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Texto Luís Roberto Barroso CPI
Texto Luís Roberto Barroso CPI
I - GENERALIDADES
1
Vejam-se, por todos, M. Seabra Fagundes, O controle dos atos administrativos pelo Poder
Judiciário, 1979, p. 4-5; e Raul Machado Horta, Limitações constitucionais dos Poderes de
investigação,Revista de Direito Público 5/34 (1968), p. 5.
reservada, pela sanção e veto, e pela edição de atos com força de lei , a
ênfase da atuação do Legislativo tem recaído, efetivamente, na fiscalização,
isto é, na investigação e no controle dos atos do Poder Público.
2
Dentre os trabalhos monográficos sobre comissões parlamentares de inquérito, em língua
portuguesa, destacam-se: Aguinaldo da Costa Pereira, Comissões parlamentares de inquérito,
1948; Nelson de Souza Sampaio, Do inquérito parlamentar, 1964; Wilson Accioli, Comissões
parlamentares de inquérito: instrumento de ação política, 1980; e José Alfredo de Oliveira
Baracho, Teoria geral das comissões parlamentares, 1988. Na doutrina estrangeira, vejam-se,
em meio a muitos outros: Joseph Barthélemy, Essai sur le travail parlementaire et le système
des commissions, 1934; Fulvio Fenucci, I limiti dell'Inchiesta parlamentare, 1968; e Jorge
Reinaldo Vanossi, El poder de investigación del Congreso Nacional, 1976.
3
V. Pimenta Bueno, Direito público brasileiro e análise da Constituição do Império, v. I, 1857, p.
106; José Alfredo de Oliveira Baracho, ob. cit., p. 108; Paulo Brossard, Da obrigação de depor
perante comissões parlamentares de inquérito criadas por Assembléia Legislativa, Revista de
Informação Legislativa do Senado Federal 69/15 (1981).
2
“Art. 58
§ 3° - As comissões parlamentares de inquérito, que terão
poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de
outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas
pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou
separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros,
para apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas
conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para
que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.”
4
Veja-se, a propósito, Fábio Konder Comparato, Comissões parlamentares de inquérito –
limites, Revista Trimestral de Direito Público 5/66 (1994), 69-70. Por evidente e intuitivo, jamais
será admissível a uma CPI discutir o mérito de decisões materialmente jurisdicionais,
convocando magistrados ou por qualquer modo questionando o acerto de seus
pronunciamentos.
5
Ob. cit., p. 36.
6
Comentários à Constituição brasileira de 1988, 1992, p. 71. No mesmo sentido, em meio a
muitos outros, Carlos Alberto Direito, Comissão parlamentar de inquérito: limites, Revista da
Faculdade de Direito da UERJ 2/147 (1994), 151, onde se lê: “O que se verifica é que a
investigação parlamentar, concretamente, está vinculada ao poder de legislar e de controlar do
Congresso. Há, portanto, uma esfera própria para a comissão parlamentar de inquérito, ou
seja, uma limitação material, assim a competência do Congresso sobre o objeto da
3
Por assim ser, não pode a comissão parlamentar de inquérito interferir
com a autonomia individual e das entidades privadas. Além disto, tampouco
pode ter caráter policial ou substitutivo da atuação de outros órgãos do Poder
Público. É o que decorre, há muito, do ensinamento de Léon Duguit,7 reiterado
por Carlos Maximiliano:
4
mas é inequívoco o ensinamento da doutrina, como se extrai de J. J. Gomes
Canotilho, in verbis:
11
Direito constitucional, 1991, p. 752.
12
349 U.S. 155 (1955). Veja-se que, já no caso Kilbourn v. Thompson (1881), a Suprema Corte
decidiu que comissão parlamentar de inquérito não tem o poder de investigar assuntos
privados.
13
V. Taylor, Grand inquest, a story of congressional investigation, 1955, p. 163: “The phrases
private affairs, private papers or right of privacy have been used to denote an area in which the
power is constitutionally limited” (As expressões negócios privados, papéis privados ou direito
de privacidade têm sido usadas para significar uma área em que o poder é limitado pela
Constituição).
14
Ob. cit., p. 70-71.
5
III.1- ESPAÇO PÚBLICO E ESPAÇO PRIVADO: PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
E AUTONOMIA DA VONTADE NO DIREITO BRASILEIRO
15
Maria Celina B. M. Tepedino, A caminho de um direito civil constitucional, Revista de Direito
Civil n° 65, p. 21/32. Para uma ampla análise desse tema, v. Gustavo Tepedino, Temas de
direito civil, 1998.
6
manifestam, ainda, no domínio associativo, consagrando a liberdade de
associar-se (art. 5°, XVII) e a não interferência estatal (art. 5°, XVIII).
“Art. 5°
XVIII – a criação de associações e, na forma da lei, a de
cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência
estatal em seu funcionamento.”
7
investigação do Poder Legislativo.16 Note-se que o contrato em questão, cuja
legalidade se pretendia discutir, foi celebrado com uma empresa particular, e
não com qualquer entidade pública ou privada da Administração Pública,
o que reforça ainda mais a tese do descabimento da instauração da CPI.
