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Rudinei Borges dos Santos

[Teatro]

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transamazônica
Copyright © 2019 by Rudinei Borges dos Santos
A encenação ou reprodução do texto desta obra teatral
só é permitida com expressa autorização do autor.

Esta peça estreou no dia 22 de março de 2019, na SP Escola de Teatro – Sede


Roosevelt, na cidade de São Paulo, SP, com direção e dramaturgia por Rudinei
Borges dos Santos, atuação por Leandro Lago e Geraldo Fernandes, música em
cena por Juh Vieira, cenografia e figurinos por Telumi Hellen, iluminação por
Decio Filho, assistência em cenotecnia por Lucas Lopes, direção de atores por
Murilo De Paula, preparação corporal e vocal por Ana Paula Lopez, assistência
de produção por Ulyce W. Z. e direção de produção por Alexandre Ganico.

Especial agradecimento a Melvin Quaresma, artista paraense,


que gentilmente cedeu as fotografias que compõem esta obra.

FICHA TÉCNICA

revisão de texto
Danilo Horã

designer gráfico
Felipe Uchôa

fotos
Melvin Quaresma

foto do autor
Christiane Forcinito

realização

Este projeto foi contemplado pelo Prêmio Zé Renato de Teatro para a cidade de São Paulo

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Em memória de Dorothy Mae Stang.

Estou com desejos de desastres...


Com desejos do Amazonas e dos ventos muriçocas
Se encontrando na canjerana dos batentes...
Tenho desejo de violas e solidões sem sentido
Tenho desejos de gemer e de morrer.

[mário de andrade - o poeta come amendoim]

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TRANSAMAZÔNICA, ESTRADA QUE LIGA NADA A LUGAR NENHUM
 
Por Júlio César — Magnus Mundi
 

A Rodovia Transamazônica era para ser uma estrada de 5 mil quilômetros


que atravessasse a Floresta Amazônica, a partir de João Pessoa, no Nordeste
brasileiro, até a fronteira com o Peru. Foi um dos mais ambiciosos programas
de desenvolvimento econômico e reassentamento já inventados, e um dos
maiores fracassos.
O projeto foi desenvolvido na década de 1970, após o então presi-
dente general Emílio Garrastazu Médici [1969 a 1974] visitar frentes de
trabalho e testemunhar uma das secas mais devastadoras da história do
Nordeste brasileiro. Médici vislumbrou ali a inusitada e malfadada solu-
ção para o flagelo da seca. Para usar uma frase que ficou famosa na época,
o jeito era levar “homens sem terra para uma terra sem homens”.
A reforma agrária era a solução óbvia para a situação dos nordesti-
nos, mas estava fora de questão, porque não havia maneira de convencer
os ricos proprietários de terras a dar nem que fosse a menor fração de
suas terras para os pobres trabalhadores rurais. Então, Médici decidiu
mudá-los. O caminho de um lugar a outro se chamaria Transamazônica,
oficialmente BR-230.
Dez dias depois da fala presidencial em Pernambuco, foi criado o
Plano de Integração Nacional [PIN], no qual a Transamazônica era o pro-
jeto prioritário, e as obras começaram em 1º de setembro, menos de 3 me-
ses após o comício. O governo queria instalar na floresta 500 mil colonos
[e esperava-se outro meio milhão de pessoas, que seriam atraídas para a
região]. Assentar essa multidão ao longo da estrada gerou uma das grandes
ficções do Brasil. Os colonos ficariam em agrovilas, implantadas a cada 10
quilômetros da via.
Os planejadores imaginavam que cada uma teria entre 48 e 64 casas,
escola primária, capela ecumênica, armazém, clínica e farmácia. Além

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disso, cada família teria uma gleba de 100 hectares, na qual teriam de
deixar metade do terreno preservado, além de ganhar um salário por seis
meses e fácil acesso a empréstimos agrícolas, em troca de se estabelecer
ao longo da rodovia e converter a floresta circundante em terras agrícolas.
Se tudo desse certo, estava previsto que a produção dessas famílias iria
abastecer o mercado interno com milhões de toneladas de feijão, arroz e
milho, bem como render milhões de dólares através da exportação de café,
cacau, pimenta, laranja e outras culturas.
Sem nem chegar perto do que havia sido planejado, a Transamazônica foi
inaugurada por Médici em outubro de 1974. Até então, apenas 4.969
famílias haviam sido oficialmente estabelecidas, das cerca de 20.000 fa-
mílias que tinham vindo para a região. O marco da inauguração da estrada
é um retrato de seu projeto. Sobre o toco de uma grande árvore centená-
ria, em Altamira, no Pará, uma placa de metal dá a notícia do que se fez
ali: “Nestas margens do Xingu, em plena selva amazônica, o sr. Presidente
da República dá início à construção da Transamazônica, numa arrancada
histórica para a conquista deste gigantesco mundo verde”.
No projeto, não houve nenhuma preocupação com a preservação da
floresta amazônica. O solo da bacia amazônica consiste principalmente
de sedimentos, o que torna o leito da estrada instável e sujeito à inun-
dação durante chuvas fortes. Com a estrada inutilizável por seis meses a
cada ano, os colonos não tinham como escoar sua produção. Além disso, a
produção das colheitas era pequena, uma vez que a camada fértil do solo
amazônico é fina, e seus nutrientes se esgotam rapidamente, sem falar a
erosão galopante com a falta da floresta.
Após a construção da Rodovia Transamazônica, o desmatamento
subiu para níveis nunca antes vistos. Ao longo dos anos, as florestas
virgens deram lugar a fazendas de gado, madeireiras e minas de ouro.
Durante períodos extremos na década de 1990 e início de 2000, mais de
25 mil quilômetros quadrados de floresta foram desmatados por ano.
Pelo menos 4 mil operários trabalharam na construção da estrada.
E enfrentaram uma dura realidade: solo miserável, chuvas torrenciais e
doenças tropicais. A estrada, entregue em tempo recorde, segue inacaba-
da até hoje. De acordo com o plano original, ela seria um grande escoa-
douro da produção brasileira para o Pacífico. De Cabedelo, na Paraíba, o
estradão iria até a cidade de fronteira de Benjamin Constant, no Amazo-
nas [e de lá, pelo Peru e Equador, até o Pacífico]. Mas seu ponto final foi
em Lábrea, 687 quilômetros antes.

