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CIP-Brasil.

Catalogação-na-Publicaçao
Câmara Brasileira do Livro, SP

Salem, Helena.
S155o O que é questão palestina / Helena
Salem. — São Paulo Nova Cultural :
Brasiliense, 1986.
(Coleção primeiros passos ; 74)
Bibliografia.
1. Árabes na Palestina 2. Relações
judeus-árabes I. Título. II. Série : Pri­
meiros passos ; 74.

85-1621 CDD-323.1192705694

Índices para catálogo sistemático:


1. Árabes e judeus : Palestina Política
323.1192705694
2. Israel : Questão palestina Política
323.1192705694
3. Palestinos Grupos nacionalistas : Relações
com Israel Política 323.1192705694
Helena Salem

Oqueé
QUESTÃO
PALESTINA

HOVA
CULTURAL Editora Brasiliense
R evisão: José W. S. Moraes
Jane S. Coelho

© Copyright 1982, by Helena Salem


© Copyright desta edição, Editora Nova Cultural Ltda.
e Editora Brasiliense S.A., São Paulo, 1986.

Publicado sob licença da Editora Brasiliense S.A., São Paulo.


r

ÍNDICE

— A presentação................................................. 7
— 0 sionismo e o aparecimento da
Questão Palestina.......................................... 10
— Os palestinos, povo erran te........................... 29
— A resistência palestina ................................. 44
— O estado palestino ........................................ 69
— Os palestinos e a conjuntura
internacional ................................................. 80
— Conclusão: a paz possível............................ 95
— Indicações para le itu ra ................................. 99

V.
Para Nelson,
com panheiro querido de tanta vida.
APRESENTAÇÃO

Talvez mais do que qualquer outro problema da


mesma natureza, o conflito árabe-israelense, e
particularmente a questão palestina, são temas de
difícil dicussão. Não apenas por serem extrema­
mente complexos, ou por sua imensa gravidade no !
cenário internacional, mas sobretudo pelas emo­
ções que despertam, pelo profundo intrincamen-
to geralmente vivido entre as questões políticas
e religiosas e/ou emocionais. Via de regra, o pro­
blema é colocado nos seguintes termos: "ou
comigo, ou contra mim; ou meu amigo ou meu
inimigo".
Com este pequeno livro, aceitamos alguns
desafios. Primeiro, o de separar questões que,
apesar da habitual mistura, são efetivamente distin­
tas. Ou seja, a questão palestina, o conflito árabe-
israelense são problemas essencial mente políticos.
v.
8 Helena Salem
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E, como tal, podem — e devem — ser tratados
com "cabeça fria", em seus vários aspectos, sem a
pressão do "bem " e do "mal". Isso não significa
que não se tenha uma opinião, um posicionamento.
Ao contrário, apenas que esse posicionamento
possa ser discutido racionalmente, baseado em
dados da realidade, sem maniqueísmo. Parece-me
que no momento em que árabes matam árabes
(no Líbano), em que judeus discordam de judeus
(em Israel e no resto do mundo, em relação ao
\ governo direitista do Likud, fica mais do que
J evidente que a questão não é apenas árabe ou judia,
U f muçulmana ou israelita, mas de fato política.
O segundo desafio que encaramos é o de tentar
Ér escrever de uma forma simples, a mais clara possí-
I vel, sobre um assunto tão complexo e, em geral,
mal conhecido. A questão palestina está de tal
forma envolvida por tantos fatores internos e
externos à região que, não raro, o observador
comum se perde naquele emaranhado aparente­
mente incompreensível. Meu objetivo é justamente
contribuir, de alguma maneira, para que esse
observador consiga mais facilmente entender os
nós da questão, seus meandros, no contexto local
e internacional.
Pessoalmente, não acho que se auxilie em
alguma coisa na segurança do Estado de Israel
compactuar com o seu expansionismo e a sua
política de negação dos direitos nacionais de um
outro povo, os palestinos. O anti-semitismo não
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í
O que é Questão Palestina 9

' ----------------------------------------------N
deve ser combatido com uma nova mistificação,
mas com a coragem da razão, da justiça. Também
não acho que se possa ser um bom amigo dos
palestinos (como aliás de qualquer outro povo), se
se perde o espírito crítico, a capacidade de discutir
os erros e limitações de sua liderança — no
caso a OLP.
Sendo este um livro de introdução, vimo-nos
na contingência de apenas suscitar uma série de
pontos, sem poder aprofundá-los. Limitações
certamente inevitáveis em um trabalho desta
natureza. No entanto, se este pequeno livro servir
para desvendar um pouco mais o emaranhado
da questão árabe-israelense, para desbloquear
o forte emocionalismo em relação ao problema,
já nos daremos por satisfeitos, pois nosso objetivo
foi alcançado.

f
O SIONISM O E O APARECIM ENTO
D A Q U ESTÃ O PA LESTIN A

Apesar da violência e profundidade que caracte­


rizam hoje o conflito árabe-israelense no Oriente
Médio, ele tem raízes muito recentes, no início
deste século. "Primos" na origem, ambos semitas,
os povos árabe e judeu mantiveram ao longo da
história relações de harmonia. Inclusive, durante
a ocupação árabe da Península Ibérica (711-1492),
os judeus conheceram um período de liberdade
e florescimento cultural naquela região. Também
as pequenas colônias judaicas remanescentes no
Oriente Médio viviam em absoluta paz com a
maioria muçulmana, há menos de um século.
Assim, não há qualquer fundamento nos argu­
mentos que pretendem explicar o conflito violento
de hoje entre árabes e judeus do ponto de vista
religioso ou pseudo-racial. Trata-se de uma questão
l ____________________ ____________________ J
0 que é Questão Palestina 11
----------------------------------------------------------------- -
essencial mente política, gerada por fatores
políticos, sociais e econômicos bastante precisos.
Mais concretamente, pode-se afirmar que a disputa
entre árabes e judeus começa com o advento do
sionismo e a implantação sionista na Palestina.
Em meados do século XIX, a maior parte dos
judeus vivia na Europa Oriental, sobretudo Polônia
(mais de 1 milhão), Lituânia, Rússia, Hungria.
Tradicionalmente, eram pequenos comerciantes,
representantes da economia de mercado no mundo |
feudal. Faziam o comércio de longa distância 1
(de produtos de luxo para os nobres e monarcas),
eram os proprietários dos negócios locais, empres­
tavam a camponeses e senhores feudais em crise,
aos reis em sua luta contra os nobres, enfim,
constituíam um verdadeiro "povo-classe", conforme
bem qualificou o historiador belga Abraam Leon.
Fazendo o comércio e a usura à margem do
modo de produção feudal, os judeus viviam por­
tanto "nos poros da sociedade polonesa" (Marx,
A Questão Judaica) e demais países do leste
europeu. Só que, se durante a Idade Média feudal
os judeus puderam desempenhar o papel de "povo-
classe" em relativa harmonia com os demais
setores da sociedade (na Polônia, no século XVI,
cada cidade-mercado — shtetl — chegou até a
possuir um conselho administrativo próprio judaico,
com grande autonomia), no século XIX a situação
se transforma sensivelmente. E que, a essa altura,
começam a se desenvolver na Europa Oriental
J
12 Helena Salem

r "\
também burguesias nacionais, que vêem no
pequeno intermediário judeu um concorrente
indesejável.
0 abalo da ordem feudal nesses países, a revo­
lução industrial, com o conseqüente esvaziamento
dos campos e a migração de milhares de pessoas
para as cidades vão resultar na formação de um
grande e miserável exército de reserva de mão-de-
obra. Desemprego em massa. Desemprego que
atingia a todos, mas que as classes dominantes
locais tratavam de atribuir àqueles a quem
desejavam destruir, por serem seus concorrentes,
ou seja, os judeus. Além de que, evidentemente,
era muito mais conveniente para essas mesmas
F classes dominantes que o povo atribuísse a sua
desgraça não a quem tinha o poder —por exemplo
os czares na Rússia —, mas a terceiros: os judeus.
Assim, não se trataria de lutar contra o injusto e
repressivo regime imperial, mas contra os judeus,
que ocupavam os postos de trabalho dos russos. . .
Por isso mesmo, as autoridades dos Estados do
leste europeu, sobretudo da Polônia e Rússia,
encarregaram-se de estimular amplamente o ódio
aos judeus (o "homem do dinheiro", o "usurário",
aquele que, numa situação de crise, aparecia como
o explorador direto). Na Rússia, inclusive, freqüen-
tem ente as próprias autoridades czaristas chegavam
a organizar os terríveis pogroms (perseguição
violenta e matança de judeus). Essa situação de
crise e violência leva, então, milhares de judeus a
O que é Questão Palestina 13

N
emigrar, primeiro para a Europa Ocidental, e
depois para os Estados Unidos e América Latina.
Na Europa Ocidental, por sua vez, os judeus
eram pouco numerosos (haviam sido banidos de
lá, nos séculos XIII, XIV e XV, com a formação
de burguesias locais e a Inquisição) e estavam em
pleno processo de assimilação. O capitalismo
permitira a sua produtivização (deixando de ser
um "povo-classe” para se distribuir entre as várias
classes da sociedade, de burgueses a proletários) e
a Revolução Francesa abrira as portas para a sua
incorporação política e social. No entanto, a
chegada de milhares de imigrantes judeus no
século XIX, procedentes do leste europeu, à
procura de trabalho em um mercado já saturado,
ofereceria um pretexto para reavivar o anti-semi­
tismo nunca efetivamente superado naqueles
países. Em consequência, o judeu "emancipado",
francês ou inglês, teve sua vida também profun­
damente abalada.
Foi justamente nesse contexto social, político
e econômico que surgiu o movimento sionista
(de Sion, uma colina de Jerusalém), com a
proposta da criação de uma pátria para os judeus.
Antes, enquanto puderam viver relativamente
bem no mundo feudal, os judeus nunca pensaram
em criar um Estado para eles, e suas ligações com
a cidade santa de Jerusalém, na Palestina, eram
puramente religiosas, de peregrinação aos lugares
sagrados.
14 Helena Salem
.
Muitos foram os pensadores judeus, na segunda
metade do século XIX, que começaram a refletir
e a propor a formação de um Estado judeu. Entre
eles destacou-se o médico russo de Odessa, Leon
Pinsker, que, em 1882, após violentos pogroms em
seu país, escreveu Auto-emancipação: um apelo
ao seu povo por um judeu russo. Homem de
formação liberal, um assimilacionista até presenciar
ele próprio os pogroms, Pinsker, em sua obra, não
chegava a indicar um local para o estabelecimento
do "Lar Nacional" judeu. Apenas apontava a
sua necessidade, declarando:
) "Nossa pátria é a terra alheia; nossa unidade, a
diáspora; nossa solidariedade, o ódio e a inimizade
universais; nossa arma, a humildade; nosso poder
defensivo, a fuga . . . Não é a equiparação civil
dos judeus num ou noutro país que vai provocara
necessária mudança, mas, única e exclusivamente, a
auto-emancipação do povo judeu como nação, a
fundação de uma entidade colonizadora judaica
própria, a qual, dia virá, será transformada em
nosso próprio e inalienável Lar Nacional".
Ou seja, ao crescente nacionalismo europeu
que os repudiava, os judeus deveriam responder
também com o seu próprio nacionalismo. Chega­
mos portanto a uma primeira conclusão da maior
importância: embora evoque o passado remoto, de
pelo menos 2 mil anos, o sionismo é um movi­
mento historicamente novo, decorrente da crise
do capitalismo no século XIX na Europa e do
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O que é Questão Palestina 15

í ;
fortalecimento dos vários nacionalismos europeus.
^
Caberia ao jornalista austríaco judeu Theodor
Herzl a elaboração de uma proposta mais estrutu­
rada para o movimento sionista nascente. Como
Pinsker, também um assimilacionista até presenciar
o chamado "Caso Dreyfus", em 1894 (no qual
um militar francês judeu foi injustamente conde­
nado por espionagem num flagrante gesto de
anti-semitismo da justiça francesa), Herzl publicou
em 1896 O Estado Judeu (Der Judenstaat),
sugerindo a criação de um Estado nacional judeu
na Palestina, berço do judaísmo. O Estado pensado
por Herzl era, evidentemente, um Estado burguês
de tipo europeu. Inclusive, dizia ele em sua obra:
"Para a Europa construiríamos na região uma
parte da muralha contra a Ásia, seríamos a
sentinela avançada da civilização contra a barbárie.
Permaneceríamos, como Estado neutro, em relação
constante com toda a Europa, que deveria garantir /
a nossa existência". y
E foi com esse atrativo — de se tornar uma '
"sentinela" contra a "barbárie" — que Herzl
partiu em busca de aliados poderosos para a sua
empreitada. Primeiro, o Kaizer alemão Guilherme
II, que não se entusiasmou; depois, o sultão turco
Abdul-Hamid, também desinteressado, e, final­
mente com sucesso, a Inglaterra, potência que
viabilizaria o seu projeto, pois, sem o apoio de uma
potência colonial, o sonho de se criar uma entidade
nacional judaica no Oriente Médio árabe, naquele
^___________________ ____________________ J
16 Helena Salem '

( -------------------------------------------------------------------- ^
momento, seria impraticável.
Portanto, além de estar diretamente vinculado
à crise do capitalismo na Europa Oriental no
século XIX, de ter sido elaborado teoricamente
pelos judeus da Europa Ocidental (Herzl, um
austríaco), o sionismo associa-se também à
expansão colonial européia do fim do século
passado. Afinal, tratava-se de transferir uma
população mais desenvolvida, de judeus europeus,
^ para uma região pobre e pouco desenvolvida, a
Palestina árabe, coisa só possível com o apoio de

f
)
k
uma grande potência, no caso a Inglaterra.

E verdade que o movimento sionista também


incorporou em seu interior, ao longo dos anos,
importantes correntes de socialistas, que sonhavam
edificar uma sociedade igualitária no Oriente
Médio. Socialistas, inclusive, que tiveram uma
importante representação, eventualmente mesmo
hegemonia, no conjunto do movimento, até
aproximadamente a década de 40. No entanto,
nem por isso o projeto sionista desvinculou-se,
para sua efetivação, da expansão colonial européia,
especialmente inglesa.

A Palestina antes do sionismo

Ao se iniciar, na segunda metade do século XIX,


a imigração sionista, a Palestina integrava —junto
L . _____________________________________________
O que é Questão Palestina 17

r
com os atuais Estados da Sfria, Líbano e Jordânia
—a região denominada Grande Síria. Era uma zona
em sua maior parte semi-árida, de atividade agrícola
precária, tecnicamente atrasada, com nível
próximo ao da subsistência e formas feudais de
organização social no campo.
O comércio sempre constituiu a atividade
principal da região. Passagem entre as grandes
zonas da civilização no mundo antigo — Europa,
África Negra e Ásia —a Grande Síria conheceu, ao
longo de sua história, momentos de florescente
prosperidade, baseada no comércio à longa
distância, e também de decadência, quando esse
comércio refluía. Enquanto o mundo rural
conservava-se de certa forma isolado, fechado em
si mesmo, sem maior importância econômica,
havia uma considerável unidade no mundo urbano
(um comerciante de Damasco tinha negócios
igualmente em Beirute e em Haifa).
Então, quando os primeiros sionistas desembar­
caram no Oriente Médio, não havia fronteiras
precisas demarcadas na Palestina, que abrangia
uma área aproximada de 27 000 km2. As fron­
teiras definitivas seriam estabelecidas apenas entre
1906 e 1922, através de uma série de acordos
entre as principais potências.
Àquela altura, o comércio decaíra muito na
Palestina, tornando-se essencial mente local, e a
indústria praticamente inexistia. O país, embora de
fato pouco habitado, não era porém despovoado.
v J
18 Helena Salem

Lá viviam árabes-palestinos, identificados com a


sua terra natal (na qual haviam se estabelecido há
séculos) e entre si. Documentos, como os relatos
do humanista judeu Ahad Haam (pseudônimo de
Ascher Ginzberg) na série de artigos "A Verdade
de Eretz Israel", escritos em duas viagens à
Palestina em 1891 e 1893, testemunham sobre a
situação na área: "Do exterior — dizia Haam —
somos inclinados a acreditar que a Palestina hoje
é üm país quase completamente vazio; um deserto
\ onde cada um pode comprar tantas terras quanto
desejar. A realidade é bem outra. É difícil encontrar
neste país terras aráveis que não sejam culti­
vadas . . . ".
/

A implantação sionista

Em 1852, a população de origem judaica na


Palestina não ultrapassava a 11 800 pessoas.
Em 1880, era de 24 mil, em aproximadamente
500 mil habitantes. As primeiras colônias agrícolas
judaicas datam de 1882, após os violentos pogroms
a que já nos referimos, na Rússia czarista. Essa
primeira fase da implantação sionista só foi possí­
vel graças ao barão de Rothschild, que financiou
a aquisição e formação de 19 colônias e uma escola
agrícola.
Rothschild, que tinha altos negócios em Paris,
O que é Questão Palestina 19

f ^
Londres e outras capitais européias, como todos
os magnatas judeus, não encarava com bons olhos
a chegada de milhares de imigrantes israelitas
pobres da Europa Oriental. Aliás, seu envio para
bem longe — Oriente Médio, Estados Unidos,
América do Sul, etc. — era sem dúvida oportuno
e bem-vindo.
Foi em Basiléia, na Suíça, que se reuniu em
1897 o primeiro Congresso Sionista, agrupando
204 membros e fundando a Organização Sionista
Mundial, com o objetivo de impulsionar o "retorno
à Palestina". Três anos depois, as "colônias
Rothschild" foram transferidas para a proteção
de um outro barão, Maurice de Hirch, da Jewish
Colonization Association. Iniciou-se a exploração
da mão de obra árabe local (apenas por pouco
tempo), diminuindo a imigração de judeus.
A segunda onda de imigração sionista, na maior
parte de judeus russos influenciados pelas idéias
socialistas (em expansão na Rússia antes da Revo­
lução de 1905), restabeleceu o princípio do
"retorno" (ao antigo "Reino de Israel", de há
dois mil anos).
Enfim, o processo de colonização sionista tinha
uma peculiaridade muito própria, que o diferen­
ciava de outras iniciativas colonizadoras da época,
como a inglesa ou francesa: não pretendia explorar
a mão de obra nativa, mas substituí-la na totalidade
pela imigrante. E, para tanto, os judeus íam
comprando, pouco a pouco, as terras palestinas
V
to H elena Salem

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de proprietários turcos (de 1517 a 1917 os
otam anos dom inaram a região) e sírios, geralm ente
absentistas (atenção: os proprietários não viviam
em suas terras, mas elas eram ainda assim habitadas
por felás, camponeses).
As vésperas da Primeira Guerra Mundial, a Pa­
lestina contava com 44 colônias agrícolas privadas,
reunindo aproxim adam ente 12 mil judeus em 44
mil hectares.

