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NOTA DE ESCLARECIMENTO DO MINISTRO DE ESTADO DO MEIO AMBIENTE,

CARLOS MINC

Espécies ameaçadas de extinção são aquelas com elevado risco de desaparecimento


na natureza em futuro próximo, com base nos melhores dados e documentação
científica disponíveis. Para isso, diversas variáveis precisam ser consideradas e não
simplesmente a redução de população. Uma espécie não pode ser incluída na lista
apenas pela sua raridade, situação da maioria das espécies tropicais. Há a
necessidade de verificar uma combinação de fatores, como a baixa densidade, a
distribuição fragmentada, as pressões antrópicas, a redução populacional, a redução
de área de distribuição, etc.

A inclusão de espécies em listas de espécies ameaçadas reflete obrigações e


compromissos legais, tanto nacionais quanto internacionais, ao mesmo tempo em que
gera restrições de uso, com reflexos não apenas nas três esferas da administração
pública, mas também nos mais diversos setores da sociedade civil. A inclusão de
espécies em Listas Oficiais de Espécies Ameaçadas, assim reconhecidas pelo
Ministério do Meio Ambiente, a quem cabe deliberar sobre o assunto na administração
pública federal por força de lei, afeta diretamente a vida de pequenos produtores,
coletores-extrativistas, pesquisadores, proprietários de terras, empresas e respectivos
empregados, entre outros.

Além de indicar as espécies que estão com a continuidade de sua existência


ameaçada, as listas representam também um instrumento legal importantíssimo para
que se possa fazer valer as leis ambientais estabelecidas no país. São utilizadas, por
exemplo, na aplicação da Lei dos Crimes Ambientais (Lei nº. 9.605/1998), inclusive
como agravante de penalidades. Da mesma forma, são utilizadas para conter o tráfico
e o comércio ilegal de espécies, conforme disposto nos anexos da Convenção sobre o
Comércio Internacional de Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de
Extinção (CITES).

Atualmente, as listas nacionais de espécies ameaçadas passaram a orientar


programas e planos de ação para conservação e recuperação de espécies da fauna e
da flora. Estas listas são utilizadas, por exemplo, na definição de áreas prioritárias
para a biodiversidade, na implantação de novas Unidades de Conservação, na
definição de diretrizes e metas de conservação e de medidas mitigadoras de impactos
ambientais, em licenciamentos de empreendimentos, no acesso a recursos genéticos
e no manejo de recursos pesqueiros, no manejo de recursos florestais, bem como na
aplicação e orientação de financiamentos a pesquisas científicas. Listas de espécies
ameaçadas são, portanto, um importante instrumento de política pública, que deve ser
utilizado com sabedoria e parcimônia, em favor da manutenção e da recuperação da
riquíssima biodiversidade brasileira, subsidiando a tomada de decisões em níveis local
e global. Assim, a figura das "listas oficiais de espécies ameaçadas de extinção" não
deve ser vista, discutida ou tratada apenas como um instrumento de caráter técnico-
científico ou uma mera regra burocrática.

A coordenação das ações relativas à elaboração e revisão das listas foi, desde 1967,
competência do então Instituto Brasileiro do Desenvolvimento Florestal - IBDF e,
posteriormente, a partir de 1989, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis - Ibama. Mais recentemente a atribuição passou para o
Ministério do Meio Ambiente - MMA com a promulgação da Lei nº. 10.683/03, que
determina expressamente que compete ao MMA, na estrutura do governo federal,
coordenar a implementação da política de preservação, conservação e utilização
sustentável de ecossistemas, biodiversidade e florestas. Além de assessorar-se da
comunidade científica e dos seus institutos de pesquisa (Ibama, Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade - ICMBio, Instituto de Pesquisas Jardim
Botânico do Rio de Janeiro - JBRJ, Serviço Florestal Brasileiro - SFB), o MMA dispõe
de um corpo técnico especializado, composto por muitos doutores e mestres. O
ICMBio e o Ibama, por sua vez, contam em sua estrutura com vários centros de
pesquisa especializados em diversos grupos da fauna e da flora.

A responsabilidade pela publicação das listas de espécies ameaçadas é, em última


instância, do MMA, cabendo ao Ministro de Estado do Meio Ambiente assinar as
Instruções Normativas - IN que darão publicidade às mesmas. Assim, é o Ministro que
deve esclarecer à sociedade e responder aos poderes constituídos, inclusive perante o
Legislativo e o Judiciário, a cada cidadão e aos setores que se sentirem afetados pela
inclusão ou exclusão de espécies nas listas. É do MMA, também, a obrigação legal de
responder por quaisquer falhas ou omissões no processo de elaboração das listas,
independente de quem tenha contribuído com informações ao longo do processo.