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Para construir os 4.073 quilômetros da Transamazônica, o governo
gastou 1,5 bilhão de dólares na época. Não foi tarefa fácil. A obra foi
quase toda em mata fechada e a extensão da estrada poderia cobrir todo o
continente europeu, de Lisboa, em Portugal, a Kiev, na Ucrânia. Mais da
metade da estrada, 2,2 mil quilômetros, não é asfaltada. A maior parte da
via não tem sinalização e iluminação. A partir de Marabá, no Pará, quando
começa o trecho de floresta, surgem os problemas. No Amazonas, dos
1,5 mil quilômetros de estrada, só 14 são asfaltados. Nos anos 90, cami-
nhoneiros indignados incendiavam as pontes de madeira, que costumavam
ceder sob o peso das carretas. A maior parte dos rios da região é atravessado por
balsas. Em muitos trechos, a “estrada da integração nacional” é só uma picada.
As estradas vicinais que partem de seu traçado ajudam a devastar a
floresta. “É inegável a relação direta entre desmatamento e construção de
rodovias”, afirma o professor Alves de Souza. “O Brasil precisa decidir se
quer uma Amazônia ligada por estradas ou uma Amazônia preservada”. O
maior meio de transporte da região ainda é o barco.
A Amazônia tem mais de 80 mil quilômetros de trechos navegáveis.
Um transatlântico poderia avançar 3,7 mil quilômetros rio Amazonas
adentro. Como dizem os autores de A Selva Amazônica, “de todos os pa-
radoxos da Amazônia, o mais espantoso é o manto de silêncio e ignorância
que a envolve”.

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PRÓLOGO
Destroços

Transamazônica. Km 3000. Itaituba. Cena externa. Fim de tarde. Cerca de


madeira. Avista-se a fotografia de uma mulher com um menino. O narrador
avista destroços de si e do tempo.

narrador — Guardo cruzes tantas na estrada. Rastros dos que parti-


ram. Gente tanta que veio de longe. Semblantes suados de camponeses.
Rasgos da Transamazônica em meio à floresta. Gente derruída. Árvore
derruída. Guardo o rosto de minha mãe. Menina ainda a minha mãe num
caminhão pela estrada. Coisas tantas trazidas de Xinguara. Coisas tantas
trazidas de Ananás. A vó. O vô. Os meninos. Apinhado de gente, uma
família: destroços. Corpo entregue à poeira. Corpo vivo na estrada, entre
curvas. Foi ali que o rosto de minha mãe se perdeu ou antes. Não sei.
Talvez minha mãe nunca tenha tido um rosto. Talvez seja invenção minha
o rosto de minha mãe. Talvez eu mesmo não tenha um rosto. Só cruzes
tantas na estrada. Rastros dos que partiram. O rosto de minha mãe, sol a
pino. O rosto de minha mãe em meio à mata. As mãos de minha mãe der-
rubam árvores da floresta. As mãos de minha mãe põem fogo na floresta:
coivara. A terra preta da floresta, adubada agora. Terra arada. O plantio.
A lavoura num cemitério de árvores. A colheita. Fagulhas. Milho assado.
Conversa tarde da noite. Semblantes suados de camponeses. Cozem.
Adentram. Mata aquele pau. Arranca aquele cipó. Descampado. Levan-
ta-se uma casa aqui outra acolá. Clareira. Casa num cemitério de árvo-
res. Caminhões abarrotados de camponeses num cemitério de árvores.
Camponeses mortos-vivos. Acende o candeeiro. Tange nas mãos o fumo.

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Vem a fumaceira. Toma um gole de aguardente. Amola o teu facão, a tua
foice. Guarda do sol o teu rosto. Bebe a tua água fria. Lava o teu rosto.
Arriba o teu motor-serra. Zonzeira. Só barulho de motor-serra no meio da
mata. Um homem sozinho no meio da mata. Um homem sozinho com um
motor-serra no meio da mata. A lâmina do motor-serra atinge a pele da
árvore. A lâmina do motor-serra atinge as artérias da árvore. Sangue por
todo lado. A árvore cai silenciosa. Arranca-se a copa e a casca da árvore.
Esgarça-se o tronco numa serraria. Tábua vermelha. Tua cama. Tua cômo-
da. Tua mesa. Tua cadeira. Carpintaria. O espectro das coisas espalhadas
numa escrivaninha em novembro de 1986. Foi ali que o rosto de minha
mãe se perdeu ou antes. Não sei. Talvez minha mãe nunca tenha tido um
rosto. Talvez seja invenção minha o rosto de minha mãe. Talvez eu mesmo
não tenha um rosto. Só cruzes tantas na estrada. Rastros dos que parti-
ram. Os olhos castanhos de minha mãe. Lembro-me dos olhos castanhos
de minha mãe. A cor de jambo da pele de minha mãe. A Transamazôni-
ca numa fotografia ao fundo. O lamaçal de barro vermelho no inverno.
Chuva o tempo inteiro. A voz do Brasil no rádio à pilha. [Sussurros] Deus
é um forasteiro. Lembro-me dos olhos marejados de minha mãe. [Volta a
narrar] Sinos na lonjura. Lembro-me do choro de minha mãe quando meu
pai partiu. Lembro-me do choro de minha mãe quando eu mesmo parti.

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CAPÍTULO 1
revólver

Transamazônica. Km 2700. Uruará. Cena externa. Noite escura. Um menino


e um pistoleiro conversam num descampado. Avistam-se apenas estilhas do ros-
to do menino e do pistoleiro.

menino — Sempre quis ter uma arma. Um revólver 38. Um fuzil AR-
15. Um fuzil M16. Sempre quis pôr na mão uma arma de verdade. Um
troço doido pulsando no meio dos dedos. Já passou o tempo de ficar cor-
rendo por aí com armazinha de mentira, brincando de polícia e ladrão.
Sempre quis ter uma arma. Uma pistola 9mm. Uma espingarda 12. Um
fuzil FAL. Um fuzil G3. Uma metralhadora .30. Uma metralhadora .50.

pistoleiro —Tenho aqui se você quiser.


menino — O quê?
pistoleiro — Uma arma.
menino — De verdade?
pistoleiro —Um revólver 38. Um revólver de verdade. Entende?
menino — Entendo.

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pistoleiro —Entende o quê?
menino — Do revólver. Não é disso que você tá falando?
pistoleiro — Você não entende coisa nenhuma. Nunca pegou num
revólver de verdade.

menino — Já peguei. Você não sabe de nada. Já peguei um revólver de


verdade.

pistoleiro — Você é só um diabo covarde que corre por aí achando


que sabe das coisas.

menino — Já peguei um revólver na mão. Esquentei os dedos. Pus a


arma na boca, no céu da boca e atirei.

pistoleiro — E morreu?
menino — Não. Foi só um sonho. [Pausa] Onde tá a arma?
pistoleiro — Não sei. [Pausa] Que arma?
menino — O revólver 38.
pistoleiro —Tá aqui.
menino — Onde?
pistoleiro — Na minha mão.
menino — Não tô vendo.
pistoleiro — Olhe bem.
menino — Tô olhando.
pistoleiro — É só você levantar bem o corpo. Segurar o revólver na
mão. Mirar bem o inimigo, o corpo do inimigo.

