo de
atividades, que aqui chamaremos de Núcleo de Atividades Identitárias (NAI).
68
A construção do NAI mantém relação direta com o habitus profissional, pois são
essas disposições mentais que permitem a inserção de uma atividade, de uma prática, nesse
núcleo. E essa disposição é influenciada pela prática, haja vista que podemos dizer, com
segurança, que o NAI de uma enfermeira de um hospital especializado em atenção
cardiovascular não é o mesmo da enfermeira que trabalha em um hospital com foco na
reabilitação de pessoas com sequelas de trauma. Assim, existe um NAI comum a todas(os) as(os)
enfermeiras(os), mas que sofre modificações, a depender do contexto, pois a prática vai
induzindo mudanças no habitus e este, provocando mudanças na prática, em um processo de
retroalimentação.
Mas esse núcleo de atividades identitárias não é constituído somente por atividades
restritas àquela categoria profissional, pois como visto, essas são bastantemente raras, mas sim
por atividades que, por sua repetição e, irremediável desenvolvimento de expertise, passam a
integrar o corpus de atividades consideradas mais atinentes ao escopo de práticas. Mas, somente
a expertise não é suficiente para a inclusão de uma atividade nesse núcleo.
Para compor o NAI de um profissional da saúde, além da expertise, é necessário:
amparo legal, essa atividade deve estar subsidiada pela legislação específica de cada profissão; o
reconhecimento dessa expertise pelos profissionais executores da atividade; o reconhecimento
dos demais agentes do campo, validando essa expertise e protagonismo na execução dessa
atividade. Assim, essas atividades passam a constituir o habitus desse grupo profissional, ou seja,
uma disposição mental para a realização daquela atividade e um reconhecimento, da apropriação
sobre ela. Esse reconhecimento é individual, do profissional, e coletivo, pelos outros
profissionais da mesma categoria e, também, de categorias diferentes, por influência do habitus,
afinal, este constitui as regras não ditas, mas que todos conhecem (BOURDIEU, 1989).
Assim, a grande questão sobre a distinção entre os agentes do campo da saúde não é
quem faz “o quê”, mas sim, quem faz mais e melhor uma determinada atividade. Normalmente,
entre os profissionais, essa expertise é reconhecida, pois mais ou menos uns sabem o que os
outros fazem, mas não completamente. Sempre existem facetas da prática que são desconhecidas
pelos outros membros do campo.
Então, o fator quantitativo, o quanto aquela atividade se repete na prática de cada
profissão, também parece contribuir, inclusive mais pelo fator de repetição, para a construção do
núcleo de atividades identitárias, que repercutirá na construção da identidade profissional.
69
Assim, ressalta-se que o escopo de atividades consideradas próprias parece estar ligado à
repetição daquela prática no cotidiano do processo de trabalho.
Um estudo realizado com gestores e profissionais da APS, identificou o quanto,
muitas vezes, não fica claro para aquele e para estes a competência de cada profissão, sendo isso
uma lacuna que se origina na matriz identitária de cada profissional e da equipe (AMARAL et
al., 2021), evidenciando a relação entre prática, habitus e identidade profissional, haja vista que
o reconhecimento entre os profissionais das práticas individuais interfere nesse processo.
A construção do NAI é influenciada pelo habitus profissional que, por sua vez, é
influenciado pela prática, pelo contexto, mais especificamente pelas normas e protocolos
institucionais, pela legislação que rege esses profissionais e, sobretudo, por seus conhecimentos,
mas esses fatores se relacionam de forma desigual na conformação dessas práticas, que são
resultado da defasagem entre o habitus e o contexto, entre o imaginado e o possível, entre o
subjetivo e o objetivo. Essa prática será o resultando das lutas estabelecidas pelos agentes diante
das relações de poder estabelecidas entre eles e entre a instituição, representada por seus
protocolos. Essas lutas ocorrem em uma dimensão invisível, a que chamamos de dimensão
política do cuidado.
Por exemplo, observou-se que os profissionais de enfermagem que atuam na
classificação de risco, algumas vezes, redirecionam usuários a outros serviços, pois esses não
atendem ao perfil de atendimento do hospital. Essa prática é tida pela legislação como privativa
do médico (BRASIL, 2001) e tida como proibida pelo Conselho Federal de Enfermagem
(COFEN, 2017), mesmo assim, motivados pela conivência da instituição e endossados por seu
saber, conhecimento clínico das situações de saúde, que lhe assegura uma certa previsibilidade
do que pode ocorrer com aquele usuário no percurso de um serviço ao outro, permitem que essa
prática seja executada. Ou seja, o poder institucional e o conhecimento dos profissionais foram
mais determinantes para a prática do que a legislação.
No entanto, nessa mesma situação e atividade, foi observado que a maioria das(os)
enfermeiras(os) não redireciona usuários, assim, se ancoram no poder da legislação e, mesmo
sabendo que o usuário teria condições clínicas para se direcionar para outro hospital (a exemplo
de uma gestante com dores leves em baixo ventre, sem perdas vaginais ou outro sinal de alerta) e
que seria mais interessante para a dinâmica da instituição e para o trabalho do médico que ele
mesmo, a(o) enfermeira(o), redirecionasse o usuário, solicita a presença do médico. Nesse caso,
70
a legislação foi predominante para que essa prática fosse executada, mas também dependeu de
um conhecimento sobre a clínica e sobre a legislação que o rege, permitindo entrar em uma
situação de conflito com a dinâmica institucional e com as expectativas do médico.
Os achados também nos permitem realizar considerações sobre o processo de
trabalho em saúde, que apresenta peculiaridades.
cada profissional. Quanto ao produto, diferentemente de um carpinteiro, que terá como resultado
uma cadeira, o produto do trabalho em saúde é o próprio ato de cuidar (MERHY, 1999).
Reiteramos que existirão atividades e necessidades dos usuários que só poderão ser
atendidas, sobretudo, a partir da execução de atividades privativas de determinados profissionais,
como uma exodontia, pelo odontólogo, uma apendicectomia, pelo cirurgião, a punção de um
acesso central, pelo médico, dentre outros. Neste sentido, o reconhecimento da importância,
também, das atividades privativas, no processo de produção da saúde, ressalta a necessidade de
uma atuação interdisciplinar.