Por estas razões, as informações sobre as espécies devem ser precisas, consistentes
e bem documentadas, retratando com realismo sua situação de ameaça no país, de
modo a não deixar dúvidas quanto à aplicação da legislação ambiental por parte dos
órgãos competentes, bem como por parte do Poder Judiciário. A credibilidade da lista
é fundamental e deve estar respaldada em critérios técnico-científicos seguros,
gerando resultados confiáveis, defensáveis e sustentáveis perante todos os setores
que venham a questioná-la, permitindo maior eficácia na aplicação das políticas
públicas. De outra forma, estaremos sob risco de cairmos no descrédito e perdermos
esta extraordinária ferramenta legal e de gestão que se constitui uma lista de espécies
ameaçadas.

Foi dentro desse contexto que o MMA e seus órgãos vinculados criaram os processos
de revisão das listas de espécies da fauna e da flora brasileiras ameaçadas de
extinção, que culminaram com a edição das Instruções Normativas MMA nos 3/03 e
5/04 (fauna ameaçada), e 6/08 (flora ameaçada). Em ambos os casos, por demanda
do MMA, foram realizados convênios entre o Ibama e a Fundação Biodiversitas, uma
instituição envolvida com a temática, para nos ajudar a mobilizar o setor acadêmico-
científico e assim subsidiar, tecnicamente, os processos de revisão das listas.

No caso da fauna, pela primeira vez os grupos de peixes e de invertebrados aquáticos


foram incluídos em uma lista de ameaçadas. A inclusão destes grupos adicionou
complexidade ao processo, particularmente do ponto de vista jurídico e operacional.
Isto porque, diferentemente das espécies terrestres, para as quais se aplica a Lei nº.
5.197, de 3 de janeiro de 1967, que proíbe "a utilização, perseguição, destruição, caça
ou apanha" de animais silvestres, para as espécies aquáticas aplica-se o Decreto-Lei
nº. 221, de 28 de fevereiro de 1967, que em seu Art. 2º define que "a pesca pode
efetuar-se com fins comerciais, desportivos ou científicos", sendo incentivada a
utilização dos chamados "recursos pesqueiros".

Por essa razão, a IN 5/04 trouxe, além de peixes e invertebrados aquáticos


ameaçados de extinção, um segundo anexo contendo uma lista dessas espécies na
condição de sobreexplotadas ou ameaçadas de sobreexplotação, já que, por força da
Lei nº. 10.683, de 28 de maio de 2003, cabe ao MMA fixar as normas, critérios e
padrões de uso destas espécies, assim definidas com base nos melhores dados
científicos existentes.
Após a edição da lista dos peixes e dos invertebrados aquáticos ameaçados de
extinção, o MMA recebeu, da Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca - SEAP e do
Ibama, proposta para revisão e enquadramento de algumas das espécies incluídas
nos anexos da IN nº 5/04. A solução desta questão deu-se em uma série de reuniões,
tomadas no âmbito da Câmara Técnica Permanente de Espécies Ameaçadas de
Extinção e de Espécies Sobreexplotadas ou Ameaçadas de Sobreexplotação, da
Comissão Nacional de Biodiversidade - CONABIO, com a participação de
especialistas dos grupos das espécies questionadas. Por meio da IN nº 52/05,
algumas espécies sobre as quais havia dúvidas foram realocadas de categoria ou
retiradas das listas, a partir de recomendação da CONABIO.

Em relação à flora, o convênio entre o Ibama e a Fundação Biodiversitas ocorreu em


