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texto cafona #1
confluência
CARLA BRAGA
1 DE DEZ. DE 2022

confesso que nunca fui muito de frequentar


os shows de artistas locais, tento não
conhecer meus ídolos para não me
decepcionar. mas um dia, andando nas ruas
do bom fim, entendi porque a alpargatos
decidiu retratar os anseios porto-alegrenses
em suas canções. o céu queimado da oswaldo
aranha junto do frescor de um suco de
laranja da lancheria capturam a essência de
cidade provinciana. nos fones, escuto a única
música de amor deles: confluência.

conheço pessoas que começaram a morar


junto depois de uma semana - foram ficando,
ficando e ficando. daí a casa de uma era mais
perto do trabalho da outra e assim
permaneceram até hoje - e outras solteiras
convictas. apesar de já terem me falado que o
amor é um sentimento universal, acho que
afonso é o único que me entende. a frase “eu
posso vir desgovernado, confundir minha
boca e a tua e atropelar você” me assombra.
ela é tão caótica e violenta que eu mesma
poderia ter escrito. um amor visceral,
enrolado e, como ele mesmo diz, com
coração na contra-mão. quando eu me
apaixono sinto que meu peito erra as batidas
e é sempre desesperador. o histórico de
rejeição e micro-violências me tornaram uma
gata arisca. amar eu até amo, mas do meu
jeito, no meu tempo. digo mais: com o
coração na contra-mão na mão.

relutando, contra meus próprios ideais,


decidi ir atrás de afonso, o vocalista, para
entender de onde partiu esse sentimento. o
motivo dele escrever tanto sobre o cotidiano
e ao mesmo trazer numa música romântica
uma sensação tão abrasiva. coloquei na
minha cabeça que eu poderia me dar ao luxo
de ser uma tiete, tudo pela arte, tudo pelo
(auto)conhecimento. depois de muito
procurar, localizei o artista e conversei com
ele pessoalmente sobre o significado do
amor. ele me contou uma história que de tão
ordinária, tornou-se extraordinária. quando
ainda estava na fase de flerte do
relacionamento, a guria literalmente o
atropelou e ele teve alguns hematomas leves.
as feridas o lembravam do acontecido e,
apesar de doídas, traziam a doce memória
dela se aproximando super sorridente e, por
estar tão concentrada nele, perdendo o
controle. sorri e passa do ponto. te
descontrola e te desconcerta. dói e cura.
morde e assopra. atropela e dá beijinho pra
sarar. assim eu entendi que o amor é o que se
vive entre os finais e o caos, o meio entre
beber para celebrar e fumar para esquecer.

esse texto é um exercício da oficina “escritas de mim”


da tayná saez a proposta era construir um texto no
qual:

1. a primeira palavra começasse com a primeira letra


do nosso nome

2. fosse inserido a 3a frase da 3a página do 3o livro da


nossa estante. o meu foi: tudo sobre o amor da bell
hooks.

é tudo fake. mas a música é de verdade.

Foto por Ana Sedrez (ig @tamastucomeoque).

eu avisei que era cafona!

a banda existe e você pode escutar a música


que eu citei aqui.

nem gosto muito desse texto, mas não tenho


produzido muito e não queria deixar a
newsletter morrer. e lembrei que meus
heróis cronistas escreviam praticamente
todo santo dia, então tiravam leite de pedra.
vou me inspirar nessa resiliência e buscar
fazer o mesmo. em 2023 teremos mais textos
cafonas, além das cartas - que, apesar de
cafonas, eu acho que mando bem.

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1 Comment

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rafa Dec 1, 2022


to aqui no meio de uma crise de ansiedade e
depois de um rivotril foi seu texto cafona e "não
tão bom" que acalmou o coração
conturbadíssimo. literal e figurativamente.
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