Esses agentes do campo da saúde, por meio dos instrumentos, podem atuar sobre o
objeto de forma indireta ou direta. A atenção direta envolve as atividades diretamente
instituídas, de modo interativo, sobre a pessoa, seus familiares ou cuidadores, ou coletividades:
psicoterapia, intubação, curativo, sondagem, administração de medicamentos, escuta ativa,
abordagem grupal. A atenção indireta, constitui atividades que vão repercutir na qualidade de
vida das pessoas, mas de forma indireta, não sendo realizadas a partir da interação entre
profissionais e usuários: aquisição de insumos, processamento de materiais esterilizados, central
de hemoterapia, produção de vacinas. Neste sentido, no contexto das atividades indiretas, não
poderão ser realizados cuidados, uma vez que estes necessitam, de forma irremediável, da
interação entre quem cuida e quem é cuidado (MOURÃO NETTO et al., 2021).
As atividades de gerência envolvem a articulação entre as intervenções produzidas
na atenção direta e na indireta e visam concatenar as diferentes intervenções no intuito de levar
ao alcance da finalidade do processo de trabalho em saúde: melhoria da qualidade de vida. É
importante considerar, portanto, que essas atividades, diretas e indiretas, dificilmente ocorrem de
forma isolada, ocorrendo, na prática, simultaneamente.
Eu faço tudo! Faço consulta de enfermagem, faço pré-natal, prevenção (câncer de colo),
acolhimento, puericultura, (...) planejamento familiar, (atendo) tuberculose, doença de
chagas, (faço) encaminhamento para especialistas, (...) urgência e emergência,
encaminhamentos para o hospital, UPA (Unidade de Pronto Atendimento), notificação,
parte da papelada (ENF-APS-2).
(...) Considero que o núcleo da nossa atuação é a consulta de enfermagem, o
acolhimento e a triagem (classificação de risco). São bem próprios da enfermagem. (...)
Também realizo atividade de gestão, (...) sou gestor de cinco ACS, técnico de
enfermagem e um médico. Faço a gerência da minha microárea (ENF-APS-3).
Só o enfermeiro faz exame de prevenção, procedimentos como sondagem vesical ou
nasogástrica, visita às puérperas. Só o enfermeiro faz o acolhimento, a gestão do ACS a
gente compartilha com o gerente (ENF-APS-4).
A gente também faz o gerenciamento da sala de vacina (ENF-APS-5).
Triagem com classificação de risco e acolhimento da demanda são atividades que a
gente não consegue destinar a outros profissionais. (...) já foi tentado colocar outros
profissionais, mas não teve tanto êxito. Também realizamos acompanhamento dos
indicadores da microárea, isso é direcionado ao enfermeiro, não conheço onde
direcionam esse fazer para outra categoria. Até a coleta de citologia já vi que médico
precisou fazer, mas não de rotina (ENF-APS-6).
Todos os enfermeiros da assistência fazem gerência, não tem como não fazer, porque
além da atenção, do vínculo, sempre tem o cuidado continuado, a gente tem muito a
parte burocrática e essa parte nos leva a parte de gerência, a organização da equipe,
minhas ACS, atendimento das gestantes, tem as planilhas de acompanhamento das
gestantes (ENF-APS-8).
77
que compõem seu núcleo de atividades identitárias, embora também apresentem dificuldades de
descrever as atribuições da(o) enfermeira(o), mesmo convivendo com esses profissionais.
Os outros membros da equipe ressaltam a atividade gerencial da(o) enfermeira(o), a
associando fortemente à sua prática, a associando a eles mais até que os próprios profissionais,
como visto nas falas. Essa percepção dos outros membros da equipe tem encontrado ancoragem
na literatura, que tem identificado que a(o) enfermeira(o) da APS tem suas atividades cada vez
mais direcionadas à organização do serviço, à supervisão das atividades exercidas pelos ACS e
aos cuidados desenvolvidos pelos membros da equipe de enfermagem (GALAVOTE et al.,
2016). Assim, tanto pela fala de médicos e odontólogos, como pela literatura e o observado no
campo, o “esquecimento” da atividade gerencial pelas(os) enfermeiras(os), atividade essa que
consome importante força de trabalho, pode estar relacionado, mais uma vez, com o caráter
alienante do campo de práticas, que parece induzir nos trabalhadores uma inserção cada vez
menos crítica.
Assim, essas apreensões reforçam a necessidade de uma atuação mais crítica e
transformadora, portanto, politizada, da(o) enfermeira(o), rompendo com a alienação do
processo de trabalho, no qual este reconhece e exerce poder no campo de práticas.
Bonfim et al. (2012) realizou estudo no qual mapeou as intervenções da(o)
enfermeira(o) na APS, segundo a Nursing Interventions Classification, em 152 atividades,
distribuídas em 7 domínios, 16 classes e 59 intervenções. A única atividade que não obteve
correspondência com as intervenções propostas pela NIC foi o acolhimento. As atividades
identificadas no estudo corroboram com a descrição de um cotidiano diversificado de práticas
da(o) enfermeira(o) na APS, sendo predominante as atividades de gerenciamento.
Nos discursos dos profissionais também é possível confirmar o contexto de
sobrecarga da(o) enfermeira(o), já apontado em outros estudos, que evidenciam que o cotidiano
da(o) enfermeira(o) na ESF é marcado por sobrecarga de trabalho, que prejudica a realização das
ações específicas da saúde da família (CAÇADOR et al., 2015; GALAVOTE et al., 2016).
Nas falas, odontólogos e médicos trazem suas visões sobre o trabalho da(o)
enfermeira(o). Em suma, relatam as atividades mais aparentes e parecem ser bem assertivos
quanto ao trabalho desse profissional, ressaltando sua importância para os diferentes serviços.
Em outro estudo, médicos também demonstraram uma boa compreensão sobre o fazer da(o)
83
enfermeira(o), mesmo às vezes lhe atribuindo funções que não eram suas (SILVA et al., 2020),
o que ajuda a desmistificar a percepção da(o) enfermeira(o) de que, muitas vezes, acredita que
seu trabalho não é visto ou não é valorizado pelos outros membros da equipe.
As atividades educativas também emergiram de forma tímida nos discursos dos
outros profissionais sobre o fazer da(o) enfermeira(o), como também foram observadas de forma
limitada nos cenários de práticas. Também precisamos considerar que a coleta foi realizada no
período pandêmico, no qual muitas atividades estavam suspensas, principalmente abordagens
coletivas, talvez o espaço mais propício para a atuação educativa da(o) enfermeira(o). Mesmo
assim, esse fenômeno é preocupante, pois pode estar indicando uma mudança no núcleo de
atividades identitárias da(o) enfermeira(o)nesses cenários, o que pode repercutir em perdas para
a capacidade de impacto do trabalho da(o) enfermeira(o), bem como para a representação de sua
importância no contexto da APS, pois a educação em saúde é vista como meio estruturante para
se provocar mudanças esperadas na saúde das pessoas, sendo considerada elemento estratégico
na atuação dos profissionais na ESF (BRASIL, 2017), sendo demonstrada uma possível
desarticulação entre os princípios da ESF e a atuação dos profissionais.