dezembro de 2002. Em dezembro de 2005, a Biodiversitas submeteu ao MMA uma
proposta contendo listagem de 1537 espécies. Somente em julho de 2006, após várias
solicitações, a Biodiversitas encaminhou ao MMA os formulários que embasaram a
inclusão das espécies na lista. De posse dessas informações, as áreas técnicas do
MMA, do Ibama, do JBRJ, do ICMBio e do SFB fizeram uma criteriosa análise dos
dados constantes dos formulários. Dessa análise, constatou-se que, para a grande
maioria das espécies, havia ausência de informações que justificassem a sua inclusão
na condição de ameaçadas. Obviamente, esse não é um problema da comunidade
científica que, na melhor das intenções e do conhecimento disponível, alimentou o
processo com informações técnicas. Caberia à Biodiversitas identificar as fichas
incompletas, solicitar a complementação de dados aos cientistas e, em última
instância, não incluir na lista proposta espécies com documentação deficiente. Assim,
no que se refere à lista da flora, não restou ao MMA outra opção que não fosse a
publicação da Instrução Normativa nº 6, de 23 de setembro de 2008, com 472
espécies ameaçadas (Anexo I) e uma segunda lista com 1079 espécies (Anexo II),
consideradas com deficiência de dados.

Para as espécies constantes do Anexo I (ameaçadas de extinção), o MMA


desenvolverá, juntamente com suas vinculadas, um plano estratégico voltado à sua
efetiva conservação e recuperação. Estes compromissos representam um claro
indicativo do imenso desafio associado à conservação e à recuperação das espécies
ameaçadas de extinção, cujo enfrentamento requererá a mobilização não apenas do
MMA, mas também de instituições de pesquisa e dos demais órgãos componentes do
Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA, além da academia e de
organizações ambientalistas não-governamentais, atuando em uma efetiva parceria
sob a coordenação do MMA. Para as espécies constantes do Anexo II, por sua vez,
serão priorizados recursos para pesquisa, de modo a esclarecer seus reais status de
ameaça, cuja condução será coordenada pelo JBRJ e ICMBio. Tão logo ocorra o
esclarecimento do status de conservação destas espécies, aquelas consideradas
ameaçadas serão incorporadas à Lista Oficial de Espécies da Flora Ameaçadas de
Extinção, conforme previsto na Instrução Normativa que a publicou.

No caso das 108 espécies presentes na lista da flora anteriormente vigente (publicada
em 1992 pelo Ibama), o processo de consulta conduzido pela Biodiversitas havia
resultado na manutenção de 55 espécies na condição de ameaçadas, na exclusão de
18 espécies consideradas não ameaçadas, e em outras 35 espécies excluídas sob o
argumento da deficiência de dados. Porém, na falta de informações que
consubstanciassem a retirada destas 35 espécies deficientes de dados, o MMA optou,
adotando o princípio da precaução, por mantê-las na lista das ameaçadas, até que
surjam dados que fundamentem a sua exclusão. Isto ocorreu pelo fato de que também
a retirada de uma espécie da Lista de Ameaçadas deve ser realizada somente com
base em dados que justifiquem tal ato, uma vez que exclusões arbitrárias tornariam
espécies desprotegidas, o que poderia resultar em perdas ao patrimônio biológico
brasileiro. Isto mostra a responsabilidade e a seriedade com que o MMA vem tratando
as questões relativas à conservação da biodiversidade.

Ao MMA não interessa a inclusão ou exclusão de espécies da lista de forma arbitrária,


sob quaisquer argumentos. Não procedem insinuações de ingerência de ordem
política ou econômica na definição de tais listas. Um exemplo disso é que figuram na
Lista dezenas de espécies de uso econômico, como é o caso do palmito (Euterpe
edulis), espécie outrora tradicionalmente explorada no bioma Mata Atlântica. Da
mesma forma, não interessa ao MMA polemizar sobre um assunto tão relevante para
o país ou criar qualquer sentimento de desrespeito à comunidade científica ou a
instituições ambientalistas, que formam importantes elos na luta constante em favor da
conservação da rica biodiversidade brasileira. Entretanto, é nosso dever restabelecer a
verdade dos fatos perante a sociedade brasileira e a comunidade internacional, diante
da veiculação de declarações de que estaríamos sendo negligentes ou mesmo
"irresponsáveis" no trato deste que, certamente, é um dos maiores patrimônios
nacionais: a nossa biodiversidade.

Se negligência houve, foi dos responsáveis pela elaboração do relatório encaminhado


ao MMA, que continha proposta de lista da flora ameaçada de extinção com grande
número de espécies sem documentação científica que respaldasse sua inclusão em
um instrumento dessa natureza.

A colaboração de cientistas e ambientalistas na elaboração das listas de espécies


ameaçadas de extinção é fundamental. Entretanto, ciente de suas responsabilidades
perante nossa sociedade, o MMA não delega nem delegará jamais, a quem quer que
seja, sua atribuição de coordenar a implementação da Política Nacional de
Biodiversidade e a aplicação de seus instrumentos.