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menino — E depois?
pistoleiro — Depois você atira uma, duas ou três vezes. Atira até o
inimigo cair, estrebuchar feito um cão sarnento.

menino — E se ele continuar vivo?


pistoleiro — Você tem que ter certeza. Não pode deixar por aí um
morto-vivo. Tem que matar mesmo. Se não matar o inimigo cria coragem.
Fica tomado de ódio e vem se vingar sem pena.

menino — E se ainda assim ele continuar respirando?


pistoleiro — Você, então, atira de verdade, com gosto. Atira no mio-
lo dele. Explode o miolo dele até que os olhos saltem no chão. Quando
sentir o último suspiro você vai embora caminhando como se nada tivesse
acontecido.

menino — Você fica arrependido?


pistoleiro — De quê?
menino — De matar.
pistoleiro — Não. Nem um pouco. Uns nascem pra morrer.
menino — Como você sabe?
pistoleiro — Eu sei.
menino — Como?
pistoleiro — É só olhar. Você olha bem e percebe: este aí tem que
morrer agora.

menino — Você faz o quê?


pistoleiro — Mato. E pronto.

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menino — Não entendo.
pistoleiro — O quê?
menino — Por que você sai por aí e mata as pessoas?
pistoleiro — Por gosto. Um troço louco dentro do corpo.
menino — E se pegarem você?
pistoleiro — Já disse: não pegam. Você sai de cena por uns tempos,
vai pra bem longe. Some, sabe? Depois aparece. Ninguém vai dedurar. O
pessoal já sabe que se dedurar o pau vai comer.

menino — Você é meio doidão.


pistoleiro — Sou não.
menino — Mas parece.
pistoleiro — Onde está seu pai?
menino — Não sei. Ele morreu — eu acho. Minha mãe disse que ele
morreu num tiroteio aqui embaixo, perto do rio. Disse que o corpo caiu
dentro do rio.

pistoleiro —Eu conheço você.


menino — Não conhece não. Vi você hoje pela primeira vez.
pistoleiro — Mas eu conheço você.
menino — De onde você me conhece?
pistoleiro — Faz muito tempo. Só isso. Faz muito tempo.
menino — Onde tá a arma?

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pistoleiro — Não sei. [Pausa] Que arma?
menino — O revólver 38.
pistoleiro — Tá aqui.
menino — Onde?
pistoleiro — Na minha mão.
menino — Não tô vendo.
pistoleiro — Olhe bem.
menino — Tô olhando.
pistoleiro — Pra que você quer um revólver?
menino — Pra matar você.
pistoleiro — Por quê?
menino — Porque eu vi. Olhei pra você e vi. Você nasceu pra morrer.
pistoleiro — Então, toma a arma.
menino — Onde?
pistoleiro — Na minha mão.
menino — [Segura a arma] Um revólver. Um revólver 38 de verdade.
pistoleiro — Espere.
menino — Não posso.
pistoleiro — Por quê?

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menino — Um revólver 38. Um troço doido pulsando no meio dos
dedos. Paro. Miro. Atiro. Logo você estará morto.

pistoleiro — Espere.
menino — Por quê?
[Pausa]

pistoleiro — [Sussurra] Sou seu pai.


[Tiros ao longe]

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CAPÍTULO 2
amparo

Transamazônica. Km 2190. Novo Repartimento. Cena externa. Sol do meio


dia. Um colono defende a benzedeira do homem da lei que tenta prendê-la
à força.

colono — O que dizer o senhor não sabe? Quantos filhos a dona tem?
Quantas bocas ela tem pra dá o de comer? Quantos pratos sobre a mesa?
Quantos metros de tecido ela precisa pra vestir tanta gente? O senhor
o que faz? A dona reza o rosário toda noite. Defuma a casa. Joga água
benta na porta. Faz promessa pra São Benedito. Agora, o senhor vem com
essa conversa que a dona não crê. Não crê em quem? No senhor ela não
credita mesmo não. Nem nos olhos encardidos que o senhor tem. Nem
no rosto liso e no terno acinzentado. Ela não usa óculos porque não quer.
A vista dela foi entregue pra Santa Luzia. A fé dela é em Nossa Senhora
de Nazaré. A dona sabe ladainha de cor. Sabe o nome e o sobrenome da
gente. É chamada de mãezinha por toda a gente da região. E o senhor vem
com esse monte de papel. Essas letras miúdas. Essas palavras difíceis. Es-
sas desculpas esfarrapadas. Antes de prender a dona vai prender os meus
meninos e a mim também. O senhor leve a minha lavoura. A minha casa.
Mas essa dona o senhor não leva não. De jeito nenhum. Injustiça é coisa
do demônio. O senhor não sabe? Pode chamar juiz, delegado, prefeito,
presidente. Pode invocar Dom Sebastião. A dona fica. Pra curar nossas
feridas. Pra ensinar que chá serve pra esta e praquela doença. Pra cuidar
do mato e das ervas santas. A dona fica. Pros nossos filhos nascerem com
os cinco dedos na mão. E chorar depois do parto. A dona é parteira velha.
Benzedeira. Mulher de saber que ninguém furta. Nem o senhor que é
doutor. Nem o senhor que é patrão. O senhor fique avisado. Não ande
torto. Segure a língua. A dona não sai daqui não.

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CAPÍTULO 3
mucura

Transamazônica. Km 2600. Medicilândia. Cena interna. Sol da manhãzi-


nha. Janelas abertas. Colona de rosto enrugado explica por que leva uma
espingarda consigo. Pequenos raios de sol cobrem o rosto enrugado da cam-
ponesa. Ela franze os olhos.

colona —A vida é cachaça braba, rasga até as entranhas. O senhor


chora quando bebe? Eu choro feito céu desabado na tempestade. Ouço
uma ladainha abatida numa procissão sem fim. A procissão segue por en-
cruzadas tantas, de capelinha em capelinha e vai juntando gente de toda
parte. Um dia chorei tanto que vi a Virgemaria na procissão. De pés des-
calços, a Virge caminhava com o Jesuscristinho no colo. Probrezinha, nem
sabia que o menino ia morrer na cruz. Que acometimento mais duro um
filho morrer na cruz. O senhor sabe quantos meninos morrem por aí com
bala na costela ou com fome? É a mesma cruz posta no calvário na Sexta-
Feira da Paixão. É a mesma dor, hômi de Deus.
O que devo o senhor averigue. Este dente de ouro é lembrança do
meu menino mais velho que foi garimpar na Serra Pelada. Este rosário eu
não largo — foi presente de minha avó. Estes sapatinhos de crochê são
do menino caçula. Olhe. Tão pequeninos. Os pés vão crescer — creio.
Que não cresça a raiva dentro dos caminhos do menino caçula. Estes
barquinhos de miriti vieram de Belém. Este perfume de alfazema me faz
lembrar minha mãe. Estes quadros desbotados na parede são do meu pai
que, metido a artista, vendeu muitas pinturas em feiras, festejos de
santo. Esta imagem de Santa Luzia de Siracusa, aquela que arrancaram os

