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OBRAS E SERVIÇOS DE ENGENHARIA - 761/186/AGO/2009

A EXIGÊNCIA DE PROJETO BÁSICO PRÉVIO À CELEBRAÇÃO DE CONTRATOS


EMERGENCIAIS DE OBRAS DE ENGENHARIA

por RODRIGO VISSOTTO JUNKES


Advogado. Mestrando em Gestão de Políticas Públicas pela UNIVALI-SC. Especia-
lista em Direito Civil pela UTP-PR. Especialista em Direito Administrativo pelo Ins-
tituto Romeu Felipe Bacellar. Integra o corpo de consultores da Zênite.
A Lei de Licitações estabeleceu, de modo bastante claro, que obras e serviços
de engenharia apenas podem ser contratados se houver projeto básico devidamente
aprovado pela autoridade competente e disponível para ser consultado pelos interessa-
dos. Essa regra, que abrange tanto os casos de licitação quanto os de contratação direta
(dispensa ou inexigibilidade), é a prevista pelo art. 7º, § 2º, inc. I e § 9º.
A existência de prévio projeto básico, portanto, constitui verdadeiro pressupos-
to para a contratação de obras e serviços de engenharia, seja decorrente de licitação ou
de contratação direta. Como a regra abrange os casos de contratações emergenciais,
baseadas na hipótese de dispensa estabelecida pelo art. 24, inc. IV, da Lei de Licitações,
pode-se afirmar que, a rigor, as contratações emergenciais que se ocupam de obras e
serviços de engenharia apenas poderão ser firmadas se preexistir o projeto básico res-
pectivo.
Não se discute a validade da regra geral acima apresentada. De fato, acredita-se
e defende-se que o panorama normativo vigente para a questão indica justamente que
também as obras emergenciais somente poderão ser firmadas se houver projeto básico
que lhe anteceda. O que se busca discutir, na presente oportunidade, é a existência de
exceções à presente regra, as quais, por assumirem essa qualidade, podem tornar legí-
tima a celebração de contratações emergenciais antes da conclusão do projeto básico.
Para realizar esse exame, é indispensável os fundamentos que legitimam e as
finalidades almejadas pelas contratações diretas fundamentadas no art. 24, inc. IV.
O art. 24, inc. IV, possibilita a contratação emergencial
Nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência
de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segu-
rança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particu-
lares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial
ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no
prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados
da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos
contratos.

A simples leitura da disposição legal possibilita aferir, com bastante clareza, que
o cabimento da contratação emergencial é bastante restrito. Isso porque ela apenas po-
derá ser empregada nos casos em que efetivamente houver situação emergencial que
provoque risco concreto e efetivo, que não possa aguardar o regular processamento
da licitação sem que isso não provoque prejuízos. O Tribunal de Contas da União, ao
que parece, também adota uma posição restritiva quanto ao cabimento da contratação
emergencial. O aresto que segue bem ilustra essa tendência:
Somente dispense por emergência o certame licitatório nos casos previstos no inciso
IV do art. 24 da Lei 8.666/1993, ou seja, quando caracterizada urgência de atendi-
mento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de
pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e
somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou ca-
lamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo
máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocor-
rência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contra-
tos. (TCU, Acórdão nº 628/2005 - 2ª Câmara, Rel. Min. Lincoln Magalhães da Rocha,
DOU de 05.05.2005.)