Foi identificada uma predominância de intervenções clínicas e gerenciais por
enfermeiras(os) da ESF, em detrimento das atividades educativas, o que está em consonância
com literatura, que aponta que, dentre as mais diversas atividades desenvolvidas pela(o)
enfermeira(o) na APS, destacaram-se as atividades administrativo-burocráticas (GALAVOTE,
2016); o que demonstra que a enfermagem no Brasil tem se afastado gradativamente das
atividades estritamente assistenciais e focado seu processo de trabalho nas atividades
administrativas, com ênfase na organização do serviço, no planejamento e no controle do
trabalho da equipe (WALDOW, 2012).
Diante do até aqui exposto, em se tratando do núcleo de atividades identitárias da(o)
enfermeira(o) da APS, no município que serve de cenário ao estudo, não seria possível dizer que
a atividade educativa comporia esse núcleo, já que não foi reconhecido nem pelos membros da
equipe e nem pelas(os) próprias(os) enfermeiras(os). Esse fenômeno revela os engendramentos
entre prática e habitus, a ponto de uma atividade, até então historicamente considerada como
integrante do escopo de atuação da(o) enfermeira(o), apresentar-se, por interferência de uma
prática que impede a educação, não ser incluída nesse NAI. Assim, o papel de educador da(o)
enfermeira(o) deve ser ressignificado, havendo para isso que existir espaço nas agendas para que
84
se faça a educação em saúde, principalmente nas consultas de enfermagem, e não somente nos
grupos.
Importante frisar que os achados não são conclusivos sobre o fato dessas profissões
educarem ou não, pois podem apenas não ter falado sobre essa atividade, possibilidade ventilada
por outro estudo, que identificou um reconhecimento menor da(o) enfermeira(o) sobre as
atividades educativas, em comparação aos usuários, que citam essa atividade como sendo de
destaque da profissão (BARRIENTOS; PIRES; MACHADO, 2020).
Em seguida, partiremos para a análise da atuação da(o) enfermeira(o) no contexto
hospitalar, onde também é vasta a gama de atividades, como expresso nas falas.
Eu presto cuidados: passagem de sondas, acolhimento de uma forma mais ampla, (...)
essa parte de exames, gasometria, coleta de urina em sistema fechado, inspecionar a
pele, organização do serviço, do plantão, direcionar a equipe, direcionar o serviço,
gestão dos técnicos. (...) A atividade de gerência do cuidado, na emergência, por isso, a
gente deixa a assistência um pouco de lado e é gestora. Eu acho que se eu não fizer
outra pessoa poderia fazer. É preencher documento, termos, acho que outra pessoa faria.
Mas a monitoração das informações é mais complexo e não tem como o técnico fazer
(ENF-H-4).
O nosso cuidado está mais limitado porque ficamos mais na parte burocrática.
Basicamente, fazemos burocracia e cuidados assistenciais. Quanto aos cuidados
NANDA e NIC não vejo muito, acho que se perdeu. Tem muitos protocolos,
procedimentos. Realizamos agendamento de exames, atualização dos pacientes,
procedimentos de enfermagem, sondas, curativos, seguimento de protocolos. (...) Não
vejo outros profissionais fazendo atividades de gerência e assistência simultaneamente
(ENF-H-5).
Faço recepção dos pacientes, checo prescrição, aprazo prescrição, checar exames,
checar se está em condição de realizar o exame (o usuário), ver dieta, checar se tem
necessidade de chamar outro profissional para avaliar o paciente, checar se precisa
comunicar ao serviço social algo, solicitar dieta, fazer curativos, chamar médico. Muito
papel, muito termo. Sem eles não tem exame também. Não vejo outros profissionais
fazerem assistência e gerenciamento. Isso já está impregnado como função do
enfermeiro. Não vejo médico, não vejo fisioterapeuta fazerem, (...) isso atrapalha no
corpo a corpo com o paciente, sem dúvidas, mas se a gente não faz essa função
gerencial, o serviço para. Tem que atualizar a passagem, paciente fica sem se alimentar,
as reavaliações não ocorreriam, pois tem que estar avisando o médico, exames que
precisam de protocolos, transfusão não seria realizada, pois não teria parte burocrática
pronta. Prejudicaria muito o serviço. Eles têm que caminhar lado a lado. (...) Acho o
gerenciamento a principal característica do nosso trabalho (ENF-H-6).
Faço evolução, não o mero registro, o exame do paciente eu digo, identificação de
agravamento, a coleta permanente de informações sobre o estado clínico dos pacientes,
percebo que sem o enfermeiro os técnicos se desestruturam. As burocracias, apesar de
atrapalharem nossa conduta, mas integram nossas ações. A burocracia existe e se faz
necessária, mas tem burocracia que só atrapalha a gente, têm muitos papeis. Me vejo
como gestor, acho que é inerente aos enfermeiros (ENF-H-7).
Fora as atividades gerenciais, tem a realização dos curativos, tem o cuidado com o
curativo, pode ser realizado por outro, pode, mas o estadiamento da lesão, um olhar
85
mais humanístico para com o paciente, mas eu vejo um todo, o que eu posso fazer para
melhorar? Temos esse olhar como um todo para a melhoria (ENF-H-10).
enfermeiras, fisioterapeutas etc., sendo profissões que têm em comum o fato de se definirem
apenas na e pela concorrência que os opõe entre si e nas estratégias antagonistas pelas quais elas
visam transformar a ordem estabelecida para garantirem aí o reconhecimento de sua profissão
(BOURDIEU, 2006).
Fisioterapeutas e médicos reconhecem as(os) enfermeiras(os) como profissionais que
realizam atividades assistenciais e gerenciais. No entanto, as atividades gerenciais emergem dos
discursos como a atividade mais característica desse profissional, mais até do que dos discursos
dos próprias(os) enfermeiras(os), ratificando que as atividades gerenciais compõem o NAI da(o)
enfermeira(o), mas muitas vezes são esquecidas de ser mencionadas por eles (LEAL; MELO,
2018).
É possível perceber que fisioterapeutas e médicos atribuem importância ao trabalho
da(o) enfermeira(o) o colocando em uma posição central no processo de produção da saúde no
contexto hospitalar, já que a ele cabe articular todas as terapêuticas instituídas e que, juntas,
concorrerão para a melhoria da qualidade de vida. Pela amplitude do trabalho da(o)
enfermeira(o), os outros profissionais também têm dificuldades de enumerar suas funções,
embora reconheçam sua atividade como importante e até essencial para o desenvolvimento do
trabalho dos demais profissionais.