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olhos, trouxe de tempos distantes. Outros guardados tenho. Não ofereço
a ninguém.
Esta espingarda eu guardo na cumeeira, mas carrego comigo se for o
caso — foi o Zé que deixou. Tenho que caçar, senão morro de fome. O que
o senhor queria duma mulher com cinco meninos? Que alimentasse as
crias só com farinha de puba, sem um quarto de carne e banha de caititu?
Meus meninos não comem sem carne de caça e banha de caititu. A gente
planta macaxeira, mandioca, inhame, cará — tudo quanto é raiz. Nem
sempre a terra ajuda. Aqui chove quase o ano todo. A água derruba tudo
quanto é plantio. Se no sertão rezávamos para chover, aqui rezamos que a
chuva, tão cedo, acabe. Por vezes, nem temos o alimento. Não cegue a vis-
ta: uma mulher sozinha que alimenta cinco bocas. O senhor tem filhos?
Já ouviu um menino lhe pedir o de comer e não restar, em casa, nem uma
cumbuca de arroz? Levo a espingarda e sigo, em meio à mata, sem pena.
Atiro. Tenho caçado mucuras só. Outros bichos não aparecem. Caço só o
que preciso. Nem um tanto mais. Nem um tanto menos. Já ouvi duns, por
aí, que levaram pêa dos encantados, na mata, por caçarem em demasia,
na ganância. Até a Matinta Perera avista o injustiçamento. Dá-lhe surra
na certa. É de carecimento muita reza para curar pêa de encantado. Mas,
como disse, tenho caçado mucuras só. Por isso carrego comigo essa espin-
garda. E uma faca. Amolo faca na pedra. Deixo a lâmina afiada. À mostra,
desnuda, a lâmina reluz quando atassalho a barriga da mucura. Separo as
vísceras com as mãos. Arranco a cabeça. Livro-me dos olhos arregalados
e da língua sedenta. Arranco as unhas e o rabo. Escaldo, nágua fervente,
o pelo cinza bem escuro. Banho o sangue da carne. Posto ao sol, ponho o
que restou da mucura para assar sobre brasas de carvão. Numa cumbuca,
sirvo com farinha de puba a carne assada. Os meninos esfomeados aboca-
nham o gambá mirrado. Emudecidos agradecem quando estão saciados.
Não morreram de fome os meus meninos.
O senhor sabe como Deus criou o mundo? [Pausa. Olha ao longe]
Deus não criou o mundo. O mundo se criou sozinho. Antes do começo
não havia nada — só silêncio. A grande explosão foi o barulho estrondoso
que rompeu o silêncio. O universo é filho do barulho. O primeiro animal
que surgiu no mundo foi a mucura. A natureza criou a mucura para que
as mães alimentassem os filhos famintos. Os seres humanos foram
expulsos do paraíso, sabe-se lá por quem, quando mataram a primeira
mucura. Desde então, por uma espécie de castigo, as pessoas caçam mu-
curas. Mas se pudessem as mucuras caçariam as pessoas que as caçam.

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[Cantarola]

Deve ter sido tão triste a morte do Cristo. Eu queria ser um mosqui-
tinho para levar água até a boca do Cristo para que o Cristo não morresse
com sede. Não me sai da cabeça que o Cristo morreu com sede. Deve ser
tão triste morrer com sede.

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CAPÍTULO 4
iraxeru

Transamazônica. Km 3390. Jacareacanga. Cena externa. Meia noite. Lua


minguante. Iraxeru é o espírito de uma menina do povo indígena mun-
durucu. Ela tem 13 anos. Iraxeru volta ao local onde era a aldeia do seu
povo. A aldeia não existe mais. Só existe a estrada sobre as ruínas de sua
gente. Iraxeru olha firme quem está defronte.

iraxeru — Iraxeru. Meu nome. Iraxeru. Índia. Me batizaram com o


nome Maria. Mas o meu nome é Iraxeru. Dos mundurucus. Índia. Era na
beira do Tapajós. Era aqui. A gente vivia aqui fazia tempo. A gente tinha
casa aqui. Casa de cipó e palha seca. Estaca de madeira. Árvore forte.
Terra batida. Goteira quando vinha chuva. Trovoada a gente ouvia quan-
do vinha chuva. Dormia na rede. Era. A gente dormia na rede. Dormia e
sonhava com a chuva. Trovoada. Era barulho. Nem era trovoada, às vezes.
Era só barulho de castanheira. Ouriço de castanha caía. Estrondo. A gente
acordava com a claridão do relâmpago. Aviso. Era. Relâmpago era aviso.
Pai acordava e ia na chuva olhar o tempo. Acalmava o tempo. Não vinha
mais o relâmpago. Estrondo. Um dia veio o estrondo. A gente acordou
com o estrondo. Era trator o nome do estrondo. Bicho grande. Maior
que onça. Maior que equiçá, oca. Quase tamanho da castanheira. Trator
comia a terra. Arrancava árvore forte. Estaca de madeira. Trator arranca-

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va equiçá, oca. Casa de cipó e palha seca. Trator levou tudo. Aldeia toda.
Pai acordou e foi na chuva olhar o tempo quando trator levava tudo. Pai
pegou facão. Pai tinha facão. Pai subiu no trator. Pai meteu facão na cara
do homem que dirigia o trator. Sangue. Sangue do homem era vermelho
como o sangue da gente. Igual sangue de macaco que também é verme-
lho. Pai meteu um monte de facãozada no homem. Depois o pai fugiu
pro mato. Homens que vieram com o homem do trator foram pro mato
pra matar o pai. Mas o pai subiu no pé de sumaúma. Alto. O pai ficou lá
no pé de sumaúma. Nunca que encontraram o pai. A gente tentou fugir
também. Tentou ir pro mato. Subir noutros pés de sumaúma. Mas não
deu tempo. Os homens que vieram com o homem do trator vieram foi pra
cima da gente com facão e corrente de trator. Puseram fogo na casa com
um troço de gasolina. Amarraram a mãe numa castanheira. Surraram a
mãe com cipó e corda pra mãe dizer onde o pai se escondeu. Mãe ficou
foi na carne viva de tanto apanhar dos homens que vieram com o homem
do trator que o pai matou com uma facãozada na cara. Sangue. Sangue do
homem era vermelho como o sangue da gente. Igual sangue de macaco
que também é vermelho. Pai meteu um monte de facãozada no homem.
Deve ter doído. Um homem veio pra cima de mim. Me arrastou até dian-
te da mãe que tava amarrada numa castanheira. Mãe que tava na carne
viva. O homem cuspiu na minha cara. Mordeu minha orelha. Chupou
meu pescoço. Meu peito. Eu tentava fugir, mas o homem me apertava o
braço. Mãe grunhia como bicho, mas mãe não tinha força de nada. Tive
medo. E gemia. Eu gemia. E mãe olhava. Mãe, em carne viva, me olhava.
[Pausa] Doía. [Sussurra] Doía muito. Homem dizia coisas. Ele não parava
de dizer coisas. Eu não entendia o que o homem dizia. Mãe chorava. Mãe,
em carne viva, chorava. Homem cortou meu cabelo com faca amolada na
pedra. Homem fez coisas comigo. Depois veio outro homem e fez mais
coisas. E veio depois outro homem e fez mais coisas. E outro homem veio
também e fez mais coisas comigo. Mãe chorava. Mãe, em carne viva,
chorava. Eram muitos homens em cima de mim. Eu não tinha mais fôlego
de tanto homem em cima de mim. Até que um deles me amarrou pelos
pés com uma corda. [Grita assombrada como se avistasse alguém ao longe]
Iraxeru. Iraxeru. Iraxeru. Pra onde foram os meninos? [Grita assombra-
da como se avistasse alguém ao longe] Iraxeru. Iraxeru. Iraxeru. [Pausa.
Cantarola. Espalha muitas pedras. Volta a narrar] Um dos homens me
amarrou pelos pés com uma corda. Depois amarrou corda no trator. E me
arrastou pela estrada entre troncos de árvores. Eu sentia pedras e troncos