A Inglaterra e a q u estão p alestina,


o u dividir para reinar

Theodor Herzl m orreu em 1904, assumindo a


direção do m ovimento sionista o alemão David
Wolffsohn. Várias correntes se digladiavam então
no interior do m ovim ento sionista: entre elas, os
seguidores fiéis de Herzl, favoráveis a um Estado
judeu na Palestina; a fração radical, representada
pela esquerda sionista e o m ovim ento dos traba­
lhadores sionistas (Po'a/e S io n ); e os "territoria-
listas", partidários da aceitação de uma oferta
britânica para o estabelecim ento de um Estado
judeu em Uganda.
Os "sionistas palestinos" levaram a melhor.
A 2 de novembro de 1917, após intenso trabalho
desenvolvido por Chaim Weizmann (que três anos
depois assumiria a presidência da Organização
V.
O que é Questão Palestina 21

Sionista Mundial), o Ministro do Exterior britâ­


nico, James Balfour, endereçou ao milionário
Lord Rothschild uma carta, afirmando: "0 governo
de Sua Majestade encara favoravelmente o esta­
belecimento de um Lar Nacional para o povo
judeu na Palestina e empregará todos os seus
esforços para facilitar a realização desse objetivo,
estando claramente entendido que não se fará
nada que possa acarretar prejuízos aos direitos
civis e religiosos das comunidades não-judias da
Palestina, bem como aos direitos e ao estatuto
político de que os judeus possam gozar em
qualquer outro país” .
Essa carta passou à história com o nome de
Declaração Balfour, abrindo oficialmente as
portas para a implantação sionista na Palestina.
A ressalva britânica para que fossem respeitados
os "direitos das comunidades não judias" era, ,
certamente, muito questionável: como não entrar ■
em choque com elas, ao se pretender criar um i
Lar Nacional de uma população estrangeira num
território já povoado? Ora, a satisfação dos
anseios sionistas (sem querer entrar no seu
mérito) necessariamente haveria de se opor aos
interesses dos habitantes árabes locais.
E foi, evidentemente, o que ocorreu. Desde
muito cedo, quase simultaneamente à chegada
das primeiras levas de colonos judeus, começaram
os primeiros atritos. A Inglaterra, por sua vez,
como em tantas outras partes do mundo, haveria
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12 Helena Salem

'-----------------------------------------------------------------------V
de utilizar a velha tática de "dividir para reinar".
Apoiaria os judeus vendendo-lhes armas, facili­
tando sua imigração para a Palestina, e reduziria
esse apoio sempre que a crescente tensão entre
árabes e sionistas atingisse níveis muito elevados.
Por exemplo, em 1922, pressionada por intensos
protestos árabes, Londres divulgou seu primeiro
Livro Branco, que restringia formalmente a
imigração judaica, com o objetivo de impedir a
formação de uma maioria não árabe na Palestina.
Embora a iniciativa tivesse provocado um pesado
mal-estar entre os sionistas e ingleses, na prática
K o Livro Branco não teve maiores conseqüências,
j já que não chegou a ser implantado de fato.
/ Ao mesmo tempo, apesar da declaração anglo-
' francesa de novembro de 1918, em que os dois
países se comprometiam a promover "a completa
e definitiva libertação dos povos há tanto tempo
oprimidos pelos turcos", a Grã-Bretanha e França
foram partilhando a região. Londres obteve os
mandatos do Iraque, Palestina e Transjordânia
(separada artificialmente da Palestina em 1920
para contentar o Xerif Abdullah el Hussein, amigo
dos ingleses), e a França os mandatos sobre o
Líbano e Síria. Em outras palavras, a "balcani-
zação" do Oriente Médio.
Em 1931 a população judaica da Palestina era
ainda pequena: apenas 175 000 pessoas, em cerca
de 1 036 000. No entanto, as perseguições do
nazi-fascismo na Europa levaram, entre 1932-38,
J
0 que é Questão Palestina 23
----------------------------------------------------------------->
mais de 200 mil novos imigrantes à região. Neste
fnterim, em 1936, violentas greves estouraram na
Palestina, e a população árabe voltou-se simulta­
neamente contra os ingleses e os sionistas.
A essa altura, o Haganah (exército clandestino
judeu, criado no início do século com o objetivo
de defender as colônias sionistas) passou a atuar
em estreita colaboração com as autoridades
coloniais britânicas na repressão aos árabes,
transformando-se no embrião do futuro exército
israelense. A situação já era de tal forma tensa
que, em 1937, uma comissão do governo britânico
(Peei) preconizou pela primeira vez a partilha da
Palestina em um Estado judeu e outro árabe.
Apavorada com o fortalecimento do nacionalis­
mo árabe — que, diga-se, por vezes descambava
para o fascismo, apoiando o Eixo para se opor a
Londres —, com as greves e os protestos, a í
Grã-Bretanha lançou em 1939 o segundo Livro u
Branco, dessa vez para valer. O documento ^
estabelecia que, entre 1939-44, apenas 75 mil
judeus poderiam imigrar para a Palestina e, após
esse período, toda a imigração deveria ser subme­
tida aos árabes.
Lógico que o movimento sionista não respeitou
as determinações do Livro Branco. A Europa
pegava fogo com a Segunda Guerra Mundial,
perseguindo mortalmente os judeus — quem
podia escapava para a América ou Palestina.
Assim, entre 1939-44, entraram clandestinamente
24 Helena Salem
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na Palestina cerca de 150 mil judeus, pelo menos.
Afinal, a suposta "consciência" britânica sobre
a discórdia que semeara no Oriente Médio, sem
dúvida, aparecia muito tarde, e no momento
menos oportuno possível.

A pressão terrorista

Além da imigração clandestina, um outro fato


assinalou essa época: o surgimento de grupos
terroristas judeus de extrema-direita. O primeiro
a aparecer foi o trgun Zvai Leumi (Organização
do Exército Nacional), mais conhecido simples­
mente por trgun, grupo saído do Haganah, em
1938. Fundado pelos estudantes David Raziel e
Abraham Stern, da Universidade Hebraica de Jeru­
salém, o trgun especializou-se em jogar bombas
nos populosos mercados árabes das principais
cidades da Palestina.
Os ingleses reprimiram o trgun prendendo seus
líderes. O grupo terrorista não fez por menos:
passou a atacar também as autoridades britânicas,
matando vários policiais. Com a eclosão da
Segunda Guerra, porém, decretou-se uma trégua
formal entre o trgun e os ingleses, que soltaram
os terroristas presos. Abraham Stern não concor­
dou com a trégua: abandonou a organização
junto com a maior parte de seus militantes,
0 que é Questão Palestina 25
>
fundando uma nova agremiação: os "Lutadores
pela Liberdade de Israel" (Lohmey Heruth Israel
— LHEY), comumente conhecida por Stern.
Os sternistas eram adeptos do mais indiscrimi­
nado terror, contra árabes e ingleses.
A debandada dos sternistas deixou o Irgun
muito mal. Era necessário sangue novo, fascista,
terrorista, para poder rearticulá-lo. Foi com esse
"nobre" objetivo que o polonês Menahem Begin
(que tempos depois viria a ser Primeiro Ministro
de Israel) chegou a Palestina em 1943. Tido como
eficiente organizador e propagandista, ele conse­
guiu de fato rearticular o Irgun.
A partir daí, Stern e Irgun vão literalmente
"botar para quebrar". A tal ponto que, em julho
de 1946, o Irgun realizou uma ação que o imor­
talizaria na história do terrorismo: a explosão
do King David Hotel, em Jerusalém, onde se
hospedavam funcionários do mandato britânico.
Segundo o Irgun, o hotel teria recebido uma
advertência 25 minutos antes da explosão, mas
não fez caso da ameaça. O fato é que simples­
mente 91 pessoas — ingleses, árabes e até judeus
— morreram no atentado e 41 ficaram feridas.
E como se comportava a liderança oficial do
movimento sionista face ao terrorismo? Através
da Agência Judaica (órgão executivo criado pela
Organização Sionista Mundial em 1920 para
cooperar com a administração britânica), os
dirigentes judeus reagiam com muita ambigüidade.
J
26 Helena Salem

A Agência condenava veemente e formalmente


o terrorismo, enquanto o Haganah (que era diri­
gido diretamente pela Agência) mantinha ambíguas
relações com o Stern e o Irgun, às vezes opondo-se
e às vezes colaborando com os terroristas.
Ou, em outras palavras: da mesma forma como
a liderança política sionista se proclamava contra
o terrorismo, ela também se utilizava, em parte,
dos atos terroristas praticados pelos grupos de
extrema-direita para pressionar politicamente as
autoridades britânicas e mesmo atemorizar os
árabes. Desse modo, a Agência Judaica criticava,
porém nada fazia de concreto para impedir a
ação dos terroristas, quando não colaborava
indiretamente com eles.

O fim da Palestina árabe

Criado o pandemônio na região, a Grã-Bretanha,


internamente arrebentada pela Segunda Guerra
Mundial, sentia-se incapaz de manter seu domínio
sobre a Palestina. Em 1947, anunciou que se
retiraria do país a 15 de maio do ano seguinte.
Ou seja, depois de criar, fomentar e se aproveitar
de toda a confusão na área, os ingleses simples­
mente lavavam as mãos e entregavam às Nações
Unidas o encargo de decidir sobre o futuro
daqueles povos.
O que é Questão Palestina 27
------------------------------------------------------------------------
A 29 de novembro de 1947, sem consultar a
população árabe palestina, a ONU votou um plano
de partilha da Palestina em um Estado judeu e
outro árabe, com Jerusalém recebendo status
internacional. O m om ento era de especial emoção,
já que o Ocidente respirava culpado a morte de
6 milhões de judeus, assassinados, diga-se de
passagem, não pelos palestinos, mas pelos desen­
volvidos e "civilizados" europeus.
Ben Gurion, líder da Agência Judaica, procla­
mou a 14 de maio de 1948 a fundação do Estado
de Israel. Os árabes, sentindo-se lesados e incitados
pelas lideranças feudais, demagógicas, declararam
no dia seguinte guerra ao Estado sionista, embora
est ivessem total mente despreparados. Mais uma
vez, tentando aproveitar-se do caos para manter
a influência na região, Londres apoiou os árabes
no conflito, enquanto a União Soviética, que
tanto com batera o sionismo, solidarizou-se com
os judeus, enviando-lhes armas de fabricação
tcheca. Na realidade, a preocupação de Moscou
era criar um flanco de oposição aos ingleses.
Mal equipados, destreinados, os exércitos
árabes foram fragorosamente derrotados pelos
sionistas. E o Estado de Israel, que pela partilha
da ONU deveria ter 14 942 km2 (com 497 mil
árabes e 498 mil judeus), aumentou para 20 673
km2 , ocupando 78% do território palestino (contra
56,47%, previstos pela ONU). Já o Estado pales­
tino, programado para ter 11 203 km2 (42,88%
V____________________________________ -____ )
28 Helena Salem

da Palestina), com 725 mil árabes e 10 mil judeus,


desapareceu do mapa, antes mesmo de se cons­
tituir oficialmente.
Israel anexou 22% a mais do território palestino,
a Jordânia se apossou da margem ocidental do
Rio Jordão (a Cisjordânia, com 5 295 km2 ou
20,5% da Palestina), enquanto a Faixa de Gaza
(354 km2 ou 1,5%) passou para a administração
egípcia. Jerusalém (com 105 mil árabes e 100 mil
judeus), a cidade santa de católicos, judeus e
muçulmanos, foi dividida entre a Jordânia (setor
oriental) e Israel.
O "sonho de Sion” tornou-se, finalmente,
realidade. Nesse exato momento começou, também,
a diáspora palestina — mais conhecida como
a questão palestina.


m
r "N

OS PALESTINOS, POVO ERRANTE

Durante muitos anos, as correntes de esquerda


favoráveis ao binacionalismo árabe-judeu na
Palestina exerceram uma forte influência no
movimento sionista. Elas defendiam a convivência
harmônica entre árabes e judeus em um único
Estado, que, para a maioria, deveria ser socialista,
embora fossem muitas e variadas as posições.
Arthur Ruppin, por exemplo, criticava "a visão
diplomática e imperialista” de Theodor Herzl,
afirmando que "o conceito herzliano de um
Estado judeu só era viável porque ele ignorava a
presença dos árabes". Enquanto isso, o sionista
trabalhista Berl Katznelson declarou categori­
camente numa conferência do Partido Trabalhista
(Mapai) em 1931: "Não desejo ver o sionismo se
realizar sob a forma de um Estado polonês onde os
árabes estariam na posição dos judeus, e os judeus
V. J
0 Helena Salem

na posição dos poloneses, o povo dirigente".


Mas as perseguições anti-semitas na Europa e
a aliança de setores nacionalistas reacionários
árabes com os alemães contribuiriam decisivamente
para fortalecer a corrente nacionalista judaica
exclusivista no sionismo. Assim, durante a guerra
de 1948 os soldados de Ben Gurion, ao se apode­
rarem de novas parcelas do território palestino,
tinham como objetivo claro o esvaziamento dessas
terras de seus habitantes árabes lá estabelecidos,
para serem povoadas por judeus,
k Aliás, antes mesmo da guerra ser desencadeada,
A já se efetivavam ações nesse sentido. Foi o caso
I do massacre na aldeia de Deir Yassin, a 9 de
j abril de 1948, em que forças do Irgun e Stern
r (grupos que não aceitaram a partilha da ONU
de 1947, por serem contrários à criação de um
Estado árabe palestino ao lado do judeu) invadiram
o povoado e mataram cerca de 250 pessoas, todos
civis. Depois, Menahem Begin chamou a imprensa
para exibir, jubilosamente, os corpos das vítimas,
j A Agência Judaica condenou o massacre, mas,
mesmo assim, para os palestinos Deir Yassin
tornou-se um símbolo de terror e convite à fuga.
Em 1947, a população árabe na Palestina era
estimada em 1 400 000 habitantes, e a de judeus
em aproximadamente 600 mil. Já em 1950,
calculava-se em 900 mil o número de refugia­
dos palestinos, alojados na Cisjordânia, ocupada
pela Jordânia, na Faixa de Gaza, na Síria, Líbano,
\ ____________________ J
32 Helena Salem
------ ------------------------------------------------------------
Egito, Iraque e Países do Golgo. Pelo menos
250 das 863 aldeias árabes haviam sido destruídas,
sua população expulsa e suas terras apropriadas
pelo exército sionista.
Mas por que os palestinos não resistiram?
Por que abandonaram suas terras? Ao que tudo
indica, duas foram as razões principais. Primeiro,
o pânico da guerra. Os bombardeios, os tanques,
as ações de intimidação, experiências anteriores
como Deir Yassin levavam os camponeses a
freqüentemente procurarem a estrada. Em segundo
lugar a expulsão pura e simples por parte do

Í Exército sionista que, em muitas aldeias, chegava


destruindo tudo e enxotando a população.

Depois do armistício, em 1949, o retorno


foi absolutamente impossível, visto que os sionistas
haviam destruído aldeias inteiras ou bloqueado
as estradas para impedir a entrada dos árabes
nos povoados. Afinal, para construir um Estado
judeu, era imprescindível ter, no mínimo, ampla
maioria de judeus em suas fronteiras e, conse-
qüentemente, o menor número possível de árabes.
Do contrário, seria inviável.
Um argumento freqüentemente levantado
considera que os maiores culpados pelo abandono
das aldeias árabes foram os próprios governos
árabes que, através de suas rádios, incitaram o
povo a fugir. Pode ser até que isso tenha ocorrido,
considerando a natureza desses regimes, embora J
pesquisas feitas por ingleses, com base em grava-
0 que é Questão Palestina 33
>
ções das emissões radiofônicas da época, neguem
que tenha havido esse incitamento. Porém, mesmo
admitindo que de fato ocorreu tal apelo à fuga,
resta sempre uma questão: por que os palestinos
não puderam voltar para seus lares? E aí a reali­
dade fala por si própria: não foi por falta de
vontade, mas porque o governo israelense nunca
permitiu, apesar de todos os apelos das Nações
Unidas.

