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cervengdes na satide publica, bem como se incia e controle da saiide de logias, Em A Vontade de Saber (2010), 0 mesmo autor trata da relagio entre os saberes, priticas ¢ politica no controle da populacio. A epidemiologia dos fatores de risco confere a cada um & responsabilidade da modulagio de seus habitos visando 8 con servagio da sade e prevencio de doengas. Apesar das questOes pelas correntes e discursos alternativos, é incontes ia do risco’ que se aprimorov 1a metade do século XX. Esse opera- leva 1a hegemonia da ‘epidemi rogressivamente a partir da segund: p hegemonia foi possibilitada nao apenas pela sua eficicia tiva, mas também pelo contexto sociocultural mais amplo, C236 idcologias voltadas para um crescente individualism> figuram o tema do capitulo + Akgns aspectos acerca do sisco cont alo Discurso 00 Risco | Se o estado de satide € favorecido por condicoes de vie adequadas, por conta de investimentos diversificados em ampl setores da politica publica, as agdes do campo circunscrito da saide se orientam privilegiadamente pelo enfrentamento de doengas especificas mediante identificacio de causas também especificas. Agdes, tanto coletivas como individuais, pautam-se por aval leradas legitimas para evidenciar relagdes causais entre exposicdes e doengas. As chamadas doencas trans- inauguraram, no século XIX, a racionalidade epidemio- logica moderna, com controle das doencas infecciosas por meio gia. Ainda no contexto do estudo de doengas transmissi a determinagio da sua causa microbi wecems € o8 que adoecem apresentam um espectro vax le gravidade, Essa constatagio tativas, ca ; Fi "vas, cujas causas nio eram difetamente identificiveis, houve In | : 1 maior investimento no deser avolvimento das téenicas de anilise 3m nome dessa finalidade, todas demais variiveis precisam estar sob controle, Para inferir 0 risco de um fator ou de um grupo de fatores, deve-se buscar observa de modo independente, € hoje uma important tividade cienti voltam-se tanto para a determinagao d Ss quanto pai embasar a incorporacio ¢ continu doen ea da satide, Identificare red na profilaxia de doencas, seja na técnica terapéutica, € um dos principais objetivos da satide publica (Almeida Filho, Castiel & ‘Ayres, 2011), A gestio de riscos é um dos eixos do discurso da promocio da sade. A nogio de risco pode ser abordada por diferentes Gmologica, histérica, sociocultural. As anélises jue produzem uma ideia de cientifi- mentos técnicos n: perspectivas: epistér de risco, a0 mesmo tem] cidade ¢ dio legitimidade aos discursos ¢ procedimentos médicos ~ simbolicas que merecem ser eS Tudadas. Os enunciados relativos aos fatores de tisco produzem Gfeitos na construgio e transformacio do conceito de doenga € modos socials e culturais de lidar com ela. wee exnados epidemiotipicos voltados para a pesquisa 40 ‘Os estudos epidemioldgicos voltados para a pesquisa d mantém como ideal de rigor 0 estudo ia moderna. Em um experimento, ores que possam interferir 10 liar uma relagio de trazem consequencias s0 risco sio observacionais ¢ n ‘experimental, padriio da ciénei 3 logica € controlar todos os fa processo criando-se condigdes ideais para av causa ¢ feito. O protocolo expe! = comparacio entre a ocorréncia do evento srimental deve estabelecet con diante da digdes de uma causa, ou Construir um model de um conjunto de causas, exige um processo de ‘purificagio’. | iio’ assumit algumas premissas que viabilizam 0 modelo, do os elementos que se deseja observar, A medida que o 0 fendmeno passa a ser apreendido me- e uma representagao que, a0 mesmo tempo que viabiliza sua operacionalizagio, reduz sua complenidade. ‘J abordagem do risco ‘redu7’ os fendmenos estudados, por e ‘m, pelo seu aprimora: ‘mento, avaliagdes mais precisas, sobretudo no que se refere A interagio entre causas eA identificagio e afastamento dos cojonn- dings (Caeresnia & Albuquerque, 1995), © caleulo do risco provém de uma populagio de estudo constituida por unidades independentes entre si. Sua a uma média abstrata que no corresponde a qualquer pessoa ou eee grupo especifico, A me do individuo ou grupo, necesita de uma intermediacio que (0 ser utilizada ou atribuida a deter- "ve em conta o conjunto