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de árvores rasgarem minha carne. Eu sentia tanta dor. Mas só lembrava do
pai no alto da sumaúma. E lembrava da mãe, em pele viva, amarrada na
castanheira. E queria pedir pro pai descer de lá e tirar mãe da castanheira,
pôr folhas na pele da mãe pra curar a pele da mãe, pra mãe viver longe,
longe da estrada nova, longe do homem do trator. Mas eu não conseguia
fazer nada disso. Só chorar. Eles acharam que eu já tinha morrido. Mas eu
ainda respirava, desfalecida já. Eu respirava. [Sussurra] Era um suspiro só.
[Volta a narrar] Então, um dos homens veio com uma peixeira e foi abrin-
do meu bucho aos poucos. Abriu meu bucho até a altura do pescoço. Ho-
mem do trator encheu o meu bucho com pedras e costurou com arame.
Depois homem do trator jogou meu corpo no rio. E, desde então, nunca
mais vi pai nem mãe. Nem casa de cipó e palha seca. Estaca de madeira.
Nem árvore forte. Nem terra batida. [Sussurra] Nunca mais.

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CAPÍTULO 5
pistoleiros

Transamazônica. Km 2375. Anapu. Cena externa. Madrugada. Dois pisto-


leiros conversam, entre cruzes, às margens da BR-230.

pistoleiro 1 — O Magal era doidão, entende?

pistoleiro 2 — Entendo não.

pistoleiro 1 — Ele punha o revólver na testa do boi e atirava. O sangue


jorrava e o boi caía. Era certeiro.

pistoleiro 2 — Você viu o doido atirando?


pistoleiro 1 — Vi. O doido fazia isso na véspera do natal. Matava o
boi com um revólver pra fazer churrasco no natal.

pistoleiro 2 — Era uma coisa louca, não era? O maluco com um


revólver na mão. O maluco encara o olho do boi. O boi olha firme o
maluco. O maluco atira. O boi cai no chão.

pistoleiro 1 — O sangue do boi era vermelho como o sangue da gente.


pistoleiro 2 — O quê?

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pistoleiro 1 — Como sangue de macaco que também é vermelho.
pistoleiro 2 — Você já comeu carne de macaco?

pistoleiro 1 — Não. Mas os índios comem.


pistoleiro 2 — Deve ser bom.
pistoleiro 1 — Não sei.
pistoleiro 2 — Já imaginou um maluco mirando o revólver? Um ma-
luco encarando, olhando firme o teu olho? Já imaginou um maluco atiran-
do no meio da tua testa?

pistoleiro 1 — Não. Mas vi num sonho. Eu caía no chão depois que


o maluco atirava. Eu caía morto no chão. O meu espírito saía do corpo.
Meu espírito via tudo de cima como se voasse. [Pausa] Quando tive esse
sonho acordei atormentado e fui à venda do Magal tomar uma dose de 51.
[Pausa] O Magal era doidão.

pistoleiro 2 — Ele andava com um rosário no pescoço. Tinha o


corpo fechado.

pistoleiro 1 — Mas não acreditava em porcaria nenhuma.

pistoleiro 2 — Em Satanás. O Magal acreditava no capiroto.


pistoleiro 1 — E você acredita em quem?
pistoleiro 2 — Na pomba-gira. Naquela puta da pomba-gira. Entende?
pistoleiro 1 — Entendo não.
pistoleiro 2 — Você precisa entender uma coisa.
pistoleiro 1 — O quê?
pistoleiro 2 — Desconfie até da sua sombra. Dos canalhas. Descon-
fie dos canalhas.

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pistoleiro 1 — Por quê?
pistoleiro 2 — Porque quem mata não confia. Não acredita.
pistoleiro 1 — Em nada?

pistoleiro 2 — Quem mata não acredita em nada.


pistoleiro 1 — Em Deus?

pistoleiro 2 — Em Deus tampouco.

pistoleiro 1 — Nos homens?

pistoleiro 2 — Menos ainda nos homens.


pistoleiro 1 — Sabe o Magal?

pistoleiro 2 — Sei. Que tem o Magal?


pistoleiro 1 — Ele tinha uma caminhonete. Ele saía adoidado com a
caminhonete pela estrada. Levantava poeira.

pistoleiro 2 — E daí?
pistoleiro 1 — Ele punha uma fita k-7 no som da caminhonete. Ele
punha a música bem alta. E saía pela estrada com a música bem alta.

pistoleiro 2 — Você ia junto?

pistoleiro 1 — Eu ouvia aquelas músicas e olhava firme a estrada.


Parecia que não havia fim. Que a gente não ia chegar nunca no fim da
estrada. Que aquela música ia tocar o tempo todo.

pistoleiro 2 — E o que houve com o Magal no fim das contas?

pistoleiro 1 — Ele capotou a caminhonete um dia.