Essas observações possibilitam dizer que a contratação direta por emergência


está diretamente ligada aos casos em que a existência de uma situação de risco requer
pronto atendimento, sob pena da ocorrência de prejuízos. Daí decorre o fundamento
por meio do qual a licitação é dispensada.
É bastante razoável supor, dentro dessa lógica, que podem existir situações
emergenciais cujo pronto atendimento requisita a realização de obras e serviços de en-
genharia sem que os projetos básicos respectivos encontrem-se previamente elabora-
dos.
O desafio que surge, a partir disso, é o de saber se é juridicamente possível ce-
lebrar tais contratações sem a prévia existência do projeto básico.
Não parece existir uma resposta única e inequívoca para solucionar o problema.
Na verdade, ela dependerá das circunstâncias de cada especial situação concreta vivida.
É que a Administração deverá, nesses casos, buscar a solução que ocasione o
menor grau de prejuízo, empregando, para tanto, os princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade.1 Deverá, portanto, confrontar as duas obrigações que lhe são impos-
tas: a de anteceder as contratações de obras e serviços de engenharia de projeto básico
com a de agir prontamente com o propósito de evitar riscos e prejuízos, e eleger aquela
que representar o menor grau de prejuízo.
Se a Administração, nessa ponderação de valores, entender que salvaguardar
os bens e interesses expostos à situação de risco representa a melhor alternativa a ser
seguida, parece possível determinar a celebração do contrato e promover a juntada pos-
terior do projeto básico. É evidente que, nessa hipótese, as razões que justificam esse
agir deverão ser amplamente motivadas e comprovadas no bojo do processo adminis-
trativo que instrui a contratação.
O Tribunal de Contas da União, em determinado situação, entendeu que, nesse
caso, a Administração poderia inclusive substituir o projeto básico por outros instru-
mentos que, de um modo ou de outro, preenchessem os requisitos para ele previstos.
Acrescentou, no entanto, a necessidade de os serviços serem de baixa complexidade.
Tal entendimento consta do Acórdão nº 53/2007 - Plenário, de cujo voto do Ministro
Relator pode-se extrair a seguinte passagem:
A respeito do indício de irregularidade relativo à elaboração de projeto básico ina-
dequado, o Tribunal tem entendido que esse instrumento pode ser traduzido em
planilha estimativa, devidamente fundamentada em relatório técnico, sempre que
tais serviços forem de característica emergencial e de baixa complexidade executiva.
É preciso assinalar que esse entendimento não se figura no sentido de dizer que o
projeto básico é elemento prescindível nas obras desse tipo, mas esclarecer que os
seus elementos constitutivos são mais simples, compatíveis com as obras que pre-
tende detalhar. Desse modo, a estimativa e o detalhamento dos tipos de serviços a
serem executados, desde que acompanhados de fundamentação técnica e compa-
tível com o trecho em questão, podem servir para atender o disposto no art. 7º da
Lei nº 8.666/1993. (TCU, Acórdão nº 53/2007 – Plenário, Rel. Min. Augusto Nardes,
DOU de 02.02.2007.)

Vale salientar que, em outra oportunidade, entendeu que mesmo nos casos de
contratação emergencial deverá ser elaborado o projeto básico. Trata-se do Acórdão nº
1.644/2008 - Plenário:
1.6. que, mesmo em obras emergenciais, providencie projeto básico com todos os
elementos do art. 6º, inciso IX, da Lei nº 8.666/93, em obediência ao art. 7º, § 2º,
inciso II, e 9º, da Lei nº 8.666/1993, sob pena de aplicação do § 6º do mesmo artigo,
ou seja, anulação dos contratos;

De qualquer modo, parece-nos razoável defender a possibilidade de a


Administração, nos casos em que a situação de risco não tolerar que se aguarde a ela-
boração do projeto básico, celebrar a contratação e, assim, viabilizar que medidas emer-
genciais sejam adotadas para resguardar bens e interesses envolvidos.
Isso, porém, não exoneraria a Administração de elaborar o projeto básico. Tal
instrumento deve, também nesses casos, ser devidamente providenciado, mas a sua
juntada ao processo aconteceria, de modo justificado, após a celebração do contrato.
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1
O princípio da razoabilidade tem fundamento em critérios racionais que se enquadram no senso co-
mum, de forma a coibir excessos com afronta aos direitos fundamentais. (STJ, REsp nº 616562/DF, DJ de
30.08.2004).

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