Curiosamente, a palavra cuidado emergiu mais nos discurso dos outros profissionais
do que das(os) próprias(os) enfermeiras(os), o que pode ser uma repercussão do afastamento
desses das atividades de assistência direta, sendo vistos pelos colegas de outras profissões mais
como gestores do que prestadores de cuidados e muito menos como educadores.
No hospital, as atividades educativas de enfermeiras(os) não foram relatadas por
outros profissionais e nem pelas(os) enfermeiras(os). As falas ressaltam o caráter de prontidão e
de vigília do trabalho dos profissionais de enfermagem, o que pode ser descrito como atividade
distintiva, já que os outros trabalham em um regime de, apenas, prontidão.
“O mundo social se oferece como uma representação, onde as práticas não são senão
papéis teatrais, execuções de partituras ou aplicações de planos” (BOURDIEU, 2011, p .86), pois
89
existe um habitus de profissão, que implica em uma prática de profissão, assim, considerando
que o habitus constitui essas partituras, percebermos que caberiam investimentos na construção
ou modificação intencionais do habitus da(o) enfermeira(o).
Os capitais são bens que podem ser acumulados. São esses capitais que permitem aos
agentes exercer poder simbólico, entendido como o poder capaz de conseguir os mesmos
objetivos que a força física ou econômica (BOURDIEU, 2011).
Os capitais assumem diferentes conformações e variam de campo a campo. Neste
capítulo, discutiremos os capitais identificados nos cenários de prática que serviram como fontes
de coleta da pesquisa e exploramos como estes são mobilizados durante o estabelecimento das
relações entre os agentes.
Muitos capitais foram citados, uns com mais e outros com menos potencial para
gerar poder simbólico. O conhecimento figurou como o capital mais significativo nas relações
entre os agentes, seja ele teórico ou prático, esse último expresso nas falas como experiência ou
tempo de serviço.
Após revelarem que percebem determinados agentes exercendo mais poder do que
outros, foi perguntado aos entrevistados ao que eles atribuíam essa distribuição desigual de
poder, entendendo poder como a capacidade de mobilizar o campo em seu benefício.
Não percebo diferença, em que pode ser mais ouvido. Mas a vezes o profissional
quando é novo, nesse começo, acaba que cada um tem um processo, acaba que os outros
tem que
se adequar. Acho que conhecimento sim, experiência, conhecimento mesmo isso é
fundamental (MED-APS-1).
No meu caso, agora, que estou velho, tenho uma boa experiência, sou a mais antiga ...
ela sabe das coisas... lá, eles estão me olhando diferente, depois da experiência me sinto
valorizado (ENF- APS -10).
Tem enfermeiros que não se comunicam, e é ruim. Eu gosto dos que se comunicam
mais (MED-H-1).
Vejo também como a comunicação é importante, todos os aspectos da comunicação, a
abordagem do enfermeiro é importante, a valorização, se ele consegue fazer uma escuta
daquele usuário ele já tem a credibilidade dele, a comunicação e um ponto estratégico, a
comunicação comanda muita coisa. Quando você tem conhecimento, tem um
reconhecimento e credibilidade, pode atrair as pessoas, mas nem sempre é tão efetivo
pois tem um jeito ou outro da pessoa que pode afastar os outros membros. (...) tem
profissionais tecnicamente muito preparados mas fica essa lacuna que ele não consegue
trazer o resta da equipe pra ele, não fica uma relação boa de confiança ele não consegue
corresponder a isso, profissionais bem preparadas que poderiam realizar coisas com
êxito, mas ele não consegue envolver outras pessoas, apesar de quando você tem
conhecimento, tem um reconhecimento e credibilidade (ENF-APS-6).
Com certeza tem enfermeiros com poder diferente, tem enfermeiro que consegue
dialogar melhor, tem enfermeiro que tem propostas de trabalho, que organiza melhor,
atende melhor e acaba que ele consegue escutar melhor os técnicos, os ACS e tem
aquela empatia, e acaba sendo até mais ajudado ainda (ODO-APS-2).
Títulos acadêmicos também não interferem pois o que interessa é o conhecimento que é
aplicado. Se aquele título não reflete em conhecimento, ele não tem valor (ENF-H-1).
Os títulos contribuem bastante, pois envolve a questão do conhecimento (ENF-APS-4).
Títulos acadêmicos não tem muito impacto, não percebo interferindo (ENF-APS-6).
Pra nós da assistência, não tem muita diferença seus títulos (ENF-APS-7).
atendimento flui. Tem enfermeiro que tem conhecimento, que desenrola, trata bem a
população (MED-APS-2).
Sobre a questão do “Dr” (doutor), eu ainda uso porque é cultural. Acho que a utilização
faz diferença. Mas as vezes eu preciso para a gente conseguir algo, para dar uma mexida
no ego da pessoa, a gente consegue influenciar mais indo na vaidade da pessoa. Mas pra
mim não indica submissão utilizar, eu uso para pegar pela vaidade. Essas expressões
carregam poder (ENF-H-3).
Não consigo realizar meu trabalho com muita autonomia, pois muitas vezes estamos
barrada a uma prescrição medica, um confronto de uma dor você precisa sair atrás do
médico, muitos médicos estão ausentes do serviço, ausentes do olhar humano, aí a gente
não consegue desenrolar, porque eu dependo de outra pessoa, eu fico muito amarrada, a
gente não consegue agir em conjunto, a gente pede mais como um favor (ENF-H-10).
No aspecto das relações, somos felizes por termos uma equipe bem harmoniosa, bem
integrada, é algo que eu destaco muito, pessoas tranquilas, bem experientes, no que diz
respeito com as relações com a gestão local, de certa forma é natural aquele aspecto de
cobrança, aquela abordagem às vezes exagerada (ENF-APS-3).
Não é fácil colocar a casa em ordem, pois estão muito tempo habituado, então a gestão
acaba que ela cobra, mas ela não corresponde. Ela me cobra e na prática as minhas
necessidades ela não atendia, me recusando eu precisava disso então tinha. Só foi eu ir
lá, olhar no olho, me impor, dizer, perguntar o problema que há, que aí a coisa já muda
(ENF-APS-1).