Bem mais tarde, em 1994, sem que se haja verificado qualquer alteração
jurisprudencial sobre este ponto no período, o mesmo Tribunal explicitou, de
forma ainda mais clara, seu entendimento acerca dos limites da atuação das
comissões parlamentares de inquérito. No julgamento do HC n° 71.039, de que
foi relator o Ministro Paulo Brossard, lavrou-se, in verbis:
16
A Lei n° 9.615, de 24.03.98, em cumprimento do dispositivo constitucional, dispõe em seu
art. 16 que “as entidades de prática desportiva e as entidades nacionais de administração do
desporto, bem como as ligas de que trata o art. 20, são pessoas jurídicas de direito privado,
com organização e funcionamento autônomo, e terão as competências definidas em seus
estatutos.”
17
STF, RTJ 151/331.
18
HC n° 32.678, rel. Min. Mário Guimarães, RDA 47, p. 291.
8
Executivo, incluídos os da administração indireta’, art. 49, X, da
Constituição. E as comissões de inquérito são instrumentos idôneos,
ainda que não os únicos, para essa fiscalização.” (grifos
acrescentados).19
19
RDA 199, p. 205-206.
20
Mandado de Segurança n° 179/94, Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio
de Janeiro, rel. Des. Ellis Figueira.
9
São investigáveis os fatos relacionados com a atividade
governamental, fatos que possam ser objeto de legislação, de
deliberação, de controle, de fiscalização.”21
21
Habeas Corpus n° 2.796, rel. Des. Décio Pelegrini, Revista Forense n° 173, p.408.
22
Francisco Campos, Comissão parlamentar de inquérito. Poderes do Congresso. Direitos e
garantias individuais. Exibição de papéis privados, in Revista de Direito Administrativo 67/341.
23
Fábio Konder Comparato, ob. cit., p. 72.
24
Fulvio Fenucci, ob. cit., p. 310-11. V. também Carlos Alberto Direito, ob. cit., p. 149.
25
Francisco Fernandez Segado, El sistema constitucional español, 1992, p. 656-57:"Uno de los
rasgos más definitorios de las notables potestades que se atribuyen a estas Comisiones lo
encontramos en la facultad que se les reconoce constitucionalmente de requerir la presencia
ante ellas de cualquier persona para que pueda ser oída. (...) La comparecencia ante las
Comisiones de investigación ha sido objeto de regulación por la Ley Orgánica 5/1984. (...) El
requerido que dejara voluntariamente de comparecer para informar ante una Comisión de
investigación incurrirá en un delito de desobediencia grave. El artículo 76.1 de nuestra
Constitución trata de dejar a salvo el principio de independencia del Poder Judicial, y a tal
10
Em Portugal, a alínea 5 do art. 181 dispõe expressamente que “as
comissões parlamentares de inquérito gozam de poderes de investigação
próprios das autoridades judiciais”. Nada obstante, nenhum dos dois principais
autores do direito constitucional português os catedráticos Jorge Miranda, de
Lisboa, e Canotilho, de Coimbra sequer cogitam a possibilidade de tais
comissões tomarem medidas como decretação de prisão, busca e apreensão e
outras intervenções igualmente drásticas em bens jurídicos tutelados
constitucionalmente.
11
tem caráter material, e não processual. Institui o poder de exigir, mas não o de
executar.
29
Anschütz, Verfassung des Deutschen Reichs, 1933, p. 222-23, apud Francisco Campos, ob.
cit., p. 372.
12
A Suprema Corte tem exigido do Congresso a adoção de
importantes salvaguardas processuais na condução de suas
investigações. Como a Declaração de Direitos limita tanto a atuação
judicial como legislativa, as investigações congressuais devem respeitar
o privilégio conferido pela quinta emenda contra a auto-incriminação, a
proibição da quarta emenda quanto a buscas e apreensões arbitrárias e
as exigências do devido processo legal..."30
30
Laurence Tribe, American constitutional law, 1988, p. 376 e 377. Sobre o tema, no Brasil,
veja-se Wilson Accioli, ob. cit., p. 64: "A IV Emenda à Constituição dos Estados Unidos
preconiza igualmente o acautelamento da privacidade do indivíduo quanto à casa, papéis e
haveres contra buscas e apreensões injustificáveis, quer dizer, desde que não haja expedição
do mandado competente para promover esse procedimento. É claro, assim, que as Comissões
Parlamentares de Inquérito nos Estados Unidos devem agir também mediante obtenção de
mandado judicial."
13
Do mesmo modo os autores que escreveram sobre o tema após a
Constituição de 1988. Veja-se, a propósito, a lição precisa de Fábio Konder
Comparato, no sentido de que “em nenhuma hipótese admite-se que a
comissão de inquérito usurpe os poderes do Judiciário, ou com ele rivalize”.
