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NAMORO E CASAMENTO: DISCERNMENTO, TRADIÇÕES, IGREJA E

GLOBALIZAÇÃO

Introdução

Damos graças a Deus, por nos unir e nos proporcionar esse momento muito
importante, em que reflectiremos sobre o caminho que nos conduz a
constituição de um casamento seguro, duradouro e harmonioso, do qual nasce
o núcleo da Igreja de Cristo – a FAMÍLIA.

Estamos todos desejosos de encontrar o rumo certo para um casamento onde a


mulher, o homem e os filhos vivem todos felizes e em harmonia, um caminho
em que cada jovem pode percorrer para encontrar um parceiro certo para a vida
toda.

Vamos percorrer, nos próximos minutos, este caminho, fazendo uma análise do
que o mundo civil nos propõem e o que a nossa mãe igreja nos ensina para
atingirmos esse desiderato.

Assim, vos proponho que sigamos a seguinte estrutura do debate:

1. Conceitos de namoro e seus objectivos;


2. Conceito de casamento & casamento duradoiro/feliz;
3. Análise do percurso rumo ao casamento;
4. Namoro e casamento cristão: características e condições
5. Discernimento como requisito fundamental;
6. A influência da tradição e da globalização para o namoro e casamento;
7. Conclusões

1. Conceitos de namoro e seus objectivos

O namoro é uma instituição de relacionamento interpessoal não moderna, que


tem como função a experimentação sentimental, comportamental e/ou sexual
entre duas pessoas através da troca de conhecimentos e uma vivência com um
grau de comprometimento inferior à do matrimônio. A grande maioria utiliza
o namoro como pré-condição para o estabelecimento de um noivado ou
casamento, definido este último ato antropologicamente como um o vínculo
estabelecido entre duas pessoas mediante o reconhecimento governamental,
religioso ou social.

O namoro é um estado transitório. Trata-se de um período durante o qual duas


pessoas mantêm uma relação amorosa com o objectivo de se conhecerem
mutuamente: se o namoro for satisfatório para ambos, a relação acaba por se
oficializar em noivado (o momento em que é feito o pedido de casamento) para
se materializar em matrimónio. Caso contrário, rompem o namoro e cada um
segue o seu caminho.
O namoro refere-se à adesão de uma pessoa a uma relação específica, mesmo
quando há factores que se interpõem. No passado, o namoro consistia numa
relação que antecedia o casamento, tinha duração relativamente curta e as
interacções eram, muitas vezes, controladas pelos pais. Actualmente, muitos
tipos de relações interpessoais são designados por este termo, desde uma
relação curta e sem compromisso até à coabitação.

Objectivos do namoro
O tempo do namoro é para que os dois se conheçam, por dentro, e não por fora.
É o momento de conhecer a história da vida do outro, seus mistérios, seus
defeitos, suas virtudes e qualidades, suas aptidões e interesses, enfim, tudo
que é preciso conhecer no outro para se saber se o namoro deve continuar ou
não.

Cada um de nós é um mistério, que só poderá ser conhecido se for revelado


com sinceridade e verdade. A caixa deste mistério, que é cada um de nós, só
tem chave por dentro, e só nós podemos abrí-la. Portanto se não houver
sinceridade nesta situação mútua, o namoro não poderá cumprir a sua missão.

Alguns casais passam o tempo do namoro se enganando mutuamente,


escondendo os defeitos e mostrando apenas as qualidades, permanecendo
desconhecidos um para o outro. Não se pode ter medo da verdade; pois como
disse Jesus, é a verdade que nos liberta. A mentira tem pernas curtas. Quem
mente, finge, engana, dissimula, logo será desmascarado e desacreditado.

Portanto, cada um deve assumir na frente de seu ou de sua namorado(a) aquilo


que realmente é, mostrando a realidade de sua vida, dos seus pais, dos seus
irmãos, etc., para que ele(a) não seja iludido(a).

2. Conceito de casamento & casamento duradoiro/feliz;

Casamento ou matrimónio é um vínculo ou contrato estabelecido entre duas


pessoas, mediante o
reconhecimento governamental, cultural, religioso ou social e que pressupõe
uma relação interpessoal de intimidade, cuja representação arquetípica é
a coabitação, embora possa ser visto por muitos como um contrato.

As pessoas casam-se por várias razões, mas normalmente fazem-no para dar
visibilidade à sua relação afectiva, para buscar estabilidade econômica e social,
para formar família, procriar e educar seus filhos, legitimar o relacionamento
sexual ou para obter direitos como nacionalidade.
Reflexão: Que tipo de casamento queremos? Porquê queremos casar?
3. Análise do percurso rumo ao casamento: onde e como é que tudo
Começa?