Espécies Brasileiras Ameaçadas de Extinção, Sobreexplotadas ou


Ameaçadas de Sobreexplotação

O processo de extinção está relacionado ao desaparecimento de espécies ou grupos de


espécies em um determinado ambiente ou ecossistema. Semelhante ao surgimento de
novas espécies, a extinção é um evento natural: espécies surgem por meio de eventos de
especiação (longo isolamento geográfico, seguido de diferenciação genética) e
desaparecem devido a eventos de extinção (catástrofes naturais, surgimento de
competidores mais eficientes).

Normalmente, porém, o surgimento e a extinção de espécies são eventos extremamente


lentos, demandando milhares ou mesmo milhões de anos para ocorrer. Um exemplo
disso foi a extinção dos dinossauros, ocorrida naturalmente há milhões de anos, muito
antes do surgimento da espécie humana, ao que tudo indica devido à alterações
climáticas decorrentes da queda de um grande meteorito.

Ao longo do tempo, porém, o homem vem acelerando muito a taxa de extinção de


espécies, a ponto de ter-se tornado, atualmente, o principal agente do processo de
extinção. Em parte, essa situação deve-se ao mau uso dos recursos naturais, o que tem
provocado um novo ciclo de extinção de espécies, agora sem precedentes na história
geológica da terra.

Atualmente, as principais causas de extinção são a degradação e a fragmentação de


ambientes naturais, resultado da abertura de grandes áreas para implantação de
pastagens ou agricultura convencional, extrativismo desordenado, expansão urbana,
ampliação da malha viária, poluição, incêndios florestais, formação de lagos para
hidrelétricas e mineração de superfície. Estes fatores reduzem o total de habitats
disponíveis às espécies e aumentam o grau de isolamento entre suas populações,
diminuindo o fluxo gênico entre estas, o que pode acarretar perdas de variabilidade
genética e, eventualmente, a extinção de espécies.

Outra causa importante que leva espécies à extinção é a introdução de espécies exóticas,
ou seja, aquelas que são levadas para além dos limites de sua área de ocorrência
original. Estas espécies, por suas vantagens competitivas e favorecidas pela ausência de
predadores e pela degradação dos ambientes naturais, dominam os nichos ocupados
pelas espécies nativas. Com o aumento do comércio internacional, muitas vezes
indivíduos são translocados para áreas onde não encontram predadores naturais, ou
ainda são mais eficientes que as espécies nativas no uso dos recursos. Dessa forma,
multiplicam-se rapidamente, ocasionando o empobrecimento dos ambientes, a
simplificação dos ecossistemas e a extinção de espécies nativas.

Espécies ameaçadas são aquelas cujas populações e habitats estão desaparecendo


rapidamente, de forma a colocá-las em risco de tornarem-se extintas. A conservação dos
ecossistemas naturais, sua flora, fauna e os microrganismos, garante a sustentabilidade
dos recursos naturais e permite a manutenção de vários serviços essenciais à
manutenção da biodiversidade, como, por exemplo: a polinização; reciclagem de
nutrientes; fixação de nitrogênio no solo; dispersão de propágulos e sementes;
purificação da água e o controle biológico de populações de plantas, animais, insetos e
microorganismos, entre outros. Esses serviços garantem o bem estar das populações
humanas e raramente são valorados economicamente.

A conservação da biodiversidade brasileira para as gerações presentes e futuras e a


administração do conflito entre a conservação e o desenvolvimento não sustentável são,
na atualidade, os maiores desafios do Ministério do Meio Ambiente.

O MMA tem, portanto, enormes responsabilidades em relação às espécies ameaçadas de


extinção. Em primeiro lugar, destaca-se a elaboração das listas das espécies ameaçadas,
com a finalidade de quantificar o problema e permitir o direcionamento de ações para
solucioná-lo; em segundo, a proteção e a recuperação dessas espécies; e em terceiro, e
talvez o mais complexo, o desenho de um modelo de desenvolvimento que assegure a
utilização sustentável dos componentes da biodiversidade.

Estes objetivos não podem, entretanto, ser alcançados individualmente por um


Ministério ou isoladamente pelo governo mas, tão somente, por meio de uma efetiva
aliança e de uma concertada ação nacional, que deve envolver as esferas de governo
federal, estadual e municipal, além dos setores acadêmico-científico, não-
governamental e empresarial.

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