A ajuda da ONU

Em dezembro de 1948, a Assembléia Geral das


Nações Unidas votou a Resolução 194 (III), que
determinava: "Os refugiados que desejarem devem
ser permitidos de retornar aos seus lares o mais
rápido possível e de viverem em paz com os seus
vizinhos, e devem ser pagas indenizações a título
de compensação pelos bens daqueles que decidirem
não regressar aos seus lares e por todo bem perdido
ou danificado, uma vez que, em virtude dos prin­
cípios de Direito Internacional, tal perda ou dano
devem ser reparados pelos governos ou autoridades
responsáveis".
Israel não respeitou essa resolução, como
nenhuma das muitas outras que se seguiriam.
Em 1950, quando já aparecia como evidente a
impossibilidade de um retorno a curto prazo, a
l___ __________________ J
34 Helena Salem
---------------------------------------------------------------------------------------------------------— -N

Assembléia Geral da ONU criou o Organismo


de Ajuda e de Trabalho das Nações Unidas para
os Refugiados Palestinos (UNRWA). Uma comissão,
formada pelos Estados Unidos, Grã-Bretanha,
França, Bélgica, Turquia, Jordânia, Líbano e Egito,
recebeu a incumbência de assistir a direção do
UNRWA.
Foi qualificado como "refugiado da Palestina"
todo indivíduo que, "no momento do conflito
de 48, residia na Palestina pelo menos há dois
anos e que, em conseqüência da guerra, perdeu sua
casa e seus meios de subsistência". Os filhos e
N netos dos refugiados igualmente incluíram-se
\ nessa lista. Os países árabes que os abrigaram
J deram-lhes documentos especiais, destacando a
I nacionalidade palestina. Apenas a Jordânia conferiu
' plena cidadania a quem desejou.
Inicialmente, os refugiados foram abrigados em
barracas levantadas pela ONU. Depois, pouco a
pouco, construíram-se casas precárias, de zinco,
madeira e, em menor número, tijolo. Cabia ao
UNRWA ajudar na sobrevivência dos palestinos,
propiciando-lhes, além de moradia, alimentação,
vestuário, saúde e escola.
Embora no campo da alimentação e vestuário a
ajuda tenha sido extremamente deficiente, não
se pode dizer o mesmo dos dois outros itens.
Por exemplo, foi bastante bem sucedida a luta
contra as doenças contagiosas, ou seja, a assistência
médica preventiva. Apesar da grande pobreza, má
J
0 que é Questão Palestina 35

alimentação, enfim, da miséria existente entre


os refugiados, até hoje nenhuma grande epidemia
atingiu os campos.
Mas o maior sucesso do UNRWA foi sem dúvida
na área da educação. O índice de escolaridade nos
campos de refugiados é de longe o mais alto do
mundo árabe: 95% e, em alguns lugares, até mesmo
100%. Daí, hoje em dia, encontrarmos tantos
técnicos e intelectuais palestinos espalhados pelo
mundo árabe. Depois de completarem o 19 grau
nos campos, muitos íam prosseguir seus estudos
nas capitais árabes.

Distribuição dos Palestinos (1979)

Localização População

Cisjordânia 722 072


Gaza 415 924
Israel (ic. Jerusalém) 610 545
Jordânia 1 127 066
Síria 208 538
Líbano 336 288
Kuwait 259 408
1raque 19 184
Líbia 19 226
Egito 46 878

Fonte: Khader, Bichara e Naim. “Le


Peuple Palestinien: Ses potentialités hu­
maines, économ iques e t scientifiques".
Université Catholique de Louvain, 1980.
^ ------- ------------------- ---- ----------------------------
36 Helena Salem
---------------------------------------------------------------------
Por outro lado, o grande problema do UNRWA
sempre residiu na falta de verbas. Funcionando
com doações voluntárias dos países-membros da
ONU ou de organizações especializadas, seus
recursos foram diminuindo ano após ano. E isso
devido claramente a razões políticas: na medida
em que muitos países, como os Estados Unidos,
desejavam pôr um fim à incômoda "questão
palestina", a extinção do UNRWA tornava-se mais
do que necessária. A tal ponto que, atualmente, a
ajuda concedida pelo UNRWA aos refugiados é
''k irrisória. Inclusive as verbas para escolaridade
) vêm sofrendo cortes.

i Os campos de refugiados

Casas de zinco, de pedra, de tijolo e cimento,


umas grudadas nas outras, não mais de três compar­
timentos (de 3 por 4 m, em média, cada um),
abrigando famílias às vezes de 15 pessoas. Os
campos de refugiados assemelham-se todos, seja
na Síria, Gaza, Jordânia ou Líbano. Muita pobreza,
uma vida que caminha lenta, à espera.
Sem água quente, em geral sem encanamento
também (a água é de poços coletivos), e sem
banheiros privados (fossas coletivas apenas). No
inverno, muito frio — abaixo de zero —, no verão,
muito calor — mais de 40°. O zinco gela, o zinco
0 que é Questão Palestina

/ >
arde. Alguns campos têm 4 mil habitantes, outros
60 mil, como o de Baqaa, perto de Amã, verdadeira
cidade de zinco. Dependendo da densidade popu­
lacional, maior ou menor número de escolas do
UNRWA. Freqüentemente, um hospital nas
vizinhanças. As ruas, estreitos caminhos de terra
ou pedra, onde crianças - muitas — brincam.
Miséria, miséria. Na aparência pouco diferem
de nossas favelas.
Apenas 17% (cerca de 700 mil) dos 4 milhões
de palestinos vivem hoje em campos de refugiados.
No Líbano, os campos são habitados por refugiados
da guerra de 1948 apenas, mas na Síria e Jordânia
foram construídos novos campos também após
a guerra de 1967.
Pode-se sair e entrar à vontade em um campo.
Os refugiados têm livre trânsito. Mas não há muito ^
o que fazer. Às vezes trabalham no pequeno
comércio dentro do próprio campo (vendas de ^
alimentos, utensílios de casa), ou, quando conse­
guem, em algum biscate na cidade mais próxima.
As mulheres, como sempre no mundo árabe,
ocupam-se do trabalho doméstico, e têm filhos.
Muitos. Criminalidade, assaltos não existem.
A solidariedade entre os moradores é grande, e
o sonho de retornar à Palestina (mesmo por parte
daqueles que não a conheceram como os mais
jovens) maior ainda.
No Líbano, antes da guerra civil e expulsão dos
guerrilheiros palestinos de Beirute por Israel
^--------------------- ------------------------------- ------------- '
38 Helena Salem

r ------------------------------------------------------ ' ..........."" "\


(agosto de 1982), havia forte atividade política e
militar da Resistência no interior dos campos, que
na maior parte eram controlados por uma ou
outra organização guerrilheira ligada à Organização
de Libertação da Palestina (OLP). Na Jordânia,
antes do massacre dos fedayin (guerrilheiros) em
1970-71, também a agitação política era forte, mas
hoje praticamente inexiste, estando os campos sob
total controle do UNRWA e do governo. Na Síria,
cabe ao governo ocupar-se dos refugiados através de
um organismo especializado, enquanto a atividade
das organizações nos campos é extremamente con­
trolada.

Resoluções da O N U e Israel

Em junho de 1967, durante a Guc.ra dos Seis


Dias, Israel ocupou novos territórios árabes,
inclusive palestinos: a Cisjordânia (em poder da
Jordânia), a Faixa de Gaza (administrada pelo
Egito) e Jerusalém oriental — além da península
do Sinai egípcia e das colinas de Golan sírias.
Milhares de novos refugiados palestinos chegaram
mais uma vez aos vizinhos países árabes, basica­
mente Jordânia e Síria. A ONU construiu então,
mais uma vez, diversos campos de refugiados.
Paralelamente, o Conselho de Segurança das
Nações Unidas e a Assembléia Geral votaram
nada mais nada menos que cinco resoluções no
J
40 Helena Salem

'l
espaço de 14 meses, referentes aos direitos humanos
das populações nos territórios ocupados. Foram
as seguintes as resoluções: n9 237, de 14/7/1967;
nP 248, de 24/3/1968; n? 259, de 27/9/1968,
todas do Conselho de Segurança; n? 2252, de
4/7/1967; e a n ? 2341, de 19/12/1967, da Assem­
bléia Geral, que prorrogava a existência do
UNRWA e reafirmava a resolução nP 2252 em
relação aos direitos dos civis nas áreas ocupadas.
Israel, como ocorreu após a guerra de 1948, não
respeitou nenhuma dessas resoluções. Ao contrário,
\ prosseguiu no trabalho de expropriação e expulsão
\ das famílias árabes de suas terras. Em Jerusalém
m oriental, o Governo israelense destruiu diversos
m bairros árabes, construindo em seus lugares
í conjuntos judeus com o objetivo de "integrar"
a cidade definitivamente no país. Na Cisjordânia,
densamente povoada por palestinos, admitiu que
grupos de religiosos direitistas criassem uma série
de colônias agrícolas que, indiscutivelmente,
representarão um forte obstáculo a uma eventual
restituição do território aos árabes — sem falar
no foco de tensão que elas hoje já constituem.
As vésperas da quarta guerra no Oriente Médio —
conhecida também como Guerra do Yon Kippur
(feriado religioso judaico) ou Guerra do Ramadã
(do calendário islâmico) — em 1973, o Partido
Trabalhista, então no poder, apresentou uma
plataforma eleitoral da qual constava nada mais
nada menos que a anexação ilegal, segundo a
y
0 que é Questão Palestina 41
------------------------------------------------------------ .
Convenção de Genebra, dos territórios ocupados.
A eclosão da guerra, a 6 de outubro, levou porém
o governo da ex-Primeira Ministra Golda Meir
a arquivar o projeto.

Os palestinos em Israel

Sem considerar os territórios ocupados em


1967, estima-se que vivem hoje nas fronteiras
de 1948 do Estado de Israel cerca de 650 mil
palestinos, numa população de pouco mais de
4 milhões de habitantes. Seu elevado crescimento
vegetativo (3,5% ao ano contra 1,5% dos judeus)
chegou mesmo a preocupar, em 1976, o Departa­
mento para a Administração do Norte de Israel, r
onde se concentra grande parte dos árabes. Na f
época, o Dr. Israel Koenig, do Partido Nacional V*
Religioso (de direita), chefe do Departamento, *
publicou um relatório advertindo para o "perigo”
que tal crescimento representava, e propondo
medidas concretas "para evitar o pior": controle
da natalidade, estímulo para os jovens árabes
irem estudar no exterior impedindo depois seu
regresso, etc. e tc .. . .
Antes de 1948, havia 475 aldeias árabes no
interior do Estado de Israel (sem anexações).
Atualmente, não ultrapassam a 90. Todas as
outras foram destruídas e expropriadas pelos
J
42 Helena Salem

israelenses. Até 1967, 92% do "domínio nacional"


eram destinados apenas aos judeus, ficando os pa­
lestinos (cerca de 15% da população) confinados
aos demais 8%.
Em algumas regiões, como a Galiléia, os pales­
tinos já constituem cerca de 49% da população
(daí o pânico do Dr. Koenig). Aparentemente, eles
têm quase todos os direitos da população judia
israelense, com exceção da lei do retorno (pela
qual todo judeu, filho de mãe judia, pode viver
em Israel tornando-se cidadão do país, assim como
os parentes dos judeus israelenses que lá foram
morar).
Concretamente, porém, não é bem assim. Um
cidadão não-judeu não tem autorização para
trabalhar nas terras reservadas ao "domínio
nacional" ou "do povo judeu". Também não pode
morar em cidades exclusivamente judaicas (a
despeito de terem sido construídas em terras
expropriadas aos palestinos). Sem dúvida nenhuma,
tratam-se de cidadãos de segunda classe, embora,
do ponto de vista estritamente sócio-econômico,
sua situação, às vezes, tenha até melhorado.
Nos últimos anos, os palestinos israelenses vêm
desenvolvendo, cada vez mais, uma consciência
nacional árabe. Assim, em 1976, na Galiléia e na
região denominada "pequeno triângulo árabe",
ao norte de Telaviv, eclodiu uma violenta onda de
protestos — os mais graves desde 1948 —, coinci­
dindo, também, com exaltadas manifestações
J
0 que é Questão Palestina 43

antiisraelenses na Cisjordânia ocupada.


"0 árabe israelense deixou de ser passivo,
passando de um nacionalismo puramente verbal
para ações mais concretas, tais como a expressão
de slogans de identificação com a OLP, o nacio­
nalismo das eleições municipais (de dezembro de
1975), a mobilização excepcional e imprevista dos
habitantes de Nazaré, a proclamação de uma greve
geral de toda a população árabe de Israel. . . "
A advertência foi feita exatamente no ano de
1976, pelo já mencionado Relatório Koenig.
De lá para cá, não voltaram a ocorrer manifestações
do mesmo vulto, mas nem por isso melhorou o
clima de animosidade.
Vivem hoje sob administração israelense —em
Gaza, Cisjordânia, Jerusalém Oriental e dentro
de Israel — cerca de 1 800 000 a 2 milhões de
árabes palestinos, para aproximadamente 4 milhões
de judeus. Árabes que, crescentemente, vão se
identificando com o movimento nacional palestino.
0 que poderá ocorrer se, um dia, todos acabarem
por se unir e lutar contra a situação de opressão
em que se encontram?
A questão palestina está portanto presente,
também, dentro do próprio Estado sionista.

J

È
A RESISTÊNCIA PALESTINA

De 1950 a 1967: formação

Em 1955, o então Secretário de Estado norte-


americano, John Foster Dulles, previu que o
problema palestino se extinguiria em 20 anos, no
máximo. Na sua opinião, os palestinos haveriam
de se integrar nos diversos países árabes onde
tinham se refugiado. Dulles, no entanto, equi­
vocou-se.
Em 34 anos de exílio, os palestinos, ao contrário,
acabaram por construir um movimento de liberta­
ção nacional, reconhecido internacionalmente.
Foi uma longa e, sem dúvida, penosa trajetória,
da qual a primeira manifestação mais organizada
que se conhece teve lugar em 1952, na Universi­
dade Americana de Beirute. Estudantes palestinos
J
0 que é Questão Palestina 45

r ~\
pertencentes ao até então desconhecido Comitê
de Resistência à Paz com Israel lançaram um
boletim clandestino, semanal, chamado Nashrat
al-Thar. Esse grupo de jovens constituiria o núcleo
central do Movimento Nacionalista Árabe (MNA),
a se formar anos depois.
Em seguida, ao ficar claro que Israel não se
retiraria das áreas palestinas ocupadas em 1948, o
UNRWA passou a estudar formas de estabelecer
definitivamente os refugiados. Foram os anos de
1953-54, quando o UNRWA apresentou uma
série de projetos no sentido de fixar os refugiados
nos campos. Para expressar seu repúdio ao fait
accompU, os palestinos organizaram diversas
manifestações e destruíram unidades residenciais
construídas pelo UNRWA.
Os projetos de integração da ONU foram
arquivados até 1959, ano em que o secretário-geral
Dag Hammarksjold elaborou um plano geral de
absorção dos palestinos na vida econômica do
I
Oriente Médio. Mas no mesmo ano de 1959, a
Conferência Árabe-Palestina em Beirute rejeitou
os serviços de Hammarksjold.
Nesse período também, pequenos grupos de
guerrilheiros palestinos, com base na Cisjordânia,
Gaza e Síria, realizaram algumas ações dentro de
Israel. Os israelenses imediatamente reagiram,
utilizando sobretudo organizações terroristas de
direita, que penetravam em Gaza ou Cisjordânia
em "ações de represália".
j
46 Helena Salem

r --------------------------------------------------------------------------------------N
Tais grupos guerrilheiros palestinos não possuíam
nenhuma organização política, vivendo, funda­
mentalmente, do dinheiro, armas e treinamento
fornecidos pelo exército egípcio. Eles praticamente
desapareceriam após a guerra de Suez em 1956.
Ao consolidar-se, em 1958, a chamada República
Árabe Unida (RAU), fusão entre a Síria e o Egito,
novas esperanças se criaram no interior do
nascente movimento palestino. Logo, logo, porém,

> o sonho acabou. Os movimentos que a RAU


tentou criar, como a União Nacional Palestina, na
Síria e Gaza, eram totalmente inviáveis, desvincu­
lados da massa palestina.
Em 1959, começou a circular em Beirute uma
revista intitulada Nossa Palestina, a qual concla­
mava os governos árabes a que ajudassem os
próprios palestinos a libertarem a Palestina dos
sionistas. Os responsáveis por essa publicação,
saber-se-ía mais tarde, eram militaVites de Al Fatah,
que acabara de se constituir enquanto organização.
Al Fatah havia sido formada em Gaza, no bojo
de discussões desenvolvidas por estudantes pales­
tinos que tinham vivido a ocupação israelense
em 1956.
Neste ínterim, no Egito e Síria firmavam-se
no poder regimes nacionalistas, extremamente
anticomunistas, mas que se utilizavam de uma
linguagem por vezes até radical. Era o chamado
"socialismo árabe", de Gamai Abdel Nasser e do
V.
Partido Baath — na realidade um capitalismo de
0 que é Questão Palestina 47

estado fortemente autoritário, burocrático e


repressivo.
Diversos militantes de Al Fatah foram acusados
por Governos árabes de pertencer à CENTO
(organização que congregava Turquia, Irã,
Paquistão e EUA), muitos chegaram a ser perse­
guidos e mesmo presos. Inclusive, o primeiro
guerrilheiro de Al Fatah morto foi assassinado por
um soldado jordaniano (e não por Israel), em 1965.