de circunstincias de cada caso. Profi ais da satide, tanto na pritica clinica individual c aces de satide publica, devem ter condigdes de interpretar ‘lequar uma medida genética de risco a0 contexto da pessoa ou populagao. No entanto, o risco mi vezes ass “es assumido sem telativizagio, Essa adequagao exige uma competéncia que wi ipeténcia que 'm do conhecimento técnico no sentido no lio € muitas La grau de bom senso no uso pessoal de ecessirio certo Olhando afirmar que nenhu- ma estrutura individualizada, em qualquer ni lo metodoligico do tisco. “Tal premissa apresenta restrigGes Obvias, por exemplo, na avalia- cuja teoria constata que o do risco de doengas transmissivei seus proximos. Além dessa restrigio especifiea, risco, supor que a individu se expde a circunstincias afetivas,sociais ta da logica do método, re- podemos, entretanto, refletir em que , podemos, entretanto, sefleu em ;oderia levar & pro- Sabemos que, se do ducoes si0 inevi medida a adesio aos enunciados cien dugao de artefatos que estreitam as possibilidades de compreen- ‘io e intervengio sobre a realidade. eee ble Ssscs “apagamentos’ nao sio neutros, as opgdes metodo s ‘apagamentos’ no s20 neutros, fas por concepgaes de mundo, valores, neces: Jidades. Os instramentos eas téenicas de pesquisa produzem cas sao condicionad: nesse conhecimento, agir. Ao serem escolhidos temas, cau odos, el sages secem legitimadas como ‘verdade’ : Nosssos modos de ser e agir acabam por ser configueados sob que tenham forca cequivalente na produgio © imposigio de discursos ¢ atitudes dos a lidar com a satide ¢ a doenga. No mundo contem- neo, as construgdes de corpo, de vida saudivel e dos modos a estilos de vida considerados benéficos ou prejudiciais si0 | | o das opcdes do dia a dia. F por meio dos estudos de risco io avaliados os efeitos do consumo de pro- a tais enunciados ¢ sua incorporacio sas representagdes € decisdes pode nos ajudar a discernir sos que nos determinam histérica ¢ culturalmente, ampliando a margem da nossa relativa liberdade de escolha 20 “ima forma propria de compreender a realidade — 0 método tem TTorga de construf-la de acordo com interesses que nio aparece orporagio acritica das reduces, ica interna do método de pso", mas sim a cons- fio é simplesmente um ‘la Sse trucio de uma visio de mundo interessada. Ao se optat Por & ta-se por um modo de conhecer e, com base ao} ‘mostrar a propriedade da aplicagio de certos enunciados gene lar comportamentos, criando ou desestimu- ta le risco epidemi igico e \dos a pensar em as- das pessoas com a propria said vida social. ontagio. Retomar essa historia permite estabelecer conexdes entre a compreensio sobre 0 adoccimento, MO S40 C0 as Felagoes entre os homens, a 7 mecitos de doenga se configuraram ar com enfermidades recorrentes em tentativas de deter agravos lagoes, por ordens civ 1s cientificos € Sone permitiram o aumen- microbiologia conferiv s elementos, uma ver a das doengas. to da expectativa de vida. O advento cientificidade 4 teoria da infeecio, conhecidos, geraram protocolos visando a profila progressos da microbiologia os avangos vacinas como t€e- Acrescentaram-se 208 smpo da imunologia ea proliferagio da nica especifica de prevengio. Ainda que as informagdes acerca das novas possibilidades criadas pela cigncia tenham se disseminado, os dados objetivos ragio e independéncia nogio de individuo. Tal nogio implica uma determin: » de corpo, de seus modos de funcionamento ¢ das formas de intera¢io com o ambiente. As repercussdes de tais concepgdes de individuo ¢ corpo vio lém da formulagio dos cones o decor ss séculos XIX € XX consolidaram-se represeniagoes de corpo que viio em diregio a ou convergem com o individualismo ‘crescente na Sociedade contemporanca, As pessoas si0 Tevadas s de satide € doen | | | | | . ‘mantenha relacoes com 0 meio, estas se de forma prevista pelas estruturas que o integram. O orga- ‘smo uni ou pluricelal | | i Molokai 0 * ~%. XX1 > Herp, ME Fo het ables auyoina, savasdes por outros organismos (como no e380 do pleasitsms e doeneas infecciosas em geral). ‘A sociedade moderna foi construida predominantemente sobre a crenga do ser humano como uma esséncia que se des- vela ao longo da existéncia, A ideia é a de que somos previamen- te