Acrescente-se, também, a posição do Professor e Ministro do Superior Tribunal
de Justiça Carlos Alberto Direito: ao enunciar os poderes de tais comissões, ele
omitiu deliberadamente a possibilidade de busca e apreensão e a de ordenar
prisões, in verbis:
14
Mello, assentou que comissão parlamentar de inquérito não tem poder de
ordenar a prisão de investigado. Remarque-se a fundamentação da decisão:
34
RDA 196/195 (1994), p.196, HC nº 71.279, rel. Min. Celso de Mello. Veja-se a mesma
orientação em despacho proferido no Habeas Corpus nº 69.647-3- DF, rel. Min. Celso de Mello,
DJU 5.08.92.
35
Fernando da Costa Tourinho Filho, Processo penal, vol. 3, 1994, p. 313.
36
O próprio Código Penal, após tipificar o crime de violação de domicílio no caput do art. 150,
conceitua no § 4º do mesmo dispositivo: "§ 4º. A expressão 'casa' compreende: I – qualquer
compartimento habitado; II – aposento ocupado de habitação coletiva; III – compartimento não
aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade."
15
Nos termos do comando constitucional, somente será legítimo penetrar
numa casa sem o consentimento do morador nas hipóteses de:
a) flagrante delito;
b) desastre;
c) prestação de socorro;
d) determinação judicial (durante o dia).
37
Manoel Gonçalves Ferreira Filho, Comentários à Constituição brasileira de 1988, vol. I, 1990,
p. 37.
16
lançar-se as premissas da medida extrema e delimitá-la. Indispensável,
para alcançar-se o objetivo visado pela Comissão Parlamentar de
Inquérito, é o mandado judicial”.38
38
DJU 7.06.99, p. 4, MS 23.454-7 (medida liminar), rel. Min. Marco Aurélio.
39
DJU 8.06.99, p. 11. Sobre este ponto, e em sentido diverso, em voto publicado como
trabalho doutrinário, v. Carlos Mário da Silva Velloso, As comissões parlamentares de inquérito
e o sigilo das comunicações telefônicas, Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política
26/36, pp. 43 e 52. Posteriormente, em linha divergente desse pronunciamento, decidiu o Min.
Celso de Mello, no MS 23.491-1 (medida liminar): “...por entender que as comissões
parlamentares de inquérito podem decretar, por autoridade própria, a quebra de sigilo bancário
de pessoas por ela investigadas, desde que justifiquem, a partir de meros indícios, a existência
concreta de causa provável legitimadora da medida excepcional e indiquem a necessidade de
sua efeitvação no procedimento de ampla investigação dos fatos determinados – como
17
É bem de ver, no entanto, que não se confundem a interceptação
telefônica – isto é, a efetiva captação de conversa alheia – e os registros
existentes na companhia telefônica acerca de ligações que tenham sido feitas.
Ouvir a conversa de alguém é diferente de verificar que chamadas partiram de
um determinado telefone ou foram por ele recebido. Nada obstante serem
coisas diversas, ambas as hipóteses estão compreendidas na inviolabilidade
das comunicações telefônicas. De fato, saber para quem se ligou pode ser tão
invasivo da privacidade quanto saber o que foi falado.
18
praticar atos materiais coercitivos ou determinar providências acauteladoras.
Isto significa que elas não produzem decisões de conhecimento sejam
condenatórias, constitutivas ou declaratórias nem de execução. Tampouco
estão investidas do poder cautelar genérico próprio dos juízes e tribunais, com
base no qual se podem tomar medidas, inclusive constritivas de direitos,
destinadas a assegurar a eficácia da decisão que se venha a proferir. Mas,
também aqui, tais comissões podem ter legítimos fundamentos para pretender
sejam tomadas medidas acauteladoras como a prisão provisória, a
indisponibilidade de bens ou a proibição de alguém ausentar-se do país. Neste
caso, deverão apresentá-los à autoridade judicial competente, com o
requerimento adequado.
41
DJU 22.06.99, p. 31, MS 23.466-1-DF (medida liminar), rel. Min. Sepúlveda Pertence.
19
A impossibilidade de que comissão parlamentar de inquérito decrete
prisão constitui entendimento consolidado, assim na doutrina como na
jurisprudência do próprio Supremo Tribunal Federal. Ainda em 1994, ao julgar o
HC 71.039, sendo relator o Ministro Paulo Brossard, pronunciou-se a Corte no
sentido da ilegalidade manifesta de prisão decretada por presidente de CPI.42
Há menos tempo, o Ministro Celso de Mello, em acórdão de cuidadosa
fundamentação, já antes citado, reiterou o ponto de vista de que comissão
parlamentar de inquérito não tem competência para impor, mediante ato
próprio, a privação da liberdade individual.
VII. CONCLUSÕES
20
3. A fórmula “poderes de investigação próprios das autoridades judiciais” (§
3º do art. 58 da Carta Política) atribui às comissões parlamentares de inquérito
competências instrutórias amplas, que incluem a possibilidade de (i) determinar
diligências, (ii) convocar testemunhas (que têm o dever de dizer a verdade, sob
pena de crime de falso testemunho), (iii) ouvir indiciados (quando estes não
optem pelo silêncio), (iv) requisitar documentos públicos, (v) determinar a
exibição de documentos privados, (vi) convocar ministros de Estado e outras
autoridades públicas, (vii) realizar inspeções pessoais, transportando-se aos
locais necessários.
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21
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