Através do modelo do desenvolvimento do compromisso (Stanley, 2002), pode


verificar-se que primeiro se desenvolve uma atracção baseada nas semelhanças
e diferenças do parceiro. Aqui existe algum nível de mistério nas raízes da
atracção, mas vamos assumir que a atracção se desenvolve entre duas pessoas.

Por causa desta atracção passam mais tempo juntos. Enquanto a relação
progride, a contínua satisfação entre os parceiros resulta numa crescente
vinculação emocional. Contudo, com esta vinculação emocional vem algum tipo
de ansiedade. Uma pessoa torna-se ansiosa, porque começa a pensar e a sentir
a potencial perda de algo valioso (Stanley, Lobitz & Dickson, 1999). É
importante reconhecer que o desenvolvimento de vinculação não é o mesmo
que o desenvolvimento do compromisso. Normalmente, fortes vinculações entre
parceiros, levam ao compromisso, mas isto não é automático.

É a formação de um compromisso que traz segurança a uma relação,


acalmando assim qualquer ansiedade e desenvolvendo o compromisso para
uma vinculação segura - Casamento.

A vinculação leva ao desejo de segurança, mas o compromisso traz a prova de


que se pode confiar, que a confiança existe. O casamento representa então, a
maior expressão de segurança entre parceiros românticos. Assim, um claro “Eu
aceito!” vai ser a fundação mais forte da qualidade e segurança da relação. Este
processo refere-se a casais que tiveram uma relação de namoro e que casaram,
sem coabitação prévia.

4. Características do namoro e casamento cristão


O propósito é o casamento
“Não tendes lido que aquele que os fez no princípio macho e fêmea os fez, E
disse: Portanto, deixará o homem pai e mãe, e se unirá a sua mulher, e serão
dois numa só carne? Assim não são mais dois, mas uma só carne.” (Mateus
19:4-6)
Muito embora o namoro cristão não signifique a obrigatoriedade do
casamento, ele deve ter como grande objetivo o casamento, porque esse é o tipo
de relação amorosa descrita pela bíblia como plano de Deus para o homem e a
mulher.

Em outras palavras, o namoro cristão não deve ser uma experiência por si só,
onde o objetivo é satisfazer o desejo humano, mas sim uma construção de
vínculos que apontam para o casamento como ideal de Deus.

A vontade de Deus está acima da relação

“E o mundo passa, e a sua concupiscência; mas aquele que faz a vontade de


Deus permanece para sempre.” (1 João 2:17)

Sem Deus como referência de amor no relacionamento cristão, qualquer coisa


pode ser chamada de “amor”, até mesmo os enganos frutos do pecado, trazendo
consequências terríveis.

O namoro cristão, portanto, tem na observância dos ensinamentos bíblicos


sua grande referência de amor e prática, de modo que a vontade de Deus é o
termômetro regulador da relação sempre que algo se inclina para o caminho
errado.

A família é um projeto

“O matrimônio seja honrado por todos, e o leito conjugal, sem mancha; porque
Deus julgará os fornicadores e os adúlteros.” (Hebreus 13, 4)

Quando Deus faz separação entre as condições da prática sexual, no caso da


passagem acima, bem como especifica a função de dominação e multiplicação
atribuída ao homem e a mulher em gêneses 1:28 sobre a criação, associada a
unidade do casal no cap. 2:24, deixa claro a constituição da família como um
projeto.

O namoro cristão, portanto, não deve ser apenas orientado para o casamento,
mas para compreender a função deste (do casamento) na sociedade, de modo
que o namoro seja uma etapa de amadurecimento para a constituição familiar.

Neste sentido, podemos dizer que uma característica marcante do namoro


cristão é o seu comprometimento com a fidelidade e respeito mútuo.
Em outras palavras, o namoro cristão deve existir como uma “sombra” da
família, servindo de etapa para o que virá se tornar. Desse modo, a honra entre
o casal começa pela fidelidade a Deus, ao parceiro(a) e ao objetivo da união
como “leito sem mácula”.

O domínio próprio está presente: temperança

“Digo, porém: Andai em Espírito, e não cumprireis a concupiscência da carne.


Porque a carne cobiça contra o Espírito, e o Espírito contra a carne; e estes
opõem-se um ao outro, para que não façais o que quereis.” (Gálatas 5:16,17)

Paulo relata na passagem acima como vivenciamos o conflito entre a “natureza”


do pecado e a natureza do Espírito, especificando mais na frente, no verso 22, o
“domínio próprio”, ou “temperança”, como um fruto do Espírito.

Muito diferente dos namoros “comuns”, o namoro cristão não é dominado


pelos frutos da carne, mas sim pelos frutos do espírito, porque seu propósito
está muito além da experiência amorosa, ou sexual, mas diz respeito
ao cumprimento do ideal de Deus através do casamento, o qual repercute para
vida inteira.