moldados e, portanto, as relagdes que mantemos com o meio ‘manifestam-se como oportunidades para a revelagio de certas predisposigdes. As faculdades da inteligéncia e da vontade esta- riam contidas nessa configuragio prévia que aos poucos se samente independentes das interagdes so- iza, sendo relat ssim, cada qual constituiria uma unidade isola atu cioambientais, dae fechada sobre si mesma, os outros caracterizando-se apenas como parte do meio, Os conceitos de autonomia, liberdade e moral postos pela modernidade derivam dessa versio individu- alista do ser humano. Nosso ponto de problematizagio versa sobre a nogio mo- de biologica, psiquica ¢ social. Ou, ainda, a ideia de que ha em. igerme, desde o primeiro instante da vida, 0 que seremos, inde- pendentemente dos acontecimentos que se produzam entre 0 ‘momento presente € 0 fururo. O individualismo moderno tem como sentimento derivado a autossuficigncia, isto é, a percepeao de seres completos, quando Ta consciéncia da incoripletade, 0 reconhecimento da propria inaptidio ou fragilidade que possibilita o sentimento de empatia © 05 agos de solidariedade, Ao nos reconhecermos como autos one ee suficientes, a imagem do outro se torna, em vez de necesshria t suficientes, a imagem do outro se torna, em vez de necessiga 3, nossa plenitude, ameaga. Diante de uma identidade completa, Unley x umeetliya (Pee) | constituida, qualquer alteridade, quaisquer ‘outros’ deixam de ser pensadlos como integrantes de um ‘eu’ em uma permanente re- lagio ¢ constituigio dinémica. Se o outzo se torna predominan- temente ameaga, afitma-se a I6gica da defesa incondicional da integridade de si. Ao pensarmos o ser em um processo de autocriacio continua, alimentada a cada nova interacio, realgamos a compreensio de que 0 outro é nio s6 possibilidade de plena manifestagio do ev, como constituinte de sua identidade. Assim, pensar a defesa como principal tatica de manutengio da integridade —a adogio ‘de uma posicao defensiva em relacio a tudo 0 que € outro — ba por desvalorizar a vitalidade presente na criatividade {tanto psiquica quanto bioldgica) originada a cada encontro, reduzindo as possibilidades de crescimento ¢ transformacio, A Igica da defesa acima de tudo acaba por transformar-se em petigo. Sea vida se afirma diante de novas opgdes que no estio sempre sob controle, ha que considerar a existéncia de riscos como um aspecto intrinseco aos processos de mudanga neces” Sitios i superagio de antigos padrdes Se por um lado a certeza é um atributo desejavel no momento dle fazer uma escolha, por outro lado, incertezas sio inerentes Essa reflexio deve ser levada em conta quando constatamos como, nos nossos dias, questdes acerca de hébitos cotidianos, modos de comportamento e estilos de vida sio correntemente ‘istas na perspectiva do risco, Alimentos sio benéficos ou pre- = Exposig6es ambientais sao fatores de risco para diversos tipos de yr Outros mais inventivos. coplasias. Quase sempre 0s riscos se confrontam com ic Junie x reonlods, | prey a vontade: por exemplo, 0 desejo de ter um corpo bronzeado implica exposigio A radi ibrit mao deste atri- estético em nome da prevengio do cincer de pel que diversos assuntos sobre os quais se deve envolvem aspectos que vio além do racional, Considerar os elementos que orientam a escolha tores relevantes para a saide © 0 bem-estar, precisamos levi-los ‘em conta no discurso eatitudes na pritica de promocio da sade. ‘A ‘tecnologia do risco” desafia tas imposicbes' ci es adesio incondicional a um estilo de vida restrito 3 ligiea do isco somada A compreensio do individuo como unidade inde- ee ——————rerre pendente exacerba uma conformagio cultural que, no extremo,, ilizarias, ju a base dos desalios que se apresentam na comunicagio sderia levar a situacdes de pobreza de lacos sociais ¢ isolamento. “Toa da ide phe . Tratamente & informacao sobre a associagao entre fatores de .do-se de um discurso cuja légica é predo- minantemente cientifica. Eo desejo, obviamente, no obedece & eee aca eae mesma regen Achamos des risco e doengas, val cel um corpo sadio. Por sua vez, a sociedade entares a situagdes que pro- a cultura incorporam habitos al piciam o encontro, o convivio gerador de momentos de prazer; de certos tipos de carne e bebidas ‘oélicas como uma opgio saudivel, no entanto sabemos da das horas alegres passadas na companbia de amigos datas festivas por tradigdes culeurais que perduram. © pertencimento a grupos implica a adesio a certos tipos de comportamento ¢ habitos de consumo, ¢ tal relagio pode ser fa- cilmente constatada ¢ mesmo traduzida em niimeros, em estats- os mostram, por exemplo, o aumento do consumo de entre jovens de ambos 0s izagio existentes, ticas que cada vex mais precocemente, sexos. Se esse é um aspecto das formas de social «sea criagio e a manutencio de lagos socixis sio vistas como Fe 61 (0 discurso do risco deixa de lado 0 quanto é necessitio jar a compreensio sobre as atitudes configuradas no encontro eee a“ entre 4 informagio as motivagGes intimas que determinam 0 comportamento dos individuos € grupos. Hi outro aspecto na discussio sobre a multiplicacio dos es- tudos de avaliagio da eficacia de procedimentos ¢ téenicas mé- dicas mediante andlises de risco. Se tais investigagdes conferem legitimidade a0 conhecimento produzido em sua aplicagio na atencao a satide, devemos considerar que nem todas as pessoas «Gm acesso igualitirio tanto As novas tecnologias, quanto a con- Aigdes de vida (alimentagio, trabalho, transporte, lazer ete) que ‘orecam uma boa satide, Condigoes decorrentes dos modos de vide originados das formas de organizacio social, problemas derivados da desigualdade e hibitos culturais sio geradores de sio, atualmente, importantes causas de morbidade € inde. Doencas decorrem de circunstincias de vida, e grande par- : dos elementos envolvidos nessas circunstincias est fora do ‘cance da agio dos individuos afetados. ‘Estilos de vida’ sio ee le adotados pelas pessoas mediante escolhas que se configuram liberdade desejo de cada mico, social € cultural, o acesso. levando em conta a margem di ‘um, mas também o nivel ecor bens e servigos. Quando doeneas incidem em s', surge a suspeita de sua determinacio ser mais ampla e de dever ser analisada e tratada também no im- bito da sociedade. Diante da ocorréncia da doenca, o papel das escolhas indivi- ‘cardiovasculares, por exemplo, nio resultam apenas da mi gestio dos tiscos (alimentagao, sedentarismo, fumo etc), mas so pro- duto de disp Consideremos a escolha de um padrio alimentar que resulta de diversas influéncias, as vezes contradit6rias. Em tal escolha so levados em conta aspectos tio variados quanto 0 padrio estético valorizado pelo individuo ou o grupo ao qual pertence, 0 modo de producto ¢ distribuigio de alimentos, a publicidade outras formas de estimulo a0 consumo. Certas marcas de re- frigerantes grandes redes de fastfood sao associadas 4 imagem de juventude, dinamismo, alegria. Alimentos industrializados, processados, com alto teor de farinha, agticar gorduras satura- das, como 05 biscoitos recheados, aparecem como opgio viavel palativel e acessivel, por exemplo, para a alimentagio infantil. Os meios de comunicagiio de massa sio fartos na apresenta> «a0 de programas ¢ reportagens sobre satide c bem-estat, assim como sobre o potencial ‘adoecedor’ de nossas escolhas, mest? ymplexas. > as aparentemente mais banais. A penetracio do ideatio do risco é tamanha, que fatores de risco so temas recorrentes de conver- Sa nos mais diversos ambientes, , na auséncia de uma causa es pecifica, proliferam-se integrados as teorias ¢ a explicacio da origem das mais variadas doencas. sebhin inch hrvotlita Le nts por ot An Livarse’ de eEstacts [a9 DINA CZERESNIA ELVIRA MARIA GODINHO DE SEIXAS MACIEL RAFAEL ANTONIO MALAGON OVIEDO Os Sentzp0s pA Sadpe E DA DoENcA Copyright © 2013 dos autores ‘Todos os direitos desta ediggo reservados i Capa, projetogrifico eeditorgio Corte Ras Revisio Ages Ports Avalle Canalogasio wa fate Insotuto de Comuniasio Iformaco Genta e Tenaga em Saide/Fioeaz | Bibione de Suid Pilea ' (C0986 Ceereseia, Dina (Os sens da sade da doenca./ Dina Czeresnia, Eins edtora@iocruz-be ba: / fone focruz be Sumario Apresentagio 1. Sentidos da Saiide 2. Transformacées dos Conceitos de Satide e de Doenca 3. Prevencio de Doengas e Promogio da Satide no Século XX. 4. O Discurso do Risco 5. Teorias de Doenga Para Finalizar Referéncias Sugestdes de Leituras 39 7 1 113, 117

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