O mito da “ unidade árabe”

0 fracasso da união sírio-egípcia (RAU) em


1961 colocou totalmente por terra a tese de que a
"unidade árabe" seria o principal instrumento para
"libertar a Palestina". Por outro lado, a vitória da
revolução armada argelina, em 1962, despontou
como um caminho para a resistência palestina.
Os argelinos haviam enfrentado com suas próprias
forças, de forma violenta e radical, os colonizadores
franceses — não deveriam os palestinos fazer
o mesmo?
Al Fatah decidiu seguir o caminho argelino.
Em 1964, realizou um congresso a fim de debater
a questão da falta de recursos — humanos e
materiais —da organização. Ao final do encontro,
resolveu, apesar das dificuldades, iniciar a luta
armada a 19 de janeiro de 1965. Decidiu, também,
________________ _____________________ J
18 Helena Salem

que as ações militares seriam desempenhadas sob


uma outra sigla — Al Assifa (Tempestade) -
para não "queimar" o grupo, que prosseguiria
atuando a nível político na clandestinidade.
Igualmente em 1964, entre 13 e 16 de janeiro,
realizou-se no Cairo a I Conferência de Cúpula
Árabe. A reunião, convocada pelo presidente
egípcio Gamai Abdel Nasser, entre as suas
resoluções finais estabeleceu que o povo palestino
deveria organizar-se independentemente para travar
a luta pela "libertação da Palestina".
O advogado palestino Ahmed Shukeiri foi
designado representante da Palestina na Liga
Árabe. Shukeiri havia sido secretário-geral-adjunto
da Liga, membro da delegação síria e o delegado
da Arábia Saudita nas Nações Unidas. Era um
nacionalista, mas não um revolucionário. Nem de
longe. A 19 de fevereiro de 1964, o advogado
iniciou viagem contatando com personalidades
palestinas e governantes árabes com vistas à
formação de um Conselho Nacional Palestino.
A primeira sessão do Congresso Nacional
Palestino teve lugar a 28 de maio de 1964, em
Jerusalém Oriental, sob os auspícios do Rei
Hussein. Cerca de 242 representantes palestinos
da Jordânia, 165 da Síria, Líbano, Gaza, Qatar,
Kuwait e Iraque, e também membros da Al Fatah
participaram da reunião. Entre as resoluções
adotadas figuravam a criação de uma Organização
para a Libertação da Palestina (OLP), abertura de
0 que é Questão Palestina 49

campos para treinamento militar (inclusive nas


academias militares árabes), e criação de um fundo
nacional palestino para financiar a OLP, com
contribuições dos governos árabes e do povo
palestino. Ahmed Shukeiri foi eleito presidente
do Comitê Executivo da OLP.
A II Conferência de Cúpula árabe, em setembro
de 1964, em Alexandria, confirmou a criação da
OLP e decidiu formar o Exército de Libertação
da Palestina (ELP). A constituição da OLP absorveu
muitos dos pequenos grupos então existentes
(mais de 20), só que Al Fatah, o setor palestino do
Movimento Nacionalista Árabe, (MNA), dirigido
pelo médico Georges Habashe, e outras poucas
organizações mantiveram sua independência,
embora participando da OLP.
Apesar de haverem aprovado e impulsionado a /
criação da OLP, os governos árabes continuavam
torpedeando a ação da Resistência, seja através da S
repressão (a Jordânia) ou da insistente tentativa
de controle político e militar (o Egito). Por outro
lado, a OLP permanecia ainda como algo muito
distante da massa palestina.
A guerra de junho de 1967 encontrou os árabes
totalmente despreparados, a despeito das belicosas
ameaças verbais de seus dirigentes contra Israel.
Egito, Síria e Jordânia perderam importantes
partes de seus territórios para os israelenses.
Por seu ladõ, os palestinos puderam constatar,
inquestionavelmente, que, para atingir seus
V. J
so Helena Salem

objetivos, eles não poderiam depender de forma


alguma dos países árabes, incapazes de defender
a si próprios.
Al Fatah realizou uma reunião clandestina,
optando por prosseguir na luta armada contra
Israel. E, em outubro de 1967, formou-se uma
nova organização, politicamente mais radical,
a Frente Popular para a Libertação da Palestina
(FPLP), liderada por Georges Habashe.
Encerrava-se uma etapa do desenvolvimento do
movimento nacional palestino: os primeiros passos.

De 1967 a 1973: consolidação

O IV Congresso Nacional Palestino reuniu-se


no Cairo em 1968 (o segundo foi no Cairo, em
1965, e o terceiro em Gaza, em 1966), sempre
sob a presidência de Shukeiri. Mas, a essa altura, o
desgaste político do advogado já era bastante
acentuado. Shukeiri preocupava-se sobretudo com
o seu prestígio pessoal, com os conchavos de
cúpula, e muito pouco com a situação de seu povo.
Além disso, grassava a corrupção entre os dirigentes
da OLP, que se utilizavam em seu próprio proveito
das dotações dos países árabes.
Ahmed Shukeiri foi destituído pelo IV Con­
gresso, que elegeu como novo presidente Vehya
Hammouda, líder do Comitê Executivo da OLP e
0 que é Questão Palestina 51

r
anteriormente dirigente da Associação dos Advo­
gados Jordanianos. Hammouda, inclusive, não
podia regressar à Jordânia desde 1957, acusado de
ser comunista.
Em fevereiro de 1969, já organizado por Yehya
Hammouda, realizou-se no Cairo o V Congresso
Nacional Palestino, ou o Congresso que assinalaria
uma virada fundamental na vida da OLP, o início
de uma nova etapa: Al Fatah conquistou a hege­
monia do Comitê Executivo. Yasser Arafat,
engenheiro palestino que estudara no Egito e líder
de Al Fatah, assumiu a presidência da OLP.
A partir daí, a OLP optou cada vez mais por
seguir um caminho autônomo, próprio, em relação
aos regimes árabes. O Conselho (ou Congresso)
Nacional passou a fazer o papel de uma espécie
de Parlamento no exílio. Os inúmeros pequenos
grupos foram aos poucos desaparecendo, sobre­ r
vivendo apenas os mais importantes e expressivos
politicamente. A palavra de ordem da OLP era:
implantação na Palestina de um "Estado demo­
crático e laico para judeus, cristãos e muçulmanos".
0 VI Congresso Palestino ocorreu em setembro
de 1969, novamente no Cairo. Por unanimidade,
foi rejeitada a resolução 242 das Nações Unidas,
que pedia a retirada israelense dos territórios
árabes ocupados em 1967, reconhecendo implici­
tamente o Estado de Israel, e tratando a questão
palestina como um mero problema de "refugiados".
Os palestinos nem reconheciam Israel, nem
j
52 Helena Salem
--------------------------------------------------------------------- -
aceitavam que a sua questão de “direitos nacionais”
fosse abordada apenas como um caso de “ refu­
giados".

O massacre da Jordânia

A essa altura na Jordânia, (que até 1920, foi


parte da Palestina e, por isso, sua população
também tem origem palestina, além de beduína),
onde a Resistência gozava praticamente de um
poder paralelo ao do Rei Hussein, com a livre
ação de suas milícias (inclusive nas fronteiras), a
situação começou a ficar tensa. O fato é que
Hussein, um monarca autoritário e conservador,
não apreciava nem um pouco aquele poder
palestino revolucionário concorrente ao seu.
Então tratou, rapidamente, de se preparar para
lançar o bote, logo que aparecesse a oportunidade.
Assim, com o auxílio dos Estados Unidos, em
setembro de 1970, após pequenos incidentes
entre as tropas reais e os fedayin (guerrilheiros),
Hussein desencadeou violenta ofensiva contra os
comandos palestinos em Amã e no interior. Foi um
verdadeiro massacre: cerca de 4 mil mortos e
11 mil feridos. Despreparada política e militar­
mente, profundamente dividida, e subestimando
a capacidade bélica das forças do Rei, a Resistência
Palestina não teve a mínima possibilidade de
repelir a ofensiva.
V.
0 que é Questão Palestina 53

Alguns países árabes — como o Egito, Líbia,


Síria e Iraque — chegaram a protestar (sempre
verbalmente) contra a carnificina perpetrada
por Hussein. Mas ninguém levantou um dedo
sequer no sentido de impedi-la. Até que, a 27 de
setembro, os palestinos e Hussein aceitaram assinar
um acordo de cessar fogo no Cairo. 0 Presidente
Nasser tomou a iniciativa e foi o mediador do
acordo — sua última atuação como estadista antes
de morrer, pouco depois.
A guerra jordaniana passou à história com o
nome de "Setembro Negro". No entanto, a paz
obtida por Nasser não representou uma total
pacificação da Jordânia. A tensão persistiu, com
freqüentes choques entre os guerrilheiros e as

G
tropas reais. A Resistência atuava semiclandestina
em Amã, só podendo agir militarmente no interior.
Até que finalmente, em 1971, após novos ataques
das forças de Hussein, os fedayin foram definiti­
vamente banidos da Jordânia.
0 "Setembro Negro" golpeou violentamente
a estrutura da Resistência, mas teve também duas
conseqüências importantes: primeiro, revelou a
necessidade das diversas organizações se unirem,
para poder travar a luta em prol de seus objetivos;
e segundo, mais uma vez ficou claro para os
palestinos que deveriam contar com as suas
próprias forças e pouco esperar dos regimes árabes.

J
54 Helena Salem
r — --------------
O terrorismo

Os anos de 1969 e 1973 caracterizaram-se


também por uma intensa atividade terrorista por
parte das organizações palestinas. Foi a época dos
seqüestros de avião (realizados sobretudo pela
Frente Popular para a Libertação da Palestina), dos
atentados à bomba nos aeroportos, do massacre
de Munique (Olimpíadas de 1972, quando a
delegação israelense foi assassinada), das atividades
da organização "Setembro Negro".
A OLP condenava oficialmente o terrorismo,

r
J
mas não chegava a se esforçar muito para coibi-lo.
Ao contrário, parece não haver dúvidas hoje de que
"Setembro Negro" era um desdobramento (não
assumido publicamente) de Al Fatah, a principal
organização da OLP. Na realidade, o comporta­
mento da OLP em relação ao terrorismo asseme-
lhava-se muito ao da liderança sionista antes de
1948, face a organizações como o trgun eoStern.
A OLP desaprovava o terror politicamente, mas, de
certa forma, utilizava-se dele como mais um
instrumento de pressão, uma maneira negativa de
chamar a atenção para a causa palestina.

Após 1973: o caminho diplomático

A guerra de outubro de 1973, no Oriente


^------------------------------ --- -------------------------------- )
0 que é Questão Palestina SS

Médio, teve um papel extremamente importante


para a questão palestina. Tratou-se da primeira
guerra árabe-israelense em que os árabes de fato
tomaram a ofensiva,, conseguindo inclusive, nas
primeiras semanas do conflito, recuperar alguns
trechos dos territórios ocupados (a margem
oriental do canal de Suez egípcio e partes das
colinas de Golan sírias).
As primeiras vitórias árabes em 25 anos de
conflito — mesmo que depois tenham se diluído
com a retomada da capacidade ofensiva de Israel
- repercutiram muito politicamente na região
e no mundo. Por outro lado, em consequência
do recrudescimento da tensão na área, de novo
a questão árabe-israelense (que ultimamente vinha
sendo bastante "cozinhada" por Israel e EUA)
ganhou evidência internacional, assim como a
necessidade de se encontrar uma solução para
ela. Como não poderia deixar de acontecer, a
questão palestina voltou também à baila, já que
{
era, e é, um aspecto fundamental da disputa.
Derrotados militarmente ao fim da batalha, os
árabes foram certamente os grandes vencedores
políticos da guerra de outubro. Afinal, eram os
donos da "arma do petróleo", utilizada pela
primeira vez durante a luta. Começava assim o
desgaste político internacional de Israel, desgaste
este extremamente favorecido pela política
belicista intransigente e anexionista dos dirigentes
sionistas. Nesse clima político mundial favorável
Helena Salem

(pela simpatia ou, mais freqüentemente, pela


necessidade de petróleo), os árabes, pela primeira
vez também, gozavam de força política para
impor a discussão da questão palestina.
Por sua vez, a Resistência Palestina, politica­
mente mais amadurecida após tantos revezes,
procurou aproveitar esse espaço que se abriu.
A 21 de outubro de 1974, Yasser Arafat reuniu-se
em Beirute com o Ministro do Exterior francês,
Jean Sauvagnargues, no primeiro encontro de
um líder palestino com um alto representante
ocidental. Cinco dias depois, a Conferência de
Cúpula Árabe, em Rabat no Marrocos, reafirmou a
OLP como única representante do povo palestino
e ratificou a proposta (formulada por dirigentes
palestinos) de criação de um Estado Palestino
na Cisjordânia e Faixa de Gaza (territórios
ocupados por Israel em 1967).
Ao invés de centrar suas energias no militarismo,
a OLP começou a trilhar o caminho da diplomacia.
Não se tratava mais de conquistar o medo interna­
cional, enquanto um movimento isolado, mas de
obter a simpatia do mundo, através de um amplo
trabalho político-diplomático.
A 13 de dezembro —também de 1974 - a OLP
colheu um importante fruto de suas iniciativas.
Com honras de chefe de Estado, ovacionado pelo
plenário, Yasser Arafat falou pela primeira vez
na Assembléia Geral das Nações Unidas. Em seu
discurso, o presidente da OLP convidou "os
J
0 que é Questão Palestina 57
. >
judeus a safrem de seu isolamento moral" e propôs
"o estabelecimento na Palestina de um Estado
democrático no qual cristãos, judeus e muçulmanos
vivam em justiça, igualdade e fraternidade".
"A justiça da causa determina o direito da luta.
Sou um rebelde e minha causa é a liberdade",
declarou ainda, emocionado, Arafat. "Vim
trazendo um ramo de oliveira e o fuzil de um
lutador pela liberdade. Não deixem que o ramo
de oliveira caia de minha mão".
A OLP foi admitida como observador permanente
nas Nações Unidas, fato jamais concebido 10 anos
v antes. E passou a usufruir de uma simpatia cres-
* :í;;. cente, sobretudo do bloco do chamado Terceiro
Í Mundo (os países da África, Ásia e América Latina).
£ A partir desse momento, em quase todas as reu- .
niões internacionais, especialmente nos Estados 0
periféricos (como a Conferência dos Não-Ali- l
nhados), formulavam-se moções de apoio à causa
palestina.

Sionismo, Racismo e Anti-semitismo

Em fins de 1975, as Nações Unidas votaram uma


moção de repúdio ao sionismo, qualificando-o de
racista e segregacionista. Essa votação causou
muita polêmica, com setores da opinião pública
internacional acusando-a de anti-semita.
Mas será nnesmo que anti-sionismo equivale a
anti-semitismo? Honestamente, a resposta só pode
Helena Salem

ser negativa, E absolutamente falso, do ponto de


vista histórico, equiparar anti-sionismo com
anti-semitismo. Afinal, o judaísmo tem mais de
5 mil anos de existência, e o sionismo não tem um
século. Como vimos (no I Capítulo), o sionismo é
um movimento essencialmente político (ainda que
com aspectos religiosos e culturais), do fim do
século XIX, que pretende proporcionar uma
solução política nacional para a tragédia do
judaísmo europeu, decorrente da crise do capita­
lismo, sobretudo no Império russo.
Ser contra tal solução não significa, de maneira
alguma, ser contra os judeus, ser anti-semita.
Personalidades judias como Isaac Deutscher,
Noam Chomsky, Moshe Menuhim, Aharon Cohen
e tantos outros, posicionaram-se contrários à
política sionista, mas nem por isso poderiam ser
qualificados de anti-semitas. Um judeu do século
XVII era judeu sem ser sionista.
Por outro lado, o sionismo, ao determinar a
existência de um Estado de Israel exclusivamente
judeu, que segrega e discrimina todos os demais
(cristãos, muçulmanos, budistas, negros, orientais
etc.), que não reconhece o casamento civil inter-
confessional, não será, de fato, uma doutrina
racista e segregacionista?
0 que é Questão Palestina 59

A OLP e as principais organizações


A mais alta instância política palestina, reconhe­
cida no mundo árabe e já por mais de 80 países
como única representante legítima do povo
palestino, a Organização para Libertação da Pales­
tina (OLP) constitui basicamente uma frente
política, que agrupa diversas organizações,
entidades e personalidades políticas, coexistindo
em seu interior correntes revolucionárias, refor­
mistas, militaristas e até chovinistas.
Seu principal organismo é o Conselho Nacional
Palestino — o "Parlamento no exílio" - que reúne
delegados das várias organizações, associações
sindicais, femininas e elementos representativos
independentes. O Conselho tem funções legislativas
e elege também o Comitê Executivo da OLP, -
presidido desde 1969 por Yásser Arafat. 0Í
As quatro principais organizações integrantes T
da OLP eram, até fins de 1983: Al Fatah, Frente «
Popular para a Libertação da Palestina (FPLP), '
Al Saika, Frente Democrática Popular para a Li­
bertação da Palestina (FDPLP). Devem ainda ser
mencionadas a Frente Nacional Palestina (dos ter­
ritórios ocupados), a Frente Árabe de Libertação
e a Frente Popular para a Libertação da Palestina-
-Comando Geral.
Para compreendermos melhor o posicionamento
político da OLP, vale a pena examinar rapidamente
cada uma das principais organizações que estão
ou estiveram na sua vanguarda:
J
60 Helena Salem

r
A l Fatah — A maior e mais importante organiza­
ção da Resistência, o nome de Al Fatah (iniciais
ao contrário de Harakat A / Tahrir Al Falastini
— Movimento de Libertação Nacional da Palestina)
surgiu pela primeira vez, publicamente, em 1959.
Sua constituição resultou de discussões entre
estudantes da Faixa de Gaza, na segunda metade
da década de 50.
\ O líder Yasser Arafat nasceu em Jerusalém, em
1929. Depois da guerra de 1948, com 19 anos,
refugiou-se junto com a família na Faixa de Gaza.

r
Mais tarde, conseguiu ir para o Cairo estudar
engenharia civil e tornou-se presidente da Federa­
ção dos Estudantes Palestinos. Como estudante,
atuou na liderança e instrução dos comandos
palestinos e egípcios que lutaram contra os ingleses
na zona de Suez, serviu no Exército egípcio sendo
perito em demolições, e lutou contra os britânicos
e franceses em Port Said e Abu Kabir, em 1956.
Apenas por um curto período Arafat exerceu a
profissão de engenheiro no Egito, indo em seguida
para o Kuwait em 1957, onde permaneceu até
1965, sempre ligado à organização.
Al Fatah define-se como um movimento de
libertação nacional, anti-sionista e antiimperialista.
O objetivo estratégico dos militantes de Al Fatah
é o estabelecimento na Palestina de um Estado
laico e democrático, para árabes e judeus. No
entanto, a curto prazo, a organização propõe
que se forme um Estado palestino em Gaza e na
J
0 que é Questão Palestina 61

Cisjordânia, como etapa para o seu objetivo maior.