É pelo domínio próprio que o cristão valoriza, por exemplo, os próprios


sentimentos e até mesmo sua integridade física, ao decidir que sua vida não é
feita só de momentos e sua felicidade é proporcional às decisões que toma no
presente. Certamente foi também com essa perspectiva que escreveu Paulo:

“Todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas convêm. Todas as
coisas me são lícitas, mas eu não me deixarei dominar por nenhuma.” (1
Coríntios 6:12)

Sexo só depois do casamento. A prática sexual é destinada exclusivamente ao


matrimônio, visto que apenas o casamento é reconhecido na bíblia como união
legítima entre um homem e uma mulher, e não o namoro!

Não só pelas razões acima evocadas, mas também porque sexo cega, sexo
anestesia, sexo adultera, impedindo enxergar-se a verdade sincera
pretendida no namoro levando a um falso compromisso.

Portanto, o domínio próprio sem dúvida é uma característica fundamental para


o namoro cristão, porque ele não apenas aponta para o casamento como
objetivo maior, em substituição do “aqui e agora”, mas também para a
submissão do ser humano em relação a vontade de Deus.
Doação e sacrifício são marcas da relação

“Assim devem os maridos amar as suas próprias mulheres, como a seus próprios
corpos. Quem ama a sua mulher, ama-se a si mesmo.

Porque nunca ninguém odiou a sua própria carne; antes a alimenta e sustenta,
como também o Senhor à igreja;” (Efésios 5:28,29)

O namoro cristão não diferencia momentos de sacrifício, doação e entrega. Por


ter o casamento como alvo, o namoro reflete a concepção do casamento
independente de já tê-lo consumado ou não.

Uma característica marcante do namoro cristão é a capacidade de um se doar


pelo outro, de modo que ambos se enxerguem como “uma só carne”, muito
embora ainda não tenham concretizado essa união.

A ideia de “alimento” e “sustento” descrita na carta aos Efésios não deve ser
encarada literalmente como comida e dinheiro, apenas, mas com todo suporte
social do homem para com a mulher, incluindo segurança física e emocional,
honra, respeito, acolhimento afetivo, compreensão e principalmente referência
espiritual/moral.

Da mesma forma, a mulher deve autenticar o papel do homem através de suas


atitudes, de modo que sua postura perante a sociedade seja de reconhecimento
da sua função enquanto “cabeça”, tal como Cristo é o cabeça da igreja.

Com isso, vemos claramente a necessidade de doação e sacrifício. Observe que


não são por acaso, pois eles significam entrega, e não há relacionamento
amoroso onde não há entrega. Esta, por sua vez, implica confiança,
cumplicidade e até a negação de si mesmo.

Características do casamento católico


O matrimónio católico é definido pelo Código de Direito Canónico como sendo
"o pacto pelo qual o homem e a mulher constituem entre si o consórcio íntimo
de toda a vida, ordenado por sua índole natural ao bem dos cônjuges e à
procriação e educação da prole, entre baptizados foi elevado por Cristo nosso
Senhor à dignidade de sacramento. Pelo que, entre baptizados não pode haver
contrato matrimonial válido que não seja, pelo mesmo facto, sacramento."
(cânon 1 055). O vínculo matrimonial é, por instituição divina, perpétuo e
indissolúvel, uma vez contraído, não se pode romper senão com a morte de um
dos cônjuges. "Não separe o homem o que Deus uniu" (Mt. 19,6-9 e Mc. 10,9).
5. Discernimento como requisito fundamental
Todo matrimônio é a continuação de um namoro; então, tudo precisa começar
bem desde cedo. Sem levar a sério o namoro não será possível construir um
casamento sólido e uma família forte.

“Quando você vai comprar um sapato, não leva para casa o primeiro que
experimentou, ainda que lhe agrade o preço, a cor e o modelo. É preciso antes,
saber se serve nos seus pés; caso contrário, experimenta outro, e outro… e,
muitas vezes você vai de loja em loja até achar o par de sapatos adequados ao
seu bolso, ao seus olhos e aos seus pés”.

Ora, se um par de sapatos que dura pouco tempo, é escolhido com tanto
cuidado, para que não lhe aperte os pés na hora de ser usado, quanto mais,
então, não de deve escolher com carinho a pessoa com quem vamos construir
uma família.