Pelos relatos, identificamos um enfermeiro que, na interação com o médico sente que
a execução do trabalho se deu por um pedido seu e não porque havia uma necessidade de
cuidado que cabia a este. Tal interação coloca o enfermeiro em situação de desfavorecimento,
dominação, pois o médico está “lucrando” na interação por uma intervenção que está em seu
escopo de atuação. Dito isso, o enfermeiro sai “endividado” dessas interações, fazendo com que
o médico sempre tenha favores a serem cobrados.
A violência simbólica decorrente do uso da expressão “doutor” pode ser explicada na
expressão da interdependência entre a forma linguística e a estrutura da relação social na qual e
para a qual ela foi produzida pode ser observada nas oscilações entre senhor, senhora e você. "E
se a gente se tratasse por você?", a subordinação da forma do discurso à forma da relação social
98
na qual ele é empregado se romperia (BOURDIEU, 2008, p. 68). Assim, seguindo o mesmo
raciocínio utilizado por Bourdieu, ao tratar o médico por doutor se reforça uma relação social de
subordinação, ao passo que transgredir essa convenção, poderá contribuir para a diminuição
dessa relação de subordinação, ou para a construção de relações mais simétricas.
A rispidez no trato com as(os) enfermeiras(os) pela gestão é tratada de forma natural.
Também podendo ser um ato de violência simbólica, pois não é percebido como tal, já que é
entendida como “natural”.
Quando os dominados aplicam àquilo que os domina esquemas que são produto da
dominação ou, em outros termos, quando seus pensamentos e suas percepções estão estruturados
em conformidade com as estruturas mesmas da relação da dominação que lhes é imposta, seus
atos de conhecimento são, inevitavelmente, atos de reconhecimento, de submissão (BOURDIEU,
2012).
A alienação está intimidante relacionada à violência simbólica. Assim, em uma das
falas, o ato de cobrar resultados, mas não ofertar subsídios para a execução do trabalho, pode
fazer o profissional ter sentimento de frustração, sendo violentado, por não reconhecer que a
culpa não é sua, e sim, do contexto ao qual está inserido.
No trabalho em saúde, o poder circula e está ancorado no saber específico de cada
profissional. No caso do médico, o saber específico de sua profissão atribui a ele autonomia
técnica e o título de perito na arte de corrigir os desequilíbrios do corpo e mantê-lo em um
permanente estado de saúde (MARIN; RIBEIRO, 2018) o que explica, em parte, a causa do
maior poder simbólico desse profissional no campo da saúde.
Durante a observação do campo, uma situação expressou a violência simbólica que
podem vivenciar estes profissionais.
Em uma das ocasiões, a impressora de um dos setores da emergência ficou sem papel,
quando um médico a estava utilizando. Mesmo em um serviço com muitos profissionais
e estudantes, a enfermeira se levantou e foi buscar o papel, em uma área fora do setor,
mesmo essa atividade não sendo, oficialmente, sua atribuição (OBSERVAÇÃO,
HOSPITAL).
Além deste episódio, também foi percebido que as(os) enfermeiras(os) assumem
atribuições que não são suas, sem questionar:
Acho que o enfermeiro detém muito poder, é a mola do posto, se tirar a enfermagem da
unidade o posto se acaba. Acho que não tem enfermeiro com mais poder não, acho que
todo mundo é igual. Agora quem leva a unidade, a vela do barco e o mastro é a
enfermeira, a tripulação vai toda embaixo, mas a enfermeira vai em cima, da hora que
entra a que sai é o enfermeiro, o médico chega 8h, às vezes sai mais cedo, tem médico
que não bate ponto, e ainda ganha não sei quanto, às vezes mais que a gente (ENF- APS
-9).
Ainda acho que o médico detém o maior poder em relação aos outros profissionais. Pois
sempre quem dar a palavra final é o médico, pois ele é quem define tudo, para onde o
paciente vai, quando vai, exame. Como eu já vi médico cancelar para fazer o exame e
220todos se organizaram, mas não ocorreu porque ele disse que não ia. Todo mundo já
tinha se organizado (ENF-H-2).
100
Os médicos ainda têm algumas regalias. Mas não como era. Acho que a educação da
gente e deles também. O mercado não está mais endeusando, porque está tendo mais
profissionais, eles também, estão refendendo isso. A saturação do mercado e a postura
da enfermagem não aceita mais esses comportamentos. Até porque diante desse
comportamento a gente pode acabar boicotando o trabalho dele e ele ter que trabalhar
duas, três vezes mais. Outra coisa, a medicina também está mais elitizada. Mas também
tem muito enfermeiro na relação vertical com os técnicos (ENF-H-3).
O médico ainda detém o maior poder. Acho que esse poder é por conta de acharem que
se não tiver médico no PSF não funciona, aí o médico continua com regalias, aí acha
que o enfermeiro é secretário dele, para fazer as receitas, o médico sempre estra certo,
ele não faz , só faz quando a gente implora muito, sempre aquele cuidado do gerente de
não vamos aborrecer o médico se não ele vai embora, pode ficar sem enfermeiro, mas
sem médicos não (ENF- APS -10).
Me sinto valorizada pelos outros membros da equipe multiprofissional. Eu acho que
eles têm essa visão, acho que um dos motivos de o enfermeiro não poder sair da unidade
é isso, o médico tira um mês de férias e o enfermeiro só quinze dias porque o PSF não
pode passar um mês sem o enfermeiro, o médico pode tirar folga dia de segunda, mas o
enfermeiro não pode, porque o posto não pode ficar segunda sem o enfermeiro, o
médico pode tirar duas folgas seguidas, o enfermeiro não pode, tudo para o enfermeiro é
mais difícil de sair do posto (ENF- APS -11).
eu sou muito tímida, eu ficava mais calada mesmo, aí as vezes vejo e não consigo falar
e quando fui falar já foi bem depois. Não falei buscando evitar conflitos, sei que não é
certo, mas foi procurando evitar conflitos, com a gestão, com o paciente, com o colega
(ENF- APS -4).
Todo funcionário do posto tem muito medo de ir pra ouvidoria, porque a gente é muito
cobrado, todo mundo que vai para ouvidoria é chamado atenção, e eu já vi, eu já
trabalhei com enfermeiros muito bons que foram transferidos por denúncias bobas da
ouvidoria. (...) eu tenho medo que tenham a impressão de que eu não quero trabalhar
quando reclamo, exemplo eu já sofri muito com isso, ficar até 12h, até 18h no posto, e
no outro dia eu não tive coragem de reclamar pra minha gerente com medo de ela dizer
assim, ave maria passou 1h do horário e tá morrendo, não quer trabalhar... eu sempre
tive medo disso. (...) eu tenho medo de não fazer isso, de ser taxada de que não quer
ajudar, de que não quer trabalhar. Olhe, na época do início da pandemia, a secretaria
pediu para a gente visitar os casos de COVID, os dentistas e os ACS se negaram a ir. Os
enfermeiros todos disseram que iam, pra você ver como nós somos. Os dentistas
colocaram o pé na parede e disseram: a gente não vai, e não foram. Os enfermeiros: não,
a gente vai, sem problema nenhum. Tudo da enfermagem parece que a gente é mais...
vulnerável, a gente abre mais. Se você soubesse o que eu já fiz para ajudar o paciente
(...,) sei que não é certo (ENF- APS -11).