Internacionalmente, Al Fatah vinculou-se desde
os seus primeiros anos aos países ditos socialistas
- União Sovjética, China, Vietnã, Coréia, Europa
do Leste e Cuba —, deles recebendo apoio de
várias espécies: armas, treinamento, saúde, além
de sustentação política. Sem dúvida alguma,
embora procure manter uma relativa eqüidistância
das disputas entre esses países (Arafat, por exem­
plo, condenou a invasão soviética ao Afeganistão),
Al Fatah mantém maiores laços com o bloco
soviético. Após a guerra de 1973, ampliaram-se
as relações também com a Europa Ocidental,
África e América Latina.
Politicamente, Al Fatah é uma frente, onde
coexistem socialistas, nacionalistas, liberais, etc.,
majoritariamente muçulmanos, uma frente que
engloba trabalhadores do campo e da cidade, e
variadas categorias da pequena-burguesia (estudan­ S
£
tes, intelectuais, profissionais liberais, comerciantes,
etc.). A hegemonia hoje está nas mãos dos setores
nacionalistas mais moderados, antiimperialistas, e
não dos marxistas.
At Saika — Criada no XI Congresso do Partido
Baath, na Síria, em 1966, Al Saika ("raio”) só
começou a atuar, de fato, depois da guerra de
junho de 1967. Desde o início umbilicalmente
ligada ao governo sírio, Al Saika pôde se desenvol­
ver rapidamente, recrutando todos os militantes
palestinos na Síria.
L J
62 Helena Salem

Em pouco tempo, Al Saika se transformou na


segunda maior organização palestina, sem significar
com isso que tenha igual importância política.
Sua dependência absoluta de Damasco diminui
muito a sua capacidade de influir sobre a Resistên­
cia como um todo.
O programa político da Al Saika propõe a
criação de um Estado democrático na Palestina,
árabe e unitário, objetivando num futuro mais
\ tardio a formação de um grande Estado árabe
"socialista" (do "tipo sírio", leia-se, capitalismo
de Estado) no Oriente Médio. Fortemente
nacionalista, Al Saika segue incondicionalmente os
passos do governo baathista sírio: se este se alia
à União Soviética, ele vai atrás, se se afasta, ela faz
o mesmo.
Antes da derrota palestina na Jordânia, a organi­
zação possuía alguma influência também entre os
refugiados daquele país. Hoje, no entanto, Al
Saika está de fato mais limitada à Síria.
Frente Popular para a Libertação da Palestina
(FPLP) — O núcleo inicial da FPLP foi o setor
palestino do Movimento Nacionalista Árabe
(MNA), criado nos anos de 1959-60. O líder
Georges Habashe, um dos fundadores do MNA,
estudou medicina na Universidade Americana de
Beirute, no início da década de 50. Exerceu a
profissão em Amã, até se dedicar inteiramente à
militância política.
A FPLP, criada logo a seguir à Guerra dos Seis
0 que é Questão Palestina 63
>
Dias, resultou da fusão de três pequenos grupos
palestinos, mas divergências políticas (por exem­
plo, críticas de alguns setores da organização à
sua estreita dependência de determinados regimes
árabes) levaram a sucessivos "rachas". Em 1968,
Abmed Djibril desligou-se do grupo e formou um
pequeno movimento chamado FPLP — Comando
Geral. Em 1969, foi a vez de Nayef Hawatmeh e
seus correligionários, que criaram a Frente Demo­
crática Popular para a Libertação da Palestina
(FDPLP).
Nos anos de 1969-70, a FPLP notabilizou-se
por suas operações propagandísticas, como seqües-
tros de aviões e os atentados de Argel, Atenas,
Zurique e Damasco. Muitas delas foram condena­
das pelos outros grupos mas, mesmo assim, deram A
fama internacional à organização. f
A FPLP chegou a romper temporariamente \
com a OLP, liderando a chamada "frente de f
recusa", por discordar da política diplomática
seguida por Arafat. Habashe era contrário a
negociações e ao estabelecimento de etapas para se
atingir os objetivos estratégicos dos palestinos.
Politicamente, a FPLP afirma-se uma organização
marxista-leninista. Durante muitos anos, ela
manteve fortes laços com a China, criticando o
"revisionismo soviético”. Porém depois da morte
de Mao Tsé Tung e a abertura chinesa para o
ocidente, suas relações com Pequim esfriaram.
Frente Democrática Popular para a Libertação
J
64 Helena Salem

da Palestina (FDPLP) — Em fins de 1968, a ala


esquerda (como era conhecida) da FPLP, liderada
pelo jordaniano de origem palestina Nayef
Hawatmeh, começou a criticar a Frente por não
possuir um programa "realmente marxista, que
definisse as etapas da luta palestina contra o
sionismo". Acirrada luta interna foi travada, até
que Hawatmeh e seus companheiros optaram por
romper com Habashe, criando, a 24 de fevereiro
de 1969, a Frente Democrática Popular para a
Libertação da Palestina.
Segundo Hawatmeh, a luta pelo objetivo
máximo da Resistência — criação de um Estado
democrático e laico na Palestina — deveria ser
travada em etapas. Assim, em 1973, no bojo da
quarta guerra árabe-israelense, a FDPLP formulou
seu "programa de etapas", propondo a formação
de um Estado palestino na Cisjordânia e Gaza
como primeiro passo para o objetivo estratégico
final: um Estado em toda a Palestina.
Paralelamente, a Frente Democrática definia
como metas prioritárias: concentração do trabalho
político dentro dos territórios ocupados e nos
campos de refugiados; diálogo e ação conjunta com
os grupos progressistas e anti-sionistas de Israel;
independência em relação aos regimes árabes.
A FDPLP chegou a crescer razoavelmente, nos
anos de 1973-74, aproximando-se bastante,
politicamente, de Al Fatah. Embora sendo
marxista, aceita em suas fileiras elementos não
0 que é Questão Palestina 65
------------------------------------------------------------ --
marxistas que concordem com o seu programa
(do contrário, não teria espaço entre uma popu­
lação na maior parte muçulmana).
Da mesma forma que defendia a independência
em relação aos regimes árabes, Hawatmeh postu­
lava a autonomia de sua organização face às
disputas do dito bloco socialista, não tomando
partido na polêmica sino-soviética. No entanto, nos
últimos anos, a FDPLP vem se ligando à URSS e
há quem diga, inclusive, que ela seria no futuro
o núcleo de um Partido Comunista palestino
pró-soviético.
Outros grupos — Fora dessas quatro principais
organizações, todos os demais grupos têm muito
pouca expressão. É o caso da Frente de Liber­
tação Árabe (pró-iraquiana) e da FPLP — Co­
mando Geral, de Ahmed Djibril, movimentos pro­
fundamente atrelados aos regimes árabes, nacio­
nalistas chovinistas e sem maior implantação no
povo palestino.
r
Diferente, porém, é o caso da Frente Nacional
Palestina, que atua clandestinamente nos territórios
ocupados, debaixo de forte repressão, e que
procura articular e organizar a oposição ao
domínio sionista. Como boa parte da Resistência,
a FNP é favorável à criação de um Estado palestino
em Gaza e na Cisjordânia.
Finalmente, a organização Setembro Negro, que
chegou a ser muito temida. Hoje em dia já não
mais existe. Sua primeira ação militar foi em
L ___________________________________ j
66 Helena Salem

1971, quando assassinou, no Cairo, o Primeiro


Ministro jordaniano, Wasfi Tell, comandante da
repressão à guerrilha palestina na Jordânia em
1970. Depois, Setembro Negro realizou alguns
atentados violentos, como o massacre da delegação
israelense em Munique em 1972.
As ações da Setembro Negro — braço armado
não assumido de Al Fatah — foram diminuindo
com a ofensiva diplomática da OLP, após outubro
de 1973, até o desaparecimento do grupo.
A cisão da OLP

Foi em fins de 1983, portanto dez anos após


ter conquistado sua grande projeção internacional,
que a OLP sofreu certamente a sua mais grave
crise: a cisão em duas facções, beligerantes entre
si — uma liderada por Arafat e outra teleguiada
pelos sírios.
Ao que tudo indica, a rebelião contra a lide­
rança de Arafat iniciou-se no Líbano, em 1982,
depois da derrota da guerrilha palestina no sul
do país e da chamada "Batalha de Beirute" con­
tra o Exército israelense. Arafat recusou-se na
época a trocar qualquer de seus líderes políticos
ou militares, ou mesmo mudar sua linha de ação,
nomeando ainda alguns quadros tidos como cor­
ruptos ou pouco populares para cargos de co­
mando. Paralelamente, o presidente da OLP
começou conversações com o Rei Hussein da
Uque e yuestao raiesnna o/
--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- .

Jordânia sobre um plano de paz do Presidente


Ronald Reagan, dos EUA, indispondo-se com a
Síria que se julgava no direito de falar em nome
dos palestinos em qualquer negociação árabe-
-israelense.
Aparentemente, a princípio a revolta desen­
cadeou-se espontaneamente, chefiada pelo Coro­
nel Saed Musa e alguns outros oficiais superiores
palestinos insatisfeitos. Logo porém a Síria fez
sentir sua presença nesse movimento, dando-lhe
armas e finaciamento, e cercando as forças fiéis
a Arafat no Líbano. Entre os revoltosos, os mili­
tantes da FPLP e da FPLP — Comando Geral, de
Ahmed Djibril. A luta chegou a tal ponto que
Yasser Arafat e suas forças acabaram sendo obri­
gadas a se retirar, sob cerco, do país (com garantias J t
das Nações Unidas), configurando assim a divisão ^
daOLP. I
Os palestinos rebeldes, entre muitas outras V
coisas, acusavam o líder da OLP de autoritário ^
e de perpertuar-se no poder. O que pode ser, de
fato, verdade. Mas quem escapa à liderança auto-
riária no próprio mundo árabe? O governo sírio,
por acaso, que mantém a oposição liberal e de
esquerda rigorosa mente sob controle ou na ca­
deia (quando não a elimina)? As próprias orga­
nizações palestinas que, em sua maioria, desco­
nhecem a alternância democrática do poder na
constituição de seus órgãos dirigentes? Certa­
mente Arafat pode ser acusado de todos os de-
v ____________________ ______I__ -------------- J
68 Helena Salem

(
feitos, mas uma coisa também não é menos real:
sob sua liderança a OLP conseguiu um nível
de independência importante em relação aos
países árabes e às próprias superpotências. Ele é
um líder nacionalista, seguramente não é um
revolucionário radical (no melhor sentido da pa­
lavra), mas se com ele pode não ser ótimo, sem
ele, efetivamente (na falta de outras lideranças
do mesmo porte), seria ainda pior —já que o amor-
daçamento da Resistência Palestina pelos sírios
resultaria, inevitavelmente, na sua morte en­
quanto movimento de libertação nacional de
todo um povo. Sintomaticamente, nos territó­
rios ocupados de Gaza a Cisjordânia naquele
mesmo período, em todas as manifestações ocor­
ridas era o nome de Arafat e da OLP que os pales­
tinos gritavam. E, afinal, é nesses territórios que,
se um dia vier a surgir a pátria palestina, ela se
consubstanciará.
O ESTADO PALESTINO

0 povo palestino passou do domínio turco e


britânico à diáspora, sem conhecer a independência
nacional. 0 Estado árabe-palestino, determinado
pela partilha das Nações Unidas de novembro de
1947, não chegou a sair do papel, já que foi riscado
do mapa por Israel (que anexou sua maior parte),
Jordânia (que ficou com a Cisjordânia) e Egito
(com Gaza).
Passados 35 anos do conflito que impediu a
formação de uma nação palestina independente,
de novo a questão do Estado palestino está na
ordem do dia. A Resistência luta por esse Estado,
enquanto Israel não admite sequer falar no assunto.
Afinal, que tipo de Estado desejam os palestinos?
Qual a sua viabilidade? Como está atualmente a
situação nos territórios palestinos ocupados?
Como já nos referimos antes (Capítulo III), desde
J
r
o seu nascimento a OLP luta pela criação em toda
a Palestina (incluindo Israel, portanto) de "um
Estado democrático e laico, onde cristãos, judeus
e muçulmanos tenham os mesmos direitos e
obrigações".
Importante destacar que esse Estado "democrá­
tico e laico" não pressupõe o extermínio ou
expulsão dos judeus da região. Em seu discurso
nas Nações Unidas, em dezembro de 1974, Yasser
Arafat colocou a questão da seguinte maneira:
"Oferecemos-lhes (aos judeus) a solução mais
generosa, que é a de vivermos juntos em um
contexto de paz justa em nossa Palestina demo­
crática. Propomos o estabelecimento na Palestina
1 de um Estado democrático no qual cristãos,
judeus e muçulmanos vivam em justiça, igualdade
e fraternidade". O que Arafat e a OLP nunca
definiram, porém, é a natureza que teria tal Estado:
se capitalista ou socialista.
Contudo não há dúvida de que, se esse Estado
"fraterno e democrático" for um dia alcançado,
ele ainda está muito longe da realidade. Em déca­
das de conflito sangrento, já existe hoje, concreta­
mente, um grande fosso de ressentimento e
desconfiança entre os povos palestino e israelense.
E não há de ser do dia para a noite, e de cima para
baixo, que os dois poderão viver em paz numa
mesma casa. Ao contrário, com certeza precisarão
algumas décadas ainda, pelo menos, para tornar
possível tal convivência — a qual, no nosso
V- J
72 Helena Salem

r
entender, só poderia ocorrer mesmo nos marcos
de uma sociedade socialista, igualitária.
Na medida em que foi se fortalecendo local e
internacionalmente, a OLP começou a perseguir
objetivos realizáveis mais a curto prazo. Assim,
desde 1974, ela aderiu ao projeto de implantação
de um Estado independente palestino na Cisjordânia
e Faixa de Gaza, territórios que deveriam ser
ligados entre si por um corredor passando dentro
de Israel. (Como objetivo estratégico final, porém,
a liderança palestina mantém a idéia de um único
Estado em todo o território palestino.)
Esse pequeno Estado agora proposto pela OLP
teria pouco menos de 6 000 km2. Só que a popula­
ção palestina é estimada atualmente em 4 milhões
de pessoas, com uma taxa de crescimento demográ­
fico das mais elevadas do mundo: 3,5% anual.
No ano 2000, os técnicos preveem que ela alcan­
çará os 7 milhões. Como ficariam tantos em uma
faixa de terra tão exígua ?
Os economistas Elias Tuma, palestino, e Hayim
Darin Drabkin, israelense, em um estudo de 1977,
previram que a população de um futuro Estado
palestino em Gaza e Cisjordânia não deveria
ultrapassar 2 400 mil, isto é, 60% da população
palestina, assim distribuídos quanto à procedência:
750 mil da Cisjordânia, 350 mil da Faixa de Gaza,
390 mil cidadãos dos países árabes e habitantes
dos campos, 800 mil procedentes dos países
árabes (não cidadãos), 50 mil de Israel (árabes
0 que é Questão Palestina 73