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pistoleiro 2 — E morreu?
pistoleiro 1 — O corpo se esbagaçou na estrada.
pistoleiro 2 — Em tempos.
pistoleiro 1 — Mas eu não consigo esquecer.
pistoleiro 2 — O quê? O que você não consegue esquecer?
pistoleiro 1 — Da música.
pistoleiro 2 — Que música?
pistoleiro 1 — Da música que o Magal escutava no som da cami-
nhonete.

pistoleiro 2 — E que diacho de música o doido do Magal escutava


na caminhonete?

pistoleiro 1 — Aquela...
pistoleiro 2 — Qual?
pistoleiro 1 — Não sei.
pistoleiro 2 — Você comia o cu do Magal era?
pistoleiro 1 — Eu não.
pistoleiro 2 — Fica aí lembrando a música que o doidão tocava no
som da caminhonete.

pistoleiro 1 — O Magal era doidão, entende?


pistoleiro 2 — Entendo não.
pistoleiro 1 — Ele punha o revólver na testa do boi e atirava. O san-
gue jorrava e o boi caía. Era certeiro.

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pistoleiro 2 — Você viu o doido atirando?
pistoleiro 1 — Vi. O doido fazia isso na véspera do natal. Matava o
boi com um revólver pra fazer churrasco no natal.

pistoleiro 2 — Era uma coisa louca, não era? O maluco com um


revólver na mão. O maluco encara o olho do boi. O boi olha firme o malu-
co. O maluco atira. O sangue jorra. O boi cai no chão.

pistoleiro 1 — O sangue do boi era vermelho como o sangue da gente.


pistoleiro 2 — O quê?
pistoleiro 1 — Como sangue de macaco que também é vermelho.
pistoleiro 2 — Você já comeu carne de macaco?
pistoleiro 1 — Não. Mas os índios comem.
pistoleiro 2 — Deve ser bom.
pistoleiro 1 — Não sei. [Pausa] Mas tinha uma coisa.
pistoleiro 2 — Que coisa?
pistoleiro 1 — Era um troço.
pistoleiro 2 — Que troço?
pistoleiro 1 — Dava até vontade de chorar.
pistoleiro 2 — Por quê? Porque dava até vontade de chorar?
pistoleiro 1 — A música.

pistoleiro 2 — Que música?

pistoleiro 1 — A música que o Magal escutava no som da caminhonete.

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pistoleiro 2 — E que diacho de música o doido do Magal escutava
na caminhonete?

pistoleiro 1 — Aquela...
pistoleiro 2 — Qual?
pistoleiro 1 — Não sei.
pistoleiro 2 — Você precisa entender uma coisa.
pistoleiro 1 — O quê?
pistoleiro 2 — Desconfie até da sua sombra. Dos canalhas. Desconfie
dos canalhas.

pistoleiro 1 — Por quê?

pistoleiro 2 — Porque quem mata não confia. Não acredita.


pistoleiro 1 — Em nada?

pistoleiro 2 — Quem mata não acredita em nada.

pistoleiro 1 — Em Deus?
pistoleiro 2 — Em Deus tampouco.

pistoleiro 1 — Nos homens?


pistoleiro 2 — Menos ainda nos homens.

pistoleiro 1 — Sabe o Magal?


pistoleiro 2 — Sei. Que tem o Magal?

pistoleiro 1 — Ele tinha um revólver 38.

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pistoleiro 2 — Eu sei. O Magal tinha um revólver 38. Uma cami-
nhonete. Uma venda. Uma fazenda.

pistoleiro 1 — E o que mais?

pistoleiro 2 — Não sei.

pistoleiro 1 — Ele tinha um revólver 38.

pistoleiro 2 — E daí?

pistoleiro 1 — Ele atirou na freira. Ele atirou na freira com o revólver 38.

pistoleiro 2 — Mas a freira era comunista.

pistoleiro 1 — Ele matou a freira porque a freira era comunista?

pistoleiro 2 — Ele matou a freira porque deu vontade.

pistoleiro 1 — O Magal era doidão, entende?

pistoleiro 2 — Entendo não.

pistoleiro 1 — Ele pôs o revólver na testa da freira e atirou. O sangue


jorrou e a freira caiu. Era certeiro.

pistoleiro 2 — Você viu o doido atirando?

pistoleiro 1 — Vi. O doido fez isso na véspera do natal. Matou a


freira com um revólver na véspera do natal.

pistoleiro 2 — É uma coisa louca, não é? O maluco com um revólver


na mão. O maluco encara o olho da freira comunista. A freira comunista
olha firme o maluco. O maluco atira. O sangue jorra. A freira cai no chão.

pistoleiro 1 — O sangue da freira era vermelho como o sangue da


gente.

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pistoleiro 2 — O quê?

pistoleiro 1 — Como sangue de macaco que também é vermelho.

pistoleiro 2 — Você já comeu carne de macaco?

pistoleiro 1 — Não. Mas os índios comem.

pistoleiro 2 — Deve ser bom.

pistoleiro 1 — Não sei.

pistoleiro 2 — Já imaginou um maluco mirando o revólver? Um ma-


luco encarando, olhando firme o teu olho? Já imaginou um maluco atiran-
do no meio da tua testa?

pistoleiro 1 — Não. Mas vi num sonho. Eu caía no chão depois que


o maluco atirava. Eu caía morto no chão. O meu espírito saía do corpo.
Meu espírito via tudo de cima como se voasse. [Pausa] Quando tive esse
sonho acordei atormentado e fui à venda do Magal tomar uma dose de 51.
[Pausa] O Magal era doidão.

pistoleiro 2 — Ele andava com um rosário no pescoço. Tinha o


corpo fechado.

pistoleiro 1 — Mas não acreditava em porcaria nenhuma.

pistoleiro 2 — Em Satanás. O Magal acreditava no capiroto.

pistoleiro 1 — E você acredita em quem?


pistoleiro 2 — Na pomba-gira. Naquela puta da pomba-gira. Entende?

pistoleiro 1 — Entendo não.


pistoleiro 2 — Às vezes penso numas coisas.
pistoleiro 1 — No quê?

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pistoleiro 2 — Na bala do revólver cortando a carne. No músculo
danificado. Nos nervos e vasos sanguíneos se rompendo.

pistoleiro 1 — Um tiro?
pistoleiro 2 — Que tiro?
pistoleiro 1 — Um tiro de revólver. Um tiro na cabeça.

pistoleiro 2 — Tudo, antes e depois da massa cinzenta, será aniquilado:


a pele, os nervos, os cabelos. [Sussurra] Morte certa.

pistoleiro 1 — Você já levou um tiro?

pistoleiro 2 — Já. Já levei um tiro.


pistoleiro 1 — Onde? Onde você levou um tiro?

pistoleiro 2 — Na testa. No braço. Na perna. Na boca. No céu da


boca. No cu. Já levei um tiro no cu.

pistoleiro 1 — E morreu?

pistoleiro 2 — Morri.

pistoleiro 1 — Quantas vezes?

pistoleiro 2 — Quantas vezes o quê?


pistoleiro 1 — Quantas vezes você morreu?
pistoleiro 2 — Todas as vezes que levei um tiro. Morri todas as vezes
que levei um tiro.