Alguns princípios do discernimento


Deus é o maior interessado que o casamento seja harmonioso; logo, a fé
nos diz que Ele nos coloca no caminho da pessoa certa. Por isso, ore para
encontrar a pessoa adequada para se casar com você, se é isto que você
quer. Mais do que nós, Deus está interessado nisto; peça-lhe com fé.
É preciso saber se a outra pessoa atende às exigências mínimas que você
tem como fundamentais para a sua vida. O ideal é que cada um se case
com uma pessoa do mesmo nível social, religioso, econômico, etc. Quanto
maior forem as diferenças, maiores serão as dificuldades para a busca da
harmonia conjugal.
Professar a mesma fé;
Observe a vida espiritual do(a) parceiro(a), prestando atenção ao seu
relacionamento com a palavra, com a oração, com o senhor Jesus no seu
quotidiano;
Observe o comprometimento do(a) parceiro(a) com a igreja local: realiza
algum trabalho na igreja? É submisso; participa nas programações da
igreja?
Ouça o conselho e a experiência dos pais, padrinhos ou conselheiros.

O namoro é o tempo da escolha da pessoa adequada para conviver com você.


Antes de tudo, não seja perfeccionista, mulher perfeita ou homem perfeito, não
existem.

7. A Influência da tradição e da Globalização no namoro e no casamento

Durante vários anos, tradicionalmente, o namoro não existia, pois o encontro


entre o rapaz e a rapariga eram proibidos para salvaguardar a pureza da
rapariga, não aceites pela sociedade e conotados como prostituição. Razão pela
qual, os pais eram responsáveis pela identificação, escolha e “paquera” daquela
que seria a sua futura nora.

Com a dinâmica social, esse papel passou para, os rapazes. Apesar desse
progresso, hoje são poucas as famílias que aceitam o namoro de suas filhas
com algum rapaz antes que esse se apresente oficialmente como recomenda a
tradição.

O casamento tradicional é estabelecido através do lobolo. Este, pode ser


entendido como um casamento costumeiro e recorrente, uma prática
tradicional que envolve o kulovola (significa dar bens à família da noiva para
realizar uma união reconhecida entre os parentes do noivo e os parentes da
noiva). Apoia-se na dinâmica, transformando-se e reinventando-se ao longo dos
tempos pelas interações sociais dos indivíduos decorrentes dos processos
socioeconômicos.

O lobolo assumidamente transcende o amor, tratando-se de uma relação


intrínseca com o mundo dos antepassados da noiva e do noivo, em que se
estabelece um contacto directo e contínuo entre os vivos e os mortos e, por
intermédio da conexão com os espíritos antepassados e a realização de suas
exigências, fundamenta-se a harmonia social entre os noivos; e, sobretudo, sela
o laço social entre ambas as famílias, abençoando e garantindo prosperidade à
família que está por vir.

O fato é que algumas das características que fazem que o lobolo continue de
modo expressivo hoje são, principalmente: a honra aos pais de ambos; o seu
instrumento para superação de problemas espirituais; a busca pela harmonia
social entre vivos e antepassados; e a inscrição do indivíduo numa relação de
redes de parentesco que faz parte de sua identidade social.

Nesta prática tradicional, vê –se espelhado o respeito ao quarto mandamento da


lei de Deus: Honrar pai e mãe e outros legítimos superiores, contudo, a tradição
está sob efeitos da Globalização e a ela deverá se adaptar.

A “tradição” funciona basicamente como uma “orientação para o passado, de tal


forma que o passado tem uma pesada influência ou, mais precisamente, é
constituído para ter uma pesada influência sobre o presente”, também diz
respeito ao futuro pois as práticas estabelecidas são utilizadas como uma
maneira de se organizar o futuro”. Dessa forma, é fundamental para a
existência da tradição a “repetição” ou “rotinização da conduta quotidiana”
como “maneira de ficar no ‘único mundo que conhecemos’, um meio de evitar a
exposição a valores [“ou a maneiras de ser”] ‘estranhos’”.

A repetição ou rotinização como forma de perpetuar a tradição passa, na


modernidade, gradativamente a não mais ocorrer como outrora, já que “torna-
se vazia, a menos que esteja ajustada aos processos da reflexividade
institucional” e, fora isso, prossegue o autor, não há na atualidade “lógica –
autenticidade moral– em fazer hoje o que fizemos ontem; mas estas coisas são a
verdadeira essência da tradição”. Temos de ter cuidados com a aculturação e a
perca de nossos valores, nossa identidade, devido a globalização.
Conclusões
Queremos casamento sólido e feliz. Não existe caminho perfeito para isso e
também não existe casamento perfeito. Para tudo, precisamos contar com a
presença de Deus e ao longo desse caminho, precisamos tê – lo como nossa
referência.

Jesus caiu três vezes, numa levantou-se sozinho e noutra foi apoiado. Vamos
nos levantar e voltar ao Senhor. Isso revela a nossa fraqueza humana. Peçamos
a Deus, as bênçãos de que mais precisamos, para sermos dignos de suas
promessas.

Nazário Thenesse José


Animador da Comunidade S. Francisco de Assis, Paróquia Santa Inês de
Nhamadjessa, Diocese de Chimoio
84 688 4739

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