Já presenciei coisas erradas, vi um médico com luva de procedimento colocar o dedo na
incisão só com a luva de procedimento, vi e fiquei em choque e não consegui fazer
nada, depois eu até me martirizei, porque que eu não questionei aquele médico.
Inclusive eu estava com uma médica, que depois ela comentou comigo e nenhuma das
duas questionou o cirurgião (ENF-H-9).
É impressionante como a gente é calado e mudo para essas coisas. Me sinto até
conivente, ficava com uma angústia, igual no dia que a gente viu o cara fazer uma
negligência, uma imperícia e a gente ficou travado, não sei o que leva a isso não,
sinceramente (MED-H-3).
106
É porque a gente está tão acostumada com a relação de poder, de estereótipo que o
médico é o dono do mundo que a gente não quer argumentar com ele porque a gente
tem medo de médico. Isso que faz a nossa profissão cair, porque temos medo dele, do
médico, isso não pode acontecer. Isso acontece por questões históricas. Até pouco
tempo só tinha ele, nossas profissões são novas, e hoje ele divide com muitas pessoas, e
quando você divide poder, você tem medo de perder poder, status (FIS-H-2).
Já aconteceu com um médico. Já vi quando era uma paciente jovem com pancreatite e
ele só entubou porque a enfermeira implorou para ele intubar. Implorou olha ai! E veio
outro médico e perguntou o que houve, porque não mandaram pra UTI e a gente ficou...
mas ele é dono da razão. Eu até disse, esse paciente você acha que tem indicação de
tubo, ele disse sim, e ela vai morrer! Acho que a gente acaba se calando devido a essa
frieza, da ignorância. Eu nunca tive medo, mas respondi a altura, já fiquei calada. Tem
gente que tem medo do que ele vai dizer. Acho que esbarra na desinformação de achar
que é ele quem diz o que deve ser feito, de achar que ele é detentor da resposta final, do
medo do que ele vai responder (FIS-H-3).
Já aconteceu isso há uns 15 dias, tinha uma paciente, que eu já acompanhava, que tinha
DM, mas o colega ainda pediu mais exames, mas aí chamei o ACS, disse que poderia
ser uma conduta mais adequada, pois eu não iria na sala da colega falar isso..., não
tenho nenhum contato com ela, ela é meio fechada até, acho que não seria bem-vinda
(MED- APS -1).
É uma situação um pouco constrangedora, que foge até a ética profissional, já aconteceu
de um paciente estar com uma infecção muito forte e o colega passar um antibiótico que
não iria fazer efeito, então chamei o paciente e falei, mas em nenhum momento quis ser
mais que o meu colega (ODO-APS-3).
As falas revelam que não somente as(os) enfermeiras(os), mas todos os profissionais
são influenciados pelas relações de poder estabelecidas no processo de trabalho, evidenciando
como a dimensão política do processo de cuidar influencia no trabalho em saúde.
A partir das falas, podemos perceber mais claramente como a prática é o resultado da
defasagem entre o habitus (disposições mentais) e as relações de poder estabelecidas no campo,
assim, podemos dizer que a prática é o resultado do que é possível ser feito diante das relações
de poder estabelecidas no campo. Por isso, advogamos que quanto mais os profissionais
conhecerem e souberem se movimentar na dimensão política do cuidado, mais seu habitus
poderá ser revertido em prática.
As dificuldades na comunicação e interação entre os profissionais da saúde tem sido
discutida na literatura. Valadão, Lins e Carvalho (2017), ao analisarem os conflitos bioéticos na
APS, identificaram falta de companheirismo e colaboração entre os membros da equipe
estudada.
Mesmo muitos participantes tendo demonstrado aversão ao conflito, foram
apreendidas situações em que as(os) enfermeiras(os) se mostraram como agentes de
107
Saber receber poder e exercer poder, em um meio termo. Na maioria das vezes consigo
influenciar os profissionais, depende dos profissionais que estamos lidando (ENF-H-3).
Existem momentos que a gente não consegue influenciar. Às vezes na triagem eu via o
paciente hipossaturando, levava para a reanimação e o médico dizia que ele está bem e
que levasse para o consultório. Era uma frustração. Mas, dias você ganha e dias você
perde. Eu me sinto mais submissa, mas eu acho que eu também tenho parte de poder, de
mandar, de ter meu espaço e fazer o que eu acho. Me sinto mais influenciada (ENF-H-
4).
Já ocorreu vezes que a minha percepção ajudou a mudar a conduta, mas outras não.
Consegui influenciar menos vezes do que mais vezes. Quando vejo coisa errada
geralmente falo. Me vejo mais influenciando do que sendo influenciado (ENF-H-5).
Não consigo influenciar sempre, eu percebo que eu consegui esse poder com aqueles
que são mais jovens, não sei se é por inexperiência, mas acho que não, mas eu penso
que é porque ele estuda mais e a gente consegue persuadir, não sei se pela forma de
falar, não sei se pela idade mais próxima que a minha. Os mais velhos são mais
resistentes. Mas eu dou a minha opinião, embora não vá persuadir. O que é
determinante é o argumento, provas (ENF-H-7).
A minha relação de amizade facilita o trabalho. É mais fácil para um médico entender
que o paciente está grave quando eu digo do que outros colegas. Mas, mesmo assim, eu
tenho dificuldade. Penso na visão de alguns colegas, os meus 20 anos de experiencia, 7
anos aqui, isso conta alguma coisa. Na maioria, consigo influenciar (ENF-H-6).
Consigo influenciar bastante, mas não todas as vezes. O que é determinante é o que eu
demonstrei... no meu último plantão eu tomei a frente da parada pois o médico não
estava muito por dentro. Acho que ganhei a confiança dele. Acho que existe uma
questão de gênero, a gente percebe que muitas vezes entre médica mulher e enfermeiro
homem não vejo problema, mas entre médico homem e enfermeira mulher acho que
ainda existe dificuldade (ENF-H-8).