pistoleiro 1 — E doeu?
pistoleiro 2 — Doeu o quê?
pistoleiro 1 — O tiro. O tiro doeu?
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pistoleiro 2 — Não me lembro.
pistoleiro 1 — De nada?
pistoleiro 2 — De nada o quê?
pistoleiro 1 — Da dor. Você não lembra da dor?

pistoleiro 2 — Não me lembro. Mas senti fome. [Sussurra] Acho que


senti fome.

pistoleiro 1 — E deram algo pra comer?

pistoleiro 2 — Não lembro. Acho que deram água.


pistoleiro 1 — Água?
pistoleiro 2 — [Sussurra] Eu já estava morto quando me deram água.
pistoleiro 1 — Nenhum cigarro?
pistoleiro 2 — Sim. Deram um cigarro.
pistoleiro 1 — E você fumou?

pistoleiro 2 — Dei um trago.


pistoleiro 1 — Só um trago?

pistoleiro 2 — Já não tinha forças.


pistoleiro 1 — Você não lembra de mais nada?

pistoleiro 2 — Tinha uma coisa.


pistoleiro 1 — Que coisa?
pistoleiro 2 — Era um troço.

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pistoleiro 1 — Que troço?
pistoleiro 2 — Dava até vontade de chorar.
pistoleiro 1 — Por quê? Porque dava até vontade de chorar?
pistoleiro 2 — A música.
pistoleiro 1 — Que música?
pistoleiro 2 — A música que tocavam lá.
pistoleiro 1 — Que música tocavam lá?
pistoleiro 2 — Era triste.
pistoleiro 1 — E a freira?
pistoleiro 2 — Que freira?
pistoleiro 1 — A freira comunista.
pistoleiro 2 — Que tem a freira comunista?
pistoleiro 1 — Você viu a freira comunista?
pistoleiro 2 — Sim. Vi a freira comunista.
pistoleiro 1 — Onde?
pistoleiro 2 — Lá.
pistoleiro 1 — Lá onde?
pistoleiro 2 — Debaixo de uma árvore.
pistoleiro 1 — E você atirou?

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pistoleiro 2 — O quê?
pistoleiro 1 — Você atirou na freira comunista?
pistoleiro 2 — É uma coisa louca, não é? A freira comunista está
debaixo de uma árvore com uma bíblia. Eu tenho um revólver na mão.
A freira comunista encara o meu olho. A freira comunista me olha firme.
Atiro. O sangue jorra. A freira cai no chão.

pistoleiro 1 — E o Magal? Você viu o Magal?


pistoleiro 2 — Que Magal?
pistoleiro 1 — Ele tinha uma caminhonete. Ele saía adoidado com a
caminhonete pela estrada. Levantava poeira.

pistoleiro 2 — E daí?
pistoleiro 1 — Ele punha uma fita k-7 no som da caminhonete. Ele
punha a música bem alta. E saía pela estrada com a música bem alta.

pistoleiro 2 — Você ia junto?


pistoleiro 1 — Eu ouvia aquelas músicas e olhava firme a estrada.
Parecia que não havia fim. Que a gente não ia chegar nunca no fim da
estrada. Que aquela música ia tocar o tempo todo.

pistoleiro 2 — E o que houve com o Magal no fim das contas?

pistoleiro 1 — Ele capotou a caminhonete um dia. Ele levou um tiro


de revólver.

pistoleiro 2 — E morreu?
pistoleiro 1 — O corpo se esbagaçou na estrada.
pistoleiro 2 — Em tempos.

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pistoleiro 1 — Mas eu não consigo esquecer.
pistoleiro 2 — O quê? O que você não consegue esquecer?
pistoleiro 1 — Da música.
pistoleiro 2 — Que música?
pistoleiro 1 — Da música que o Magal escutava no som da caminhonete.
pistoleiro 2 — E que diacho de música o doido do Magal escutava
na caminhonete?

pistoleiro 1 — Aquela...
pistoleiro 2 — Qual?
pistoleiro 1 — [Canta a canção “India”, de José Asunción Flores, com
letra do poeta Manuel Ortiz Guerrero]

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EPÍLOGO
fotografia

Transamazônica. Km 3000. Itaituba. Cena externa. Sol da metade da ma-


nhã. Projeta-se a fotografia de um funeral. Uma família pobre está diante de
um caixão com flores. O narrador descreve a fotografia antiga.

narrador — O enquadramento da fotografia está focado no apinhado


de gente, uma família: destroços. Rostos furtados de si, atônitos. Ossos de
gente à parte. Fios de vida entrelaçados. Posicionam-se num semicírculo
para celebrar a fotografia fatídica, testemunho árido de dor. Os corpos
cabisbaixos, postos em reverência, reparam o corpo duma das irmãs que
morrera; o corpo da irmã, ainda menina, coberto de flores murchas; o
corpo duma irmã, num caixão. Quase nada avistamos da paisagem. Nada
sabemos sobre onde estão. Mas uma casa de madeira, ao fundo, talvez
denuncie as posses apoucadas daquela gente. As paredes envelhecidas
pela chuva guardam marcas de pregos enferrujados. Não avistamos o céu.
O dia parece ensolarado, apesar da atmosfera embargada da foto. Não
sabemos se é manhã ou tarde, que horas são. Talvez seja meio dia. Talvez
seja exatamente meio dia sobre o chão de terra onde aqueles pés se
firmam em sandálias. Talvez alguém ali se atreveu em fotografar o suplí-
cio. Talvez a família quisesse guardar para si aquela última lembrança da