r ~\
israelenses), 10 mil de fora do Oriente Médio.
Desse total, estima-se que a população ativa se
eleve a mais de 30%, ou seja, 700 mil trabalhadores.
E seria viável um Estado desses? Os cientistas
sociais palestinos Bichara e Naim Khader, da Uni­
versidade Católica de Louvain (Bélgica), afirmam
categoricamente que sim. E explicam que não se
deve confundir Estado independente com Estado
autárquico. Dizem eles, em um trabalho publicado
em 1980: "Tal Estado terá certamente excelentes
relações com seus vizinhos árabes e relações privi­
legiadas com a Jordânia. A independência não
significa absolutamente a autarquia ou o fecha­
mento".
Segundo os dois estudiosos, atualmente, ao invés
da economia rural, a urbanização revela que o
tamanho da superfície territorial não é mais o
critério dominante para o desenvolvimento e, /
assim, um país pequeno pode ter um potencial \
econômico muito maior que um grande. Seria o
caso do Japão, de 144 000 km2 e 110 milhões de >1
pessoas, em oposição a Mongólia, um imenso
território de 604 000 km2 com apenas 1 milhão
de habitantes.
No seu entender, a Cisjordânia eGaza, territórios
férteis, teriam plenas condições de se industrializar,
devido a três fatores: a) existência de uma força
de trabalho abundante (700 mil) e quadros quali­
ficados; b) uma rede de transportes e comuni­
cações que permite a importação e exportação
74 Helena Salem
----------------------------------------------------------------
das matérias-primas básicas; c) capitais para
financiar a construção do Estado.
Bichara e IMaim afirmam mesmo que o povo
palestino constitui o Quartier Latin ("bairro
latino", centro da intelectualidade em Paris)
do mundo árabe, visto que dispõe de uma grande
concentração de quadros e intelectuais em todas
as especializações. Para se ter uma idéia, estima-se
em 16 a 17 por 1 000 a taxa de ensino universitário
entre os palestinos, o que seria um número
equivalente ao de Israel e superior a alguns países
\ europeus, como a Espanha (9/1000). Atualmente,
] é calculado em 115 mil o total de quadros univer-
j sitários palestinos, dos quais uns 15 mil estariam
J empregados na Cisjordânia e Gaza.
’ Por outro lado, os estudos dos economistas
Tuma e Drabikin antecipam que seriam necessá­
rios cerca de 12 bilhões de dólares para viabilizar
economicamente o Estado palestino. Tal soma teria
quatro direções: urbanização e melhoria das
construções existentes, criação de novos postos de
emprego e melhoramento das atuais condições
de trabalho, desenvolvimento da infra-estrutura
nacional e modernização da agricultura. Se conside­
rarmos que Egito e Síria juntos dispenderam
15 bilhões de dólares na guerra de outubro de
1973 — dizem os economistas — 12 bilhões não
é tanto assim.
Os palestinos consideram que esse capital
poderia ser obtido graças às indenizações a serem
s____________________________________________
0 que é Questão Palestina 75
—\
pagas por Israel, à ajuda oficial árabe, à ajuda da
ONU e às remessas de capitais palestinos, oficiais'
e privados.
Outra importante fonte de renda seria, também,
o turismo. O Estado palestino compreenderia
necessariamente Jerusalém oriental com seus
lugares santos muçulmanos, cristãos e judeus,
muito procurados pelos peregrinos e turistas.
Por sua vez, na Cisjordânia ficam o Mar Morto e
o Vale do Jordão, e na Faixa de Gaza existem
atraentes praias, todos pontos de importante
atração turística.
Enfim, a liderança palestina parece não ter
dúvidas de que seria plenamente viável um Estado
independente palestino na Faixa de Gaza e Cisjor­
dânia. Sua viabilidade, inclusive, revelar-se-ia tão
mais palpável quando se constata a profunda
hostilidade de Israel à idéia. No entanto, é certo
também que tal Estado — pequeno, sem recursos
minerais e energéticos — poderia ter sua indepen­
dência real um tanto limitada, devido aos fortes
laços que provavelmente manteria com os seus
vizinhos árabes, sobretudo a Jordânia, a Síria, os
países produtores de petróleo e, talvez, também
a URSS.
Afinal, a dependência econômica acarreta com
frequência dependência política: vide o próprio
caso de Israel em relação aos Estados Unidos e
de Cuba com a União Soviética. Em última
instância, contudo, a palavra final caberá sempre
76 Helena Salem
------- ---------------------------------------------- _ _ _ _ _
ao próprio posicionamento político daqueles
que assumirem a direção desse Estado palestino
e ao regime que lá implantarem.

Gaza e Cisjordânia:
a repressão não funcionou

Para os ultranacionalistas religiosos israelenses, a


margem ocidental do Rio Jordão não se chama
Cisjordânia: seu nome é Judéia e Samaria, inte­
grantes do antigo Reino de Israel, parte hoje
r indissociável do Estado sionista. Daí a política
de criação de colônias agrícolas nesse território:
entre 1967 e 1981, foram levantadas cerca de
104 colônias na Cisjordânia (e 10 em Gaza).
Considerando que se trata de uma pequena
região densamente povoada por árabes, a criação
dessas colônias sionistas resultou em substancial
aumento do clima de tensão na área. Inclusive
porque, ao admitir que grupos fanáticos formassem
essas colônias, o governo israelense violou todas
as convenções internacionais sobre territórios
ocupados. A esse respeito, o Conselho de Segu­
rança da ONU, a 20 de julho de 1979, votou a
resolução 452 rechaçando a pol ítica israelense de
estabelecer colônias nos territórios árabes ocupa­
dos, e qualificando-a de violação da IV Convenção
de Genebra sobre a proteção das pessoas civis
0 que é Questão Palestina 77

em tempo de guerra.
Hoje, já existem aproximadamente 18 mil
colonos judeus na Cisjordânia e 7 mil na Faixa de
Gaza. é lógico que, no futuro, esses colonos hão
de colocar todos os obstáculos a uma eventual
retirada israelense dos territórios, se a paz com os
árabes for alcançada.
Paralelamente à criação das colônias, o governo
israelense executa uma política duramente repres­
siva em relação aos palestinos das áreas ocupadas.
Até 1968, quando o Rei Hussein fechou as pontes
de acesso à Jordânia, era comum a deportação
em massa para aquele país.
Segundo o Dr. Israel Shahak, professor da
Universidade Hebraica de Jerusalém e presidente
da Liga dos Direitos Humanos em Israel, havia nos
territórios ocupados 1 milhão e meio de palestinos
antes da guerra de 1967, e hoje eles são pouco
mais de 1 milhão.
Incansável defensor dos direitos humanos dos
palestinos em Israel, o Dr. Shahak —através de
artigos, livros, conferências dentro e fora do país -
denuncia a prática de punições coletivas ampla­
mente utilizadas pelas autoridades sionistas, tais
como: destruição das casas de possíveis suspeitos
de conspirar contra a ocupação, mesmo que nelas
habitem familiares velhos e crianças; proibição
da venda de carne de carneiro em uma determinada
cidade (Ramallah, por exemplo) durante dois
meses, para forçar os notáveis palestinos a se
78 Helena Salem

curvarem face às autoridades sionistas etc. etc....


As prisões nos territórios ocupados vivem
lotadas. Estima-se que, desde 1967, 30 mil pales­
tinos passaram ou permaneceram nos cárceres
israelenses. Em 1977, era calculado em 5 mil o
total de militantes palestinos presos nos territórios
ocupados, condenados a penas entre 5 e 120 anos.
Em seu livro With My Own Eyes {Com Meus
Próprios Olhos), a advogada israelense Felicia
Langer, defensora dos presos políticos nos territó­
rios ocupados, declara que as autoridades sionistas
sistematicamente praticam a tortura: espanca­
mentos, choques elétricos nos órgãos genitais,
afogamentos, queimaduras com cigarros etc.
Ou, ainda, a execução pura e simples. Outro
método utilizado é a expulsão individual: durante
a noite, o prisioneiro é colocado fora do território
ocupado (no Líbano ou Jordânia), sem direito
a retorno.
Na opinião do Dr. Israel Shahak, "o regime de
ocupação dos territórios árabes — longe de ser
liberal - é um dos mais cruéis e mais repressivos
que conheci na história moderna''. Nem por isso,
no entanto, acabou ou diminuiu o sentimento
antiocupação entre os palestinos desses territórios,
nos últimos 15 anos. Muito pelo contrário, a
criação de colônias, a deportação, as mortes, a
destruição de casas, a repressão só fizeram aumen­
tar esse sentimento.
De ano para ano, intensificam-se as manifesta-
L _J
0 que é Questão Palestina 79
----------------------------------------------- ------------------ v
ções antiisraelenses, algumas com muita violência
- como as que ocorreram em março e abril de
1982, que resultaram na morte de cinco palestinos
e um israelense. E não se tratam apenas de
protestos de estudantes, mas de toda a população,
incluindo os notáveis. Via de regra, uma manifes­
tação em Nablus ou Hebron acaba se espraiando
por todo o território e até mesmo à Faixa de
Gaza. O que, antes, eram pequenos atos isolados,
agora generaliza-se.
Ao mesmo tempo, há um crescente movimento
no sentido de rejeitar qualquer solução que não
seja a independência de Gaza e Cisjordânia. Por
exemplo: em fins de março de 1982, prefeitos
palestinos de oito cidades dos dois territórios
- Belém, Hebron, Kulkarim, Dura, Beit Sahour,
Qalquiya, Anabte e Gaza — anunciaram que
boicotariam o governo civil a ser instalado por
Israel em substituição ao governo militar.
De acordo com os prefeitos, a nova administração
civil seria parte do plano israelense para impor
uma autonomia limitada às duas regiões. Esse fato
é totalmente rejeitado pela população palestina.
Inclusive, na ocasião, realizou-se uma greve geral
nos territórios, em protesto contra os planos
israelenses de autonomia controlada.
A repressão não conseguiu sufocar o protesto
dos palestinos.

y
OS PALESTINOS E A
CONJUNTURA INTERNACIONAL

Os acordos de Camp David

A 17 de setembro de 1978, o Presidente dos


Estados Unidos, Jimmy Cárter, o Primeiro Ministro
de Israel, Menahem Begin, e o Presidente do
Egito, Anwar Sadat, assinaram os Acordos de
Camp David, regulamentando a paz entre egípcios
e israelenses.
Os acordos, alcançados menos de um ano após
a célebre visita do Presidente Sadat a Israel
(dezembro de 1977), estabeleceram a programação
para a retirada israelense da Península do Sinai
até 25 de abril de 1982, e uma série de itens
referentes à segurançça e às relações dos dois
países. Além disso, Camp David pretendia criar
J
0 que é Questão Palestina 81
>
as condições para a solução do problema pales­
tino.
Em todo o mundo árabe os acordos foram
veementemente rejeitados, tanto pelos governos
notoriamente conservadores como por aqueles
tidos como mais progressistas. Os dirigentes árabes
acusavam Sadat de ter feito a paz em separado
com Israel e ser, por isso, um traidor. A Confe­
rência de Cúpula Árabe, realizada entre 5 e 7 de
novembro de 1978, em Bagdá, votou várias sanções
contra o Egito.
A Organização para a Libertação da Palestina
também repudiou Camp David. E não apenas por
se tratar de uma “paz em separado", mas sobre­
tudo por considerar que os acordos eram "um
novo passo no processo de eliminação da causa
palestina".
Item por item, a OLP rebateu todas as propostas
contidas em Camp David com relação aos palesti­
nos e aos seus territórios ocupados, Cisjordânia,
Faixa de Gaza e Jerusalém Oriental. Vale a pena
examinar essas objeções, tomando como base
o estudo de Fayez A. Sayegh, publicado pela OLP.
Os direitos palestinos fundamentais —Os acordos
prevêem "uma solução final para o problema
palestino que exclui o exercício do direito nacional
inalienável do povo palestino à sua autodetermi­
nação na Palestina. O direito humano natural dos
palestinos regressarem aos seus lares e o direito
elementar do povo palestino escolher e designar
L. ______________.____________________— j
82 Helena Salem

seus representantes nacionais” .


O desmembramento permanente do povo
palestino — 0 povo palestino é dividido em três
diferentes categorias: os habitantes da margem
ocidental (Cisjordânia) e Gaza; aqueles que foram
desalojados desses dois territórios em 1967; e
finalmente, de maneira genérica, os refugiados.
Os acordos não mencionam por exemplo aqueles
que foram desalojados depois de 1967 de Gaza
e Cisjordânia, nem os que saíram em 1948, mas
que não se registraram no UNRWA.
Para cada categoria, Camp David prevê uma
forma diferente de negociar, sacralizando assim
o desmembramento do povo palestino.
Uma "solução im posta" — Todas as decisões
básicas sobre os procedimentos a se adotar em
relação ao problema palestino foram tomadas
sem a presença de representantes palestinos e
ignorando os seus anseios. "Nesse sentido, os
acordos de Camp David figuram na História da
Palestina junto com a Declaração Balfour, o
Mandato da Sociedade das Nações, a recomenda­
ção da partilha da Assembléia Geral da ONU
e a resolução 242 do Conselho de Segurança,
todos eles tratando os palestinos como objetos e
ignorando seus direitos inalienáveis e suas legíti­
mas aspirações".
"Completa autonomia" — Sobre a proposta
para o estabelecimento de um regime transitório
na Cisjordânia e Gaza, com vistas a uma autonomia
V. J
84 Helena Sälen,

limitada, a OLP faz as seguintes objeções:


—Camp David prevê a retirada do governo
militar israelense e sua substituição por um auto­
governo com completa autonomia. Só que os
poderes desse governo deverão ser definidos
ainda através de negociações entre o Egito, Israel
e Jordânia. Ora, considerando,,que os três países
têm de concordar entre si, isso significa que cada
um deles possui também poder de veto. Ou seja,
tal "autogoverno” não poderá usufruir, na prática,
de "completa autonomia", como se pretende.
—A participação palestina nas negociações é,
na realidade, "uma farsa". Segundo os acordos,
"as delegações do Egito e Jordânia podem incluir
palestinos da Cisjordânia e Faixa de Gaza ou
I
i
outros palestinos, desde que em um acordo
mútuo". Essa pequena cláusula tem uma série
de implicações, a saber:
1) a participação dos palestinos nas delegações
da Jordânia e Egito não consta como decisão, mas
deve ser submetida ainda à aprovação desses
governos;
2) a seleção de representantes individuais pales­
tinos fica a critério dos dois governos árabes
(Egito e Jordânia), e não do próprio povo palestino;
3) cada palestino incluído na delegação deve ser
aprovado também por Israel (Arafat estaria de
fora, então);
4) durante as negociações, cada proposta feita
pelos palestinos deve ser aprovada pela delegação
J
0 que é Questão Palestina 85
-------------------------------------------------------------- -
do país árabe a que pertence;
5) uma proposta considerada inaceitável pelos
participantes palestinos pode ser aprovada pela
delegação árabe;
6) qualquer proposta de um participante pales­
tino — já ratificada por sua respectiva delegação
árabe — precisa ser também aprovada pela dele­
gação israelense, para poder figurar no acordo
final.
—As eleições para o "autogoverno" se realizarão
sob a ocupação militar. Não se prevê a suspensão
sequer da legislação militar durante a campanha
eleitoral e as eleições, o que, no mínimo, castra
a liberdade de expressão.
—Durante o período de transição, programado
para cinco anos a partir do estabelecimento do
"autogoverno", as forças israelenses continuarão m
estacionadas na Cisjordânia e Gaza, operando-se /
apenas uma retirada parcial em locais a serem \
especificados ao largo de negociações egípcio- V
jordano-israelenses. Assim, a "autoridade áutô- ^
noma” não terá nenhum poder para determinar os
locais a serem evacuados. E mais: os acordos
legitimariam ainda por mais tempo "uma ocupação
considerada internacionalmente ilegal".
—A situação do setor oriental de Jerusalém
ocupado fica de fora das negociações tripartites
(Egito-Jordânia-Israel), assim como fora do âmbito
da autoridade do "autogoverno". Em suma, o
"autogoverno" não poderá fazer nada contra a
V_________________.__________________J
86 Helena Salem l

destruição de bairros árabes, a desfiguração da


cidade e sua incorporação efetiva a Israel.