Percebo relações de poder no serviço, me vejo mais sendo influenciado do que
exercendo poder (ENF-H-10).
Eu me vejo mais sofrendo a influência do poder dos outros (ENF- APS -4).
Acho que sou mais influenciada (ENF- APS -9.
Em outros termos, os discursos não são apenas (a não ser excepcionalmente) signos
destinados a serem compreendidos, decifrados; são também signos de riqueza a serem avaliados,
apreciados, e signos de autoridade a serem acreditados e obedecidos. A língua raramente
funciona, na existência ordinária, como puro instrumento de comunicação (BOURDIEU, 2008).
Para o sucesso nos conflitos ou para se sobressaírem nas relações de dominação,
as(os) enfermeiras(os) se valem do conhecimento e da comunicação.
As(os) enfermeiras(os) se sentem tanto mais influenciadas(os) como influenciando,
fugindo do estereótipo de profissional submissa(o) predominante no imaginário social. Nas
observações do campo, também foi possível perceber o protagonismo da(o) enfermeira(o), a
centralidade de seu papel na prestação do cuidado.
de uma profissão em relação a outra. Neste sentido, o habitus da profissão pode justificar a
relação da médica em relação a enfermeira.
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
muito mais pela dinâmica do campo, por influência do habitus, portanto, seus fazeres são
fortemente influenciados pela dimensão política do cuidado.
As(os) enfermeiras(os) têm dificuldade para sistematizar e falar sobre o que fazem,
podendo ser repercussão da pouca reflexão sobre o processo de trabalho acrescido de uma maior
gama de atribuições, se comparados aos demais profissionais.
É possível dizermos que definir um núcleo de atividades privativas para cada
profissão, enfermeiras(os), odontólogos, fisioterapeutas e médicos, parece ser infértil e pouco
viável, haja vista que os limites impostos pela legislação são tênues, possibilitando aos
profissionais realizarem atividades comuns, que são mobilizadas a depender das necessidades
dos espaços de produção da saúde, seja na APS ou no hospital.
Em nosso estudo, uma das intenções era descrever o núcleo de práticas, que em
nossa imaginação seria um núcleo de atividades privativas de cada categoria. No entanto, o
campo nos mostrou que esse núcleo de práticas, na verdade, é formado menos por atividades
privativas e muito mais por atividades comuns e que, embora existam práticas privativas, não são
essas as que determinam e nem são as mais representativas no fazer desses profissionais, seja no
hospital ou na APS, pois existem, sim, práticas privativas, mas o núcleo de atividades tem sua
conformação mais fortemente influenciada pela execução de práticas comuns/compartilhadas,
fenômeno que sustenta o que estamos denominando de Núcleo de Atividades Identitárias (NAI).
Foram identificadas situações de violência simbólica, as quais vivenciam as(os)
enfermeiras(os). Essas situações são, provavelmente, fruto de uma inserção prática pouco crítica,
o que sinaliza a necessidade de se discutir mais sobre política junto a esses profissionais.
Os resultados deste estudo podem contribuir com a elucidação das dinâmicas de
poder no campo, permitindo às(aos) enfermeiras(os) reconhecer situações de violência simbólica
e como melhorar sua performance no referente às relações de poder implicadas na produção do
cuidado, sabendo melhor se movimentar pela dimensão política do cuidar.
Assim, o desenvolvimento da politicidade dos enfermeiros e enfermeiras é
estruturante para que sejam capazes de reconhecer essas relações de poder e envidar esforços
para se movimentar por essa dimensão, provocando movimentos de resistência e/ou disruptivos,
podendo resultar em melhores resultados na consecução do cuidado aos usuários ou nas
condições de trabalho, o que, possivelmente, se refletiria em mais reconhecimento social dessa
profissão.
112
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130
Prezado(a) Colaborador(a),
O(A) Sr.(a) está sendo convidado(a) a participar desta pesquisa que irá investigar as
repercussões da dimensão política do cuidado do enfermeiro no processo de trabalho e na
expressão do habitus profissional. Esta pesquisa tem como objeto de estudo a dimensão
política do cuidado, ou seja, a teia de relações de poder estabelecidas pela equipe durante a
prestação do cuidado e de como essa dimensão influencia nesse mesmo cuidado.
O interesse pela realização do estudo emergiu de experiências profissionais, no âmbito da
Estratégia Saúde da Família, atenção hospitalar, Centro de Apoio Psicossocial e na atuação junto
à entidades de classe, de como a politização dos profissionais pode interferir na prestação do
cuidado, de forma que, muitas vezes, isso pode ser definidor para as terapêuticas obterem
sucesso ou não.
Neste sentido, e no contexto da enfermagem e saúde, acredita-se que a realização do estudo
possa repercutir: no ensino, contribuindo para que novos conteúdos sejam trabalhados, e assim,
consiga-se desenvolver mais a politicidade dos estudantes; na pesquisa, estimulando produções
que se detenham a analisar os múltiplos fatores que compõem essa dimensão do cuidado de
enfermagem e em saúde; na assistência, podendo estimular o desenvolvimento de competências
que impactem no processo de trabalho dos enfermeiros e técnicos de enfermagem; na gestão,
com a clarificação e maior visibilidade desta dimensão do cuidado, este estudo pode contribuir
para subsidiar uma melhor atuação dos enfermeiros gestores, uma vez que estes desenvolvem
atividades de direção e coordenação, o que estão diretamente ligadas a dimensão política.
você.
5. CONFIDENCIALIDADE: todas as informações que o(a) Sr.(a) nos fornecer, ou que sejam
conseguidas por nós a partir de sua participação, serão utilizadas somente para esta pesquisa.
Suas RESPOSTAS ficarão em segredo e o seu nome não aparecerá em lugar nenhum
(ENTREVISTAS, GRAVAÇÕES), nem quando os resultados forem apresentados.
Se desejar obter informações sobre os seus direitos e os aspectos éticos envolvidos na pesquisa
poderá consultar o Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Saúde e Gestão Hospitalar.
7. RESSARCIMENTO DAS DESPESAS: caso o(a) Sr.(a) aceite participar da pesquisa, não
receberá nenhuma compensação financeira.
132
__________________________________________________
Assinatura do participante
________________________________________________
Assinatura do Pesquisador
133
1 Caracterização
Codificação (iniciais do nome): Data: Cenário/local: ( ) hospital ( ) PSF sexo: ( )
masculino ( ) feminino
Idade:
Graduação: Ano:
Tempo que atua na APS/HOSPITAL atual: Experiência em outro serviço de saúde similar: ( ) sim
( ) não
2. Você poderia descrever que atividades o enfermeiro realiza? Que atividades você considera que
caracterizam a atuação desse profissional?