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filha, da irmã, da tia. Talvez não se envergonhassem da morte. Era comum
que aquela gente visse a vida se perder, de repente, aos poucos ou de uma
vez só. Era comum que aquela gente fosse fotografada entre caixões. Era
comum que aquela gente vestida com camiseta pobre, sem cerimônia,
se aglomerasse na carroceria dum caminhão e viajasse por quilômetros.
Era comum que se acidentasse. Era comum que aquela gente morresse.
[Pausa] A menina coberta com flores murchas morreu numa estrada ao
longe, a Transamazônica. Era minha tia. [Sussurra] Nunca vi a minha tia.
A menina mais velha, cabelos curtos, está no meio da foto e afronta,
semblante enrijecido, quem olha – talvez o fotógrafo. O sol esconde-lhe
os olhos, os cílios e as sobrancelhas. Mas é possível avistar os seus lábios
cerrados. É possível sentir a sua boca seca. Das suas vestes vemos apenas
a camiseta pobre, sem cerimônia. A mesma camiseta pobre, sem cerimô-
nia, que os outros meninos usavam por engano ou não. A menina mais
velha continuará olhando quem está defronte pelos séculos sem fim, até
que acabe, num incidente indevido, a fotografia que a captou para sempre
naquela posição imóvel e incômoda de ser a única pessoa ali a encarar
quem fotografa, o anjo caído que quis registrar a desgraça dos seus.
Ao seu lado está o menino mais novo, perdido no apinhado de gente,
uma família: destroços. Decerto, não sabe o que faz ali, em riste, posicio-
nado como se fosse ser fuzilado em seguida. Decerto, nem sabe o que é
fuzilamento. Dele só avistamos a cabeça miúda e o dedo indicador aden-
trando o nariz. Decerto, ele queria coçá-lo, mas o flash da câmera o inter-
rompeu e ele ficou para sempre ali, com o dedo dentro do nariz.
Os outros dois meninos estão um em cada extremidade da fotografia.
Do menino no canto direito da foto avistamos as pernas magras, os pés
quase descalços numa sandália, a bermuda curta e a camiseta pobre, sem
cerimônia, como a da menina mais velha. Não avistamos o seu rosto. Ele
está virado. Impactado, olha para o centro da fotografia. Dos meninos, ele
é o mais triste, o mais centrado. Os braços parecem pesar como pedras.
Ele, ao contrário do menino mais novo, sabe o que ali acontece e se com-
padece derruído.
Do menino no canto esquerdo da foto avistamos as pernas magras, os
pés quase descalços numa sandália, a bermuda curta e a camiseta pobre,
sem cerimônia, como a da menina mais velha. Avistamos o seu rosto de
perfil e a sua expressão de quem se admira do que ali se sucede, mais
como um curioso, mais como quem não pertencesse àquele acontecimen-
to, alheio, absorto. Por isso, talvez pouse a mão sobre a virilha de menino e

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coce levemente o saco com a mão sobre a bermuda. E, assim, ficará para
sempre: alheio, coçando levemente o saco com a mão sobre a bermuda.
Outros dois irmãos, quase adultos, aparecem contritos, com o corpo
curvado, em reverência. Compõem um semicírculo. Uma reza dura e si-
lenciosa. Delongada. Dum dos irmãos só avistamos a sombra, parte da
cabeça cabeluda e os pés quase descalços numa sandália. O outro irmão
veste uma camisa com mangas. Um homem já. Mas a bermuda curta de-
nuncia o menino que ainda é. Ele se põe firme. Corajoso. Doído por dentro.
Outras duas irmãs, já adultas, aparecem também nas extremidades da
foto. Elas guardam no rosto um coração arrasado. Os corpos se mantêm
pesados como o restante do apinhado de gente, uma família: destroços.
Uma das irmãs pousa levemente os braços sobre o ombro do menino do
canto esquerdo da foto, conferindo intimidade. Talvez buscasse apoio ou,
como ele, quisesse fugir dali.
No centro da foto, a mãe e o pai resguardam o que sobrou da família.
Estão em pé como se estivessem prostrados. A mãe, braços à mostra, ca-
belos curtos, tem o olhar caído. O pai, barba por fazer, encalvecido, camisa
desabotoada, parece perder-se na tristeza mais daninha. Dele ficou a foto-
grafia amargurada de sua gente.
Mas uma mulher, entre o centro e a extremidade esquerda da foto, rou-
ba a cena. Dos irmãos adultos é a que nasceu primeiro. Tem a cabeleira
grande. Cobre o corpo curvado com um vestido amarelo e claro, pobre,
sem cerimônia. Os pés estão quase descalços numa sandália. O semblante
sobrevém abatido e magro. Desnudado. Pesa-lhe a barriga. Ela está grávida.
Essa mulher é a minha mãe. Ela se chama Iraxeru. [Sussurra] Talvez seja eu
o menino por nascer.

[Cantarola]

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UM DRAMATURGO NA TRANSAMAZÔNICA

Rudinei Borges dos Santos nasceu de uma família de colonos migran-


tes da Transamazônica, em Itaituba, oeste do Pará, na Amazônia brasilei-
ra, onde iniciou a sua formação teatral. É poeta, ficcionista e dramatur-
go. Doutorando e Mestre em Educação pela Universidade de São Paulo
[USP]. Graduou-se em Filosofia. Autor indicado ao Prêmio Shell de Tea-
tro/2016 pela obra cênica Dezuó, breviário das águas. Publicou os livros
Epístola.40, Memorial dos meninos, Dentro é lugar longe e Chão de terra
batida. E ainda o ensaio Teatro no ônibus e a revista Fagulhas.
É autor de, pelo menos, 10 obras teatrais encenadas em Angola e no
Brasil, entre elas: Transamazônica, Todo sacrifício feito em teu nome, Medea
Mina Jeje, Luzeiros, Revolver, Agruras, ensaio sobre o desamparo, Fé e
Peleja e Dentro é lugar longe.
Peças de sua autoria foram apresentadas no Festival Internacional de
Teatro do Cazenga/Angola, no Festival Internacional de Rio Preto, no
Festival de Dança de Londrina, no Festival Nacional de Presidente Pru-
dente, no Festival Satyrianas, no Feverestival de Campinas, no Festival de
Artes Cênicas de Bragança Paulista, no mOno_festival, na Mostra Mario
Pazini de Teatro do Gueto e na Mostra de Teatro de Heliópolis.
As peças Dezuó, breviário das águas e Epístola.40 integram a lista de
textos sugeridos em processos seletivos da Escola de Artes Dramáticas

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[EAD/USP] e da ELT – Escola Livre de Teatro. Como dramaturgo, parti-
cipou de projetos cênicos da Oka, ...AVOA!, Agrupamento Andar7, Trupe
Sinhá Zózima, Coletivo Negro, Cia. do Miolo e 127 Fundos. Atuou como
roteirista do Núcleo de Cinema do Sertão que Virou Mar e como editor
do site Mais Revista Cultura.
Em 2011, fundou o Núcleo Macabéa, da Cooperativa Paulista de
Teatro, onde, atuando como diretor artístico e dramaturgo, desenvolve
criações teatrais com ênfase na intersecção entre dramaturgia, memória
e história oral.
Integrou cursos de atuação, dramaturgia e encenação do Teatro
Escola Macunaíma, da SP Escola de Teatro e da ELT.
Foi contemplado pelo Concurso de Texto Inédito de Dramaturgia do
Programa de Ação Cultural [PROAC], pelo Programa de Valorização de
Iniciativas Culturais [VAI], pelo Prêmio FUNARTE de Teatro Myriam
Muniz e pelo Programa Municipal de Fomento ao Teatro para a Cidade
de São Paulo. Integrou a comissão de seleção da 3° Edição do Prêmio
Zé Renato de Teatro e dos PROACs de Incentivo à Criação Literária In-
fantil e/ou Juvenil e Incentivo à Criação e Publicação Literária – Poesia.
Poemas de sua autoria foram publicados nos sites e revistas Babel
Poética, Releituras, Zagaia e Jornal de poesia. Publica textos literários e
ensaios sobre teatro nos sites Memorial dos Meninos e Alzira Re(vista).

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