Os palestinos e os países árabes

Os Acordos de Camp David isolaram profun­


damente o Egito do restante do mundo árabe, e
K especialmente da OLP. O Presidente Sadat, que
seria assassinado a 6 de outubro de 1981, foi
literalmente repudiado.
/ Se é verdade que o Egito de Sadat, e hoje de
Hosni Mubarak, voltou as costas para os palestinos,
não se pode dizer, também, que os demais regimes
árabes sejam amigos particularmente confiáveis
da OLP. Tidos como mais progressistas ou
conservadores, os regimes árabes são, em sua quase
totalidade, dirigidos por governos autoritários,
repressivos (por conseguinte, antipopulares, com
medo do povo), e atrelados a uma ou mais
potências imperialistas.
Freqüentemente, o apoio desses regimes à causa
palestina implica tentativa de manipulação,
controle, ou se esbarra na eventual ameaça que a
luta palestina possa representar para a sobrevi­
vência interna de tais governos autoritários. Afinal,
apesar de todas as suas limitações, a OLP tem uma
proposta antiimperialista e revolucionária, dife­
rente dos regimes árabes.
)que é Questão Palestina 87

Não existe nenhuma mulher no mundo árabe


tão integrada política e culturalmente, tão eman­
cipada, como a palestina. Ou, ainda, os palestinos
falam em Estado laico, enquanto todos os Estados
da região (árabes e israelense) são religiosos,
rejeitando até o matrimônio interconfessional.
Enfim, apesar de todos os fatores de identidade
étnica, cultural, a questão palestina é um problema
político, e os demais fatores se curvam necessa­
riamente diante desse aspecto principal.
Inclusive, apenas compreendendo bem tal
característica política é que podemos entender
também as idas e vindas da "solidariedade árabe"
em relação à OLP. Por exemplo, as tropas do
Rei Hussein na Jordânia massacraram seus irmãos
palestinos, quando o poder revolucionário dos
fedayin se tornou uma ameaça ao poder monár­
quico. Durante a guerra civil no Líbano, metra-,
lhadoras e tanques sírios concentraram seu fogo ’
no campo palestino de Tal Zaatar, assassinando
centenas de pessoas, numa tentativa de arrebentar
com uma força que contestava a ação de Damasco
no conflito. A Líbia de Muammar Kadhafi, apesar
R
do radicalismo verbal pró-palestino, nunca moveu
uma palha contra nenhum desses massacres. Os
palestinos também foram massacrados e expulsos
de Beirute por Israel, ante os olhos passivos de
todos os regimes árabes.
Por outro lado, não há dúvida de que a questão
palestina e o estado de beligerância contra Israel,
j
88 Helena Salem

como todas as situações de guerra, constituem


uma boa forma de desviar as atenções dos proble­
mas internos dos países árabes. Assim, com uma
mão, o Príncipe Fahd, da Arábia Saudita, ajuda
financeiramente a OLP e propõe um plano de
paz (o "Plano Fahd” ), incluindo a criação de um
Estado palestino nos territórios ocupados, e com
a outra reprime os descontentes políticos em
seu país.
Ou seja: as relações dos líderes palestinos com os
diversos regimes árabes variam muito segundo a
conjuntura política interna de cada um. 0 mesmo
Rei Hussein que massacrou em 1970 os fedayin
hoje estende a mão a Arafat, sem que tenha al­
terado em nada o seu pensamento e prática po­
lítica na Jordânia. Portanto, se existe a solida­
riedade étnica, esta subordina-se sempre aos
interesses políticos do momento.
Em função de sua própria experiência nos
últimos anos, e mais recentemente no Líbano,
a OLP cada vez mais se esforça por conservar-se
eqüidistante das querelas regionais — embora
sem dispensar o apoio material e político dos
países árabes (quando consegue).
Apesar disso, algumas organizações da Resis­
tência mantêm laços muito fortes com um ou
outro regime árabe (Al Saika com a Síria, por
exemplo).
Depois do "Setembro Negro” na Jordânia, a
OLP transferiu para o Líbano o seu centro de

J
0 que é Questão Palestina 89

r
ação militar e política na região. A guerra civil
naquele país iniciada em 1975, que resultou na
divisão do Líbano em três (setor dos cristãos
maronitas, setor dos muçulmanos libaneses e
palestinos, e território de ocupação síria), signifi­
cou um sério baque para a Resistência Palestina, que
perdeu milhares de combatentes (e também civis
palestinos). Como também, a expulsão dos fe-
dayin, em agosto de 1982, pelas tropas de Israel,
após um verdadeiro genocídio, representou uma
grande perda de conseqüências ainda imprevisíveis
(os fedayin foram então dispersos por vários países:
Síria, Tunísia, Egito, Arábia Saudita etc.). Por
fim, a cisão da OLP, em 1983, certamente figura
entre os maiores danos já experimentados pelo
movimento palestino desde a sua formação.

A posição de Israel

A liderança política israelense, seja tendo à


frente o bloco de direita Likud ou o Partido Tra­
balhista, sempre se recusou a reconhecer e nego­
ciar com a Organização para a Libertação da Pa­
lestina, sob o pretexto de que era um "bando de
terroristas”. Os eventuais encontros entre persona­
lidades (progressistas) israelenses e membros da
OLP, já ocorridos, tiveram lugar geralmente no
exterior e total mente à margem do esquema polí­
tico oficial.
90 Helena Salem

r
Durante muitos anos, os israelenses apostaram
na integração dos palestinos nos países árabes em
que haviam se refugiado, negando a existência
de uma questão palestina. Por uma razão ou por
outra (falta de empenho dos regimes árabes e/ou
resistência dos próprios palestinos devido ao seu
sentimento nacional em relação à Palestina), o
fato é que concretamente essa integração não
aconteceu e Israel viu-se na contingência de
alterar seus pontos de vista. Quer dizer, alterar
em parte.
0 máximo que o governo israelense hoje admite
é o que está escrito nos acordos de Camp David:
a autonomia limitada (e muito) dos palestinos de
Gaza e Cisjordânia. As colônias implantadas nesses
territórios lá devem permanecer e, quanto a Jeru­
salém oriental, não se cogita absolutamente em sua
devolução aos árabes ou mesmo sua internacionali­
zação. Ao contrário, segundo o governo israelense,
"Jerusalém está unida e é indivisível, e será por
toda a eternidade a capital de nosso povo".
E não há dúvida de que, se as condições polí­
ticas assim o permitirem, o governo fará todo
o possível para anexar na íntegra a própria
Cisjordânia - ou melhor, segundo os religiosos
nacionalistas, a Judéia e Samaria, também são
"territórios indissociáveis" do Grande Israel.
Por outro lado, a invasão do Líbano pelas
forças israelenses em junho de 1982 trouxe um
dado novo à realidade interna de Israel. Pela
________ _
0 que é Questão Palestina 91

primeira vez em sua história, num momento de


guerra, verificaram-se manifestações de repúdio
no país contra a atuação do governo e forças
armadas. Israel atacou o Líbano, massacrou civis
palestinos, num período em que, de maneira
alguma, poder-se-ia invocar risco de segurança
ao Estado sionista. Foi uma guerra absolutamente
ofensiva, quase de extermínio, já que o alvo era
indiscriminado, atingindo simultaneamente fedayin
e milhares de civis palestinos indefesos.
A guerra do Líbano, desfechada pouco depois
do ex-Premier Menahen Begin sofrer quase uma
derrota no Parlamento e com a clara intenção de
forçar os palestinos a engolirem a solução de Camp
David (autonomia limitada), fez com que se desen­
volvesse um movimento sem precedentes da oposi­
ção dentro do Estado de Israel. Movimento que se
intensificou ainda mais após o massacre perpetrado
pelas forças falangistas cristãs libanesas nos.cam­
pos de refugiados de Sabra e Chatila, em Beirute
Ocidental, com a cumplicidade das tropas israelen­
ses que ocupavam a cidade, dirigidas pelo Ministro
da Defesa Ariel Sharon e o Premier Menahen
N
Begin.
É possível que, futuramente, esse movimento
desencadeado em Israel sob a liderança do "Paz
Agora'' (que chegou a levar 400 mil pessoas às
ruas de Telaviv) se torne a base para uma
mudança de posição do governo sionista em
relação aos palestinos. Que ao invés da violência,
92 Helena Salem
---------------------------------------------------- ——
da repressão, Israel enverede pelo caminho do
diálogo. Mas isso dependerá, também, de uma
maior definição do próprio "Paz Agora" quanto
è questão palestina e à OLP.
Por sua vez a OLP, ainda no bojo da guerra
libanesa, também enunciou um implícito reconhe­
cimento do Estado de Israel, ao afirmar que
aceitava todas as resoluções das Nações Unidas
referentes aos palestinos. Assim, embora oficial­

) mente a OLP não reconheça Israel, na prática esse


reconhecimento já começa a ser sugerido.

Os palestinos e as
superpotências

Pelo menos há quase um século o Oriente


Médio vem sendo dilacerado por grandes interesses
externos. Primeiro Inglaterra e França, entrando
depois no páreo Itália e Alemanha (nazi-fascistas).
Após a Segunda Guerra Mundial e o declínio do
colonialismo europeu, as duas superpotências
em ascensão — EUA e URSS — foram gradativa­
mente ocupando os espaços existentes nas mais
variadas alianças com os regimes locais.
A URSS apoiou Israel em 1948 para se opor
aos ingleses. Os EUA não entraram na Campanha
de Suez em 1956 (Israel, Inglaterra e França),
conservando-se de mãos limpas para avançar
0 que é Questão Palestina 93

r "N
politicamente na área. Os soviéticos prepararam e
armaram os egípcios para a guerra de outubro
de 1973, e ao fim do conflito Sadat voltou-se
para os norte-americanos.
A perda do aliado egípcio e o enfraquecimento
dos laços com o Iraque —apesar do estreitamento
de relações com a Líbia — abalaram bastante o
poderio soviético na região. Moscou não dispõe de
um aliado forte e confiável como os EUA têm
em Israel. Sem falar que, além de Israel, os EUA
contam (entre outros) com a Arábia Saudita e o
próprio Egito, dois países fundamentais no
Oriente Médio. A disputa pela hegemonia entre
as duas superpotências nessa estratégica região tem
pendido, sem dúvida, mais favoravelmente para
os EUA. Washington está na ofensiva, Moscou
na defensiva.
Em relação aos palestinos, a situação é clara.
Os EUA fecham com a posição israelense, embora
comecem a visualizar a inevitabilidade da criação
de um Estado palestino independente. Dois ex-
Presidentes norte-americanos, Jimmy Cárter e
Henry Ford, uma vez fora da Casa Branca, já
admitiram isso claramente. Por enquanto, porém,
r
os EUA podem ter algumas divergências com as
atitudes israelenses (como exemplos, o ataque ao
reator nuclear iraquiano, em 1981, ea atuação das
tropas de Israel na guerra do Líbano), mas não
a ponto de colocar em xeque essa aliança.
Washington também não reconhece a OLP.
j
94 Helena Salem

r
A União Soviética, em contrapartida, apóia os
palestinos, assim como toda a Europa do leste e
aliados. Por outro lado, Moscou rompeu relações
diplomáticas com Israel, só havendo contatos
oficiosos e esporádicos entre os dois países. A
URSS, contudo, nunca propôs a extinção do
Estado de Israel, nem que os judeus fossem
"jogados ao mar".
Finalmente, a Europa, o Japão e os países .
periféricos do chamado Terceiro Mundo (Ásia,
África e América Latina). Premidos pela arma do
petróleo árabe, os dois primeiros, tradicionais
aliados de Israel, desde 1973 começaram a

ï reconhecer "os direitos inalienáveis do povo


palestino" (Arafat esteve até em Tóquio, em
1981). E, quanto aos países periféricos, entre os
quais o Brasil, anteriormente bastante envolvidos
;
!
I
I
com a posição norte-americana-sionista, hoje,
em sua maioria, apoiam explicitamente as reivin­
dicações da OLP — a "arma do petróleo" sensibi- '
lizou a todos: ditaduras, democracias burguesas l
etc., etc.. .. Foi-se o tempo em que palestino era
sinônimo de terrorista. ,


CONCLUSÃO: A PAZ POSSÍVEL

0 historiador e humanista judeu-polonês Isaac


Deutscher comparou certa vez a situação entre
judeus e árabes no Oriente Médio como a de um
homem que, tendo a casa em chamas, pula a
janela para salvar a vida. Mas, na queda, atinge
uma pessoa que estava próxima, quebrando-lhe
pernas e braços. Os dois poderiam discutir e
ajudar-se. Mas, ao contrário, passam a agredir-se.
0 primeiro culpa o segundo por seus ferimentos
e jura fazê-lo pagar por aquilo. O segundo, temendo
a possível vingança daquele que aleijou, toda vez
que o encontra chuta e surra-o.
Acho que essa parábola ilustra bem a tragédia
árabe-israelense em nosso século. Os palestinos
pagam por um pecado que não cometeram:
incendiar a "casa" européia dos judeus. Estes
últimos, ao fugir das perseguições na Europa,
J
96 Helena Salem 0
r
apoderaram-se das terras dos palestinos, expul­
sando-os e desrespeitando seus direitos nacionais.
Com medo, alegando questões de segurança,
grande parte dos judeus recusa-se até hoje a
enfrentar a questão nacional do povo palestino
—os novos judeus de nossa época.
Concretamente, o problema está aí. Não se
extinguiu, como queria Foster Dulles. Agravou-se.
A negação e a repressão utilizadas pelos dirigentes
sionistas não funcionaram.
O governo israelense argumenta que um Estado
palestino independente em Gaza e na Cisjordânia,
portanto nas suas fronteiras e no seu coração,
seria um foco de ameaça constante ao Estado
sionista, uma "ponta de lança" da'União Soviética.
E possível (e até provável) que um tal Estado
palestino de fato mantenha relações preferenciais
com a URSS, como é possível também que ele
tente um relativo não-alinhamento. Dependerá
da correlação das forças políticas internas que lá
se estabelecerem. De qualquer maneira, não consta
que interesse à URSS o aniquilamento de Israel
(para quê?).
Quanto aos riscos de um ataque árabe, eles
continuarão existindo com ou sem Estado
palestino, enquanto Israel se mantiver como uma
ilha ocidental no Oriente Médio oriental, depen­
dendo para sua sobrevivência do imprescindível
apoio econômico e militar dos EUA (previsto ofi­
cialmente, para 1985, em 2,6 bilhões de dólares,
V
que é Questão Palestina 97

sem contar as importantes remessas de particulares


do lobby sionista norte-americano). Israel não tem
fronteiras com a Síria, o Líbano, o Egito e a
Jordânia —todos países árabes? O Estado palestino
apenas substituiria uma parte da fronteira jorda-
niana. Hostilidade por hostilidade, o regime de
Damasco nunca cultivou nenhum amor pelo
Estado sionista . . .
Enfim, é o caso de se perguntar: não será
muito mais arriscado para Israel continuar
negando o fato nacional palestino e a
OLP, procurando marginalizá-la sem qualquer
sucesso? O que será mais perigoso: uma OLP
dispersa por vários países e em luta incessante
contra Israel, ou concentrada e empenhada na
construção de seu pequeno Estado que, inclusive,
necessariamente cedo ou tarde, deverá até ter
vínculos econômicos com Israel para sobreviver?
A longo prazo, Israel não estará correndo um
risco muito maior ao fomentar a rebelião dos
árabes que vivem sob seu controle (e clamam pela
OLP) e alimentar o isolamento internacional?
A realidade é que dois pequenos povos disputam
uma estreita faixa de terra. Nenhum dos dois está
k
disposto a abrir mão de seus direitos —históricos
ou adquiridos. Não se trata de jogar uns no mar
òu de cegamente continuar ignorando os anseios
dos outros. A faixa de terra é pequena, mas dá
para dividir — pelo menos para que se comece
a percorrer a difícil trilha da convivência.
J
98 Helena Salem

Não vejo outra saída, pelo menos a curto prazo.


Isso não significa, contudo, que a criação de um
Estado palestino nos marcos da realidade atual
trará a paz definitiva a toda região. Seria uma
ilusão pensar assim. Por exemplo, as disputas
entre a Síria e o Iraque, entre o Egito e a Líbia,o
dilaceramento do Líbano ou o militarismo israe­
lense não cessarão. Nem a luta pela hegemonia
na área entre as duas superpotências — EUA e
URSS. A solução da questão nacional palestina
sem dúvida é um aspecto fundamental de uma
problemática ainda mais complexa.
Pois a paz duradoura, a convivência realmente
fraterna inter-árabe e entre árabes e israelenses
terá de passar certamente por transformações
sociais, econômicas epolíticas bem mais profundas.
Transformações que eliminem a presença das
superpotências na região e seus múltiplos aliados
internos, que derrubem esses regimes autoritários,
expansionistas e antipopulares, que permitam o
desenvolvimento de uma sociedade socialista,
verdadeiramente democrática e internacionalista
no Oriente Médio.
Mas isso é coisa para um futuro certamente
ainda distante.