3. Qual sua percepção sobre a repercussão do trabalho do enfermeiro, seja para os pacientes, seja
para os demais profissionais? Como você acha que os pacientes percebem o trabalho desse profissional?
médicos e fisioteraopeutas : por que vc acha que o enfemrio não consegue visibilidade?
4. Você acha que os pacientes conseguem diferenciar os profissionais da saúde na prestação do
cuidado? A partir de que elementos eles os conseguem diferenciar?
5. Quais as facilidades e dificuldades encontradas na realização de suas atividades profissionais, no
tocante a interação com os outros profissionais?
4. Qual profissional/categoria você acha que mantém mais relação/interação com os demais atores
do processo de cuidar (outros profissionais, familiares, acompanhantes, gestão, etc)?
5. Quais profissionais você mais interage para a execução do seu trabalho? Como se dá essa
interação? Qual mais influencia no seu trabalho e porquê? (investigar as relações de poder sem citar
poder). Como você considera o nível de poder dos enfermeiros ? Acha que o enfermneiro mais exerce
poder ou sofre com o poder exercido pelos outros profissionais? Porque o enfermeiro não tem
visibilidade?
6. Quais principais dificuldades para a execução do seu trabalho diante da equipe interdisciplinar?
(investigar as fragilidades relacionadas ao poder).
7. Já passou pela situação de ver o colega ou outro profisisonal) fazer algum procedimento errado mas
não conseguir falar ?
Por que não conseguiu?
8. Você consegue desempenhar suas atividades com autonomia?
9. Acha que todos os profissionais detém o mesmo poder (conceito: capacidade de influenciar processos)?
Por que uns têm mais poder e outros menos? (descobrir quais capitais mais valiosos)
10. Acredita que por ser homem ou mulher isso resulte em doferenças nas relações profissionais?
11. Para você, o que seria um profissional de saúde politizado?
Para prosseguir, explorar a ideia de política do participante, discutir e informar qual a definição de
política e politização adotada no estudo.
12. Como você acha que a politização interfere no trabalho entre os profissionais? Dê exemplos?
13. Como você percebe as relações de poder no trabalho? Como e onde você se encontra nessas relações?
4° BLOCO: FRUSTRAÇÕES, DESEJOS, SONHOS, EXPECTATIVAS DE FUTURO,
PERSPECTIVAS DE MUDANÇA.
Quanto às dificuldades na interação multiprofissional, que estratégias você utiliza para enfrentá-las?
Como a equipe enfrenta essas dificuldades de interação? (investigar relações de poder).
135
Sobre essas dificuldades, acredita que possam ser superadas? Como a instituição lida com esses
problemas?
Quanto à sua vida profissional, quais suas perspectivas nos próximos 10 anos?
E na instituição, quais suas expectativas para os próximos 10 anos? Se deseja sair antes desse período,
explique o motivo.
1.Você poderia descrever o seu processo de trabalho (enfermeiro) e quais atividades você considera que
marcam/caracterizam esse trabalho (atividades que somente o enfermeiro realiza)? Quais as facilidades e
dificuldades na realização dessas atividades, no tocante a interação com os outros profissionais?
2. Qual sua percepção sobre a repercussão do trabalho do enfermeiro, seja para os pacientes, seja
para os demais profissionais? Como você acha que os pacientes percebem seu trabalho? Como você acha
que os outros profissionais percebem seu trabalho?
3. Você acha que os pacientes conseguem diferenciar os profissionais da saúde na prestação do
cuidado? A partir de que elementos eles os conseguem diferenciar?
4. Qual profissional/categoria você acha que mantém mais relação/interação com os demais atores do
processo de cuidar (outros profissionais, familiares, acompanhantes, gestão, etc)?
5. Quais profissionais você mais interage para a execução do seu trabalho? Como se dá essa interação?
Qual mais influencia no seu trabalho e porquê? (investigar as relações de poder sem citar poder)
6. Quais suas principais dificuldades para a execução do seu trabalho? Que medos impedem você de
realizar seu trabalho ? o receio de entrar em conflito limita o seu trabalho ? o medo de represálias ou
retaliações pode interferir no seu trabalho? Se sente ou já se sentiu oprimido no trabalho?
7. Você consegue desempenhar suas atividades com autonomia?
8. Já passou pela situação de ver o coelga (enfemrio ou outro profisisonal) fazer algum procedimento
errado mas não conseguir falar ? Por que não conseguiu?
9. Acha que todos os profissionais detém o mesmo poder (conceito: capacidade de influenciar processos)?
Por que uns têm mais poder e outros menos? (descobrir quais capitais mais valiosos, explorar relações de
poder).
10. Acredita que por ser homem ou mulher isso interfira em suas interações com os outros profissionais?
(traga mais ou menos poder)
11. O que seria um enfermeiro politizado?
Para prosseguir, explorar a ideia de política do participante, discutir e informar qual a definição de
política e politização adotada no estudo.
12. Como você acha que a politização interfere no trabalho do enfermeiro? Dêexemplos?
13. Como você percebe as relações de poder no trabalho? Como e onde você se encontra nessas relações?
14. Você acha que o melhor entendimento sobre a dimensão política do cuidado, relações de poder,
capitais, pode ajudar no processo de trabalho do enfermeiro? Como?
Você sabe que existe uma dimensão política não porque vc ve, mas porque sente. vc sabe que existe pelos
seus efeitos: medo, vergonha, constrangimento, frustração, receio, sensação de ser impedido, de ser
calado, todos os sentimentos que limitam a liberdade de expressão dos enfermeiros
137
15. Quando as decisões da gestão estão em desacordo com o que vc pensa, e podem prejudicar os
pacientes ou os profissionais, como vc se sente? Como vc faz para tentar resolver?
4° BLOCO: FRUSTRAÇÕES, DESEJOS, SONHOS, EXPECTATIVAS DE FUTURO,
PERSPECTIVAS DE MUDANÇA.
Quanto às dificuldades de interação, que estratégias você utiliza para enfrentá-las?
Como a equipe enfrenta essas dificuldades na interação? (investigar relações de poder). Sobre essas
dificuldades, acredita que possam ser superadas ?
Como a instituição lida com esses problemas?
Quanto à sua vida profissional, quais suas perspectivas nos próximos 10 anos?
E na instituição, quais suas expectativas para os próximos 10 anos? Se deseja sair antes desse período,
explique o motivo.
APÊNDICE D – ROTEIRO DA OBSERVAÇÃO NÃO PARTICIPANTE