IV
1
INDICAÇÕES PA R A LEITURA

São poucos os livros produzidos no Brasil


ou mesmo traduzido em português sobre o con­
flito árabe-israelense e especialmente a questão
palestina.
As Origens do Nacionalismo Judaico, de Jaime
Pinsky, Ed. Hucitec, São Paulo, 1978, é um desses
poucos, fazendo uma boa análise das raizes do
sionismo. A obra de Abram Leon, II Marxismo e
la Questione Ebraica, Ed. La Nuova Sinistra,
Samoná e Savelli, Roma, 1972, e Le Sionisme
Contre Israel, de Nathan Weinstock, são outros
dois trabalhos da maior importância sobre esse
tema, ambos com uma visão crítica em relação
ao ponto de vista sionista. Indispensável a leitura
de A Questão Judaica, de Karl Marx, Ed. Laemmert
S.A., Rio de Janeiro, 1969.
Já defendendo a posição sionista, temos a
importante seleção de textos O Judeu e a Moder-
100 Helena Salem

nidade, de J. Guinsburg, Ed. Perspectiva, São


Paulo, 1970, onde encontramos Auto-emancipação,
de Leon Pinsker, O Estado Judeu, de Theodor
Herzl, e outros teóricos do sionismo. Interessante
como relato humano o livro da ex-Primeira Minis­
tra Golda Meir, Minha Vida, Bloch Editores, Rio,
1976, que narra desde a chegada dos primeiros
colonos sionistas até a última guerra árabe-israe­
lense, por alguém que foi uma das principais
protagonistas de tais episódios.
O trabalho de Aharon Cohen, Israel and the
Arab World, Beacon Press, Boston, 1976, constitui
talvez o estudo mais importante já feito sobre
as relações entre árabes e judeus. Militante da
organização de esquerda sionista Hashomer Hatzair,
Cohen dedicou uma boa parte de sua vida è luta
pela convivência fraterna entre árabes e judeus.
Les Árabes en Israel, de Sabri Geries, Éd. Mas-
pero, Paris, 1969, faz um levantamento minucioso
sobre a situação dos árabes vivendo no interior do
Estado de Israel (fronteiras de 1948). A respeito
dos refugiados palestinos deve-se consultar os
relatórios do UNRWA, das Nações Unidas, editados
em Beirute.
Sobre a Resistência Palestina, indicamos: Pales-
tine, Année Zero, de Lorand Gaspar, Maspero,
Paris, 1970; La Resistance Palestinienne, de Gerard
Chaliand, Ed. du Seuil, Paris, 1970; The Palestinian
Revolution, 14 Years o f Continuous Strugg/e, OLP,
Beirute, 1979; Por que Lutam os Palestinos,
0 que é Questão Palestina 101

Yasser Arafat, Ed. Paralelo; Setembro 1970, da


FDPLP, Ed. Portucalense, Porto, 1971 (sobre o
massacre dos palestinos na Jordânia); Le Peuple
Palestinien et Son Droit à Eriger Son État Indé­
pendant, OLP, Beirute, e* Palestinos, Os Novos
Judeus, Helena Salem, Ed. Eldorado, 1977, Rio.
As várias resoluções internacionais sobre a
Palestina até 1973 constam em A Palestina e o
Direito Internacional, de Henry Cattan, Ed. Grafi-
par, Curitiba; e também em Israeli Belligerent
Occupation and Palestinian Armed Résistance
in International Law, Ezzeldin Foda, PLO
Research Center, Beirute, 1970; e Raccolta di
Documenti Delle Nazioni Unité Relativo a!
Problema dei Rifugiati Arabi nei Medio Oriente,
Edizioni E.A.S.T., Roma, 1970.
Les Arabes au Présent, de Mahmoud Hussein,
Seuil, Paris, 1974, faz um balanço interessante da
guerra de outubro de 1973, segundo a perspectiva
de dois importantes autores marxistas egípcios,
que assinam sob um único pseudônimo (Mahmoud
Hussein).
L
Palestinians and Israel, de Y. Harkabi, Keter
Publishing House Jérusalem Ltd., Jerusalém,
1974, analisa a questão palestina do ponto de
vista do Estado de Israel, sendo importante para
o melhor conhecimento das posições sionistas.
Sobre as possibilidades de criação de um Estado
palestino na Cisjordânia e Faixa de Gaza, reco­
mendamos o estudo de Bichara Khader e Naim
102 Helena Salem
— —
Khader, Le Peuple Palestinien: ses potentialités
humaines, économiques et scientifiques, Université
Catholique de Louvain, Institut des Pays en Voie
de Développement, 1980.
Para um conhecimento da política israelense
de colonização e anexação dos territórios ocupados
convém consultar La Adquisición de Tierras en
Palestin, Nações Unidas, N. York, 1981; The
Judaization of Jérusalem, de Rouhi Al-Khatib,
PLO Research Center, Beirute, 1970; e Efectos
de la Creación de las Colonias Israelies en La
Situación de los trabajadores árabes de Palestina
y de los demás territórios árabes ocupados, Orga-

Î nización Arabe dei Trabajo, 1981.

A repressão israelense nos territórios ocupados


é testemunhada pelo professor Israel Shahak, em
Le Racisme de L'État d'Israël, Ed. Guy Authier,
Paris, 1975; e em Palestinian Militants in the
Prisons o f theZionistOccupation, PLO Department
of Information Culture, Beirute, 1977.
A opinião dos palestinos em relação aos acordos
de Camp David figura na seleção de textos publi­
cada pela OLP, La Revolución Palestina frente
a Camp David, Sayegh, Mathiot e Lacheraf,
Prolibro/OLP, México, 1979.
Finalmente, uma discussão mais ampla sobre
V. o conflito árabe-israelense encontra-se em Arabes
& Israéliens, Un Premier Dialogue, de Jean
0 que é Questão Palestina 103

israelense Saul Friedländer, mediado pelo jorna­


lista francês Jean Lacouture, extremamente interes­
sante. Também com uma visão mais abrangente
do conflito e com posições críticas ao sionismo,
é muito rica a leitura de dois humanistas judeus:
Noam Chomsky, Guerre et Paix au Proche-Orient,
Ed. Pierre Belfond, Paris, 1974; e Isaac Deutscher,
0 Judeu Não-Judeu, Civilização Brasileira, Rio
de Janeiro, 1970.

?
"A coleção PRIMEIROS PASSOS aborda temas polê­
micos, que permitem diferentes posições e interpre­
tações. Os textos de PRIMEIROS PASSOS são, assim,
expressão das idéias dos intelectuais que os assinam,
como convites à reflexão, à concordância ou à discor­
dância. Mas sempre enriquecem e explicam.”
Biografia

H elena Salem , de origem ju d aica, nasceu n o R io de


Janeiro, em 1 9 4 8 . G raduou-se em Ciências Sociais, no
In stitu to de F ilo so fia e C iências Sociais da Universidade
Federal d o R io de Janeiro, em 1 9 7 0 .
Trabalhou durante seis anos (1 9 6 9 -1 9 7 5 ) na editoria
internacional do Jornal d o Brasil, sen d o enviada especial
do jornal à Guerra de O utubro de 1 9 7 3 , n o m undo árabe,
on d e perm aneceu quatro m eses percorrendo o Egito,
Síria, L íb an o, Jordânia, A rgélia e T unísia.
F oi editora intern acion al do sem anário Opinião e corres­
p on d en te da revista Isto É em Lisboa (1 9 7 7 -1 9 7 9 ). Em
Portugal tam bém era colaboradora regular do semanário
E xpresso, d e L isboa, ecorresp on d en te do Jornal de
Brasília e do M o vim en to .
D e volta ao Brasil, em setem b ro de 1 9 7 9 , fo i repórter
do Jornal da R epública, colaboradora em p o lítica interna­
cional d o jornal M ovim ento e dep ois redatora da revista
Careta.
Escreveu os livros Palestinos, os N o vo s Judeus (Ed.
E ldorado, R io , 1 9 7 7 ) e A Igreja d o s O prim idos (Brasil-
D ebates, R io , 1981). A tu alm en te, ensin a Comunicação
na Faculdade da cidade do R io de Janeiro, é repórter
especial de O Globo.
Violência, Crise e Crime!

QUEPAISEESTE?
Violência, Povo e P olícia — V iolência U rb a n a no N oticiário
de Im p ren sa
Maria Victoria Benevides
Maria Victoria Benevides, socióloga da USP, tenta mostrar
aqui como a ideologia de segurança e repressão policial se
afirma através do impacto do noticiário de imprensa sobre a
opinião pública. Um estudo que merece a atenção do público
em geral, principalmente estudantes e professores das áreas de
Comunicação, Ciências Sociais e Política.
Q ue C rise é Esta?
Marcei Bursztyn/Pedro L eitã o / A rnaldo Chain (orgs.)
Vivemos a maior crise da história do Brasil, uma crise que se
caracteriza por um emaranhado de problemas sociais,
econômicos e políticos. Que Crise é Esta? reúne artigos e
entrevistas que trazem as mais diversas interpretações sobre a
natureza e as manifestações da crise, colocando em relevo os
aspecto religiosos, psicológico, tecnológico, jurídico,
econômico e político da questão.
Crime e C otidiano — A crim in a lid a d e em São Paulo (1880-
1924)
Boris Fausto
Boris Fausto examina nesse livro o fenómeno da criminalidade
em São Paulo num período de mudanças profundas para o
Brasil. Foi no final do século passado e início deste que se
sentiram as conseqüências da abolição da escravidão, da
imigração estrangeira, do nascimento das fábricas e do
surgimento de uma massa operária explorada pelo capital
nascente. Crime e Cotidiano se reveste de uma significação
peculiar nos dias de hoje para a compreensão de uma
realidade de violência que voltamos a presenciar.
O PODER NA HISTÕRIA

Cabanagem — O Povo no Poder


Júlio José Chiavenato
Arrebentando com a hierarquia social,
destruindo as forças militares e
substituindo-as por algo que faz tremer
os poderosos: o povo em armas, no
poder.

A Revolta de Kronstadt
Henri Arvon
A história do soviete de Kronstadt, que
lutou e resistiu à ditadura do Partido,
após a Revolução de Outubro de 1917, na
Rússia.

Quotidiano e Poder em São Paulo


no Séc. XIX
Maria Odila Leite da Silva Dias
O que se relata aqui é a história de
mulheres que viveram às margens do
sistema, instalaram-se nas frestas sociais,
à sombra dos chamados acontecim entos
históricos.
TUMBEIROS
O tráfico escravista para o Brasil
R o b ert E dgard C onrad
Um estudo originai e desmistificador da
escravidão no Brasil, através da realidade de
quatro séculos de tráfico escravista.

NEGROS, ESTRANGEIROS
Os e scra v o s libertos e su a volta à
África
M anuela C arneiro d a C unha
As dimensões ideológicas da alforria e o caso
dos negros que retomaram à África, onde
passaram a ser tratados como estrangeiros.

QUAL É A QUESTÃO DA NEGRITUDE


Zilá Bernd
No atual momento em que vivemos, terão
todos —brancos e negros —idêntica posição
sobre a questão da negritude?

E M AIS:
O Q U E É R A C IS M O
d o e i R u fin o d o s S a n t o s
A A B O L IÇ Ã O D A E S C R A V ID Ã O
S u e ly R e is d e Q u e iro z
A A F R O -A M É R IC A :
A e s c r a v id ã o n o N o v o M undo
C iro F la m a rio n C a r d o s o
A P A R T H E ID
O h o r r o r b r a n c o n a Á fr ic a d o Sul
F r a n c is c o J o s é P e reira
A C R ISE D O E S C R A V IS M O E A
G R A N O E IM IG R A Ç Ã O
P. B e ig u e lm a n
HAITI
P o d e r , c u ltu r a e d e s e n v o lv im e n t o
M a rc e lo G ro n d m
O S Q U IL O M B O S E A REBELIÃO
NEGRA
C lóv is M o u ra
SEMPRE BONS LIVROS

SEXO E JU V EN TU D E
Com o d isc u tir se x u alid ad e em ca sa e n a escola
Carmem Barroso e C ristina Bruschini (orgs.)
Fundação Carlos Chagas
U m a ex p e riên c ia b em su ced id a, rea liza d a ju n to a
ad o lesc en te s, originou e s te inovador program a de
educação sexual. E sc la re c e d o r guia d e orientação,
um livro ú til a p a is e p ro fe sso res.

POEM A PED A G Ó G ICO


A. S. Makárenko
Tradução e apresentação: Tatiana Belinky
B ase d a m o d e rn a pedagogia, re la ta as experiências
ren o vadoras de M akárenko, um dos grandes
ed u c ad o res d e s te século. P o etic am en te elaborado,
é fonte de co n su lta s p a ra ed u cad o res de todo o
m undo.

O QUE É MENOR
Edson P assetti
Na n o ssa sociedade, s e r m en o r é algo pejorativo,
sinônim o de d elin q ü en te. Com o a sociedade
estab e lec e a distin ção e n tre m en o r e jo v em ? Q ual o
p ap e l d a fam ília, d a escola e do trab alh o na
(des)lntegração do m enor?
OCESTAO
DO
ÍN D IO
O ÍN D IO E A C ID A D A N IA
C om issão P ró -Ín d io
Antropólogos, ju r is ta s , c ie n tis ta s p o lític o s e sociólogos
aprofundam a d isc u ssã o d a q u e s tã o in d íg e n a no B rasil.
Qual o “lu g ar” do ín d io ? Q u a is o s “c u s to s ” d a d d ad & n ia?
Quais os d ireito s dos ín d io s ? E m a is : a tra j e tó ria do s P a ta -
xô H ã H ã H ãl, do su l d a B ah ia.

A Q U EST Ã O D A E D U C A Ç Ã O IN D Í G E N A
Com issão P ró -Ín d io
S ubjacente ao p ro b le m a d a e d u c a ç ã o in d íg e n a , a q u e stã o
maior dos d ireito s d os povos in d íg e n a s : o d ire ito à condu­
ção de seu p róprio d e stin o . É p re c is o p e n s a r u m a educação
que considere a e s p e c ific id a d e d o s in te re s s e s d esses
povos.

T E R R A S E M M AL
O p r o fe tis m o tu p i- g u a r a n i
H élène C la stre s /
Hoje as so ciedades tu p i-g u a ra n is e s tã o m orrendo. O m ito ■
da T erra sem Mal, p o ré m , p e rm a n e c e : um lu g a r de abun- 1
dância, onde o m ilho c re sc e sozin h o e a s flechas, sozinhas,
vão à caça. A usência d e p re sc riç õ e s e proscrições, a pleni­
tude da lib erd ad e. Q ual o sig n ific ad o disso?

TESTEM U N HA O C U LA R
T e x to s d e a n t r o p o l o g ia s o c ia l d o c o tid ia n o
D iversos a u to re s
Um estra n h am en to do q u e n o s é fam iliar, olhos estrangei­
ros p a ra o cotidiano: a im ag em do índio nos livros didáti­
cos, a p u b licidade dos cigarros, im agens d a educação, a
festa de N atal e u m caso hnm nascxiial. —
brasilierfse
/A m érico

OS JUROS SUBVERSIVOS
JoeJmir Beting
U m a en trev ista e sp e c ia l com F id el C astro, na
p rim e ira re p o rta g e m so b re a d ív id a extern a
d o T erceiro M undo. Joelm ir, o colunista
eco n ô m ico m ais lido d o p aís, analisa, com
h u m o r e lu cid ez, o foco p o lítico d a crise
fin an c eira m undial.

SANDINISTAS
Gabríele Invem izzi (org.)
E ntrevistas exclusivas, fora d o s p a d rõ e s jornalísticos
co n v en cio n ais, rea liza d as cin co an o s após a vitória
d a rev o lu ç ão sand in ista. D e um lado, con ceitu ad o s
jo rn alistas e u ro p e u s; d o outro, líd e res d o gov ern o
n ic a ra g ü e n se — B ayardo A rc e, Jaim e W heelock e
H u m b erto O rte g a .

FIDEL E A RELIGIÃO
Frei Betto
P ela p rim e ira vez um ch efe d e Estado d e p aís socialista
a b o rd a o tem a d a reliao. Num dep o im en to inédito concedido
a Frei Betto, em H avana, Fidel C astro fala tam bém d e
T eologia d a L ibertação, C h e G u ev a ra , revolução, culinária
e outros assuntos.
SOY LOCO POR TI
lAM ÉRIC
D E M O C R A C IA E D IT A D U R A N O C H IL E
E m ir S a d e r
Forem precisos poucos dias para que uma democracia que pa­
recia eterna se transformasse na maior ditadura da história do
Chile...

M O V IM E N T O O P E R Á R I O A R G E N T IN O
D a s o r i g e n s a o p e r o n i s m o (1 8 9 0 -1 9 4 6 )
J o s é L u iz B. B e ir e d
Uma polêmica análise histórica do papel que o movimento sindi­
cal argentino desempenhou na constituição do peronismo.

R E B E L IÃ O C A M P O N E S A N A B O L ÍV IA
M a r c e lo G r o n d i n
Sob a liderança de Tupac Katari, a rebelião armada dos campo­
neses indigenas significou o grito de dor contra dois séculos de
exploração colonialista espanhola.

A R E V O L U Ç Ã O M E X IC A N A (1 9 1 0 -1 9 1 7 )
A n n a M. M a r t in e z C o r r ê a
Mobilizando grande parte da população, a Revolução Mexicana
é considerada uma das mais significativas comoções sociais
ocorridas na América Latina.

E mais:
AS INDEPENDÊNCIAS NA AMÉRICA LATINA
Leon Pom er

MILITARISMO NA AMÉRICA LATINA


Clóvis Rossi

O POPUUSMO NA AMÉRICA LATINA


Maria Lígia Prado

O TROTSKISMO NA AMÉRICA LATINA


O svaldo Coggiola
r Q ue p o d e h av er de m a io r ou m en o r que um toque?
S
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orienta
Coleção Primeiros Passos « ^ f t

Helena Salem

O que é
UESTÃO
«.PALESTINA
'D e s e n v o lv e n d o t e m a s p e r t in e n te s .a o
c o n f lit o á r a b e - is r a e le n s e (o s io n is m o
e o a p a r e c im e n t o d a q u e s t ã o p a le s tin a ;
o s p a le s tin o s , p o v o e r r a n te ; -
a r e s is t ê n c ia p a le s tin a ; o E s ta d o
p a le s tin o ; o s p a le s tin o s e a c o n ju n tu r a
i n t e r n a c i o n a l e t c . ) , e s t e p e q u e n o liv r o
p r o c u r a b lo q u e a r o fo r te
e m o c i o n a l i s m o e m r e la ç ã o a o p r o b le m a e
e n c o n tr a r u m p o s ic io n a m e n to b a se a d o em
d a d o s d a r e a lid a d e , s e m m a n iq u e ís m o .
CAPA: © Forster Brehm Fotografia

■ ilio n c o

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